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Mar português

Ó mar salgado, quanto do teu sal


São lágrimas de Portugal
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena?
Tudo vale a pena,
Se não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa

Em termos formais, constatamos que o poema é constituído por duas


estrofes, de seis versos (sextilhas). Quanto ao metro os versos são
irregulares. Os versos são decassilábicos e octossílabos. A rima é
emparelhada, segundo o esquema aabbcc.

O tema desta composição poética é a apresentação dos perigos e das


glórias que o mar comporta ao povo português. Este tema desenvolve-se
em duas partes.

A primeira parte é constituída pela primeira estrofe, onde o sujeito


poético apresenta uma realidade épica – é a síntese da história de um povo
e dos sacrifícios que suportou para poder conquistar o mar; a segunda
estrofe é de caráter mais reflexivo, fazendo o sujeito poético um balanço
dos referidos sacrifícios. A conclusão é que valeu a pena, pois em resultado
desse sofrimento o povo português conquistou o absoluto. A recompensa
das grandes dores são as grandes glórias.
A primeira parte inicia-se com uma apóstrofe ao mar encerrando com outra
desta feita não adjetivando o mar como salgado (veja-se a expressividade
deste adjetivo, enfatizando o sabor amargo do sal, mas mais amargo ainda
o sofrimento que causa as lágrimas já de si também salgadas – perspetiva
simbólica deste elemento), mas conferindo à estrofe e de certo modo ao
poema uma espécie de circularidade. A aliteração poderá sugerir a relação
necessária e fatal entre o mar e o sofrimento. Tudo começa e termina no
mar. A metáfora associada à hipérbole nestes dois versos iniciais (Quanto
do teu sal são lágrimas de Portugal), acentuam o sofrimento causado pelo
mar no povo português. Note-se ainda a metonímia em Portugal. As frases
exclamativas conferem o tom épico a esta primeira estrofe e patenteiam as
vítimas que o mar fazia em terra: as mães, as noivas e os filhos são os
atingidos pelo sofrimento causado pelo elemento marinho. A repetição do
determinante interrogativo, em posição anafórica, nos dois últimos versos
acentua o dramatismo das situações narradas. Foi sobretudo nos núcleos
familiares que se fizeram sentir os malefícios do mar. Ressalte-se o valor
expressivo da metáfora inicial “ Por te cruzarmos”, apontando para a cruz
símbolo de sofrimento. Os verbos choraram, rezaram, e ficaram por casar
ainda por cima reforçado pela expressão “em vão” denotam a dor, o
sofrimento e o choro aflito provocados pela destruição do amor maternal,
filial e de namorados. Tudo isto porque almejamos a posse do mar “ para
que fosses nosso, ó mar!”

A segunda parte inicia-se com dois versos em jeito de balanço, o qual


para o sujeito poético é positivo apesar de todos os sacrifícios. Basta para
tal que o objetivo que esteja na base da empresa seja nobre. Note-se a
reiteração de valeu...vale e mais adiante passar...passar... reforçando a
relação necessária entre o sofrimento e o heroísmo. A própria interrogação
retórica funciona como uma chamada de atenção para as contrapartidas
que o povo português alcançara do destino. A resposta à questão que
levantou o sujeito poético obtém a resposta nele mesmo, através de
três frases, todas elas carregadas de grande simbolismo. A primeira
resposta “ Tudo vale a pena se a alma não é pequena” sugere a
grandeza da alma humana, sempre pronta a desejar o impossível, o
que pode proporcionar a glória, a heroicidade. Tudo vale a pena
para alcançar o ideal sonhado. Na segunda frase “ Quem quer passar
além do Bojador / tem que passar além da dor”, deve entender-se
Bojador na sua dimensão simbólica, de ultrapassar o medo,
ultrapassar o desconhecido, conseguir a glória e a heroicidade
desejada. Não obstante é necessário ultrapassar também em
primeiro lugar a dor. Finalmente a terceira frase “ Deus ao mar o
perigo e o abismo deu / mas nele é que espelhou o céu”. O perigo e o
abismo do mar são a causa de sofrimentos, mas no sentido
metafórico e simbólico que está para lá do denotativo de o céu se
refletir no mar, está a ideia de que o céu é símbolo do sonho
realizado, da glória. Daqui poderemos deduzir que quem vencer os
perigos do mar e o sofrimento alcançará a glória suprema.

Ao longo do poema predominam os tempos do perfeito para


evocar acontecimentos passados trágicos e o presente que situa o
sujeito poético num tempo presente, considerando os valores
morais fundamentais à construção de heróis, bravura, tenacidade e
desejo de vencer.

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