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Efeito solo
Simone Sayegh
Edição 51 - Março/2001
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santista, porém, não param por aí: quase uma centena de edifícios estão ameaçados
DESTAQUES DA LOJA PINI
A cidade de Santos, no litoral paulista, famosa pelos jardins em toda a extensão de suas
praias também atrai atenção por um motivo nada comum: seus prédios tortos. A cidade
apresenta quase 100 prédios na orla com problemas de recalques, desde a ponta da praia NEWSLETTER TÉCHNE
até a divisa com São Vicente, com maior concentração entre o Canal 5 e a avenida Ana
Costa. Esse problema surgiu nas décadas de cinqüenta e sessenta, resultado da execução
de prédios com mais de dez andares com fundações diretas apoiadas em uma camada
APLICATIVOS
superficial de areia, que por sua vez recobre uma extensa camada de solo argiloso muito
compressível.
Um dos prédios que representa fielmente esse tipo de problema é o edifício Núncio Malzoni,
praia do Boqueirão. O edifício começou a inclinar desde a sua construção, em 1967, e como
a maioria dos prédios que sofreram recalques, suas fundações diretas são apoiadas na
camada de areia fina e compacta com 12 m de espessura, que por sua vez repousa sobre
vértices do edifício, que chegou a ter uma inclinação de 2,10 m, em 1999. A primeira
tentativa para reverter esse quadro data de 1978 quando foram executadas estacas-raiz no
lado mais adensado do edifício, que impediram recalques por cerca de três meses. Após
esse período as inclinações voltaram, e em 1995 uma comissão de obras formada pelos
Solução pioneira
A primeira proposta apresentada pela equipe liderada por Maffei, composta pelo engenheiro
de estruturas Paulo Mattos Pimenta e pela engenheira de solos e fundações Heloísa Helena
Silva Gonçalves, indicava que um acréscimo de dez a 15 anos na vida útil do edifício poderia
ser obtido com o reforço estrutural de pilares e vigas. De acordo com o engenheiro Paulo, a
análise dos custos, dificuldades e prazos desse tipo de intervenção levaram a equipe a optar
projeto de reforço estrutural, além dos transtornos para os moradores, como quebradeiras e
Para trazer o prédio de volta ao prumo foram planejados uma série de procedimentos. "As
primeiras avaliações estruturais foram feitas em 1996 e apontavam uma inclinação de 1,99
m", ressalta Paulo. A primeira etapa do projeto contou com a análise computacional do
O resultado dessas análises mostrou que se o prédio atingisse 2,20 m de inclinação sua
esforços, mas o resultado não indicou que o prédio iria ruir, pois o número é só um
1ª etapa em 1998
Implantação de fundações profundas por meio da execução de oito estacas em cada lado do
edifício, com diâmetros entre 1,00 m e 1,40 m, escavadas com lama bentonítica e protegidas
na camada de areia por meio da cravação de camisas metálicas. As estacas atingiram o solo
encontramos outra faixa de areia e outra de argila, e só então o solo residual, seguro e
2ª etapa em 1999/2000
Nesta etapa foram executadas oito vigas de transição trapezoidais para receber os esforços
Os técnicos instalaram 14 macacos hidráulicos acionados por seis bombas, entre as vigas de
transição e os blocos das novas fundações, que sustentaram todo o peso do prédio, cerca
posterior reaprumo. "Além de controlar a velocidade de cada macaco temos que manter as
pelo macaqueamento.
cerca de 200 t de terra entre as sapatas, que impediam o nivelamento por causa do peso
que exerciam nas fundações. Com a escavação foi encontrada uma camada de concreto
magro sob as sapatas que atrapalhava os serviços de reaprumo. "Para liberar o trabalho dos
macacos tivemos que cortar essa camada e descolar a sapata do solo", conta o engenheiro
José Eduardo de Carvalho Pinto, responsável pelas obras. As antigas fundações do Núncio
também haviam sido travadas por vigas de concreto que enrijeciam a estrutura, executadas
por toda a equipe que checava possíveis fissuras, forças e deslocamentos. "Em um dia
para uma análise estrutural detalhada", lembra o engenheiro José Eduardo. Com essa etapa
Hoje, o Núncio Malzoni já está completamente reaprumado, único caso na orla, e suas
medidas são alvo de muitas visitas e olhares internacionais. No entanto, Maffei recomenda:
"Cada prédio tem uma inclinação perigosa, e para cada inclinação existe uma solução
específica", diz. "O mais importante é cada morador tomar consciência dos problemas de
A Secretaria de Obras e Serviços Públicos divulgou que irá encaminhar à Câmara Municipal
de Santos um projeto de lei que estabelece normas para o monitoramento dos prédios com
Tortos famosos
Quem já não ouviu falar de Pisa e sua principal atração turística, um campanário de igreja
que a cada ano inclina mais? A torre foi construída no século XIII, portanto há mais de 600
anos, mas nunca havia sido objeto de correções, até cinco anos atrás, quando na cidade
italiana de Pavia, perto de Milão, ruiu uma torre com inclinação menor que a de Pisa. De
acordo com o engenheiro Paulo Mattos Pimenta, estruturas de concreto ou alvenaria não
avisam quando vão sofrer um colapso. "As construções sofrem algumas trincas e de repente
ruem", alerta Pimenta.
O solo da região de Pisa também é formado por areia e argila mole compressível, e a
possibilidade de também ocorrer um colapso da torre mobilizou uma equipe que procurou
consistiu de vários procedimentos. Foi feita uma série de perfurações e sangrias no terreno
que envolve o lado menos recalcado da torre, que possibilitou o afundamento do edifício
nesse lado. Ao mesmo tempo foram fixados blocos de aço a esse mesmo lado para
sendo escorada por uma cinta presa a dois cabos de aço presos a cerca de 200 m do
Outra construção que também sofria o mesmo problema de recalques é a catedral Nossa
cidade do México possui um solo tão ruim quanto o de Santos, também composto por argila
mole. A maioria dos edifícios foi construída sobre ruínas de pedras de cidades astecas e
possui fundações compostas de estacas com base perdida na argila mole. A catedral de
apresenta recalques desde a sua construção. Ao longo das últimas décadas, esse problema
Pimenta, a solução encontrada pela equipe mexicana para renivelar a catedral também
consistiu de uma série de furos no solo e emprego de dragas do lado menos adensado do
terreno, que retirou terra e possibilitou um afundamento desse lado da catedral. Essa
HISTÓRIA ANTIGA
onde instalou-se a Cosipa e, por fim, na própria orla santista, alvo do mercado imobiliário. De
acordo com o engenheiro de fundações e mecânica de solos Milton Vargas, que participou
da equipe responsável pelas sondagens na época, a partir de 1950 o IPT fez uma série de
estudos que acompanharam a construção dos prédios com mais de dez andares da orla.
inclinações desses edifícios. "Todo mundo já sabia que um prédio com até dez andares não
apresentaria problemas de recalques, e que os prédios mais altos com certeza iriam gerar
mercado imobiliário e preferiram arriscar, afinal fundações profundas eram muito caras e
prédios mais baixos seriam um desperdício de espaço."
Altos e inclinados
Na grande maioria, os solos de Santos são formados basicamente por uma camada
superficial de areia, uma camada de argila marinha mole muito compressível, algumas
camadas de areia e argila pouco espessas, e por fim uma camada de solos provenientes da
"Em Cubatão não há camada de areia, então todas as fundações são profundas", diz.
Heloísa lembra que em lugares onde o solo residual é próximo à superfície, portanto a
camada de argila é mais estreita, os problemas de recalques são muito pequenos. Porém,
em alguns pontos da orla, as fundações recomendadas para os prédios mais altos teriam
sapatas e possuem mais de dez andares, o que gerou a compressão da camada de argila e
os posteriores recalques. Milton Vargas garante que pelo menos cinco daqueles primeiros
prédios estudados já apresentavam problemas, e deram inicio à história dos recalques dos
prédios em Santos.
Um dos fatores que intensificou as inclinações dos prédios é a própria proximidade entre
eles. A pressão no solo de prédios vizinhos cria uma sobreposição dos bulbos de tensões, o
que causa uma inclinação lateral. "É muito comum os prédios da orla inclinarem para o
mesmo lado, parecendo que vão se chocar", explica Milton Vargas. Ele insiste no fato de que
não são só as fundações que causam recalques, mas todo um conjunto de fatores. "Um
prédio estaqueado em Santos deu um grande problema, pois, por ignorância absoluta do
mole."
pela decomposição das rochas que permanecem no mesmo lugar, e os solos sedimentares,
formados por resíduos de rochas que são transportados de uma área para outra e
depositam-se formando camadas. Belo Horizonte e Brasília possuem solos residuais, mais
resistentes. O Estado de São Paulo possui, na sua maioria, solos sedimentares. Os solos de
Santos pertencem ao período quaternário, mais recente, e portanto são menos rígidos,
O reaprumo do Núncio é uma vontade dos moradores que vem crescendo ao longo desses
30 anos de inclinações. "Sempre soubemos que teríamos que corrigir esse problema",
garante Ari José Ribeiro Gomes, atual síndico do prédio e responsável pela comissão de
escritório de Maffei, foi organizado um caixa de obras, que garantiu a continuidade dos
serviços. "Foi muito difícil conseguirmos todo o dinheiro, mas não podíamos adiar mais o
problema", ressalta. "A falta de uma linha de crédito pela Caixa nos mostra o pouco caso da
prefeitura, pois é uma obra de emergência, e esse problema atinge uma centena de
moradores aqui em Santos que não podem arcar com tantas despesas", desabafa.
O orçamento inicial previu o investimento de 60 mil reais para as três etapas, que foi dividido
em cotas corrigidas para facilitar o pagamento pelos moradores. "Quem pôde contribuir com
todo o capital pagou sem juros e financiou a obra", conta Ari. O pagamento dessas etapas
iniciou-se em 1996, e agora está sendo criado outro fundo de caixa para financiar a
edifício, que de acordo com o síndico vai acrescentar 43 mil reais aos 60 mil já gastos.
"Vamos dividir novamente em cotas, e quem pagar à vista financia essa fase", explica. Ari
lembra que o bloco B, que sofre o mesmo problema de recalque, também foi estaqueado e
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