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UMA ANÁLISE

CRÍTICA DA
ERA PETISTA
Este livro é um compilado de artigos. Todos os créditos devem ser dados aos autores dos
respectivos sites.

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Sumário
Prefácio:

Pensando o Brasil: Uma crítica ao Partido dos Trabalhadores

Capítulo 01: Uma trilogia do Lulopetismo: A grande mentira

Capítulo 02: Lula

- Candidatos do Apocalipse: O Messianismo de Lula

- Governo Lula: Dissimulação, displicência e corrupção

- As provas contra Lula: 3 mil evidências, 13 casos e R$ 80 milhões em propina

Capítulo 03: Dossiê BNDES

Capítulo 04: Pré-sal: Estão mentindo para você

Capítulo 05: Dilma

- O legado econômico de Dilma Rouseff

- Impeachment: Uma punição branda pela irresponsabilidade fiscal

- Não há inocentes em pedaladas

- E ainda há quem diga que é golpe?

- O impeachment gerou a maior crise da história do país?

Postfácio: Nem tudo foi ruim no governo Temer

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Prefácio: Pensando o Brasil: Uma
crítica ao Partido dos Trabalhadores
Artigo retirado de: http://fraternalha.com/blog/pensando-o-brasil-uma-critica-ao-plano-de-
governo-do-partido-dos-trabalhadores/

A iniciativa consiste em analisar o que teria sido o plano de governo de Fernando Haddad,
candidato à Presidência da República pelo Partido dos Trabalhadores, que foi derrotado no
último domingo. Buscou-se avaliar a viabilidade econômica das propostas que foram
apresentadas, utilizando fontes, dados, pesquisas e informações.

A conclusão é que a maior parte das propostas ou seriam irrealizáveis ou no caso das
"realizáveis", estas trariam danosos efeitos colaterais à população brasileira. Exemplo disso é
que a palavra “investimento”, tendo o Estado como seu condutor, apareceu 75 vezes. O plano
visava aumentar investimentos públicos na ciência e tecnologia, na retomada de 2800 obras
públicas, na construção de 2.000.000 (dois milhões) de casas populares, nas Forças Armadas,
na retomada da industrialização, no Judiciário, Internet, saúde (aumentando para 6% do PIB),
educação (aumentando para 10% do PIB), na cultura e artes, no esporte, em infraestrutura,
meio ambiente, agronegócio, turismo, transporte e etc.

Acompanhado da elevação dos gastos estava o aumento de impostos sobre lucros e


dividendos, ponto que, na atual conjuntura, traria desestímulo à produtividade. Como
expandir a responsabilidade do Estado brasileiro pela gestão de tantas áreas e proporcionar
equilíbrio fiscal é uma questão que não foi respondida satisfatoriamente.

Aqui apresentaremos a versão resumida do relatório. Para tanto, dividimos em 3 partes que
julgamos centrais: 1) Política Fiscal; 2) Política Comercial Externa e 3) Setor Privado

POLÍTICA FISCAL

A atual situação fiscal do Brasil atingiu níveis alarmantes. Conforme o relatório “Ajuste Fiscal
Na América Latina e Caribe: Custos no Curto Prazo, Benefícios no Longo Prazo?” realizado pelo
Banco Mundial1, o Brasil apresenta déficit fiscal equivalente a quase 4% do PIB, acima da
média de 2,4% da região analisada. Se for levantar a relação entre dívida e PIB, a média da ALC
é 57,6%, enquanto o Brasil encontra-se em 70%. Ainda sobre as análises do Banco Mundial, em
novembro de 2017 foi publicado o relatório “Ajuste Justo: análise de eficiência e equidade no
gasto público”2, onde foi detectado a possibilidade de cortar até R$400 bilhões a.a.
desperdiçados com má gestão, regalias e corrupção. No entanto, o plano de governo Haddad
visa outra direção: em vez de profundos cortes nos gastos governamentais, haverá expansão
destes. Um dos itens é a “valorização do salário mínimo”.

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Sabe-se que boa parte das despesas do governo tem vínculo com o salário mínimo. Isso
significa que um aumento do salário mínimo representaria aumento das despesas, incluindo a
previdenciária. A cada R$1 de aumento do salário mínimo, o déficit do governo aumenta em
R$303,9 milhões (R$341,7 milhões de aumento de gasto e R$37,8 de aumento de receita)3. A
valorização dos impostos deriva de maior demanda por mão-de-obra e está só pode ser
alcançada por meio de um ambiente de negócios que prestigie a livre iniciativa,
desburocratizando a economia.

A tentativa petista era a de contrabalançar com aumento de impostos, sobretudo a lucros e


dividendos. A teoria econômica prova que os custos das empresas são repassados ao
consumidor, portanto tributar mais os ricos não significa alívio aos mais pobres. Outro risco do
aumento de impostos é provocar fuga de capitais. A economia brasileira, ainda fragilizada, não
se mostra atraente a investidores do setor privado e isso é comprovado pelo rebaixamento do
rating brasileiro.

Na Introdução, há a afirmação de que haverá a revogação da Emenda Constitucional 95 (PEC


dos gastos), o que seria uma ação totalmente na contramão das necessidades do momento
atual da economia brasileira. Este é o remédio amargo a ser prescrito diante do descaso com
as políticas econômicos nos últimos 15 anos. Outro ponto a destacar, diz respeito a crítica à
Reforma Trabalhista, que na visão do PT torna precário o trabalho e retira direitos trabalhistas,
o que é apenas uma retórica, já que não cita os direitos que foram tirados e nem cita os pontos
que deixa claro que houve precarização do mercado de trabalho. Mais adiante (pág. 37) é dito
“Revogar a EC 95, que impõe uma ortodoxia fiscal permanente com um teto declinante nos
gastos públicos por 20 anos.”

A dívida atual do governo está em torno de R$ 5,4 trilhões. Tal dívida foi gerada por sucessivos
déficits orçamentários, causados pelo descontrole fiscal do governo federal, especialmente no
fim do segundo mandato de Lula, e nos governos de Dilma Rousseff. Importante ressaltar que
o atual patamar das taxas de juros é o mais baixo da série histórica, graças ao limite de gastos
estabelecido.

POLÍTICA COMERCIAL EXTERNA

O plano de governo também aborda a necessidade de se ter uma política externa centrada nos
países latinos americanos e no eixo sul-sul, o que já foi tentado ao longo dos últimos 13 anos.
O que fica claro e evidente é uma atuação regional, com protagonismo apenas do ponto de
vista regional e sem expressão mundial. O que prejudica o Brasil na competitividade e na
integração com os principais mercados consumidores do mundo. Conforme demonstra a
OCDE, o Brasil encontra-se isolado das principais oportunidades globais. É preciso diversificar a
participação brasileira nos diferentes mercados ao redor do mundo, em vez de restringir a
ação econômica a poucas e inexpressivas parcerias.

As tentativas de ações no âmbito dos BRICS, na Cooperação Sul-Sul e outras ações são
importantes, mas não na amplitude sinalizada pelo Programa de Governo proposto pelo PT.
Aliado a isso, os investimentos a serem realizados através de Bancos de Desenvolvimentos

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específicos abrem oportunidades para a continuidade dos esquemas de corrupção e da
canalização de recursos para projetos sem viabilidade social ou econômica. A prova dessa
inviabilidade é representada pelo recente calote bilionário sofrido pelo país. Coube ao Brasil
arcar a dívida não paga de Venezuela e Moçambique ao banco Credit Suisse e ao BNDES.

De acordo com ICC Open Market Index, o Brasil é mais retraído que economias como Uganda,
Kenya, Sri Lanka, Malásia, Vietnã e outros. Já o relatório Doing Business, do Banco Mundial,
demonstra o grau de facilidade em fazer negócios. De 190 países pesquisados, o Brasil
encontra-se na 125ª posição. O ranking avalia itens como abertura de empresas, obtenção de
alvarás de construção, registro de propriedades, obtenção de créditos, execução de contratos
e outros.

SETOR PRIVADO

Foi citado "conter a privatização e a precarização no serviço público..." o que fere a livre
iniciativa e proporciona a manutenção da ineficiência verificada em diversas empresas públicas
do Governo Federal. O artigo “Os efeitos da privatização sobre o desempenho econômico e
financeiro das empresas privatizadas” (2005) demonstra que “Os resultados obtidos indicam
que estas empresas se tornaram mais eficientes após a privatização. Em particular observou-se
um aumento da lucratividade e da eficiência operacional”6. A amostra se baseia em 102
empresas privatizadas de 1987 a 2000. É um dos estudos mais abrangentes sobre o tema. Não
há razões econômicas para interromper o processo de privatizações, apenas motivações
políticas, isso porque uma empresa estatal não responde ao mecanismo de lucro e prejuízo do
mercado, sendo assim, ela opera em uma “dimensão” paralela e não precisam preocupar-se
em oferecer um bom serviço/produto haja vista, qualquer mau negócio, prejuízo ou
descapitalização são prontamente cobertos pelo tesouro, lê-se: nós, via imposto.

Fato claro é o dos correios que segundo o relatório do Ministério da transparência e


Controladoria-Geral da União, em 2016 já apresentava prejuízo acumulado de R$
3.415.777.000,00. Alguns alegam que isso é o resultado de anos marcados por corrupção, uso
político e má gestão, com queda na qualidade dos serviços. Tratando-se de instituições
estatais esse fato não é esporádico ou isolado, segundo um estudo feito pela Harvard
University intitulado: National champions and corruption: Some unpleasant interventionist
arithmetic, há uma relação empiricamente comprovada entre intervenção estatal na economia
e corrupção. A pesquisa conclui:

“While we focus on the effects of active industrial policy, the argument coud be extended to
aplly to other interventionist policies that have the effect of transferring rents and
potentially induce corruption. The magnitude of the corrections estimated in this papers
suggests that the cosideration od corruption should not be absent from cost-benefit analyses
of market intervention.” [“Enquanto nos concentramos nos efeitos da política industrial ativa,
o argumento pode ser estendido a outras políticas intervencionistas que tenham o efeito de
transferir aluguéis e potencialmente induzir a corrupção. A magnitude das correções
estimadas neste artigo sugere que a consideração da corrupção não deve estar ausente das
análises de custo-benefício da intervenção no mercado ”.]

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Outro aspecto fundamental e talvez mais importante que as privatizações, é a desestatização
que nas palavras de Ubiratan J. Iorio significa: “retirar do estado seu poder de controlar um
mercado, escolhendo quem pode e quem não pode entrar nele.”

CONCLUSÃO

Conforme analisado, as propostas apresentadas ou teriam sido irrealizáveis ou


demasiadamente vagas por estarem divorciadas da realidade fiscal em que o país atualmente
se encontra. Ao apontar para um aumento dos gastos governamentais, combate à privatização
e novos impostos, o plano petista vai de encontro ao recomendado por prestigiadas
organizações como OCDE, Banco Mundial, ICC e outros. Tais medidas não teriam sido apenas
equivocadas, mais também irresponsáveis.

Além disso, o uso da retórica como “garantia de direitos”, “participação popular”, “função
social da propriedade”, “imperialismo”, “Reforma do judiciário”, “democratização da terra” e
afins, induz o leitor ao erro e esconde os verdadeiros propósitos do partido dos trabalhadores
– um projeto totalitário visando o aparelhamento completo das instituições. Por trás dessas
palavras que parecem agradar, está um histórico de retumbar o fracasso representado pela
maior crise econômica da história republicana.

A volta do partido dos trabalhadores representaria o retrocesso populista, o mesmo que


mergulhou a nação em desemprego, inflação, aumento da pobreza, baixa produtividade e
criação de uma sociedade cada vez mais dependente do estado, dos assistencialismos como
moeda e troca para a perpetuação do poder.

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Capítulo 01: Uma trilogia do
Lulopetismo: A grande mentira
Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/uma-trilogia-do-lulopetismo-grande-mentira/

“O mais importante é inventar o Brasil que nós queremos.” - Darcy Ribeiro

“Brasil, o País do Futuro” - Título do mais conhecido livro de Stefan Zweig

Advertência: calma, muita calma leitor anti-petista ferrenho, pois neste terceiro de três artigos
não defenderei que tudo o que os governos Lula I e II e o governo Dilma I e mezzo 2 fizeram foi
inútil, mentira, errado. Na verdade, quase tudo, mas não a totalidade das ações e políticas de
governo.

A Grande Mentira. Qual foi a cartada de mestre (Ace in the Hole) dada pelo governo petista
em 2014? Qual foi sua grande mentira? Por que ela foi usada? Este é o último de três artigos
que tentam desvendar a farsa, a ilusão e a mentira implícitas dos governos petistas. Mas, não,
não foram as pedaladas em si somente o enredo da Grande Mentira: há algo mais sutil, como
veremos.

Billy Wilder (1906–2002) foi um dos mais importantes cineastas que migraram para os EUA e
sem dúvida um dos que mais cinicamente criticaram os valores hegemônicos americanos no
pós guerra. Podemos atestar isso pelos roteiros e estórias que escolhia, pela forma de dirigir,
pelo humor ácido em The Apartment (Mundo do Trabalho), por exemplo ou pela degradação
produzida da fama e vaidade em seu próprio meio Sunset Blvd.

Qual seria seu melhor filme? Difícil sempre é responder este tipo de questão. Qual é o melhor
Kubrick? O melhor Allen? O melhor Coppolla (este talvez seja mais fácil, The Godfather II, mas
quem esqueceria The Conversation?). Dependendo do momento, dependendo do gênero,
nossa hierarquia se altera. No caso de BW, quando pendo na crise moral engendrada pelo
governo Dilma, vêm-me à mente como o melhor Ace in the Role.

O repórter fracassado, caçador de notícias sensacionalistas, depois de sua última demissão


(por mais do que justa causa) Charles Tatum (Kirk Douglas) vai parar em Albuquerque, Novo
México. Na procura por trabalho, consegue um no jornal da cidade. Com o passar do tempo e
sem nada de relevante para cobrir – Albuquerque nos anos 50 do século passado não era bem
LA – vê-se, por ordem do chefe, na obrigação nada desafiadora de fazer uma reportagem
sobre uma corrida de cascavéis no interior.

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No caminho para o local do certame reptiliano, ele e o fotógrafo que o acompanha fazem uma
parada corriqueira num posto de gasolina e descobrem que um cidadão local, Leo Minosa,
estava preso em uma mina. Tatum, enfim, está diante de uma potencial matéria de destaque,
quiçá não somente regional, mas de âmbito nacional. Ele constrói várias mentiras – não serei
spoiler – para fazer a matéria render. Mas, a pior estava baseada no atraso deliberado do
resgaste do infeliz, já que havia descoberto uma forma de tirá-lo de lá rapidamente, mas ele a
oculta de todos. Quanto mais durasse a notícia, mais dramática ficava a situação, mais
matérias ele poderia escrever, maior seria sua notoriedade e, quem sabe, conseguiria emprego
num grande jornal, talvez na Califórnia. Ademais, passaria ainda a imagem de amigo de última
hora da vitima e de seu salvador. O que acontece ao final? Não serei spoiler II, mas acho que
dá para inferir.....

As mentiras de Dilma foram trágicas e moralmente condenáveis como as atitudes de Tatum.


Em 2013 e principalmente em 2014, já havia evidências de que algo de podre estava a ocorrer
na condução da política fiscal. A bem da verdade, na monetária também. Contudo, vários
economistas alentavam para este fato e o surgimento da contabilidade criativa. A proximidade
entre Arno Agostin e Dilma não era segredo. Vamos lembrar que Barbosa sai do governo por
não aceitar a política fiscal implementada.

Os resultados de tudo isso todos conhecem, ocioso perder tempo aqui com eles. Mas é bom
lembrar como se deu a construção de uma narrativa da mentira, principalmente logo após a
Copa de 2014, quando enfim a campanha eleitoral ganha fôlego. Lembremos que o discurso da
Presidente e de sua campanha era de que a economia estava em ordem e que os outros
candidatos vinham com discursos catastrofistas, de complexo de vira lata.

Com a ajuda de seu marqueteiro, as peças publicitárias usadas contra a oposição,


notadamente contra Marina Silva, passaram do limite do aceitável em termos de mentira e
construção de discurso meramente obscurantista. Vamos lembrar dois filmes importantes
dessa campanha, que cá entre nós, contribuiu para rachar de vez o país num maniqueísmo
torpe de coxinhas e petralhas. A primeira peça de propaganda que faria Goebels levantar do
túmulo e aplaudir é aquela sobre a independência do Banco Central. Parem um pouco de ler
este artigo e o vejam, agora com um certo distanciamento temporal e emocional. O vídeo é
violento, desinforma sobre algo importante em termos de educação econômica e chega a ser
leviano. Mas é eficaz para a construção de uma narrativa da mentira.

Considerem outro vídeo, sobre “se Dilma não for eleita vocês voltarão de onde vieram, da
classe pobre”. A estória contada é voltada exatamente para os milhões de brasileiros que
ascenderam à chamada classe C. Se qualquer outro candidato ganhasse, haveria a perda de
todas as conquistas. Claro, campanha é campanha, mas há limites – ou deveriam haver. Os
eleitores de Dilma descobririam que as perdas viriam com Dilma mesmo. Boa parte delas e
deles não entende a razão – como em qualquer democracia de massas, assim as coisas se dão.

O mais interessante é ver alguns petistas e simpatizantes – isso também foi dito por ex-
ministro – que, agora, com a baixa popularidade de Dilma, atesta-se que “os pobres” são

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ingratos, que deveriam saber que foi o lulopetismo que os colocou numa melhor situação. Isso
é mentira.

Vamos lá, desconstrução de uma narrativa mentirosa.

Lula foi essencial para o Brasil, assim como o PT o é, não era. Os governos de Lula colocaram o
combate à desigualdade extrema e à pobreza na agenda das políticas de Estado. Nossas elites
são extremamente conservadoras e o discurso hipócrita da meritocracia sempre foi a regra
quando do debate sobre pobreza e desigualdade. Sabemos que meritocracia é um valor em si
– ou deve sê-lo – quando falamos de diferenças de riqueza e renda entre iguais, ou mais ou
menos iguais. Do contrário, tal discurso é insensato. “Sem igualdade de oportunidades, falar
de meritocracia é piada”, diria Ricardo Paes de Barros recentemente ao Valor.

Parte da divisão que há hoje no Brasil entre coxinhas e petralhas existe também devido à
resistência dos endinheirados – muitos nem tanto – a aceitar que os mais pobres que haviam
ascendido tivessem o direito de “participar da festa”. A economia política do desenvolvimento
indica-nos que mentalidades custam a mudar, mesmo quando as condições objetivas de
produção já mudaram. Mas parte dessa confusão foi, repito, explorada como tática de
propaganda no nível de “Protocolos dos Sábios do Sião” pelo agora encarcerado João Santana,
reforçando maniqueísmos e mentiras que, como salientei em parte nos dois artigos que
antecedem a este, duram pouco. A verdade se impõe.

A queda na desigualdade e na pobreza é obra de FHC I e II e de Lula I e II, mas também de


fatores exógenos. Vamos lá: quais seriam as causas da melhoria dos indicadores sociais,
principalmente Gini e pobreza? Até onde sabemos, pois isto é objeto de estudo de muitos
economistas hoje em dia, seriam:

1. O controle da inflação feito pelo Plano Real, bem como o relativo, parcial, saneamento
das contas públicas, diminuiu sensivelmente o imposto inflacionário que atingia os
mais pobres e permitiu ao Estado ter condições de implementar políticas públicas
sociais, a começar pelas mandatórias, estabelecidas na Constituição de 1988, aliás não
assinada pelo PT;
2. Por falar na “Cidadã”, a necessidade legal de sua implementação de facto, não apenas
de jure, impôs aos governos FHC a necessidade de aumentar o gasto social;
3. A transição demográfica que ocorre em função da urbanização acelerada do Brasil,
entre os anos 50 e 80 e a inflexão na taxa de crescimento populacional e na fertilidade
vão surtir resultado na primeira década do Século XXI, com uma mudança estrutural
no mercado de trabalho;
4. O crescimento promovido por Lula I – que não foi somente “efeito China”, mas
também de reformas microeconômicas liberais implementadas durante o governo –
puxou tanto o emprego como a renda do salário dos mais pobres, lembrando que
houve formalização do trabalho e aumentos do salário mínimo (inconsistentes agora,
mas ocorreram);
5. A partir da segunda década deste século começam a aparecer os frutos do Bolsa
Família (que não é uma política de redistribuição de renda numa mesma geração, mas

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intergeracional), com mão-de-obra jovem mais qualificada, o que, com crescimento,
eleva o salário dos mais pobres mais do que os dos mais ricos.

Há ainda muito o que se estudar – e até se questionar sobre o acima afirmado – mas não foi o
simples fato de Lula entrar que o Brasil melhorou em termos de desigualdade e pobreza.
Existem lags de causalidade. Causação é um conceito científico para lá de importante e por
isso o ensino de ciências – cabe aqui breve comentário – é tão importante para o
desenvolvimento do raciocínio crítico. Se qualquer um pegar tabelas de Gini e pobreza verá
que a partir de 2003 tudo começa a mudar, para melhor. Pois é, mas existem causas,
principalmente quando trabalhamos com tempo e fenômenos complexos como o social (isso
vale para os meteorológicos também, por sinal), espalhadas pelos anos, pelo passado. Seus
efeitos demoram para aparecer.

A Grande Mentira não foi somente a enganação deliberadamente colocada na campanha


eleitoral de 2014, estelionato. Ela se baseia na construção de uma narrativa falsa. Repito, o
mérito dessa esquerda meio estranha, que dá dinheiro do trabalhador para eikes batistas, foi
realmente colocar a pobreza e a desigualdade como problemas a serem atacados. Mas,
afirmar que foram as políticas do lulopetismo, somente elas, responsáveis por isso, é má fé ou
ignorância econômica ou, como sempre digo, um pouco de cada uma.

Não vou rediscutir aqui algo que o eleitor já deve estar cansado de saber. A Grande Mentira se
baseou também nas pedaladas, na contabilidade criativa, na destruição sistemática da ordem
fiscal e monetária conquistada a duras penas. Para mim isto é chover no molhado. Neste
artigo, contudo, desejei apenas finalizar a trilogia dando destaque a uma mentira, nem sempre
revelada como tal.

Mas devo reconhecer que a “Nova Matriz Macroeconômica” não foi fruto da desonestidade,
mas da ignorância econômica mesmo. O que preocupa é ainda uma certa esquerda, petista e
do PSOL, ignorante em termos de economia. Melhor dizendo, a falta de conhecimentos
básicos de economia por parte dos intelectuais orgânicos do PT e PSOL – e a racionalização
que fazem sobre os fracassos com os apelos a teorias conspiratórias e a devoção a uma crença
voluntarista – são entraves não somente para o sucesso eleitoral desses partidos, mas também
para a construção de um debate mais honesto e informado sobre políticas econômicas e
sociais. Neste sentido, recomendo fortemente a leitura de artigo recente na Folha de São
Paulo sobre economia e a esquerda daquele que hoje considero o principal intelectual à
esquerda no Brasil, Celso Rocha de Barros.

Antes de acabar, um breve comentário. O que queremos ser? Creio que a maioria dos
brasileiros quer crescimento, estabilidade monetária e combate às desigualdades e pobreza.
Este foi o sinal dado pela reeleição de Lula e pela eleição daquela que nem vereadora foi,
Dilma Rousseff. Creio que desejamos mais. Precisamos buscar nosso sonho. Em geral
brasileiros oscilam entre a utopia e a distopia, ambas irracionais. O Brasil é ainda half full, half
empty, mas o momento pelo qual passamos nos coloca do lado “meio cheio”, ao contrário do
que a leitura comum que se faz do país hoje coloca (leitura distópica).

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Millôr Fernandes escreveu, “Brasil, o país do faturo”, Paulo Francis, “Talvez o Brasil já tenha
acabado e a gente não tenha se dado conta disso”, Raymundo Faoro, “Acho que a história do
Brasil é um romance sem heróis”, Stanislaw Ponte Preta, “A prosperidade de alguns homens
públicos do Brasil é uma prova evidente de que eles vêm lutando pelo progresso do nosso
subdesenvolvimento”, Millôr, mais uma vez, "O Brasil é realmente muito amplo e luxuoso. O
serviço é que é péssimo", Roberto Campos, “O Brasil é um país que não perde uma boa
oportunidade de perder uma boa oportunidade”, Barão de Itararé, Aparício Torelli, “O Brasil é
feito por nós. Só falta agora, desatar os nós".

Há algo de verdadeiro sobre nós nestas frases? Sim e não. Há algo que o dinamismo
econômico, social e informacional do país passa a não tolerar, talvez muito do que
subliminarmente acima está colocado. Nossa mania nacional é tentar prever o passado, como
seríamos se não o fossemos. Creio ser mais sensato desenhar o futuro, a partir do que somos.

Nota: recomendo aqui a leitura, com apresentação de Caetano Veloso, de Trópicos Utópicos,
de Eduardo Giannetti da Fonseca, lançado dia 27 de junho, pela Cia das Letras. Vale!

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Capítulo 02: Lula
Candidatos do Apocalipse: O Messianismo de Lula

Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/candidatos-do-apocalipse-o-messianismo-de-


lula/

É quase um consenso que Lula tenha realizado uma boa presidência (período de 2003 a 2010).
Mesmo acerca dessa afirmação é possível realizar diversas críticas, principalmente tendo em
vista o contexto internacional favorável na época, além de algumas medidas questionáveis
tomadas em seu segundo mandato.

Mas, independente das críticas, aquele Lula de 2003 a 2010 é totalmente diferente do Lula
atual, réu condenado em duas instâncias e candidato à presidência pelo PT (Partido dos
Trabalhadores) que talvez nem campanha possa fazer porque está preso e condenado em
segunda instância. Tal candidatura, caso seja viabilizada - algo improvável - e atinja o objetivo
almejado, que é o de vencer a eleição, representará não apenas uma derrota aos candidatos
da oposição, mas uma grande derrota institucional para o Brasil.

O mutualismo entre Lula e o PT

Nenhum partido brasileiro possui um líder (ou símbolo) tão soberano quanto o PT em relação
a Lula. O motivo para tamanho simbolismo se dá muito pelo fato de Lula ter sido o primeiro
candidato da sigla a se eleger como presidente da república, tendo ainda conseguido a
reeleição quatro anos depois. Além disso, foi o grande, se não o maior responsável, pelas duas
vitórias petistas nas eleições presidenciáveis posteriores, nas quais Dilma Rousseff foi eleita.

As vitórias petistas sofreram um grande revés, que foi a grave crise econômica brasileira,
iniciada em 2014 e que ainda assola o país. Mas o grande “golpe” nas estruturas do partido
ocorreu após o impeachment da ex presidente Dilma Rousseff. A partir disso, o PT sofreu uma
série de reveses, desde derrotas políticas a prisões de importantes membros do partido, entre
estes a do próprio Lula. Nas eleições municipais de 2016, a sigla petista quase saiu do mapa,
tendo sofrido inúmeras derrotas nas principais cidades do Brasil. A maior derrota talvez tenha
ocorrido na eleição para a prefeitura de São Paulo, em que o candidato pelo PT, Fernando
Haddad, não conseguiu ao menos levar a disputa eleitoral para o segundo turno.

Porém, parece que a relação entre PT e Lula ficou ainda mais forte nesse período de crise do
partido, chegando ao ponto de um quase mutualismo. Isso é demonstrado pela postura
relutante do partido em lançar um candidato à presidência que não seja Lula, mesmo sabendo
que este se encontra inelegível para as próximas eleições devido a Lei da Ficha Limpa. A
manutenção dessa postura pode custar caro ao partido, mas como em toda relação
mutualística, um não vive sem o outro, mesmo que isso resulte em graves consequências.

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Retórica pronta e o líder carismático

A retórica evocada pelo PT, desde o impeachment da ex presidente Dilma, é a de que o Brasil
vem sofrendo um golpe, que culminou na perseguição sistemática do partido e dos seus
principais representantes. Tal narrativa deve ser ainda mais reforçada, como uma forma
desesperada de reverter de algum modo a inexigibilidade de Lula.

Será relembrado que Dilma teria sido vítima de um golpe financiado pelas grandes elites, elites
que não satisfeitas, fazem de tudo para impedir qualquer retorno do partido que “defende” os
pobres. Mas nesse tipo de discurso será interessante observar a ausência de alguns algumas
informações relevantes. Como o fato dos governos petistas terem justamente privilegiado essa
chamada elite, algo que ocorreu a partir de vultosos financiamentos (muitos à margem da lei)
nunca antes vistos na história desse país.

Para superar tamanha inconsistência, o elemento carisma deve ser usado ao máximo. Aquela
figura de um Lula, retratado como um protetor dos oprimidos, um perseguido por algozes,
sendo o único capaz de fazer com que o Brasil volte aos tempos de prosperidade. Para quem
não quiser acreditar, basta clicar aqui.

O messianismo lulista

Infelizmente, algumas pessoas ainda acreditam cegamente na retórica petista, de que todos os
males pelos quais passam o Brasil, como o avanço da pobreza extrema e do elevado número
de desempregados, não são consequências da administração do PT, repleta de erros técnicos e
éticos, que podem ser observados nas pedaladas fiscais do governo Dilma e na série de
esquemas de corrupção. Para essas pessoas, o retorno de Lula à presidência significaria um
retorno da “bonança perdida”. Essa crença é baseada em certas ilusões, alimentadas pelo
carisma de Lula, junto com algumas premissas bem rasas em relação ao seu governo.

É como se bastasse a simples presença de Lula no Palácio da Alvorada, sorrindo e fazendo


promessas bastasse para que todos os problemas do país sumissem em um toque de mágica,
como um milagre. Mas as coisas não funcionam desse modo, e nenhum tipo de messias é
capaz de resolver os graves problemas econômicos do Brasil, ainda mais um que apregoa um
discurso que vai em direção oposta a resolução dos problemas do país, como a questões
trabalhista e previdenciária.

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Para começar, um retorno de Lula não viria junto com o pragmatismo da “Carta aos
brasileiros”, mas chegaria com uma retórica fortemente populista, cheia de chavões e meias
verdades, fundamentadas em um “mártir que retornaria para salvar o povo brasileiro”.

Esse tipo de retorno, de um líder quase que messiânico, pode ser interessante na ficção, mas
na vida real , e principalmente no campo da política, é altamente perigoso. Basta observar na
história recente, que países influenciados por líderes altamente carismáticos, geralmente
sofrem catástrofes econômicas acompanhados por autoritarismo político, a exemplo da China
na época de Mao Tsé-Tung, da Coréia do Norte e da atual Venezuela.

Vitória eleitoral de Lula e o “apocalipse”?

A candidatura de Lula não gira em torno de propostas, mas sim do mantenimento do seu
poder e do seu partido. Não há pautas definidas, como o que fazer com a dramática situação
da saúde? E o crescimento da violência? O regime previdenciário brasileiro está falido, e
agora? A única “proposta” é deslegitimar acusações bem fundamentadas e de repetir o jargão
de que a população pobre vem sofrendo. E, claro, reverter quase tudo que foi feito no governo
atual de Michel Temer.

Considerando um cenário hipotético, de uma vitória eleitoral de Lula, é bem provável que as
acusações que pesam sobre si e sobre o seu partido fossem abafadas. A população mais pobre
teria o seu contingente aumentado, assim como o nível de seu sofrimento. Esse cenário seria
decorrência da censura que com certeza seria instaurada, com o objetivo de impedir um novo
“golpe”, algo que sinalizaria uma quebra institucional do Brasil. Assim, uma série de empresas
sairiam do Brasil, o real sofreria uma desvalorização recorde, que viria junto a queda
significativa do índice Ibovespa.

Qualquer tentativa de reforma da Previdência seria barrada, algo que levaria a um inevitável
colapso do sistema previdenciário brasileiro, levando a diversas famílias que possuem como
única renda formal, as aposentadorias, literalmente passassem fome. Além disso, o
contingente de milhões de desempregados, cerca de 13 milhões, iria se elevar, dado que o
mercado de trabalho ficaria ainda mais inflexível (fora as empresas que sairiam do país por
questões institucionais). Nesse momento, é bem provável que a inflação entraria em
disparada, um flashback dos tempos pré Plano Real, gerando a necessidade de elevar a taxa
Selic como tentativa de contenção inflacionária.

Para amenizar a situação de caos, políticas populistas mal disfarçadas de políticas sociais,
seriam distribuídas, tendo como o único objetivo, angariar o apoio popular dar sustentação ao
regime. É bem provável que medidas esdrúxulas passem a entrar em vigor, a exemplo de
aumentos de 1000% no salário mínimo e da criação de uma série de novos impostos. A
situação que iria desembocar num inevitável movimento de insatisfação popular, que seria
contida por meio de violência e repressão, e claro, sendo acusado como golpista.

No final, chegaríamos num estado de quase convulsão social, com serviços sociais como de
educação e saúde, arruinados. Não haveria mais confiança no real, o desemprego só elevaria.

15
E tais problemas gerariam um novo ciclo de intervenção acompanhado por repressão, que
resultaria em um clímax apocalíptico, difícil de se prever com exatidão.

16
Governo Lula: Dissimulação, Displicência e Corrupção

Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/governo-lula-dissimulacao-displicencia-e-


corrupcao/

O juiz federal Sérgio Moro determinou nesta quinta-feira (5) a prisão do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, condenado em duas instâncias da Justiça no caso do triplex em Guarujá
(SP). No entendimento do Tribunal, Lula ocultou a propriedade do apartamento e o imóvel foi
recebido como propina da empreiteira OAS em troca de favores na Petrobras. A sociedade
brasileira está dividida. Apesar de todos lamentarem o ocorrido, alguns acreditam que o ex-
presidente é vítima de perseguição, outros enxergam a justiça sendo feita.

Independentemente do que se ache do caráter de Lula, é preciso reconhecer que sua gestão
foi, no mínimo, omissa e ineficiente. Há, por parte de muitos, a crença de que o governo Lula
foi apoteótico, uma mudança brusca em direção ao sucesso, e de que “nunca na história deste
país” o país foi tão próspero. Nada disso é verdade. O ex-presidente foi hábil em construir esta
narrativa, valendo-se de sua base de eleitores fiéis, que apostaram nele desde 1989.

Houve, sim, crescimento acelerado sob Lula, superior aos anos de FHC (4% contra 2.3% [1]),
mas como inúmeros economistas avisaram na época e como se pôde observar nos últimos
anos, o crescimento inicial foi essencialmente involuntário e, depois, insustentável e
absolutamente deficiente, além de não ter sido particularmente destacável entre as
economias emergentes.

Lula dissimulou esta realidade, além de ter feito boa parte da população, incluindo sua base
leal de eleitores, acreditar que seu primeiro governo representava rompimento com a política
econômica de FHC. Como pretendemos mostrar, o êxito econômico do primeiro governo Lula
deveu-se a três fatores: (i) estabilidade macroeconômica conquistada pelo governo anterior;
(ii) ventos externos excepcionalmente favoráveis; e (iii) equipe econômica competente,
alinhada ao que se taxa negativamente de neoliberalismo pelos próprios partidários de Lula.

Aproveitando a sua sorte, expressa pelos dois primeiros fatores, o petista foi displicente. Não
assentou quaisquer bases para o futuro e apenas fez o mínimo para garantir que o PT
continuasse no poder. O mínimo, em seu primeiro governo, era moderar seu discurso radical e
escalar uma equipe econômica independente, que assegurasse a manutenção dos avanços de
FHC e evitasse que incertezas provocassem um terremoto nos mercados.

No segundo governo, com os efeitos desestabilizadores do Mensalão ainda se fazendo sentir e


por ocasião da crise financeira internacional, Lula apelou ao populismo. Optou pelo caminho
mais fácil, apenas para emplacar sua sucessora, Dilma Rousseff.

Nesta segunda fase de Lula, o crescimento de curto prazo, empurrado sob as diretrizes
jurássicas do desenvolvimentismo e do dirigismo estatal, reforçou tremendamente a simbiose
entre o governo e grandes empresários. O governo passou a dever mais favores e a intervir
cada vez mais nos mercados. O resultado, é claro, foi a explosão de casos de corrupção, os
quais só tomamos ciência depois, com a Lava-Jato.

17
Por que dizemos tudo isso? Primeiro, convém lembrar que nas eleições municipais de 2000
alguns setores do PT ainda defendiam que os juros da dívida interna e externa não fossem
pagos. Os menos radicais propunham que isso fosse discutido e, no limite, o partido divulgou
um documento oficial (Um outro Brasil é possível) em que propunha renegociar a dívida
externa e limitar os recursos destinados aos juros da dívida pública interna.

Com razão, o mercado esperava a declaração de uma moratória se Lula chegasse ao poder.
Porém, em agosto de 2002, veio a Carta ao Povo Brasileiro [2], convenientemente lançada
para segurar os índices de confiança na economia brasileira, que despencavam. Nela, Lula se
comprometeu com o esforço fiscal previsto no acordo com o FMI, instituição que até hoje é
um dos grandes espantalhos da esquerda. Para confirmar suas intenções, publicou a Nota
sobre o Acordo com o FMI [3]. Tudo isso apesar de ter dito, em 02/05/2000 [4]:

“ Precisamos, em primeiro lugar, readquirir controle sobre nossa política fiscal e monetária,
hoje comandada pelo FMI, a serviço de geração de superávits primários para pagar os
credores”

Mas as resistências internas à drástica mudança na orientação da política econômica foram


superadas com o sucesso de Lula na campanha eleitoral. E, por fim, ele venceu as eleições. Dali
em diante, teria uma oportunidade de ouro, que certamente anteviu: apenas reafirmando o
que já dissera, poderia reduzir o risco-Brasil e encontrar espaço para diminuir a taxa de juros,
colhendo os aplausos de seu público.

Agora, vamos examinar brevemente o ano a ano de Lula na presidência, para fundamentar
melhor o que dissemos até então. No final, vamos fazer uma avaliação dos resultados positivos
e negativos do governo do petista.

2003: Manutenção da política econômica de FHC

Lula chama Antônio Palocci para ser seu Ministro da Fazenda, a mesma pessoa que, por
defender um ajuste fiscal e medidas ditas conservadoras, entraria em um embate tácito com a
ex-presidente Dilma Rousseff em 2005. Para presidir o Banco Central, o recém-empossado
presidente da República convoca o atual Ministro da Fazenda Henrique Meirelles, um golpista
neoliberal para partidários da ex-presidente.

Outros nomes competentes e que levam atualmente esta mesma alcunha também foram
escolhidos por Lula para compor sua equipe econômica. Dois deles estariam na liderança
daquilo que lhe foi mais caro junto a seu eleitorado: o Bolsa-Família. Marcos Lisboa e Ricardo
Paes de Barros capitanearam a unificação e ampliação dos programas sociais criados no
governo FHC [6]. O produto de seus esforços, o Bolsa-Família, foi um programa muito bem
executado e o número de famílias beneficiadas saltou dos 3.6 milhões do governo FHC para
12.8 milhões sob Lula.

18
A meta do superávit primário foi elevada de 3.75% para 4.25%, mesmo que isso não tenha sido
exigido pelo FMI, e cortes orçamentários acompanharam a decisão. Não era algo que se
esperaria de uma gestão petista, absolutamente. No entanto, foi feito. Lula é esperto e sabia
que não poderia desestabilizar o país, pois seu nome agora estava em jogo.

Para completar, a grande anátema da esquerda, a taxa de juros, continuou subindo bastante
até a metade do ano. Era preciso combater a inflação, que começou o ano em 13%, refletindo
o efeito-Lula (em 2002, as expectativas de inflação para 2003 subiram de 4.0% para 11% e o
câmbio se desvalorizou seguindo a escalada do risco-Brasil).

Nesse primeiro ano de governo, a sorte já começa a sorrir para Lula. A demanda por
exportações brasileiras aumenta, impulsionada pelo câmbio desvalorizado e pelo boom dos
preços das commodities, que pautam as vendas do país para o exterior. Este efeito seria
essencial para o sucesso do petista nos anos seguintes.

Agora, com a confiança de que a economia cresceria, Lula poderia ser até mais ousado com
questões espinhosas. Em mais um ato inesperado, o governo aprovou emendas constitucionais
relacionadas a reformas tributária e previdenciária.

Diante de tudo isso, os mercados se acalmaram e o risco-Brasil caiu. Então, o câmbio acabou
se apreciando e a inflação cedeu, possibilitando que a taxa de juros caísse um pouco. Ainda
assim, contrariando a crença de que, por questões ideológicas, a taxa de juros sob um governo
petista seria mais baixa do que com o PSDB na presidência, a taxa de juros real média foi de
12% em 2003-2006, tendo sido 1% mais baixa entre 1999-2002.

2004: Bonança fortuita

O aperto monetário se fez sentir e a inflação caiu de 9.3% para 7.6%. As taxas de juros
começaram a cair mais rapidamente e abriu-se espaço para economia crescer com mais vigor.
O crescimento do PIB, que havia sido de apenas 1.2% em 2003, foi de espantosos 5.7% em
2004. E qual foi o papel de Lula? Basicamente, não atrapalhar.

O primeiro presente dos deuses para Lula foi os termos de troca, isto é, o preço relativo entre
as nossas exportações e as nossas importações. O aumento da demanda internacional por
commodities, puxado pelo China, fez com que os termos subissem mais de 28% entre 2003 e
2010, um movimento extraordinário. Se olharmos apenas para os preços das exportações, a
dinâmica é ainda mais admirável: enquanto que entre 1975 e 2002 eles se mantiveram mais
ou menos constantes, subiram cerca de 104% durante o governo Lula.

De fato, os consecutivos superávits comerciais que observamos nestes oito anos poderiam ter
sido déficits ou superávits muito menos expressivos se os preços anteriores tivessem sido
mantidos. Mas essa não foi a única fonte de melhoria involuntária nas contas externas. Pelo
lado do investimento, as condições também eram deslumbrantes: a taxa de juros
internacional, já em níveis reduzidos, permaneceu caindo.

19
Em conjunto, a alta no preço das commodities e os juros baixos alimentaram o apetite ao
risco. Nossas altas taxas de juros representavam um retorno relativo elevado aos investidores
estrangeiros e, ao mesmo tempo, emprestar dinheiro para economias dependentes de
commodities tinha risco reduzido. Foi a época da abundância do crédito internacional. Com a
injeção de dólares na economia, a taxa de câmbio se apreciou em mais de 43% entre 2003 e
2010, tornando o controle da inflação algo bem mais simples que em épocas anteriores.

Por último, é preciso lembrar que havia um exército de mão de obra para ocupar, pois Lula
assumiu o país no início do ciclo econômico. O índice do número de trabalhadores
desempregados caiu em cerca de 40% entre 2003 e 2010. Naturalmente, uma política
preguiçosa que atuasse apenas pelo lado da demanda, como a de Lula, iria funcionar em um
ambiente como esse.

A economia cresceu vibrante no período não porque a produção no país estava se tornando
mais eficiente, moderna e resiliente, mas porque a capacidade ociosa foi sendo ocupada. Em
outras palavras, trabalhadores desempregados preencheram vagas, mas em momento algum
houve preocupação em criar mais vagas ou aumentar a produtividade destes trabalhadores.

2005: Mensalão

Com a chegada de 2005, veio a crise política. O escândalo do Mensalão, esquema de compra
de votos pelo PT no Congresso Nacional, estoura e expõe as distensões dentro do partido. Com
a queda de sua cúpula dirigente, começou a ficar impossível administrar as diferenças em
relação à condução da política econômica. Como conta Rogério Werneck em A Ordem do
Progresso [7], uma onda de revisionismo acometeu o PT, e a percepção que se tinha era de
que o partido deveria se purgar para restabelecer a ética, renegando também seu novo
discurso econômico.

Dilma Rousseff, com sua sanha desenvolvimentista, entra na Casa Civil, substituindo José
Dirceu. Ao mesmo tempo, havia pressão para tirar Palocci da Fazenda. Ele estava levando
muitos créditos pelo sucesso da economia e, ainda por cima, nem ele, nem ninguém da equipe
econômica, foi implicado no Mensalão como tantos outros membros importantes do PT.

A cereja no bolo foi sua proposta de contenção do gasto público no longo prazo, pois este já
estava aumentando em uma taxa de duas vezes o crescimento do PIB. A ideia de Palocci era
facilitar a queda dos juros (houve um novo ciclo de aperto monetário de setembro/2004 a
outubro/2005), aumentar os investimentos e reduzir os impostos. Ninguém no governo o
ouviu.

2006: Desenvolvimentismo chega à Fazenda

Em março de 2006, Palocci se demite e a ideia de ajuste fiscal é oficialmente abandonada, com
a perspectiva de aumento da arrecadação. Entra mais um desenvolvimentista ferrenho no
governo: Guido Mantega vira Ministro da Fazenda.

20
Naquele mesmo ano, Mantega dá uma entrevista ao Financial Times [8] em que revela como
seria sua descompensada gestão. Ele diz que, como o governo não contava com muitos
recursos pra investir, então deveria financiar o investimento privado – com seus próprios
recursos, claro! Também faz uma segunda afirmação contraditória, de que não havia
necessidade de reforma fiscal. Portanto, muito antes de qualquer preocupação com a crise
mundial, se delineava a distorciva política de campeões nacionais.

2007: Demagogia que custa caro

No início de 2007, veio o malfadado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Apesar de


o quadro fiscal não estar com folga suficiente para investimentos pesados em infra-estrutura,
o governo mantém sua inação diante da necessidade de se desenhar um arcabouço
regulatório para atrair capital privado e tirar o peso de cima do Estado. Lula começa apelar ao
populismo dos gastos desmedidos para eleger sua sucessora, anunciada já neste primeiro ano
do segundo mandato.

Não se chega sequer a discutir o benefício que agências reguladoras independentes trariam
para o setor e para o país – sobrecarregar o Estado e agigantar estatais como a Petrobrás e a
Eletrobrás era visto como um caminho mais conveniente. Obviamente, o governo necessitava
de financiamento para isso. Luta, sem sucesso, para prolongar a CPMF, um imposto em
cascata, o mesmo que Joaquim Levy tentou reviver em 2015, sob duras críticas.

Enquanto isso, o boom das commodities continuava, o câmbio se apreciava, a economia


crescia por força dos mesmos fatores já citados, os juros apertavam por conta do risco de
inflação, e se inicia a elevação acelerada do salário mínimo com uma nova regra de indexação.
Como nada foi feito a respeito da baixa produtividade do trabalhador brasileiro, os salários
passaram a subir acima do desejável, e o Brasil perdeu em competitividade externa. Mais uma
vez, em nome do populismo, o governo fechou uma porta que conduz ao crescimento no
longo prazo.

É preciso salientar que esta pressão adicional nos salários não tinha nenhuma justificativa
racional: a migração dos trabalhadores do campo para a cidade havia se esgotado e o nível de
escolaridade aumentava, de forma que a mão-de-obra menos qualificada ficou mais escassa.
Isso já estava incrementando mais seu rendimento em relação ao do trabalhador de maior
nível de instrução. A desigualdade cairia de qualquer maneira, ainda mais levando em conta os
programas sociais que atuavam.

2008: Uma desculpa para continuar errando

Neste ano, o governo ainda gerava superávits primários e a inflação estava controlada. O tripé
do governo FHC continuava a ser sustentado enquanto o cenário externo permanecia
amplamente favorável e havia abundância de liquidez internacional.

21
A S&P, agência de rating, deu o título de grau de investimento ao Brasil – o país entrou no
grupo de nações consideradas de pouca possibilidade de inadimplência. Dessa vez, Lula deu
bastante importância à S&P, à revelia do que faria em 2015, quando o Brasil perdeu o grau de
investimento. Nessa ocasião, Lula disse o seguinte sobre o rebaixamento [9]:

Não significa nada

Mas a crise financeira internacional abriu as portas do inferno fiscal. A deterioração das contas
públicas nas economias de ponta fez o Brasil parecer relativamente muito bem. Agora, o
governo estaria plenamente confortável para intensificar, e muito, o que já havia começado. O
caminho estava aberto para o aprofundamento da problemática capitalização do BNDES.

2009/2010: Irresponsabilidade

Em 2009, a queda da economia foi bastante suave, de apenas 0.3%. Não era necessário manter
o expansionismo fiscal nos níveis em que estavam, tanto que no ano seguinte cresceu-se a
insustentáveis 7.5%. Mas Lula seguia chamando o descontrole de simples “política
contracíclica” e mantendo a sangria fiscal. Por que? Porque ele não podia arriscar. Precisava
assegurar a vitória de Dilma, já que no final de 2009 ainda não estava claro quem venceria. E
despesas correntes ganham votos.

Grande parte da dívida emitida em 2009 e 2010 foi destinada a capitalizar o BNDES. Os
recursos eram repassados ao banco de forma serem emprestados a poderosos grupos
industriais a taxas de juros reduzidas. Era a política de campeões nacionais. Além de ter sido
uma fábrica de corrupção, esta política provocou perdas irreparáveis aos cofres públicos, uma
vez que a taxa cobrada dos empresários, a TJLP, era sensivelmente mais baixa que a taxa de
captação do dinheiro, a SELIC.

Os problemas não param por aí. A vertiginosa expansão do crédito estatal, que chegou a
injetar nada menos que 230 bilhões de reais no BNDES (quase o tamanho do ajuste fiscal que o
governo tem que fazer atualmente), começou a solapar a Lei de Responsabilidade Fiscal. Esta
instituição, que havia consolidado a estabilização do país, estava se desmantelando sob a
perigosa reaproximação entre bancos públicos e o setor público não financeiro. Para piorar,
entra em cena a contabilidade criativa.

A gastança do final do segundo governo Lula foi muito bem disfarçada sob o questionável
superávit primário de 1.9% do PIB em 2009. Os aportes ao BNDES naquele ano foram da
ordem de 2.9% do PIB, mas não foram contabilizados na dívida líquida, com a justificativa de
que seriam ativos do governo. Por outro lado, os dividendos devolvidos do BNDES ao Tesouro
eram adicionados ao resultado primário. Esta assimetria não permite avaliar a solidez dos
superávits dos últimos anos de Lula.. As contas públicas já haviam perdido a credibilidade
antes mesmo das pedaladas de Dilma Rousseff.

22
Progressos

Houve redução da desigualdade de distribuição de renda? É claro que sim. Como dissemos,
políticas de curto prazo orientadas ao consumo funcionam quando há um enorme contingente
de desempregados, como havia no início do governo Lula. Assim, houve uma redução de
50.6% da pobreza extrema.

Mas redução da pobreza extrema não foi uma exclusividade da gestão petista, como Lula gosta
de afirmar. 32% das pessoas nesta situação subiram de nível de renda durante o governo FHC.
Nada mais natural que esse percentual tenha subido em anos de crescimento mais elevado e
sob a condução eficaz de políticas redistributivas (que, como dissemos, estavam nas mãos de
economistas afinados com o tal do neoliberalismo).

Ademais, o gasto social subiu 5.5% com FHC, o que enterra de vez o mito de que não houve
preocupação social no governo do tucano. A bem da verdade, o gasto social cresceu em 8.2% a
mais sob Lula, 2.7% acima da gestão anterior, mas isso era natural em um contexto de mais
crescimento.

Por fim, sejamos justos: o índice Gini, que mede a desigualdade de renda, vem caindo
continuamente desde 1993, quando era 0.6. Em 2002, já tinha passado para 0.56. Ao final do
governo Lula, em 2010, estava em 0.53. A queda na desigualdade, portanto, foi até um pouco
maior durante a gestão de FHC, certamente um efeito da estabilização monetária e da adoção
do tripé macroeconômico.

Erros e Oportunidades Perdidas

Na contramão de suas frágeis conquistas, Lula concedia uma miríade de benesses e privilégios
a produtores nacionais de bens de capital, criando exigências absurdas de conteúdo local.
Essas decisões prejudicaram especialmente a Petrobrás, impactando em seus custos e criando
um ambiente fértil para corrupção. Lula apenas aprofundou as consequências nefastas do
nosso antigo sistema econômico, o capitalismo de compadrio. No Brasil, as empresas
competem para conseguir proteção e incentivos governamentais, e não para inovarem e
aumentarem sua produtividade.

A inflação legada por Lula foi alta, de 5.9% (já muito próxima do teto da meta de 6.5%), na
esteira dos gastos descontrolados de seu segundo governo. A demanda foi excessivamente
pressionada e isso aumentou o nível dos preços em uma economia com a capacidade já em
vias de se esgotar (o desemprego foi de 6.7% em 2010). Foi o prenúncio do desmonte do
regime de metas de inflação protagonizado pelo governo Dilma.

Praticamente nada foi feito para aumentar a capacidade produtiva do país e, assim, assegurar
o progresso da economia brasileira no futuro: a agenda microeconômica foi abandonada, a
produtividade decresceu, o nível de investimentos se manteve insuficiente, a competitividade
em relação a empresas estrangeiras piorou, a carga tributária aumentou e a infra-estrutura
continuou precária, principalmente porque muito pouca atenção foi dada a setores de base,
como saneamento e transporte.

23
A poupança total, a contrapartida necessária para investimentos produtivos, aumentou em um
percentual ínfimo (foi de 17.3% do PIB em 1995-2002 a 17.6% em 2003-2010), mesmo com a
contribuição positiva da poupança externa. Pudera. A poupança interna, soma da poupança
pública com a privada, foi pressionada para baixo pelo aumento do consumo do governo e das
famílias. Por isso, o investimento ficou estagnado nos mesmos níveis obtidos por FHC (durante
ambos os governos, a formação bruta de capital fixo foi, em média, de 17% do PIB).

O baixo nível de investimentos, somado à falta de atitude para fazer reformas necessárias e
aos incentivos incorretos ao setor produtivo, refletiu negativamente na produtividade, como
era de se esperar. O crescimento nos anos Lula, pautado no emprego e na utilização de
capacidade produtiva ociosa, tinha um limite - não há como criar mais emprego quando já não
existem desempregados em número suficiente, nem como sobreutilizar o capital quando este
já está desgastado.

Há, no entanto, duas opções: ampliar a capacidade instalada via investimentos e/ou aumentar
a produtividade do trabalhador, com uma agenda que passa necessariamente pela abertura
comercial e melhoria do ambiente de negócios. Lula não tratou destes problemas de oferta,
que ficam evidentes por qualquer ótica de medida da produtividade do brasileiro.

Um trabalho do pesquisador Renato Fonseca [10], por exemplo, avalia que enquanto a
produtividade por homem ocupado na indústria de transformação na década de 1990 foi de
6.5%, na média, na década seguinte despencou para 0.3%. Já um estudo do Boston Consulting
Group [11] estima que a taxa de crescimento da produtividade (em todos os setores) entre
2001 e 2011 foi de apenas 1%, perdendo para Chile, México e Rússia.

Conclusão

Lula mudou de convicções conforme lhe convinha eleitoralmente. Suas ações frequentemente
contraditórias colocam em dúvida se possuía qualquer projeto de país. Mas não teria o ex-
presidente acertado ao se adaptar a diferentes situações, dando para elas respostas distintas e
assegurando quase sempre um elevado crescimento?

Não. Um sonoro não. Como vimos, nenhum dos fundamentos para um crescimento duradouro
foi prioridade em seu governo. Muitos erros estratégicos foram cometidos, erros que só
seriam sentidos no médio prazo, durante a atrapalhada (para dizer o mínimo) gestão de Dilma.

Quando Lula assumiu, o Brasil estava em plena condição de expandir seu potencial. O
presidente nada fez, mas vendeu como se tivesse feito. Foi dissimulado. Entregou o país
essencialmente como o encontrou, senão pior. Foi displicente. Entrou no governo como
paladino da honestidade. Mas, segundo o entendimento da justiça, na realidade foi corrupto.

Referências

24
Quando não apontado, os dados foram retirados de [1], [5] ou [7]

[1] Giambiagi, F., Villela, A., Castro, L., Hermann, J. Economia Brasileira Contemporânea: 1945
– 2010. 2ª Edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

[2] http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u33908.shtml

[3] http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u35644.shtml

[4] Ver referência [1]

[5] Schwartsman, A., Giambiagi F. Complacência: Entenda por que o Brasil cresce menos do
que pode. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

[6] Para os que se perguntam sobre como e quais eram estes programas, Rogério Werneck os
lista em A Ordem do Progresso – ver referência [7] - e Fábio Giambiagi os descreve em
Economia Brasileira Contemporânea – ver referência [1].

[7] Abreu, M. de P. (org). A Ordem do Progresso: Dois Séculos de Política Econômica no Brasil.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

[8] Ver “Guido Mantega: Interview transcript”, 1° de abril de 2006, disponível em


http://www.ft.com

[9]https://oglobo.globo.com/economia/lula-sobre-rebaixamento-do-brasil-nao-significa-nada-
1-17451611

[10] Fonseca, R. Produtividade e crescimento da indústria brasileira. Revista Brasileira de


Comércio Exterior. Funcex, 2012.

[11] Disponível em
https://www.bcgperspectives.com/content/articles/growth_value_creation_strategy_brazil_c
onfronting_the_productivity_challenge/

25
As provas contra Lula: 3 mil evidências, 13 casos e R$ 80 milhões em propina

Retirado de: https://epoca.globo.com/politica/noticia/2017/05/provas-contra-lula-3-mil-


evidencias-13-casos-e-r-80-milhoes-em-propina.html

No fim da tarde de uma segunda-feira recente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu
ao palco de um evento organizado pelo PT em Brasília. Empunhou sua melhor arma: o
microfone. Aos profissionais da imprensa que cobriam o evento, um seminário para discutir os
rumos da economia brasileira, o ex-presidente dispensou uma ironia: “Essa imprensa tão
democrática, que me trata maravilhosamente bem e, por isso, eu os amo, de coração”. Lula
estava a fim de debochar. Não demorou para começar a troça sobre os cinco processos
criminais a que responde na Justiça. Disse que há três anos ouve acusações sem o direito de se
defender, como se não tivesse advogados. “Eu acho que está chegando a hora de parar com o
falatório e mostrar prova. Eu acho que está chegando a hora em que a prova tem de aparecer
em cima do papel”, disse, alterado. Lula repetia, mais uma vez, sua tática diante dos casos em
que é réu: sempre negar e nunca se explicar. E prosseguiu: “Eu quero que eles mostrem R$ 1
numa conta minha fora desse país ou indevida. Não precisa falar que me deu 100 milhão, 500
milhão, 800 milhão... Prove um. Não estou pedindo dois. Um desvio de conduta quando eu era
presidente ou depois da Presidência”. Encerrou o discurso aplaudido, aos gritos de “Brasil
urgente, Lula presidente!”.

A alma mais honesta do Brasil, como o ex-presidente já se definiu, sem vestígio de fina ironia,
talvez precise consultar seus advogados – ou seus processos. Há, sim, provas abundantes
contra Lula, espalhadas em investigações que correm em Brasília e em Curitiba. Estão em
processos no Supremo Tribunal Federal, em duas Varas da Justiça Federal em Brasília e na 13ª
Vara Federal em Curitiba, aos cuidados do juiz Sergio Moro. Envolvem uma ampla e formidável
gama de crimes: corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa, crime contra a
Administração Pública, fraude em licitações, cartel, tráfico de influência e obstrução da Justiça.
O Ministério Público Federal, a Polícia Federal, além de órgãos como a Receita e o Tribunal de
Contas da União, com a ajuda prestimosa de investigadores suíços e americanos, produziram,
desde o começo da Lava Jato, terabytes de evidências que implicam direta e indiretamente
Lula no cometimento de crimes graves. Não é fortuito que, mesmo antes da delação da
Odebrecht, Lula já fosse réu em cinco processos – três em Brasília e dois em Curitiba. Também
não é fortuito que os procuradores da força-tarefa da Lava Jato, após anos de investigação,
acusem Lula de ser o “comandante máximo” da propinocracia que definiu os mandatos
presidenciais do petista, desfalcando os cofres públicos em bilhões de reais e arruinando
estatais, em especial a Petrobras.

A estratégia de Lula é clara e simples. Transformar processos jurídicos em campanhas políticas


– e transformar procuradores, policiais e juízes em atores políticos desejosos de abater o
maior líder popular do país. Lula não discute as provas, os fatos ou as questões jurídicas dos
crimes que lhe são imputados. Discute narrativas e movimentos políticos. Nesta quarta-feira,
dia 10, quando estiver diante de Moro pela primeira vez, depondo no processo em que é réu
por corrupção e lavagem de dinheiro, acusado de receber propina da OAS por meio do tríplex
em Guarujá, Lula tentará converter um ato processual (um depoimento) num ato político (um
comício).

26
Se não conseguir desviar a atenção, saindo pela tangente política, Lula terá imensa dificuldade
para lidar com as provas – sim, com elas. Nesses processos e em algumas investigações ainda
iniciais, todos robustecidos pela recente delação da Odebrecht, existem, por baixo, cerca de 3
mil evidências contra Lula. Elas foram analisadas por ÉPOCA. Algumas provas são fracas –
palavrórios, diria Lula. Mas a vasta maioria corrobora ou comprova os crimes imputados ao
petista pelos procuradores. Dito de outro modo: existe “prova em cima de papel” à beça. Há,
como o leitor pode imaginar, toda sorte de evidência: extratos bancários, documentos fiscais,
comprovantes de pagamento no Brasil e no exterior, contratos fajutos, notas fiscais frias, e-
mails, trocas de mensagens, planilhas, vídeos, fotos, registros de encontros clandestinos,
depoimentos incriminadores da maioria dos empresários que pagavam Lula. E isso até o
momento. As investigações prosseguem em variadas direções. Aguardem-se, apesar de alguns
percalços, delações de homens próximos a Lula, como Antonio Palocci e Léo Pinheiro, da OAS.
Renato Duque, ex-executivo da Petrobras, deu um depoimento na sexta-feira, dia 5, em que
afirma que Lula demonstrava conhecer profundamente os esquemas do petrolão. Existem
outras colaborações decisivas em estágio inicial de negociação. Envolvem crimes no BNDES, na
Sete Brasil e nos fundos de pensão. Haja prova em cima de papel.

Trata-se até agora de um conjunto probatório, como gostam de dizer os investigadores, para lá
de formidável. Individualmente e isoladas, as provas podem – apenas – impressionar.
Coletivamente, organizadas em função do que pretendem provar, são destruidoras; em alguns
casos, aparentemente irrefutáveis. Nesses, podem ser suficientes para afastar qualquer dúvida
razoável e, portanto, convencer juízes a condenar Lula por crimes cometidos, sempre se
respeitando o direito ao contraditório e à ampla defesa – e ao direito a recorrer de possíveis
condenações, como qualquer brasileiro. Não é possível saber o desfecho de nenhum desses
processos.

Ainda assim, os milhares de fatos presentes neles, na forma de provas judiciais, revelam um
Lula bem diferente daquele que encanta ao microfone. As provas jogam nova luz sobre a
trajetória de Lula desde que assumiu o Planalto. Assoma um político que conheceu três
momentos distintos. O primeiro momento deu-se como um presidente da República que
decidiu testar os limites do fisiologismo e clientelismo da política brasileira. A partir de 2003, e
com mais força em 2004, Lula começou a agir para beneficiar, em atos sucessivos,
empreiteiras e grandes grupos empresariais, por meio de homens de confiança em postos-
chave no governo. Era, naquele momento, um político cujas campanhas e base aliada eram
financiadas, comprovadamente, com dinheiro de propina desses mesmos empresários – entre
outros. Era um político que caíra nas graças do cartel de empreiteiras que rapinava a Petrobras
e comprava leis no Congresso.

O segundo momento sobreveio entre 2009 e 2010, conforme o tempo dele no poder se
aproximava do fim – e, com Dilma Rousseff como sucessora, todos, em tese, continuariam a
prosperar. Nesse ponto, assomou um político que, pelo que as provas e depoimentos indicam,
passaria a viver às custas das propinas geradas pelo cartel que ajudara a criar. Entre 2009 e
2010, o cartel, em especial Odebrecht e OAS, passou a se movimentar para assegurar que Lula
e sua família tivessem uma vida confortável. Faziam isso porque, como já explicaram, deviam
propina ao ex-presidente e, não menos importante, pela expectativa de que ele usasse sua

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influência junto a Dilma Rousseff para manter o dinheiro do governo entrando nas empresas –
como fez, de fato, em algumas ocasiões.

Nesse período de final de mandato, houve uma série de operações fraudulentas e


clandestinas, comandadas pelo cartel, que resultaram na multiplicação do patrimônio de Lula.
Usaram-se laranjas e intrincadas transações financeiras para esconder a origem do dinheiro
dos novos bens do ex-presidente. Mas, hoje, esses estratagemas foram descobertos, com
fartura de provas, pelos investigadores. Da Odebrecht, Lula ganhou o prédio para abrigar seu
instituto, um apartamento em São Bernardo do Campo, onde mora até hoje, e a reforma de
um sítio em Atibaia que, todas as provas demonstram, pertence ao petista, e não é somente
“frequentado” por ele. Da OAS, ganhou o famoso tríplex em Guarujá, assim como as reformas
pedidas por ele – o apartamento só ficou pronto após a Lava Jato, de modo que não houve
tempo para que Lula e família se mudassem para lá. A mesma OAS passou a bancar o
armazenamento do acervo presidencial do petista. Todas essas operações – todas – foram
feitas clandestinamente, para ocultar o vínculo entre Lula e as empreiteiras. Todas foram
debitadas do caixa de propinas que Lula mantinha junto às empreiteiras.

Além de dar moradia a Lula, as empreiteiras passaram a bancar o ex-presidente e sua família,
além de pessoas próximas. Havia, segundo as provas disponíveis, pagamentos de propina da
Odebrecht a um dos filhos do presidente, a um irmão dele, a um sobrinho e a Paulo Okamotto,
presidente do Instituto Lula e um dos assessores mais próximos de Lula. Havia pagamentos em
dinheiro vivo e, em alguns, casos, por meio de empresas – como a de um filho e a de um
sobrinho. Havia, ainda, os pagamentos à empresa de palestras de Lula e ao próprio Instituto
Lula. Na maioria dos casos, segundo as evidências, não se tratava de doação ou contratação
para palestras, embora essas tenham acontecido em alguns casos. Trata-se de propina
disfarçada de doação. Até que a Lava Jato mudasse tudo, Lula e seus familiares receberam, de
acordo com as evidências disponíveis e se obedecendo a um cálculo conservador, cerca de R$
82 milhões em vantagens indevidas – bens ou pagamentos ilegais.

O terceiro momento de Lula, aquele que as provas revelam com mais nitidez, precipita-se em
março de 2014, quando irrompe a Lava Jato. O petista, que sabia o que fizera e intuía o
potencial da operação, preocupou-se. É esse Lula preocupado – quiçá desesperado – que
aparece nos processos de obstrução da Justiça. Que, segundo depoimentos e documentos,
tenta destruir provas. Tenta, em verdade, destruir a Lava Jato, para por ela não ser destruído.
Há semanas, dias antes do discurso de Lula em Brasília, a voz rouca de Léo Pinheiro sacudira
Curitiba. Diante do juiz Sergio Moro, Léo Pinheiro expunha segredos guardados por anos. “Eu
tive um encontro com o presidente, em junho... bom, isso tem anotado na minha agenda,
foram vários encontros.” Era 20 de abril e Léo falava de um encontro mantido há quase três
anos, em maio de 2014, quando a Lava Jato começava a preocupar. “O presidente,
textualmente, me fez a seguinte pergunta: ‘Léo’, e eu notei até que ele estava um pouco
irritado, ‘você fez algum pagamento a João Vaccari no exterior?’. Eu disse: ‘Não, presidente,
nunca fiz nenhum pagamento dessas contas que nós temos com Vaccari no exterior’. ‘Como é
que você está procedendo os pagamentos para o PT?’. ‘Através do João Vaccari. Estou
pagando, estamos fazendo os pagamentos através de orientação do Vaccari, caixa dois e
doações diversas que nós fizemos a diretórios e tal’. ‘Você tem algum registro de algum

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encontro, de conta, de alguma coisa feita com o João Vaccari com você? Se tiver, destrua.
Ponto. Acho que quanto a isso não tem dúvida’.”

Lula, como Renato Duque confirmou em depoimento a Moro na sexta-feira, estava se


mexendo para descobrir quanto estava sob risco. No depoimento, Duque, que fora indicado
pelo PT e pelo próprio Lula à Diretoria de Serviços da Petrobras, destruiu o antigo chefe. Disse,
como Léo Pinheiro, que Lula “tinha o pleno conhecimento de tudo, tinha o comando”. Referia-
se ao petrolão. Nas últimas semanas, Duque e o ex-ministro Palocci disputavam quem fecharia
antes um acordo de delação premiada, em busca de pena menor. Ambos pretendiam entregar
informações sobre Lula, pois suas defesas detectaram que a Lava Jato queria mais elementos
para cravar que o então presidente não só sabia da existência, como comandava o esquema de
corrupção na Petrobras. Palocci recuou duas ou três casas em sua negociação, após a
libertação do ex-ministro José Dirceu. Duque aproveitou para avançar. Disse que encontrou
Lula pessoalmente três vezes. “Nessas três vezes ficou claro, muito claro para mim, que ele
tinha pleno conhecimento de tudo, tinha o comando”, disse Duque. No último encontro, em
2014, segundo Duque, Lula perguntou se ele tinha recebido dinheiro na Suíça da holandesa
SBM, fornecedora da Petrobras. Duque diz que negou. Lula, então, perguntou: “Olha, e das
sondas? Tem alguma coisa?”. Lula se referia a negócios da Sete Brasil, a estatal criada para
turbinar o petrolão. Duque afirma que mentiu a Lula ao dizer que não tinha. Ouviu do então
presidente, de saída do cargo: “Olha, presta atenção no que vou te dizer. Se tiver alguma coisa,
não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome, entendeu?”.

No ano seguinte, Lula prosseguiu em sua tentativa desesperada de sabotar a Lava Jato. Em
maio de 2015, o então senador Delcídio do Amaral foi à sede do Instituto Lula, em São Paulo.
Àquela altura, líder do governo no Senado, Delcídio era um interlocutor frequente de Lula
sobre a situação precária do governo Dilma no Congresso, mas, principalmente, sobre o
avanço da Lava Jato em direção ao coração petista. Na conversa, Lula se disse preocupado com
a possibilidade de seu amigo, o pecuarista José Carlos Bumlai, ser engolfado pela operação.
Delcídio percebeu que fora convocado para discutir o assunto. Avisou que Bumlai poderia ser
preso devido às delações do lobista Fernando Baiano e do ex-diretor da Petrobras Nestor
Cerveró. Delcídio também tinha medo disso, pois recebera propina junto com Cerveró. Então,
contou a Lula que, quatro meses antes, recebera um pedido de ajuda financeira de Bernardo,
filho de Cerveró. Delcídio afirma que Lula determinou que era preciso ajudar Bumlai.

Assim, Delcídio passou a trabalhar. Dias depois, encontrou-se com Maurício, filho de Bumlai, e
“transmitiu o recado e as preocupações de Lula”. Maurício topou a empreitada: era preciso
bancar as despesas com advogado e sustentar a família para “segurar” a delação de Cerveró e,
assim, tentar salvar o pai de Maurício. Nos meses seguintes, Maurício Bumlai entregou R$ 250
mil em espécie a um assessor de Delcídio, em encontros em São Paulo. O dinheiro era levado
depois à família Cerveró. Quando, em setembro, ÉPOCA publicou que Cerveró fechara um
acordo de delação, Maurício interrompeu os pagamentos. Em novembro de 2015, Delcídio foi
preso, por ordem do Supremo, por tentar obstruir a Lava Jato.

Por meio de nota, o Instituto Lula afirma que “não há nenhum” ato ilegal nas delações dos
executivos da Odebrecht e que as delações não são provas, mas “informações prestadas por
réus confessos que apenas podem dar origem a uma investigação. Por enquanto, o que existe

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são depoimentos feitos aos procuradores, a acusação, divulgados de forma espetacular”.
Sobre a “conta Amigo”, a nota afirma ser “a mais absurda de todas as ilações no depoimento
de Marcelo Odebrecht”. “Se for verdadeiro o depoimento, Marcelo Odebrecht teria feito, na
verdade, um aprovisionamento em sua contabilidade para eventuais e futuras transferências
ou pagamentos. A ser verdadeira, trata-se, como está claro, de uma decisão interna da
empresa. Uma ‘conta’ meramente virtual, que nunca se materializou em benefícios diretos ou
indiretos para Lula.” Sobre a ajuda da Odebrecht a Luís Cláudio, um dos filhos de Lula, o
Instituto Lula afirma que “mesmo considerando real o relato de delatores que precisam de
provas, Emílio Odebrecht e Alexandrino Alencar relatam que a ajuda para o filho de Lula iniciar
um campeonato de futebol americano foi voluntária e após diversas conversas e análises do
projeto”. Sobre a mesada de R$ 5 mil que a Odebrecht pagou por anos a Frei Chico, irmão do
ex-presidente, a nota afirma que “não só Lula não pediu, como não foi dito que Lula teria
pedido”. Afirma que o principal assessor de Lula, Paulo Okamotto, “negou ter recebido
qualquer ‘mesada’ de Alexandrino Alencar”. O Instituto diz que a Odebrecht não inventou Lula
como palestrante e que “as palestras eram lícitas e legítimas”.

As provas contra o petista apontam pagamentos de propina que chegam a 80 milhões:

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Capítulo 03: Dossiê BNDES
Retirado de: http://terracoeconomico.com.br/dossie-bndes/

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, que atende pela sigla de BNDES, foi
criado em 1952, por meio da Lei nº 1.628/1952, no segundo governo de Getúlio Vargas. Seu
estatuto deixa claro que seu objetivo é “Promover o desenvolvimento sustentável e
competitivo da economia brasileira, com geração de emprego e redução das desigualdades
sociais e regionais.”

Como todo banco de fomento, o BNDES opera com dinheiro público, principalmente vindo do
FAT, o Fundo de Amparo ao Trabalhador, custeado com impostos. Mais recentemente, o
banco passou a receber aportes do Tesuro Nacional, que ultrapassaram R$410 bilhões no
período de 2008 a 2014.

Bancos desse tipo deveriam subsidiar única e exclusivamente projetos cujo retorno social
supere o retorno privado (diz-se que esses projetos têm “VPL social positivo”). São
investimentos que a iniciativa privada não tem tanto interesse, por não conseguir capturar os
benefícios externos gerados (chamados de “externalidades positivas”), mas cujos impactos
sociais têm grande relevância. Justamente por ter objetivos tão focalizados, um banco de
desenvolvimento deveria ser enxuto.

Entretanto, não é isso o que se vê por aqui. O BNDES, especialmente nos últimos anos, tomou
uma proporção assustadora. A carteira de crédito total do banco saiu de cerca de 4,7% do PIB,
em 2007, para quase 11% do PIB, em 2015, expansão esta abastecida com recursos do Tesouro
Nacional, via emissão de dívida.

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É algo nunca antes visto na história deste país. Trata-se de uma enorme distorção na alocação
de recursos, que deixa de seguir a lógica do mercado e passa a seguir a lógica do jogo político.
Setores são artificialmente inflados, o que prejudica a produtividade média e seu crescimento,
como mostra um estudo de Monica de Bolle.

O BNDES é uma máquina de produzir desigualdade e ineficiência

Como resposta à crise de 2008, o governo petista resolveu assumir um papel ainda maior no
controle da economia. Entre medidas como aumento de gastos públicos, controle de preços e
do câmbio, e corte de juros na marra, uma se destacava: a promoção de “campeãs nacionais”.
Essas tais “campeãs nacionais” nada mais eram do que empresas em “setores estratégicos”,
que o governo julgava capazes de competir internacionalmente.

Empresas como Oi, JBS e EBX receberam bilhões de reais do banco, para supostamente
financiarem seus investimentos e se alçarem ao mercado global. Em outras palavras, o BNDES
quis assumir o papel do mercado, como aquele que escolhe quem são os vencedores e
perdedores.

O banco distribuiu crédito subsidiado a rodo e sem critério algum, contribuindo para a
concentração de vários mercados no Brasil, algo que não só reduz a eficiência, como aumenta
a desigualdade. As empresas beneficiadas ganharam poder de mercado, puderam aumentar
preços e se mantiveram protegidas contra a concorrência, o que desestimula investimentos e
inovação.

É como se o BNDES estimulasse a ineficiência e a improdutividade, prejudicando todo o


restante da economia. Como já era de se esperar, esse programa fracassou, e foi encerrado
pela instituição.

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Os gráficos mostram que a maior parte dos desembolsos do BNDES foi para grandes empresas.
Empresas estas que, por serem grandes, já têm amplo e fácil acesso ao mercado de capitais, e
já investiriam de qualquer forma.

Nesse contexto, o banco se transformou numa espécie de Robin Hood às avessas: passou a
tirar dinheiro do pobre contribuinte para transferir a megaempresários amigos do governo.
Isso contribui para piorar a distribuição de renda do Brasil, um país que já é marcado pela
desigualdade econômica e social.

Ademais, essa sistemática resultou, inclusive, numa CPI, para investigar as relações do banco
com agentes privados, em uma tentativa de destrinchar o famoso “capitalismo de quadrilhas”
de terras brasileiras. Essas tais relações amiguinhas entre setor público e setor privado são
característica marcante do nosso país, e o BNDES é um dos maiores símbolos do capitalismo de
laços brasileiro.

Para além disso, o banco passa longe de atingir sua missão de “diminuir as desigualdades
regionais”. Sul e Sudeste, as duas regiões mais ricas do país, receberam nada menos que 71%
dos desembolsos do BNDES desde 2000. Ao invés de direcionar recursos às regiões do Brasil
que menos os têm, o BNDES transferiu-os àquelas que menos precisam.

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Inflação e juros

O auge da expansão recente do BNDES foi o ano de 2013, quando os desembolsos atingiram
R$190 bilhões. Para se ter uma ideia, o Bolsa Família, programa que efetivamente transfere
dinheiro aos mais vulneráveis e ajuda a mitigar a pobreza no país, teve um orçamento de cerca
de R$25 bilhões no mesmo ano. E, como consequência, a inflação começou a se acelerar,
puxando a taxa de juros.

É simples de entender: o Banco Central utiliza a taxa básica de juros da economia – conhecida
no Brasil como Selic – para controlar a inflação. Um dos canais é o controle da demanda
agregada: o aumento dos juros desencoraja a tomada de empréstimos, desacelerando a
demanda e, por consequência, a inflação.

Acontece que, como resultado do crescimento recente do BNDES e também dos bancos
públicos em geral, hoje metade das operações de crédito no Brasil é “direcionada”, isto é, não
afetada pela taxa Selic. Essa modalidade de crédito, concedida majoritariamente pelos bancos
públicos, é feita à taxas especiais, com finalidades específicas. Como o crédito direcionado,
concedido especialmente pelos bancos públicos (principalmente o BNDES) é feito à taxas
consideravelmente menores que o crédito livre, e dado seu volume atualmente, a parte dita
“livre” das operações de crédito precisa ser muito mais cara, como mostra o estudo
supracitado de Monica de Bolle.

Note como o crédito direcionado passou a responder por uma fatia cada vez maior do total
desde 2007, chegando a metade de todo o crédito na economia brasileira em 2015. Esse é um
dos motivos pelos quais temos a maior taxa de juros do mundo: metade do crédito no Brasil

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não é afetada por ela, forçando o custo da outra metade para cima. Como consequência, o
investimento é prejudicado e, junto com ele, o crescimento futuro.

O crédito direcionado cresceu muito nos últimos anos.

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Custos

Como já citado neste texto, o Tesouro Nacional passou a fazer aportes cada vez maiores no
BNDES, com a ideia de aumentar o tamanho do banco e subsidiar o investimento por toda a
economia brasileira. Acontece que, para conseguir esses recursos, o Tesouro precisa se
endividar. E, grosso modo, o custo dessa dívida é a taxa Selic. Mas o Tesouro empresta esse
dinheiro ao BNDES cobrando apenas a Taxa de Juros de Longo Prazo, conhecida como TJLP. A
diferença fica para o Estado e, consequentemente, para o contribuinte. Esse é o chamado
subsídio financeiro, que é pago via dívida e não entra nos gastos primários do governo.

O problema vai além. Em muitos casos, o governo exigia que o BNDES cobrasse taxas ainda
menores do que ele – o banco – geralmente cobraria (grosso modo, TJLP + 1%) para
determinadas linhas de crédito no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI).
Essa diferença é conhecida como equalização de juros. O subsídio, nesse caso, recebe o nome
de subsídio orçamentário e, como o nome já sugere, entra no orçamento do governo, como
despesa primária.

Alguns felizardos que fizeram conchavos e lobby junto ao governo conseguiram empréstimos à
taxas tão baixas quanto 2,5% a.a., mesmo com a inflação perto de 6,5% a.a. Em outras
palavras: é como se o governo estivesse pagando para empresários levarem dinheiro para
casa. É isso que ficou conhecido como “Bolsa Empresário”.

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Ao todo, o BNDES captou, entre 2008 e 2014, mais de R$416 bilhões junto ao Tesouro
Nacional, de tal sorte que este se tornou sua principal fonte de recursos. O custo dessa farra
foi estimado emR$323 bilhões até 2060. Mas, considerando ainda o verdadeiro custo de
capital do BNDES junto às suas fontes de captação, bem como o custo econômico e as
distorções causadas pelo financiamento do BNDES (algo conhecido em economia como custos-
sombra), a conta é ainda maior.

Isso sem contar o custo de oportunidade de emprestar esse montante ao banco. A primeira lei
da economia é que os recursos são escassos. O dinheiro público usado no BNDES deixa de ser
usado em outros lugares, como programas sociais, investimentos em infraestrutura, ou
mesmo cortes de impostos, que aliviariam o setor privado.

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Conclusão

O BNDES se tornou um monstro gerador de distorções, ineficiências, desigualdade e corrupção


generalizada. O governo petista transferiu mais de R$416 bilhões a grandes amigos do partido,
jogando a conta para as futuras gerações. Com isso tudo em mãos, a conclusão é óbvia: é
preciso mudar o BNDES por completo.

Mas como? Um primeiro passo seria criar regras para que o banco só concedesse empréstimos
e subsidiasse projetos que apresentem VPL social positivo, como infraestrutura, saneamento
básico, P&D, entre outros.

É preciso, também, fazer com que o BNDES enfrente o verdadeiro custo de capital de quem o
financia (majoritariamente, FAT e Tesouro). Afinal, todo tomador precisa remunerar seu
credor de acordo com os riscos que o impõe. Dessa forma, o BNDES teria que ser mais
criterioso e diligente na hora de conceder empréstimos, aumentando sua eficiência.

O BNDES precisa ser 1) reduzido, 2) mais eficiente e 3) mais transparente, prestando contas à
sociedade (afinal, ele utiliza recursos desta) e constantemente avaliando e revisitando os
projetos que financia, verificando se os custos estão de acordo com os benefícios esperados,
etc. Só assim teremos um banco de fomento eficiente e que beneficie o crescimento
econômico e a produtividade, como deve ser.

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Capítulo 04: Pré-Sal: Estão mentindo
para você
Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/pre-sal-estao-mentindo-para-voce/

Após a destituição de Dilma Rousseff da presidência, em 2016, o discurso de que o atual


governo, de Michel Temer, tem entregado o petróleo do Pré-Sal a preço de banana vem se
esparramando pelas redes sociais. Essa ideia vem ganhando força, principalmente em
manifestações de lideranças políticas e de movimentos sociais.

Entretanto, quando confrontado com os dados disponíveis, tal discurso acaba perdendo
sentido e significação. Tendo essa ideia em mente, e com o objetivo de apresentar os dados de
maneira mais clara, será utilizado para efeito de ilustração, um item comum nas compras de
mercado dos brasileiros: maçãs.

O leilão das macieiras de José

José tinha uma ampla área com várias macieiras na sua casa. As maçãs já estão bastante
maduras, no momento ideal para serem colhidas. Apesar de não saber manejar a colheita de
maçãs, José tem um filho, chamado Petros, que é um especialista no assunto. Mas para Petros
é inviável colher as maçãs sozinho, pois os custos seriam muito elevados para ele gastaria
demais com isso. Diz que até faz, desde que José pagasse boa parte de seus custos.

Assim foi decidido que a área de colheita seria dividida em partes. Em cada parte, um bloco de
pessoas atuaria colhendo maçãs. Mas a regra principal era que Petros participasse de todos os
blocos, com percentual mínimo de 30% de maçãs para si. Os demais integrantes do bloco
seriam definidos a partir de dois critérios: um pagamento inicial, em dinheiro, para o dono das
macieiras, além de um percentual do lucro com a colheita de maçãs, pago em maçãs.

Fixadas as regras, foi realizado um primeiro leilão de área para a colheita das maçãs. José havia
definido que os competidores deveriam oferecer, no mínimo, 150 reais como pagamento
inicial e um percentual de 40% das maçãs lucradas com a colheita. Estava ansioso. Esperava a
participação de vários competidores. Porém, para a sua surpresa, apenas um grupo se formou
e arrematou a área pelos percentuais mínimos instituídos. Os que não participaram
reclamaram que as regras do leilão eram desvantajosas, como a obrigação da participação de
Petros em todos os blocos e o alto percentual mínimo de maças exigido para a disputa.

Além disso, ocorreu outro problema: o filho de José estava passando por dificuldades
financeiras, e não teria condições de participar em todas as áreas, preferindo priorizar áreas
que oferecessem maior quantidade de maçãs. José, irredutível, decidiu paralisar os leilões, até
que Petros pudesse voltar a operar em todas as áreas. Mas, incomodada com a ociosidade da
plantação, a família de José começou a pressioná-lo para que alterasse as regras e permitisse a

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colheita de maçãs, mesmo que Petros não pudesse participar. José cedeu, com uma condição:
o seu filho escolheria, obrigatoriamente, se participaria ou não da colheita em determinada
área.

O enfraquecimento do monopólio da colheita de maçãs por Petros, acabou permitindo que as


macieiras voltassem a ser exploradas. E diferente da situação inicial, a exploração tomou outro
rumo, sendo realizada de maneira mais racional, o que acarretou em um aumento da sua
produtividade.

De José para a Petrobrás, qualquer semelhança não é mera coincidência

Assim é o governo federal e a Petrobras. A estatal realizou as pesquisas e descobriu uma ampla
reserva de petróleo em águas profundas, porém é inviável para ela explorar toda aquela
imensidão sozinha, salvo se o governo fizer aportes bastante generosos em seus cofres.

Essa foi a decisão do governo Lula, em 2009: criar o regime de partilha para a exploração do
Pré-Sal. Nele, a Petrobras seria operadora única, em todos os campos, com participação
mínima de 30% na exploração e produção de petróleo. As outras empresas vencedoras seriam
aquelas que oferecessem um bônus de assinatura alto para o governo e, após descontados os
custos, oferecessem maior percentual em barris de petróleo para a União. Além, é claro, dos
pagamentos de royalties a estados e municípios e todos os impostos envolvidos nessas
atividades.

Da mesma forma, em 2013, ocorreu o primeiro leilão de Pré-Sal no Brasil: o do campo de Libra.
O governo federal exigiu R$ 15 bilhões no ato de assinatura do contrato e, no mínimo; 41,65%
dos barris de petróleo lucrados. O governo esperava uma intensa competição pela área, porém
apenas um bloco de empresas se formou em torno da Petrobras e arrematou a área pelos
mínimos estabelecidos. Houve reclamação quanto às regras. Mesmo assim, o governo cantava
vitória e não admitia debater mudanças nas regras.

Após o leilão do campo de Libra, a Petrobras entrou em uma espiral de endividamento,


resultante dos escândalos descobertos pela Operação Lava Jato, pelo não-reajuste dos preços
de combustíveis e, também, pelos altos investimentos em refino e exploração de petróleo. O
governo suspendeu leilões, porém via crescer no Congresso uma articulação para alterar as
regras do regime de partilha. Discursos inflamados, passeatas e manifestações depois, governo
(ainda sob a batuta de Dilma) e Congresso acordaram que a Petrobras deixaria de ser a
operadora única nos campos do Pré-Sal, mas seria consultada antes sobre o interesse em
participar ou não.

Assim, como ocorreu com as macieiras de José, os leilões nos campos do Pré-Sal voltaram a ser
realizados. Após o leilão de Libra, em 2013, mais dois ocorreram. Em ambos, houve mais de
um consórcio interessado. Ao total, 12 áreas foram a leilão. Três delas não tiveram
interessados. Nas nove leiloadas, a Petrobras é operadora em seis delas.

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E as regras seguem as mesmas: vence a disputa o consórcio de empresas que oferecer maior
quantidade de barris de petróleo excedentes à União. Se no leilão de Libra, a oferta vencedora
foi de 41,65% de barris, nos últimos dois leilões esse número subiu para cerca de 70%, em
média nas nove áreas. Ou seja, o governo federal ampliou os ganhos nos leilões. Aqueles que
apontam “perdas” para o país, utilizam apenas o ganho de bônus de assinatura do contrato
como valor total pago pelos consórcios pela exploração do Pré-Sal, ignorando os ganhos com o
excedente em óleo, royalties e impostos, com a movimentação que esse setor gera na
economia.

É uma desonestidade, portanto, dizer que passamos a entregar nosso petróleo aos gringos a
preço de banana. Longe disso. E aqui, cabe lembrar que a mudança na regra de partilha foi
aprovada no Senado, ainda no governo Dilma, no dia 24 de fevereiro de 2016, em acordo
costurado pelo senador Romero Jucá e o então ministro da Casa Civil, Jaques Wagner. O
senador Lindbergh Farias, na época, disse que se sentia traído por Dilma Rousseff. Logo depois
do impeachment, a Câmara aprovou o projeto, no dia 09 de novembro de 2016. E então, o
Presidente Temer o sancionou a nova lei. Um raro de caso de lei proposta por um tucano (José
Serra), aprovada durante um governo petista e mantida após a troca de governo.

Com a mudança, permitiu-se o avanço na exploração do Pré-Sal em um momento crucial, em


que o futuro da demanda por petróleo encontra-se em dúvida, com especialistas apontando
que ela atingirá o ápice na próxima década, para começar a cair. Grandes empresas
petrolíferas, como a Shell, já se colocam em uma situação de transição energética: saindo dos
combustíveis fósseis para investir em fontes renováveis e limpas, como eletricidade. Caso
esperássemos mais tempo para explorar o Pré-Sal, os projetos poderiam se tornar inviáveis,
com prejuízos a quem se dispusesse a operar nas áreas.

Voltando à analogia do início do texto, seria como se as maçãs de José apodrecessem.

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Capítulo 05: Dilma
O legado Econômico de Dilma Rouseff

Retirado de: http://terracoeconomico.com.br/o-legado-economico-de-dilma-rousseff/

Guido Mantega, então ministro da fazenda em entrevista à revista Veja em 12/12/2007

A confirmação do impeachment de Dilma Rousseff pelo Senado Federal substituiu as


reticências do governo interino de Michel Temer pelo ponto final no governo Dilma Rousseff.

E como temos um início, um meio e um fim de governo bem delimitados, podemos olhar para
trás e ver qual foi o legado deixado por Dilma e sua equipe econômica.

Caso não tenhamos memória curta e decidamos levantar, sacodir a poeira e dar a volta por
cima, podemos concluir que tivemos belíssimas aulas práticas de economia, às custas de
efeitos deletérios para a população. Mas como dizem por ai, não é possível fazer um omelete
sem quebrar alguns ovos.

Com Dilma Rousseff e sua equipe econômica, aprendemos na prática que o estabelecimento
da taxa de juros básica da economia não é uma decisão tomada pela classe rentista que
cooptou a autoridade monetária. Dilma Rousseff nos ensinou que baixar os juros na marra
(com a ideia fixa de que os juros são altos pois os bancos são gananciosos) somente traz
inflação mais alta. Uma aula de política monetária.

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Com Dilma Rousseff e sua equipe econômica, também aprendemos que gasto público não é
vida e que o aumento do dispêndio governamental às custas de maior endividamento não gera
crescimento econômico para pagar a conta no futuro. Uma aula de política fiscal.

Ainda, aprendemos com Dilma Rousseff e sua equipe econômica, que canalizar crédito
subsidiado a empresas que conseguem facilmente obter financiamento no mercado e que não
são grandes geradoras de externalidades positivas para a economia somente aumenta a
concentração de mercado com efeitos maléficos nos preços ao consumidor. Uma aula de
microeconomia.

Dilma Rousseff e sua equipe econômica também nos ensinaram que desrespeitar contratos de
longo prazo firmados com a ideia de que mexer no preço da energia pode causar um boom de
investimentos e produção somente terá os efeitos colaterais de adiar um aumento mais forte
do preço das tarifas e reduzir o investimento em novas fontes de energia. Uma aula de direito
econômico.

Ainda em 2014, aprendemos com Dilma Rousseff e sua equipe econômica que aumentar o
gasto público em ano eleitoral a fim de distribuir benesses para se reeleger pode garantir o
resultado nas urnas, mas os anos seguintes serão de sacrifícios para o eleitorado. Uma aula
magistral de economia política.

Felizmente, a equipe econômica de Dilma Rousseff e ela mesma nos ensinaram também que
tomar empréstimos em bancos controlados pelo governo para pagar a conta do aumento de
gastos é uma clara violação à lei brasileira e que pode (e deve) derrubar um governo que
coloca em risco a suada estabilidade monetária.

Caso nossa memória não seja curta, oxalá todas as aulas de economia que assistimos durante
os últimos anos nos deixem um bom legado sobre o que não fazer em política econômica nos
próximos anos. Seria uma dádiva evoluirmos no debate econômico para um patamar no qual
não existam sequer menções às políticas praticadas durante a gestão Dilma Rousseff.

Ficamos honrados pelas aulas ministradas, mas não sentiremos saudades desses nossos
professores.

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Impeachment: Uma punição branda pela irresponsabilidade fiscal

Retirado de:

“Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem


contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:

(...)

VI - A lei orçamentária;

VII - A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos;”

O artigo acima é da Lei 1.079 de 1950, a famosa Lei do Impeachment. O artigo 73 da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF) prevê que suas violações podem ser punidas com o
impeachment, fazendo referência à Lei 1.079.

Com o processo de impedimento a todo vapor, com a presidente Dilma Rousseff já


temporariamente afastada de suas funções e após a entrevista coletiva do novo ministro da
Fazenda na última sexta-feira soubemos qual o tamanho do buraco fiscal que Dilma e sua
equipe econômica deixaram para trás. Um desfalque de R$ 170,5 bilhões, ou de
aproximadamente 3% do PIB de 2016. O rombo terá de ser coberto via aumento de dívida,
venda de patrimônio, aumento da carga tributária e redução dos gastos públicos.

Com todo esse descalabro fiscal que violou a Lei de Responsabilidade Fiscal o que posso
afirmar é: a punição ficou barata demais para Dilma e seus assessores econômicos. Aos
amantes do esporte bretão e conhecedores da regra, Dilma deu um carrinho por trás na
economia brasileira e recebeu somente um cartão amarelo. À irresponsabilidade fiscal deste
porte, caberia uma punição muito mais severa.

Apesar de parecer para muitos um conceito um pouco vago, o equilíbrio fiscal é um dos pilares
que garante a estabilidade macroeconômica, ou seja, baixa inflação e um ambiente propício
para que os agentes possam planejar, investir e, ultimamente, para que o país possa crescer
sem o receio de que a qualquer momento o governo vá aumentar seus gastos
irresponsavelmente e adotar políticas econômicas das alcovas para fechar a conta: aumento
da carga tributária e/ou aumento da inflação.

E todo arcabouço que rege o funcionamento das contas públicas foi cuidadosamente
construído na década de 90 para impedir que tais episódios de descalabro fiscal ponham em
risco o futuro dos que estão entrando no mercado de trabalho. Trocando em miúdos: leis
como a LRF servem justamente para evitar que políticos inflem o gasto público durante seu
mandato e joguem os custos para os próximos governos.

O raciocínio é simples: aumenta-se hoje o gasto em programas que vão beneficiar os eleitores
no curto prazo mesmo sem as receitas necessárias para realizá-lo. Ao não ter a receita,
aumenta-se a dívida pública que somente será paga pelos próximos governantes – ou pelas

57
próximas gerações que entrarão no mercado de trabalho e terão que arcar com maior carga
tributária.

E aqui eis o que teremos de fazer para recolocar a casa em ordem e quanto tempo levará para
arrumar o estrago da irresponsabilidade.

I. Em 2016 teremos uma redução da ordem de 3,9% do PIB e um déficit primário


próximo a 3% do PIB.
II. Com o nosso custo da dívida beirando os 9%, o nosso déficit nominal em 2016 ficará
próximo de 12% do PIB.
III. Para que estabilizemos a dívida, precisaremos cortar gastos e/ou aumentar a receita
pública, de forma a gerar um superávit primário de 4% do PIB para arcar com os
custos da dívida e reduzi-lo ao longo do tempo.
IV. Claro que isso não se faz de um ano para outro. Se 2016 está perdido, em 2017 a
meta deverá ser zerar o déficit e aumentar gradativamente o resultado primário para
atingirmos os 4% em 2020 e ai sim estabilizar a nossa dívida pública.

Todo esse esforço permitirá uma redução gradual no gasto com juros da dívida, que ajudará
também na sua estabilidade. Colocando tudo isso num simples gráfico, se seguirmos o
receituário acima levaremos quase 10 anos para colocarmos a nossa dívida novamente em
uma rota descendente. Para acelerarmos o processo, podemos recorrer a soluções paliativas,
como a venda de ativos para abater um pouco a nossa dívida.

Assim, ao ignorar a Lei de Responsabilidade Fiscal que havia disciplinado a atuação fiscal e
garantido certa estabilidade macroeconômica para um crescimento moderado, Dilma Rousseff

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não violou somente uma regrinha boba. Ela e sua equipe de economistas colocaram pelo
menos meia geração para arcar com a conta da irresponsabilidade (chamemos de
irresponsabilidade o que pode ser chamado de má fé) fiscal.

A década a seguir no Brasil está praticamente perdida e as reformas para que possamos (oxalá)
crescer novamente de forma sustentada serão dolorosas e que sirvam de lição para sermos
mais vigilantes com o conceito até então vago de “estabilidade fiscal”.

Mas como penitência, Dilma e seus brilhantes policymakers – a saber: Guido Mantega, Márcio
Holland, Nelson Barbosa, Arno Augustin, Luciano Coutinho - sairão da vida pública, manterão
seus privilégios de servidores públicos aposentados e muitos ainda dirão que não foram
culpados pelo ocorrido.

A punição é muito branda!

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Não há inocentes em pedaladas

Retirado de:

O pedido de impedimento de Dilma Rousseff acusa a presidente de ter cometido vários crimes,
dois dos quais justificariam a cassação do seu mandato: aumentos no orçamento sem
autorização do Congresso, e empréstimos fraudados junto a bancos públicos, estes últimos
apelidados de “pedaladas”, explicadas de forma didática por minha colega Rachel Sá[1]. Ambas
práticas são expressamente proibidas por lei. O governo defende-se dizendo que os tais
“decretos de abertura de crédito suplementar” não comprometeram o atingimento de metas
fiscais, e logo não contrariaram a lei. As pedaladas, por sua vez, não configurariam
empréstimos. O relator do impeachment, deputado Jovair Arantes, rebateu essas duas teses,
orientando o Congresso a votar pelo impedimento. Cabe agora aos congressistas, segundo
manda a lei, julgar.

É de admirar que, depois de Mensalão, Petrolão, venda de MPs, Aloprados, Rosemary, Erenice,
Delcídio e companhia, sejam duas faltas na administração orçamentária e financeira a pôr em
risco o governo do PT. Não são menos legítimas, nem menos nocivas à democracia e à saúde
do Estado, mas certamente menos acessíveis ao cidadão comum. O caso das pedaladas é
particularmente acintoso, principalmente porque a argumentação petista insiste em jogar
fumaça nos olhos dos incautos, levando-os a crer que 1) não houve empréstimo dos bancos
públicos ao governo, 2) os governos anteriores faziam a mesma coisa, e 3) fez-se tudo isso em
nome das conquistas sociais desses governos maravilhosos que se sucedem desde 2003. Esse
último argumento mal merece consideração: se era tão imprescindível realizar os gastos feitos
com dinheiro das pedaladas, o governo deveria ter retirado de outras áreas do orçamento, e
não do caixa dos bancos públicos.

E quanto à ilegalidade? A lógica governista do momento é a mesma lógica que protegia os


mensaleiros: somente na presença de uma prova indiscutível seria possível caracterizar uma
conduta criminosa. Para o PT, o crime tem que ser sempre organizado contabilizado e
documentado, senão não é crime... É verdade, seria tão mais fácil se as pedaladas fiscais
fossem um contrato de empréstimo explícito, com assinatura do presidente da Caixa e da
presidenta da República! Mas se os fatos são muito mais sutis, nem por isso são menos claros.

Ponham-se por um momento nos sapatos de Dilma Rousseff em seu primeiro mandato, com
um governo quebrado, com sua incompetência proverbial, protestos inéditos nas ruas e uma
reeleição ameaçada. Brilhante ideia emerge das trevas: usar dinheiro dos bancos públicos para
pagar as obrigações do governo, liberando o orçamento para outros gastos e não aumentando
a dívida pública. É impossível pegar dinheiro emprestado desses bancos, já que tal prática é
expressamente vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal, justamente para evitar que
governos irresponsáveis dilapidem instituições públicas. Porém, é possível “forçar” tal
situação, deixando que os bancos públicos paguem as contas do governo sem realizar as
transferências necessárias para saldar essas operações. Em outras palavras, é possível deixar
uns bilhões pendurados por meses a fio, alegando-se sempre que não se trata de um
empréstimo!

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É evidente que governo nenhum, por mais inepto e contraventor que seja, cometeria a
estupidez de assinar um contrato de operação de crédito com um banco público. Mas alegar
que um contrato explícito é a única circunstância capaz de caracterizar a conduta vedada pela
lei é um atentado à inteligência.

No caso das pedaladas, o governo ainda pôde contar com uma ambiguidade que certamente
joga a seu favor: as contas utilizadas pelos bancos públicos para realizar pagamentos em nome
do Tesouro apresentaram saldos negativos em diversas circunstâncias no passado, como
durante os governos Lula e Fernando Henrique Cardoso. Isso é verdadeiro, e como
corretamente afirmado pela defesa da presidente, a existência de saldos negativos nessas
contas é corriqueira e legal, pois o governo realiza transferências baseadas numa previsão de
despesas, e frequentemente essa transferência é insuficiente. Porém, o fato de a existência de
saldos negativos ser tolerada não autoriza que o governo transfira aos bancos públicos a
responsabilidade de quitar suas despesas de forma sistemática, como de fato fez, segundo
atestam diversas análises[2] e o julgamento do TCU. De forma cada vez mais intensa e
frequente, o governo transferia muito menos do que os valores dos pagamentos feitos pelas
instituições públicas em seu nome, deixando-as arcar com a salgada fatura.

Outro argumento, mui garboso, apresentado pelo defenestrado Ministro da Justiça e atual
Advogado Geral da União, é o de que o TCU mudou de ideia sobre as pedaladas: julgava-as
regulares até 2013, e em 2014 considerou-as um crime. Para o governo, a prova disso é que o
TCU aprovou as contas do governo anteriores a 2014, mesmo havendo pedaladas. Ao aprovar
as contas de 2013, em que as pedaladas ocorriam a todo vapor, o TCU teria aprovado por via
tácita a própria prática das pedaladas fiscais! Um argumento temerário. Terá o TCU o condão
de legitimar a prática de pedaladas fiscais pela via tácita? Poderia o TCU desfazer um
dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal? Infelizmente para o governo, em que pese o
Tribunal de Contas da União ter seu papel e importância na nossa democracia, não creio que
esteja arrolado entre seus poderes a capacidade de descriminalizar tacitamente uma conduta
vedada por lei, sem sequer mencioná-la!

No entanto, em defesa do TCU, é preciso ainda lembrar que as tais pedaladas não eram
registradas nos relatórios do governo como dívida do governo junto a seus bancos. E nem
poderiam sê-lo, já que admitir dívida com uma entidade controlada seria confissão de crime.
Sim, o TCU aprovou as contas de Dilma, mas tratavam-se de contas que escondiam o desvio de
recursos de empresas públicas para o pagamento das contas do governo.

As pedaladas foram operações feitas na surdina, nos bastidores da contabilidade do governo.


Mas são muito mais do que simplesmente uma irregularidade contábil, tratando-se de uso de
recursos públicos sem autorização. Como é possível, ó céus, afirmar de boa-fé que as
pedaladas não atentam contra a Lei de Responsabilidade Fiscal ou que não fraudam a
administração financeira? Como imaginar que a prática de “pendurar” R$ 50 bilhões por meses
a fio não representa o uso direto de recursos dos bancos públicos, expediente que a Lei
corretamente proíbe? Como acreditar que o uso indevido dos recursos da Caixa, do Banco do
Brasil, do BNDES e do FGTS (!!!!!!!!) possa ter passado despercebido pela presidente da

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República, beneficiária direta dessa prática, que lhe rendeu dividendos eleitorais e alimentou
suas mentiras de campanha?

Quem defende as pedaladas de Dilma tem todo um leque de chicanas a seu favor: diga que
não havia um contrato explícito de operação de crédito, diga que saldos negativos existiram
previamente, diga que era primordial o governo realizar aquelas despesas mesmo não tendo o
dinheiro para tal! Mas não diga que é legalista. Não se apresente como defensor do bom uso
do dinheiro público, das políticas sociais e da democracia. Já que somos um país livre, cada um
pode defender a abobrinha que quiser. Mas a essa altura do campeonato, não dá para
defender as pedaladas mantendo a inocência.

Referências:

[1] http://terracoeconomico.com.br/pedaladas-fiscais-destrinchando-contabilidade-criativa

[2] Ver, entre outros: http://www.valor.com.br/pedaladas,


http://economia.estadao.com.br/blogs/joao-villaverde/o-governo-dilma-cometeu-um-erro-
em-sua-defesa-das-pedaladas/, https://mansueto.wordpress.com/2015/04/18/pedaladas-
fiscais-desde-sempre-nao/

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E ainda há quem diga que é golpe?

Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/e-ainda-ha-quem-diga-que-e-golpe/

De que se trata esse processo de impeachment? Trata-se de julgar a presidente da República


por ter gastado recursos que ela não podia gastar. E por que ela teria feito isso? Para maquiar
a situação fiscal caótica que ela ajudou a criar. Como ela fez isso? De duas maneiras: a
presidente fez com que bancos públicos usassem seus próprios recursos para pagar despesas
que eram de responsabilidade do governo, o que é vedado por lei. Em segundo lugar, a
presidente não ajustou as despesas do governo ao comportamento preocupante das receitas,
encaminhando o governo ao não cumprimento das metas de superávit. (Ao final do ano, a
presidente conseguiu que o Congresso alterasse a própria meta para fazer caber a sua
lambança). Essas condutas configuram crime de responsabilidade de acordo com as leis do
Brasil, foram utilizadas para afastar a presidente da República, e serão julgadas ao fim do
processo que ora se inicia no Senado Federal.

Deve-se relembrar sempre os motivos jurídicos que levaram ao afastamento de Dilma


Rousseff, ainda que motivos políticos também pesem nesse processo. As irregularidades fiscais
de Dilma não constituem um pretexto qualquer, uma desculpa aleatória para tirá-la do cargo.
Se fosse possível escolher um pretexto qualquer para iniciar um processo de impeachment,
seria mais aconselhável escolher alguma acusação vinculada à Lava Jato, com muito mais apelo
midiático. Punir as fraudes fiscais de Dilma com impeachment tampouco pode ser qualificado
de “desproporcional” ou excessivamente rigoroso: a Lei de Responsabilidade Fiscal não é
irrazoável. Não é absurdo exigir que seja obedecida. Já o seu descumprimento pode acarretar
elevados custos à sociedade.

Dilma fraudou as contas públicas, aumentou o endividamento nacional e minou a credibilidade


dos dados do governo. O custo disso é incalculável. Lembremo-nos de que ninguém questiona
o impeachment de Fernando Collor: pairava contra ele a acusação de recebimento de propina.
Trata-se de fato grave, passível de impeachment, mas o dano de um Fiat Elba ao país é ínfimo
perto do que fez Dilma Rousseff. Pouco importa se ela recebeu ou não propina: Dilma
desajustou a economia do Brasil com seus trambiques. Receber propina não é a única forma
de se desrespeitar a lei, e obviamente não é a única hipótese para impeachment.

Especialistas e a imprensa livre denunciam há anos as práticas fiscais detestáveis promovidas


pela gestão Dilma, tornando inacreditável a tese de que tais procedimentos não eram de
conhecimento do alto escalão do governo. O Tribunal de Contas da União, em parte motivado
por essa denúncias na imprensa[1], realizou ampla investigação sobre as irregularidades fiscais
do governo, acusando sua ilegalidade. O STF, cujos membros foram majoritariamente
indicados pelos governos do PT, avalizou (e dificultou!) o processo de impeachment. A Câmara
constituiu (duas vezes!) uma Comissão para elaborar, analisar e votar um parecer sobre o
impeachment, posteriormente aprovado por maioria acachapante no plenário. Idem para o
Senado Federal. O direito de defesa foi resguardado e utilizado em extensão, com tentativas
contínuas de obstrução do processo junto ao STF e – gran finale - com o cancelamento
relâmpago e burlesco das sessões da Câmara por um presidente interino. O impeachment é
uma obra conjunta de diversas instituições, que embora não sejam perfeitas, funcionam.
Golpe de Estado é querer passar por cima de tudo isso para manter um presidente no poder.

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Ninguém é obrigado a amar o impeachment de Dilma Rousseff, muito menos simpatizar com o
vice-presidente Michel Temer, que no entanto foi escolhido por ela (e por seus eleitores) para
substituí-la numa circunstância como esta. Mas é preciso reconhecer que as ações de um
governante devem se dar dentro dos limites legais e que por mais que se aprove a sua conduta
, suas supostas boas ações não compensam as irregularidades que cometam. Mandato não é
cheque em branco para que o eleito faça o que bem entender. Por mais traumático que seja o
processo que estamos vivendo, trata-se de uma reação desejável das instituições e da
sociedade a um governo que notoriamente fez pouco caso das regras que cerceiam sua
atuação.

Afinal, lembremo-nos, é o mesmo governo que presidiu à derrocada da Petrobras, ali


implantando um imenso esquema desvios e propinas; é o mesmo governo que, como sugerem
as investigações em curso, cobrava propinas para favorecer empresas via BNDES e benefícios
fiscais. É o governo de uma presidente que afirmou que se pode “fazer o diabo” para ganhar
eleições e que irrigava a esgotosfera com dinheiro público para a disseminação de mentiras e
calúnias. Por fim, é o governo que negou a todos que havia metido o país numa recessão, e
dilapidou os bancos públicos para fingir que nada estava acontecendo. E dentre todos, foi este
o motivo que conseguiu derrubá-lo. Já era hora.

Referência:

[1] Conforme relatado pelo procurador Julio Marcelo de Oliveira no programa Roda Viva de
9/05/2016. https://www.youtube.com/watch?v=MQAYnvkPWnk

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O impeachment gerou a maior crise da história do país?

Retirado de:

A partir do impedimento de Dilma Rousseff e da entrada de Michel Temer na presidência, os


outrora contestadores do fato de que o Brasil vive em uma crise desde meados de 2014
passaram não só a admiti-la como a utilizá-la como argumento de que políticas de ajuste não
funcionam. Recentemente, com a divulgação dos dados oficiais do IBGE para o PIB de 2016
(uma queda de 3,6%, ligeiramente mais suave que os 3,8% de 2015), uma reportagem curta do
portal Brasil 247 elevou ao “máximo” nível este raciocínio controverso. [1]

A matéria alega que o impeachment arrasou a economia. Como diria Alexandre Schwartsman,
esta versão tem apenas um pequeno defeito, que é não ter qualquer conexão com a realidade.
Não entrando na questão “foi ou não golpe”, mas considerando que o terceiro trimestre de
2016 foi o momento da já mencionada troca do comando do Executivo, vamos aos dados:

Fonte: IBGE, Inspirado por um gráfico do blog Análise Macro

Pelo gráfico, é evidente que o crescimento acumulado da economia brasileira vem


apresentando uma forte tendência de queda desde, pelo menos, 2011, primeiro ano do
governo Dilma. Um pouco antes, o Brasil enfrentava as dificuldades da crise financeira
internacional, que interrompeu uma trajetória de crescimento que vinha desde o segundo
governo FHC.

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Tipicamente, defensores da tese de que o impeachment causou a crise econômica advogam
que aumentar o gasto público e baixar os juros na marra são o caminho para o crescimento.
Temer e sua base, ao propor e endossar reformas para equilibrar o orçamento e equacionar as
contas da Previdência, estariam sufocando a economia. O Banco Central, sob nova presidência
desde que Temer assumiu, estaria contribuindo para o desastre, mantendo os juros altos por
tempo demasiado.

Acontece que nenhuma destas duas “soluções mágicas” – abaixar os juros de maneira forçada
e elevar os gastos públicos – funcionaram durante o governo Dilma. Este segundo gráfico
mostra que nem mesmo um aumento vigoroso da dívida pública a partir de 2014 ou uma
queda da SELIC aos níveis mais baixos da série entre 2012 e 2013 foi capaz de reverter a
trajetória de declínio do PIB. Se fosse verdade que uma simples aceleração dos gastos (e
consequente aumento da dívida) gera crescimento, então teríamos visto uma recuperação em
2015. Não ocorreu. Ao mesmo tempo, o afrouxamento da política monetária teria trazido
benefícios em 2012/2013, e não apenas inflação.

A gênese e o aprofundamento da crise não possuem datas precisas, mas o marco inicial
certamente não foi após a transição para Temer. A mudança na direção da política econômica
no segundo governo Lula (2007-2010) ganhou força na era Dilma e, em conjunto com o fim de
condições internacionais amplamente favoráveis, desnudou a fraqueza de nossa economia.

Por um lado, a partir de meados de 2011, termos de troca mais desvantajosos e taxas de juros
internacionais mais altas reverteram o sinal das fontes do crescimento durante a era Lula [2].
Ficou claro que pouco havia sido feito para sustentar o sucesso econômico daqueles anos.
Nossas taxas de investimento e poupança continuaram baixas. Nossa produtividade, pífia,

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reveladora de nossas deficiências em educação e infraestrutura. Nossa indústria de
exportação, ineficiente, pouco diversificada e prejudicada pelo baixo nível de abertura
comercial. Como resultado, a economia parou de crescer quando as forças internacionais
deixaram de colaborar involuntariamente.

Por outro lado, no segundo governo Lula, políticas de estímulo começaram a ser aplicadas de
maneira pouco transparente e com justificativas questionáveis. Basta lembrar que o Programa
de Sustentação ao Investimento (PSI), também conhecido como Bolsa Empresário, foi iniciado
em 2009. Existem, inclusive, investigações que têm encontrado fortes indícios de negociações
entre grandes grupos empresariais e os ex-ministros da Fazenda de Lula, Antônio Palocci e
Guido Mantega. O controle peremptório do preço da gasolina, que impactou negativamente a
Petrobrás e desorganizou o promissor setor sucroalcooleiro ao modificar os incentivos para a
produção de etanol, também foi introduzido pelo governo Lula [3].

Com Dilma, as intervenções se intensificaram e foram se tornando cada vez mais opacas. A
contabilidade criativa e as pedaladas fiscais tornaram-se instrumentos do descalabro fiscal
perpetrado em seu governo: era possível gastar mais sem que “ninguém” soubesse. E gastar
mal. As emissões de títulos públicos para capitalizar o BNDES, por exemplo, representaram 1/3
do aumento estoque da dívida nos últimos dez anos, que simplesmente dobrou [4]. Ainda que,
apesar de toda a evidência em contrário [5], se argumente que este tipo de alocação de
crédito pode ser eficaz, não se pode negar que a economia encolheu e a maior parte destes
recursos foi, na realidade, perdida.

Em 2015, a situação fiscal estava tão deteriorada e imprevisível que o então Ministro da
Fazenda, Nelson Barbosa, chegou a propor uma esdrúxula “banda fiscal”. Era a exata medida
da importância dada pelo governo à formação de expectativas: nenhuma. Não por acaso, a
inflação dos anos Dilma ficou sistematicamente acima do centro da meta, com a ajuda de um
Banco Central leniente e apesar da contenção dos preços administrados (combustíveis e
energia elétrica, basicamente).

É verdade que a partir de 2013 o Banco Central de Alexandre Tombini aumentou a taxa de
juros. Mas, quando isso finalmente ocorreu, o mercado já não acreditava no
comprometimento da instituição em combater a inflação. Há quem diga que foi este
movimento de alta que fez a dívida pública explodir. Esta forma de pensar, além de deixar de
lado o papel central dos seguidos déficits primários desde 2011, ignora que a inflação pode
fermentar mais a dívida do que a SELIC [6].

Mesmo com a PEC 55, os gastos ainda subirão este ano, ao menos em termos nominais (mas é
provável que os gastos reais também cresçam). Isto também invalida o argumento de que uma
suposta austeridade está causando a retração no produto. A recessão tem raízes muito
anteriores e, embora ainda não tenha transcorrido tempo suficiente para avaliar de forma
completa, a influência das propostas de reforma parece ter tido impacto positivo nas
expectativas. O mercado já espera que a inflação fique bastante próxima do centro da meta no
fim de 2017, em contraste com os cerca de 7% esperados para 2016 no início daquele ano. As
expectativas para a SELIC já estão em torno de 9%, distantes dos 12.25% que se projetava em

67
março do ano passado.[7] Estes indicadores também refletem a recuperação da credibilidade
do Banco Central, que encontrou espaço e confiança para baixar as taxas de juros pela
primeira vez desde 2013.

Não é aceitável, portanto, que a crise seja atribuída ao novo governo. Algumas inverdades
propagadas pela Internet podem simplesmente ser deixadas de lado, por serem auto-
evidentes. Outras, por transmitirem relações de causalidade enganosas e prejudiciais à
compreensão dos fatos pelo público, precisam de uma resposta mais consistente.

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Postfácio: Nem tudo foi ruim no
governo Temer
Retirado de: https://terracoeconomico.com.br/nem-tudo-foi-ruim-no-governo-temer/

Na última pesquisa Ibope divulgada em 15 de outubro de 2018 o governo Temer era aprovado
por apenas 5% da população. Contribuíram para a baixa popularidade do governo sucessivos
escândalos de corrupção, inclusive com gravações que incriminam o próprio presidente, a
persistência da crise econômica e a aprovação de reformas impopulares (ainda que
necessárias) como a do teto dos gastos e a trabalhista. Mas como admitiu o próprio Jair
Bolsonaro, nem tudo foi ruim no governo Temer. A jóia da coroa do imperador nu é a equipe
econômica, comandada inicialmente por Henrique Meirelles, agora sob a batuta do discreto
Eduardo Guardia.

Além de estancar a piora da crise econômica, é mérito desta equipe uma série de medidas que
costumam ficar abaixo do radar e são pouco noticiadas, mas que podem contribuir com a
retomada do crescimento econômico e da melhora da produtividade das empresas brasileiras.
Isso é bom para todo mundo já que mais produtividade significa mais riqueza.

Os economistas do Ministério da Fazenda partiram de um diagnóstico diferente do que


acreditava-se anteriormente. Para a equipe da Fazenda, o problema da produtividade não está
concentrada na diferença entre setores, mas sim, intra setores. O que isso quer dizer? Significa
que não existem setores produtivos no Brasil e setores improdutivos. Se esse fosse o problema
bastaria que o governo desse incentivos para os setores mais produtivos para impulsioná-los
em detrimento dos demais. Foi o que fez a China com sucesso, levando gente do setor rural
para as cidades e com isso aumentou muito a sua produtividade. Mas não é o caso do Brasil,
aqui existem empresas produtivas e improdutivas dentro dos setores econômicos.

A partir deste diagnóstico, o papel do governo deixa de ser estimular setores específicos e
passar a ser o de advogar pela concorrência entre empresas, como diz o nome da secretaria
criada especificamente para esse fim, a Seprac - Secretaria de Promoção da Produtividade e
Advocacia da Concorrência. Isso pode ser feito melhorando o ambiente de negócios,
promovendo a estabilidade econômica e a qualidade regulatória, expondo as empresas a
competição e reduzindo as distorções na regulamentação que acabam gerando incentivos
contra-produtivos (por exemplo, a sede de uma empresa deve estar localizada no local que
faça sentido em termos de negócios e não porque em determinada localidade o imposto é
menor, seria então papel do Governo eliminar essa distorção tributária que prejudica a
produtividade).

Algumas medidas importantes neste sentido foram propostas pela equipe do Ministério da
Fazenda, vamos a elas:

69
Duplicata eletrônica: A lei que regulamenta a duplicata eletrônica foi aprovada no Senado dia
17/10 e segue agora para sanção presidencial. Duplicata é um título de crédito gerado em cima
de vendas comerciais, também conhecida como recebíveis. Quando você faz uma compra
parcelada em uma loja, o comerciante muitas vezes não fica esperando receber de você para
ter seu capital de giro. O que ele faz é vender essa carteira de recebíveis no sistema financeiro
com um desconto, que é baseado na taxa de juros. Esse sistema de duplicata agora passará a
ser feito por meio eletrônico diminuindo os riscos na transação bem como os seus custos. Mais
segurança significa menos juros. Com isso, a duplicata eletrônica pode gerar uma queda de
juros nas compras a prazo o que acaba deixando os preço final mais barato estimulando o
consumo e consequentemente aquecendo a economia. É uma medida simples, mas que pode
ter um impacto importante. Segundo a Central de Registro de Direitos Creditórios (CRDC) essa
medida deve aumentar o mercado de duplicatas que somou R$ 850 bilhões em 2017 em
adicionais R$ 280 bilhões até 2023

Cadastro Positivo: Outra medida que também pode ajudar a reduzir a taxa de juros aos
consumidores é a lei do cadastro positivo. A medida teve aprovação simbólica em maio deste
ano, mas acabou não avançando por falta de consenso em relação aos destaques dos
parlamentares. O cadastro positivo na realidade já existe, mas a adesão da população a ele foi
baixo porque muita gente nem sabe da existência e quem sabe não quer passar pelos trâmites
burocráticos para pedir sua inclusão. Então o governo quer inverter a lógica, ou seja, incluir
todo mundo e quem quiser sair pode pedir para que seu nome seja retirado do cadastro.
Como funciona esse cadastro? Cada vez que uma pessoa paga uma conta em dia ela ganha um
“ponto positivo” na sua nota de crédito, ou seja, quanto melhor pagadora ela for, maior essa
nota. É importante ressaltar que o cadastro negativo já inclui todo mundo automaticamente,
ou seja, quando você não honra um pagamento, seu nome pode ir para o serasa ou para o
SPC. O que muda com a medida é que o “bom comportamento” seria considerado também.
Assim, a empresa ou banco que está emprestando dinheiro para você saberá que você
costuma pagar suas dívidas em dia, e com isso terá mais confiança para emprestar dinheiro
para você. Se ela tem mais confiança, poderá cobrar menos juros. As vantagens parecem
óbvias mas esbarram em uma série de questões técnicas principalmente relacionadas ao sigilo
dos dados pessoais que podem estar sujeitos a vazamentos. Mas caso essa medida tenha
sucesso ela pode sim ajudar a reduzir os juros e da mesma forma que a duplicata eletrônica
estimular a economia.

eSocial: Essa é uma medida que visa informatizar a relação das empresas com o governo,
facilitando a prestação de contas.. O eSocial é uma ferramenta que reúne os dados
trabalhistas, fiscais, previdenciários das empresas em uma só plataforma. Desde 16 de julho,
empresas de médio porte (com faturamento entre R$ 4,8 milhões e R$ 78 milhões) passaram a
ser obrigadas a utilizar o sistema que já era obrigatório para as empresas maiores desde o
início do ano. A partir de novembro deste ano, as micro e pequenas e os MEI,
(microempreendedores individuais) que por enquanto tem adesão facultativa, também terão
que aderir ao sistema. Apesar das reclamações, quando totalmente implementado o eSocial
deve diminuir os custos e o tempo destas atividades, com ganhos de produtividade para as
empresas.

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Além dessas medidas também podemos citar outros esforços como a SPED o sistema público
de escrituração contábil (que começou a ser implantado em 2013), a ampliação do alcance da
nota fiscal eletrônica, propostas de mudanças na lei de recuperação judicial e falências e o
portal único de comércio exterior, que existe desde a década de 90, mas que foi modernizado
em 2016 com a eliminação de documentos e etapas e a redução de exigências
governamentais.

Esses são exemplos de medidas que foram ou iniciadas ou impulsionadas pelo governo Temer
e que devem melhorar o ambiente de negócios no Brasil. Segundo o último relatório do Banco
Mundial, o Doing Business, o Brasil ocupa posição de 123 entre 190 países analisados, ou seja,
o nosso ambiente de negócios ainda é muito ruim.

Ao contrário da estabilidade macroeconômica que foi alcançada com o sucesso do Plano Real,
não é possível criar uma única bala de prata para melhorar o ambiente microeconômico e a
produtividade. Aqui trata-se mais de uma guerra de trincheiras em que cabe ao governo
primeiro parar de atrapalhar e segundo, estimular a concorrência entre as empresas, essa sim,
a maior impulsionadora da produtividade.

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