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PSICOLOGIA CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2004, 24 (4), 78-87

Transitando entre Folhas e Bytes


a Expressão da Mídia Impressa e da
Mídia Digital na Cultura e na Produção
de Subjetividades
Transiting between sheets and bytes the expression of the printed and digital
media in the cultures and the subjectivity production

Resumo: A comunicação pode ser entendida através de diversos dispositivos. Neste trabalho, optou-se
pela escrita. Esta bifurca-se devido às transformações tecnológicas e culturais: a permanência dos meios de
comunicação impressos juntamente à escrita digital. A partir disso, é possível analisar a sua coexistência
como também a relação desses modos de comunicação com a cultura e os processos de subjetivação.
Propõe-se pensar a mídia e os sistemas de comunicação inseparáveis da cultura a partir de um enfoque
genealógico. Nesse sentido, percebe-se a processualidade dos agentes sociais de diferentes épocas. Para
tanto, o trabalho tem a proposta da “tecelagem”, onde vários autores, como Marshall McLuhan, Pierre
Lévy, Félix Guattari, Neil Postman, André Lemos e Celso Cândido contribuem com diferentes “fios”,
propondo, portanto, um entendimento transdisciplinar da relação entre cultura, mídia e subjetividade.
Palavras-Chave: Psicologia Social, cibercultura, cultura, Comunicação Social.

Abstract: Communication can be understood through several ‘dispositives’ or modes of communication.


For this study, writing was chosen as the mode of communication. It bifurcates—due to technological and
cultural transformations—into the existence of printed media and digital writing. From this point of view, it
is possible to analyze the coexistence of printed media and digital writing. It is also possible to analyze the
relation of these media to culture and subjectification. Starting from a genealogical focus, the study proposes
that media and communication systems cannot be understood apart from culture. In this sense, it is
possible to perceive the processuality of the social agents in different time periods. Therefore, the study has
a “weaving” character, where some authors like Marshall Mc Luhan, Pierre Lévy, Félix Guattari, Neil
Postman, André Lemos and Celso Cândido contribute with various “threads”, suggesting a multidisciplinary
understanding of the relationship among culture, media and subjectivity.
Key Words: Social Psychology, cyberculture, culture, Social Communication.

Cristina Wulfhorst

Estudante de Psicologia
(8º semestre) da
Universidade do Vale do
Rio dos Sinos (UNISINOS)
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Transitando entre Folhas e Bytes
a Expressão da Mídia Impressa e da Mídia Digital na Cultura e na Produção de Subjetividades

2
Sendo este trabalho uma referência ao professor Assim, os próprios meios já são informação,
Dante Moreira Leite, não faria sentido apenas um condicionantes de mudança (McLuhan, 1969). A
olhar sobre qualquer fenômeno, sendo que ele escrita é considerada um meio, logo, é uma faceta
visava uma concepção não fragmentada do sujeito. da Comunicação Social.
Tinha a transdisciplinaridade “tecida nele”.
Conceitos de Cultura
Sendo assim, parto da idéia da tecelagem utilizando
alguns fios para compor uma figura. Ao ser
A difusão do saber e o desenvolvimento da
terminada, necessita de um olhar caleidoscópico.
comunicação entre os homens conseguirão um dia
Nesse sentido, apresenta-se um entrecruzamento
lhes fazer em harmonia, na aceitação e no respeito
entre diferentes fios, representados pela
de sua diversidade (Lévy Strauss apud Laraia, 2002,
Comunicação, Psicologia e Antropologia, a fim de
p. 37).
refletir sobre os processos de subjetivação e
construções culturais potencializadas pela
Para fazer a relação dos meios de comunicação
comunicação. Os autores vêm desses diferentes […] as características
com a cultura, faz-se necessário um breve
campos, como Marshall McLuhan, Pierre Lévy, psicológicas não
panorama sobre conceitos de cultura e de suas
Félix Guattari, Neil Postman, André Lemos e Celso poderão ser
transformações, sendo que, na medida em que o
Cândido. Além disso, um enfoque genealógico, entendidas como
ser humano vai-se repensando, ele também
de historicidade, passa a ser relevante quando se fonte de
reconstrói seus pontos de vista e conceitos.
pretende não apenas expor fatos mas também desenvolvimento
contextualizá-los. histórico e social. Ao
O substantivo “cultura” significa, em seu uso
contrário, as
primeiro, cultura agrícola, plantação e cuidados
A comunicação pode ser entendida através de condições da vida
requeridos pelo cultivo. Depois de o sentido da
diversos dispositivos. Neste trabalho, optou-se pela social é que
cultura ter sido atrelado a esse uso mais concreto,
escrita. Esta será “tecida” pela análise da mídia determinam as
ele é transposto para a esfera humana e passa a
impressa e digital. Parte-se, ainda, do pressuposto características
significar a “cultura do espírito”, designando a
que a escrita é uma tecnologia indelevelmente psicológicas, embora
formação intelectual do ser humano.
ruptora e potencializadora, que, segundo estas, depois, passem
McLuhan (1969), é uma extensão de nossos também a influir na
O conceito passou por várias visões, desde as
sentidos, alterando nossas percepções. vida social. E ainda
positivistas do evolucionismo, o estruturalismo e
aqui será preciso
relativismo cultural, até as considerações
Comunicação Social e Psicologia distinguir?
contemporâneas.
Leite
A Comunicação Social compreende todas as formas Com Charles Darwin e o positivismo (Semprini,
de produção simbólica, seu intercâmbio e 1999), cria-se a tendência de ver a cultura sob um
conservação entre os homens; parte da cultura, a aspecto evolucionista, de uma ordem histórica e
consideração dos aspectos estruturais da de progressividade. Entende-se a seleção natural
Comunicação Social permite demonstrar sua das culturas como a seleção natural das espécies,
complexidade [...] é parte do processo de produção ignorando, assim, a variedade e riqueza peculiar 1O conceito de hibridação é
e intercâmbio cultural, parte da dinâmica social, na das culturas. Alguns antropólogos, como Margaret definido por Canclini como os
“procesos socio-culturais en los
qual se combinam sistemas de intercâmbio Mead (1970), começam a preocupar-se com o
que estructuran praticas
simbólico com a intervenção de tecnologias que estudo de culturas mais “primitivas” no sentido de discretas, que existían en forma
ampliam o potencial humano para o intercâmbio mostrar as diferenças culturais a partir da vivência separada, se combinam para
(Santoro, 1986, p. 471). direta com os povos estudados. Houve, nesse generar nuevas estructuras,
objetos e prácticas” (Canclini,
processo, uma passagem de entendimento de 2001, p.14) , e refere, ainda, o
Pensar em Comunicação Social nos faz pensar na “Cultura” para o plural “Culturas”, a fim de romper conceito, aos “[…] productos de
Psicologia, nos processos de subjetivação em com todo e qualquer padrão elitista e hierárquico. las tecnologias avanzadas y
relação à comunicação. Como afirma Santoro procesos sociales modernos e
posmodernos”(Canclini, 2001,
(1986), o estudo da Comunicação excede os O plural é a marca do discurso antropológico p.22).
limites de qualquer disciplina. Os conhecimentos moderno, que tem como representantes Franz
imbricam-se, tecem-se; não se sabe onde começa Boas e Durkheim (Laraia, 2002) no século passado. 2 McLuhan considera os
1 conteúdos dos meios
um e termina outro, sendo, portanto, híbridos . Tal discurso passa a ser alternativo àquele da época secundários, sendo que “as
das grandes navegações e descobertas, dotado de sociedades sempre foram
Santoro entende a Comunicação Social muito uma visão colonialista eurocêntrica. Assim, abre- moldadas mais pela natureza
além da concepção de comunicação de massa: dos meios do que pelo conteúdo
se espaço para o particularismo histórico como
da comunicação” (McLuhan,
“Comunicação Social cobre todos os processos reação à concepção evolucionista, enfatizando as 1969, p. 30).
de geração, transformação, armazenamento e especificidades das culturas. Continuando esse
difusão de conteúdos simbólicos” (Santoro, 1986, processo, há uma reorientação do particularismo
p. 417), e considera que toda comunicação é, histórico, com uma concepção relativista da 79
por definição, social. cultura: o estruturalismo. Este tem Lévy Strauss
Cristina Wulfhorst

(Auge, 1988) como representante, supondo que o O Diagrama de Foucault explica esse movimento,
progresso só seja possível na coalizão e relação onde a constituição e a compreensão do sujeito
entre as culturas, introduzindo a importância dos não são dicotômicas, no sentido de algo estar “fora”
encontros interculturais. e exigir adaptação. Deleuze (1988) desconstrói o
entendimento fragmentado no momento em que
Porém, os conceitos de cultura contemporâneos considera sermos uma dobra desse fora, uma entre
consideram os processos de subjetivação muito inúmeras possibilidades de ser. Já Postman (1994)
mais que o armazenamento, transmissão do posiciona a tecnologia da informação como algo
conhecimento e manifestações a partir da externo, um “ser” invisível, autônomo, que atua
estabilidade e identidade fixa. sobre nossas vidas no momento em que afirma
que “(...) o gênio que saiu da garrafa proclamou
Guattari (1992), a respeito disso, afirma que o que a informação seria o novo deus da cultura e
conceito de cultura é profundamente reacionário, não avisou sobre os perigos do excesso de
“pois separa atividades semióticas em esferas, informação” (Postman, 1994, p.69).
padronizadas e capitalizadas para o modo de
semiotização dominante, cortadas de suas realidades Porém, ao retomarmos a idéia de Deleuze e
políticas” (Guattari, 2000, p.15). Williams (2002) Guattari, também nos colocamos como agentes e
apresenta outro conceito interessante, que considera responsáveis pelos processos. Não se trata mais de
a cultura sempre criativa, rompendo com a idéia de receptor-emissor, da lógica da comunicação a partir
3
uma cultura elitista e outra popular: “a cultura é algo da metáfora do tubo (Maturana; Varela, 1987).
usual, originário: esse é o fato primordial. Toda Há sempre uma ambigüidade numa interação
sociedade tem sua própria forma, propósitos e comunicativa.
sentidos” (Williams, apud Laraia, 2002, p.54).
Segundo Cândido (2000), hoje nós
Esses conceitos mais contemporâneos foram compreendemos e interpretamos o mundo a partir
mudando com os meios de comunicação e do que vemos, ouvimos e lemos nos meios de
tecnologias, sendo que estes revelam novos comunicação, sendo que muito da formação
sentidos, como afirma Williams (2002): “Uma subjetiva é, em grande parte, elaborada nesses
cultura possui dois aspectos: os sentidos e direções processos de comunicação e informação. A
conhecidos (...) e as novas observações e sentidos, mudança da escrita, de uma “passagem” do sentido
que são oferecidos e testados” (Williams, apud do papel para os bytes, mostra o quanto as
Laraia, 2002, p.54). Os meios de comunicação mudanças, os processos de subjetivação, são
3 A metáfora do tubo trata da digitais permitem uma visão inédita, remetendo a reordenados a partir da transformação das
comunicação como algo gerado
num ponto, levado por um tubo e
uma a-historicidade, na qual as gerações já não percepções pela tecnologia, uma vez que nossos
entregue ao receptor. Daí perpassam, de maneira tão significativa, seus sentidos são extensões das tecnologias.
estarmos acostumados a falar conhecimentos; a tecnologia tem um forte papel Antigamente, eram extensões mecânicas; hoje, a
da informação contida na nesse sentido, onde, por exemplo, os mais novos extensão é do nosso sistema nervoso central
palavra impressa. Para
Maturana e Varela (1996), essa estão ensinando os mais velhos. Não é à toa que os (McLuhan,1964).
metáfora, embora seja a conceitos formulados para a cultura ficaram
compreensão usual, é falsa, pois retrógrados em poucos anos. A tecnologia passa a Postman (1994) e Lévy (1995) usam o mesmo
“supõe uma unidade não
determinada estruturalmente,
idéia de re-invenção e ressignificação da cultura, e exemplo para se referir às mudanças em relação
4
como se o que ocorre com um não uma idéia estagnada, como conceitos às tecnologias: o relógio mecânico do século XVI .
organismo numa interação fosse anteriores. Portanto, entende-se a mídia como Porém, o primeiro autor o vê como determinante,
determinado pelo agente forma de significação cultural. o segundo, como condicionante, sendo que o que
perturbador e não por sua
dinâmica” (Maturana; Varela, ocorre são condições para o favorecimento de tal
1987, p. 217). Cultura na Midia, a Midia na Cultura atuação.

4 Autores como McLuhan (1969), Com isso, esclarece-se que a mídia não é
Comunicar é pôr em comum, entrar em relação. Nesse
Postman (1994) e Lemos (2002) simplesmente uma representação exterior do
utilizam o exemplo do relógio sentido, o desenvolvimento da mídia contemporânea,
mundo humano e seu cotidiano (...) são extensões
mecânico como uma tecnologia acompanhada pela transformação das culturas, das
com forte ruptura das habilidades intelectuais e comunicativas
identidades, das formas de poder e da autoridade, humanas, constituindo, revelando, inventando
paradigmática, uma vez que
este passou a ser um meio de gera novas formas de estar junto (Bougnox, 1993, p. 6). parte importante do mundo dos desejos, das
regular a vida privada dos
cidadãos, além de marcar a
representações e do imaginário contemporâneo
passagem de uma lógica do
A cultura produz a mídia e a mídia produz a (Cândido, 2000, s.p.).
público para a lógica do privado. cultura. Não há uma lógica cartesiana de causa, e,
sim, uma simultaneidade e complementaridade. Porém, alguns autores, como Lipovetsky (1983),
A mídia não deve ser entendida como algo afirmam estarmos vivendo numa Era do Vazio,
80 “separado”, “que vem de fora”, das quais somos as herança dos “tempos modernos” e de suas
conseqüências. extensões mecânicas: o ser humano passou a ser
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fragmentado, pulverizado. O efeito zapping para McLuhan (1969), relaciona-se com a extensão
poderia ser uma expressão disso. Facilitou-se a de sentidos pelas tecnologias. Qualquer invenção
informação fragmentada. Se a leitura de um livro, ou tecnologia é uma extensão ou auto-amputação
a linearidade, tornou-se maçante para muitas de nosso corpo, e essa extensão exige novas
pessoas, é porque algo foi afetado na sua
relações e equilíbrios entre os demais órgãos e
subjetividade e é com isso e a partir disso que os
extensões do nosso corpo.
indivíduos vão construindo cultura.

Svend Dahl coloca a questão da transitoriedade


A Midia Impressa e sua Revolução típica dos nossos tempos: “o livro continuará com
a vantagem de não ser passageiro como os demais
[…] as boas maneiras de ler hoje, é chegar a tratar
meios de comunicação, mas um perdurável
um livro como se escuta um disco, como se olha um
filme ou um programa de televisão, como se é tocado depósito de pensamentos e saberes da
por uma canção; todo tratamento do livro que humanidade, sempre disposto a abrir-se de novo”
exigisse um respeito especial, uma atenção de outra (Dahl, apud Campos,1994, p.215). Assim,
espécie, vem de uma outra era e condena remetemo-nos à relativização do tempo, ou seja, o
definitivamente o livro. Não há nenhuma questão tempo para ler um livro é de fato um investimento,
de dificuldade nem de compreensão: os conceitos mas para baixar um programa para ler um texto
são exatamente como sons, cores ou imagens, são não se pode esperar mais do que um minuto sem
intensidades que convêm a você ou não, que passam uma certa irritação e sensação de “perda de
ou não passam (Deleuze, 1988, p.10).
tempo”. Há menos tempo e paciência para o ato
de ler, saborear um livro completo. O tempo que
Com a invenção da escrita e, em seguida, dos meios
de reprodução de texto, um novo suporte se precisa para pensar no que a leitura afetou, no
midiático é instituído, e, com ele, novas que desestabilizou, concorre com o tempo sempre
possibilidades de relações sociais. O texto impresso escasso. Anestesiaram-se o silêncio, as invenções,
permite uma outra percepção e apropriação de nas entrelinhas. Estas são sensações ligadas ao nosso
saberes impensáveis nas sociedades orais. Uma fazer com a tecnologia.
idéia não precisa mais de uma retórica para ser
transmitida e conhecida, e, pela primeira vez, os De acordo com McLuhan (1964), durante as
discursos podem ser separados das circunstâncias idades mecânicas, da qual a Era de Gutenberg faz
particulares em que foram produzidos. A memória
parte, projetamos nossos corpos no espaço. A
e a inteligência não precisam mais encarnar em
imprensa seria uma extensão do visual – a
uma entidade viva.
valorização do que pode ser visto. Para o autor,
A escrita foi o meio fundamental de comunicação qualquer extensão afeta todo o complexo psíquico
e subjetivação das sociedades até o século XIX. Ela e social (McLuhan, 1964).
consolidou valores, critérios, materializou a
informação, facilitando a impressão do “universal”. A imprensa, por exemplo, acentuou o
Campos (1994) analisa a importância e individualismo e nacionalismo do século XVI. Esta,
longevidade dos livros. Afirma que o livro é o meio segundo McLuhan, tem um efeito duplicador,
de comunicação mais antigo, data cerca de 6 mil confirmou e prolongou a nova tensão visual:
anos. Desde o suporte de barro, passando por
“psicologicamente, o livro impresso, como
diversas transformações, manteve-se como um
extensão da faculdade visual, intensificou a
porta-voz do silencioso pensamento humano.
Enfatiza-se a palavra “silencioso”, que atualmente perspectiva e o ponto de vista fixo. A nova
parece não ter muito reconhecimento, senão intensidade da pressão visual e do ponto de vista
interpretado pejorativamente. Que valor nossa particular” (McLuhan,1964, p.142). A imprensa
cultura dá, afinal, ao silêncio?! A televisão e outros forneceu a primeira mercadoria uniformemente
meios sonoros preenchem os espaços vazios do duplicável, a primeira linha de montagem – a
silêncio e das entrelinhas. produção em massa. Além disso, ela acendeu o
desejo de imortalidade: todos queriam imprimir
Segundo Cândido (2000), a televisão excitou ao seus feitos, como se “a imortalidade fosse inerente
máximo as faculdades auditivas e televisivas do à mágica repetição e extensão da imprensa”
corpo, de tal modo que os outros sentidos, como (MCLuhan, 1964, p. 200).
a sensibilidade tátil e olfativa, são neutralizados.
Passa-se a compreender o mundo com essas duas É interessante, ainda, ressaltar que a imprensa pôs
faculdades superexcitadas; literalmente, vemos e um fim nos segredos dos alquimistas, tornando a 81
ouvimos o mundo. A neutralização dos sentidos, ciência um empreendimento público. De acordo
Cristina Wulfhorst

com Postman (1994), há uma estreita relação entre O mundo eletrônico e os meios tradicionais de
o crescimento da ciência e da prensa tipográfica, comunicação antecipam essa Revolução. Porém,
pois a imprensa anunciou o advento da ciência. esses meios, segundo Rolnik e Guattari (2000),
Além disso, introduziu a idéia de mensuração de tendem à subjetividade passiva, uma
hegemonização do imaginário social e da
espaço e tempo.
subjetividade, entrando de acordo com McLuhan
e Adorno. Já na mídia digital, o estabelecimento
De maneira gradual, novas concepções de
de uma hegemonia é praticamente impossível.
conhecimento e inteligência foram tomando
espaço, e, com elas, maior respeito pela razão e
Cândido (2000) propõe uma analogia que
privacidade. Novas formas de discurso público
expressa essa Revolução, onde a antiga praça
foram sendo implementadas. A época tecnocrata
pública estaria transformando-se em praça virtual
(ou Idade Mecânica) foi a primeira a ter sua
planetária. Não é mais necessário um espaço físico
existência discutida em impresso, tanto que
em comum para os encontros. A Revolução é
Tocqueville (1954) afirmava que a razão e a
percebida nas formas de produção, distribuição e
imprensa eram inseparáveis.
consumo da informação e do conhecimento. Isso
“As novas redes de retrata uma ruptura com as principais mercadorias
Logo se compreendeu que o livro impresso havia
comunicação e e lógicas da sociedade industrial.
criado uma crise de informação e que algo
informação digitais precisava ser feito para manter algum controle. Um
potencializam a Nessa revolução, comparada a um dilúvio (Lévy,
meio foi a escola moderna, que tomou forma no
liberação de uma 1995), exige-se dos indivíduos contemporâneos a
século XVII. Segundo McLuhan (1964), houve
multiplicidade de rápida inovação; quem não se renova, se estagna
várias razões para o crescimento da escola comum,
vozes, constituindo um e corre o risco da exclusão. Isso provoca alterações
mas nenhuma era mais óbvia que a necessidade
novo poder subjetivas muito significativas; sempre se tem a
de resposta às ansiedades e confusão causadas pela
comunicativo real sensação de estar “perdendo” algo, de estar sempre
informação desenfreada. Por isso a invenção do
que pode se revelar correndo atrás de um tempo que já se foi. Hoje, o
currículo, para organizar, limitar a informação
de imprevisíveis acúmulo de informação não é a questão, e, sim, a
disponível. As escolas tornaram-se as primeiras
maneiras” renovação, a reciclagem.
burocracias seculares da tecnocracia, estruturas
para legitimar parte do fluxo de informação e para
Lévy Cândido (2000) aponta para as novas máquinas e
desacreditar outras.
redes de comunicação e interação digitais que
disponibilizam grandes recursos no sentido de
No uso da tecnologia, o homem é perpetuamente
apropriação e da evolução cultural do coletivo
modificado por ela, mas, em compensação, sempre
humano. O computador em rede evoluiu para
encontra novos meios de modificá-la. Utilizar ou
tornar-se o principal centro de informação e
perceber uma extensão de nós mesmos sob forma
cultura e o maior meio de comunicação. Sua
tecnológica implica necessariamente adotá-la. Ler
característica fundamental é a desterritorialização,
uma página impressa é aceitar essas extensões de
além de concentrar em si os tradicionais meios de
nós mesmos e sofrer o fechamento ou o
comunicação, como a escrita, apesar de
deslocamento da percepção que
transformada.
automaticamente se segue (McLuhan, 1964, p.64).
As construções subjetivas, nessa realidade, são
A Mídia Digital Escrita e sua desestabilizadoras em relação a toda uma lógica
Revolução ordenada vigente, o que provoca a preocupação
daqueles mais reticentes em relação a essa onda
As novas redes de comunicação e informação digitais digital. Para Guattari (2000), é um momento em
potencializam a liberação de uma multiplicidade que a natureza explosiva e caótica do crescimento
de vozes, constituindo um novo poder comunicativo das telecomunicações provoca os contatos
real que pode se revelar de imprevisíveis maneiras transversais. É uma inundação de signos.
(Lévy, 1995, p. 35).
Postman (1994) apresenta um ponto de vista mais
Vivemos uma época inimaginável para gerações temeroso sobre essa Revolução, mas também faz
anteriores, para as quais, na história da civilização, uma reflexão importante sobre a necessidade
há uma grande ruptura. Com a mídia digital, imprescindível de pensar e contestar as tecnologias
mudamos nossos fazeres, a noção tradicional de em todos os ângulos, alertando que a tecnologia
tempo e espaço, modo de pensar e relações. As pode ser “amiga” e “inimiga”.
transformações se seguem numa velocidade
vertiginosa, e o ser humano nem sempre parece Para esse autor, toda essa Revolução pode criar
82 acompanhar todas elas, nem cognitiva nem uma cultura sem base moral, pois mina certos
emocionalmente. processos mentais e relações sociais e altera as
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estruturas sobre as quais pensamos e agimos. comparável ao ocorrido a partir da Revolução


Exemplifica isso através das terminologias usadas Industrial, ainda que seja um desdobramento (e
na nossa linguagem em relação à máquina não substituição), uma extensão e
(“programar-se”, “vírus no computador”, “cérebro aprofundamento desta.
como disco rígido”), como sendo influência do
5
que denomina Tecnopólio .

Além disso, Postman (2000) enfatiza sua


preocupação sobre o fato de a vida das pessoas
ser mudada pela tecnologia e esse fato ser encarado
como algo natural. Acredita que tal fato possa levar
a um tratamento das pessoas como se fossem
máquinas, devido ao desenvolvimento
tecnológico. Se for para pensar nessa direção, é
inevitável lembrar-se de Charles Chaplin, que já “A cibercultura
previa o mesmo problema na Inglaterra forma-se da
industrializada, bem retratado no clássico “Tempos convergência entre o
Modernos”, ou no “Grande Imperador”, onde, social e o
no final do discurso, ele exclama: “Não sois tecnológico, sendo
máquinas, homens é que sois!”. A angústia não é através da inclusão
atual, e não é determinada pela mídia digital. da socialidade na
prática diária da
Fica clara a posição defensiva do autor a essas
tecnologia que ela
transformações, que fariam parte desse “abalo
adquire seus
sísmico”(Postman, 1994). Ele, portanto, faz uma
contornos mais nítidos
analogia ao estagnado, à terra, e não à água e ao

dilúvio, como Guattari e Deleuze, que, por sua
vez, sugerem flexibilidade e fluidez.
Lemos

Cibercultura
Transversalização da Mídia
A cibercultura forma-se da convergência entre o
Impressa e Digital: Implicações
social e o tecnológico, sendo através da inclusão da
socialidade na prática diária da tecnologia que ela Culturais e Subjetivas
adquire seus contornos mais nítidos (Lemos, p. 93,
2002). Não existe a “misteriosa comunicação” do passado
com o presente, a não ser que aquele continue a
Estamos numa época “pré–cibercultura”, num atuar diretamente neste? Ou, em outras palavras,
processo de subjetivação que já se delineia sob quando se transforma a situação, o que continua a
diversos aspectos. Lévy (1999) entende a influir é apenas o que, na situação nova, restou da
cibercultura como o conjunto de técnicas, práticas, anterior (...). O passado atua no presente e pode ser
atitudes, modos de pensamento e valores que se uma força determinante da ação, mas isso só ocorre 5 Postman (1994) considera o
Tecnopólio como a redenção das
desenvolvem com o crescimento do ciberespaço. quando forças do passado continuam no presente pessoas à tecnologia, onde este
A descentralização cultural é um dos pontos (Leite, 1969, pp. 328-329). seria o responsável por “alterar
chaves desse processo, através da a estrutura de nossos interesses:
as coisas sobre as quais
desterritorialização do acesso à informação, onde A mídia digital e impressa se transversalizam, não é pensamos. Alteram o caráter,
as redes digitais, como um rizoma, disseminam-se possível pensá-las separadamente. Ambas surgem verdade, política, privacidade,
tranversalmente. A informação não é recebida em épocas diferentes, o que não significa que uma etc” (Postman, 1994, p. 57).
através de “filtros” e de maneira ordenada, mas, exclua a outra, e, sim, que são re-significadas.
6 O ciberespaço, segundo Lévy
sim, caoticamente, onde a lógica emissor-receptor (1995), especifica não apenas
não faz mais sentido. Lévy (1995) apresenta três formas pelas quais a a infra-estrutura material da
humanidade organizou suas tecnologias de comunicação digital mas
também o universo oceânico de
Outro aspecto é a possibilidade do encontro, comunicação: da oralidade, escrita e informática. informações que ela abriga,
mostrando suas diversidades, dando vazão ao A oralidade primária, presente nas antigas assim como os seres humanos
encontro dos corpos (que aqui, também, são reais), civilizações, era o meio de comunicação e que navegam e alimentam esse
às afetações e à alteridade. É sempre um movimento “armazenamento” cultural. Como Lévy (1995) bem universo.

contrário à homogeneização. compara: quando morria um ancião, uma


biblioteca se queimava. Era uma cultura de
6
A emergência do ciberespaço representa, para a repetição. A entrada da escrita nessas culturas 83
civilização humana, um acontecimento condicionou uma série de mudanças culturais e
Cristina Wulfhorst

subjetivas, não só em relação à passagem de seja, pela transversalização de tecnologias. Porém,


informação mas, principalmente, pelo modo como isso provoca a desestabilização, logo, a “saudade”
as pessoas passavam a se comunicar e a se entender do mundo estabilizado.
também a partir da escrita.
Postman (1994) explicita isso na analogia do sistema
Houve, nas duas revoluções, preocupações de que de crença de uma cultura usuária de ferramentas
a nova invenção fosse desatualizar e/ou extinguir com um novo baralho de cartas: sabe-se o que
um meio mais antigo. Porém, para McLuhan vem depois de certa carta, há uma seqüência. É
(1969), um novo meio nunca se soma a um velho, um mundo compreensível. Já a Era Digital seria
nem deixa o velho em paz; ele nunca cessa de uma cultura parecida com um “baralho de cartas
oprimir os velhos meios, até que encontre neles embaralhadas, produzida pelo caos da
novas configurações e posições. Assim, a informação” (Postman, 1994, p.69). Isso porque o
hibridação, proposta por McLuhan (1964), tem mundo nunca se confrontou com o excesso de
condições de acontecer a partir do encontro e informação, que levaria a um “colapso da
afetação dos meios, criando a forma nova e a tranqüilidade psíquica e do propósito social”.
libertação do entorpecimento desses meios. É uma (Postman, 1994, p.63).
reinvenção.
Sobre esse “excesso de informação”, Cândido
McLuhan (1964) considera que todas as uniões (2003) faz uma analogia a partir do projeto da
híbridas geram liberação de energia e mudança, e biblioteca de Alexandria do antigo Egito. Ele remete
cita a hibridação entre as culturas orais e letradas esse desejo do “armazenamento do
como maior representante disso: provocaram conhecimento” do passado a uma atualização,
recomposições nos papéis e cenários sociais, denominando o ciberespaço como uma
borraram suas fronteiras, mas não apagaram sua Alexandria digital atual. Só que este não tem um
existência. Isso explica o fato de a cultura existir território definido, tem o acesso ilimitado.
num continuum, não no sentido linear, mas no
sentido de interação incessante de tradição e O textos impressos e digital têm muitas diferenças
mudança e de afetações com o outro (confirmando entre si, sendo operados em uma dimensão distinta,
as conceitualizações contemporâneas de cultura). assim como acontece numa biblioteca real e virtual.
McLuhan (1964) fala de meios frios e quentes,
A partir disto, talvez seja mais interessante pensar sendo que, quanto maior a possibilidade de
não em proporções de mudanças radicais, interação com o meio, mais frio é esse meio. O
gigantescas, como propõe Postman, mas, sim, de texto digital evolui simultaneamente com quem o
transformações na realidade micro, nos produz, é meio frio, interativo. Ele está sempre se
agenciamentos dessa Revolução. reconstruindo, fazendo novas dobras, renovando-
se com seu autor. Mas, se isso passa uma idéia de
Lévy (1995) entende as transformações e uma nova dinâmica interativa, também pode
implicações culturais da mídia digital a partir de passar a idéia de transitoriedade.
uma mudança do vertical ao horizontal, ou seja,
do “estoque” ao fluxo, sendo que o que acontece Postman (1994), Cândido (2000) e Guattari (1992)
é a circulação de produtos, conhecimentos e seres usam várias metáforas associando essa realidade
humanos, e nunca sua estagnação. A própria digital à água: dilúvio, ondas, oceânico. Isso pode
noção de Identidade é alterada: não é vista apenas remeter à idéia de transitoriedade (de identidades,
como um depósito, mas, sim, como sistema ativo conhecimentos, relações afetivas, etc.), mas
de relações e metamorfoses. Outra transformação também a uma certa permanência, figurada pela
é o processo da heteronomia à autonomia, que, água em si, mas que não sustenta a noção de
necessariamente, vem acompanhado de um “núcleo” e “essência”. Remete, sim, a movimento
processo de desenraizamento; há um abalo na e às mudanças aí implicadas. Além disso, uma onda,
lógica de hierarquização, através de um processo um dilúvio, nunca vem de razões simples e
circular. Não impera mais a lógica da passagem da deterministas. O desafio é (re)aprender a navegar.
informação “um-todos” e, sim, “todos-todos” Como bem afirma Cândido (2003, s.p.): “É preciso
(Lemos, 2002). Essas mudanças do “micro” são reinventar o próprio pensamento, porque o certo
exemplos que potencializam novas formas de é que o dilúvio não vai parar. O perigo de se afogar
saber, novas formas de se estar junto e de ser si é real. O perigo de ficar à deriva é real. Mas não
mesmo. existe navegação sem perigos.”

Isso quer dizer que, com a transformação das Hall (2000) analisa esse sujeito na pós-
tecnologias, o ser humano pode ressignificar-se modernidade, agente nesse dilúvio. Acredita que
84 através da interação “maquínica” de vários meios haja perda de um sentido estável de si, uma
de comunicação tradicionais e particulares, ou descentração do sujeito, uma crise de identidade.
Transitando entre Folhas e Bytes
a Expressão da Mídia Impressa e da Mídia Digital na Cultura e na Produção de Subjetividades

Nas muitas identidades pós-modernas, existe a Nessa concepção, é preciso sair da noção de que
constância da mudança: renovação incessante subjetividade seja algo associado à esfera psi. Não
para acompanhar a velocidade instaurada por uma se trata nem de esferas nem de limitação a alguma
nova lógica do tempo e de mercado. Para Hall área do conhecimento.
(2000), isso pode significar que cada um pode
desfazer-se de certas características pela nova De acordo com Cândido (2000), a subjetividade
aparência e imagem do amanhã. A partir disso, contemporânea é transversalizada por dois grandes
pode-se pensar numa analogia das subjetividades movimentos: de um lado, um embrutecimento
com os meios de comunicação: na digital, o tema massivo da subjetividade pelos meios de
central é renovação, flexibilidade, remetendo a comunicação de massa e, de outro, as revoluções
configurações identitárias semelhantes, enquanto moleculares da subjetividade pelas novas
que a mídia impressa, que tem como marco a tecnologias. Esse segundo movimento seria uma
“fixidez”, sugere identidades permanentes como possibilidade de re-singularização, da invenção de
eram as identidades modernas. O impresso é visível, novos devires. Trata-se de transformação, e não
concreto, ao alcance da mão e olhos; é a extensão substituição. Os livros, por exemplo, continuam a
ser impressos, mas é irreversível sua transformação:
destes. Portanto, há esse movimento de subjetivação
na Era Mecânica, obedeciam a uma lógica de
entre o estável e o instável, o visível e o invisível, da
difusão; na digital, é a lógica de mundialização.
ordem e do caos, lados de uma mesma moeda
que são, cada vez, menos separáveis. McLuhan
Tal evolução “maquínica” não pode ser julgada
(1964) já falava a respeito de uma ansiedade, nos
nem positivamente nem negativamente, como
anos 60, na “Era da Eletrônica”, que considerava
afirma Guattari (2000):
ser a “Idade da Angústia”, destinada a cumprir as
tarefas de hoje com as ferramentas de ontem. O Não se trata de categorizações em “bom/ruim”. É A única finalidade
impasse não mudou. então preferível pensar se se objetiva, reifica, se aceitável das
cientificiza a subjetividade ou se se tenta apreendê- atividades humanas
Justamente pelo fato de a construção da la em sua dimensão de criatividade processual. é a produção de
subjetividade se fazer no coletivo, mas ser Tudo depende de como for sua articulação com uma subjetividade
singularizada, aparecem diferentes manifestações os agenciamentos coletivos de enunciação. O que enriqueça de
para o mesmo fenômeno, como as de Lévy e melhor é a criação, a invenção de novos universos modo contínuo sua
Postman. Enquanto, de um lado, surge uma de referência; o pior é a mass-midialização relação com o
movimentação produtiva (no sentido de potência) embrutecedora. mundo
em relação a essas novas realizações subjetivas com (Guattari; Rolnik, 2000, p. 24)
os meios de comunicação, de outro, há um
Guattari
profundo anseio em como isso pode levar ao caos Cândido (2000) complementa essa idéia ao afirmar
indesejado. É importante ressaltar que a noção de a possibilidade de as evoluções tecnológicas
“caos” é vista de maneira diferente, nessas duas ajudarem a sair de um período opressivo para entrar
concepções, sendo que a primeira entende o caos numa outra era além daquela caracterizada pelos
como possibilidade de criação, o “desorganizar meios de comunicação em massa, que, por sua
para organizar”, enquanto que o segundo percebe vez, seria caracterizada por uma reapropriação e
o caos como fuga total de controle. uma re-singularização da utilização dos meios de
comunicação. São, enfim, movimentos que
O determinismo tecnológico tem a concepção da entendem esse dilúvio como a maneira positiva
segunda visão de caos. Este implica uma percepção para a construção de novos tipos de barcas – não
simplificada e mecânica das relações entre a apenas uma, mas várias delas.
subjetividade e a tecnologia, pois desconhece o
fato de que Conclusão
a máquina é, em si mesmo, um acontecimento A única finalidade aceitável das atividades humanas
subjetivo. As máquinas são ferramentas, é a produção de uma subjetividade que enriqueça
instrumentos, mas que, em seus processos de de modo contínuo sua relação com o mundo
invenção e uso, correspondem aos desejos e ficções (Guattari, 1992, p.33).
humanas. A máquina é subjetiva antes de ser
objetiva (Guattari, 2000, p.35). Este trabalho transitou entre vários fios, onde as
várias interfaces da escrita digital, impressa, e suas
Portanto, não é possível a dicotomia Homem x implicações na cultura e subjetividade foram
Máquina. Existe uma implicação na qual a configurando diferentes desenhos.
subjetividade se transforma a partir da invenção
de um dispositivo, na direção e dimensão próprias Foi possível perceber o quanto esse olhar 85
do dispositivo tecnológico em questão. transversal e móvel sobre as mutações da escrita se
Cristina Wulfhorst

expressa em modos de pensar, agir, entender o mostrou o quanto as mudanças, os processos de


tempo e as relações, enfim, a cultura. subjetivação, são reordenados a partir da
transformação das percepções.
As preocupações da Era Digital revelam um modo
de pensar análogo ao modo de operacionalizar as Porém, concluiu-se que não se trata de substituição
informações recebidas da rede. Revelam que do que foi produzido no passado; a questão é sua
culturas são afetadas pela sua existência, muitas transformação; a processualidade não pára. A
vezes com uma velocidade que dizem não escrita, como meio, acompanha esse processo;
compactuar com a nossa evolução. pode ter outros formatos, outras possibilidades de
leitura e produzir diferentes sentidos, enfim, ser
Há uma processualidade na mudança de lógica, reinventada.
onde se pensa a partir de tecnologias do passado e
isso abarca os processos de subjetivação de nossa Assim, nosso grande desafio é justamente este: a
época. A passagem da lógica do papel para os bytes (re)invenção.

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Transitando entre Folhas e Bytes
a Expressão da Mídia Impressa e da Mídia Digital na Cultura e na Produção de Subjetividades

Cristina Wulfhorst
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São Leopoldo/RS
E-mail: Criswulf@yahoo.com.br

Recebido 07/04/04 Aprovado 25/08/04

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