Traduçaõ de Antonio Carlos Viana. Porto Alegre: L&PM, 1987.
- Movimentos eróticos apavoram o humano.
- CITAR – INTRODUÇÃO cap. 3. No prefácio de Erotismo: “Mas o homem pode ultrapassar o que o assusta, pode encará-lo de frente. Ele escapa por esse preço à estranha falta de conhecimento de si mesmo que até agora o definiu. Nada mais faço que seguir um caminho que outros, antes de mim, fizeram avançar” (p. 7). - Aborda erotismo não como objeto de uma ciência, mas da paixão, e, mais ainda, de uma contemplação poética. - Do erotismo é possiv́ el dizer que ele é a aprovaçaõ da vida até na morte (p. 10). A atividade sexual de reproduçaõ é comum aos animais sexuados e aos homens, mas, aparentemente, só os homens fizeram de sua atividade sexual uma atividade erótica, e o que diferencia o erotismo da atividade sexual simples é uma procura psicológica independente do fim natural encontrado na reproduçaõ e na preocupaçaõ das crianças. [Ainda assim] o objeto dessa procura psicológica, independente, como eu o disse, da preocupaçaõ de reproduçaõ da vida, naõ é estranho à morte. Isso está de acordo com o que Freud diz sobre instinto sexual (conectar), sobre como passou a ser mais aceito falar disso, mas era um assunto subversivo pensar na sexualidade que não tivesse um fim pra reprodução. - O ser, com frequência, parece dado ao homem fora dos movimentos da paixaõ . E eu direi mesmo que nunca devemos imaginá-lo fora desses movimentos (p. 10). (...) Mas se é verdade que o erotismo se define pela independência do prazer erótico e da reproduçaõ como fim, o sentido fundamental da reproduçaõ naõ constitui menos a chave do erotismo. A reproduçaõ coloca em jogo seres descontínuos (p. 11). - Entre um ser e outro há um abismo, uma descontinuidade. Este abismo, num sentido, é a morte, e a morte é vertiginosa, fascinante. Mas morte tem o sentido de continuidade do ser e reprodução leva à descontinuidade, mas põe em jogo a continuidade dos seres, e está intimamente ligada à morte. - Nos seres sexuados, o novo ser é descontiń uo, mas traz em si a passagem à continuidade, a fusaõ , mortal para cada um deles, dos dois seres distintos. Relação com Platão até certo ponto, mas fusão de DOIS seres e não de um que foi separado. - Fala de: erotismo dos corpos, erotismo dos corações e do erotismo sagrado. Quer deixar bem claro que nelas o que está sempre em questaõ é substituir o isolamento do ser, a sua descontinuidade, por um sentimento de continuidade profunda (p. 13). - SOBRE NUDEZ (e strip tease) A açaõ decisiva é o desnudamento. A nudez se opõe ao estado fechado, isto é, ao estado de existência descontínua. É um estado de comunicaçaõ que revela a busca de uma continuidade possiv́ el do ser para além do voltar-se sobre si mesmo. Os corpos se abrem para a continuidade através desses canais secretos que nos daõ o sentimento da obscenidade. A obscenidade significa a desordem que perturba um estado dos corpos que estaõ conformes à posse de si, à posse da individualidade durável e afirmada (p. 14). - SOBRE A MORTE e o movimento da vida (descontinuidade) Há um terrível excesso do movimento que nos anima: o excesso ilumina o sentido do movimento. Mas isto é para nós apenas um signo monstruoso, a nos lembrar constantemente que a morte, ruptura dessa descontinuidade individual a que a angústia nos prende, se nos propõe como uma verdade mais eminente que a vida (p. 15). COLOCAR LÁ EM CORPOS para falar dessa sensação de morte em vida, da sensação dessa possibilidade, quando nunca parei pra pensar em mim como mortal. Isso tem a ver com a questão do corpo, as imagens de raio x – seio e pulmão). Esse me ver de um outro modo, me ver em pedaços (a partir desses pedaços), me ver fotografada, me ver mudar, alterar-me, meu corpo tornar-se diferente do que era, sentir a falta de controle sobre a vida e a morte. - Com efeito, o que a experiência miś tica revela é uma ausência de objeto. O objeto se identifica com a descontinuidade, e a experiência mística, na medida em que temos em nós a força de operar uma ruptura de nossa descontinuidade, introduz em nós o sentimento da continuidade. Ela o introduz por outros meios sem ser o do erotismo dos corpos ou dos corações. Mais exatamente, ela se priva de meios que naõ dependem da vontade. A experiência erótica ligada ao real é uma espera do aleatório, é a espera de um ser dado e das circunstâncias favoráveis. O erotismo sagrado, dado na experiência miś tica, quer somente que nada perturbe o individ́ uo (p. 17). Capítulo I - O erotismo na experiência interior - O erotismo é um dos aspectos da vida interior do homem. Nisso nos enganamos porque ele procura constantemente fora um objeto de desejo. Mas este objeto responde à interioridade do desejo (p. 20). - Sabemos que os homens fabricaram instrumentos e os utilizaram a fim de prover sua subsistência, depois, sem dúvida, bastante depressa, suas necessidades supérfluas. Resumindo, eles se distinguiram dos animais pelo trabalho. Paralelamente, eles se impuseram restrições conhecidas como interditos (p. 20). - O erotismo, eu o disse, é aos meus olhos o desequilíbrio em que o próprio ser se põe conscientemente em questaõ . Em certo sentido, o ser se perde objetivamente, mas nesse momento o indivíduo identifica-se com o objeto que se perde. Se for preciso, posso dizer que, no erotismo, EU me perco (p. 21). - COLOCAR-SE NO TEXTO Insisto: se às vezes falo a linguagem de um homem de ciência, isto é sempre uma aparência. O cientista fala de fora, tal como um anatomista do cérebro. E ele fala da teologia de dentro (p. 22). - MOVIMENTO DA DÚVDA Em se tratando de erotismo (ou geralmente de religiaõ ), a sua experiência interior lúcida era impossiv́ el num tempo em que naõ aparecia às claras o jogo de balança do interdito e da transgressaõ que ordena a possibilidade de um e de outro. Naõ basta saber que existe esse jogo. O conhecimento do erotismo, ou da religiaõ , exige uma experiência pessoal, igual e contraditória, do interdito e da transgressão. (...) Mas se é verdade que a desconfiança (o movimento incessante da dúvida) é necessária a quem se esforça por descrever a experiência de que estou falando, ela deve particularmente satisfazer às exigências que posso desde já formular (p. 24). - Interdito - Com freqüência, para a ciência, o interdito naõ é justificado, é patológico, é feito da neurose. Ele é, entaõ , conhecido de fora: se mesmo nós temos a sua experiência pessoal, na medida em que o imaginamos doentio, nele vemos um mecanismo exterior que penetra em nossa consciência. Esta maneira de ver naõ suprime a experiência, mas lhe dá um sentido menor. Assim, o interdito e a transgressão, se saõ descritos, o saõ como objetos, o saõ pelo historiador — ou pelo psiquiatra (ou pelo psicanalista). O erotismo encarado pela inteligência como uma coisa é, como a religiaõ , uma coisa, um objeto monstruoso. (...) Naõ nos opondo mais a ele, devemos deixar de fazer dele uma coisa, um objeto exterior a nós. Devemos encará-lo como o movimento do ser em nós mesmos. (p. 25). Capítulo II - O interdito ligado à morte - Aborda a oposição de dois temas irreconciliáveis: o interdito e a transgressão. - Há na natureza e subsiste no homem um movimento que sempre excede os limites (da razão) e que nunca pode ser reduzido senaõ parcialmente (p. 27). - Trabalho faz refrear movimentos tumultuosos Em nossa vida o excesso se manifesta na medida em que a violência prevalece sobre a razaõ . O trabalho exige um comportamento em que o cálculo do esforço, ligado à eficácia produtiva, é constante. Ele exige uma conduta sensata, onde os movimentos tumultuosos que se liberam na festa, e geralmente no jogo, naõ saõ decentes (p. 27). - Sade — o que ele quis dizer geralmente horroriza mesmo aqueles que fingem admirá-lo e naõ reconheceram por si mesmos este fato angustiante: que o movimento do amor, levado ao extremo, é um movimento de morte. Essa relaçaõ naõ deveria parecer paradoxal: o excesso que dá origem à reproduçaõ e o que é a morte só podem ser compreendidos um com a ajuda do outro. Mas parece, desde o princípio, que os dois interditos iniciais se referem, o primeiro, à morte, e o outro, à função sexual (p. 28). - A prática da sepultura é o testemunho de um interdito semelhante ao nosso que concerne aos mortos, e à morte. (...) Trata- se essencialmente de uma diferença feita entre o cadáver do homem e os outros objetos, como as pedras. Hoje essa diferença caracteriza ainda um ser humano em relaçaõ ao animal: o que chamamos de morte é em primeiro lugar a consciência que temos dela. Percebemos a passagem da vida à morte, isto é, ao objeto angustiante que é para o homem o cadáver de um outro homem. Capítulo III - O interdito ligado à reprodução - a proibição do incesto; a nudez; a relação entre homem e mulher em lugar privado; o sangue menstrual e o sangue do parto, etc. Capítulo IV - A afinidade da reprodução e da morte - a morte, a corrupção e a renovação da vida; a náusea; prodigalidade da vida e o medo desse movimento. Capítulo V - A transgressão - A transgressaõ naõ é a negaçaõ do interdito, mas o ultrapassa e o completa. - Acontece que a violência, de alguma maneira, excede o interdito. - Esta maneira de ver é difić il, na medida em que sagrado designa ao mesmo tempo duas coisas opostas. De uma maneira fundamental, é sagrado o que é objeto de um interdito. O interdito que designa negativamente a coisa sagrada naõ tem só o poder de nos dar — no plano da religiaõ — um sentimento de medo e terror. Este sentimento transforma-se em última instância em devoçaõ ; transforma-se em adoraçaõ . Os deuses, que encarnam o sagrado, fazem tremer os que os veneram, mas eles os veneram. Os homens saõ em um mesmo tempo submetidos a dois movimentos: o terror, que intimida, e a atraçaõ , que comanda o respeito fascinado. O interdito e a transgressaõ respondem a esses dois movimentos contraditórios: o interdito intimida, mas a fascinaçaõ introduz a transgressaõ . O interdito e o tabu naõ se opõem ao divino senaõ num sentido, mas o divino é o aspecto fascinante do interdito: é o interdito transfigurado. A mitologia compõe — às vezes ela embaralha — seus temas a partir desses dados (p. 45). De alguma forma poderia se relacionar ao culto e ao “sagrado” (teleológico) de que fala Benjamin sobre a obra de arte antes – mágica ou ritualística. Há um interdito porque precisavam ficar escondidas, só alguns poderiam vê-las. Não consigo deixar de pensar que isso ainda é meeeeio verdade. Não é que alguém seja impedido necessariamente de ir a um museu, mas é um local de ‘guardar’ essas obras que em geral é mais elitista, nem todo mundo tem acesso a ele. Capítulo IX - A pletora sexual e a morte - profundamente, secretamente, essa fissura que é própria da sensualidade humana é a mola do prazer. Capítulo XII - O objeto do desejo: a prostituição
Estudo VII - O objeto que provoca o movimento de Eros se dá por outro que ele naõ é (p. 174).