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A dimensão cognitiva do discurso teológico

Reflexões em diálogo com Jürgen Habermas


Congresso Internacional Habermas 80 Anos – João
Pessoa-PB – 2009
1
Júlio Paulo Tavares Zabatiero

Introdução

O objetivo da minha fala é dar continuidade a um diálogo com as teses de Jürgen


Habermas, iniciado há mais de década2, no qual busco concretizar o caráter
multidisciplinar e dialogal da teologia cristã, aprendendo com um dos principais
pensadores de nosso tempo. Meu foco não é o tema da religião no pensamento de
Habermas, mas o da teologia. Em 1988 Habermas, pela primeira vez, como ele mesmo
afirmou, respondeu a teólogos que dialogavam com suas teses e escritos. O texto que
ele preparou para esse colóquio com teólogos norte-americanos foi publicado no livro
fruto do Congresso3 e em duas outras coletâneas de textos habermasianos. A resposta de
Habermas aos teólogos reunidos no Congresso tem as marcas típicas dos textos
habermasianos: sensibilidade para ouvir seus interlocutores, familiaridade com o tema
sob discussão e argumentação sólida e ética, em que ele não se abstém de reconhecer
erros em seus próprios textos, mas também reafirmando sua visão teórica4.
Na sua resposta, porém, Habermas traz novamente à luz sua posição sobre os
limites da religião, já indicada em vários de seus textos anteriores, e aplica esses limites
ao discurso teológico. Apesar do esforço significativo em se familiarizar com as
discussões teológicas, porém, o texto deixa evidente que o esforço de Habermas em se
familiarizar com as discussões teológicas, embora significativo, não deu conta de
mapear adequadamente o território, de modo que em sua resposta ele deixou de levar
1
Professor-Pesquisador da Escola Superior de Teologia (EST-IEPG) e Coordenador de Pós-Graduação e
Pesquisa da Faculdade Unida de Vitória-ES.
2
Os primeiros textos publicados a partir desse diálogo foram quatro artigos na revista Práxis Teológica,
então editada por mim e Jorge H. Barro, como fruto dos grupos de pesquisa da Faculdade Teológica Sul-
Americana, em Londrina-PR, em parceria com a Editora Descoberta (Londrina-PR).
3
HABERMAS, Jürgen. “Transcendence from Within, Transcendence in the World”. In: BROWNING,
Don S. & FIORENZA, Francis S. (Eds.). Habermas, Modernity, and Public Theology. New York:
Crossroad, 1992, p. 226-250.
4
Em textos mais recentes, pode-se perceber as mudanças nas teses de Habermas em relação ao papel
público da religião (e, poderíamos acrescentar, da teologia). Como trato desses textos em outros ensaios,
neste restrinjo-me às teses habermasianas da época do Congresso.
em conta uma forma de fazer teologia bem menos afetada pelas críticas – corretas, a
meu ver – que ele teceu aos modelos teológicos que discutiu. Assim, minha fala se
moverá de uma síntese breve do texto de Habermas para o Congresso (1), para uma
reflexão sobre a dimensão cognitiva da moralidade (2), como analogia preparatória para
uma breve apresentação de modos pós-convencionais de fazer teologia (3), os quais não
foram notados por Habermas.

1. A teologia em “Transcendence from Within, Transcendence in the World”


Dadas as limitações de tempo, notarei apenas as teses mais significativas, sem
apresentar a argumentação a elas subjacente. Habermas valoriza os esforços de teólogos
“críticos” que tentam, segundo ele, traduzir os potenciais semânticos e motivacionais da
fé cristã para os tempos modernos. Ao realizar esse esforço, porém, teólogos devem se
precaver contra o perigo de que, no diálogo com as ciências humanas, a teologia perca
seu próprio estatuto, o qual, segundo ele, consiste “na natureza da referência ao discurso
conduzido dentro de cada comunidade religiosa específica”.5 Essa breve descrição é
apropriada, mas acarreta um peso insustentável para a teologia – como o discurso
religioso é pré-moderno, totalizante e metafísico, a teologia está limitada a esse estatuto.
Se teólogos se apropriarem desses conteúdos semânticos na forma da tradução
secularizante, como o deve fazer a filosofia, a teologia perderá sua identidade, posto que
ela não pode se desvencilhar do peso dogmático da experiência religiosa. Destarte, a
teologia ficará delimitada pelo peso dessa experiência comunitária, ou, se tornará
inócua, pois, nas palavras de Habermas, “a teologia não apresentou perigo para a fé da
comunidade na medida em que usou os conceitos básicos da metafísica”.6
Tal condição da teologia perante a comunidade religiosa, nos tempos modernos,
a deixa apenas com três alternativas: (a) seguir o “caminho protestante”, personificado
em autores como Kierkegaard e Barth, que apela para o querigma e a fé da comunidade
como a fonte do insight religioso “absolutamente independente da razão”7, (b) “ou
escolher o caminho do „catolicismo iluminado‟ que abre mão do estatuto de discurso

5
HABERMAS, Jürgen, op. cit., p. 231.
6
Ibidem, p. 234.
7
Não creio que tal descrição faça justiça às críticas de Barth e Kierkegaard ao uso da filosofia por
teólogos sistemáticos de suas respectivas épocas. Nenhum dos dois propôs formas de teologia que
abdicassem da razão, mas, sim, cada um deles procurou, a seu próprio estilo e modo de pensar, libertar as
fontes do fazer teológico do domínio de conceitos e sistemas filosóficos presentes, segundo eles, em obras
teológicas de seu tempo.
especial e expõe suas asserções ao amplo espectro da discussão científica”8, e (c) “o
terceiro caminho, porém, é caracterizado pelo que tenho chamado de „ateísmo
metodológico‟. É uma via que conduz a um programa de desmitização que equivale a
um experimento. Sem reservas, é entregue a esse experimento verificar se a
interpretação teológica (não de uma ciência das religiões) dos discursos religiosos, por
força de sua própria argumentação, permite uma entrada na discussão científica de tal
modo que o jogo de linguagem religioso permaneça intacto, ou entre em colapso”.9
Em relação ao primeiro caminho, Habermas se cala, posto que para ele o mero
refúgio no protegido espaço sagrado do querigma e da fé não pode ser um caminho
viável. Nisso ele tem razão, porém, ao denominar tal caminho como o protestante, ele
indica seu desconhecimento das discussões amplas na teologia protestante – e também
no catolicismo e ortodoxia – que apontam os limites desse caminho e oferecem
alternativas significativas de discurso teológico que se refere intrinsecamente à
comunidade de fé e dialoga amplamente com as ciências humanas e naturais. É esse
caminho que Habermas não notou que retomarei ao final de minha fala.
Quanto ao segundo caminho, embora ele mesmo reconheça que teólogos
católicos não se sentirão à vontade com a denominação de catolicismo iluminado,
Habermas o critica, pois, na prática dialogal, apresenta-se como um discurso
apologético: “de modo consistente com isso, meus parceiros teológicos de diálogo,
portanto, escolheram o procedimento indireto de uma argumentação apologética e
tentam encurralar o oponente secular mediante uma crítica imanente tal que o oponente
não pode encontrar um modo de escapar das aporias demonstradas apenas ao custo de
aceitar as afirmações defendidas teologicamente”.10 Com relação à crítica habermasiana
ao modo apologético de teologizar, também penso que Habermas tem razão. Sem
generalizar o seu comentário para a teologia católica como um todo, que é tão plural
quanto a protestante, de fato a teologia não pode entrar no diálogo acadêmico com
argumentação apologética de cunho metafísico, posto que tal modo argumentativo já
fecha as portas para um possível aprendizado mútuo.
Quanto ao terceiro caminho, Habermas, corretamente, demonstra que a adoção
de um ateísmo metodológico por teólogos inevitavelmente retirará do discurso teológico

8
Também não vejo como essa descrição se aplique ao modo de teologia católico iluminado descrito por
Habermas, que não “abre mão” do caráter propriamente confessional do discurso teológico ao dialogar
com outras formas de saber.
9
Todas as citações vêm de ibidem, p. 235.
10
Ibidem, p. 236.
aquilo que lhe é próprio.11 Não há qualquer sentido em fazer da teologia um discurso
“secular”, nesse caso, ela simplesmente deveria ser abandonada, substituída pelos
discursos científicos relevantes, ou transformada em filosofia da religião, ciências da
religião, ou algo similar, mas sempre ao custo de perder sua especificidade como
discurso teológico.
Após essas considerações Habermas reafirma a sua posição relativa aos limites
da linguagem religiosa: “Repito minha posição: na medida em que a linguagem
religiosa possui, de fato, conteúdos inspiradores e semânticos aos quais não deve
renunciar, que escapam (por ora?) ao poder expressivo de uma linguagem filosófica e
ainda aguardam tradução em um discurso que dê razões de sua posições, a filosofia,
mesmo em sua forma pós-metafísica, não será capaz de substituir, nem de reprimir a
religião”.12
A posição reafirmada nega, claramente, à linguagem religiosa uma dimensão
cognitiva, reduzindo-a (e à teologia juntamente), ao campo da linguagem pré-discursiva
e motivacional, meramente portadora de potencial semântico à espera de tradução
secularizadora. Habermas, em textos mais recentes, abandonou tal posição, de modo
que encerro aqui a breve descrição do ensaio sob análise. Tal descrição serve-me como
motivação para, dentro dos parâmetros do modo habermasiano de discutir, defender que
o discurso teológico, sem abrir mão de sua especificidade (vínculo a um querigma e a
uma comunidade de fé)13, possui, sim, dimensão cognitiva, independentemente de
tradução secularizadora. Pretendo mostrar que, dentro dos padrões do pensamento
habermasiano, o discurso moral – considerado por Habermas como possuidor de
dimensão cognitiva –, possui características tais que pode servir de analogia ao
discurso teológico de modo que a dimensão cognitiva deste seja reconhecida,
analogicamente à do discurso moral.14

11
Ibidem, p. 235-236.
12
Ibidem, p. 237, em que Habermas cita um de seus textos em Nachmetaphysiches Denken.
13
Os termos em itálico são próprios à tradição cristã, e os usei em referência ao texto discutido de
Habermas. Isto não significa que discursos teológicos não cristãos devam ser classificados como não-
cognitivos.
14
Insisto na qualificação “dentro dos limites do pensamento habermasiano” por que, fora desses limites,
por exemplo, dentro dos limites do pensamento rortyano, não é preciso restringir a analogia ao discurso
moral, posto que nenhum tipo de discurso corresponde ao que é real que lhe outorgaria um caráter
epistêmico-cognitivo garantido pela realidade ou pela literalidade de suas proposições: “Esse termo
[verdade literal] remonta à má idéia kantiana de que o discurso sobre objetos físicos é o caso
paradigmático do discurso que realiza alegações de verdade e que todas as outras áreas de discurso devem
ser pensadas como não-cognitivas”. RORTY, Richard. “Cultural politics and the question of the existence
of God”. In: Philosophy as Cultural Politics. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, p. 22. Se
seguirmos os termos de Brandom na discussão da racionalidade (e dimensão cognitiva do discurso), esta
2. A dimensão cognitiva do discurso moral15
Para Habermas, possuir dimensão cognitiva significa que um conteúdo é
passível de justificação por razões. Tendo em vista que o discurso moral tem sido
descrito em tons não cognitivistas, Habermas se engaja em debate com outros teoristas
morais a fim de demonstrar que uma ética do discurso se funda sobre uma moralidade
entendida sob a égide do cognitivismo forte.16 A peculiaridade do discurso moral, em
relação ao científico, segundo Habermas, é que o moral possui não só conteúdo, mas
também envolve aplicação de modo a coordenar a ação humana em sociedade. O
cognitivismo forte defendido por Habermas se situa na tradição kantiana, na qual “a
teoria moral funda a possibilidade de justificação moral ao reconstruir o ponto de vista
que membros de sociedades pós-tradicionais intuitivamente adotam quando acham que
devem apelar a razões para justificar normas morais problemáticas. Mas em contraste
com as variedades empiricistas do contratualismo, esta visão mantém que essas razões
não são concebidas como motivos relativos-a-agentes, deixando, assim, intacto, o
núcleo epistêmico da validade moral”.17
Tal peculiaridade corresponde ao fato de que o discurso moral não se refere ao
mundo objetivo, mas ao social (e não ao subjetivo, que é objeto do discurso ético-
identitário). Aqui encontramos uma interessante tensão no texto habermasiano, posto
que, ao mesmo tempo em que condena a redução da razão ao seu aspecto instrumental,
este é, de certo modo, o padrão para a totalidade plural da racionalidade. Por isso,
Habermas pode afirmar que o problema ao qual a validade do discurso moral se
submete nas sociedades pós-tradicionais ocorre pelo fato de que, “graças à
desvalorização da autoridade epistêmica do „ponto-de-vista de Deus‟, os mandamentos
morais perdem seu fundamento religioso e também o metafísico. Este desenvolvimento
também tem implicações para a ética do discurso: ela não pode defender os conteúdos

seria propriedade exclusiva da inferenciação e não da validade do conteúdo específico de cada discurso
que, mesmo sendo racional-cognitivo, não é necessariamente correto ou verdadeiro. (Ver, por exemplo, a
recente síntese do próprio Brandom às suas discussões sobre a inferência, em Reason in Philosophy.
Animating Ideas. Cambridge: The Belknapp Press, 2009.
15
Restringirei minhas citações, por questões de tempo, a HABERMAS, Jürgen. “A Genealogical
Analysis of the Cognitive Content of Morality”. In: CRONIN, Ciaran & DeGREIFF, Pablo (Eds.). The
Inclusion of the Other. Studies in Political Theory. Cambridge: The MIT Press, p. 3-46. Uma visão mais
completa deveria tomar em consideração os textos mais antigos desde a coletânea publicada com o título
“Consciência Moral e Ação Comunicativa”.
16
Para não ultrapassar o tempo previsto, não sintetizo a discussão de Habermas com as outras três
posições que ele menciona no artigo.
17
Op. cit. (nota 11), p. 7. Nisto Brandom se distancia de Habermas, pois em sua reconstrução do
pragmatismo kantiano, ele refere a racionalidade simultaneamente ao discurso relativo-a-objetos e
relativo-a-agentes (op. cit., p. 27-51)
morais plenos das intuições religiosas (1), nem pode representar a validade das normas
morais em termos realistas (2)”.18
Não sendo um discurso realista, o discurso moral sofre de uma espécie de déficit
de racionalidade em comparação com o científico, posto que não pode contar com a
objetividade derivada do mundo objetivo pesquisado pelo cientista, mas deve contar
com um tipo de objetividade constituído como inter-subjetividade. Como fruto da
condição moderna, pós-metafísica e pós-religiosa, “de um lado, o conhecimento moral é
desacoplado da motivação moral e, de outro, o conceito de ação moralmente correta é
diferenciado da concepção de uma vida boa ou piedosa”.19 Por isso, a validação do
discurso moral deve ser feita de acordo com os parâmetros racionais da ética do
discurso, atendendo aos princípios U e D que regulam a argumentação comunicativa,
não-estratégica – e outorgam dimensão cognitiva ao discurso moral proveniente do
mundo-da-vida. O discurso moral validável também levar em consideração que é
preciso, também, performar discursos de aplicação, aos quais se agrega o postulado da
sensibilidade contextual para a concretização de normas morais universalmente válidas.
Assim, embora o discurso moral não se beneficie da objetividade do mundo pesquisado
pela ciência, seu caráter cognitivo é determinado pela argumentação inter-subjetiva
fundada sobre o mundo social (mundo-da-vida), mas realizada de forma não intuitiva e,
sim, discursiva.
Encero aqui minha brevíssima descrição da dimensão cognitiva do discurso
moral, posto que ela é suficiente para introduzir o meu tópico principal, a seguir.

3. A dimensão cognitiva do discurso teológico


Defendo que o discurso teológico possui estatuto similar ao do discurso moral. A
similaridade se dá pelo fato de que ambos não são discursos referentes ao mundo
objetivo, mas ao social, incorporam aspectos afetivos e são normativos. Visto dessa
forma, em analogia com o discurso moral, o discurso teológico pode ser reconhecido
como possuidor de dimensão cognitiva que pode ser descrita com razões – o que farei
com brevidade.
O discurso teológico é passível de justificação com base em razões, de modo
similar ao moral, posto que ele apela não ao mundo objetivo empírico, mas ao mundo-
da-vida como seu referente. Ora, se vale para o discurso moral que esse apelo mantém

18
Ibidem, p. 34.
19
Ibidem, p.34.
intacto seu núcleo epistêmico, também o deve valer para o teológico, com a provisão de
que o discurso teológico também se limite à condição de que não pode representar a sua
validade em termos realistas. Com esta provisão em mente, o discurso teológico não
precisa perder sua referência à experiência e linguagem religiosa da comunidade
específica de fé a que pertence. Deve, porém, reconhecer a contextualidade da
experiência e linguagem religiosa de sua comunidade e sua correspondente
problematicidade em termos de universalização. O caráter cognitivo do discurso
teológico não implica em que ele seja verdadeiro para todos os mundos-da-vida, apenas
que ele é racional e universalizável argumentativamente.
Para muitos leitores de Habermas e, provavelmente também para ele, tal
reconhecimento remontaria à descaracterização da própria religião, posto que esta seria,
por natureza, uma forma dogmática de experiência, presa a uma verdade absoluta
revelada por um Deus extra-mundano. Ora, tal descrição da religião não faz justiça ao
fenômeno religioso em sua amplitude, nem mesmo às religiões monoteístas abraâmicas
a partir das quais ela é elaborada. Em primeiro lugar, o apelo à revelação epistêmica não
é universal nas práticas religiosas. Em segundo, conceber a revelação do Deus judaico-
cristão e do islâmico como uma oferta proposicional de verdades só faz justiça aos
modos fundamentalistas dessas religiões, e reduz a muito mais ampla experiência e fé
dessas religiões, com suas várias formas particulares, à sua caricatura terrível – o
fundamentalismo.
Em texto mais recente, Habermas se aproxima dessa percepção ao afirmar que
nas religiões:
na medida em que consigam evitar o dogmatismo e a coerção sobre as
consciências, permanece intacto algo que se perdeu em outros lugares
e que tampouco pode ser reproduzido apenas com o saber profissional
de especialistas: refiro-me aqui às possibilidades de expressão e a
sensibilidade suficientemente diferenciadas para falar da vida
malograda, das patologias sociais, dos fracassos dos projetos
individuais e da deformação dos contextos de vida desfigurados. A
partir da assimetria das pretensões epistêmicas, deve-se fundamentar
uma disposição de aprendizado da filosofia em relação à religião, e
não por razões funcionais, mas – recordando seus bem-sucedidos
processos hegelianos de aprendizado – por razões de conteúdo.20

20 HABERMAS, Jürgen. “Fundamentos prepolíticos del estado democrático de derecho?”. In: Entre
naturalismo y religión. Barcelona: Paidós, 2006, p. 116. Note-se o preconceito moderno contra o
conhecimento religioso presente na frase “a partir da assimetria das pretensões epistémicas”.
Voltando a atenção à teologia, há diversas manifestações de discurso teológico
que dão testemunho exatamente desse tipo de práticas religiosas. Tais manifestações,
além de tornar públicas experiências religiosas que corporificam valores morais
elevados, também deixam claro que a religião, diferentemente da moralidade, não sofre
da desvinculação entre obrigação e motivação, mas as articula significativamente. Tais
discursos, e posso apenas mencioná-los, vêm do movimento ecumênico que já tem mais
de 50 anos; vêm das teologias contextuais dos anos 1980 em diante: teologia negra,
teologia da libertação, teologia feminista, teologias asiáticas e outras; vêm, por fim, da
nova onda de teologias pluralistas pós-metafísicas cujo apelo universalizador se dá pelo
reconhecimento da contextualidade da confissão própria que se abre para o aprendizado
de outras religiões e cosmovisões, como fruto de amplos processos de diálogo inter-
religioso que têm ocorrido em âmbito global. Tais teologias são capazes de discursivizar
“possibilidades de expressão e a sensibilidade suficientemente diferenciadas para falar
da vida malograda, das patologias sociais, dos fracassos dos projetos individuais e da
deformação dos contextos de vida desfigurados” e, ao fazê-lo, de se apresentar ao
debate comunicativo como mais uma voz parceira, e não como voz dogmática e
determinante (o que é próprio dos fundamentalismos e partidarismos que existem aos
montes em nosso tempo).
Este tipo de discursos teológicos reafirma a validade da convicção habermasiana
de que a filosofia não pode substituir nem reprimir a religião (e que a religião e a
teologia não devem, reciprocamente, substituir ou reprimir a filosofia). A esse tipo
emancipador de teologia se deve ouvir e é a experiência de fé e reflexão de
comunidades que sustentam esse tipo de teologia que precisa ser apoiada por pessoas
não-religiosas, seculares, sob pena de que nossas sociedades democráticas sucumbam ao
fundamentalismo do pensamento único que só amplia sua legitimidade espúria com o
apoio do fundamentalismo religioso.

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