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Luiz Antonio Dias

Cultura Afro-Indígena
Brasileira
Apresentação

É com satisfação que a Unisa Digital oferece a você, aluno(a), esta apostila de Cultura Afro-Indígena
Brasileira, parte integrante de um conjunto de materiais de pesquisa voltado ao aprendizado dinâmi-
co e autônomo que a educação a distância exige. O principal objetivo desta apostila é propiciar aos(às)
alunos(as) uma apresentação do conteúdo básico da disciplina.

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ciplinares, como chats, fóruns, aulas web, material de apoio e e-mail.

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bem como acesso a redes de informação e documentação.

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Unisa Digital
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................... 5
1 O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO: ESCRAVIDÃO E OPRESSÃO................................... 7
1.1 Resumo do Capítulo.............................................................................................................................................................9
1.2 Atividades Propostas............................................................................................................................................................9

2 O PROCESSO DE CONVERSÃO: CATEQUESE E INQUISIÇÃO......................................11


2.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 12
2.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 13

3 ÍNDIOS, NEGROS E CULTURA BRASILEIRA..............................................................................15


3.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 18
3.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 18

4 LUTAS E RESISTÊNCIAS.........................................................................................................................19
4.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 20
4.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 20

5 O PROCESSO DE ABOLIÇÃO..............................................................................................................23
5.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 24
5.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 24

6 A IDEIA DE POVO: FORMAÇÃO E PRECONCEITO...............................................................27


6.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 29
6.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 29

7 NEGROS E ÍNDIOS DO BRASIL ATUAL........................................................................................31


7.1 Resumo do Capítulo.......................................................................................................................................................... 33
7.2 Atividades Propostas......................................................................................................................................................... 34

RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS...........................................35


REFERÊNCIAS...................................................................................................................................................37
INTRODUÇÃO

Caros(as) alunos(as), o objetivo principal desta disciplina – e desta apostila – é apresentar e discutir
a importância do elemento negro e do indígena na formação social e cultural do Brasil. Não pretendemos
enfatizar o lado exótico e diferente de negros e índios; pelo contrário, pretendemos demonstrar a forte
contribuição desses povos para a formação do Brasil, em sua totalidade.
Tanto a cultura indígena quanto a cultura africana, durante todo o processo histórico, contribuíram
para a formação da cultura brasileira, apresentando-se de forma diluída em vários aspectos: língua, mú-
sica, culinária e religião.
Mais do que apresentar a questão negra e indígena na formação histórica do Brasil, a intenção é
promover o debate e a conscientização dos alunos para problemas que continuam presentes na contem-
poraneidade.
Em um país como o Brasil, com forte miscigenação, é fundamental pensarmos as contribuições
culturais e a importância de seus vários elementos. Também devemos levar em conta a existência de
uma sociedade marcada pela desigualdade social, mas que apresenta, igualmente, fortes traços de desi-
gualdade racial, ou seja, índios e afrodescendentes têm pouca participação nos estratos mais elevados
da pirâmide social.
O Brasil moderno – e seus problemas e impasses – só pode ser entendido a partir da análise de sua
formação, de sua herança colonial. A desigualdade social tem origem na forma de concentração de ter-
ras/renda, que, em grande medida, não se alterou profundamente até os dias atuais.
No mesmo sentido, percebemos um choque racial, através de um racismo implícito, que se fun-
damenta na crença da inferioridade negra. No entanto, existe uma aceitação do elemento negro como
necessário. Com isso, devemos repensar a ideia de “democracia racial”.
Dessa forma, discutimos o processo de colonização e seus impactos sobre os ameríndios, no aspec-
to social, cultural, religioso, mas também a contribuição dos nativos para a formação cultural da colônia
portuguesa. De forma semelhante, buscamos analisar a cultura indígena e suas influências na formação
cultural brasileira.
Com relação ao elemento negro, buscamos apresentar e discutir as estruturas socioculturais da
África portuguesa e suas influências sobre o Brasil, analisando a formação da cultura afro-brasileira, so-
bretudo como forma de resistência à opressão da escravidão e, também, da conversão.
Além de apresentar e discutir a importância e contribuição de negros e índios, buscamos também
analisar a representação e representatividade do negro e do índio na história e na historiografia brasi-
leira, pensar como esses indivíduos foram “vistos” e “pensados” dentro da produção cultural e científica
brasileira nos séculos XIX e XX. Buscamos, ainda, analisar os impactos das ideias de “branqueamento”, su-
perioridade racial, eugenia etc., além disso, entender a preocupação com a formação do povo brasileiro
na segunda metade do século XIX.

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Dentro dessa perspectiva, analisamos as ideias debatidas ao longo do século XX, como “democra-
cia racial”, “racialismo”, “coisificação” do negro, processos e mecanismos de resistência à opressão.
Finalizamos a discussão com reflexões sobre a situação atual de negros e índios: mercado de traba-
lho; mecanismos de inclusão e exclusão; racismo e preconceito. Além disso, buscamos debater a necessi-
dade – e possibilidades – dos programas e projetos “compensatórios” – sistema de cotas nas universida-
des públicas, por exemplo – como mecanismo que visa a reduzir a marginalização desses grupos.
Será um grande prazer acompanhá-los ao longo desse trajeto.

Prof. Luiz Antonio Dias

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O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO:
1 ESCRAVIDÃO E OPRESSÃO

Caro(a) aluno(a), neste capítulo iniciaremos a Esse relato apresenta os tupis, um dos gran-
discussão sobre o processo de colonização. des grupos indígenas no território recém-conquis-
O fortalecimento do comércio europeu du- tado, no entanto existia uma grande diversidade
rante o século XIV criou a necessidade de se busca- cultural entre os nativos. O principal grupo tupi,
rem novas rotas comerciais para o Oriente, proces- nessa região, eram os tupinambás. Percebe-se,
so que ficou conhecido como Expansão Marítima. desde o início, uma preocupação em buscar seme-
Dentro desse contexto, os europeus chegaram ao lhanças entre os europeus – homens de Deus – e
Novo Mundo. Pedro Álvares Cabral tomou posse os nativos, que deveriam ser salvos através da ca-
da colônia portuguesa (Brasil) em nome do Rei tequese. Dessa forma, a Coroa proibiu a escravidão
de Portugal. Não existiu, no início da ocupação, o
indígena, a partir de 1570, exceto por “razões jus-
objetivo de povoar; isso só ocorreu mais tarde, a
tas” (ataques dos nativos, resistência à catequese).
partir da segunda metade do século XVI, quando
as regiões tropicais passaram a ser ocupadas e ex- Nesse sentido, é importante destacar que
ploradas. essa primeira imagem do nativo, retratada por
No entanto, desde o início, sempre houve a Caminha, rapidamente começa a se transformar:
preocupação em converter a população local. Cabe descobre-se o canibalismo de vários grupos – en-
destacar que Portugal e Espanha eram os grandes tre eles os tupinambás – a crença em mitos e sím-
reinos católicos do período; dessa forma, ao lado bolos – associados pelos jesuítas ao mal. Essa nova
das questões econômicas, existiam também as visão acabou, em muitos momentos, justificando
questões religiosas envolvidas na conquista. Isso as “capturas justas” de nativos para escravidão.
pode ser claramente percebido nesse trecho da
Carta de Caminha, primeiro documento sobre a
colônia portuguesa: A escravidão dos índios e o uso de sua
mão-de-obra no plantio e beneficiamento
da cana revelaram-se etapa transitória no
[...] a feição deles é serem pardos, maneira desenvolvimento da indústria açucareira,
de avermelhados, de bons rostos e bons durante a qual se empregou uma força
narizes, bem feitos. Andam nus, sem co- de trabalho relativamente barata e pron-
bertura alguma. Não fazem o menor caso tamente acessível até que a atividade se
de encobrir ou de mostrar suas vergo- encontrasse totalmente capitalizada. [...]
nhas; e nisso têm tanta inocência como processo gradual e de forma alguma ine-
em mostrar o rosto. [...] Parece-me gente vitável. A escravidão dos aborígines defi-
de tal inocência que, se homem os enten- nhou devido às percepções e limitações
desse e eles a nós, seriam logo cristãos, culturais de índios e europeus, à susceti-
porque eles, segundo parece, não têm, bilidade dos nativos às doenças do Velho
nem entendem em nenhuma crença. [...] Mundo e ao curso de eventos históricos.
Portanto Vossa Alteza, que tanto deseja (SCHWARTZ, 1988, p. 40).
acrescentar a santa fé católica, deve cui-
dar da sua salvação. E prazerá a Deus que Percebe-se a importância dos nativos, prin-
com pouco trabalho seja assim. [...] Assim,
cipalmente, no início da colonização. A substitui-
Senhor, a inocência dessa gente é tal, que
a de Adão não seria maior, quanto à ver- ção do trabalho escravo indígena pelo trabalho
gonha. escravo negro foi, dessa forma, uma transição em
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função de vários fatores: intervenção dos jesuítas


– que buscavam evitar a escravidão indígena; ne- Atenção
cessidade de limitar os poderes dos colonos – que
No entanto, cabe destacar que Portugal
podiam, até esse momento, capturar seus próprios
foi o responsável por tornar a escravidão
escravos; aumentar a produção com braços mais em um grande negócio. Dessa forma,
fortes e não tão suscetíveis às doenças e, talvez o com a utilização de mão de obra escrava
mais importante para a Coroa portuguesa, a neces- negra na América, as guerras entre os po-
sidade de auferir lucros no comércio de escravos. A vos africanos tornaram-se a consequência
escravidão negra, ao lado da empresa açucareira, da necessidade de escravos. Para Portu-
foi determinante para o enriquecimento e fortale- gal, que intermediava o negócio, os lucros
tornaram-se fabulosos.
cimento do Império Português.
No Brasil, predominou sempre a economia
agroexportadora. A “empresa açucareira” prospe- Segundo Alencastro (2000), o tráfico ne-
rou principalmente na capitania de Pernambuco. greiro tornou-se instrumento de alavancagem do
Produtos tropicais com grande aceitação na Euro- Império Português no ocidente, ligando o Brasil à
pa, em especial o açúcar, demandaram produção África Ocidental através de um comércio bilateral
em larga escala, só obtida por meio do plantation. intermediado por Portugal. Dessa forma, Brasil e
África – colônias portuguesas – tornaram-se com-
plementares e não concorrenciais.
Dicionário Dentro dessa perspectiva, o Brasil tornou-
-se o maior “consumidor” de escravos da América.
Plantation significa unidade de produção agrí-
cola baseada no latifúndio, ou seja, monocultu- Estima-se que, durante os três séculos de tráfico
ra apoiada em mão de obra barata/escrava. negreiro, tenham entrado no Brasil mais de cinco
milhões de escravos, submetidos a condições de-
sumanas no trajeto e, posteriormente, na colônia.
A utilização do escravo negro ocorreu em Um número muito grande de negros morria
função da falta de braços livres em Portugal e da no trajeto, além disso, percebemos altas taxas de
impossibilidade de o colono europeu sujeitar-se, mortalidade nos primeiros meses após a chegada
na América, ao trabalho assalariado. Além disso, em função das péssimas condições das viagens, de
Portugal possuía estrutura, na África, para fornecer doenças, maus-tratos.
os escravos necessários e integrar os mercados co- Muito comum, também, são os relatos de
loniais. suicídios, além disso, existia um número muito ele-
A escravidão já existia, na África, antes da vado de fugas, que, consequentemente, levavam à
chegada dos portugueses, no entanto não era morte dos escravos fugitivos.
uma estrutura, os escravos eram consequências
das guerras. Saiba mais

Alegadamente já cativados pelos nativos, No Brasil, a expectativa média de vida


os escravos eram adquiridos por compra e durante o cativeiro era de doze anos em
escambo nas feiras dos sertões, e não por média. Isso ocorria em função da grande
captura direta dos portugueses, como só exploração no trabalho (jornadas de até
16 horas diárias); punições exageradas
ia ocorrer no cativeiro indígena do Brasil.
(trezentas chibatadas poderiam levar à
Na mesma época, ensinava-se na Univer- morte); alimentação escassa e pouco va-
sidade de Coimbra que o tráfico negreiro, riada (basicamente feijão, farinha e rapa-
regularmente submetido aos contratos e dura).
impostos régios de Portugal, recebia ipso
facto, plena chancela jurídica (ALENCAS-
TRO, 2000, p. 172).

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Cultura Afro-Indígena Brasileira

Além desse massacre físico, pelo qual os ín- punição pelas heresias, cometidas por negros e ín-
dios também passaram, devemos discutir também dios.
o “massacre cultural” imposto pela conversão e

1.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a), neste capítulo estudamos:

1. A expansão Marítima e o processo de colonização;

2. A escravidão e o tráfico negreiro;

3. As condições de vida e trabalho dos escravos.

Espero que a discussão tenha sido proveitosa.

1.2 Atividades Propostas

Agora vamos avaliar sua compreensão:

1. Reflita sobre a visão de Caminha sobre os nativos.

2. Analise as condições de vida e trabalho dos negros no Brasil.

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O PROCESSO DE CONVERSÃO:
2 CATEQUESE E INQUISIÇÃO

Caro(a) aluno(a), neste capítulo discutiremos Os desregramentos sexuais, o canibalis-


as relações entre Estado, Igreja e o processo de mo e as superstições demonstravam as
ligações entre os índios e Satã. As mencio-
conversão.
nadas práticas, porém, originavam-se do
Segundo Souza (1993), a expansão marítima Diabo e não provinham da natureza dos
marcou a vitória da ciência (cálculos e rotas ma- nativos. Os relatos jamais demonstraram a
rítimas) sobre o “mágico” (crenças e superstições irreversibilidade dos costumes indígenas,
cabendo aos padres a tarefa de transfor-
sobre seres monstruosos), no entanto o cotidiano
má-los em fiéis aliados. (RAMINELLI, 1996,
europeu continuou marcado pelo “maravilhoso”, p. 19).
ou seja, o homem comum continuava a “encon-
trar” seres monstruosos
pelo mundo, em especial Atenção Essa visão tornou-
na América. -se predominante a par-
O diferente sempre foi associado ao mal
O primeiro con- pelo ocidente cristão. A luta do bem (re- tir do final do século XVI.
tato com os nativos, de presentado por Cristo e pela Igreja) contra Mesmo não sendo res-
acordo com os relatos o mal (representado pelo demônio e os ponsáveis pelo mal em si,
de Caminha, foi positivo, seus seguidores) marcava a mentalidade os nativos deveriam ser
europeia. O processo de expansão marí-
no entanto, durante o punidos e purificados.
tima possibilitou a difusão da fé católica
processo de colonização, entre os povos bárbaros (ameríndios e, Para a salvação seria ne-
essa visão passou por al- também, africanos). Dessa forma, Igreja e cessária a expiação dos
terações significativas. O Estado acabam se entrelaçando no con- pecados (humilhação,
índio puro transforma-se trole das colônias, melhor exemplo disso humildade, trabalho).
em “malicioso”; o índio foi o envio de missões para a América e o Para tanto, temos uma
poder que a Igreja exercia no Brasil
hospitaleiro transforma- verdadeira “Cruzada”
-se em canibal; o índio contra o mal na Améri-
que aceitaria facilmente o cristianismo torna-se ca. Os jesuítas, em especial, formam um poderoso
“endemoniado”. Dessa forma, não tardou o contro- exército para combater e expulsar o demônio des-
le e a punição às heresias, à idolatria e ao caniba- sas terras, mesmo que isso significasse a morte de
lismo. milhares de nativos. A escravidão, as doenças, a in-
quisição e a catequese massacraram a população,
a cultura e a religião indígena.
Dicionário

Heresia trata-se de doutrinas contrárias à fé


cristã. Atos ofensivos à Igreja. Os hereges eram
perseguidos e punidos pela Igreja.

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tadora”. Segundo Alencastro (2000), a Igreja tolera-


Saiba mais va a escravidão, tanto de índios quanto de negros,
pois isso facilitaria a catequese.
Acredita-se que em 1500 existiam entre No mesmo sentido, as garras da Inquisição
cinco e seis milhões de índios no Brasil,
atualmente a Fundação Nacional do Ín- também abateram muitos negros. Nos registros
dio (Funai) calcula que a população indí- das visitações do Santo Ofício ao Brasil existem
gena não chegue a 500 mil. Para a Igreja, vários processos contra negros acusados de here-
no entanto, a salvação da alma dos nati-
vos era fundamental. sias diversas, feitiçaria, devassidão sexual etc. Além
disso, a própria religiosidade negra não foi comple-
tamente abandonada com o processo de conver-
são ao cristianismo. Ocorreu, em muitos casos, um
Os nativos, porém, nem sempre aceitaram sincretismo religioso (mistura entre elementos das
passivamente a evangelização, reagiam de forma religiões africanas com os do cristianismo) e, tam-
violenta ou deturpavam os ensinamentos. Com re- bém, foi muito comum a manutenção dissimulada
lação aos negros, a situação não foi muito diferente. de práticas pagãs.
Os cativos, antes do embarque nas costas africanas, Podemos perceber que, a exemplo dos nati-
deveriam receber o batismo e, posteriormente, na vos, o massacre dos negros não foi operado apenas
colônia conseguiriam a salvação da alma através pela escravidão e péssimas condições de vida, mas
da penitência e purgação dos pecados. Nesse sen- também pela Igreja e o processo de conversão.
tido, existia a perspectiva de uma “escravidão liber-

2.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a), neste capítulo estudamos:

1. O processo de conversão e catequese dos nativos e dos negros;

2. O massacre cultural;

3. As resistências de nativos e negros.

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2.2 Atividades Propostas

Agora vamos avaliar sua compreensão. Leia e reflita sobre o texto, em seguida responda às ques-
tões propostas:

“A religião dos tupinambás”

A mentalidade etnocêntrica, reforçada pelo cristianismo da época da Reforma, aparece entre


os cronistas-viajantes, principalmente quando eles tratam das crenças espirituais dos tupinambás.
Para Jean de Léry, que era fervoroso calvinista, só o deus e as práticas religiosas dos cristãos
tinham validade, enquanto as crenças dos índios eram absurdas e produto do estado de selvage-
ria em que viviam [...]. No entanto o próprio cronista, caído em certa contradição, afirmava que
os índios, mesmo não adorando deuses, acreditavam na imortalidade da alma. Principalmente os
guerreiros, que matavam e comiam muitos inimigos, vingando os seus antepassados, ao morrerem
iriam para uma espécie de paraíso, onde poderiam dançar e se regozijar de várias outras formas.
Acreditavam também em espíritos malignos e numa espécie de diabo: chamado Ainnham.
Este podia assumir a forma de animais e freqüentemente atormentava os vivos, em especial os co-
vardes (depois de sua morte), numa espécie de inferno.
Figuras importantes, em termos da vida religiosa, eram os caraíbas, denominados pajés por
Hans Staden, que, segundo vários cronistas, eram apenas trapaceiros que exploravam a crença in-
gênua dos índios.
Esses caraíbas andavam pelas diversas aldeias. Acreditava-se que se comunicavam com os
espíritos e realizavam curas. Periodicamente presidiam cerimônias que reuniam aldeias inteiras,
exorcizando demônios, pedindo sucesso na guerra, fertilidade da terra e caça e pesca abundantes.
Léry presenciou uma dessas cerimônias e a descreveu de maneira pormenorizada. Nelas, os
participantes entravam em transe depois de cantar, dançar, tomar cauim e substâncias alucinóge-
nas.
Para o cristão Léry, esses rituais eram apenas ‘macaquices’. No entanto, ele parece se desmen-
tir quando diz que ficou impressionado com as cerimônias a que assistiu e particularmente com
a música cantada pelos tupinambás e que ele conseguiu anotar. Muitos anos depois ele diria: “E
ainda hoje quando recordo essa cena sinto palpitar o coração e parece-me a estar ouvindo.”
Sintetizando, podemos dizer que os cronistas-viajantes, assim como os colonizadores em
geral, não compreenderam, ou não quiseram compreender, as práticas religiosas dos índios. Foi
grande o esforço dos brancos, tanto católicos como protestantes, para destruir essas crenças e, em
especial, para desmoralizar os caraíbas, particularmente no tocante às suas atividades de curar do-
enças. Esta foi uma das formas mais eficientes de implantar o cristianismo e a dominação colonial
em sociedades indígenas, que passaram a viver um processo de rápidas mudanças.

Fonte: Campos (1998, p. 54-55).

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A partir do texto anterior, da apostila e das aulas, assinale a alternativa correta:

1. Segundo o viajante Jean de Léry, os nativos:

a) Não tinham crenças sobrenaturais.


b) Eram cristãos e, portanto, acreditavam em Deus, no paraíso e no inferno.
c) A
creditavam na imortalidade da alma, na remissão dos pecados, na salvação e na vida eter-
na.
d) Acreditavam na existência de espíritos malignos punitivos.

2. A perseguição, punição e desmoralização dos pajés foram fundamentais para:

a) Implantar o cristianismo entre os nativos.


b) Promover uma valorização da cultura negra.
c) Reduzir as punições de Ainnham aos indígenas covardes.
d) Eliminar, completamente, a crença dos nativos no sobrenatural.

3. Segundo vários cronistas, os caraíbas eram:

a) Indivíduos que aumentavam as colheitas.


b) Demônios que aterrorizavam os nativos.
c) Charlatões que exploravam a ingenuidade dos nativos.
d) Espíritos dos guerreiros que morreram em combate.

4. Podemos perceber, a partir da leitura do texto, que:

a) A preocupação dos europeus em preservar a cultura nativa.


b) A valorização dos bens materiais pelos europeus.
c) A inexistência de rituais religiosos entre os nativos.
d) A ideia de superioridade cultural dos europeus.

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ÍNDIOS, NEGROS E CULTURA
3 BRASILEIRA

Caro(a) aluno(a), neste capítulo buscaremos O irmão António Blazquez descreveu


compreender um pouco melhor quem somos. as choças indígenas, representando-as
como o purgatório [...]. As casas eram es-
A formação do povo e da cultura brasileira, curas, fedorentas e ‘afumadas’, nelas havia
como percebemos hoje, sofreu influências dos po- uns cântaros semelhantes às caldeiras do
vos indígenas e africanos. No entanto, essas contri- Inferno. No interior das cabanas, os na-
buições foram desiguais. A maior proximidade en- turais permaneciam na imundície, pois a
preguiça impedia-os de fazer suas neces-
tre brancos e negros possibilitou um intercâmbio
sidades nos locais adequados. E assim uri-
cultural mais efetivo. navam nas redes, que logo apodreciam e
Além disso, a grande diferença social e cultu- exalavam aroma repugnante. (RAMINELLI,
ral entre nativos e europeus impediu a valorização 1996, p. 117).
da cultura indígena. Ao contrário das grandes civi-
lizações existentes no México e nas regiões andi- Ou, por outro lado, existiu também uma ide-
nas (Incas, Maias, Astecas), no Brasil a organização alização do índio, que não se corrompeu diante de
social, os padrões de comportamento e os valores bens materiais, que preserva a natureza, vive em
eram muito diferentes dos europeus. Os nativos grande harmonia social e em perfeita comunhão
brasileiros sempre foram vistos pelos colonizado- com os seus semelhantes. Essa visão que surgiu no
res e cronistas da época como inferiores. O índio final do século XIX ainda é comum.
começou a ser valorizado – e idealizado – somente Essas ideias entram em choque com alguns
no final do século XIX, quando intelectuais brasi- aspectos muito reais do cotidiano indígena.
leiros começam a buscar o “verdadeiro brasileiro”.
De qualquer forma, também percebemos,
Saiba mais
principalmente na língua e em alguns nomes pró-
prios, a contribuição indígena. Além disso, houve
uma grande influência na chamada “medicina po- As guerras entre as tribos eram extrema-
pular” – duramente combatida pela Igreja – com- mente comuns, inclusive com a escra-
vidão dos derrotados e com rituais de
posta por ervas e “beberagens”. antropofagia. Era comum, entre vários
Assim como entre os negros, existe uma di- grupos indígenas, devorar o inimigo; bus-
versidade cultural muito grande entre os nativos, cava-se adquirir as qualidades do guerrei-
ro morto por meio desses rituais.
mas existem algumas características mais comuns,
como, por exemplo, a pouca preocupação com o
acúmulo de bens e riquezas. Isso motivou diferen-
tes teorias, sempre vinculadas às ideias predomi-
nantes na época como, por exemplo, a inaptidão Acredita-se que em nenhum dos casos te-
do índio para o trabalho e sua “preguiça biológica”, mos uma perspectiva correta dos povos indígenas,
muito presentes nos documentos do período colo- eles de fato possuem uma relação diferente com
nial. Essa perspectiva evidencia-se nesta descrição a terra – e isso deve ser levado em consideração
de um religioso do século XVI: nos processos de demarcação de terras indígenas,
por exemplo. No entanto, também buscam uma
interação com a sociedade branca e, consequente-

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mente, assimilam valores da nossa cultura, como a De fato, a possibilidade de manter as tradi-
ideia de acumulação e consumo. ções era muito reduzida diante do ímpeto dos
No aspecto religioso, existia uma grande di- portugueses em converter os nativos e “expulsar o
versidade, no entanto, com uma estruturação co- demônio dessas terras”. Ao lado da estrutura eco-
mum: crença nas forças da natureza, vistas como nômica de exploração – da colônia, dos nativos e
deuses e/ou espíritos; cultos aos antepassados dos negros – existia, também, uma estrutura de
(acreditava-se na permanência dos espíritos); im- “purificação” de todos eles.
portância do pajé, espécie de sacerdote que inter- A diversidade cultural, linguística e religiosa
mediava a relação dos índios com o mundo mági- também era muito forte no continente africano,
co, além disso, o pajé conhecia profundamente os dessa forma, temos diferentes contribuições à cul-
mitos e curas (através de ervas), o que lhe conferia tura brasileira. Vários grupos distintos entraram no
um grande poder entre os nativos. Brasil, ao longo de três séculos de tráfico negreiro.
Devemos destacar que a exemplo de várias Apesar dessa diversidade, a maior parte dos
mitologias politeístas, entre os nativos não existia escravos que entraram no Brasil era originária da
a ideia de “bem” ou “mal” absolutos, representados região de Congo, Angola e Moçambique. De qual-
por um deus. Os nativos acreditavam que os deu- quer forma, apresentavam um padrão cultural,
ses e espíritos eram apenas “caprichosos” – como, sexual e religioso muito diferente daquele vistos
de fato, se apresentam as forças da natureza – des- como corretos pelos portugueses. Portanto, a re-
sa forma, deveriam buscar sua proteção e ajuda pressão e tentativas de “enquadramento” foram
através de rituais, danças e oferendas. O Sol – vis- comuns sobre os negros.
to como um deus – que poderia ajudar o cultivo, No aspecto sexual, predominava a poligamia,
também poderia destruir uma plantação, portanto considerada pela igreja como uma heresia e passí-
o indígena deveria agradar o deus. Essa interpreta- vel de forte punição. A homossexualidade também
ção das vontades, caprichos e significados dos atos não era incomum entre os africanos, em especial
dos deuses era feita pelo pajé. na região de Congo e Angola, onde inclusive era
Justamente, por isso, existia uma grande riva- institucionalizada através dos quimbandas.
lidade – e, consequentemente, perseguição – entre
os pajés e os religiosos. Nesse sentido, a Inquisição
Dicionário
foi implacável com as pajelanças e contribuiu para
a destruição da cultura indígena. Quimbandas eram os homossexuais masculinos.

Aos índios caberia escolher entre o rigor


da escravidão e a proteção dos jesuítas. A religiosidade negra, de forma geral, era
Comumente, preferiam a segunda alterna-
tiva, porém ela mostrava-se tão destrutiva marcada por características1 comuns aos ritos pa-
quanto a primeira. Os padres interferiam gãos – diversidade de deuses (orixás), mitos funda-
abertamente nos costumes indígenas, dores, ausência de bem e mal absolutos. Quando
fazendo-os abandonar práticas perpe- eram embarcados na África, os negros eram bati-
tuadas por seus ancestrais. Os religiosos zados e convertidos ao catolicismo, isso, no entan-
lançaram-se contra os padrões da cultura
dos índios da costa do Brasil. A poligamia, to, não significava professar a fé cristã, muito pelo
o casamento entre primos, a antropofagia contrário, a maioria dos negros continuava a crer
e a guerra foram duramente perseguidos em seus orixás.
e extintos entre as populações que viviam Percebemos essa permanência na constru-
nas áreas colonizadas. Nesse sentido, os
projetos coloniais minavam os pilares da ção do candomblé, no qual ocorre uma forte influ-
tradição tupinambá. (RAMINELLI, 1996, p. ência das estruturas dos iorubás (sudaneses), mas
14). também de outros povos. Percebemos, no Brasil,
uma grande mistura entre as “culturas africanas”,

1
Exceto pelos grupos islamizados, originários principalmente do norte da atual Nigéria. Esses indivíduos foram chamados de
Malês (na Bahia) ou Alufás (no Rio de Janeiro) e buscaram, na medida do possível, manter sua religiosidade.

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em parte, devido à mistura étnica aqui ocorrida e Aliás, o culto religioso, na umbanda, deixa de ser
também a partir do crescimento do número de ne- apenas de afrodescendentes. Os próprios antepas-
gros nascidos no Brasil, que perdem suas origens sados deixam de ser os heróis africanos, mas sim
africanas. Apesar disso, o candomblé, que surgiu os líderes de terreiros. Dessa forma, o mito passa a
na metade do século XIX, foi a melhor reconstitui- fazer sentido também para o branco que aderiu à
ção da cultura negra e, apesar de revezes, mantêm- umbanda; os orixás tornam-se universais e deixam
se forte até hoje. de ser fonte de memória e identidade do negro.
Podemos destacar como características bási- Na segunda metade do século XX, a socieda-
cas do candomblé: de branca passou a incluir-se no candomblé, que
deixou de ser exótico e tornou-se comum. A cultu-
ra de uma minoria tornou-se objeto de consumo
a) Grande mistura de cultos, mitos e ceri-
de todos.
mônias. Culto aos orixás (de cada família,
de cada região). Além disso, existe o cul-
to comum a Exu (elemento que estabele- Atenção
ce a ligação entre os homens e as divin-
Esse processo de valorização da cultura
dades);
negra ocorreu juntamente com movi-
b) Culto ao orixá da adivinhação, Orunmilá, mentos de minorias, que buscavam iden-
por uma confraria de sacerdotes (baba- tidade. Dessa forma, a reconstituição do
laôs), esse culto é importante para buscar passado dos negros, que orienta a cons-
previsões e entender os desígnios dos trução da identidade, só pode ser feita a
deuses. Somente a partir da interpreta- partir da cultura brasileira. A negritude só
pode ser afirmada como brasileira (daí a
ção dos mitos pode-se explicar o mundo;
cultura “afro-brasileira”).
c) Culto dirigido pelo chefe masculino ou
feminino, o orixá do fundador do grupo
torna-se o orixá de toda a comunidade; Do Brasil de hoje se faz a África de ontem,
d) Em cada grupo, ou região, a “nação afri- África simbólica que é memória e identi-
dade possíveis aos afro-descendentes. O
cana” que o identifica é a que mais lhe candomblé, nesse processo, deixa de ser
fornece elementos, no entanto, ocorre religião e passa a funcionar apenas como
uma forte mistura com elementos de ou- fonte idealizada de identidade, mesmo
tras “nações”. porque o candomblé não tem a menor dis-
posição de se enfileirar com o movimento
de afirmação do negro; pais e mães-de-
A religião, para o negro, tornou-se uma espé- -santo, muitos deles brancos ou mestiços,
cie de refúgio idílico capaz de atenuar as agruras querem ser apenas líderes religiosos [...]. O
candomblé tornou-se religião universal, já
do cotidiano. não pertence a raça ou etnias definidas, é
Com o fim da escravidão e com a formação religião ‘para todos nós’, para todos os bra-
da sociedade de classes – a partir de 1889, com o sileiros. (PRANDI, 2005, p. 173).
advento da República –, as organizações de castas
e étnicas perderam o sentido. Dessa forma, vários Dessa forma, a religiosidade negra, pelas
aspectos da cultura africana foram absorvidos pela perseguições da Igreja ou do Estado, só sobreviveu
cultura nacional. porque se reinventou a cada dia, tornando-se mais
No início do século XX, isso se tornou mais próxima dos padrões religiosos europeus; além
forte: a sobrevivência da cultura negra dependia da disso, promoveu um processo de aproximação e
possibilidade de ser absorvida pela cultura branca. sincretismo religioso, tomando emprestados san-
Na música, o lundu – ritmo de origem africana – le- tos católicos para representar seus orixás. Um pro-
vou ao choro; a batida do candomblé influenciou o cesso de constante luta e resistência.
samba das classes médias. Na religião, a umbanda
tornou-se mais aceitável, porque ocorreu um for-
te processo de miscigenação e branqueamento.

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3.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a), neste capítulo estudamos os seguintes temas:

1. Cultura e religiosidade indígena.

2. Cultura e religiosidade negra.

3. Processo de formação da cultura brasileira a partir desses elementos.

4. Os sincretismos.

3.2 Atividades Propostas

Agora vamos verificar como foi a compreensão do capítulo, respondendo às questões a seguir:

1. A religiosidade nativa apresentava uma grande diversidade, no entanto algumas característi-


cas eram muito comuns entre vários povos, dentre elas podemos destacar:

a) A pajelança.
b) O monoteísmo.
c) O salvacionismo.
d) O messianismo.
e) As oferendas aos orixás.

2. Com relação à religiosidade negra no Brasil, durante o período colonial, podemos afirmar que
ela:
a) Foi tolerada pela Igreja Católica.
b) Foi completamente extinta através da ação da Inquisição.
c) Apresentava um grande sincretismo.
d) Era monoteísta.
e) Tornou-se a religião oficial do Brasil colonial.

3. Com relação ao candomblé, podemos afirmar que:


a) É uma religião africana.
b) Sempre foi tolerada pela Igreja católica e pelo Estado brasileiro.
c) Sofreu forte influência dos iorubas.
d) É uma religião monoteísta.
e) Foi criado no século XX como uma tentativa de “branquear” a umbanda.

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4 LUTAS E RESISTÊNCIAS

Caros(as) alunos(as), neste capítulo veremos os projetos de nação passavam sempre por ideais
que além da resistência cultural e religiosa, tam- de igualdade e liberdade. Justamente por isso, es-
bém temos a luta mais visível: as fugas, os quilom- sas lutas pela independência (Conjuração Baiana,
bos, os homicídios e os suicídios. Quando falamos Insurreição Pernambucana) geraram entre a elite
em quilombos, a primeira ideia que vem à mente uma grande preocupação com o potencial revo-
é o Quilombo de Palmares. De fato, tornou-se um lucionário das massas populares e, também, com
símbolo de resistência à escravidão, mas Palmares o choque racial/social. Dessa forma, a elite brasi-
não foi o único, existiram centenas de quilombos leira e portuguesa optou por uma independência
em várias partes do Brasil e em vários períodos da “negociada”. A independência brasileira (07 de se-
história. tembro de 1822) preservou a antiga ordem social,
manteve a escravidão e a estrutura fundiária.
Dicionário
Saiba mais
Os quilombos eram aldeamentos de negros fugi-
tivos, estes chamados de quilombolas
No século XVIII, apenas na região das
Minas, contabilizam-se quase duzentos
Palmares destacou-se pela sua grandiosida- quilombos. Cada quilombo possui sua
especificidade e número de integrantes,
de. Localizado na capitania de Pernambuco, che- podendo variar de uma dezena a mais
gou a contar com vinte mil habitantes. Surgiu por de mil indivíduos. As atividades desen-
volta do início do século XVII e durou até o início volvidas pelos quilombolas também
eram variadas: mineração, lavoura, caça.
do XVIII, quando foram definitivamente massacra- A própria relação com a “vizinhança” –
dos após um longo período de guerras. Em 20 de maior isolamento ou maior relaciona-
novembro de 1695, Zumbi – a principal liderança mento – também variava. Aliás, esse re-
lacionamento era vantajoso para todas
militar de Palmares – foi assassinado. Cabe desta- as partes (negros, comerciantes, contra-
car que Zumbi tornou-se um mito e símbolo da bandista etc.), por isso o governo sem-
resistência negra, mas não foi a única liderança pre tentou impedir essa relação.
importante, assim como Palmares não foi o único
quilombo.
Dessa maneira, devemos entender os qui-
lombos como forma importante de resistência ao
escravismo e, consequentemente, pensar o escra- Mesmo depois da independência, as mani-
vo como um sujeito histórico. festações de insatisfação popular continuaram,
evidenciando o descontentamento com esse Im-
Além disso, os negros – escravos ou forros
pério nascente. Uma trova (COSTA, 1973, p. 98-99)
(ex-escravos) – também se envolveram em ou-
de 1823 exemplifica essa situação e dá uma dimen-
tras revoltas mais amplas pela liberdade da colô-
são do medo de um choque social/racial:
nia. Essas revoltas de cunho mais popular sempre
evidenciavam as desigualdades raciais e sociais, e

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Marinheiros e caiados / todos devem se acabar Atenção


Porque só pardos e pretos / o País hão de habitar.
A situação de confronto entre escravos
e brancos, senhores ou não, continuou
se agravando e, desde o início do sécu-
Essa trova nos dá uma ideia do país que co- lo XIX, suscitando discussões acaloradas
meçava a ser construído em 1822. e teorias sobre o melhor caminho para a
sociedade brasileira. De forma geral, os
projetos passavam pela necessidade da
abolição da escravidão.

4.1 Resumo do Capítulo

Caros(as) alunos(as), neste capítulo tivemos a oportunidade de conhecer:

1. As diversas formas de lutas dos negros.

2. A importância dos quilombos na luta negra.

3. O choque racial que avançou ao longo do Império.

4.2 Atividades Propostas

Agora, vamos verificar a compreensão do capítulo respondendo às questões a seguir:

1. Com relação ao quilombo de Palmares podemos afirmar que:

a) Foi o único quilombo existente na região de Pernambuco, no século XVI, daí sua importân-
cia.
b) Suas principais lideranças foram Canga Zumba e Negro Cosme.
c) Ele não teve grande importância na luta negra contra a escravidão.
d) Ele se destacou pela sua grandiosidade, localizado na capitania de Pernambuco, chegou a
contar com mais de vinte mil habitantes.
e) Ele não representou, em nenhum momento, uma resistência ao sistema escravista.

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2. Sobre os quilombos, podemos afirmar que:

a) Eram agrupamentos de indígenas aprisionados para a catequese.


b) Existiram em pequena quantidade e não se constituíram como forma de luta contra a es-
cravidão.
c) Após a destruição do Quilombo de Palmares, em 20/11/1695, não surgiram novos quilom-
bos.
d) Não representaram, em nenhum momento, risco ao escravismo.
e) Cada quilombo possui sua especificidade e número de integrantes, podendo variar de uma
dezena a mais de mil indivíduos.

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5 O PROCESSO DE ABOLIÇÃO

Caros(as) alunos(as), agora que já entende-


Atenção
mos a escravidão e as lutas dos escravos, chegou
o momento de entendermos como esse sistema Dentro desse terceiro modelo explicati-
chegou ao seu final. vo, a afirmação – muito comum nos livros
Em 1850, o Tráfico Negreiro foi extinto pela didáticos – de que os negros receberam
da Lei Eusébio de Queiroz, dando a ideia que a um impulso inicial da elite branca e abo-
própria escravidão logo chegaria ao fim. Em 13 de licionista para se rebelarem e fugirem (na
década de 1880) é equivocada. Isso ocor-
maio de 1888, a Lei Áurea acabou com a escravi-
reu porque a historiografia não percebeu
dão no Brasil. Esse processo pode ser analisado de
as várias formas e possibilidades de resis-
várias formas: tência (vistas como desordem).

a) Em uma visão mais tradicional e em de-


Ainda dentro dessa terceira explicação, po-
suso, a abolição foi obra do caráter cari-
demos perceber nas décadas de 1860-70, na pro-
doso da Princesa Isabel, que já havia pro-
mulgado, em 1871, a Lei do Ventre Livre; víncia de São Paulo, um aumento considerável das
revoltas e assassinatos cometidos por escravos e
b) Questões econômicas, que passavam
diminuição das fugas. Segundo Azevedo (1987),
pela pressão britânica, com o objetivo
de criar um mercado consumidor para ocorreu, a partir de 1860, um aumento da reação
seus produtos, e pelo surgimento de negra nas fazendas e diminuição dos quilombos.
uma nova classe: a burguesia do café Entre os motivos podemos destacar:
no Oeste Paulista (tese defendida, com
poucas variações, por Fernando Henri- a) Abrandamento da punição a crimes: a
que Cardoso, Otavio Ianni, Celso Furtado partir de 1857, as galés perpétuas pas-
e Sérgio Buarque de Holanda). Essa bur-
saram a ter a pena máxima (ao invés da
guesia percebeu a falta de produtividade
pena de morte prevista pela Lei de 10 de
da mão de obra escrava e a possibilidade
julho de 1835);
de ampliação do mercado consumidor
interno para seus produtos. Dessa forma, b) A expansão das plantações de café di-
apoiou a abolição, financiando e partici- minuiu as matas e ampliou as vias de
pando do movimento abolicionista; comunicação, dificultando a criação de
c) Finalmente, uma nova produção histo- quilombos;
riográfica, sobretudo do final dos anos c) Negros recém-ingressos em São Paulo,
1980 (AZEVEDO, 1987; CHALHOUB, que não conheciam a região.
1990), mostra a forte participação dos
negros no processo de abolição, pressio-
nando, por meio de atitudes cotidianas – Dicionário
fugas, rebeliões, assassinatos –, as elites,
que, temerosas do acirramento do con- Galés perpétuas significa trabalhos forçados. O indi-
víduo tornava-se uma espécie de escravo público.
flito, optaram por uma saída honrosa: a
concessão da liberdade.
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Justamente esses negros recém-chegados preso a correr o risco de ser capturado e reescravi-
do nordeste açucareiro, em crise, foram aponta- zado pelo senhor. Ironia do destino: preso, porém
dos como os principais elementos envolvidos em liberto do cativeiro.
crimes. O “escravo mau, vindo do Norte” tornou-se
sinônimo de “negro violento”. Para o presidente da
província, em 1872, apenas o fim da escravidão po- Saiba mais
ria fim a essa barbárie.
Qualquer indivíduo corria o risco de ser ata- O crime poderia atingir qualquer pes-
cado por escravos fugitivos. Azevedo (1987) apre- soa, quando o intuito não se resumisse à
vingança. Essa situação contribuía para
senta vários relatórios policiais do período, nos o aumento da sensação de insegurança
quais se evidencia que as principais vítimas eram e da possibilidade de um “acerto final de
senhores e feitores, mas qualquer um podia tornar- contas” entre negros e brancos. Nesse
-se vítima da violência: sentido, a Lei Áurea, sem restrições – na
época aventou-se a hipótese de um pe-
ríodo de trabalho compulsório para os
Na fazenda de D. Maria Caetana de Olivei- negros libertos – foi a melhor forma de
ra, o escravo Venâncio assassinou o feitor evitar uma revolta ainda maior.
Boaventura Moreira da Silva, na noite de
18 de maio, e, no dia seguinte, apresentou-
-se na cadeia pedindo que o prendessem
porque tinha sido o autor de uma morte.
A divulgação do fato foi demorada por- De qualquer forma, é importante discutir
que o escravo assassinou o feitor quando a união dos vários fatores que levaram ao fim da
este dormia, mutilando-lhe o corpo com escravidão: econômicos, ação dos negros, fim do
golpes de enxada. (RELATÓRIO POLICIAL, tráfico, evolução dos costumes sociais e políticos
1874, grifo nosso).
etc., caso contrário, a libertação poderia ter ocor-
Devemos destacar que o escravo apresen- rido antes.
tou-se à polícia. Poderia ter fugido, mas preferiu ser

5.1 Resumo do Capítulo

Caros(as) alunos(as), neste capítulo discutimos as várias possibilidades de entendimento do pro-


cesso de abolição e a importância do debate historiográfico para o aprofundamento da análise.

5.2 Atividades Propostas

Agora, vamos realizar algumas atividades para verificarmos a compreensão do conteúdo:

1. A Lei Eusébio de Queiroz, de 1850, foi responsável pelo fim:


a) Da escravidão negra no Brasil.
b) Do tráfico negreiro para o Brasil.
c) Da escravidão indígena no Brasil.
d) Da catequese no Brasil.
e) Da dominação portuguesa sobre o Brasil.
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2. Segundo Célia Marinho Azevedo (1987) – em sua obra Onda Negra, Medo Branco –, o fim da
escravidão deve ser pensada, também, como consequência:
a) Da benevolência da Princesa Isabel, que promulgou a Lei Áurea em 13/05/1888.
b) Da necessidade de ampliar o mercado consumidor interno através da expansão do traba-
lho assalariado.
c) Da ação cotidiana dos negros.
d) Das pressões portuguesas contra o tráfico negreiro.
e) Do estabelecimento da escravidão indígena, mais lucrativa para os colonos.

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A IDEIA DE POVO: FORMAÇÃO E
6 PRECONCEITO

Caros(as) alunos(as), neste capítulo analisa- Da mesma forma que a abolição, o imigran-
remos um dos grandes problemas que ainda hoje tismo também foi percebido de formas diferentes:
preocupam o país, a questão do preconceito racial. pensando no aspecto econômico, o imigrantismo
Desde o início do século XIX, percebemos tinha como objetivo ampliar a produtividade da
uma grande preocupação com o povo brasileiro. terra. Em 1847, o Senador Vergueiro introduziu o
Durante o Império, a preocupação intensifica-se e, sistema de parceria: o colono era obrigado a ser-
ao final do século XIX, a História, a Sociologia e a vir por cinco anos e dividiam-se despesas, lucros
Literatura estão em busca do “verdadeiro” brasilei- e prejuízos. Esse sistema prendia o trabalhador ao
ro, que não era o português (colonizador e explo- seu senhor e gerou reações de países europeus.
rador), tampouco o negro (inferior, de acordo com
Posteriormente, criou-se o sistema de colonato em
as teorias da época). Para vários intelectuais, esse
que o imigrante recebia, também, um salário.
título pertencia aos índios, nada mais paradoxal,
uma vez que o índio é anterior ao Brasil. Por outro lado, autores como Azevedo
(1987), mostram que o imigrantismo esteve ligado,
Saiba mais também, a projetos de branqueamento da popula-
ção. Através da análise dos projetos abolicionistas/
Desde a década de 1820, surgem teorias integracionistas ou abolicionistas/imigrantistas,
para melhorar a “raça brasílica” – que seria fica evidente que uma parcela da elite buscava a
a mistura de europeus, negros e indígenas. eliminação do elemento negro. Dessa forma, o imi-
grantismo esteve ligado, também, a questões cul-
turais e ideológicas.
A maior preocupação da elite branca era com O índio por sua vez, vivia um momento de
a integração do negro à sociedade após a abolição idealização. Conforme já apresentamos, os nati-
(nível econômico/produtivo e social/costumes). vos passaram a sintetizar a essência do brasileiro e,
No imaginário da elite, criava-se a ideia – não de através da idealização, encontramos um brasileiro
todo errada – de um país com supremacia de uma forte, corajoso, leal, honesto. Isso contrastava com
minoria branca oprimindo a maioria negra, o que a sociedade real, corrompida e violenta. A explica-
gerava revoltas e atos de vingança. ção da degeneração social recaía sobre a mistura
racial, sobre o elemento negro, considerado infe-
Atenção rior, violento e degenerado pelas teorias científicas
do final do século XIX.
Dessa forma, todas as soluções – para evi-
tar o ódio racial – passavam pela busca A imprensa também contribuiu para a cria-
da ideia de nação e nacionalidade, que ção, divulgação e consolidação de várias teses
poderia superar o choque racial. Pensar- que sustentavam a inferioridade negra. Schwarcz
se “brasileiro”, antes de pensar-se “negro” (1987) resgata, com grande propriedade, a repre-
ou “pobre”, seria uma possibilidade de
evitar os enfrentamentos. Por outro lado, sentação dos negros nos jornais paulistanos no fi-
buscava-se, também, trazer imigrantes nal do século XIX. O negro era apresentado como
europeus para purificar a raça brasílica. violento, fruto da ira do negro contra o branco e de

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uma selvageria própria de indivíduos animalescos. Freyre derruba mitos como a superioridade da cul-
Apresentavam uma incapacidade genética de se tura europeia e mostra, pela primeira vez, o papel
cuidarem, tornando-se presas fáceis para os vícios. de negros e mulatos na história e na cultura brasi-
Além disso, eram vistos como degenerados, em leira. No entanto, também cria outros mitos, como,
função de suas “práticas bárbaras” como o samba por exemplo, a do “bom senhor”, da “docilidade”
e a capoeira – inclusive considerada crime pelo có- dos escravos e, principalmente, da “democracia
digo penal – que sempre acabavam em confusão e racial”.
mortes. Aliás, em todos os crimes nos quais o crimi-
noso era desconhecido, suspeitava-se de negros. A força, ou antes, a potencialidade da cul-
Ribeiro (2004, p. 451) aponta essa ideia – tura brasileira parece-nos residir toda na
riqueza de antagonismos equilibrados [...].
equivocada – que se manteve presente ao longo
Não que no brasileiro subsistam como no
do século XX: “Fala-se muito, também, da preguiça anglo-americano duas metades inimigas:
brasileira, atribuída tanto ao índio indolente, como a branca e a preta; o ex-senhor e o ex-
ao negro fujão e até às classes dominantes vicio- -escravo. De modo nenhum. Somos duas
sas.” Dessa forma, acaba ganhando corpo a ideia de metades confraternizantes que se vêm
mutuamente enriquecendo de valores e
melhoria da raça com o imigrantismo e também a
experiências diversas; quando nos com-
ideia de necessidade de montar um forte aparato pletarmos num todo não será com o sa-
repressivo para conter a violência e a vadiagem crifício de um elemento a outro. (FREYRE,
promovida pelo negro/pobre. 1987, p. 377).
Nesse mesmo sentido, também percebemos
uma tentativa de “melhorar” o indígena, no entan- Nesse trecho, percebemos a importância da
to isso não ocorreria através da miscigenação ra- miscigenação racial, que criou um novo povo, di-
cial, mas sim por meio de uma nova visão sobre os ferente e, em certa medida, melhor, pois vive em
nativos. Através, principalmente, da obra O Guarani harmonia com suas diferenças, as quais são inte-
– de José de Alencar, publicada, originalmente, em gradas.
folhetins em um jornal carioca –, percebemos uma
releitura do elemento indígena. O elemento central
do romance é Peri, um índio guarani forte, valente, Dicionário
corajoso, ou seja, virtuoso. Além disso, o romance
Democracia Racial traz a ideia de que, no Brasil,
de Peri com a jovem Ceci – filha de um fidalgo por- não existe preconceito racial, todos são iguais.
tuguês – representaria a união dos povos. Dessa Negros e brancos convivem dentro de uma certa
forma, teríamos um povo originário da união de ordem, com relativa proximidade.
uma espécie de nobreza portuguesa (fidalgo) com
o herói nativo, representado por Peri.
A grande questão que se coloca é debater
Somente no século XX, essas ideias de pure- se, efetivamente, vivemos em uma “democracia ra-
za racial, superioridade dos europeus e necessida- cial”, se o brasileiro se vê como um povo mestiço,
de de melhorar a “raça brasílica” começaram a ser e se não existe, entre nós, racismo e preconceito.
superadas. Especialmente após os estudos de Gil- Somos, de fato, “duas metades confraternizantes”?
berto Freyre, que resultaram na obra prima Casa-
-Grande & Senzala, publicada em 1933. Nessa obra,

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6.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a), neste capítulo analisamos:

a) O processo de formação do povo brasileiro.


b) O elemento negro na formação do povo brasileiro.
c) O elemento indígena na formação do povo brasileiro.
d) A ideia de “democracia racial”.

6.2 Atividades Propostas

Agora, devemos refletir um pouco sobre essas questões, analisando o texto a seguir e respondendo
conforme solicitado:

Para Sérgio Buarque de Holanda seriam características nossas, herdadas dos iberos, sobran-
ceira hispânica, o desleixo e a plasticidade lusitanas, bem como o espírito aventureiro e o apreço à
lealdade de uns e outros e, ainda, seu gosto maior pelo ócio do que pelo negócio. Da mistura de to-
dos esses ingredientes, resultaria uma certa frouxidão e anarquismo, a falta de coesão, a desordem,
a indisciplina e a indolência. Mas derivariam delas, também, certo pendor para o mandonismo,
para o autoritarismo e para a tirania [...].
Fala-se muito, também, da preguiça brasileira, atribuída tanto ao índio indolente, como ao
negro fujão e até às classes dominantes viciosas. Tudo isso é duvidoso demais frente ao fato do
que aqui se fez. E se fez muito, como a construção de toda uma civilização urbana nos séculos de
vida colonial, incomparavelmente mais pujante e mais brilhante do que aquilo que se verificou na
América do Norte, por exemplo. A questão que se põe é entender por que eles, tão pobres e atra-
sados, rezando em suas igrejas de tábua, sem destaque em qualquer área de criatividade cultural,
ascenderam plenamente à civilização industrial, enquanto nós mergulhávamos no atraso.
As causas desse descompasso devem ser buscadas em outras áreas. O ruim aqui, e efetivo
fator causal do atraso, é o modo de ordenação da sociedade, estruturada contra os interesses da
população, desde sempre sangrada para servir a desígnios alheios e opostos aos seus. Não há, nun-
ca houve, aqui um povo livre, regendo seu destino na busca de sua própria prosperidade. O que
houve e o que há é uma massa de trabalhadores explorada, humilhada e ofendida por uma minoria
dominante, espantosamente eficaz na formulação e manutenção de seu próprio projeto de pros-
peridade, sempre pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma da ordem social vigente.

Fonte: Ribeiro (2004).

1. De acordo com Darcy Ribeiro, o povo brasileiro não pode ser considerado inferior. No entan-
to, as teorias do século XIX afirmavam essa inferioridade. Produzam um texto – refletindo e
posicionando-se – sobre essas duas ideias.

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7 NEGROS E ÍNDIOS DO BRASIL ATUAL

Segundo dados da Funai, existem hoje no encerra. [...], mas o certo é que contrasta
Brasil cerca de 460 mil índios, distribuídos entre muito, e contrasta para melhor, com as
formas de preconceito propriamente ra-
225 sociedades indígenas. Além desses, estima-se
cial que conduzem ao apartheid. (RIBEIRO,
que existam pouco menos de 200 mil fora das ter- 2004, p. 225-226).
ras indígenas, inclusive em áreas urbanas. A maior
parte destes indígenas está em áreas mais afasta- De fato, percebemos que no Brasil existe a
das. possibilidade de “deixar de ser negro” através da
Os grupos que viviam no litoral, em especial ascensão social. Caetano Veloso, na música Haiti,
os Tupis, foram praticamente dizimados durante o diz “quase pretos de tão pobres”; poderíamos dizer,
processo de colonização. Hoje, muitos vivem em também, “quase brancos de tão ricos” aos negros
núcleos urbanos, completamente descaracteriza- que ascendem socialmente e passam a ser trata-
dos. Tornaram-se miseráveis como qualquer bra- dos como “brancos” pela sociedade.
sileiro. Paradoxalmente, foram integrados ao Brasil
por meio da pobreza e marginalidade.
Com relação à visão sobre os índios, perce- Atenção
bemos hoje um misto de tudo o que já foi pensado
No entanto, essa ideia não é um con-
no Brasil. Ora o índio é idealizado – como superior,
senso. Alguns autores, como Guimarães
puro, defensor da natureza –, ora é visto como um (1998), afirmam que a discriminação ra-
sujeito incapaz que ocupa grandes áreas sem nada cial no Brasil é camuflada, porque ten-
produzir, travando o desenvolvimento da região. demos a atribuir a pobreza dos negros à
discriminação de classe e isso nos levaria
No entanto, nas últimas décadas, percebe- a duas armadilhas:
mos uma ampliação de estudos sobre os indígenas
e maior preocupação do Estado com a sua preser- a) Perde-se a dimensão do conceito de
vação cultural e física, o que possibilitou cresci- classe;
mento demográfico nos últimos anos. b) Descarta-se o conceito de raça, mesmo
Com relação aos negros, também percebe- que a discriminação seja motivada por
mos velhos preconceitos e mitos escondidos sob questões raciais. Significa dizer que ne-
uma suposta “democracia racial”. gros pobres sofrem maior preconceito
do que apenas os pobres e, mais, a ori-
A característica distintiva do racismo bra- gem dessa pobreza estaria vinculada à
sileiro é que ele não incide sobre a origem cor do indivíduo.
racial das pessoas, mas sobre a cor de sua
pele [...]. Acresce que aqui se registra, tam-
bém, um branquização puramente social
ou cultural [...]. Essa situação não chega a
configurar uma democracia racial, como
quis Gilberto Freyre e muita gente mais,
tamanha é a carga de opressão, precon-
ceito e discriminação antinegro que ela

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Percebemos hoje uma ampla – e positiva – Aqueles que defendem as cotas argumen-
discussão sobre esses preconceitos, sobre o racis- tam que seria uma forma de compensar a explo-
mo e, até mesmo, sobre o conceito de raça. É co- ração e segregação histórica desses grupos; além
mum a utilização do conceito entre aspas (“raça”) disso, atingiria apenas uma parte do sistema uni-
para demonstrar seu caráter de construção social. versitário e, finalmente, o aproveitamento dos co-
No entanto, a ideia de raça é uma categoria indis- tistas não é inferior aos dos alunos que ingressaram
pensável para organizar a resistência antirracista. pelo sistema tradicional. Nesse sentido, já existem
Outro grande debate, presente na sociedade dados confiáveis, em especial referentes às univer-
civil neste início de século XXI, diz respeito aos pro- sidades estaduais do Rio de Janeiro, que utilizam o
jetos e programas de políticas compensatórias, ou sistema de cotas há vários anos.
seja, compensar negros e índios pela exploração O grupo contrário acredita que a ideia de
passada. Dentro desse debate, a discussão mais vi- raça está superada, que isso poderia levar a uma
sível diz respeito ao sistema de cotas raciais nas cisão da sociedade brasileira, efeito contrário do
universidades públicas. Existem duas visões dife- esperado. Além disso, o sistema de cotas não seria
rentes, dentro do próprio movimento negro e do sustentável; nesse sentido, seria mais interessante
debate acadêmico, sobre a Lei de Cotas e o Estatu- investir em uma educação universal de qualidade.
to da Igualdade Racial. De qualquer forma, incontestável é a atual
situação de marginalidade dos negros e índios no
Dicionário mercado de trabalho, na educação, sobretudo na
educação superior e na divisão de renda.
Sistema de Cotas, referido no Projeto de Lei nº
73/1999, Institui Sistema Especial de Reserva de
Saiba mais
Vagas para estudantes egressos de escolas públi-
cas, em especial negros e indígenas, nas institui-
ções públicas federais de educação superior. Quase 70% dos analfabetos são negros.

(IBGE, 2007)

Tabela 1 – Rendimento Real Médio no Trabalho Principal, por Sexo, segundo a Cor Região Metropoli-
tana de São Paulo – Ano 2000.
Rendimento e Jornada Total Homens Mulheres
Rendimento Médio (em R$) 878 1.051 652
Negros* 538 639 412
Não Negros** 1.033 1.236 765

Fonte: Seade-Dieese. Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED).


Legenda: *Negros: população preta e parda. **Não Negros: população branca e amarela.

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Cultura Afro-Indígena Brasileira

A Tabela 1 aponta para uma situação de infe- de inferioridade, continuam a ser discriminados no
rioridade dos negros no mercado de trabalho – e, presente. Dessa forma, quais seriam as perspecti-
em especial, das mulheres negras. De acordo com vas para o futuro?
os dados apresentados, o indivíduo negro recebe
em média pouco mais da metade do salário de um Nós brasileiros, nesse quadro, somos um
trabalhador branco. Dessa forma, podemos afirmar povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo
que, no mercado de trabalho, um branco equivale mestiço na carne e no espírito, já que aqui
a mestiçagem jamais foi crime ou pecado.
a dois negros, ou três negras.
Nela fomos feitos e ainda continuamos
nos fazendo. Essa massa de nativos oriun-
As estatísticas demonstram que não ape- dos da mestiçagem viveu por séculos sem
nas o ponto de partida é desvantajoso (a consciência de si, afundada na ninguen-
herança do passado), mas que, em cada dade. Assim foi até se definir como uma
estágio da competição social, na educa- nova identidade étnico-nacional, a de bra-
ção e no mercado de trabalho, somam-se sileiros. Um povo, até hoje, em ser, na dura
novas discriminações que aumentam tal busca de seu destino. Olhando-os, ouvin-
desvantagem. Ou seja, as estatísticas de- do-os, é fácil perceber que são, de fato,
monstram que a desvantagem dos negros uma nova romanidade, uma romanidade
não é apenas decorrente do passado, mas tardia mas melhor, porque lavada em san-
é ampliada no tempo presente, através de gue índio e sangue negro. (RIBEIRO, 2004,
discriminações. (GUIMARÃES, 1998, p. 67). p. 453).

Um mercado de trabalho discriminatório, Sociedade em (re)construção, povo em (re)


uma educação discriminatória (escolas com baixa construção, devemos pensar e discutir que futu-
qualidade dificultam o acesso ao ensino superior ro queremos. Esse debate passa pela escola, pela
público) e um processo de urbanização discrimina- educação, mas deve seguir adiante, em propostas,
tório (empurram pobres para áreas cada vez mais projetos e programas que, efetivamente, possam
periféricas) tornam os negros “escravos da escravi- reduzir a desigualdade social e racial que hoje im-
dão”. Ou seja, marcados pelo passado e pelas ideias pera.

7.1 Resumo do Capítulo

Caro(a) aluno(a), neste capítulo mostramos a situação de indígenas e, principalmente, de negros


no momento atual; isso é importante para termos uma ideia da necessidade da implantação de políticas
públicas para a redução da desigualdade racial e, também, social.
Além disso, este capítulo apresentou o debate atual sobre essas políticas, sobretudo a polêmica
sobre o sistema de cotas.

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7.2 Atividades Propostas

Agora vamos responder às questões a seguir para verificarmos a compreensão da discussão feita
no capítulo:

1. “As estatísticas demonstram que não apenas o ponto de partida é desvantajoso (a herança
do passado), mas que, em cada estágio da competição social, na educação e no mercado de
trabalho, somam-se novas discriminações que aumentam tal desvantagem. Ou seja, as esta-
tísticas demonstram que a desvantagem dos negros não é apenas decorrente do passado,
mas é ampliada no tempo presente, através de discriminações.” (GUIMARÃES, 1998). Segundo
esse trecho, podemos afirmar que:

a) O fim da escravidão encerrou a desigualdade racial e social no Brasil.


b) O processo de democratização da sociedade brasileira ampliou a discriminação racial no
Brasil.
c) O racismo e o preconceito foram difundidos pela imprensa.
d) A desigualdade não e fruto apenas do passado escravocrata, mas, também de discrimina-
ções do presente.
e) A “Democracia Racial” está, definitivamente, consolidada no Brasil.

2. Com relação ao atual mercado de trabalho, podemos afirmar que:


a) Não existe, como regra, a discriminação racial.
b) Homens negros recebem, em geral, um salário mais baixo que os homens brancos.
c) Existe discriminação racial, no entanto isso não se reflete nos salários.
d) Os homens negros apresentam, em média, rendimentos superiores aos homens brancos.
e) As estatísticas demonstram que os negros recebem salários semelhantes aos brancos.

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RESPOSTAS COMENTADAS DAS
ATIVIDADES PROPOSTAS

Capitulo 1
1. Caminha apresenta os nativos como seres puros, que seriam facilmente convertidos ao cris-
tianismo.
2. As condições eram péssimas, com jornadas de trabalho intensas, péssima alimentação e cas-
tigos físicos constantes.

Capítulo 2
1. d
2. a
3. c
4. d

Capítulo 3
1. a
2. c
3. c

Capítulo 4
1. d
2. e

Capítulo 5
1. b
2. b

Capítulo 6
1. A análise do capítulo e a compreensão do texto mostram que as teorias chamadas de cientí-
ficas, do século XIX, estavam carregadas de preconceitos, pois sustentavam a ideia de raças
superiores e raças inferiores. Temos que levar em consideração que existia a necessidade de
justificar a escravidão e a opressão dos negros e indígenas, além disso as elites não aceitavam
o negro, em especial, como um dos elementos formadores do povo brasileiro.

Capítulo 7
1. b
2. b
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