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NOVOS VALORES
PARA UMA NOVA ERA
Por Daisaku Ikeda,
Presidente da Soka Gakkai Internacional
NOVOS VALORES
PARA UMA NOVA ERA
Neste 80º aniversário da Soka Gakkai e 35º tunidades de emprego, em virtude da ênfase na po-
aniversário de fundação da Soka Gakkai Interna- lítica de energia renovável.
cional (SGI), minha primeira palavra é de soli- O sistema financeiro mundial, então à beira do
dariedade às vítimas do devastador terremoto no colapso, estabilizou-se graças às ações políticas coor-
Haiti. Oro ardentemente por todos os afetados e con- denadas de vários governos. Contudo, isso resultou
fio que a comunidade internacional reúna esforços em deficits orçamentários massivos e a situação de
de auxílio à reconstrução do país. emprego permanece calamitosa.
Quero sugerir algumas NASA Profundas são as raí-
formas eficazes para a zes da crise. Tudo indica
construção de um mundo que uma recuperação ple-
de paz, minha constante na ainda está distante.
preocupação. Faz um ano Existe, sim, a possibili-
que Barack Obama tomou dade de uma “recessão
posse como presidente dos dupla”, como a da Gran-
Estados Unidos. Sob a de Depressão dos anos 30.
bandeira da “mudança”, O presidente Obama
a eleição do primeiro pre- impulsiona uma transfor-
sidente afro-americano mação fundamental na
dos Estados Unidos criou questão das armas nuclea-
grandes expectativas nos res — produto demonía-
povos do mundo. co da civilização científi-
A recessão global, pe- co-tecnológica moderna.
la falência do banco de in- No discurso de Praga, Re-
vestimentos Lehman Brothers, em setembro de 2008, pública Tcheca, em abril de 2009, falou da respon-
alimentou ainda mais as esperanças de que alguma sabilidade moral dos Estados Unidos por ser o úni-
mudança seria anunciada pelos Estados Unidos. O co país a usar bombas atômicas na guerra. Obama
Ato Americano de Recuperação e Reinvestimento, clamou por um mundo liberto dessas armas, geran-
assinado no mês seguinte à posse de Obama, atraiu do novo ímpeto aos esforços para o desarmamento,
a atenção de todos, como um processo de novas opor- paralisados há muito tempo.
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A abolição dessas armas é Jossei Toda, segundo presidente da Soka Gakkai e dividuais para alcançar gran-
uma questão antiga, de extre- autor da Declaração pela Abolição das Armas Nucleares des objetivos. Expectativas po-
ma importância para mim: dem ser frustradas. Espero que
compromisso que mantenho a comunidade internacional
com meu mestre, o segundo assuma esses desafios, sem
presidente da Soka Gakkai, perder de vista o seu ideal du-
Jossei Toda (1900-1958). Não rante a luta para vencer todas
me canso de enfatizá-la nos as dificuldades.
meus encontros com intelec-
tuais e líderes políticos ao lon- Perda de valores
go dos anos. Em 8 de setem-
bro de 2009, lancei a propos- Quero me deter numa
ta “Construindo a Solidarie- questão profunda: o pessimis-
dade Global pela Abolição das mo. Ou ainda: o niilismo que
Armas Nucleares” para cele- permeia a sociedade contem-
brar o brado cinquentenário porânea.
de Toda pela eliminação des- O niilismo é comu- WI K
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DIA
sas armas apocalípticas. mente atribuído a
Elas representam os impulsos negativos mais pro- Friedrich Nietzsche (1844-1900) por
fundos do coração humano, em toda a história de sua afirmação da morte de Deus. Con-
nossa espécie. Sei que eliminá-las é tarefa difícil. vém notar, entretanto, que não se tra-
É ilusão esperar progressos rápidos. Como o próprio ta de um fenômeno exclusivamente
presidente Obama advertiu ao receber o Prêmio No- europeu. Tem genealogias múltiplas no
bel da Paz: pensamento oriental. Uso aqui o termo em re-
ferência à patologia da civilização que paira como
A não violência de Gandhi e Luther um miasma sobre o desolado panorama hu-
King pode não ter sido possível nem mano ferido pelas contradições da globa-
é aplicável em certas circunstân- lização. Essa tendência é visível no Ja-
cias, mas o amor que pregaram — pão, no teor quase sempre pessimista do
a fé no progresso humano — deve discurso. A razão disso, acredito, não se
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sempre guiar nossa jornada. ©
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limita ao fim da era de consistente cresci-
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ONGRESS mento econômico.
Como Gandhi observou, “O bem Essa decadência é caracterizada pelo pessimis-
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viaja com velocidade de lesma”. mo e niilismo que difere da experiência das pessoas
É, portanto, vital manter uma po- durante a Grande Depressão da década de 1930,
sição flexível e persistente; evi- quando o socialismo era colocado como alternativa
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tar prejulgamentos de políticas in- para o sistema em vigor. O atual pessimismo pare-
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ce o oposto da energia frenética de uma bolha in- ção profunda de nossas prioridades.
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flacionária, mas na realidade, é simplesmen- RAMA O objetivo básico da civilização moder-
te um aspecto daquelas contradições. na é fazer da capacidade econômica — a
O cientista político francês Emmanuel habilidade para o maior lucro possível e
Todd faz a seguinte análise do que cha- o acúmulo de riqueza — o critério único
ma de “culminação lógica” da globaliza- do valor humano. Esta tendência crônica
ção centrada das finanças: “Ao querer ‘li- da civilização capitalista moderna — ali-
bertar o indivíduo’ de qualquer pressão coleti- mentada pela expansão sem limites da ambição
va, só conseguiu fabricar um anão amedrontado e — permanece essencialmente incorreta mesmo de-
desanimado, que procura a segurança na diviniza- pois do experimento devastador do comunismo so-
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ção e no entesouramento do dinheiro”. viético. Quase quarenta anos depois da advertência
O reverso do mamonismo (culto do dinheiro) é, do Clube de Roma com Os Limites do Crescimento,
em outras palavras, o niilismo. Aspectos que pare- a humanidade já precisa aprender com as lições da
cem diametralmente opostos são, na realidade, gê- atual recessão global e reconhecer essa patologia.
meos nascidos da civilização moderna. São produ- Sejamos conscientes: o padrão de valores que
tos desta era que poderia ser chamada de “era da avalia a qualidade humana a partir de termos eco-
perda de valores”. Nenhuma outra medida é reco- nômicos é o que Todd chama de sistema de valor de
nhecida além da monetária. Até mesmo discussões mediocridades. Ou melhor, de total ausência de va-
de aspectos negativos da globalização, como a po- lores. Precisamos perguntar a nós mesmos pelas ra-
breza e a disparidade de renda, são consideradas zões do pessimismo e do niilismo tão difusos em so-
em termos de valores monetários, tornando-os im- ciedades industriais avançadas, onde o padrão de
produtivos e desumanos. vida avaliado em termos rigorosamente materiais,
A crescente desigualdade de renda é inegável. superam monarquias e aristocracias do passado.
Não podemos fechar os olhos para tantas tragédias
que dela se originam, inclusive crimes e suicídios. Refreando a cobiça
Há muito tempo saliento que existe uma clara res-
ponsabilidade política para enfrentar a situação. As maiores forças que levam ao desenvolvimen-
Medidas legais e sistêmicas para manter uma rede to da civilização moderna são a ciência e a tecnolo-
de segurança social são exigências dos valores éti- gia. Yoshiharu Izumi, cientista que explora a rela-
cos, como equidade e justiça, sobre os quais toda ção entre religião, o budismo em particular, e a ciên-
ordem social próspera repousa. Contudo, minha preo- cia, afirmou: “A humanidade busca um modo de vi-
cupação maior é com o precário resultado dos es- da estável e seguro, com a religião servindo de vo-
forços para melhorar as condições físicas e tangí- lante e freio para guiar e contrabalançar o acelera-
veis. Porque só combatem os sintomas. O funda- dor da ambição que carrega o motor do intelecto”.4
mental é eliminar as causas. Para assegurar a efi- De fato, a civilização moderna e, em especial, o
cácia genuína e duradoura de nossa resposta é im- sistema capitalista moderno era, aos olhos de Max
prescindível um mergulho espiritual, uma reavalia- Weber (1864-1920), caracterizado por um modo de
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A/ mo contemporâneo reside no desenvol- o que realmente perturba não é a tecnologia em si,
vimento potencial de formas extremas mas a absurda resposta, totalmente inadequada, que
de biotecnologia, como a engenharia damos aos desafios que ela apresenta.
genética de células germinativas.
Francis Fukuyama (Nosso Futu- 350
A linguagem e os
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ro Pós-Humano: Consequên- valores do bem
cias da Revolução da Biotecnolo-
gia) e Bill McKibben (Enough: Staying A filósofa francesa Simone Weil (1909-
Human in na Engineering Age) estão en- 1943) escreveu em 1941 em tom de la-
tre os que sugerem a ostensiva possibili- mentação: ”As principais características
dade de um mundo “pós-humano”, em que da primeira metade do século 20 são o cres-
a herança espiritual acumulada em milênios cente enfraquecimento e o quase desapareci-
— moralidade e religião, cultura e arte — mento do conceito de valor”. Cita a obser-
serão insignificantes e sem valor. vação de Paul Valéry (1871-1945) de que
A engenharia genética pode, por pu- decaiu toda uma classe de palavras, es-
ro egoísmo das pessoas (o desejo de per- pecialmente as que se referem ao bem.
feição delas e de seus descendentes), atin- “Palavras como virtude, nobreza, honra,
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gir um nível de desenvolvimento que escapa PAULVALERY.F
honestidade, generosidade tornaram-se de uso
à nossa consciência. Assim, se a tecnologia das ar- impossível e ainda adquiriam significados adulte-
mas nucleares é considerada uma ameaça à exis- rados; a linguagem quase já não serve mais para
tência da humanidade, a manipulação de célu- enaltecer legitimamente o caráter humano”. Weil
las germinativas pode ser vista como um de- referiu-se a isso como “enfraquecimento do
safio à nossa humanidade, ameaça à in- senso de valor”.6
tegridade fundamental dos seres huma- A visão de Simone Weil assim como
nos. Envolvendo ambas as ameaças tec- a do filósofo contempo-
nológicas está a sombra escura do niilis- râneo Gabriel Marcel
mo, às vezes manifestando confiança arro- SIM
(1889-1973), incorpo-
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gante, outras vezes fria indiferença... ra verdades eternas. Po-
A ciência e a tecnologia divorciadas da questão demos aplicar facilmente as
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do valor estão sujeitas a não ter controle algum da conclusões de Weil para a nos-
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realidade e encerram a possibilidade de WIKIP
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sa atual situação. De fato, o mal JEA
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conduzir a sociedade a perigo mortal. que ela descreve tem se agravado. A guerra já
Numa era em que o acúmulo de co- representa a patologia humana de forma tão
nhecimento científico já atingiu o concentrada que o uso de armas de destrui-
ponto de não retrocesso, ganham re- ção em massa e de técnicas de terrorismo têm
levo as ideias de Martin Heidegger tornado essa violência quase que totalmente
(1889-1976) em relação à tecnologia — indiscriminada: nos impede de perceber o valor
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rá uma fonte” e também à declaração de Einstein: próprias tecnologias que criamos, oscilando descon-
“Minha eternidade é agora. Tenho apenas um interes- troladamente entre eufóricas bolhas econômicas,
se: cumprir com o meu propósito aqui onde estou”.11 pânico e desespero. A realidade será consumida por
Essa ideia coincide profundamente com a visão sua contraparte virtual. A principal função da reli-
do budismo. Conceitos fundamentais do Budismo gião é ajudar as pessoas a fincar os pés firmemen-
Mahayana — a simultaneidade de causa e efeito, a te no aqui e no agora, de tal maneira que percebam
correspondência do infinito passado com os Últimos a necessidade de corrigir o seu curso.
Dias da Lei, a iluminação imediata, a consecução do Na tradição budista, o caminho do bodhisattva é
estado de Buda na presente forma — não conforme um modo de vida dedicado ao compromisso social.
a passagem linear do tempo físico ou histórico, mas Está enraizado num senso de unicidade com a vida
que só podem ser compreendidos por meio de con- do cosmos, ao mesmo tempo, está comprometido
ceitos de tempo e espaço, diferentes daqueles que com a ação corajosa e o projeto de “viver bem”, do
estão na base da ciência no período moderno. agora para o porvir.
Como Nietzsche observa em seu ensaio “Uso e Einstein, ao buscar o sentimento religioso cós-
Abuso da História na Vida”, a ideia de um passado mico, manifestou a consciência e o caráter univer-
fixo ou de um futuro adicional condicionado pelo sal enquanto se dedicava às atividades pela paz.
tempo físico ou histórico é limitada: não pode in- Do mesmo modo, o pioneiro que decide se levantar
fluenciar no nosso modo de viver. Cada história, sozinho pela transformação da história está viven-
mesmo factual, torna-se estranha a nós, inadequa- do o momento presente, vitalmente comprometido
da à realidade da nossa vida. neste instante com a criação de valor. Ele é levado
No registro minucioso da interpretação de Niti- por impulsos irresistíveis de consciência e, frente
ren Daishonin (1222-1282) do Sutra de Lótus, ele ao rico espectro de possibilidades de espaço e tem-
diz: “Na palavra ‘desde’ (irai), o elemento i (já, ou po compreendido naquele seu momento, corajosa-
decorrido) refere-se ao passado, e o elemento rai mente gera a linguagem de valores do bem.
(porvir) refere-se ao futuro. O presente está incluí- Não há caminho fácil nem para aprender, nem
do nesses dois elementos i e rai”.12 É nada mais para realizar o bem. Não temos escolha, a não ser
que um instante no fluxo do passado para o futuro. assumir deliberadamente desafios difíceis, com os
Mas, este presente instante é uma realidade que pés fincados na realidade, aprimorando-nos inces-
compreende o infinito passado e o ilimitado futu- santemente na fornalha da alma. Este é o caminho
ro: fonte de energia mais profunda e essencial. É direto para a conquista do bem.
essa força que, embora sujeita ao passado, abre es- Como Marcel observou: há sempre uma tensão
peranças para o futuro. entre “a individualidade das circunstâncias e a uni-
Neste sentido, agora é o ponto de partida para versalidade da lei”. Considerou essa tensão “o pon-
tudo. O aqui e o agora são a base, o eixo, o princí- to crucial, a fonte” de valor.13 O budismo ensina: “O
pio e o fim de todos os aspectos da atividade huma- superficial é fácil de abraçar, o profundo é difícil”.14
na. Se perdermos isso de vista e basearmos a vida Esta frase brilha como eterno guia para a vida.
num mundo virtual, acabaremos como escravos das Para vencer essa tensão, essa fornalha, sem des-
13
vios é preciso disposição para buscar o profundo e nos A fornalha da luta espiritual
fortalecer dia a dia, mês a mês. Aqui encontramos a
tensão do coração que possibilita romper com a ten- ED
IA O filósofo espanhol José Ortega
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dência do ser humano a sempre buscar o caminho fá- y Gasset (1883-1955) usou o ter-
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cil, em vez da constante conquista da superação. mo “a vida da história” para
Tudo, em essência, é impermanente. A realida- descrever esta fornalha de in-
de é uma sucessão interminável de transformações. cessante luta espiritual e ofere-
Um adágio ensina que se você não vir alguém por três ceu a seguinte vívida descrição:
dias, espere o próximo encontro com mais esperan-
ça. Em outras palavras, a pessoa que se esforça pa- Não creio na absoluta determinação da
ra amadurecer, em apenas três dias, dá sinais de mu- história. Ao contrário, penso que toda vida
dança. Quem explora as profundezas, logo vai sen- e, portanto, a história, compõem-se de sim-
tindo as mudanças. Responderá a elas com acuida- ples instantes, cada um dos quais está rela-
de, sem deixar de avançar para a criação de valores. tivamente indeterminado em relação ao an-
Palavras como esperança, coragem, esforço, ami- terior, de modo que nele a realidade vacila,
zade e gentileza são qualidades de quem procura rom- piétine sur place, e não sabe bem como se
per as dificuldades, por um fu- decidir entre as várias pos-
turo melhor. Eis por que, em mi- sibilidades. Esse titubeio
nha palestra na Universidade metafísico proporciona a
de Harvard, em 1991, enfati- todo o vital essa inconfun-
zei a importância da contem- dível qualidade de vibra-
plação, do autoquestionamen- ção e estremecimento.15
to, por meio do qual a pessoa
alcança a sua própria essência Esse “titubeio metafísico”
e toma decisões que expres- não deve ser confundido com
sem estímulos internos e mo- falta de decisão. Indica a fon-
tivações da consciência. te de energia para rejeitar to-
Quando as pessoas de fé su- das as concepções fixas e es-
cumbem ao impulso de confiar forçar-se para encontrar o bem
cegamente e de atribuir total dentro de um estado de tensão,
responsabilidade às forças ex- marcado por uma “vibração e
teriores, nesse caso, a religião estremecimento”.
apenas serve de ópio e não é Faz lembrar a súplica de
capaz de ajudá-las na busca Brahma a Sakyamuni para en-
de um novo modo de vida — descrito no budismo sinar o Darma. Depois de atingir a iluminação,
como o caminho do Bodhisattva — como agentes de Sakyamuni relutou em ensinar o Darma sabendo
mudança capaz de transformar a era. quão profunda, misteriosa e insondável era a natu-
14
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po Myriel e um moribundo convencionalis- CA ENCYC DIA/NADA ça que divide barbárie e civilização.
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ta, sobre os respectivos clamores por justiça da Em meu encontro com o ex-presidente soviéti-
Igreja Católica e da Revolução Francesa. Quando o co, Mikhail Gorbachev, o homem que devolveu o
bispo pergunta ao convencionalista o que ele pen- debate e o diálogo à cultura política da União So-
sa de Marat [Jean-Paul Marat (1743-1793)] aplau- viética, concordamos com a importância de apren-
dindo a guilhotina, o segundo rebate perguntan- der e respeitar os outros e de nos adaptar à realida-
do ao bispo o que ele achava então de Bossuet de dos outros. De início, defini o niilismo como uma
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recusa ao sentido moral de valor, que nos compele tal até chefes de Estado; o total de árvores plantadas
a nos relacionar com as pessoas como indivíduos chega a mais de uma por habitante do planeta.
únicos e insubstituíveis. Por esta razão, acredito que Em 2008, o Pnuma lançou o programa “Rede
discernir a concepção que os outros têm da vida per- Clima Neutro”, que visa a zerar a emissão de ga-
mite a transformação de uma era enfraquecida do ses de efeito estufa. Várias nações e governos lo-
senso de valores e restaurar a linguagem do bem hu- cais, como também corporações, ONGs, universi-
mano. O fortalecimento de cada um, dia a dia, mês dades e instituições educacionais, estão participan-
a mês, é, portanto, um encorajamento incomparável do dessa rede. Embora seja verdade que negocia-
e insuperável para a tarefa de vencer o niilismo. ções intergovernamentais não tenham chegado a
acordo em Copenhague, esforços contínuos são fei-
Uma vida de contribuições tos para encontrar propostas baseadas em novas for-
mas de cooperação internacional, conduzidas por
Tomo a oportunidade para discutir várias pro- ações produtivas de indivíduos e organizações.
postas que, acredito, podem apoiar esforços que re- Para o encontro de soluções das questões globais,
solvam as crises atuais da humanidade e edi- 2010 será um ano crítico, com vários impor-
ficar uma nova ordem de paz e coexis- tantes encontros programados, incluindo
tência para o século 21. a Conferência das Partes para Revisão
A crise econômica tem causado do Tratado de Não Proliferação de Ar-
forte impacto na vida de cidadãos em mas Nucleares (TNP), em maio, e a
muitos países. Existe a preocupação reunião de cúpula especial sobre os
de que uma de suas consequências Objetivos de Desenvolvimento do
será a de um retrocesso dos esforços Milênio (ODMs), em setembro.
internacionais para solucionar ques- É importante lembrar que sempre
tões globais, como a pobreza e a degra- há um jeito, uma rota que leve ao topo da
dação ambiental. Precisamos evitar o ciclo Tsunessaburo Makiguti,
montanha mais elevada e ameaçadora. Ain-
em que crises dão surgimento ao pessimis- primeiro presidente da da que uma rocha escarpada se agigante
Soka Gakkai
mo, que por sua vez, gera novas crises. diante de nossos olhos, não podemos per-
Apesar de protelados os esforços para a criação der a coragem. Ao contrário, devemos continuar a per-
de uma estrutura internacional capaz de promover a severante busca de um caminho. O que mais se exige
redução dos gases de efeito estufa até 2013, isso não de nós é a imaginação, a capacidade de considerar as
significa que não houve progresso algum. Por exem- crises atuais como oportunidades para transformar fun-
plo, a campanha de plantio de árvores iniciada pelo damentalmente o curso da história. Reunindo a força
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente de vontade e a determinação, podemos converter de-
(Pnuma), em 2006, resultou, até o fim de 2009, no safios em estímulos para mudanças positivas.
plantio de 7,4 bilhões de árvores no mundo inteiro. Quando a Soka Gakkai foi fundada em 1930, o
Esse trabalho tem a participação de milhões de ci- Japão e o mundo encontravam-se abalados devido
dadãos, desde alunos de escolas de ensino fundamen- ao impacto da crise financeira. Alastrava-se o medo
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nha antiga convicção de que devemos lutar contra o bombas atômicas que devastaram as duas cidades
verdadeiro inimigo, que não são as armas nucleares — que efetivamente marcariam o fim desses instru-
propriamente ditas, nem os Estados que as possuem mentos de morte.
ou as fabricam. O inimigo mais perigoso é o pensa-
mento que justifica a existência de armas — a faci- Expandindo as estruturas
lidade de aniquilar os outros transformados em amea- contra as armas nucleares
ça ou obstáculo à realização de nossos objetivos.
Desejo que minhas propostas sejam passos para Até agora, as Zonas Livres de Armas Nucleares
vencer e mudar o pensamento que justifica o uso (NWFZ) têm trabalhado para preencher a lacuna
das armas atômicas, bem como para fortalecer o ím- deixada na estrutura legal pela falta de tratados ou
peto para a abolição delas. convenções que proíbam o uso de armas nucleares.
O primeiro passo seria expandir, a partir do sis- Em 2009, tratados de NWFZ entraram em vigor na
tema do TNP, estruturas com bases institucionais Ásia Central e na África. Estes acordos similares
que obriguem clara e legalmente o não uso de ar- abrangeram a América Latina e o Caribe, o Pacífi-
mas nucleares, eliminando assim a sua função de co Sul e o Sudeste Asiático. A decisão de tantos go-
segurança nacional. vernos de várias regiões do mundo para eliminar os
O segundo passo seria a inclusão da ameaça ou arsenais nucleares é realmente significativa.
do uso de armas nucleares entre os crimes de guer- O prêambulo do TNP, que entrou em vigor há qua-
ra sob a jurisdição do Tribunal Penal Internacional renta anos, apela aos signatários a “empreender to-
(TPI), deixando claro que essas armas jamais de- dos os esforços para afastar o risco de uma guerra e
vem ser usadas. tomar medidas para resguardar a segurança dos po-
O terceiro passo seria criar um sistema funda- vos”.18 Apesar disso, os Estados com armas nuclea-
mentado na Carta das Nações Unidas para que a As- res não cumpriram essa obrigação.
sembleia Geral e o Conselho de Segurança traba- O TNP, obviamente, não confere a esses países
lhem juntos visando à completa eliminação das ar- o menor direito de possuir essas armas. Contudo, a
mas nucleares. adesão contínua destes ao sistema de coibição nu-
Reconheço que não é fácil pôr em prática nenhu- clear resultaram no incentivo tanto da “proliferação
ma dessas propostas. Todas, no entanto, podem ser vertical” (expandido os arsenais nos Estados nu-
firmadas sobre bases institucionais existentes. Não cleares) quanto da “proliferação horizontal” (a dis-
são, de modo algum, objetivos inatingíveis. É meu seminação de tecnologias nucleares para outros Es-
sincero desejo que a Conferência de Revisão do TNP tados e entidades). O verdadeiro efeito mundial foi
a ser realizada em maio, inicie um movimento para abalar as bases do regime do TNP.
esses objetivos e que estes possam ser implemen- Para os Estados nucleares, chegou o momento de
tados nos próximos cinco anos. Tais esforços devem desenvolver a visão comum de um mundo sem ar-
culminar numa reunião de cúpula para a abolição mas atômicas e de se livrar da crença ilusória de que
nuclear em 2015 — realizada em Hiroshima e em a segurança pode ser obtida com ameaças de des-
Nagasaki, setenta anos depois do lançamento das truição mútua e com equilíbrio do terror. É hora de
18
um pensamento novo, voltado para a atuação con- Conforme conclui o relatório da Comissão Inter-
junta a fim de enfraquecer ameaças e criar círculos nacional de Não Proliferação Nuclear e Desarmamen-
mais amplos, capazes de proporcionar segurança fí- to — iniciativa conjunta dos governos australiano e
sica e psicológica, até abarcar o mundo todo. japonês, emitido em dezembro de 2009 — crescem
Como evidência da decisão dos Estados nuclea- os apelos de países que vivem sob o guarda-chuva
res em deixar a coibição, apelei a eles para que fir- nuclear por uma revisão da doutrina tradicional.
massem três compromissos na Conferência de Re- Entre os benefícios do estabelecimento de re-
visão do TNP em 2010 e se empenhassem para im- giões nucleares não declaradas estaria o incentivo
plementá-los totalmente até 2015: ao progresso da desnuclearização global e de um
1. Chegar a um acordo que obrigue legalmente sistema abrangente para evitar a proliferação de to-
a estender as garantias de segurança negativas — das as armas de destruição em massa e interceptar
o não uso de armas nucleares contra quaisquer dos a terrível possibilidade de terrorismo nuclear. O
Estados não detentores dessas armas, cumprindo as objetivo seria transformar a postura de confronto
obrigações com o TNP. prevalecente em certas regiões — inclusive aque-
2. Iniciar a negociação de um tratado que codi- las em que Estados com ogivas nucleares ou os alia-
fique a promessa do não uso de armas nucleares uns dos destes estão presentes — de enfrentar a amea-
contra os outros. ça com ameaça. O que deve ser encorajado em vez
3. Para declarar qualquer área de uma região zo- disso é a redução da ameaça mútua, exemplificada
nas livres de armas nucleares, é preciso um severo pelo Programa de Cooperação de Redução de Amea-
trabalho para comprometê-las a não usar esses ar- ças (CTR), instituído entre os Estados Unidos e os
mamentos. países da ex-União Soviética, após a Guerra Fria.
Não tenho a intenção de subestimar as dificul- Lamentavelmente, o TNP, na estrutura atual, não
dades existentes para o cumprimento desses com- tem sido capaz de reduzir ameaças e oferecer ga-
promissos, em especial o segundo e o terceiro. Mas rantias mútuas para intensificar a confiança. Se pro-
é importante frisar que eles são decisões políticas gressos fossem logrados nas negociações para esses
que os Estados nucleares podem tomar agora, en- objetivos na base regional, mais importante seria a
quanto mantêm a condição atual de possuidores de segurança física e psicológica da sua participação
armas nucleares. no desarmamento, impedindo o crescente isolamen-
Sobre as garantias de não uso mútuo, mesmo um to externo. Sem dúvida, diminuiria a motivação pa-
acordo limitado aos Estados Unidos e à Rússia se- ra desenvolver ou adquirir armas atômicas.
ria um evento divisor de águas que acarretaria na Se, por meio desses sistemas, círculos expandidos
maior redução em ameaças perceptíveis, do qual de segurança física e psicológica pudessem ser cria-
ambas as partes se beneficiariam igualmente. Ofe- dos, para envolver não apenas países que já contam
receria também uma abertura para rever a distribui- com a proteção do “guarda-chuva” de Estados nuclea-
ção extraterritorial de programas de defesa de ogi- res, mas também a Coreia do Norte e o Irã, e nações
vas e mísseis, como medidas para o desmantelamen- como a Índia, o Paquistão e Israel, que atualmente
to gradual do guarda-chuva nuclear. não fazem parte do TNP, isso representaria maior aber-
19
AÇ
L
ÃO
res, foi adotado numa série de reuniões de cúpula o caminho rumo à total abolição das armas nuclea-
e teve como fundo de cena o impactante desastre da res — desejo ardente não só dos sobreviventes dos
usina nuclear de Chernobyl. Outro importante fator ataques nucleares mas dos povos do mundo.
desse direcionamento político foi a oposição públi- Muitos Estados participantes das negociações que
ca ao desenvolvimento de armas nucleares na Eu- conduziram ao estabelecimento do TPI em 1998, de-
ropa nos anos 80. fendiam a inclusão do uso de armas nucleares como
Embora essas ações apresentem apenas um pro- crime de guerra enquadrado na jurisdição do Tribu-
gresso limitado, refletem o constante aprofundamen- nal. Porém, isso não foi considerado na redação fi-
to de consciência dentro da comunidade internacio- nal do Estatuto de Roma, quando de sua adoção. Re-
nal de que as armas nucleares nunca devem ser usa- considerei a questão em minha proposta de paz do
das e que medidas rigorosas são necessárias para ano seguinte. Em novembro de 2009, na 8ª Sessão
conter sua ameaça. Este fato é ainda mais surpreen- da Assembleia dos Estados-Membros do Estatuto de
dente se lembrarmos que, logo depois da Segunda Roma do Tribunal Penal Internacional, o México pro-
Guerra Mundial, as bombas nucleares foram vistas pôs a emenda ao Estatuto. Um grupo de trabalho foi
como armas convencionais extremamente destrui- criado visando a essa ratificação e outras revisões.
doras e de uso inevitável. Considero o fato um importante avanço da paz.
Por mais discordantes que nossos ideais sejam Os Estados que não fazem parte do TPI, em es-
da realidade, não devemos nos desesperar ou nos re- pecial, as nações nucleares, deveriam ser convida-
signar. Em vez disso, como cidadãos do mundo, pre- dos a participar dos debates sobre esta questão co-
cisamos nos unir e criar outra realidade. A proibi- mo observadores. É importante que o maior núme-
ção das minas terrestres e das bombas de fragmen- ro possível de representantes de governos confron-
tação em anos recentes é fruto de tal solidariedade. te, por meio de sério debate, a natureza desumana
Ano passado, clamei por um movimento de apoio das armas nucleares e a intolerável ameaça que elas
a uma “Declaração dos Povos do Mundo pela Aboli- representam. Obviamente, a finalidade da revisão
ção Nuclear”, que poderia ser feita em conjunto por proposta mais do que punir o uso de armas nuclea-
indivíduos, organizações, grupos religiosos e espiri- res, é estabelecer uma norma clara de que o uso de-
tuais, universidades e institutos de pesquisa e tam- las, em qualquer circunstância, é inaceitável.
bém por agências do sistema das Nações Unidas. Para nós, membros da SGI, a declaração feita pe-
Além dessa iniciativa, sugiro, nesta oportunida- lo segundo presidente da Soka Gakkai, Jossei To-
de, a promoção de um movimento para ratificar o da, clamando pela proibição das armas atômicas, é
Estatuto do Tribunal Penal Internacional, definin- nossa eterna fonte de inspiração. Induzidos por ela,
do o uso de armas nucleares como crime de guerra. ao longo de meio século, prosseguimos na luta pa-
Devemos abraçar o objetivo de fazer da proibi- ra combater os horrores das armas nucleares, ele-
ção desses aparatos de destruição em massa, nor- vando a consciência pública e conquistando apoio
ma e aspiração comuns de toda a humanidade até à sua abolição. Em setembro de 2007, por ocasião
2015, o 70º aniversário do lançamento das bombas do 50º aniversário da declaração de Toda, a SGI lan-
de Hiroshima e Nagasaki. Uma norma para limpar çou a Década dos Povos para a Abolição Nuclear.
22
segurança internacionais, desviando o menos pos- lição nuclear recai sobre os Estados detentores des-
sível de recursos humanos e econômicos do mundo sas armas. É óbvio também que os Estados não nu-
para armamentos”. cleares não precisam esperar passivamente que as
Até hoje, a Assembleia Geral alicerça-se no Ar- negociações pela redução de armas sejam concluí-
tigo 11, empenhando-se ativamente em questões de das. Por meio das próprias ações, eles podem pres-
desarmamento. Em contrapartida, o Conselho de Se- sionar para que a abolição seja agilizada e se con-
gurança tem falhado em cumprir esse papel, dei- cretize. Tais esforços estariam naturalmente em con-
xando o Artigo 26 adormecido durante todos esses cordância com a linha de conduta estipulada pelo
anos. Essa é uma das razões pela qual a Cúpula do Parecer Consultivo do TPI, de que “qualquer tenta-
Conselho de Segurança da ONU sobre Não Prolife- tiva de desarmamento geral e completo, em especial
ração e Desarmamento Nuclear, realizado em se- o desarmamento nuclear, necessita da cooperação
tembro do ano passado, ter sido tão significativa. de todos os Estados”.26
Para cumprir o compromisso firmado na ocasião, de Porque essas resoluções expressam a vontade da
“criar as condições para um mundo sem armas nu- comunidade internacional, a Assembleia Geral es-
cleares”,25 o Conselho de Segurança — cujos cin- timula esforços ambiciosos de vários países para re-
co membros permanentes são todos Estados nuclea- duzir divergências. Isso, por sua vez, torna-se, nos
res — deve assumir a liderança no estabelecimen- termos do requerimento de Costa Rica (2008) ao Con-
to de um fórum para negociações de desarmamen- selho de Segurança pela regulamentação de armas,
to multilateral por meio de, por exemplo, uma série conforme o Artigo 26, um meio “para romper o cír-
de reuniões de cúpula com a participação do secre- culo vicioso da corrida armamentista que parece ga-
tário-geral das Nações Unidas. nhar ímpeto em várias regiões do mundo, competin-
Uma ação que poderia ser tomada pela Assem- do com a priorização de gastos sociais e o acordo in-
bleia Geral seria fazer uma avaliação crítica do re- ternacional de objetivos de desenvolvimento, incluin-
sultado prático das resoluções dedicadas ao objeti- do os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, e
vo da abolição nuclear. A Assembleia Geral come- afetando negativamente a segurança humana”.27
çaria emitindo recomendações anuais ao Conselho Numa era em que todas as sociedades deveriam
de Segurança, pedindo pelo cumprimento das res- se unir para responder aos desafios comuns da hu-
ponsabilidades para atingir a redução mínima es- manidade — como a destruição ambiental e a po-
pecificada de armas nucleares. Para fortalecer a au- breza —, os gastos militares ultrapassam os limites
toridade moral das recomendações, estas poderiam dos recursos econômicos e humanos. As armas nu-
ser acompanhadas por relatórios FO TOS:WMD C
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cleares, em particular, são um mal fundamental que
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de Estados sobre ações por eles não pode resolver as complexas ques-
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tora do Centro de Estudos para Não Proliferação do Conselho de Segurança. O país deveria aproveitar a
Instituto de Pesquisa Internacional de Monterrey, oportunidade para incentivar os Estados Unidos e ou-
são ambos especialistas em questões de desarma- tras nações nucleares a obter progressos no desarma-
mento mundialmente renomados. Num prefácio es- mento. Seja como for, o Japão possui o dever único e
crito em conjunto para um relatório do Instituto das a responsabilidade maior de trabalhar pela concreti-
Nações Unidas para Pesquisa sobre o Desarmamen- zação de um mundo livre das armas nucleares.
to (Unidir), eles clamam que em qualquer discus-
são sobre desarmamento, seja sobre armas de pe- Por um mundo de
queno porte, seja sobre armas de destruição em mas- dignidade humana
sa, à segurança humana deve ser dada prioridade.
“Precisamos falar sobre desarmamento para colo- Analiso agora algumas medidas para a resolução
cá-lo em seu devido lugar: no centro de nosso pen- das distorções estruturais da comunidade global que
samento sobre segurança humana. Desarmamento ameaçam a dignidade humana e que foram trazidas
é ação humanitária.”28 para primeiro plano pela atual crise econômica.
Com base neste princípio, clamo para que todos Em 2009, houve uma pronunciada redução no
os esforços possíveis sejam feitos para a implemen- ritmo de crescimento econômico nos países em de-
tação plena do Artigo 26 da Carta das Nações Uni- senvolvimento. A economia global sofreu uma con-
das, de forma que o Conselho de Segurança cumpra tração que não se via desde a Segunda Guerra Mun-
com as obrigações de desarmamento, fortalecendo dial. Particularmente severo foi o impacto sentido
o ímpeto para a abolição nuclear e a desmilitariza- pelos membros mais vulneráveis da sociedade. Exis-
ção do nosso planeta. te a crescente preocupação de que outras crises hu-
Como país que teve a amarga experiência de um manitárias surjam em diferentes partes do mundo,
ataque nuclear, o Japão patrocina, há mais de uma caso não seja dada assistência a essas populações.
década, resoluções da Assembleia Geral pela aboli- Há muitos anos, tenho frisado a necessidade fun-
ção das armas nucleares. O Japão também adere aos damental da formação de redes de segurança inter-
três princípios não nucleares (não produzir, não pos- nacional para salvaguardar a vida e a dignidade das
suir e nem permitir a entrada de armas nucleares em pessoas e tornar realidade a segurança humana. Ao
seu território) como também aos três princípios de mesmo tempo, defendo a atribuição de poderes aos
exportação de armas. A nação japonesa deve com- indivíduos, de efeito a longo prazo.
prometer-se, aderindo firmemente a esse conjunto de Desejo oferecer propostas concretas sobre o tra-
princípios e, ao mesmo tempo, liderar a opinião pú- balho, os direitos e a valorização das mulheres e das
blica mundial em prol da abolição nuclear. crianças.
Em novembro do ano passado, o Japão e os Esta-
dos Unidos fizeram uma declaração conjunta expres- Trabalho: Fonte de dignidade
sando a intenção de trabalhar ativamente para criar
condições de eliminar por completo os arsenais nu- Antes, peço aos governos que enfrentem corajosa-
cleares. Este ano, o Japão atuará como membro do mente a questão do desemprego e das oportunidades
25
gramas como a Iniciativa das Nações Unidas para Makiguti, criei programas de curso por correspon-
a Educação de Meninas do Fundo das Nações Uni- dência na Universidade Soka e fundei a Faculdade
das para a Infância (Unicef). Visualizando 2015, Feminina Soka.
precisamos nos empenhar em criar condições para As mulheres desempenham papel fundamental
que o maior número de meninas tenha acesso aos no movimento da SGI. A exposição “As Mulheres e
ensinos médio e superior. a Cultura de Paz” foi criada pelo Comitê de Paz
LIBRARY
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Para esse fim, proponho a criação de um das Mulheres da Soka Gakkai, no Japão, com
fundo administrado internacionalmente a colaboração da renomada ativista da paz
dedicado a oferecer um futuro melhor pa- Elise Boulding, e fóruns sobre o valor fe-
ra as mulheres. Esse fundo seria forma- minino são realizados para ajudar a ele-
do por parte das dívidas perdoadas de paí- var a consciência em muitas comunida-
ses em desenvolvimento e pela aplicação des locais. A mensagem subjacente a esses
da quantia equivalente na educação feminina. esforços é que as mulheres são as construtoras
São muitos os desafios e as ameaças enfrentados da paz. Isso representa a tradução da crença de Ma-
pelas mulheres. A ampliação dos horizontes na edu- kiguti para o contexto contemporâneo.
cação possibilitam a elas se levantarem como pro- Essas atividades compartilham o espírito da Re-
tagonistas autoconfiantes, capazes de atravessar cri- solução 1325 do Conselho de Segurança das Nações
ses, redirecionar a vida e a sociedade para um fu- Unidas, adotada dez anos atrás, em outubro de 2000.
turo melhor. Plantar as sementes desse “empodera- O significado da Resolução reside, acima de tudo,
mento” agora é tornar isso uma realidade. no fato de que foi uma declaração para o mundo no
Há cem anos, quando a posição social das mu- início do século 21: o envolvimento das mulheres é
lheres no Japão era muito baixa, o presidente fun- essencial para que a paz duradoura seja alcançada.
dador da Soka Gakkai, Tsunessaburo Makiguti, de- Tive recentemente o privilégio de trocar ideias
dicou-se apaixonadamente para ampliar as oportu- sobre o assunto com o ex-subsecretário-geral das
nidades de ensino às mulheres, certo de que elas se- Nações Unidas, Anwarul K. Chowdhury, que se em-
riam as construtoras de uma sociedade melhor. Ma- penhou incansavelmente para a sua adoção. O em-
kiguti estabeleceu um programa que oferecia aulas baixador Chowdhury também concorda que a par-
por correspondência para mulheres que não pos- ticipação das mulheres possibilita que a cultura de
suíam condições de receber instrução no ensino mé- paz aprofunde as suas raízes.
dio após a graduação no ensino fundamental. Ele Em setembro de 2009, a Assembleia Geral das
compilava materiais de estudo e os editava num pe- Nações Unidas adotou uma resolução para juntar
riódico. Dentre outras iniciativas de Makiguti estão quatro agências e escritórios com a finalidade de tra-
a criação de facilidades, aulas gratuitas para mulhe- tar das questões concernentes às mulheres — o Fun-
res com restrições de recursos financeiros para apren- do de Desenvolvimento das Nações Unidas para a
der a costurar e a bordar, habilidades que, na épo- Mulher, a Divisão das Nações Unidas para o Avan-
ca, constituíam o principal elemento da educação ço das Mulheres, a Assessoria Especial do Secretá-
das meninas no Japão. Como herdeiro do espírito de rio-Geral para Assuntos de Gênero e o Instituto In-
28
ternacional de Pesquisa e Treinamento para o Avan- Seja nos países em desenvolvimento, seja nos
ço das Mulheres — formando uma nova entidade de desenvolvidos, são as crianças quem pagam o pre-
alto nível dedicada à igualdade de gênero. ço mais alto quando a crise bate à porta. Com a eco-
Tenho esperanças de que este novo órgão inclua nomia em recessão e os orçamentos nacional e fa-
entre suas principais atividades a supervisão do cum- miliar duramente afetados, aumenta o número de
primento da Resolução 1325, além de promover o crianças sem acesso à boa alimentação, à saúde,
“empoderamento” das mulheres, incluindo natural- obrigadas a abandonar a escola para trabalhar.
mente a educação para meninas. Diante dessa situação, sugiro que escolas sirvam
O grau de consolidação da Resolução 1325 refle- de refúgio para as crianças se protegerem das vá-
te-se claramente na participação feminina nos pro- rias ameaças — como fortalezas de segurança hu-
cessos de paz. Por outro lado, a Comissão Construto- mana — e tornem-se um local para formá-las como
ra da Paz obedeceu à Resolução 1325 no trabalho de protagonistas de uma nova cultura de paz.
reconstrução em Burundi e em Serra Leoa. Contudo, Em 1995, a Organização Mundial de Saúde (OMS)
mundialmente, as mulheres ainda compõem menos lançou a Iniciativa Global de Saúde na Escola, pro-
de dois por cento dos signatários dos acordos de paz grama conduzido pela Fresh — Focusing Resources
e apenas sete por cento das negociações de paz.32 on Effective School Health (Concentração de Recur-
Este é o ano do 15º aniversário da Plataforma de sos em Saúde Escolar Efetiva). Criada em 2000, con-
Ação de Pequim, padrão de políticas internacional ta com a parceria da Organização Mundial de Saú-
relacionado às mulheres, adotada na Quarta Confe- de, do Fundo das Nações Unidas para a Infância
rência Mundial sobre Mulheres, e também do 10º (Unicef), da Organização das Nações Unidas para a
aniversário da Resolução 1325. É importante, por- Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e do Ban-
tanto, fazer de 2010 um ano rompedor de barreiras, co Mundial. A Fresh tem como objetivos estimular
de progressos significativos em relação ao empode- o aprendizado, melhorar o ambiente de estudo, de-
ramento das mulheres em escala mundial. Para es- senvolvendo habilidades necessárias para estabe-
se fim, espero que mais países venham a unir-se aos lecer práticas saudáveis e oferecendo refeições es-
Amigos da 1325 e ao grupo ad-hoc de Estados-Mem- colares nutritivas.
bros das Nações Unidas, empenhados no respeito à A experiência do Programa Mundial de Alimen-
Resolução. Neste e em outros fóruns devem ser rea- tação comprova, há mais de quatro décadas, que os
lizados debates sobre a melhor forma de aumentar programas de merenda escolar protegem a saúde e
a participação feminina na construção da paz. garantem o futuro das crianças. O Unicef defende o
projeto Escolas Amigas da Criança e a construção
Crianças: tesouro da humanidade de salas de aula capazes de resistir a terremotos e
tempestades, para que as escolas possam servir de
Minha terceira proposta visa a proteger as con- abrigo em tempos de crise, local onde as crianças
dições de sobrevivência das crianças e a solidificar retomem a vida normal, de coração sereno.
as bases para que o século 21 se torne o “Século da Estes esforços e experiências educacionais de-
Paz e da Coexistência”. vem ser aplicados de tal maneira que as escolas se
29
Alunos do Instituto
Educacional Soka do Brasil
(janeiro de 2009)
tornem centros de promoção da segurança humana ras de viver, para que sejam capazes de resolver pa-
e da construção de uma cultura de paz. cificamente as divergências com respeito à dignida-
Em anos recentes, ênfase tem sido dada à valo- de humana, tolerância e não discriminação”.33
rização das crianças como agentes de mudança, em Tenhamos estas palavras como diretriz na impor-
vez de simplesmente protegê-las, tamanha é a im- tante tarefa de formar as crianças para lidar com
portância da questão. Vamos prepará-las porque ameaças à vida e à dignidade, como também a dis-
mais tarde, serão elas quem vão iniciar ondas de posição de resolver questões sempre pelo diálogo,
mudanças, transformar e romper com os ciclos his- jamais pela violência. Estes esforços devem envol-
tóricos de sofrimento e tragédia da humanidade. ver todos os lugares onde as crianças aprendem: o
Este ano de 2010 será o último da Década Inter- lar, a escola e a comunidade. Precisamos educá-las
nacional por uma Cultura de Paz e Não Violência para que se tornem indivíduos capazes de defender
para as Crianças do Mundo. Todas as iniciativas pa- os direitos e a dignidade delas e dos outros. É im-
ra promover a cultura de paz devem continuar nos portante o papel das crianças para que a cultura de
anos vindouros, tendo as escolas como centro de ati- paz finque raízes na sociedade.
vidades. A Declaração e Programa de Ação para uma Para expandir ainda mais o alcance positivo de
Cultura de Paz, adotada pela Assembleia Geral em uma cultura de paz, é imprescindível não apenas o
1999, pede a todos os protagonistas: “Assegurar que trabalho das Nações Unidas e dos governos, mas
crianças desde cedo sejam protegidas e beneficia- também o da sociedade civil. Precisamos elevar a
das com educação sobre valores, atitudes e manei- consciência sobre as ideias constituintes de uma
30
Membros da SGI
(março de 2010)
cultura de paz em termos de valores, comportamen- do” tem viajado a vários países desde a sua inaugu-
tos e modos de vida. ração em 2004 e “As crianças e a cultura de paz” é
Como herdeira dos ideais de Tsunessaburo Ma- exibida em inúmeras cidades japonesas desde 2006.
kiguti, a SGI se empenha para que a felicidade das As crianças são mensageiras do futuro, tesouro
crianças seja o padrão de avaliação do sucesso na comum da humanidade. Convencidos de que o ato
solução dos problemas que a sociedade enfrenta. de encorajar e plantar a esperança no coração das
A fim de corresponder à adoção da Convenção pessoas é o caminho certeiro para a paz mundial,
sobre os Direitos da Criança em 1989, promovemos continuaremos a lutar para edificar uma comunida-
as exposições “As crianças do mundo e o Unicef” e de global, onde a infância tenha as prioridades.
“Quais são os direitos das crianças?”. As exposi- Recordo-me das palavras de Toynbee: “Nós não
ções percorreram todo o Japão. Desde 1996, a mos- estamos fadados à repetição da história. Ela se re-
tra “Valorizando o futuro: os direitos e a realidade vela. Os nossos esforços fazem a história”.34
das crianças” circula pelos Estados Unidos. Para Este ano marca, respectivamente, o 80º e o 35º ani-
servir à Década Internacional, a exposição “Edifi- versários de fundação da Soka Gakkai e da SGI. Nos-
cando uma cultura de paz para as crianças do mun- sa história é a de pessoas comuns, incansáveis na cria-
31
ção de valores, que se recusam a se abater pelas vio- conduzir uma vida de contribuições em benefício
lentas correntezas dos tempos. Quanto mais escuras próprio e dos outros — e do segundo presidente
as nuvens das crises que pairam sobre nós, mais vi- Jossei Toda — de eliminar a miséria da face da
gorosamente os membros da SGI se empenham para Terra — continuaremos confiantes no poder do
irradiar a luz da esperança. Esta é a determinação que diálogo, empenhados em despertar o que há de
inspira os membros da SGI a trabalhar em suas co- melhor em cada indivíduo. Este é o caminho pa-
munidades nos 192 países e territórios. ra formar uma rede mundial de pessoas verdadei-
Sustentados pelo grande espírito de nosso pre- ramente comprometidas com a paz mundial e com
sidente fundador, Tsunessaburo Makiguti — de a vida da humanidade.
Notas
1. Obama, “A Just and Lasting Peace” (“Uma paz que nada busca”), p. 13. Armas Nucleares, p. 266.
justa e duradoura”). 11. Einstein, Ideas and Opinions Based on Mein 23. Weeramantry, “Opinião divergente do juiz
2. Gandhi, Hind Swaraj or Indian Home Rule Weltbild (Ideias e Opiniões Baseadas em Mein Weeramantry”, p. 433.
(Hind Swaraj ou Código Civil Indiano), p. 45. Weltbild), p. 38. 24. Weeramantry, Universalising International
3. Todd, L’illusion économique (A Ilusão 12. Nitiren, The Record of the Orally Transmitted Law (Universalização do Direito Internacional),
4. Izumi, Kagakusha ga tou: Raise wa aru ka (Os 13. Marcel, The Decline of Wisdom (O Declínio 25. NU, “Manutenção da paz e da segurança
Morte?), p. 10. 14. Nitiren, The Writings of Nichiren Daishonin 26. CIJ, Legalidade da Ameaça ou do Uso de
5. Weber, The Protestant Ethic and the Spirit of (Coletânea dos Escritos de Nitiren Daishonin), Armas Nucleares, 264.
Capitalism (A Ética Protestante e o Espírito do v. 1, p. 402. 27. NU, “Fortalecimento da segurança coletiva”.
Capitalismo), p. 182. 15. Ortega y Gasset. A Rebelião das Massas, p. 111. 28. Dhanapala e Lewis, “Prefácio”, p. viii.
6. Weil, The Simone Weil Reader (A Leitora 16. Ikeda, Complete Works (Obras Completas), 29. OIT, “OIT marca 90º aniversário com diálogo
7. Aitmátov e Ikeda, “Ikeda SGI kaicho to 17. Toda, Complete Works (Obras Completas), 30. G-20, “Declaração dos líderes: Cúpula de
presidente da SGI e Tchinguiz Aitmátov”), p. 3. 18. AIEA, “Tratado de Não Proliferação de Armas 31. Ban, “Relatório para a Assembleia Geral”.
8. Einstein, Ideas and Opinions Based on Mein Nucleares”. 32. Unifem, “Declaração do Unifem”.
Weltbild (Ideias e Opiniões Baseadas em Mein 19. Kennedy, “Discurso de formatura”. 33. NU, “Declaração e Programa de Ação para
Weltbild), p. 38. 20. CICV, “Protocolo sobre a proibição”. uma Cultura de Paz”.
9. Toynbee e Ikeda, Escolha a Vida, p. 259. 21. Ban, “Pela paz e pelo desenvolvimento”. 34. Toynbee, Civilization on Trial (A Civilização
10. Kajima, “Motomenai kokoro” (“O coração 22. CIJ, Legalidade da Ameaça ou do Uso de Posta à Prova), p. 45.
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