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Pode-se dizer que, de certa forma, a regência é tão antiga quanto o homem. Por
exemplo, se você observar duas crianças brincando, notará que uma delas assumirá o
papel de liderança, organizando a brincadeira com as ferramentas que dispõe.
Na igreja cristã, a pessoa que cumpria essa função utilizava também uma espécie de
bastão para exercer a liderança.
Quando a música se tornou mais ritmicamente desenvolvida, o bastão começou a ser movido
para cima e para baixo para indicar o tempo, agindo como uma forma inicial de "batuta".
Outros dispositivos para indicar o tempo entraram em uso nesse período. Folhas de
papel enroladas, varas menores e mãos sem adornos podem ser vistas em imagens da
época.
Era comum também o cravista (tecladista) reger a partir de seu instrumento. Essa prática
era especialmente eficiente, pois, em geral, o cravista era o compositor e executava em
seu instrumento uma "reprodução" das partes dos outros instrumentos, além do
chamado baixo contínuo.
Execuções de óperas podiam contar com dois regentes: o cravista, que era responsável
pelos cantores, e o principal violinista, que se encarregava da orquestra.
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O filme Le Roi Danse, do diretor belga Gérard Corbieau, foi baseado na biografia de
Jean-Baptiste Lully, compositor do séc. XVII. Em um dos trechos, ele mostra por que
acredita-se que o bastão foi responsável pela morte de Lully.
Essa infecção evoluiu para uma gangrena, mas Lully recusou a amputação. A gangrena
se espalhou para sua perna e ele morreu cerca de dois meses mais tarde, em 22 de março
de 1687.
Século XIX
No início desse período, a estrutura musical já estava bastante complexa e o tamanho
dos grupos musicais se tornava maior.
Com isso, cada vez mais, fazia-se necessário um regente que cumprisse apenas a função
de reger os músicos.
Para isso, esse profissional necessitava de maior preparo quanto às obras que se
dispunha a reger.
O regente assume, então, o papel de líder da interpretação musical. Passa a ser o
"tradutor” das ideias dos compositores. Estabelece-se também, de forma mais clara, o
seu papel na estrutura dos rituais de ensaios e concertos.
Entre os primeiros regentes notáveis, estavam Louis Spohr (1784-1859), Carl Maria
von Weber (1786-1826), Louis-Antoine Jullien (1812-1860) e Felix Mendelssohn
Bartholdy (1809-1847), todos compositores.
Com o aumento do tamanho dos grupos, popularizou-se também o uso da batuta, pois
esse instrumento era mais visível para a orquestra do que as mãos ou um pedaço de
papel enrolado. Acredita-se que Mendelssohn foi o primeiro a utilizar a batuta tal qual a
conhecemos hoje.
Foi no século XIX que se tornou muito comum os regentes viajarem para dirigir
orquestras e grupos de outros países e diferentes culturas. Essa foi uma das principais
razões que motivaram a padronização de alguns aspectos da regência.
Essas padronizações ocorreram no aspecto "gestual“, convencionando a forma de
regência dos vários compassos, e nos rituais de ensaio com a afinação da orquestra.
Com variações eventuais, essas padronizações foram aceitas pela comunidade musical
por facilitarem o entendimento entre regentes e músicos, o que tornou o trabalho de
preparação musical mais ágil.
Hans von Bülow (1830-1894) foi particularmente aclamado como maestro. Ele elevou
os padrões técnicos de regência a um nível sem precedentes, por meio de inovações,
como ensaios separados e detalhados de diferentes seções da orquestra (ensaio
seccional). Em seu posto, como chefe da Ópera Estadual da Baviera, Orquestra de
Meiningen e Filarmônica de Berlim, ele trouxe um nível de nuance e sutileza para a
performance orquestral anteriormente ouvida apenas na música instrumental solo.
Com isso, inspirou jovens artistas, como Richard Strauss, que, aos 20 anos, trabalhou
como seu assistente, e Felix Weingartner, que veio a desaprovar suas interpretações,
mas ficou profundamente impressionado com seus padrões orquestrais.
Finalmente, foi nesse período que surgiram, na Europa, os primeiros cursos regulares de
regência.
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Século XX
A partir do início do séc. XX, a música ampliou sua participação nos movimentos
estéticos da arte em geral, herdando deles o aspecto filosófico.
O regente não era mais apenas um músico, era alguém que fazia de sua interpretação um
manifesto filosófico, e suas decisões, musicais e técnicas, eram guiadas por convicções
filosóficas ou políticas.
Um dos mais notáveis da nova geração de regentes foi o húngaro Arthur Nikisch (1855-
1922), que sucedeu a Hans von Bülow (1830-1894) como diretor musical da
Filarmônica de Berlim, em 1895. Ele já havia sido chefe da Ópera de Leipzig, Orquestra
Sinfônica de Boston e Leipzig Gewandhaus Orchestra, e foi diretor de música da
London Symphony Orchestra.
Nikisch estreou obras importantes de Anton Bruckner e Pyotr Ilyich Tchaikovsky, que
admirava muito seu trabalho. Johannes Brahms, depois de ouvi-lo dirigir sua Quarta
Sinfonia, disse: “[...] bastante exemplar, é impossível ouvir melhor".
Nikisch levou a London Symphony Orchestra, em turnê pelos Estados Unidos, em abril
de 1912, a primeira turnê americana de uma orquestra europeia. Ele também fez uma
das primeiras gravações de uma sinfonia completa: a Sinfonia nº5 de Beethoven com a
Filarmônica de Berlim, em novembro de 1913. Nikisch foi o primeiro maestro a ter sua
arte capturada em filme (infelizmente, sem som). O filme confirma os relatos de que ele
fez uso de contato visual e expressão para se comunicar com uma orquestra. Fritz
Reiner afirmou que fora influenciado por esse aspecto de sua técnica.
Regentes das gerações após Nikisch deixaram registros na ampla discografia do séc.
XX. Duas figuras particularmente influentes e amplamente gravadas foram o maestro
italiano Arturo Toscanini (1867-1957) e o maestro alemão Wilhelm Furtwängler (1886-
1954). Toscanini é considerado por muitos como o maior intérprete da obra de Verdi,
mas o seu repertório era extenso, visto que tinha interpretações dos sinfonistas alemães
Beethoven e Brahms, que era particularmente renomado e gerador de influência,
favorecendo tempos mais severos e mais rápidos do que um regente, como Bülow, ou,
antes dele, Wagner. Ainda assim, seu estilo mostra mais flexibilidade do que sua
reputação pode sugerir, e ele era, em especial, dotado em revelar detalhes e fazer
orquestras tocarem como se estivessem cantando.
Karajan e Bernstein formaram outro antípoda aparente nos anos 1960-80, Karajan como
diretor musical da Filarmônica de Berlim (1955-89) e Bernstein como diretor musical
da Filarmônica de Nova York (1957-69), e, em seguida, regente frequentemente
convidado na Europa. A técnica de Karajan era altamente controlada, e, eventualmente,
ele conduzia com os olhos fechados.
Karajan e Bernstein fizeram extenso uso de avanços na tecnologia para transmitir sua
arte, mas de maneiras diferentes. Bernstein organizou grandes séries televisivas
nacionais de horário nobre para educar e alcançar as crianças e o público em geral sobre
a música clássica. Karajan fez uma série de filmes no final de sua vida, mas, neles, ele
não falou.
Ambos fizeram inúmeras gravações, mas suas atitudes diferiram: Karajan,
frequentemente, fez gravações de estúdio para aproveitar os avanços na técnica de
gravação, o que o fascinava. Ele desempenhou um importante papel na definição das
especificações da criação e do desenvolvimento da tecnologia do CD, mas Bernstein,
em seus dias pós Nova York, insistiu (na maior parte) em gravações de concertos ao
vivo, acreditando que a música não ganhava vida em um estúdio sem audiência.
Século XXI
Nesse início de século, a regência não apresenta grandes mudanças no sentido técnico.
Dificilmente se verá um regente moderno que não tenha as bases de sua formação
técnica fincada nas bases que formaram Bülow, Toscanini ou Karajan.
Ele deve se manter atualizado com o que ocorre no mundo em todos os sentidos. Deve
motivar a criação artística.
O regente do século XXI deve ser o responsável pela subsistência da arte, em um tempo
em que a luta é constante.
Quando se diz que o tempo dos grandes “maestros" acabou, trata-se de uma versão
romântica (e saudosista) de um ser considerado um semideus que a poucos era dado o
privilégio de conviver.
• Com o passar dos séculos, o regente foi estabelecendo sua função de forma mais
ampla. De "marcador de tempo” a tradutor de ideias, com suas próprias convicções e
personalidade.
• Os recursos tecnológicos que facilitam o acesso à arte devem ser utilizados pelo
regente de forma responsável, em prol de seu trabalho e da própria arte.
REFERÊNCIAS
HARRIS, B. Construction. In: Home Studio Setup. Burlington, MA: Focal Press,
2014.
HOLDEN, Raymond: The technique of conducting. In: The Cambridge Companion
to Conducting. Cambridge: Cambridge University Press, 2003.
WAKIN, Daniel J. The Maestro's Mojo. Disponível em: The New York Times.
<http://www.nytimes.com/2012/04/08/arts/music/breaking-conductors-down-by-
gesture-and-body-part.html?_r=1&pagewanted=all>. Acesso: 04.mar.2017.