Reforma educacional e construtivismo: o estado como
uma problemática de governo
Thomas S. Popkewitz
Tem havido uma série de discussões1, em uma variedade
de contextos, sobre as cambiantes relações entre o estado e a arena educacional.2 Freqüentemente essas discussões se centram em questões a respeito da centralização e da descentralização do estado ou da devolução do poder (mudanças nos loci de poder, transferido para contextos geograficamente locais, através da administração comunitária da educação). A discussão coloca o estado como uma entidade “real”, em oposição à sociedade civil (público vs. privado, governo vs. economia). Num nível diferente estão as discussões sobre a “privatização” e “mercantilização” da política social, conceitos que indicam uma importante mudança nas relações entre estado e sociedade civil. Esses conjuntos de distinções aceitam a retórica política como pressupostos da análise em vez de fazer com que a própria retórica se torne o foco daquilo que deve ser compreendido e explicado. É propósito deste ensaio localizar o problema do estado na problemática da regulação. Argumento que as mudanças na arena educacional acima mencionadas são exemplos de mudanças na produção de regulação social em dois níveis diferentes mas relacionados. Uma dessas mudanças é a reconstituição de relações entre atores nas agências governamentais e na sociedade civil. Utilizo o conceito de “arena” para descrever aqueles dois níveis. Um é o estado, concebido como padrões de relações, nas quais certos atores são autorizados a organizar, classificar e administrar as práticas escolares.3 Um segundo nível de regulação envolve sistemas de governo, os quais organizam e classificam os objetos para avaliação e ação naquela arena. No século XIX, argumenta Foucault (1979), estabeleceu-se uma nova relação entre as práticas de governo do estado e os comportamentos e disposições individuais. Se o estado devia ser responsável pelo bem-estar de seus cidadãos, argumenta ele, a identidade dos indivíduos tinha que ser vinculada aos padrões administrativos encontrados na sociedade mais ampla. Isso envolvia uma relação poder-saber. Novas instituições de saúde, trabalho, educação ligavam os novos objetivos de bem- estar social do estado aos princípios de auto-reflexão e de autogoverno da individualidade (Donald, 1992; Rose e Miller, 1992; Shapiro, 1992; Hunter, 1994). O conceito de governo é utilizado, pois, para focalizar práticas historicamente específicas, através das quais os indivíduos podem pensar-se, conduzir-se e avaliar-se como indivíduos produtivos. A “socialização” resultante desse processo, tal como no habitus – e antes dele em Durkheim e Weber – em Bourdieu (1984), não é a socialização do universo antropológico da sociologia funcionalista; ela é, em vez disso o resultado de práticas sociais específicas,, através das quais as subjetividades são construídas. Ela também implica uma mudança: de uma concepção do governo como soberania para uma concepção do governo relacionada a pessoas e coisas. Exploro o problema do estado, concebido como um sistema de regulação, em três níveis. Em primeiro lugar, examino a relação entre atores e discursos nas reformas educacionais de quatro países aparentemente diferentes – Rússia, África do Sul, Suécia e Estados Unidos. Traço mapas de similaridades e diferenças nas construções/reconstruções na arena educacional. É relevante aqui a forma como as subjetividades dos vários atores são historicamente constituídas através dos padrões de relação assim produzidos. Argumento que os efeitos nos padrões de governo estão relacionados não apenas à criança e ao/à professor/a, mas também ao campo dos atores na arena educacional. Em segundo lugar, examino as homologias entre a construção do/a professor/a e da criança na arena educacional e mudanças que estão ocorrendo na política, nas artes e na economia. Meu objetivo, neste nível de análise, é o de explorar um amálgama de intersecções não-causais nos padrões de governo. Em terceiro lugar, considero a pedagogia como um local específico que vincula racionalidades políticas a capacidades do indivíduo. Esse governo, entretanto, não ocorre num campo igualitário, no sentido de que existe uma distribuição desigual das credenciais que permitem a participação e a ação. Argumento que os sistemas de distinção e diferenciação em pedagogia produzem sistemas de inclusão/exclusão na medida em que saberes locais, parciais, são inscritos como sendo universais e globais. A pedagogia “construtivista”, que se tornou central em reformas nos Estados Unidos e em outros países, é um exemplo da produção dessas diferenciações. Embora as discussões públicas sobre reforma escolar sejam populistas e, algumas vezes, evangélicas – as reformas promovem, de forma ostensiva, escolha individual, fortalecimento de poder e democracia – argumento que as reformas são tecnologias de governo que ordenam as possibilidades de ação e auto-reflexão. Esse processo de governo não é uma história linear, mas uma história de flutuações, movimentos desiguais e transformações impredizíveis, na medida em que racionalidades políticas são trazidas para o discurso pedagógico através de múltiplas capilaridades – capilaridades que atravessam as conhecidas distinções entre estado e sociedade civil.
Construindo a/o cidadã/o resolvedor-de-problemas
As duas últimas décadas envolvem importantes mudanças
no governo estatal da arena educacional na Suécia e nos Estados Unidos, dois países industrializados que, na aparência, são historicamente diferentes. Nesta seção, comparo as arenas educacionais desses dois países para explorar essas transformações. Minha discussão problematiza uma discussão que começa com a filosofia moral e a política hegeliana e pós-kantiana e continua no presente. Minha premissa é de que o estado não é constituído apenas pela regulação de formas legitimadas de ação política e econômica, mas por modos de ação que atuam sobre as disposições, as sensibilidades e a consciência, capacitando, assim, os indivíduos a serem atores produtivos e autônomos. A subjetividade da pessoa torna-se, pois, “não apenas sujeita ao jogo de forças no aparato do social mas atua também como autor e sujeito de sua própria conduta” (Donald, 1992, p. 14). Ao conceber o estado como constituído de padrões de regulação, utilizo uma noção de poder que tem sido central nas discussões pós-modernas sobre a política do conhecimento. Essa preocupação consiste em compreender como o poder é exercido através de múltiplas capilaridades, as quais produzem e constituem o “eu” como um agente de mudança (Young, 1990; Barret e Philipss, 1992; Shapiro, 1992; Butler, 1993). Meu uso do conceito de arena educacional objetiva interpretar o poder de forma relacional e histórica, como um amálgama de práticas institucionais e discursivas, que funcionam como “uma montagem coletiva de partes disparatadas para formar uma superfície social única” (Crary, 1990, p. 6). Minha discussão afasta-se da concepção de poder visto como soberania. Essa última concepção busca identificar as “origens” ou raízes do poder, fazendo uma classificação entre aqueles grupos que estruturalmente dominam e aqueles que são reprimidos. Embora a noção do poder como soberania proporcione certos insights, ela ignora ou deixa de reconhecer as qualidades disciplinares e produtivas do poder no processo de construção da pessoa autônoma e auto-reflexiva. Discuti os problemas da concepção de poder como soberania, no contexto do estudo da escolarização, em outro local (Popkewitz, 1991; Popkewitz e Brennan, no prelo). Neste momento, é suficiente dizer que a noção do poder como soberania, considerada como uma narrativa histórica, supõe estruturas e processos unificados e freqüentemente evolutivos. Entretanto, o poder tende a ser construído, visto e exercido de uma maneira historicamente contingente, com fronteiras múltiplas, fluidas. Embora a condição generalizada do capitalismo, uma das categorias centrais da análise tradicional, possa ser colocada como pano de fundo para a organização do poder, ela não propicia um fundamento teórico adequado para se compreender como as capilaridades do poder funcionam na sociedade contemporânea. Não existe um modelo único de capitalismo; tampouco existe uma história única de um desenvolvimento único, unificado (Boyer, 1989; Crary, 1990; Sousa Santos, 1995).
Governando à distância: reconstituindo a arena sueca
A construção do moderno estado sueco de bem-estar, nos
anos 20 e 30, transformou uma rede de instituições variadas e freqüentemente antagônicas (associações voluntárias, sindicatos, partidos políticos e burocracias municipais) no aparato profissional e administrativo centralizado do estado do “bem-estar”.4 Esse tipo de governo corporificava certos princípios e ideais de engenharia social, isto é, a aplicação de um conhecimento racional universal e a expertise profissional, aparentemente “neutra”, para calcular e regular questões sociais, econômicas e morais. Esse estado de “bem- estar” deveria assegurar altos níveis de emprego, progresso econômico, seguridade social, saúde e habitação (na Suécia, a educação como uma atividade estatal surgiu muito antes). A responsabilidade principal pelo planejamento e pela avaliação pertencia ao ministério estatal centralizado e às burocracias e não ao/à professor/a. Promulgaram-se leis com instruções detalhadas aos/às professores/as. O Conselho Sueco de Educação, por exemplo, foi instituído de acordo com essa concepção burocrática, com essa concepção de engenharia social. Além disso, as ciências educacionais foram mobilizadas, particularmente no período posterior à Segunda Guerra, no esforço de desenvolvimento administrativo da escolarização, bem como na produção do eu, levando o processo de racionalização a um indivíduo disciplinado, autônomo e moralmente autodirigido.5 As duas últimas décadas presenciaram importantes mudanças nos padrões de governo que constituem a arena educacional sueca. Nos anos 70, o sistema escolar centralizado tinha produzido uma série de problemas não- resolvidos e desenvolvido uma boa quantidade de “inércia”. Surgiram demandas por respostas locais mais flexíveis à educação, tais como as fornecidas historicamente pelas escolas paroquiais e, mais tarde, municipais (Kallos, 1995). Na verdade, houve um movimento geral para aumentar o alcance da ação dos conselhos escolares municipais, durante os anos 70, cujas conseqüências são “visíveis” nas reformas dos anos 80 e 90. Em 1991, o Conselho de Educação foi substituído por uma nova instituição, a Agência Nacional Sueca de Educação (Skolverket). Essa última é uma instituição pequena que tem preocupações tanto regionais quanto centrais na administração das escolas. Num certo sentido, a construção da agência educacional sueca, Skolverket, constitui um esforço parlamentar para desfazer a centralizada e uniforme burocracia escolar. Ao mesmo tempo, o Skolverket está localizado no interior de mudanças historicamente contingentes na arena educacional, mudanças que não são nem evolutivas nem redutíveis às intenções conscientes do parlamento. Analiso as mudanças na arena educacional através da idéia de que a reforma do estado do “bem-estar” é menos o começo de uma nova forma de estado do que a construção de um novo modo de inscrever as racionalidades políticas no autogoverno do indivíduo. Os padrões cambiantes de regulação são examinados através do reposicionamento — produzido na arena educacional — de atores e do processo de solução de problemas. A nova forma de definir o processo de solução de problemas implica uma revisão do currículo estatal sueco (Läroplan), o qual é reformulado através de uma nova concepção do estado, vista agora como uma instituição dirigida por objetivos vis-à-vis a arena educacional (Carlgreen, no prelo). Os objetivos curriculares gerais são estabelecidos pelo governo central, com a finalidade de permitir uma certa flexibilidade aos distritos escolares locais e um certo grau de autonomia no desenvolvimento de planos de implementação. Em troca, a burocracia estatal central monitora os resultados e o conteúdo através de medidas psicométricas e não através de processos. Se vemos a atual situação a partir de uma certa visão do estado, a Agência Nacional Sueca de Educação estabelece o que é legítimo e razoável para a conduta da educação, mas as localidades e os/as professores/as têm a responsabilidade de avaliar e, em alguns casos, escolher entre os muitos objetivos. Embora a palavra tenha permanecido a mesma, o Läroplan corporifica uma reestruturação das capacidades de “solução-de-problemas” do/a professor/as e das autoridades administrativas locais. O/a “novo/a” professor/a que participa do estado moderno é um/a professor/a que é flexível, sensível às mudanças e age com maior autonomia na busca de soluções para os problemas sociais. Embora haja discussão sobre as reformas, as categorias que são usadas para construir o/a professor/a não são, em geral, problematizadas. As práticas de governo do novo Läroplan corporificam certos conjuntos de pressupostos, relacionados à importação de duas palavras anglo- americanas: “currículo” e “profissionalismo” (veja, por exemplo, Kallós e Lundahl-Kallós, 1994; Kallós e Nilsson, 1995). A palavra “currículo” coloca em foco certas distinções sobre ensino e ajuda a construir um/a professor/a dotado/a de auto-autonomia e capacidades no processo de planejamento, na organização e na administração locais, bem como na avaliação do conhecimento escolar. O apelo em favor do profissionalismo está relacionado com uma re-visão da identidade ocupacional. Esse profissionalismo visa valorizar o trabalho escolar ou incluir maior responsabilidade e flexibilidade docente na implementação das reformas do estado concebidas como sendo dirigidas por objetivos.6 A importação das palavras “currículo” e “profissionalismo” representa mais que um simples processo de empréstimo de palavras para expressar “estados” desejados do/a futuro/a professor/a. Em vez disso, essas palavras corporificam “regras de raciocínio” sobre o auto- exame e as capacidades do/a professor/a, pesquisadores/as educacionais, burocratas e formadores/as de professores/as. “Currículo” e “profissionalismo” são conceitos extraídos das tradições de governo anglo-americanos, onde uma burocracia central historicamente “fraca” interage com organizações civis, departamentos escolares locais e grupos profissionais para produzir a prática pedagógica. Essas tradições contrastam, de forma clara, com práticas estatais européias (continentais) anteriores (Popkewitz, 1993a).7 Entretanto, elas têm relevância na atual reconstituição da arena educacional sueca. O importante na recepção sueca de noções de “currículo” e “profissionalismo” é que elas não são trazidas para a arena educacional “meramente” como “entidades fixas”. Elas recebem uma determinada interpretação no interior dos padrões de relações da arena educacional, tendo um horizonte histórico específico. Por exemplo, as palavras “currículo” e “profissionalismo” são reinterpretadas de acordo com tradições educacionais européias continentais (dinamarquesa e alemã) associadas com Herbart, de acordo com uma concepção de classe educada que é diferente das noções anglo-americanas de conhecimento especializado, embora se misture com elas. Essas mudanças na problemática da regulação são mudanças não apenas das “regras” sobre professores e estudantes; elas afetam as subjetividades dos vários atores naquela arena. Por exemplo, há uma autoproblematização da burocracia. O antigo funcionário governamental que monitorava a escola agia sob pressuposto de que as regras da escolarização eram claramente definidas de acordo com uma autoridade hierárquica. Isso não é mais assim: o funcionário burocrático precisa agir num contexto de solução-de- problema mais fluido, pragmático e localmente definido. Nesse sentido, o burocrata que “administra” a escola é definido e compreendido no contexto da reconstituição dos princípios de governo da arena educacional. A universidade contemporânea e a educação dos/as professores/as, na Suécia, também envolvem um visão/re- visão da produção do conhecimento e da expertise. Num certo nível, houve um desmonte ou enfraquecimento das instituições governamentais que anteriormente coordenavam e monitoravam as universidades. Nesse novo esquema, as universidades ocupam uma nova posição relativamente a outros atores na arena educacional, na medida em que há um maior controle interno sobre as posições docentes e sobre o orçamento. A retórica política contemporânea fala (positivamente ou negativamente, dependendo da posição ideológica de quem fala) da “nova” universidade sueca como tendo que responder ao “mercado”, um mercado que seria flexível diante de condições cambiantes. Entretanto, a “natureza” do envolvimento do corpo docente é freqüentemente prescrita através da racionalidade do “autogoverno” e de estratégias de financiamento do governo central, estratégicos que afetam as questões organizacionais. Epistemologicamente, as análises educacionais centradas-no-estado têm sido questionadas por uma visão mais pragmática. Essa visão se centraliza nos problemas dos/as professores/as e na didática, com uma maior utilização de “métodos qualitativos” nas avaliações das implementações locais de reformas e no desenvolvimento de habilidades de solução-de-problemas dos/as professores/as. Ao mesmo tempo, ganha autoridade um processo centralizado de informação estatística sobre o rendimento das crianças, sobre os recursos escolares e sobre a implementação da reforma, na medida em que o governo central vê-se às voltas com diferentes exigências de “informação” sobre os resultados escolares. A produção desse último tipo de informação tem-se tornado uma atividade considerável dentro da universidade, na medida em que novos testes nacionais estão sendo construídos para monitorar os programas governamentais. As mudanças epistemológicas nessa arena envolvem a aparição de dois “novos” conjuntos de atores autorizados. Um deles é constituído pelos psicometristas, que têm estado presentes na arena educacional desde o início dos anos 50, mas que ganham uma nova credibilidade na atual reestruturação. Um diferente agrupamento de atores é constituído pelos/as formadores/as de professores/as, que anteriormente tinham muito pouca autoridade na comunidade de pesquisa. Vou chamá-los/as de pesquisadores/as “locais”. Eles/as se focalizam no conhecimento que é considerado “utilizável” pelas autoridades regionais, nos programas de formação docente “descentralizados” e nos pais e mães. Os/as avaliadores/as locais vêem-se como “praticamente” orientados para responder às “demandas” sobre o uso de programas de reforma. Com ênfase em métodos “qualitativos”, as novas avaliações focalizam práticas docentes relacionadas com um processo de controle dirigido por objetivos. Os/as pesquisadores/as “locais” são eles/as próprios/as posicionados/as relativamente a uma reemergência da didática no estudo e treinamento docentes. A didática envolvida nos atuais programas, entretanto, é diferente da didática do idealismo alemão dos esquemas educacionais profissionais iniciais.8 A nova didática dá importância a relações entre os/as professores/as, aprendizes e o conteúdo acadêmico das matérias escolares, através de psicologias construtivistas (essas últimas são chamadas, na Suécia, de “progressivistas”). A ênfase está num/a professor/a que é visto um “solucionador de problemas” e que trabalha num ambiente flexível, num ambiente em fluxo constante. As mudanças na construção dos/as professores/as não ocorre através de diretivas governamentais formais mas, em vez disso, através de mudanças no programa e nos discursos, à medida que certas estratégias são consideradas como “educação profissional”. Essas estratégias incluem noções tais como “ professor reflexivo” e “pesquisa-ação” (Kallos e Selander, 1993). Essa última emerge através de uma ênfase crescente na avaliação em sala de aula. Essas estratégias governam à distância, através da arte do auto-exame. Sem argumentar em favor de uma correspondência, pode-se ver que as estratégias aqui descritas como didática e a concepção do professor visto como um profissional “autônomo” e “auto- reflexivo” estão relacionadas com as disposições docentes inscritas nas práticas dirigidas por objetivos governamentais anteriormente discutidas. Os discursos sobre currículo, profissionalização, didática e pesquisa-ação, entre outros, estão situados no interior de um conjunto de relações cujos padrões de governo incluem o estado. Os padrões de relações resultantes, entretanto, não podem ser adequadamente compreendidos como uma reconstrução daquilo que foi desmontado nos anos 20, mas, em vez disso, como uma reconstituição de poder cujas relações compreendem a arena educacional. As novas práticas de governo estão sendo discutidas: o resultado final ainda não está claro.
Governando à distância: os Estados Unidos
Discursos de reforma similares podem ser vistos nos
Estados Unidos. Entretanto, os discursos de reforma estão corporificados em diferentes conjuntos históricos de relações na arena educacional.9 Desde o século XIX, o governo das escolas tem sido organizado através de complexos padrões, que incluem editoras comerciais de livros didáticos, financiamento e sistemas de recrutamento municipais das escolas, bem como uma forte administração escolar distrital e local. Em algumas discussões, o papel do estado nos Estados Unidos tem sido visto como “fraco”, em comparação com a “forte” tradição estatal sueca. O Departamento de Educação dos Estados Unidos teve um papel pequeno ou nulo na construção da escolarização desde a Segunda Guerra e os movimentos de reforma que começaram no final dos anos 50. De fato, a maior parte da História Educação e da pesquisa educacional aceita implicitamente a idéia de um estado “fraco”, através de diversas categorias de interpretação, tais como descrições do sistema estadunidense como descentralizado e localizado; resultados escolares interpretados através de teorias psicológicas de “aprendizagem”; microetnografias da cultura de sala de aula; o diretor visto como a chave da reforma escolar. As noções de estado “fraco” e estado “forte”, entretanto, têm pouco valor analítico, quando se considera a problemática do governo. Na verdade, essa linguagem tende a ser mais enganadora que útil. Basta examinar os atuais discursos políticos americanos sobre subjetividades “virtuosas” para compreender que os Estados Unidos corporificam um conjunto forte de relações institucionais e discursos dirigidos ao governo da subjetividade. As discussões atuais sobre a regulação do hábito de fumar e dos rótulos de alimentos para disciplinar os hábitos de dieta dos indivíduos, por exemplo, apontam para regras “fortes”, que conectam a legislação governamental com o comportamento moral dos cidadãos. Essa inscrição da harmonização de padrões administrativos com autogoverno individual transcende ideologias. Discursos nacionais sobre aborto e direitos das crianças, violência contra as mulheres, gravidez adolescente e reforma do estado de bem-estar, construídos com diferentes agendas ideológicas, acabam convergindo, através da aceitação da harmonização de racionalidades políticas com o comportamento e a conduta moral de sujeitos individuais. As diferenças entre a Suécia e os Estados Unidos estão na forma como os padrões de governo são construídos em vez de em rótulos como “fraco” ou “forte”. A ligação das racionalidades políticas com subjetividade, nas escolas dos Estados Unidos, durante os séculos XIX e XX, por exemplo, envolveu trajetórias diferentes daquelas descritas anteriormente para a Suécia. Certos discursos sobre a pedagogia da “criança”, “infância”, administração escolar e medição do rendimento, por exemplo, circularam nacionalmente, para construir o objeto e o sujeito da escolarização. As regras do “currículo” e da infância inscreviam noções de progresso que ligavam abordagens de engenharia social ao desenvolvimento infantil e à construção do “eu”. Ao mesmo tempo, um conhecimento academizado do “professor” na formação docente e no desenvolvimento de técnicas administrativas de recrutamento e de organização e avaliação do desempenho docente se juntar a outras práticas, com a finalidade de governar o professor e a criança. O amálgama de idéias, tecnologias e instituições que formavam os sistemas de governo não era “fraco”, descentralizado ou evolutivo. As atuais reformas podem ser entendidas como uma reconstituição dos padrões que têm governado a arena escolar. Englobadas na frase recentemente usada de “reforma escolar sistêmica”, têm emergido novos conjuntos de relações entre instituições governamentais, grupos docentes profissionais nas várias matérias escolares, comunidades de pesquisa e autoridades regionais. Tal como na Suéica, as novas estratégias de governo movem-se entre múltiplos conjuntos de atores cujos padrões de governo constituem o estado na educação. Os discursos sobre padrões e sobre profissionalismo aparecem no interior de um contexto de construção de sistemas fortes de controle e monitoramento, tais como objetivos curriculares nacionais, técnicas de avaliação (por exemplo, avaliação qualitativa) e testes nacionais para o credenciamento de docentes. Os discursos sobre padrões nacionais e profissionalismo docente emergem de coalizões entre grupos no interior de instituições estatais, grupos profissionais, fundações e sindicatos docentes. Os discursos nacionais sobre padrões juntam-se a discussões sobre gerência local, “processo de decisão partilhado”, reformas da formação docente voltadas para um “professor reflexivo” e uma pedagogia construtivista. Uma conseqüência disso, como argumentarei na última seção, é uma revisão da problemática do governo do “eu”, uma revisão que se dá através do raciocínio aplicado. Os conjuntos de atores que estão sendo mobilizados e as relações que estão sendo estabelecidas na arena educacional da Suécia e dos Estados Unidos envolvem uma reconstituição do campo da “solução-de-problemas” para as possibilidades de ação, mas em diferentes condições históricas nacionais. Em nenhuma das instâncias podemos supor que a mudança educacional envolve um processo linear e evolutivo no qual um grupo estável e consistente de atores é repentinamente questionado por um novo e emergente grupo. Essa descrição do processo de reforma ignora o ajuntamento de técnicas e imagens que se interseccionam para criar posições de sujeito e para posicionar e reposicionar “atores”. O ator “burocrático” que pratica a engenharia social na Suécia é um “ator” burocrático diferente no atual contexto de “solução-de- problemas”. Num sentido importante, atores que podem parecer, em certo nível, os mesmos, são, na verdade, transformados, à medida que competem em diferentes padrões e através de diferentes regras epistemológicas de envolvimento. Conceitos tais como “mercado” e “privatização”, que são apresentados em ambos os países para explicar as mudanças, deixam de examinar o campo das relações que estão sendo produzidas na arena educacional. Regimes cambiantes e padrões de regulação: Rússia e África do Sul
Enquanto as mudanças nos governos da Suécia e dos
Estados Unidos relacionam-se com políticas de partido, o caso da Rússia e da África do Sul envolvem mudanças nas racionalidades da política e da cidadania associadas com seus regimes.10 Entretanto, ambos os países estão envolvidos em programas de reforma que têm certas similaridades com os da Suécia e dos Estados Unidos. Mas as condições históricas em cada país envolvem diferentes conjuntos de relações, no que diz respeito ao significado do estado na educação. Meu foco nessas relações é duplo: historicizar a noção de estado através da exploração da intersecção de atores e epistemologias cambiantes nas mudanças de regimes políticos; e localizar a produção de um processo centralizado de “solução-de- problemas” no governo das práticas sociais. Esse último processo exige atenção, dada a importância ao conhecimento mediado por experts na construção de padrões de governo. A vinculação entre atores e discursos é feito, outra vez, com objetivo de oferecer uma concepção multiestratificada, relacional e histórica do estado. A Rússia e a África do Sul são países que estão passando, ambos, por uma mudança em seus regimes políticos. Em ambos os países estão emergindo discussões sobre a construção de uma “sociedade civil” (através de organizações não-governamentais – ONGs), sobre a existência de um foco ideológico no interior das agências internacionais e sobre políticas públicas. A sociedade civil, acredita-se, forneceria instituições sociais intermediárias entre o indivíduo e o estado, as quais poderiam democratizar a sociedade e reduzir ou eliminar as práticas autoritárias dos regimes anteriores (veja, por exemplo, Fukuyama, 1995; Zakaria, 1995). Além disso, a Rússia e a África do Sul têm políticas que apontam para uma descentralização que coincide com uma centralização (“construção-da-nação”) que, na superfície, parece similar àquela que foi discutida com respeito à Suécia e aos Estados Unidos. Esses últimos países, por exemplo, têm desenvolvido uma retórica da descentralização, da gerência local e de reformas educacionais que incorporam o construtivismo psicológico. Na Rússia, um regime econômico político liberal e capitalista está substituindo o sistema centralizado organizado pelo Partido Comunista. O regime soviético anterior, por exemplo, não tinha quaisquer atores de governo, fora da infraestrutura das agências governamentais formais e do partido, a partir dos quais fortes sistemas hierárquicos de regulação pudessem ser construídos e monitorados. A rápida emergência do sistema soviético após a Revolução resultou numa combinação de políticas czaristas e comunistas que impediram a formação de uma sociedade civil viável ou de associações públicas. Em todos os aspectos, o Partido dominava as atividades políticas, sociais e culturais. (Na linguagem das agências internacionais de financiamento, não havia ONGs viáveis na antiga União Soviética). Podemos contrastar as transformações que estão ocorrendo atualmente na Rússia com aquelas da África do Sul, à medida que o sistema de apartheid é politicamente desmontado. Embora fosse autoritário em suas tecnologias de supressão da discordância, o sistema de apartheid da África do Sul tinha um sistema econômico capitalista forte e movimentos acadêmicos, sociais e de trabalhadores relativamente fortes. Mesmo durante os piores momentos do apartheid, os sindicatos de trabalhadores negros eram fortes, e certos grupos comunitários estavam em ação, embora as conseqüências econômicas da discriminação racial freqüentemente destruíssem o tecido da vida familiar. Além disso, grupos no exílio desafiavam o regime a partir de fora. Embora o sistema educacional fosse segregado, havia uma elite negra educada que vinha principalmente das escolas missionárias. Os acadêmicos podiam contribuir para as ciências locais estudando fora e no próprio país (algumas vezes podiam ler livros considerados “subversivos” em setores especiais das bibliotecas). A situação acadêmica dos intelectuais da África do Sul apresenta, pois, um grande contraste com a dos cientistas sociais e educacionais soviéticos, os quais tinham seu desenvolvimento teórico e metodológico seriamente restringido. Na África do Sul, uma conseqüência do funcionamento desses diferentes grupos, fora e dentro do país, foi o desenvolvimento de capacidades administrativas que podiam ser trazidas para a reestruturação dos padrões de governo, uma vez terminado o apartheid.13 É nesse contexto político que podemos pensar historicamente na mobilização de uma engenharia social que permaneceu “dormente” durante os anos de apartheid – alguns intelectuais foram exilados ou viviam temerosos de represálias se não agissem de acordo com a política governamental. À medida que o apartheid começou a ser oficialmente desmontado, os “dormentes” da sociedade civil da África do Sul começaram a despertar. Eles tinham as habilidades (mentalidades) necessárias para trabalhar como “grupos de planejamento”, ao lado dos corpos governamentais oficiais. Com o colapso da União Soviética, não havia nenhum “dormente” desse tipo, exceto no antigo sistema partidário. O Partido Comunista era tão abrangente em seus mecanismos de controle (e atemorização) que não havia qualquer sociedade civil desenvolvida para se inter-relacionar com as instituições governamentais formais na construção de padrões de governo.11 Igualmente importante era o fato de que as pessoas não tinham as disposições e as “regras de civilização” da modernidade capitalista com as quais negociar as complexidades da nova situação. Não é acidental o fato de que muitas pessoas que tomam as decisões na Rússia são as mesmas que eram burocratas do Partido no antigo sistema, mas que agora agem dentro dos “novos” espaços epistêmicos das reformas institucionais que enfatizam a “escolha” e a individualidade (Kerr, trabalho em andamento). Ambas as instâncias de mudanças de regime implicavam a produção de um conhecimento especializado (expertise) para governar a razão e para governar pessoas “razoáveis”. As lutas em torno do novo cidadão e da nova configuração política são ilustradas de forma mais dramática no conflito entre o parlamento russo e o presidente russo. Entretanto, essas lutas estão corporificadas de forma igualmente profunda na reforma da arena educacional. O problema educacional russo consiste, entre outras outras coisas, na necessidade de desenvolver uma expertise necessária para gerenciar uma administração educacional mais fluida e menos burocraticamente centralizada. A expertise não consiste, entretanto, de mera competência técnica. Ela também envolve uma reconstituição do professor: como ele se sente, como se “vê” e como age como um sujeito competente na escola. Tal como na Suécia e nos Estados Unidos, o governo dos professores e das crianças é central à construção da arena educacional. Aparentemente, os novos regimes da Rússia e da África do Sul precisam produzir mais professores, retreinar os professores existentes e construir um novo “conteúdo” no currículo.12 Mas as práticas de reforma são mais que práticas de recrutamento ou de mudanças nos focos curriculares; o mapa da arena educacional é também reordenado através das relações estabelecidas. Deixem-me explorar isso através do trabalho da Fundação SOROS, uma instituição filantrópica de Nova York que investe grandes somas de dinheiro na Europa Oriental para facilitar as mudanças em direção a uma economia de mercado. Essa fundação tem trabalhado com o Ministério da Educação da Rússia para produzir novos livros didáticos para o segundo grau, envolvendo as novas “comunidades imaginadas” da nacionalidade e do cidadão. Anteriormente, os professores soviéticos trabalhavam a partir de planos de aula pré-determinados, que detalhavam cronologicamente uma seqüência exata para cada aula. Os estilos de apresentação dos materiais eram ritualizados – todo mundo, no país inteiro, deveria utilizá-los de uma forma padronizada. Os livros didáticos da Fundação SOROS, em constraste, foram planejados para construir “mentalidades” que combinassem diferentes abordagens pedagógicas russas com noções liberais ocidentais de educação centrada-na- criança. Embora as construções discursivas não sejam monolíticas, o “Novo Professor” é alguém que pode agir de forma autônoma, utilizando capacidades de “solução de problemas”. Em outras palavras, esse professor é a corporificação do professor “resolvedor de problemas” que discuti numa seção anterior. Entretanto, a tarefa de construção de uma nova e imaginada comunidade consiste em mais do que “meramente” escrever livros didáticos. Ela envolve reconstituir o “autor” como sujeito e objeto de exame. Quando a Fundação SOROS contactou autores para escrever esses livros, os planejadores do projeto se deram conta de que os autores não tinham as habilidades exigidas. Esses autores tinham “mentalidade” estatista, a qual estava associada com o regime comunista anterior. Para produzir os livros didáticos, a Fundação SOROS organizou workshops para “ensinar” os autores a pensar e organizar o conteúdo curricular, a didática e a avaliação. Os guias destinados aos professores lhes davam a possibilidade de escolher entre várias atividades e tinham um apelo visual e psicológico para as crianças – “coisas” que são vistas como “naturais” nos países ocidentais. Menos explícitas, mas no horizonte da construção de currículo, estavam as visões russas sobre espiritualidade e perspectivas religiosas específicas que se tornaram parte dos discursos sobre a escola. As práticas da Fundação SOROS fornecem um ponto de entrada nas cambiantes relações de diferentes atores e das lutas em torno da produção da “razão”. Os livros didáticos assim reescritos ocupam uma posição problemática em relação a outras práticas escolares e docentes que se centram no domínio do conteúdo escolar corporificado nos sistemas de exame fornecidos pelo Ministério de Educação russo. Um contexto mais geograficamente localizado de administração escolar, com autoridades e finanças regionais, também redefine o “planejamento” e a produção de conhecimento, corporificado na Academia Russa de Educação e Formação Docente. No presente, nenhuma dessas instituições tem o monopólio do professor ou dos sistemas epistemológicos que constroem os currículos, a didática e o professor. Tal como na Suécia, há um novo pesquisador/avaliador “local”. O mapa da arena sul-africana tem uma construção histórica diferente. À medida que as negociações sul-africanas para uma mudança de regime se aproximavam, o Congresso Nacional Africano, com a ajuda de fundações privadas internas e externas, estabeleceu unidades de tomada de decisão para competir com aquelas unidades que funcionavam dentro do governo formal controlado pelo Partido Nacional Afrikaaner. Um desses grupos acadêmicos em educação produziu o NEP (National Educational Plan). Enquanto, anteriormente, a formulação de políticas era dominada por acadêmicos do grupo branco dominante e por uma “Pedagogia Fundamental” que legitimava o apartheid, o NEP foi planejado para avaliar e desenvolver objetivos para um novo sistema multicultural de educação. A implementação desse plano resultou na produção de uma série de folhetos que esboçavam os propósitos e a direção de um currículo multicultural e da administração e economia de um novo sistema educacional. O NEP pressupunha um papel forte para o estado no processo de levar a África do Sul a atingir objetivos nacionais. Esse processo, tal como na Suécia, estava acoplado a desenvolvimentos no governo local e na autonomia docente, expressos como profissionalização. Se abstrairmos, dos documentos do NEP uma certa retórica (referências ao apartheid e à igualdade e à democracia), os textos corporificam certos discursos universalizados sobre o cálculo e a administração da mudança, discursos que são também encontrados em outros países, tais como os Estados Unidos e a Grã-Bretanha. O NEP também inscreve muitas das prioridades de instituições internacionais, tais como o Banco Mundial, através de sua definição dos problemas e das opções para a solução de problemas.14 Os documentos do NEP foram produzidos por um grupo de experts acadêmicos extraídos de grupos anteriormente marginalizados dentro das universidades inglesas e indianas, bem como de sul-africanos negros pós-graduados fora do país (essas distinções são, elas próprias, efeitos de poder, no sistema de apartheid, e efeitos que são ainda produtivos no processo de sua desmontagem). Menos visíveis e raramente reconhecidas são as fundações e as instituições internacionais: não apenas a Fundação SOROS na Rússia, mas também outras instituições, como o Banco Mundial, a USAID, a SIDA sueca e a OCDE, bem como instituições “não- governamentais”, tais como as fundações Ford, Rockefeller e McArthur, que atuam na Rússia, na África do Sul, na Suécia e nos Estados Unidos (veja, por exemplo, Lagemann, 1989; Fisher, 1993). Meu argumento, até agora, é o de que se nós vemos, de forma estreita, o estado, na presente conjuntura histórica, como confinado apenas às agências governamentais, deixamos de reconhecer as relações de poder através das quais as práticas de governo estão sendo formadas. Embora práticas similares de reforma, relativamente à descentralização, circulem entre os quatro países, existem distinções históricas na constituição das relações de poder na arena educacional. Os vários atores, na sociedade civil e no governo, não têm quaisquer atributos “essenciais”, imutáveis, mas são definidos através dos sistemas de relações estabelecidos. As reformas emergem através de múltiplas trajetórias e recebem sua autoridade através de diferentes conjuntos de atores que estão localizados tanto no estado quanto na sociedade civil. Meu foco na Rússia e na África do Sul, entretanto, tem também o objetivo de colocar em relevo a posição dos atores científicos acadêmicos nos princípios de governo utilizados para construir o professor e a criança nos processos de escolarização e de formação docente. Mas mesmo aqui não podemos pressupor os atores acadêmicos como um grupo único e unificado. Apenas certos agrupamentos de acadêmicos são autorizados a falar. A compreensão dos padrões de regulação exige que consideremos a noção de “ator” como problemática; que compreendamos empiricamente as relações entre agrupamentos em sua arena de prática e que consideremos os sistemas de conhecimento que dão direção e interpretação àquelas práticas. Esse último coloca em destaque o problema da governamentalidade para que se possa compreender como as regras epistemológicas da solução de problemas posicionam e são posicionadas pelos vários atores na arena educacional.
A pedagogia e a reconstituição dos padrões regulatórios no
estado americano
Nesta seção, focalizo diretamente a pedagogia a fim de
considerar as regras e os padrões do processo de solução de problemas. Meu objetivo é tornar problemático aquilo que muitos analistas tomam como pressuposto quando focalizam os “atores” no processo de tomada de decisão ou as “origens” ideológicas dos enunciados da formulação de políticas – isto é, as tecnologias práticas de pedagogia que ordenam, avaliam e disciplinam as práticas educacionais e seus indivíduos (veja Ball, 1990; Marshall, 1995, como contra-exemplos). Meu exemplo é a pesquisa pedagógica construtivista americana sobre o ensino de matérias escolares, um exemplar explorado por múltiplas razões.15 Esse tipo de pesquisa é produzido através de múltiplas capilaridades que não estão restritas às agências formais do governo estatal e da sociedade civil. Isto é, as regras epistemológicas particulares que governam a pesquisa construtivista são autorizadas através da intersecção de diferentes conjuntos de atores. Nos Estados Unidos, os programas construtivistas de pesquisa são sancionados através de financiamentos dos governos federais e estaduais, bem como de fundações e de organizações profissionais.16 Essa forma de autorização é importante não apenas na arena educacional mas também em relação com mudanças nos padrões de regulação de outras arenas. Essas arenas incluem a política, como mencionei anteriormente, mas também a economia e as artes sob formas que discutirei mais adiante. Finalmente, o discurso construtivista é influente em todos os países mencionados anteriormente, embora em alguns casos atenda por nomes diferentes, tais como “teoria de atividade” na Rússia e psicologia “histórico-materialista” na África do Sul.
A reforma como governo do professor
Em contraste com o movimento de reforma dos anos 60/70, que procurou racionalizar o conteúdo do currículo, as atuais reformas americanas buscam regular através da abertura das “mentes” dos professores, retrabalhando as noções de competência, capacidade e conhecimento docentes sobre as matérias escolares. O foco central está na forma como se organizam as capacidades e disposições dos professores e estudantes para com o conhecimento. Os discursos pedagógicos normalizam as disposições e a capacidade dos indivíduos, os quais passam a regular a sua própria conduta como atores “autônomos”. Uma forte corrente nas reformas do magistério e da formação docente, por exemplo, dá atenção a programas de pesquisa “construtivistas”, programas que constroem os professores como sujeitos que agem com um certo grau de autonomia e flexibilidade. Esse tipo de pesquisa, com freqüência apoiada por financiamento federal e de fundações, define o conhecimento docente como pragmático e com “significados” negociados que são organizados através das práticas de sala de aula. A flexibilidade reivindicada pelos pesquisadores construtivistas refere-se à forma pela qual as crianças aprendem conceitos e está em contraste com reformas curriculares anteriores que organizavam as estruturas disciplinares do conhecimento de acordo com competências docentes estritamente definidas, tais como a habilidade de obter o “domínio conceitual” das crianças. Se colocamos os vários discursos de reforma em relação entre si, emerge uma série de diferentes atores na construção da “identidade” do professor. No nível nacional, os padrões curriculares americanos, um movimento em direção ao controle da educação pelo governo federal, não diferente do da Suécia, fornecem quadros de referência (dirigidos por objetivos) para os professores no nível local da escola (Celis, 1993). Os esforços por parte de organizações profissionais por desenvolver padrões curriculares nacionais são sustentados por financiamentos concedidos pela legislação federal e por fundações. O trabalho do National Council for Social Studies e do National Council for Teachers of Mathematics são dois exemplos que inscrevem a pesquisa e a educação construtivista. Os padrões referidos nesse tipo de discurso têm, de fato, o objetivo de “retransformar” os professores (e estudantes) em indivíduos solucionadores de problemas, “fortalecidos” (empowered), autônomos e pessoalmente flexíveis, que agem em contextos que não têm nenhum conjunto claro de fronteiras ou respostas simples. Embora possamos apontar processos desiguais através dos quais as reformas são produzidas, existem atores diferenciados que se tornaram parte dos processos de governo. Se examinamos os padrões nacionais, por exemplo, as organizações profissionais assumiram a responsabilidade de monitorar a conformidade, trabalhando com os editores de livros didáticos, secretarias estaduais de educação e instituições de avaliação. Esse monitoramento não é realizado através de qualquer processo legal mas, em vez disso, através da construção de uma rede de atores que inter-relacionam associações civis e agências governamentais. Num nível diferente, foi introduzida uma série de práticas de gerenciamento, com o objetivo de liberalizar a escola e de aumentar as responsabilidades docentes na instrução; estou pensando aqui na administração local das escolas (site-based management), no “processo partilhado de tomada de decisão” e no conceito de formação docente que privilegia a participação docente no planejamento curricular e o trabalho em colaboração com as comunidades locais (esse último conceito é encontrado em programas que enfatizam o ensino para a diversidade e o multiculturalismo). A “pesquisa-ação”, um importante elemento em esforços recentes para reformar o ensino e a formação docente, pode ser vista historicamente em relação com as reformas acima mencionadas. Seu objetivo é fazer com que os professores aprendam como estudar sistematicamente e como refletir sobre como suas práticas se relacionam com objetivos curriculares. Se pensamos nas práticas de reforma como ocorrendo numa arena, as práticas aparentemente diferentes acima mencionadas são construídas de acordo com padrões de relações cujos efeitos consistem em reconstituir a forma como os professores devem pensar sobre seu desempenho e como devem avaliá-lo. As diferentes práticas de reforma corporificam práticas que dizem respeito às capacidades e disposições do professor, na medida em que ele pensa sobre si próprio, no contexto escolar, como um profissional hábil e capaz. É importante observar que a responsabilidade profissional para monitorar a conformidade com os padrões está historicamente relacionada, nos Estados Unidos, com o desenvolvimento do estado de bem-estar na passagem entre o século XIX e o século XX. O processo de governo americano tem consistentemente combinado agências administrativas governamentais e não-governamentais na produção de regulação. A legislação federal americana recente, por exemplo, tem estabelecido uma comissão de padronização para monitorar a implementação de objetivos nacionais. Essa comissão é uma agência semi-independente, que não está situada dentro da burocracia governamental formal. A construção de agências quase-administrativas para regular a educação é parte histórica do desenvolvimento do estado nos Estados Unidos, em nada diferente da criação de uma agência federal de aviação, uma agência federal de transporte ou da agência regulatória federal para o mercado de ações(Skowronek, 1982). A reformulação e coordenação das práticas de reforma é descrita pelo slogan da “reforma escolar sistêmica”. A “reforma escolar sistêmica” faz uma alegação retórica de que os pesquisadores identificaram os componentes necessários das escolas bem-sucedidas e que o papel do governo central consiste em coordenar as práticas federal, local e profissional através de uma política pública coerente (Smith e O’Day, 1990). Essa “coordenação” não é, entretanto, neutra, na medida em que é parte da construção de padrões de governo que relacionam vários conjuntos de atores e discursos na arena escolar. Conselhos escolares, associações profissionais e distritos escolares locais, por exemplo, estão vinculados a uma nova expertise, através das categorias e distinções que definem a escola “bem-sucedida”, incluindo aquelas corporificadas nas abordagens construtivistas de ensino das matérias escolares. Quando ocorrem debates, eles tendem a ignorar questões que digam respeito à pedagogia como uma tecnologia de governo que constrói o objeto e o sujeito da escolarização e focalizam-se, em vez disso, em debates no nível macro tais como os méritos relativos do controle nacional versus controle local das escolas, a necessidade de igualdade e inclusão ou os benefícios de uma educação multicultural.
O cognitivismo e a reconstrução do professor
Existe um conjunto particular de regras epistemológicas
em torno das quais o professor é definido nas atuais práticas de reforma.17 Essas regras freqüentemente giram em torno do rótulo do “construtivismo”, o qual está baseado em perspectivas psicológicas e sócio-interacionais. As estratégias construtivistas pretendem capacitar os professores para que tenham as disposições e capacidades “corretas” para efetuar a reforma escolar. As subjetividades e o conhecimento são vistos como contingentes e plurais. Eles podem ser representados através da seguinte equação: “eu compreendo isso” + “eu posso fazer isso” + “eu me importo com isso” = “capacidade”18
Mas as pedagogias construtivistas não são estratégias
neutras de ensino da “solução de problemas”; elas politizam o corpo ao conectar poder e saber. Há uma mudança: do indivíduo definido como tendo conjuntos particulares de competências, habilidades e conhecimento (tais como os que são necessários para o domínio cognitivo) para o indivíduo que corporifica capacidades e disposições pragmáticas. As “capacidades” do professor são “auto-confiança, auto- disciplina, solução de problema e disposição para aprender”. Se examinamos o relatório do Holmes Group (1986, 1990), uma comissão organizada por diretores de importantes faculdades de educação nos Estados Unidos, para produzir mudanças na formação docente, vê-se que se oferece aí uma psicologia construtivista como modelo para aumentar a qualidade do ensino nas escolas de desenvolvimento profissional. O construtivismo é utilizado na formação docente quando se afirma que “a tarefa genérica da educação” consiste em “ensinar os estudantes a produzir conhecimento e significado – a produzir cultura…” ou quando se argumenta que é necessário que as redes institucionais desenvolvam múltiplos modelos de reforma em vez de “um modelo de concepção única” (Holmes Group, 1990, pp. 10, 6). Num diferente aspecto das atuais reformas escolares, a dos padrões curriculares nacionais, o construtivismo é privilegiado como uma tecnologia para reforçar os objetivos nacionais de modernização da escola. O National Council for Teachers of Mathematics, por exemplo, tem desenvolvido padrões de ensino que são fortemente influenciados pela pesquisa construtivista. Utilizando uma linguagem que soa como se tivesse sido tomada emprestada de um texto de psicologia, os proponentes dos padrões curriculares estabelecem a necessidade de envolver as crianças como “indivíduos ativos que constroem, modificam e integram idéias…”. O construtivismo, nos Padrões de Matemática, recebe o apoio adicional da referência à concepção do conhecimento como “fazer”, devida a Dewey. As construções retóricas das abordagens construtivistas são sedutivas. As novas abordagens de ensino capturam um impulso democrático. As reformas pedagógicas pretendem ajudar os professores a construir sua identidade profissional através da cooperação e da iniciativa individual.19 O professor deve ser um profissional “auto-governdado”, que tem uma responsabilidade local maior na implementação de decisões curriculares, dentro dos limites do controle dos objetivos por parte do estado. A “Escola para o Desenvolvimento Profissional” do Relatório Holmes e os Padrões de Matemática propõem um conhecimento que é contingente e plural, com o “novo” professor e o “novo” estudante” concebidos como pessoas capazes de resolver problemas, como constituídos de “subjetividades” flexíveis, cujas fronteiras estão continuamente mudando. Ao mesmo tempo, supõe-se que as regras de pensamento sejam democrátiacas na medida em que são apresentadas como se fossem universais e aplicáveis a todas as crianças. O “mapa” construtivista de raciocínio parece aplicável a todas elas, na medida em que as categorias de aprendizagem são apresentadas de uma forma neutra, sem qualquer dimensões espaciais ou temporais. O problema consiste em como dar lições eficientes de forma que todas as crianças possam resolver problemas de forma flexível. Embora seja fácil elogiar a auto-atualização que a pedagogia construtivista alega fornecer a cada indivíduo, ficam evidentes certas relações de poder. Um dos elementos na produção de poder é o obscurecimento das bases históricas e sociais do conhecimento. O construtivismo naturaliza o conhecimento mediado pelo expert trazido para a escola, ao mesmo tempo que busca as múltiplas formas pelas quais esse conhecimento pode ser aprendido. A ciência e a matemática são tratadas como “coisas” universais da lógica em vez de como sistemas de raciocínio que são historicamente formados e contestados. Embora a história do conhecimento das disciplinas esteja repleta de exemplos de conflito sobre os princípios que devem organizar o processo de solução de problemas, o construtivismo na matemática, por exemplo, é um método de solução de problemas baseado na idéia de princípios estáveis de demonstração e prova e de axiomas que são aprendidos através do emprego de múltiplas estratégias de ensino. Em outro local, chamei de “alquimia” ao processo que leva à transformação do conhecimento em matérias escolares, na medida em que esse processo envolve a transferência de conhecimento de um campo social (a “comunidade” de cientistas”) para outro espaço social (o da escolarização) (Popkewitz, 1993b). A alquimia “transfere” o trabalho disciplinar das ciências, da matemática, das ciências sociais, por exemplo, para problemas de aprendizagem, desenvolvimento infantil e gerência escolar. A alquimia deixa de questionar o fato de que as categorias disciplinares das matérias escolares são, elas próprias, representações que são socialmente construídas e vinculadas a uma configuração saber–poder – isto é, a matemática, as ciências, as ciências sociais são constituídas de métodos rivais e de paradigmas múltiplos para governar a forma como o mundo deve ser visto, compreendido e transformado. A alquimia tem o efeito de fazer com que pareça que pensamento e a razão não têm nenhuma expressão fora de nossas “negociações” pessoais, da aprendizagem de grupo ou do processo individual de “solução de problemas”. Discutindo o construtivismo das reformas suecas, Carlgren (no prelo) argumenta que as reformas anteriores viam o professor como um “objeto de mudança”, como um “fazedor” não-pensante. Isso pode ser compreendido, por exemplo, no movimento de reforma curricular dos anos 60, que buscava produzir materiais “à prova de professor”, materiais que não podiam ser prejudicados por um ensino incompetente. Carlgren argumenta que as atuais reformas redescobriram o professor como um ser pensante, além de um ser que faz, mas essa “reintrodução do professor pensante está conectada com uma concepção do professor como um expert técnico racional em planejamento e avaliação”. A concepção de professor, conclui Carlgren, inclui não apenas uma divisão entre os pensamentos e ações dos professores, mas também uma dissociação entre meios e fins e entre teoria e prática. Nesse ponto poder-se-ia sugerir que o currículo escolar é um discurso normativo e que há necessidade de se afirmar certos tipos de solução de problema como válidos e apropriados. Os princípios didáticos extraídos da psicologia construtivista, pode-se ainda argumentar, constituem apenas um exemplo do processo de se tomar os objetivos normativos da escolarização e colocá-los entre as obrigações profissionais para com a melhoria do ensino. Meu argumento, entretanto, não rejeita as qualidades normativas do currículo escolar e do ensino ou as responsabilidades gerais das escolas em regular os tipos de solução de problemas. Meu argumento, em contraste, consiste em explorar a forma como sistemas de governo são exercidos através de capilaridades múltiplas dentro da arena escolar, desde as ciências educacionais e as agências governamentais até as instituições filantrópicas, as associações profissionais e outros grupos envolvidos no processo de reforma. Na próxima seção, aponto para trajetórias em outras arenas sociais em que existem homologias nas disposições e sensibilidades construídas.
Sistemas globais, capacidades individuais e reformas
educacionais
A reestruturação dos padrões de regulação na educação,
como indicam meus comentários anteriores, precisa ser compreendida histórica e globalmente. Em um certo nível, esses discursos são elementos de uma circulação “internacional” de idéias sobre as práticas e as interpretações apropriadas da mudança escolar. A circulação dos discursos internacionais ocorre não apenas através de instituições formais envolvidas com políticas públicas, mas através de associações profissionais, periódicos, conferências e a mobilidade de acadêmicos ao redor do globo.20 Tampouco a globalização está restrita a grupos “hegemônicos” particulares de nações, já que a literatura “pós-colonial” tem mostrado o hibridismo dos discursos (ver, por exemplo, Appiah, 1992; Young, 1995). Podemos também ver a “globalização” através de homologias entre os padrões regulatórios da educação e os de outras arenas.21 Utilizo o termo “homologias” para considerar relações entre a educação e outras práticas sociais de uma forma que não seja nem causal nem sugira uma única origem para as mudanças. Essa segunda dimensão da globalização permite-me estender a discussão das normas regulatórias do construtivismo, ao vincular as “sensibilidades” do professor a outras transformações nos padrões de política, cultura e economia que a escolarização tanto expressa quanto influencia. O tipo de mudança que passa o centralismo burocrático (governo pela regra) ao “controle por objetivos” está ocorrendo não apenas na Suécia mas também em muitos outros países europeus. As mudanças podem ser relacionadas a uma tendência para que os projetos políticos se tornem mais locais e menos focalizados na classe, tal como tem ocorrido no movimento dos Verdes e na política do feminismo nas últimas décadas. Há alguns anos um membro do Parlamento Sueco, por exemplo, falava sobre o movimento feminista como demasiado importante para ser deixado para as mulheres; hoje essa visão do estado não é mais predominante. Pode-se encontrar práticas “localizadas” também no discurso acadêmico, com uma ênfase no conhecimento pragmático, em histórias sociais locais e em rejeições de histórias universais e de generalizações (Lloyd, 1991). A reorganização administrativo-legal dos governos nacionais está relacionada também com mudanças na relação entre a economia global e economias regionais, cujos padrões de regulação são homólogos aos da arena educacional. A nova estrutura empresarial é menos hierárquica e piramidal do que no passado e eliminou muitos dos níveis médios de administração. A linguagem das páginas empresariais dos principais jornais é similar à da literatura da profissionalização no ensino: a nova organização empresarial, por exemplo, é a “lei do microcosmo”, que postula que as empresas mais ágeis e flexíveis serão as que mais provavelmente sobreviverão. A nova empresa implica uma condição de trabalho que envolve a “solução de problemas” – onde demandas altamente variáveis por parte dos clientes, novas tecnologias, estruturas empresariais multicentradas e “horizontais” organizam os trabalhadores em grupos preocupados com projetos específicos, sem os antigos níveis hierárquicos de administração. As unidades menores, supostamente, “fortalecem” os trabalhadores e desenvolvem ambientes flexíveis, sensíveis, que podem responder prontamente às demandas do consumidor (leia-se: “empresarial”). Essa reestruturação empresarial corporifica padrões cambiantes de governo relativamente ao trabalho e à produtividade. Ao examinar os esforços para aumentar a produção, Donzelot (1991) argumenta que há esforços crescentes para romper laços psicológicos anteriores que definiam a identidade individual de acordo com noções fixas de trabalho e produção. As novas abordagens acentuam a relação entre a autonomia do indivíduo e sua capacidade para se adaptar e ser um agente de mudança num mundo cambiante, vendo-a como integral à sua auto-realização. “Em vez de definir o indivíduo pelo trabalho ao qual ele [sic] é designado, a nova psicologia vê a atividade produtiva como o local de exercício das habilidades pessoais do indivíduo” (1991, p. 252). Sob certos e cruciais aspectos, as disposições da pessoa que Donzelot identifica são homólogas às do construtivismo que vimos no Relatório Holmes e nos padrões curriculares nacionais anteriormente discutidos, bem como na literatura sobre mudança conceitual associada com o ensino construtivista das matérias escolares. Os objetivos individuais são agora vinculados mais estreita e diretamente que antes aos objetivos institucionais e empresariais. O individualismo do construtivismo é homólogo às concepções cambiantes de “individualidade” que Donzelot descreve e que existem também nas práticas culturais, na filosofia e na política. É um mundo de instabilidades, pluralidades e de necessidade de ações pragmáticas, à medida que os indivíduos interagem com sistemas de comunicação. É um mundo de qualidades contingentes em contextos que mudam rapidamente. As mudanças pedagógicas na forma como um professor “vê”, avalia e age no mundo estão relacionadas com outras mudanças sociais, mas não em correspondência com outras arenas sociais. A importância das estratégias de reforma no problema do governo está em suas qualidades invasivas. O potencial dos discursos construtivistas advém do fato de que ele vincula o conhecimento que a pessoa tem do mundo com “objetivos” institucionais, de uma forma que lhe permite sentir-se satisfeita de que o processo cumprirá de forma eficaz metas tanto pessoais quanto sociais. Estão inscritas nessas tecnologias concretas de pedagogia as disposições e as capacidades corretas que permitem que a pessoa seja auto- regulada e auto-policiada, de forma que o professor individual seja – para usar expressões da literatura educacional – não apenas “capaz” mas também “disposto” (veja, por exemplo, Barth, 1986; Cazden, 1986; Newmann et alii, 1989). Mas a qualidade invasiva, regulatória, não é um elemento reflexivo do discurso. O sentido de “fazer” e “querer” é aceito de forma não-crítica como uma prescrição para a ação. Assim, quando consideramos a mudança nos discursos individuais, que passa do indivíduo definido como tendo conjuntos particulares de competências, habilidades e conhecimento (tais como os exigidos pelo domínio cognitivo) para o indivíduo que corporifica capacidades e disposições pragmáticas, essa mudança nos loci de regulação está relacionada com mudanças em arenas outras que não a da educação.
O conhecimento como um sistema de governo que envolve
inclusão/exclusão
No começo deste ensaio, sugeri que a construção de
sistemas de governo não ocorre em campos de jogo onde haja uma situação de equilíbrio e igualdade entre os jogadores. Não é construída uma mesma subjetividade para todas as pessoas. O governo constitui uma economia que capacita e descapacita as subjetividades através da inscrição de diferentes regras de participação e ação. Aqui, pois, discuto brevemente como as regras de “razão” do construtivismo pedagógico normalizam e inscrevem subjetividades que excluem tanto quanto incluem. Podemos pensar nos princípios da pedagogia como construindo uma “comunidade imaginada”. Seus sistemas de classificação traçam fronteiras que determinam o que é incluído no “mapa”, através de suas práticas de ordenação e de divisão. Isso pode ser pensado como análogo ao mapa de um país, que identifica os “cidadãos” dentro de seu território. As inclusões não apenas definem mas fazem com que as identidades sejam historicamente redefinidas (por exemplo, chamando os ibos de “nigerianos”), fazendo também com que elas sejam excluídas ao não lhes conceder representação (como, por exemplo, ao reclassificar todas as pessoas que falam espanhol como “hispânicas” certas áreas são excluídas). Na pedagogia, os “mapas” são mapas da razão, do rendimento, da competência e das capacidades, mapas que são traçados através de regras de classificação. As regras classificam a “razão” que normaliza disposições e sensibilidades particulares do indivíduo que está na escola. A normatividade não aparece diretamente mas através de regras do normal, que aparecem como universais e aplicáveis a todos. Assim, podemos examinar as idéias atuais sobre reforma educacional nos Estados Unidos como construindo distinções que separam o “normal” do não-normal. Distinções que dizem respeito à juventude da periferia, estilos de aprendizagem, recuperação, diversidade cultural e que, aparententemente, concedem valor e ajuda a crianças que não foram bem-sucedidas na escola, envolvem, na verdade, esse tipo de normalização.22 O “raciocínio” estabelece um conjunto silencioso de normas que posicionam a criança nomeada como o “Outro”. Estabelecem-se relações de mesmidade/diferença. A criança “diversa” e de “risco” é internada e encerrada como diferente, não tendo as competências, o rendimento e as capacidades daquelas classificadas como normais. É nesse contexto de normalização que podemos explorar como a pedagogia inclui/exclui, através das classificações da “solução de problemas”. A pedagogia construtivista pressupõe, assim como o fazem os sistemas de idéias que definem a criança de “periferia”, uma normatividade silenciosa que é obscurecida à medida em que a “solução de problemas” é vista como universal e “natural” para todos os grupos de crianças que vêm para a escola. Onde a diversidade é pressuposta, trata-se de uma noção populacional de diversidade que constrói um continuum de valor e divisões a partir dos quais se pode comparar a criança individual. O problema do ensino consiste, então, em como fornecer lições eficientes, de forma que todas as crianças possam resolver problemas de forma flexível; ou de forma que os professores possam ser “reflexivos” sobre suas práticas, com a “reflexão” parecendo ter uma lógica que é independente do tempo histórico ou da localização social. Supõe-se que as regras são “naturais” e universais. Mas as “reflexões”, o pensamento e a solução de problemas que são pressupostos pelo construtivismo como sendo universais não são características globais mas locais. Um grande número de pesquisas, por exemplo, permite-nos compreender que as noções de solução de problemas que tomamos como “universais” surgem de grupos na sociedade que têm “capital cultural”, para tomar emprestado um termo de Bourdieu, para inserir suas sensibilidades, seus gostos e seu ordenamento cognitivo como tendo autoridade (veja, por exemplo, Bourdieu, 1984; Hertfeld, 1992; Zerubavel, 1993).23 A universalização da razão é uma inscrição de poder, que toma o que é “localmente” produzido e faz com que apareça como sendo “global”, natural e essencial. Por que a mudança do local para o global é importante para a noção de estado? As distinções representadas como universais, para continuar com o exemplo do construtivismo, são parciais e excluem aquelas pessoas cujas capacidades e disposições são diferentes. Os processos de inclusão/exclusão podem ser aproximados de uma discussão mais ampla chamada de “solução dos dois terços”. Comentários sobre políticas sociais na Europa têm sugerido que elas podem produzir divisões nas sociedades (Wagner, 1994). A sociedade dos dois terços consiste daquelas pessoas cujas subjetividades corporificam os sentimentos e disposições para criar “oportunidades”, onde o “Outro”/outros corporificam um habitus diferente que os excluem das “principais esferas da sociedade nas quais as identidades sociais podem ser formadas” (Wagner, 1994, p. 167). As inclusões/exclusões não são consequências das construções categóricas que estão associadas com as teorias da rotulação, tal como chamar uma criança de “socialmente em desvantagem”, “em risco” ou “de periferia”. Em vez disso, as inclusões/exclusões estão embutidas nos sistemas de reconhecimento, divisões e distinções que constroem identidades. Os sistemas de reconhecimento geram as normalidades pelas quais os indivíduos devem “ver”, agir e avaliar a si próprios como “pessoas razoáveis” e “normais”. A produção de subjetividade é historicamente específica e está inscrita no interior das relações de sujeito das arenas de práticas sociais. Meu argumento é que os sistemas que devem incluir não são nunca universais e, simultaneamente, produzem exclusões. A universalização da razão no construtivismo tem uma dualidade: seus sistemas de governo pretendem abrir possibilidades para aquelas pessoas que têm as disposições e as sensibilidades apropriadas para capitalizar o novo currículo, enquanto que aqueles que não as têm são excluídas. Assim, em vez de abrir espaços para aqueles que são diferentes, os sistemas de reforma podem, em vez disso, colocá-los num espaço de oposição ou de marginalidade. Isso ocorre à medida que o construtivismo nomeia as crianças que precisam de recuperação ou de ajuda especial, afirmando, ao mesmo tempo, um universalismo em seus sistemas de classificação de como o pensamento se dá. Como argumenta Dumm, num contexto diferente, os discursos das ciências sociais são práticas normalizadoras, que classificam grupos marginalizados, tais como as pessoas de cor, como diferentes da norma e que, na melhor das hipóteses, podem ser “como as pessoas normais”. Agrupamentos particulares de pessoas são encerrados e internados (Dumm, 1993). Assim, a produção de princípios de governo e de atores também envolve, através das subjetividades produzidas, sistemas de inclusão/exclusão. Mas não se trata apenas de uma questão de diferenciação interna. Como Badie e Burnbaum (1994) sugerem num recente trabalho sobre o estado, a emergência de relações transnacionais e a crise na maquinaria de regulação das relações internacionais têm imposto novos padrões regulatórios. Quero sugerir aqui que as distinções na reconstrução do internacional pode não ser feita no nível do território nacional, mas através da produção de distinções e diferenciações relacionadas a subjetividades. Numa recente revisão das políticas das agências internacionais de empréstimos, dirigidas à reestruturação da formação docente, produziam-se distinções entre os professores dos países do “Primeiro” Mundo e os do “Segundo/Terceiro” Mundo (Carnoy et alii, no prelo). Enquanto os países do “Primeiro” Mundo enfatizavam a educação universitária e as culturas científicas na formação dos professores, as políticas das agências internacionais de financiamento dirigidas aos países não-industrializados davam preferência ao treinamento prático dos professores, feito na própria escola. Essas diferenças nas abordagens da formação docente são alegadamente para economizar dinheiro no setor educacional, mas as regras financeiras vinculam o exercício do poder à produção de distinções. Mas se focalizamos não o Banco Mundial como um “ator” soberano, mas as “regras de raciocínio” sobre as práticas educacionais, essas práticas podem ser compreendidas como parte de um conjunto amplo de práticas e discursos planejados para reconstruir a forma como os professores pensam sobre seu desempenho e como o avaliam. As diferenças entre países estão não apenas naquilo que é aprendido explicitamente, mas na distinção, nas disposições e sensibilidades produzidas nas práticas sociais. Minha discussão anterior do vínculo entre trabalho e “lazer”, das homologias entre as disposições associadas com a pedagogia “construtivista” e outras transformações das sociedades industrializadas, bem como das diferenciações nacionais entre agrupamentos, apontava para o exercício do poder através da construção de estilos particulares de “pensamento” e “ação”. Assim, embora possamos falar de uma escola universalizada, como o fazem Meyer e seus associados (1992), para que possamos compreender como distinções e diferenciações são efeitos de poder, devemos historicizar a construção da pedagogia. Num diferente nível de discussões sobre o estado, tem sido comum rotular as mudanças como uma “restauração conservadora”, rótulos que, acredito, deixam de considerar os processos históricos de longa duração que subjazem a essas mudanças, algumas delas ocorrendo já nos anos 40 e 50 – bem antes de Thatcher na Grã-Bretanha ou Reagan nos Estados Unidos (Popkewitz, 1991; Whitty, no prelo). Se examinamos a atual retórica sobre os slogans neoliberais do “mercado” e da “privatização”, que surgiram como slogans políticos e que têm sido utilizados como conceitos científicos sociais, damo-nos conta de que as mudanças não começam com as políticas recentes mas são parte de mudanças sociais mais profundas, as quais têm ocorrido de forma desigual durante, pelo menos, as últimas quatro décadas. Num certo nível, há o colapso do compromisso fordista da Europa e dos Estados do pós-guerra. À medida que o fordismo perdia sua eficiência com tecnologias e mercados, ocorria também um colapso no compromisso entre trabalhadores, industriais e o estado, produzindo uma divisão e uma mecanização do trabalho, em troca de uma fórmula salarial favorável e da implementação de um sistema de estado do bem-estar. A reorganização do trabalho que estamos presenciando agora é, em parte, uma resposta à falta de eficiência da produção fordista de massa bem como das próprias novas tecnologias de produção. Mas as mudanças no governo não tem um única origem, que possa ser reduzida à “ideologia”, à economia ou à hegemonia: elas corporificam trajetórias históricas múltiplas. Há uma gama de outras contestações ao mecanismo de governo social que emergiram durante essas mesmas décadas, partindo de militantes das liberdades civis, feministas, radicais, socialistas, sociólogos e outros. Esses programas reorganizados de governo utilizam e instrumentalizam a multitude de experts de gerência, de vida familiar, de estilo de vida, que proliferaram nos pontos de intersecção das aspirações sócio-políticas e nos desejos privados de auto-promoção (Rose e Miller, 1992; 201). Se seguimos o argumento de Rose e Miller, o problema do estado é a constituição de práticas de governo. Essa posição contrasta com boa parte das análises contemporâneas, que definem o estado como um “objeto” que fornece poder, em vez de como um conjunto de relações através das quais o governo é produzido. É interessante observar aqui que ass discussões atuais sobre “trazer o estado de volta”, na teoria social e na teoria educacional, tendem a incorporar distinções historicistas e estruturais do século XIX às análises teóricas. As distinções evocam imagens do passado, que são inadequadas para compreender os cambiantes padrões de governo discutidos acima. (Para uma discussão geral das epistemologias do século XIX e da teoria social contemporânea, veja Wallerstein, 1991; em educação, Popkewitz, no prelo).
Algumas notas de conclusão
Meu interesse no estado concentra-se em considerar o
problema do governo na educação como relacional, histórico e comparativo. Duas estratégias diferentes, mas relacionadas, orientaram este ensaio. Uma delas está relacionada ao conceito de arena educacional. A idéia de arena dirige a atenção para a posição dos diferentes atores como sendo análoga aos jogadores num jogo; é também importante reconhecer que alguns jogadores têm mais recursos e “capital”, no sentido de Bourdieu, que outros. Corporificado na noção de arena está um segundo movimento: a exploração da relação entre os atores e a construção de sistemas de regulação. Esse conceito baseia-se na noção de “governamentalidade” de Foucault, para dirigir a atenção para as regras do jogo que disciplinam a “razão” e o auto- governo de pessoas “razoáveis”. Embora o disciplinamento não seja totalmente coercivo, a produção de conhecimento posiciona e produz poder através dos princípios regulatórios aplicados como “razão” e “verdade”. O significado do estado está, pois, em relação com esses dois conjuntos de problemas empíricos à medida que mudam ao longo do tempo e em múltiplos níveis. Rússia, África do Sul, Suécia e Estados Unidos forneceram exemplos de mudanças nas relações que constituem sua arena educacional. Meus exemplos focalizaram os atores que estão autorizados a “falar” sobre o objeto e o sujeito da educação e as relações sociais nas quais a inteligibilidade que diz respeito ao falar é encontrada. A atenção se focalizou na proximidade entre diferentes agrupamentos de atores na produção das categorias e das distinções. O estado, pois, foi tratado como uma categoria epistemológica, com a finalidade de se considerar empiricamente os padrões de governo. Minha preocupação, entretanto, não é apenas com padrões de relação, mas também com práticas de governo, vistas como sistemas de produção de inclusão/exclusão. O governo para incluir/excluir se dá através do raciocínio que é aplicado e não através de qualquer sistema “explícito” de exclusão. Aqui, a atenção à “razão” como um efeito do poder é uma contribuição importante da teoria feminista e das análises políticas pós-modernas para nossa compreensão das micropráticas da escolarização. Três diferentes dimensões no estudo das políticas públicas, do poder e da escolarização podem agora ser discutidas. Em primeiro lugar, não podemos pressupor que os atores e suas posições na arena educacional são categorias estáveis e fixas. As categorias de atores são, elas próprias, às vezes, efeitos de poder. Além disso, os atores na arena educacional não constituem grupos monolíticos e universalizados, mas são, em vez disso, agrupamentos historicamente formados e reformados. Na verdade, o agrupamento e a posição dos atores muda realmente ao longo do tempo mesmo que seus rótulos permaneçam os mesmos. Como um exemplo, embora possamos dizer que os pesquisadores educacionais são posicionados na arena na qual o poder é produzido, aqueles agrupamentos e posições mudam à medida que os padrões regulatórios são reconstituídos. Nesse sentido, não existem atores velhos nem novos que detêm o poder, mas apenas padrões de relações. A produção de poder, pois, pode ser compreendida em relação aos padrões nos quais o ator é construído e reconstituído. Embora a maior parte das análises da política da reforma apliquem conceitos estruturais de poder (isto é, questões sobre quem domina sobre quem é dominado), as subjetividades na arena educacional são formadas através de um amálgama de idéias, tecnologias e relações que são historicamente contingentes. Em outras palavras, os “razoáveis” burocratas governamentais que “monitoram” as reformas, a comunidade de pesquisa educacional que produz sistemas de reflexão e auto-reflexão, assim como o professor e as crianças que classificam suas práticas não são, como poderia parecer, categorias universais e neutras; estão, em vez disso situadas no tempo e no espaço. A recusa em tornar o sujeito problemático é uma das principais dificuldades das políticas públicas e dos estudos educacionais. Meu segundo foco está na pedagogia como uma tecnologia de poder. A pedagogia vincula racionalidades políticas com auto-exame autônomo, auto-reflexão e autocuidado do indivíduo. Mas sua importância no problema do governo está não apenas na produção. Isso ocorre, como argumentei, através de práticas de normalização que aplicam disposições e sensibilidades “locais” como universais e “naturais” para todas as pessoas. As normalizações e práticas de inclusão/exclusão na pedagogia não deveriam ser vistas como um epifenômeno de outras e mais primárias “causas”. A exploração de homologias na política, na arte, na economia e na arena educacional bem como nas tecnologias de governo da pedagogia construtivista sugerem relações que não são relações de correspondência ou processos evolutivos, mas constituem trajetórias históricas múltiplas, nas quais são construídas tecnologias que governam as subjetividades, não tendo uma única origem. Retorno, pois, ao ponto do qual parti. Discussões sobre restaurações conservadoras, privatização e mercado, estado/sociedade civil obscurecem as mudanças que ocorrem através dos sistemas de raciocínio que são aplicados. Essas categorias são freqüentemente construídas no interior de um campo de retórica política e são trazidas para as ciências sociais e educacionais como distribuições que explicam os fenômenos. O “raciocínio” aplicado, entretanto, supõe o estado como uma “entidade real”, com atores estáveis. Além disso, essas análises pressupõem aquilo que elas deveriam problematizar – isto é, a questão do estado como governo. Deixa-se de examinar a reunião de atores, técnicas e imagens que se interseccionam na construção do governo. Essa reunião não é nem evolutiva nem estrutural, mas historicamente contingente. Argumentei que existem mudanças de longo prazo nos problemas de governo, os quais exigem diferentes distinções analíticas para interpretar as alternativas oferecidas que não sejam aquelas do estado como uma entidade soberana relacionada ao território. Embora esteja claro que a retórica moral e política das lutas educacionais têm mudado, essas análises deixam de examinar as mudanças nas condições históricas através das quais o poder é construído e exercido. Outra vez, se as discussões comparativas sobre homologias entre política, arte, ciência, economia e educação e as construções das arenas educacionais entre diferentes nações são historicamente apropriadas, o que estamos agora presenciando na arena escolar são mudanças que envolvem movimentos desiguais de longa duração em múltiplas arenas, bem antes que Reagan e Thatcher chegassem ao poder. Notas
1. Este ensaio foi originalmente escrito para uma
conferência dada na Universidade de Granada, Espanha. Gostaria de agradecer as seguintes pessoas pelos comentários feitos enquanto eu o escrevia e o reescrevia: Lynn Fendler, Dory Lightfoot, Fran Varvus, Miguel Pereyra, Lizbeth Lundahl-Kallós, Daniel Kallós, Michael Shapiro, Ingrid Carlgren, Eva Astrom, Ulla Johannson, Christina Segerholm, Bob Tabachnick, Geoff Whitty e o grupo do Seminário na Pedagogik Instititionem, Umea University, Suécia, bem o Seminário das quartas-feiras, em Madison. Agradeço também os comentários de dois avaliadores anônimos do Journal of Education Policy. 2. Utilizo “arena” para pensar as práticas educacionais como ocorrendo num campo de relações cambiantes. Essas relações implicam posições entre atores e práticas discursivas. Utilizo “arena”, portanto, como um conceito histórico para considerar posições sociais e poder cambiantes na educação. O conceito é discutido em Popkewitz e Pereyra (1993). A noção de arena toma emprestada de Bourdieu (1984) o conceito de “campo”; e a noção de discurso está relacionada aos argumentos de Foucault (1979) sobre a ciência tanto como uma prática normalizadora quanto como uma prática disciplinadora. Minha forma particular de relacionar esses dois conceitos é discutida como uma epistemologia social em Popkewitz (1991). 3. Utilizo a noção de ator para falar sobre agrupamento social na arena. Não estou preocupado com atores no sentido individual ou na perspectiva da teoria estrutural. 4. Para citar umas poucas estatísticas ilustrativas em educação (Kallós, 1995): em 1957 ainda havia 2.700 municipalidades; em 1995, havia apenas 286. Em 1967, o Ministério da Educação tinha um corpo de 90 funcionários, o Conselho Nacional de Educação tinha 550 e o Departamento de Administração das Universidades tinha cerca de 100. Em 1977, destinou-se ao Conselho Nacional de Educação 60% de todo o orçamento educacional. 5. Nos Estados Unidos, por exemplo, as ciências educacionais receberam “pressões” institucionais, através de seus vínculos com as escolas normais, durante o período de rápida expansão da escolarização de massa na volta do século e durante a I Guerra Mundial, na qual havia uma grande demanda por disciplina militar. Os psicólogos estavam profundamente envolvidos nos problemas de recrutamento e treinamento, bem como na busca de formas para desenvolver disposições pacíficas e democráticas, após a guerra (para esse último ponto, veja Freedman, 1987; também, O’Donnel, 1985). 6. É interessante observar que muitos países escandinavos têm uma tradição germânica, na qual a palavra “profissão” tendia a não ser usada em falas sobre ocupações educadas tais como direito ou medicina. Além disso, a forte tradição de governo centralizado tendia a tornar as ocupações educadas mais estreitamente vinculadas ao governo, com uma sociedade civil menos autônoma. É também importante observar que estava oculta nos discursos das profissões a relação entre o governo e o desenvolvimento do capitalismo, de um lado, e questões de gênero, de outro (Popkewitz, 1993a). 7. Minha suposição, tomada de empréstimo de Giddens (1990), é a de que o conhecimento profissional exerce um importante papel na mediação entre mudanças sociais e mudanças nas quais a pessoa interpreta e age na modernidade. Além disso, também vejo o conceito de profissionalismo como um conceito particular, associado com desenvolvimentos estatais (Popkewitz, 1993a). 8. Para uma discussão de distinções nas tradições da didática nos Estados Unidos, Alemanha e Suécia, veja Hoffmann e Riquarts (1995). 9. Essa discussão é extraída de Popkewitz (1991, 1993b). 10. Meu envolvimento na educação russa começou em 1976, quando freqüentei um Seminário russo-americano em Washington, que continou em 1981, quando, com uma bolsa da Fulbright, passei um semestre na Academia Soviética de Ciências Pedagógicas, um contato que continua até o presente. Minhas observações sobre a África do Sul estão relacionadas com uma bolsa da Fundação Oppenheimer que me foi concedida para dar conferências em universidades e para realizar encontros com suas comunidades acadêmicas em maio e junho de 1993. Forneço essas “credenciais” com grande hesitação, reconhecendo que as situações nesses países é muito mais complexa do que dou a entender aqui. 11. Os russos tiveram que criar leis com as quais não tinham nenhuma experiência desde as primeiras décadas do século: sobre propriedade privada, bancos, finanças, falências, escolas privadas, etc. 12. Para úteis discussões sobre as mudanças na África do Sul, veja Muller e Cloete (1993); na Rússia, Kerr (no prelo). 13. A racionalização que envolveu vários conjuntos de atores na construção da regulação pode ter sido necessária apenas para prevenir uma guerra civil, a qual, até agora, tem sido bem-sucedida. 14. Durante as negociações políticas entre os partidos sul- africanos, um membro do sindicato docente comentou comigo que grande parte da discussão sobre reestruturação do sistema educacional usava categorias relacionadas às prioridades do Banco Mundial. Embora o Banco não estivesse envolvido nas reformas sul-africanas até o período de transição, o Banco, pensava o sindicalista, era parte do horizonte de negociações. Os dois principais partidos queriam ser capazes de dizer ao eleitorado que eles tinham acesso ao dinheiro do Banco Mundial para efetuar essa reestruturação. 15. Nesses países, há diferentes rótulos para a pesquisa didática, que podem obscurecer uma estruturação epistemológica similar do conhecimento didático; ao mesmo tempo, precisamos estar conscientes de que os conceitos sobre a reforma em cada contexto nacional são articulados a diferentes tradições estatais de solução de problema e em diferentes conjuntos de relações nas quais a arena educacional é formada. Nos Estados Unidos e na Rússia, por exemplo, há fortes tradições de pesquisa construtivista que estão associadas com pesquisadores de alto status que anteriormente estudavam a aprendizagem, mas não o ensino e a formação docente. Aquilo que é chamado de “construtivista” nos Estados Unidos tem um rótulo diferente na Rússia. A discussão russa está colocada em torno de uma longa tradição de pesquisa didática que está relacionada com “atividades de conhecimento” e com o trabalho do psicólogo Lev Vygotsky. Isso impõe nuances que são diferentes da discussão encontrada nos Estados Unidos, onde a tradição psicológica russa é trazida para as psicologias construtivistas que são também empregadas para dirigir a didática escolar. Os Estados Unidos mantêm um legado que deve muito a Piaget. Em ambas as tradições de pesquisa, a americana e a russa, não existe qualquer distinção entre o esforço reformista na pesquisa e na ciência (por exemplo, Popkewitz, no prelo). Os Estados Unidos fornecem um outro contraste interessante com a maior parte das discussões intelectuais européias. Enquanto o construtivismo é posicionado como um problema de psicologia nos Estados Unidos e historicamente posicionado em relação a uma pesquisa utilitária americana, o construtivismo europeu tende a ser social e histórico. Veja o trabalho de Bourdieu e Wacquant (1992). Embora haja debate interno com o movimento de reforma pedagógica sobre “construtivismo”, existem também certas regras epistemológicas gerais que dominam as discussões americanas. 16. Quando se observa os títulos das pesquisas nos encontros da American Educational Research Association, ao longo dos últimos cinco anos, ou a literatura atual sobre reforma escolar, ou as discussões sobre “reforma sistêmica”, há uma forte presença do pressuposto de que as práticas de reforma exigem uma abordagem “construtivista”. 17. Embora possamos entender o adjetivo “construtivista” como englobando muitas e diferentes visões sobre ensino e aprendizagem, há regras e padrões epistemológicos particulares a partir dos quais se deriva a diversidade. Minha utilização do adjetivo “construtivista”, portanto, tem o objetivo de focalizar as regras e padrões gerais, prestando uma atenção apenas parcial a suas distinções internas. Sob certos aspectos, meu foco no construtivismo pode ser vinculado à discussão de Thomas Kuhn (1970), sobre a solução de problemas como um paradigma de “ciência normal”. 18. Tiro essa distinção de uma discussão da Organização Internacional do Trabalho sobre as características cambiantes das habilidades do trabalho metalúrgico. Eles comparam as novas condições de trabalho com as de um modelo “fordista” que se centrava nas competências do trabalhador e não em suas capacidades. Embora eu utilize essa formulação, meu objetivo é assinalar mudanças que são tanto sociais e culturais quanto econômicas. Muitas dessas mudanças, como argumenta Wagner, ocorrem no interior de movimentos sociais que não podem ser reduzidos a mudanças econômicas (Wagner, 1994). 19. Poderia parecer que a iniciativa individual e a cooperação são mutuamente exclusivas, mas qualquer pessoa que tenha conhecido a pesquisa russa durante as últimas décadas sabe que as duas podem, na verdade, coexistir (Roubtsov, 1991). 20. A mobilização de intelectuais é evidente, se consideramos o movimento historicamente. Enquanto, anteriormente, apenas as elites da vida intelectual se movimentavam nos círculos internacionais, ela se tornou, hoje, muito mais comum; o programa ERASMUS, da Comunidade Européia, é um reconhecimento oficial dessa mobilidade. Pode-se também examinar a utilização crescente do inglês como a lingua franca das comunidades científicas, bem como as crescentes e rápidas traduções de textos científicos sociais do inglês e para o inglês. 21. Utilizo a palavra “homologia” para sugerir uma relação histórica entre eventos e discursos. Não tem o significado de relação causal. 22. Reconheço que os apelos em favor de uma educação e de um currículo multiculturais que valorizam a diversidade cultural têm múltiplas agendas, ao reorganizar os padrões de governo das subjetividades produzidas na escolarização. Meu argumento é que as práticas discursivas são localizadas no interior de regras de raciocínio pedagógico que posicionam a criança como o “outro” no interior de uma mesmidade. Por exemplo, veja Young (1990), para uma discussão dessa noção de colonização que atravessa tanto os discursos liberais quanto os da esquerda. 23. Essas diferenças são a produção de diferentes habituses e ocorrem através de distinções e “maneiras” disponíveis aos diferentes grupos, desde gostos sobre o que se come, se lê, se vê, se compra, se fala e é “visto” como valorizado e útil. São encontrados nos “gostos” que temos na leitura de jornais, nos filmes que vemos, nos livros que compramos, bem como naquilo que comemos e nas maneiras de comer. Essas sensibilidades, distinções e diferenciações controem poder.
Referências bibliográficas
APPIAH, K. In my Father's House; Africa in the
Philosophy of Culture. Nova York: Oxford University Press, 1992. BADIE, B. e BIRNBAUM. R Sociology of the state revisited. International Social Science Journal, 139, pp. 151- 167, 1994. BALL, S. Foucault and Education: Disciplines ant Knowledge. Londres: Routledge, 1990. BARRETT, M. e PHILLIPS, A. Destabilizing Theory: Contemporary Feminist Debates. Stanford: Stanford University Press, 1992. BARTH, R. The principal and the profession of teaching. The Elementaty School Journal, 86, pp. 471-492, 1986. B0URDIEU, R. Distinction: A Social Critique of the Judgment of Taste. Cambridge: Harvard University Press, 1984. BOURDIEU, P. e WACQUANT, L. An Invitation to Reflexive Sociology. Chicago: University of Chicago Press, 1992. BOYER, R. (1989) The capital labor relations in OECD countries: From the Fordist 'golden age' to contrasted national trajectories. In J. Schor (org.). Capital Labor Relations, 1989. BUTLER, J. Bodies that Matter: On the Discourse Limits of 'Sex'.Nova York: Roudedge, 1993. CARLGREN, I. Professional cultures in Swedish teacher education. In A. Goodson e A. Hargreaves (orgs.). Professional Lives. Londres: Falmer Press, no prelo “a”. CARLGREN, I. National curriculum as social compromise or discursive politics: some reflections on a curriculum- making process, Journal of Curriculum Studies, no prelo “b”. CARNOY,M.; FENDLER, L.; POPKEWITZ, T.; TABACHNIK, B. e ZEICHNER, K. Teacher Reestructuring: Some Trends and Implications. Genebra: Organização Internacional do Trabalho, no prelo. CAZDEN, C Classroom discourse. In M. Wittrock (org.). Handbook of Research on Teaching 3ª ed. Nova York: Macmillan), pp. 432 463, 1986. CELIS, C. The fight over national standards. Eductional Lfe: The New York Times, 1º de agosto, pp. 14-16, 1993. CRARY, J. Techniques of the Observer: On Vision and Modernity in the Nineteenth Century. Cambridge, MA: MIT Press, 1990. DONALD, J. Sentimental Education: Schooling, Popular Culture and the Regulation of Liberty. Londres: Verso, 1992. DONZELOT, J Pleasure in work. In G. Burchell, C. Gordon e P. Miller (orgs.) The Foucault Effect. Studies in Governmentality. Chicago: University of Chicago Press, pp. 251 280, 1991. DUMM, T. The new enclosures: racism in the normalized community In R. Gooding Williams (org.). Reading Rodney King: Reading Urban Uprising. Nova York: Routledge, pp. 178-195, 1993. FISHER, D. Fundamental Development of the Social Sciences: Rockefeller Philantropy and the United States Social Science Research Council. Ann Arbor, MI: University of Michigan Press, 1993. FOUCAULT, M. Governmentality. Ideology and Consciousness, 6, pp. 5 22, 1979. FREEIDMAN, K. Art education as social production: culture, society and politics in the formation of the curricu¬lum. In T. Popkewitz (org.) The Formation of School Subjects: The Struggle for Creating an American Institution. Londres: Falmer Press), pp. 63-84, 1987. FUKUYAMA, F. Trust: The Social Virtues and the Creation of Prosperity. Nova York: Free Press, 1995. GIDDENS, A. The consequences of Modernity. Stanford: Stanford University Press, 1990. HERTFELD, M. The Social Production of Indifference: Exploring the Symbolic Roots of Western Bureaucracy. Chicago: University of Chicago Press, 1992. HOFFMANN, S. e RIQUARTS, K. Starting a dialogue: issues in a beginning conversation between Didaktik and the curriculum traditions. Journal of Curriculum Studies, 27, pp. 3 12, 1995. HOLMES GROUP. Tomorrow's Teachers. East Lansing: Holmes Group, 1986. HOLMES GROUP. Tomorrow’s Schools. East Lansing: Holmes Group, 1990. HUNTER, I. Rethinking the School: Subjectivity, Bureaucracy and Criticism. Nova York: St. Martin's Press, 1994. KELLY, D. Reflections on decentralization as a concept in education policy analyses. Paper presented at the Second Comparative Education Policy Seminar: New Policy Contexts for Education: Suécia e Grã-Bretanha, Centre for Educational Studies, King's College, Londres, 27 a 29 abril, 1995. KALLÓS, D. e LUNDAHL KALLÓS L. Recent changes in teachers’ work in Sweden: professionalization or what? In D. Kallós e S. Lindblad (orgs.) New Policy Contexts for Education: Sweden and United Kingdom. Umea, Suécia: Pedagogiska institutionen, Umea universitet, pp. 140 168, 1994. KALLÓS, D. e NILSSON, I. Defining and redefining the teacher in the Swedish comprehensive school. Educational Review, 47, pp. 173-188, 1995. KALLÓS, D. e SELANDER, S. Teacher education and teachers' work in Sweden: reform strategies and professional reorientation. In T. Popkewitz (org.). Changing Patterns of Power: Regulation and Teacher Education Reform. Albany: State University of NewYork Press, pp. 211 262, 1993. KERR, S. T. When the center cannot hold: the devolution and evolution of power, authority and responsibility in Russian education. In T. Popkewitz e A. Kazamias (orgs.). Educational Knowledge: Changing Relations Between the State, Civil Society and the Educational Community. Albany: State University of New York Press, no prelo. KUHN, T. Structure of Scientific Revolutions, 2ª ed. Chicago: University of Chicago Press, 1970. LAGEMANN, E. The Politics of Knowledge: The Carnegie Corporation, Philantrophy, and Public Policy. Middletown: Wesleyan University Press, 1989. LLOYD, C. The methodologies of social history: a critical survey in defense of structurism. History and Theory: Studies in the Philosophy of History, 30, pp.180 219, 1991. MARSHALL, J. Needs, interests, growth and personal autonomy: Foucault on power. In W. Kohli (org.). Critical conversations in Philosophy of Education. NovaYork: Routledge, pp. 364-378, 1995. MEYER, J.; RAMIREZ, J. e SOYSAL, Y. World expansion of mass education, 1870 1980. Sociology of Education, 65, pp. 128 149, 1992. MULLER, J. e CLOETE, N. Out of Eden: modernity, post apartheid and intellectuals. Theory, Culture and Society, 10, pp.155 172, 1993. NEWMANN, F.; GRIFFIN, D. e COLE, M. The Construction Zone: Working for Cognitive Change in Schools. Cambridge: Cambridge University Press, 1989. O'DONNEL, J. The Origins of Behaviorism: American Psychology, 1876-1920. Nova York: New York University Press, 1985. POPKEWITZ, T. A Political Sociology of Educational Reform: Power/Knowledge in Teaching, Teacher Education, and Research. Nova York: Teachers College Press, 1991. POPKEWITZ, T. Professionalization in teaching and teacher education: some notes on its history, ideology and potential. Teacher and Teacher Education, 10, pp. 1 14, 1993a. POPKEWITZ, T. US teacher education reforms: regulatory practices of the state, university, and research. In T. Popkewitz (org.). Changing Patterns of Power: Social Regulation and Teacher Education Reform. Albany: State University of New York Press, pp. 263-302, 1993b. POPKEWITZ, T. Systems of ideas in social spaces: postmodemism conditions, and cultures/history in a Vygotskian psychology. In V. Rubstov (org.) Cultural and Historical Theory of 1. Vygotsky: The Past, The Present and the Future. Moscou: Russian Academy of Education Sciences (em russo), no prelo. POPKEWITZ e BRENNAN, M. Restructuring social and political theory: Foucault, and a social epistemol¬ogy of school practices. In T. Popkewitz e M. Brennan (orgs.) Governnentality through Education: Foucault's Chadlenge to the Institution, Production and Study of Knowledge. Nova York: Teachers College Press, no prelo. POPKEWITZ, T. e LIND, K. Teacher incentives as reform: implications for teachers' work and the changing con¬trol mechanism in education.Teachers College Record, 90, pp. 575 594, 1989. POPKEWITZ, T. e PEREYRA, M. An eight country study of reform practices in teacher education: an outline of the problematic. In T. Popkewitz (org.) Changing Patterns of Power: Social Regulation and Teacher Education Reform. Albany: State University of New York Press, pp.1 52, 1993. ROSE, N. e MILLER, P. Political power beyond the state: problematics of government. British Journal of Sociology, 43, pp. 173 205, 1992. RUBTSOV, V, Learning in Children: Organization and Development of Cooperative Actions, organizado por L. Martin, trad. M. J. Hall. Nova York: Nova, 1991. SHAPIRO, M. Reading the Postmodern Polity: Political Theory as Textual Practice. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1992. SKOWRONEK, S. Building a New American State: The Expansion of National Administrative Capacities, 1877 1920. Nova York: Cambridge University Press, 1982. SMITH, M. e O'DAY, J. Systemic school reform. Politics of Education Association Yearbook, pp. 233 267, 1990. SOUSA SANTOS, B. Toward a New Common Sense: Law, Science and Politics in the Paradigmatic Transition. Nova York: Routledge, 1995. TOULMIN, S. Cosmopolis, the Hidden Agenda of Modernity. Nova York: Free Press, 1990. WAGNER, P. Sociology of Modernity: Liberty and Discipline. Nova York: Routledge, 1994. WHITTY, G. New school for new times? Educational reform in a global context. In T. Popkewitz e A. Kazamias (orgs.) Educational Knowledge: Changing Relations Between the State, Civil Society, and the Educational Community. Albany: State University of NewYork Press, no prelo. YOUNG, R. White Mythologies: Writing, History and the West. Nova York: Routledge, 1990. YOUNG, R. Colonial Desire: Hybridity in Theory, Culture and Race. Londres: Routledge, 1995. ZAKARIA, F. Bigger than the family, smaller than the state: are voluntary groups what make countries work? Book Review, New York Times, 13 de agosto, Seção 7, pp. 1, 25, 1995. ZERUBAVEL, E. The fine Line: Making Distinctions in Everyday Life. Chicago: University of Chicago Press, 1993.