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A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSIGNIFICÂNCIA E IRRELEVÂNCIA

PENAL DO FATO NO DELITO DE ROUBO

Talitha Marc Nunes de Oliveira1


Emmanoel Lundberg2

RESUMO
O presente artigo científico busca estudar os princípios da insignificância e da
irrelevância penal do fato sob o prisma do delito de roubo. Expõe os entendimentos
doutrinários e jurisprudenciais a respeito do tema. A pesquisa bibliográfica foi a
metodologia usada, bem como exames a documentos indiretos referentes ao
assunto. Ficou evidenciado que, parte considerável da doutrina e jurisprudência
entende pela não aplicação de ambos os princípios ora analisados no caso do delito
de roubo, existindo uma minoritária parcela que infere de maneira contrária.
Constatou-se que, no caso do princípio da insignificância, entende esta última
corrente que, pelo fato do roubo ser um delito complexo e que tutela dois bens
jurídicos (patrimônio e liberdade individual), não será possível falar no citado crime
quando está ausente a ofensa a um desses bens, podendo haver a desclassificação
deste para outro delito que seja mais pertinente. Já quanto ao princípio da
irrelevância penal do fato, a corrente minoritária entende que, dependendo do caso
sob análise e tendo em vista o princípio da necessidade da pena, pode haver a não
aplicação desta, nos ditames do artigo 59 do Código Penal.

ABSTRACT
...

INTRODUÇÃO

O delito de roubo é caracterizado pela sua complexidade e por tutelar dois


bens jurídicos, quais sejam: o patrimônio e a liberdade do indivíduo. Logo, discute-se
sobre a possibilidade de ser aplicado o princípio da insignificância ou o princípio da
irrelevância penal do fato a tal crime.

1
Bacharelanda em Direito pela Universidade Potiguar – UNP. E-mail: talithamarc@hotmail.com
2
Professor Orientador da Universidade Potiguar – UNP. E-mail: emmanoel.unp@gmail.com
De acordo com o posicionamento da doutrina majoritária, temos que, não será
possível utilizar o princípio da insignificância (excludente da tipicidade material do
fato) no que se refere ao crime de roubo, pois, por se tratar de delito em que
necessariamente temos a incidência da violência ou grave ameaça à pessoa, não há
que se falar em conduta ínfima, desprovida de lesividade. Ademais, outro fator de
suma importância para a não aceitação ora discutida é a afetação da liberdade do
indivíduo que, originariamente, já é considerada de extrema relevância para o Direto
penal.

Já a corrente minoritária defende que, justamente por se tratar de crime que


tutela dois bens jurídicos, se um deles for considerado irrelevante, poderá haver a
devida desclassificação, como é o caso da desclassificação do delito de roubo
(artigo 157 do Código Penal) para o de constrangimento ilegal (artigo 146 do Código
Penal) quando o valor da res furtiva for ínfimo.

Quanto a aplicação do princípio da irrelevância penal do fato no delito de


roubo, somente a análise de uma determinada situação concreta poderá dizer se é
caso de desnecessidade da pena (princípio da necessidade da pena
consubstanciado no artigo 59 do Código Penal), ainda mais se examinado sob a
problemática da realidade do sistema prisional brasileiro. Aqui estaríamos diante de
uma excludente de punição.

Para a exploração do estudo proposto foi feita uma pesquisa bibliográfica,


além de buscas a documentos eletrônicos referentes ao assunto, por meio de várias
fontes já publicadas.

Assim sendo, o presente artigo científico visa estudar os princípios da


insignificância e da irrelevância penal do fato, com o intuito de examinar a
possibilidade de aplicação destes no delito de roubo, tendo em vista a citada
duplicidade de bens jurídicos tutelados por este.

1 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: ORIGEM, RELAÇÃO COM OUTROS


PRÍNCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO PENAL, NATUREZA JURÍDICA E
CONCEITO.
A origem do princípio da insignificância é tema deveras controvertido, não
sendo possível determinar um lapso temporal certeiro, existindo, assim,
posicionamentos doutrinários que buscam identificar tal origem histórica.

Nesse diapasão, temos uma primeira corrente de pensamento que


segundo o apontamento de Gomes (2013, p. 53):

Para alguns autores (ACKEL FILHO, Diomar. O princípio da insignificância


no Direito penal, JTACrim, c. 94, p. 73, por exemplo) o princípio da
insignificância já existia no Direito romano, época em que o praetor cuidava
da criminalidade de bagatela. Mas a ele também fez referência VON LISZT
no final do século XIX (Tratado de Derecho penal. Trad. Jimenes de Asúa.
20. Ed. Alemã. Madrid: Reus, s/d, p. 21) [...]. Na Europa o Bagatelledelikte
ganhou amplo conhecimento depois da segunda Guerra Mundial,
particularmente em relação aos delitos patrimoniais. Mas sabe-se que não é
um princípio aplicável tão somente ao âmbito estrito desses delitos. É um
princípio de Direito Penal e como tal com capacidade para influenciar, dirigir
e determinar o conteúdo das normas penais incriminadoras [...]

No mesmo sentido temos o posicionamento de Carlos Vico Mañas (1994, p.


56), “No que diz respeito à origem, pode-se afirmar que o princípio já vigorava no
direito romano, pois o pretor, em regra geral, não se ocupava de causas ou delitos
insignificantes, seguindo a máxima contida no brocardo minimis non curat pretor”.3

Quanto a esta concepção, existem críticas a ideia da origem do princípio da


bagatela4 ter sido no Direito Romano Antigo, visto que este teria maior
aprimoramento na seara do direito civil do que no direito penal.

Ademais, alguns doutrinadores alemães entendem que a origem do princípio


da insignificância estaria ligada ao fim da segunda Guerra Mundial, com a crise
econômica européia, pois o excessivo desemprego e a falta de alimentação causada
por esta, desencadearam pequenos subtrações que foram denominadas de
“criminalidade de bagatela”, a supracitada Bagatelledelikte. 5

3
Carlos Vico Mañas apud BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus nº 184.556/ MS.
Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Julgamento: 13/08/2013, Publicado
no DJ de 22/08/2013. Disponível em HTTP://www.stj.jus.br. Acesso em: 22 abril 2014.
4
Segundo GOMES (2013, p. 51), o termo princípio da bagatela foi nomeado por TIEDMANN (em
JUS, p. 108-113) já a denominação princípio da insignificância foi dada por ROXIN (Kriminal-politik
und Strafrechtssystem, 2. Ed., 1973, p. 24, em JUS, 1964).
5
Wesley Costa de Oliveira. Princípio da insignificância e sua aplicação nas ações penais ambientais.
Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4154>. Acesso em: 22 de
abril de 2014.
Noutro pórtico, segundo Bitencourt (2012, p. 60) o citado princípio da
insignificância foi primordialmente defendido por “Claus Roxin em 1964, que voltou a
repeti-lo em sua obra Política Criminal y Sistema Del Derecho Penal, partindo do
velho adágio latino mínima non curat praetor”.

Com relação aos princípios norteadores da insignificância, temos que analisar


inicialmente o princípio da intervenção mínima. Este, segundo Luiz Luisi6, “nasce
vinculado ao pensamento iluminista que pretendeu reduzir, de forma geral, toda
legislação e, em especial, as leis penais”.

O princípio da intervenção mínima tem previsão na Declaração dos Direitos


do Homem e do Cidadão datada em 1789 quando em seu artigo 8º preceitua o
seguinte: “A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias
e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada
antes do delito e legalmente aplicada”.7

Tal princípio tem como base duas características: a subsidiariedade e


fragmentariedade. Assim, temos que, respectivamente, o direito penal só deve ser
aplicado quando outros ramos do direito não tiverem mais êxito e deverá atuar
apenas nos casos de lesão ou perigo de lesão que seja considerável quando
analisado sob o prisma do bem juridicamente salvaguardado.

Merece transcrição a lição de Carlos Vico Mañas (1994, p. 56):

O princípio da insignificância surge justamente para evitar situações dessa


espécie, atuando como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal,
com o significado sistemático e político-criminal de expressão da regra
constitucional do nullum crimen sine lege, que nada mais fez do que revelar
a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal. 8

Desta feita, podemos concluir que o Direito Penal é considerado ultima ratio,
ou seja, só deve ser aplicado quando a necessidade for excepcional, quando o
controle social não mais tiver eficácia.

6
1991 apud LIMA, 2012, p. 131.
7Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Disponível em <
http://www.fd.unl.pt/docentes_docs/ma/mla_MA_19926.pdf>. Acesso em 19 de abril de 2014.
8
Carlos Vico Mañas apud BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus nº 184.556/ MS.
Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Julgamento: 13/08/2013, Publicado
no DJ de 22/08/2013. Disponível em HTTP://www.stj.jus.br. Acesso em: 22 abril 2014.
Segundo leciona Heleno Cláudio Fragoso (2003 apud SANCHES, 2014, p.
72):

Desde logo se deve excluir do sistema penal a chamada criminalidade de


bagatela e os fatos puníveis que se situam puramente na ordem moral. A
intervenção punitiva só se legitima para assegurar a ordem externa. A
incriminação só se justifica quando está em causa de um bem ou valor
social importante. Não é mais possível admitir incriminações que resultem
de certa concepção moral da vida, de validade geral duvidosa, sustentada
pelos que têm poder de fazer a lei. Orienta-se o Direito Penal de nosso
tempo no sentido de uma nova humanização, fruto de larga experiência
normativa.

Outro princípio que também é considerado basilar para a teoria da


insignificância é o da proporcionalidade, segundo este, é preciso haver uma
correlação ponderada entre a gravidade da infração praticada e a pena aplicada.

Este não se encontra explicitado no texto da Carta Maior, mas é um princípio


solidificado e respeitado pelo ordenamento jurídico pátrio, achando-se
implicitamente em outros princípios como, por exemplo, o da individualização das
penas (art. 5º, XLVI, da Constituição Federal).

Nos dizeres de Sanches (2014, p. 99):

Trata-se de um princípio constitucional implícito, desdobramento lógico do


mandamento da individualização da pena. Para que a sanção penal cumpra
a sua função, deve se ajustar à relevância do bem jurídico tutelado, sem
desconsiderar as condições pessoais do agente. Esse mandamento foi
aprofundado na teoria geral da pena.

Logo, por tudo até aqui explicitado, é de suma relevância que haja uma real
conformidade no que diz respeito à conduta punível e a intervenção do Estado.

Assim sendo, podemos concluir que, o princípio da insignificância busca


repelir qualquer punição que seja aplicada excessivamente em razão de um ato de
lesividade ínfima, apesar do tal ato se emoldurar ao tipo penal.

Entrando no viés da natureza jurídica do princípio da insignificância, temos o


entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência apontando esta como causa
excludente de tipicidade.

Tal entendimento tem em vista a orientação atual de conceituação da


tipicidade penal que consiste na reunião da tipicidade formal, material e a
antinormativiade. É o conhecido conceito de tipicidade conglobante de Zaffaroni.
Para este, se existe uma norma que estimula não há como aceitar que exista
outra proibindo, logo, “A tipicidade conglobante é um corretivo da tipicidade legal,
posto que pode excluir do âmbito do típico aquelas condutas que apenas
aparentemente são proibidas”.9

Registre-se que, aquilo que Zaffaroni conceitua de tipicidade conglobante Luiz


Flávio Gomes (2013, p. 190-191) entende como tipicidade material, senão vejamos:

O conceito de tipicidade conglobante de ZAFFARONI, que nos ensina o


seguinte: a tipicidade objetiva é composta de uma parte sistemática
(conduta, resultado etc.) e outra conglobante (análise do fato diante de
todas as normas do ordenamento jurídico – excluindo-se as justificantes,
que cuidam de causas excludentes da antijuridicidade). Tipicidade objetiva =
tipicidade sistemática + tipicidade conglobante. Desta última, fazem parte
(a) a lesividade e (b) a imputação objetiva.

[...]

O que ZAFFARONI inclui na tipicidade conglobante (ofensividade +


imputação objetiva) nós inserimos no conceito de tipicidade material.

Logo, é certo que, a conduta será considerada antinormativa pelo fato de não
ser imposta ou fomentada pelo direito penal e a tipicidade material está relacionada
a “se a conduta representa relevante lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico”.10

Nessa esteira, transcrevemos os ensinamentos de Edilson Mougenot Bonfim


e de Fernando Capez (2004):

Na verdade, o princípio da bagatela ou da insignificância (...) não


tem previsão legal no direito brasileiro (...), sendo considerado,
contudo, princípio auxiliar de determinação da tipicidade, sob a ótica da
objetividade jurídica. Funda-se no brocardo civil minimis non curat praetor e
na conveniência da política criminal. Se a finalidade do tipo penal é tutelar
um bem jurídico quando a lesão, de tão insignificante, torna-se
imperceptível, não será possível proceder a seu enquadramento típico, por
absoluta falta de correspondência entre o fato narrado na lei e o
comportamento iníquo realizado. É que, no tipo, somente estão descritos os
comportamentos capazes de ofender o interesse tutelado pela norma. Por
essa razão, os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos.
A tipicidade penal está a reclamar ofensa de certa gravidade exercida sobre
os bens jurídicos, pois nem sempre ofensa mínima a um bem ou interesse
juridicamente protegido é capaz de se incluir no requerimento reclamado
pela tipicidade penal, o qual exige ofensa de alguma magnitude a esse
mesmo bem jurídico.11

9
Zaffaroni, 2004, p. 436.
10
Sanches, 2014, p. 72.
11 Bonfim ; Capez apud BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus nº 184.556/ MS.

Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Julgamento: 13/08/2013, Publicado
no DJ de 22/08/2013. Disponível em HTTP://www.stj.jus.br. Acesso em: 22 de abril 2014.
Conforme elucida Gomes (2013) se um fato é insignificante ele é formalmente
típico, porém não há que se falar em tipicidade material. Ressalta ainda que, a
tipicidade formal que é composta da conduta, do resultado naturalístico, nexo de
causalidade e da adequação do fato à letra da lei, não exaure a composição global
da tipicidade penal, posto que, é necessária a observância da dimensão material
(desaprovação da conduta e desaprovação do resultado jurídico) para que haja
completude deste.

Não é outro o posicionamento do Supremo Tribunal Federal 12 que, em


diversos julgados, adotou a tese de exclusão da tipicidade material.

Ademais, analisando sob o prisma do aspecto hermenêutico, o princípio da


insignificância é um instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, posto que,
mesmo que haja a subsunção legal, se não houver tipicidade material, deve ser
apartada a norma penal, de forma que estaremos diante de um fato atingido pela
atipicidade.13

Ressalte-se o que registra Gomes (2013, p. 89) a respeito do posicionamento


de ZIPF sobre o método de interpretação restritiva do tipo:

O método de interpretação restritiva do tipo, do qual o critério da


insignificância constitui instrumento, só seria possível nos casos em que a
redação legal do tipo penal contivesse característica (p. exemplo, o
resultado) que se pudesse confrontar com a escassa importância da ofensa
material verificada ao bem jurídico tutelado. Conforme tal posição, somente
os delitos materiais comportariam juízo de insignificância sob a ótica penal,
com a conseqüente possibilidade de reconhecimento de sua atipicidade
material. Tal postura, como se vê, considera exclusivamente o critério do
desvalor do resultado para a configuração do fato como delito de bagatela,
ignorando, por tanto, que também o desvalor da ação deve ser levado em
conta para a fixação do caráter irrelevante da conduta, segundo o
parâmetro da nocividade social, de cunho eminentemente normativo.

Por fim, resta-nos conceituar o princípio da insignificância que, saliente-se,


não encontra resguardo em nenhuma norma notória, sendo, pois, uma construção
puramente doutrinária e jurisprudencial.

Importante destacar o que elucida Gomes (2013, p. 51-52) de forma clara e


objetiva, senão vejamos:

12
O Supremo Tribunal Federal reconheceu em 29.06.2004 a aplicação do princípio da insignificância
no Direito penal quando concedeu Medida Cautelar no Habeas Corpus 84.412-0/ SP. Relator: Min.
Celso de Mello, Segunda Turma. Julgamento: 19/10/2004. Publicado no DJ de 19/11/2004.
Disponível em HTTP://www.stf.jus.br. Acesso em: 22 de abril 2014.
13
Sanches, 2014.
O princípio da insignificância “é o que permite não processar condutas
socialmente irrelevantes, assegurando não só que a Justiça esteja mais
desafogada, ou bem menos assoberbada, senão permitindo também que
fatos nímios não se transformem em uma sorte de estigma para seus
autores. Do mesmo modo, abre portas para uma revalorização do direito
constitucional e contribui para que se imponha penas a fatos que merecem
ser castigados por seu alto conteúdo criminal, facilitando a redução dos
níveis de impunidade. Aplicando-se este princípio a fatos nímios se fortalece
a função da Administração da Justiça, porquanto deixa de atender fatos
mínimos para cumprir seu verdadeiro papel. Não é um princípio de direito
processual, senão de Direito penal.

Outrossim, o princípio da bagatela no entender de Diomar Ackel Filho (1988,


p. 73) é “aquele que permite infirmar a tipicidade de fatos que, por sua
inexpressividade, constituem ações de bagatela, despidas de reprovação, de modo
a não merecerem valoração da norma penal, exsurgindo, pois, como irrelevantes”.14

Assim sendo, por tudo posto, sabe-se que, somente o caso concreto dirá se é
possível a aplicação ou não desse princípio, não havendo como taxar, através de
uma conceituação, quando obrigatoriamente será este observado.

1.1 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Importante distinção deve ser feita no que se refere ao princípio da


adequação social e o princípio da insignificância.

Hans Welzel foi o responsável por impulsionar o princípio da adequação social no


âmbito do direito penal e, precisamente, da teoria do delito. Segundo Gomes (2013),
esta teoria antes de Welzel era sistematizadora, não considerava a chamada
“referenciabilidade social”, só graças a este que houve, primordialmente, uma vinculação
entre o sistema do fato punível juntamente a realidade social e a hermenêutica.

De acordo com Greco (2011), o supracitado princípio teria uma dupla função. A
primeira seria de descartar condutas que a sociedade aceitasse e entendesse como
adequadas. A segunda função seria direcionada ao legislador e desta poderíamos extrair
duas vertentes: a) quando o legislador, na busca de salvaguardar os bens mais
importantes, for eleger condutas que serão proibidas, não poderá reprimir estas caso
sejam consideradas socialmente adequadas. Serviria o princípio da adequação social
como uma direção a ser seguida; b) já a segunda vertente teria o propósito de fazer com

14
Diomar Ackel Filho apud REBÊLO, José Henrique Guaracy. Breves considerações sobre o princípio
da insignificância. Disponível em: http://daleth.cjf.jus.br/revista/numero10/artigo7.htm. Acesso em:
22 de abril de 2014.
que o legislador repensasse os tipos penais e, além disso, revogasse aqueles que se
adaptaram fielmente à evolução da sociedade.

O próprio Rogerio Greco (2011, p. 56) enuncia que “O princípio da adequação


social, por si só, não tem o condão de revogar tipos penais incriminadores”. No mesmo
viés de pensamento temos Gomes (2013) quando afirma que “Aquilo que está vedado
taxativamente não pode ser “revogado” pela maioria, sob o argumento da sua
adequação social”.

Nesse diapasão, como ensina Capez (2012), se o princípio da adequação social


estiver operando juntamente com outros princípios é possível que haja a exclusão da
tipicidade, o que não pode é o conceito de adequação social ser admitido de forma
exclusiva.15

Importante ressalva é feita por Bitercourt (2011, p. 50) no que concerne a


adequação social:

As consequências da chamada “adequação social” não encontra ainda o seu


porto seguro. Discute-se se afastaria a tipicidade ou simplesmente eliminaria a
antijuridicidade de determinadas condutas típicas. O próprio Welzel, seu mais
destacado defensor, vacilou sobre seus efeitos, admitindo-a, incialmente, como
excludente de tipicidade, depois como causa de justificação e, finalmente, outra
vez como excludente da tipicidade. Por último, conforme anota Jescheck, Welzel
acabou aceitando o princípio da “adequação social” somente como princípio
geral de interpretação, entendimento até hoje seguido por respeitáveis
penalistas.

[...]

O certo é que a imprecisão do critério da “adequação social” – diante das mais


variadas possibilidades de sua ocorrência -, que, na melhor das hipóteses, não
passa de um princípio inseguro e relativo, explica por que os mais destacados
penalistas internacionais, entre outros, não o aceitaram nem como excludente
da tipicidade nem como causa de justificação.

Distinguindo claramente o princípio da insignificância do princípio da


adequação social temos ainda a boa doutrina de Capez16 quando explica que, o
princípio da adequação social difere do princípio da insignificância, pois no primeiro
a conduta não receberá punição em razão da sociedade não mais a reputar injusta,
já no segundo, a conduta não deixa de ser injusta, porém será desprovida, ao
menos ofensivamente, de lesividade.

15
No mesmo sentido temos o entendimento de Gomes (2013, p. 187) cuja “A adequação social é causa
supralegal de exclusão da tipicidade”.
16
Capez, 2012, p. 32.
Registre-se o que ensina o mestre Francisco de Assis Toledo17, em sua obra
"Princípios Básicos de Direito Penal" - Ed. Saraiva - 4a ed. - 1991 - p. 132:

"Welzel considera que o princípio da adequação social bastaria para excluir


certas lesões insignificantes. É discutível que assim seja. Por isso, Claus
Roxin propôs a introdução, no sistema penal, de outro princípio geral para a
determinação do injusto, o qual atuaria igualmente como regra auxiliar de
interpretação. Trata-se do denominado princípio da insignificância, que
permite, na maioria dos tipos, excluir os danos de pouca importância. Não
vemos incompatibilidade na aceitação de ambos os princípios que,
evidentemente, se completam e se ajustam à concepção material do tipo
que estamos defendendo. Segundo o princípio da insignificância, que se
revela por inteiro pela sua própria denominação, o direito penal, por sua
natureza fragmentária só vai até onde seja necessário para a proteção do
bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas..."

Assim sendo, segundo este princípio uma conduta será entendida como atípica
se estiver amparada pelo que o meio social entende como adequado (aquilo que não é
proibido pela cultura, costumes, entre outros), deixando então de ser injusta, e, acentue-
se, desde que não seja contrário ao que preceitua a Carta Magna, pois, segundo Gomes
(2013, p.188) “a adequação social está subordinada à democracia material, ou seja, sua
incidência tem que respeitar os direitos e garantias fundamentais das pessoas”.

2 DA INFRAÇÃO BAGATELAR PRÓPRIA E IMPRÓPRIA

É de suma importância para nosso estudo diferenciarmos a infração bagatelar


própria daquela que é imprópria.

Inicialmente temos que assentar o entendimento sobre o que seria uma


infração bagatelar, no ensinamento de Sanches (2014) seria o caso de uma ofensa
que, apesar de concretamente praticada, é tão reduzida que não há como afetar
materialmente e de maneira severa o bem juridicamente protegido.

Nessa esteira de pensamento, não será necessária a interferência penal


sobre um fato que se amolde ao conceito acima elucidado, caberá a outros ramos
do Direito tal encargo.

Quanto à infração bagatelar própria, temos a boa doutrina de Gomes (2013)


lecionando que tal infração é aquela que na sua gênese já não tem relevância

17
Francisco de Assis Toledo apud BRASIL, Tribunal de Justiça de Minhas Gerais, APELAÇÃO
CRIMINAL N° 1.0351.02.012773-1/001. Relator: Exmo. Sr. Des. Alexandre Victor de Carvalho -
Relator para o acórdão: Exmo Sr. Des. Hélcio Valentim. 5ª Câmara Criminal. Julgamento:
03/10/2006. Publicação: 10/11/2006. Disponível em < http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 24 de abril
de 2014.
alguma para a seara penal, posto que, não se vislumbra uma ação ou resultado, ou
até mesmo ambos, que tenham relevante desvalor. Neste caso, estaríamos frente a
uma clara aplicação do princípio da insignificância.

Ainda segundo o renomado autor, “Assim, se estamos diante de uma infração


bagatelar própria não há que se perquirir o animus do agente, seus antecedente,
sua vida pregressa etc”.18

Na infração bagatelar própria, que, como já afirmado, é situação de


aplicabilidade do princípio da insignificância, não há como especificar taxativamente
o que, de fato, seria insignificante, é de comum entendimento que somente o caso
concreto irá abrir caminho para uma interpretação quanto ao reconhecimento ou não
da aplicação de tal princípio.

Já a infração bagatelar imprópria é aquela que:

Nasce relevante para o Direito Penal (porque há desvalor na conduta bem


como no desvalor do resultado), mas depois se verifica que a incidência de
qualquer pena no caso concreto apresenta-se totalmente desnecessária
(princípio da desnecessidade da pena conjugado com o princípio da
irrelevância do fato).19

Posto isto, pode-se concluir que, o Princípio da Irrelevância Penal do Fato20 é


aplicado em face de uma infração bagatelar imprópria, qual seja, aquela que
indubitavelmente é relevante para o Direito Penal, visto que há desvalor originário da
conduta assim como no resultado.

Ocorre que, no caso da infração bagatelar imprópria há, sob o prisma de


política criminal, uma valoração de critérios subjetivos, pois, segundo Gomes (2013),
importa para esta, por exemplo, o autor, seus antecedentes, sua personalidade, a
culpabilidade, reparação de danos, colaboração com a justiça etc. Ressalte-se que,
tais condições podem ocorrer de forma combinada ou alternada.

Ora, como bem afirmamos outrora, a infração bagatelar imprópria tem


assentamento na união entre o princípio da desnecessidade da pena e o princípio da

18
GOMES, 2013, p. 21.
19
GOMES, Op. Cit., p. 28.
20
Entende-se que o princípio da irrelevância penal do fato foi introduzido no ordenamento jurídico
pátrio pelo penalista Luiz Flávio Gomes.
irrelevância penal do fato, assim, cabe ao juiz, ao averiguar a responsabilidade penal
do indivíduo diante de um caso concreto, deixar de aplicar a pena.

Assim sendo, é imperioso registrar que não se busca fomentar a prática de


pequenos delitos, nem mesmo questionar o poder de motivação da norma, mas, em
verdade, ocorre que, ao analisar as circunstâncias do contexto fático a intervenção
do Direito Penal não se mostra necessária. É aí que podemos notar claramente a
crucial pertinência do princípio da intervenção mínima, pelo qual o Direito Penal é
ultima ratio.

2.1 UMA ANÁLISE DOS CRITÉRIOS DISTINTIVOS ENTRE O PRICÍPIO DA


INSIGNIFICÂNCIA E O PRINCÍPIO DA IRRELEVÂNCIA PENAL DO FATO.

Fazendo uma análise, ainda que perfunctória, dos critérios que distinguem o
princípio da insignificância do princípio da irrelevância penal do fato, temos o
entendimento de Gomes (2013) acerca do tema.

Segundo o ilustre autor alguns pontos distintivos e de suma relevância devem


ser elucidados para que não haja uma aplicação errônea ou até mesmo arbitrária do
Direito Penal.

Logo, sob a ótica do supracitado penalista, o Princípio da Insignificância difere


do Princípio da Irrelevância Penal do Fato quanto à posição topográfica, visto que
aquele exclui a tipicidade material do fato, além disso, tem incidência na teoria do
delito, refere-se à infração bagatelar própria e seu critério fundante está no desvalor
do resultado e/ou conduta, ou seja, é essencialmente objetivo. O princípio da
insignificância ainda conduz inexoravelmente ao arquivamento do inquérito policial e,
em caso de não arquivamento, o juiz deve absolver sumariamente o réu, com fulcro
no art. 397, III, do Código de Processo Penal21 (CPP).

Nesse diapasão temos que, o Princípio da Irrelevância Penal do Fato está


topograficamente posicionado como excludente de punição concreta do fato,
compete à teoria da pena, é aplicado quando estamos falando em infração bagatelar
imprópria, importa para este o desvalor ínfimo da culpabilidade, bem como diversos
requisitos post factum que conduzem ao reconhecimento da desnecessidade da

21
Código de Processo Penal. Art. 397: Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos,
deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] III - que o fato
narrado evidentemente não constitui crime [...].
pena no caso concreto, ou seja, há uma subjetivação dos critérios determinantes de
aplicabilidade deste princípio, ademais, implica em abertura e regular
desenvolvimento do processo criminal, ficando a cargo do juiz, em sentença,
dispensar a aplicação da pena fundamentadamente (tendo como base o art. 59, do
Código de Processo Peal), visto que esta se tornou desnecessária.

Observando este panorama traçado sobre as divergências entre os princípios


da insignificância e irrelevância penal do fato, importante frisar um aspecto sobre
eles, enquanto o primeiro não encontra amparo legal no Código Penal, logo tem
natureza jurídica de causa supralegal, sendo este um ponto que leva alguns juristas
a entenderem que não seria caso de aplicação daquele por ser uma concepção ou
idealização puramente doutrinária, o princípio da irrelevância penal do fato está
resguardado no art. 59 do Código Penal Brasileiro (CPB), nos dizeres de Gomes
(2013, p. 51):

A não punição concreta do fato, nesse caso, não chega a afetar o seu
aspecto preventivo geral, desde que o juiz demonstre a justiça (no caso
concreto) da não incidência da pena, tendo em conta tudo quanto o sujeito
já padeceu e tudo quanto ele representa em termos positivos (falta de
antecedentes, primário, profissão certa, indenização em favor da vítima,
assistência total e absoluta para ela etc.).

Quanto ao Princípio da Insignificância ser essencialmente objetivo, deve-se


ressaltar que este não é entendimento pacificado na jurisprudência pátria.

Sobre este ponto, é primoroso elucidar que a jurisprudência do Supremo


Tribunal Federal (STF) destaca quais são os vetores que precisam estar presentes
para que seja cotejada a pertinência da tipicidade material penal, a saber: (a) a
mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da
ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a
inexpressividade da lesão jurídica provocada. (SÃO PAULO, Supremo Tribunal
Federal, HC: 84412, Relator: Min. Celso de Melo, 2004).

Ocorre que, a 2ª Turma do STF, analisando a possibilidade de aplicação do


Princípio da Insignificância em caso de réu reincidente (critério estritamente
pessoal/subjetivo) tem se posicionado, em recentíssimo julgado, da seguinte
maneira:

Colho dos autos que o recorrente registra duas condenações transitadas em


julgado por crime de roubo. Com relação a esse aspecto, respeito o
entendimento desta Segunda Turma no sentido de afastar a aplicação do
princípio da insignificância aos acusados reincidentes ou de habitualidade
delitiva comprovada, contudo, levando em conta as circunstâncias
peculiares do caso (valor ínfimo de R$ 30,00; bens restituídos; ausência de
violência; e o cumprimento da pena de 5 meses de reclusão), entendo que
razão assiste à defesa e, assim, reconheço a atipicidade da conduta do
recorrente. Nesses termos, dou provimento ao recurso para trancar a Ação
Penal n. 1607297/09, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Pouso Alegre/MG,
ante a aplicação do princípio da insignificância (MINAS GERAIS, Recurso
Ordinário em Habeas Corpus 113.773, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2013).

Na mesma decisão acima transcrita, a Ministra Cármen Lúcia, em seu voto,


asseverou que, acompanhou o voto do Relator Ministro Gilmar Mendes, porém, com
a ressalva que somente o fez em virtude da situação particular do indivíduo em
questão, visto que, este havia ficado preso até o final do processo, o que, no parecer
da saudosa Ministra, já seria caso de constrangimento ilegal, porém, o fato daquele
ter condenações anteriores (ser reincidente), em qualquer outra situação, a fariam
votar em sentido diverso.

Ademais, é de suma valia colacionar trecho da brilhante decisão do Juiz de


Direito Rosivaldo Toscano dos Santos Júnior, em tal pontificou que:

Assim, no tocante à vedação da bagatela em razão da reincidência, entendo


que tal interpretação não se coaduna com a Carta de 1988 por várias
razões. Vou a primeira. Uma pessoa deve ser punida pelo que fez e não
pelo fato de que responde a outro processo ou a uma execução penal.
Isso é ferir o princípio do non bis in idem.

[...]

Posto isso, com fulcro nos princípios da lesividade, da culpabilidade, do non


bis in idem e da dignidade da pessoa humana, afasto a alegação da
reincidência como fator que desnatura a insignificância. Que responda [...]
por cada crime que cometeu e não pelo "conjunto da obra" do qual a
sociedade termina por ser co-autora impune. O sistema penal é um felino e
feroz predador. E suas presas são sempre, invariavelmente, oriundas dos
extratos mais desprotegidos e distantes do poder [...]. 22

Assim sendo, quanto ao princípio da insignificância estar relacionado


intimamente com o desvalor do resultado e/ou conduta, a partir do entendimento
aplicado do STF, podemos concluir que, na prática, ocorre a chamada subjetivação
daquele, todavia, vale salientar o posicionamento de Gomes (2013) que, com
relação aos dados subjetivos do agente, compreende pela não introdução destes no

22
Processo Nº 0102585-15.2011.8.20.0002, que está tramitando perante a 2ª Vara Criminal do
Distrito Judiciário da Zona Norte da Comarca de Natal – Rio Grande do Norte. Disponível em
<http://esaj.tjrn.jus.br>. Acesso em: 06 de abril de 2014. (Até o fechamento desse artigo o
processo ainda estava em tramitação).
campo da insignificância, justamente por serem estes característicos de outro
princípio, qual seja, o da irrelevância penal do fato.

Em relação à aplicação pelo magistrado do princípio da irrelevância penal do


fato e sua relação com o perdão judicial, é indispensável trazer à baila a ponderação
de Luiz Flávio Gomes a respeito do tema, senão vejamos:

Quando o juiz reconhece o princípio da irrelevância penal do fato não está


concedendo perdão judicial extralegal. Não é o caso. Referido princípio não
é extralegal, ao contrário, tem amparo legal expresso (no art. 59 do CP). O
juiz reconhece e dispensa da pena (ou seja: sua necessidade) no caso
concreto e isso é feito com base no art. 59 do CP (que diz que o juiz só
aplica a pena quando for necessária para a reprovação e prevenção do
delito).23

Entende-se assim que, não é possível haver uma associação do princípio da


irrelevância penal do fato ao perdão judicial.

Outra discussão que vale ser mencionada se refere especificamente ao delito


de roubo, visto que, há correntes jurisprudenciais aplicando ora o princípio da
insignificância ora o princípio da irrelevância penal do fato e existe ainda o
posicionamento, a nosso ver majoritário, quanto a não aplicação de ambos, todavia,
é custoso explorar nesta etapa da pesquisa o que defende parte da doutrina pátria.

Para o Gomes (2013), se há uma ameaça, caberia a aplicação do princípio da


irrelevância penal do fato, posto que, no delito de roubo os bens jurídicos protegidos,
por si só, já seriam de suma relevância para o ordenamento jurídico.

Quem, sobretudo quando primário, rouba uma caneta esferográfica de dois


reais sem violência e é preso, depois vem a ser submetido a inquérito e
processo, ficando privado da liberdade por alguns dias ou meses, não
merece mais nenhuma pena.24

[...]

Caso concreto 9: Caso A.T. – “roubo de um pote de manteiga” e princípio da


irrelevância penal do fato [...] Comentários: Partindo-se da premissa de que
teria (efetivamente) havido ameaça, o caso que acaba de ser narrado não
está regido pelo princípio da insignificância, sim, constitui uma típica
infração bagatelar imprópria, que está norteada pelo princípio da
irrelevância penal do fato.25

[...]

23
GOMES, 2013, p.30.
24
GOMES, 2013, p.44-45.
25 Ibidem. p. 47.
Tratando-se de “roubo”, que envolve bens jurídicos sumamente importantes
(integridade física, liberdade individual etc.), pode ter incidência o princípio
da irrelevância penal do fato (se presentes todos os seus requisitos). 26

Assim sendo, tendo em vista a necessidade e suficiência (conforme determina


o art. 59, do Código Penal) de aplicação da pena do delito de roubo no caso
concreto, poderia o julgador aplicar ou não o princípio da irrelevância penal do fato.

3 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL: OS TRIBUNAIS PÁTRIOS E A APLICAÇÃO


DOS PRINCÍPIOS DA INSIGNIFICÂNCIA E IRRELEVÂNCIA PENAL DO FATO NO
DELITO DE ROUBO.

3.1 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO DELITO DE ROUBO

Inicialmente é forçoso elucidar que, a jurisprudência majoritária pátria entende


pela inaplicabilidade do princípio da insignificância no delito de roubo, que está
preceituado no artigo 15727 do Código Penal Brasileiro, independentemente,
ressalte-se, da valoração que for atribuída à lesão ou a grave ameaça.

Segundo o posicionamento consolidado do Superior Tribunal de Justiça


temos que:

HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO SIMPLES. ART. 157, CAPUT, DO


CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
IMPOSSIBILIDADE. DELITO COMPLEXO. PLURALIDADE DE BENS
JURÍDICOS OFENDIDOS. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENDIDA DESCLASSIFICAÇÃO
PARA O CRIME DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INADEQUAÇÃO DA
VIA ELEITA. PRECEDENTES. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL.
NECESSIDADEDE READEQUAÇÃO DO REGIME INICIAL DE
CUMPRIMENTO DE PENA, PARA O ABERTO, NOS TERMOS DO
PRECEITO CONTIDO NO ART. 33, §§ 2.º E 3.º, C.C. O ART. 59, AMBOS
DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS PARCIALMENTECONCEDIDO.
1. Conforme orientação desta Corte Superior de Justiça e do Supremo
Tribunal Federal, é inaplicável, ao crime de roubo, o princípio da
insignificância - causa excludente da tipicidade penal -, pois,tratando-se de
delito complexo, em que há ofensa a bens jurídicos diversos (o patrimônio e
a integridade da pessoa), é inviável a afirmação do desinteresse estatal à
sua repressão. 2. Se a conduta do Paciente descrita na denúncia preenche
todos os elementos do tipo previsto no art. 157 do Código Penal, não há
como se acolher a pretendida desclassificação para o delito de
constrangimento ilegal. 3. "A análise do pleito de absolvição ou
desclassificação do delito implica exame aprofundado das provas,
providência que refoge aos estreitos limites do Habeas Corpus.

26
Ibidem. p. 48.
27
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência
a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena
- reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
Precedentes do STJ." (HC148.544/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, DJe13/12/2010.) [...].28

Assim, nessa esteira de pensamento, conclui-se que, pelo fato do delito de


roubo ser complexo, qual seja a junção entre o crime de furto29 (art. 155, do Código
Penal) e o crime de constrangimento ilegal30 (art. 146, CP), a análise do tipo deverá
ser sob o prisma dessa característica, não havendo como separar tal união feita pelo
legislador e aplicar o princípio da insignificância somente a um deles, posto que,
existe uma autonomia entre o delito capitulado no art. 157 do Código Penal com
relação àqueles que o deu proveniência.

Já segundo leciona Rogério Greco (2011), se todos os elementos que fazem


parte do conjunto complexo do delito de roubo são insignificantes, é perfeitamente
viável que haja o reconhecimento e aplicação do citado princípio. Para o autor, se
somente um dos tais elementos for grave o suficiente, não haverá como aplicar o
princípio da bagatela.

Todavia, analisaremos a partir de agora outra vertente, a que defende a


aplicabilidade do princípio da insignificância no delito de roubo.

Em 2001 foi julgada apelação criminal nº 350.097-431, o Ministério Público do


Estado de Minas Gerais havia denunciado a apelante como incursa nas sanções do
artigo art. 157, § 2º, I e II do Código Penal, em virtude de ter subtraído, na
companhia de mais dois agentes, mediante ameaça de arma de fogo, o valor de R$
15,00 (quinze reais) da vítima em questão.

No seu voto o Desembargador Erony da Silva (relator) aduziu que, quando


estamos diante de uma lesão patrimonial insignificante, a condenação pelo crime
roubo “acaba, muitas vezes, revelando-se, na aplicação concreta da norma, não só

28
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, HABEAS CORPUS Nº 238.990 – SP, Relator: Ministra
LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 18/04/2013, Quinta Turma, Disponível em:
HTTP://www.stj.jus.br. Acesso em: 24 abril 2014.

29
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro
anos, e multa.

30
Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver
reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a
fazer o que ela não manda: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
31
MINAS GERAIS. Tribunal de Alçada. Apelação Criminal. Processo n. 2.0000.00.350097-4/000.
Relator: Des. Erony da Silva. Data do julgamento 04/12/2001. Data da publicação: 15/12/2001.
Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 24 de abril de 2014.
inconstitucional, por ferir o princípio da individualização das penas, mas também
injusta”.

Para o relator, não há que se falar em não aplicação da pena, mas é preciso
lembrar-se do requisito da moderação. Já que estaremos diante de um caso em que
haverá uma desproporção entre a pena e a conduta reprovável. Visto que, “Se
pensarmos no Estado como um ente orgânico, chegaremos à conclusão de que os
efeitos colaterais do remédio social imposto (pena) certamente são muito mais
graves do que a própria doença (crime)”.

Segundo o Desembargador, a releitura do artigo 5º, inciso XLVI 32, da


Constituição Federal, sendo essa o limite da norma e do magistrado, acabou o
convencendo que a condenação pelo delito de roubo, quando estamos diante de
uma lesão insignificante ao patrimônio da vitima, é inconstitucional; pois, “A
exigência da individualização da pena traz implícita consigo a necessidade de uma
proporcionalidade entre a reprovação e a conduta que se reprova”.

Ao comparar duas situações hipotéticas com a dos autos, temos a brilhante


conclusão do relator, senão vejamos:

1. Se um indivíduo aborda um motorista e o obriga mediante violência ou


grave ameaça a transportá-lo até determinado local o crime será de
constrangimento ilegal e será punido com uma pena de 3 (três) meses a 1
(um) ano, ou multa, nos termos do art. 146 do CP.

2. Se um indivíduo, também mediante violência ou grave ameaça obriga a


um caixa de banco a passar-lhe todo o dinheiro ali depositado estará
cometendo roubo e será punido com uma reprimenda que varia de 4
(quatro) a 10 (dez) anos e multa, conforme o disposto no art. 157 do CP.

[...]

A violência exercida tanto no caso dos autos, quanto nos exemplos citados
é exatamente a mesma. A única diferença que justifica uma maior apenação
no caso do segundo exemplo é a relevante ofensa ao patrimônio da vítima o
que não ocorreu nem no primeiro exemplo, nem no caso ora em análise.

Sabendo que o roubo é um delito complexo e que tutela dois bens jurídicos,
quais sejam o patrimônio e a liberdade individual, elucida o Douto Desembargador
que não será possível falar em roubo quando está ausente a ofensa a um desses
bens, o que, no caso em análise, seria o primeiro.

32
Art. 5º, XLVI, da CF/88 - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social
alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.
Para o relator a palavra que melhor resume a compreensão do princípio da
insignificância é suportável, ou seja, não estamos falando de uma conduta que seja
aplaudida pela sociedade, mas que o “Estado se vê obrigado a suportar em razão da
evidente desproporção entre a conseqüência legal prevista (pena) e o
comportamento indesejado”.

Faz-se ainda uma análise do caso em que o delito de roubo é desclassificado


para o de furto com suporte na insignificância da violência ou da ameaça,
transcrevendo que, “De modo geral a 'tromabada' caracteriza o furto e não roubo,
pois a violência empregada não impede a resistência da vítima, limitando-se apenas
a dificultá-la (TACRIM-SP - RT 571/358)”.

Assim sendo, segundo o entendimento do nobre relator, se o delito de roubo


pode ser desclassificado para o de furto em razão da ínfima violência e ameaça, é
notadamente possível desclassificar o roubo para o constrangimento ilegal quando a
lesão patrimonial for irrelevante.

Diante dos fundamentos acima, o Des. Erony da Silva chegou a conclusão


que, no caso sob análise, seria melhor tipificação a do delito capitulado no artigo 146
do Código Penal, entendendo, então, pela desclassificação do delito de roubo para o
de constrangimento ilegal.33

Já em 2008 o Tribunal de Justiça de Minas Gerais julgou a apelação criminal


n° 1.0713.07.075999-6/00134, nela temos o seguinte fato, o apelante havia subtraído,
mediante grave ameaça, exercida com o emprego de arma de fogo, R$ 16,20
(dezesseis reais e vinte centavos), tendo sido condenado à pena de 05 (cinco) anos
e 04 (quatro) meses de reclusão, ao regime semi-aberto e 13 (treze) dias-multa, pelo
cometimento do delito previsto no artigo 157, §2º, I, do Código Penal.

Neste caso pleiteava o apelante pela desclassificação do crime de roubo para


o de constrangimento ilegal.

33
O voto proferido pelo Relator foi acompanhado integralmente pelos demais componentes da Turma
Julgadora - Alexandre Victor de Carvalho (Revisor) e Maria Celeste Porto (Vogal).
34
MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça, Apelação Criminal N° 1.0713.07.075999-6/001. Relator:
Desembargador Alexandre Victor de Carvalho. Data do julgamento: 28/10/2008. Data da publicação:
10/11/2008. Disponível em <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 24 de abril de 2014.
Tendo como base o princípio da lesividade, entendeu, na relatoria do recurso,
o Senhor Desembargador Alexandre Victor de Carvalho, que deveria prosperar a
pretensão aduzida pela defesa.

Continuou explicitando que reconhece a tendência da maioria da


jurisprudência em afastar a aplicação do princípio da insignificância quando estamos
diante de um delito de roubo, posto que a vida e a integridade física ou moral são
bens indisponíveis.

Ao citar Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli quando afirmam que:

Todos os bens jurídicos poderiam ser reduzidos a um único: a


disponibilidade.

[...]

No sentido de disponibilidade como uso, a vida é o mais disponível dos


bens jurídicos, porque costumamos consumi-la a cada momento a nosso
bel-prazer, mas ao decidir sobre ela freqüentemente somos premiados e
condecorados por arriscá-la.

Concluiu o Douto desembargador o seguinte:

Avalizado, assim, pelas precisas colocações dos Doutos juristas, reafirmo o


entendimento de que é realmente possível a incidência do princípio de
insignificância mesmo nos crimes cometidos com violência ou grave
ameaça a pessoa, porque o juízo de tipicidade material não passa pela
análise do comportamento da vítima, ou seja, seu dissenso ou
contrariedade à ação do agente e, sim, em um juízo de lesividade da
conduta - nullum crimen sine iniuria.

Ou seja, no entendimento do Relator Alexandre Victor de Carvalho, para que


haja a adequação da lesividade da conduta ao tipo penal do delito de roubo, é
necessário, no viés da tipicidade material, que haja ofensa, cumulativamente, ao
patrimônio e à pessoa, caso contrário, faltando alguma dessas lesões estaríamos
diante de outro crime que não seja o roubo.

No caso em apreço entendeu-se pela desclassificação do delito de roubo para


o de constrangimento ilegal.

Posteriormente, em 2010, ao julgar os Embargos de Declaração Criminal N°


1.0702.08.540660-2/00235, em um caso onde o agente havia subtraído da vítima um

35
MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça, Embargos de Declaração Criminal N° 1.0702.08.540660-
2/002. Relator: Desembargador Alexandre Victor de Carvalho. Data do julgamento: 14/06/2010.
maço de cigarros e um isqueiro, o Senhor Desembargador Alexandre Victor de
Carvalho, quando Relator, posicionou-se no mesmo sentido de outrora, qual seja
“Não havendo lesividade relevante ao patrimônio da ofendida, ocorre a
descaracterização do crime complexo de roubo, pelo que o artigo 157 do Código
Penal não pode ser aplicado”, vejamos a ementa deste:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - ROUBO - PRINCÍPIO DA


INSIGNIFICÂNCIA - CRIMES COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA -
DELITO COMPLEXO - TIPICIDADE MATERIAL - NECESSIDADE DE
OFENSA A AMBOS OS BENS JURÍDICOS TUTELADOS -
DESCLASSIFICAÇÃO - EMBARGOS REJEITADOS. [...] II - É possível a
incidência do princípio da insignificância mesmo nos crimes cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa, porque o juízo de tipicidade material
não passa pela análise do comportamento da vítima, ou seja, seu dissenso
ou contrariedade à ação do agente e, sim, em um juízo de lesividade da
conduta - nullum crimem sine iniuria. III - Sendo o delito de roubo espécie
de crime complexo, a lesividade da conduta para se adequar a este tipo
penal deve abranger necessariamente os dois valores protegidos pela
norma, sendo imprescindível significativa lesão ao patrimônio e à pessoa,
cumulativamente. IV - Não havendo lesividade relevante ao patrimônio da
ofendida, ocorre a descaracterização do crime complexo de roubo, pelo que
o artigo 157 do Código Penal não pode ser aplicado.

Assim sendo, concluímos que, de acordo com a jurisprudência majoritária não


é possível a aplicação do princípio da insignificância no delito de roubo, pois, sendo
este um delito complexo e tendo em vista que, a integridade física e a liberdade
individual do ser humano é algo de extrema relevância a ser tutelado pelo Direito
Penal, a violência ou grave ameaça perpetradas nunca serão inofensivas para este.

Em contrapartida temos o entendimento minoritário que defende a


possibilidade de desclassificação do delito de roubo para outro mais adequado
quando estivermos diante de uma ação que comine irrelevante lesividade ao
patrimônio da vítima.

3.2 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IRRELEVÂNCIA PENAL DO FATO NO


DELITO DE ROUBO.

Analisando a aplicação do princípio da irrelevância penal do fato no delito de


roubo, iremos explorar o julgamento da revisão criminal proferida pelo Tribunal de
Justiça do Mato Grosso do Sul no ano de 200836.

Data da publicação: 30/06/2010. Disponível em <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 24 de abril de


2014.
36
MATO GROSSO DO SUL, Tribunal de Justiça. Revisão Criminal nº 0002829-66.2008.8.12.0000.
Relator: Des. Romero Osme Dias Lopes. Data de Julgamento: 19/05/2008. Data de
Na citada revisão criminal estava sendo discutido o caso de R.M.M. que havia
praticado o delito de roubo a mais de cinco anos, tendo exercido grave ameaça pela
simulação de arma de fogo e realizando o ilícito penal sob o efeito de drogas e para
sustentar tal vício. Era réu primário, o bem subtraído era de pequeno valor, o feito já
havia se estendido por tempo desarrazoado e o requerente já estava recuperado do
vício em substâncias entorpecentes.

O Desembargador Romero Osme Dias Lopes, ora relator, entendeu pelo


deferimento da revisional esclarecendo que, para falar-se nesta não seria
necessário, estritamente, um fato novo ou prova nova. Aduziu que a liberdade
humana é um bem de valor inestimável, ainda mais se aliada ao precedente do
falido sistema prisional brasileiro.

Citando o artigo do Doutor Thales Tácito P. Lux de P. Cerqueria, falou-se no


Direito Penal Moderado, afirmando ser esse um ponto intermediário entre o Direito
Penal Máximo e Mínimo, utilizando, assim, os melhores institutos de cada um
destes. Segundo o autor, temos o seguinte:

Somente através de um Direito Penal e Processual Penal funcional teremos


a verdadeira Justiça, pois do contrário teremos o Judiciário lento, moroso e
cheio de processos fomentados pela própria desordem jurídica (e
desigualdade fomentada por Leis como a 10628/02) e causas sociais cujo
reflexo político é a inércia de sempre (reforma agrária; educação, saúde,
habitação, etc).

Passando a explorar a classificação pátria do princípio da bagatela, abordou


sobre o princípio da insignificância próprio e impróprio (ou “irrelevância penal do
fato”).

Quanto ao princípio da bagatela próprio, segundo o supracitado autor, será


ele empregado quando estivermos diante de uma conduta que não ofenda
efetivamente a objetividade jurídica do crime, elencou os seguintes requisitos para a
verificação de ausência, in verbis:

1.1 - relevância da ação (imputação objetiva da conduta): leia-se,

(a) O sujeito somente responde penalmente se ele criou ou incrementou um


risco proibido relevante;

(b) Não há imputação objetiva quando o risco criado é permitido (exemplo,


teoria da confiança);

registro: 18/06/2008. Seção Criminal. Disponível em: <http://www.tjms.jus.br>. Acesso em: 24 de


abril de 2014.
(c) O sujeito somente responde nos limites do risco criado;

(d) Não há imputação objetiva quando o risco é tolerado (ou aceito


amplamente pela comunidade);

(e) Não há imputação objetiva quando o risco proibido criado é


insignificante ( a conduta em si é insignificante). [...]

1.2 - resultado jurídico penalmente relevante.

(a) o resultado deve ser relevante;

(b) o resultado deve ser transcendental (afetar terceiras pessoas);

(c) O resultado jurídico não deve ser fomentado ou tolerado ou autorizado


ou determinado pelo ordenamento jurídico [...].

1.3- relevância do resultado (imputação objetiva do resultado): leia-se, o


nexo causal entre a conduta e o resultado (leia-se, o sujeito somente
responde pelos riscos criados ou incrementados) [...].

Ponto também abordado no julgado, através da citação do artigo do Doutor


Thales Tácito P. Lux de P. Cerqueria, diz respeito ao “afastamento da tipicidade de
uma conduta insignificante em razão do desvalor da intenção” do agente, segundo o
autor:

Realmente, o desvalor da intenção pune pelo que o agente queria e não


pelo que fez, o que até vai de desencontro com a imputação objetiva, cujo
Direito Penal, numa evolução do funcionalismo, deve ser voltado ao
indivíduo, ao caso concreto, e não meras projeções ou intenções.

Passando ao efetivo exame do princípio da bagatela impróprio, ressaltou-se


que, a aplicação deste está relacionada intimamente ao princípio da necessidade da
pena, com previsão no artigo 59 do Código Penal, o fato passaria então a categoria
de irrelevante penal.

Defendeu a tese exemplificando o seguinte:

Tentativa de roubo sem relevância, vislumbre-se, réu primário, jovem, sem


uso de arma, apenas de ameaça, onde o agente ficou 6 meses preso
provisoriamente, confessou e arrependeu .

O artigo 59 do CP resolve pelo princípio da necessidade da pena: haveria


necessidade, proporcionalidade ou razoabilidade em condenar um jovem
primário de 4 a 10 anos de reclusão, sendo que confessou, se arrependeu,
ficou preso provisoriamente por 6 meses e apesar da ofensa real a
objetividade jurídica, não há mais relevância penal do fato?

Ressalva-se que desejam incluir na Constituição Italiana tal princípio.

Este princípio serve exatamente para limitar a injusta intervenção do Estado


na dignidade da pessoa humana, única forma viável de, no processo de
conhecimento, prevenir o crime, impedindo que um jovem recuperável se
transforme num meliante escolado e perigoso para a própria sociedade que
o quer condenado.
O artigo transcrito, na revisão criminal sob análise, ressalta ainda que, a
natureza jurídica do princípio bagatelar impróprio será visar estritamente a
diminuição “dos índices de reincidência penal e a valorização da dignidade da
pessoa humana, como um instrumento eficaz de prevenção especial, já que a pena
em si não permite isto, face nossas realidades prisionais” .

Já o objetivo de tal princípio será o de limitar a aplicação da pena privativa de


liberdade, observando a demarcação trazida pelo binômio: necessidade - suficiência,
sem que através disso tenhamos uma ofensa social.

Ressalta que, esse princípio, como novidade que é, poderá culminar


descontentamento, posto que, é possível que haja uma confusão ao ligar este à
intransigência.

Tendo em vista o papel de ressocialização do sistema prisional conjugado aos


fatos específicos do delito no caso concreto, narrados outrora, entendeu o nobre
Relator pelo deferimento da revisional para manter a decisão condenatória do
magistrado de “instância singela”, entretanto, tendo em vista o princípio da bagatela
imprópria, não seria o caso de aplicação da pena, “em observância aos princípios da
irrelevância penal do fato e da desnecessidade de aplicação concreta da pena”.

O Douto Desembargador Carlos Eduardo Contar (Revisor), entendendo de


forma contrária, salientou que, o pedido não seria admissível, pois não teria base em
qualquer uma das hipóteses preceituadas no artigo 621 do Código de Processo
Penal37, não devendo ser conhecido.

Adentrando nos fatos da revisão criminal, entendeu o nobre Desembargador


que, verbis:

É certo que, desde a data dos fatos, já transcorreram mais de 5 anos,


porém essa morosidade do Estado na prestação da tutela jurisdicional não
pode levar à automática conclusão de que a pena não deve mais ser
aplicada, sob o singelo argumento de que ocorreram “nesse ínterim várias
situações positivas, dentre elas, a total recuperação do requerente do mal
que o perseguia.”

37
Código de Processo Penal, artigo 621 – A revisão dos processos findos será admitida: I- quando a
sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II-
quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos
comprovadamente falsos; III- quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência
do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial de pena.
Ora, sob essa ótica, privilegia-se, apenas, o objetivo reabilitador da sanção
penal. Onde ficam os objetivos da retribuição e da prevenção?

Por fim, votou pelo indeferimento da revisão criminal, pois o Estado não
poderia olvidar o seu “direito de punir”.

O 1º Vogal, Desembargador Gilberto da Silva Castro, acompanhou o revisor e


o 2º Vogal, Desembargador Claudionor Miguel Abss Duarte, acompanhou o relator.

A decisão constante na ata teve a redação que segue: “DEFERIDA A


REVISÃO, NOS TERMOS DO VOTO RELATOR, VENCIDOS O REVISOR E O 1º
VOGAL, CONTRA O PARECER.”

Assim sendo, conclui-se que, não há regra que defina o que é irrelevante ou
não para ser analisado sob o prisma do princípio da necessidade da pena, seria
necessário uma análise do contexto fático concreto, pois, ressalte-se, algumas
vezes, os males advindos de um sistema prisional falido, como é o caso do
brasileiro, podem ser ferrenhos, além de não cumprir com o necessariamente ao que
se propõe, qual seja, a ressocialização daquele que nele se encontra.

CONCLUSÃO

O direito penal é considerado pacificamente como ultima ratio, ou seja,


somente incide em casos excepcionais e quando os outros ramos do direito não
mais tiverem como atuar satisfatoriamente.

O princípio da insignificância, que não se confunde com o princípio da


adequação social, é norteado por alguns outros princípios como, por exemplo, o da
intervenção mínima e o da proporcionalidade. Busca repelir qualquer punição que
seja aplicada excessivamente em razão de um ato de lesividade ínfima, apesar do
tal ato se emoldurar ao tipo penal, sendo, pois, excludente da tipicidade material
(analisada sob o conceito da tipicidade conglobante de Zaffaroni).

A infração bagatelar pode ser própria ou imprópria, a primeira é aquela que,


segundo Gomes (2013), na sua gênese já não tem relevância alguma para a seara
penal, posto que, não se vislumbra uma ação ou resultado, ou até mesmo ambos,
que tenham relevante desvalor.

Já a infração bagatelar imprópria é aquela que:


Nasce relevante para o Direito Penal (porque há desvalor na conduta bem
como no desvalor do resultado), mas depois se verifica que a incidência de
qualquer pena no caso concreto apresenta-se totalmente desnecessária
(princípio da desnecessidade da pena conjugado com o princípio da
irrelevância do fato) (GOMES, 2013, p. 28).

Quanto a infração bagatelar própria seria caso de aplicação do princípio da


insignificância, já para a imprópria o princípio da irrelevância penal do fato seria a
opção acertada de aplicação.

Ao ser examinada a jurisprudência pátria entendemos que, majoritariamente,


não é aceita a aplicação do princípio da insignificância no delito de roubo, posto que,
estamos diante de um delito que agrega violência ou grave ameaça, além de afetar
a liberdade do indivíduo, logo, em nenhum caso é possível falar em irrelevância.

Já a jurisprudência minoritária compreende que, pelo fato do delito ser


complexo e que tutela dois bens juridicamente protegidos, quais sejam o patrimônio
e a liberdade individual, não será possível falar no crime de roubo quando não é
constatada a ofensa a um desses bens, sendo assim, perfeitamente considerável
utilizar tal princípio para uma desclassificação, por exemplo.

Quanto ao princípio da irrelevância penal do fato, conclui-se que somente o


caso concreto irá definir se há possibilidade de aplicação ou não, ainda mais se
considerarmos que tal princípio está intimamente relacionado com o princípio da
necessidade da pena (consubstanciado no artigo 59 do Código Penal) e que neste é
possível falar em critérios subjetivos para análise do citado caso concreto.

Este último princípio tem em vista questões como o falido sistema prisional
brasileiro e a liberdade humana.

Assim, entendemos ser possível a incidência do princípio da irrelevância


penal do fato no delito de roubo caso todos os elementos que façam parte da
complexidade de que é dotado o citado crime sejam indubitavelmente irrelevantes.

Seguimos tal corrente tomando como base os ensinamentos de Luiz Flávio


Gomes (2013) quando ensina que infração bagatelar imprópria é aquela que na
órbita do direito penal tem, em sua gênese, suma relevância, todavia,
posteriormente, ao analisar o caso concreto, nota-se que não há necessidade de
aplicação da pena, sendo uma verdadeira excludente de punição.
Ressalte-se que, para chegar a adotar o princípio da irrelevância penal do fato
no caso concreto, somos da concepção que, é preciso que haja um juízo de valor
com relação ao autor, sua personalidade, seus antecedentes, ínfima lesão à
integridade física ou psicológica e patrimonial da vítima, tempo que o autor tenha
ficado preso, entre outras peculiaridades de características diminutas do caso; pois,
somente desta forma poderemos falar em aplicação justa de tal princípio frente a
uma lesão sofrida por outrem.

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mecum. São Paulo: Saraiva, 2011.

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São Paulo: Saraiva, 2011.

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1941. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2011.

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Revista dos Tribunais, 2013. – (Coleção direito e ciências afins ; v. 1)

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