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PERSONAGENS:
DANICA- Moço, eu quero dois hambúrgueres, dois refrigerantes, muita batata frita com
catchup, maionese e bacon. Sorvete de creme com morango, mashmellow, castanha com
cobertura de caramelo. Entendido ?
LEÔNCIO- Muito bem... Ela pediu... sorvete de bacon com catchup, batata frita de
morango, hambúrguer de mashmellow e...
JILÓ (A LEÔNCIO) – E eu ?
LEÔNCIO (APAVORADO)- Falaram comigo de novo ! Não há ninguém aqui. Será que
estou louco ?
LEÔNCIO- Eu quem ?
LEÔNCIO- Devo estar trabalhando demais. Preciso de férias... Onde já se viu ? Um jiló
falante ?
JILÓ- Acredite ou não, eu falo. E vou torrar a sua paciência, até você me escutar.
LEÔNCIO- A freguesinha vai pensar que eu sou maluco e vai embora. Não posso perder
dinheiro, a coisa tá preta... (A JILÓ) Espere um momento. (SE DIRIGE À DANICA) Já está
quase pronto o seu lanche, senhorita. Posso te pedir um favor ?
DANICA- Beliscar ?
LEÔNCIO- Ai !!! Não precisava ser tão forte ! Não é sonho, é realidade.
LEÔNCIO- Claro, claro... Fique tranqüila, que já já eu trago o seu lanche, senhorita...
senhorita...
DANICA- Danica.
LEÔNCIO- Já trago o seu lanche, canjica.
LEÔNCIO- Vou. Mas fale baixo, senão a menina vai achar que estou louco. Onde já se viu
? Conversar com um Jiló ?
JILÓ- Como disse anteriormente, sou o Príncipe dos legumes e exijo que me embrulhe
para viagem junto aos outros gordurosos.
LEÔNCIO- Acho agora que o maluco aqui é você. Jiló é horrível. Ela nunca vai querer.
JILÓ- Sou leve e saudável. Não possuo gorduras e colesterol. Por favor, me embrulhe.
LEÔNCIO- Já disse que não ! Não posso perder a freguesia. Já pensou ? Ela chega em
casa, abre o embrulho e encontra junto a todas aquelas delícias, um jiló feio, amargo e sem
graça. Vai jogar o lanche todo fora.
JILÓ- Por favor, Leôncio ! O meu povo está em extinção. Os jilós estão acabando.
Ninguém mais planta, ninguém mais come jiló. A menina precisa gostar de mim...
LEÔNCIO- Já estou perdendo muito tempo com você, seu legume cretino. Vou te jogar
fora !
JILÓ- Não, Leôncio ! Não faça isso ! Pergunte à menina se ela me quer ?
LEÔNCIO (RINDO) – Ah, ah, ah ! Essa é boa ! Pergunte se ela te quer ? Claro que ela não
quer jiló !
LEÔNCIO- Tá certo. Já que insiste, vou perguntar à menina. Agora, se ela disser não, o
seu destino será o lixo !
DANICA- Danica.
DANICA- O quê ? Oferta ? Se for chocolate eu quero. Se for pudim eu quero. Se for pizza
eu quero. Se for bolo eu quero. Se for doce eu quero. Se for...
LEÔNCIO- Tudo bem, tudo bem. Já trago o seu lanche bem quentinho ! Além disso, ainda
te darei um bom desconto ! Tudo bem suculento, gostoso ! E sem jiló ! Sem jiló !
(CANTANDO EM DIREÇÃO AO BALCÃO) (JILÓ ESTÁ DESOLADO) Ela não quer jiló !
Ela não quer jiló ! (LEÔNCIO OLHA PARA JILÓ, AMEAÇADORAMENTE) Chegou a
hora ! Dê adeus ao mundo dos alimentos vivos, seu jiló idiota ! Vou te jogar no valão, seu
horroroso !
JILÓ- Me dê uma chance, por favor ? Posso te provar que ela gosta de mim.
JILÓ- Ela cresceu, ouvindo que sou ruim e amargo. Mas, na verdade, nunca me provou.
Não conhece o meu sabor... me dê um tempo para conquistá-la...
JILÓ- Simples. Me jogue no lixo, acabe com meu povo, me mate, me destrua.
JILÓ- Vamos fazer essa aposta então. Você só tem a ganhar, Leôncio.
LEÔNCIO (APERTANDO A MÃO DE JILÓ)- Fechado. Te dou um dia para ela gostar de
você. Senão, acabo contigo !
JILÓ- Meu nome é Raddi Solanum Gilo, da nobre família solanácea. Mas pode me chamar
apenas de Jiló.
DANICA- Jiló ? Você é um Jiló ?
DANICA- Sei fazer uma careta bem engraçada ! (DANICA FAZ CARETA)
JILÓ (AO PÚBLICO)- Acho que ela não entendeu. (À DANICA) Eu perguntei qual o seu
nome ?
DANICA- Danica
DANICA- Tenho que ir para casa, seu Jiló. Meu lanche está esfriando e eu estou com fome.
JILÓ- Para quê a pressa, Danica ? Vamos conversar ? Precisamos nos conhecer. Aliás,
você precisa me conhecer melhor...
DANICA- É difícil eu falar isso, seu Jiló. Mas eu não gosto do senhor.
DANICA- Não.
JILÓ- Porque é uma cretina ! Aliás, porque é uma menina... Pois então preciso que me
ouça !
DANICA- Já disse que estou com fome e preciso comer meu lanche.
JILÓ- Por favor, menina... Ouça esse pobre legume que te pede ajuda ! (JILÓ FICA DE
JOELHOS)
DANICA- Está bem, Jiló. Mas não demore muito.
JILÓ- Sente-se, Danica. (ELA SE SENTA) Vou te contar a minha história. Hoje sou
desprezado por todos. Quase ninguém gosta de mim, principalmente as crianças. Ninguém
mais planta jiló e, por isso, estou acabando. Mas, no passado, fui um dos legumes mais
nobres e dos mais vendidos. Meu povo nasceu no oriente, na China, no Japão.
DANICA- Nossa !
JILÓ- Em Roma, comer jiló era sinônimo de nobreza. Só os fortes comiam. Júlio César
adorava... (IMPOSTA A VOZ, E ESTICA O BRAÇO DIREITO PARA FRENTE) Ave César !
Ave Roma ! Ave Jiló !
JILÓ- Muito mais do que você pensa, Danica. Sou ainda adorado por muitos.
JILÓ- Os inteligentes, os ricos e famosos adoram jiló. Madonna gosta. Michael Jackson
gosta. Pelé adora jiló. Além de tudo, quem come jiló fica mais bonito. Giselle Bundchen
come, Brad Pitt come, Di Cáprio, Gianechini... E quem come também fica mais inteligente.
Todos os homens mais brilhantes do mundo já comeram: Shakespeare, Einstein, Jorge
Amado... Grandes homens da história da humanidade comiam jiló. Aliás, sabe por que
Napoleão ficava sempre com a mão na barriga ? (IMITA NAPOLEÃO BONAPARTE) Le
France vencerá !!! (TIRA UM JILÓ NA BARRIGA) Ele fazia isso para esconder o jiló dos
seus cruéis inimigos ! Porque o jiló é que dava o seu poder. Os fortes só se alimentam de
jiló: Stallone, Swarzennegger, Van Damme, O Super-man, O Batman, o Popeye...
JILÓ- Espinafre com jiló ! Toda sua força vinha desse prato. Enfim, Danica... Sou um dos
alimentos mais saudáveis e nutritivos que existem. Mas, hoje, as crianças e jovens preferem
essas comidas gordurosas e salgadas. Não tem mais espaço pra mim na barriga de vocês. É
o fim do jiló.
DANICA- Mas isso não pode acontecer. O senhor é muito importante. Não pode acabar
assim. Temos que fazer alguma coisa !
JILÓ- Não adianta, você não gosta de mim. Sou amargo e azedo. Vou me matar ! Onde é a
lixeira mais próxima ? O mundo não tem mais sentido pra mim ! (CHORA)
DANICA- Jiló ! (JOGA O EMBRULHO FORA) Eu estou com fome e quero comer jiló.
(JILÓ FICA MUITO FELIZ) Você tem algum jilozinho pra mim ?
JILÓ- Claro, Danica. Claro que tenho... (DÁ UM JILÓ PARA DANICA ) (ELA COME,
DEMONSTRANDO PRAZER)(MÚSICA) E então ? Gostou ?
JILÓ- Mas, para salvar meu povo, precisamos fazer mais. Todas as crianças precisam
gostar de mim.
DANICA- Eu tenho muitos amigos. Vamos conseguir fazer com que todos gostem de você.
Então, todo mundo vai querer comer jiló e o seu povo será salvo. Vamos contar a sua
história para todos.
LEÔNCIO (AO PÚBLICO)- O tiro saiu pela culatra. Aquele jiló intrometido conseguiu
convencer a Martinica a comê-lo. E, pelo visto, também convenceu vocês. Todas as
crianças, que só comiam hambúrgueres e pizzas, agora vão querer jiló. Com isso, eu vou à
falência. Tudo que comprei irá se estragar, pois ninguém comprará. Preciso fazer alguma
coisa para evitar isso. Acabar com esse Jiló cara-de-pau. Acabar com ele e com todos os
seus parentes !
LEÔNCIO- Não seja tolo, verdinho. Nunca trocarão uma bela pizza calabresa por um
prato de jiló amargo.
LEÔNCIO- Todo o nosso lanche tem agora 50% de desconto. O que vai querer ?
Hambúrguer ?
DANICA- Não.
LEÔNCIO (DESESPERADO) – Jiló não ! Jiló não ! Aqui não se vende jiló !
LEÔNCIO- Eu odeio jiló ! Odeio você ! Você e essa menina chata, a Burrica !
LEÔNCIO- Nosso trato acabou quando não te joguei fora, legume bisonho!
LEÔNCIO (GRITANDO AO PÚBLICO)- Quem vai querer ? Jiló frito ! Sopa de jiló !
Picolé de jiló ! Doce de jiló ! Pizza de jiló !
LEÔNCIO- Ótimas. Estou ficando rico. Nunca pensei que tanta gente fosse gostar de jiló.
Até eu, agora gosto. Lá em casa é todo dia.
DANICA- Por quê ? Você conseguiu o que queria. Não só salvou o seu povo, como ficou
famoso.
JILÓ- Mas o meu tempo chegou. Chega um dia em que todo jiló fica enrugado, amarelado.
Nosso tempo de vida é pequeno. E tenho que acabar de cumprir minha missão por aqui.
Nós, alimentos, nascemos para alimentar os seres humanos. Para dar-lhes força, saúde. Não
só nós jilós, como as cenouras, as batatas, as verduras, as carnes, as frutas. É assim, Danica.
Não adianta fugir da ordem das coisas. Amanhã, outro jilozinho vai me substituir e depois
outro o substituirá. E por aí vai.
JILÓ- Vou para o prato de alguém que está precisando de mim. Para alguma barriga vazia,
que chora de fome à noite, sem ter o que comer. Farei a minha parte. Hoje vai ter jiló. Um
pobre legume desprezado, que não tem nada contra os outros, mas, que sempre lutará
contra o preconceito e as injustiças. Sou o Príncipe dos Legumes !
FIM