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CARTAS A NORA
ILUM I|ÍJRAS
você puder a fim de ficar mais parecida com uma mulher do que
com a garotinha querida, magra, simplória e um tanto desejeitada
que você é. Se aquele cacau acabar peça ao Stannie que mande
pedir mais: vai custar 5 xelins e 6 “pence”. Enquanto isso beba
bastante daquele outro cacau e chocolate. Vá acertando as contas
com a tua costureira. Hoje te enviei dois livros de moldes para
escolher. No sábado te mando sete ou oito metros de tweed de
Donegal para você fazer vestidos novos. Estive procurando um
jogo de peles para você e se os meus negócios aqui andarem bem
eu simplesmente irei te sufocar com peles e vestidos e capas de
todos os tipos. Já escolhi para você algumas peles muito lindas.
Escreva agora, meu amor, e me diga que você está fazendo
o que eu te peço. E que você está feliz porque vê que eu te amo
e sou leal e penso em ti. Sou leal, Nora, e penso em você todos
os dias e sempre.
Boa-noite, querida. Seja feliz durante este breve período em
que estivermos separados, e cada vez que você pensar de mim
beije a minha imagem em Georgie.
Addio, mia cara Nora!
JIM
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l 2 de novembro de 1909 44 Fontenoy Street, Dublin
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São duas da madrugada. Estou aqui copiando sozinho na
cozinha depois que todos foram se deitar e agora te escrevo. Se eu
pudesse erguer os olhos e encontrar aqueles teus olhos caninos.
Tentarei merecer a confiança que eles têm em mim.
Não se inquiete, Borboletinha. Aqui estão alguns versos
escritos quatrocentos anos atrás por um poeta que era amigo de
Shakespeare:
Lágrimas sufocam o coração, creia-me.
Oh luta para não ser excelente no pesar
Que apenas é fonte da ruína da sua beleza.1
Você é uma pessoinha triste e eu sou um parceiro extre
mamente melancólico de modo que o nosso amor é bastante
sombrio, imagino. Não chore por aquele jovem senhor maçante
da fotografia. Ele não merece isso, querida.
É muito gentil da tua parte perguntar sobre esse meu maldito
assunto sujo.2 Não piorou de qualquer maneira. Fiquei inicial
mente alarmado cotn o teu silêncio. Temi que algo de errado
tivesse acontecido. Mas você vai muito bem, não vai, queridinha?
Graças a Deus! Pobre Norinha, como sou mau para você!
Não se importe com Eva mas você deveria ver se o Stannie
está se cuidando. Espero que ele esteja melhor agora. Addio,
Giorgino e Lucetta! Vengo subito!’ E addio, Nora mia!
JIM
1 Tears kill the heart, believe./ O strive not to be excellent in woe. / Which only breeds
your beauty's overthrow.
Poema de John Dowland, "I saw my lady weep”, incluído no seu livro Second Booke
o f Songs or Ayres (1600).
: Provavelmente alguma doença contraída de uma prostituta.
' “Vou logo.”
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18 de novembro de 1909 44 Fontenoy Street, Dublin
[Sem saudação.]
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Deixe-me. É uma degradação e uma vergonha para você
viver com uma vil criatura como eu. Aja corajosamente e me
deixe. Você me deu as coisas mais belas deste mundo mas você
apenas jogava pérolas aos porcos.
Se você me deixar viverei para sempre com a tua lembrança,
mais sagrada para mim do que Deus. Vou orar pelo teu nome.
Nora, guarde alguma boa lembrança deste pobre miserável
que te desonrou com o seu amor. Pense que os teus lábios o
beijaram e que os teus cabelos o cobriram e que os teus braços o
estreitaram contra ti.
Não vou assinar meu nome porque é o nome com o qual
você me chamava quando você mc amava c me honrava e me
dava a tua alma gentil para que eu a ferisse e traísse.
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19 de novembro de 1909 44 Fontenoy Street, Dublin
[Sem saudação]
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tão triste pensar nela caminhando pelo quarto, comendo pouco,
vestida com simplicidade, de maneiras afáveis e alerta, e levando
sempre consigo em seu secreto coração a pequena chama que
inflama as almas e os corpos dos homens.
Choro também de pena dela por haver escolhido um amor
tão pobre e ignóbil quanto o meu: e de pena de mim mesmo que
não mereço ser amado por ela.
Uma terra estranha, uma casa estranha, olhos estranhos e a
sombra de uma estranha, bem estranha garota parada em silêncio
junto ao fogo, ou contemplando pela janela o brumoso parque do
College. Que beleza misteriosa reveste cada um dos lugares onde
ela viveu!
Duas vezes enquanto escrevia essas frases esta noite os
soluços rapidamente subiram pela minha garganta e brotaram
dos meus lábios.
Amei nela a imagem da beleza do mundo, o mistério e a
beleza da própria vida, a beleza e o destino da raça da qual sou
filho, as imagens de pureza espiritual e de piedade nas quais
acreditei quando criança.
Sua alma! Seu nome! Seus olhos! Eles se parecem com
belas e raras flores silvestres azuis crescendo em alguma sebe
emaranhada e molhada de chuva.1E eu senti sua alma estremecer
junto da minha, e murmurei seu nome para a noite, e chorei ao
ver a beleza do mundo passar como um sonho atrás dos seus
olhos.
[Não assinada]
1 N o prim eiro ato <Ja peça E xiles [Exilados], de Joyce, Robert Hand cham a Bertha de
“Um a flor-do-campo desabrochando num a sebe” .
22 de novembro de 1909 44 Fontenoy Street, Dublin
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de te enviar palavras. Me agradaria mais ter nossos lábios unidos,
nossos braços entrelaçados, nossos olhos desfalecendo na triste
alegria da possessão.
Perdoe-me, queridinha. Queria ser mais reservado. Mas
devo arder e arder e arder por você.
JIM
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27 de novembro de 1909 Sábado à noite [Dublin]
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Copyright © 2012
S érgio M ed eiros e D irce W altrick do Am arante
Capa
E d er C ardoso / Iluminuras
Revisão
Leticia C astello Branco
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
J79c
2012
EDITORA ILUM INURAS LTDA.
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www.iluminuras.com.br
SUM ÁRIO
CARTAS
DUBLIN (1904)
15 de junho de 1904, 29
[? 12 de julho de 1994], 30
[? Fim de Julho de 1904], 31
[Fim de julho? 1904], 32
3 agosto 1904, 34
[Aproximadamente 13 de agosto de 1904], 35
15 de agosto de 1904, 36
29 de agosto de 1904, 37
[Aproximadamente 1" de setembro de 1904], 40
10 de setembro de 1904, 42
16 de setembro de 1904, 44
19 de setembro de 1904, 45
[26 de setembro de 1904], 46
29 de setembro de 1904, 47