Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
1 Departamento de Medicina Abstract The subject of this paper is changes in health care when “user embracement” is used
Preventiva e Social,
as a strategic aim. According to the “user embracement” concept, health care clients are the cen-
Faculdade de Ciências
Médicas, Universidade ter of the health services’ organization, including the following: 1) care for everyone seeking it,
Estadual de Campinas. thus guaranteeing universal accessibility; 2) reorganization of the work process, such that its
Cidade Universitária
central thrust is shifted from the physician to the multiprofessional staff, or “user embracement
Zeferino Vaz, Campinas, SP
13083-970 Brasil. team”, in charge of “hearing” users and becoming involved in solving their health problems; and
* Falecido 3) solidarity, humanity, and citizenship as parameters for the relationship between health care
users and providers. The research showed improvement of non-medical health care productivity
and greater accessibility by users. After nine months, the “user embracement team” solved 50% of
the health problems themselves. The above-mentioned effects were also linked to workers’ moti-
vation, leading to greater creativity in the work process.
Key words Program Evaluation; Medical Care; Ambulatory Care; Community Health Services
Resumo Este trabalho relata experiência de inversão do modelo tecno-assistencial para a saú-
de, tendo como base a diretriz operacional do acolhimento. O acolhimento propõe que o serviço
de saúde seja organizado, de forma usuário-centrada, partindo dos seguintes princípios: 1) aten-
der a todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, garantindo a acessibilidade universal;
2) reorganizar o processo de trabalho, a fim de que este desloque seu eixo central do médico para
uma equipe multiprofissional – equipe de acolhimento –, que se encarrega da escuta do usuário,
comprometendo-se a resolver seu problema de saúde; e 3) qualificar a relação trabalhador-usuá-
rio, que deve dar-se por parâmetros humanitários, de solidariedade e cidadania. Por meio da in-
vestigação realizada, foi possível observar um aumento significativo do rendimento profissio-
nal, dos servidores não-médicos, que passaram a atuar na assistência; esse elevado rendimento
profissional determinou, por conseqüência, maior oferta e aumento extraordinário da acessibi-
lidade aos serviços de saúde.
Palavras-chave Avaliação de Programas; Assistência Médica; Assistência Ambulatorial; Ser-
viços de Saúde Comunitários
direção, quais sejam, o Grupo de Direção Es- semana anterior à data prevista, quando o Con-
tratégica – GDE (que reunia a Secretária de selho procurou avisar à comunidade o novo
Saúde e os gerentes dos projetos estratégicos) funcionamento da Unidade de Saúde.
e o Colegiado Gestor (formado pelo GDE e to-
dos os gerentes de Unidades de Saúde). Essa O processo de trabalho no acolhimento
decisão partia de alguns pressupostos básicos,
como: O acolhimento modifica radicalmente o pro-
1) A maioria das pessoas que necessitavam cesso de trabalho. O impacto da reorganização
de atendimento em saúde estavam excluídas do trabalho na Unidade se dá principalmente
dos serviços, daí a grande desconfiança e, até sobre os profissionais não-médicos que fazem
mesmo, opinião negativa que os usuários têm a assistência. No caso da UBS Rosa Capuche,
dos serviços de saúde. consideram-se a enfermeira, a assistente so-
2) As pessoas que procuravam a Unidade de cial, a técnica e a auxiliar de enfermagem. Na
Saúde faziam-no, majoritariamente, em busca atual situação, a equipe de acolhimento passa
da consulta médica, estrangulando completa- a ser o centro da atividade no atendimento aos
mente este serviço. Por outro lado, um grande usuários. Os profissionais não-médicos pas-
número dessas mesmas pessoas não necessita- sam a usar todo seu arsenal tecnológico, o co-
va da consulta, mesmo que essa fosse sua de- nhecimento para a assistência, na escuta e so-
manda individual. lução de problemas de saúde trazidos pela po-
3) O trabalho na Unidade de Saúde era cen- pulação usuária dos serviços da Unidade.
trado na pessoa e no saber médico, ficando os A enfermeira, além de acolher, garante a re-
outros profissionais subestimados no processo taguarda do atendimento realizado pelas auxi-
de trabalho, tendo o seu potencial para a assis- liares de enfermagem. Contribuem nesse pro-
tência enormemente oprimido, reduzindo a cesso os protocolos, que orientam sobre os
oferta de serviços. procedimentos a serem adotados pela equipe
4) A relação trabalhador-usuário sofria de de acolhimento. Na UBS Rosa Capuche, por
crônica degeneração, causada pela alienação exemplo, os protocolos orientam o enfermeiro
dos trabalhadores do seu processo de trabalho, na prescrição de vários exames e medicamen-
ou seja, este se realizava compartimentado, tos, o que aumenta em grande medida a reso-
com os procedimentos sem a necessária inte- lubilidade deste profissional na assistência, fa-
gração multidisciplinar. O objeto de trabalho vorecendo enormemente o fluxo dos usuários.
‘problema de saúde’ recebia, dessa forma, um No modelo anterior, por a assistência estar
tratamento sumário e burocrático, numa rela- centrada no médico, o enfermeiro não realiza-
ção impessoal com o usuário. O mais comum va todo o seu potencial técnico, reduzindo sua
mesmo era a sua exclusão. No entanto, os tra- capacidade de intervenção. Em estudo compa-
balhadores, embora conscientes dos proble- rando este novo modelo com o do período an-
mas, sentiam-se impotentes para mudar aque- terior ao acolhimento, os dados de rendimento
la situação existente, lamentada por eles pró- mostram que seu rendimento agora é aumen-
prios. O contexto sugeria, então, aparente con- tado em 600%.
tradição de interesses entre trabalhadores e Esse novo papel da enfermagem na Unida-
usuários dos serviços de saúde. de de Saúde, com acolhimento, não se deu sem
A partir da decisão de implantar o acolhi- tensões. Subjacente a este processo está a dis-
mento, e sob a permanente coordenação da puta pela supremacia do saber e do poder no
gerente da UBS, definiu-se pela organização de serviço de saúde, até então, monopólio médi-
uma equipe de acolhimento, composta pelos co. Como parte desse polêmico processo, regis-
profissionais de nível superior, por uma técni- tram-se pressões da Câmara de Vereadores con-
ca e auxiliares de enfermagem, para oferecer a tra o atendimento realizado pela enfermeira.
escuta dos usuários. Os médicos ficaram na re- Foi importante também um concorrido debate
taguarda, ou seja, atendendo nos consultórios sobre o acolhimento, promovido pelo Sindica-
os usuários encaminhados pela equipe de aco- to dos Médicos de Minas Gerais, que contou
lhimento. Eliminaram-se a ficha e a fila de ma- com o relato de diferentes experiências de sua
drugada, abrindo-se as portas da Unidade de implantação.
Saúde, com atendimento a todos os usuários É importante registrar que, além de utili-
que a procurassem. Organizou-se a sala de es- zar todo seu arsenal técnico, a enfermeira, com
pera, substituindo a recepção. a reorganização do processo de trabalho, vê-se
O Conselho Local de Saúde teve um papel dotada de maior autonomia na função que
importante para a implantação do acolhimen- exerce. Essa autonomia deve ser entendida dia-
to. Isso se deu, principalmente, no período da leticamente como a condição que o profissio-
Figura 1
Rendimento dos profissionais de nível superior, da Unidade Básica de Saúde Rosa Capuche, por período de um ano,
antes e após o Acolhimento.
3
rendimento 95
2,5 rendimento 96
1,5
1
rendimento
0,5
0
clínica médica pediatria ginecologia/obstetrícia consulta de assistência social especialidades
enfermagem
Figura 2
Distribuição dos problemas de saúde que se apresentaram à equipe de acolhimento da Unidade Básica de Saúde
Rosa Capuche, segundo a resolubilidade e encaminhamentos adotados, apresentados em freqüência relativa,
por períodos mensais.
80
resolvido pela equipe
de acolhimento
70
resolubilidade da equipe de acolhimento (%)
marcado atendimento
para outro setor da unidade
60
referenciado para rede SUS
50
não anotado
40
30
20
10
0
mar/96 abr/96 mai/96 jun/96 jul/96 ago/96 set/96 out/96 nov/96 dez/96 jan/97 fev/97
nômica, epidemiológica local, bem como com Essas diretrizes gerais fazem parte da mais
as necessidades dos usuários da região. Este recente experiência de organização de serviços
trabalho deve ser executado por uma equipe, de saúde, alinhados à perspectiva de efetiva
auto-intitulada Equipe de Saúde Pública, for- construção de um sistema de saúde com base
mada especificamente com esse objetivo, po- no acesso para todos, eqüidade, integralidade
dendo atuar vinculada a uma ou a várias uni- das ações, eficácia, com atendimento de quali-
dades de uma mesma região da cidade. dade e humanizado e sob controle social.
Referências
BAREMBLIT, G., 1992. Compêndio de Análise Institu- MERHY, E. E., 1997a. Em busca do tempo perdido: a
cional e Outras Correntes. Rio de Janeiro: Editora micropolítica do trabalho vivo em saúde. In: Agir
Rosa dos Tempos. em Saúde. Um Desafio para o Público (E. E. Merhy
CAMPOS, G. W. S., 1997. Subjetividade e adminis- & R. Onocko, org.), pp. 71-112, São Paulo: Editora
tração de pessoal. In: Agir em Saúde. Um Desafio Hucitec.
para o Público (E. E. Merhy & R. Onocko, org.), MERHY, E. E., 1997b. A rede básica como uma cons-
pp. 229-266, São Paulo: Editora Hucitec. trução da saúde pública e seus dilemas. In: Agir
FRANCO, T. B., 1997. Acolhimento: Diretriz do Modelo em Saúde. Um Desafio para o Público (E. E. Merhy
Tecno-Assistencial em Defesa da Vida. Trabalho & R. Onocko, org.), pp. 197-228, São Paulo: Edito-
apresentado à Rede de Investigação em Sistemas ra Hucitec.
e Serviços de Saúde do Cone Sul, Fundação Os-
waldo Cruz. (mimeo.)