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Reinventando a antropologia: perspectivas obtidas desde o estudo das elites.

Laura Nader

Tradução: Rafael Costa: ‘Up the anthropologist –perspectives gained from studying up’. In: Dell Hyme (ed.)
Reinventing Anthropology. Nova York: Random House, 1972. Pp. 284-311.

Neste ensaio irei descrever algumas oportunidades que os antropólogos encontram ao “estudar os de cima”
(studying up, no original) na sua própria sociedade, com a expectativa de gerar uma discussão sobre o porquê
estudarmos quem estudamos e como estudamos (Nader, 1964). Os antropólogos têm papel importante na
compreensão dos processos através dos quais se exerce o poder e a responsabilidade nos Estados Unidos.
Ademais, há uma certa urgência para um tipo de antropologia que esteja interessada no poder (cf. Wolf, 1969),
pois a qualidade de vida e as nossas vidas em si mesmas dependem do modo como os cidadãos compreendem
as atitudes daqueles que modelam e controlam as estruturas institucionais. O estudo do homem está sendo
confrontado com uma situação sem precedentes: pois, nunca antes tão poucos, por suas ações ou inações,
tiveram tanto poder sobre a vida e a morte de tantos outros membros da nossa espécie. Neste ensaio,
apresentarei três razões para “estudar os de cima”: o entusiasmo e o engajamento que gera entre muitos
estudantes; a sua pertinência científica; e a sua relevância democrática para o trabalho científico. Finalmente,
devo considerar alguns obstáculos e objeções a esse projeto e tentar respondê-los.

A INDIGNAÇÃO COMO MOTIVO

Muitos dos nossos alunos mais brilhantes olham para os periódicos recentes da disciplina e concluem
que a antropologia parece estar em fase de extinção, contentada em ganhar a vida [284], na maioria das vezes,
redescobrindo o que já havia sido descoberto ou vendendo seus bens num mercado de troca com outras
disciplinas e profissões. A audiência é muito limitada e o interesse pela minuciosidade desproporcional.
Ganhar a vida no mercado de troca de bens não é um modo apropriado de sobreviver; contudo, neste caso, é
algo sintomático de um talento subutilizado, a perspectiva do Mirror for Man.1
Hoje temos estudantes de antropologia indignados com os vários problemas que afetam o futuro do
Homo sapiens, mas eles estão estudando problemas com os quais aparentam não ter “sentimentos”. Alguns
pensam que esse seria a postura apropriada da ciência. Todavia, as coisas com as quais os estudantes se
entusiasmam e se engajam energicamente em suas vidas não são de fato estudadas. Eu penso que estamos
perdendo alguma coisa aqui. O impulso normativo geralmente nos leva a fazer perguntas importantes com
relação aos fenômenos que não seriam feitas de outra maneira ou a definir um problema em um novo
contexto. O rápido crescimento dos estudos sobre os direitos civis [nos Estados Unidos] está diretamente
atribuído às atividades por meio das quais as vítimas de um sistema tornaram visível a sua vitimização. Por
um processo de contágio, essa visibilidade espalha a indignação moral dentro das escolas e entre os
profissionais do direito, o que leva à condução de pesquisas a partir das questões levantadas pelos direitos
civis e por temas correlatos, como a lei da pobreza (poverty law, no original).2 Na antropologia nós temos o
exemplo de Ruth Benedict, em seu livro The Chrysanthemum and the Sword (1946) [O Crisântemo e a
Espada, 1072 Editora Perspectiva (traduzido) ], que se esforçou em compreender os oponentes numa guerra.
O impulso normativo aqui, mobilizado nas circunstâncias da Segunda Guerra Mundial, foi responsável por
um livro perspicaz e que desenvolveu novas técnicas para estudar culturas à distancia.

1 N.T.: A autora faz referência ao livro de Clyde Kluckhohn, Mirror for Man: the relation of anthropology to modern life,
1949. Nova York e Londres: McGraw-Hill Book Company, Inc.
2 N.T.: A “lei da pobreza” é a uma expressão que nos Estados Unidos se refere a um conjunto de regras garantidoras de direitos

e acesso a banefícios governamentais a indivíduos e famílias de baixa renda.

1
Olhando para os antigos fundadores da antropologia Americana, L. H. Morgan (o primeiro
antropólogo a se tornar presidente da AAAS [a Associação Americana para o Avanço da Ciência], descobrimos
que ele negociava um novo campo na ciência como o resultado do seu interesse por um novo problema social
(Resek, 1960). Ao longo se sua carreira, Morgan estava indignado com a forma com que os indígenas
americanos eram tratados, do modo como eles eram expulsos de seus territórios. Foi a sua indignação inicial
que o levou a estudar os índios americanos [285], e a sua indignação precede a sua curiosidade com relação
aos sistemas de parentesco e à estrutura social. No caso Morgan, a indignação possui um efeito energizante.
Tal como Jules Henry propôs:
Pensar profundamente em nossa cultura é deixar-se envolver pela raiva e pela
irritação com os outros; e se alguém não pode tolerar essa raiva, este alguém está
perdendo o seu tempo pensando profundamente. Uma das recompensas do
pensamento profundo é o brilho quente da raiva ao descobrir o injusto, mas se a
raiva é um tabu, o pensamento morrerá de fome (Henry, 1963, p. 146).
Eu percebo entre os jovens estudantes em Berkeley um entusiasmo que os mobiliza a estudar as
principais organizações e instituições que afetam a vida cotidiana, tais como a Comissão Californiana de
Seguros, agências reguladoras de empresas, departamentos públicos de meio ambiente, entre outras. A
seguinte e extensa citação ilustra alguns aspectos da motivação desses estudantes para ingressar nesses
campos:
Eu escolhi estudar a indústria de seguros primeiramente porque ela é uma das
“coisas” (não há um termo específico) feitas a partir de uma vasta rede de pessoas
com o poder de afetar muitos aspectos da vida de muita gente na Califórnia. A
maior parte é afetada de modo direto, ao contratar uma apólice de seguros. Todos
são afetados de outras maneiras, pela vasta influência política da “indústria de
seguros” e a sua tremenda influência econômica sobre nossas vidas pessoais.
Por exemplo, uma pessoa se dirige ao supermercado em um carro, o qual possui
uma apólice de seguro. O mercado em que essa pessoa chega também é segurado
contra perdas, roubo, danos e prejuízos. A comida vendida nos supermercados foi
entregue por caminhões cujas cargas são seguradas, e estão também protegidas
contra vários outros problemas. O preço dessas coberturas também afeta o preço
sobre a sua comida. A propósito, as fábricas onde os caminhões e os carros são
fabricados são seguradas por várias apólices (e do mesmo modo seus
empregados). Uma delas, denominada “seguro contra poluentes”, protege a
empresa de eventuais prejuízos decorrentes de um eventual processo judicial por
danos ambientais. O preço disso afeta outras precificações, como mencionado,
mas a propriedade do seguro permite à fábrica [286] ou à rede de pessoas que
controla a fábrica poluírem o ar sem um risco econômico para o seu negócio. Indo
mais adiante, a fábrica de automóveis é provavelmente uma das grandes
proprietárias de empresas de seguros. Para se ter uma ideia da imensa riqueza da
indústria de seguros, os proprietários das apólices de seguro somente na
Califórnia pagaram mais de U$ 6 bilhões em bônus de seguro em 1970, o que
equivale a mais de U$ 300 por pessoa. Isso é mais que a renda per capita da
população mundial. De fato, o montante anual de bônus nos EUA pela indústria
de seguros é maior que o produto interno bruto de todos os países com exceção
das cinco maiores economias do mundo (Serber, 1971, pp. 2-3).
Outro estudante afirmou o seguinte com relação aos seus estudos sobre a Agência de Promoção de
Negócios de Oakland [a Oakland Better Business Bureau – BBB]:
Na nossa sociedade complexa, nós obtemos muitos bens e serviços já
empacotados. Tal como o provérbio da criança que cresceu pensando que o leite
brota de embalagens cartonadas, a maioria dos consumidores sabem muito pouco
do que são feitas as mercadorias consumidas, como elas funcionam, como avaliar
sua utilidade antes de comprá-las, ou como repará-las em caso de defeito. Essa
ignorância não é apenas limitada aos bens, mas se estende aos serviços,
investimentos, caridades, para não mencionar as profissões legais e médicas. Nós
confiamos na Empresa de Gás e Eletricidade para instalar equipamentos, checar
a sua segurança, e até mesmo reacender o piloto se não conseguirmos localizá-lo

2
quando acidentalmente apagado. Nós levamos nosso vestuário especial para a
lavadora a seco. Quando a transmissão do carro não funciona, o automóvel é
levado para um especialista. As mercadorias são ordenadas por telefone ou por
correio. Do mesmo modo, o agendamento de horário num estúdio de fotografia,
num salão de beleza, a assinatura de revistas, investimentos e contribuições à
caridade. Quando se necessita comprar um carpete, o consumidor depende do
vendedor para explicar a qualidade de seu material, para calcular a metragem
desejada, e para garantir que o custo com a instalação esteja incluso no preço final.
Nós dependemos dos especialistas para o provimento de serviços e muito
frequentemente até mesmo para orientar o nosso próprio critério de julgamento
do seu trabalho. Muitas das nossas transações são realizadas ocasionalmente
[287], o que significa que o consumidor possa ser totalmente inexperiente de uma
avaliação sobre o valor pago quando compra um aparelho eletrônico, uma apólice
de seguro ou uma viagem de férias.
Da mesma forma, ele pode se achar incapaz de obter uma reparação para a sua
queixa quando suspeita de que está sendo enganado ou trapaceado. A maioria dos
contatos com a empresa são limitados às vozes descorporificadas dos operadores
das centrais telefônicas, dos representantes do secretariado e das relações públicas
nos balcões de atendimento, ou dos vendedores que primeiramente aparecem
quando o cliente entra numa loja. O consumidor telefona para a empresa para
saber o que ela pode fazer por ele, ou escreve uma carta de reclamação a um jornal
ou entra em contato com um programa de rádio de grande repercussão. Os
serviços desses despachantes são também “empacotados”: a reclamação é
recebida e o reclamante aguarda que a maquinaria lhe dê uma resposta. Essa
situação se estende até mesmo às organizações de defesa do consumidor e às
instituições legais, para as quais o irado consumidor pode eventualmente relatar
o seu problema...
Eu comecei minha pesquisa na Oakland Better Business Bureau numa total
ignorância com relação ao que a instituição representava, o que ela fazia e não
fazia, e porquê. Como um cidadão comum, eu iniciei com o conhecimento simples
de que se tratava de uma organização de suporte aos negócios e que se podia
contatá-los por telefone caso uma pessoa tivesse alguma questão sobre uma
empresa de confiança (ou existente) ou alguma reclamação sobre um negócio que
fracassou. Poucas pessoas vão além desses fatos e perguntam de quem é a voz do
outro lado da linha, de onde se obtém a informação ou o que realmente acontece
com o formulário da queixa entregue e quais resultados são repassados de volta
para o consumidor por e-mail. Mas, ainda assim, milhões de pessoas utilizam o
serviço todo ano (Eaton, 1971, pp. 2-3).

Talvez estas sejam tentativas do antropólogo de se colocar por de trás do rosto sem forma da
sociedade burocrática, a fim de alcançar os mecanismos que as distantes corporações e as indústrias de grande
escala utilizam para dirigir os aspectos cotidianos das nossas vidas. Qualquer que seja a motivação, tais
estudos levantam questões importantes quanto à responsabilidade, a accoutability, a autorregulação, ou, em
outro nível, traz questões relacionadas à estrutura social, à análise de redes, à pesquisa e à observação
participante [288].

ADEQUAÇÃO CIENTÍFICA

Se olharmos para a literatura científica com base no trabalho de campo nos Estados Unidos, nós
encontramos uma relativa abundância de textos sobre os pobres, grupos étnicos, e os marginalizados; por
outro lado, comparativamente, há pouca pesquisa sobre as classes médias e, muito menos, sobre as classes
mais altas. Os antropólogos poderiam se perguntar se o trabalho de campo não depende de certas relações de
poder em favor dos antropólogos, e se o efeito das relações de dominação e subordinação não afeta os tipos
de teoria que estamos produzindo. E se, ao reinventar a antropologia, os antropólogos fossem aptos a estudar

3
os colonizadores ao invés dos colonizados, a cultura do poder ao invés da cultura dos desempoderados, a
cultura da afluência ao invés da cultura da escassez?
Estudar “os de cima” (Studying up) tal como estudamos “os de baixo” (down) nos levaria a uma
proposição ao reverso de muitas questões que hoje consideramos “senso comum”. Por exemplo, ao invés de
nos perguntarmos porque algumas pessoas são pobres, iríamos perguntar porque outras pessoas são tão
ricas? De que maneira um cientista social explicaria os padrões de acumulação das classes médias e ricas da
América? Como podemos explicar a fantástica resistência à mudança daqueles que parecem ter várias opções?
Enfim, poderíamos questionar, como se convencionou a ideia de que os antropólogos guardam maior
interesse em saber por que os campesinos não mudam que no porquê de a indústria automotiva não inovar,
ou por que o Pentágono ou as universidades não podem se organizar de forma mais criativa? A compreensão
do conservadorismo de tais destacadas instituições e organizações burocráticas tem, provavelmente,
implicações maiores para sociedade humana e para as teorias de mudança, que a compreensão do
conservadorismo do campesinato.
Se, ao reinventarmos a antropologia, estivéssemos estudando principalmente os estratos mais
poderosos das sociedades urbanas, as visões que temos sobre os guetos seriam ampliadas pois elas abarcariam
aqueles relacionamentos que são muito maiores que o gueto em si mesmo. Nós estudaríamos os bancos e as
indústrias de seguros que deixam de fora áreas urbanas às quais não será oferecido crédito ou vendidas
apólices. Nós [289] estudaríamos as classes dos latifundiários que “barganham” ou “influenciam” as
autoridades municipais para que regras urbanísticas não sejam cumpridas. Favelas (slums) são tecnicamente
ilegais; mas se as regras urbanísticas ou outras leis municipais fossem cumpridas, tais territórios não seriam
favelas (se a execução da lei fosse bem-sucedida), ou seriam denominados com outro nome, que representasse
que tais territórios são antes o resultado de uma má administração pública ou dos crimes do colarinho branco.
Alguém poderia dizer que, se os crimes administrativos são bem-sucedidos, eles irão produzir o crime nas
ruas. Com essa perspectiva, nossas análises da delinquência de gangues (gangs) podem ser
correspondentemente afetadas e, ao desenvolver tais teorias sobre o comportamento das gangues suburbanas
poderíamos perguntar: Se é suficiente entender as gangues como um produto do sistema de valor daquela
subcultura em si mesma? Nós poderíamos estudar os sistemas de mercado ou os sistemas de transporte os
quais, como no bairro de Watts3, transformam uma área de gueto numa ilha virtual. Nós poderíamos estudar
até que ponto as práticas legais, ou os tipos de serviços de assessoria jurídica, moldam as percepções da lei
presente nos guetos.
As consequências em não estudar ‘os de cima’ (studying up) do mesmo modo como estudamos ‘os de
baixo’ (down) são muito sérias nos termos do desenvolvimento de uma teoria social adequada e da descrição
etnográfica. Se o pivô da discussão do pesquisador estiver em torno daqueles quem possuem uma
responsabilidade em virtude de um poder delegado, então, as questões mudam. Desde tal perspectiva, se pode
notar diferentes aspectos da cultura – o gueto pode ser ali representado como um território sem lei ou
desordenado. Os tribunais não são orientados para atender as queixas dos pobres; ademais, eles não são
orientados para a resolução rápida e barata dos conflitos – uma questão crucial para as populações de baixa
renda. Deste ponto de vista, poder-se-ia dizer que as comunidades dos guetos estão desconectadas dos
sistemas legais exceto como réus e, aliás, eles são frequentemente desconectados de outros serviços
municipais que vão desde a coleta de resíduos à proteção policial. Com essa orientação, novamente, a mesma

3
N.T.: Watts é um bairro da cidade de Los Angeles, nos EUA, historicamente ocupado por classes trabalhadoras
de origem africana e sul-americana. Em 1904 a construção de uma estação de trem no bairro o fez crescer de
forma independente da cidade, transformndo-se numa periferia.

4
pergunta é colocada: Nos estudos sobre delinquência, é suficiente compreender as gangues como produtos
dos sistemas de valor de uma subcultura em si mesma?
Faremos outra pergunta: Quais têm sido as [290] consequências das pesquisas sociais sobre a
criminalidade? Em virtude de concentramos a nossa atenção nos crimes das classes mais baixas, nós
contribuímos para a definição pública do “problema da lei e da ordem” nos termos dos crimes cometidos pelas
classes mais baixas. Vamos presumir que o público que paga impostos numa democracia, após escutar o
discurso do presidente convocando mais pagamentos de impostos para a segurança e a proteção contra os
crimes de rua, decidam ver por si mesmos. Não importa qual biblioteca consultem, o máximo que eles irão
encontrar é alguma informação sobre crimes cometidos pelas classes baixas. E assim não terão a possibilidade
de avaliar, considerando os dados e os materiais disponíveis, se, numa situação de recursos públicos
limitados, seria melhor investir contra o crime de rua ou contra o crime do colarinho branco, apesar de ambos
porem em perigo as vidas dos contribuintes todos os dias e de modos variados.
Tal como Clyde Mitchell notou, foi com tais problemas em mente que os antropólogos primeiramente
introduziram o conceito de “campo social” (social field):
O estudo antropológico clássico toma uma unidade – a “tribo” ou “sociedade” ou
“comunidade” – e apresenta o comportamento de seus membros nos termos de
uma série de instituições, estruturas, normas e valores integrados. Contudo, não
somente os antropólogos que trabalham em áreas urbanas, mas também aqueles
que têm conduzido estudos em “tribos” na África moderna (e presumidamente em
outros locais), consideram esse tipo de suposição difícil de se manter. Pois eles
descobriram que os efeitos de grupos e instituições, que não estão fisicamente
presentes na área da tribo, influenciam o comportamento das pessoas ali. A
unidade de interação dos relacionamentos, em outras palavras, é mais ampla que
a tribo (Mitchell, 1966, p. 56).

Lowie pode ter estudado os Crow e Llewellyn e Hoebel os Cheyenne como se estes grupos fossem
“ilhas” desconectadas da sociedade envolvente e até mesmo desconectadas das políticas e das ações da
Agência Governamental Indígena (Bureau of Indian Affairs), mas uma nova literatura, cuja escrita inicia-se
nos anos cinquenta, desafiou os limites da visão comunitária etnográfica do mundo e das metodologias sociais
até então reconhecidas, tal como notou Mitchell, o que talvez tenha estimulado o desenvolvimento da teoria
de redes e [291] o desenvolvimento dos estudos sobre as nações (Adams, 1970).
Se a antropologia fosse reinventada para estudar ‘os de cima’ (study up), nós, mais cedo ou mais
tarde, necessitaríamos estudar ‘os de baixo’ (down) também. Afinal, não estamos lidando com a oposição “isto
ou aquilo”; mas, simplesmente, percebendo quando é conveniente e crucial, no momento da elaboração de
um problema de pesquisa, ampliarmos os domínios dos nossos estudos – para cima, para baixo ou de ambos
os lados. Se nos interessarmos por determinados padrões ou formas de família (ao invés dos pobres ou dos
ricos como tais), o estudo desses problemas nas diferentes classes sociais, ou ao menos em um segmento
vertical, seria um modo de testar a hipótese se certos aspectos das classes inferiores ou condições das classes
elevadas são de alguma forma marcados por um tipo particular de padrão familiar (monogamia serial,
matrifocalidade, pai ausente), ou se a pobreza, por exemplo, é gerada por determinados padrões de
empregabilidade ou fatores externos. Ao menos ao colocar esses problemas num marco comparativo, as
nossas chances de compreensão da origem e da dinâmica das forças que geram a pobreza excessiva ou a
afluência seriam ampliadas, se se trata de forças da sociedade mais ampla ou “determinadas por transmissões
culturais dentro do grupo”. Dependendo do ponto de vista sobre o processo que gera o comportamento,
poder-se-ia buscar soluções para os problemas sociais, de um lado, direcionando reformas políticas para a
sociedade como um todo, de outro, dirigindo as modificações para o comportamento de uma subcultura, ou
ambos (Vatentine, 1969; Gladwin, 1969).

5
A partir de pesquisas em nossa própria sociedade4, nós poderíamos reescrever os livros sobre a
sociedade americana, cujos índices não fazem referência a instituições como as indústrias de seguros, de
imóveis, de automóveis, os bancos – que a grande parte da população sabe o quanto suas vidas são
influenciadas por elas. Relatos etnográficos descreveriam os grupos de mídia e suas agências reguladoras, as
instituições que representam e supervisionam os setores industriais, bem como seus setores legislativos, as
universidades e as organizações profissionais, e tais descrições abordariam tanto o ponto de vista de seus
usuários como dos seus gestores. É apropriado que uma reinvenção da antropologia se volte para o estudo
das instituições poderosas e das organizações burocráticas nos [292] Estados Unidos, pois tais instituições e
toda a sua rede afetam nossas vidas e, do mesmo modo, a vida das pessoas que os antropólogos
tradicionalmente estudaram em todo o mundo.
É particularmente apropriado aos antropólogos conduzirem esse trabalho em virtude das
características da sua disciplina. O estudo do homem deve ser eclético nos seus métodos e amplo na sua visão
do que é necessário para compreender a humanidade – seu passado, seu presente, sua cultura, sua biologia.
Nós nos especializamos na compreensão da cultura em sua totalidade e em contextos comparativos amplos
ou multiculturais. Nós deveríamos, por exemplo, nos sentir em casa para estudar escritórios de advocacia
como se fossem sociedades secretas para descobrir e analisar as suas redes de poder – as quais, no papel,
parecem não estar ali –, para descrever aqueles comportamentos habituais, até então não oficiais,
indispensáveis para a compreensão daquilo que, por exemplo, move o Congresso. Os antropólogos deveriam,
antes de tudo, dada a sua compreensão do princípio de reciprocidade, serem capazes de analisar por que as
decisões dos Comissários Federais de Comunicação não são tão racionais, ou as dimensões culturais que
comprometem ou determinam o fracasso de programas nacionais de desenvolvimento ou reintegração da
sociedade. Os antropólogos podem contribuir para a definição do papel do cidadão acadêmico – a proposição
de uma ciência do homem para o homem.

RELEVÂNCIA DEMOCRÁTICA

“Estudar os de cima” (Studying up) parece ser um caminho para alinhar e integrar as mais relevantes
questões sociais às metas e objetivos das ciências do homem. A função social que os antropólogos prestam à
sociedade poderia ser ampliada de modo a incluir outros papéis, tanto sociais quanto científicas, tal como
oferecer uma descrição etnográfica para os “nativos”. Uma monografia que possa ser lida e levada em
consideração pelos gestores de projetos que envolvem, por exemplo, a garantia do bem-estar social das
populações que são reassentadas involuntariamente em decorrência de grandes obras de desenvolvimento –
como descrito no livro de Colson (1971), The Impact of the Kariba Ressetlement Upon the Gwembe Tonga
[293].
O desenvolvimento tecnológico massivo causa sofrimento. Esse é um fato
largamente ignorado pelos planejadores financeiros, técnicos e líderes políticos.
Ao planejar operações drásticas no ambiente que desalojam populações ou que
fazem com que velhas formas de adaptação ao meio ambiente não sejam mais
possíveis, apenas os custos das obras de engenharia são contabilizados pelos
planejadores, mas não os custos sociais. No final, eles não pensam em compensar
financeiramente estes últimos... Este livro é um estudo sobre o impacto do
reassentamento forçado em algumas de suas vítimas.

4
Ver livro de M. N. Srinivas, Social Chage in Modern India, Capítulo 5, “Some Thoughts on the Study of One´s
Own Society”, para uma discussão dos problemas envoltos nessa tentativa.

6
Outro exemplo é a etnografia de Spradley, You Owe Yourself a Drunk, uma descrição etnográfica das
interações (e de suas consequências) entre pessoas alcoólatras com os sistemas legais e normativos. Essa
monografia já está sendo utilizada para educar os gestores desse sistema sobre as consequências de certas
decisões legais que são tomadas e de alguns procedimentos. Esse não é um papel inovador a ser
desempenhado pelos cientistas sociais, embora, infelizmente, nossas descobertas têm sido usadas mais em
proveito do próprio pesquisador que para ajudar aqueles que estudamos. Outro papel, entretanto, está
relacionado ao conceito de cidadania em um país que deve ser conduzido no marco da democracia e onde se
espera que os cidadãos tenham o controle da gestão administrativa. Não podemos, como cientistas
responsáveis, educar os “administradores” sem, ao mesmo tempo, educar aqueles que “são administrados”.
Um contexto democrático implica que os cidadãos tenham acesso às tomadas de decisão, às
instituições de governo e assim por diante. Isto significa que os cidadãos aprendam o mínimo sobre o
funcionamento das instituições mais importantes da sua sociedade, de seus governos ou de outras formas de
organização que afetam as suas vidas. A maioria dos membros de uma sociedade complexa e, certamente, a
maioria dos americanos não sabem muita coisa sobre as instituições e as organizações que mais influenciam
as suas vidas. Eu acredito que os antropólogos fariam um surpreendente trabalho se aplicassem suas
ferramentas analíticas e descritivas para o seguinte problema: Como pode funcionar a cidadania numa
democracia quando essa cidadania é lamentavelmente ignorante sobre como funciona a sociedade ou como
ela não funciona? Como um cidadão pode se ocupar como tal, e o que aconteceria se os cidadãos começassem
a exercer seus direitos mais além do voto, e fazer com que o “sistema” funcionasse para [294] eles? Mas,
primeiramente, como todos sabem, devemos descrever a burocracia e sua cultura.
Love e Eaton (1970) começaram seus estudos sobre a Agência de Controle da Poluição Atmosférica
preocupados em conhecer as funções da agência: Como a agência percebe a si mesma? Quem a utiliza? Como
seus usuários percebem a agência? O acesso ao público era uma questão chave.
Nossa abordagem era, a princípio, cautelosa em função das nossas próprias
dúvidas. Pretendemos ser inocentes, e de fato descobrimos que éramos realmente
inocentes. E assim passamos a nos perceber como “forasteiros”. Nós éramos o
público que não compreende a linguagem técnica e profissional que se fala. As vias
que tomamos para acessar a agência eram aquelas mesmas geralmente seguidas
pelo público em geral. Gradualmente, uma imagem da agência e da sua posição no
sistema legal de controle da poluição foi tomando forma.
Sua estrutura, as personalidades de seus tomadores de decisão, as limitações que
a realidade impõe a qualquer sistema ideal e, finalmente, os tipos de uso feitos da
agência tornavam-se inteligíveis... (Pp. 2-3).
Quando um cidadão vai à agência, ela o converte num dado estatístico que o separa
do real procedimento ou do uso da agência... Nessa relação, o que se supõe é a
noção de que a agência é feita para proteger o interesse público, e que o público
buscará o seu apoio. Mas a realidade é bem diferente. A agência age o tão
autonomamente quanto possível para combater a poluição e, ao fazer isso,
desenvolve uma relação bastante próxima com os funcionários das indústrias os
quais falam a mesma linguagem técnica e legal. É a indústria que tem o maior
acesso à agência, especialmente no nível legislativo. É a indústria que faz maior
uso da agência para proteger seus interesses (Pp. 32-33).
Este mesmo estudo nota que, nas divisões jurídicas da agência, as infrações legais verificadas são
tratadas como multas de trânsito – só após muitas violações serem acumuladas, o violador é processado. Mas
em que consiste tais processos num contexto onde os padrões íntimos das interações sociais se desenvolvem
segundo as características descritas acima? Não se trata de crimes ordinários.
No departamento jurídico da agência, seus advogados enfatizavam que os
princípios do código penal não eram uma solução, e por isso se aplicava as [295]

7
multas civis. Os tipos de “crime” cometidos não contemplam a possibilidade dos
“responsáveis” serem colocadas atrás das com “prostitutas e assaltantes”... (P. 33).
Além de ser um estudo útil sobre a cultura burocrática, este texto de trinta e sete páginas é um tipo
de informe etnográfico que os cidadãos precisam conhecer antes de tentarem obter acesso ou usar uma
agência pública. Tais informes introduziriam os cidadãos à cultura e à estrutura de determinado subgrupo de
modo que os permita avaliar se todas as cartas do baralho estão postas na mesa, de tal maneira que os
possibilitasse ter acesso real, bem como utilizar plenamente, uma agência pública.
O estudo sobre a Agência Californiano de Seguros, e em particular a forma como são recebidas as
queixas dos usuários pelo Departamento de Relações Públicas dessa mesma agência, é outra tentativa de
descrever o trabalho de uma organização onde os atos de omissão ou comissão afetam a vida de muita gente
(Serber, 1971). Serber conclui (P. 62) que o departamento que recebe as queixas não está à altura da demanda
do público que utiliza a agência porque “a maioria das pessoas não sabem da sua existência”. E adiciona, por
meio de uma citação, um registro importante dos modos de entendimento internos de uma instituição,
apontado por outro pesquisador no campo das agências governamentais (que não são muito diferentes das
agências privadas que oferecem serviços de caráter público), o qual sugere que tais instituições não estão
estruturadas para que o público as acesse:
É muito pior lidar com alguém do público porque se sabe que você está muito
limitado aos tipos de resposta que lhes podem ser dadas e aos resultados que se
podem conseguir. Eles esperam mais e geralmente ficam impacientes. Com a
indústria é diferente: eles são usualmente amigáveis e educados, ao menos na
nossa presença; nós sempre sabemos como se colocar e até que ponto podemos
avançar. É menos estressante porque eu me sinto menos responsável com o
resultado das nossas conversas. (Funcionário da Agência de Seguros III) [296].
O texto prossegue apontando que “há uma diferença qualitativa na natureza da interação entre
aqueles que se queixam com os funcionários da agência de seguros, e entre os representantes das indústrias
com os funcionários da agência de seguros”:
Não é muito prazeroso chegar aqui às oito e quinze após batalhar para cruzar a
ponte sobre as docas por quarenta e cinco minutos e, antes que eu pudesse
terminar meu café, uma puta gorda histérica que dificilmente consegue falar, tão
estúpida e agitada, irá entrar, e eles vão me chamar. Quando me aproximo dela
meu estômago embrulha e minha boca fica seca; as vezes a batata quente chega a
minha mesa antes mesmo de eu levantar da cadeira, e eu terei que tomar um gole
d´água para tentar me acalmar. (Funcionário da Agência de Seguros IV).5
Este mesmo estudo traz uma série de projeções do que poderia acontecer a esse departamento de
queixas caso fosse acessado mais facilmente pelo público; sua estrutura e sua função teriam que se modificar
profundamente de modo a aproximá-las aos principais objetivos da Agência, qual seja, “assegurar o
cumprimento dos contratos das apólices de seguro, bem como alcançar os níveis mais elevados possíveis de
proteção do público em geral e, em particular, de seus segurados e beneficiários” (Serber, 1971: p. 64).
O objetivo acima indicado levanta uma questão mais geral: De quem é a responsabilidade de decidir
o que é melhor para o público? O artigo de Eaton sobre a Agência de Promoção de Negócios de Oakland [a
Oakland Better Business Bureau – BBB] ilustra o dilema em torno desse conflito de valor.
Uma enorme limitação no valor da BBB para o consumidor recai sobre o
mesmíssimo fato de que ela é uma organização desenhada para promover os
interesses de negócios legítimos. Tal movimento supõe que aquilo que é bom para
os negócios é bom para a economia e para o consumidor. Supõe que a consciência
e o poder da opinião pública triunfarão sobre a desenfreada ganância do lucro, e
que um público bem informado seria capaz de moldar a responsabilidade do

5
N.T. No original: “sometimes the burning in my pipe stats before I can even get up to the desk, and I´ll have a
sip of water”.

8
mercado de acordo com seus próprios desejos. Essas pressuposições podem ser
reais em alguns níveis, mas a questão não é tão simples assim. Existem setores da
sociedade nos quais o poder está concentrado e setores onde o poder é mais
disperso ou até mesmo ausente. A queixa endereçada pelo consumidor tem mais
[297] peso entre os comerciantes locais que entre as corporações distantes que
fornecem seus produtos para os comerciantes. A agência de promoção de negócios
regula a propaganda dos estabelecimentos locais, mas o consumidor também está
exposto às propagandas a nível nacional, especialmente via televisão. O
comerciante com frequência não é um agente livre: ele está limitado pelo alcance
de seu distribuidor e de seu fornecedor...
A Agência está preocupada com a veracidade da propaganda, mas estaria
igualmente preocupada como a relevância desses comerciais? Há muitas coisas
que podem ser ditas sobre um produto e que são verdadeiras, mas que tem muito
pouco a dizer de seus atributos mais significantes, como: durabilidade, segurança,
eficiência... Ao consumidor é dito, de um lado, que é sua a responsabilidade de se
informar e exercer seu poder de escolha, para fazer com que o mercado se adeque
às suas necessidades e aos seus interesses... De outro lado, ele é abusado pelas
propagandas nacionais, as quais enfatizam os atributos não práticos dos produtos,
e assim ele é confrontado por uma gama de produtos de diferentes fabricantes que
aparentemente não possuem diferenças entre si em aspectos que o consumidor
poderia achar relevante. Ao consumidor é dito que ele/a compreenda os termos
da garantia do seu carro, mas não o que fazer em caso de discordar de alguns
desses termos e, no final, ele se depara com fato de que as garantias oferecidas por
todas as companhias são as mesmas. Como indivíduo, ele é essencialmente
incapaz de barganhar no sistema de mercado mais amplo característico das
sociedades modernas complexas (Eaton, 1971: pp. 68-70).
Compreender as diferenças na percepção dos fabricantes, de um lado, e dos consumidores de outro,
permite ao cidadão avaliar por si mesmo qualquer declaração de governo assumindo a sua responsabilidade
em não intervir nas organizações auto reguladoras tais como a BBB, instituída por grupos de empresários. O
estudo de Eaton sobre a BBB aborda apenas uma parcela muito pequena das tentativas de auto regulação dos
negócios. Desde 1966, uma série de “mecanismos para administrar queixas” foram desenvolvidos, desde “os
canais de linha direta” até os auditores (ombudsmen) corporativos. Um estudo comparativo de tais
mecanismos seria uma grande contribuição para a literatura que lida com a natureza das tentativas extralegais
de dar voz às queixas e obter formas de retificação. Seria fascinante saber até que ponto a [298] “lei informal”
é dominada pela relações públicas e pelas técnicas de gerenciamento de conflitos da avenida Madison.6 O uso
das relações públicas para a resolução de reclamações pode estar relacionado à perspectiva das classes altas
sobre a lei e a ordem, que comumente repetem “É melhor esfriar isso que resolvê-lo” [“Cool it rather than
resolve it”].
Alguns anos atrás, o criminologista Edwin H. Sutherland escreveu um livro intitulado White-Collar
Crime [Crimes do Colarinho Branco]. Uma grande descoberta documentada neste trabalho foi o simples fato
de que trabalhadores de colarinho branco cometiam crimes, um acontecimento que poderia combater a
crença, ao menos entre os cientistas sociais, que os pobres possuem o monopólio da delinquência. Se, como
cientistas, estivermos interessados em compreender as determinações de um crime, então a “descoberta” de
que os ricos tal como os pobres cometem “atos criminosos” é bem importante (algo que é amplamente
conhecido pelos cidadãos comuns e muito mais bem conhecido pelos pobres). O fato de que os crimes estejam
estigmatizados de modo diferente e processados segundo parâmetros de classe deveria nos guiar a desprezar
teorias simplistas sobre o comportamento criminoso. São poucos os trabalhos sociológicos que seguem os

6
N.T. A avenida Madison é uma avenida do bairro de Manhattan, na cidade de Nova York, EUA, conhecida por
ter abrigado nos anos 20, muitas empresas de publicidade estadunidenses.

9
estudos de Sutherland, e de fato houve um grande período de escassez entre os escândalos da virada do século
XX7 e o texto de Sutherland [em 1949].
Em vez disso, sociólogos como Lewis Coser (1968) preferem nos dizer o que os pobres fazem e porque
alguns deles cometem crimes e outros não, recorrendo aos termos de uma teoria da conduta criminal. Se
olharmos para a questão a partir de um corte vertical, fica evidente o fato de que as leis criminais foram
orientadas para a punição de crimes individuais, preferencialmente crimes de rua, enquanto os
comportamentos criminosos coletivos de uma corporação ou empresa são frequentemente insvestigados por
agências administrativas ou por meios que deixam pouco espaço para a estigmatização dos envolvidos
(Pound, 1906; Sutherland, 1949). Todavia, a base de dados analisada é bastante limitada. Henry Ruth, diretor
do Instituto Nacional de Justiça Criminal e Manutenção da Ordem [Law Enforcement and Criminal Justice],
notou em 1970 que
O Instituto Nacional de Justiça Criminal e Manutenção da Ordem tem
desenvolvido uma preocupação crescente com relação ao fato dos ditos “crimes do
colarinho branco” receberem pouca atenção das instituições de manutenção da
ordem [299] e de grupos de pesquisa... Todo o campo dos crimes do colarinho
branco representa uma prioridade nacional para a ação institucional e para a
pesquisa acadêmica – no que toca à definição do problema, do exame das suas
múltiplas fazes, da medição de seus impactos, e da determinação dos modos como
tais crimes podem ser prevenidos, detidos e efetivamente processados (Edelhertz,
1970: p. iii).
Considerado o benefício aos cidadãos, é surpreendente que num país tão legalista como os Estados
Unidos, em lugar algum do sistema educacional se obtém um conhecimento prático (working knowledge) da
lei como parte do processo educativo. De fato, após anos de estudo sobre o sistema legal dos povos Zapotec,
em Oaxaca, México, eu concluiria que a maior diferença entre o sistema legal dos Zapotec e o sistema legal
dos Estados Unidos (do ponto de vista de um consumidor de classe média) é que os Zapotec têm acesso, e
sabem como dele se beneficiar, ao sistema legal. Nos Estados Unidos, a maioria dos cidadãos não tem acesso
ao sistema legal, seja pelo fato de serem ignorantes com relação ao funcionamento do sistema ou por não
poderem arcar com os custos de um profissional (advogado) com conhecimento adequado sobre o
funcionamento do sistema. Na Califórnia, por exemplo – e imagino que isso seja comum em muitos outros
lugares – há poucos livros que descrevem o que é e como funciona o sistema legal para os cidadãos.
Essa situação é representativa de um problema mais amplo da educação cidadã. A maior parte do
nosso conhecimento sobre as leis nós aprendemos indiretamente nos canais de TV ou em séries televisivas.
Trabalhos etnográficos sobre questões legais preencheriam uma lacuna científica e descritiva, bem como
informaria aos nativos sobre o funcionamento de um sistema que exerce grande influência na direção de suas
vidas. Por exemplo, um estudante começou a estudar o Serviço de Imigração e Naturalização (Immigration
and Naturalization Service – INS) preocupado em descobrir como a imigração e o INS deram forma e
influenciaram às comunidades de imigrantes do terceiro mundo. A hipótese básica era a de que o INS é um
produto histórico da atitude negativa dos norte-americanos para com os imigrantes provenientes de outros
países que não os do Norte da Europa – o medo do estrangeiro [300], o desgosto pela cultura distante, o
isolamento, e atitudes similares; e que, embora tenha ocorrido uma maior flexibilização dessas leis, os
serviços de administração dos imigrantes, inclusive o recrutamento de pessoal pela instituição, continuam a
serem afetados por essas atitudes históricas. Outros estudos antropológicos feitos a partir da análise de

7
N.T. Nader se refere a um período da história Norte-americana, a partir dos anos 1870, que ficou conhecido
como “Era Dourada” (Golden Age). Marcado por um rápido crescimento econômico e altos níveis de corrupção
política no país.

10
documentos pessoais – como as memórias autobiográficas de juízes, advogados e executivos – ainda são
estudos bastante ausentes na bibliografia disponível. Os escritórios de advocacia de Washington, cuja
influência lhes garante o título de ser o quarto poder do Estado, seria um lugar fascinante para provar a tese
de Elizabeth Bott sobre as redes. Quais formas e quais funções as redes sociais ou de relacionamento
interpessoal possuem numa organização onde, no meio da carreira profissional, a maioria dos advogados dos
escritórios se dispersam por Washington, mas ainda assim seguem mantendo relações com o escritório de
advocacia mesmo depois de já não mais fazerem parte das suas folhas de pagamento? Que tipo de
reciprocidade pode ser encontrada nessa relação?

OBSTÁCULOS E OBJEÇÕES

Não obstante, há aqueles que não querem considerar tal reorientação do fazer antropológico e é
importante apreciar por que razões, nos dias de hoje, alguns antropólogos argumentariam que esse
movimento seria “impossível”, “improvável”, “irrelevante”, “fora de contexto”, ou até mesmo “impertinente”.
Os obstáculos que estão sendo postos são muitos, mas, para o propósito desse texto, poderíamos discuti-los
nos seguintes termos: acesso, atitudes, ética e metodologia.
Os departamentos de antropologia geralmente consideravam que seus estudantes tivessem que
realizar suas pesquisas de campo em uma cultura não-ocidental. Num determinado momento, essa era uma
política bastante útil na prática, quando se dava importância ao choque cultural e aos tipos de distanciamento
(detachment) que o acompanhava na formação dos antropólogos. Contudo, para muitos estudantes hoje, a
experiência de trabalhar numa firma de advocacia em Washington, num povoado controlado por uma
empresa privada (a company town) ou num complexo industrial internacional, pode ser tão bizarra quanta
qualquer outra que o estudante de antropologia pudesse [301] encontrar numa vila Mexicana, ou na Nova
Guiné. Nós antropólogos temos estudado as culturas do mundo apenas para descobrir que, no final, a nossa
cultura é uma da mais bizarras de todas, e, em virtude da sua influência sobre o mundo, para o “bem” ou para
o “mal”, é urgente que a estudemos.
O obstáculo que é mais usualmente colocado se dá nos termos do acesso. Os poderosos estão fora do
nosso alcance em planos muito distintos: eles não querem ser estudados; é perigoso estudar os poderosos;
eles não estão todos no mesmo lugar, e assim por diante. Como alguns estudantes expuseram em seus estudos
sobre os usos corporativos do sistema judicial:
A crença de que as corporações trabalham de modo secreto e sub-repticiamente
em seu próprio interesse tem sido verificada, de certa forma. O seu desejo em
manter o sigilo, seu medo paranoico de tudo com exceção da publicidade
autocomplacente, a sua recusa em discutir questões sobre a sua operação, e a
observância acentuada de seus advogados à natureza confidencial dos
relacionamentos cliente-advogado (mesmo quando o interesse público esteja em
jogo), tudo isso serve para eliminar o fluxo livre de informação o qual deveria estar
disponível nos fóruns públicos, mas que permanecem secretos para a sociedade.
O caráter furtivo de uma corporação é resumido na imagem daqueles mestres de
xadrez que são por ela contratados para conduzir seus casos, os advogados
corporativos (Zeff e Bush, 1970).
Essas dificuldades são igualmente certas entre outros povos que os antropólogos estudaram em
diferentes lugares. Que os problemas de acesso sejam muito diferentes, ou pelo menos mais problemáticos,
nos estudos dos de cima (studying up) nos Estados Unidos, é uma proposta que ainda não foi verificada
adequadamente. Os antropólogos tiveram problemas em acessar qualquer lugar onde foram; a resolução de
tais problemas é parte daquilo que representa “estabelecer uma relação”. Em vista de nosso êxito entre os
povos do mundo incrivelmente hostis, é um tanto surpreendente que os antropólogos estejam tão tímidos em

11
suas próprias casas (ver Riesman, 1954: pp. 440-66). Ademais, poder-se-ia argumentar que o acesso a
organizações burocratas (tais como as agências governamentais), ocupadas pelas pessoas mais ricas e
poderosas, deveriam estar todas acessíveis aos cientistas sociais em virtude das leis que protegem [302] o
acesso público à informação e o interesse coletivo. Além disso, há antropólogos privilegiados que
presumivelmente tem acesso aos de cima (up). Cleveland Amory (1947) e E. Digby Baltzell (1964) fizeram
contribuições substanciais para a compreensão do status de poder das classes altas, embora nenhum deles
fosse um antropólogo. Não, há de se ter razões mais plausíveis do porquê os menos poderosos são mais
atrativos para os estudos nos Estados Unidos.
Tem sido dito que os antropólogos valorizam estudar aquilo que eles gostam e que eles gostam
daquilo que estudam, assim, no geral, nós preferimos os de baixo. Braroe e Hicks (1967), ao discutir a mística
da antropologia, fazem referência novamente à alienação tradicional da sua própria cultura que é
característica entre os antropólogos, e exploram como tal alienação está associada à falta de um
comprometimento declarado para com a reforma social. Isso pode ser colocado de um modo mais positivo:
Antropólogos têm favorecido o estudo de culturas não-ocidentais como um modo de realizar a sua missão de
estudar os modos diversos de existência humana; eles não têm um compromisso intenso com a reforma social
porque a sua postura relativista e a sua crença em tal postura são necessárias para se alcançar uma verdadeira
“perspectiva científica objetiva e distanciada”, ou porque eles pensam que outros [cientistas], tais como os
sociólogos, já estão envolvidos com a reforma social. Embora os achados científicos possam ser idealmente
considerados como livre de valor ou neutros, certamente a escolha dos objetos de pesquisa não é. Os
antropólogos do futuro terão uma grande responsabilidade em escolher o que vão estudar, bem como a forma
que vão estudar.
Os problemas éticos que são colocados para os estudos dos de cima (studying up) quase sempre se
confundem, particularmente, com a discussão da ética do trabalho de campo em sua própria sociedade. Um
estudante fez o seguinte comentário:
Dizer que os participantes do kula não desempenham na prática aquilo que eles
dizem que fazem tem consequências distintas de dizer que uma agência
governamental não está seguindo as suas normas. Isso não equivale a dizer que a
agência governamental não deveria ser estudada, ou que o fato dela não seguir as
suas [303] normas não deveria ser apontado. A questão é: Pode o antropólogo
fazer um estudo estrutural e depois, no seu papel de cidadão, apontar que a
agência está fodendo com o público americano?
O mesmo estudante se pergunta:
Como podemos ter acesso aos mesmos tipos de informação que reunimos quando
“estudados os de baixo” (study down) sem sermos desonestos (i.e. ocupar o posto
de um falso secretário ou qualquer outra ocupação)? Se conseguíssemos as
informações sem que os nossos informantes saibam que somos cientistas sociais,
como então publicá-las? Parece que o único modo “aberto” de se fazer um estudo
permaneceria muito superficial – por meio de questionários e entrevistas formais,
em oposição daquilo que aprendemos como o método da observação participante.
Os problemas levantados por esse estudante são problemas éticos que os antropólogos devem
enfrentar, não importa a cultura que estejam estudando. Ao discutir as questões éticas envolvidas nos estudos
dos de cima (studying up) na nossa sociedade, eu fico com a impressão de que essa confusão resulta do modo
como um ou outro antropólogo lida com a dupla questão implicada nessa relação – existiria uma ética para
estudar os de cima (studying up) e outra para estudar os de baixo (studying down)? Ou seria o caso, como o
estudante sugere, que as consequências de descrever as inadequações sistemáticas de uma sociedade são
maiores quando se refere às agências de governo, que aos sistemas econômicos campesinos ou às resoluções

12
de conflito (ou simplesmente conflitos) em uma pequena vila de pescadores, e que, portanto, nossos sujeitos
de pesquisa devam ser tratados de acordo com cada uma dessas circunstâncias?
Há uma distinção importante a ser feita entre o “público” e o “privado”, mesmo que o anonimato do
informante seja importante em ambos os casos. De modo geral, os antropólogos que trabalham nos Estados
Unidos são considerados como se tivessem trabalhando na esfera “privada”: nós estudamos famílias,
pequenos grupos, aspectos comunitários que são mais privados que públicos. Nós não devemos,
necessariamente, aplicar a mesma ética desenvolvida para os estudos do privado, inclusive a ética
desenvolvida para o estudo de culturas estrangeiras (onde somos os visitantes), para os estudos das
instituições, organizações [304] e burocracias com grande impacto para o público. Ao reinventar a
antropologia, qualquer discussão sobre a ética deve considerar as dimensões público-privadas, bem como os
componentes casa e estrangeiro. Ademais, na antropologia atual, um trabalho feito nos moldes das ciências
sociais objetivas, pode ser considerado como uma peça “jornalística” pelos sujeitos da pesquisa. Contar as
coisas como elas são pode ser percebido como uma denúncia escandalosa (muckraking) pelos sujeitos da
pesquisa (o trabalho de Oscar Lewis no México foi interpretado dessa forma) ou pelos colegas de trabalho
mais cômodos em apresentar os dados de suas pesquisas dentro dos jargões das ciências sociais, o que
protegeria o seu trabalho do consumo massivo.
O conceito de observação participante tem um papel decisivo na determinação daquilo que os
antropólogos escolhem estudar. O poder da observação participante como tal foi apenas descoberto no século
XX. Malinowski e Radcliffe-Brown, entre os primeiros a fazer trabalho de campo com essa técnica, definiram
um novo padrão de se fazer etnografia. Quando os antropólogos vão estudar a cultura de um povo, ele vive
com ela; a descrição resultante é rica em informações contextuais e é o resultado de muitos pontos de vista
que se abrem em função de ter “vivido com os nativos”. Hortense Powdermaker descreveu os componentes
da observação participante do seguinte modo:
As condições para uma bem-sucedida comunicação envolvem: 1) aproximação
física do pesquisador de campo com as pessoas com que estuda; 2) conhecimento
da sua língua; e 3) envolvimento psicológico (1966: p. 287).
A autora segue afirmando:
A habilidade para adaptar-se psicologicamente é importante em situações
hierárquicas onde é indispensável mover com facilidade entre os diferentes níveis
da estrutura de poder. Alguns pesquisadores de campo se identificam tão
completamente com os desfavorecidos que eles são incapazes de fazer contatos
efetivos com aqueles situados nas posições mais altas das hierarquias sociais (e
políticas) (p. 291) [305].
Ao mesmo tempo que Hortense Powdermaker descreveu o valor das observações participantes, ela também
já se referiu às limitações de uma aceitação plena da observação participante como um traço distintivo de
todo trabalho de campo em antropologia social. Quando um antropólogo participante observa, ele ou ela
reside ou geralmente vive com os “nativos”. Tal método tem pesado bastante nas escolhas sobre onde o
antropólogo irá estudar: nós preferimos situações residenciais, seja a residência numa vila primitiva ou num
hospital moderno.
O grau com que as escolhas dos nossos campos de investigação podem ser determinadas pelo fato de
conseguir ou não observar como um participante se tornou claro para mim quando dois dos meus alunos
foram para a cidade de Washington para estudar um escritório de advocacia que não desejava ser estudado
(mesmo que alguns membros individuais do escritório estivessem dispostos a cooperar de modo limitado).
Como eles poderiam empregar o método da observação participante se o escritório não os permitia cruzar a
porta de entrada, e se eles não pudessem observar participando, como poderiam fazer antropologia? Essas

13
questões, obviamente, já foram levantadas anteriormente pela antropologia, e quando os antropólogos
pensaram que isso realmente importava, eles as superaram os problemas enfrentados. Um exemplo são os
estudos de “culturas à distância” (culture-at-a-distance) que se multiplicaram durante a II Guerra Mundial8,
ou o trabalho de Elizabeth Bott (1957) no seu estudo sobre as redes de parentesco em Londres, baseado em
entrevistas diretas com seus informantes.
A questão que aqui pretendo sublinhar é a existência de uma mística em torno da observação
participante que carrega consigo certos requisitos, embora o que permanece é a autoimagem devastada do
antropólogo caso ele não consiga observar e participar de seu campo de investigação (Fischer, 1969), e a
maioria dos nossos estudantes não são treinados nos tipos de técnicas requeridas para trabalhar em contextos
não residenciais tais como bancos, empresas de seguros, agências governamentais, indústrias eletrônicas, e
outros. Quantos antropólogos sabem descobrir a quem uma cidade pertence? Se Sol Tax está correto em
apontar que os antropólogos não estão trabalhando com os problemas mais relevantes para o mundo de hoje
– tais como a população, a poluição e a guerra – [306] porque eles não conseguem fazer observação
participante de tais problemas numa comunidade, então, ao reinventar a antropologia, nós poderíamos
reorganizar o excessivo valor aferido à observação participante que tem nos levado a esquecer a existência de
outros métodos (ver Gussow e Tracy, 1971) mais úteis para os problemas e as situações que despertam nosso
interesse de pesquisa. O uso de documentos pessoais pode substituir a investigação antropológica
participante em algumas áreas da cultura que levaria anos de participação para compreendê-las. Um
estudante fez o seguinte comentário sobre metodologia:
O principal método de pesquisa do antropólogo, a observação participante, não é,
desnecessário dizer, totalmente aplicável quando se está estudando uma agência
governamental ou uma instituição de elite e suas formas de interação com várias
classes de pessoas. Uma situação particular pode ser resolvida, mas,
caracteristicamente, os dados coletados serão reunidos a partir da observação
mais que da participação. A definição que se mantém para a afirmação de que o
antropólogo é um participante se sustenta no fato do pesquisador ser capaz de
interagir como um nativo na situação estudada e, portanto, está apto a usar a si
mesmo como um informante. A outra definição considera que o status de
participante é alcançado por um forasteiro (outsider), que consiga ser tratado
como uma pessoa de dentro (insider). Idealmente, quanto mais íntima a aceitação,
menos o observador/participante influenciará a situação que se está observando e
mais próximo se chegará ao status de participante. Considerando essas duas
definições, o termo “observador/participante” não se aplicaria às situações onde o
etnógrafo se volta para o estudo das instituições de grande escala ou muito
estendidas, ao menos que se possa ser um membro do grupo que se está
estudando. O termo “observador participante” não se aplicaria verdadeiramente
às técnicas de pesquisa deste pesquisador, mesmo que nessas situações se tente
preencher esse ideal. Ao estudar a sua sociedade, especialmente se ela é complexa
e altamente especializada e heterogênea, a questão é determinar os níveis reais de
participação e os limites além dos quais essa participação é excluída.
Se o antropólogo está disposto a fazer uma contribuição para a compreensão das
instituições as quais, de um modo complexo [307], afetam as vidas de muitas
pessoas, ele deve levar a cabo uma abordagem metodológica eclética... (Serber,
1971: pp. 5-6).
Entrevistas com várias fontes (formais/informais, diretas/por telefone) são usadas por muitos
estudantes. Documentos idem (ver o NACLA Guide, 1970) – documentos de relações públicas para a
compreensão da imagem preferencial de uma organização, documentos internos sobre a estrutura e trabalhos
estatísticos planejados e concluídos por uma organização, todos são bastante úteis para descobrir as

8
A autora faz referências aos “estudos de área” (Area Studies) que se popularizaram nas universidades dos EUA
e do mundo ocidental após a II Guerra Mundial, os quais estavam preocupados em compreender aspectos
históricos, políticos, culturais e econômicos dos países não-ocidentais em processo de descolonização.

14
tendências de uma organização e o que é considerado problemático por seus atores. Igualmente importante é
aquilo que Marian Eaton denominou como “autoanálise” – uma consciência por parte dos estudantes de como
ele ou ela, por ser um cientista social, é percebido na sociedade, de como a sua imagem é difundida entre as
pessoas (run around), da forma como essa imagem se adapta (enculturated) e é tratada de modo velado ou
não na sua interlocução com os informantes ou com os membros de uma organização e outros cujo trabalho
é lidar com forasteiros (outsiders). Devemos atribuir alta prioridade aos valores antropológicos tradicionais
tais como o de utilizar nosso conhecimento sobre os outros como espelhos de nós mesmos e nos permitir
elaborar problemas que nos levem a questões metodológicos (e não o contrário).
Talvez devamos reordenar a nossa concepção da antropologia. Seguramente, são as necessidades da
humanidade que devem guiar os caminhos para o estudo do homem.

Notas
Sou imensamente agradecida a Elizabeth Colson, Marian Eaton, Dell Hymes e Julio Ruffini por tomarem seus
tempos para a leitura e crítica das primeiras versões desse artigo. Marian Eaton merece um reconhecimento
especial pela ajuda na pesquisa e na edição. Os estudantes de graduação pioneiros no “estudo dos de cima”
(studying up) merecem reconhecimento pela sua visão, suas atitudes perseverantes, seu contentamento em
fazer etnografia das situações cotidianas em casa, e por tentar fazê-lo melhor que o usual. O físico Arthur
Rosenfeld merece um agradecimento especial pelo financiamento de dois estudantes de antropologia nos seus
esforços iniciais de estudar os de cima (studying up) em Washington, D.C., um esforço que levou à formulação
das ideias desse artigo.

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