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APOSTILA DE SERVIÇO

SOCIAL PARA CONCURSOS

CONHECIMENTO ESPECÍFICO

http://WWW.SERVICOSOCIALPARACONCURSOS.COM.BR/
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
comunidade, habitação, gestão de pessoas, segurança pública,
Professora Ana Maria B. Quiqueto justiça e direitos humanos, gerenciamento participativo, direitos
sociais, movimentos sociais, comunicação, responsabilidade
Mestre em Educação-Gestão e Instituição Educacional
social, marketing social, meio ambiente, assessoria e consultoria,
Especialista em Gestão de Políticas Públicas Sociais
que variam de acordo com o lugar que o profissional ocupa no
Graduada em Serviço Social
mercado de trabalho, exigindo deste um conhecimento teórico-
metodológico, ético-político e técnico-operativo.
Esse profissional busca a inclusão social e a participação das
1 SERVIÇO SOCIAL NA classes subalternas, por meio de formas alternativas e estratégicas
CONTEMPORANEIDADE. de ação. Pois procura conhecer a realidade em que atua e possuir
compromisso ético com a classe trabalhadora e com a qualidade
dos serviços prestados.
Para uma reflexão do Serviço Social na atualidade, com suas
demandas e perspectivas nesse momento histórico, é necessário situá-
O Serviço Social é uma profissão inserida na divisão social
lo em sua trajetória histórica e revelar o legado desse momento com
e técnica do trabalho, realiza sua ação profissional no âmbito das
seus rebatimentos no contexto do século da globalização. Tempos em
políticas socioassistenciais, na esfera pública e privada. Neste sentido,
que a economia e o ideário neoliberal intensificam as desigualdades
desenvolve atividades na abordagem direta da população que procura
sociais com suas múltiplas faces. Tempos em que crescem as massas
as instituições e o trabalho do profissional e por meio da pesquisa,
descartáveis, sobrantes e à margem dos direitos e sistemas de
da administração, do planejamento, da supervisão, da consultoria, da
proteção sociais. Tempos, portanto em que crescem as demandas por
gestão de políticas, de programas e de serviços sociais.
políticas sociais, de um modo geral e, particularmente, por políticas
O Serviço Social atua na área das relações sociais, mas sua
de proteção social (Yazbek, 2000), entre as quais se destaca, neste
especificidade deve ser buscada nos objetivos profissionais tendo
estudo, a Educação, como campo privilegiado e desafiador para o
estes que serem adequadamente formulados guardando estreita
exercício profissional, é o que será discutido a seguir. (Texto adaptado
relação com objeto. Essa formulação dos objetivos garante-nos,
de PIANA, M. C. doutora em Serviço Social).
em parte, a especificidade de uma profissão. Em consequência,
um corpo de conhecimentos teóricos, método de investigação e
intervenção e um sistema de valores e concepções ideológicas
1.1 DEBATE TEÓRICO-METODOLÓGICO,
conformariam a especificidade e integridade de uma profissão.
ÉTICO-POLÍTICO E TÉCNICO-OPERATIVO
O Serviço Social é uma prática, um processo de atuação que se
DO SERVIÇO SOCIAL E AS RESPOSTAS
alimenta por uma teoria e volta à prática para transformá-la, um
PROFISSIONAIS AOS DESAFIOS DE HOJE.
contínuo ir e vir iniciado na prática dos homens face aos desafios
de sua realidade.
O assistente social é um profissional que tem como objeto de
trabalho a questão social com suas diversas expressões, formulando
Do legado da história aos desafios atuais da profissão
e implementando propostas para seu enfrentamento, por meio
das políticas sociais, públicas, empresariais, de organizações
O surgimento e desenvolvimento do Serviço Social como
da sociedade civil e movimentos sociais. Para Netto (1992), “a
profissão é resultado das demandas da sociedade capitalista e
questão social, como matéria de trabalho, não esgota as reflexões”.
suas estratégias e mecanismos de opressão social e reprodução da
Sem sombra de dúvidas, ela serve para pensar os processos de
ideologia dominante. Como profissão que surge de uma demanda
trabalho nos quais os assistentes sociais, em uma perspectiva
posta pelo capital, institucionaliza-se e legitima-se como um
conservadora, eram “executores terminais de políticas sociais”,
dos recursos mobilizados pelo Estado e pelo empresariado, mas
emanadas do Estado ou das instituições privadas que os emprega.
com um suporte de uma prática cristã ligada à Igreja Católica, na
No processo de ruptura com o conservadorismo, o Serviço
perspectiva do enfrentamento e da regulação da chamada questão
Social passou a tratar o campo das políticas sociais, não mais
social que, a partir dos anos 30 (séc. XX), adquire expressão política
no campo relacional demanda da população carente e oferta do
pela intensidade das manifestações na vida social cotidiana.
sistema capitalista, mas acima de tudo como meio de acesso
Conforme afirma Yazbek (2000), terá particular destaque
aos direitos sociais e à defesa da democracia. Dessa forma, não
na estruturação do perfil da emergente profissão no país a Igreja
se trata apenas de operacionalizar as políticas sociais, embora
Católica, responsável pelo ideário, pelos conteúdos e pelo
importante, mas faz-se necessário conhecer as contradições da
processo de formação dos primeiros assistentes sociais brasileiros.
sociedade capitalista, da questão social e suas expressões que
Cabe ainda assinalar, que nesse momento, a questão social é vista
desafiam cotidianamente os assistentes sociais, pensar as políticas
a partir de forte influência do pensamento social da Igreja, que a
sociais como respostas a situações indignas de vida da população
trata como questão moral, como um conjunto de problemas sob a
pobre e com isso compreender a mediação que as políticas sociais
responsabilidade individual dos sujeitos que os vivenciam, embora
representam no processo de trabalho do profissional, ao deparar-se
situados dentro de relações capitalistas. Trata-se de um enfoque
com as demandas da população.
individualista, psicologizante e moralizador da questão, que
A atuação do assistente social realiza-se em organizações
necessita para seu enfrentamento de uma pedagogia psicossocial,
públicas e privadas e em diferentes áreas e temáticas, como:
que encontrará no Serviço Social efetivas possibilidades de
proteção social, educação, programas socioeducativos e de
desenvolvimento.

Didatismo e Conhecimento 1
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O surgimento do Serviço Social está intrinsecamente A linguagem do “investimento”, da técnica, do planejamento
relacionado com as transformações sociais, econômicas e passa a ser um referencial importante, constituindo-se com isso,
políticas do Brasil nas décadas de 1930 e 1940, com o projeto de uma das bases para o processo de profissionalização do Serviço
recristianização da Igreja Católica e a ação de grupos, classes e Social.
instituições que integraram essas transformações. Essas décadas O processo de institucionalização e de legitimação do Serviço
são marcadas por uma sociedade capitalista industrial e urbana. Social desvencilha suas origens da Igreja, contudo não supera o
A industrialização processava-se dentro de um modelo de ranço conservador, quando o Estado passa a gerir prioritariamente
modernização conservadora, pois era favorecida pelo Estado a política de assistência, efetivada direta ou indiretamente pelas
corporativista, centralizador e autoritário. Assim, a burguesia instituições por ele criadas ou a ele associadas. A assistência deixa
industrial aliada aos grandes proprietários rurais, buscava apoio de ser um serviço prestado exclusivamente pelas instituições
principalmente no Estado para seus projetos de classe e, para privadas, tendo novos parceiros como o Estado e o empresariado.
isso, necessitavam encontrar novas formas de enfrentamento da O desenvolvimento do capitalismo e a inserção da classe
chamada “questão social”. operária no cenário político da época cria o fundamento necessário
O Estado Novo visando garantir o controle social e sua à institucionalização da profissão. A chamada “questão social”
legitimação, apoia-se na classe operária por meio de uma política manifesta-se por meio de vários problemas sociais (fome,
desemprego, violência e outras) que exigem do Estado e do
de massa, capaz ao mesmo tempo de “defender” e de reprimir os
empresariado uma ação mais efetiva e organizada. A demanda do
movimentos reivindicatórios. Ele se constitui na “versão brasileira
trabalho profissional (assistente social), portanto, vem no bojo de
atenuada do modelo fascista europeu”, ou seja, as diretrizes
uma demanda apresentada pelo setor patronal e pelo Estado.
assumidas pelo governo Vargas baseavam-se nos modelos Também se diferencia no que diz respeito à população
corporativos europeus. Esta ação vai desde uma legislação social atendida, quando antes uma pequena parcela da população tinha
protetora até uma estrutura sindical, o Estado “lhe concede o acesso aos serviços das obras assistenciais privadas, agora um
direito potencial à reivindicação e lhe concede a cidadania”, mas maior número do proletariado tem acesso às incipientes políticas
em contrapartida, subtrai-lhe a possibilidade de uma organização sociais criadas pelo Estado. Essa mudança substancial altera
política autônoma e com isso cria um aparato institucional também o vínculo profissional, pois o Estado e o empresariado
assistencial que irá atender muito mais ao elevado nível econômico passam a ser os grandes empregadores de Assistentes Sociais,
do mercado do que às necessidades da população. A política dando um contorno diferenciado ao exercício profissional.
Vargas tem duas posturas contraditórias em relação aos operários, Sob a égide do pensamento da Igreja, a atuação profissional
a conciliação e a repressão, ou seja, o ditador buscava obter estava impregnada da ideia de “fazer o bem”, de legitimar a
“apoio” das classes trabalhadoras, inicialmente, pela legislação da doutrina social da Igreja. O Serviço Social no Brasil, assim como
Previdência Social, depois pelo controle das estruturas sindicais, na Europa, frente à fragilidade teórica, com uma formação mais
controle esse que assumiu diversas formas repressivas. moral e ética, e à complexidade da realidade social, fez uso dos
A implementação dessas ações governamentais ocorre no ensinamentos da Igreja para executar sua prática, e esta usava o
momento em que a proposta de institucionalização do Serviço Serviço Social para expandir sua doutrina, sua visão de homem e
Social começa a existir. Na América Latina, bem como no de mundo.
Brasil, a Igreja ainda desenvolvia quase que exclusivamente sua Com isso, o pensamento conservador e a influência da doutrina
intervenção no campo de ação social por meio das chamadas obras católica traçaram um perfil de ação para os profissionais de
de caridade e assistência, que envolviam em suas ações a burguesia Serviço Social atrelados ao pensamento burguês, atribuindo-lhes
e especialmente o segmento feminino. tarefas de amenizar conflitos, recuperar o equilíbrio e preservar
A formação profissional dos primeiros assistentes sociais a ordem vigente, com frágil consciência política, pois envolvida
brasileiros dá-se a partir da influência europeia, por meio do pelo “fetiche” da ajuda, não conseguia ter claro as contradições do
modelo franco-belga que, tendo como base princípios messiânicos exercício profissional.
Essas características do Serviço Social brasileiro, no período
(tomistas) de salvar o corpo e a alma, e fundamentava-se no
inicial de sua existência, são marcantes, e dizem respeito a uma
propósito de “servir ao outro”.
profissão aceita não só pela Igreja, mas principalmente pelo Estado
O modelo franco-belga, limitou-se, portanto, a uma
e pela burguesia. Seu componente técnico-operativo incorpora
formação essencialmente pessoal e moral sendo, nesse período, formas tradicionais de assistência social e da própria ação
o Serviço Social assumido como uma vocação, e a formação social, tais como: estudo das necessidades individuais, triagem
moral e doutrinária, enquanto cerne da formação profissional, dos problemas, concessão de ajuda material, aconselhamentos,
visou, sobretudo, formar o assistente social para enfrentar, com inserção no mercado de trabalho, triagem, visitas domiciliares,
subjetividade, a realidade social. encaminhamentos, aulas de tricô e outros trabalhos manuais,
A partir dos anos 40, abre-se um novo horizonte no campo da atividades voltadas à educação ou a orientações sobre moral,
profissionalização da assistência, que, mesmo ainda estreitamente higiene, orçamento, entre outros.
ligada a sua origem católica, com as ideias e princípios da Nos anos 40, surgem os métodos importados dos Estados
“caridade”, da “benevolência” e da “filantropia”, próprios do Unidos, Serviço Social de Caso e, ainda que este predomine,
universo neotomista, tem sua atividade legitimada pelo Estado também há espaço para a abordagem grupal, com o Serviço Social
e pelo conjunto da sociedade, por meio da implementação de de Grupo, cujo enfoque de ambos é a solução dos problemas
grandes instituições assistenciais. Nesse quadro, o Serviço Social pessoais, de relacionamento e de socialização. Só nos anos 60,
busca uma instrumentalização técnica, valorizando o método e o Serviço Social no Brasil amplia seu campo de atuação para o
desvinculando-se dos princípios neotomistas para se orientar pelos chamado Serviço Social de Comunidade, legitimando com esta
pressupostos funcionalistas da sociologia e assim poder responder forma de intervenção o atendimento do projeto de influência norte-
às novas exigências colocadas pelo mercado. americano.

Didatismo e Conhecimento 2
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
No período pós Segunda Guerra Mundial, a profissão que antes aparecimento, na América Latina, da proposta de transformação
era composta quase que exclusivamente por elementos da elite, da sociedade, em substituição à desenvolvimentista adotada
passa a receber agentes que procediam da pequena burguesia, não até o momento. Nessa década, o mundo passa por grandes
mais movidos apenas por motivações religiosas, mas incentivados transformações, especialmente na América Latina, com a
e interessados pela qualificação profissional que poderia garantir Revolução Cubana que, criticando as estruturas capitalistas,
acesso ao mercado de trabalho. mostra-se ao continente como alternativa de desenvolvimento,
Em 1942, a era Vargas possibilitou estreitar relações com os libertando-se dos Estados Unidos. É grande o inconformismo
Estados Unidos, em nome de interesses econômicos e políticos popular com o modelo de desenvolvimento urbano industrial
cujo principal objetivo era fortalecer o capitalismo na América dominante.
Latina e combater o comunismo. Esta relação estendeu-se para Toda essa agitação política é acompanhada pelas reflexões e
além das relações econômicas e envolveu um forte processo de pela inquietação das ciências sociais que, por meio da introdução
ideologização norte-americana no País. A América do Norte passa do marxismo, começam a questionar a dependência externa,
a ser o novo “protótipo” de ideias, a nova referência de ações, especialmente a norte-americana, por meio do enfoque dialético.
especialmente na esfera das políticas públicas. Essa crise não poderia deixar de atingir as Universidades
O Serviço Social, inserido neste contexto social, sofre forte e, especialmente, o Serviço Social que começa a questionar sua
rebatimento da ideologia da época e passa a buscar no modelo ação, conforme apresenta Netto (2001), trata-se de um cenário, em
de profissão norte-americano uma nova referência filosófica, o primeiro lugar, completamente distinto daquele em que se moveu
suporte teórico e científico necessário para responder às demandas a profissão até meados dos anos sessenta. Sem entrar na complexa
postas ao exercício profissional. O ideário dominante requeria uma causalidade que subjazia ao quadro anterior da profissão, é
crescente intervenção técnica (organizada e planejada) e fazia que inconteste que o Serviço social no Brasil, até a primeira metade da
o Serviço Social desencadeasse uma busca de recursos técnicos década de sessenta, não apresentava polêmicas de relevo, mostrava
para superar ações espontâneas e filantrópicas. As exigências uma relativa homogeneidade nas suas projeções interventivas,
de tecnificação do Serviço Social são atendidas, mantendo-se sugeria uma grande unidade nas suas propostas profissionais,
a mesma razão instrumental: busca-se uma maior qualificação sinalizava uma formal assepsia de participação político-partidária,
dos procedimentos interventivos, utilizando-se, inclusive, carecia de uma elaboração teórica significativa e plasmava-se
fundamentos advindos da Psicologia, na expectativa de que os numa categoria profissional onde parecia imperar, sem disputas de
profissionais, assistentes sociais fossem capazes de executar vulto, uma consensual direção interventiva e cívica:
programas sociais com soluções consideradas modernizantes para Assim o Serviço Social começa a perceber a dimensão política
o modelo desenvolvimentista adotado no Brasil. de sua prática, e o modelo vigente baseado na visão funcionalista
Esse é um período importante para consolidação da do indivíduo e com funções integradoras não é mais de interesse
profissão, pois ela se estabelece de forma significativa no âmago da realidade latino-americana que passava por transformações
das instituições públicas e privadas. As escolas de formação sociais, políticas e econômicas. O modelo importado de Serviço
profissional multiplicam-se, “ao final da II Guerra Mundial já Social torna-se inoperante e tem início um processo de ruptura
se encontravam em funcionamento cerca de duzentas escolas teórico-metodológico, prático e ideológico. “A ruptura com o
distribuídas pela Europa, pelos Estados Unidos e pela América Serviço Social tradicional se inscreve na dinâmica de rompimento
Latina, onde se instalaram a partir de 1925” (Martinelli, 2000). O das amarras imperialistas, de luta pela libertação nacional e de
Serviço Social com sua formação teórico-metodológica sustentava transformações da estrutura capitalista excludente, concentradora,
as ações “modernizadoras”, pois respondia de forma particular às exploradora” (Faleiros, 1987).
necessidades e exigências determinadas pelo capital. Os assistentes Nos anos posteriores, a profissão busca uma concepção
sociais começam a assumir, no mercado de trabalho, funções de crítica e um vínculo com a classe trabalhadora, embasado em
coordenação e de planejamento de programas sociais. uma percepção do exercício profissional para além da mera
A ação profissional tem por objetivo, orientada pela razão instrumental, ou seja, a busca de uma “transformação na
matriz positivista, eliminar os “desajustes sociais” por meio intencionalidade dos profissionais que se identificavam como
de uma intervenção moralizadora de caráter individualizado e agentes de mudanças”.
psicologizante, revelando uma ideia e imagem falsas de reforma Na década de 1960, o modelo de desenvolvimento entra em
social. O conservadorismo continua presente no universo crise, provocando uma agitação política e muitas mobilizações
ideológico da profissão e passa a conceber uma política técnico- populares, e, o Serviço Social é influenciado por este clima
burocrática a partir desse período. E como expressa Barroco político, quando dá início a um processo de discussão política no
(2003), o Serviço Social traduz sua ação profissional por meio, de interior da categoria.
uma ética vinculada à moral conservadora e dogmática segundo a É necessário, portanto, buscar caminhos e que aconteçam,
base ideológica neotomista. no interior da categoria, reflexões, indagando-se sobre o papel
A abordagem individualizada, com predominância de uma dos profissionais em face de manifestações da “questão social”,
ação psicologizada, ainda era a mais utilizada pelo Serviço Social, interrogando-se sobre a adequação dos procedimentos profissionais
caracterizada pela perspectiva de responsabilização do indivíduo consagrados às realidades regionais e nacionais, questionando-
com seu destino social, embora alguns segmentos profissionais se sobre a eficácia das ações profissionais e sobre a eficiência
estivessem atuando em planejamentos e ações de maior amplitude. e legitimidade das suas representações, inquietando-se com o
Em meados de 1960, surge um momento importante no relacionamento da profissão com os novos atores que emergiam na
desenvolvimento do Serviço Social como profissão. É a primeira cena política (fundamentalmente ligados às classes subalternas) e
crise ideológica em algumas escolas de Serviço Social, com o tudo isso sob o peso do colapso dos pactos políticos que vinham do

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
pós-guerra, do surgimento de novos protagonistas sociopolíticos, Netto apresenta três vertentes que se fizeram presentes no
da revolução cubana, do incipiente reformismo gênero Aliança processo de renovação do Serviço Social no Brasil e instauraram o
para o Progresso, ao mover-se assim, os assistentes sociais latino- ecletismo ou o pluralismo profissional: a tendência modernizadora,
americanos, através de seus segmentos de vanguarda, estavam a reatualização do conservadorismo e a intenção de ruptura.
minando as bases tradicionais da sua profissão. A vertente modernizadora teve hegemonia até os anos 70,
Assim, em plena vigência da Ditadura Militar, instaurada no iniciando-se no Seminário de Araxá em 1967 e se consolidando
País desde os anos de 1964, é que o Serviço Social vai passar por no Seminário de Teresópolis em 1970. Buscou modernizar o
processo de renovação amplo que mudará de forma significativa Serviço Social a partir da mesma razão instrumental vigente na
sua base teórico-conceitual. profissão (neopositivismo), com isso, faz a revisão de métodos e
Assim, a mobilização social e política da sociedade e a técnicas para adequar-se às novas exigências postas pelo contexto.
mobilização interna dos assistentes sociais põem em relevo a
O Serviço Social é tido como elemento dinamizador e integrador
crise da profissão em meados dos anos 60: sua desqualificação
no mundo científico acadêmico, sua inadequação “metodológica” do processo de desenvolvimento.
com a divisão em serviço social de caso, serviço social de grupo e A vertente da reatualização do conservadorismo (ou
desenvolvimento de comunidade e a ausência de uma teorização fenomenológica) buscou desenvolver procedimentos diferenciados
articulada. Suas práticas mais significativas faziam-se longe dos para a ação profissional, a partir do que seus teóricos conceberam
graves problemas sociais, sem consonância com as necessidades como referencial fenomenológico. Esta vertente recupera o que
concretas do povo. As ações de transformação ficavam “à margem”. há de mais conservador na herança profissional, com um enfoque
O Movimento de Reconceituação do Serviço Social, iniciado psicologizante das relações sociais e distante do verdadeiro legado
na década de 1960, representou uma tomada de consciência crítica fenomenológico de Husserl.
e política dos assistentes sociais em toda a América Latina, não Segundo Barroco (2003) a fenomenologia se apresenta como
obstante, no Brasil as condições políticas em que ele ocorreu um método de ajuda psicossocial fundado na valorização do
trouxe elementos muito diversos dos traçados em outros países. diálogo e do relacionamento; com isso, reatualiza a forma mais
As restrições da Ditadura Militar, principalmente depois do Ato tradicional de atuação profissional: a perspectiva psicologizante
Institucional nº 5, trouxeram elementos importantes nos rumos
da origem da profissão. [...] e o marco referencial teórico dessa
tomados pelo Serviço Social em seu processo de renovação.
metodologia é constituído por três grandes conceitos: diálogo,
Esses profissionais, mediante o reconhecimento de intensas
contradições ocorridas no exercício profissional, que se apoiava na pessoa e transformação social.
corrente filosófica positivista, de Augusto Comte, questionavam A terceira vertente do movimento de reconceituação nos anos
seu papel na sociedade, buscando levar a profissão a romper com 80 foi a marxista, denominada de intenção de ruptura com o Serviço
a alienação ideológica a que se submetera. Suas expectativas e Social tradicional (Netto, 2001). Por meio de um pequeno grupo
desejos voltavam-se para a busca da identidade profissional do de vanguarda, essa perspectiva remeteu a profissão à consciência
Serviço Social e sua legitimação no mundo capitalista. Para tanto, de sua inserção na sociedade de classes, gerou um inconformismo
uma nova proposta teórico-ideológica deveria alicerçar o ensino tanto em relação à fundamentação teórica quanto à prática, fazendo
da profissão, originando uma prática não assistencialista, mas emergir momentos de debates e questionamentos que se estendem
transformadora, comprometida com as classes populares. Quando não exclusivamente ao que ocorre dentro da profissão, mas
o modelo filosófico elaborado por Karl Marx, passou a embasar principalmente sobre as mudanças políticas, econômicas, culturais
o referencial teórico-metodológico do Serviço Social, o chamado e sociais que a sociedade da época enfrentava, consequência do
materialismo Histórico Dialético. É no marco desse movimento
desenvolvimento do capitalismo mundial que impôs à América
que o Serviço Social, abertamente, apropria-se da tradição
Latina seu modelo de dominação, da exploração e da exclusão.
marxista e o pensamento de raiz marxiana deixou de ser estranho
no universo profissional (Netto, 2001). Essa vertente de ruptura não ocorreu sem problemas, pois
Nesse modelo, o referencial teórico-científico é o Materialismo estes relacionam-se à visão reducionista e equivocada do marxismo
Histórico e o referencial filosófico e a Lógica Dialética (ou a presente no marxismo althusseriano (Louis Althusser), que recusou
dialética materialista), que tem por objetivo estudar as relações a via institucional e as determinações sócio históricas da profissão,
que envolvem homem e sociedade, ou seja, a prática concreta, (Yazbek, 2000), porém tais problemas não serão aqui detalhados.
afirmando que, nesta interação, há uma constante transformação, Tal vertente adquire maior consistência, quando surgem os estudos
com crescimento quantitativo e qualitativo. que procuram aprofundar as formulações teóricas da profissão.
O Materialismo Histórico Dialético situa a sociedade Fundamentadas nessa nova perspectiva, especialmente no que
determinada historicamente e em constante transformação, dividida se refere à dimensão político-ideológica, explicitam o caráter
em classes sociais distintas: a burguesia, como detentora do capital contraditório de sua prática e vinculam sua ação profissional à
e de todo o lucro, e a classe trabalhadora ou o proletariado que transformação social.
dispõe da força de trabalho vendida por um ínfimo salário, não Essas tendências, que expressam matrizes diferenciadas
garantindo condições dignas de sobrevivência.
de fundamentação teórico-metodológicas da profissão,
Assim, como afirma José Filho (2002), que o Serviço Social,
no decorrer das últimas décadas, evoluiu no processo de pensar-se acompanharam a trajetória do pensamento e da ação profissional
a si mesmo e à sociedade, produzindo novas concepções e auto nos anos seguintes. É nos anos 80 (séc. XX) que a teoria social
representações como “técnica social”, “ação social modernizante” de Marx inicia sua efetiva interlocução com a profissão. Outras
e posteriormente “processo político transformador. Atualmente estratégias passam a compor a prática profissional: educação
põe ênfase nas problematizações da cidadania, das políticas sociais popular, assessoria a setores populares, investigação e ação e
em geral e, particularmente, na assistência social. principalmente a redefinição da prática da Assistência Social.

Didatismo e Conhecimento 4
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
É no bojo deste debate que o Serviço Social consegue, ao longo Iamamoto (2000), ao profissional assistente social apresenta-se um
dos últimos 30 anos, ir definindo uma concepção mais crítica de dos maiores desafios nos dias atuais é desenvolver sua capacidade
sua própria inserção no mundo do trabalho, como especialização de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas
do trabalho coletivo. E será esse referencial marxista que, a partir e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas
dos anos 80 e avançando nos anos 90, irá imprimir direção ao emergentes no cotidiano. O perfil predominante do assistente
pensamento e à ação do Serviço Social no Brasil. Permeará as ações social historicamente é o de um profissional que implementa
voltadas à formação de assistentes sociais na sociedade brasileira políticas sociais e atua na relação direta com a população usuária.
(o currículo de 1982 e as atuais diretrizes curriculares); os eventos Hoje exige-se um trabalhador qualificado na esfera da execução,
acadêmicos e aqueles resultantes da experiência associativa dos mas também na formulação e gestão de políticas sociais, públicas e
profissionais, como suas convenções, congressos, encontros e empresariais: um profissional propositivo, com a sólida formação
seminários; estará presente na regulamentação legal do exercício ética, capaz de contribuir ao esclarecimento dos direitos sociais
profissional e em seu Código de Ética. e dos meios de exercê-los, dotado de uma ampla bagagem de
Essa realidade ganha visibilidade possibilitando um novo informação, permanentemente atualizada, para se situar em um
processo de recriação da profissão, “em busca de sua ruptura mundo globalizado.
com o histórico conservadorismo e do avanço da produção Mediante essa afirmação da autora, no desenho do perfil
de conhecimento, nos quais a tradição marxista aparece do profissional de Serviço Social, como coparticipante do
hegemonicamente como uma das referências básicas”. processo de transformação, deverá contribuir, por meio de uma
Obviamente que esse percurso da profissão não aconteceu sem práxis educativa e transformadora, para a construção de sujeitos
dificuldades, limites e desafios, pois inicialmente a apropriação históricos respeitados e valorizados como seres humanos livres
equivocada do referencial teórico fez que o Serviço Social negasse capazes de pensar, agir, decidir, optar e, nessa perspectiva dialética,
a dimensão instrumental da profissão e mesmo a atuação no âmbito transformar a realidade e por ela ser transformado.
do Estado. Mais tarde, com o retorno às fontes do pensamento de Dessa forma, o exercício da profissão envolve a ação de
Marx, a perspectiva dialética pôde ir subsidiando uma análise de um sujeito profissional que tem competência para propor, para
realidade mais coerente, possibilitando a apreensão das mediações negociar com a instituição seus projetos, defender seu campo de
necessárias para uma análise em uma perspectiva de totalidade. trabalho, suas qualificações e funções profissionais que extrapolem
Com isso, o Serviço Social foi construindo seu projeto ético- ações rotineiras e decifrem realidades subjacentes, revertendo-
político que possibilita uma nova perspectiva em sua dimensão as em ações concretas de benefícios à população excluída. Suas
interventiva. ações vão desde a relação direta com a população até o nível do
Na década de 1990, as consequências da lógica capitalista planejamento, tendo inclusive a árdua tarefa de priorizar os que têm
excludente e destrutiva, desenhadas no modelo de globalização e os que não têm direitos de acesso aos serviços e equipamentos
sociais.
neoliberal, contribuem para a precarização e a subalternização do
Diante do legado histórico da profissão, pode-se ressaltar
trabalho à ordem do mercado, para a desmontagem dos direitos
o protagonismo crescente dos assistentes sociais na prestação
sociais, civis e econômicos, para a eliminação da estrutura e
de serviços sociais, no campo do planejamento, da gestão e
responsabilidade do Estado em face da “questão social, para a
execução das políticas, dos programas, dos projetos e serviços
privatização dos serviços públicos e empresas estatais e atingem
socioassistenciais, no avanço da área acadêmica, na avaliação
diretamente a população trabalhadora, rebatendo nos profissionais
do processo de formação profissional, na área da pesquisa, na
de Serviço Social enquanto cidadãos trabalhadores assalariados e
área de produção de conhecimento e na própria organização
viabilizadores de direitos sociais.
política da categoria. O Serviço Social aparece atualmente como
A profissão, como especialização do trabalho coletivo, traz
uma profissão consolidada na sociedade brasileira, ganhando
em si as contradições e as determinações do contexto social mais visibilidade no cenário atual e sustentado por um projeto
amplo possibilitando a superação do caráter conservador do ético-político que o habilita a formular respostas profissionais
Serviço Social, que expressa uma visão mecanicista da profissão qualificadas face à questão social. Esse projeto comprometido com
e da perspectiva que lhe atribuía um caráter revolucionário, fruto valores e princípios que apontam para a autonomia, a emancipação,
de um militantismo que superestimava a capacidade profissional a defesa da liberdade e da equidade, a socialização da política e
(Barroco, 2003). É o grande debate entre a postura fatalista e a da riqueza socialmente produzida e o pleno desenvolvimento
messiânica, que tanto incomodou os profissionais de Serviço de seus usuários, vem se concretizando nas ações cotidianas de
Social. A primeira desconsiderava as contradições do sistema, das trabalho dos Assistentes Sociais, seja qual for o espaço de atuação,
instituições e das próprias relações sociais, não sendo possível permitindo-lhes compreender o Serviço Social na divisão sócio
fazer nada para ser modificado, e a segunda subestimava o contexto técnica do trabalho e no encaminhamento de ações que contribuam
social, as classes sociais, as organizações políticas, os movimentos para a ultrapassagem do discurso da “denúncia” para o âmbito das
sociais, os homens como sujeitos históricos, enfim, os limites da práticas institucionais e da contribuição à formulação de novas
realidade social e do profissional. políticas sociais.
No exercício profissional cotidiano, o Serviço Social mantém A efetivação do projeto ético-político do Serviço Social exige
o desafio de conhecer e interpretar algumas lógicas do capitalismo que os profissionais, cada vez mais, recriem seu perfil profissional
contemporâneo, especialmente em relação às mudanças no mundo e sua identidade, ultrapassem limites institucionais e superem a
do trabalho e sobre as questões de desestruturação dos sistemas ideologia do assistencialismo e avancem nas lutas pelos direitos e
de proteção social e das políticas sociais em geral. E como afirma pela cidadania. É o que será discutido no próximo item.

Didatismo e Conhecimento 5
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O Serviço Social e a consolidação do projeto ético-político impulsionaram a crise da ditadura, “coroando esforços coletivos
frente às desigualdades sociais do século XXI e a politização progressista da vanguarda da categoria” (Netto,
1996). A categoria dos assistentes sociais foi sendo questionada
A partir dos anos 80, as mudanças ocorridas na profissão pela prática política de diferentes segmentos da sociedade civil,
foram pautadas na necessidade de conhecer e acompanhar no contexto do crescimento dos movimentos sociais e das lutas
as transformações econômicas, políticas e sociais do mundo em torno da elaboração e aprovação da Carta Constitucional de
contemporâneo e da própria conjuntura do Estado e do Brasil. 1988 e pela defesa do Estado de Direito, não ficando como mera
As duas últimas décadas do século XX foram determinantes expectadora dos acontecimentos. Mas avançou com maturidade
nos novos rumos acadêmicos, políticos e profissionais para o sendo protagonista na construção desses momentos históricos e
Serviço Social. No País, as intensas e crescentes manifestações em sua participação efetiva em gerir políticas sociais e viabilizar
de expressões da questão social, decorrentes das inúmeras crises a construção dos direitos sociais das classes subalternizadas da
econômicas e políticas, exigiram da profissão sua adequação a sociedade, conquistando o que Netto (idem, ibidem) denominou,
essas demandas sociais. Esse período marca profundamente no “maturação profissional”.
País o desenvolvimento da profissão por meio de um dos seus É possível atestar que a profissão nas últimas décadas deu um
momentos importantes que é a recusa e a crítica do conservadorismo salto qualitativo em sua formação acadêmica e em sua presença
profissional. política na sociedade. Intensificou-se a produção científica e o
Foi implantado, na década de 1990, o Projeto Ético-Político do mercado editorial; os assistentes sociais constituíram-se uma
Serviço Social, fruto de uma organização coletiva e de uma busca categoria pesquisadora, reconhecida nacional e internacionalmente
de maturidade que possibilita à profissão a formular respostas (tema do próximo item). E ainda amadureceram em suas
qualificadas frente à questão social. Trata-se de um projeto que, representações políticas e corporativas, por meio de órgãos
para Neto (2000), é um processo em contínuos desdobramentos, acadêmicos e profissionais reconhecidos e legitimados. Travou-
flexível, contudo sem descaracterizar seus eixos fundamentais”. Ele se um amplo debate em torno das políticas sociais públicas,
é comprometido com valores e princípios que têm em seu núcleo especialmente da seguridade social, contribuindo para a
o reconhecimento da liberdade como possibilidade de escolher
reafirmação da identidade profissional.
concretamente alternativas de vida, buscando o compromisso
A profissão, como afirma Yazbek (2000, p.29), enfrenta o
com a autonomia, a emancipação, a defesa da equidade, a
desafio de decifrar algumas lógicas do capitalismo contemporâneo,
socialização da política e da riqueza socialmente produzida e o
especialmente em relação às mudanças no mundo do trabalho, os
pleno desenvolvimento de seus usuários.
processos desestruturadores dos sistemas de proteção social e da
Para Santana (2000), as assistentes sociais, preocupados
política social em geral e o aumento da pobreza e a exclusão social.
com a modernização do País e da profissão, assumem posições
O Serviço Social vê-se confrontado e desafiado a compreender
predominantemente favoráveis à reprodução das relações sociais.
e intervir nessa sociedade de transformações configuradas nas
Porém, a partir da década de 1980, os setores críticos (em geral,
respaldados na teoria marxista) assumem a vanguarda da profissão. novas expressões da questão social: a precarização do trabalho,
É no bojo desse processo de renovação do Serviço Social que o a penalização dos trabalhadores, o desemprego, a violência em
pluralismo se institui e inicia a construção do que hoje chamamos suas várias faces, a discriminação de gênero e etnia e tantas outras
de projeto ético-político da profissão. questões relativas à exclusão. Como observa Barroco (2003), se
A construção coletiva desse projeto profissional aglutinou na entrada dos anos 90 é evidente o amadurecimento de um “vetor
assistentes sociais de todos os segmentos e materializou-se no de ruptura”, isso não significa que essa vertente tenha alcançado
Código de Ética Profissional do Assistente Social, aprovado em uma “nova legitimidade” junto às classes subalternas. Além disso,
13/3/1993, na Lei de Regulamentação da Profissão de Serviço a ruptura com o conservadorismo profissional, consolidada em 80,
Social (Lei 8.662 de 7/6/1993) e na proposta das Diretrizes não significa que o conservadorismo (e com ele o reacionarismo)
Curriculares para a Formação Profissional em Serviço Social foi superado no interior da categoria.
(8/11/1996). Confirma Guerra (2007) que a década de 1990 Nesse cenário, no início da década de 1990, é que a questão
confere maturidade teórica ao Projeto Ético Político Profissional ética apresentava-se como tema relevante para a profissão. Surgiram
do Serviço Social brasileiro que, no legado marxiano e na tradição as mobilizações reivindicatórias da ética na política e como tema
marxista, apresenta sua referência teórica hegemônica. Enfeixa um privilegiado de cursos, encontros, publicações, invadem os meios
conjunto de leis e de regulamentações que dão sustentabilidade de comunicação de massa atingindo a vida cotidiana da população.
institucional, legal, ao projeto de profissão nos marcos do E para a profissão, apareceram desafios e questionamentos teórico
processo de ruptura com o conservadorismo: a) o Novo Código práticos e ético-políticos para o enfrentamento das consequências
de Ética Profissional de 1993; b) a nova Lei de Regulamentação do ideário neoliberal que acirravam as desigualdades sociais.
da Profissão em 1993; c) as Diretrizes Curriculares dos cursos de A profissão passou a explicitar com maior clareza seu projeto
Serviço Social em 1996; d) as legislações sociais que referenciam ético-político que foi gestado em duas décadas anteriores. Essa
o exercício profissional e vinculam-se à garantia de direitos como: construção caracterizou-se pela busca do rompimento com a
o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA de 1990, a Lei vertente conservadora do Serviço Social e pela proposição de um
Orgânica da Assistência Social – Loas de 1993, a Lei Orgânica da novo projeto profissional que se aproxima dos projetos societários.
Saúde em 1990. Segundo Netto (2000), “os projetos societários são projetos
Esse projeto de profissão é expressão de um momento histórico coletivos; mas seu traço peculiar reside no fato de se constituírem
e fruto de um amplo movimento de lutas pela democratização da projetos macroscópicos, em propostas para o conjunto da
sociedade brasileira, com forte presença das lutas operárias que sociedade”.

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Com isso, o projeto ético-político do Serviço Social diferenciadas de organização e luta para fazer frente à pobreza
caracteriza-se pelos determinantes sócio históricos, pela dimensão e à exclusão econômica, social e cultural. Formas de lutas que
política pautada no compromisso com a classe trabalhadora e passam por partidos políticos, sindicatos e movimentos sociais
pelos interesses, aspirações e demandas do projeto coletivo dos organizados; mas que passam, também, por reivindicações em
assistentes sociais. torno de melhorias parciais de vida, além do conjunto de expressões
Então, a categoria com a aprovação do Código de Ética em associativas e culturais que conformam o modo de viver e de
1993, conseguiu articular compromissos éticos, políticos e o pensar das classes e seus segmentos sociais. O desafio é captar
exercício da prática profissional, reconhecendo as mediações os núcleos de contestação e resistência, as formas de imaginação
necessárias entre projeto societário e projeto profissional. e intervenção do cotidiano, de defesa da vida e da dignidade do
Para os projetos profissionais, Netto (2000) apresenta como trabalhador.
construção coletiva de uma categoria, (ou sujeito coletivo) que Esse compromisso ético-político assumido pela categoria
retrata sua imagem profissional. nas últimas décadas, tem revelado o desafio da competência
Os projetos profissionais apresentam a autoimagem de profissional, que deve embasar-se no aprimoramento intelectual
uma profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente, do assistente social, com ênfase em uma “formação acadêmica
delimitam e priorizam os seus objetivos e funções, formulam os qualificada, alicerçada em concepções teórico-metodológicas
requisitos (teóricos, institucionais e práticos) para seu exercício, críticas e sólidas, capazes de viabilizar uma análise concreta
prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e da realidade social” e possibilitar um processo de formação
estabelecem as balizas da sua relação com os usuários de seus permanente e “estimular uma constante postura investigativa”
serviços, com as outras profissões e com as organizações e (Netto, 2000).
instituições sociais, privadas e públicas (entre estas, também e No que diz respeito aos usuários dos serviços, faz-se necessário
destacadamente com o Estado, ao qual coube, historicamente, o que este projeto profissional priorize uma nova relação de
reconhecimento jurídico dos estatutos profissionais). compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população,
Nesse sentido, a formulação de um projeto profissional bem como a publicização, democratização e universalização dos
crítico à sociedade capitalista é “uma demanda dos segmentos da recursos institucionais a ela direcionados.
sociedade que recebem os serviços prestados pelo assistente social, Contudo, a consolidação desse projeto depende da organização
e não apenas uma condição de grupos ou do coletivo profissional” da categoria dos assistentes sociais e de sua articulação com outras
(Guerra, 2007). categorias que partilhe dos mesmos compromissos e princípios
Este projeto profissional reafirma o compromisso da categoria fundamentais. Depende ainda da mobilização que se trave com a
com um projeto societário que propõe a construção de uma nova sociedade civil na luta pela garantia dos direitos civis, sociais e
ordem societária, sem dominação, exploração de classe, etnia políticos de todos os cidadãos. Requer, segundo Iamamoto (2001)
e gênero. Ele tem como aspecto central a liberdade, ou seja, a “remar na contracorrente, andar no contravento, alinhando forças
possibilidade de o ser humano fazer concretamente suas escolhas, que impulsionem mudanças na rota dos ventos e das marés na vida
e com isso comprometer-se com a autonomia, a emancipação e em sociedade”. Trata-se de um projeto que está se consolidando
a plena expansão dos indivíduos. A partir desses princípios, o hegemônico no interior da categoria, isto porque, ele tem raízes
projeto ratifica a intransigente defesa dos direitos humanos e efetivas na vida social brasileira, vinculando-se a um projeto
contra qualquer forma de preconceito, o arbítrio, o autoritarismo, societário antagônico ao das classes possuidoras e exploradoras.
culminando no exercício do pluralismo na sociedade em geral e no Neste sentido, a construção deste projeto profissional
exercício profissional (Netto, 2000). acompanha a curva ascendente do movimento democrático e
Como analisa o autor acima, a dimensão política do projeto é popular que, progressista e positivamente, tensionou a sociedade
evidenciada pela equidade e pela justiça social, por meio da busca brasileira entre a derrota da ditadura e a promulgação da
universal do acesso aos bens e aos serviços nos programas e nas Constituição de 1988 (referida como Constituição Cidadã), um
políticas sociais. Com isso, tem-se a consolidação da cidadania por movimento democrático e popular que, colocando-se inclusive
meio da viabilização de todo esse processo democrático, garantido como alternativa nacional de governo nas eleições presidenciais
a todas as classes trabalhadoras. de 1989, forçou uma rápida redefinição do projeto societário das
A efetivação desses valores preconizados pelo projeto-ético- classes possuidoras.
político do Serviço Social ocorrerá por meio do protagonismo Na contramão da busca pela efetivação do projeto ético-
da classe trabalhadora na inserção e na participação nos espaços político do Serviço Social, existem duras ameaças de mudanças
públicos, com poderes de decisão no que lhe diz respeito, na estruturais propostas pelo capital e obviamente opostas aos
ampliação do conhecimento de direitos e interesses em jogo, da princípios do projeto profissional. O neoliberalismo instituiu
viabilização de meios para a implementação de decisões coletivas, uma política de desmantelamento do Estado, privatização das
do acesso às regras de negociação com transparência, e com isso o instituições públicas, precarização de direitos e garantias sociais e
trabalhador social, possa contribuir para a inclusão social da classe a sobreposição do econômico em relação ao social ou às expressões
trabalhadora na real construção da cidadania e no fortalecimento da questão social e consequente aviltamento da pessoa humana.
da democracia. Assim, Iamamoto (2000) explica que uma É importante considerar que o aprofundamento e a manutenção
aproximação, por meio da pesquisa criteriosa, às condições de vida do projeto ético-político do Serviço Social na contemporaneidade,
e de trabalho das classes subalternas é um requisito indispensável em tempos de tantas adversidades, depende da vontade majoritária
para a efetivação daqueles valores e princípios mencionados. da categoria profissional e junto a ela, o revigoramento das lutas
Esta aproximação deve permitir captar interesses e necessidades e movimentos democráticos e populares, garantindo os direitos a
em suas diversas maneiras de explicitação, englobando formas programas e a políticas sociais estabelecidas pelas conquistas das

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classes trabalhadoras. Junto a isso, afirma Santana (2000) que a contra a moral burguesa, não basta o senso moral. É necessário que
relevância do processo formativo, torna-se um determinante para se desenvolva a consciência moral, que se aproprie da ética como
a consecução do projeto ético-político da profissão. Explica que: reflexão crítica sobre a moral para se estabelecer quais as escolhas
À medida que o profissional assume o compromisso com a e ações tácitas e estratégicas que nos permitam organizar ações e
transformação dessa ordem societária e institui como estratégia sujeitos históricos para intervir no processo de democratização da
de ação, no atual momento histórico, a luta por direitos sociais, sociedade, visando a uma sociedade justa e equitativa, o que passa
comprometendo-se com a qualidade dos serviços prestados e com pela defesa da vida humana.
o fortalecimento do usuário, seu perfil tem que ser necessariamente Neste sentido, é possível entender que o profissional social,
crítico e questionador. É preciso, também, que este esteja munido de posse desse projeto crítico, percebe que as possibilidades de
de um referencial teórico-metodológico que lhe permita apreender transformação não estão na profissão, mas na própria realidade,
a realidade numa perspectiva de totalidade, e construir mediações
na qual, certamente, por meio de uma intervenção profissional
entre o exercício profissional comprometido e os limites dados
competente, poderão se estabelecer devidas mediações entre
pela realidade de atuação.
O Serviço Social ao longo de sua história, conforme interesses da classe trabalhadora e da classe dominante.
abordado anteriormente, convive com o sistema capitalista, Competência essa que é dinâmica, não estática e adquirida
no qual nasceu enquanto profissão, buscou criar estratégias de de uma vez por todas, construída social e historicamente e que
minimização das manifestações da miséria e empobrecimento da ultrapasse saberes e conhecimentos, mesmo se constituindo por
classe trabalhadora, por meio de ações distributivas de serviços eles. É fundamental que haja uma intervenção reflexiva e eficaz
assistencialistas e clientelistas, sem questionar as estruturas que no sentido de articular dinâmicas de conhecimentos, saberes,
geram as desigualdades sociais. habilidades, valores e posturas.
Para a categoria profissional a releitura do trabalho do assistente O projeto profissional hegemônico, por sua perspectiva crítica,
social exigiu a ruptura com posicionamentos ideológicos e ações torna-se um instrumento capaz de permitir aos assistentes sociais
restritas, endógenas e focalistas do Serviço Social, transpondo as uma antevisão da demanda, a captação de processos emergentes
determinações da classe dominante. Com isso, faz-se necessário e históricos que se configuram e requisitam uma intervenção
um profissional propositivo, reflexivo, crítico, “que aposte no profissional a curto, médio e longo prazos, o significado social e
protagonismo dos sujeitos sociais, versado no instrumental técnico- político da profissão e da intervenção que desenvolve. Tais projetos
operativo”, com competência para ações profissionais em nível de têm raízes na vida social e respondem aos anseios de setores e
assessorias, de negociações, de planejamentos, de pesquisa e de forças da sociedade por meio de valores, princípios, estratégias
incentivo à participação dos usuários em gestão e da avaliação de
que se reportam a uma sociedade justa, democrática, equânime.
programas sociais de qualidade.
Assim, o projeto profissional tem de oferecer respostas
Continua a mesma autora que, para responder a esse perfil
profissional traçado exige-se uma competência crítica que concretas para uma democracia social, política e econômica,
supere tanto o teoricismo estéril, o pragmatismo, quanto o mero indicando os meios de concretizá-las.
militantismo. Competência que não se confunde com aquela Enfim, é possível admitir que o projeto ético-político do
estabelecida pela burocracia da organização, conforme a linguagem Serviço Social se consolidará a partir do momento em que este
institucionalmente permitida e autorizada; que não reifica o saber clarifique os objetivos da profissão, que com seu referencial
fazer, subordinando-o, antes, à direção social desse mesmo fazer. teórico-metodológico permita que o profissional faça a crítica
Competência que contribui para desvelar os traços conservantistas ontológica do cotidiano, da ordem burguesa e dos fundamentos
ou tecnocráticos do discurso oficial, recusa o papel de tutela e conservadores que persistem na profissão, que lance luzes sobre
controle das classes subalternas em seus diferentes segmentos e as novas escolhas e orientações para direcionamentos sociais e,
grupos, para envolvê-las nas teias e amarras do poder econômico, assim, o assistente social estará apto a ocupar os diversos espaços
político e cultural. institucionais, privados, públicos e profissionais; a questionar
Nesse sentido, surge um desafio histórico aos assistentes critérios de escolha e elegibilidade para o direcionamento de
sociais, frente ao sistema vigente, em atingir a “consciência serviços sociais, a democratizar o acesso à informação; a pesquisar
humano-genérica” importante ao exercício crítico da profissão, e conhecer os sujeitos que demandam as ações profissionais e
pois implica em “criar condições para vencer a alienação em um realizam alianças com eles; a estabelecer compromisso com as
mundo marcado pela reificação social. denúncias e efetivar o trabalho de organização popular.
O cenário atual com a idolatria da moeda, o fetiche do mercado
e do consumo, o “culto” ao individualismo, a lógica do mercado
A formação profissional: do ensino à pesquisa
financeiro, reforça o desafio dos assistentes sociais em manter seu
caminho pautado pelos valores e princípios éticos e políticos que
iluminaram suas ações durante as últimas décadas. Percebe-se que A década de 1980 foi extremamente importante nas definições
o profissional de hoje precisa se requalificar, ter visão crítica da de rumos teórico-metodológicos, técnico-acadêmicos e políticos
realidade, por meio de uma atitude reflexiva, analítica, investigativa para o Serviço Social. Tem-se hoje um projeto profissional ético-
e propositiva frente à realidade. Exige-se um profissional ousado, político, construído coletivamente em décadas anteriores, que
atento e disposto a apropriar-se e a decifrar novas propostas de selou o compromisso da categoria com a universalização dos
trabalho apresentadas ao Serviço Social. valores igualitários e democráticos, conforme já apresentado. Os
Nesse contexto os valores e princípios do atual projeto princípios norteadores desse projeto desdobraram-se no Código de
profissional remetem a um novo modo de operar a profissão o que Ética do Assistente Social, de 1993, na Lei de Regulamentação da
pressupõe a crítica sobre as condições e relações do seu exercício Profissão de Serviço Social – Lei 8662/93 e na nova Proposta de
profissional [...] é claro ao profissional que não basta se indignar Diretrizes Gerais para o curso de Serviço Social.

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O novo Código de Ética Profissional de 1993 é um marco Este currículo traduz, em uma perspectiva histórico-crítica, os
histórico na trajetória do Serviço Social por sua legitimidade seguintes núcleos de fundamentação na constituição da formação
teórico-prática alcançada pela categoria profissional. profissional: 1. Núcleo de fundamentos teórico-metodológicos da
A partir desse momento de discussão e de construção coletiva, vida social; 2. Núcleo de fundamentos da formação sócio histórica
destacam-se na profissão a relevância e o reconhecimento da ética da sociedade brasileira; 3. Núcleo de fundamentos do trabalho
como componente fundamental do projeto profissional que, nos profissional.
últimos vinte anos, tem construído uma hegemonia na profissão. Diante dessas mudanças ocorridas no campo da formação
Um olhar retrospectivo para as décadas anteriores não deixa profissional, duas características decorrentes desse processo
dúvidas de que o Serviço Social foi sendo questionado pela prática tornaram-se pontos de reflexão e do desenvolvimento da profissão:
política de vários movimentos sociais e segmentos da sociedade a preocupação com a investigação como dimensão constitutiva da
civil, encontrando aí sua base social de reorientação da profissão formação e do exercício profissional e a afirmação das políticas
nos anos 80. Com isso, a profissão deu um salto de qualidade, sociais como campo de interesse teórico-prático para os assistentes
de atuação e de formação profissional. Com o novo Código de sociais. Contudo, o processo de implementação do currículo
Ética, ganhou visibilidade pública e maior credibilidade junto à mínimo do Serviço Social, ao longo dos anos, não ocorreu de
população usuária. Houve também um avanço no mercado editorial forma tranquila, mas foi objeto de críticas, de dúvidas e de debates
e de produção acadêmica impulsionada pela pós-graduação e por parte de diferentes segmentos intelectuais e profissionais
pela interlocução teórica com áreas conexas de maior tradição na ligados ao Serviço Social e pelos próprios assistentes sociais, pois
pesquisa social. muitos deles sentiam-se despreparados e distantes de uma proposta
Os assistentes sociais ingressaram, na década de 1990, como inovadora. Entretanto, não será discutida aqui essa questão, mas o
uma categoria pesquisadora e reconhecida pelos órgãos de fomento registro dessas informações evidencia os limites da profissão e os
à pesquisa. permanentes questionamentos da identidade profissional.
Tiveram ainda um amadurecimento em suas formas de Assim afirma Koike (2000):
representatividade político-corporativas, por meio de órgãos As alterações na configuração sócio técnica da profissão
de representação acadêmica e profissional reconhecidos e evidenciam ser a formação profissional um processo dinâmico,
legitimados. E amplas discussões e debates em torno das políticas continuado, inconcluso, em permanente exigência de apropriação
sociais públicas, especialmente a assistência social, como direito e desenvolvimento dos referenciais críticos de análise e dos modos
social, na teia das relações entre o Estado e a sociedade civil, de atuação na realidade social. E o ato de avaliar a profissão
contribuíram para intensificar e propagar a reflexão e o debate (formação e trabalho profissionais) em suas conexões com as
sobre a identidade profissional, na busca do fortalecimento de necessidades sociais de onde derivam as demandas ao Serviço
seu auto reconhecimento e para traçar criticamente os rumos da Social, expõe com radicalidade as exigências de uma profunda,
profissão. cuidadosa e continuada capacitação profissional. Essa radicalidade
A reforma curricular aprovada em 1979 pela assembleia da
marcou o processo de construção das novas diretrizes curriculares
Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social, implementada
que se inicia com a definição dos critérios norteadores do trabalho
a partir de 1982, desmontou a estrutura tradicional dos chamados
coletivo.
processos de intervenção em caso, em grupo e em comunidade
Para Iamamoto (2001), diante dos avanços qualitativos que
pela orientação teórico-metodológica da prática profissional
o Serviço Social viveu nas últimas décadas, no que diz respeito à
pautada nas principais tendências que, até então, embasavam
formação profissional e ao trabalho de Serviço Social, travaram-
teoricamente o Serviço Social: o funcionalismo, a fenomenologia
se fortes embates e discussões no que diz respeito à relação
e o marxismo. Defendeu a profissão na busca de uma visão crítica
dialética entre teoria e exercício profissional (prática) ou seja,
e comprometida com a transformação social e a formação dos
futuros assistentes sociais a partir de análises críticas da realidade a busca de estratégias do profissional que vão mediar as bases
capitalista. teóricas acumuladas com a operatividade do trabalho profissional.
A nova reforma do projeto de formação profissional, ocorrida O caminho é longo, mas foi dado um longo “voo teórico”,
em 1998, foi motivada pela participação e pela mobilização aproximando o Serviço Social ao movimento da realidade concreta,
vivenciada na revisão curricular de 1982, fruto do debate coletivo. às várias expressões da questão social. O desafio na atualidade,
Sobretudo no meio universitário, buscou a formação de um segundo a autora, “é transitar da bagagem teórica acumulada ao
profissional generalista, em ruptura com as especializações e enraizamento da profissão na realidade, atribuindo, ao mesmo
contribuiu para o avanço do entendimento das debilidades e de tempo, uma maior atenção às estratégias, táticas e técnicas do
suas consequentes inadequações metodológicas do pensar e do trabalho profissional”, em decorrência das particularidades dos
fazer profissional, “a prática é formulada como um processo de temas que são objetos de estudo e de ação do profissional.
trabalho, como uma atividade com fins, meios e resultados em Nesse contexto, situa-se o mundo da pesquisa científica que a
torno da questão social, definida formalmente como objeto do categoria profissional enveredou nas décadas passadas, e fortalece-
Serviço Social” (Faleiros, 2005). se, nos dias atuais, a aproximação do profissional e o científico,
A partir de então, na década de 1990, a formação profissional do profissional e do político e do profissional com as condições e
passa a ser primordial, e o projeto curricular foi elaborado e relações de trabalho. Herdeira da ditadura militar e de seu projeto
aprovado pelos órgãos competentes da categoria, especialmente de modernização conservadora, a categoria dos assistentes sociais
pela Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS), emerge na cena social no processo de “transição democrática” com
com um novo currículo, hoje em vigor. Segundo a ABESS 7 (1997, um novo perfil acadêmico profissional, que representa um salto de
p.63): qualidade na trajetória do desenvolvimento profissional.

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O Serviço Social insere-se, nos anos da ditadura, nos qualidade na formação que, consequentemente, perpassa todo
quadros universitários, passando a formação profissional a ser o trabalho profissional evitando que o Serviço Social fique
paulatinamente articulada à pesquisa e à extensão. burocrático, tecnicista, mercantil e “sem vida”.
A profissão implementa nos anos 70 e 80 (século XX) a pós- Tal desafio para os assistentes sociais é, portanto, a busca de um
graduação em Serviço Social com os cursos lato sensu e strictu posicionamento ético e político que se insurja contra os processos
sensu, rapidamente ampliados, tendo nesse período a consolidação de alienação vinculados à lógica capitalista, impulsionando-os a
acadêmica do ensino pós-graduado nos cursos de especialização, trabalhar na busca de romper com a dependência, a subordinação,
no nível de mestrado (nos anos de 1970, a existência de seis cursos a despolitização, e assim poder manter vivas as forças sociais
de mestrado) e com desdobramentos no nível de doutoramento, motivadoras da esperança de uma nova sociedade e da capacidade
atualmente todos ampliados e com intercâmbio nacional e de luta no cenário social e profissional.
internacional. Efetivamente, o Serviço Social pode interferir na construção de
Hoje, no Brasil, é possível reconhecer a credibilidade científica direitos sociais e sujeitos políticos contribuindo com movimentos
que o Serviço Social veio conquistando junto aos órgãos oficiais sociais e lutas da categoria como garantia legal da profissão na
de fomento à pesquisa e o apoio, o incentivo e o trabalho de seus Política Educacional das três esferas nacionais: União, Estados e
órgãos competentes, especialmente a ABEPSS que reafirma seu Municípios. É o que será trabalhado nos próximos capítulos por
empenho em contribuir no sentido de que a formação da graduação meio dos dados documentais (pesquisa documental) e empíricos
e pós-graduação em Serviço Social substancie e respalde cada vez da pesquisa de campo. (Texto adaptado de PIANA, M. C. doutora
mais a plataforma emancipatória da profissão, na resistência às mais em Serviço Social).
diversas formas de exclusão, opressão e violências que no tempo
presente se adensam e atualizam como demanda privilegiada ao
ensino de qualidade e à pesquisa no Serviço Social. 1.2 CONDICIONANTES,
Diante dessa realidade apresentada, surge como desafio CONHECIMENTOS, DEMANDAS E
à formação profissional o ideário neoliberal, que busca como EXIGÊNCIAS PARA O TRABALHO DO
ação predominante o enfraquecimento das lutas das classes SERVIÇO SOCIAL EM EMPRESAS.
sociais e sua subordinação ao capital. Tal ideologia é fortalecida
especialmente pela queda do socialismo real e com o florescimento
da pós-modernidade, sobretudo em sua versão neoconservadora,
influenciando muitos docentes, pesquisadores e pensadores do
meio acadêmico levando muitos a desistirem e reverem seus O pressuposto do mundo do trabalho têm sido uma temática
trabalhos. importante no debate contemporâneo, principalmente pelas
Outro aspecto a ser considerado é a concepção de educação mudanças ocorridas nos últimos anos que de certa forma rebatem no
para o século XXI, por organismos internacionais como o Serviço Social, por isso abordaremos alguns aspectos importantes
Fundo Monetário Internacional – FMI e o Banco Mundial, para deste processo de trabalho no Brasil a partir da década de 70.
responderem aos interesses econômicos da globalização; é A partir da década de 70 o capitalismo intensificou as
ainda depositada a tarefa de oferecer soluções aos problemas do suas transformações no processo produtivo através do avanço
desemprego, das lutas étnicas, da violência, do meio ambiente e da tecnológico sob novas formas de acumulação flexível e dos modelos
própria exclusão, que se apresentam na atualidade. alternativos ao modo de produção do Taylorismo/Fordismo
Enfim, para a educação, fica a tarefa conciliadora e pacificadora destacando-se principalmente o toyotismo. Segundo Antunes,
de conflitos, ou seja, a existência de uma política educacional toyotismo apresenta a seguinte característica em contraposição
mundial que não questione a distribuição de riquezas e do poder, ao taylorismo/ fordismo, a sua produção muito vinculada à
mas ofereça reformas e soluções a partir da própria ordem interna demanda, ela é variada e bastante heterogênea, fundamenta-se no
do capital. O que para Koike, não existe outro enfrentamento, trabalho operário em equipe com multivariedade de funções, tem
a não ser desvendar a concepção ilusória de que poderia como princípio o just in time, o melhor aproveitamento possível
“humanizar” o capital em sua própria ordem e fazê-lo por meio de do tempo de produção e funciona segundo o sistema de kanban,
uma educação danificada funcional, pragmática e despolitizada e controle de qualidade e forma de flexibilizada de acumulação do
compreender o caráter e o significado das transformações sociais capital –baseada na reengenharia e na empresa enxuta.
em curso, colocando as classes sociais no centro dessa apreensão Estes processos fizeram com que ocorressem profundas
como condição de atribuir inteligibilidade ao processo social mutações econômicas, sociais, políticas e ideológicas com fortes
contemporâneo. repercussões no ideário da subjetividade e nos valores constitutivo
Por fim, tem-se uma reforma da educação superior direcionada principalmente da classe que vive do trabalho. Esta crise estrutural
para a lógica mercantil, na busca dos negócios lucrativos, calcada desencadeou o processo de liberalização e desregulamentação
na adaptação dos perfis profissionais ao novo paradigma da como; privatização; liberdade para o capital industrial e financeiro
sociedade moderna, no conhecimento tecnológico, por meio da expandir mundialmente; os grandes Estados Capitalistas colocam
expansão da educação a distância e consequente precarização, “mercados” no comando em forma desigual e desproporcional.
especialmente, do ensino público superior público. Toda emblemática desta transformação do mundo do trabalho
À categoria profissional do Serviço Social, fica o desafio caracteriza-se no Brasil principalmente a partir dos anos 90,
de preparar profissionais aptos para lidar com as contradições as políticas de cunho econômico começa a se desregulamentar
do presente apresentadas pela ordem neoliberal e pelo financeiramente, e as privatizações repercutem nas indústrias
neoconservadorismo no conhecimento, e o compromisso com a nacionais. No governo de Fernando Collor (1990-1992), são

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implementadas medidas de liberação comercial e financeira que Criou-se, de um lado em escala minoritária, o trabalhador
desestruturaram diversos seguimentos produtivos no país, havendo polivalente e multifuncional da era informacional, capaz de operar
substituição de produtos nacionais por produtos importados maquinas com controle numérico e de, por vezes exercitar com
fortalecendo a abertura do comércio para a exportação. mais intensidade sua dimensão mais intelectual. E, de outro lado.
Este processo ocasionou no fechamento das linhas internas Há uma massa de trabalhadores precarizados sem qualificação, que
de produção inteiras acarretando o desemprego estrutural e está presenciando as formas de part-time, emprego temporário,
intensificou de forma maior com os programas e políticas parcial, ou então vivenciando o desemprego estrutural.
neoliberais, segundo Pereira (2005), “a época em que o Estado Todos estes aspectos de programas qualidades para a
tinha um peso considerável nas decisões econômicas e sociais satisfação do cliente acarretam rigidez no cumprimento de metas
internas está se esgotando. Em seu lugar, a desregulamentação das fazendo com que os funcionários não tenham tempo livre, descanso
relações de trabalho e o desmonte da proteção social ao trabalhador necessário, tempo com a família, que de certa forma atrapalha em
são práticas correntes”. seu rendimento na produtividade, mas são exigências do mercado.
Tanto que o pacto democrático firmado na Constituição As novas morfologias do mundo do trabalho rebatem no
Federal de 1988, acontece o tensionamento de duas propostas: Serviço Social, em todas as áreas de atuação. E o que tentaremos
de um lado os movimentos sociais na luta para ampliação da demonstrar no próximo item de forma, mas particular na empresa.
responsabilidade do Estado perante as demandas sociais e do
outro a oposição favorável a abertura de mercado, defendendo a Serviço Social na Reestruturação produtiva
ampliação de poder sobre os fluxos de investimento e a redução
de poder do Estado. As alterações impostas no mundo do trabalho vêm gerando
Desta forma, a fórmula neoliberal pode ser resumida em um redimensionamento do Serviço Social, ocorrendo redução
algumas posições 1- um estado forte para romper o poder dos de postos de trabalhos e consequentemente a inserção em outras
sindicatos e controlar a moeda; um Estado parco para os gastos formas de trabalho. O serviço social é uma profissão que esta
sociais e regulamentação econômica; a busca de estabilidade inserida na divisão sócio técnico do trabalho, nas diferentes
monetária como a meta suprema; uma forte disciplina orçamentária, problemáticas do campo social.
diga-se , contenção dos gastos sociais e restauração de uma Os profissionais atuam com objeto na intervenção das
taxa natural de desemprego; uma reforma fiscal, diminuindo os expressões da questão social que se expressam nas desigualdades
impostos sobre os rendimentos altos; o desmonte dos direitos sociais, fruto das contradições social presentes na sociedade
sociais, implicando a quebra da vinculação entre pacto político. capitalista que geram o agravamento das condições de vida da
população. A questão social equacionada e entendida como
A ideologia neoliberal como todas as medidas citadas acima
objeto sob o qual incide ação do profissional esta relacionada
destrói as regulamentações imposta como resultado das lutas
segundo Iamamoto, o conjunto das expressões das desigualdades
dos movimentos sociais e da camada trabalhadora, priorizando
da sociedade capitalista madura que tem uma raiz comum: a
a supressão de direitos sociais arduamente conquistados
produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se
estabelecendo a liquidação das garantias do trabalho com a
mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos
ampliação explosiva da terceirização da subcontratação e das
mantém-se privada monopolizada por uma parte da sociedade.
distintas formas de precarização.
O serviço social tenha surgido paralelamente ao processo
As empresas que atuam no Brasil trouxeram implicações de industrialização as empresas tiveram influência na
significativas causando alterações na conduta empresarial como: institucionalização da profissão, “embora seja conhecida a
implantação de gestão de produção, reorganização do trabalho; existência de experiência esparsas a partir dos anos 40, é notório
inovação tecnologia, a competição marcado pelo aumento da que a inclusão do Serviço Social na empresa se deve a conjunturas
produtividade, redução dos empregados e adoção de programas específicas, marcadamente a partir de 1960”.
de reengenharia, qualidade total, terceirização, subcontratação de Historicamente a inclusão fosse vasta no campo empresarial,
mão-de-obra, redução da hierarquia, inovação técnico-científico e as empresas não são consideradas tradicionais empregadores
a redução do trabalho vivo, dentre outros fatores. de assistentes sociais. Na contemporaneidade com as novas
Dentre algumas empresas o sistema de qualidade implantada morfologias no mundo do trabalho este quadro se reduz ainda
impõe-se padronização rígida procurando difundir valores rígidos e mais.
regras padronizadas, incentivando o merecimento de cestas básicas A flexibilização do mundo do trabalho, atrelada com
para quem não falta, programa de participação de desempenho e de acumulação do capital e novas tecnologias, típicas do toyotismo
participação nos lucros pelo resultado de produtividade, etc. refletem consequências enormes. Dentre elas destacamos: redução
O enfoque patrimonial é a garantia e o sucesso de qualidade, dos postos de trabalho, diminuição dos níveis hierárquicos,
enfatizando que a competitividade provoca a busca da eficiência. introdução a polivalência e aumento das tarefas, terceirização,
Para tanto, as empresas investem em programas de motivação com subcontratação e precarização dos vínculos empregatícios e das
estratégias de envolvimento e marketing; treinamento pessoal; condições de trabalho, a taxa elevada de desemprego estrutural,
programas de qualidade e produtividade e desenvolvimento de expansão do emprego informal, aumento do trabalho a domicilio e
práticas participativas como: formação de comitês e grupos de do trabalho no terceiro setor.
sugestões; fóruns deliberativos, cursos, seminários etc. O trabalho do assistente social sofre impactos diretos,
A todo momento o mundo do trabalho exige a qualificação dessas transformações operadas na esfera privada e estatal. “A
do trabalhador em aprender novas tecnologias, técnicas flexibilização do trabalho atinge a estrutura produtiva processo do
organizacionais, integração entre concepção e execução da trabalho do assistente social [...] gerando enxugamento do quadro
produção, compromisso com os interesses dos cliente. de pessoal” (Serra apud Iamamoto, 2003).

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É nessa lógica que permite entender as particularidades do O serviço social é uma profissão intrinsecamente
nosso trabalho profissional. As alterações do processo de trabalho determinada pelas condições sociais em que se realiza, atendendo
também atingem o (a) Assistente Social não apenas, no sentido contraditoriamente as demandas da empresa e do trabalho; sua
objetivo, a sua condição de emprego e salário, mas no sentido particularidade, nos setores geridos pelo capital, sempre constituiu
subjetivo, a sua consciência de classe. O profissional de Serviço na busca de respostas mediadoras para a situação de conflito.
social é um trabalhador assalariado, e experimenta como os E o exercício profissional do Assistente Social é atuar nesta
demais trabalhadores, as injunções da lógica vigente, enquanto contradição capital /trabalho no modo de produção capitalista. É
que historicamente, o profissional construiu um projeto-ético- um movimento contraditório, pois, ao mesmo tempo que permite
político hegemônico, dissonante das diretrizes vigentes. a reprodução e a continuidade da sociedade de classe, cria as
O mercado de trabalho exige novos requisitos para o trabalho possibilidades de transformação.
profissional dos assistentes sociais tais como: profissional O serviço social também é requisitado na empresa para
multidisciplinar, com raciocínio lógico, aptidão para novas intervir e responder aos problemas que interferem no processo
qualificações, conhecimento técnico geral e da lógica do trabalho, de produção tais como: acidentes, alcoolismo, absenteísmo,
responsabilidade com o processo de produção, resolução rápida insubordinação, relacionadas à vida privada do trabalhador
de problemas, e capacidade de decisão rápida, disposição para que afetam o seu desempenho no trabalho, conflitos familiares,
apreender e empreender, dentre outras. A exigência não é tão doenças, dificuldade financeira etc. Sendo assim o assistente social
somente “vestir a camisa da empresa” é necessário que ele pense executam serviços sociais asseguradores da manutenção da força
pela empresa e seja competente. de trabalho no espaço da reprodução.
Segundo Iamamoto, o profissional de Serviço Social deve Na empresa privada o (a) Assistente Social é selecionado
ser consistente e propositivo e capaz de atuar, criticamente, em para administrar benefícios, atuar em programas, com a finalidade
novos espaços e ter um desempenho profissional adequado. Capaz de atender o trabalhador em suas necessidades, para que possa
de responder as demandas imediatas, mas transformá-las em produzir mais e melhor, com mais eficiência e produtividade,
respostas profissionais sustentáveis. dentro da ordem vigente do capita. O Serviço Social participa
tanto do processo de produção e reprodução dos interesses de
A leitura hoje predominante da “prática profissional” é de preservação do capital, quanto das respostas às necessidades de
que ela não deve ser considerada isoladamente em si mesma, sobrevivência do trabalhador.
mas em seus condicionantes sejam “internos” – os que dependem É preciso criar novas estratégias para as questões que recaem
do desempenho profissional ou externo - determinados pelas sobre a ótica de inversão do Serviço Social, o padrão empresarial
circunstancias sociais nas quais se realiza a pratica do assistente vem diversificando as requisições feitas ao serviço social,
social. Os primeiros são geralmente referidos a competências do diminuindo as demandas dos assistentes sociais passando para
assistente social como, por exemplo, acionar estratégias técnicas, outros profissionais, seja pelo surgimento de novas atribuições e
capacidade da leitura da realidade conjuntural, a habilidade no trato papeis profissionais, surgindo uma nova modalidade de trabalho
das relações humanas, a convivência numa equipe interdisciplinar, para o Assistente Social o trabalho em equipes interprofissionais.
etc. Os segundos abrangem um conjunto de fatores que não Essas equipes tem sido chamadas a atuar em programas
dependem exclusivamente do sujeito profissional, desde as relações de qualidade de vida, prevenção de doenças, na promoção
de poder institucional, os recursos colocados à disposição para o de motivação para o trabalho, em programas como saúde do
trabalho pela instituição ou empresas que contrata o assistente trabalhador, círculos de qualidade, gerenciamento participativo,
social, as políticas sociais especificas, os objetivos e demandas da clima social no trabalho, entre outros.
instituição empregadora a realidade social da população usuária Em contrapartida a empresa ao colocar seus serviços sociais,
dos serviços prestados etc. direciona seus objetivos para a redução dos custos, concentrarem
Um dos desafios para o assistente social na contemporaneidade riqueza, desemprego, desproteção social, terceirização, desmonte
é desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir das políticas de incentivo a independência econômica e
proposta de trabalho criativo, ou seja, capazes de preservar e efetivar objetivando a maximização de seus lucros. As empresas utilizam
direitos a partir das demandas postas no cotidiano profissional, ser de um código de ética onde expressam seus princípios, através da
um profissional propositivo e não somente executivo, ter atitudes sua missão, visão de valores em um quadro de avisos expostos
ousadas frente as novas demandas e ampliar o espaço profissional. para conhecimento do funcionários bem como para os clientes.
Dentro de muitas empresas o Serviço Social sofreu impactos É importante salientar que não existe preocupação com valores
da reestruturação produtiva. As empresas preocuparam em éticos, mas com a sua legitimidade do lucro na lógica do capital. O
redefinir a política de recursos humanos, englobando no conjunto assistente social participa desses princípios ativamente, na inclusão
demais políticas e estratégias organizacionais, tais como: o do funcionário, no treinamento, nas atividades cotidianas etc.
desenvolvimento de programas participativos; incentivo a Por isso é necessário fazer a com que o projeto profissional do
produtividade do trabalho; capacitação; treinamento; programas de Serviço Social seja efetivado e consolidado em realidades distintas
qualidade total; ampliação do sistema de benefícios dentre outros. como as empresas.
Em muitas empresas o Assistente Social é requisitado como
mediador de novas formas de controle de trabalho, ou seja, nas O Projeto Profissional do Serviço Social.
empresas a prática profissional esta relacionada com as alterações
nas modalidades de consumo da força de trabalho, com as novas Quando surgem no Brasil, os primeiros resultados do projeto
estratégias de controle persuasivos e com as políticas de benefícios societário inspirado no neoliberalismo (resultados que, aliás,
e incentivos para os trabalhadores. reproduzem o que tem ocorrido em todo o mundo: privatização do

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estado, desnacionalização da economia, desemprego, desproteção Outra dimensão do projeto ético-político é a jurídico-política.
social, concentração de riqueza, etc.) fica claro que o projeto ético– Seixas (2007), define-se como o conjunto de leis, resoluções,
político do serviço Social tem futuro. E tem futuro porque aponta documentais e textos políticos consagrados no meio profissional,
precisamente para o combate (ético, teórico, político e prático - o suporte profissional. Abrange o aparato jurídico-político e
social) ao neoliberalismo. institucional da profissão, expresso no Código de Ética, na lei de
O serviço social com o projeto ético político vem trabalhando Regulamentação e nas Diretrizes Curriculares e ainda no conjunto
a questão ética e política como dimensões fundamentais na de leis advindas do capitulo da Ordem Social da Constituição
formação profissional. O projeto profissional é designado ético- Federal de 1988, tais como a LOAS (Lei orgânica da Assistência
político porque tem uma indicação ética que não se limita às Social), Estatuto da Criança e Adolescente, Lei Orgânica de Saúde,
questões morais e prescrições de direitos e deveres, mas sim de dentre outras. Particularmente nas empresas a consolidação das
escolhas teóricas, ideológicas e direção política profissional. Leis Trabalhistas e acordos sindicais etc.
O código de Ética de 1993 reafirma o processo de construção
Somente para fins didáticos e sem profundidade citaremos os
do projeto-ético-político quando afiram seus onze princípios:
códigos de ética do Serviço Social até chegarmos ao atual na qual
Reconhecimento da liberdade como valor ético central; defesa
nortearam nossos estudos.
intransigente dos direitos humanos; ampliação e consolidação
O primeiro código de ética surgiu em 1947, o eixo central da cidadania; defesa do aprofundamento da democracia;
era caracterizado pela moral, e posicionamento conservadores. posicionamento em favor da equidade e justiça social; empenho
O segundo código surge em 1965, que teve como motivação a na eliminação de todas as formas de preconceito; garantia do
regulamentação jurídica da profissão, terceiro código surge em pluralismo; opção por um projeto profissional vinculado ao
1975, e nenhum debate sobre a ética fora privilegiado. O quarto processo de construção de uma nova ordem societária; articulação
código é datado em 1986, onde há a inserção do assistente social na com os movimentos sociais de outras categorias profissionais;
divisão sócio técnico do trabalho cujo marco histórico e documental compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população
é a ruptura com a ética tradicional opondo-se ao neotomismo e e com aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência
buscando superar a concepção universal aos conceitos da pessoa profissional; exercício profissional sem ser discriminado e nem
humana e bem comum. discriminar.
O atual código de ética datado em 1993, traz o projeto
profissional com proposta emancipatórias, base do compromisso O projeto apresenta outra dimensão que é a político-
ético-político, com avanço teórico, com valores emancipatórios, organizativa onde estão os fóruns deliberativos, quanto as
explicitando valores éticos fundamentais: liberdade, equidade e entidades representativa da profissão, estão interligadas nos
justiça social, articulando-se a democracia e cidadania. espaços deliberativos e consultivos como Conselho Federais de
Os projetos profissionais apresentam a autoimagem de Serviço Social, Conselho regional de Serviço Social, Associação
Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social, Executiva
uma profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente,
Nacional de Estudantes de Serviço Social.
delimitam e priorizam os seus objetivos e funções, formulam os
A dimensão político-organizativa do projeto direciona suas
requisitos (teóricos, institucionais e práticos) para o seu exercício, ações em defesa da equidade e da justiça social, na universalização
prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e e aos bens socialmente produzidos, relativos aos programas e
estabelecem as balizas da sua relação com os usuários de seus políticas sociais, na ampliação e consolidação da cidadania, postas
serviços, com as outras profissões e com as organizações e como condições para a garantia dos direitos civis políticos e sociais.
instituições sociais, privadas e públicas. O projeto articula os demais segmentos e setores da sociedade em
O projeto ético-político implica no compromisso com a busca de uma nova ordem societária em sua dimensão política.
competência que só é possível com o aprimoramento intelectual do Mustafá apud Seixas (2007), salienta que o Assistente Social
assistente social. Que prisma uma nova relação sistemática com o pode fortalecer conquista importantes dos usuários em seus
usuário dos serviços oferecidos pelo profissional com a qualidade serviços.
dos serviços prestado à população. O assistente social, assim como nenhum outro profissional
Mustafá apud Seixas (2007) afirma que o projeto profissional ou trabalhador, seja individualmente ou como categoria, não tem
do Serviço Social aponta para um compromisso com o força política para assegurar a universalidade. Apenas a classe
aprimoramento intelectual, para possibilitar a competência social cabe este papel. Mas o assistente social pode posicionar-
profissional. E esta competência se revela, no cotidiano, na se a favor desta universalidade e somar com outros segmentos
implementação de programas e políticas sociais. Compete ao sociais, numa perspectiva de classe, sendo assim, protagonista de
profissional desvendar a lógica, os fundamentos e a direção de uma ideologia enfocada em princípios éticos [...] no entanto, entre
o real e o possível, existe muito caminho a ser percorrido e é da
tais políticas e programas, produzir um acumulo de conhecimento
competência ética fazer analise existente e oferecer subsídios que
sobre o seu significado e repassar, para o usuário, tanto o serviço
apontem para o devir.
- com boa qualidade- quanto a concepção do direito nela contida.
Diante de propósitos distintos de um projeto societário das
O projeto ético político tem uma perspectiva de ruptura com as empresas, é importante que os profissionais de serviço social
teorias neoliberais voltadas para o clientelismo, assistencialismo, articulem-se com equipes interprofissionais para fortalecer as lutas
seletividade com o conservadorismo, através do projeto pretende- dos usuários e pelos princípios éticos que defendemos. (Texto
se contribuir para um processo social nos princípios de igualdade, adaptado de Fátima de Oliveira SOUZA, F. O.; PINHEIRO, M. G.
liberdade e da justiça social. S. e GIBIM, R. A. Docentes em Serviço Social).

Didatismo e Conhecimento 13
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Porém, consideravam somente o local de trabalho, desconsiderando
1.3 O SERVIÇO SOCIAL E A SAÚDE a totalidade da vida do trabalhador. A Medicina do Trabalho surgiu
DO TRABALHADOR DIANTE DAS na Inglaterra, num contexto de Revolução Industrial, sob um ponto
MUDANÇAS NA PRODUÇÃO, de vista baseado em Taylor e Ford.
ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DO TRABALHO. Após a II Guerra Mundial, as indústrias e os altos empresários
cresceram muito, as mulheres começaram a trabalhar, pois
com o aumento da demanda ocorre uma relativa escassez de
força de trabalho, e as condições de trabalho eram ainda piores.
Noções Conceituais: Medicina do Trabalho e Saúde do Dessa maneira a Medicina do Trabalho evoluiu, tendo início
Trabalhador uma intervenção sobre o ambiente de trabalho, chamada Saúde
Ocupacional. Como resposta técnica e científica aos trabalhadores,
Com a reestruturação produtiva, os trabalhadores sofrem passa-se a ver o processo de trabalho como um todo. Iniciam-se
inúmeras perdas de direitos sociais, além da agressão de seus limites interlocuções entre médicos, engenheiros e profissionais das
físicos e psicológicos, consequentemente perdem capacidade ciências sociais, ou seja, uma equipe interdisciplinar, onde tem
de luta, desconhecendo-se enquanto classe trabalhadora. Tudo ênfase a higiene do trabalho. Esse método predomina nos dias
isso devido à vulnerabilidade a que são expostos, correndo o de hoje, de maneira a controlar os índices de poluição, ruídos,
constante risco de demissão, e deparando-se com um mercado de produtos tóxicos, riscos de acidentes.
trabalho cada vez mais restrito, e condições salariais cada vez mais Porém, a questão de saúde não se resume somente a melhoras
humilhantes.
nas condições de trabalho, mas também nas boas condições
Diante desse novo quadro, o trabalhador sofre um processo de
de habitação, alimentação, transporte, educação, remuneração,
culpabilização, tornando-se potencial desempregado, vez que se
lazer, higiene, vestuário, etc. Essa amplitude, chamada de Saúde
manter atualizado e especializado não garante sua empregabilidade.
Sente-se pressionado, pois sabe que saindo do mercado formal, do Trabalhador, se consegue através de políticas sociais, que se
existe um exército de reserva esperando para ocupar seu espaço. moldam através da pressão exercida pelos movimentos sociais
Assim, submete-se a todo tipo de má situação profissional, abusos junto ao Estado. É um avanço na dialética do processo saúde-
por parte dos superiores, riscos de acidente de trabalho, salários doença com o propósito de potencializar a saúde, representando a
muito baixos, constrangimentos que vão prejudicando-o, física e desmedicalização da sociedade, onde as políticas de saúde teriam
psiquicamente. que ser preventivas ao invés de curativas.
No mundo do trabalho contemporâneo, onde cada um torna-se No que tange à saúde mental do trabalhador, deve-se considerar
responsável pela sua “empregabilidade”, a pressão desencadeadora as condições de trabalho em geral, o ambiente, o tempo de jornada,
de sofrimento é constante, agindo sobre os trabalhadores. as ações desenvolvidas no processo de trabalho, pois estas podem
Para Lukács (2002), o sujeito é formado por um processo levar a reações psicopatológicas relacionadas, causando estresse,
histórico de relações sociais, onde o trabalho está no centro dessa alterações do sono, levando até mesmo a um transtorno mental de
humanização do sujeito individual, o que o diferencia do mundo maior gravidade.
natural. Dessa maneira, podemos compreender a importância que Nesse ponto se destaca a importância de ter um profissional
o trabalho tem na vida de um indivíduo, e a consequência de um assistente social inserido na equipe interdisciplinar que trata a
processo de trabalho desumanizador. saúde do trabalhador, pois esse tem uma visão diferente da dos
Segundo Dejours (1992), a organização do trabalho aliena o médicos. Possui uma atuação crítica que organiza os movimentos
trabalhador, desestruturando o seu psiquismo e se utilizando de sociais e é devidamente capacitado para elaborar, executar e
seu sofrimento para aumentar a produção. Nessa perturbação, o avaliar as políticas sociais. Tem uma visão ampla a respeito da
trabalhador cria mecanismos de defesa que leva a uma adaptação exploração do trabalhador, e é o profissional capaz de articular
ao sofrimento, ou a uma descompensação, que seria desequilíbrio, o mundo do trabalho com a totalidade social que envolve a vida
neurose, psicose ou uma psicossomatização, levando a uma deste, considerando a história, economia, política e as questões
doença física a partir de um desequilíbrio emocional decorrente sociais em que se insere. No entanto, trataremos do trabalho do
do ambiente de trabalho. Assim, o trabalho repetitivo cria a assistente social mais à frente.
insatisfação, cujas consequências não se limitam a um desgosto
particular. Ela é de certa forma uma porta de entrada para a doença,
A Reestruturação Produtiva e suas consequências à Saúde
e uma encruzilhada que se abre para as descompensações mentais
do Trabalhador
ou doenças somáticas.
Como bem nos traz Mendes (1991), em decorrência
A saúde do trabalhador reflete as condições materiais, sociais
desse adoecimento dos trabalhadores, começou-se a tratar dos
funcionários dentro da própria empresa, colocando um médico para e políticas do processo de trabalho e das condições de vida desse
atender os trabalhadores adoentados. Dessa maneira, teve início a trabalhador. Segundo Freire (2006) diversos fatores interferem
Medicina do Trabalho, onde o objetivo era trazer o funcionário na saúde do trabalhador, tais como produtividade, impacto de
rapidamente de volta ao trabalho, exercendo uma medicina apenas mudanças tecnológicas, reconversão industrial e o problema do
curativa. Os médicos perceberam que os trabalhadores adoeciam não-trabalho coercitivo (desemprego), que origina o agravamento
devido às péssimas condições de trabalho a que eram submetidos, das condições de saúde da população trabalhadora. (...) o processo
dessa maneira buscava-se uma adaptação dos trabalhadores às saúde-doença-trabalho se insere nos diversos aspectos da
máquinas, aos meios de trabalho, para buscar um bem-estar físico. organização, divisão e relações sociais no trabalho”.

Didatismo e Conhecimento 14
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A principal consequência desse processo é o desgaste físico e determinado, sem treinamento e nenhuma proteção. São expostos
psíquico que o trabalhador sofre, potencializando diversos fatores a condições “perversas e nocivas” de trabalho, “como se fosse
como “posição incômoda, alternância de turnos, ruídos, tensão possível escolher entre a saúde e o acesso a postos de trabalho”
nervosa por pressão e alto ritmo.” (ALMEIDA, MELO e MATOS, 2006).
A todos esses fatores, Freire ainda acrescenta a “carga No entanto, para amenizar esse processo, temos como
social” que expressa as relações de desigualdade, autoritarismo, objetivo final dos capitalistas o mercado, os consumidores,
impotência do trabalhador perante suas condições de trabalho, o que impõe às empresas uma busca pela “Qualidade Total”,
por sua colocação desfavorável dentro da divisão do trabalho na e isso implica em certificações de qualidade, como os ISOs
empresa. Essa impossibilidade de se tornar agente de mudança (International Organization for Standartization) que buscam um
acaba levando a atrofiação da capacidade de lutar do trabalhador, padrão internacional como diferencial no mercado globalizado.
gerando uma conformidade com relação a sua situação. Resulta, Com isso, as empresas precisam se adaptar às normas referentes
então, na alienação social do trabalhador. à processo de produção e qualidade dos produtos (ISO 9000),
Lúcia Freire aponta ainda como sendo as principais impactos ambientais (ISO 14000) e, mais recentemente lançada,
consequências da reestruturação produtiva à saúde dos a certificação por melhores condições de saúde dos trabalhadores
trabalhadores as doenças profissionais desencadeadas pelas (ISO 18000). Mas não podemos deixar de mencionar que esse
inovações tecnológicas, como as DORTs (doenças osteomusculares processo atinge somente os trabalhadores de grandes empresas,
relacionadas ao trabalho) e o estresse causado pelas novas condições que, na maioria das vezes, visam uma melhor aceitação de seus
e possíveis demissões; o agravamento das doenças preexistentes produtos no mercado externo.
degenerativas, que exigiriam maiores investimentos no processo Com relação a esse fato, vale destacar uma colocação de Marx
de trabalho, mesmo que sub-registrados ou mascarados. (1983, apud MENDES e ALMEIDA, 2004) onde diz que:
Essas consequências vêm se agravando com o processo O capital não tem (...) a menor consideração pela saúde do
de terceirização nas empresas, que desqualificam todo processo trabalhador (...), a não ser quando é coagido pela sociedade a ter
de trabalho, incluindo os setores de Medicina e Segurança do consideração. Receamos ter que confessar que os capitalistas não
Trabalho, com um descompromisso dos profissionais com os se sentem inclinados a conservar e zelar por esse tesouro e dar-lhe
trabalhadores, com uma prática totalmente institucionalizada, valor (...) a saúde dos trabalhadores foi sacrificada.
sem autonomia profissional. Temos também, um atraso nas Marx já havia previsto que os capitalistas só seria interessante
modernizações tecnológicas, causado pela busca de reduzir os zelar pela saúde de seus trabalhadores no momento em que esse
custos, sem considerar as reais condições de trabalho e o que fato significasse melhoria em sua produção e em seu mercado
acarretariam à saúde dos trabalhadores. consumidor.
A terceirização contribui com o propósito do aumento da
produtividade e redução dos custos de produção. Nesse processo, O Serviço Social na área de “Saúde do Trabalhador”
a empresa fica com a atividade que desempenha melhor e com
menor custo e transfere a outras empresas as demais fases do A “Saúde do Trabalhador” configura a principal demanda
processo produtivo, gerando empresas “enxutas e especializadas” do Serviço Social atuante em empresas. Isso porque atende aos
(ALMEIDA, MELO e MATOS, 2006). empresários, significando a continuidade da produção, envolve
Esse processo barra as pressões por melhores salários e reduz aos sindicatos, buscando melhorar as condições gerais do processo
os direitos dos trabalhadores, criando relações mais frágeis e produtivo, e principalmente, lida com o trabalhador, buscando
dominadas entre empresa-trabalhador, precarizando as relações garantir sua integridade física, psíquica e social.
de trabalho e gerando uma desmobilização das organizações Nesse sentido, podemos acompanhar Freire (2006) quando
sindicais. Como resultado, temos um novo trabalhador, adaptado diz que (...) a saúde do trabalhador constitui uma expressão
ao novo sistema de produção e agindo de forma a aumentar a concreta, privilegiada, da realidade socioeconômica e política
produtividade. Caso não ocorra essa adaptação, é prontamente das relações de trabalho. Suas evidências indiscutíveis facilitam
substituído. o desvendamento das contradições ocultas por trás do discurso
A terceirização e as mudanças no corpo das empresas, levam dominante, primordialmente mistificador, possibilitando a
ao aumento do desemprego estrutural, tendo por razão direta constituição de sujeitos políticos em torno da luta pelo direito à
a reestruturação produtiva e a adaptação tecnológica que as saúde e condições de trabalho que não a agridam.
empresas passam. No entanto, não podemos desconsiderar a sua dimensão
O processo de terceirização em pleno desenvolvimento, leva econômica, sendo que reflete diretamente na produtividade
a uma redução da responsabilidade da empresa com o funcionário, empresarial e também representa custos ao Estado com os
que pertence a uma outra empresa externa e menor, sendo apenas trabalhadores doentes ou lesionados.
um prestador de serviços preso a um contrato precário e em O Serviço Social está inserido na área de Recursos Humanos,
condições de total vulnerabilidade, sendo uma força de trabalho atuando nas demandas do processo produtivo, como “qualificação,
descartável. políticas (de atendimento ao trabalhador), estratégias, instrumentos
O que se percebe é que os trabalhadores formais têm seu ritmo gerenciais de controle e motivação”, atuando também nas
de trabalho intensificado e assumem uma postura multifuncional na condições de “ambiente e relações de trabalho, (...) produção e
empresa, enquanto os trabalhadores subcontratados e temporários reprodução física e social da força de trabalho”).
têm sua jornada aumentada e os direitos sociais anulados. Em Como consequência da reestruturação produtiva ocorre uma
comum entre eles é a exposição à riscos, que nos terceirizados desregulamentação dos direitos dos trabalhadores, instituindo-se
se agrava, pois a maioria desenvolve o trabalho por um tempo os Contratos Coletivos de Trabalho, que são restritos e temporários.

Didatismo e Conhecimento 15
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Esse processo restringe, também, o trabalho dos assistentes crítico e comprometido com a classe trabalhadora, é o profissional
sociais, representando uma anulação dos critérios sociais, vez que preparado para analisar a relação capital X trabalho e atuar nas
baseia-se em uma negociação direta com a empresa. No entanto, as situações advindas dessa relação, relacionando às perspectivas
políticas de saúde do trabalhador permanecem, com a necessidade políticas, históricas e sociais.
de ter assistentes sociais atuando nelas. Têm por papel promover a saúde e garantir direitos, por isso
Lúcia Freire (2006) divide as atuações dos assistentes sociais deve atuar no campo de saúde do trabalhador.
na área de saúde do trabalhador em cinco grupos: “educação e Pensar em saúde do trabalhador, implica pensar o processo de
desenvolvimento de recursos humanos em saúde” (campanhas e trabalho e o ambiente em que trabalha, em conjunto com o modo e
eventos), “higiene industrial” (controle da saúde de cada trabalhador qualidade de vida que esse trabalhador possui. Implica conhecer o
e do ambiente de trabalho), “análise e acompanhamento médico- trabalhador em todas as suas dimensões sociais, conhecer o meio
social individual ou grupal” (atendimento individual ou grupal para em que ele está inserido e se relaciona. Nesse ponto que se insere
atender determinadas demandas), “assistência multidisciplinar de o Assistente Social, quando passa a se considerar os determinantes
saúde” (gerenciamento dos recursos assistenciais) e “qualidade de sociais como parte do processo de adoecimento dos trabalhadores.
vida e fóruns participativos” (desenvolvimento cultural e social do Sendo assim, a atenção à saúde do trabalhador se propõe a
trabalhador, desenvolvimento do clima organizacional, envolvendo gerar melhorias nas condições de vida e saúde dos trabalhadores e
a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA). dos que o cercam. Porém, esse processo não se dá de forma simples,
A inserção do assistente social nesse processo é importante pois, como traz Mendes e Almeida (...) como garantir a liberdade
devido (...) a sua bagagem teórica e técnico-operacional, focalizando e a autonomia do trabalhador, visto que as instituições priorizam a
as condições e relações sociais articuladas às situações cotidianas produtividade, o lucro, sendo, portanto, subsidiadas por interesses
apresentadas em tais ocasiões, assim como na comunicação econômicos que se sobrepõem às capacidades humanas.
democrática individual e grupal e em fóruns coletivos. É necessário buscar uma forma de relacionar o interesse do
Tivemos, porém, algumas contradições na reestruturação empregador às condições “saudáveis” de trabalho.
produtiva, como a articulação entre profissionais da área de saúde, Trabalhando a saúde do trabalhador, o Assistente Social busca
levando a uma valorização do Serviço Social. Os problemas não compreender as relações entre o trabalho, a saúde e a doença, para
são mais tratados de forma isolada, mas sim de maneira paralela nortear suas ações de promoção e proteção da saúde, de forma a
ao processo produtivo. Também, com a informatização, têm-se humanizar o ambiente e o processo de trabalho em geral.
uma organização dos dados assistenciais e médicos, o que facilita No entanto, para que essa atuação se dê em toda a
e otimiza o trabalho dos assistentes sociais. complexidade da área do trabalho, é necessário que o Assistente
Dentro da empresa, o assistente social está inserido na Social esteja inserido em uma equipe interdisciplinar, com caráter
contradição capital trabalho, andando sempre no limite entre o
multiprofissional, e ainda, com a participação dos próprios
empresário e os trabalhadores, como nos diz Iamamoto: Reproduz
trabalhadores, envolvendo-os na análise das condições de trabalho
(...) pela mesma atividade, interesses contrapostos que convivem
em que estão inseridos e na identificação dos melhores meios de
em tensão. Responde tanto a demandas do capital como do trabalho
intervir nessa realidade a eles posta.
e só pode fortalecer um ou outro polo pela mediação de seu oposto.
Ou seja, se faz necessário dar voz, comprometer e envolver o
Em relação às ameaças a profissão, a reestruturação traz o
próprio trabalhador no planejamento, desenvolvimento e execução
medo do desemprego, que enfraquece o profissional politicamente,
das ações, considerando-o como o elemento principal, por seu
e leva a tendência de se deixar nortear as atividades profissionais,
de forma a trabalhar somente para o capital. conhecimento empírico das reais condições de risco/segurança no
Essas ameaças levam ao “avanço da importância dos programas ambiente de trabalho. Como consequência teríamos facilitada a
sócio educacionais” (forma de dominação pelo capital), “tendência negociação entre trabalhadores e empregadores, buscando maior
de descarte dos programas assistenciais das empresas” (com a democratização nas decisões e no controle social do processo de
terceirização, delegando a trabalhadores temporários), “tendência trabalho, resultando na transformação técnica e organizacional,
da transdisciplinariedade, associada à polivalência, substituindo melhorando o ambiente de trabalho na sua relação com a Saúde
os espaços profissionais, multiprofissionais e interprofissionais, do Trabalhador.
sobretudo quanto a programas sócio educacionais.” Com relação à inserção do trabalhador no processo de melhoria
Esses processos levam o assistente social a misturar-se nas das condições de trabalho, podemos trazer o que nos diz Mendes
equipes multidisciplinares, onde demonstra facilidade de atuação, e Almeida (2004), quando analisam as contradições na área de
pela sua formação, enquanto em setores onde trabalha isolado, saúde do trabalhador e a relação do Assistente Social dentro desse
acaba se desvalorizando e perdendo seu espaço profissional para processo: (...) o resguardo à saúde dos trabalhadores se torna um
a terceirização. campo de luta entre classes sociais, cujos interesses exprimem
No entanto, para se inserir nessa nova conjuntura é necessário o caráter contraditório do sistema capitalista de produção. Daí o
ao assistente social capacitar-se para esse novo mercado, a fim de desafio para os assistentes sociais e para os diferentes profissionais
se adaptar à nova realidade de trabalho e poder extrair o melhor da que se deparam com essa demanda de identificar, nas „queixas‟
situação posta, em sua atuação. dos usuários, tais mecanismos de subversão e criar possibilidades
de intervenção, como a capacitação (por meio de uma prática
A Atuação do Assistente Social na Saúde do Trabalhador crítica e politizante, veiculada por informações), o incentivo e o
fortalecimento da constituição de estratégias de resistência dos
Os Assistentes Sociais são os profissionais preparados para trabalhadores, com vistas a garantir os direitos humanos, a recusa
compreender o modo como se revelam e as consequências dos do autoritarismo e do determinismo, a equidade, a justiça e a
diversos processos sociais na vida das pessoas. Com um olhar proteção social, no campo do trabalho.

Didatismo e Conhecimento 16
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Esse processo de implementação da política de Saúde do Analisando a organização do trabalho, devemos avaliar a linha
Trabalhador, coloca como ponto de partida ações de prevenção de montagem, se o trabalho é rápido, controlado e fragmentado, se
junto aos trabalhadores, contribuindo também com a disseminação exige uma atenção prolongada, ou se, pelo contrário, é um trabalho
desse ideário em todos os campos do processo de trabalho. lento, monótono e repetitivo; se é realizado com computadores e o
Enquanto profissão comprometida com a efetivação dos direitos ritmo é ditado pela máquina; se a jornada de trabalho é extensa e
sociais, cabe ao Assistente Social contribuir na realização dessa se o descanso é suficiente entre as jornadas, com pausas frequentes
prática conscientizante, de modo a resultar numa intervenção nos durante a jornada; se o trabalho ocorre de forma isolada, como
determinantes sociais do processo saúde doença. em cabines por exemplo; se existe hierarquia e autoritarismo por
No caso de saúde mental, especificamente, temos o estresse parte das chefias, além de controle de desempenho individual;
como uma reação do organismo diante de uma situação de pressão se o trabalho ocorre em turnos alternados; se há risco de
ou perigo, com efeitos nocivos, como o esgotamento mental que acidentes, sobrecarga de trabalho; se as informações passadas aos
leva a desencadear outras doenças mais graves. trabalhadores são suficientes e não distorcidas; se ocorre desvio
Segundo Marisa Palácios, 50% das doenças que afastam os ou acúmulo de funções; se o trabalhador tem liberdade para se
trabalhadores são relacionadas à saúde mental, sendo estes os levantar, andar, espreguiçar, relaxar, ações necessárias para aliviar
custos diretos ao empregador. Ainda têm-se os custos indiretos, a tensão; como se dão as relações interpessoais no ambiente de
como uma alta rotatividade de trabalhadores, o que leva ao aumento trabalho; por fim, se existe instabilidade no emprego, com alta
de investimentos em treinamentos, por exemplo, além da baixa rotatividade de trabalhadores.
na produtividade, vez que trabalhadores estressados contribuem Ainda se faz necessário considerar o contexto socioeconômico
pouco ou quase nada na produção. dos trabalhadores, se o custo de vida é viável e a remuneração é
Considerando o estresse como possível ponto de partida suficiente.
de todas as outras doenças relacionadas ao trabalho, Palácios A associação entre esses diversos fatores indica se o ambiente
(2007) nos apresenta métodos para detectar e buscar neutralizar é saudável e onde devemos intervir para melhorá-lo, sem deixar de
os problemas organizacionais, com intervenções e estratégias considerar que todos os fatores externos ao ambiente de trabalho
preventivas, além de curativas, para a melhoria dos níveis de saúde também influenciam e dependem do processo produtivo em que o
no trabalho. trabalhador está inserido.
Em equipes interdisciplinares, é necessário buscar junto aos Bisneto (2007) nos ensina ainda que o Assistente Social na
trabalhadores identificar os fatores que os levaram ao estresse, área de saúde do trabalhador deve atuar de acordo com o Projeto
identificando as “psicopatologias” (PALÁCIOS, 2007) da Ético-Político que norteia a profissão e buscando conciliar com as
organização do trabalho. diretrizes da Lei Orgânica da Saúde, de modo a:
É importante incentivar o bom relacionamento de equipe entre - Empenhar-se na viabilização dos direitos sociais e de
os trabalhadores e Palácios acredita que se o trabalhador deter um cidadania aos trabalhadores em dificuldade social;
certo controle sobre seu processo de trabalho imediato vai adoecer - Repassar serviços de saúde que são assegurados socialmente
menos. A falta de controle sobre o tempo, métodos, técnicas e o e institucionalmente a todos, sem discriminação em todos os níveis
excesso de demanda, leva ao estresse. É importante compreender de assistência (universalidade, integralidade, equidade).
que o trabalhador não é um mero executor de tarefas, ele precisa - Garantir acesso às informações, fazendo divulgação e
controlar seu processo de trabalho. publicização, assegurar a democratização das informações aos
É necessário um suporte social para viabilizar uma forma de trabalhadores.
trabalho em equipe, reduzindo os trabalhos competitivos, que é um - Empenhar-se na participação da comunidade nos programas
dos fatores mais estressantes, hoje em dia, no processo produtivo. de saúde.
Palácios nos sugere ainda que a melhor forma de intervir é - Garantir o funcionamento dos Conselhos e Conferências
atuar no ambiente de trabalho, mas sem deixar de atuar também em, Saúde do Trabalhador com a participação dos trabalhadores e
nos trabalhadores, investindo em capacitação técnica e em cursos profissionais engajados.
de desenvolvimento humano, como mediar conflitos em equipe, - Participar da formulação de políticas e da execução de
por exemplo. ações em todo os âmbitos de „Saúde do Trabalhador “em equipe
Outro modo é tentando alterar os desenhos dos cargos, de interdisciplinar.
modo a incrementar a auto determinação dos ritmos de trabalho, - Participar da política de formação de recursos humanos.
garantir a total compreensão do trabalho a ser executado, de modo - Realizar ações educativas sistemáticas e continuadas nos
a fazê-lo se sentir mais seguro em suas atividades laborativas. diversos programas de atenção à saúde do trabalhador.
Torna-se necessário também, propiciar o contato humano, com Realizar estudos e pesquisas a níveis epidemiológicos,
atividades extras, promovendo encontros familiares, sociais e institucionais e comunitários que contribuam para esclarecer
políticos. demandas postas pelos trabalhadores e que possam orientar
José Augusto Bisneto (2007), baseando-se em Edith diretrizes populares aos programas de atenção à saúde.
Seligmann-Silva, traz o que devemos observar em relação ao Como apresenta Dejours (1992), o trabalho tem a mesma
processo saúde-doença no trabalho, em especial a saúde mental. intensidade para levar ao prazer ou ao sofrimento, dependendo
Devemos considerar os aspectos físicos e químicos, como da forma e das condições em que é realizado. E é possível aos
luminosidade, acústica (excesso de ruído), vibrações, higiene Assistentes Sociais trazer grandes contribuições para melhora
local, condições ergonômicas, se há risco de contaminações ou se dessas condições de realização do trabalho. (Texto adaptado de
há exposição a radiações. PINTO, A. S. Assistente Social). 

Didatismo e Conhecimento 17
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
caráter monopolizador, entravando o próprio mercado e tolhendo
2 HISTÓRIA DA POLÍTICA SOCIAL. as novas possibilidades de sua expansão. O abaixamento do nível
de vida da população garante ao mesmo tempo uma taxa média de
lucro e também a redução do mercado imprescindível à produção.
Dessa forma, pode-se afirmar que não há política social
O estudo das políticas sociais, na área de Serviço Social, desligada das lutas sociais. De modo geral, o Estado assume
vem ampliando sua relevância na medida em que estas têm-se algumas das reivindicações populares, ao longo de sua existência
constituído como estratégias fundamentais de enfrentamento das histórica. Os direitos sociais dizem respeito inicialmente à
manifestações da questão social na sociedade capitalista atual. consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores.
Não se pode precisar um período específico do surgimento Certamente, não se estende a todas as reivindicações, mas na
das primeiras identificações chamadas políticas sociais, visto aceitação do que é conveniente ao grupo dirigente do momento. E
que, como processo social, elas se originam na confluência dos com Faleiros (1991), pode-se afirmar que as políticas sociais ora
movimentos de ascensão do capitalismo como a Revolução são vistas como mecanismos de manutenção da força de trabalho,
Industrial, das lutas de classe e do desenvolvimento da intervenção ora como conquista dos trabalhadores, ora como arranjos do
estatal. bloco no poder ou bloco governante, ora como doação das elites
Sua origem relaciona-se aos movimentos de massa dominantes, ora como instrumento de garantia do aumento da
socialmente democratas e à formação dos estados-nação na Europa riqueza ou dos direitos do cidadão.
Ocidental do final do século XIX, porém sua generalização situa- O período que vai de meados do século XIX até os anos de
se na transição do capitalismo concorrencial para o capitalismo 1930, é marcado predominantemente pelo liberalismo e sustentado
monopolista, especialmente em sua fase tardia, após a Segunda pela concepção do trabalho como mercadoria e sua regulação pelo
Guerra Mundial. livre mercado.
Historicamente, o estudo das políticas sociais deve ser O estado liberal é caracterizado pelo indivíduo que busca seu
marcado pela necessidade de pensar as políticas sociais como próprio interesse econômico proporcionando o bem-estar coletivo,
“concessões ou conquistas”, na perspectiva marxista, a partir predomina a liberdade e competitividade, naturaliza a miséria,
de uma ótica da totalidade. Dessa forma, as políticas sociais são mantém um Estado mínimo, ou seja, para os liberais, o Estado deve
entendidas como fruto da dinâmica social, da inter-relação entre os assumir o papel “neutro” de legislador e árbitro, e desenvolver
diversos atores, em seus diferentes espaços e a partir dos diversos somente ações complementares ao mercado e as políticas sociais
interesses e relações de força. Surgem como “[...] instrumentos de estimulam o ócio e o desperdício e devem ser um paliativo, o que
legitimação e consolidação hegemônica que, contraditoriamente, significa que a pobreza deve ser minimizada pela caridade privada.
são permeadas por conquistas da classe trabalhadora”. É, portanto, o mercado livre e ilimitado que regula as relações
A política econômica e a política social estão relacionadas econômicas e sociais e produz o bem comum.
intrinsecamente com a evolução do capitalismo (conforme Mediante esses princípios defendidos pelos liberais e
proposta de reflexão), fundamentando-se no desenvolvimento assumidos pelo Estado capitalista, o enfrentamento da questão
contraditório da história. Tais políticas vinculam-se à acumulação social, neste período, foi sobretudo repressivo, e seguido de
capitalista e verifica-se, a partir daí, se respondem às necessidades algumas mudanças reivindicadas pela classe trabalhadora que
sociais ou não, ou se é mera ilusão. foram melhorias tímidas e parciais na vida dos trabalhadores, sem
Segundo Vieira E. (1995), a acumulação é o “[...] sentido atingir as causas da questão social.
de concentração e de transferência da propriedade dos títulos Também as reformas sociais ocorridas no período pós-Segunda
representativos de riqueza”. As transformações ocorridas nas Guerra não atingiram esse objetivo. Assim as primeiras ações de
revoluções industriais acarretaram uma sociedade com um vasto políticas sociais ocorrerão na relação de continuidade entre Estado
exército de proletários. liberal e Estado social. Ambos terão um ponto em comum que é o
A política social surge no capitalismo com as mobilizações reconhecimento de direitos sociais sem prejudicar os fundamentos
operárias e a partir do século XIX com o surgimento desses do capitalismo. Isso porque não houve ruptura radical entre o Estado
movimentos populares, é que ela é compreendida como estratégia liberal (século XIX) e o Estado social capitalista (século XX).
governamental. Com a Revolução Industrial na Inglaterra, do Mas, sim, uma nova visão de Estado, pressionado por mudanças
século XVIII a meados do século XIX, esta trouxe consequências (lutas das classes trabalhadoras), o “velho liberalismo foi cedendo
como a urbanização exacerbada, o crescimento da taxa de espaço a um liberalismo mais social e incorporando orientações
natalidade, fecunda o germe da consciência política e social, socialdemocratas em um novo contexto socioeconômico e da luta
organizações proletárias, sindicatos, cooperativas na busca de de classes, possibilitando uma visão social e, consequentemente,
conquistar o acolhimento público e as primeiras ações de política investimentos em políticas sociais (Behring & Boschetti, 2006).
social. Ainda nesta recente sociedade industrial, inicia-se o conflito O Estado europeu liberal do século XIX reconheceu direitos
entre os interesses do capital e os do trabalho. civis tais como: o direito à vida, à liberdade individual e os direitos
Para Vieira E. (1992), a história do capitalismo testemunha de segurança e de propriedade, mas com características de Estado
contradição fundamental, de um lado, ininterrupto crescimento do policial e repressor (Pereira 2000) e assim a população usufruiu
mercado e do consumo e de outro, sua gradativa monopolização. especialmente do direito à liberdade e à propriedade.
Com isso, o processo de acumulação do capital impõe à O fortalecimento e a organização da classe trabalhadora foram
indústria a necessidade de alargar o mercado e de aumentar o determinantes para a mudança da natureza do Estado liberal no
consumo, mas o resguardo e o incremento da rentabilidade do final do século XIX, e os ganhos sociais e políticos obtidos mais
capital já invertido exigem de quando em quando limitações de precisamente no século XX pelos trabalhadores.

Didatismo e Conhecimento 18
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A busca da classe operária pela emancipação humana, a O capitalismo monopolista intensifica suas contradições
socialização da riqueza e uma nova ordem societária garantiram oriundas da organização da produção capitalista, ou seja, sua
algumas conquistas importantes na dimensão dos direitos políticos produção cada vez mais socializada é restrita pela concentração
tais como: o direito de voto, de organização e a formação de mundial de renda por meio de apropriação privada dos produtos do
sindicatos e partidos, de livre expressão e manifestação, e de trabalho. E assim, como afirma Netto, o capitalismo monopolista
ampliar os direitos sociais. Desta forma, segundo Behring & recoloca, em patamar mais alto, o sistema totalizante de
Boschetti, a generalização dos direitos políticos é resultado contradições que confere à ordem burguesa os seus traços basilares
da luta da classe trabalhadora e, se não conseguiu instituir uma de exploração, alienação e transitoriedade histórica [...].
nova ordem social, contribuiu significativamente para ampliar A fase monopólica firma-se por meio do controle dos
os direitos sociais, para tencionar, questionar e mudar o papel do mercados, garantindo maiores lucros aos capitalistas. Com isso
Estado no âmbito do capitalismo a partir do final do século XIX e ocorrem diversas variações nas instituições capitalistas, tais como:
início do século XX. ampliação do sistema bancário e creditício, acordos empresariais
Ainda segundo as autoras, o surgimento das políticas sociais para o aumento do lucro por meio do controle dos mercados,
foi gradativo e diferenciado entre os países, com base nos formando os chamados cartéis. Surge grande acumulação de lucro,
movimentos e organizações reivindicatórias da classe trabalhadora diminuição da taxa média de lucro e a tendência ao subconsumo
e na correlação de forças no âmbito do Estado. A história relata aumenta. Os setores de grandes concorrências aumentam em seus
que é no final do século XIX o período em que o Estado capitalista investimentos demandando o surgimento de novas tecnologias e
passa a assumir e a realizar ações sociais mais amplas, planejadas diminuindo os postos de trabalho.
e sistematizadas sob caráter de obrigatoriedade. Tais contradições geram uma concorrência acirrada de vários
Assim o século XX vive transformações globais desenfreadas grupos monopolistas que disputam o mercado nacional e o mercado
que alteram a vida de bilhões de pessoas no mundo. As internacional. Contudo, criam-se mecanismos extra econômicos
transformações no mundo do trabalho determinaram novos de controle, por meio do Estado, na perspectiva neoliberal ou na
padrões de organização e gestão da indústria, novos tipos de perspectiva social-democrática, para controlar as ameaças aos
relações e contratos de trabalho e comercialização, altos índices de lucros dos monopólios.
investimentos em avanços tecnológicos e de automação. Todas essas modificações estendem-se em nível planetário
O padrão dominante taylorista/fordista, surgido nos anos 30 no chamado “mundo” de globalização, que se expressa como
(século XX), após a chamada Grande Depressão, fundamentado na nova modalidade de dominação imposta pelo capital por meio da
produção maciça de mercadorias em grandes fábricas, concentradas
intensificação do intercâmbio mundial de mercadorias, preços,
e verticalizadas, com rígido controle do processo de trabalho que
ideias, informações, relações de produção, proporcionando
reunia grande número de trabalhadores manuais, especializados,
mudanças significativas nas relações humanas. Para Netto, a
relativamente bem pagos e protegidos pela legislação trabalhista,
globalização, ainda, vem agudizando o padrão de competitividade
passa a ser substituído ao entrar em crise, e é substituído pela
intermonopolista e redesenhando o mapa político-econômico
chamada acumulação flexível, ou seja, a descentralização da
do mundo: para assegurar mercados e garantir a realização de
economia, com o chamado modelo japonês toyotista que supõe um
superlucros, as grandes corporações têm conduzido processos
processo de modificações enfeixadas no mote da flexibilização. Este
modelo apresenta uma nova racionalidade produtiva como afirma supranacionais de integração, os megablocos (União Europeia,
Antunes tem-se um sistema que responde imediata e diretamente Nafta, APEC) que, até agora, não se apresentam como espaços
às demandas que são colocadas e que possui a flexibilidade para livres de problemas para a concentração dos interesses do grande
alterar o processo produtivo de modo que não se opere com capital.
grandes estoques, mas com estoque mínimo; de modo que se tenha Dessa forma, o fenômeno da globalização se por um lado
um sistema de produção ou de acumulação flexível, que se adeque permite o intercâmbio mundial por meio da maior interação
a essas alterações cotidianas de mercado. Enfim, um processo entre os povos, por outro, tem trazido uma série de contradições
produtivo flexível que atenda esta ou aquela rigidez característica e divergências: o aumento do desemprego estrutural, a exclusão
de produção em linha de montagem do tipo fordista [...]. É então social, o aumento da pobreza, guerras políticas e religiosas e
um processo de organização do trabalho fundado numa resposta outros, ratificando a lógica do capital, que trazem a concentração
imediata à demanda, numa organização flexível do trabalho, numa da riqueza nas mãos dos setores monopolizados e o acirramento da
produção integrada e que supõe necessariamente o envolvimento desigualdade social.
do trabalho, acarretando o estranhamento do trabalhador, sua Para atenuar as contradições postas pelas “crises cíclicas
“alienação” do trabalho que se torna menos despótico e mais de superprodução, superacumulação e subconsumo da lógica do
manipulatório [...]. Um sistema de produção flexível supõe direitos capital” e manter a ordem, ocultar as consequências nefastas do
do trabalhador também flexíveis, ou de forma mais aguda, supõe a capitalismo, criam-se mecanismos políticos e econômicos que
eliminação dos direitos do trabalho [...]. garantem a reprodução do sistema e formam um amplo aparato
Estas transformações afetam as relações de trabalho e o ideológico que procura naturalizar e perpetuar este modelo
cotidiano do trabalhador, em seus direitos como a educação, de sociedade. Após a Segunda Guerra Mundial, consolidou-
a saúde, a habitação, o lazer, a vida privada. Contudo, o que se o chamado Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) e
permanece é o modelo societário capitalista sob o qual ocorrem posteriormente o neoliberalismo.
tais modificações. E assim, este se estabelece, no final do século O ideário do Estado de Bem-Estar Social é proposto pela teoria
XX, não mais como concorrencial. E com a Era Imperialista, keynesiana em países da Europa e nos Estados Unidos da América
tem-se uma hegemonia que se efetiva a partir da consolidação de que tinha como princípio de ação o pleno emprego e a menor
grandes grupos monopolizados (concentração do capital). desigualdade social entre os cidadãos. É erigido pela concepção

Didatismo e Conhecimento 19
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
de que os governos são responsáveis pela garantia de um mínimo Com o avanço das ideias neoliberais, ganha espaço o discurso
padrão de vida para todos os cidadãos, como direito social. É vitorioso do capitalismo. Tem-se uma realidade ideológica em
baseado no mercado, contudo com ampla interferência do Estado defesa dos interesses do capital, favorecendo grupos monopolizados,
que deve regular a economia de mercado de modo a assegurar o em detrimento dos trabalhadores, realidade essa, velada por
pleno emprego, a criação de serviços sociais de consumo coletivo, um discurso de direitos individuais, tem-se a naturalização da
como a educação, saúde e assistência social para atender a casos desigualdade social, a busca pela eficiência e competitividade no
de extrema necessidade e minimizar a pobreza. mundo da globalização. Segundo Sposati (2000), o maior impacto
Faleiros afirma, é pelo Estado Bem-Estar que o Estado garante da globalização se manifesta na desregulamentação da força de
ao cidadão a oportunidade de acesso gratuito a certos serviços e a trabalho, no achatamento de salários e no aumento do desemprego.
prestação de benefícios mínimos para todos. Nos Estados Unidos, Esta é a face perversa da globalização, pois em vez de traduzir
esses benefícios dependem de critérios rigorosos de pobreza e os melhores condições aos povos, ela vem trazendo a globalização da
serviços de saúde não são estatizados, havendo serviços de saúde indiferença com os excluídos.
para os velhos e pobres. O “acesso geral” à educação, à saúde e à O neoliberalismo passou a ditar o ideário de um projeto
justiça existente na Europa decorre de direitos estabelecidos numa societário a ser implementado nos países capitalistas para restaurar
vasta legislação que se justifica em nome da cidadania. O cidadão o crescimento estável. Tendo como assertivas a reestruturação
é um sujeito de direitos sociais que tem igualdade de tratamento produtiva, a privatização acelerada, o enxugamento do Estado,
perante as políticas sociais existentes. as políticas fiscais e monetárias sintonizadas com os organismos
Com essa realidade, ampliaram-se as funções econômicas e mundiais de hegemonia do capital como o Fundo Monetário
sociais do Estado que passou a controlar parcialmente a produção e Internacional (FMI).
a assumir despesas sociais. Essas transformações do Estado foram Para essa realidade, vive-se o desmonte da cidadania social,
de acordo com a força do movimento trabalhista e ocorreram nos uma das maiores conquistas democráticas e o abalo da utopia de
chamados países desenvolvidos da Europa e nos Estados Unidos. construção de uma sociedade livre de incertezas e desamparos
O Estado de Bem-Estar Social buscou assegurar um acordo sociais (Estado de Bem-Estar Social).
de neutralidade nas relações das classes sociais e amortecer a Como afirma Pereira (2000), tem-se em quase todo o mundo, o
crise do capitalismo com a sustentação pública de um conjunto desmonte das políticas nacionais de garantias sociais básicas, cujas
de medidas anticrise. Entretanto, foram beneficiados os interesses principais implicações estão voltadas aos cortes de programas
monopólicos. E como afirmam Behring & Boschetti (2006), as sociais à população de baixa renda, à diminuição dos benefícios da
seguridade social e à criminalização da pobreza com o incentivo
políticas sociais se generalizam nesse contexto, compondo o rol de
às práticas tradicionais de clientelismo, à filantropia social e
medidas anticíclicas do período, e também foram o resultado de um
empresarial, à solidariedade informal e ao assistencialismo,
pacto social estabelecido nos anos subsequentes com segmentos
revestidos de práticas alternativas e inovadoras para uma realidade
do movimento operário, sem o qual não podem ser compreendidas.
de pobreza e exclusão social.
Nos chamados países pobres e dependentes da América
No que diz respeito ao Estado Capitalista, este sempre
Latina, especialmente no Brasil, nunca ocorreu a garantia do
assumiu historicamente os interesses da burguesia, da classe
bem-estar da população por meio da universalização de direitos
dominante assegurando muitos favorecimentos e benefícios para a
e serviços públicos de qualidade. Segundo Faleiros (1991), nos
primazia do lucro. Afirma Netto (1996) que “[...] a desqualificação
países pobres periféricos não existe o Welfare State nem um pleno do Estado tem sido, como se sabe, a pedra-de-toque do privatismo
keynesianismo em política. Devido à profunda desigualdade da ideologia neoliberal: a defesa do ‘Estado Mínimo’ pretende
de classes, as políticas sociais não são de acesso universal, fundamentalmente o ‘Estado Máximo’ para o Capital”.
decorrentes do fato da residência no país ou da cidadania. São O enfrentamento do Estado Nacional mediante as exigências
políticas “categoriais”, isto é, que tem como alvo certas categorias da globalização capitalista, em transferir as responsabilidades e as
específicas da população, como trabalhadores (seguros), decisões do mesmo para o mercado, o bem comum dos cidadãos
crianças (alimentos, vacinas) desnutridas (distribuição de leite), para a iniciativa privada, a soberania da nação para a ordem social
certos tipos de doentes (hansenianos, por exemplo), através de capitalista dominante no cenário mundial (Abreu, 2000) vêm
programas criados a cada gestão governamental, segundo critérios acompanhados de desregulamentação e de extinção de direitos
clientelísticos e burocráticos. Na América Latina, há grande sociais, mas com uma “proposta” de modernização, liberdade,
diversidade na implantação de políticas sociais, de acordo com democracia e cidadania.
cada país [...]. Os rebatimentos do neoliberalismo (ideologia capitalista) nas
A década de 1970 enfrentou o declínio do padrão de bem- políticas sociais são desastrosos. Estas passam a ter um caráter
estar por meio da crise capitalista agravada pelos reduzidos índices eventual e complementar por meio de práticas fragmentadas e
de crescimento com altas taxas de inflação. A regulamentação compensatórias, como afirma Laurell (1997), o Estado só deve
do mercado por parte do Estado e o avanço da organização intervir com o intuito de garantir um mínimo para aliviar a pobreza
dos trabalhadores passam a ser considerados entraves à livre e produzir serviços que os privados não podem ou não querem
acumulação de capitais. produzir, além daqueles que são, a rigor, de apropriação coletiva.
Na década seguinte, com a queda dos regimes socialistas do Propõem uma política de beneficência pública ou assistencialista
leste europeu, a crise fiscal do Estado de Bem-Estar e a estagnação com um forte grau de imposição governamental sobre que
da economia ganham forças e os argumentos neoliberais programas instrumentar e quem instruir, para evitar que se gerem
recuperando as ideias liberais propõem a mínima regulamentação “direitos”. Além disso, para se ter acesso aos benefícios dos
do mercado e a ampla liberdade econômica dos agentes produtivos. programas públicos, deve-se comprovar a condição de indigência.

Didatismo e Conhecimento 20
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Rechaça-se o conceito dos direitos sociais e a obrigação da a ser utilizadas como meio de subordinação dessa população aos
sociedade de garanti-los através da ação estatal. Portanto, o padrões vigentes [...] Do ponto de vista do capital, tais serviços
neoliberalismo opõe-se radicalmente à universalidade, igualdade constituem meios de socializar os custos de reprodução da força
e gratuidade dos serviços sociais. de trabalho, preferível à elevação do salário real, que afeta
O cumprimento do ideário neoliberal pelos diversos países diretamente a lucratividade da classe capitalista [...] A filantropia
terá influência sobretudo por sua tradição histórica e cultural, é redefinida na perspectiva da classe capitalista: a “ajuda” passa
pelo regime político vigente inserido no mundo globalizado, bem a ser concebida como investimento. Não se trata de “distribuir”
como pelo enfrentamento da questão social (que será abordado no mas de “construir”, de favorecer a acumulação do capital. É esta a
último item deste capítulo) e pelo nível de organização da classe lógica que preside a organização dos serviços sociais.
trabalhadora. Ficam portanto, evidentes, a partir da autora, as funções das
Não será aprofundada essa questão, senão apresentada políticas sociais (e públicas) que são: econômica, política e social.
a implementação das políticas sociais no Brasil destinadas a No que diz respeito à função econômica, tem-se a ação do
minimizar a questão social que, nas primeiras décadas do século Estado por meio da transferência direta ou indireta (pagos pela
XX, foi tratada como questão de polícia. população por meio de impostos) de bens, recursos e outros,
As políticas sociais brasileiras estão diretamente relacionadas aos usuários mais carentes da população, oferecidos em forma
às condições vivenciadas pelo País em níveis econômico, político de prestação de serviços sociais como a saúde, a educação e a
e social. Estão, portanto, no centro do embate econômico e político assistência social, visando ao “barateamento da força de trabalho
deste início de século, pois a inserção do Brasil (país periférico e consequente acumulação ampliada do capital”. Essas ações
do mundo capitalista) no mundo globalizado, far-lo-á dependente apresentam-se como formas compensatórias às quedas do salário
das determinações e decisões do capital e das potências mundiais real, desobrigando o capitalista a atender exclusivamente as
hegemônicas. necessidades de sobrevivência e reprodução da força de trabalho.
Para entender o real significado das políticas sociais, deve-se Com isso, no contexto atual, parte desses custos são retirados das
relacioná-las estreitamente a suas funções, que, segundo Pastorini empresas e designadas ao Estado que possui a tarefa de suprir as
(1997), partindo da perspectiva marxista, as políticas sociais necessidades básicas da classe trabalhadora, por meio das políticas
devem ser entendidas como produto concreto do desenvolvimento sociais.
capitalista, de suas contradições, da acumulação crescente do Deve-se reconhecer, então que o Estado assume o papel de
capital e, assim, um produto histórico, e não consequência de
anticrise por meio das políticas sociais, que contribuem para
um desenvolvimento “natural”. As políticas sociais desenvolvem
a subordinação do trabalho ao capital, com a força da mão de
algumas funções primordiais no mundo capitalista: função social,
obra ocupada e excedente e também pela adequação e controle
econômica e política.
da população trabalhadora que pode ter condições de consumo
A começar pela função social, afirma-se que as políticas sociais
contra a tendência nefasta do subconsumo. Como afirma Netto
têm por objetivo o atendimento redistributivo dos recursos sociais,
(1996), através da política social, o Estado burguês no capitalismo
por meio de serviço sociais e assistenciais, para um complemento
monopolista procura administrar as expressões da “questão
salarial às populações carentes. Contudo, esta função dissimula
social” de forma a atender às demandas da ordem monopólica
as verdadeiras funções que as políticas sociais desempenham
no mundo capitalista ao apresentarem-se como mecanismos conformando, pela adesão que recebe de categorias e setores cujas
institucionais que compõem uma rede de solidariedade social demandas incorpora, sistemas de consenso variáveis, mas operantes
que objetiva diminuir as desigualdades sociais, oferecendo mais [...] a funcionalidade essencial da política social do Estado burguês
serviços sociais àqueles que têm menos recursos. no capitalismo monopolista se expressa nos processos referentes à
Neste sentido, como analisa Iamamoto (2002), são devolvidos preservação e ao controle da força de trabalho ocupada, mediante a
aos usuários os serviços sociais de direito: saúde, educação, regulamentação das relações capitalistas/trabalhadoras [...].
política salarial, trabalho, habitação, lazer e outros, como benesse, Neste sentido, as políticas sociais apresentam-se como
assistência, filantropia, favor, ou seja, medidas parcelares e setoriais estratégias governamentais de integração da força de trabalho na
que o Estado oferece nas questões sociais para manter o controle relação de trabalho assalariado, destinadas a atender problemáticas
e a ordem social. Essa ação paternalista do Estado tende a inibir particulares e específicas apresentadas pela questão social
crises sociais e legitimam seu discurso demagógico de cooperação (produto e condição da ordem burguesa), contribuindo para uma
entre as classes sociais e o ajustamento da classe trabalhadora às subordinação dos trabalhadores ao sistema vigente e reproduzindo
regras do modelo neoliberal. as desigualdades sociais decorrentes das diferentes participações
Do ponto de vista da classe trabalhadora, estes serviços no processo de produção.
podem ser encarados como complementares, mas necessários Por fim, a função política das políticas sociais diz respeito
à sua sobrevivência, diante de uma política salarial que mantém ao contexto de lutas entre as classes sociais opostas, não podendo
aquém das necessidades mínimas historicamente estabelecidas ser vistas como meros favores das classes dominantes para os
para a reprodução de suas condições de vida. São ainda vitais, dominados, nem como conquista das reivindicações e pressões
mas não sufi cientes, para aquelas parcelas da força de trabalho populares. Na concepção geral de Estado, tem-se interesses e
alijadas momentaneamente do mercado de trabalho ou lançadas disputas das classes, não sendo exclusivamente instrumento da
no pauperismo absoluto. Porém, à medida que a gestão de tais classe dominante. Com isso, as políticas sociais apresentam-se
serviços escapa inteiramente ao controle dos trabalhadores, como expressão da correlação de forças e lutas na sociedade civil,
não lhes sendo facultado opinar e intervir no rumo das políticas e concessões dos grupos majoritários no poder objetivando obter
sociais, as respostas às suas necessidades de sobrevivência tendem legitimidade e controle social.

Didatismo e Conhecimento 21
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Segundo Faleiros (1991), as políticas sociais devem ser vigente, nos repasses dos recursos financeiros, nas relações de
entendidas como produto histórico concreto a partir do contexto trabalho, com um mercado altamente seletivo e excludente e
da estrutura capitalista; com isso: outros. E com Vieira pode-se afirmar que se tem no Brasil uma
As políticas sociais são formas de manutenção da força de “política social sem direitos”.
trabalho econômica e politicamente articuladas para não afetar Como exemplo nacional, algumas leis complementares foram
o processo de exploração capitalista e dentro do processo de regulamentadas a partir da proposta constitucional de 1988, como
hegemonia e contra hegemonia da luta de classes. [...] as políticas a Lei n. 8.069 de 1990 – o Estatuto da Criança e do Adolescente
sociais, apesar de aparecerem como compensações isoladas para – a Lei n. 8742 de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social –
cada caso, constituem um sistema político de mediações que visam resultantes de uma ampla mobilização dos segmentos da sociedade
à articulação de diferentes formas de reprodução das relações representantes de diversas categorias sustentados pelo paradigma
de exploração e dominação da força de trabalho entre si, com o da cidadania que, segundo Boff (2000), entende-se por cidadania
processo de acumulação e com as forças políticas em presença. o processo histórico-social que capacita a massa humana a forjar
Mediante esse breve entendimento das funções das políticas condições de consciência, de organização e de elaboração de um
sociais há que se considerar que estas não podem ser entendidas projeto e de práticas no sentido de deixar de ser massa e de passar a
como um movimento linear e unilateral, ou seja, do Estado para ser povo, como sujeito histórico plasmador de seu próprio destino.
a sociedade civil como concessão ou da sociedade civil para O grande desafio histórico é certamente este: como fazer das
o Estado como luta e conquista, contudo têm de ser analisadas massas anônimas, deserdadas e manipuláveis um povo brasileiro
como um processo dialético entre as classes sociais, como afirma de cidadãos conscientes e organizados. É o propósito da cidadania
Pastorini (1997). como processo político-social e cultural.
As políticas sociais no Brasil tiveram, nos anos 80, formulações Na realidade vigente, o desrespeito às leis complementares
mais impactantes na vida dos trabalhadores e ganharam mais da Constituição tem sido a tônica de vários governos,
impulso, após o processo de transição política desenvolvido em consequentemente temos o descaso com a população trabalhadora
uma conjuntura de agravamento das questões sociais e escassez e assim as políticas sociais continuam assistencialistas e mantêm
de recursos. Não obstante, as políticas sociais brasileiras sempre a população pobre, grande parte miserável, excluída do direito à
tiveram um caráter assistencialista, paternalista e clientelista, com cidadania, dependente dos benefícios públicos, desmobilizando,
o qual o Estado, por meio de medidas paliativas e fragmentadas, cooptando e controlando os movimentos sociais.
intervém nas manifestações da questão social, preocupado, O que se pode constatar diante do exposto, é que a efetivação
de políticas sociais (públicas ou privadas) reflete a realidade
inicialmente, em manter a ordem social. São elas formatadas
marcante de um país dependente e está condicionada ao modelo
a partir de um contexto autoritário no interior de um modelo de
neoliberal, que prevê que cada indivíduo garanta seu bem-estar em
crescimento econômico concentrador de renda e socialmente
vez da garantia do Estado de direito.
excludente.
Outro aspecto a destacar é que os avanços da legislação não
Assim afirma Vieira, que a política social brasileira compõe-
podem negar seus limites. O fundamento das desigualdades sociais
se e recompõe-se, conservando em sua execução o caráter
está alicerçado na forma de produção da riqueza que, na sociedade
fragmentário, setorial e emergencial, sempre sustentada pela
capitalista, se sustenta sobre a propriedade privada dos meios de
imperiosa necessidade de dar legitimidade aos governos que
produção e nas contradições de classe. Diante disso, o homem torna-
buscam bases sociais para manter-se e aceitam seletivamente as
se sujeito coletivo e transformador das relações existentes. Então,
reivindicações e até as pressões da sociedade. a busca pela transformação social é um processo que necessita do
Nos anos 80, o País viveu o protagonismo dos movimentos fortalecimento da população e de protagonistas na conquista de
sociais que contribuiu com uma série de avanços na legislação direitos, na participação, que segundo Marx (1982), “a história
brasileira no que diz respeito aos direitos sociais. dos homens é a história de suas relações sociais, e capitalismo é
A Constituição Federal, promulgada em 1988, chamada expressão da luta de classe entre burguesia e proletariado”.
Constituição Cidadã, pauta-se em parâmetros de equidade e direitos Cabe aos sujeitos sociais a construção e a transformação
sociais universais. Consolidou conquistas, ampliou os direitos nos das relações sociais. São diversos os segmentos presentes nesta
campos da Educação, da Saúde, da Assistência, da Previdência luta, especialmente os profissionais, assistentes sociais, que têm o
Social, do Trabalho, do Lazer, da Maternidade, da Infância, da compromisso de mediar as relações entre Estado, trabalhadores e
Segurança, definindo especificamente direitos dos trabalhadores Capital e gerir as políticas sociais. Neste início de milênio, o cenário
urbanos e rurais, da associação profissional e sindical, de greve, colocado pelo capitalismo em seu modelo neoliberal, coloca para
da participação de trabalhadores e empregadores em colegiados o Brasil questões agravantes como alto índice de desempenho,
dos órgãos públicos, da atuação de representante dos trabalhadores aumento da concentração de renda/riqueza, empobrecimento e
no entendimento direto com empregadores (artigos 6 a 11, do miserabilidade da população.
Capítulo II, do Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais). E, nessa dinamicidade da história, o novo milênio traz em
Assim, pela primeira vez na história brasileira, a política seu bojo o desejo de um novo projeto societário com referência a
social teve grande acolhimento em uma Constituição. Entretanto, conquista dos direitos da cidadania. Daí o redimensionamento das
duas décadas depois pode-se afirmar que nunca houve tantos políticas sociais que poderão sinalizar uma distribuição de renda
desrespeitos à sociedade brasileira, como hoje, por meio de equitativa. Tal realidade tem um impacto direto na atuação do
violações, fraudes e corrupções explícitas do Estado, da classe Serviço Social que atua na elaboração, na organização e na gestão
hegemônica, dos representantes do poder e do povo, na legislação das políticas sociais.

Didatismo e Conhecimento 22
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Organização e gestão das políticas sociais amplo movimento social de participação política que conferiu
visibilidade social a propostas de democratização e ampliação de
Conforme discutido anteriormente, as políticas sociais no direitos em todos os campos da vida social.
Brasil emergem no final da República Velha, especialmente nos No cenário das relações entre Estado e sociedade civil,
anos 20 (séc. XX), e começam a conquistar espaço no período surgiram neste período novos espaços em que forças sociais
getulista. Contudo, até a Constituição Federal de 1988, o País não foram protagonistas na formulação de projetos societários para o
tinha um aparato jurídico-político que apontasse para a formação enfrentamento da crise social que assolou o Brasil nos anos 80 e a
mínima de padrões de um Estado de Bem-Estar Social. Na década disseminação da pobreza e da miséria, que colocou o País em alto
de 1980, foram reorganizadas as políticas sociais contra a ditadura nível de desigualdade social.
militar e têm sido, nos últimos anos, ocasião de debates no A Constituição Federal de 1988 definiu instrumentos de
contexto das lutas pela democratização do Estado e da sociedade participação da sociedade civil no controle da gestão das políticas
no Brasil. Novos interlocutores e sujeitos sociais surgiram no sociais, estabeleceu mecanismos de participação e implementação
campo das políticas sociais por meio da participação de segmentos destas políticas, apontou canais para o exercício da democracia
organizados da sociedade civil na formulação, implementação, participativa, por meio de decisões direta como o plebiscito,
gestão e controle social destas políticas. referendo e de projetos de iniciativa popular. Nesta perspectiva,
Esse fenômeno ocorre a partir da crise dos anos 80 (séc. a Carta Constitucional instituiu a criação de conselhos integrados
XX), que se depara com realidades determinantes de ordem por representantes dos diversos segmentos da sociedade civil para
política, vinculada à crise da ditadura e à transição marcada colaborar na implementação, execução e controle das políticas
pela democratização do Brasil, e de ordem econômica e social, sociais.
decorrentes do processo de reorganização mundial do capitalismo. Hoje, esses conselhos, que expressam uma das principais
Situação essa consequente da crise do chamado Estado de Bem- inovações democráticas no campo das políticas sociais,
Estar Social, em meados da década de 1970 e da derrocada do Leste organizam-se em diferentes setores destas políticas e assumem
Europeu, nos anos 80, que se abriram às propostas neoliberais, uma representatividade nas diferentes esferas governamentais.
findando as concepções do Estado, enquanto instância mediadora Possuem uma composição paritária entre representantes da
da universalização dos direitos sociais. sociedade civil e do governo e função deliberativa no que se refere
Neste cenário de redefinições das relações entre Estado à definição da política em cada setor e ao controle social sobre sua
e sociedade civil, acontecem muitas mobilizações de grupos execução.
e protagonistas sociais por meio de debates e propostas no Por meio dessa concepção dinâmica da sociedade, é possível
enfrentamento da crise social, que desencadearam no processo acreditar que os espaços de representação social na organização
constituinte resultando na reforma Constitucional em 1988. e gestão das políticas sociais devem ser ampliados, buscando a
Neste contexto da chamada década perdida de 1980, em participação de novos e diferentes sujeitos sociais, especialmente,
função da crise da ditadura, do agravamento da questão social, do os tradicionalmente excluídos do acesso às decisões do poder
aumento da pobreza e da miséria e da luta pela democratização político.
do País, Estado e sociedade, intensificam-se as discussões sobre Várias são as experiências hoje, de organização dos conselhos,
as políticas sociais de caráter público. É importante ressaltar nas áreas da saúde, da criança e do adolescente, da educação, da
que, embora seja um período intenso das desigualdades sociais, assistência social e de outras; são novas formas de participação
também é marcado dialeticamente por conquistas democráticas da sociedade civil na esfera pública com uma proposta de
sem precedentes na história política brasileira. democratização das políticas sociais, porém muitas vezes na
As políticas sociais no período de 1964 a 1988, eram políticas contraposição do modelo neoliberal legitimado pelos governos
de controle, seletivas, fragmentadas, excludentes e setorizadas. vigentes. Para Raichelis (2000):
Daí a necessidade de questionar esse padrão histórico das políticas O termo público-estatal (publicização) tem despertado uma
sociais e propor a democratização dos processos decisórios na polêmica político-ideológica pela apropriação do seu significado,
definição de prioridades, na elaboração, execução e gestão dessas que remete ao caráter das relações entre o Estado e sociedade na
políticas. Nesse sentido, a elaboração e a conquista das políticas constituição da chamada esfera pública [...] é adotado numa visão
sociais passam ainda por processos de pressões e negociações ampliada de democracia, tanto do Estado quanto da sociedade
entre as forças políticas vigentes e uma relativa transparência das civil, e na implementação de novos mecanismos e formas de
articulações. atuação, dentro e fora do Estado, que dinamizem a participação
Nessa dinâmica, travou-se, a partir de 1985, com a Assembleia social para que ela seja cada vez mais representativa da sociedade,
Constituinte, uma luta na sociedade em torno da definição de especialmente das classes dominadas.
novos procedimentos e de regras políticas que regulassem as Neste sentido, busca-se romper com a subordinação histórica
relações do Estado com a sociedade civil, objetivando criar um da sociedade civil frente ao Estado, por meio da construção de
novo posicionamento democrático. espaços de discussão e participação da sociedade civil na dimensão
Dados históricos, segundo Raichelis (2000), revelam intensa política da esfera pública, rumo à universalização dos direitos de
participação da sociedade brasileira em função da Assembleia cidadania.
Constituinte, reuniram-se na Articulação Nacional de Entidades A conquista de novos espaços de participação da sociedade
pela Mobilização Popular na Constituinte, cerca de 80 organizações, civil consolidou-se na construção de descentralização das ações,
algumas de âmbito nacional, compostas por associações, sindicatos, com maior responsabilidade dos municípios na formulação e na
movimentos sociais, partidos, comitês plenárias populares, fóruns, implantação de políticas sociais, na transferência de parcelas de
instituições governamentais e privadas, que se engajaram num poder do Estado para a sociedade civil organizada. Os conselhos

Didatismo e Conhecimento 23
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
paritários e deliberativos no âmbito das políticas públicas foram a campo das políticas sociais, por outro, tem-se apresentado à
estratégia privilegiada. Ou seja, são compostos por representantes profissão a urgência da qualificação em seu aspecto teórico-prático
de entidades da sociedade civil e representantes do governo que e ético-político, para atuar na elaboração dos planos nas esferas
devem, em conjunto, participar do planejamento, das decisões e governamentais.
do controle de políticas sociais setoriais. Os conselhos são espaços No que diz respeito à participação e à descentralização político
públicos de discussão, decisão, acompanhamento e fiscalização administrativa no campo das políticas sociais, essas estratégias
de ações, programas e distribuição de recursos. E para Raichelis revelam um recente processo de redemocratização vivenciado
(2000, p.66), os conselhos são “expressões de novas relações no Brasil, para integrar a relação entre Estado e sociedade.
políticas entre governos e cidadãos e um processo de interlocução Conforme afirma Stein (1997), a descentralização adquiriu um ar
permanente: de modernidade e recentemente constituiu palavra de ordem no
Os conselhos significam o desenho de uma nova mundo político e administrativo, especialmente no Brasil, a partir
institucionalidade nas ações públicas, que envolvem distintos do processo constituinte de 1987. Dentre os princípios enumerados
sujeitos nos âmbitos estatal e societal. A constituição de tais pela nova Constituição de 1988, o da descentralização política-
espaços, tornou-se possível, também, em virtude das mudanças administrativa demarca uma nova ordem política na sociedade,
a partir do momento que à sociedade é garantido o direito de
que se processavam nos movimentos populares que, de costas
formular e controlar políticas, provocando um redirecionamento
para o Estado no contexto da ditadura, redefiniram estratégias e
nas tradicionais relações entre Estado e sociedade.
práticas, passando a considerar a participação institucional como
A descentralização implica transferência de poderes,
espaço a ser ocupado pela representação popular. atribuições e competências, baseia-se em uma divisão de trabalho
Por meio dos conselhos, objetiva-se propor alternativas social entre a União, o Estado e o Município, onde este responde
de políticas públicas, criar espaços de debates entre governos e pela formulação, organização e implementação das ações, sem
cidadãos, buscar mecanismos de negociação, conhecer a lógica abrir mão do apoio técnico-financeiro dos níveis supra municipais
burocrática estatal para socializar as ações e deliberações, de governo, de acordo com o que determina a Constituição
ultrapassar interesses particulares e corporativistas em atendimento Federal. O processo de descentralização pressupõe a existência
às demandas populares. Tem-se uma realidade dinâmica que busca da democracia, da autonomia e da participação, entendidas como
a construção de esferas públicas autônomas e democráticas em medidas políticas que passam pela redefinição das relações de
relação às decisões políticas e assim, rever as relações entre espaço poder, como componentes essenciais do desenvolvimento de
institucional e práticas societárias. políticas sociais voltadas às necessidades humanas e à garantia de
Hoje, têm-se nos municípios brasileiros um grande número direitos dos cidadãos.
de conselhos implementados em diferentes setores, o que revela Contudo, o que se sabe nacionalmente, é que os princípios
um novo modelo de participação da sociedade na gestão pública, proclamados não alcançaram o plano das intenções, ou seja, não
oriundo das lutas sociais das últimas décadas, que propõem uma existiu uma verdadeira política nacional de descentralização que
redefinição das relações entre espaço institucional e práticas orientasse a reforma das diferentes políticas sociais, salvo a área
societárias, como forças antagônicas e conflitantes que se da saúde, como tem sido destaque em sua reforma que resultou
completam na busca de uma sociedade democrática. em uma política deliberada e radical de descentralização, não
É evidente que a garantia legal da criação e da implementação obstante, com resultados positivos comprometidos, tendo em
desses conselhos, não garante a efetivação e a operacionalização vista as dificuldades de relacionamento entre as diferentes esferas
de todos, assim como a participação popular não pode tão pouco de governo e o setor privado prestador de serviço, por meio dos
ser reduzida apenas ao espaço dos conselhos, sejam eles de graves problemas de financiamento (Silva, 1995). Outros fatores,
assistência social, criança e adolescente, educação, saúde e outros. como: a ausência de redistribuição de competências e atribuições,
Tal participação apresenta-se como forma de participação política a crise fiscal (crise do capitalismo) associada às indefinições do
da sociedade civil organizada e que precisa ser devidamente governo federal, interesses particulares em manter uma estrutura
de centralização, ausência de um programa nacional planejado
acompanhada e avaliada. Com um acompanhamento sistemático
de descentralização na consecução e articulação de programas e
das práticas dos conselhos, nas diferentes políticas sociais e
projetos nas políticas sociais contribuíram para a não efetivação
nos diversos níveis governamentais, sinaliza para o perigo da
desta proposta constitucional.
burocratização, da rotina e da cooptação pelos órgãos públicos, Com essa realidade acima apresentada, vê-se que as
centralizando as decisões nas mãos do poder governamental, estratégias de implementação das políticas sociais são várias.
neutralizando ou fragilizando a autonomia dos conselhos em suas Vão desde um Estado provedor de bens e serviços até um Estado
ações e decisões. que responsabiliza a sociedade civil, por meio de suas redes de
Tem-se na realidade dos muitos municípios brasileiros essa filantropia e solidariedade, no enfrentamento das expressões
interferência dos órgãos governamentais principalmente no que das questões sociais e colocando-a diante do desafio de discutir
diz respeito às decisões relativas ao orçamento, processo eleitoral e decidir a importância da descentralização e participação como
dos conselheiros, a escolha das presidências e outros. estratégia de democratização das relações de poder e de acesso a
Apresenta-se como desafio, então, a formação dos bens e serviços públicos (Stein, 2000).
conselheiros, sobretudo da sociedade civil, nas competências Diante disso, a formulação, o acesso e a qualidade das políticas
políticas, econômicas, éticas, sociais, e outras, para o exercício de sociais é tarefa difícil, pois pressupõe a existência de recursos
seu papel com seriedade e compromisso social na gestão pública. financeiros e financiamentos sufi cientes para atender às demandas
Diante disso, o profissional de Serviço Social tem se inserido da população e às responsabilidades do poder público, bem como a
com frequência nos conselhos em suas diferentes áreas. Se por gestão financeira de instrumentos que assegurem a democratização
um lado sua contribuição tem feito avançar a esfera pública no e a transparência na concepção das políticas sociais.

Didatismo e Conhecimento 24
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Hoje, a União arrecada impostos sobre renda, produtos o aspecto da mercantilização da saúde e da previdência social,
industrializados, importação, exportação, operações financeiras, dificultando o acesso universal a esses sujeitos sociais e a proteção
contribuições sociais e outros, sendo parte transferidos para os de direitos do adolescente trabalhador. Também na assistência
fundos de participação dos Estados e dos Municípios, que, por social, observa-se a ampliação do assistencialismo, de programas
sua vez, possuem também suas arrecadações próprias, segundo a focalizados, a ênfase nas parcerias com a sociedade civil e a família,
legislação. atribuindo a elas ações de responsabilidade do Estado; e ainda a
No que tange às políticas sociais, a Constituição Federal, em desconsideração da assistência social como política pública.
seu artigo 194, traz inovações, dentre elas o conceito de seguridade Assim, as políticas sociais devem ser defendidas como
social, com orçamento próprio para cada área (previdência social, instrumento estratégico das classes subalternas na garantia de
saúde e assistência social) e com recursos diferenciados dos que condições sociais de vida aos trabalhadores para sua emancipação
financiariam as demais políticas sociais. humana e a luta organizada para a conquista da emancipação
Segundo Behring & Boschetti (2006), os recursos permanecem política. Com isso, a busca da ampliação dos direitos e das
extremamente concentrados e centralizados, contrariando políticas sociais é essencial, porque envolve milhões de brasileiros
a orientação constitucional da descentralização. Além de espoliados em qualidade de vida, dignidade humana, condições de
concentrados na União – o ente federativo com maior capacidade trabalho. O profissional assistente social é chamado, então, a atuar
de tributação e de financiamento –, também há concentração nas expressões da questão social, formulando, implementando e
na alocação dos recursos nos serviços da dívida pública, juros, viabilizando direitos sociais, por meio das políticas sociais, como
encargos e amortizações, rubrica com destinação sempre maior será abordado abaixo.
que todo o recurso da seguridade social – e para as políticas sociais
que são financiadas pelo orçamento fiscal, a exemplo da educação, A questão social e desafios para a implementação de
reforma agrária e outras, as quais não estão contempladas no políticas sociais
conceito constitucional restrito de seguridade social do Brasil.
Entretanto, mesmo diante do aumento da arrecadação No que diz respeito à questão social, a presente reflexão parte
tributária, não tem ocorrido aumento de recursos para as políticas do princípio relacional da questão social com o modo de produção
sociais de modo geral e especialmente para a seguridade social, capitalista, no bojo do processo de industrialização e do surgimento
que tem sofrido desvios de recursos nos últimos anos e que, por do proletariado e da burguesia industrial. Historicamente, a
meio desses recursos, poderiam ampliar os direitos relativos às “questão social” é nominação surgida na segunda metade do século
políticas de previdência, à saúde e à assistência social. XIX, na Europa ocidental, a partir das manifestações de miséria
Embora com alguns avanços observados no financiamento e de pobreza oriundas da exploração das sociedades capitalistas
das políticas sociais, com a busca da democratização da gestão com o desenvolvimento da industrialização. É neste contexto que
financeira, a implementação de fundos especiais e de participação iniciam as respostas para o enfrentamento desse novo jeito do
popular, aprofundamento do processo de descentralização de capitalismo surgido naquela época.
recursos com relação ao montante transferido, novas formas de Segundo Cerqueira Filho, por questão social, no sentido
repasse e outros, não são suficientes para atender às demandas da universal do termo, queremos significar o conjunto de problemas
população. E o que se tem é o aumento da miséria, da fila dos políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operária
desempregados, dos excluídos e de outros. provocou na constituição da sociedade capitalista. Logo, a questão
Conforme afirmam Behring & Boschetti, a sustentação social está fundamentalmente vinculada ao conflito entre capital e
financeira com possibilidade de ampliação e universalização trabalho.
dos direitos, assim, não será alcançada com ajustes fiscais que No capitalismo concorrencial, a questão social era tratada
expropriam recursos das políticas sociais. A consolidação da de forma repressiva pelo Estado, ou seja, a organização e a
seguridade social brasileira, e da política social brasileira de mobilização da classe operária para a conquista de seus direitos
uma forma geral, já que essa direção atinge também políticas sociais, eram casos de polícia.
que estão dentro do orçamento fiscal, depende da reestruturação Já no início do século XX, com o contexto de emergência
do modelo econômico, com investimentos no crescimento da do capitalismo monopolista, a questão social torna-se objeto de
economia, geração de empregos estáveis com carteira de trabalho, resposta e de estratégia do Estado, por meio de políticas sociais
fortalecimento das relações formais de trabalho, redução do como mecanismo básico de controle das classes trabalhadoras
desemprego, forte combate à precarização, transformação das e, ao mesmo tempo, legitima-se como representativo de toda a
relações de trabalho flexibilizadas em relações de trabalho estáveis, sociedade. Passa a exigir intervenção dos poderes públicos nas
o que, consequentemente, produzirá ampliação de contribuições e questões trabalhistas e a criação de órgãos públicos que pudessem
das receitas da seguridade social e, sobretudo, acesso aos direitos se ocupar dessas questões.
sociais. São criados no Brasil novos aparelhos e instrumentos de
Diante de tudo o que foi exposto, o que se percebe é que controle como o Ministério do Trabalho e a Consolidação das
as políticas sociais são definidas e operacionalizadas a partir Leis Trabalhistas (CLT) que objetivavam mais a desmobilização
das reformas de cunho neoliberal e legitimadas pelas agências e despolitização da classe operária emergente do que a eliminação
internacionais; o projeto neoliberal privilegia a defesa das de conflitos.
privatizações e a constituição do cidadão consumidor. Pensar a questão social na contemporaneidade é um desafio,
Nessa realidade de defesas de privatizações, é sentido um pois esta é reproduzida pela mundialização da economia e
impacto direto, por exemplo, na seguridade social e, assim, as pelo retorno forçado do mercado autorregulado. Esses fatores
políticas referentes à infância, à juventude e à família revelam intensificam-se pela competição e pela concorrência nos Estados

Didatismo e Conhecimento 25
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
por meio de pressões internas e entre os Estados pela intensidade deliberativos das políticas sociais, associações, sindicatos.
das pressões externas e pela capacidade de proteção e direitos Segmentos da sociedade civil reivindicaram inovações de práticas
contra o mercado. No Brasil, isso não ocorre, pois as proteções políticas do País ao exigir o direito à participação na gestão das
de trabalho não possuem raízes de sustentação e sucumbem políticas públicas. O cidadão passa a entender que possui direitos
rapidamente. e reivindica por sua efetividade.
No Brasil hoje, a questão social apresenta-se de forma grave, A democracia passou a conviver com o ajuste estrutural
porque atinge intensamente todos os setores e classes sociais, da economia e com as limitações dos gastos públicos, além da
sendo constantemente ameaçada pelo pauperismo do século XX e necessidade de preparo dos conselheiros e dos gestores para a
pelos excluídos do século XXI e, dessa forma, a realidade vigente prática da gestão democrática e participativa. Embora o pacto
de uma política salarial injusta dificulta a construção de uma federativo previsse a corresponsabilidade do poder nas esferas
sociedade coesa e articulada por meio de relações democráticas e governamentais, União, Estados e Municípios, este último tornou-
interdependentes. se um ente federado, fortalecendo o processo de municipalização
O que se tem no País é uma desmontagem do sistema de das políticas sociais e passou a ser o principal responsável pela
proteção e garantias do emprego e, consequentemente, uma oferta dos serviços sociais, como a saúde, a educação, a assistência
social, ampliando a complexidade da gestão das políticas sociais
desestabilização e uma desordem do trabalho que atingem todas
em nível local.
as áreas da vida social.
Com isso, o município criou vários mecanismos para efetivar
Como afirma Arcoverde, a questão social brasileira
as determinações constitucionais no que diz respeito à participação
assumiu variadas formas, tendo como características orgânicas a e à gestão das políticas sociais. Surgiram os Conselhos de
desigualdade e a injustiça social ligadas à organização do trabalho Políticas Públicas na área da criança e do adolescente, do idoso,
e à cidadania. Resultante da “estrutura social produzida pelo da assistência social, da educação, da saúde e de outros. Entretanto
modo de produção e reprodução vigentes e pelos modelos de os Conselhos necessitam ainda aprender a ser deliberativos, pois
desenvolvimento que o País experimentou: escravista, industrial essa democracia participativa enfrenta o desafio histórico de uma
(desenvolvimentista), fordista – taylorista e o de reorganização “cultura” clientelista e autoritária, pautada no mando e não no
produtiva”. direito.
Assim, as expressões da questão social, tais como: as As políticas sociais podem ser “mecanismos eficientes para
desigualdades e as injustiças sociais são consequentes das relações a democratização do acesso a bens e serviços para a população e
de produção e reprodução social por meio de uma concentração também atuam como condições necessárias ao desenvolvimento
de poder e de riqueza de algumas classes e setores dominantes, econômico e social”.
que geram a pobreza das classes subalternas. E tornam-se questão Dessa forma, propor a construção da igualdade social no
social quando reconhecidas e enfrentadas por setores da sociedade Brasil, visando à conquista da cidadania, exige a efetivação da
com o objetivo de transformação em demanda política e em promessa da universalização dos direitos sociais, políticos e
responsabilidade pública. civis, desafiando um discurso liberal que isenta o Estado das
Com tudo isso, tem-se que a questão social, que deve ser responsabilidades sociais e restringe as políticas sociais à classe
enfrentada enquanto expressão das desigualdades da sociedade social menos favorecida, ou seja, “os pobres mais pobres”,
capitalista brasileira, é construída na organização da sociedade e reduzindo-as a medidas compensatórias, paliativas e focalizadas.
manifesta-se no espaço societário onde se encontram a nação, o As políticas sociais devem possibilitar serviços para os
Estado, a cidadania, o trabalho. cidadãos, como exemplo, a educação pública deve ser para o
Como afirma Iamamoto (2001) “o Serviço Social tem como cidadão, independentemente de classe social, embora, o quadro
tarefa decifrar as formas e expressões da questão social na nacional e o mundial revelem a emergência de atendimento
contemporaneidade e atribuir transparência às iniciativas voltadas das políticas básicas à população mais empobrecida e excluída.
à sua reversão ou enfrentamento imediato”. Conhecer essa realidade social e econômica que gera grande
instabilidade financeira, imenso endividamento dos países pobres,
Dessa forma, é indispensável decifrar as novas mediações,
especialmente o Brasil, com progressiva redução nos investimentos
por meio das quais se expressa a questão social hoje, ou seja, é
produtivos e redução nos índices de crescimentos econômicos em
importante que se possam apreender as várias expressões que
todo mundo, torna-se importante para se lutar por direitos, por
assumem na atualidade as desigualdades sociais e projetar formas trabalho, por democracia e por possibilidades de emancipação
de resistência e de defesa da vida. humana. Tais situações caracterizam-se como grandes desafios,
Continuam questionamentos para o Serviço Social, suas especialmente para o Serviço Social, que possui um Projeto Ético-
possibilidades e seus limites, frente aos desafios do mundo Político Profissional, pautado nesses princípios.
contemporâneo. A busca da implementação de políticas de direito Assim afirma, Boschetti, o Serviço Social ao se constituir
sinaliza como grande desafio ao profissional assistente social que como uma profissão que atua predominantemente, na formulação,
luta pelo protagonismo das classes subalternizadas. planejamento e execução de políticas públicas de educação, saúde,
A década de 1980, no Brasil, pôde ser marcada pela busca previdência, assistência social, transporte, habitação, tem o grande
da democracia, pela organização e pela mobilização de diversos desafio de se posicionar criticamente diante da barbárie que reitera
segmentos da sociedade civil e pela luta por direitos sociais, a desigualdade social, e se articular aos movimentos organizados
políticos e civis contra governos ditadores. em defesa dos direitos da classe trabalhadora e de uma sociedade
Após a declaração constitucional em 1988, do direito à livre e emancipada, de modo a repensar os projetos profissionais
participação popular e à descentralização político-administrativa, nessa direção. Esses são os compromissos éticos, teóricos, políticos
foram ampliados os espaços públicos, por meio de experiências e profissionais que defendemos no Brasil e em nosso diálogo com
da sociedade civil em conselhos comunitários, conselhos o mundo (on-line).

Didatismo e Conhecimento 26
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A complexidade da sociedade atual exige um repensar contínuo
do saber teórico e metodológico da profissão, da ampliação da 2.1 O MUNDO DO TRABALHO NA ERA
pesquisa no conhecimento da realidade social, na produção do DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E
conhecimento sobre a organização da vida social e na busca da DA MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL.
consolidação do projeto ético-político, por meio do exercício
profissional nas atividades diárias, na inserção e participação
política nas entidades nacionais de Serviço Social (CFESS/Cress,
ABEPSS, Enesso), na articulação com outros movimentos sociais
em defesa dos interesses e necessidades da classe trabalhadora Decorrência da Crise de Acumulação
e em luta permanente contra as imposições do neoliberalismo,
contra o predomínio do capital sobre o trabalho, da violência, do No período do pós-Segunda Guerra Mundial até final dos
autoritarismo, da discriminação e de toda forma de opressão e de anos 1960 eram notáveis os índices de crescimento econômico e
exploração humana. as taxas de lucro obtidas pelos proprietários de capital. Foi um
A busca dessa organização política exige a recusa pelo momento em que se combinou crescimento econômico com a
profissional do conservadorismo, do assistencialismo e das práticas conquista de direitos sociais (nos países desenvolvidos) através da
funcionalistas, como parte de uma construção histórica, humana, implementação de políticas de bem-estar social, período em que
intencional e criativa, capaz de possibilitar uma reflexão crítica, a ação do Estado reduziu algumas incertezas que caracterizam a
voltada para a construção do pacto democrático no Brasil, com a economia capitalista.
ampliação da cidadania por meio da implementação de políticas No princípio dos anos 70 do século XX, ocorre o esgotamento
sociais de direito. do ciclo de crescimento da economia capitalista denominado de
Outro aspecto importante para um projeto profissional e “anos dourados”, quando houve uma crise de acumulação com um
societário comprometido com uma nova sociabilidade é o trabalho caráter universal em relação ao tipo de capital, isto é produtivo,
que o assistente social cotidianamente formula e desenvolve, financeiro ou comercial. O alcance da crise foi global e teve
projetos que viabilizam o acesso aos direitos, que questiona o fundo um período de duração relativamente extenso (MÉSZÁROS,
público a favor dos grandes oligopólios, que luta pela socialização 2002). Essa crise combinou a queda generalizada da taxa de
e pela democratização da política, que implementa serviços com lucro, com estagnação econômica, elevação generalizada dos
qualidade aos usuários, envolvendo-os em seu planejamento, que preços e esgotamento das ferramentas tecnológicas da Segunda
se contrapõe às regras institucionais autoritárias e tecnocráticas. Revolução Industrial originando uma recessão. Esse conjunto de
Assim, é um desafio para o Serviço Social incorporar em sua acontecimentos foi caracterizado pela literatura econômica como
formação teórico-crítica e prático-operativa a compreensão das estagflação, e atingiu globalmente os países contribuindo para
diferentes dimensões da questão social na complexa vida moderna. elevar a crise fiscal, agravada nos chamados “países dependentes”
Pensar o conjunto de necessidades sociais que se colocam em razão do endividamento externo.
como campo potencial para a atuação do profissional do Serviço A partir dessa crise ressurge revigorado o debate teórico entre
Social exige um profissional mais refinado, capaz de compreender adeptos da política econômica keynesiana e os neoliberais em torno
para além da brutalidade da pobreza, da exclusão social, da da forma de regulação das atividades econômicas, se a mesma
violência, as possibilidades emancipatórias dos desejos e das deve ser realizada por intervenção estatal ou pelo livre jogo das
escolhas significativas. forças de mercado. Esse debate histórico resultou vantajoso para
É tarefa inerente à profissão compreender a lógica de formação os neoliberais, como indicam as políticas econômicas adotadas a
e o desenvolvimento da sociedade capitalista e os impasses partir dos governos: do Chile de Pinochet (1973), da Inglaterra
colocados pelos conflitos sociais, tendo como campo de atuação de Thatcher (1979), dos Estados Unidos, de Reagan (1980) entre
as expressões da questão social. E nessa perspectiva, o assistente outros.
social defende a luta pela democracia econômica, política e social, A partir de então, diversos governos, inclusive no Brasil, fazem
busca a defesa de valores éticos para o coletivo em favor da uso de orientações de recorte neoliberal nas políticas econômicas
equidade, defende o direito ao trabalho e o emprego para todos, (e sociais), com o objetivo de restabelecer as condições de
a luta pela universalização da seguridade social, com garantia acumulação do capital e consolidar o poder do capital em especial
de saúde pública e previdência para todos os trabalhadores, uma financeiro. Adota-se a chamada economia de mercado, restringe-se
educação laica, pública e universal em todos os níveis, enfim, luta a ação do Estado, se promove à desregulamentação da economia,
pela garantia dos direitos como estratégia de fortalecimento da a privatização das empresas estatais e se adota políticas sociais
classe trabalhadora e mediação fundamental e urgente no processo focalizadas com base na meritocracia e nos mínimos sociais,
de construção de uma sociedade emancipada. (Texto adaptado de enquanto ofensiva do capital para superar a crise.
PIANA, M. C. doutora em Serviço Social).
A Ofensiva do Capital na Produção para Superar a Crise

A ofensiva efetuada para superar a crise teve como base a


análise dos ideólogos neoliberais, como Friederick Von Hayek que
considera que a raiz da crise é o modelo econômico pós-guerra em
que o Estado limita a economia de mercado (negando a análise
da crise estrutural). Para os neoliberais a crise localiza-se no
excessivo poder dos sindicatos, e dos trabalhadores que através das

Didatismo e Conhecimento 27
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
reivindicações e conquistas de aumento de salário e conquista de participaram da definição, enquanto necessidade de assegurar a
direitos sociais fazendo com que o Estado aumentasse os “gastos competitividade, manter o emprego e obter ganhos de participação
sociais”. nos lucros.
Assim, para os neoliberais a superação da crise passa por O estímulo usado para promover o aumento de produtividade
medidas que impactam as conquistas dos trabalhadores como por e disponibilização dos saberes são as compensações materiais
exemplo a flexibilização do contrato de trabalho e a retirada dos e simbólicas para quem contribuir para melhorar a produção, o
direitos, entre os quais alguns presentes na legislação trabalhista. produto e reduzir custos. Aliado a isto, ocorre uma ofensiva
Bem como, realizam as privatizações das estatais e supressão ideológica a fim de obter o envolvimento dos trabalhadores a lógica
da intervenção do Estado na economia, isto é redefinindo o seu do capital desde o processo seletivo, seguindo nos treinamentos,
papel. Ou seja, ocorreu um impulso na liberalização e abertura das e nas reuniões. Contudo a busca da hegemonia, isto é cooptação
economias via desregulamentação viabilizando a mundialização (consentimento) não significa que se abdicou das relações de
do capital, através da maior autonomia do capital para seu dominação, ou seja, de coerção como indicam os controles em
deslocamento facilitado pelas novas tecnologias. relação ao cumprimento das metas, por exemplo. Nesse sentido nas
Esse processo de liberalização econômica é conduzido na relações capitalistas de trabalho coexistem relações de coerção e
perspectiva de favorecer especialmente ao capital produtivo consentimento, sendo que esta última ganhou relevo na atualidade
e financeiro oligopolista. Outro aspecto disso é a crescente diante do seu impacto no aumento da produtividade.
finaceirização da economia através da interpenetração e uso Assim aspecto importante das inovações atuais na organização
de sua lógica pelo capital industrial, comercial e agrícola na da força de trabalho consiste na atenção conferida à subjetividade
medida em que a valorização do capital deixa de ser maximizada do trabalhador, reconhecendo o seu saber buscando sua “captura”
principalmente pela produtividade do trabalho na busca de lucros e simultaneamente obtenção de seu consentimento a fim de reduzir
e passa a ser do tipo ganhos através dos juros. as resistências.
Ainda como parte desse contexto efetua-se transformações Em síntese, na medida em que o processo de trabalho capitalista
quanto à forma de organização do trabalho como evidencia o objetiva conservar e elevar as taxas de lucro prescinde fragilizar a
toyotismo que busca a subordinação formal intelectual do trabalho resistência da ação coletiva dos trabalhadores através da “captura”
a lógica do capital através das alterações organizacionais sem, da sua subjetividade que no processo produtivo ocorre através da
contudo romper com a racionalidade do taylorismo-fordismo. A organização da produção de acordo com o toyotismo.
adoção do toyotismo integra ao que se chama de complexo de
reestruturação produtiva que é facilitado pelas Tecnologias da A Organização Toyotista da Produção
Terceira e Quarta onda de transformações produtiva6, e refletem
a busca do capital em elevar a taxa de lucro através do aumento A organização toyotista de produção tem como principais
da produtividade, da intensificação e elevação da extração da mais traços: a produção vinculada à demanda, a fim de atender ao mercado
valia em meio à mundialização do capital. Afinal as transformações consumidor mais individualizado; o trabalho concebido em equipe
permanentes são indispensáveis ao processo de valorização e e com atuação multifuncional dos trabalhadores; a operação pelo
acumulação de capital materializadas em mecanismos como, por trabalhador, simultaneamente, de várias máquinas; a adoção do
exemplo: a extensão da duração do trabalho através da ampliação princípio de Just-inTime, visando ao melhor aproveitamento do
da jornada de trabalho; o aumento da intensidade do ritmo de tempo de produção; o funcionamento da produção segundo o
trabalho via tecnologias e processos de organização. sistema Kanban, cujas placas ou senhas de comando determinam
Em relação a isso, é oportuno destacar que as inovações a reposição de peças e estoques administrando a produção; a
do complexo de reestruturação produtiva requerem que o estrutura organizacional horizontalizada, priorizando somente a
trabalhador tenha flexibilidade, ou seja, que seja polivalente e produção do que é central para sua unidade produtiva terceirizando
multifuncional capaz de operar simultaneamente várias máquinas o restante; o estímulo à organização dos Círculos de Controle de
e realizar diferentes atividades como produzir e efetuar controle Qualidade (CCQs), para debater o trabalho e o desempenho, com
de qualidade. Mas a flexibilidade também ocorre na produção a finalidade de melhorar a produtividade; a adoção do “emprego
cujas novas tecnologias permitem uma rápida reconfiguração vitalício” (no Japão) para uma parcela de trabalhadores.
das máquinas, adaptando a produção e serviços de acordo com o O toyotismo faz uso da mobilização das capacidades físicas
mercado consumidor e a busca de inovação e criação de novas e intelectuais dos trabalhadores, desta maneira distinguindo-se do
necessidades. Em síntese, as transformações em curso indicam que taylorismo-fordismo. Nesse sentido a busca do envolvimento dos
na atualidade vivencia-se a transição de um regime de “acumulação trabalhadores à lógica do capital é parte constitutiva fundamental
fordista” para o da “acumulação flexível”. do toyotismo, pois sem a qual compromete os princípios da
Quanto ao regime da “acumulação flexível” constata-se autonomação/autoativação e do Justin-Time. Quanto aos
que a organização do trabalho do tipo toyotista tem instigado os princípios da autonomação/autoativação, o primeiro diz respeito a
trabalhadores a disponibilizar sua capacidade física e intelectual dotar as máquinas automáticas de mecanismos de parada em caso
(menosprezando pelo taylorismo). A maneira que isto é evidenciado de algum defeito, contribuindo com a “auto avaliação” (verificar a
é a administração participativa (com base na prática do Kaizen, que qualidade) na execução do trabalho, para evitar retrabalho devido
significa melhoramento contínuo envolvendo todos). Contudo essa defeitos. Assim, a autonomação/autoativação atribui ao operário a
participação se limitada ao debate e sugestões para melhoria do responsabilidade pela qualidade dos produtos nos próprios postos
ambiente de trabalho para aumentar o desempenho, a produtividade de produção, passando os mesmos a desempenhar as funções de
e qualidade da mercadoria ou serviços. Essa participação restrita operadores diretos, fazer o diagnóstico, o reparo, a manutenção e
requer dos trabalhadores o cumprimento de metas, as quais não o controle de qualidade, isto é tornando o trabalho multifuncional.

Didatismo e Conhecimento 28
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Nesse sentido a base técnica associada à organização do com relações precárias de trabalho diante da diminuição do custo
trabalho permite exigir dos assalariados não apenas a vigilância, dos transportes. Mas, paradoxalmente a era da “empresa enxuta”
mas o controle sobre sua atividade, e também que efetuem a com suas terceirizações é também a era de acentuado processo
prevenção de avarias, na busca da qualidade total (em meio a de concentração e centralização de capital enquanto processo
redução do tempo de duração das mercadorias). Diante dessa mais geral do capital. Contribuí para esse processo paradoxal de
realidade, ocorrem a intensificação do ritmo e uma necessidade terceirizações em meio a concentração e centralização de capital
de maior subordinação do trabalhador ao processo de produção, enquanto processo inerente ao capitalismo a possibilidade de
alterando-o qualitativamente (novas habilidades e competências deslocamentos do capital.
são requeridas diante das novas tecnologias). Assim as inovações Esse deslocamento do capital por sua vez permite pressionar
(tecnológicas e organizacionais) no mundo do trabalho efetuam os trabalhadores para aceitarem a degradação das relações salariais,
o domínio do tempo humano mobilizando as capacidades dos reduzirem os direitos trabalhistas e precarizar os contratos de
trabalhadores para a produção de bens de consumo e execução de trabalho já que o capital se instala ou adquire mercadorias onde
serviços viabilizando a exploração. é mais vantajoso ao processo de sua valorização. Nesse processo
Evidentemente que aliado a isto, as novas tecnologias de base de deslocamento de capitais também se mantém e aprofunda-se
técnica informacional potencializam um controle mais objetivo o desenvolvimento assimétrico e desigual entre países. O capital
do trabalho, inclusive o efetuado a distância, pois conseguem situado nos países desenvolvidos continua proprietário do know-
integrar diferentes organizações com suas unidades localizadas em how, da tecnologia, dos serviços financeiros e do design dos
distintos espaços, e em “tempo real”. Em suma, essas tecnologias produtos, enquanto que o capital dos demais países permanecem
contribuem para alterar a noção espaço (do nacional para mundial), como montadores de produtos industriais e fornecedores de
pois as máquinas informacionais permitem interação “intrafirma produtos primários. Em síntese pode-se afirmar que o processo
e interfirmas” localizadas em diferentes países. Mas, também de reestruturação produtiva em meio à mundialização do capital
modificam a noção de tempo uma vez que “não há longo prazo” preserva o enrijecimento da hierarquia econômica internacional,
diante das constantes inovações, das “incertezas”, e do desejo da amplia as desigualdades sociais, fragiliza as lutas por direitos dos
rápida valorização do capital. trabalhadores, acentua a precarização das relações de trabalho
Atualmente a organização da economia adquire a dimensão de inclusive nas nações desenvolvidas.
resultados de curto prazo, sendo uma das materializações disso na Em suma, de maneira sintética pode-se afirmar que a
produção o princípio do Just-in-Time, que significa a eliminação organização toyotista do trabalho contribui para precarizar os
dos estoques a partir do uso de tecnologia de informação que contratos de trabalho, elevar a taxa de mais-valia, envolver
possibilita o mapeamento dos insumos, da produção e das vendas física e/ou intelectualmente os trabalhadores, intensificar o ritmo
na perspectiva da lógica da economia de custos. Para administrar de trabalho e efetuar maior controle do trabalho. Assim essa
o Just-in-time adota-se o sistema Kanban, a fim de enfrentar organização do trabalho associada às novas tecnologias contribui
o desafio de aumentar a produção sem crescer o contingente de para a expansão das terceirizações, flexibilização da produção,
trabalhadores, através de dispositivos organizacionais de controle concentração das decisões sem centralização, e deslocamento
do processo de fabricação. Com ele, passa-se a “administrar pelos de capital diante da mundialização dos mercados impactando no
olhos”, visando dar visibilidade aos “excessos gordurosos”, isto trabalho e nos trabalhadores.
é, tudo o que pode ser dispensado, melhorando o aproveitamento
do tempo de produção e permitindo um controle maior do capital. Os Impactos da Reestruturação Produtiva no Trabalho
O princípio do Just-in-time encontra-se em consonância
com a perspectiva de economia de curto prazo e a estrutura A organização toyotista da produção sugere uma produção
técnico-organizacional adotada pela “empresa enxuta”, isto é, a flexível que requer uma organização flexível do trabalho (exigindo
descentralização produtiva por meio da terceirização das etapas uma força de trabalho polivalente, multifuncional e com alguns
acessórias da produção e de serviços, para que haja a concentração trabalhadores qualificados, além da capacidade de operar em
da atividade naquilo em que a empresa possui vantagens equipe), bem como flexibilidade de contratação (contrato de
competitivas. Com a terceirização, eliminam-se os estoques de trabalho parcial ou temporário). Esses aspectos da organização
matérias primas e de produtos e promove-se maior integração do flexível do trabalho toyotista contribuem para evidenciar uma
processo produtivo a partir da gestão de fluxos de materiais e de crescente heterogeneidade e complexificação na morfologia da
informações possibilitados pelas novas tecnologias. A lógica disso classe trabalhadora. Tem-se assim: os trabalhadores com relações
é a racionalização da produção e dos serviços com diminuição dos de contrato de tempo integral de trabalho e os com contratos
custos proporcionada pela redução do estoque e pela economia de tempo parcial; existem os trabalhadores com empregos e os
de espaço, além da simplificação dos fluxos de informação e da desempregados; aqueles que executam atividades qualificadas
flexibilidade conferida à produção e serviços diante das constantes e os que trabalham em atividades pouco qualificadas e/ou
inovações. desqualificadas; persistem as diferenças entre a remuneração,
Vive-se a chamada era da “empresa enxuta” que fez proliferar o tipo de contrato e os trabalhos executados pelos homens e pelas
processo de uso de relações de terceirização na qual a rentabilidade mulheres (divisão sexual do trabalho).
não se limita à produção e à comercialização de mercadorias, Mais especificamente, quanto os trabalhadores do segmento
mas amplia-se para as relações entre empresas. Essas relações mais qualificado e intelectualizado que atuam junto às tecnologias
permitem ao terceirizador apropriar-se de parte da mais-valia mais avançadas, desempenhando um papel central na criação de
produzida pelos terceirizados situados em diferentes localidades valor de troca, os mesmos são objeto de intenso processo de busca
do mundo, especialmente onde o custo de produção é reduzido e de manipulação pelo capital. Sendo que a busca da subsunção

Didatismo e Conhecimento 29
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
desses trabalhadores inicia-se no processo de seleção e contratação, e serviços ocorre uma pressão sobre os trabalhadores preservar o
posteriormente persiste através dos treinamentos e qualificações emprego enquanto fonte de renda, dessa forma contribuindo para
técnicas e políticas a que são submetidos constantemente. sua submissão às determinações e condições impostas pela lógica
Contudo, mesmo os trabalhadores qualificados têm estabilidade da valorização do capital. Acabam por sujeitar-se as condições e
no emprego apenas relativa, pois há uma flexibilização do mercado contratos de trabalho, às metas de produção ou serviços cada vez
de trabalho, diante das permanentes mudanças e a permanência do maiores, à intensificação do ritmo de trabalho, à extensão da sua
trabalhador por um período longo em um mesmo emprego estar jornada de trabalho para casa, à busca permanente de atividades
relacionada com o custo dessa mão de obra. Além disso, diante da de qualificação e retreinamento para além da jornada de trabalho.
necessidade de constantes inovações, a “capacitação” deixa de ser Fatos esses que reduzem objetivamente o tempo livre para o
uma mercadoria durável e o retreinamento pode ser considerado desenvolvimento humano e de inserção nas atividades coletivas
oneroso diante da disponibilidade no mercado de trabalho de força vinculadas a “classe em si” em sua trajetória de “classe para si”.
de trabalho com as exigências requeridas. Diante do custo advindo (Texto adaptado de Paulo Roberto WÜNSCH, P. R.; MINCATO, R.
de contratos de trabalho com longo prazo e da necessidade de e REIS, C. N. professores doutores em Programa de Pós Graduação).
retreinamento o capitalista opta por contratar pessoas mais jovens,
com salário menor e que causem “menos problemas”, pois os mais
velhos tendem a dar vazão à insatisfação. Tudo isso, em meio a 3 A FAMÍLIA E O SERVIÇO SOCIAL.
demanda que os trabalhadores tenham agilidade, criatividade ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
e que estejam abertos a mudanças de curto prazo, que assumam EM SERVIÇO SOCIAL.
riscos continuamente, que dependam cada vez menos de leis e
procedimentos formais (SENNETT, 2006).
A “cultura do novo capitalismo” estimula a histórica
concorrência entre os trabalhadores e entre as empresas, reforçando
a disputa contra os “outros”, enquanto parte da moderna ética do Dois principais modelos familiares são destacados na história
trabalho concentrada no trabalho em equipe. O trabalho em equipe da formação da família brasileira, principalmente enquanto
fragmenta e contribui para romper com a noção de classe na aparelho ideológico do imaginário coletivo, são eles: a família
medida em que estimula a disputa contra outra equipe. Contudo patriarcal, modelo instaurado no Brasil colônia, e a família
é oportuno ressaltar que essas mutações em processo convivem burguesa.
com sistemas de organização e tecnologias da Segunda onda de Na família patriarcal, o chefe da família - patriarca -
Transformações Produtivas em uma espécie de coexistência entre representava a figura do poder e de autoridade. O patriarca era
os “Jetsons e os Flintstones”. Cria-se uma realidade em que ocorre o responsável pelo controle dos negócios, o sustento material
uma acentuada heterogeneidade no que se refere às condições, às da família, a manutenção da ‘ordem’ familiar, primando pela
situações e à morfologia da classe dos trabalhadores, acentuando a indissolubilidade do patrimônio e centralização do poder. A
fragmentação sócio histórica estrutural. mulher da família patriarcal - sinhazinha - apresentava como
Diante da fragmentação da classe dos trabalhadores e da características a afabilidade e a mansuetude, possuindo atribuições
hegemonia das ideias vinculadas à lógica do capital no trabalho voltadas para o ambiente doméstico.
e na sociedade, acentua-se a dificuldade da construção de uma Este modelo familiar, era encontrado principalmente nos
identidade coletiva na perspectiva de promover ações sindicais latifúndios, que na época colonial se baseavam em matrizes
de resistência de forma classista em defesa dos direitos. A disputa escravocrata e na monocultura (produção açucareira), ocorrendo
de ideias entre os interesses do capital e do trabalho, associada com maior predominância no nordeste do país. Essas famílias
à crescente fragmentação objetiva da classe dos trabalhadores, desempenhavam funções econômica e política, e exerciam
fragiliza a percepção da identidade de classes diante da lógica influências sob Igreja e instituições econômicas e poderes locais.
do trabalho em equipe. O reflexo disso é a dificuldade de os A família burguesa, introduzida no Brasil no começo do
trabalhadores se reconhecerem enquanto classe em sua 15 trajetória século XX com o início do processo de modernização, urbanização
de “classe para si” em sua subjetividade, consciência, organização e industrialização do país, é outro modelo que influenciou
e ação coletiva de resistência para garantir a manutenção ou fortemente a concepção de família existente na atualidade. Neste
conquista de direitos. modelo familiar, é atribuído à mulher o papel de boa esposa e mãe.
Ainda como se isso não bastasse, como parte do processo O amor à família é um dos sentimentos ressaltados e cultivados e a
manipulatório é estimulado o consumo especialmente de marcas, mulher é considerada o sustentáculo do lar e da família.
efetuado uma fetichização da mercadoria e promovendo a Na família burguesa a divisão de tarefas e os papéis a serem
mercantilização das relações sociais em que se considera que tudo desempenhados pelo homem e a mulher eram rigorosamente
se vende e compra. Busca tornar padrão o modo de vida na qual os estipulados. Ao marido, considerado a maior autoridade do
sonhos, os projetos e os prazeres estão associados à aquisição de lar, era destinada a função de provedor econômico. Já, para a
mercadorias, em detrimento desse fundarem-se em valores como esposa, era designado os cuidados com o ambiente doméstico e a
solidariedade, igualdade e justiça social. educação dos filhos, sendo esta submissa ao marido. Deste modo,
Na medida em que boa parte das energias físicas e mentais o desempenho, a dedicação ao marido e a administração do lar
são canalizadas para a obtenção dos recursos para o pagamento eram as prioridades da mulher – mãe e esposa. A mãe possuía
das mercadorias, muitas vezes, comprometem o tempo necessário uma relação mais próxima de seus filhos, e o pai permanecia uma
para o convívio social, a participação política, o lazer e a cultura. figura distante. O lar era considerado um local seguro, acolhedor e
Diante da busca da aquisição e/ou manutenção de mercadorias aconchegante, sendo valorizada a intimidade deste ambiente.

Didatismo e Conhecimento 30
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Estes modelos, por muito tempo vigoraram como os únicos compõem e harmonia. É a família ideal introjetada desde criança
existentes na sociedade brasileira. Mas, ao estudar a constituição como sendo a ‘correta’ e o modelo a ser seguido. Porém, essa visão
da família brasileira, observa-se que houve a participação de idealizada não retrata a realidade de inúmeras famílias existentes
vários povos, que através de sua etnia, história, cultura, crenças e na atualidade.
costumes, geraram a nação brasileira, resultando numa diversidade Essa concepção idealizada da família permanece latente na
étnico-cultural e que por não terem influenciado ideologicamente sociedade, através de construções ideológicas e míticas que se
a concepção de família, e também por não possuírem o poder, a perpetuam através do tempo. Um dos perigos dessas construções
riqueza e a força política, pouco se destacaram na história social é que o indivíduo possa não considerar outros tipos de arranjos
da família brasileira. familiares existentes na sociedade moderna como uma ‘família’,
atribuindo a esses outros arranjos o rótulo de ‘desestruturados’
Família e seus diversos significados e ‘disfuncionais’, sem uma análise mais profunda da estrutura
familiar, de como se realizam as interrelações familiares e as
Quando se pensa em família é comum fazer a relação com os relações desta com a sociedade.
laços de parentesco e de consanguinidade que unem as pessoas Outra dificuldade é o vício de se compararem as diversas
entre si. O dicionário da Língua Portuguesa, descreve com nitidez famílias à experiência particular, como se todas as famílias
funcionassem de uma só maneira, não possuindo suas próprias
esta definição: Pessoas aparentadas, que vivem em geral, na
dinâmicas e padrões interacionais e de funcionamento.
mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos, ou ainda,
pessoas do mesmo sangue, e grupo formado por indivíduos que
Essa intimidade do conceito de família pode causar confusão
são ou se consideram consanguíneos uns dos outros, ou por entre a família com a qual trabalhamos e nossos próprios modelos
descendentes dum tronco ancestral comum (filiação natural) e de relação familiar.
estranhos admitidos por adoção (FERREIRA, 1986). Acercamo-nos da família do outro a partir de nossas próprias
OSÓRIO (1996) concebe a família como um grupo no qual referências, de nossa história singular. O resultado disso é que
se desdobram três tipos de relações: a aliança - relativa ao casal, tendemos a trabalhar com as famílias desconhecendo as diferenças
a filiação - entre pais e filhos e a consanguinidade - entre irmãos. ou, pior, em muitas situações transformamos essas diferenças em
Segundo este autor, a família, com os objetivos de preservação, desigualdade ou incompletude.
proteção e alimentação de seus membros e ainda com a atribuição Tal questão ganha maior relevância quando passamos ao
de propiciar a construção da identidade pessoal, desenvolveu em setor das políticas sociais e refletimos sobre o conceito de família
sua história atribuições diferenciadas de transmissão de valores interiorizado pelo trabalhador social que, frequentemente, se
éticos, culturais, morais, religiosos. depara com os diversos tipos de configurações familiares, cada
MIOTO (1997), ao abordar o tema família, extrapola os qual com suas particularidades e peculiaridades.
conceitos apresentados anteriormente e nos aponta que a família Esse trabalhador necessita instrumentalizar-se, a fim de que
contemporânea abrange uma heterogeneidade de arranjos possa trabalhar sem ‘preconceitos’ com as famílias, evitando-se
familiares presentes atualmente na sociedade brasileira, não rotulá-las como desestruturadas e irregulares. Faz-se importante
se podendo falar em um único conceito de família, mas sim de apreender o contexto sócio histórico e cultural em que a família
‘famílias’, a família pode ser definida como um núcleo de pessoas está envolvida, para empreenderem-se ações que vão ao encontro
que convivem em determinado lugar, durante um lapso de tempo das necessidades das mesmas.
mais ou menos longo e que se acham unidas (ou não) por laços
consanguíneos. Ela tem como tarefa primordial o cuidado e a Funções da família
proteção de seus membros, e se encontra dialeticamente articulada
com a estrutura na qual está inserida. Diretrizes e orientações sobre a educação dos filhos são
SZYMANSKI (2002) afirma que a família na atualidade é encontradas em antigos manuscritos, dentre os quais cita-se o do
constituída por um grupo de indivíduos que, devido à existência jesuíta Alexandre de Gusmão, datado de 1685.
Nesse manual, o autor traça normas de conduta para boas
de laços afetivos, optam por conviverem juntos, com o acordo do
famílias, sendo que o genitor possuía a função de ‘direcionar’ sua
cuidado mútuo entre seus membros. Este significado acolhe em
prole, ou seja, a ele cabia os cuidados da formação moral e religiosa
seu seio numerosos tipos de possibilidades que há vários anos
dos filhos. O pai era o provedor de sua família e não se dedicava
coexistem na sociedade e que nunca puderam ser oficialmente aos filhos até que estes completassem sete anos, possuindo, então,
reconhecidos como uma família. a capacidade de compreender os ensinamentos cristãos. A mãe era
Com base nas afirmações das últimas autoras, considera-se responsável por ‘formar’ os filhos, ou seja, a ela cabia os cuidados
que o conceito de família supera os parâmetros da consanguinidade no âmbito material: vestuário e alimentação. Assim, a mãe deveria
e do parentesco e apresenta um sentido mais amplo, fundamentado dedicar-se aos filhos, principalmente nos primeiros anos de vida
na convivência e nas relações mútuas de cuidado e proteção entre da criança, caso contrário, comprometer-lhes-ia a formação futura.
indivíduos que construíram laços afetivos entre si. No entanto, devido à diversidade étnica e cultural existente
Porém, há alguns empecilhos que dificultam a introjeção deste no Brasil colonial, essas ‘regras’ de boa formação de famílias não
significado de família na vivência cotidiana. O primeiro deles é frutificaram na terra brasileira (VENÂNCIO, 2001).
que, quando se aborda o tema família, imediatamente conecta-se A rigorosidade da divisão sexual dos papéis, que era
a visão de um núcleo composto por pai, mãe e filhos, ou seja, do encontrada nas famílias patriarcais e na família burguesa,
modelo nuclear tradicional. Esta concepção de família vem ainda atualmente não existe mais. Na época contemporânea, percebe-se
permeada de atributos que se consideram inerentes a qualquer uma flexibilização dos papéis parentais e a função da família pode
estrutura familiar: aconchego, amor entre os membros que a ser contemplada segundo diversas vertentes.

Didatismo e Conhecimento 31
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Funções de ordem biológica e demográfica garantem a A família possui um papel fundamental na formação físico-
reprodução e a sobrevivência do ser humano; função de ordem moral- emocional e espiritual do ser humano. A família é o lócus
educadora e socializadora transmite conhecimentos, valores, afetos onde há o encontro das gerações e dos gêneros, onde se aprende a
através de uma comunicação verbal e corpórea tão importante nas arte da convivência e a prática da tolerância, e entre suas funções
relações interpessoais; função de ordem econômica (produtoras pode-se relacionar a promoção e a transmissão de valores, a
e consumidoras) que se dá no campo do trabalho; função de construção da identidade do indivíduo e o apoio emocional e
seguridade, que cuida da seguridade física, moral, afetiva, afetivo aos seus membros.
criando uma dimensão de tranquilidade e função recreativa, que
se traduz em atividades diversas que rompem o tédio, as tensões, Família contemporânea
como as festas em família (aniversário, casamentos e outras). [...]
Outra consideração é que a família exerce também uma função A família passou por várias transformações na segunda
ideológica, ou seja, além da reprodução biológica ela promove metade do século XIX: ampliou-se a participação das mulheres
também a reprodução social: é na família que os indivíduos são no mercado de trabalho e nas universidades, observando-se as
educados para que venham a continuar, biológica e socialmente, a diferenças entre as classes sociais, pois as mulheres mais pobres,
estrutura familiar (FILHO, 1998). em sua grande maioria, continuavam com pouca qualificação e
OSÓRIO (1996) considera que as funções da família baixa escolaridade.
são: biológica, psicológicas e sociais, sendo intrinsecamente O casamento sofreu transformações, sendo efetivado através
relacionadas, às vezes se confundindo entre si. da anuência do casal, com a livre escolha do parceiro, e norteado
- A função biológica, segundo a concepção deste autor, seria principalmente pela afinidade entre o casal e por fatores afetivos e
o dever de assegurar a sobrevivência da espécie, oferecendo os emocionais com bases no amor romântico.
cuidados básicos para o desenvolvimento dos indivíduos e não A tradicional família nuclear apresenta transformações. Além
compreenderia a função reprodutiva. do pai, a esposa e os filhos inserem-se no mercado de trabalho,
- As funções psicológicas seriam o afeto, o suporte familiar auxiliando nas despesas e na manutenção da família, alterando
para a superação de crises individuais que ocorrem no ciclo de padrões de hierarquia, autoridade e sociabilidade.
vida, a transmissão de experiências de vida para os descendentes, Surge a família contemporânea que é construída através
a atuação facilitadora da aprendizagem empírica e, também, a de uma somatória de experiências e trajetórias particulares,
intermediação de informações com o universo extrafamiliar. manifestando-se através de arranjos familiares diferenciados e
- Como funções sociais pode - se destacar a transmissão de peculiares, denotando a impossibilidade de identificá-la como um
valores culturais e a preparação para o exercício da cidadania. padrão familiar uniforme e ideal.
Dentre os vários arranjos familiares, podem-se citar as
À família cabe permitir o crescimento individual e facilitar os
famílias:
processos de individuação e diferenciação em seu seio, ensejando
-reconstituídas, que são aquelas em que, após a separação
com isso a adequação de seus membros às exigências da realidade
conjugal, o indivíduo constitui uma nova família;
vivencial e o preenchimento das condições mínimas requeridas
- constituídas através de uniões estáveis;
para um satisfatório convívio social.
- monoparentais femininas;
Assim, verifica-se que uma das tarefas básicas da família é
- monoparentais masculinas;
a socialização. O termo socialização é entendido de acordo com
- nas quais avós moram e cuidam de seus netos;
o conceito proposto “por BERGER e LUCKMANN (1976),
- unipessoais;
isto é, enquanto um processo de construção social do homem”
- formadas por uniões homossexuais;
(GOMES, 1994). Esse conceito subdivide-se em duas categorias: O modelo idealizado da família nuclear burguesa ainda
a socialização primária e a socialização secundária. perpetua no imaginário do indivíduo - coletivo. Famílias que
A socialização primária consiste na transformação do homem não fazem parte desse tipo de arranjo familiar tentam ‘adaptar’
(que ao nascer é apenas um organismo, é apenas biológico) em um e aproximar a sua estrutura e padrão de funcionamento ao do
ser social típico: de um gênero, de uma classe, de um bairro, de ‘modelo ideal’, acreditando, muitas vezes, que não constituem uma
uma região, de um país. família, ou que a sua família é ‘errada’, quando não conseguem
A família transmite às novas gerações, especialmente à reproduzi-lo.
criança, desde o nascimento, padrões de comportamento, hábitos, No início do século XXI, percebem-se as metamorfoses nas
usos, costumes, valores, atitudes, um padrão de linguagem. Enfim famílias: a diminuição do número de filhos, a redução de número
maneiras de pensar, de se expressar, de sentir, de agir, e de reagir de matrimônios realizados legalmente (casamento civil), o
que lhe são próprios naturais. Não bastasse tudo isso, ela ainda aumento de separações e divórcios. A divisão sexual dos papéis, ou
promove a construção das bases da subjetividade, da personalidade seja, as funções socialmente destinadas aos homens e mulheres nas
e da identidade, Deriva disso a enorme importância da família famílias são questionadas, não havendo mais a rígida separação
tendo em vista a vida futura de cada criança: ela, a família constrói dos papéis, demonstrando uma estrutura mais aberta e flexível.
os alicerces do adulto futuro. Dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e
A socialização secundária refere-se à aprendizagem do Estatística - apontam outras transformações ocorridas na família
indivíduo, adquirida através do contato com outros setores contemporânea, entre as quais podem-se citar: a redução do
institucionais (escola, clube, grupos comunitários, local de tamanho das famílias, o aumento de número de famílias chefiadas
trabalho, entre outros). por mulheres e das unidades unipessoais, entre outros.

Didatismo e Conhecimento 32
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Esses dados demonstram que a família brasileira está visando o atendimento somente do ‘mais pobre dos pobres’, sendo
moldando uma nova cultura e um novo modo de viver, que não que o Estado atende apenas o que a sociedade civil, as instituições
se adequam mais aos modelos patriarcal e burguês, pois em seu filantrópicas e o voluntarismo não atende.
tecido familiar estão imbricados as suas próprias particularidades, Os últimos governos do Estado brasileiro, Fernando Collor
peculiaridades e valores. de Mello e Fernando Henrique Cardoso foram gradativamente
Outro aspecto relacionado à família é que a mesma não é implementando planos de ajustes nacionais que se adequavam à
estática. A família possui um ciclo vital, é dinâmica e se apresenta ideologia neoliberal. O atual governo, também compactua com
de forma diferenciada de acordo com a sua evolução, ou seja: ela esta ideologia.
também nasce, cresce, amadurece, habitualmente se reproduz Desse modo, no cenário nacional continua sendo
em novas famílias, encerrando seu ciclo vital com a morte dos implementadas ações governamentais que submetem o Estado
membros que a originaram e a dispersão de seus descendentes para brasileiro à dinâmica da globalização capitalista. Abreu aponta as
constituir novos núcleos familiares). seguintes:
Desse modo a família é influenciada pelas situações internas - a redução de capital público destinado as áreas de saúde,
que lhe sucedem como: nascimento, casamento, morte de seus educação, transporte, entre outras, incentivando o desenvolvimento
membros e por fatores externos: sociais, econômicos, culturais, de serviços privados nestas áreas;
entre outros. - a desregulação das relações de trabalho, transferindo-as do
setor público e submetendo-as às condições da iniciativa privada;
Família e Estado - a privatização e transnacionalização das empresas públicas;
- a liberação do comércio com a eliminação das barreiras
A família enquanto unidade integrante da sociedade é alfandegárias;
diretamente influenciada pela situação macro sócio-política e - a desregulamentação da entrada e saída de capitais
econômica do país. As ações estatais atingem o microssistema estrangeiros.
familiar, atuando como fatores desagregador e propiciador Com essas práticas, as classes dirigentes brasileiras estão
de situações de vulnerabilidade, sendo que esta última está cumprindo as exigências impostas pelos personagens que ditam
intrinsecamente relacionada às condições econômicas das os rumos da ordem mundial: o capital financeiro especulador, os
famílias, a forma de distribuição de renda no país e ao modo de grandes banqueiros credores do Estado, o capital multinacional,
funcionamento do modelo econômico vigente - o capitalismo. organismos capitalistas internacionais e os governos do G7 (grupo
A crise do Estado-Providência, as transformações em curso dos sete Estados mais ricos do mundo comandados pelos EUA).
no mundo do trabalho e do capitalismo, introduzem no cenário A adequação dos países a uma ideologia neoliberal é condição
mundial a ideologia neoliberal e a globalização, sendo esta última para que o Estado continue integrado às relações políticas e
um processo pelo qual se busca a união dos mercados de diversos econômicas internacionais.
países, através da internacionalização do capital e da economia, A entrada do neoliberalismo e da globalização no cenário
objetivando o lucro rápido. mundial traz como consequências o surgimento de expressões da
O neoliberalismo surge na década de 70, inicialmente na questão social generalizadas, que assumem uma amplitude global
Inglaterra e Estados Unidos, em decorrência das crises do petróleo e produzem efeitos comuns nas diversas partes do mundo, tais
e da emergência da chamada Terceira Revolução Industrial, como como: desemprego estrutural, aumento da pobreza e da exclusão
uma reação conservadora à presença do Estado nas esferas social social, precarização e casualização do trabalho e desmonte de
e econômica e, aos poucos, vai se estendendo aos países de outros direitos sociais edificados há mais de um século.
continentes. Na década de 80, têm-se as primeiras marcas do No Brasil, as tendências políticas em relação ao tratamento
neoliberalismo na América Latina: México, Argentina, Venezuela da questão social levam a políticas setoriais e fragmentadas, que
e, mais recentemente no Brasil. procuram atender apenas situações emergentes, visando amenizar
ABREU (1999) afirma que o neoliberalismo é uma ideologia os impactos das demandas sociais.
capitalista que defende o ajuste dos Estados Nacionais às A ideologia neoliberal reinante apresenta um Estado
exigências do capital transnacionalizado, portanto contrária aos desterritorializado e sujeito a comandos dos detentores do capital
pactos que subordinam o capital a qualquer forma de soberania externo e, desse modo, impossibilitado de exercer o controle sobre
popular ou instituições de interesse público. as políticas econômicas e sociais internas e de proteger o emprego
As vertentes orientadoras do neoliberalismo são derivadas e a renda de sua população, aliado ao predomínio do Estado
do liberalismo clássico: promoção pelo mérito, mercado auto Mínimo, caracterizado pela desresponsabilizarão do governo
regulador, desconfiança à intervenção do Estado, igualdades de com os setores públicos, principalmente a assistência social e a
chance para todos os indivíduos. seguridade.
A ideologia neoliberal pressupõe que a ação espontânea do As modalidades de proteção se apoiam em pilares
mercado deve possibilitar um equilíbrio de condições entre os da flexibilização das relações de trabalho, na seletividade
indivíduos, de tal modo que qualquer pessoa pode conseguir seus ou focalização das políticas sociais e na desobrigação do
objetivos através da livre concorrência e livre escolha. estabelecimento dos mínimos sociais como direitos de todos.
A questão da assistência, segundo a visão neoliberal, é Os princípios neoliberais apontam para o desmonte das
encarada como um dever moral, sendo estabelecido um limite: políticas nacionais de garantias sociais básicas, cujas principais
que esta não se transforme em direito para as classes subalternas, implicações são: cortes de programas sociais (inclusive os voltados
para os empobrecidos, miseráveis e excluídos. A política de para as populações empobrecidas), diminuição dos benefícios
assistência social é utilizada apenas em situações emergenciais, da seguridade social, criminalização da pobreza e a valorização

Didatismo e Conhecimento 33
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
de velhas fórmulas de ajuda social, maquiadas pelo discurso da Para reduzir os custos, ocorre a flexibilização do mercado de
solidariedade e da humanidade, que são travestidas com nova trabalho, associada à desproteção e à desmantelação dos direitos
‘roupagem’ e, por isso, veiculadas como modernas e avançadas. trabalhistas. Essa flexibilização pode ser interna, ou seja, a que
É o caso da filantropia social e empresarial, das ações impõe a adaptabilidade da mão-de-obra a essas situações novas e
voluntárias e da ajuda mútua, que involuntariamente tendem que, evidentemente, expulsa os que não são capazes de se prestar a
a contribuir para a desresponsabilização do Estado perante essas novas regras do jogo.
ao provimento dos mínimos sociais e a proteção à família, à Ou externa que se refere à subcontratação de mão-de-obra em
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, como expressa condições mais precárias, salários baixos e menor proteção.
a Lei Orgânica de Assistência Social, de 1993. Segundo CASTEL, a precarização do trabalho alimenta o
A globalização, no Brasil, apresenta em sua face a marca desemprego, pois torna-o cada vez mais fragilizado e obriga os
indivíduos a entrarem em uma situação de vulnerabilidade. Tal
da desregulamentação da força de trabalho, o achatamento dos
situação atinge de forma diferenciada as camadas sociais e as
salários e o aumento do desemprego, contribuindo, assim, para o
famílias brasileiras.
aumento da exclusão social.
As políticas sociais apresentam-se incapazes e ineficazes
A exclusão não é mais vista como um fenômeno de ordem para atender a demanda populacional de miseráveis e excluídos,
individual mas, social, cuja origem deveria ser buscada nos tornando-se, desse modo, focalista, residual e seletista, ou seja,
princípios mesmos do funcionamento das sociedades modernas. são orientadas por uma perspectiva de se atender somente a
O fenômeno da exclusão social não envolve apenas o pobreza absoluta, limitando-se a ações minimalistas, pontuais e
caráter econômico da pobreza, supõe, também, o preconceito e a descontínuas, que excluem cidadãos que por direito deveriam ter
discriminação. acesso a recursos e benefícios.
A exclusão social é aqui entendida como uma situação A família, enquanto instituição inserida na sociedade, é afetada
de privação coletiva que inclui pobreza, discriminação, por esse processo de desenvolvimento socioeconômico e pelo
subalternidade, a não - equidade, a não acessibilidade, a não - impacto da ação do Estado através de suas políticas econômicas
representação pública como situações multiformes. e sociais.
Surge, assim, o fenômeno histórico do final do século, A conjuntura político-econômica brasileira, norteada
chamado, segundo Cristovam Buarque, (apud SPOSATI, 1999) pelos princípios neoliberais e pela globalização, promove o
de apartação social. Trata-se da naturalização da desigualdade aceleramento do empobrecimento, desemprego, minimização
social, criando uma barreira entre o mundo dos ricos e dos pobres, das políticas sociais oferecidas às comunidades, influenciando a
ocasionando a culpabilização do pobre por sua pobreza. estrutura familiar em suas relações, estrutura, papéis e formas de
reprodução e contribuindo para a desagregação dessa instituição.
No início do século XXI, o que se apresenta, do ponto de vista
(Texto adaptado de ÁLVARES, L. de C. e FILHO, M. J. doutores
social, é o crescimento da pobreza, do desemprego e da exclusão,
em Serviço Social).
ao lado de uma enorme concentração de renda e de riqueza por
parte de uma parcela minoritária da população. A Família e o Serviço Social
Considerando-se a pobreza não como sinônimo de
‘insuficiência de renda’, mas como a pobreza socioeconômica, A família aparece como demanda para o Serviço Social
ou seja, a pobreza material, originada historicamente do modo quando ocorre algum problema ou conflito na função social, ou
em que a sociedade se organiza. É a desigualdade produzida seja, quando a família por um certo motivo não consegue cumprir
economicamente que se “manifesta de modo quantitativo, ou seja, o seu papel.
na falta de renda, de emprego, de habitação, de nutrição, de saúde”. Deve-se apreender a família do ponto de vista teórico com um
Essa pobreza atinge grande parte do contingente populacional do pensamento crítico, desvelando a realidade, analisando as relações
país. de totalidade e principalmente considerando as determinações
Na pobreza não encontramos somente o traço da destituição históricas, para não culpabiliza-la e nem fazer uma psicologização
material, mas igualmente a marca da segregação, que torna a das questões que são sociais.
pobreza produto típico da sociedade, variando seu contexto na Para se ter uma visão crítica de família é preciso analisá-la
história, mas se reproduzindo na característica de repressão do como uma construção histórica, como apontamos no segundo item
acesso às vantagens sociais. deste trabalho.
Esse panorama denuncia o retraimento do Estado, a ausência A ação do Assistente Social deve ser transformadora, buscando
a emancipação e o autodesenvolvimento da família. O profissional
de políticas de proteção social as famílias pertencentes as camadas
deve atuar nas demandas, essas demandas deverão providenciar
sociais de baixa renda e as consequências no mundo do trabalho.
respostas, as demandas institucionais que são demandas objetivas,
Nos anos 70, CASTEL afirma que ao trabalho está vinculada
imediatas, devem ser respondidas com o desenvolvimento e a
uma série de garantias, direitos e proteções sociais, sendo atribuída utilização de instrumentos (meios) para atingir seus objetivos, estes
estabilidade e status ao trabalhador. Há uma seguridade social instrumentos podem ser: os bens, serviços, benefícios, programas
interligada ao trabalho, o aspecto dos direitos vinculados ao e projetos, porém o âmbito da ação profissional deve transcender
trabalho é que fez com que o trabalho não fosse apenas a retribuição a demanda institucional, passando assim para a demanda sócio
pontual de uma tarefa, mas que a ele fossem vinculados direitos. profissional, compreender as demandas na sua totalidade, as suas
Com o advento da internacionalização do mercado, da contradições, a sua relação com a sociedade e assim o Assistente
globalização e dos princípios de concorrência, eficiência e Social deve articular, criar meios para que família crie condições
lucratividade, o trabalho passa a ser alvo de redução de custos. para cumprir a sua função social.

Didatismo e Conhecimento 34
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O Assistente Social como um profissional que tem como seu X – Planejamento, organização e administração de Serviços
objeto de intervenção as necessidades sociais, deve intervir nas Sociais e Unidades de Serviço Social; [...].
expressões da Questão Social. Estas expressões da Questão Social A mesma Lei, no artigo 5º, inciso II estabelece o planejamento,
rebatem no campo de trabalho como uma consequência do sistema a organização e administração de programas e projetos em Unidade
que fundamenta o capitalismo, aparece no sujeito individual e/ou de Serviço Social, como uma atribuição privativa do Assistente
coletivo em situação de vulnerabilidade social e pessoal, e é no Social. Este texto, visa dar uma contribuição ao debate sobre a
âmbito da família que se encontram o maior número de demandas, importância do planejamento e administração, enquanto momento
e é nela também que deve estar a ação do Assistente Social. integrante da intervenção profissional.
O profissional deve em sua ação desnaturalizar todas as formas
de discriminação, promovendo também a garantia dos direitos dos O ato de planejar
cidadãos e possibilitando a sua autonomia como está previsto no
projeto ético-político profissional. É necessário também que este O ato de planejar pressupõe um esforço para imprimir uma
articule junto ao Estado, as organizações que tenham o mesmo direção à prática profissional. Ou seja: Trata-se de uma ação que
objetivo diante desta situação, para juntos buscar a edificação parte da compreensão de que:
as respostas políticas que garantam direitos e que esses sejam I) é possível interferir no rumo dos acontecimentos
efetivados. concernentes à vida social e, por conseguinte, é possível direcionar
Através da gestão democrática, o trabalho do Assistente a nossa ação profissional de forma consciente e dirigida para o
Social pode contribuir com a justiça e a equidade social a favor da alcance dos nossos objetivos, ainda que em circunstâncias dadas;
universalidade das políticas sociais, posicionando seus programas, II) o ato de definir objetivos requer saber onde se está, onde
serviços e projetos e desenvolvendo ações que venham aumentar se pretende chegar e exige concentrar forças em uma direção
os recursos para que se tenha uma concretização dessas políticas definida. Por essa razão o ato de planejar, enquanto parte do fazer
de forma eficaz, o profissional deve agir juntamente ao seu profissional do Serviço Social deve partir, primeiramente, do
usuário, fazer reuniões com todos membros da família, as crianças, exame da forma como se organiza a sociedade em que vivemos e o
o adolescente, os pais, a mulher, o homem, o idoso, enfim trabalhar papel conferido ao Serviço Social nesta sociedade.
com eles as questões de gênero, questões geracionais, e outras de A interferência nos rumos da história parte do pressuposto
acordo com a necessidade da população, sempre criando meios de que os homens devem estar em condições de viver para fazer
para que eles mesmos criem os seus valores a História, o que exige, em primeiro lugar, comer, beber, ter
A tarefa do Assistente social é lutar pela participação habitação, vestir-se, ter lazer. Neste sentido, a produção dos meios
social, emancipação, autonomia (ética, política, moral, cultural), que possibilitam a satisfação dessas necessidades constitui um ato
desenvolvimento dos sujeitos sociais, e principalmente pela histórico precedente e basilar. A gênese do ser social se realiza
ampliação dos direitos sociais e da cidadania, investindo assim sobre esta base ontológica, que é a produção material da vida,
nas potencialidades dos usuários, caminhando sempre na busca da no intercâmbio dos homens com a natureza e deles entre si, em
liberdade política, econômica e cultural. resposta às necessidades. É o trabalho que efetiva este intercâmbio,
Este profissional deve agir com sua formação embasada que por constituir uma atividade vital que distingue os homens
nas diretrizes curriculares, com seu fundamento na teoria social dos animais, tão logo começam a produzir seus meios de vida.
crítica. O profissional deve ter um perfil teórico-crítico (tem A atividade humana diferencia-se da realizada pelo restante dos
que ter capacidade para fazer uma leitura crítica da realidade), animais por não ser instintiva e imediata.
técnico-operativo (profissional interventivo, que tem um arsenal Por ser o homem um animal capaz de atribuir finalidade
de técnicas e instrumentos que possibilitam a intervenção) e ético- aos seus atos, avaliá-los e recriá-los, constantemente, o trabalho
político (o agir tem uma intenção, tem valores do código de ética). humano é uma atividade consciente, cuja forma final do objeto
Tendo assim um práxis transformadora que supere o imediatismo. do trabalho é prefigurada na mente do trabalhador, antes mesmo
(Texto adaptado de SILVA, J. C. M. Assistente Social). de iniciar o processo de trabalho. Todavia, toda a práxis social,
se considerarmos o trabalho como seu modelo, contém em si um
ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO EM SERVIÇO caráter contraditório. Por um lado, a práxis é uma decisão entre
SOCIAL alternativas, já que todo indivíduo singular, sempre que faz algo,
deve decidir se o faz ou não. Por outro, conforme analisa Marx, os
O planejamento e a administração são instrumentos homens são impelidos pelas circunstâncias a agir de determinado
integrantes das ações desenvolvidas pelos assistentes sociais, modo.
conforme estabelece a Lei de Regulamentação da Profissão em seu O trabalho, enquanto unidade de causalidade e teleologia,
artigo 4º, que aponta dentre outras as seguintes competências do possui como elementos constitutivos a projeção do fim que se
Assistente Social: quer alcançar; o reconhecimento das causalidades objetivas; a
[...] II - Elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, escolha dos meios mais adequados para a execução da finalidade;
programas e projetos que sejam do âmbito do Serviço Social com a operação sobre o objeto e a execução da finalidade.
participação da sociedade civil; Trata-se, portanto, de uma atividade que une objetividade e
VI - Planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços subjetividade. É objetiva na medida em que se realiza sobre um real
Sociais; exterior ao sujeito, pré-existente e independente de sua consciência
VII - Planejar, executar e avaliar pesquisas que possam e é subjetiva enquanto somente se realiza como atividade se estiver
contribuir para a análise da realidade social e para subsidiar ações na consciência do sujeito, que age orientado por seus objetivos.
profissionais; Essa atividade se realiza como atividade objetiva, visando um

Didatismo e Conhecimento 35
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
resultado objetivo, mediada por processos, meios e instrumentos De acordo com a perspectiva dos empregadores, a profissão
objetivos, através dos quais o sujeito busca realizar no real sua de serviço social foi, e é, historicamente, instituída para
subjetividade. enfrentar as refrações da questão social por meio do controle e
O ponto de partida da atividade é a finalidade. Entretanto, é do disciplinamento da força de trabalho. A forma de inserção da
preciso levar em consideração, ao longo da realização da atividade, profissão na divisão social do trabalho e seu caráter de prática
a resistência do real, o que requer que a consciência esteja em profissional torna necessário, àqueles profissionais interessados
atividade não só na apreensão do real, bem como, ao buscar em elaborar um projeto de intervenção comprometido com a
impor-se nele transformando e transformando-se no processo de garantia do acesso dos usuários aos direitos sociais, qualificar
realização da intencionalidade. o horizonte da ação profissional para perceber qual o caráter
Deriva desta compreensão a necessidade de apreender o possível da intervenção na perspectiva de transformação na prática
significado da profissão do Serviço Social na sociedade capitalista, profissional.
posto que o ato de planejar deve considerar, não só a possibilidade Esse reconhecimento precisa levar em conta os limites reais
de imprimir uma direção social ao exercício profissional, em impostos pelo caráter institucionalizado da prática, ao mesmo
decorrência da relativa autonomia que dispõe o assistente social tempo, em que precisa buscar no real as possibilidades concretas
(respaldada juridicamente na regulamentação da profissão, na de instituição de práticas diferenciadas, nas quais possa se dar a
experiência de formas de relação democráticas, garantidoras do
formação universitária especializada e no Código de Ética)
acesso dos usuários aos direitos sociais.
como também, as condições sociais em que opera o trabalho do
É nesse quadro, brevemente delineado, que se insere o ato de
assistente social e as formas por ele assumidas em cada contexto
planejar. Ressalto que o pensamento conservador tenta reduzir o
histórico social . ato de planejar a um processo que visa apenas instrumentalizar a
O capitalismo é, basicamente, um sistema, no qual tudo o realidade. Para tal, propõe que a tomada de decisão sobre a ação a
que se produz deve ter valor de uso e de troca. Esta troca é feita ser realizada centre-se na previsão de necessidades e racionalização
em mercados competitivos controlados pelos que possuem a de emprego de meios (materiais) e recursos (humanos) disponíveis,
propriedade privada dos meios de produção: a terra, os bancos, visando a concretização de objetivos, em prazos determinados e
as fábricas. Se olharmos a sociedade como um grande mercado etapas definidas, a partir dos resultados das avaliações que visam,
todos, tanto os proprietários, como o trabalhador que vende a quando muito, intervir sobre uma ou outra disfunção na dinâmica
sua força de trabalho, aparecem, como homens livres, iguais e sócio institucional.
trocando equivalentes. Marx, no volume I do Capital, demonstra Distintamente, defendemos que o ato de planejar é antes de
que na realidade o processo de produção capitalista se organiza tudo um processo político, no qual o que determina o que será
como base na exploração entre os que detêm os meios de produção considerado problema e as possibilidades e condicionantes da
e os que só possuem sua força de trabalho. Segundo o autor, o tomada de decisões estão relacionadas ao poder de pressão que
trabalhador, não só não usufrui da liberdade de ir e vir, posto que uma classe ou fração de classe exerce numa sociedade num dado
está prisioneiro no interior da unidade produtiva, onde seu tempo momento histórico.
e seus passos são controlados, como não é tido como igual, posto Entendemos que esta é uma afirmação válida, quando se
que deve obediência ao capitalista e a seu preposto, e a utilização pensa numa intervenção em nível macroestrutural, como também,
de sua força de trabalho, ao invés de agregar apenas um valor para planejamentos em microestruturas sociais. Porém, há que
correspondente ao que lhe foi pago, gera um valor excedente que é se ressaltar, que muito embora as instituições sociais sofram as
apropriado pelo capitalista. determinações estruturais e conjunturais do contexto social e
O trabalhador assalariado é, de fato, juridicamente livre, o político no qual estão inseridas, elas possuem uma história e
que o distingue do escravo e do servo. Todavia, tal liberdade é uma dinâmica própria que lhes confere certa peculiaridade, o que
ilusória, na medida em que busca ocultar a relação de exploração e requer, por parte do assistente social, uma análise concreta da
de dominação de classe. A resistência dos trabalhadores à opressão correlação de forças existente no espaço institucional. A apreensão
e à exploração representa a grande força motriz da história. O das particularidades contidas em cada dinâmica institucional nos
afasta das análises excessivamente abstratas e genéricas, o que
processo de resistência operária à exploração e à opressão passou
contribui para assegurar alguma margem de possibilidade de
a ser denominada pelo pensamento conservador de “questão
concretização do que está sendo projetado.
social”. O que, segundo CARVALHO e IAMAMOTO, (1983)
Assim, ao pensarmos a questão do planejamento enquanto
de fato, significa “(...) as expressões do processo de formação e um momento do fazer profissional do assistente social há que se
desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário ter claro que a sua exequibilidade dependerá, especialmente, das
político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe relações de força presentes no contexto sócio institucional e no
por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no contexto social no qual a Instituição se insere.
cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a A seguir, apresentamos uma proposta de metodologia de
burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais elaboração de um projeto de intervenção.
além da caridade e repressão”.
Os efeitos da questão social constituem o objeto sobre o qual Compartilhando objetivos
atua o assistente social. Diferentemente de outras profissões, o
Serviço Social não atua sobre uma única necessidade humana, Entendemos que para que os objetivos a serem traçados
nem tampouco sua ação se destina a todos os homens e mulheres no plano de ação possam ser assumidos pelos interessados é
indistintamente. Ao contrário, o assistente social atua sobre todas necessário que o ato de planejar seja realizado de modo a envolver
as necessidades humanas de uma classe social, formada por aqueles no planejamento os sujeitos da ação: alguns membros da instituição
que são impedidos do acesso aos bens serviços e riquezas sociais. e os usuários.

Didatismo e Conhecimento 36
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Todavia, aqui cabe uma ressalva: Em tempos nos quais a Definido os objetivos, passa-se a construção das estratégias. A
“participação no planejamento” é, essencialmente, um item a elaboração da estratégia envolve, principalmente:
ser cumprido dentro das exigências das fontes internacionais de a) A identificação dos autores:
financiamento. Permite-se o acesso à informação e a população - Quem são os aliados?
é consultada, porém, não há qualquer garantia de que as opiniões - Quem são os oponentes?
da população sejam, de fato, incorporadas pelo poder público, - Quem é potencialmente aliado?
julgo ser necessário enfatizar que são participativos os processo b) A identificação do poder de pressão dos diversos sujeitos.
de planejamento que estimularem a autonomia e a capacidade de c) A elaboração das bases das alianças e formas de confronto.
fazer valer as decisões dos seus participantes. Feito isso, há que se perguntar: devemos passar imediatamente
Levando-se em conta que trabalhamos com uma imensa gama para as ações mais decisivas? Algumas vezes, torna-se preciso
de situações, torna-se necessário definir prioridades com base analisar melhor, uma vez que durante a execução podem acontecer
nos critérios definidos no debate com os envolvidos. Definida a surpresas desagradáveis que venham a colocar em risco a
prioridade com base numa análise das necessidades prementes consecução dos objetivos, tais como: o corte de verbas, mudanças
e das condições para a sua superação, passa-se ao momento da na gestão administrativa, entre outras.
justificativa da escolha. Trata-se de responder à seguinte questão: Nesse caso, o melhor é não passar para as ações mais decisivas
Que razões nos levaram a optar por enfrentar essa problemática? sem fazer o levantamento de todos os recursos necessários.
Para evitar equívocos acerca do significado de uma dada Exemplo: precisa-se contar com um número X de técnicos, durante
problemática e, logicamente, sobre o modo de intervenção sobre um determinado período de tempo. O mesmo procedimento deve
ela, torna-se necessário descrevê-la de uma forma precisa e ser utilizado em relação aos recursos financeiros e materiais.
objetiva. Além desta preocupação, torna-se necessário reavaliar o
Descrever o problema é dizer de que forma ele aparece e ao, cenário sócio-político durante a construção da problematização.
mesmo tempo, resgatar as razões ou, de forma mais precisa, os Esta preocupação parte da compreensão de que alguns dos
determinantes sociais da sua existência. Partindo da hipótese de determinantes ou condicionantes que podem possibilitar a
que a faticidade, simultaneamente, revela e oculta a existência de concretização da intenção proposta podem ter sofrido modificação.
uma processualidade, há que se apreender os fatos como sinais de Afinal, a realidade é dinâmica!
um processo que os transcendem. É sobre essa processualidade Por isto, indicamos que, ao longo da elaboração do plano, se
que é preciso se deter para construir a descrição do problema, ou
faça uma previsão acerca das tendências que começam a surgir no
a problematização.
cenário e se discuta o que fazer caso elas venham a se confirmar.
Evidentemente, os que expõem a respeito de uma problemática
A construção da problematização, dos objetivos e estratégias
fazem parte dela, estão dentro da situação. Isto significa que nesse
fornece base para momentos decisivos da ação. A formulação das
jogo de relações sociais não existe neutralidade, e sim, interesses
táticas diz respeito às operações que possibilitam materializar a
em jogo. Se por um lado, a explicação de uma problemática
estratégia. Entre as táticas a serem utilizadas para a garantia da
não pode ser considerada como uma verdade acabada, absoluta
democratização do processo devem estar presentes: o fluxo
e inquestionável, por outro lado, não podemos deixar de ser
rigorosos na sua apreensão e exposição. permanente de informações, a descentralização das atividades e a
Por isto, alguns procedimentos precisam ser observados para avaliação permanente da ação.
que se construa uma problematização rigorosa e compartilhada Sugerimos, também, um acompanhamento permanente da
com aqueles que estão interessados e envolvidos com a ação. ação a fim de que se possa inferir na alteração, caso necessário,
Neste sentido, faz-se necessário: dos objetivos, da política para a realização dos objetivos e na
- partir de uma análise diagnóstica, da qual devem constar o organização da ação.
contexto histórico e social no qual a problemática se insere e os Por fim, faz-se uma revisão crítica, comparando-se os
dados que se dispõem sobre ela; resultados reais com os previstos, analisando, em primeiro lugar,
- apreender determinantes de seu aparecimento e continuidade; que decisões foram acertadas ou não. Além disso, avalia-se o
- justificar a importância de uma atuação que vise o que foi ou não obtido e as determinações e condicionamentos
enfrentamento dessa problemática; do alcance da ação, de forma a identificar, por meio da análise
- informar sobre os benefícios e beneficiários que podem ser conjunta, a visão que os diversos sujeitos possuíam acerca de como
atingidos com a ação e o grau de interesse e o envolvimento destes, os acontecimentos iriam evoluir e as necessidades de mudança.
- demonstrar as condições existentes, necessárias e os limites (Texto adaptado de LIMA, S. L. R. Mestre em Serviço Social).
que precisam ser superados para lidar com tal situação.
Tendo explicitado a problemática sobre a qual desejam A administração e o Serviço Social
intervir, os sujeitos passam a formular seus objetivos. Um passo
inicial nesta direção é começar com a seguinte indagação: A que Inicialmente é importante registrar que a Administração e o
resultados pretendemos chegar com a execução deste projeto? Serviço Social são dois campos com objetos distintos. Enquanto o
Ao imaginar estes resultados os participantes da elaboração Serviço Social tem como objeto a questão social e suas múltiplas
devem debater sobre as consequências que estes resultados deverão expressões, a Administração, ou gestão, define-se como “[...] modo
produzir. Este é um momento interessante, não só para avaliar racional e calculado de ordenar os meios para atingir resultados”
a dimensão das modificações que se pretende produzir, como (NOGUEIRA, 2007).
também, avaliar as possibilidades de enfrentamento às resistências O fundamento da gestão ou da administração é a noção de
às modificações. Porém, os objetivos podem e devem ser alterados racionalidade, isto é, o uso da inteligência, da razão, para encontrar
de acordo com o curso e avaliação dos acontecimentos. os meios mais adequados com vista à realização de resultados.

Didatismo e Conhecimento 37
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Estes são definidos como objetivos a alcançar, ao passo que os No próprio campo da Administração, que não se orienta apenas
meios dizem respeito às pessoas, aos modos e aos recursos que por teorias conservadoras da ordem capitalista, mas também por
garantem a conquista dos objetivos. teorias críticas, podemos encontrar elementos para a discussão
De acordo com Nogueira, o que pode ser um problema para os dessa perspectiva. Faria define a teoria crítica nos seguintes
analistas sociais, para o pensamento administrativo é uma virtude, termos: Teoria crítica é uma escola de pensamento derivada do
pois “[...] idealmente, burocracia é administração profissional marxismo, também conhecida como marxismo ocidental, com um
que visa, por meio da racionalização e do controle do trabalho, a corpo conceitual definido (e suas divergências internas), com suas
eficiência e a maximização de resultados”. linhas de investigação, que também realiza estudos críticos. Teoria
A racionalidade buscada na produção é algo que transcende crítica não é teoria pós-moderna (FARIA, 2007).
à história e aos modos de produção, não é algo relacionado Na análise de Faria, as organizações não são entes abstratos,
apenas ao modo de produção capitalista, embora, a gestão e a sujeitos absolutos, entidades plenamente autônomas, unidades
Administração tenham sido, como nos ressalta Nogueira, “[...] totalizadoras e independentes, mas construções sociais dinâmicas e
impulsionadas pelo surgimento da modernidade e encontraram contraditórias, nas quais convivem estruturas formais e subjetivas,
seu pleno desenvolvimento no contexto da segunda Revolução manifestas e ocultas, concretas e imaginárias [...] O problema
central de uma Teoria Crítica, portanto, consiste em esclarecer em
Industrial, na virada do século XIX para o século XX”.
que medida as instâncias (a) obscuras, que se operam nos bastidores
Já o Serviço Social se inscreve como profissão a partir do
organizacionais, nas relações subjetivas e no inconsciente
advento do capitalismo e tem na questão social o seu objeto.
individual, e (b) manifestas inclusive e especialmente as referentes
O serviço social é considerado uma especialização do trabalho
ao regramento e às estruturas, dão conteúdo as configurações do
e atuação do assistente social uma manifestação do seu trabalho, poder nas organizações.
inscrito no âmbito da produção e reprodução da vida social. Ainda em Faria, a teoria crítica, na Administração, está
O Serviço social tem na questão social a base de sua fundação relacionada com um referencial que permite esclarecer os
como especialização do trabalho. Questão social apreendida bastidores das organizações, sua dinâmica, as relações subjetivas
como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade e o inconsciente individual. Essa perspectiva aqui explicitada
capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social procura visualizar saídas para a ação profissional para além da
é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente crítica algumas vezes imobilizadora dos efeitos do capital sobre
social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, o trabalho.
monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 2006).
Nos pressupostos da formação profissional (ABEPSS, 1996) Aproximações do Serviço Social com o campo da
inscreve o Serviço Social como profissão interventiva vinculada Administração
às contradições do capitalismo monopolista, que tem como objeto
a questão social, a qual se agrava com a reestruturação produtiva. De acordo com Kameyama, “Os estudos sobre o processo de
Esse agravamento produz alterações na profissão. trabalho aparecem especialmente na área das Ciências Sociais a
Em relação ao processo de trabalho, as diretrizes estabelecem partir da segunda metade dos anos 80, enquanto no Serviço Social
como pressuposto que o processo de trabalho do Serviço Social os primeiros trabalhos surgem em meados da década de 90”.
é determinado pelas configurações estruturais e conjunturais da Verificamos que o campo da Administração, da gestão, o tema
questão social e pelas formas históricas de seu enfrentamento, das organizações, começa a ganha maior visibilidade no Serviço
permeadas pela ação dos trabalhadores, do capital e do Estado, Social a partir da década de 1980, após a profissão ter vivido o
através das políticas e lutas sociais (ABEPSS, 1996). movimento de reconceituação e o processo de ruptura.
O projeto-ético-político da profissão baseado no marxismo, A atuação do Serviço Social vinculada ao campo da gestão
dada a centralidade da categoria Trabalho e sua vinculação com tem seu registro no estudo do Serviço Social de empresa, campo
a classe trabalhadora, tende a ser crítico da Administração, na de trabalho que foi se firmando de forma gradativa não apenas
medida em que a racionalização está a serviço do capital e não do no Brasil, mas nos demais países da América latina e dos Estados
Unidos da América e da Europa, pois os “[...] sindicatos assumindo
trabalho.
responsabilidade de benefícios aos trabalhadores contribuíam para
Como nos indica Antunes, sob o sistema de metabolismo
a ausência do Serviço Social” (FREIRE, 1983).
social do capital, o trabalho que estrutura o capital desestrutura
Uma obra significativa neste período é Serviço Social
o ser social. O trabalho assalariado que dá sentido ao capital gera
organizacional, de Lucia Freire (1983). Essa obra, prefaciada pelo
uma subjetividade inautêntica no próprio ato de trabalho. Numa educador Paulo Freire, reflete um tempo em que a vanguarda do
forma de sociabilidade superior, o trabalho, ao reestruturar o ser Serviço Social estava bastante vinculada à organização popular.
social, terá desestruturado o capital (1999). Freire (1983) faz um apanhado do Serviço Social de empresa
Compreendemos que o exercício do trabalho autônomo, nos EUA, na Europa e na América Latina. Em relação aos EUA,
livre, não alienado, não estranhado, não pode ocorrer na ordem indica a atuação profissional com a Escola de Relações Humanas,
capitalista, pois, como afirma Antunes, “[...] o sentido dado a ato relacionada com a concessão de benefícios e atendimento dos
laborativo pelo capital é completamente diverso do sentido que problemas individuais dos trabalhadores. Na Europa, onde a ação
a humanidade pode conferir a ele”. Isto não significa, entretanto, profissional foi mais significativa, verifica-se uma produção teórica
que em sua ação interventiva nas organizações o Serviço Social estabelecendo funções específicas da profissão, sem, entretanto,
não possa caminhar em direção à emancipação, transcendendo à haver maior estudo em relação à metodologia. Já América Latina
reprodução. a Fundación Servicio Social em la Empresa apresenta uma

Didatismo e Conhecimento 38
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
perspectiva de atuação funcional e avançada, na Argentina e no Essa obra reflete um momento da realidade social brasileira
Chile, o governo da Unidade Popular, na gestão de Salvador em que o Serviço Social está se vinculando à classe trabalhadora e
Allende, apresenta uma perspectiva de transformação social. há um fortalecimento de alguns de seus segmentos.
A experiência da América latina tem como ponto de partida O processo de conscientização citado pela autora relacionava-
a necessidade dos trabalhadores, privilegia a participação dos se com os conceitos de Paulo Freire. Baseava-se ainda, no conceito
trabalhadores nos processos decisórios. Os programas visam de “consciência crítica” de Lucien Goldman. A proposta recebia
atender as necessidades básicas dos trabalhadores. influência também do método BH, desenvolvido a partir dos
Em seu livro, Lucia Freire apresenta “[...] uma proposta de
estudos da equipe de Serviço Social da Universidade Católica de
metodologia de intervenção de serviço social em empresa, em
experimentação há sete anos, em três empresas brasileira de Minas Gerais em Belo Horizonte, daí a referência a BH (SANTOS,
grande porte” (FREIRE, 1983). 1985).
O trabalho é resultado de uma vivência profissional nas Partindo da realidade da fragilidade da teoria para a
organizações, com uma proposta embasada na perspectiva fundamentação do Serviço Social em empresa, com a realização
dialética, denominada pela autora como “dialética processual”. dos “experimentos”, a pesquisadora conclui que o Serviço Social
Essa concepção é aplicada ao campo das organizações não deve voltar-se tanto para o atendimento das necessidades
empresariais, considerando as relações de produção e dominação, humanas em si. A ação profissional deve ter como centro “[...]
dentro da unidade dialética. A perspectiva adotada é analisada em o processo de conscientização e capacitação social dos seres e
confronto com estudos da Teoria das Organizações, em diferentes grupos humanos nas organizações (FREIRE, 1983). Tal processo
concepções. se relaciona também com a desalienação, possibilidade de os
Dentre os objetivos estabelecidos pela pesquisadora,
indivíduos se descobrirem como sujeitos participativos na análise
destacamos o seguinte: “Demonstrar que o serviço social é aplicável
em organizações empresariais, de acordo com os componentes das situações cotidianas que envolvem a organização. A proposta
básicos do seu corpo teórico, aplicados numa perspectiva dialética desenvolvida tinha como horizonte a transformação social.
processual”. Nos estudos de Rico, autora parte do entendimento de que o
Essa obra tem um grande valor histórico, pois sintetiza sistema capitalista é que interfere nos problemas de relações sociais
o esforço de compreender a organização como unidade de da empresa. “A exploração do trabalho humano dentro da lógica
intervenção do Serviço Social já que naquele período histórico necessária à existência do sistema, provoca consequências como,
se entendia a metodologia tradicional do serviço social não inclui habitações precárias, saúde deficiente, alimentação inadequada,
a organização, de modo geral, como uma unidade objeto de sua etc.
intervenção. Também não a considera de modo específico, no A autora adverte que essa análise não é a que mais influenciou
campo empresarial, que é questionado e até hoje não firmado como
o Serviço Social de empresa e adianta: “Parece-nos até coerente.
possível, dentro dos fundamentos teóricos da disciplina (FREIRE,
Como usar da análise materialista dialética (pensamento marxista)
1983).
Freire pretende com sua proposta superar esse estágio na para intervir como assistente social numa empresa capitalista?
profissão no que se refere à aplicação do Serviço Social na empresa. Ora, as soluções propostas por Marx são a nível da superação do
A sua hipótese era a de que os integrantes de determinadas sistema”.
empresas nas quais foi aplicada a abordagem de Serviço Social Na análise de Rico “[...] O uso das teorias dialéticas pelo
Organizacional, num enfoque dialético processual, apresentam Serviço Social, inclusive no campo de empresa, são dificultadas
indicadores de mutação da consciência menos crítica para também pela própria falta de operacionalização dessas teorias.
consciência mais crítica e de maior capacitação para participação, Pouco se criou a nível de intervenção nos fenômenos sociais. Este
organização, gestão e mobilização popular, em sucessivos é um caminho que começamos a percorrer muito recentemente, e
momentos no decorrer da aplicação de uma pesquisa-ação, num que nas palavras de Ander Egg; ‘continua sendo uma busca’”.
processo de desenvolvimento social nas organizações com vistas à
O artigo apresenta uma análise das experiências do Grupo de
transformação social.
A proposta da autora foi fruto de sua atuação profissional desde Estudos de Serviço Social do Trabalho – GESSOT, um órgão do
1973 em organizações empresariais, a qual denomina Serviço Ministério do Trabalho, criado em 22 de novembro de 1969, do
Social Organizacional – SSO e baseava-se nos conceitos e métodos Grupo Meta, formado por assistentes sociais de São Paulo, e da
de Desenvolvimento Organizacional – DO numa perspectiva Fundácion Servicio Social em la Empresa de Buenos Aires. Esses
dialética, buscando absorver os elementos contraditórios do grupos tinham por objetivo a discussão da ação profissional.
Desenvolvimento Organizacional – DO e do desenvolvimento A análise da atuação do Serviço Social nas empresas se
de comunidade, visando à transformação social. A ideia de SSO pautava no seguinte, o Serviço Social de Empresas, em especial
estava relacionada com comissões de empresa e cogestão. é o campo que tem recebido maiores críticas pela vanguarda da
A abordagem de SSO envolve tanto a representação ‘formal’ profissão, face à sua intervenção que tem sido praticamente dirigida
da estrutura do poder das organizações, como a representação “a superação das dificuldades surgidas na interação do trabalhador
“informal” dos trabalhadores, atuando concomitantemente com
na empresa e na sociedade. Ocorre que essas dificuldades, como já
grupos de todos os segmentos organizacionais, num processo
de desenvolvimento desses grupos, em “interação” visando mencionamos, são o resultado do processo de relação de produção,
à superação das contradições da realidade dos mesmos, da específico do sistema capitalista. [...] obviamente, o conflito entre
organização e do seu contexto. [...] O SSO apresenta como capital e trabalho aparece em toda estrutura social. [...]O campo
objetivos básicos, a conscientização e capacitação social, para a da empresa, só é motivo de maior atenção porque é o local do
mobilização, participação social, organização e gestão popular. confronto direto: entre o empregado e o empregador.

Didatismo e Conhecimento 39
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A reconceituação defende uma nova postura do Serviço Social construção de uma sociedade livre de todas as formas de violência
face à realidade social da América Latina, apresentando-se como e exploração de classe, gênero, etnia e orientação sexual. Ao
um processo que, embora não se excluindo de determinações integrar a equipe dos(as) trabalhadores(as) no âmbito da política
históricas objetivas, refuta o Serviço Social tradicional em prol de Assistência Social, os(as) profissionais podem contribuir para
de uma nova proposta de prática que atenda prioritariamente ao criar ações coletivas de enfrentamento a essas situações, com
projeto dos trabalhadores (MOTA, 1991). vistas a reafirmar um projeto ético e sócio-político de uma nova
Verificamos assim, um salto no entendimento da profissão sociedade que assegure a divisão equitativa da riqueza socialmente
no que se refere ao papel do assistente social na empresa, produzida.
relacionando-o com o surgimento de necessidades sociais em Dessa forma, o trabalho interdisciplinar em equipe deve
função da expansão capital, como sua representante institucional a ser orientado pela perspectiva de totalidade, com vistas a situar
empresa passa “[...] a requisitar o assistente social para desenvolver o indivíduo nas relações sociais que têm papel determinante nas
um trabalho de cunho assistencial e educativo junto ao empregado suas condições de vida, de modo a não responsabilizá-lo pela
e sua família”. sua condição socioeconômica. O Código de Ética Profissional
Assim, a requisição do assistente social responde a de assistentes sociais, por exemplo, estabelece direitos e deveres
necessidade de se entregar a um técnico a administração racional que, no âmbito do trabalho em equipe, resguardam-lhes o sigilo
e científica dos serviços sociais geridos pela empresa. É evidente profissional, de modo que estes(as) não podem e não devem
que a racionalidade se prende tanto ao caráter de eficiência da encaminhar, a outrem, informações, atribuições e tarefas que
administração de benefícios materiais como ao caráter educativo não estejam em seu campo de atuação. Por outro lado, só devem
dessa administração, instituído nas orientações de condutas compartilhar informações relevantes para qualificar o serviço
desviantes do empregado e sua família. prestado, resguardando o seu caráter confidencial, assinalando a
No estudo de Mota, a autora considera a empresa como responsabilidade, de quem as receber, de preservar o sigilo. Na
“[...] requisitante institucional da profissão de Serviço Social. elaboração conjunta dos documentos que embasam as atividades
Tal requisição mostra que a empresa legitima a ação da profissão em equipe interdisciplinar, psicólogos/as e assistentes sociais
no limite dos seus interesses; isto é, reconhece que os serviços devem registrar apenas as informações necessárias para o
prestados historicamente pelos assistentes sociais atendem suas cumprimento dos objetivos do trabalho.
necessidades”. Em virtude dos desafios impostos na atuação interdisciplinar
O texto reconhece o surgimento da profissão no continente na política de Assistência Social, considera-se importante a
latino-americano com a formação do proletariado urbano e entende criação de espaços, no ambiente de trabalho, que possibilitem a
que a ação profissional se estabelece mediante “requisições” do discussão e reflexão dos referenciais teóricos e metodológicos que
capital. subsidiam o trabalho profissional e propiciem avanços efetivos,
Por outro lado, também analisa a “participação do trabalhador” considerando as especificidades das demandas, das equipes e
como algo constituinte da ação profissional; o trabalhador é também dos(as) usuários(as). A construção do trabalho interdisciplinar
requisitante que dispõe do Serviço Social de forma fetichizada. Ele impõe aos(às) profissionais a realização permanente de reuniões
precisa desvelar os interesses do capital e a ação do “Serviço Social de planejamento e debates conjuntos a fim de estabelecer as
tradicional” e consolidar o seu potencial negador dessa cooptação. particularidades da intervenção profissional, bem como definir
Assim, “a nosso ver, a consideração do potencial negador do as competências e habilidades profissionais em função das
trabalhador como a real e verdadeira requisição a que o assistente demandas sociais e das especificidades do trabalho. Balizados
social deve responder, constitui a principal, senão a única, pelos seus Códigos de Ética, Leis de Regulamentação e Diretrizes
determinação para a construção de uma nova prática do Serviço Curriculares de formação profissional, os(as) profissionais
Social” (MOTA, 1991). (Texto adaptado de ROSA, J. J. R. Mestre podem instituir parâmetros de intervenção que se pautem pelo
em Serviço Social). compartilhamento das atividades, convivência não conflituosa das
diferentes abordagens teórico- metodológicas que estabelecimento
do que é próprio e específico a cada profissional na realização
3.1 ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL de estudos socioeconômicos, visitas domiciliares, abordagens
EM EQUIPES INTERPROFISSIONAIS E individuais, grupais e coletivas.
INTERDISCIPLINARES. A atuação interdisciplinar requer construir uma prática político
profissional que possa dialogar sobre pontos de vista diferentes,
aceitar confrontos de diferentes abordagens, tomar decisões que
decorram de posturas éticas e políticas pautadas nos princípios
e valores estabelecidos nos Códigos de Ética Profissional. A
O trabalho de assistentes sociais, psicólogos/as e pedagogos/ interdisciplinaridade, que surge no processo coletivo de trabalho,
as, que constituem as principais profissões hoje atuantes no SUAS, demanda uma atitude ante a formação e conhecimento, que se
requer interface com as políticas da saúde, Previdência, educação, evidencia no reconhecimento das competências, atribuições,
trabalho, lazer, meio ambiente, Comunicação Social, segurança e habilidades, possibilidades e limites das disciplinas, dos sujeitos,
habitação, na perspectiva de mediar o acesso dos(as) cidadãos(ãs) do reconhecimento da necessidade de diálogo profissional e
aos direitos sociais. cooperação.
As abordagens das profissões podem somar-se com intuito Nessa perspectiva, é fundamental assegurar a participação
de assegurar uma intervenção interdisciplinar capaz de responder dos(as) profissionais das diferentes categorias que integram
a demandas individuais e coletivas, com vistas a defender a as equipes dos CRAS e CREAS e dos(as) usuários(as), nos

Didatismo e Conhecimento 40
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Conselhos de Assistência Social, como forma de fortalecimento da a intervenção profissional não se realiza e nem pode ser tratada
contribuição das diferentes profissões para a construção do SUAS como responsabilidade individual dos(as) trabalhadores(as).
e para a qualificação dos espaços de controle social democráticos. (Parâmetros para a Atuação de assistentes Sociais na Política de
Destaca-se também a importância da atuação conjunta na Assistência Social).
perspectiva da organização dos(as) usuários(as), com vistas a
viabilizar sua participação nos Conselhos, bem como intervir
no sentido de tornar acessível à população as deliberações das
Conferências e dos Conselhos de Assistência Social, aprimorando 3.2 ASSESSORIA, CONSULTORIA E
os mecanismos de divulgação e socialização dos debates com a SERVIÇO SOCIAL.
população.
Pela sua formação e experiência, os/as assistentes sociais têm
uma função estratégica na análise crítica da realidade, no sentido
de fomentar o debate sobre o reconhecimento e defesa do papel
da assistência social e das políticas sociais na garantia dos direitos Para as reflexões deste texto, parte-se da realidade social
e melhoria das condições de vida; isso sem superestimar suas da prática profissional, mediada por questões da reestruturação
enfrentamento das desigualdades sociais, gestadas e cimentadas produtiva do capital, amplamente discutida na literatura do Serviço
nas determinações macroeconômicas que impedem a criação de Social, da qual se destacam os seguintes fatores:
emprego, redistribuição de renda e ampliação dos direitos. Da a) o processo de reestruturação produtiva desencadeou
mesma maneira, têm um papel fundamental na compreensão mudanças nas operações de diferentes setores da atividade
e análise crítica da crise econômica e de sociabilidade que econômica capitalista, alterando estruturas produtivas e, por
assola o Brasil e o mundo. Essa crise é fortemente determinada consequência, o mercado de trabalho;
pela concentração de renda e expressa-se nos altos índices de b) as alterações no mercado de trabalho são evidenciadas a
desemprego, violência, degradação urbana e do meio ambiente, partir de novas formas de contratação, inserção e manutenção do
ausência de moradias adequadas, dificuldade de acesso à saúde, trabalho, além da redução dos postos e consequente desemprego;
educação, lazer e nas diferentes formas de violação dos direitos. c) os efeitos da reestruturação produtiva, conforme Amaral
Portanto, não se pode analisar e planejar a Assistência Social e Cesar (2009), expressam-se pela flexibilização do trabalho
isolada do conjunto das políticas públicas e nem se pode reforçar a e desregulamentação das leis trabalhistas, resultantes de um
perspectiva de que o enfrentamento das desigualdades estruturais movimento mais geral da economia mundial que, entre outros
pode se dar pela via da resolução de problemas individualizados efeitos, redirecionaram as estratégias empresariais, de forma a
e que desconsiderem as determinações objetivas mais gerais possibilitar uma cultura do trabalho adequada aos requerimentos
da sociabilidade Os desafios que se colocam demandam dos/ de produtividade, competitividade e maior lucratividade;
as profissionais, e dos/as assistentes sociais especialmente, uma d) nas empresas capitalistas, a partir da necessidade de atender
articulação na defesa do SUAS e de todas as políticas sociais, a a um mercado globalizado e altamente competitivo, estratégias
partir de uma leitura crítica da realidade e das demandas sociais. como privatizações, fusões de empresas, novas formas de produzir
Embora Serviço Social e Psicologia, principais profissionais mercadorias, marcadas pelas exigências de produtividade,
hoje inseridos no SUAS, possuam acúmulos teórico-políticos qualidade e rentabilidade, impulsionaram a modernização
diferentes, o diálogo entre essas categorias profissionais aliará tecnológica (gerenciais, instrumentais e técnicas), introduziram
reflexão crítica, participação política, compreensão dos aspectos novas formas de gerenciamento da força de trabalho, novas
objetivos e subjetivos inerentes ao convívio e à formação do políticas de administração dos recursos humanos e organização do
indivíduo, da coletividade e das circunstâncias que envolvem as trabalho, com consequências diretas para o trabalhador.
diversas situações que se apresentam ao trabalho profissional. O assistente social é um profissional assalariado e sua inserção
É possível construir, a partir dessa ação interdisciplinar, um no mercado de trabalho perpassa por condições econômicas e
cenário de discussão sobre responsabilidades e possibilidades na sociais previamente determinadas.
construção de uma proposta ético-política e profissional que não Conforme Raichelis (2011), a reestruturação produtiva
fragmente o sujeito usuário da política de Assistência Social. O do capital atinge o mercado de trabalho do assistente social
trabalho em equipe não pode negligenciar a responsabilidades tanto no setor público quanto no privado. O movimento nas
individuais e competências, e deve buscar identificar papéis, empresas industriais é de mudança e/ou redução de postos de
atribuições, de modo a estabelecer objetivamente quem, dentro da trabalho, enquanto no setor público ocorre a ampliação devido à
equipe multidisciplinar, encarrega-se de determinadas tarefas. descentralização dos serviços sociais públicos.
O conhecimento da legislação social é um pré-requisito Nas empresas, os postos de trabalho profissional são reduzidos,
para o exercício do trabalho. No caso do Serviço Social, esta é quer pela não substituição de trabalhadores desligados quer pela
uma matéria obrigatória prevista nas Diretrizes Curriculares. A absorção das tarefas do profissional por elementos polivalentes,
atualização do conhecimento dos marcos legais, contudo, é uma “quanto na transferência das atividades do assistente social para
necessidade contínua de todos(as) os(as) trabalhadores(as) e deve terceiros, na forma de consultoria” (Cesar, 2010).
ser buscada conjuntamente pelas equipes do SUAS. Esses fatores causaram inflexões nas condições de trabalho dos
A consolidação do processo coletivo de trabalho de assistentes sociais e, também, reorientaram sua função social, já
assistentes sociais na política de Assistência Social não está que novas demandas foram instituídas aos profissionais, incidindo
desvinculada das lutas pela garantia de um Estado democrático, sobre suas competências, atribuições e autonomia. A esse respeito,
comprometido com os direitos da classe trabalhadora. Isso porque seguem ainda as seguintes ponderações:

Didatismo e Conhecimento 41
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
a) Serra (2010), em análise de resultados de sua pesquisa sociais efetivos, há uma maior dependência dos benefícios
realizada em 1998, com relação ao setor empresarial, pontua que, oferecidos [pelas empresas] e os profissionais admitem que tais
além da tendência a prevalecer um número reduzido de assistentes benefícios acabam prendendo-os à empresa. Raichelis (2011),
sociais por empresa - um e no máximo dois profissionais -, as em artigo recente a respeito do assunto terceirização, chama a
demandas do Serviço Social sofreram alterações, pois foram atenção para a influência nas condições de trabalho do assistente
centradas não somente na prestação e administração de benefícios, social, nos diferentes espaços institucionais, a partir da dinâmica
mas também para os programas de formação e qualificação de mão flexibilização/precarização, que, para além do rebaixamento
de obra ou de qualidade total, que eram exigências decorrentes salarial e perda de benefícios sociais, ocasiona o seguinte: [...]
da reestruturação produtiva no Brasil, perpassadas por nova intensificação do trabalho, aviltamento dos salários, pressão pelo
racionalidade técnica e ideopolítica; aumento da produtividade e de resultados imediatos, ausência de
b) com relação às demandas do profissional, Amaral e Cesar horizontes profissionais de mais longo prazo, falta de perspectivas
(2009), recorrem a Mota (1985) e descrevem que, nas empresas, de progressão e ascensão na carreira, ausência de políticas de
o Serviço Social mantém o seu caráter “educativo”, voltado para capacitação profissional, entre outros.
mudanças de hábitos, atitudes e comportamentos do trabalhador, Boschetti (2011) também reconhece que os profissionais têm
objetivando sua adequação ao processo produtivo. O profissional vivenciado, na atualidade, os percalços dos demais trabalhadores,
continua sendo requisitado para responder às questões que como desemprego, terceirização, informalidade e prestação de
interferem na produtividade - absenteísmo, insubordinação, serviços sem regulamentação.
acidentes, alcoolismo etc. -; a intervir sobre os aspectos da vida Embora não se disponha de dados nacionais sobre as condições
privada do trabalhador, que afetam seu desempenho - conflitos de trabalho de assistentes sociais, é óbvio que os efeitos da crise,
familiares, dificuldades financeiras, doenças etc. - e a executar que impacta de modo destrutivo a vida da classe trabalhadora,
serviços sociais asseguradores da força de trabalho. atinge igualmente os(as) assistentes sociais.
Esse “pano de fundo” fez-se necessário para fundamentar Assinala que, de maneira geral, o Brasil registrou crescimento
algumas das implicações que a reestruturação produtiva imprimiu no emprego formal, no ano de 2010, de 6,9%, em relação a 2009,
ao mercado trabalho e às condições de trabalho dos assistentes e, embora represente 50,7% da população economicamente ativa
sociais em empresas, com consequências também verificadas no (PEA) com carteira assinada, a condição de trabalho continua
trabalho dos profissionais das consultorias pesquisadas. sendo de forte precarização e informalidade, representada por
Considerando as mudanças ocorridas na forma de inserção “[...] 49,3% da PEA sem contrato formal de trabalho e sem acesso
desse profissional, por meio das consultorias/assessoria, apreende-
aos direitos, como previdência, seguro-desemprego e os demais
se que, como “atividade-meio” na empresa, o Serviço Social
direitos dependentes do emprego formal” (Boschetti, 2011).
estará (se já não estiver) cada vez mais próximo do processo de
O trabalho do assistente social enquadra-se, de acordo com
terceirização. O desafio que se apresenta ao profissional é o de
a literatura da economia, no setor de serviços. Embora seja um
estabelecer a forma pela qual pretende ingressar nesse espaço, em
profissional liberal, inserindo-se no conceito de profissões
quais condições, e qual relação social estabelecerá com os demais
regulamentadas, são trabalhadores, que na grande maioria não
trabalhadores, a partir dos elementos contidos no seu projeto
dispõem dos meios próprios e instrumentos de trabalho. Podem
profissional, na condição de trabalhador também subordinado à
exercer seu trabalho na qualidade de empregado ou prestador de
exploração pelo capital.
serviço de forma autônoma.
Consultorias/assessorias empresariais: significados e Na condição de profissional autônomo, sem vínculo trabalhista,
implicações da função no âmbito da profissão na área do o assistente social é obrigado a ter inscrição profissional no
Serviço Social Conselho Regional de Serviço Social (Cress). Também necessita
inscrever-se e atualizar seus dados no Cadastro de Contribuintes
O trabalho dos assistentes sociais nas consultorias/assessorias Mobiliários (CCM), na prefeitura do município em que exercerá
empresariais passa a integrar o mercado de trabalho profissional a suas atividades, pois esse tipo de contratação implica o pagamento
partir de meados dos anos 1990. Contudo, considerando estudos do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) ao
sobre as repercussões da reestruturação produtiva para a profissão, município. Ainda sobre o assunto, o Cress posiciona-se, para a
realizados nesse período, por Serra (2010), Mota e Amaral (2010) e categoria profissional, como não sendo o órgão competente para
Cesar (2010), induz-se que isso se deu sem assegurar as condições ditar exigências de âmbito contratual, e orienta os profissionais a
e relações de trabalho defendidas pelo Serviço Social brasileiro. negociarem seus honorários com base na Tabela Referencial de
Nas empresas, entre as condições de trabalho estabelecidas Honorários de Serviço Social (TRHSS).
no contexto da reestruturação, sobressaem as citadas por Cesar Quanto à inscrição de pessoa jurídica, visando prestar serviços
(2010), que dizem respeito à instabilidade e à insegurança sofridas em assessoria, consultoria, planejamento, capacitação e outros da
pelos profissionais, devido à redução de postos de trabalho, e mesma natureza em Serviço Social, o Conselho Federal de Serviço
responsáveis pelos esquemas de subcontratação por meio da Social (CFESS) estabelece a obrigatoriedade de registro da pessoa
terceirização, ou do estabelecimento de vínculos precários e jurídica, assim como o pagamento de anuidade ao Cress.
temporários, que se manifestam também na precarização do A Lei n. 8.662, de 7 de junho de 1993, que regulamenta
trabalho, em termos salariais e de benefícios sociais. a profissão de assistente social, com relação a assessoria e
Conforme a autora, para os assistentes sociais subcontratados, consultoria, nos artigos 4º e 5º, refere-se às competências e
há uma clara diferenciação: salários mais baixos e [ausência de] atribuições do profissional:
benefícios sociais regulados pelo Estado. Para os assistentes Art. 4º Constituem competências do assistente social:

Didatismo e Conhecimento 42
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da administração “em dependência do seu saber teórico-metodológico, de suas
pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, habilidades técnico-operacionais e de sua postura ético-político
com relação às matérias relacionadas no inciso II deste artigo; [...]”, a partir de sua autonomia (limitada e restrita), poderá utilizá-
IX - prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em la no sentido de favorecer mais os trabalhadores ou somente os
matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa empresários. Considera que ambos ganham. O empresário e os
dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade; gestores, por terem os trabalhadores satisfeitos a partir de suas
Art. 5º Constituem atribuições privativas do assistente social: conquistas, produzindo melhor e prestando melhores serviços; e
III - assessoria e consultoria a órgãos da Administração os trabalhadores, pelo mérito no alcance das suas conquistas e,
Pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, em principalmente, pela prática do exercício político.
matéria de Serviço Social. (CFESS, 2011). No entanto, concorda-se com a autora, ao referir que
A respeito do tema consultoria, na bibliografia do Serviço somente os assistentes sociais com perfil qualificado, capacitado
Social, além de registrar referência recente, nota-se que mais e atualizado apresentarão a vantagem de apreender a realidade, no
de um autor conjuga o termo consultoria ao de assessoria. Para seu cotidiano de trabalho, sem descartar os limites institucionais,
Matos (2010), a distinção entre ambos é considerada mínima, e muitas vezes os limites históricos, e contribuirão para constituir
por isso ele se refere aos dois processos de forma indistinta. O novos sujeitos políticos diante da classe trabalhadora.
autor define assessoria e consultoria como “aquela ação que é Na bibliografia da área de administração, que concentra
desenvolvida por um profissional com conhecimentos na área, que a maioria dos estudos a respeito de consultorias empresariais,
toma a realidade como objeto de estudo e detém uma intenção de constata-se que essa modalidade representa o resultado da busca
alteração da realidade”. Portanto, o assessor/consultor deve ser de novas estratégias de gestão, impulsionadas pelas mudanças
alguém permanentemente atualizado e com capacidades técnica e constantes decorrentes da globalização, pelo avanço tecnológico,
teórica de apresentar suas proposições. pelos novos modelos de competitividade, pela velocidade do
Para Matos (2009), a assessoria e a consultoria, são atribuições processo de especialização, pelas exigências do consumidor, e
dos assistentes sociais no conjunto das atividades que desenvolvem maximização da qualidade e do lucro, e adentram cada vez mais
em seus locais de trabalho, embora seja na universidade que o nas empresas privadas.
profissional encontra seu espaço privilegiado. Conforme Djalma Oliveira (2004), a consultoria empresarial
Lúcia Freire, em artigo que integra o livro organizado por é um dos segmentos de prestação de serviços que mais tem
Bravo e Matos (2010), relata a experiência que talvez seja a crescido no mundo, representando um dos campos de trabalho
única na bibliografia do Serviço Social, que se refere à assessoria mais procurados por jovens graduados em universidades europeias
e consultoria a empresas e aos seus gestores e trabalhadores. e americanas. Conforme pesquisa a respeito, a justificativa dada
Freire (2010), de início, reforça que esse tipo de assessoria e de pelos jovens é que esse segmento representa a possibilidade
consultoria é diferente do contratado pelas empresas - consultorias de maior rapidez na evolução de conhecimentos adquiridos e a
externas - empregadas exclusivamente para profissionais e percepção de um crescimento do negócio consultoria em relação
dirigentes. Baseada nessa relação, a autora questiona, inclusive, a outros negócios, principalmente quando comparados aos
por que se assessoram apenas os dominantes (gestores, dirigentes, segmentos da indústria e do comércio.
gerentes) e os pares (profissionais), e não os sujeitos usuários dos Elizenda Orlickas (2001) descreve consultoria como sendo “o
programas. A esses, apenas se “’orienta’ e ‘educa’”. fornecimento de determinada prestação de serviço, em geral, por
Justifica, ainda, no referido artigo, que tem utilizado a ação um profissional muito qualificado e conhecedor do tema, provido
de assessorar para todos os sujeitos atendidos pelo Serviço de remuneração por hora ou projeto, para um determinado cliente”.
Social, em razão de expressar, de forma mais contundente, a Conforme a autora, a finalidade do trabalho de consultoria visa
perspectiva democrática de respeito à capacidade desses sujeitos a mudança de uma realidade, demonstrando, desta forma, também
de pensar sobre a sua realidade e elaborar seus planos de ação, a necessidade de o consultor estar qualificado por instrução
nesta perspectiva, o verbo assessorar substitui os verbos assistir, superior e experiência específica. Conforme consta,
atender, apoiar, encaminhar e a maioria dos compreendidos na ação Os trabalhos desenvolvidos pelo consultor/assessor de
profissional, na perspectiva de ruptura com o conservadorismo. organização devem ser realizados visando à introdução de
A experiência relatada caracteriza-se como assessoria e inovações que objetivem auferir um melhor desempenho do cliente,
consultoria interna, embora esclareça que, na década de 1990, transferindo-lhes todos os conhecimentos necessários à perfeita
o trabalho não era identificado dessa forma. As demandas de continuidade do funcionamento dos serviços implantados, jamais
assessoria praticadas e mencionadas pela autora destinaram-se retendo elementos ou mantendo reserva sobre conhecimentos que
a gerentes isoladamente, a trabalhadores isoladamente, ou ao seriam importantes para que o cliente se torne independente em
conjunto de gerentes ou representantes da empresa e trabalhadores, relação ao consultor.
como na [Comissão Interna de Prevenção de Acidentes] Cipa. Oliveira (2004) relaciona o aumento do número de empresas
Podem ocorrer também demandas temporárias, na introdução de de consultorias a algumas tendências, entre as quais se destaca
novos projetos e em reestruturações, com grandes pesquisas para o objetivo deste texto, qual seja, o aumento da demanda de
obter a adesão de trabalhadores ou um controle diferenciado por consultoria “como consequência dos processos de terceirização”.
eles (muitas vezes, apenas na aparência de que existe um controle O autor acrescenta que as empresas estão direcionando todos os
social de fato). esforços para o núcleo de seu negócio, e, nesse contexto, utilizam
Freire (2010) destaca que esse espaço na área do trabalho é a terceirização como estratégia para facilitar o processo. Descreve
contraditório, e nele se convive com conflitos de interesses, mas a terceirização como processo administrado de transferência, para
também com consensos. O profissional que coordena o trabalho terceiros, de atividades que não constituem a essência tecnológica

Didatismo e Conhecimento 43
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
dos produtos e serviços da empresa, pois envolvem tecnologias A «modernidade» «tem sido mera retórica para legitimar um
de pleno domínio do mercado e, por conseguinte não consolidam novo padrão de produção que tem como núcleo a flexibilização
quaisquer vantagens competitivas, quer sejam tecnológicas ou e a precarização do trabalho» (Dau, 2009, p. 170).
comerciais, além de contribuírem para o aumento dos custos fixos Na visão de empresários e consultores/assessores, a
da empresa. terceirização gera empregos e contribui para aumentar a
Cita ainda, como exemplos da elevada terceirização, os serviços especialização e a qualidade dos serviços. Na visão dos
de recursos humanos e de informática, os quais são transferidos sindicalistas, é destruidora de empregos e de direitos, pois, quando
para as consultorias, por representarem melhor qualidade e custos uma empresa terceiriza atividades e serviços, o faz para empresas
menores. E que, embora os serviços terceirizados, em sua maioria, cujo acordo coletivo (quando existente) é negociado em condições
não sejam considerados como de consultoria empresarial, existem inferiores à da grande empresa, além do que a renda, os benefícios
algumas exceções em fase de crescimento, como é o caso da e as condições de trabalho apresentam-se superior ao das pequenas
transferência para terceiros (consultores e empresas de consultoria), empresas (Dau, 2009).
de algumas atividades que agreguem valor ao produto e serviço Graça Druck (1999), com base em informações do
oferecidos pela empresa-cliente. A empresa pode decidir “eliminar Dieese (1994), aborda a terceirização a partir de dois padrões:
alguma atividade ou realizar esta situação de maneira indireta, por reestruturante e predatório. No primeiro, a finalidade é a redução de
meio da terceirização” (Oliveira, 2004, p. 82). custos, a partir de determinantes tecnológicos e organizacionais, já
As consultorias empresariais envolvidas neste estudo que a focalização possibilita ganhos de produtividade e eficiência,
configuram, de maneira geral, a descrição acima feita pelo autor, na ao mesmo tempo que, ante a instabilidade do mercado, permite
medida em que prestam parecer sobre assunto de sua especialidade transferir os riscos para terceiros. Esse padrão estaria relacionado
às empresas contratantes e terceirizam a atividade dos assistentes com a qualidade e a produtividade e inserido, portanto, no novo
sociais. paradigma tecnológico. O segundo padrão é reconhecido, pela
autora, como o predominante no Brasil, e definido da seguinte
Algumas notas sobre a terceirização: flexibilização e forma:[...] caracteriza-se pela redução de custos através da
precarização exploração de relações precárias de trabalho. Essa terceirização
recorre a todas as principais formas de trabalho precário: a)
Graça Druck e Tânia Franco (2008), a respeito da terceirização, subcontratação de mão de obra; b) contrato temporário; c)
referem-se a Carelli (2003), que conceitua a palavra como uma contratação de mão de obra por empreiteiras; d) trabalho a
criação brasileira, revelando o real conteúdo da prática, qual seja, o domicílio; e) trabalho por tempo parcial; f) trabalho sem registro
“repasse ou a transferência de uma atividade a um ‘terceiro’ ou um em carteira. O que se observa, portanto, é uma flexibilização
‘outro’, que deveria se responsabilizar pela relação empregatícia e, dos direitos trabalhistas, um mecanismo de tentar neutralizar a
portanto, pelos encargos e direitos trabalhistas. Essa transferência regulação estatal e a regulação sindical.
é realizada por um ‘primeiro’. Como não se aborda quem seria É certo que um dos processos para entender o que envolve
o “segundo”, as autoras concluem que o termo indica posição a terceirização seja a «contratação, visto que é evidente o
periférica, e nos mais diversos setores em que a terceirização arbitramento na flexibilização dos contratos com terceiros.
se realiza, aponta para uma desqualificação, em geral para uma «A terceirização é uma das principais formas ou dimensões da
condição mais baixa, precária, menos central e de subordinação flexibilização do trabalho, pois ela consegue reunir e sintetizar
aos “primeiros”. o grau de liberdade que o capital dispõe para gerir, e, desta
Conforme relatório técnico elaborado pelo Departamento forma, dominar a força de trabalho”.
Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Quanto à legislação regulamentadora da terceirização, a
o que se terceiriza é a atividade, e não a empresa ou o trabalhador. polêmica e o debate são intensos e representam, para a classe
“A empresa terceira contrata o trabalhador, que não é terceirizado, trabalhadora, um dos maiores problemas, pela inexistência de
mas faz parte do processo de terceirização”. legislação específica sobre a modalidade no Brasil.
Para Denise Motta Dau (2009), os principais objetivos das Graça Druck (2009) reporta-se à precarização do trabalho no
empresas, com o processo de terceirização, são custos reduzidos Brasil como uma característica oriunda do trabalho escravo, e que
e maior flexibilidade da gestão da força de trabalho em termos perdurou até o trabalho assalariado, e do grau de informalidade
de contratação e demissão, “o que para a classe trabalhadora tem do trabalho nas regiões de fraco desempenho industrial, como é
significado redução de direitos, maior instabilidade e condições de o caso do Norte e Nordeste. Reconhece também que, em variados
trabalho, de modo geral, adversas”. momentos históricos, houve conquistas dos trabalhadores, nas
É importante destacar que, na visão da autora, as formas de proteção social e trabalhistas, identificando, em 1944,
empresas terceirizam tudo o que é possível, caminho apontado a edição da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o avanço
pelos empresários como para a modernidade, quando, na da industrialização e o crescimento da classe operária brasileira.
realidade, a terceirização no Brasil apresenta pouca relação Assegura, no entanto, que há uma nova precarização social do
de modernidade, quando comparada ao modelo japonês, já trabalho, que atinge tanto as regiões mais desenvolvidas do país
que não promove relação de parceria, de especialização, de quanto as mais tradicionalmente marcadas pela precariedade, e
aperfeiçoamento da qualidade, que orientaram a reorganização registrada nos setores mais dinâmicos e modernos, nas indústrias
da produção e do trabalho no Japão. A prática econômica e a de ponta e também nas formas mais tradicionais do trabalho
gerencial, nas empresas e organizações em geral, combinadas informal, por conta própria, autônomo etc., que atinge tanto
com o ideário neoliberal, elege a terceirização como prática os trabalhadores qualificados como os menos habilitados. Por
estratégica para reduzir custos em todos os setores produtivos. fim, a autora destaca que essa precarização se estabelece e se

Didatismo e Conhecimento 44
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
institucionaliza fragilizando os vínculos e impondo perda “dos É uma empresa pioneira no Brasil no conceito EAP,
mais variados tipos (de direitos, do emprego, da saúde e da vida) considerado um programa que complementa o plano de
para todos os que vivem-do-trabalho” (Druck, 2009). benefícios sociais oferecidos pelas empresas de grande porte.
Para o atendimento, a consultoria tem uma rede credenciada de
O caso de consultorias/assessorias empresariais e os profissionais especialistas em dependência química, psicologia,
profissionais do Serviço Social psiquiatria, serviço social e direito. Para as questões do Serviço
Social atualmente a rede é composta por duzentos assistentes
Identifica-se que as consultorias/assessorias (A e B) sociais distribuídos no território latino-americano, acionados
participantes da pesquisa qualitativa têm o perfil de consultoria nas demandas. Todos esses profissionais prestam serviço para
empresarial, uma vez que fornecem determinada prestação de a consultoria de forma autônoma.
serviço, a especialização de seus consultores/assessores, para as Como descrito no site da consultoria, o programa atende às
empresas clientes. Os assistentes sociais que prestam serviços por seguintes demandas: ansiedade, angústia, depressão, pânico e
meio das consultorias/assessorias participantes são denominados outros problemas emocionais; dificuldades de relacionamento
de consultores/assessores em Serviço Social e consultores/ pessoal e profissional; problemas no trabalho; situações de luto
assessores de atendimento. Para as empresas clientes, são ou perda; estresse diário, situações críticas e emergências, como
considerados consultores/assessores externos, uma vez que não as assaltos, sequestros, acidentes e desastres; envolvimento com
integram legal e administrativamente. álcool e drogas; convívio com idosos; crianças com problemas de
Confirma-se a tendência apontada no estudo nacional, aprendizagem ou necessidades especiais; dificuldades financeiras
realizado pelo CFESS (2005), a respeito das mudanças na ou planejamento financeiro familiar; e orientações sobre questões
nomenclatura dos cargos e funções exercidos pelos profissionais, legais.
que tendem a refletir mais as funções e competências do que a A Consultoria B tem, ao todo, 65 profissionais, divididos entre
formação profissional original. os escritórios de São Paulo e do Rio de Janeiro. Em São Paulo, a
As consultorias/assessorias têm características distintas, equipe da Consultoria B é composta por 35 profissionais e, desses,
considerando-se a forma e prestação dos principais serviços, catorze têm formação em Serviço Social, ocupando os seguintes
desenvolvidos pelos assistentes sociais, e, por consequência, cargos: um gerente de operações, um executivo de contas, um
alteram-se as relações sociais estabelecidas com os empregados gerente de rede credenciada, dez consultores de atendimento,
das empresas clientes. que são assistentes sociais, e um estagiário de Serviço Social.
A Consultoria/assessoria A foi constituída em 1998 e tem Recentemente, todos os profissionais da consultoria de autônomos
como característica principal a prestação de serviço especializado passaram a ser contratados celetistas.
em Serviço Social, e, conforme a representante legal, os O atendimento aos empregados (das empresas contratantes)
programas mais contratados pelas empresas são aqueles que que recorrem ao PAE, principal produto da consultoria, ocorre
envolvem o atendimento social e emergencial, bem como o a partir de uma central de atendimento, por um consultor
destinado ao acompanhamento de empregados em afastamentos especializado, que são psicólogos e assistentes sociais, instalados
previdenciários. Conforme site da consultoria, por meio desses internamente na consultoria. Esses profissionais não são
programas, oferecem atendimento 24 horas para situações de responsáveis pelos atendimentos externos. A partir de sistema
emergência; entrevista social; visitas domiciliar e hospitalar; informatizado, é identificado o cliente, o programa contratado,
captação de recursos públicos; suporte social aos gestores, se o PAE, o número de sessões, que geralmente são seis, para
funcionários e familiares; orientação em casos de falecimento, resolução do caso apresentado, que pode variar a cada ligação. Os
nos âmbitos nacional e internacional; apoio a incidente crítico consultores fazem a triagem inicial, orientam ou encaminham para
(violência urbana, acidente de trabalho, entre outros); orientação profissionais da rede credenciada e acompanham o caso até que
e acompanhamento decorrentes de desequilíbrio orçamentário; e seja finalizado.
dependência química. Partindo do ano de constituição das consultorias - 1998 e 2000
Para disponibilizar os serviços às empresas clientes, possui -, constata-se que ambas vêm suprir, para as grandes empresas,
25 profissionais, dos quais dezenove são formados em Serviço uma demanda iniciada nos anos 1980, relacionada à política
Social, ocupando, em novembro de 2011, os seguintes cargos: gerencial de recursos humanos de extensa diversidade de planos
um diretor, um gerente, dois supervisores e quinze assistentes de benefícios e serviços sociais. Esse período é marcado pelo
sociais. Desses, dez são autônomos, e revezam-se na central de avanço tecnológico nas empresas e necessidade de envolvimento
atendimento e também de forma presencial nas empresas clientes dos empregados para o alcance da produtividade e da qualidade.
para a prestação de serviços, e cinco são contratados via CLT, Paralelamente, outra tendência que se inicia, nesse período,
para trabalhar em uma empresa que assim exigiu. Além desses é a terceirização, visando reduzir os quadros e setores de trabalho
profissionais, a consultoria tem uma rede credenciada composta que não representassem as atividades-fim da empresa e que se
por 3.500 assistentes sociais, 2 mil psicólogos e alguns advogados, expressam também como forma de aumentar a lucratividade. Com
todos autônomos, distribuídos em várias localidades no Brasil. isso, várias áreas administrativas, muitas relacionadas a recursos
A Consultoria B foi constituída como empresa limitada, no ano humanos - campo da prática do profissional do Serviço Social -,
de 2000, e trouxe para o Brasil o conceito de Employee Assistance são entregues a terceiros, a consultorias especializadas.
Programs (EAP) ou, como também é conhecido, Programa de Os serviços oferecidos pelas Consultorias A e B, no campo do
Assistência ao Empregado (PAE). De origem americana, surgido Serviço Social, referem-se às “velhas demandas”, expressas em
em 1940, inicialmente voltava-se para programas ocupacionais de intervenções, e não em ações profissionais, com os empregados
prevenção e tratamento do alcoolismo. Atualmente, abrange ampla das empresas contratantes, para situações pontuais, na maioria de
variedade de problemas e consta em 90% das maiores empresas caráter individual, com a finalidade de orientar sobre como obter
americanas. bens ou acesso a serviços.

Didatismo e Conhecimento 45
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Evidenciam-se também a manutenção de práticas vinculadas O relato de uma das entrevistadas da Consultoria B exemplifica
às relações de trabalho, já que os consultores são requisitados para o fato: “O empregador recebe relatórios demográficos e por
atender problemas pessoais que interferem na produtividade. As demanda, com o propósito de a empresa, a partir daí, desenvolver
questões de natureza psicossocial associam-se aos atendimentos ações preventivas, mas não sabemos se desenvolve”.
a problemas não relacionados diretamente com o processo de Na Consultoria A, o relato foi similar, já que, eventualmente,
trabalho, mas a questões de caráter humanitário, função tradicional se reúnem com os representantes das empresas clientes e, quando
da profissão. Pode-se inferir que os profissionais do Serviço solicitado, podem propor ações. “A consultoria tem um programa
Social, nas consultorias pesquisadas, desenvolvem atividades para o cliente acessar as estatísticas de atendimento, através
instituídas (pelas consultorias e empresas), e não são envolvidos de senha própria. Com isso, pode fazer o monitoramento das
em demandas oriundas das novas tecnologias de gerenciamento, demandas e custo mensal, e podemos, em conjunto, propor ações
como, por exemplo, os programas de formação e qualificação preventivas.”
da mão de obra, verificadas em estudos de Serra (2010) e Cesar Quanto à forma de contratação das assistentes sociais,
(2010) sobre as demandas apresentadas ao Serviço Social advindas especialmente as consultoras em Serviço Social, que são
da reestruturação produtiva. autônomas, nota-se que as profissionais não se sentem
As duas consultorias oferecem às empresas clientes o esquema desprotegidas pelo fato de serem subcontratadas pela consultoria,
de trabalho por 24 horas, e isso significa que os consultores ficam e verificou-se também que buscam alternativas como forma de se
de sobreaviso para atendimentos emergenciais aos empregados. O preparar para situações futuras de aposentadoria e desemprego.
esquema exige, do profissional de plantão, disponibilidade após o Não reconhecem, como forma de precarização do trabalho, o fato
expediente de trabalho (geralmente noite e madrugada) e nos fins de não serem trabalhadoras com vínculo empregatício.
de semana. O acionamento é feito por telefone móvel, e o consultor Essa constatação remete às ponderações de Druck (2009), a
poderá resolver a situação à distância, ou acionar um profissional respeito da institucionalização da precarização do trabalho, e aqui
da rede credenciada para conduzir o caso. Na Consultoria A, o as consultoras consideram natural sua condição de profissional
consultor poderá ainda comparecer ao local do fato, se estiver terceirizado.
dentro da área de sua atuação. É relevante o número de assistentes sociais prestadores
O atendimento 24 horas disponibilizado às empresas exige de serviço na rede credenciada. Entre as duas consultorias
dos profissionais das consultorias a flexibilidade das condições contabilizam-se, aproximadamente, 3.700 assistentes sociais,
de trabalho para o atendimento a empregados da era globalizada,
distribuídos em várias localidades (Brasil e América Latina)
ocasionada a partir da abertura dos mercados. A abrangência
para atendimentos diversos, evidenciando que muitos desses
oferecida pelas consultorias (várias localidades no Brasil e
profissionais têm mais de um vínculo empregatício, ou apenas
na América Latina) evidenciam que as consultorias também
esse trabalho de caráter eventual das consultorias. Conforme
flexibilizaram a sua mão de obra.
relato de uma das entrevistadas, da Consultoria A, «a maioria
Sobre a relação estabelecida com o empregado atendido, as
desses profissionais têm o seu trabalho, e prestam serviço para
consultoras são unânimes em relatar que se cria uma relação de
a consultoria quando acionados».
confiança, inclusive naqueles casos em que o atendimento não se
Outro dado relevante, revelado a partir das características
dá pelo mesmo profissional, ou é feito apenas por telefone. Na
Consultoria B, onde a totalidade dos casos é atendida a distância, das consultorias, é que a maioria dos clientes que terceirizam as
relata-se também a criação de vínculos. As entrevistadas revelam atividades de assistentes sociais é composta de empresas privadas.
que a confidencialidade, confiabilidade e disponibilidade do Essas empresas representam 95% dos clientes na Consultoria A
serviço 24 horas são as principais vantagens para os empregados. e 98,5% a Consultoria B. Foi considerado o número de clientes
Lembrando que esse é o ponto de vista dos assistentes sociais, informados pelas consultorias.
uma vez que a pesquisa não abrangeu os usuários dos serviços a Considerando-se que na Consultoria B, recentemente, as
respeito do assunto. assistentes sociais, consultoras de atendimento, passaram de
O tipo de atendimento prestado aos empregados das empresas autônomas para celetistas, e que, na Consultoria A, as consultoras
contratantes é considerado como de caráter orientador pelas em Serviço Social são autônomas,11 conclui-se, a partir do
profissionais da Consultoria B, e orientador e educador pelos levantamento, que essas consultorias representam uma tendência
profissionais da Consultoria A, evidenciando que a determinação à informalidade do trabalho do assistente social.
dos empregadores (no caso aqui consultoria e empresa) influencia Com relação às características profissionais que os assistentes
a finalidade da função do Serviço Social nesse ambiente. sociais consideram importantes para trabalhar na consultoria e,
Confirmam-se as ponderações de Freire (2010), a respeito do consequentemente, prestar serviços nas empresas, a pesquisadora
caráter orientador e educativo, que adquire a intervenção do elegeu doze itens para serem avaliados pelas profissionais
consultor externo, quando é dirigida ao empregado. entrevistadas, com nota de um a dez delas. Apenas o item confiança
A confidencialidade dos dados do empregado é preservada. recebeu nota máxima das entrevistadas. Os outros, por ordem
Para as empresas existe estatística de atendimento por demanda, crescente, foram: bom intermediador de relações, compreensível,
para identificar situações que mereçam intervenções preventivas com foco na humanização do local de trabalho, polivalente,
ou desenvolvimento de programa que visem à redução da conhecedor dos critérios para prestação de serviços sociais, bom
incidência. Diante dessa realidade, as consultoras confirmam o interlocutor da empresa, com qualificação profissional, com perfil
que geralmente acontece com a atuação profissional nas empresas educador e orientador, assertividade no assessoramento à gerência,
privadas, ou seja, a autonomia relativa, numa margem limitada. boa capacidade técnica e qualificação intelectual.

Didatismo e Conhecimento 46
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Confirma-se, nas consultorias, assim como nas empresas Completando o pensamento a respeito das alterações que se
privadas, que as novas modalidades de gestão da força de trabalho processam nas demandas, com o qual esta pesquisadora concorda
requerem, como característica básica do assistente social, a plenamente, a autora discorre que os espaços ocupacionais e as
confiabilidade e o bom relacionamento, para o envolvimento com fronteiras profissionais sofrem significativas alterações, pois são
os objetivos da empresa. Evidencia-se que não há requisitos com resultantes históricos e, portanto, móveis e transitórias (Iamamoto,
relação às características profissionais citadas no Código de Ética 2002).
profissional, que dizem respeito ao “técnico competente teórica, Conforme se demonstrou ao longo deste texto, as consultorias/
técnica e politicamente” (p. 20). assessorias empresariais apresentam-se como contingente de
As entrevistadas reconhecem o assistente social como trabalho profissional e, independentemente do vínculo empregatício
um profissional estratégico na consultoria, capacitado para o - seja no regime celetista ou na condição de autônomo -, os
atendimento, e acreditam no crescimento do número de empresas assistentes sociais são contratados, não para trabalhos profissionais
de consultoria com esse tipo de prestação de serviço, portanto, no de assessoria/consultoria, no sentido pleno da palavra, como
aumento de vagas para os profissionais no mercado de trabalho. estudado com Matos (2009, 2010) e Freire (2010), ou com a
Sobre as vantagens em trabalhar nas consultorias, são diversos finalidade de transferir conhecimentos necessários à continuidade
os posicionamentos dos assistentes sociais, todos positivos, com do funcionamento dos serviços implantados, conforme visto com
relação à experiência que as relações de trabalho proporcionam ao Orlickas (2001). Pela descrição, nas entrevistas, os atendimentos
profissional. Os destaques são para a experiência adquirida com prestados fazem parte das atividades específicas e especializadas
a variedade de casos de atendimentos, o incentivo à capacitação do assistente social, visando aos objetivos empresariais tanto das
demandada pelos atendimentos, a troca de experiências entre consultorias quanto das empresas clientes, de melhoria da qualidade
os profissionais, e também o conhecimento diversificado das de vida e trabalho dos empregados e do clima organizacional,
realidades empresariais. voltados para a produtividade e a lucratividade.
As representantes das consultorias destacam a importância As características das consultorias/assessorias permitem
da prestação de serviços para os empregadores (empresa) que têm a reflexão de que os impactos da reestruturação produtiva nas
equipes de empregados na área comercial, ou com um contingente empresas impulsionaram a constituição de prestadores de serviços,
de trabalhadores em atividades externas. O formato do serviço em que a hegemonia e a subordinação (ao grande empresariado)
proporcionado pelas consultorias, cada qual com um nível de existem, mesmo que de forma ocultada.
abrangência, 24 horas por dia, possibilita cobertura integral ao As consultorias, nas quais trabalham os assistentes sociais
atendimento dos empregados e familiares em várias localidades, entrevistados, se constituíram no período 1998-2000, no auge
seja Brasil ou na América Latina. do toyotismo e da reestruturação produtiva brasileira, marcados,
Na opinião das assistentes sociais, as vantagens para os entre outros, pelo neoliberalismo intensificado no governo
empregadores se estendem além das questões operacionais. Nos Fernando Henrique Cardoso, em que a austeridade no gasto
relatos, apontam questões financeiras, favoráveis às empresas público, as privatizações, a reestruturação das políticas sociais, a
contratantes, em terceirizar a atividade, e também vantagens desregulamentação e a flexibilização das relações trabalhistas são
oferecidas pela especialização do serviço, e formato na algumas características marcantes.
disponibilização - tempo, recursos e abrangência. Embora não O retardamento na implementação e na efetivação dos direitos
mencionem o conceito flexibilização, é isso que se constata e sociais postos pela Constituição federal de 1988, a protelação na
remete a Graça Druck (2002) sobre as formas concretas que se efetivação das coberturas públicas, levam as empresas, a partir de
difundem em todas as atividades e lugares. seus interesses, a ampliar seus benefícios ocupacionais, práticas
Ainda sobre a dinâmica do trabalho das assistentes sociais essas iniciadas nos anos 1980. Ao mesmo tempo, a lógica do
nas consultorias, as entrevistadas foram questionadas se as mercado exige competitividade, produtividade, e lucratividade.
atividades se constituíam em competências e atribuições dos Para isso, as empresas apoiam-se na flexibilidade dos processos de
assistentes sociais. A questão não teve o objetivo de investigar o trabalho, que, entre outros fatores, se expressam na terceirização.
conhecimento dos profissionais acerca da legislação profissional. A As consultorias/assessorias especializadas em gestão de
pergunta iniciou-se com a explicação sobre o conceito dos termos, pessoas surgem, para as empresas, num momento em que a
ou seja, as atividades de competências como sendo aquelas que ampliação das políticas de recursos humanos, principalmente e
podem ser realizadas tanto pelo assistente social quanto por outros não só, é caracterizada pela combinação de sistema de benefícios
profissionais, e as atribuições privativas como sendo as atividades e serviços sociais como políticas de incentivo à produtividade do
exclusivas dos assistentes sociais. As respostas foram 100% trabalho. Novas exigências são requeridas ao assistente social,
afirmativas para as duas questões, mas nota-se que os profissionais na conjuntura atual. Competências e atribuições misturam-se
confundem os termos competências e atribuições, o que pode com intervenções tradicionais, em novos contextos, próprios
acontecer levando-se em conta o redimensionamento dos espaços da contemporaneidade, como, por exemplo, intervenções nos
ocupacionais e das demandas que definem novas competências ao casos provenientes de incidentes críticos, de sequestro, assaltos,
assistente social. desastres, acidentes etc.
Iamamoto (2002), em artigo a respeito dos espaços Para atender às necessidades dos empregados, as consultorias
ocupacionais e trabalho do assistente social na atualidade, alerta informatizam-se, requerem profissionais competentes, com aptidão
que as alterações nas demandas interferem nas funções dos para responder por vários assuntos, confiáveis, bem relacionados
assistentes sociais que passam a executá-las, mas, “muitas vezes, (no ambiente das consultorias e empresarial), dinâmicos, proativos,
não são por eles reconhecidos como atribuições privativas, tal polivalentes, que tenham disponibilidade para o trabalho por
como estabelecidas tradicionalmente”. 24 horas (quando nos sobreavisos) e de forma abrangente (rede

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
credenciada). O esquema de trabalho para atender a um trabalhador
globalizado requer disponibilidade de serviço durante 24 horas e
amplo nível de abrangência (no caso do Brasil e América Latina) e,
3.3 SAÚDE MENTAL, TRANSTORNOS
com isso, organização em rede e equipes internas enxutas.
MENTAIS E O CUIDADO NA FAMÍLIA.
A flexibilidade apresentada pelas consultorias atende ao
formato exigido pelas empresas. A dinâmica de trabalho e o
esquema montado para o atendimento aos empregados das
empresas contratantes - a distância, presencial, pela central de A inserção do assistente social em saúde mental no Brasil,
atendimento - demonstram que não só as empresas flexibilizaram a partir dos anos 90 tem por determinante o processo de
a sua produção, mediante a desconcentração industrial ou a desinstitucionalização da pessoa com transtorno mental, isto é,
horizontalização produtiva, expressa na terceirização, mas as todo um processo de “crítica epistemológica ao saber médico
consultorias também.
constituinte da psiquiatria” (AMARANTE, 1996) e a todo aparato
O pressuposto de que, em empresas privadas, assim como
que deu suporte à institucionalização do modelo hospitalocêntrico
nos serviços públicos, a prestação de serviços dos assistentes
de atenção a este segmento social, ou seja, todo arcabouço legal,
sociais, de forma terceirizada, intermediada pelas consultorias
empresariais, era verificável, nas formas de trabalho autônomo, técnico, administrativo e interventivo da psiquiatria clássica.
temporário, por projeto, por tarefa, pode ser constatada por meio Supracitado processo deu origem à reforma psiquiátrica
do conhecimento da constituição dos recursos humanos das brasileira conceituada como “conjunto de transformações de
consultorias participantes do estudo. práticas, saberes, valores culturais e sociais em torno do “louco” e da
Os assistentes sociais, na condição de profissionais autônomos, “loucura”, mas especialmente em torno das políticas públicas para
envolvidos direta e internamente em uma das consultorias/ lidar com a questão” (BRASIL, 2007), que tem origem na década
assessorias, prestando serviços para as empresas, mais os de 70, do século XX, no cerne do processo de redemocratização
assistentes sociais da rede credenciada das duas consultorias, da sociedade brasileira. Primeiramente persiste subsumido ao
somam aproximadamente 3.700 profissionais. Essa verificação Movimento Sanitário, mas, ganha uma identidade própria, haja
permite deduzir que as consultorias possivelmente sejam uma visto que o primeiro tem como bandeira de luta a universalidade
tendência de informalização do trabalho do assistente social, sob do direito à saúde, tendo por foco os direitos sociais. Por sua vez, o
a aparência de prestação de serviços autônomos. Deve-se lembrar Movimento da Reforma Psiquiátrica orienta-se pelos direitos civis
que foram identificadas cinco consultorias e que, portanto, esse das pessoas com transtornos mentais, isto é, se insere na luta das
número tende a ser maior. minorias sociais pelas liberdades básicas, tais como: circular pela
As condições de trabalho flexíveis, o domínio diversificado de cidade e convívio social.
informações, o nível de abrangência do alcance para o atendimento, O modelo asilar/ hospitalocêntrico em psiquiatria emerge
o trabalho part time são os requisitos de empresas da era globalizada como uma resposta a uma das questões sociais postas pela pessoa
para essas consultorias/assessorias, no atendimento à reprodução com transtorno mental, com a emergência da sociedade moderna,
da sua força de trabalho. A disponibilidade em tempo integral para fundamentada no trabalho, no ser da razão e da produção. Tais
situações emergenciais, por demanda, remete ao modo just in time, pessoas figuram no novo contexto como improdutivas (BASTIDE,
característica amplamente difundida na reestruturação produtiva. 1967) e, portanto, são alijadas do convívio social, a partir da
Os atendimentos de caráter individual, orientador, relacionados à apropriação médica da loucura, definida desde então, como
busca por apoio, informação, encaminhamentos, aconselhamentos, “doença mental”, presumindo-se a periculosidade e incapacidade
para situações pontuais e emergenciais, condicionam a forma e os de tais sujeitos, fato que justificará no imaginário social a ideia de
resultados do trabalho do assistente social e reiteram que a prática
que “lugar de doido é no hospício”. Supracitado modelo, sobretudo
se dê num setor que é contraditório, por envolver relações entre
após a II Guerra Mundial, passa a ser equiparado a um campo de
capital e trabalho.
Conclui-se que, na gestão organizacional, as consultorias/ concentração, por ter se constituído em um espaço de violação de
assessorias seguem o mesmo padrão adotado pelas empresas, ou direitos humanos, pela ação centrada na massificação da atenção
seja, se apropriam dos processos de reestruturação produtiva, na e na mera segregação social. Neste contexto emergem várias
forma de organização e na obtenção de lucro. A centralidade está propostas reformistas em saúde mental, com diferentes tradições
nos interesses dos processos produtivos das empresas clientes, teóricas, em conjunturas históricas singulares e em vários países
tornando-se secundária a perspectiva de ação do assistente social, do mundo Ocidental, destacando-se a Inglaterra, a França, os
com o empregado presente no projeto ético-político profissional. Estados Unidos e a Itália.
Isso não deve ser considerado como crítica, uma vez que a Desses processos, emerge paulatinamente, com mais
incidência não está somente na esfera empresarial. intensidade a partir da década de 90, sobretudo no Brasil, a luta
O desafio é para o profissional que, sem negar sua condição pela inclusão da pessoa com transtorno mental na condição cidadã,
de trabalhador assalariado, deve reconhecer que “há espaço para como sujeitos de direitos.
a defesa do projeto profissional em qualquer local, público ou Coroando estes processos, a Organização Panamericana da
privado, em que o assistente social é requisitado a intervir”. Saúde realiza a Conferência Regional para a Reestruturação da
Um bom começo, conforme cita a autora, é o profissional Assistência Psiquiátrica, no período de 11 a 14 de novembro de
estabelecer o que a profissão tem a oferecer naquele espaço 1990, em Caracas, Venezuela. Do encontro resulta a Declaração
ocupacional, como subsídio para o atendimento das demandas, de de Caracas, em que o “manicômio” é condenado tendo por base
forma que possa manter o compromisso com os valores anunciados 04 eixos:
no Código de Ética e garantidos na lei de regulamentação 1 – Ético-jurídico – pela violação dos direitos humanos das
profissional. (Texto adaptado de GIAMPAOLI, M. C.). pessoas com transtornos mentais;

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
2 – Clínico – em função da ineficácia terapêutica e da condição “A Clínica Ampliada propõe que o profissional de saúde
de agente patogênico e cronificador historicamente assumido por desenvolva a capacidade de ajudar as pessoas, não só a combater
tais instituições; as doenças, mas a transformar-se, de forma que a doença, mesmo
3 – Institucional – devido tais instituições se constituírem sendo um limite, não a impeça de viver outras coisas na sua vida”
como espaço de violência – “instituições totais”, que mortificam, (BRASIL, 2004).
sujeitam; Com estes arcabouços, desenvolvem-se no Brasil várias
4 – Sanitário – em função da organização do modelo experiências inovadoras em saúde mental, combatendo o estigma
assistencial figurar como “cidade dos loucos”, produzindo a loucura que historicamente cercou este segmento bem como consolidam-
administrativa, executiva e organizacional (ORGANIZAÇÃO se alterações no plano assistencial e legislativo.
PANAMERICANA DA SAÚDE, 1990). Em 1989 é apresentado o Projeto de Lei nº 3.657/89 de autoria
Em reforço à tendência de reconhecimento da condição de do deputado mineiro Paulo Delgado, que propõe a extinção dos
sujeito de direitos da pessoa com transtorno mental, em 17 de manicômios e sua substituição por serviços extra hospitalares.
dezembro de 1991 a Organização das Nações Unidas divulga Este projeto impulsionou os debates em torno da construção da
o documento que trata da “proteção de pessoas com problemas cidadania das pessoas com transtornos mentais na década de 90 no
país, levando 12 anos para se transformar em uma lei específica.
mentais e a melhoria da assistência à saúde mental”.
No início dos anos 90 a Coordenação de Saúde Mental do
Em suma, o que singulariza as reformas psiquiátricas em
Ministério da Saúde adota uma política de reestruturação da
curso no mundo Ocidental no pós II Guerra e a partir dos anos 70
assistência psiquiátrica, orientada para a criação de novos serviços,
no Brasil é a construção da cidadania da pessoa com transtorno
posto que, até então, o governo federal só financiava serviços
mental, até então tuteladas. Paradoxalmente, o desafio que é identificados com o modelo hospitalocêntrico.
colocado é de revisão da “cidadania interditada” (DELGADO, No plano legislativo as inovações circunscrevem os avanços
1992). estabelecidos pela Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, que “dispõe
O movimento brasileiro é influenciado pela experiência sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos
italiana, da tradição basagliana (AMARANTE, 1996), que coloca mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”.
a enfermidade entre parênteses, evidenciando o sujeito enfermo e Em 2002 o Ministério da Saúde lança a Portaria nº 336, que
seu contexto de vida. Constrói seu objeto sobre a complexidade define as modalidades de Centros de Atenção Psicossocial - CAPs,
da “existência-sofrimento” (ROTELLI, 1990) das pessoas principal equipamento reformista, colocado como substitutivo ao
com transtornos mentais, articulando-a com suas condições de modelo hospitalocêntrico.
reprodução social, enfatizando o processo de invenção/produção Os CAPs são definidos pela portaria acima como serviço
da saúde. ambulatorial, que funciona segundo a lógica do território, devendo
Nesta leitura a questão a ser enfrentada é a emancipação, a priorizar o atendimento de pessoas com transtornos mentais
ampliação do poder de trocas sociais das pessoas com transtornos severos e persistentes.
mentais, não a obstinação terapêutica pela cura ou a reparação, O território é entendido como a esfera da gestão da vida
mas a reprodução social, a reinscrição dessas pessoas no mundo cotidiana da pessoa com transtorno mental. Circunscreve os
social. espaços construídos e reconstruídos permanentemente, resultando
Tal perspectiva se sintoniza com o conceito ampliado de do jogo de interesses entre diversos atores sociais. Desse modo,
saúde advogado pelo Sistema Único de Saúde, reforçado pela cabe à intervenção do Caps propiciar laços sociais e melhorar
Constituição Federal de 1988, em que os determinantes sociais do a vida cotidiana da pessoa com transtorno mental. O cuidado
processo saúde-doença ganham destaque. A saúde é vinculada às oferecido vai além da debelação dos sintomas, abarcando o lazer,
condições de reprodução da vida. Passa a abranger: o meio físico; as relações sociais, as condições de moradia, as atividades da vida
o meio socioeconômico e cultural e a oportunidade de acesso aos diária, a esfera da geração de renda/trabalho, dentre outras.
serviços que visem à promoção, proteção e recuperação da saúde. O paradigma que orienta a nova perspectiva e prática
Emerge assim um novo paradigma, baseado na promoção da saúde, circunscreve o amplo campo denominado de reabilitação
psicossocial, um termo polissêmico mas, no contexto do presente
onde a qualidade de vida e a atenção integral são ressaltadas.
texto compreendido como um processo que implica a abertura
Tais entendimentos, associados aos avanços da bioética
de espaços de negociação para o paciente, para sua família, para
e princípios do controle social das ações do Estado pelos
a comunidade circundante e para os serviços que se ocupam do
Movimentos Sociais impõem uma ampliação do campo clínico,
paciente: a dinâmica da negociação é continua e não pode ser
que ganha uma denominação específica na área psiquiatria, como codificada de uma vez por todas, já que os atores (e os poderes) em
clínica da reforma; clínica do cotidiano ou clínica ampliada. Ou jogo são muitos e reciprocamente multiplicantes (SARACENO,
seja, a dimensão socioeconômica, política e cultural são integradas 1999).
na abordagem dos profissionais que advogam esta perspectiva. O Saraceno equipara o conceito de reabilitação psicossocial à
clínico e o extra clínico não mais se dissociam. cidadania, entendendo-os como sinônimos.
Anteriormente, tratar circunscrevia limitar-se às expressões Nesta perspectiva vários elementos assumem papel de
dos sintomas da enfermidade, à terapia medicamentosa ou a destaque na evolução de um transtorno mental, assim como
intervenção exclusiva ou preponderantemente médica. O que era na estratégia da intervenção em saúde mental. Saraceno
da enfermidade era considerado clínico, então remetido ao médico. (1994) classifica estes elementos dividindo-os em variáveis
O extra clínico, o social, era remetido a outros profissionais, fortes e variáveis sombra. As primeiras são delimitadas pelo:
principalmente ao assistente social. diagnóstico; idade; agudeza ou cronicidade do quadro e história

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
da enfermidade. As variáveis denominadas como “sombra” não de vida da pessoa enferma, atuação em rede sócioassistencial,
são menos importantes, mas, contornam uma gama de fatores intersetorial, calcada no controle social, na promoção da cidadania
que se relacionam com: a) os recursos individuais da pessoa com e da autonomia possível de usuários e familiares.
transtorno mental (“o nível de capacidade intelectual e o grau de O novo perfil do trabalhador em saúde tem por traços: a ação
informação” da pessoa com transtorno mental, seu status social, polivalente; com competências múltiplas e que atue mais com
sua condição de solidão ou não e o sexo. Entre os recursos do o intelecto, com a intuição. Ou seja, a clássica divisão social do
contexto, são destacados: o nível de comprometimento relacional trabalho que segmenta trabalho intelectual do trabalho manual,
dos familiares; nível de solidariedade ou hostilidade da rede de planejamento e execução, se rompe.
parentesco ou de vizinhança; o status social do grupo familiar e Constrói-se um trabalhador coletivo sintetizado no termo
nível de integração ou desintegração social do meio em que vive. Técnico de Referência - TR, que é o profissional que acolhe
Entre os recursos do serviço assistencial, Saraceno (1999) destaca e assegura um vínculo com os usuários dos serviços e que tem
os recursos materiais, organizacional e os processos de trabalho. “sob sua responsabilidade monitorar junto com o usuário o seu
Dentre os recursos do contexto do serviço de atenção, os projeto terapêutico, (re) definindo, por exemplo, as atividades e a
elementos que podem favorecer ou obstaculizar o sucesso da frequência de participação no serviço. O TR também é responsável
intervenção estão relacionados ao: nível de solidariedade da rede pelo contato com a família e pela avaliação periódica das metas
social; nível de articulação da rede sócioassistencial; qualidade traçadas no projeto terapêutico, dialogando com o usuário e com a
e eficiência do sistema de saúde do país e atitude, positiva ou equipe técnica do CAPS” (BRASIL, 2004).
negativa dos demais serviços sócioassistenciais em relação às Consequentemente, não só o médico ganha destaque nas
decisões da equipe da saúde mental. Todavia, conforme alerta
intervenções e na direção dos serviços. Outros profissionais passam
Saraceno:
a ter suas práticas valorizadas. Muitos Caps, inclusive alguns
Essas variáveis geralmente são deixadas à sombra porque
hospitais psiquiátricos e coordenações estaduais e municipais
são consideradas “irrelevantes” no que diz respeito à evolução da
passam a ser comandados por profissionais não médicos.
enfermidade e à estratégia de intervenção. Entretanto, é provável
que um paciente piore muito mais pela falta de todos (ou alguns) Para cimentar os avanços acima, no campo da formação
desses recursos do que pelo tipo de enfermidade (Diagnóstico). Na profissional em saúde, são implantadas as Diretrizes Curriculares
realidade, pacientes que têm um mesmo diagnóstico desenvolvem Nacionais do Curso para os Cursos Universitários da Área da Saúde
diferentes evoluções e resultados, assim como pacientes que (ALMEIDA, 2003). As diretrizes têm um caráter interprofissional,
têm uma mesma terapia farmacológica desenvolvem diferentes que corrobora uma formação parametrada pelo reforço aos
evoluções e resultados. Por isso, o diagnóstico sozinho, assim postulados do Sistema Único de Saúde, orientado para a promoção
como o fato de que o paciente tome alguns psicofarmácos, à saúde e determinantes sociais do processo saúde-doença.
não orienta para um prognóstico. O diagnóstico pode ajudar a Com todo este contexto e contorno, o movimento de reforma
estabelecer a oportunidade de uma terapia farmacológica, porém psiquiátrica impõe novas demandas para todos os profissionais
não a estabelecer estratégias de intervenção mais complexas e da saúde mental, particularmente para os assistentes sociais, que
articuladas [...] O que determina resultados tão diferentes é: boa não são profissionais da saúde, mas tem atualmente este campo
ou má utilização das medidas terapêuticas; a existência e/ou numericamente como um de seus principais espaços sócio
influência das variáveis “sombra”. ocupacional. A Resolução 287/98 do Conselho Nacional da Saúde
Desse modo, a pessoa com transtorno mental é restituída em reconhece o Serviço Social como uma das 14 profissões da área da
sua integralidade e o foco da atenção dos profissionais de saúde saúde, mas no interior da categoria há um acúmulo ainda incipiente
mental se amplia para além dos sintomas e dos medicamentos, nesta arena.
para as dimensões sociais da vida. Assim, os determinantes sociais
do processo saúde-doença ganham ênfase e o social passa a ser Demandas postas para o assistente social na Saúde Mental
uma dimensão que ganha evidência na intervenção de todos os
profissionais de saúde mental. Historicamente, a inserção do assistente social em saúde
O modelo assistencial psiquiátrico brasileiro encontra-se em mental no Brasil tem início em 1946, a partir do trabalho em
processo de transição, de um modelo segregador, excludente, instituições voltadas para a infância. Em seguida o assistente
para um modelo de serviços aberto, comunitário e preservador da social é incorporado aos hospitais psiquiátricos, atuando na “porta
cidadania. Muito embora persista a coexistia de lógicas/modelos, de entrada e saída” dos serviços, como informa Vasconcelos
um dos principais avanços é no reconhecimento da pessoa com
(2007). As ações dos assistentes sociais no espaço hospitalar
transtorno mental como sujeito de direitos.
volta-se preponderantemente para levantamentos de dados sociais
Neste contexto, o próprio modelo hospitalocêntrico tem
dos PTMs e seus familiares; confecção de atestados sociais;
sido exigido a se modernizar. A institucionalização do Programa
encaminhamentos para a rede sócia assistencial e difusão de
Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares – PNASH –
versão hospitais psiquiátricos (Portaria GM/MS 3.408, de 05 de informação e orientação social, sobretudo para regularizar a
agosto de 1998) materializa o investimento no sentido de “garantir documentação e acessar benefícios sociais, aposentadorias.
a qualidade mínima necessária aos serviços de saúde”. Gradativamente, no interior dos próprios hospitais
No contexto mudancista novos processos de trabalho são psiquiátricos os assistentes sociais passam a atuar em vários setores:
requeridos exigindo novas técnicas e tecnologias e novas formas de plantão psiquiátrico, pavilhões - divididos por sexo (masculino e
trabalho em saúde e, particularmente em saúde mental, calcadas no feminino) e faixa etária (pavilhão infantil ou geriátrico); hospitais-
trabalho em equipe multiprofissional e interdisciplinar, no território dia e ambulatórios).

Didatismo e Conhecimento 50
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Entre os serviços típicos da reforma psiquiátrica, Caps, Caps Vale lembrar que nem a questão social nem o social são
infanto-juvenil, Caps-álcool e drogas, residências terapêuticas exclusividades do assistente social. Uma vasta gama de objetos
e atenção primária, observa-se os assistentes sociais assumindo de intervenção dos assistentes sociais se situa na interface com
uma multiplicidade de funções, sobretudo como gestores, outras profissões. Neste sentido, o trabalho em equipe pode
coordenadores, planejadores, técnicos, supervisores, dentre outras. constituir-se em uma arena de construção interdisciplinar ou de
Na área empresarial, sobretudo em empresas de economia tensões, disputas corporativas e de saberes. Essas possibilidades
mista, em hospitais gerais e algumas instituições públicas tem podem estar reforçadas no próprio termo trabalhador coletivo
crescido o número de assistentes sociais coordenando programas construído no cerne dos novos serviços, com a figura do técnico
de alcoolismo, tendo por público alvo os funcionários ou de referência. Este “personagem” pode reforçar a diluição das
servidores públicos e seus familiares. A área da assistência social fronteiras entre as diferentes categoriais profissionais, ampliando
tem se alargado em direção à saúde mental, através de programas áreas de sombreamento, permitindo a interdisciplinaridade ou até
de abrigamento de idosos ex-moradores de hospitais psiquiátricos, acirrando o confronto entre as profissões.
população de rua com transtornos mentais, mas fora de crise e De qualquer maneira, os novos serviços colocam o desafio de
mais recentemente, tem criado coordenadorias de dependência reconstrução das identidades e fazeres profissionais tradicionais.
química, voltada para os adolescentes em cumprimento de medidas O desafio é fazer convergir os olhares e práticas para a
socioeducativas. construção de algo novo “de modo a poder dar uma direção às
Além dessas atividades é comum encontrar assistentes sociais diferentes intervenções que, guardando sua especificidade, não
em atividades de docência, supervisão de serviços e de pesquisa sejam conflitantes entre si, permitam alguma coerência no trabalho
na área da saúde mental, no Serviço Social Jurídico abordando da equipe e tornem viável uma ação conjunta. Não é ‘todo mundo
questões de interdições, tutela, curatela, dentre outros. fazendo a mesma coisa” nem ‘cada um faz uma coisa diferente’
Cada serviço traz necessidades particulares para a prática (FIGUEIREDO; JARDIM, 2001).
profissional, exigindo adequações a múltiplas temáticas e Como afirma Marilda Iamamoto, o trabalho coletivo não
segmentos no interior da saúde mental e a heterogêneos processos impõe a diluição de competências e atribuições profissionais. Ao
de trabalho, a exemplo da coordenação de uma residência contrário, exige maior clareza no trato das mesmas e o cultivo da
terapêutica. identidade profissional, como condição de potenciar o trabalho
Além disso, a história do serviço e da equipe multiprofissional conjunto. O assistente social mesmo realizando atividades
bem como as habilidades de cada um de seus membros, a correlação partilhadas com outros profissionais dispõe de ângulos particulares
de forças internas e externas às equipes também vão influir nas
de observação na interpretação dos mesmos processos sociais e
possibilidades da prática profissional do assistente social.
uma competência também distinta para o encaminhamento das
Em suma, observa-se que são várias as demandas colocadas
ações (IAMAMOTO, 2002).
pela nova política, novo paradigma e novos serviços, com novos
Dessa maneira, muito embora o assistente social não seja
processos de trabalho para todos os profissionais da saúde mental
um profissional do campo psi nem da saúde, tem um olhar e uma
e particularmente para os assistentes sociais. Mas,
contribuição singular para a área da saúde mental, historicamente
As múltiplas competências e atribuições para as quais
legitimados, reconhecidos pela própria inclusão desta categoria na
é chamado a exercer no mercado de trabalho exigem uma
equipe multiprofissional.
interferência prática nas variadas manifestações da questão social,
Mas, nos novos cenários a identidade do assistente social em
tal como experimentadas pelos indivíduos sociais. Essa exigência,
no âmbito da formação profissional, tendeu a ser unilateralmente saúde mental encontra-se em processo de construção. A mesma
restringida ora aos procedimentos operativos, ora à qualificação é determinada por vários elementos: 1) pelo conjunto de fatores
teórica como se dela automaticamente derivasse uma competência macroestruturais, que determinaram a emergência da profissão na
para a ação (IAMAMOTO, 2007). sociedade brasileira. No caso da saúde mental é preciso resgatar
Os assistentes sociais durante seu curso de graduação não têm historicamente os condicionantes da emergência do serviço social
uma formação específica em saúde mental. neste campo, o que foi realizado por Vasconcelos (2007); 2) pelos
Os estágios curriculares e extracurriculares em saúde ainda documentos legais que delimita as competências e atribuições dos
tem uma relação intensa com o modelo hospitalocêntrico, haja assistentes sociais, destacando-se a Lei de Regulamentação da
vista que muitos serviços se conformam como hospitais de ensino, Profissão nº 8.662, de 07 de junho de 1993; o Código de Ética
sendo vinculados com as universidades, que ainda disseminam Profissional, Resolução CFESS nº 290; a Resolução CFESS nº
uma formação pautada fortemente no modelo biomédico, 383/99 de 29 de março de 1999 que caracteriza o assistente social
separando os sintomas do contexto social, no geral, preparando como profissional da saúde; Resolução CFESS nº 493/2006, de 21
de maneira tímida para o trabalho em equipe multiprofissional de agosto de 2006, que dispõe sobre as condições éticas e técnicas
e interdisciplinar. Isto é, não é fomentado durante o processo do exercício profissional do assistente social; 3) pela visão de
formativo o diálogo entre as diferentes ciências e profissões, o que mundo e singularidade de cada profissional, pois, cada agente
é requerido no dia a dia assistencial. reproduz em sua prática profissional suas crenças e valores
No contexto reformista em saúde mental tende a haver uma Ramos (2003) ao analisar a identidade do assistente social nos
crise de identidade entre os profissionais das diferentes categoriais Centros de
profissionais, demandados a alargar seu horizonte interventivo Atenção Psicossocial a partir da própria categoria e com os
para o social, até então vistos como dimensão inerente à prática demais membros, de outras categorias profissionais da equipe,
do assistente social. mostra que os assistentes sociais se auto qualificam como:

Didatismo e Conhecimento 51
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
- Agente assistencial. Esta identidade está relacionada às sociais ações no plano clínico terapêutico. Apesar disto, por
funções tradicionais historicamente vinculadas ao Serviço Social, exemplo, há um número significativo de assistentes sociais com
relacionadas às condições socioeconômicas dos usuários e às suas formação em terapia de família, que balizam suas práticas com
necessidades em acessar determinados recursos que viabilizem estes fundamentos e não com base no Projeto Ético Profissional,
o acesso a direitos. Entre as demandas colocadas neste campo como pode ser visualizado em Dócolas (2009).
encontram-se o acesso aos benefícios sociais, sobretudo, benefício Além dos profissionais com uma formação específica nos
de prestação continuada, vale-transporte, aposentadorias, licenças campos acima há um grupo de assistentes sociais que atuam nos
dentre outros. serviços de saúde mental empregando na sua atuação com usuários
- Potencializador de mediações. O assistente social potencializa e familiares técnicas de relaxamento, fundamentados na meditação
mediações em vários sentidos, articulando as relações do Caps ou Yoga.
com a rede sócioassistencial do município ou do Estado; a relação Desse modo, uma pluralidade de entendimentos e ações
usuários-familiares e equipe de Caps; a relação do Caps com a começam a se desenhar entre os assistentes sociais da saúde
comunidade/território; a relação entre os próprios profissionais mental. Talvez estes direcionamentos de alguns assistentes sociais
na saúde mental se deva a uma necessidade do profissional de
do Caps. Neste sentido, o assistente social é um articulador por
“mostrar serviço”, dar uma materialidade para sua intervenção
excelência, porque na prática cotidiana assume a condição de
junto aos usuários e demais membros da equipe.
veiculador de informações entre os diferentes atores sociais que
Especulativamente, pode estar subjacente a tais práticas a
atuam a partir dos serviços de saúde mental. necessidade de ter alguma identidade com o campo clínico, mais
- Agente complementar, colaborador. Historicamente o agente valorizado na área da saúde mental, onde os profissionais do
privilegiado em saúde é o médico. O assistente social já figurou campo psi são os mais destacados.
como paramédico e agente complementar, subsidiário à ação das Um outro elemento que pode ter contribuído na assunção
categorias que dominam o setor. Figura como um coadjuvante do destas práticas entre os assistentes sociais pode estar relacionado
processo de saúde mental, mas nem por isso com um estatuto ou à ação dos novos serviços estar centrada nas necessidades dos
importância menor. usuários, ser uma ação conceituada como usuário centrada, onde
- Agente político, da cidadania, dos direitos. Tal identidade as atribuições e competências específicas da categoria tenderem
auto referida pelos assistentes sociais está relacionada à gama de a ser secundarizadas, fazendo emergir outras habilidades ou
informações sobre legislação social que este profissional detêm e competências pessoais de alguns colegas. Desse modo, observam-
aciona para viabilizar o exercício de direitos por parte dos usuários se alguns assistentes sociais, por exemplo, coordenando oficinas
dos serviços. O assistente social possui um amplo e difuso campo de coral, por ter na música um hobby ou uma habilidade para além
de intervenção circunscrito ao trato com a legislação social, das suas atribuições profissionais.
a rede institucional, os mecanismos de acesso e restrição dos De qualquer maneira, soa estranho em um contexto
segmentos sociais aos institutos de regulação social, e, ainda, às de valorização e difusão do social entre todas as categorias
ações de caráter imaterial voltadas para a mobilização de valores profissionais que integram o campo da saúde mental, alguns
e comportamentos no universo das relações sociais (BARBOSA; assistentes sociais buscarem exatamente no campo clínico o
CARDOSO; ALMEIDA, 1998). centramento de sua perspectiva teórica e interventiva.
Desse modo, o assistente social contribui no processo de Todavia, o assistente social em saúde mental não se
acesso a determinados direitos pela veiculação de informação, autoconstrói. Sua identidade é construída nas relações sociais
aproximação dos canais garantidores de direitos e no fomento à e a partir das demandas originárias do corpo de dirigentes das
criação de conselhos locais de saúde. De outra maneira, também, instituições, dos usuários dos serviços e na relação com os demais
pode atuar como agente político no interior da própria equipe de profissionais da equipe, que demandam ações do assistente social
saúde mental, pois é identificado como um profissional que faz tendo em vista o que entendem ser as competências e atribuições
deste profissional. Evidentemente, o próprio entendimento do
circular as informações entre os diferentes membros da equipe;
profissional do Serviço Social e sua leitura acerca da legislação
questiona o cotidiano institucional fazendo com que a equipe
profissional também influirão nesta construção. Ramos
funcione e acione seu potencial em prol das necessidades dos
(2003) ao avaliar a identidade do assistente social desenhada
usuários e do serviço. pelos demais profissionais da equipe informa que os mesmos
- Agente terapêutico/terapeuta. Há um grupo significativo de apontaram o assistente social numa multiplicidade de dimensões,
assistentes sociais com formação específica em psicanálise, terapia numericamente mais significativas do que aquelas traçadas pelos
de família ou fundamentados na teoria sistêmica, que se incluem próprios assistentes sociais, como:
no denominado Serviço Social Clinico. Há um intenso debate - Agente assistencial;
pela Internet e materializado em publicações do CRESS do Rio - Potencializador de mediações;
de Janeiro em torno desta identidade assumida por uma parcela - Profissional auxiliar, complementar
de assistentes sociais. No debate sintetizado no livro Atribuições - Agente terapêutico/ terapeuta
Privativas do Assistente Social e o “Serviço Social Clínico” - Agente político/da cidadania, dos direitos
Marilda Iamamoto entende que investir neste sentido é retornar a - Profissional da família.
um passado profissional antes do Movimento de Reconceituação. O assistente social comumente é identificado pelos demais
Representantes da UERJ e do CRESS entendem que “os membros da equipe de saúde mental como o profissional que
defensores do Serviço Social Clínico não estabelecem relação do tem mais habilidade e competência para atuar diretamente com
seu modo de operar com o Código de Ética Profissional, com a Lei os grupos familiares, sobretudo de baixa renda. Neste sentido é
de Regulamentação da Profissão e com as Diretrizes Curriculares” demandado a realizar: orientação social; analisar a dinâmica
(CRESSRJ, 2004). Sintetizando, não é atribuição dos assistentes familiar; fazer atendimento ao grupo e realizar visita domiciliar.

Didatismo e Conhecimento 52
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Trabalhamos com famílias atuando no processo de viabilização Nos anos 90 é que crescem o número de pesquisas brasileiras
dos direitos e dos meios de exercê-los. Requer considerar as orientadas para a relação dos grupos familiares com a pessoa com
relações sociais e a dimensão de classe que as conformam, sua transtorno mental. Surge uma multiplicidade de análises, que
caracterização socioeconômica, as necessidades sociais e os apontam na seguinte direção, como explicita Rosa (2002):
direitos de cidadania dos sujeitos envolvidos, as expressões 1) Como um recurso como outro qualquer, no rol das
da questão social que se condensam nos grupos familiares, as estratégias de intervenção (SANT’ANNA; FONTOURA, 1996)
políticas públicas e o aparato de prestação de serviços sociais que 2) Como um lugar de possível convivência da pessoa com
as materializam (CRESSRJ, 2004). transtorno mental, desde que os laços relacionais possam ser
Para tanto, o assistente social articula o trabalho com os mantidos ou reconstruídos.
grupos familiares com a intersetorialidade, pois, tem que atuar
3) Como sofredora, pois, é influenciada pela convivência
em conjunto com as demais políticas públicas, sendo, em tese, um
exímio conhecedor da rede sócio assistencial e de seus recursos. com uma pessoa com transtorno mental e, desse modo, precisa
Vale lembrar que todos os profissionais da equipe de saúde ser “tratada”, assistida, recebendo suporte social e assistencial
mental atuam de maneira direta mesmo que, no geral, pontual (MOTTA, 1997);
com as unidades familiares. Todavia, é o assistente social que 4) Como um sujeito da ação. Sujeito coletivo, ator
temporalmente tende a ter maior dedicação a este grupo no seu político que se organiza em associações específicas, na opinião
cotidiano interventivo. Há ainda uma tendência das políticas de Sant’Anna e Fontoura (1996) e, ainda, sujeito avaliador dos
públicas se matriciarem no grupo familiar. Historicamente, o serviços, conforme Pereira (1997) e construtora da cidadania da
assistente social tem uma relação de intervenção construída com pessoa com transtorno mental;
as famílias, mas a categoria não construiu um arcabouço teórico 5) Como provedora de cuidados, desde que os serviços de
metodológico próprio para atuar com este grupo, o qual necessita saúde mental visam atuar sobre os momentos de crise, tratando e
de maiores investimentos do Serviço Social. não prestando cuidados contínuos. E também porque a família é o
Agente educativo, socializador. O assistente social ao principal agente potencializador de mediações entre a pessoa com
conferir novos tons à realidade da pessoa com transtorno mental,
transtorno mental e a sociedade, constituindo historicamente um
ao viabilizar os direitos de cidadania, é requisitado a ser um agente
educativo, socializador. É da natureza do conteúdo de seu trabalho lugar privilegiado de cuidados e reprodução social.
a dimensão pedagógica, o trabalho socioeducativo, de educação Essas perspectivas não são excludentes entre si. Ao contrário,
em saúde até mesmo com a equipe de saúde mental, pois, é o se entrelaçam, indicando simultaneamente a variedade de
profissional que em função de seu ofício faz a informação circular necessidades que emergem no interior dos grupos familiares;
entre todos os atores sociais e institucionais. a pluralidade de identidades desta instituição e exigências de
Profissional da inserção. O assistente social tem sido flexibilidade dos serviços e das práticas profissionais para
percebido como profissional da inserção exatamente pela contemplar a heterogeneidade nesta arena.
articulação que promove entre as diferentes políticas públicas, Historicamente, o modelo hospitalocêntrico desenvolveu uma
para mobilizar recursos com o objetivo de reintegração social da pedagogia de exclusão do grupo familiar, ao restringi-la a mera
pessoa com transtorno mental. Neste sentido, alguns assistentes informante do histórico da enfermidade da pessoa com transtorno
sociais têm inclusive se engajado em programas de geração de mental; a ser um recurso ocasional ou “visita” pontual, sendo
renda e cooperativas de trabalho para inserir a PTM em atividades invisibilizada na sua condição de provedora de cuidados contínuos,
laborativas significativas.
no plano doméstico.
Profissional do controle. Historicamente o assistente social
também teve um papel disciplinador dos usuários dos serviços, Neste modelo de gestão as abordagens dirigidas às famílias
ao ser o profissional encarregado de veicular normas e rotinas eram pontuais e limitadas a algumas reuniões familiares (no
institucionais, em algumas circunstâncias até mesmo assumindo o geral palestras) e atendimentos individuais do grupo. A maioria
papel de fiscalizador de seu cumprimento. dos profissionais da equipe fazia algum tipo de atendimento com
Agente multiplicador. O assistente social na sua condição as famílias, mesmo que de maneira assistemática e descontínua.
de veiculador de informação acaba por se constituir como um Havia implicitamente uma divisão de trabalho na abordagem do
agente multiplicador da mesma, ao difundir informações através grupo familiar, como identifica Rosa (2003). O médico, sobretudo
dos veículos de massa, como rádios comunitárias; palestras em no ato da admissão, para colher informações sobre o histórico das
serviços comunitários ou pelos demais serviços da rede sócia enfermidades, dos sintomas. Os enfermeiros, no geral, por ocasião
assistencial. da alta hospitalar, para realizar orientações sobre o prosseguimento
Assim, uma multiplicidade de atribuições e competências do tratamento, via ambulatorial e cuidados com as medicações.
cerca a identidade e o perfil profissional dos assistentes sociais Os assistentes sociais, durante o processo de internação,
em saúde mental, que precisam receber um tratamento mais
coordenando reuniões de famílias, no geral comandado por ações
aprofundado. A seguir, a abordagem com as unidades familiares
será destacada, pela importância que estes grupos adquiriram em socioeducativas, abordando uma variedade de questões, tais como
um contexto de cuidado comunitário. normas e rotinas institucionais; mudanças no modelo assistencial;
direitos; manejo da pessoa com transtorno mental no ambiente
A família no movimento da reforma psiquiátrica doméstico e difusão de conhecimentos sobre os diferentes quadros
diagnósticos e medicamentos, permitindo troca de experiência
As unidades familiares ganham visibilidade, inicialmente, no entre os diferentes cuidadores familiares.
interior do movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira ao se Mudanças legislativas sinalizam no sentido de uma outra
constituir como um ator político, se organizando para defender os incorporação das famílias nos projetos terapêuticos dos serviços
direitos das pessoas com transtorno mental. de saúde mental.

Didatismo e Conhecimento 53
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A portaria nº. 251/GM de 31 de janeiro de 2002, que estabelece Nos projetos terapêuticos dos Caps os familiares são
diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria e incorporados como “parceiros no tratamento” (BRASIL, 2004)
reclassifica os hospitais psiquiátricos prevê, no desenvolvimento sendo estimulados a participar do cotidiano dos serviços. “Os
dos projetos terapêuticos, o preparo para o retorno à residência/ familiares podem participar dos” Caps, não somente incentivando
inserção domiciliar e uma abordagem dirigida à família no o usuário a se envolver no projeto terapêutico, mas também
sentido de garantir orientação sobre o diagnóstico, o programa de participando diretamente das atividades do serviço, tanto internas
tratamento, a alta hospitalar e a continuidade do tratamento. como nos projetos de trabalho e ações comunitárias de integração
As famílias, sobretudo na fase inicial da eclosão do transtorno social.
mental, têm um papel fundamental na construção de uma nova Observa-se em alguns Caps e outros serviços de saúde mental
trajetória para o seu ente enfermo, desde que seus recursos o engajamento dos familiares em redes de solidariedade, através
emocionais, temporal e econômico sejam bem direcionados pelos de grupos de mutua ajuda e troca de suporte, mas ainda de maneira
trabalhadores e serviços de saúde mental. tímida. É difícil mobilizar os familiares para ações grupais porque:
É importante destacar que nenhum grupo familiar está 1) a cultura e pedagogia dos serviços, historicamente, as excluiu;
preparado para ter um membro com transtorno mental em seu 2) participar para alguns familiares é um trabalho a mais, uma
meio (MELMAN, 2001). Não está capacitado para prover cuidado sobrecarga, exigência a mais; 3) alguns serviços se limitam a
de uma pessoa adulta que tem um transtorno mental, cujo cuidado oferecer um espaço para a família restrito a palestra, que muitas
doméstico é complexo, envolvendo intensas responsabilidades e vezes, é desfocada de suas necessidades; 4) os horários dos
dedicação temporal. encontros nem sempre é compatível com os horários disponíveis
A complexidade se manifesta em uma variedade de dos familiares.
acontecimentos. Em primeiro lugar, ninguém espera ter uma Mas, com mudanças que levem em conta o acima explicitado
pessoa com transtorno mental no meio familiar. Trata-se de um e com o estímulo e a consolidação de engajamento dos familiares
evento imprevisto na trajetória da vida familiar. Em segundo na abordagem pedagógica e terapêutica dos serviços de saúde
lugar, no imaginário da sociedade moderna, é previsto que uma mental, espera-se construir uma nova etapa na trajetória dos
pessoa adulta seja emancipada, tenha incorporado o auto cuidado mesmos, através de ações mais solidárias e partilhadas.
e seja independente, não necessitando de cuidados de terceiros. Destaca-se que as unidades familiares encontram-se
Em terceiro lugar, tratar de uma pessoa adulta, com transtorno muito sobrecarregadas na atual conjuntura, com o crescente
mental, no ambiente doméstico é uma tarefa complexa, que exige empobrecimento e mudanças demográficas. Os serviços de saúde
preparo mínimo do cuidador, para lidar com uma gama imensa de mental têm que contribuir inclusive neste sentido, sobretudo
ocorrências. Não é suficiente ter amor. Em quarto lugar, os grupos aliviando o peso gerado pelas demandas de cuidado, dividindo
familiares são demandados a se reposicionar em relação a uma encargos com as famílias.
série de questões envolvendo inclusive sentimentos. Em quinto
lugar, os grupos familiares encontram-se sobrecarregados com Atuação do assistente social com o grupo familiar
uma série de demandas oriundas de uma conjuntura de restrição
de gastos sociais e pelas repercussões das mudanças, sobretudo, O assistente social, frequentemente, contribui com os
demográficas em seu interior. cuidadores familiares através do trabalho socioeducativo,
Quando emerge uma pessoa com transtorno mental as famílias promovendo a troca de informações e vivências, para que, sobretudo
são demandadas primeiramente a enfrentar a nova situação, tendo os cuidadores familiares saiam de seu isolamento pessoal e social,
que ao mesmo tempo compreender a própria enfermidade, a tendo sua carga de trabalho aliviada, apoiada. Quando passam a
dinâmica dos serviços de saúde mental e manejar seus próprios trocar informações com outros cuidadores familiares é comum
sentimentos e recursos. perceberem que muitas vivências são semelhantes e que não foram
Frequentemente o familiar cuidador se isola no plano os “únicos escolhidos para sofrer neste mundo”. Inclusive há uma
doméstico para cuidar, porque não tem preparo mínimo para pressão social para que as famílias não publicize, não remeta
cuidar e não consegue manejar a pressão social e o estigma que para a arena das políticas públicas a sua situação. Neste sentido
também o atinge. é paradigmático o depoimento de um familiar com um artigo no
Enquanto não são treinados para o conhecimento da livro Minas sem manicômios (2004) “algumas pessoas acharam
enfermidade, passa por processos de confronto com a pessoa que estávamos expondo demais nossos dramas familiares”
com transtorno mental. Por exemplo, lidam com o delírio como (ORNELAS, 2004).
sendo “besteiras”, “bobagens”. Alguns chegam a querer corrigir A troca de vivência potencializa novas estratégias de cuidado,
a maneira da pessoa com o transtorno mental ver o mundo (via tendo em vista que não há uma “receita pronta” para cuidar, muito
delírios), confrontando-se com o mesmo. No caso de uma depressão embora alguns familiares cheguem às reuniões com a expectativa
é comum os familiares afirmarem que “Sugeri pra ela procurar um do acontecimento de uma mágica, que mude substancialmente
curso, passear, mas ela não vai. Ela não se ajuda”. É difícil para suas vidas.
o familiar, sem treinamento, entender que a depressão atinge o É importante desconstruir esta expectativa, pois, muitos
centro volitivo da pessoa, não sendo expressão da “preguiça” ou familiares consideram que “só quem estudou (isto é, esteve em
má vontade. uma universidade) sabe cuidar bem dele”
O retrato dessas trajetórias facilita a avaliação do grupo Todavia, os familiares cuidadores historicamente aprenderam
familiar e mostra a importância de inclusão das famílias nos a cuidar no “ensaio e erro” (ROSA, 2003) das exigências cotidianas,
projetos terapêuticos e pedagógicos dos serviços de saúde e no geral, sem as salvaguardas/respaldo dos profissionais de saúde
assistência. mental. É importante reconstruir as trajetórias dos familiares na

Didatismo e Conhecimento 54
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
construção de respostas para os desafios cotidianos, para reforçar
o que foi aprendido e potencializando os próprios recursos internos 3.4 RESPONSABILIDADE SOCIAL
do grupo. Potencializando um conhecimento que os cuidadores DAS EMPRESAS.
familiares construíram e nem sempre se apercebem disso.
Com a criação de espaços próprios no interior do serviço
(ou no território) para reunir os grupos familiares e permitir a
interação, com acompanhamento de um ou mais profissionais (mais Da filantropia à responsabilidade social
comumente o assistente social atua em conjunto com as psicólogas
ou enfermeiras), pode-se observar mudanças significativas na Historicamente, as empresas sempre praticaram ações no
qualidade de vida destes cuidadores. sentido de contribuir para o atendimento das necessidades sociais
Interessante que muitas reuniões denominadas de familiares, emergentes da sociedade. No Brasil, até o início dos anos 1980,
no geral, se reduzem a reuniões de mulheres, comumente, mães, a classe empresarial tinha compreensão de que a solução dos
esposas, filhas e irmãs. É importante chamar outros membros do problemas sociais era estritamente responsabilidade do Estado
grupo familiar para esta arena, resgatar, por exemplo, o homem e que, através das políticas sociais públicas, deveria equacionar
como cuidador, colocando assim em evidência as questões de as situações oriundas da miséria, da falta de habitação, do
gênero no interior das famílias. analfabetismo, das questões ambientais, entre outras.
Os assistentes sociais com toda sua bagagem sobre As iniciativas do empresariado voltadas à atenção à população
investigação/análise social, podem contribuir realizando desassistida ficaram limitadas a ações pontuais e heterogêneas.
levantamentos sobre o perfil das famílias usuárias dos serviços de Não existiam projetos ou programas com práticas planejadas
saúde mental, para: e sistematizadas. As ações eram desenvolvidas como forma de
- Conhecer que tipo de arranjo doméstico prevalece e a praticar o bem, ligadas aos aspectos culturais e espirituais do
heterogeneidade de arranjos existentes e como repercutem no proprietário da empresa. Essa prática se caracterizava como ações
provimento de cuidado; assistencialistas através de doações e de prestação de auxílio
- Como as mudanças demográficas repercutiram sobre a material e financeiro destinado ao atendimento de problemas
organização do grupo, tendo por foco o provimento de cuidado; imediatos de famílias e de instituições privadas de caridade.
- Analisar a dinâmica familiar. Como se dão as relações sociais. Observa-se que, com o passar dos anos, as empresas brasileiras
Quem provê renda? Quem provê cuidados? Quem é a autoridade foram se aperfeiçoando e se modernizando diante do quadro
no grupo? Qual o lugar que a pessoa com transtorno mental ocupa econômico, político e social que se fazia presente na sociedade
no grupo? Qual a qualidade das relações familiares? Predominam brasileira. Por muito tempo, porém, a mentalidade dos proprietários
os sentimentos positivos ou negativos entre seus membros? Como das empresas em relação aos problemas socioambientais se
por exemplo, um PTM que recebe um benefício em comparação a limitava à necessidade de desenvolvimento de ações filantrópicas
um outro que não o têm, são tratados por suas famílias? Como este e que a responsabilidade no enfrentamento da questão social se
“ganho secundário” repercute no grupo? restringia às funções do Estado. Tal comportamento expressava a
- Identificar a posição da pessoa com transtorno mental no vocação para a benevolência e para a caridade através de atitudes
grupo; os valores/a ética que preside o provimento de cuidado de: e ações individuais dos empresários.
“dar, receber, retribuir” (SARTI, 1996); qual o clima que prevalece Melo Neto e Froes (2001) caracterizam as ações filantrópicas
em relação à PTM: hostilidade ou solidariedade; desenvolvidas pelo empresariado brasileiro, até meados dos
- Conhecer como a família vive, como mora. Qual o status do anos 1980, como atitudes individuais e voluntárias restritas aos
grupo no seu meio. empresários filantrópicos e religiosos, estimulados pela caridade
- Identificar os recursos que lança mão na rede de parentesco, cristã a partir de base assistencialista, sem levar em consideração a
de vizinhança e rede sócio assistencial. Identificar os fatores de necessidade de planejamento e gerenciamento dessas ações.
proteção e de risco existentes no meio familiar. Levantar os fatores Desta forma, a atuação filantrópica dependia da vontade
sociais de vulnerabilidade do grupo. e da iniciativa particular e individual das pessoas que possuíam
- Conhecer os recursos da rede sócio assistencial à disposição valores circunscritos na caridade e no dever moral. Essas ações
dos cuidadores familiares; filantrópicas buscavam contribuir para a sobrevivência das
- Levantar os significados, o imaginário e as práticas sociais classes desfavorecidas, sem nenhuma preocupação efetiva com o
sobre o louco e a loucura em seu território existencial. desenvolvimento e a emancipação coletiva.
Com a sistematização destas informações, o assistente social Nesse sentido, vale considerar que desenvolvimento, um
pode devolvê-las aos grupos familiares, propiciando o debate e a substantivo, implica liberdade dos indivíduos para que consigam
troca de informações entre os provedores de cuidado. garantir vida com qualidade e dignidade. Veiga (2005) concorda
É importante o investimento dos profissionais para que outros que o desenvolvimento requer que se removam as principais
membros das famílias passem a participar da gestão do cuidado fontes de privação de liberdade: pobreza e tirania, carência
cotidiano da pessoa com transtorno mental, que tende a ficar ao de oportunidades econômicas e destituição social sistemática,
encargo de uma única pessoa. (Texto adaptado de ROSA, L. C. S. negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência
e MELO, T. M. F. S. Docentes em Serviço Social). de Estados repressivos.
Furtado (2000) explica que o desenvolvimento não se refere
somente ao crescimento econômico, mas, sobretudo, a profundas
modificações nas estruturas econômica e social, trazendo elevações
no nível de vida das pessoas. Desse modo, o desenvolvimento não

Didatismo e Conhecimento 55
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
depende do aumento da renda per capita, mas de um conjunto venda, de segurança do trabalhador, de ampliação de benefícios
de ações integradas capaz de oferecer à sociedade benefícios do ao corpo sócio funcional, relacionamento ético com fornecedores,
crescimento econômico no sentido de ampliar as capacidades consumidores, funcionários, com a preservação do meio ambiente,
humanas, permitindo vida longa e saudável. enfim, preocupação com a sustentabilidade.
Vale lembrar que, desde o final da década de 1960, no Brasil, No Brasil, durante os anos 1980, houve volumosa
já se iniciava um movimento entre as empresas e os interlocutores mobilização dos movimentos populares visando à liberdade, à
da sociedade relacionado à inquietação do empresariado diante democracia e à superação da situação de pobreza cultural, política,
dos problemas sociais e ambientais, percebendo-se, aos poucos, material e espiritual de grande maioria da população do país. Em
algumas transformações nos padrões de comportamento ligados à consequência da organização política dos vários segmentos da
cultura e à gestão empresarial. sociedade, em 1988, houve a promulgação da Nova Constituição
Os empresários começaram a entender que os principais Federal Brasileira, caracterizada como “Constituição Cidadã”,
problemas sociais prejudicavam o processo de desenvolvimento em razão de alguns avanços conquistados a exemplo dos direitos
de seus negócios e também da nação. A busca pela emancipação da sociais, civis, humanos e políticos. A partir dessa constituição, o
sociedade, e, com isso, a tentativa de garantir o desenvolvimento, país estabelece o regime democrático e participativo como modelo
passou a ser questão fundamental das preocupações de parte do de organização política. Essa constituição aponta várias diretrizes
empresariado brasileiro. para a efetivação da democracia, da liberdade, da igualdade e
Uma referência importante foi a atuação da Associação dos consegue inaugurar a universalização dos direitos sociais, além de
Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE) Brasil que organizava consagrar à sociedade civil o papel de corresponsável nas questões
e promovia seminários, congressos e palestras visando refletir de combate à exclusão social.
sobre a dinâmica social das empresas, seus objetivos, reforçando Interessante citar o artigo 5º da Constituição Federal Brasileira
os aspectos ligados ao compromisso diante da necessidade sobre os direitos e garantias individuais e coletivos, assegura
constitucional em cumprir sua função social. o direito à propriedade e essa propriedade deverá atender à sua
Vários documentos resultantes de fóruns e debates, que função social. Também no artigo 170, essa lei maior garante a
se sucederam ao longo do tempo, demonstraram tendência responsabilidade das empresas com a sociedade:
de sensibilização da classe empresarial com as questões Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização
socioambientais do país. Entre essas atividades, destacam-se três do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar
documentos elaborados no Fórum dos Líderes Empresariais nos a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
anos de 1978, 1983 e 1997, todos revelando ideias e preocupações observados os seguintes princípios:
das empresas com os problemas sociais e políticos prioritários. I – soberania nacional;
O primeiro foi denominado como Documento dos Oito, que II – propriedade privada;
tinha sustentação nas questões relacionadas à democracia e aos III – função social da propriedade;
direitos políticos. O segundo, Documento dos Doze, priorizou IV – livre concorrência;
as reflexões para os novos limites, funções e tamanho do Estado, V – defesa do consumidor;
não deixando de criticar e negar a interferência do mesmo na VI – defesa do meio ambiente;
economia. E o último, considerado Cidadania e Riqueza Nacional, VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
contribuiu significativamente para a compreensão da necessidade VIII – busca pelo pleno emprego;
de recuperar ações incidentes à coletividade social no sentido de IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno
alcançar o desenvolvimento econômico na sociedade brasileira. A porte que tenham sua sede e administração no país.
partir desse documento, percebeu-se maior expressão e interesse A partir da Nova Constituição Federal houve preocupação
nas reflexões sobre responsabilidade social das empresas no meio das pessoas e das empresas no cumprimento da lei. As empresas
corporativo. passaram a buscar conhecimento e articular mudanças para
A década de 1980 ficou marcada por profundas mudanças e assumirem sua função na sociedade. Ao respeitar a função social,
transformações nas áreas social, econômica, política e cultural, no que não se restringe somente à oferta de empregos, pagamento
mundo e, especialmente, no Brasil que se refletiram diretamente de impostos, circulação de mercadorias, acúmulo de riqueza,
na forma de ver e agir dos empresários, desencadeando várias a empresa garante a possibilidade de transformação social
discussões sobre a responsabilidade social das empresas diante do contribuindo para a superação das desigualdades sociais.
cenário mundial que apontava inúmeros desafios à humanidade. Alves (2000) explica que uma nova realidade no jogo das
O processo de globalização, a velocidade das inovações forças sociais se estabelece entre empresa-sociedade e também
tecnológicas e a socialização das informações provocaram tem suas ramificações explícitas na criação de um aparato jurídico-
aumento da complexidade no mundo dos negócios exigindo legal ou em mudanças nos padrões de comportamentos sociais que
dos empresários novas formas de produção, comercialização afetam a cultura e a ação empresarial.
e prestação de serviços, além da implementação de modelos Srour (1998) aponta um conjunto de fatores históricos
diferenciados de gerenciamento do trabalho, como resultado ocorridos durante a segunda metade do século XX, em âmbito
das exigências impostas às organizações empresariais diante da mundial, que reforçam a construção do movimento sobre
concorrência internacional. A realidade dos mercados competitivos responsabilidade social corporativa.
fez surgir investimentos inovadores em toda a cadeia produtiva, O fortalecimento de uma sociedade civil, ativa e articulada,
acrescida da preocupação com os custos, da qualidade dos produtos que rejeitou a acomodação à pobreza sem apelo à solução de força,
e serviços. As empresas que buscaram a permanência no mercado e que aos poucos penetrou no aparelho de Estado, tornando-o
passaram a desenvolver políticas internas de serviços de pós- poroso; o fato de, numa economia aberta e cada vez mais

Didatismo e Conhecimento 56
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
policiada pela mídia, os investimentos passarem a dar resultados Contribuir para a promoção do desenvolvimento sustentável
econômicos apenas quando os produtos oferecessem mais valor do Brasil, por meio do fortalecimento político-institucional
aos consumidores; o desenvolvimento de alianças estratégicas e do apoio à atuação estratégica de institutos e fundações de
entre empresários que, embora concorrentes entre si, estabelecem origem empresarial e de outras entidades privadas que realizem
diversas formas de cooperação para dinamizar seus negócios investimento social voluntário e sistemático, voltado para o
e alcançar maior competitividade; a conjugação dos esforços interesse público.
de agentes sociais em fundos de investimentos e em fundos de Com preocupação em disciplinar e em organizar as práticas
pensão, numa associação em que o capital assume caráter conjunto sociais desenvolvidas no país pelas empresas, o Gife, por
meio dos seus constituintes, elaborou um código de ética cuja
ou associativista; a pulverização do capital aplicado numa
finalidade visa restringir as ações que não estejam relacionadas ao
variedade enorme de empreendimentos sem mudar sua essência desenvolvimento sustentável.
privada e individual; a emergência de empreendedores que O Código de Ética preconiza que os conceitos e a prática do
controlam alguma forma de conhecimento, ou de saber inovador, investimento social derivam da consciência da responsabilidade
em detrimento dos antigos detentores de capital monetário, dando e reciprocidade para com a sociedade, assumida livremente por
corpo ao conceito de capital intelectual; o fortalecimento da figura empresas, fundações ou institutos associados ao Gife. Para a rede
dos gestores profissionais, possuidores de capacidades gerenciais Gife, as práticas de investimento social são de natureza distinta e
centradas na perseguição da qualidade, da produtividade crescente não devem ser confundidas como ferramentas de comercialização
e da competitividade internacional; e a conquista de espaços de bens tangíveis e intangíveis (fins lucrativos) por parte das
democráticos no seio das empresas graças à gestão participativa. empresas ou mantenedoras.
Pelo exposto, observa-se que, a partir do final da década O exercício de atitudes e de comportamentos socialmente
de 1980, as empresas brasileiras passaram a compreender responsáveis das empresas, no Brasil, passa a destacar no
a necessidade do cumprimento de sua função social diante ambiente social e vem se efetivando como conjunto de realizações
orientadas para concretização do desenvolvimento sustentável de
da exigência da lei, como também do atendimento às novas
comunidades, transcendendo as questões filantrópicas.
determinações dos mercados competitivos, submetidas às regras e
O atual cenário globalizado dos mercados determina que as
aos padrões éticos internacionais. Nesse sentido, questões ligadas empresas não sejam meramente organizações econômicas, mas
à ética e à responsabilidade social ganham espaço e importância no também sociais. Assim a compreensão complexa e correta sobre
universo empresarial. responsabilidade social se torna imprescindível no universo
Ao longo dos anos 1990, um movimento ascendente de empresarial.
valorização da responsabilidade social empresarial faz surgir
algumas entidades representativas importantes para discussão, A responsabilidade social empresarial
reflexão e desenvolvimento de nova cultura empresarial no Brasil.
Entre elas o Instituto Ethos de Responsabilidade Social; o Instituto Willis Harman (apud Makray, 2000) explica que “há uma
de Cidadania Empresarial; o Conselho de Cidadania Empresarial década a comunidade de negócios havia se tornado a mais
da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg); poderosa instituição na última metade do século XX, cabendo-lhe,
a Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial e Social portanto, uma nova tarefa no capitalismo: assumir uma parcela da
responsabilidade pelo todo.”
(Fides); o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) e o
A responsabilidade pelo todo representa atitude que envolve
Instituto Brasileiro de Análises Sociais (Ibase).
pessoas e organizações no desenvolvimento dos diferentes papéis
Vale destacar a importância desenvolvida pelo Instituto Ethos e funções, na construção coletiva de uma sociedade justa e
de Responsabilidade Social no Brasil, criado pelo empresário Oded sustentável. Isso significa que toda decisão e atitude nos negócios
Grajew, em 1998, na cidade de São Paulo. Organização privada pode e deve ser efetivada a partir da consciência de que o destino
sem fins lucrativos, mantém-se pela contribuição das empresas da humanidade e de todos os seres vivos depende dessas ações. A
associadas cuja principal função é a disseminação do conceito responsabilidade pelo todo favorece a criação de ações e atitudes
de responsabilidade social por meio de encontros, seminários, empresariais para o desenvolvimento sustentável.
congressos e outras atividades de publicação e divulgação. A sustentabilidade é uma situação crítica para todo o planeta e
Também o Instituto de Análises Sociais (Ibase), organizado é preciso ser atingida para permitir qualidade de vida à população,
em 1996 pelo sociólogo Herbert de Souza, teve reconhecida compatível com a capacidade de suporte ambiental. Só uma
atuação. O Ibase deu grande impulso à necessidade de realização verdadeira solução global pode garantir um futuro humano e
do balanço social das empresas, contando com apoio de lideranças sustentável. Essa solução exigiria formulação de políticas públicas
empresariais e de outros segmentos da sociedade. Em 1996, que assumisse desde já as escalas da humanidade e da biosfera.
(Informação verbal)
foi lançado o “Selo Balanço Social”, visando à certificação das
A sustentabilidade pode ser entendida como condição para
empresas socialmente comprometidas com o desenvolvimento das igualdade entre as gerações. Uma sociedade torna-se sustentável
áreas de educação, de saúde, de cultura e do meio ambiente. quando consegue oferecer condições para que no futuro a vida
O Gife, criado em 1996, desempenhou contribuição favorável da humanidade possa ter continuidade de forma qualitativa e
no reconhecimento e no desenvolvimento da responsabilidade quantitativa no espaço e no tempo.
social pelas empresas. A missão desse grupo é o aperfeiçoamento A Organização das Nações Unidas (ONU) (apud Credidio,
e a difusão dos conceitos e práticas do investimento privado em 2007) define sustentabilidade como “[...] atendimento das
fins públicos, a sustentabilidade. Seu objetivo principal está assim necessidades das gerações atuais, sem comprometer a possibilidade
definido: de satisfação das necessidades das gerações futuras.”

Didatismo e Conhecimento 57
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Dessa forma, o desenvolvimento sustentável torna-se ética. Srour explica que a moral pode ser vista como conjunto
fundamental para a sobrevivência da sociedade e do planeta, de valores e de regras de comportamento que as coletividades,
dependendo do equilíbrio estabelecido entre o social, o ambiental sejam elas nações, grupos sociais ou organizações, adotam por
e o econômico. Portanto, o grande desafio do desenvolvimento julgarem corretos e desejáveis. Ela abrange as representações
sustentável está na expansão do crescimento econômico imaginárias que dizem aos agentes sociais o que se espera deles,
incorporando variáveis culturais, educacionais e ecológicas, além que comportamentos são bem-vindos, qual é a melhor maneira de
de proporcionar condições para a melhoria da qualidade de vida da agir coletivamente, o que é o bem e o que é o mal.
humanidade, o que requer e exige ações integradas entre todos os Existe relação muito próxima entre responsabilidade social e
segmentos e setores da sociedade organizada. ética, entendo que somente a partir dos princípios e valores morais
Na sociedade de mercado, a empresa se constitui como unidade determinados pelos que conduzem as empresas, de acordo com
básica de organização econômica, sendo a mola propulsora para o padrões éticos universalmente aceitos e definidos, torna possível a
desenvolvimento econômico e, por esse motivo, com condições prática da responsabilidade social corporativa. Assim o exercício
essenciais à promoção do desenvolvimento sustentável. da responsabilidade social pressupõe assumir comportamentos e
Essa relação pode ser compreendida como responsabilidade atitudes éticas pela organização e todo o conjunto societário.
social empresarial, ou seja, a livre adesão da empresa em As empresas que almejam a expansão dos negócios em âmbito
contribuir para o desenvolvimento sustentável, criando propostas mundial precisam adotar padrões éticos e morais abrangendo
e programas estratégicos que envolvam acionistas, fornecedores, noções internacionais a respeito dos direitos humanos, do exercício
consumidores, funcionários, suas famílias, a comunidade local, da cidadania, da prática de participação na sociedade, da defesa e
enfim, o conjunto da sociedade civil organizada, visando à garantia da preservação do meio ambiente, entre outros.
de vida com qualidade e sustentação ao longo do tempo. Efetivamente, valores éticos e morais influenciam as
Na opinião de Grajew (2000), “[...] toda empresa é uma atitudes e a imagem organizacional e estão se tornando cada
força transformadora poderosa, é um elemento de criação e vez mais homogêneos, rigorosos e universais. Dessa forma,
exerce grande ascendência na formação de ideias, de valores, a responsabilidade social corporativa expressa nova forma de
nos impactos concretos na vida das pessoas, das comunidades, da realizar negócios em todo o mundo, caracterizando-se por visão
sociedade em geral.” inovadora, seguindo o rigor dos valores éticos e morais aceitos
As empresas são poderosas, pois possuem os meios de universalmente.
produção, os recursos financeiros, tecnologias e autoridade Do ponto de vista de Grajew (2000), responsabilidade social
empresarial acrescenta a obrigatoriedade do cumprimento da lei.
política. O poder requer responsabilidade para com a sociedade em
Esclarece que “[...] ela começa a partir disso, de decisões que
geral que se inicia no princípio constitucional do cumprimento de
precisam ser tomadas não porque a Lei obriga e devem ser vistas
suas funções sociais e legitimamente reconhecida pela sociedade.
como um gesto de livre e espontânea vontade, voluntária, calcada
A responsabilidade da empresa se justifica pela qualidade
não na legislação, mas na ética, nos princípios e valores.”
de comprometimento com pessoas, comunidades, sociedade
O compromisso da responsabilidade social significa a
e meio ambiente, uma vez que os impactos e as influências
integração e a opção voluntária das organizações empresariais
atingem diretamente toda a cadeia de relacionamento, interferindo
com questões socioambientais que se materializam por meio
propositivamente na satisfação de necessidades básicas e de das atividades administrativas, produtivas e comerciais, das
sobrevivência, refletindo no processo de mudança social. relações estabelecidas com todos os envolvidos, integrantes
A cultura que organiza a estrutura empresarial, as metas, diretos e indiretos da cadeia produtiva, os stakeholders. Além
os objetivos, as decisões, as atitudes e as atividades pode disso, complementa as exigências legais e contratuais que
demonstrar à sociedade valores que contribuem para a construção constitucionalmente são obrigadas a cumprir. Em outras palavras,
de uma sociedade sustentável. As empresas que internalizam a a responsabilidade social abrange as boas práticas corporativas e
responsabilidade social na gestão dos negócios, do planejamento a ética empresarial, ultrapassando as normas jurídicas e incluindo
estratégico à implementação das ações, estabelecem padrões éticos aspectos diversos como os que vão da gestão de recursos humanos
no relacionamento com toda a cadeia produtiva. e da cultura empresarial à seleção dos parceiros comerciais e
A ética, entendida como juízos morais, padrões e regras de da aplicação de tecnologias. Implica integração das decisões e
conduta humana, com ênfase na determinação do certo e do errado, avaliações estratégicas sobre as dimensões financeira, tecnológica,
corresponde às práticas, valores e comportamentos esperados ou ambiental, comercial e social da empresa, levando em consideração
proibidos pelos membros da sociedade, apesar de não codificados seus impactos na sociedade. Na opinião de Ferrel et al. (2001),
em leis. “[...] a responsabilidade social no mundo dos negócios consiste na
A ética empresarial direciona o comportamento em obrigação da empresa em maximizar seu impacto positivo sobre os
conformidade com as condutas aceitas pela sociedade. Ferrel et al. stakeholders e em minimizar o negativo.”
(2001) ressaltam que a maioria das definições de ética empresarial Kraemer (2005) define responsabilidade social das empresas
diz respeito a regras, padrões e princípios morais sobre o que é como um conceito segundo o qual as empresas decidem, numa
certo ou errado em situações específicas [...] ética empresarial base voluntária, contribuir para uma sociedade mais justa e para
compreende princípios e padrões que orientam o comportamento um ambiente mais limpo. A empresa é socialmente responsável
no mundo dos negócios. quando vai além da obrigação de respeitar as leis, pagar impostos
A moral no ambiente empresarial refere-se ao conjunto de e observar as condições adequadas de segurança e saúde para os
valores e de normas reconhecidos e vinculados pelas organizações trabalhadores, e faz isso por acreditar que assim será uma empresa
como base de conduta. Os valores, os padrões e os princípios melhor e estará contribuindo para a construção de uma sociedade
morais são estabelecidos para a coletividade, definem a vivência mais justa.

Didatismo e Conhecimento 58
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Atualmente, muitas empresas, principalmente aquelas As reflexões de Melo Neto e Froes (1999) colocam a
que buscam, incansavelmente, modernização, inovação, responsabilidade social como fator de competitividade. As
competitividade e que esperam a lucratividade, estão assumindo empresas que assumem postura ética e responsável, além de
a responsabilidade social como modelo de gestão. As empresas desenvolverem ações sociais dirigidas à sociedade, conquistam
precisam incorporar em seu cotidiano a ética nas relações com posição de vantagem no mercado.
seus diversos públicos e, essa postura, requer mudança cultural e A responsabilidade social, postura inovadora de
gerencial. gestão corporativa, propõe-se responder às demandas da
Responsabilidade social não é uma atividade separada do sociedade, simultaneamente, aos seus propósitos de mercado,
negócio. É a nova forma de gestão empresarial. E para uma empresa compatibilizando-os com a busca pelo lucro. Ela configura
ter sucesso, conquistar e ampliar mercado, ter competitividade, a como movimento que envolve grupos representativos de vários
responsabilidade social é indispensável e faz parte da operação, segmentos empresariais, estimulando-os e obrigando-os a
está na infraestrutura da organização. repensarem o seu papel e a forma de conduzir seus negócios, com
A responsabilidade social não pode permanecer no discurso dos vistas a assumirem atitudes éticas e socialmente responsáveis em
executivos e nem mesmo diluir-se nos comportamentos e práticas todas as suas relações.
O movimento da responsabilidade social não expressa
filantrópicas, assistencialistas, através de doações e participações
modismo, mas uma realidade do contexto empresarial mundial,
em eventos na comunidade. Ela exige postura ética, decisão
que acarreta alterações gradativas na cultura organizacional
política e conhecimento profundo da comunidade. Ela se incorpora
determinando mudanças de comportamentos e de valores nas
à gestão empresarial através das decisões e do planejamento empresas. Essas modificações se iniciam através das decisões de
estratégico, na prática do gerenciamento, de processos e técnicas seus proprietários e gestores e que balizam todo o relacionamento
que desenvolvam a sustentabilidade das populações para as quais da empresa com a sociedade.
direcionam suas ações. Essa atuação envolve o compromisso Kraemer (2005) explica que “a sociedade é que dá permissão
social dos acionistas, diretores, funcionários, fornecedores e até para a continuidade da empresa.” Os consumidores e os
mesmo dos clientes. investidores não estão interessados em arriscar seus patrimônios
O compromisso social, que ultrapassa o cumprimento da em companhias que se recusam a tomar medidas de prevenção na
função social empresarial, não implica que a gestão empresarial área social e ambiental.
renuncie a seus objetivos econômicos e interesses particulares. Interessante ilustrar essa reflexão com alguns aspectos que
As organizações empresariais socialmente responsáveis são, identificam ações socialmente responsáveis a partir da concepção
justamente, aquelas que, além de desempenharem funções de Karkotli e Aragão (2004):
importantes na produção de bens e de serviços, geram riquezas, - gerar valor para seus agentes internos – proprietários,
conforme as normas legais e os padrões éticos estabelecidos pela investidores e colaboradores – para que, em primeiro lugar, se
sociedade, proporcionam empregabilidade, conseguem garantir justifiquem os recursos financeiros, humanos e materiais utilizados
condições de vida digna para todos integrados ao seu meio ambiente pelo empreendimento;
interno, mas, sobretudo, se organizam para investimentos sociais - adicionar valor para a sociedade, nela identificados governos,
que causem impacto local, regional e nacional. consumidores e mercado, disponibilizando bens ou serviços
Drucker (2002) explica que a única forma das empresas adequados, seguros e de algum significado para melhorar a vida
atenderem a suas funções sociais será através do bom desempenho das pessoas;
das suas funções econômicas. - prestar informações confiáveis;
A maneira como a instituição desempenha sua missão - promover comunicação eficaz e transparente para com os
específica é também a primeira necessidade e o maior interesse colaboradores e agentes externos;
da sociedade. Esta nada tem a ganhar [...] se a capacidade da - recolher tributos devidos;
instituição em desempenhar sua própria tarefa específica for - racionalizar, ao máximo, a utilização de recursos naturais e
adotar medidas de proteção e preservação do meio ambiente;
reduzida. [...] Uma empresa falida não é uma boa empregadora e
- incentivar a participação de dirigentes e colaboradores,
dificilmente será uma boa vizinha na comunidade. Como também
enquanto cidadãos, na solução de problemas da comunidade;
não criará o capital necessário para os empregos do futuro ou as
- formar parcerias com outros organismos, de governos e
oportunidades para os trabalhadores de amanhã. da sociedade civil, para identificar deficiências e promover o
Drucker (2002) defende que a maior responsabilidade social desenvolvimento da comunidade onde está instalada;
da empresa é o desempenho de suas funções e a primeira delas é - transacionar de forma ética em toda a cadeia de
gerar riqueza. A empresa que não consegue obter lucros está sendo relacionamento e outras partes interessadas como fornecedores,
irresponsável, porque está desperdiçando recursos destinados ao colaboradores, clientes, entidades associativas e representativas,
atendimento de necessidades sociais. governos, entre outras.
Sob a perspectiva capitalista, as empresas necessitam da Os mesmos autores consideram que a gestão de uma
lucratividade e, somente através de bons resultados econômicos, organização que adota práticas éticas e responsáveis consegue
conseguirão contribuir para o desenvolvimento sustentável da atingir a sua maioridade, podendo ser entendida como cidadania
sociedade. Vale considerar que os interesses econômicos refletem empresarial.
diretamente na concepção da responsabilidade social da empresa, A empresa-cidadã assume compromissos e respeita direitos
uma vez que a obtenção do lucro é essencial para que os negócios em relação aos públicos interno e externo. A cidadania empresarial
se mantenham e sejam competitivos no mercado, ao mesmo direciona políticas a cada um de seus parceiros e cultiva,
tempo, que os comportamentos éticos e responsáveis garantem a voluntariamente, valores que expressam sua cultura organizacional,
sua própria sustentabilidade. sendo referência de ação dos dirigentes aos consumidores.

Didatismo e Conhecimento 59
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A empresa-cidadã opera sob uma concepção estratégica e um Tendo em vista que a cidadania corporativa exige transparência
compromisso ético, resultando na satisfação das expectativas e e compromisso, algumas instituições se preocuparam com a
respeito aos direitos dos parceiros. Com esse procedimento, acaba construção de instrumentos específicos para avaliar condutas
por criar uma cadeia de eficácia, e o lucro nada mais é do que o socialmente responsáveis das empresas. Por isso, foram criados
prêmio da eficácia. (Martinelli, 2000). indicadores de desempenho que permitem avaliar, medir, auditar,
As organizações empresariais se desenvolvem na sociedade além de orientar a conduta dessas organizações. Esses indicadores
e nela buscam atingir seus objetivos atendendo às necessidades contribuem para identificar necessidades e apontar deficiências das
essenciais e básicas. A empresa-cidadã não se restringe somente iniciativas de responsabilidade social.
ao atendimento constitucional de suas funções sociais, mas Para tanto, normas, padrões, diretrizes, incluindo
inova quando efetiva e avalia sua contribuição à sociedade. Essa certificações sociais, selos nacionais e internacionais representam
contribuição é fruto de posição proativa e da decisão de mobilizar diferenciadores de credibilidade e aceitação no mercado para as
todos os seus recursos (humanos, tecnológicos, materiais, corporações socialmente responsáveis.
financeiros, informações, processos e técnicas de gestão) para No Brasil, destacam-se o Selo Balanço Social, conferido pelo
o encaminhamento de soluções aos problemas sociais. Assim a Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) às
empresa-cidadã reflete o compromisso com a humanidade através empresas que realizam o balanço social, e o Selo Empresa Amiga
de atitudes éticas e responsáveis com o todo organizacional da Criança, concedido pela Fundação Abrinq àquelas que não
utilizando talentos humanos, tempo e tecnologias em busca do utilizam mão de obra de crianças e adolescentes e que contribuem
desenvolvimento sustentável. para programas de melhoria de suas condições de vida.
Vale esclarecer que todos os recursos mobilizados para a O balanço social consiste em instrumento que reúne todas as
prática da responsabilidade social, sob essa concepção, não são informações sobre as atividades de caráter social e não obrigatórias
incorporados no custo dos produtos e serviços, pois visam atender que a empresa realiza durante um período de tempo, visando à
aos objetivos sociais. transparência em suas ações, além de contribuir para melhorar a
A cidadania corporativa traduz o relacionamento entre comunicação e o sistema de informação da organização para com
empresas e sociedade, direciona a organização ao contexto global
todas as partes interessadas. Do ponto de vista de Reis e Medeiros
compartilhando valores e formas responsáveis de gerenciar os
(2007), o balanço social deve ser “ferramenta de ação e divulgação
negócios com todos os parceiros e, neste sentido, constitui-se
das informações econômicas e sociais que possam servir como
parte integrante do planejamento, dos objetivos e da operação da
instrumentos de apoio ao planejamento do desenvolvimento.”
empresa. Assim a cidadania corporativa significa novo estilo de
Essa ferramenta representa um indicador de responsabilidade
gestão, no qual o planejamento estratégico contempla o impacto
social. Segundo o Ibase, o balanço social [...] é um demonstrativo
de seus produtos e serviços sobre os diversos públicos com os
quais a empresa interage, tanto em relação aos direitos quanto à publicado anualmente pela empresa reunindo um conjunto de
responsabilidade das partes. informações sobre os projetos, benefícios e ações sociais dirigidas
A discussão do conceito de cidadania corporativa remete à aos empregados, investidores, analistas de mercado, acionistas e
compreensão da expressão “governança corporativa”, que significa à comunidade. É também um instrumento estratégico para avaliar
o modo como a empresa trabalha. A forma correta de planejar, e multiplicar o exercício da responsabilidade social corporativa.
executar, controlar e avaliar as ações empresariais determina a O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
cidadania corporativa responsável. Na visão de Reis e Medeiros desenvolveu um conjunto de indicadores sociais que permite
(2007), “[...] a responsabilidade das empresas perante suas ações identificar a performance da empresa em relação a práticas
que afetam a sociedade é tão importante quanto a responsabilidade socialmente responsáveis. Esses indicadores são apresentados
do governo pela boa governança da nação. A empresa também em forma de questionário de avaliação da empresa, dividido em
deve ser governada beneficiando todas as partes interessadas.” sete grandes temas: valores e transparência, público interno, meio
Nesse sentido, a responsabilidade social não se limita às ambiente, fornecedores, consumidores/clientes, comunidade e
funções do Estado, mas das empresas e da sociedade como um todo. governo e sociedade.
Martinelli (2000, p.88) defende que a empresa-cidadã consegue Algumas normas internacionais foram criadas como padrão
ampliar e complementar a sua função de agente econômico em de referência na qualidade requerida pelos mercados. A BS 8800,
agente social, pela disponibilização voluntária e responsável norma britânica, através das especificações Occupational Health
dos mesmos recursos usados nos negócios para transformar a and Safety Assessment Serie (OHSAS) 18001 e 18002, compõe
sociedade e desenvolver o bem comum. um sistema de gestão da Segurança e Saúde do Trabalhador
A responsabilidade social se aplica em qualquer tipo de (SST) que orienta as empresas para o desenvolvimento de ações
organização empresarial, independentemente do porte, se pública destinadas ao seu público interno.
ou privada, podendo ser considerada como estratégia para alcançar De igual relevância, a Norma Accountability – AA 1000,
a competitividade no mercado, uma vez que os consumidores criada em 1996 pelo Institute of Social and Ethical Accountabilitity
têm preferência pelos produtos e serviços de empresas éticas (Isea), organização não governamental sediada em Londres, no
e comprometidas com a sociedade. Portanto, as empresas Reino Unido, objetiva monitorar as relações sociais entre a empresa
socialmente responsáveis são agentes que agregam valores à e a comunidade onde está inserida, como também promover e
cultura empresarial e, ao mesmo tempo, agentes de mudança dar suporte às organizações nas atividades de implementação de
social. Assumem o relacionamento ético e responsável para com sistemas de gestão éticos e socialmente responsáveis.
todos os seus parceiros e buscam a construção de um futuro A norma Social Accountability (SA) 8000 foi criada em
com crescimento econômico, equidade social e uso adequado 1997 com o objetivo de atestar e comprovar o exercício pleno da
dos recursos naturais, diferenciando-se, entre outras, pelo maior responsabilidade social interna e externa a empresa, conferindo-
potencial de sucesso e longevidade. lhe a condição de empresa-cidadã.

Didatismo e Conhecimento 60
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Essa última, considerada a Norma Internacional de Enfim, a responsabilidade social torna-se importante meio das
Responsabilidade Social, atua como princípio ético balizador das organizações empresariais participarem no enfrentamento das
ações e relações da empresa com os públicos com os quais interage expressões da questão social. (Texto adaptado de LIMA, M. J. O.
– funcionários, consumidores, fornecedores e a comunidade. Essa Doutora docente em Serviço Social).
norma visa socializar valores para todos os elos dessa cadeia e foi
elaborada com base nas regras da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), na Declaração Universal dos Direitos Humanos e
na Declaração Universal dos Direitos da Criança. Possui critérios 3.5 GESTÃO EM SAÚDE
essenciais de atuação que visam à erradicação da mão de obra E SEGURANÇA.
infantil, à segurança e à saúde do trabalhador, à liberdade de
associação e direito à negociação coletiva, à discriminação, ao
horário de trabalho, à remuneração, às práticas disciplinares que
determinam a política de responsabilidade social. A norma SA
8000 constitui o primeiro padrão de certificação social que busca Para Araújo (2006a), perdas, injúrias, danos à propriedade
garantir os direitos básicos dos trabalhadores. eventualmente causados pelas atividades, produtos e serviços
A SA 8000 surgiu como resposta às pressões do mercado de uma organização, constituem problemas que podem acarretar
consumidor sobre empresas que ignoram as condições de trabalho prejuízos através de várias formas, tais como processos de
oferecidas por seus fornecedores. Teve maior impulso após responsabilidade civil pelo fato do produto ou serviço oferecer
denúncias de utilização de mão de obra infantil e escrava na riscos aos trabalhadores, alto índices de absenteísmo e afastamento
indústria chinesa de brinquedos, principal fornecedora das redes de trabalho devido a acidentes.
americanas de varejo. (Pacheco, 2001). As empresas devem estar livre de riscos inaceitáveis de danos
Outro destaque em relação aos indicadores de responsabilidade nos ambientes de trabalho, garantindo o bem estar físico, mental,
social se refere ao Global Compact (Pacto Global), criado em e social dos trabalhadores e partes interessadas. Para minimizar
1999, a partir da iniciativa do secretário-geral das Nações Unidas, ou eliminar tais prejuízos, muitas organizações desenvolvem
Kofi Annam, cuja finalidade motiva, mundialmente, a criação e implementam sistemas de gestão voltados para a segurança e
saúde ocupacional.
de estruturas sociais e ambientais para assegurar a continuidade
Ainda cita Araújo (2006) que os controles implementados
de mercados livres, abertos, e dar possibilidade para que todos
devem ser capazes de identificar e avaliar as causas associadas
tenham acesso aos benefícios da economia global.
aos acidentes e incidentes. Principalmente, a avaliação e o
Os objetivos e princípios propostos pelo Pacto Global estão
exame dos incidentes, pois fornecem dados que, se devidamente
relacionados a questões de direitos humanos, civis, de trabalho
tratados através de uma visão sistêmica, podem fornecer subsídios
e de meio ambiente, estando disseminados pelos organismos
importantes para a prevenção de possíveis acidentes.
internacionais como a Organização Internacional do Trabalho
Lapa (2001) considera a gestão de segurança e saúde, através
(OIT), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
da garantia da integridade física e da saúde dos funcionários, como
(Pnuma), Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos fator de desempenho que deve ser incorporado à gestão do negócio
Humanos (Acnudh) e o Programa das Nações Unidas para o empresarial.
Desenvolvimento. Acidentes, incidentes constituem, muitas vezes, em eventos
Várias organizações empresariais nacionais e estrangeiras que devem ser controlados de maneira preventiva através do
estão buscando conhecer e adotar normas e padrões de planejamento, organização e avaliação do desempenho dos
responsabilidade social, pois, no contexto globalizado, a não meios de controles implementados. Estes eventos estão, muitas
observância desses princípios tem ocasionado reflexos negativos vezes, associados a inúmeras causas, e não apenas a uma causa
nas economias regionais e locais, impedindo a expansão dos específica. Análises simples e rápidas podem levar à conclusão de
negócios em vários segmentos. que a causa imediata reside nos fatores humanos e/ou em algum
Por meio de pressões do mercado internacional, as empresas tipo de problema técnico, mas, grande parte de tais eventos é
são impulsionadas a aderirem aos critérios impostos pelas normas decorrente de falhas na gestão responsável pela segurança e saúde
de certificação a fim de alcançarem a condição de empresas- ocupacional aplicada a estes fatores. Assim, é importante que os
cidadãs. gestores responsáveis pelo controle dos aspectos de segurança e
As principais normas e certificações significam ferramentas saúde da organização deem especial atenção ao fator humano e a
para avaliar e certificar as empresas consideradas socialmente tecnologia utilizada.
responsáveis e contribuem, de maneira positiva, para que o Na época da Revolução Industrial, as preocupações na área de
movimento sobre a responsabilidade social se efetive através segurança não focavam a prevenção de acidentes, e sim a reparação
da concretização da consciência ética, do agir corretamente, dos danos à saúde e a integridade física dos trabalhadores, cujos
não pela imposição da lei, mas pela necessidade de contribuir custos diretos eram conhecidos. Segundo Benite (2004), por volta
para o desenvolvimento sustentável, do compromisso com a de 1926 os estudos do norte-americano Heinrich já demonstravam
responsabilidade em avaliar constantemente os impactos das ações uma relação entre os custos indiretos e diretos da ordem de 4:1, ou
corporativas para com a sociedade de modo geral. Acrescenta-se a seja, os custos indiretos eram muito mais altos do que os custos
este conjunto de fatores a responsabilidade perante os problemas diretamente associados aos acidentes evidenciando que somente a
sociais que perpassam o mundo, adotando práticas e ações éticas reparação não era suficiente sendo necessários investimentos em
comprometidas aos valores humanos, sociais e ambientais. prevenção.

Didatismo e Conhecimento 61
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Qualquer acidente gera um prejuízo econômico significativo, Segundo o BSI (1996), em 1996 foi criada a norma BS 8800
pois todos os custos diretos e indiretos resultantes são custeados que tem como objetivo ser uma ferramenta para os administradores,
pela a empresa e consequentemente atinge todas as partes empregados e profissionais envolvidos com a Segurança do
relacionadas. A abrangência destes custos deve ser bem conhecida Trabalho e outras especialidades terem a sua disposição uma
pelos empresários, de modo que esses percebam os recursos “bússola” para seguir e direcionar suas ações. Dentre os objetivos
desperdiçados para cada acidente que ocorra, servindo como um da norma destacam-se:
forte argumento para estimular investimentos que reduzam ou - Valorização do Capital Humano;
eliminem a sua ocorrência. Deve-se destacar que o custo total da - Melhora do rendimento do trabalho; - Garantia do sucesso
não-segurança para as empresas, trabalhadores, famílias, sociedade da organização;
e governo é de difícil mensuração. - Melhora da imagem da organização frente à sociedade.
Reativamente, os custos decorrentes da falta de segurança Esta norma foi criada com a intenção de proporcionar uma
linguagem comum para os sistemas de gestão de segurança e
estão ligados ao tratamento das consequências dos acidentes
saúde ocupacional, auxiliando as empresas a estabelecer uma
e as subsequentes ações corretivas. Já, os custos da segurança
plataforma universal para tratar e administrar questões de risco,
estão relacionados com todo o tempo e recursos utilizados higiene no trabalho, comportamento e atitudes seguras em relação
no planejamento da prevenção de acidentes e nos controles ao ambiente onde se exercem alguma atividade.
implementados nos locais de trabalho. Em 1999, foi criada A Norma Occupational Health and
Muitas empresas vêm mudam do seus princípios e valores, Safety Assessment Series OHSAS 18000 que apresenta os
expressando formalmente em seu código de ética e que devem requisitos para um sistema em saúde e segurança ocupacional,
nortear todas as suas relações, planos, programas e decisões, permitindo a uma organização controlar seus riscos em saúde
buscando implementar uma gestão socialmente responsável. e segurança ocupacional e melhorar seu desempenho. Ela não
Nesse caso, o exercício destes princípios e valores se dá em duas estabelece critérios específicos de desempenho em saúde e
dimensões: a gestão da responsabilidade social interna e a gestão segurança ocupacional, nem fornece especificações detalhadas
da responsabilidade social externa. Assim, este novo conceito faz para a concepção de um sistema de gestão. A série de avaliação de
com que empresas socialmente responsável tomem suas decisões, saúde e segurança ocupacional OHSAS 18001 foi projetada para
pró-ativamente, com base na ética e na transparência de suas ações. ajudar as organizações a formularem políticas e metas de saúde e
segurança ocupacional, incluindo a norma 18002, Diretrizes para
Sistemas de gestão de segurança e saúde a implementação da OHSAS 18001.
Os elementos de um sistema de saúde e segurança
Os sistemas de gestão da Segurança e Saúde no Trabalho é ocupacional exigem um processo contínuo de revisão e avaliação,
dentro do conceito de melhoria contínua, levando em conta o
um conjunto de iniciativas da organização, formalizado através
aperfeiçoamento e a minimização de todas as não-conformidades
de políticas, programas, procedimentos e processos de negócio
em saúde e segurança. Segundo Tavares Jr. (2001) nesta avaliação,
da organização para auxiliá-la a estar em conformidade com as a identificação de um elemento com alto percentual ou indicador
exigências legais e demais partes interessadas, conduzindo suas elevado em uma não-conformidade, pode ser usado como indicador
atividades com ética e responsabilidade social. Os elementos deste de prioridade para eliminar a não-conformidade ou reduzi-la a
sistema de gestão não são estáticos e devem reagir e se adaptarem padrões estabelecidos nas Normas Regulamentadoras.
aos desvios (reais ou potenciais) que ocorram em relação aos seus
objetivos e propósitos, visando à melhoria contínua. Principais requisitos dos sistemas de gestão de segurança
Tavares Jr. (2001), diz que, embora a gestão da saúde e e saúde
segurança ainda não exista como norma internacional, como é o
caso da ISO 9000 para qualidade e da ISO 14000, para a gestão - Política, Objetivos e Programas de Segurança e Saúde no
ambiental, os especialistas da área acreditam que a questão da Trabalho
saúde e segurança terá o mesmo caminho, considerando a série de Segundo a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), a empresa
normas britânicas BS 8800 para sistemas de gestão de segurança deve implementar uma política de segurança e saúde no trabalho,
e saúde. Diferente das normas de qualidade e ambiental que são autorizada pela alta administração, que claramente estabeleça
certificadoras, as normas de saúde e segurança vêm na forma de os objetivos gerais de segurança e saúde e o comprometimento
guia unificando todo um conteúdo. No Brasil, há diversas empresas com a melhoria do desempenho em segurança e saúde. Através
da implantação desta política, define-se um direcionamento geral
que já possuem ou trabalham para obter sistemas integrados que
para a empresa e as diretrizes de atuação em relação à segurança
incorporam os requisitos da ISO 9000, ISO 14000 e as diretrizes
e saúde do trabalho. Estas diretrizes devem ser compostas por
da BS 8800. requisitos que efetivamente sejam cumpridos pela empresa e que
Para implementação do Sistema de Gestão de Segurança e sejam evidenciados de maneira clara.
Saúde no Trabalho, também é importante conhecer os níveis de A empresa deve fundamentar, com base em sua política os
desempenho em relação à Segurança e Saúde no Trabalho que objetivos e os respectivos programas de gestão da segurança
as organizações podem apresentar, visto que o propósito básico e saúde no trabalho. O desdobramento da política e missão da
do sistema é atuar sobre esse desempenho. Estes sistemas de empresa em objetivos quantificados feito sucessivamente ao longo
gestão de podem contribuir para que empresas obtenham um de todos os níveis da organização, de maneira a permitir que cada
nível de melhoria contínua de desempenho, visto que apresentam pessoa saiba exatamente de que forma contribui, faz com que a
mecanismos sistêmicos de melhoria, fundamentando-se em uma empresa seja facilmente manobrável, tornando-se mais ágil e
atuação proativa. dinâmica.

Didatismo e Conhecimento 62
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Segundo a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), os programas Os controles operacionais na fonte, devem dar prioridade
de gestão de Segurança e Saúde devem ser analisados criticamente à eliminação dos perigos ou evitar que eles existam, pois uma
em intervalos regulares e planejados. Onde houver necessidade, vez que não existe o perigo, não haverá o acidente. Deve-se
estes programas devem ser revisados para atender às mudanças destacar que essa forma de controle pode demandar a aplicação
nas atividades, produtos, serviços, ou condições operacionais da de novas tecnologias, mudanças significativas nos processos e
organização. consequentemente maiores investimentos para se obter resultados
Os objetivos a serem estabelecidos devem ser mensuráveis mais significativos.
sempre que possível, a utilização de objetivos não mensuráveis só Os controles nos meios baseiam-se na criação de barreiras
é recomendada quando a empresa não encontrar formas adequadas para prevenir que o homem fique exposto a um determinado
para realizar o seu acompanhamento de forma qualitativa. Os perigo, sem que este seja eliminado. Uma vez aplicadas, operando
objetivos devem ser comunicados de forma eficaz a fim de que as corretamente e com as devidas manutenções, as barreiras não
pessoas possam contribuir para atingi-los. demandam ações por parte das pessoas. Uma das maiores
- Identificação de Perigos, Avaliação e Controle dos dificuldades em relação a esse tipo de controle é que, muitas vezes,
Riscos as barreiras são removidas ou tornadas inoperantes, expondo as
Para a norma BSI-OHSAS 18001 (1999) a organização deve pessoas ao risco. Esse tipo de controle, em alguns casos, pode criar
estabelecer e manter procedimentos para a contínua identificação uma falsa sensação de segurança, podendo gerar graves acidentes.
O controle sobre as pessoas baseia-se no estabelecimento de
de perigos, avaliação de riscos e a implementação das medidas de
parâmetros para a forma de pensar e agir dos trabalhadores, como
controle necessárias. Estes devem incluir:
intuito de que os processos ocorram de maneira segura. Este deve
- Atividades de rotina e não-rotina;
ser utilizado como último recurso, somente nos casos em que não
- Atividades de todo o pessoal que têm acesso ao local de
é possível conseguir uma forma praticável de tornar o ambiente de
trabalho (incluindo subcontratantes e visitantes); trabalho intrinsecamente seguro.
- Instalações
Segundo norma BSI-OHSAS 18001 (1999), a organização - Exigências Legais e Outras
deve garantir que os resultados dessas avaliações e os efeitos dos Para a norma BSI-OHSAS 18000 (1999), a organização
controles sejam considerados para o estabelecimento dos objetivos deve estabelecer e manter procedimento para identificar e
de Segurança e Saúde no Trabalho, devendo documentar e manter acessar a legislação e outras exigências de Segurança e Saúde no
tais informações atualizadas. Trabalho que lhe são aplicáveis. A organização deve manter estas
Tomando como base o pressuposto de que é impossível ocorrer informações atualizadas. Deve comunicar informações relevantes
um acidente e suas consequências sem a presença de um perigo, as sobre legislação e outras exigências aos seus empregados e a
empresas devem buscar o total conhecimento dos perigos e riscos outras partes interessadas.
existentes em seus ambientes de trabalho, estabelecendo uma A falta de um processo adequado para identificação e aplicação
sistemática que permita a criação de um inventário dos perigos e de legislações e normas nas empresas pode contribuir para o seu
riscos existentes, contemplando a avaliação dos riscos envolvidos, descumprimento e as consequentes multas, embargos e acidentes.
devendo ser proativo e com objetivo garantir que todos os perigos
atuais e futuros sejam identificados e tratados adequadamente. Estrutura e Responsabilidade
O gerenciamento de riscos é de fundamental importância,
pois auxilia a tomada de decisão na área de Segurança e Saúde e Segundo a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), a
permitir melhor alocação de recursos, além de subsidiar o processo responsabilidade final sobre segurança e saúde no trabalho
de definição de medidas de controle, podendo avaliar quais riscos pertence à alta administração. A organização deve designar um
são toleráveis e quais devem ser controlados. Estes dados também membro da alta administração (por exemplo, em uma grande
devem subsidiar o estabelecimento dos objetivos e programas, organização, um diretor ou um membro do comitê executivo) com
direcionando os recursos para as áreas mais importantes, o que a particular responsabilidade de assegurar que o sistema de gestão
resulta em uma melhoria na relação custo-benefício. de Segurança e Saúde no Trabalho seja devidamente implementado
Deve-se notar a importância deste requisito pois o e atende aos requisitos em todas as situações e locais de operação
da organização. A administração deve fornecer recursos essenciais
desempenho de segurança e saúde está diretamente ligado à
para a implementação, controle e melhoria do sistema de gestão de
eficácia de sua implementação, ou seja, se os perigos e riscos
Segurança e Saúde no Trabalho.
forem mal identificados ou avaliados, todas as ações decorrentes
- Treinamento, Conscientização e Competência
serão realizadas de forma inadequada.
Para a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), a empresa
A empresa, baseando-se na identificação de perigos e deve estabelecer um procedimento para identificar e prover as
avaliação de riscos, deve identificar quais são os processos que competências necessárias para se exercer cada um dos cargos
podem contribuir para a eliminação dos perigos ou para a redução existentes, podendo considerar as seguintes fontes:
dos riscos, e estabelecer os controles necessários, considerando - Demandas relacionadas aos objetivos e programas de gestão
diversos fatores, entre eles: o nível de risco existente, os custos, de Segurança e Saúde no Trabalho;
a praticidade do controle e a possibilidade de se introduzir novos - Requisitos legais e outras exigências;
perigos, a fonte (perigo), o meio e o homem, e quanto mais - Procedimentos e instruções de segurança;
próximos os controles estiverem das fontes mais eficientes e - Resultados de avaliações de desempenho de equipes;
efetivos eles serão. - Identificação dos perigos e avaliação dos riscos;

Didatismo e Conhecimento 63
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
- Antecipação das necessidades de sucessão de gerentes e - Acidentes, Incidentes, Não-Conformidades, Ações
da força de trabalho; - Alterações em processos, ferramentas e Preventivas e Corretivas
equipamentos. Para a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), estes procedimentos
As competências podem ser estabelecidas em documentos, devem requerer que toda ação preventiva e corretiva proposta
que é utilizado como base para a realização de novas contratações, seja analisada criticamente durante o processo de avaliação de
mudanças de funções e para a identificação de necessidades de riscos antes de sua implementação. Qualquer ação preventiva ou
novos treinamentos, para a garantia de que não haja pessoas corretiva tomada para eliminar as causas das não-conformidades,
inabilitadas realizando atividades. reais ou potenciais, deve ser adequada à magnitude dos problemas,
- Consulta e Comunicação e proporcional aos riscos de segurança e saúde no trabalho
A norma BSI-OHSAS 18001 (1999) determina que a empresa encontrado. A organização deve implementar e registrar quaisquer
deve possuir um procedimento que estabeleça a sistemática para
mudanças nos procedimentos documentados resultantes das ações
assegurar uma boa comunicação entre a gerência e os trabalhadores
preventivas e corretivas.
e vice-versa, entre a empresa e todas as partes interessadas.
A comunicação entre os trabalhadores e a gerência deve ser A empresa deve estabelecer um procedimento com a
desenvolvida por meio de um procedimento que proporcione uma sistemática para a identificação e para a análise das não-
sistemática confiável. conformidades, acidentes e incidentes, e para a subsequente
- Preparação e Atendimento a Emergências tomada de ações corretivas e preventivas.
Segundo a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), a organização Quando a empresa cria um espaço facilitador para tratar dos
deve analisar criticamente os planos e procedimentos de preparação problemas ali existentes, nas suas dimensões de efeitos e causas, é
e atendimento a emergências, especialmente após a ocorrência de possível melhorar, de forma considerável, a visão dos problemas
incidentes ou situações de emergência. em sua verdadeira essência e dar-lhes a solução adequada. Assim,
Com base nos perigos existentes, deve-se identificar as este requisito tem ligação direta com o conceito de retroação,
hipótese de emergências, considerando todos os novos perigos que pois objetiva garantir ao sistema de gestão uma melhoria do
possam surgir e suas decorrentes hipóteses de emergência, como desempenho com base nos problemas detectados, sejam eles reais
por exemplo, novas instalações, novos equipamentos, introdução ou potenciais.
de novos materiais e serviços. O procedimento exigido por este requisito deve contemplar os
Nenhuma atividade pose ser realizada de maneira totalmente seguintes itens básicos:
segura. Desta forma, a empresa deve ter planos ou procedimentos - Formas de identificação das não-conformidades, acidentes e
que definam como agir em uma eventual situação de emergência, quase-acidentes;
o que poderá se tornar a diferença entre um pequeno acidente e
- Técnicas utilizadas para a investigação das causas;
evento catastrófico. Araújo (2006b) cita que a eficácia da resposta
- Forma de planejamento das ações necessárias (de correção,
durante as emergências é uma função da quantidade e qualidade do
planejamento, dos treinamentos e simulados realizados. corretivas ou preventivas), incluindo a definição de prazos e
responsáveis;
Medição e Monitoramento o Desempenho - Forma de acompanhamento da implementação das
ações planejadas; - Forma de avaliação da eficácia das ações
Para a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), as empresas devem implementadas.
aumentar sua capacidade de julgamento analítico por meio da As ações corretivas e preventivas devem ser analisadas pelo
obtenção de informações atualizadas que lhes permitam construir processo de identificação de perigos e riscos, pois os acidentes
estratégias consistentes para abordar seus problemas. Devem ou quase-acidentes poderem ser resultantes de um perigo que
também, identificar quais elementos chave para o desempenho não foi identificado, ou que não foi controlado de maneira eficaz,
em Segurança e Saúde no Trabalho (processos, programas, além da possibilidade de surgirem perigos resultantes das ações
objetivos, procedimentos etc.) devem ser medidos e monitorados, estabelecidas.
estabelecendo procedimentos para a coleta, processamento dos
dados e para a avaliação das informações de modo que permita Documentação e Controle e Documentos, Dados e Gestão
a tomada de decisões e a intervenção. Este requisito estabelece de Registros
alguns elementos que devem obrigatoriamente ser medidos e
monitorados, como por exemplo, o atendimento dos objetivos e
Segundo a norma BSI-OHSAS 18001 (1999), os registros de
das leis e normas aplicáveis, os acidentes e quase-acidentes.
segurança e saúde no trabalho devem ser legíveis, identificáveis
Recomenda-se que o Sistema de Gestão de Segurança e Saúde
contemple entre seus elementos mecanismos adequados para obter e rastreáveis às atividades envolvidas. Os registros de segurança
e processar informações que sejam capazes de proporcionar não e saúde no trabalho devem ser arquivados e mantidos de maneira
somente interpretações adequadas sobre os eventos passados, que possam ser rapidamente recuperados e protegidos contra
mas assegurar a compreensão dos processos organizacionais a danos, deterioração ou perda. O tempo de retenção deve ser
fim de que essas informações possam ser incorporadas ao ciclo estabelecido e registrado. Registros devem ser mantidos, de acordo
de melhoria contínua. Este requisito também exige que, com com a necessidade do sistema e da organização, para demonstrar
base em suas formas de medição e monitoramentos, devem ser conformidade com esta especificação OHSAS. O objetivo deste
identificados e controlados os equipamentos de medição utilizados. requisito é assegurar que a empresa mantém sob controle todos
Essa exigência busca assegurar que os equipamentos utilizados os registros gerados, os quais comprovam a implementação e
estejam adequados ao seu uso e com a precisão exigida, garantindo operação do sistema de gestão de segurança e saúde no trabalho
a confiabilidade das medições realizadas. e servem como fontes de informação para a retroação do sistema.

Didatismo e Conhecimento 64
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A norma BSI-OHSAS 18001 (1999) estabelece que o Sistema
de Gestão de Segurança e Saúde no Trabalho deve ser baseado em 3.6 GESTÃO DE RESPONSABILIDADE
documentos, pois parte do princípio de que a documentação é um SOCIAL. CONCEITOS, REFERENCIAIS
elemento chave para a realização de qualquer processo que envolva NORMATIVOS E INDICADORES.
comunicação, permitindo que o conhecimento existente relativo à
Segurança e Saúde no Trabalho seja mantido e aperfeiçoado de
forma contínua, mesmo com a mudança das pessoas.
Deve-se também ser desenvolvido um manual ou documento
similar que contemple essas informações, explicando o Os novos desafios implicados pela responsabilidade social
funcionamento do Sistema de Gestão de Segurança e Saúde no e pelo compromisso empresarial com a cidadania ultrapassam
Trabalho em linhas gerais. Todos os documentos desenvolvidos os limites estritos de uma atuação social de cunho internalista
para o sistema de gestão devem ser controlados por meio de um voltada para satisfazer necessidades sociais dos empregados e
procedimento que assegure que eles sejam criados e distribuídos dependentes.
de forma organizada, permitindo a sua correta utilização. As empresas passam a considerar como elemento constitutivo
- Auditoria e Análise Crítica pela Administração de seu campo de responsabilidade a atuação social de cunho
A norma BSI-OHSAS 18001 (1999), cita que a organização externalista, direcionada para satisfazer necessidades de atores
deve estabelecer e manter um programa de auditorias e sociais outros que não apenas seus empregados e dependentes.
procedimentos para a execução de auditorias periódicas do sistema Nesse movimento, o compromisso para com os outros não se
de gestão de segurança e saúde no trabalho. Devendo ser baseado restringe apenas ao universo de concorrentes e clientes (efetivos ou
nos resultados das avaliações de risco das atividades da organização, potenciais), que seriam outros integrantes de uma esfera imediata
e nos resultados de auditorias anteriores. Os procedimentos de de interesse econômico.
auditoria devem abranger o escopo, a frequência, as metodologias, As transformações produzidas pelas empresas para o
as competências, bem como as responsabilidades e requisitos para desenvolvimento das ações socialmente responsáveis afetam sua
conduzir auditorias e relatar os resultados. estrutura e o modo pelo qual elas passam a efetuar a gestão de
Desta forma, a empresa deve possuir uma sistemática para suas diversas relações. Destacamos neste capítulo as principais
realização de auditorias internas do sistema a fim de garantir sua transformações operadas pelas empresas.
implementação, manutenção e melhoria contínua. Esta é uma
etapa essencial para dar consistência ao ciclo de melhoria contínua A necessária atenção aos interlocutores
e contribuir para a aprendizagem organizacional.
A norma BSI-OHSAS 18001 (1999), cita que a alta A responsabilidade social efetua um movimento de ampliação
administração da organização deve, em intervalos por ela da atuação da empresa de internalista para externalista. Essa
determinados, analisar criticamente o sistema de gestão de ampliação engloba outros públicos, num movimento que supera
segurança e saúde do trabalho para assegurar sua contínua o campo da esfera imediata de interesse econômico e incide sobre
conveniência, adequação e eficácia. O processo de análise crítica as comunidades locais e regionais, além de toda a sociedade, o
pela administração deve garantir que as informações necessárias que, em tempos de consensos sociais apoiados sobre meios de
sejam coletadas para permitir que a administração realize a comunicação globalizados, pode significar para corporações
avaliação. Esta análise crítica deve ser documentada. A análise transnacionais uma diversificada gama de realidades. Aos
crítica deve abordar a possível necessidade de mudanças na política, stakeholders tradicionais das empresas – empregados, parceiros,
objetivos e outros elementos do sistema de gestão de segurança e clientes e fornecedores – agregam-se, portanto, novos atores, em
saúde do trabalho, à luz dos resultados das auditorias do sistema de relação aos quais são concebidas, propostas e implantadas ações
gestão, das mudanças das circunstâncias e do comprometimento focalizadas.
com a melhoria contínua. Na literatura temática sobre a responsabilidade social
Este requisito tem como foco o desempenho global do sistema empresarial, a formalização de uma abordagem conceitual sobre
de gestão de segurança e saúde do trabalho e não a análise de as diversas relações de uma empresa com seus interlocutores foi
dados específicos, visto que estes devem ser tratados pelos demais formulada por Freeman (2000), em 1984, sendo conhecida como
elementos do sistema (medição e monitoramento, ação corretiva teoria dos stakeholders. A figura a seguir ilustra a passagem do
e preventiva etc.). Os resultados das auditorias e análise crítica paradigma de atuação social internalista para atuação social
devem gerar adequações e ações corretivas sobre o sistema de externalista:
gestão de segurança e saúde no trabalho, garantindo sua contínua Na atuação social internalista, predomina o modelo de gestão
adequação à realidade da empresa e buscando a melhoria contínua da qualidade de vida no trabalho e dos recursos humanos da
do desempenho. (Texto adaptado de ARAUJO, R. P.; SANTOS, N. empresa. Na atuação social externalista, o foco privilegiado de
dos. e MAFRA, W. J. Docentes em nível superior). atenção passa a ser o fomento ao desenvolvimento social local, ao
qual se incorpora a dimensão da sustentabilidade, que emerge com
força no debate político ideológico, associada às preocupações
ambientais que marcaram os anos 1970. O que se quer enfatizar
é a perduração dos efeitos benéficos das ações. O Bem não pode
ser visto como um efeito apenas pontual. Sua possibilidade de se
perenizar no tempo como um compromisso para com as gerações
futuras ganha forte destaque.

Didatismo e Conhecimento 65
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Estratégia orientada aos interlocutores Na construção de uma estratégia orientada para a relação com
os stakeholders, existem dois fatores relevantes para a ação dos
As relações entre as organizações e a sociedade são dinâmicas. gestores: i. o tipo de responsabilidade social que irá configurar-
Portanto, uma atuação empresarial voltada para a responsabilidade se como ponto forte da empresa e este em função da sinergia
social pressupõe uma abertura permanente e constante de canais existente entre a cultura da empresa e as demandas da comunidade
de diálogo e de comunicação para monitoramento do ambiente onde ela está inserida; e ii. o reconhecimento ou a identificação
e das relações com os interlocutores organizacionais, não se de seus stakeholders efetivos e potenciais. No que respeita ao
constituindo apenas em estabelecer uma prioridade predefinida de primeiro fator, a empresa deve focar as ações sociais que pretende
comprometimento com grupos específicos. desenvolver no exercício da responsabilidade social. Esse foco na
A responsabilidade social empresarial prima pela construção ação deve ser direcionado para as demandas sociais que tenham
de ações e práticas nos negócios em que os interesses e a realidade vínculo com a cultura da organização, ou seja, que estejam
dos interlocutores sejam levados em consideração. Essa atitude diretamente relacionadas ao trabalho e à estratégia predefinida da
pressupõe a internalização de padrões de conduta que valorizem empresa. Sem esse vínculo entre as demandas da comunidade e a
o ser humano, a sociedade e o meio ambiente e tenham como cultura organizacional, as ações socialmente responsáveis podem
decorrência uma boa governança e a transparência. As empresas transformar-se em meras ações filantrópicas.
Hitt et al. apud Borger (2001) classificou os stakeholders em
eticamente responsáveis criam um ambiente que propicia e
três grupos, quais sejam:
fortalece suas posições para a sustentabilidade de seus negócios
1. Stakeholders de capital: os acionistas e os principais
em longo prazo e a perenização da vida no planeta. Isso implica
provedores de capital para firmas como bancos, agentes financeiros,
inserir valores outros, a confiança e a reciprocidade, atípicos no fundos de investimentos.
mundo dos negócios, caracterizado pela produtividade, pela 2. Stakeholders de produto e mercado: os clientes, os
competitividade e pela concorrência. fornecedores, as comunidades locais e sindicais.
A resposta efetiva de uma empresa às solicitações de seus 3. Stakeholders organizacionais: empregados, incluindo o
diversos interlocutores não está garantida pela formalização pessoal administrativo (executivos) e não administrativo.
e pela manifestação de princípios em suas políticas, valores e Na maioria das vezes, existe divergência entre esses grupos de
crenças, como declarado pela alta administração. É necessário um interesses e as relações de dependência entre estes e as organizações
compromisso efetivo e concreto com as carências e as demandas são desiguais e assimétricas.
da sociedade. Quanto mais significativa for a participação de um ou mais
Não há um modelo específico e único para a implantação da grupos na empresa, maior sua dependência e maior o poder de
responsabilidade social nas empresas. O modelo a ser implantado influência desses grupos sobre a organização.
deve estar enraizado e vinculado ao tamanho, ao setor e à cultura Gerenciar essas relações de poder assimétricas, desiguais
da empresa, devendo ter como base (BORGER, 2001): e conflituosas é um grande desafio posto à alta administração e
a. uma visão integrada e sistêmica; aos que atuam na formulação e na implantação das estratégias
b. a melhoria contínua; empresariais. A escolha dos gestores da organização quanto aos
c. uma perspectiva de atuação de longo prazo e stakeholders se baseia na caracterização de sua legitimidade, na
sustentabilidade na operação dos negócios, abrindo-se mão de capacidade de influir na empresa e na urgência das demandas.
resultados de curto prazo, à medida que esses interfiram na relação As decisões estratégicas tomadas pela empresa são
com os stakeholders; diferenciadas para esses diversos grupos de interesse, porque
d. comunicação aberta e transparente com as partes os acionistas desejam credibilidade da organização e querem
interessadas, implicando adotar transparência, honestidade, maximizar seus retornos, preservar e aumentar sua riqueza; os
integridade e padrões de conduta éticos. consumidores e os clientes querem qualidade e confiabilidade
As diversas demandas das partes interessadas impõem dos serviços e produtos sem aumento de preços; os fornecedores
querem aumentar o preço e reduzir os custos; a comunidade quer
condições de negociação complexas e podem exigir
que as empresas sejam responsáveis, sendo empregadores de
comportamentos distintos e, aparentemente, contraditórios para
longo prazo, paguem mais impostos e não demandem serviços
as empresas. Com relação ao ambiente externo, a empresa não
de infraestrutura; e, finalmente, os trabalhadores da organização
efetua a gestão das relações com seus interlocutores, mas a gestão esperam confiança, desejando que a empresa forneça um ambiente
das expectativas das partes interessadas e de como elas serão de trabalho dinâmico, estimulante e compensador.
incorporadas à gestão empresarial e sustentadas. Esse fato, que não Não é possível que seja estabelecida uma relação imediata,
resume a gestão das ações socialmente responsáveis a uma mera linear ou direta, entre um comportamento eticamente responsável
questão de comando e controle, exige uma percepção acurada dos e um determinado nível de sucesso nos negócios. O sucesso
valores, dos direitos e dos deveres envolvidos para a tomada de nos negócios depende, em senso estrito, de ações racionais
decisão, colocando para a administração empresarial o desafio de instrumentais, enquanto o envolvimento com ações socialmente
controlar recursos críticos e acomodar demandas distintas que as responsáveis pressupõe, seguindo Max Weber, não somente ações
partes interessadas esperam que sejam atendidas (KARKOTLI, racionais instrumentais, mas também ações valorativas e afetivas.
2004). Mas a forma de condução pela organização dessas interações
A atuação para a responsabilidade social é um processo dinâmicas e complexas com as várias expectativas e interesses
contínuo em que se revisam os objetivos e as metas em diversos dos interlocutores cria imagens distintas da corporação, que são
momentos. Deve-se buscar a melhoria contínua com base na responsáveis pela reputação desta e, consequentemente, por sua
cooperação, na ética e na transparência e seu foco principal é a existência em longo prazo. Fombrun (1996) mostra essas relações
sustentabilidade. da seguinte forma:

Didatismo e Conhecimento 66
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
- os acionistas e daqueles que lidam com a empresa. A alteração do futuro, mas sim de construção de um futuro possível.
boa governança corporativa assegura aos sócios equidade, O planejamento é, portanto, decidir antecipadamente quais as
transparência, prestação de contas (accountability) e alternativas para a ação, escolher um curso de ação e o que deve
responsabilidade pelos resultados (IBCG, 2008). A forma como ser feito para que se alcance o objetivo desejado.
as atividades de responsabilidade social são estruturadas na Várias empresas que desejam adotar políticas de
empresa acarreta implicações para a governança corporativa. responsabilidade social têm utilizado estratégias que procuram
Assim, o processo de implantação das ações deve ser transparente mostrar que elas se encontram em sintonia com os interesses e
e monitorado. as aspirações de seus interlocutores, além da mera ênfase na
Comparando-se com a filantropia tradicional, o investimento preocupação com a maximização de lucros e a redução de custos.
social privado, tanto de pessoas físicas como de jurídicas, tem as O desafio nesse caminho é lidar com os parâmetros e as variáveis
seguintes características distintivas: associados ao desempenho social e ambiental, tanto em termos da
- a focalização em áreas, a presença de ações integradas e construção de diagnósticos quanto em termos do acompanhamento
convergentes e a concentração de recursos, além de ter na gestão de ações e processos e de avaliação de resultados.
seu fator dominante de efetividade e eficácia. Fundamental é que Há três momentos dinâmicos e interdependentes que
ele seja objeto de um processo de gerenciamento contínuo (MELO envolvem as atividades relacionadas às diversas funções de uma
NETO; BRENNAND, 2004), em que as práticas de certificação organização: o planejamento, a implantação e a avaliação. No
social e ambiental podem ser apontadas como o ponto culminante. planejamento estratégico a avaliação ex ante define o diagnóstico
inicial a partir do qual será construída uma visão de futuro desejada,
Responsabilidade social e planejamento estratégico levando-se em consideração os contextos diversos que podem
influenciar a organização. A visão de futuro define que ações serão
A implantação dos programas e das iniciativas que revelem implementadas. O monitoramento sistemático e contínuo destas
a responsabilidade social das organizações deve incluir o possibilita correções de rumo.
planejamento, desde um diagnóstico inicial da situação em que se O planejamento de uma organização pode ser separado em
encontra a empresa até a proposição final do conjunto de ações que estratégico, gerencial e operacional. O planejamento estratégico
pretende ver implantado. dá mais atenção aos fatores do ambiente externo da organização
Melo Neto & Fróes (2001) destacam a visão da responsabilidade e prioriza a definição da missão e da visão estratégicas, o
social como postura estratégica empresarial e explicam seu estabelecimento dos diversos objetivos de longo, curto e
significado: “... neste aspecto, a busca da responsabilidade pelas médio prazos e das mudanças necessárias para que as ações da
empresas é centrada na valorização do seu negócio em termos
organização sejam socialmente responsáveis. O planejamento
de faturamento, vendas e marketshare”. A responsabilidade
gerencial enfatiza fatores do ambiente interno da organização,
social passa a ser vista como ação social estratégica que gera
procurando agenciar os diversos recursos para que os objetivos
retorno positivo para os negócios. Como já foi destacado,
organizacionais sejam colocados em prática. O planejamento
somente haverá uma vinculação sistêmica das ações socialmente
operacional busca assegurar a realização das ações definidas no
responsáveis às outras diversas atividades da organização quando a
plano gerencial.
responsabilidade social empresarial constituir parte da estratégia da
A inserção da responsabilidade social pressupõe a articulação,
organização, fato que depende da elaboração de seu planejamento
a escolha, a adoção e o estabelecimento de indicadores e medidas
estratégico. As ações descontinuadas e desconectadas do
planejamento da instituição revestem-se do caráter de filantropia que possam trazer informações sobre a responsabilidade social
e não indicam necessariamente que a instituição está no caminho da empresa. Para isso, além das atividades associadas às funções
para a implantação da responsabilidade social. da produção, de marketing, de finanças e de desenvolvimento
A forma que uma organização pode adotar para praticar a de produtos/serviços, de recursos humanos, de compras, de
responsabilidade social é definir sua visão, o que compreende um engenharia/suporte técnico e manutenção, dentre outras, a
foco de atuação – meio ambiente, cidadania ou recursos humanos organização necessita efetuar uma vinculação sistêmica com as
–, sua estratégia de ação e seu papel principal. O papel está ligado atividades da responsabilidade social empresarial, adotando uma
aos valores da empresa, assim como o foco e a estratégia estão estrutura factível e condizente com sua realidade.
ligados à ação e à relação desta com seu entorno. Esses três
elementos (MELO NETO; FROES, 2001) – o foco, a estratégia Estruturas para implantação da responsabilidade social
e o papel – circunscrevem um campo de ação para a prática da
responsabilidade social empresarial. A organização define sua Machado Filho (2002) apresenta três formas básicas de
visão predominante e visões secundárias de responsabilidade estruturas organizacionais alternativas para a condução de ações
social e estabelece parâmetros para avaliar a gestão dessa prática sociais, interna ou externamente aos limites da empresa. Pela
no que corresponde, por exemplo, à relação com a comunidade. opção interna, a empresa opera as ações de responsabilidade social
Falar em planejar significa considerar a natureza do futuro dentro da sua própria estrutura organizacional, mantendo essas
ante as decisões tomadas no presente. O planejamento implica atividades no seu organograma. A opção externa é aquela segundo
avaliar a situação como um todo, prever as dificuldades potenciais a qual a empresa cria uma organização própria para operar as
e se preparar para superá-las. Dada a avaliação de uma situação ações sociais, como uma fundação sem fins lucrativos, ou então
diagnosticada no presente, pode-se estabelecer, planejar um desenvolve parcerias com outras instituições, aportando recursos.
futuro desejado e delinear, implementar os meios de torná-lo Entretanto, não opera diretamente as ações de responsabilidade
realidade. Assim, criam-se condições de possibilidade, não de social.

Didatismo e Conhecimento 67
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A empresa internaliza as atividades, operacionalizando interessadas, e para aumentar a credibilidade dos relatórios e
diretamente os projetos sociais demandas sobre a RS. O campo de aplicação da norma envolve
É uma estrutura usada por empresas onde há uma vinculação qualquer tipo de organização e porte, tanto público quanto privado.
estreita entre as demandas por ações sociais a serem desenvolvidas Por isso o termo RS, ao invés de RSE.
e as atividades empresariais. Os projetos sociais são realizados A ISO 26000 acrescenta valor aos trabalhos de RS já
pela própria estrutura organizacional da empresa. Um exemplo existentes através das seguintes medidas: desenvolver um
seria o caso do desenvolvimento de ações sociais e ambientais consenso internacional sobre o significado da Responsabilidade
corretivas ou preventivas, com relação direta e interligada com Social e os assuntos que a RS precisa abordar; fornecer normas
a atividade central da empresa potencialmente causadora de de procedimentos para ações efetivas em RS; e disseminar as
Essa estrutura também é sugerida no caso de uma ação social melhores práticas para o bem comunitário já desenvolvidas.
intrinsecamente relacionada com a atividade e o desempenho O objetivo da norma não é de que seja concorrente de outros
empresarial, especialmente as ações internas dirigidas aos padrões e requisitos de RS, mas complementar-se a estes. Para
próprios funcionários. Ou o caso de quando se deseja explorar de isso, a ISO divulgou uma lista com 90 documentos e iniciativas
forma intensa a especificidade da marca, associando diretamente considerados importantes para o assunto, dentre eles, o GRI,
determinada prática de responsabilidade social ao negócio da SA8000 e a AA1000, que serão apresentados com mais detalhes
empresa. abaixo.

Referenciais normativos e indicadores AA 1000

O presente texto busca apresentar algumas ferramentas Criada no Reino Unido, a AA 1000 é uma norma internacional
normativas de Responsabilidade Social descrevendo a sua de certificação que apresenta princípios e padrões de processo
finalidade, como e por quem ela tem sido usada, sua proposta e voltados para o engajamento com os públicos de interesse. Foi
destinação, e, em alguns casos, seu histórico de criação. Observando publicada em 1999 pela ONG ISEA (Institute of Social and Ethical
o grande leque de opções de modelos de normas de RS foram Accountability), em Londres, reconhecida como o primeiro padrão
selecionadas as principais normas reconhecidas no mercado: ISO internacional de gestão da RSE. Em 2005 a AccountAbility lançou
26000, AA 1000, SA 8000, NBR 16001, Indicadores Ethos de RS, o segundo módulo da AA 1000, o AA 1000SES – Stakeholder
e GRI. Com esse estudo busca-se uma melhor compreensão dessas Engagement Standard. Esse módulo acrescenta uma listagem
de considerações práticas sobre engajamento dos públicos de
normas, principalmente quanto a sua finalidade.
interesse e uma estrutura para o processo de diálogo entre eles.
A série de normas AA 1000 define melhoria de práticas para
ISO 26000
prestação de contas com a finalidade de assegurar a qualidade
da contabilidade, auditoria e relato social ético de qualquer tipo
A ISO 26000, norma internacional de responsabilidade
de organização. Os padrões de processo da AA 1000 estimulam
social, vem sendo desenvolvida por representantes de diversas
a conceituação dos valores das organizações e as alinha com o
organizações envolventes da sociedade de países desenvolvidos
desenvolvimento de metas de desempenho da organização,
e de países em desenvolvimento – consumidores, empresas,
assim como a avaliação e comunicação das mesmas através do
governos, ONGs, trabalhadores, organismos de normalização
foco no engajamento dos públicos de interesse, ponto-chave da
e entidades de pesquisa. A ISO (International Organization for norma. Nesse âmbito, inserem-se questões sociais e éticas à gestão
Standardization) formou um GT sobre Responsabilidade Social estratégica e operações do negócio.
que une, anualmente, 33 organizações e 54 países para encaminhar O foco no engajamento dos públicos de interesse é de extrema
a nova norma, com prazo para ser publicada até 2010. O GT está importância por implicar na eficácia e objetividade das metas e
sobre a liderança da SIS (Swedish Standards Institute) e da ABNT indicadores determinados e na seleção do sistema de relatório
(Associação Brasileira de Normas Técnicas). Considera-se esse mais adequada. A série de normas AA 1000 traz benefícios para o
processo inovador porque a norma será coordenada por um país desempenho ético, social, ambiental e econômico da organização.
industrializado (Suécia) e um país em desenvolvimento (Brasil). A norma AA 1000 tem caráter certificador por meio da
Composta por diretrizes, a norma não terá propósito de especificação do processo a ser seguido na construção do
certificação assim como não conterá caráter de sistema de gestão, relatório de desempenho, embora não indique níveis desejados de
ao contrário da ISO 14000 e ISO 9000 que, por sua vez, é composta desempenho, similar a
por requisitos. Isso indica que a ISO 26000 será uma norma de ISO 14000. Não há, nesta certificação, a comprovação do
desempenho, ou seja, não terá a estrutura da metodologia PDCA comportamento ético e socialmente responsável da organização,
(Plan-Do-Check-Act), mas terá ênfase em resultados. A norma mas garante que suas ações sejam conforme seus valores e que
está em construção, mas já se sabe que será elaborada com base cumpra as metas definidas a partir do diálogo com stakeholders.
em iniciativas já existentes e que contém uma estrutura definida A norma apresenta os principais tópicos relacionados à
presente no relatório da norma no site da ISO (www.iso.org). responsabilidade social, e os pontos de convergência e divergência
A norma deverá assistir as organizações para abordar o tema com os demais padrões (ISO, SA 8000 e GRI), podendo ser usada
da Responsabilidade Social efetivamente em diferentes culturas, em conjunto ou isolada a essas ferramentas. Em suma, a estrutura
ambientes e sociedades, apresentando guias metodológicos da AA 1000 contém processos e princípios para três pontos:
e operacionais para identificação e engajamento das partes relatórios, prestação de contas e auditoria.

Didatismo e Conhecimento 68
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
SA 8000 - assegurar a conformidade com a legislação e com a política
de RS;
A SA 8000, passível de auditoria e certificação, é uma - apoiar o engajamento efetivo das partes interessadas;
ferramenta normativa que estabelece padrões para as relações de - realizar uma auto-avaliação e autodeclaração da
trabalho. Elaborada em 1997 nos EUA pela atual ONG SAI (Social conformidade com a norma;
Accountability International) por meio de grupos de trabalhos - buscar confirmação de sua conformidade por partes que
envolvendo diversos stakeholders. É a primeira certificação possuam interesse na organização;
internacional de RS. - buscar certificação por uma organização externa.
Reconhecida internacionalmente como um sistema de A norma NBR 16001 apresenta uma listagem de características
implementação, manutenção e verificação das condições adequadas que devem ser agregadas aos objetivos e metas, essas compatíveis
do trabalho, assim como do respeito aos direitos fundamentais dos com a política de RS da organização. O relatório oficial da norma
trabalhadores, a norma é destinada principalmente a empresas que está disponível
tem sua cadeia de produção em países em que há uma necessidade
de assegurar condições de trabalho decentes. Indicadores Ethos de RS
Seu sistema de auditoria é similar à ISO 9000, mas seus
requisitos são baseados nas diretrizes internacionais de direitos O Instituto Ethos, ONG brasileira idealizada em 1998 por
empresários e executivos, desenvolveu os indicadores Ethos como
humanos, principalmente da ONU. Esses requisitos caminham
uma ferramenta de auto diagnóstico para auxiliar as empresas a
dentro dos seguintes temas: trabalho das crianças, trabalho
gerenciarem seus impactos sociais e ambientais.
forçado, higiene e segurança, práticas, discriminação, direito de
Os indicadores são atualizados periodicamente para atender
reunião (sindicatos), tempo de trabalho, remuneração e sistema de novas necessidades do setor privado, o que a torna a principal
gestão. ferramenta de gestão empresarial referente à incorporação da RS
Pode-se implantar a SA 8000 por dois meios: o Certification ao planejamento estratégico e ao monitoramento geral da empresa.
SA 8000 em que a empresa passa por avaliação de auditor Com isso, a sua estrutura viabiliza um planejamento para alcançar
independente de uma organização credenciada e supervisionada um grau mais elevado de responsabilidade social da empresa.
por auditores da SAI; e pelo CIP (Corporate Involvement Program), As diretrizes da ferramenta estabelecem, através de
aplicável a empresas que vendem mercadorias. questionário, metas de aprimoramento dentro dos seguintes
temas: valores, transparência e governança, público interno, meio
NBR 16001 ambiente, fornecedores, consumidores e clientes, comunidade,
e governo e sociedade. As respostas dadas a essas questões são
A norma NBR 16001 foi elaborada pela ABNT (Associação correlacionadas com outras iniciativas (GRI, Pacto Global e Metas
Brasileira de Normas Técnicas), representante oficial da ISO no do Milênio).
Brasil, em 2004. A norma, de âmbito nacional, busca atender todos Visando atender cada setor de atuação, os Indicadores Ethos
os tipos e portes de organizações, adequando-se às divergências Setoriais abrangem certas peculiaridades e dificuldades de cada
geográficas, culturais e sociais brasileiras. Por essa razão, a setor e possibilitam avaliar oportunidades e desafios típicos.
sua aplicação depende de alguns fatores: a política de RS da Portanto, já existem indicadores próprios para o setor financeiro,
organização, a natureza de suas atividades, produtos e serviços, varejo, panificação, restaurantes e bares, entre outros.
de sua localidade e condições em que opera. O seu propósito é de Após preenchimento do questionário e envio ao Instituto
certificação e consiste em um sistema de gestão. Por consistir esse Ethos, a organização tabula as respostas em um processo de
caráter ela não dita critérios específicos de desempenho da RS. pontuação, elabora um Relatório de Diagnóstico de RSE e
Segundo a edição de lançamento da norma (2004), a adoção fornece os dados confidencialmente à empresa. A aplicação dos
e a implementação da mesma não garantem “resultados ótimos”, indicadores é voluntária, não havendo nenhum tipo de prêmio, selo
mas estimula as organizações a considerarem a implementação da ou certificação. O resultado desse processo é a inclusão do processo
em 642 empresas do Brasil e a disseminação dos indicadores para
melhor prática disponível a partir de conceitos, práticas e indicadores
toda a América Latina e também para o Portugal.
propostos por instituições de renome que podem contribuir para o
planejamento do sistema da gestão da responsabilidade social (i.e.
GRI – Global Reporting Iniciative
Indicadores Ethos).
Um dos seus fundamentos é o Tríplice Resultado da A Global Reporting Initiative – GRI é pioneira mundial em
sustentabilidade (econômico, ambiental e social) e sua metodologia estipular diretrizes de comunicação sobre a responsabilidade
segue o modelo PDCA da ISO 14001. Embora esse fundamento social, ambiental e econômica das empresas. Atualmente é o
envolva a dimensão ambiental, a norma não substitui as outras principal padrão mundial para a mensuração, monitoramento e
normas da série ABNT NBR ISO 9000 ou ISO 14000, portanto divulgação dos programas de sustentabilidade das empresas.
são complementares. Através do padrão estabelecido pela GRI, pode-se realizar
A NBR 16001 permite à organização formular e implementar comparações e análises críticas das empresas, além de aumentar a
uma política e objetivos que considerem os requisitos legais qualidade dos relatórios.
apresentando uma atuação ética, preocupada com a promoção A ferramenta foi concebida pela CERES, em 1997, e
da cidadania, do desenvolvimento sustentável e transparência desenvolvida junto com a Tellus Institute, copatrocinada pelo
das suas atividades. A sua aplicação é indicada para as seguintes Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas, mas só foram
situações: publicadas em 2002. A GRI já passou por três versões, sendo a
- Implantar, manter e aprimorar um sistema de gestão de RS; mais atual, a G3, lançada em 2006.

Didatismo e Conhecimento 69
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O estabelecimento deste padrão de relatório econômico, social Itália - 1945; Turquia - 1961; Iugoslávia - 1953; Islândia - 1981)
e ambiental se dá através de um modelo que determina princípios (Brauns e Kramer, 1986). Giarchi e Lankshear (1998) afirmam
e estrutura para o relatório. A vantagem deste dispositivo é que a que a Igreja esteve presente no desenvolvimento do serviço
empresa pode acessar relatórios de outras empresas, permitindo, social, nos países europeus e que teve um relevante papel na
assim, a comparação da atuação da mesma com o mercado. Além história da profissão. São citados países, como: Áustria, Bélgica,
de que, a GRI serve como uma plataforma para facilitar o diálogo Inglaterra, Finlândia, França, Alemanha, Suécia e Noruega em
e o engajamento de stakeholders. que as organizações protestantes foram ativas, na fundação de
As diretrizes da GRI estabelecem 11 princípios de divulgação instituições de ensino de serviço social, sem falar na importância
que tem o objetivo de garantir a credibilidade e comparabilidade, da Igreja Católica, em países como Itália, França (Vèrdes-Leroux,
por exemplo, a exatidão, clareza, pontualidade e relevância. 1982), Portugal e Espanha.
Os indicadores funcionam da seguinte maneira: tem-se 146 Os autores reconhecem que o surgimento do serviço social
indicadores agrupados em categorias com base no Tríplice europeu sofreu também a influência do movimento organizado de
Resultado (ambiental, social e econômico) e dentro de cada trabalhadores, relacionando a questão da industrialização com o
categoria definem-se uma série de “aspectos” avaliados com surgimento da profissão. Casos deste tipo foram encontrados em
base em indicadores específicos. Exemplificando, na categoria países como Bélgica, França, Alemanha, Itália, Espanha, Turquia,
ambiental há o aspecto “energia” que tem indicadores como
Inglaterra e Iugoslávia. Além disso, para Giarchi e Lankshear,
“programas para utilizar fontes renováveis de emergia e para
o surgimento do serviço social esteve também relacionado com
aumentar a eficiência energética”. Difuso a essa categorização
outros “movimentos sociais”, como o de mulheres e o da Igreja. No
há um manual explicando o que deve ser informado para cada
entanto, dentre essas três grandes influências, somente a relação da
indicador. Podem-se encontrar também diretrizes setoriais, que
atendem um setor específico do mercado (financeiro, mineração, profissão com as Igrejas é que se mostrou durável.
operadoras de turismo), e pretende, futuramente, lançar diretrizes Lorenz (1994) é outro autor que reconhece a importância da
nacionais relevantes a situação de cada país. religião no surgimento do serviço social europeu. Para o autor, o
Com a GRI, a empresa pode estabelecer metas, identificar serviço social representa valores, tanto quanto um expertise técnico
as melhorias alcançadas, avaliar se os objetivos foram atingidos e, embora a história da educação em serviço social tenha tentado
e avaliar internamente a relação entre o que é dito e o que é traçar uma forma de intervenção, afirmando sua base científica e de
efetivamente realizado. neutralidade, “as questões valóricas continuam intensas”. É, neste
As empresas podem usar a GRI como roteiro ou manual sentido, que o autor irá discutir a importância de quatro estruturas
informal, ou serem classificadas em três níveis: A/A+, B/B+ e C/ ideológicas que teriam sido, e continuam sendo, relevantes para
C+. Cada nível tem uma série de requisitos para atingi-lo, sendo a profissão, nos países europeus: o Cristianismo, a filantropia, o
avaliados pela própria empresa, ou, para obter o sinal “+”, por um feminismo e o socialismo.
órgão externo. A avaliação externa, feita pela própria GRI ou por Em relação à importância do Cristianismo, afirma Lorenz, que
um órgão oficial, considera apenas a conformidade do relatório o serviço social surgiu no momento de modernização da Europa,
com as diretrizes GRI, não conferindo a conformidade dos pontos exatamente quando a secularização estava se espalhando por
colocados com a realidade da empresa. todos os setores da sociedade e os “consensos religiosos” estavam
No Brasil o modelo já é adotado por 38 organizações, o que sendo cada mais restritos a crenças privadas. Com isso, o papel
é um número baixo quando comparado às mais de mil empresas proeminente das Igrejas (o autor está pensando principalmente
no mundo que se beneficiam desta ferramenta. A tendência é que na Católica) em muitas das formas originais do serviço social,
cresça o uso da GRI, padronizando os relatórios de sustentabilidade foi a principal resposta da Igreja para a secularização. As Igrejas
e facilitando a comparação e análise entre empresas. (Texto entenderam que tinham que reconstituir sua legitimidade, através do
adaptado de AMARAL, J. P e ZANDER, K.). serviço às pessoas e não mais em exibições de poder ou privilégio.
Dessa maneira, acreditava-se que eles poderiam competir com o
movimento socialista, numa ação mais efetiva junto às massas
4 HISTÓRIA E CONSTITUIÇÃO DA prejudicadas do que através da simples pregação. Com isso, a
CATEGORIA PROFISSIONAL. religião tornou-se, na sua expressão interior e subjetiva, uma
matéria de crença pessoal e, na sua expressão exterior e objetiva,
a demonstração de cuidado pessoal (personal caring) para com
outras pessoas.
As Escolas de Serviço Social europeias não datam todas na Na Inglaterra, particularmente, a herança cultural que
mesma época. Surgem no século XIX, sendo a da Inglaterra (1886) redundou no serviço social - as igrejas tradicionais da Idade Média,
a mais antiga, seguida depois pela da Alemanha (1899). Do início os recentes serviços estatais providos em âmbito comunitário
do século XX até os anos vinte, foram registrados outros sete casos (parish) sob a Lei dos Pobres (Poor Law), o desenvolvimento
de surgimento de cursos de serviço social: França (1907), Suíça das profissões antigas, como direito, medicina e educação e as
(1908), Suécia (1910), Áustria (1912), Finlândia (1918), Noruega sociedades de caridade do século dezenove -, associado com o
(1920) e Bélgica (1920). Após os anos vinte, os países europeus protagonismo feminino na profissão fizeram com que “a noção de
vão incorporando cursos de serviço social em seus complexos importância das relações pessoais, para o processo de reabilitação
universitários, até os anos oitenta (Espanha - 1932; Israel - 1934; social [seja] ainda uma de suas características essenciais” (Jordan,
Irlanda - 1934; Portugal - 1935; Dinamarca -1937; Grécia - 1945; 1984: 32; grifo adicionado).

Didatismo e Conhecimento 70
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O que esta “relação pessoal” desenvolvida por dentro de A Ação Católica, protagonizada por uma intelectualidade
um Estado que continuamente se burocratizava e, portanto, laica e estritamente ligada à hierarquia católica, propugna, com
tornava-se impessoalizado significava era uma ideia de “perfeita uma visão messiânica, a recristianização da sociedade, através
amizade” (perfect friendship), oriunda do ideário caritativo que de um projeto de reforma social. Estes núcleos leigos, orientados
envolvia “enormes sacrifícios de tempo e energia emocional, por uma retórica política de cunho humanista e antiliberal, com
dando a estas pessoas uma mistura de amor cristão e conselhos forte viés romântico (Iamamoto, 1992), lançam-se a uma vigorosa
práticos” (idem). Esta concepção derivava diretamente do ideário ação, pretendendo penetrar em todas as áreas e instituições sociais,
vitoriano de tratamento moral dos pobres. Por isso, os primeiros ao criar mecanismos de intervenção em amplos segmentos da
assistentes sociais eram vistos como meio santos, pois além de sociedade. Além da Ação Católica, as Encíclicas Papais, Rerum
aconselhamentos práticos para a vida, representavam também Novarum (1891) e Quadrigesimo Anno (1931) tiveram um
forte impacto na ação católica exercida na América Latina e,
“a esperança do perdão de Deus e da regeneração das almas”.
especificamente, garantindo um fundamento religioso para a ação
A definição dada para a “perfeita amizade”, baseada na tradição
profissional, já que focavam para uma alternativa cristã, tanto ao
puritana de aconselhamento religioso, depois, seria identificada socialismo, quanto ao capitalismo.
como “relação de ajuda”. A primeira Escola de Serviço Social latino-americana foi
A religião também se fez presente, de forma relevante, no fundada no Chile, em 1925, por Alejandro Del Rio tendo, como
serviço social norte-americano. principal influência, a experiência católica belga. Em 1929, sob
Nesse país, a profissão surgiu vinculada aos trabalhos a influência da União Católica Internacional de Serviço Social
organizados pelas Charity Organizations Societies (COSs), (UCISS), fundada em 1925, na Itália, forma-se a primeira Escola
tendo Mary Richmond como principal liderança. Foi através Católica de Serviço Social (Escola Elvira Matte de Cruchaga).
do treinamento de “charity workers” (que numa tradução mais Comenta Castro, que a Igreja Católica não esteve ausente do
livre pode ser identificado como “trabalhadores voluntários”, processo constitutivo do serviço social, já que sua marca estava
embora a tradução literal seja “trabalhadores da caridade”) gravada ali, desde os tempos remotos, uma vez que a Igreja foi a
que a atividade caritativa passa a ter o status de profissão e prover principal promotora das obras de caridade e difusora permanente
oportunidades para reflexões e pesquisas acadêmicas, de que do seu pensamento e doutrina, que “fecundaram as proformas do
resultaram a formulação de ideias e princípios teóricos. serviço social”.
A experiência em trabalhos caritativos era um requisito, para os Também, segundo as informações de Castro, no Peru,
alunos que ingressaram na primeira escola em filantropia, realizada Argentina, Colômbia, Venezuela, Cuba e Brasil a influência
pela Charity Organization Society de Nova Iorque, em 1898. Esta católica desempenhou um relevante papel, na criação das Escolas
de Serviço Social, tendo todas, como influência decisiva, a ação
experiência resultou na formação do Instituto de Ciências Sociais,
da UCISS, através de seu escritório, estabelecido no Chile,
organizado pelas instituições de caridade. Em outras cidades dos
exatamente na Escola Elvira Matte de Cru chaga.
Estados Unidos as COSs seguiram esta iniciativa, transformando- Castro chama a atenção para o ideário difundido pela Escola
se em Escolas de Serviço Social e sendo incorporadas a complexos de Serviço Social chilena. Mais do que profissão, o serviço social
universitários. de cunho católico era tido como uma vocação, o que significava a
O Settlement Houses representa outro tipo de organização, adoção de uma entrega incondicional e de um espírito de sacrifício
que serve de base para o surgimento do serviço social nos Estados no cuidado, tanto do corpo, quanto da alma. Era um tipo de prática,
Unidos. Estas instituições, sob a liderança de Jane Addams, que já tentava instrumentalizar os valores e virtudes cristãs com
originaram-se do trabalho voluntário, realizado principalmente por elementos técnicos e “científicos”, visando obter um desempenho
universitários, engajados em trabalhos comunitários, na periferia mais eficaz na prática assistencial.
das grandes cidades. O movimento era implementado em casas Outro traço importante, na criação das Escolas de Serviço
alugadas, que funcionavam como centros comunitários. Social, na América Latina, mais especificamente no Chile, é
Segundo Bastos (1988), ao se realizar uma apropriada leitura o fato, ressaltado também por Castro, de que outros cursos
do que foram estas duas experiências, pode-se perceber que os formados sob o auspício do Estado (como a Escola de Del Rio)
temas comuns a ambos os movimentos, embora expressos de “nem por isso a iniciativa esteve isenta da poderosa inspiração
forma diferente, vinculam-se a três ideias e crenças importantes, religiosa de organizadores, docentes e alunos”. Este comentário
na cultura norte-americana: a ética protestante, o liberalismo e o abre ainda a possibilidade de importantes derivações como, por
exemplo, não se atribuir de forma imediata uma conotação laica
positivismo. Segundo a autora, a contribuição da ética protestante
ou secular aos cursos de serviço social, exclusivamente por eles
“e do calvinismo” foi a da ideia de que o homem deve criar
estarem localizados em órgãos estatais. Assim também que,
riqueza e ser autossuficiente; desta feita, o objeto de assistência independentemente de onde o curso esteja situado, é a “inspiração
seriam aqueles que, comprovadamente, não se mostrassem aptos religiosa” dos organizadores, docentes e alunos, que a ele atribui
ao trabalho. o caráter religioso.
Na América Latina, é a partir da ação da Igreja Católica que Assim é, que os critérios de admissão da Escola Elvira Matte
se verifica a emersão do serviço social. Um dos poucos estudos, se de Cruchaga, depois seguidos no Uruguai, Argentina, Colômbia,
não o único, que mostra como este processo ocorreu é o de Castro Peru, Venezuela e Cuba previam, não só critérios etários, como
(1987). O autor tem, como fundamento da sua argumentação, a atestado de boa saúde, mas também antecedentes probatórios
premissa de que o surgimento do serviço social Latino Americano de honorabilidade e recomendação paroquial, atentando que o
só pode ser explicado “no interior do desenvolvimento das relações candidato tivesse uma sólida educação religiosa. “A seleção era
de produção capitalista, embasadas nas condições particulares de sumamente rigorosa, quase como se se tratasse do ingresso numa
cada país latino-americano”. entidade religiosa”.

Didatismo e Conhecimento 71
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Ainda tratando de países latino-americanos, Midgley lembra identidade profissional, que esteja acima dos requerimentos
que as Escolas de Serviço Social foram criadas, nesta região, no nacionais? Estas respostas não podem ser aqui fornecidas,
período anterior aos anos cinquenta. O Uruguai, por exemplo, teve mas elas indicam o tamanho do problema, quando se pensa em
seu primeiro curso em 1937, “por uma orientação religiosa”. Já a “qualificação profissional”.
Escola de Costa Rica, criada em 1942, teve sua fundação realizada Em todos estes países, há uma constante tensão entre o
por um grupo de voluntários. status acadêmico e as demandas práticas diárias. Para Brauns
Estas experiências mostram que a formação dos assistentes e Kramer (1986), esta tensão deriva da difícil coexistência de
sociais, através de escolas religiosas, contribuiu para a formação uma base disciplinar / “científica” eclética de um lado e um
de um etos profissional, em que a ideia de ajuda ao ser humano treinamento vocacional de outro. Até os anos oitenta, nenhum
e os valores religiosos e afetivos eram parte integrante do agir dos países europeus tinha encontrado uma solução inteiramente
assistencial profissionalizado. De fato, não era “qualquer um” que satisfatória para isto, embora todos tenham tentado dar-lhe algum
podia ingressar nesta carreira. O candidato precisava ter atributos encaminhamento.
próprios, que o qualificassem, enquanto tal. Estes qualificativos Os trabalhos de Kornbeck (1998) e Giarchi e Lankshear
estarão relacionados, em grande medida, com a questão do (1998) discutem o processo de profissionalização do serviço social
expertise profissional e das fronteiras entre trabalho voluntário e na Europa. Um dos grandes problemas, apontado pelos autores é
profissional. a ausência de um consenso sobre a natureza, ou o que é o serviço
social. Além disso, para os autores, é difícil estabelecer que
Voluntariado teorias e habilidades são centrais para a profissão. Após analisar o
desenvolvimento das atividades de assistência em todos os países
Os problemas da fronteira pouco definida entre o trabalho europeus, com suas peculiaridades internas, os autores afirmam
voluntário e profissional e a questão do expertise são assuntos que “é claro que há uma considerável evidência das dificuldades
que têm dinâmicas diversas, assim como obedecem a trajetórias de se identificar o que é o serviço social como profissão ou como
próprias, como foi visto anteriormente neste próprio capítulo. uma ocupação”.
No entanto, a literatura analisada apresenta estas duas questões O que leva os autores a esta conclusão é o fato da assistência
de forma muito articulada. A análise, a seguir, distingue os dois social profissionalizada não ter conseguido se estabelecer e
grupos de problemas, apenas quando eles já aparecem em separado consolidar, em muitos dos países analisados. Alguns dos exemplos,
na bibliografia consultada. dados pelos autores são: na Inglaterra, um terço dos assistentes
O problema de se estabelecer um expertise profissional começa sociais não são qualificados; na Finlândia, as profissões de cuidado
primeiro, por uma dificuldade semântica: não existe como mostra social (care profession) têm sido realizadas, crescentemente,
Brauns e Kramer (1986), em todas as experiências europeias, por setores privados e voluntários, em detrimento do Estado;
uma definição única para o significado de “serviço social”. Além também na Suíça, o cuidado social (social care) é muito mais
disso, em cada país a profissão “serviço social” engloba um âmbito responsabilidade do setor privado não-lucrativo e das Igrejas do
próprio de atividades. que do Estado; um último exemplo é o caso de Luxemburgo, em
Enquanto na Irlanda e Inglaterra “social Works” não inclui que o cuidado social segue uma tradição que vem da idade média
trabalhos comunitários e com jovens, na Alemanha estas atividades e é baseada sobre valores religiosos. Percebe-se o quanto o
caracterizam proeminentemente o que se entende por “social problema do expertise está relacionado com as fronteiras pouco
pedagogy” (pedagogia social). definidas entre o trabalho profissional e o voluntário.
Para, além disso, a prática de serviço social profissional, na Brauns e Kramer (1986) afirmam existir um amplo ceticismo
Europa, compreende pessoas que são treinadas, em diferentes público em relação às atividades profissionais, nos últimos anos
instituições e com programas educacionais variados. Na Alemanha (anos oitenta), em muitos dos países desenvolvidos. Em grande
e na França, por exemplo, existem instituições de ensino médio, parte, atribui-se este ceticismo exclusivamente à crise financeira
que formam assistentes sociais, não deixando que se perceba do Welfare State. Os autores afirmam, ainda, que este ceticismo é
se estes profissionais constituem, de fato, um grupo a parte ou derivado, também, de uma crise de identidade do próprio serviço
se podem ser incluídos em grupos de profissionais com nível social. A competição entre os trabalhos voluntários e as iniciativas
superior de formação. Na Inglaterra, até o ano de 2003, inclusive, de autoajuda, de um lado, e as outras profissões, de outro, tem
era possível se formar, realizando um curso de dois anos, para forçado os profissionais de serviço social a justificarem seus custos.
tornar-se qualificado em serviço social; ou três anos, recebendo Marshall mostra que, na Inglaterra, a partir do período entre
o diploma de serviço social. Ambos, no entanto, são considerados guerras, mas também no período posterior, houve uma aproximação
como assistentes sociais, embora as diferentes qualificações. entre as práticas assistenciais desenvolvidas pelas entidades
Com qualificações e estruturas curriculares diversas, além de filantrópicas e voluntárias e o Estado, além de uma disseminação,
o serviço social europeu envolver, em cada um dos países, âmbitos em ambas as instituições, das ideias veiculadas pelos pioneiros da
de atuação distintos, o problema semântico acaba derivando profissão (vinculadas à religião). No período do pós-2a. Guerra,
na dificuldade de definição de como se compõe o expertise a colaboração entre as instituições continua, embora com o maior
profissional: mais treinamento e técnica ou mais teoria e erudição? predomínio das ações do Estado, com o estabelecimento do Estado
O que exatamente significa, para o desempenho profissional, a de Bem-Estar Social inglês. O importante a ressaltar é que houve
diferença entre aqueles que se formaram em cursos que só tinham uma confluência de propósitos e, mesmo, de formação, entre as
dois anos e os que se formaram em cursos de três anos (ou mesmo ações voluntárias e filantrópicas e a ação profissional. Exatamente
em quatro, como ocorre no Brasil)? E, ainda, se os campos de a existência destas “fronteiras borradas” vai levar o autor a
atuação não são os mesmos, o que exatamente pode criar uma questionar se a assistência social é, de fato, uma profissão. E, sobre

Didatismo e Conhecimento 72
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
isto, afirma que, para a prática da assistência social, “não há nenhum Indefinições com o mesmo sentido, embora com uma
ponto claramente definido, ou nível, no qual o treinamento conduza formatação distinta, ocorreram na experiência japonesa. Ito (1995)
a uma habilitação profissional reconhecida universalmente” e que mostra a rejeição à incorporação dos conhecimentos provenientes
os assistentes sociais, deixaram de ser “mentores morais”, como da influência norte-americana e inglesa do serviço social daquele
na era vitoriana, para serem “conselheiros psicológicos”, sem país.
estarem, para isto, devidamente preparados. O risco, então, de que Embora não houvesse problemas com a definição do expertise
a ação profissional derivasse, para um julgamento moral e de que, profissional nesse país, apenas a tentativa dos acadêmicos
neste, estivessem presentes elementos típicos do senso comum, de incorporar elementos do budismo no ensino e na prática
não parece ser pequena. profissional, adequando-os aos padrões culturais nacionais, mostra
o quão frouxo e inconsistente era o conjunto de saberes importados.
Até os anos sessenta, segundo o mesmo autor, a assistência
Além disso, nas agências de governo, estudantes aprendem a
social ainda podia ser “desempenhada por ajudantes familiares
prática profissional sob a supervisão de pessoas sem qualificação,
especialmente treinados, por conselheiros familiares, por colocando em suspeição o que se define como próprio do âmbito
orientadores familiares, por assistentes sociais ou por profissional. Segundo Ito (1995), haveria uma estreita relação
administradores residenciais”, caracterizando “a imaturidade da entre a inovação no campo do conhecimento do serviço social
administração social nesse setor específico”. Mesmo assim, o japonês com a atuação dos serviços voluntários. Afirma o autor
prestígio e status social da assistência social continuaram altos e que “quarenta anos de experiências depois da guerra mostram
em ascensão. que a ausência de movimentos voluntários significa a ausência de
Como foi dito, embora as práticas assistenciais sejam serviços inovadores.
anteriores à formação da primeira Escola de Serviço Social, é de Onde o serviço não é inovador, nenhuma nova teoria de
se notar que está se institucionaliza, quando ganha força a lógica serviço social pode surgir”. Além disso, o governo japonês ainda
de que os serviços voluntários representam um conceito ativo de depende do setor voluntário, para a provisão dos serviços sociais.
cidadania. Pelo que afirma Lowe (1999), as iniciativas privadas Também na Rússia pós-comunista os mesmos problemas
desempenharam um importante papel na provisão dos serviços se fizeram presentes. O serviço social surge, em 1991, sendo
considerado importante, no contexto de transição da Rússia,
sociais. Elas são, junto com as agências locais (estatais) de
quando muitas pessoas tornaram-se socialmente excluídas. O
assistência, os principais empregadores dos assistentes sociais. Sua objetivo do serviço social neste país era prover suporte social,
importância está em identificar as reais necessidades da população domiciliar, médico, psicopedagógico, serviços jurídicos e ajuda
e elas “eram também capazes de desenvolver novos métodos e material, promovendo “reabilitação e adaptação social dos
técnicas de cuidado porque, diferente de suas contrapartes oficiais, cidadãos em situação difícil de vida”.
eles não tinham que assegurar sempre equidade ou considerar A profissão também não contava com um grande prestígio
possíveis objeções políticas”. No entanto, estavam baseadas em social ou com bons salários.
uma antiga tradição filantrópica que, por vezes, era indevidamente Desta forma, menos de 30% dos assistentes sociais
moralista ou ineficiente (ou ambas). diplomados seguiram a carreira. Como no Japão, o crescimento
Questões e problemas semelhantes ocorreram na implantação da profissão ocorreu através da qualificação dos trabalhadores,
do serviço social na América Latina e África. Ao tratar do serviço que já atuavam na área, mas ainda sem diploma. Assim também,
social nestas localidades (generalizado pelo autor como 3o. a partir dos anos noventa, a participação do setor voluntário e
Mundo), Midgley (1981) afirma que até os anos sessenta não havia das Igrejas, associada às atividades promovidas pelo Estado,
foram os principais responsáveis pelo desempenho das atividades
um acordo sobre o que propriamente qualificava um curso, como
assistenciais naquele país.
profissional ou não profissional. O trabalho de Iarskaia e Romanov (2002) se reporta ao
Diferenças na extensão dos cursos, diferenças culturais de resultado de entrevistas realizadas com 19 mulheres e um homem,
cada país, incidindo sobre os currículos e campos de atuação entre 24 e 51 anos, que trabalhavam no serviço social russo, em
também variados, favoreciam uma difícil formação da identidade 1998, e suas experiências de trabalho. Quando perguntados sobre
profissional. Assim, a padronização da qualificação e dos títulos o papel do conhecimento (teórico-técnico) no serviço social, os
profissionais torna-se uma importante tarefa para as associações informantes mencionaram vários tipos de saberes, como relevantes,
profissionais latino-americanas, segundo o autor. sem mencionar nenhuma habilidade específica da profissão.
No México, por exemplo, somente nove de trinta e sete O método de trabalho dos profissionais derivava da própria
cursos de serviço social têm status acadêmico e os restantes são prática e eles não viam a necessidade de ter nenhum conhecimento
considerados como vocacionais e centros de treinamento pré- sistematizado. Um dos entrevistados afirmou que: “conhecimento
profissional. Problemas similares foram detectados em diversos de vida ajuda muito... precisa de gentileza, simpatia para as
países. Nos países africanos francofônicos, o serviço social era pessoas. Conhecimento não tem nada a ver com isso”. Na relação
com clientes, eles afirmam ter um forte senso de dívida moral para
provido originalmente por Escolas de Enfermagem. Na Escola
com eles, um forte sentimento de empatia e ainda que os próprios
de Enfermagem de Mali, fundada em 1961, por exemplo, os
assistentes sociais tomavam para si o sofrimento de seus clientes.
estudantes podiam escolher entre formar-se como Aides Sociales Desta forma, afirmam os autores que, antes de serem experts
(Socorro Social) ou Assistantes Sociales (Assistentes Sociais), ou técnicos, os assistentes sociais russos mantém o foco de
compartilhando um primeiro ano de treinamento básico, em suas atividades na caridade, patrocinada por valores ortodoxos
assuntos de saúde e enfermagem prática, com estudantes de religiosos, do período anterior à Revolução de 1917. O exemplo
enfermagem para, em um segundo ano, receberem aulas de bem- dado para ilustrar tal afirmação é retirado de uma das entrevistas,
estar social (social welfare). em que o assistente social afirmou:

Didatismo e Conhecimento 73
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
“É um prazer conversar com eles... Eu mesmo aprendo com Posteriormente, o Serviço Social ultrapassa a ideia do homem
eles. É interessante visitar estas famílias, falar com elas... Eu sou como objeto profissional. Passa-se à compreensão de que a
uma pessoa muito doente também e vejo como os outros lidam situação deste homem – analfabeto, pobre, desempregado, etc. – é
com uma situação similar” (idem). fruto, não só de uma incapacidade individual, mas também, de um
Em uma profissão quase inteiramente feminina (98,5%), o conjunto de situações que merecem a intervenção profissional.
profissionalismo do serviço social russo tem se dado através do Para IAMAMOTO(2003), o objeto do Serviço Social, no
desenvolvimento da empatia, como uma habilidade necessária Brasil, tem, historicamente, sido delimitado em virtude das
ao trabalho com pessoas, para que se entenda como é possível conjunturas políticas e socioeconômicas do país, sempre se tendo
ajudá-las, e não prejudicá-las. Baseado, então, no princípio da em vista as perspectivas teóricas e ideológicas orientadoras da
ajuda social, para estas mulheres, nem o salário, nem o prestígio intervenção profissional.
da profissão são o mais importante, mas a auto realização que é Para a Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social, o
possível obterem com estas atividades. Além disso, o trabalho
Assistente Social convive cotidianamente com as mais amplas
flexível dos assistentes sociais permite que estas mulheres possam
expressões da questão social, matéria prima de seu trabalho.
também cuidar de seus próprios filhos e parentes.
Confronta-se com as manifestações mais dramáticas dos processos
O Serviço Social parece, assim, possuir características bastante
semelhantes nos diversos países em que ele foi estabelecido. da questão social no nível dos indivíduos sociais, seja em sua vida
Dada a importância difusora do Serviço Social americano individual ou coletiva.
na consolidação de cursos em toda a América Latina, África e Não contraditória a esta concepção, temos IAMAMOTO:
Ásia, a análise de Canda e Furman (1999), embora não possa ser “Os assistentes sociais trabalham com a questão social nas suas
generalizável, em termos temporais para as demais experiências mais variadas expressões quotidianas, tais como os indivíduos
mundiais, pois baseia-se na experiência americana, ela serve as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional,
de referência para uma questão importante: mesmo no período na saúde, na assistência social pública, etc. Questão social que
considerado como o de “secularização” do Serviço Social sendo desigualdade é também rebeldia, por envolver sujeitos que
americano, entre os anos 1920 e 1970, ideologias religiosas vivenciam as desigualdades e a ela resistem, se opõem. É nesta
tácitas continuavam presentes nos serviços sociais do Estado. tensão entre produção da desigualdade e produção da rebeldia e
Como foi dito, se a análise temporal não pode ser generalizável, da resistência, que trabalham os assistentes sociais, situados nesse
é possível, no entanto, verificar que, em geral, após um período de terreno movido por interesses sociais distintos, aos quais não é
identificação mais clara entre a gênese da profissão e seus impulsos possível abstrair ou deles fugir porque tecem a vida em sociedade.
religiosos, há a constituição de um período de “secularização” da [...] apreender a questão social é também captar cujas múltiplas de
mesma. No entanto, se na segunda fase ainda existem elementos pressão social, de invenção e de reinvenção da vida.”
ideológicos atuando tacitamente na profissão, isso não ocorre por
Segundo FALEIROS, (1997): “... a expressão questão social
falta de uma secularização do conhecimento profissional mas, pelo
é tomada de forma muito genérica, embora seja usada para definir
conjunto de elementos analisados neste texto.
uma particularidade profissional. Se for entendida como sendo
Somado a isto, está o fato de que, só é possível admitir
a existência de elementos ideológicos tácitos na profissão, se as contradições do processo de acumulação capitalista, seria, por
os próprios profissionais perceberem nexos de sentido entre o sua vez, contraditório colocá-la como objeto particular de uma
seu fazer profissional e suas convicções religiosas. Estes nexos profissão determinada, já que se refere a relações impossíveis
derivam, em parte, da fundamentação teológica / doutrinária que de serem tratadas profissionalmente, através de estratégias
cada vertente religiosa confere para essas atividades; em parte, institucionais/relacionais próprias do próprio desenvolvimento
são uma expressão da própria identidade prática existente entre das práticas do Serviço Social. Se forem as manifestações dessas
os trabalhos assistenciais profissionais e voluntários. A relação contradições o objeto profissional, é preciso também qualificá-las
entre Estado e sociedade, no provimento dos serviços sociais, para não colocar em pauta toda a heterogeneidade de situações
assim como a alternância em alguns países entre “profissionais” que, segundo Netto, caracteriza, justamente, o Serviço Social”.
e “voluntários” para a execução dos mesmos serviços, atestou a Acreditamos que a proposta de Faleiros torne mais clara
fragilidade do Serviço Social, como uma profissão e evidenciou a nossa interpretação acerca da questão social. Pois qualificar
que aqueles serviços estavam conectados com uma ideologia a questão social significa apreender o que compete ao Serviço
religiosa ou cívica. Social no âmbito da questão social. Se falarmos, por exemplo, nas
Em cada um dos países citados, além de outros tantos, expressões sociais da questão social, estaremos, minimamente,
reconhece-se que, em alguma medida, a religião continua, não definindo um espaço de atuação profissional.
apenas presente na prática profissional, mas que o aprofundamento
Segundo IAMAMOTO(2003), as expressões sociais
do debate sobre a temática pode acarretar uma melhor intervenção
necessitam de uma reflexão contemporânea sobre o trabalho
do assistente social. Isto, no entanto, é matéria para outros artigos.
profissional, reflexão esta que permita identificar as expressões
(Texto adaptado de Prof. Dr. SIMÕES, P.).
particulares da questão social, assim como os processos sociais
A questão social e o Serviço Social que as reproduzem.
Ao fazermos reflexões sobre as literaturas aqui apresentadas,
Inicialmente o Serviço Social creditava aos homens a “culpa” conseguimos entender o significado da questão social e suas
pelas situações que vivenciavam, e acreditando que uma prática expressões e compreendemos a forma como se deu, historicamente,
doutrinária, fundamentada nos princípios cristãos, era a chave para o processo de institucionalização do Serviço Social no Brasil que,
a “recuperação da sociedade” (FALLEIROS, 1997) aqui, está profundamente arraigado na questão social.

Didatismo e Conhecimento 74
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A institucionalização do Serviço Social no Brasil de Araxá (1967) e no Documento de Teresópolis (1970). Melhor
dizendo, preocupação com o processo de desenvolvimento e a
A questão social foi enfrentada inicialmente pela sociedade ratificação do modelo econômico implantada no pós-64, acabam
brasileira através da Igreja Católica e dos setores mais abastados influenciando numa linha mais tecnicista, na preocupação com as
da burguesia, repassando ideologicamente para os leigos, técnicas, com o planejamento, com o instrumental da profissão.
principalmente para a parcela feminina, a ideologia dos serviços O Serviço Social brasileiro sofre um processo de consolidação
assistenciais, como missão, tendo estes um cariz de benevolência acadêmica: cresce o mercado editorial, cresce a pós-graduação,
social. Com o agravamento da questão social, a classe trabalhadora o mestrado, o doutorado; movimento esse, acadêmico, que não
insatisfeita com os serviços prestados pela Igreja, reivindicava, foi acompanhado pelos países de língua espanhola no mesmo
através de movimentos sociais, políticas que respondessem aos ápice de tempo. O desdobramento disso é o seguinte: o Serviço
problemas de forma mais ampla, sendo, portanto, necessária à Social brasileiro se consolida. Passa a ter, depois dos anos 80,
intervenção estatal no intuito de conter tais movimentos. com a abertura democrática, uma produção muito mais madura
A partir da década de 30, o Estado, enquanto representante dos academicamente e politicamente do que nos outros países. Tem-se
interesses da classe burguesa, interferiu na questão social através de todo o processo de renovação do Serviço Social brasileiro e uma
seus aparelhos coercitivos, a questão social como caso de polícia. preocupação muito interessante numa linha de reconhecimento
A burguesia e o Estado ao perceberem que tais mecanismos eram de fazer a diferença entre a militância e a profissão, que são
insuficientes, passaram a enfrentá-la pela ideologia, através da
dimensões correlatas, mas são dimensões distintas, e o Serviço
criação e fundamentação de leis, serviços e políticas sociais.
Social brasileiro chega aos anos 90/2000 com o papel de efetiva
O Estado necessitava de profissionais tecnicamente qualificados
liderança no Serviço Social latino-americano. O movimento, que
para a execução e organização dos Serviços Sociais, capazes de
organizar, coordenar e distribuir esses serviços à população. A num primeiro momento da Reconceituação, encontrou nos países
atuação desses profissionais foi um mecanismo de repasse da de língua espanhola um tom crítico do Serviço Social latino-
ideologia burguesa. Dessa forma ocorre a institucionalização da americano, tem nos anos 80/90 o seu papel invertido, onde o Brasil
profissão, inscrita na divisão sócio técnica do trabalho, sob forte passa a dar o tom mais acadêmico-crítico da leitura do Serviço
influência do Serviço Social americano e europeu. Social latino-americano. (IAMAMOTO, 2001)
Com a instalação do governo ditatorial, a partir de 64, o Acreditamos que, muito do que foi discutido nos congressos
Serviço Social passou a implementar e legitimar as políticas que geraram esses importantes documentos que reconceituaram
sociais implantadas nesse período. A política desenvolvimentista, a categoria, contribuiu para os avanços no campo de atuação
estrategicamente adotada pelo governo ditatorial, tinha por profissional e da forma de fazer a profissão, porém ainda há muito
objetivo levar o desenvolvimento através de uma série de medidas que se avançar, se questionar. Não há teoria que responda todos
políticas, sociais e econômicas que permitissem o desenvolvimento os problemas. Ater-se a uma única matriz teórica não permite um
econômico dessas populações, os profissionais do Serviço Social avanço, é necessário buscar a pluralidade teórica que dê conta
eram os agentes responsáveis por levar o desenvolvimento. Mas dos vários problemas sociais da sociedade contemporânea. (Texto
o referencial teórico dos profissionais não permitia uma leitura adaptado de SILVA, E. da).
das problemáticas da época, passando a buscar instrumentos para
intervir nessa realidade. A categoria passou a questionar a sua
atuação, esses questionamentos foram registrados nos documentos
de Araxá, Teresópolis, Sumaré, Boa Vista e Belo Horizontes, que 5 LEIS E CÓDIGOS RELACIONADOS
foram formulados a partir dos congressos realizados pela categoria AO TRABALHO PROFISSIONAL DO
na década de 70 e 80, período da efervescência política pela qual ASSISTENTE SOCIAL.
o Brasil passava:
“Na década de 70, com a mobilização popular contra a
ditadura militar, o Serviço Social revê seu objeto, e o define
como a transformação social. Apesar do objeto equivocado, afinal
LEI No 8.662, DE 7 DE JUNHO DE 1993
a transformação social não se constitui em tarefa de nenhum

profissional – é uma função de partidos políticos; o que este objeto,
Dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras
efetivamente, representou foi a busca, por assistentes sociais, de
um vínculo orgânico com as classes subalternizadas e exploradas providências
pelo capital. E é esta postura política que tem marcado os debates
do Serviço Social até os dias atuais. (IAMAMOTO, 2003)” O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o
O Movimento de Reconceituação, num primeiro momento Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
optou por numa linha claramente desenvolvimentista e
posteriormente crescendo a influência de uma tendência mais Art. 1º É livre o exercício da profissão de Assistente Social em
crítica - da teoria social crítica. Em 1964, o Brasil rapidamente todo o território nacional, observadas as condições estabelecidas
entra na ditadura militar e, consequentemente, o rumo do Serviço nesta lei.
Social neste período em nosso país irá se diferenciar muito do rumo Art. 2º Somente poderão exercer a profissão de Assistente
do Serviço Social latino-americano. A linguagem era diferente, as Social:
temáticas eram diferentes. O Movimento de Reconceituação foi de I - Os possuidores de diploma em curso de graduação
fato uma unidade de diferenças, em função das particularidades dos em Serviço Social, oficialmente reconhecido, expedido por
contextos nacionais. O Serviço Social brasileiro caminhou numa estabelecimento de ensino superior existente no País, devidamente
linha mais tecnocrática, que podemos observar no Documento registrado no órgão competente;

Didatismo e Conhecimento 75
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
II - os possuidores de diploma de curso superior em Serviço VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de estagiários
Social, em nível de graduação ou equivalente, expedido por de Serviço Social;
estabelecimento de ensino sediado em países estrangeiros, VII - dirigir e coordenar Unidades de Ensino e Cursos de
conveniado ou não com o governo brasileiro, desde que devidamente Serviço Social, de graduação e pós-graduação;
revalidado e registrado em órgão competente no Brasil; VIII - dirigir e coordenar associações, núcleos, centros de
III - os agentes sociais, qualquer que seja sua denominação estudo e de pesquisa em Serviço Social;
com funções nos vários órgãos públicos, segundo o disposto no IX - elaborar provas, presidir e compor bancas de exames e
art. 14 e seu parágrafo único da Lei nº 1.889, de 13 de junho de comissões julgadoras de concursos ou outras formas de seleção
1953. para Assistentes Sociais, ou onde sejam aferidos conhecimentos
Parágrafo único. O exercício da profissão de Assistente Social inerentes ao Serviço Social;
requer prévio registro nos Conselhos Regionais que tenham X - coordenar seminários, encontros, congressos e eventos
jurisdição sobre a área de atuação do interessado nos termos desta assemelhados sobre assuntos de Serviço Social;
lei. XI - fiscalizar o exercício profissional através dos Conselhos
Art. 3º A designação profissional de Assistente Social é Federal e Regionais;
privativa dos habilitados na forma da legislação vigente. XII - dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades
Art. 4º Constituem competências do Assistente Social: públicas ou privadas;
I - elaborar, implementar, executar e avaliar políticas sociais XIII - ocupar cargos e funções de direção e fiscalização
junto a órgãos da administração pública, direta ou indireta, da gestão financeira em órgãos e entidades representativas da
empresas, entidades e organizações populares; categoria profissional.
II - elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas Art. 5o-A. A duração do trabalho do Assistente Social é de
e projetos que sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com 30 (trinta) horas semanais. (Incluído pela Lei nº 12.317, de 2010).
participação da sociedade civil; Art. 6º São alteradas as denominações do atual Conselho
III - encaminhar providências, e prestar orientação social a Federal de Assistentes Sociais (CFAS) e dos Conselhos Regionais
indivíduos, grupos e à população; de Assistentes Sociais (CRAS), para, respectivamente, Conselho
IV - (Vetado); Federal de Serviço Social (CFESS) e Conselhos Regionais de
V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos Serviço Social (CRESS).
sociais no sentido de identificar recursos e de fazer uso dos mesmos Art. 7º O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e os
no atendimento e na defesa de seus direitos; Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS) constituem, em
VI - planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços seu conjunto, uma entidade com personalidade jurídica e forma
Sociais; federativa, com o objetivo básico de disciplinar e defender o
VII - planejar, executar e avaliar pesquisas que possam exercício da profissão de Assistente Social em todo o território
contribuir para a análise da realidade social e para subsidiar ações nacional.
profissionais; 1º Os Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS) são
VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da administração dotados de autonomia administrativa e financeira, sem prejuízo de
pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, sua vinculação ao Conselho Federal, nos termos da legislação em
com relação às matérias relacionadas no inciso II deste artigo; vigor.
IX - prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em 2º Cabe ao Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e aos
matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS), representar, em
dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade; juízo e fora dele, os interesses gerais e individuais dos Assistentes
X - planejamento, organização e administração de Serviços Sociais, no cumprimento desta lei.
Sociais e de Unidade de Serviço Social; Art. 8º Compete ao Conselho Federal de Serviço Social
XI - realizar estudos socioeconômicos com os usuários para (CFESS), na qualidade de órgão normativo de grau superior, o
fins de benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração exercício das seguintes atribuições:
pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades. I - orientar, disciplinar, normatizar, fiscalizar e defender o
Art. 5º Constituem atribuições privativas do Assistente Social: exercício da profissão de Assistente Social, em conjunto com o
I - coordenar, elaborar, executar, supervisionar e avaliar CRESS;
estudos, pesquisas, planos, programas e projetos na área de Serviço II - assessorar os CRESS sempre que se fizer necessário;
Social; III - aprovar os Regimentos Internos dos CRESS no fórum
II - planejar, organizar e administrar programas e projetos em máximo de deliberação do conjunto CFESS/CRESS;
Unidade de Serviço Social; IV - aprovar o Código de Ética Profissional dos Assistentes
III - assessoria e consultoria e órgãos da Administração Sociais juntamente com os CRESS, no fórum máximo de
Pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, em deliberação do conjunto CFESS/CRESS;
matéria de Serviço Social; V - funcionar como Tribunal Superior de Ética Profissional;
IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, VI - julgar, em última instância, os recursos contra as sanções
informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social; impostas pelos CRESS;
V - assumir, no magistério de Serviço Social tanto a nível de VII - estabelecer os sistemas de registro dos profissionais
graduação como pós-graduação, disciplinas e funções que exijam habilitados;
conhecimentos próprios e adquiridos em curso de formação VIII - prestar assessoria técnico-consultiva aos organismos
regular; públicos ou privados, em matéria de Serviço Social;

Didatismo e Conhecimento 76
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
IX - (Vetado). Parágrafo único. As pessoas de direito público ou privado
Art. 9º O fórum máximo de deliberação da profissão para os que se encontrem na situação mencionada neste artigo terão o
fins desta lei dar-se-á nas reuniões conjuntas dos Conselhos Federal prazo de noventa dias, a contar da data da vigência desta lei, para
e Regionais, que inclusive fixarão os limites de sua competência e processarem as modificações que se fizerem necessárias a seu
sua forma de convocação. integral cumprimento, sob pena das medidas judiciais cabíveis.
Art. 10. Compete aos CRESS, em suas respectivas áreas de Art. 16. Os CRESS aplicarão as seguintes penalidades aos
jurisdição, na qualidade de órgão executivo e de primeira instância, infratores dos dispositivos desta Lei:
o exercício das seguintes atribuições: I - multa no valor de uma a cinco vezes a anuidade vigente;
I - organizar e manter o registro profissional dos Assistentes II - suspensão de um a dois anos de exercício da profissão ao
Sociais e o cadastro das instituições e obras sociais públicas e Assistente Social que, no âmbito de sua atuação, deixar de cumprir
privadas, ou de fins filantrópicos; disposições do Código de Ética, tendo em vista a gravidade da
falta;
II - fiscalizar e disciplinar o exercício da profissão de Assistente
III - cancelamento definitivo do registro, nos casos de extrema
Social na respectiva região;
gravidade ou de reincidência contumaz.
III - expedir carteiras profissionais de Assistentes Sociais, 1º Provada a participação ativa ou conivência de empresas,
fixando a respectiva taxa; entidades, instituições ou firmas individuais nas infrações a
IV - zelar pela observância do Código de Ética Profissional, dispositivos desta lei pelos profissionais delas dependentes, serão
funcionando como Tribunais Regionais de Ética Profissional; estas também passíveis das multas aqui estabelecidas, na proporção
V - aplicar as sanções previstas no Código de Ética Profissional; de sua responsabilidade, sob pena das medidas judiciais cabíveis.
VI - fixar, em assembleia da categoria, as anuidades que 2º No caso de reincidência na mesma infração no prazo de
devem ser pagas pelos Assistentes Sociais; dois anos, a multa cabível será elevada ao dobro.
VII - elaborar o respectivo Regimento Interno e submetê-lo a Art. 17. A Carteira de Identificação Profissional expedida
exame e aprovação do fórum máximo de deliberação do conjunto pelos Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS), servirá de
CFESS/CRESS. prova para fins de exercício profissional e de Carteira de Identidade
Art. 11. O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) terá Pessoal, e terá fé pública em todo o território nacional.
sede e foro no Distrito Federal. Art. 18. As organizações que se registrarem nos CRESS
receberão um certificado que as habilitará a atuar na área de
Art. 12. Em cada capital de Estado, de Território e no Serviço Social.
Distrito Federal, haverá um Conselho Regional de Serviço Social Art. 19. O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) será
(CRESS) denominado segundo a sua jurisdição, a qual alcançará, mantido:
I - por contribuições, taxas e emolumentos arrecadados
respectivamente, a do Estado, a do Território e a do Distrito
pelos CRESS, em percentual a ser definido pelo fórum máximo
Federal.
instituído pelo art. 9º desta lei;
1º Nos Estados ou Territórios em que os profissionais que II - por doações e legados;
neles atuam não tenham possibilidade de instalar um Conselho III - por outras rendas.
Regional, deverá ser constituída uma delegacia subordinada Art. 20. O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e os
ao Conselho Regional que oferecer melhores condições de Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS) contarão cada
comunicação, fiscalização e orientação, ouvido o órgão regional e um com nove membros efetivos: Presidente, Vice-Presidente, dois
com homologação do Conselho Federal. Secretários, dois Tesoureiros e três membros do Conselho Fiscal,
2º Os Conselhos Regionais poderão constituir, dentro de sua e nove suplentes, eleitos dentre os Assistentes Sociais, por via
própria área de jurisdição, delegacias seccionais para desempenho direta, para um mandato de três anos, de acordo com as normas
de suas atribuições executivas e de primeira instância nas regiões estabelecidas em Código Eleitoral aprovado pelo fórum instituído
em que forem instalados, desde que a arrecadação proveniente pelo art. 9º desta lei.
dos profissionais nelas atuantes seja suficiente para sua própria Parágrafo único. As delegacias seccionais contarão com três
manutenção. membros efetivos: um Delegado, um Secretário e um Tesoureiro,
Art. 13. A inscrição nos Conselhos Regionais sujeita os e três suplentes, eleitos dentre os Assistentes Sociais da área de sua
Assistentes Sociais ao pagamento das contribuições compulsórias jurisdição, nas condições previstas neste artigo.
(anuidades), taxas e demais emolumentos que forem estabelecidos Art. 21. (Vetado).
Art. 22. O Conselho Federal e os Conselhos Regionais terão
em regulamentação baixada pelo Conselho Federal, em deliberação
legitimidade para agir contra qualquer pessoa que infringir as
conjunta com os Conselhos Regionais.
disposições que digam respeito às prerrogativas, à dignidade e ao
Art. 14. Cabe às Unidades de Ensino credenciar e comunicar prestígio da profissão de Assistente Social.
aos Conselhos Regionais de sua jurisdição os campos de estágio Art. 23. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
de seus alunos e designar os Assistentes Sociais responsáveis por Art. 24. Revogam-se as disposições em contrário e, em
sua supervisão. especial, a Lei nº 3.252, de 27 de agosto de 1957.
Parágrafo único. Somente os estudantes de Serviço Social,
sob supervisão direta de Assistente Social em pleno gozo de seus Brasília, 7 de junho de 1993; 172º da Independência e 105º
direitos profissionais, poderão realizar estágio de Serviço Social. da República.
Art. 15. É vedado o uso da expressão Serviço Social
por quaisquer pessoas de direito público ou privado que não ITAMAR FRANCO
desenvolvam atividades previstas nos arts. 4º e 5º desta lei. Walter Barelli

Didatismo e Conhecimento 77
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
CÓDIGO DE ÉTICA Título II
DOS DIREITOS E DAS RESPONSABILIDADES
Princípios Fundamentais GERAIS DO/A ASSISTENTE SOCIAL
I. Reconhecimento da liberdade como valor ético central e
das demandas políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e Art. 2º Constituem direitos do/a assistente social:
plena expansão dos indivíduos sociais; A- garantia e defesa de suas atribuições e prerrogativas,
II. Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do estabelecidas na Lei de Regulamentação da Profissão e dos
arbítrio e do autoritarismo; princípios firmados neste Código;
III. Ampliação e consolidação da cidadania, considerada B- livre exercício das atividades inerentes à Profissão;
tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos C- participação na elaboração e gerenciamento das
direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras; políticas sociais, e na formulação e implementação de
IV. Defesa do aprofundamento da democracia, programas sociais;
enquanto socialização da participação política e da riqueza D- inviolabilidade do local de trabalho e respectivos arquivos
socialmente produzida; e documentação, garantindo o sigilo profissional;
V. Posicionamento em favor da equidade e justiça social, que E- desagravo público por ofensa que atinja a sua honra
assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos profissional;
programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática; F- aprimoramento profissional de forma contínua, colocando-o
VI. Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, a serviço dos princípios deste Código;
incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos G- pronunciamento em matéria de sua especialidade,
socialmente discriminados e à discussão das diferenças; sobretudo quando se tratar de assuntos de interesse da população;
VII. Garantia do pluralismo, através do respeito às correntes H- ampla autonomia no exercício da Profissão, não sendo
profissionais democráticas existentes e suas expressões teóricas, e obrigado a prestar serviços profissionais incompatíveis com as
compromisso com o constante aprimoramento intelectual; suas atribuições, cargos ou funções;
VIII. Opção por um projeto profissional vinculado I- liberdade na realização de seus estudos e pesquisas,
ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem resguardados os direitos de participação de indivíduos ou grupos
dominação, exploração de classe, etnia e gênero; envolvidos em seus trabalhos.
IX. Articulação com os movimentos de outras categorias
profissionais que partilhem dos princípios deste Código e Art. 3º São deveres do/a assistente social:
com a luta geral dos/as trabalhadores/as; A- desempenhar suas atividades profissionais, com eficiência
X. Compromisso com a qualidade dos serviços prestados e responsabilidade, observando a legislação em vigor;
à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva B- utilizar seu número de registro no Conselho
da competência profissional; Regional no exercício da Profissão;
XI. Exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem C- abster-se, no exercício da Profissão, de práticas que
discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, caracterizem a censura, o cerceamento da liberdade, o policiamento
etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de dos comportamentos, denunciando sua ocorrência aos
gênero, idade e condição física. órgãos competentes;
D- participar de programas de socorro à população em
CÓDIGO DE ÉTICA situação de calamidade pública, no atendimento e defesa
DO ASSISTENTE SOCIAL de seus interesses e necessidades.

Art. 4º É vedado ao/à assistente social:


Título I A- transgredir qualquer preceito deste Código, bem como da
DISPOSIÇÕES GERAIS Lei de Regulamentação da Profissão;
B- praticar e ser conivente com condutas antiéticas, crimes
Art.1º Compete ao Conselho Federal de Serviço Social: ou contravenções penais na prestação de serviços profissionais,
A- zelar pela observância dos princípios e diretrizes deste com base nos princípios deste Código, mesmo que estes sejam
Código, fiscalizando as ações dos Conselhos Regionais e a prática praticados por outros/as profissionais;
exercida pelos profissionais, instituições e organizações na área C- acatar determinação institucional que fira os princípios
do Serviço Social; e diretrizes deste Código;
B- introduzir alteração neste Código, através de uma D- compactuar com o exercício ilegal da Profissão, inclusive
ampla participação da categoria, num processo desenvolvido em nos casos de estagiários/as que exerçam atribuições específicas,
ação conjunta com os Conselhos Regionais; em substituição aos/às profissionais;
C- como Tribunal Superior de Ética Profissional, firmar E- permitir ou exercer a supervisão de aluno/a de Serviço
jurisprudência na observância deste Código e nos casos omissos. Social em Instituições Públicas ou Privadas que não tenham em
Parágrafo único: Compete aos Conselhos Regionais, nas seu quadro assistente social que realize acompanhamento direto
áreas de suas respectivas jurisdições, zelar pela observância dos ao/à aluno/a estagiário/a;
princípios e diretrizes deste Código, e funcionar como órgão F- assumir responsabilidade por atividade para as quais
julgador de primeira instância. não esteja capacitado/a pessoal e tecnicamente;

Didatismo e Conhecimento 78
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
G- substituir profissional que tenha sido exonerado/a por B- ter livre acesso à população usuária;
defender os princípios da ética profissional, enquanto perdurar o C- ter acesso a informações institucionais que se relacionem
motivo da exoneração, demissão ou transferência; aos programas e políticas sociais e sejam necessárias ao pleno
H- pleitear para si ou para outrem emprego, cargo ou função exercício das atribuições profissionais;
que estejam sendo exercidos por colega; D- integrar comissões interdisciplinares de ética nos locais
I- adulterar resultados e fazer declarações falaciosas sobre de trabalho do/a profissional, tanto no que se refere à avaliação
situações ou estudos de que tome conhecimento; da conduta profissional, como em relação às decisões quanto às
J- assinar ou publicar em seu nome ou de outrem trabalhos de políticas institucionais.
terceiros, mesmo que executados sob sua orientação.
Art. 8º São deveres do/a assistente social:
Título III A- programar, administrar, executar e repassar os serviços
DAS RELAÇÕES PROFISSIONAIS sociais assegurados institucionalmente;
B- denunciar falhas nos regulamentos, normas e programas da
Capítulo I instituição em que trabalha, quando os mesmos estiverem ferindo
os princípios e diretrizes deste Código, mobilizando, inclusive, o
Das Relações com os/as Usuários/as
Conselho Regional, caso se faça necessário;
C- contribuir para a alteração da correlação de forças
Art. 5º São deveres do/a assistente social nas suas relações institucionais, apoiando as legítimas demandas de interesse da
com os/as usuários/as: população usuária;
A- contribuir para a viabilização da participação efetiva da D- empenhar-se na viabilização dos direitos sociais dos/as
população usuária nas decisões institucionais; usuários/as, através dos programas e políticas sociais;
B- garantir a plena informação e discussão sobre as E- empregar com transparência as verbas sob a sua
possibilidades e consequências das situações apresentadas, responsabilidade, de acordo com os interesses e necessidades
respeitando democraticamente as decisões dos/as usuários/as, coletivas dos/as usuários/as.
mesmo que sejam contrárias aos valores e às crenças individuais
dos/as profissionais, resguardados os princípios deste Código; Art. 9º É vedado ao/à assistente social:
C- democratizar as informações e o acesso aos programas A- emprestar seu nome e registro profissional a firmas,
disponíveis no espaço institucional, como um dos mecanismos organizações ou empresas para simulação do exercício efetivo do
indispensáveis à participação dos/as usuários/as; Serviço Social;
D- devolver as informações colhidas nos estudos e pesquisas B- usar ou permitir o tráfico de influência para obtenção de
aos/às usuários/as, no sentido de que estes possam usá-los para o emprego, desrespeitando concurso ou processos seletivos;
fortalecimento dos seus interesses; C- utilizar recursos institucionais (pessoal e/ou financeiro)
E- informar à população usuária sobre a utilização de para fins partidários, eleitorais e clientelistas.
materiais de registro audiovisual e pesquisas a elas referentes e a
forma de sistematização dos dados obtidos; Capítulo III
F- fornecer à população usuária, quando solicitado, Das Relações com Assistentes Sociais e outros/as
informações concernentes ao trabalho desenvolvido pelo Serviço Profissionais
Social e as suas conclusões, resguardado o sigilo profissional;
G- contribuir para a criação de mecanismos que venham Art. 10 São deveres do/a assistente social:
desburocratizar a relação com os/as usuários/as, no sentido de A- ser solidário/a com outros/as profissionais, sem,
agilizar e melhorar os serviços prestados; todavia, eximir-se de denunciar atos que contrariem os postulados
éticos contidos neste Código;
H- esclarecer aos/às usuários/as, ao iniciar o trabalho, sobre
B- repassar ao seu substituto as informações necessárias à
os objetivos e a amplitude de sua atuação profissional.
continuidade do trabalho;
C- mobilizar sua autoridade funcional, ao ocupar uma
Art. 6º É vedado ao/à assistente social: chefia, para a liberação de carga horária de subordinado/a, para
A- exercer sua autoridade de maneira a limitar ou cercear o fim de estudos e pesquisas que visem o aprimoramento
direito do/a usuário/a de participar e decidir livremente sobre seus profissional, bem como de representação ou delegação de entidade
interesses; de organização da categoria e outras, dando igual oportunidade a
B- aproveitar-se de situações decorrentes da relação assistente todos/as;
social-usuário/a, para obter vantagens pessoais ou para terceiros; D- incentivar, sempre que possível, a prática profissional
C- bloquear o acesso dos/as usuários/as aos serviços oferecidos interdisciplinar;
pelas instituições, através de atitudes que venham coagir e/ou E- respeitar as normas e princípios éticos das outras profissões;
desrespeitar aqueles que buscam o atendimento de seus direitos. F- ao realizar crítica pública a colega e outros/ as profissionais,
fazê-lo sempre de maneira objetiva, construtiva e comprovável,
Capítulo II assumindo sua inteira responsabilidade.
Das Relações com as Instituições
Empregadoras e outras Art. 11 É vedado ao/à assistente social:
A- intervir na prestação de serviços que estejam sendo efetuados
Art. 7º Constituem direitos do/a assistente social: por outro/a profissional, salvo a pedido desse/a profissional;
A- dispor de condições de trabalho condignas, seja em em caso de urgência, seguido da imediata comunicação ao/à
entidade pública ou privada, de forma a garantir a qualidade do profissional; ou quando se tratar de trabalho multiprofissional e a
exercício profissional; intervenção fizer parte da metodologia adotada;

Didatismo e Conhecimento 79
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
B- prevalecer-se de cargo de chefia para atos discriminatórios Parágrafo único A revelação será feita dentro do estritamente
e de abuso de autoridade; necessário, quer em relação ao assunto revelado, quer ao grau e
C- ser conivente com falhas éticas de acordo com os princípios número de pessoas que dele devam tomar conhecimento.
deste Código e com erros técnicos praticados por assistente social
e qualquer outro/a profissional; Capítulo VI
D- prejudicar deliberadamente o trabalho e a reputação de Das Relações do/a Assistente Social com a Justiça
outro/a profissional.
Art. 19 São deveres do/a assistente social:
Capítulo IV A- apresentar à justiça, quando convocado na qualidade de
Das Relações com Entidades da Categoria e demais perito ou testemunha, as conclusões do seu laudo ou depoimento,
organizações da Sociedade Civil sem extrapolar o âmbito da competência profissional e violar os
princípios éticos contidos neste Código;
Art.12 Constituem direitos do/a assistente social: B- comparecer perante a autoridade competente, quando
A- participar em sociedades científicas e em entidades intimado/a a prestar depoimento, para declarar que está obrigado/a
a guardar sigilo profissional nos termos deste Código e da
representativas e de organização da categoria que tenham por
Legislação em vigor.
finalidade, respectivamente, a produção de conhecimento, a defesa
e a fiscalização do exercício profissional;
Art. 20 É vedado ao/à assistente social:
B- apoiar e/ou participar dos movimentos sociais e A- depor como testemunha sobre situação sigilosa
organizações populares vinculados à luta pela consolidação e do/a usuário/a de que tenha conhecimento no exercício
ampliação da democracia e dos direitos de cidadania. profissional, mesmo quando autorizado;
B- aceitar nomeação como perito e/ou atuar em perícia quando
Art. 13 São deveres do/a assistente social: a situação não se caracterizar como área de sua competência ou
A- denunciar ao Conselho Regional as instituições públicas de sua atribuição profissional, ou quando infringir os dispositivos
ou privadas, onde as condições de trabalho não sejam dignas ou legais relacionados a impedimentos ou suspeição.
possam prejudicar os/as usuários/as ou profissionais;
B- denunciar, no exercício da Profissão, às entidades de Título IV
organização da categoria, às autoridades e aos órgãos competentes, Da Observância, Penalidades, Aplicação e
casos de violação da Lei e dos Direitos Humanos, quanto a: Cumprimento Deste Código
corrupção, maus tratos, torturas, ausência de condições mínimas
de sobrevivência, discriminação, preconceito, abuso de autoridade Art. 21 São deveres do/a assistente social:
individual e institucional, qualquer forma de agressão ou falta de A- cumprir e fazer cumprir este Código;
respeito à integridade física, social e mental do/a cidadão/cidadã; B- denunciar ao Conselho Regional de Serviço Social,
C- respeitar a autonomia dos movimentos populares e das através de comunicação fundamentada, qualquer forma
organizações das classes trabalhadoras. de exercício irregular da Profissão, infrações a princípios e
diretrizes deste Código e da legislação profissional;
Art. 14 É vedado ao/à assistente social valer-se de posição C- informar, esclarecer e orientar os/as estudantes, na
ocupada na direção de entidade da categoria para obter vantagens docência ou supervisão, quanto aos princípios e normas contidas
pessoais, diretamente ou através de terceiros/as. neste Código.
CAPÍTULO V
Do Sigilo Profissional Art. 22 Constituem infrações disciplinares:
A- exercer a Profissão quando impedido/a de fazê-lo, ou
facilitar, por qualquer meio, o seu exercício ao/às não inscritos/as
Art. 15 Constitui direito do/a assistente social manter o sigilo
ou impedidos/as;
profissional.
B- não cumprir, no prazo estabelecido, determinação
emanada do órgão ou autoridade dos Conselhos, em matéria
Art. 16 O sigilo protegerá o/a usuário/a em tudo aquilo de destes, depois de regularmente notificado/a;
que o/a assistente social tome conhecimento, como decorrência do C- deixar de pagar, regularmente, as anuidades e contribuições
exercício da atividade profissional. devidas ao Conselho Regional de Serviço Social a que esteja
Parágrafo único Em trabalho multidisciplinar só obrigado/a;
poderão ser prestadas informações dentro dos limites do D- participar de instituição que, tendo por objeto o Serviço
estritamente necessário. Social, não esteja inscrita no Conselho Regional;
E- fazer ou apresentar declaração, documento falso ou
Art. 17 É vedado ao/à assistente social revelar sigilo adulterado, perante o Conselho Regional ou Federal.
profissional.
Das Penalidades
Art. 18 A quebra do sigilo só é admissível quando se tratarem de
situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso, Art. 23 As infrações a este Código acarretarão penalidades,
trazer prejuízo aos interesses do/a usuário/a, de terceiros/as e da desde a multa à cassação do exercício profissional, na forma dos
coletividade. dispositivos legais e/ ou regimentais.

Didatismo e Conhecimento 80
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Art. 24 As penalidades aplicáveis são as seguintes: Art. 32 A punibilidade do assistente social, por falta sujeita a
A- multa; processo ético e disciplinar, prescreve em 5 (cinco) anos, contados
B- advertência reservada; da data da verificação do fato respectivo.
C- advertência pública;
D- suspensão do exercício profissional; Art. 33 Na execução da pena de advertência reservada,
E- cassação do registro profissional. não sendo encontrado o/a penalizado/a ou se este/a, após duas
Parágrafo único Serão eliminados/as dos quadros dos convocações, não comparecer no prazo fixado para receber a
CRESS aqueles/as que fizerem falsa prova dos requisitos exigidos penalidade, será ela tornada pública.
nos Conselhos. §1º A pena de multa, ainda que o/a penalizado/a compareça
para tomar conhecimento da decisão, será publicada nos termos do
Art. 25 A pena de suspensão acarreta ao/à assistente social a artigo 29 deste Código, se não for devidamente quitada no prazo
interdição do exercício profissional em todo o território nacional, de 30 (trinta) dias, sem prejuízo da cobrança judicial.
pelo prazo de 30 (trinta) dias a 2 (dois) anos. § 2º Em caso de cassação do exercício profissional, além
Parágrafo único A suspensão por falta de pagamento de dos editais e das comunicações feitas às autoridades competentes
interessadas no assunto, proceder-se-á a apreensão da Carteira e
anuidades e taxas só cessará com a satisfação do débito, podendo
Cédula de Identidade Profissional do/a infrator/a.
ser cassada a inscrição profissional após decorridos três anos da
suspensão.
Art. 34 A pena de multa variará entre o mínimo correspondente
ao valor de uma anuidade e o máximo do seu décuplo.
Art. 26 Serão considerados na aplicação das penas os
antecedentes profissionais do/a infrator/a e as circunstâncias em Art. 35 As dúvidas na observância deste Código e os casos
que ocorreu a infração. omissos serão resolvidos pelos Conselhos Regionais de Serviço
Social “ad referendum” do Conselho Federal de Serviço Social, a
Art. 27 Salvo nos casos de gravidade manifesta, que exigem quem cabe firmar jurisprudência.
aplicação de penalidades mais rigorosas, a imposição das penas
obedecerá à gradação estabelecida pelo artigo 24. Art. 36 O presente Código entrará em vigor na data de sua
publicação no Diário Oficial da União, revogando-se as disposições
Art. 28 Para efeito da fixação da pena serão considerados em contrário.
especialmente graves as violações que digam respeito às seguintes
disposições: Brasília, 13 de março de 1993
Artigo 3º - alínea c;
Artigo 4º - alínea a, b, c, g, i, j; MARLISE VINAGRE SILVA
Artigo 5º - alínea b, f; Presidente do CFESS
Artigo 6º - alínea a, b, c;
Artigo 8º - alínea b; e artigo 9º - alínea a, b, c; LEI Nº 8.742, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1993.
Artigo 11 - alínea b, c, d;
Artigo 13 - alínea b; Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras
Artigo 14; providências.
Artigo 16;
Artigo 17; O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o
Parágrafo único do artigo 18; Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
Artigo 19 - alínea b;
LEI ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
Artigo 20 - alínea a, b e
CAPÍTULO I
Parágrafo único. As demais violações não previstas no
Das Definições e dos Objetivos
“caput”, uma vez consideradas graves, autorizarão aplicação
de penalidades mais severas, em conformidade com o artigo 26. Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do
Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê
Art. 29 A advertência reservada, ressalvada a hipótese prevista os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado
no artigo 32 será confidencial, sendo que a advertência pública, de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o
suspensão e a cassação do exercício profissional serão efetivadas atendimento às necessidades básicas.
através de publicação em Diário Oficial e em outro órgão da
imprensa, e afixado na sede do Conselho Regional onde estiver Art. 2o A assistência social tem por objetivos: (Redação dada
inserido/a o/a denunciado/a e na Delegacia Seccional do CRESS pela Lei nº 12.435, de 2011)
da jurisdição de seu domicílio. I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à
redução de danos e à prevenção da incidência de riscos,
Art. 30 Cumpre ao Conselho Regional a execução das decisões especialmente: (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
proferidas nos processos disciplinares. a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à
adolescência e à velhice; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Art. 31 Da imposição de qualquer penalidade caberá recurso b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes; (Incluído
com efeito suspensivo ao CFESS. pela Lei nº 12.435, de 2011)

Didatismo e Conhecimento 81
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
c) a promoção da integração ao mercado de trabalho; (Incluído II - universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o
pela Lei nº 12.435, de 2011) destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas
d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e públicas;
a promoção de sua integração à vida comunitária; e (Incluído pela III - respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e
Lei nº 12.435, de 2011) ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como
e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer
à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir comprovação vexatória de necessidade;
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua IV - igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem
família; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) discriminação de qualquer natureza, garantindo-se equivalência às
II - a vigilância socioassistencial, que visa a analisar populações urbanas e rurais;
territorialmente a capacidade protetiva das famílias e nela a V - divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas
ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de vitimizações e
e projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos pelo
danos; (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Poder Público e dos critérios para sua concessão.
III - a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos
direitos no conjunto das provisões socioassistenciais.  (Redação
dada pela Lei nº 12.435, de 2011) SEÇÃO II
Parágrafo único.  Para o enfrentamento da pobreza, a Das Diretrizes
assistência social realiza-se de forma integrada às políticas
setoriais, garantindo mínimos sociais e provimento de condições Art. 5º A organização da assistência social tem como base as
para atender contingências sociais e promovendo a universalização seguintes diretrizes:
dos direitos sociais. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) I - descentralização político-administrativa para os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, e comando único das ações em
Art. 3o Consideram-se entidades e organizações de assistência cada esfera de governo;
social aquelas sem fins lucrativos que, isolada ou cumulativamente, II - participação da população, por meio de organizações
prestam atendimento e assessoramento aos beneficiários representativas, na formulação das políticas e no controle das
abrangidos por esta Lei, bem como as que atuam na defesa e ações em todos os níveis;
garantia de direitos. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) III - primazia da responsabilidade do Estado na condução da
§ 1o  São de atendimento aquelas entidades que, de forma política de assistência social em cada esfera de governo.
continuada, permanente e planejada, prestam serviços, executam
programas ou projetos e concedem benefícios de prestação social CAPÍTULO III
básica ou especial, dirigidos às famílias e indivíduos em situações Da Organização e da Gestão
de vulnerabilidade ou risco social e pessoal, nos termos desta Lei,
e respeitadas as deliberações do Conselho Nacional de Assistência Art. 6o A gestão das ações na área de assistência social fica
Social (CNAS), de que tratam os incisos I e II do art. 18.(Incluído organizada sob a forma de sistema descentralizado e participativo,
pela Lei nº 12.435, de 2011) denominado Sistema Único de Assistência Social (Suas), com os
§ 2o  São de assessoramento aquelas que, de forma continuada, seguintes objetivos: (
permanente e planejada, prestam serviços e executam programas I - consolidar a gestão compartilhada, o cofinanciamento
ou projetos voltados prioritariamente para o fortalecimento dos e a cooperação técnica entre os entes federativos que, de modo
movimentos sociais e das organizações de usuários, formação
articulado, operam a proteção social não contributiva;  (Incluído
e capacitação de lideranças, dirigidos ao público da política
pela Lei nº 12.435, de 2011)
de assistência social, nos termos desta Lei, e respeitadas as
deliberações do CNAS, de que tratam os incisos I e II do art. II - integrar a rede pública e privada de serviços, programas,
18.(Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) projetos e benefícios de assistência social, na forma do art. 6o-
§ 3o  São de defesa e garantia de direitos aquelas que, de forma C; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
continuada, permanente e planejada, prestam serviços e executam III - estabelecer as responsabilidades dos entes federativos
programas e projetos voltados prioritariamente para a defesa e na organização, regulação, manutenção e expansão das ações de
efetivação dos direitos socioassistenciais, construção de novos assistência social;
direitos, promoção da cidadania, enfrentamento das desigualdades IV - definir os níveis de gestão, respeitadas as diversidades
sociais, articulação com órgãos públicos de defesa de direitos, regionais e municipais; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
dirigidos ao público da política de assistência social, nos termos V - implementar a gestão do trabalho e a educação permanente
desta Lei, e respeitadas as deliberações do CNAS, de que tratam na assistência social; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
os incisos I e II do art. 18. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) VI - estabelecer a gestão integrada de serviços e benefícios;
e (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
CAPÍTULO II VII - afiançar a vigilância socioassistencial e a garantia de
Dos Princípios e das Diretrizes direitos. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1o As ações ofertadas no âmbito do Suas têm por objetivo
SEÇÃO I a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à
Dos Princípios velhice e, como base de organização, o território. (
§ 2o O Suas é integrado pelos entes federativos, pelos respectivos
Art. 4º A assistência social rege-se pelos seguintes princípios: conselhos de assistência social e pelas entidades e organizações de
I - supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre assistência social abrangidas por esta Lei.  (Incluído pela Lei nº
as exigências de rentabilidade econômica; 12.435, de 2011)

Didatismo e Conhecimento 82
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
§ 3o  A instância coordenadora da Política Nacional de § 1o O Cras é a unidade pública municipal, de base territorial,
Assistência Social é o Ministério do Desenvolvimento Social e localizada em áreas com maiores índices de vulnerabilidade e
Combate à Fome. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) risco social, destinada à articulação dos serviços socioassistenciais
no seu território de abrangência e à prestação de serviços,
Art. 6o-A.   A assistência social organiza-se pelos seguintes programas e projetos socioassistenciais de proteção social básica
tipos de proteção: (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) às famílias. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
I - proteção social básica: conjunto de serviços, § 2o  O Creas é a unidade pública de abrangência e gestão
programas, projetos e benefícios da assistência social que municipal, estadual ou regional, destinada à prestação de serviços
visa a prevenir situações de vulnerabilidade e risco social por a indivíduos e famílias que se encontram em situação de risco
meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições e do pessoal ou social, por violação de direitos ou contingência,
fortalecimento de vínculos familiares e comunitários;  (Incluído que demandam intervenções especializadas da proteção social
pela Lei nº 12.435, de 2011) especial. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
II - proteção social especial: conjunto de serviços, programas § 3o Os Cras e os Creas são unidades públicas estatais instituídas
e projetos que tem por objetivo contribuir para a reconstrução no âmbito do Suas, que possuem interface com as demais políticas
de vínculos familiares e comunitários, a defesa de direito, o públicas e articulam, coordenam e ofertam os serviços, programas,
fortalecimento das potencialidades e aquisições e a proteção projetos e benefícios da assistência social.  (Incluído pela Lei nº
de famílias e indivíduos para o enfrentamento das situações de 12.435, de 2011)
violação de direitos. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) Art. 6o-D.  As instalações dos Cras e dos Creas devem ser
Parágrafo único.  A vigilância socioassistencial é um dos compatíveis com os serviços neles ofertados, com espaços para
instrumentos das proteções da assistência social que identifica trabalhos em grupo e ambientes específicos para recepção e
e previne as situações de risco e vulnerabilidade social e seus atendimento reservado das famílias e indivíduos, assegurada a
agravos no território. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) acessibilidade às pessoas idosas e com deficiência. (Incluído pela
Art. 6o-B.  As proteções sociais básica e especial serão ofertadas Lei nº 12.435, de 2011)
pela rede socioassistencial, de forma integrada, diretamente pelos Art. 6o-E.  Os recursos do cofinanciamento do Suas, destinados
entes públicos e/ou pelas entidades e organizações de assistência à execução das ações continuadas de assistência social, poderão
social vinculadas ao Suas, respeitadas as especificidades de cada ser aplicados no pagamento dos profissionais que integrarem as
ação. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) equipes de referência, responsáveis pela organização e oferta
§ 1o A vinculação ao Suas é o reconhecimento pelo Ministério daquelas ações, conforme percentual apresentado pelo Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome de que a entidade do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e aprovado pelo
de assistência social integra a rede socioassistencial. (Incluído pela CNAS. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Lei nº 12.435, de 2011) Parágrafo único.  A formação das equipes de referência deverá
§ 2o Para o reconhecimento referido no § 1o, a entidade deverá considerar o número de famílias e indivíduos referenciados,
cumprir os seguintes requisitos: (Incluído pela Lei nº 12.435, de os tipos e modalidades de atendimento e as aquisições que
2011) devem ser garantidas aos usuários, conforme deliberações do
I - constituir-se em conformidade com o disposto no art. CNAS. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
3o; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
II - inscrever-se em Conselho Municipal ou do Distrito Art. 7º As ações de assistência social, no âmbito das entidades
Federal, na forma do art. 9o; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) e organizações de assistência social, observarão as normas
III - integrar o sistema de cadastro de entidades de que trata o expedidas pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS),
inciso XI do art. 19. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) de que trata o art. 17 desta lei.
§ 3o  As entidades e organizações de assistência social
vinculadas ao Suas celebrarão convênios, contratos, acordos Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
ou ajustes com o poder público para a execução, garantido observados os princípios e diretrizes estabelecidos nesta lei, fixarão
financiamento integral, pelo Estado, de serviços, programas, suas respectivas Políticas de Assistência Social.
projetos e ações de assistência social, nos limites da capacidade
instalada, aos beneficiários abrangidos por esta Lei, observando-se Art. 9º O funcionamento das entidades e organizações de
as disponibilidades orçamentárias.  (Incluído pela Lei nº 12.435, assistência social depende de prévia inscrição no respectivo
de 2011) Conselho Municipal de Assistência Social, ou no Conselho de
§ 4o  O cumprimento do disposto no § 3o  será informado ao Assistência Social do Distrito Federal, conforme o caso.
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome pelo § 1º A regulamentação desta lei definirá os critérios de
órgão gestor local da assistência social.  (Incluído pela Lei nº inscrição e funcionamento das entidades com atuação em mais de
12.435, de 2011) um município no mesmo Estado, ou em mais de um Estado ou
Art. 6o-C.   As proteções sociais, básica e especial, serão Distrito Federal.
ofertadas precipuamente no Centro de Referência de Assistência § 2º Cabe ao Conselho Municipal de Assistência Social e ao
Social (Cras) e no Centro de Referência Especializado de Conselho de Assistência Social do Distrito Federal a fiscalização
Assistência Social (Creas), respectivamente, e pelas entidades das entidades referidas no caput na forma prevista em lei ou
sem fins lucrativos de assistência social de que trata o art. 3o desta regulamento.
Lei. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) § 3º (Revogado pela Lei nº 12.101, de 2009)

Didatismo e Conhecimento 83
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
§ 4º As entidades e organizações de assistência social § 3o (VETADO).  (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
podem, para defesa de seus direitos referentes à inscrição e ao § 4o  Para fins de fortalecimento dos Conselhos de Assistência
funcionamento, recorrer aos Conselhos Nacional, Estaduais, Social dos Estados, Municípios e Distrito Federal, percentual
Municipais e do Distrito Federal. dos recursos transferidos deverá ser gasto com atividades de
apoio técnico e operacional àqueles colegiados, na forma fixada
Art. 10. A União, os Estados, os Municípios e o Distrito pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
Federal podem celebrar convênios com entidades e organizações sendo vedada a utilização dos recursos para pagamento de pessoal
de assistência social, em conformidade com os Planos aprovados efetivo e de gratificações de qualquer natureza a servidor público
pelos respectivos Conselhos. estadual, municipal ou do Distrito Federal. (Incluído pela Lei nº
12.435, de 2011)
Art. 11. As ações das três esferas de governo na área de
assistência social realizam-se de forma articulada, cabendo a Art. 13. Compete aos Estados:
coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e I - destinar recursos financeiros aos Municípios, a título de
execução dos programas, em suas respectivas esferas, aos Estados, participação no custeio do pagamento dos benefícios eventuais
ao Distrito Federal e aos Municípios. de que trata o art. 22, mediante critérios estabelecidos pelos
Conselhos Estaduais de Assistência Social;  (Redação dada pela
Art. 12. Compete à União: Lei nº 12.435, de 2011)
I - responder pela concessão e manutenção dos benefícios II - cofinanciar, por meio de transferência automática, o
de prestação continuada definidos no art. 203 da Constituição     aprimoramento da gestão, os serviços, os programas e os projetos
Federal; de assistência social em âmbito regional ou local; (Redação dada
II - cofinanciar, por meio de transferência automática, o pela Lei nº 12.435, de 2011)
aprimoramento da gestão, os serviços, os programas e os projetos III - atender, em conjunto com os Municípios, às ações
de assistência social em âmbito nacional; (Redação dada pela Lei assistenciais de caráter de emergência;
nº 12.435, de 2011) IV - estimular e apoiar técnica e financeiramente as associações
III - atender, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e consórcios municipais na prestação de serviços de assistência
e os Municípios, às ações assistenciais de caráter de emergência. social;
IV - realizar o monitoramento e a avaliação da política V - prestar os serviços assistenciais cujos custos ou ausência
de assistência social e assessorar Estados, Distrito Federal e de demanda municipal justifiquem uma rede regional de serviços,
Municípios para seu desenvolvimento.  (Incluído pela Lei nº desconcentrada, no âmbito do respectivo Estado.
12.435, de 2011) VI - realizar o monitoramento e a avaliação da política
de assistência social e assessorar os Municípios para seu
Art. 12-A.  A União apoiará financeiramente o aprimoramento desenvolvimento. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
à gestão descentralizada dos serviços, programas, projetos e
benefícios de assistência social, por meio do Índice de Gestão Art. 14. Compete ao Distrito Federal:
Descentralizada (IGD) do Sistema Único de Assistência Social I - destinar recursos financeiros para custeio do pagamento
(Suas), para a utilização no âmbito dos Estados, dos Municípios dos benefícios eventuais de que trata o art. 22, mediante critérios
e do Distrito Federal, destinado, sem prejuízo de outras ações a estabelecidos pelos Conselhos de Assistência Social do Distrito
serem definidas em regulamento, a: (Incluído pela Lei nº 12.435, Federal; (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
de 2011) II - efetuar o pagamento dos auxílios natalidade e funeral;
I - medir os resultados da gestão descentralizada do Suas, com III - executar os projetos de enfrentamento da pobreza,
base na atuação do gestor estadual, municipal e do Distrito Federal incluindo a parceria com organizações da sociedade civil;
na implementação, execução e monitoramento dos serviços, IV - atender às ações assistenciais de caráter de emergência;
programas, projetos e benefícios de assistência social, bem como V - prestar os serviços assistenciais de que trata o art. 23 desta
na articulação intersetorial; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) lei.
II - incentivar a obtenção de resultados qualitativos na gestão VI - cofinanciar o aprimoramento da gestão, os serviços,
estadual, municipal e do Distrito Federal do Suas; e (Incluído pela os programas e os projetos de assistência social em âmbito
Lei nº 12.435, de 2011) local; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
III - calcular o montante de recursos a serem repassados VII - realizar o monitoramento e a avaliação da política de
aos entes federados a título de apoio financeiro à gestão do assistência social em seu âmbito. (Incluído pela Lei nº 12.435, de
Suas. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) 2011)
§ 1o Os resultados alcançados pelo ente federado na gestão do
Suas, aferidos na forma de regulamento, serão considerados como Art. 15. Compete aos Municípios:
prestação de contas dos recursos a serem transferidos a título de I - destinar recursos financeiros para custeio do pagamento
apoio financeiro. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) dos benefícios eventuais de que trata o art. 22, mediante critérios
§ 2o As transferências para apoio à gestão descentralizada do estabelecidos pelos Conselhos Municipais de Assistência
Suas adotarão a sistemática do Índice de Gestão Descentralizada Social; (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
do Programa Bolsa Família, previsto no art. 8o da Lei no 10.836, de II - efetuar o pagamento dos auxílios natalidade e funeral;
9 de janeiro de 2004, e serão efetivadas por meio de procedimento III - executar os projetos de enfrentamento da pobreza,
integrado àquele índice. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) incluindo a parceria com organizações da sociedade civil;

Didatismo e Conhecimento 84
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
IV - atender às ações assistenciais de caráter de emergência; Art. 18. Compete ao Conselho Nacional de Assistência Social:
V - prestar os serviços assistenciais de que trata o art. 23 desta I - aprovar a Política Nacional de Assistência Social;
lei. II - normatizar as ações e regular a prestação de serviços de
VI - cofinanciar o aprimoramento da gestão, os serviços, natureza pública e privada no campo da assistência social;
os programas e os projetos de assistência social em âmbito III - acompanhar e fiscalizar o processo de certificação das
local; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) entidades e organizações de assistência social no Ministério do
VII - realizar o monitoramento e a avaliação da política de Desenvolvimento Social e Combate à Fome; 
assistência social em seu âmbito. (Incluído pela Lei nº 12.435, de IV - apreciar relatório anual que conterá a relação de entidades
2011) e organizações de assistência social certificadas como beneficentes
e encaminhá-lo para conhecimento dos Conselhos de Assistência
Art. 16.  As instâncias deliberativas do Suas, de caráter Social dos Estados, Municípios e do Distrito Federal; 
permanente e composição paritária entre governo e sociedade V - zelar pela efetivação do sistema descentralizado e
civil, são: (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) participativo de assistência social;
I - o Conselho Nacional de Assistência Social; VI -  a partir da realização da II Conferência Nacional de
II - os Conselhos Estaduais de Assistência Social; Assistência Social em 1997, convocar ordinariamente a cada
III - o Conselho de Assistência Social do Distrito Federal; quatro anos a Conferência Nacional de Assistência Social, que terá
IV - os Conselhos Municipais de Assistência Social. a atribuição de avaliar a situação da assistência social e propor
Parágrafo único. Os Conselhos de Assistência Social estão diretrizes para o aperfeiçoamento do sistema; 
vinculados ao órgão gestor de assistência social, que deve prover VII - (Vetado.)
a infraestrutura necessária ao seu funcionamento, garantindo VIII - apreciar e aprovar a proposta orçamentária da
recursos materiais, humanos e financeiros, inclusive com despesas Assistência Social a ser encaminhada pelo órgão da Administração
referentes a passagens e diárias de conselheiros representantes do Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional
governo ou da sociedade civil, quando estiverem no exercício de de Assistência Social;
suas atribuições. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) IX - aprovar critérios de transferência de recursos para os
Estados, Municípios e Distrito Federal, considerando, para tanto,
Art. 17. Fica instituído o Conselho Nacional de Assistência
indicadores que informem sua regionalização mais equitativa,
Social (CNAS), órgão superior de deliberação colegiada,
tais como: população, renda per capita, mortalidade infantil e
vinculado à estrutura do órgão da Administração Pública Federal
concentração de renda, além de disciplinar os procedimentos de
responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência
repasse de recursos para as entidades e organizações de assistência
Social, cujos membros, nomeados pelo Presidente da República,
social, sem prejuízo das disposições da Lei de Diretrizes
têm mandato de 2 (dois) anos, permitida uma única recondução
Orçamentárias;
por igual período.
X - acompanhar e avaliar a gestão dos recursos, bem como
§ 1º O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) é
composto por 18 (dezoito) membros e respectivos suplentes, cujos os ganhos sociais e o desempenho dos programas e projetos
nomes são indicados ao órgão da Administração Pública Federal aprovados;
responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência XI - estabelecer diretrizes, apreciar e aprovar os programas
Social, de acordo com os critérios seguintes: anuais e plurianuais do Fundo Nacional de Assistência Social
I - 9 (nove) representantes governamentais, incluindo 1 (um) (FNAS);
representante dos Estados e 1 (um) dos Municípios; XII - indicar o representante do Conselho Nacional de
II - 9 (nove) representantes da sociedade civil, dentre Assistência Social (CNAS) junto ao Conselho Nacional da
representantes dos usuários ou de organizações de usuários, das Seguridade Social;
entidades e organizações de assistência social e dos trabalhadores XIII - elaborar e aprovar seu regimento interno;
do setor, escolhidos em foro próprio sob fiscalização do Ministério XIV - divulgar, no Diário Oficial da União, todas as suas
Público Federal. decisões, bem como as contas do Fundo Nacional de Assistência
§ 2º O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) é Social (FNAS) e os respectivos pareceres emitidos.
presidido por um de seus integrantes, eleito dentre seus membros, Parágrafo único.    (Revogado)
para mandato de 1 (um) ano, permitida uma única recondução por
igual período. Art. 19. Compete ao órgão da Administração Pública Federal
§ 3º O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência
contará com uma Secretaria Executiva, a qual terá sua estrutura Social:
disciplinada em ato do Poder Executivo. I - coordenar e articular as ações no campo da assistência
§ 4o  Os Conselhos de que tratam os incisos II, III e IV do social;
art. 16, com competência para acompanhar a execução da política II - propor ao Conselho Nacional de Assistência Social
de assistência social, apreciar e aprovar a proposta orçamentária, (CNAS) a Política Nacional de Assistência Social, suas normas
em consonância com as diretrizes das conferências nacionais, gerais, bem como os critérios de prioridade e de elegibilidade,
estaduais, distrital e municipais, de acordo com seu âmbito além de padrões de qualidade na prestação de benefícios, serviços,
de atuação, deverão ser instituídos, respectivamente, pelos programas e projetos;
Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, mediante lei III - prover recursos para o pagamento dos benefícios de
específica. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) prestação continuada definidos nesta lei;

Didatismo e Conhecimento 85
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
IV - elaborar e encaminhar a proposta orçamentária da § 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado
assistência social, em conjunto com as demais da Seguridade pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade
Social; social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da
V - propor os critérios de transferência dos recursos de que pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei
trata esta lei; nº 12.435, de 2011)
VI - proceder à transferência dos recursos destinados à § 5o  A condição de acolhimento em instituições de longa
assistência social, na forma prevista nesta lei; permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com
VII - encaminhar à apreciação do Conselho Nacional de deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada
Assistência Social (CNAS) relatórios trimestrais e anuais de pela Lei nº 12.435, de 2011)
atividades e de realização financeira dos recursos; § 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da
VIII - prestar assessoramento técnico aos Estados, ao deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta
Distrito Federal, aos Municípios e às entidades e organizações de por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos
assistência social; peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro
IX - formular política para a qualificação sistemática e Social - INSS.     (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
continuada de recursos humanos no campo da assistência social; § 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de
X - desenvolver estudos e pesquisas para fundamentar as residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em
análises de necessidades e formulação de proposições para a área; regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo
XI - coordenar e manter atualizado o sistema de cadastro de que contar com tal estrutura. (
entidades e organizações de assistência social, em articulação com § 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser
os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-
XII - articular-se com os órgãos responsáveis pelas políticas de se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o
saúde e previdência social, bem como com os demais responsáveis deferimento do pedido. (       
pelas políticas socioeconômicas setoriais, visando à elevação do § 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de
patamar mínimo de atendimento às necessidades básicas; aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o
XIII - expedir os atos normativos necessários à gestão do § 3o deste artigo.      (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), de acordo com § 10.  Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins
as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Assistência do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo
Social (CNAS); de 2 (dois) anos.      (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
XIV - elaborar e submeter ao Conselho Nacional de Assistência
Social (CNAS) os programas anuais e plurianuais de aplicação dos Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto
recursos do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS). a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições
que lhe deram origem. (Vide Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
CAPÍTULO IV § 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que
Dos Benefícios, dos Serviços, dos Programas e dos forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de
Projetos de Assistência Social morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar
SEÇÃO I irregularidade na sua concessão ou utilização.
Do Benefício de Prestação Continuada § 3o O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras
ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas
Art. 20.  O benefício de prestação continuada é a garantia de de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem
um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com
65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por   § 4º  A cessação do benefício de prestação continuada
sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) concedido à pessoa com deficiência não impede nova concessão
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em
pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência regulamento.     (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)       
de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos
e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o Art. 21-A.  O benefício de prestação continuada será suspenso
mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) pelo órgão concedente quando a pessoa com deficiência exercer
§ 2o  Para efeito de concessão deste benefício, considera- atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor
se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de individual.     (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, § 1o  Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir de que trata o caput deste artigo e, quando for o caso, encerrado
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
condições com as demais pessoas.     (Redação dada pela Lei nº beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário,
12.470, de 2011) poderá ser requerida a continuidade do pagamento do benefício
§ 3o  Considera-se incapaz de prover a manutenção da suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou
pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse
capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação fim, respeitado o período de revisão previsto no  caput  do art.
dada pela Lei nº 12.435, de 2011) 21.      (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)

Didatismo e Conhecimento 86
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
§ 2o A contratação de pessoa com deficiência como aprendiz § 1º Os programas de que trata este artigo serão definidos
não acarreta a suspensão do benefício de prestação continuada, pelos respectivos Conselhos de Assistência Social, obedecidos os
limitado a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da objetivos e princípios que regem esta lei, com prioridade para a
remuneração e do benefício.     (Incluído pela Lei nº 12.470, de inserção profissional e social.
2011) § 2o  Os programas voltados para o idoso e a integração da
pessoa com deficiência serão devidamente articulados com o
SEÇÃO II benefício de prestação continuada estabelecido no art. 20 desta
Dos Benefícios Eventuais Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

Art. 22.  Entendem-se por benefícios eventuais as provisões Art. 24-A.  Fica instituído o Serviço de Proteção e Atendimento
suplementares e provisórias que integram organicamente as Integral à Família (Paif), que integra a proteção social básica
garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias e consiste na oferta de ações e serviços socioassistenciais de
em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade prestação continuada, nos Cras, por meio do trabalho social com
temporária e de calamidade pública.  (Redação dada pela Lei nº famílias em situação de vulnerabilidade social, com o objetivo
12.435, de 2011) de prevenir o rompimento dos vínculos familiares e a violência
§ 1o A concessão e o valor dos benefícios de que trata este no âmbito de suas relações, garantindo o direito à convivência
artigo serão definidos pelos Estados, Distrito Federal e Municípios familiar e comunitária. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
e previstos nas respectivas leis orçamentárias anuais, com base Parágrafo único.  Regulamento definirá as diretrizes e os
em critérios e prazos definidos pelos respectivos Conselhos de procedimentos do Paif. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Assistência Social. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2o  O CNAS, ouvidas as respectivas representações de Art. 24-B.  Fica instituído o Serviço de Proteção e
Estados e Municípios dele participantes, poderá propor, na medida Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi), que
das disponibilidades orçamentárias das 3 (três) esferas de governo, integra a proteção social especial e consiste no apoio, orientação e
a instituição de benefícios subsidiários no valor de até 25% (vinte acompanhamento a famílias e indivíduos em situação de ameaça
e cinco por cento) do salário-mínimo para cada criança de até 6 ou violação de direitos, articulando os serviços socioassistenciais
(seis) anos de idade. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) com as diversas políticas públicas e com órgãos do sistema de
§ 3o  Os benefícios eventuais subsidiários não poderão ser garantia de direitos. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Parágrafo único.  Regulamento definirá as diretrizes e os
cumulados com aqueles instituídos pelas Leis no 10.954, de 29 de
procedimentos do Paefi. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
setembro de 2004, e no 10.458, de 14 de maio de 2002. (Redação
dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Art. 24-C.  Fica instituído o Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil (Peti), de caráter intersetorial, integrante da
SEÇÃO III
Política Nacional de Assistência Social, que, no âmbito do Suas,
Dos Serviços
compreende transferências de renda, trabalho social com famílias
e oferta de serviços socioeducativos para crianças e adolescentes
Art. 23.  Entendem-se por serviços socioassistenciais as
que se encontrem em situação de trabalho. (Incluído pela Lei nº
atividades continuadas que visem à melhoria de vida da população 12.435, de 2011)
e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os § 1o  O Peti tem abrangência nacional e será desenvolvido
objetivos, princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei. (Redação de forma articulada pelos entes federados, com a participação da
dada pela Lei nº 12.435, de 2011) sociedade civil, e tem como objetivo contribuir para a retirada de
§ 1o  O regulamento instituirá os serviços crianças e adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos
socioassistenciais. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) em situação de trabalho, ressalvada a condição de aprendiz, a
§ 2o Na organização dos serviços da assistência social serão partir de 14 (quatorze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
criados programas de amparo, entre outros: (Incluído pela Lei nº § 2o As crianças e os adolescentes em situação de trabalho
12.435, de 2011) deverão ser identificados e ter os seus dados inseridos no
I - às crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal
social, em cumprimento ao disposto no art. 227 da Constituição (CadÚnico), com a devida identificação das situações de trabalho
Federal e na Lei no  8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da infantil. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Criança e do Adolescente); (
II - às pessoas que vivem em situação de rua. (Incluído pela SEÇÃO V
Lei nº 12.435, de 2011) Dos Projetos de Enfrentamento da Pobreza

SEÇÃO IV Art. 25. Os projetos de enfrentamento da pobreza


Dos Programas de Assistência Social compreendem a instituição de investimento econômico-social nos
grupos populares, buscando subsidiar, financeira e tecnicamente,
Art. 24. Os programas de assistência social compreendem iniciativas que lhes garantam meios, capacidade produtiva e
ações integradas e complementares com objetivos, tempo e área de gestão para melhoria das condições gerais de subsistência,
de abrangência definidos para qualificar, incentivar e melhorar os elevação do padrão da qualidade de vida, a preservação do meio-
benefícios e os serviços assistenciais. ambiente e sua organização social.

Didatismo e Conhecimento 87
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Art. 26. O incentivo a projetos de enfrentamento da pobreza III - Plano de Assistência Social.
assentar-se-á em mecanismos de articulação e de participação de Parágrafo único.   É, ainda, condição para transferência
diferentes áreas governamentais e em sistema de cooperação entre de recursos do FNAS aos Estados, ao Distrito Federal e aos
organismos governamentais, não governamentais e da sociedade Municípios a comprovação orçamentária dos recursos próprios
civil. destinados à Assistência Social, alocados em seus respectivos
Fundos de Assistência Social, a partir do exercício de 1999. 
CAPÍTULO V
Do Financiamento da Assistência Social Art. 30-A.  O cofinanciamento dos serviços, programas,
projetos e benefícios eventuais, no que couber, e o aprimoramento
Art. 27. Fica o Fundo Nacional de Ação Comunitária (Funac), da gestão da política de assistência social no Suas se efetuam por
instituído pelo  Decreto nº 91.970, de 22 de novembro de 1985, meio de transferências automáticas entre os fundos de assistência
ratificado pelo Decreto Legislativo nº 66, de 18 de dezembro de social e mediante alocação de recursos próprios nesses fundos nas
1990, transformado no Fundo Nacional de Assistência Social 3 (três) esferas de governo. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
(FNAS). Parágrafo único.  As transferências automáticas de recursos
entre os fundos de assistência social efetuadas à conta do orçamento
Art. 28. O financiamento dos benefícios, serviços, programas e da seguridade social, conforme o art. 204 da Constituição Federal,
projetos estabelecidos nesta lei far-se-á com os recursos da União, caracterizam-se como despesa pública com a seguridade social,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, das demais na forma do art. 24 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de
contribuições sociais previstas no art. 195 da Constituição Federal, 2000. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
além daqueles que compõem o Fundo Nacional de Assistência
Social (FNAS). Art. 30-B.  Caberá ao ente federado responsável pela utilização
§ 1o  Cabe ao órgão da Administração Pública responsável dos recursos do respectivo Fundo de Assistência Social o controle e
pela coordenação da Política de Assistência Social nas 3 (três) o acompanhamento dos serviços, programas, projetos e benefícios,
esferas de governo gerir o Fundo de Assistência Social, sob por meio dos respectivos órgãos de controle, independentemente
orientação e controle dos respectivos Conselhos de Assistência de ações do órgão repassador dos recursos. (Incluído pela Lei nº
Social. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) 12.435, de 2011)
§ 2º O Poder Executivo disporá, no prazo de 180 (cento e
oitenta) dias a contar da data de publicação desta lei, sobre o Art. 30-C.  A utilização dos recursos federais descentralizados
regulamento e funcionamento do Fundo Nacional de Assistência para os fundos de assistência social dos Estados, dos Municípios e
Social (FNAS). do Distrito Federal será declarada pelos entes recebedores ao ente
§ 3o O financiamento da assistência social no Suas deve ser transferidor, anualmente, mediante relatório de gestão submetido
efetuado mediante cofinanciamento dos 3 (três) entes federados, à apreciação do respectivo Conselho de Assistência Social, que
devendo os recursos alocados nos fundos de assistência social comprove a execução das ações na forma de regulamento. (Incluído
ser voltados à operacionalização, prestação, aprimoramento e pela Lei nº 12.435, de 2011)
viabilização dos serviços, programas, projetos e benefícios desta Parágrafo único.  Os entes transferidores poderão requisitar
política. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) informações referentes à aplicação dos recursos oriundos do seu
fundo de assistência social, para fins de análise e acompanhamento
        Art.  28-A.   Constitui receita do Fundo Nacional de de sua boa e regular utilização. (Incluído pela Lei nº 12.435, de
Assistência Social, o produto da alienação dos bens imóveis da 2011)
extinta Fundação Legião Brasileira de Assistência. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.187-13, de 2001) CAPÍTULO VI
Das Disposições Gerais e Transitórias
         Art. 29. Os recursos de responsabilidade da União
destinados à assistência social serão automaticamente repassados Art. 31. Cabe ao Ministério Público zelar pelo efetivo respeito
ao Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), à medida que se aos direitos estabelecidos nesta lei.
forem realizando as receitas.
Parágrafo  único.   Os recursos de responsabilidade da Art. 32. O Poder Executivo terá o prazo de 60 (sessenta)
União destinados ao financiamento dos benefícios de prestação dias, a partir da publicação desta lei, obedecidas as normas por
continuada, previstos no art. 20, poderão ser repassados pelo ela instituídas, para elaborar e encaminhar projeto de lei dispondo
Ministério da Previdência e Assistência Social diretamente ao sobre a extinção e reordenamento dos órgãos de assistência social
INSS, órgão responsável pela sua execução e manutenção. ( do Ministério do Bem-Estar Social.
§ 1º O projeto de que trata este artigo definirá formas de
Art. 30. É condição para os repasses, aos Municípios, aos transferências de benefícios, serviços, programas, projetos,
Estados e ao Distrito Federal, dos recursos de que trata esta lei, a pessoal, bens móveis e imóveis para a esfera municipal.
efetiva instituição e funcionamento de: § 2º O Ministro de Estado do Bem-Estar Social indicará
I - Conselho de Assistência Social, de composição paritária Comissão encarregada de elaborar o projeto de lei de que trata
entre governo e sociedade civil; este artigo, que contará com a participação das organizações dos
II - Fundo de Assistência Social, com orientação e controle usuários, de trabalhadores do setor e de entidades e organizações
dos respectivos Conselhos de Assistência Social; de assistência social.

Didatismo e Conhecimento 88
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Art. 33. Decorrido o prazo de 120 (cento e vinte) dias da o orçamento da seguridade social e a disponibilidade do Fundo
promulgação desta lei, fica extinto o Conselho Nacional de Serviço Nacional de Assistência Social (FNAS), poderá propor ao Poder
Social (CNSS), revogando-se, em consequência, os Decretos-Lei Executivo a alteração dos limites de renda mensal per capita
nºs 525, de 1º de julho de 1938, e657, de 22 de julho de 1943. definidos no § 3º do art. 20 e caput do art. 22.
§ 1º O Poder Executivo tomará as providências necessárias
para a instalação do Conselho Nacional de Assistência Social Art. 40. Com a implantação dos benefícios previstos nos arts.
(CNAS) e a transferência das atividades que passarão à sua 20 e 22 desta lei, extinguem-se a renda mensal vitalícia, o auxílio-
competência dentro do prazo estabelecido no caput, de forma a natalidade e o auxílio-funeral existentes no âmbito da Previdência
assegurar não haja solução de continuidade. Social, conforme o disposto na Lei nº 8.213, de 24 de julho de
§ 2º O acervo do órgão de que trata o caput será transferido, 1991.
no prazo de 60 (sessenta) dias, para o Conselho Nacional de §  1º  A transferência dos beneficiários do sistema
Assistência Social (CNAS), que promoverá, mediante critérios previdenciário para a assistência social deve ser estabelecida
e prazos a serem fixados, a revisão dos processos de registro e de forma que o atendimento à população não sofra solução de
certificado de entidade de fins filantrópicos das entidades e continuidade. (Redação dada pela Lei nº 9.711, de 20.11.1998
organização de assistência social, observado o disposto no art. 3º §  2º  É assegurado ao maior de setenta anos e ao inválido o
desta lei. direito de requerer a renda mensal vitalícia junto ao INSS até 31
de dezembro de 1995, desde que atenda, alternativamente, aos
Art. 34. A União continuará exercendo papel supletivo requisitos estabelecidos nos incisos I, II ou III do § 1º do art. 139
nas ações de assistência social, por ela atualmente executadas da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. 
diretamente no âmbito dos Estados, dos Municípios e do Distrito
Federal, visando à implementação do disposto nesta lei, por Art. 41. Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
prazo máximo de 12 (doze) meses, contados a partir da data da Art. 42. Revogam-se as disposições em contrário.
publicação desta lei.
Art. 35. Cabe ao órgão da Administração Pública Federal Brasília, 7 de dezembro de 1993, 172º da Independência e
responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência 105º da República.
Social operar os benefícios de prestação continuada de que trata
esta lei, podendo, para tanto, contar com o concurso de outros ITAMAR FRANCO 
órgãos do Governo Federal, na forma a ser estabelecida em Jutahy Magalhães Júnior
regulamento.
Parágrafo único. O regulamento de que trata o caput definirá
as formas de comprovação do direito ao benefício, as condições de
sua suspensão, os procedimentos em casos de curatela e tutela e o 6 PESQUISA SOCIAL. ELABORAÇÃO
órgão de credenciamento, de pagamento e de fiscalização, dentre DE PROJETOS, MÉTODOS E TÉCNICAS
outros aspectos. QUALITATIVAS E QUANTITATIVAS.

Art. 36.  As entidades e organizações de assistência social que


incorrerem em irregularidades na aplicação dos recursos que lhes
foram repassados pelos poderes públicos terão a sua vinculação A teoria é um conhecimento organizado, sedimentado, que
ao Suas cancelada, sem prejuízo de responsabilidade civil e muito embora tenha partido da realidade concreta, passou por
penal. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) um complexo processo de sucessivas abstrações, que ao mesmo
tempo o faz distanciar-se do concreto imediato e poder explicar
Art.  37.   O benefício de prestação continuada será devido uma realidade mais ampla, concentrando-se em apontar os
após o cumprimento, pelo requerente, de todos os requisitos elementos essenciais de um objeto construído nesse processo de
legais e regulamentares exigidos para a sua concessão, generalização e abstração.
inclusive apresentação da documentação necessária, devendo A pesquisa é uma das formas de se produzir conhecimento, que
o seu pagamento ser efetuado em até quarenta e cinco dias após foi se estruturando com o tempo, criando seus objetos e métodos,
cumpridas as exigências de que trata este artigo.  (Redação dada definindo as relações que os pesquisadores devem estabelecer
pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)         (Vide Lei nº 9.720, de com seus objetos de conhecimento, em um processo de discussão
30.11.1998) profundo e polêmico entre os cientistas.
Parágrafo único.  No caso de o primeiro pagamento ser feito Mas a prática profissional representa uma das possibilidades
após o prazo previsto no  caput, aplicar-se-á na sua atualização de se produzir conhecimento também. Alguns preferem denominar
o mesmo critério adotado pelo INSS na atualização do primeiro esta produção como um tipo de saber, e na pós-graduação
pagamento de benefício previdenciário em atraso. (Incluído pela de algumas áreas mais profissionalizadas, como é o caso do
Lei nº 9.720, de 30.11.1998) Serviço Social, tem-se valorizado o saber que se origina do fazer
profissional.
Art. 38.    (Revogado pela Lei nº 12.435, de 2011) O que é pesquisar para nós? Achamos que a pesquisa e
a produção de conhecimento só podem ser desenvolvidas na
Art. 39. O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), Universidade ou nas Instituições de Pesquisas? Ou só por
por decisão da maioria absoluta de seus membros, respeitados pesquisadores reconhecidos pela sociedade como tal?

Didatismo e Conhecimento 89
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Há pesquisas que contribuem para o avanço do conhecimento seletivas: percebemos de um fato vivido, de uma reunião
teórico ou que contestam teorias estabelecidas. É muito presenciada, as posturas e as “falas” que mais nos impactaram
frequente, na pós-graduação e em bancas, arguidores perguntarem: e tendemos a registrar na memória, apenas aquilo que mais nos
o que esse trabalho trouxe de contribuição para a teoria? Quer impressionou.
dizer, que novo conhecimento foi produzido? Confirmou as teorias Na prática profissional, no estágio ou na docência, é preciso
existentes? Aponta novos caminhos para a pesquisa? Diante disso, transformar as Observações Assistemáticas da realidade em
pode se restringir a noção de pesquisa com a pesquisa teórica e Observações Sistemáticas: este processo deve ser incorporado
acadêmica, bem como o lócus de produção do conhecimento pelos profissionais e pelos docentes e transmitido aos estudantes.
na universidade. E muitos chegam a pensar que se não estão na Esta é uma exigência para que o trabalho profissional se torne um
universidade, não estão produzindo conhecimento, e, não podem saber profissional. Mas como fazer isto?
ou não têm condições de pesquisar. Primeiro: preparar o processo de observação, como um Projeto
É certo que o desenvolvimento da pós-graduação e o que permita a observação o mais ampla possível dos processos que
apoio das agências de fomento, como o CNPq, a Capes, a estão ocorrendo na prática profissional, no estágio ou na prática
FINEP, e agências estaduais, no caso do Brasil, permitiram o docente.
desenvolvimento da pesquisa no país, bem como a constituição Segundo: Registrar Detalhadamente o que foi observado. É
difícil registrar o cotidiano: no dia-a-dia não dá tempo e na maioria
de grupos de pesquisadores e instituições de pesquisa que hoje
das vezes, o profissional não desenvolveu essa habilidade, e nem
podem ser consideradas como “ilhas de excelência” reconhecidas
sempre esta prática é considerada essencial nos planos de estágio.
internamente e algumas até internacionalmente. Esse apoio que
No entanto, vale a pena frisar: uma prática se só torna um
se prolonga por quase quatro décadas, foi fundamental para
saber sistemático se for observada e registrada detalhadamente.
o desenvolvimento de todas as áreas do conhecimento e para o Registrando-a de modo organizado e sistemático, podemos perceber
desenvolvimento dos Programas de Pós–Graduação, inclusive no ângulos e dimensões que não tínhamos percebido no momento em
Serviço Social. que os fatos estavam ocorrendo e, chegar a uma observação mais
No entanto, essa não é a única forma de produzir completa da realidade. Faz parte do arsenal profissional, do fazer
conhecimento, e nem a universidade e os institutos de pesquisa profissional, passar da observação assistemática da prática, para
são os únicos “lugares” para se desenvolver pesquisas. Há outras uma observação sistemática.
formas, e dentre elas, devemos destacar a pesquisa em serviços, Se conseguirmos cumprir esta exigência, já será possível
que necessariamente, não está produzindo um novo conhecimento apresentarmos uma Produção Importante sobre a Prática,
teórico, que muitas vezes não é valorizada pela academia, nem sistematizar o saber profissional. Caso contrário, o conhecimento
passa pelas provas que a academia considera legítimas, mas que advindo da prática, o saber fazer, terá um alcance muito pequeno
é uma pesquisa realizada na pratica e no cotidiano de muitas de disseminação: pode se perder ou quando muito, tornar-se
instituições e serviços. uma imagem “esfumaçada” na memória de alguns que dela
Não podemos esquecer que o Serviço Social é uma participaram.
profissão, e que na essência, somos profissionais embora também Outra decorrência importante da observação e do registro
pesquisadores e formadores. Esta é uma questão muito importante sistemático da prática cotidiana, é que eles nos permitem
para pensarmos a pesquisa no Serviço Social, pois é fundamental elaborar um diagnóstico mais preciso sobre a realidade e sobre
para o seu desenvolvimento que haja uma reflexão contínua sobre os problemas e os grupos populacionais com os quais estamos
sua prática, como uma forma de produzir conhecimento, tão lidando. Nas instituições em que os profissionais registram e
importante quanto à pesquisa acadêmica. analisam minimamente seu trabalho profissional, apresentam as
Na área social, pesquisas de tipo exploratório têm trazido observações e os resultados de forma sistematizada nas reuniões
contribuições muito importantes para a compreensão de questões de equipe ou para as direções, as contribuições dos Assistentes
novas que estão sendo percebidas na realidade concreta, Sociais se tornam valiosas para todos, podem fornecer subsídios
denominados de “temas emergentes”. A pesquisa exploratória para a tomada de decisões e o Serviço Social é Reconhecido pelas
permite uma aproximação de tendências que estão ocorrendo outras profissões e pelas direções.
Um diagnóstico mais preciso sobre a realidade, por sua
na realidade, para as quais não temos ainda conhecimento
vez, permite chegar-se a Propostas de Ação mais adequadas às
sistematizado nem bibliografia consolidada. Nestas condições é
necessidades, que devem ser acompanhadas durante o processo de
preciso consultar pessoas que tenham alguma experiência prática
implantação e avaliadas em seus resultados para o replanejamento.
em relação ao tema ou que elaboraram alguma observação, ainda
Participando ativamente de todas as etapas desse processo, os
que inicial, sobre os fenômenos que estão ocorrendo. profissionais e os estagiários terão a oportunidade de recompor
Este tipo de pesquisa pode ser um instrumento muito a Totalidade dos Processos de Trabalho em que estão envolvidos
importante para o trabalho profissional do Assistente Social e nas instituições, tornando sua própria pratica menos fragmentada,
também para a formação dos futuros profissionais. repetitiva e desligada de suas finalidades. O trabalho se torna mais
significativo para os profissionais à medida que eles dominam os
Da Observação Assistemática à Observação Sistemática processos de trabalham como um todo, contribuem e participam
das decisões. Reunir os momentos de observar, planejar, executar,
O trabalho no cotidiano permite uma observação muito avaliar e reformular as propostas para a ação prática permite
próxima dos fenômenos que estão ocorrendo. Mas estas ressignificar o processo de trabalho e a pratica profissional, bem
observações tendem a ser espontâneas assistemáticas e muito como produzir um novo saber profissional.

Didatismo e Conhecimento 90
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
O Que Usar? Metodologias Quantitativas ou Qualitativas? No que diz respeito aos serviços de saúde, tema importante
do Congresso Internacional e Ibero-Americano de Investigação
Devemos reconhecer que atualmente, apesar das dificuldades, Qualitativa em Saúde no México em 2003. Bosi e Mercado,
temos melhores condições de desenvolver a produção do (2004) os congressistas presentes apresentaram-se preocupados
conhecimento no Serviço Social, como em todas as áreas das com os desafios existentes no interior dos serviços e no âmbito
Ciências Humanas e Sociais. As experiências de Iniciação de sua investigação, chamando a atenção para a adequação das
Científica, ainda durante a graduação, embora sejam ainda abordagens qualitativas para o desenvolvimento do conhecimento
reduzidas numericamente, mostram tendência de crescimento; a nessa área.
exigência do Trabalho de Conclusão de Curso - TCC; algumas
pesquisas, realizadas pelos profissionais em seu campo de O Projeto de Pesquisa
trabalho; as monografias de especialização; as dissertações de
mestrado e as teses de doutorado têm incentivado a preocupação As pesquisas teóricas, metodológicas ou sobre a prática
dos Assistentes Sociais com relação à produção de conhecimento, exigem: uma preparação inicial passa pela etapa de execução (ou
ao domínio das metodologias de sua produção e à escolha dos trabalho de campo) e análise dos achados, e, por fim, pela etapa de
métodos e instrumentos de pesquisa mais adequados ao que apresentação e divulgação dos resultados.
desejam pesquisar.
Do ponto de vista metodológico, percebem-se no Serviço 1. Preparação ou Fase Exploratória da Pesquisa
Social nos últimos anos, uma valorização das pesquisas
qualitativas, dos estudos de casos, dos instrumentos e técnicas Para Deslandes (1994), é preciso no início decidir sobre
de entrevistas, principalmente entrevistas semiestruturadas, da o tema e o problema a ser pesquisado: a saúde representa uma
análise de conteúdo e de discurso. grande área de interesse para a pesquisa, mas é preciso dentro
Aproximamo-nos durante os anos 90 de uma visão muito dessa área definir especificamente o que se quer pesquisar. Por
interessante a respeito da discussão da relação sujeito-objeto, exemplo, certo aspecto da política, em um determinado período,
subjacentes à discussão da pesquisa-ação e da pesquisa participante. os princípios que a orientam, o controle social que existe na
E da reflexão sobre a necessidade de compartilhar o processo da área, os níveis de atenção à saúde, a organização dos serviços de
produção do conhecimento - seja científico ou popular. Devemos saúde, o acesso da população a eles, a satisfação/insatisfação da
aproximar esses dois tipos de conhecimento, para que eles se população com o que lhes é oferecido, os processos de trabalho
complementem e se fertilizem mutuamente. em saúde, o mercado de trabalho, as necessidades da população,
Discutindo a questão das pesquisas na saúde, Turato, (2003) as concepções de saúde e adesão aos tratamentos propostos, os
relembra que o termo “quantitativo” relaciona-se à ideia de sentidos que diferentes segmentos sociais atribuem às doenças,
mensuração e busca resposta para a pergunta “quanto”? Enquanto as relações entre condições de vida, trabalho e saúde, os riscos
o termo “qualitativo” busca responder a perguntas como “qual”? diferenciados de adoecer, as diferenças sociais e regionais do perfil
“Qual tipo”? de morbimortalidade, e, muitos outros.
A constituição do conhecimento metódico ocorreu entre O problema a ser pesquisador deve ser delimitado e
os séculos XVII e XIX, seguindo os princípios da observação apresentado sob a forma de uma Pergunta e Avaliarmos se
(controlada), da experimentação (reprodução dos fenômenos) e temos condições de pesquisá-lo (acesso às informações, tempo
da indução (regularidade matemática da repetição do fenômeno). disponível, competência, a conjuntura).
No século XIX, Claude Bernard incorporou os princípios na
área da medicina, passando o corpo humano a ser pesquisado 2. Justificativa da Escolha do Problema de Pesquisa
experimentalmente, tendo a fisiologia como modelo para o
entendimento dos fenômenos das áreas biomédicas (Turato, 2003). Razões da escolha de tal problema, relevância teórica,
Este pensamento expandiu-se na área da saúde, e procurou-se metodológica ou social do problema, contribuições para o
expandir o uso do mesmo modelo nas Ciências Humanas e Sociais conhecimento ou grupos sociais a serem beneficiados com os
com pouco sucesso. resultados.
Já no século XX as Ciências Humanas e Sociais concentraram-
se mais nos métodos qualitativos de pesquisa, também denominados 3. Objetivos da pesquisa
de compreensivo-interpretativos. E tem havido certa disputa entre
as duas áreas de conhecimento, com defesas e questionamentos O que se pretende conhecer com a pesquisa (Objetivo Geral)
das pesquisas de caráter qualitativo pelas Ciências Básicas. No e as metas específicas a serem alcançadas (Objetivos Específicos).
entanto, nos últimos anos, vem se firmando entre os pesquisados
a ideia de os métodos quantitativos e os qualitativos devem ser 4. Definição da Base Teórica e Conceitual da Pesquisa
vistos como Complementares o que pode levar a um melhor
desenvolvimento das pesquisas com objetos complexos. É a base de sustentação da pesquisa, deve ser obtida através
Nesta perspectiva, Barros et. alii, (2003), afirmam que de uma pesquisa bibliográfica sobre o problema, lendo-se vários
determinados objetos e problemas de pesquisa, dado seu caráter autores, que produziram sobre o tema de ângulos diferentes ou que
contextual, complexo e multicausal, podem ser menos controlados apresentam posicionamentos controversos sobre o tema. Outras
e necessitam de métodos e técnicas diferenciadas de investigação. pesquisas produzidas sobre o mesmo assunto, e, se possível, realizar
Minayo e Minayo, (2001) consideram que os estudos na área da entrevistas exploratórias com pessoas que tenham experiência com
saúde devem usar as metodologias qualitativas para captar o” o problema, mas que não foram publicadas. O material obtido
significado e a intencionalidade” inerentes aos atos, às relações e nesta etapa deve ser fichado, e, as referências bibliográficas e as
às estruturas sociais. citações, devem ser anotadas conforme as normas da ABTN.

Didatismo e Conhecimento 91
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
5. Formulação de hipóteses ou pressupostos para a pesquisa b) Típicas: quando se seleciona para a pesquisa os casos
típicos, que tenham as características do universo. Isto exige um
A hipótese é uma pressuposição que se faz sobre o problema razoável conhecimento prévio do problema e do universo da parte
que se quer estudar, baseada numa reflexão teórica, nas leituras do pesquisadores;
prévias, nas entrevistas com especialistas e também na sua própria c) Cotas: considerando-se as características dos integrantes
observação sobre a realidade. É uma resposta prévia para o do universo, constrói-se uma maquete que o represente, com
problema que se vai investigar e que poderá ser confirmada ou não presença de todos os elementos na amostra, na mesma proporção
ao final da pesquisa. Para Minayo, (1992) e Quivy e Campenhoudt, em que aparecem no universo.
(1998), as hipóteses são afirmações provisórias sobre o problema.
Para Gil, (1987) as hipóteses podem surgir também da intuição 8. Técnicas ou instrumentos de pesquisa
do pesquisador, evidentemente de uma intuição sustentada pela
leitura, observação prévia ou experiência prática com respeito ao As técnicas mais usadas nas pesquisas são as observações,
problema. os questionários, as entrevistas, histórias de vida e a análise de
documentos.
6. Metodologia As observações podem ser assistemáticas quando são
realizadas de modo ocasional e informalmente, mas devem
Definir o tipo de estudo que será adotado. Serão usadas transformar-se em observações sistemáticas: planejar o que será
metodologias quantitativas, ou qualitativas ou ambas. Quais serão observado, em que condições e como serão feitos os registros.
as fontes de informação: as informações originais colhidas pelo Pode ser externa (quando o pesquisador o faz a observação de
próprio pesquisador são denominadas de fontes primárias. Quando fora da situação), participante (quando o pesquisador se insere na
se recorre a dados já existentes em instituições, associações ou situação ou no grupo investigado), individual ou em equipe.
trabalhos de outros pesquisadores; estamos lidando com fontes O questionário é um instrumento de pesquisa, constituído
secundárias de informação. pôr uma série ordenada de perguntas referentes ao tema de
Define-se neste momento o que será observado, quantos serão pesquisa. Quando o Questionário é enviado para os pesquisados
entrevistados, o que representam do universo de envolvidos com o responderem diretamente, precisa ser acompanhado de uma carta
problema, isto é, a Amostra que deverá representar a totalidade; o com explicações claras para o preenchimento correto, mas mesmo
mesmo ocorre com os documentos que serão analisados no conjunto
assim a porcentagem de respostas e devolução costuma ser muito
de documentos existentes quando pretendemos desenvolver uma
pequena. Quando o próprio pesquisador aplica pessoalmente o
pesquisa documental; há que definirem-se ainda os instrumentos
instrumento nos pesquisados, este é denominado de Formulário.
a serem utilizados para a coleta de informações (observação,
Os questionários e formulários apresentam perguntas objetivas,
questionários, entrevistas, análise de documentos), etc.
muitas vezes com alternativas de respostas já codificadas, mas
podem conter também algumas perguntas abertas. Antes de
7. Amostragem
serem aplicados os formulários ou enviados os questionários,
No geral se trabalha com uma amostra da realidade e as o instrumento de coleta deve passar por um pré - teste, isto é,
amostras podem ser probabilísticas ou não probabilísticas. As ser aplicado em algumas pessoas que tenham características
probabilísticas são usadas em pesquisas quantitativas, buscando- semelhantes àquelas que farão parte das amostras, para se verificar
se uma representatividade do universo. As amostras não se há necessidade de modificar as perguntas ou a sequência delas.
probabilísticas são mais usadas em pesquisas qualitativas, e estão As entrevistas são os instrumentos mais usados nas pesquisas
preocupadas em captar a diversidade do universo. sociais, porque além de permitirem captar melhor o que os
As amostras probabilísticas mais usadas são: pesquisados sabem e pensam, permitem também ao pesquisador,
a) Aleatórias simples: quando se procura garantir a mesma observar a postura corporal, a tonalidade da voz, os silêncios, etc.
possibilidade de compor a amostra para cada um dos componentes Podem ser Padronizadas, Estruturadas ou Semiestruturadas,
do universo. Fazemos uso de sorteios, com numeração prévia de quando o pesquisador apenas coloca alguns tópicos para o
cada elemento componente do universo; pesquisado expressar o que pensa sobre eles.
b) Sistemáticas: usadas quando os elementos do universo As histórias de vida: é um tipo particular de entrevista, em
estão ordenados: em listagens, em arquivos, em uma rua. Por geral uma serie delas, em que se busca reconstituir a vida toda,
exemplo: queremos ter uma amostra de 10 % delas. Sorteamos a ou uma fase ou um aspecto da vida da pessoa (como profissional,
primeira entre os dez primeiros, e depois escolhemos as demais de como paciente, como docente, como estudante). As histórias de
dez em dez; vida permitem também ao pesquisador perceber as concepções
c) Estratificadas: usadas quando a totalidade das pessoas que as pessoas têm de seu papel e de sua participação nos grupos
pode ser subdividida em subgrupos ou estratos pôr faixas de dos quais fazem parte (família, trabalho, política, religião, etc.),
idade, renda, religião, profissão, escolaridade ou outros critérios. e podem ser complementadas com outros tipos de informações,
Sorteia-se certo número de elementos em cada estrato para compor sobre os processos sociais referidos pelos pesquisados, através da
a amostra final, conservando na amostra, a mesma proporção em pesquisas em jornais, revistas, documentos, relatórios ou outras
que cada estrato participa na totalidade. pesquisas.
As amostras não probabilísticas podem ser: A análise de documentos: é dirigida a textos escritos que
a) Intencionais: quando se deseja, por exemplo, obter a opinião podem servir como fonte de informação para a pesquisa: planos,
ou conhecer a situação de determinadas pessoas ou serviços, por programas, leis, decretos, artigos, atas, relatórios, ofícios,
sua especificidade e não representatividade do universo; documentos, panfletos, etc.

Didatismo e Conhecimento 92
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
9. Recursos necessários, composição da equipe e cronograma teremos uma distribuição bimodal, com três ou mais valores que se
de execução. multiplicam, temos uma distribuição multimodal;
b) Média aritmética (M): soma dos valores de todos os dados
Definir os recursos financeiros, materiais e equipamentos obtidos, dividida pelo número de casos;
necessários; a equipe que vai desenvolver a pesquisa (currículo e c) Mediana (Md): valor abaixo do qual estão metade dos casos
atribuições); as etapas de execução e o tempo previsto para cada estudados e acima do qual está a outra metade;
uma delas (seleção e treinamento da equipe, coleta de dados, análise d) Quartil: os quartis dividem a distribuição dos valores em
do material coletado, conclusões, relatório final e divulgação). quatro partes iguais (até 25%, até 50%, até 75% e até 100%);
e) Amplitude: é uma medida que nos mostra o quanto os dados
10. Comissão de Ética na Pesquisa obtidos estão variando, entre o valor mínimo e o valor máximo da
Todo projeto de pesquisa deve passar por uma comissão de distribuição;
ética, na instituição de ensino ou nos serviços, e anexando ao f) Gráficos: para Marconi e Lakatos (1988), os gráficos
mesmo um termo de Consentimento Informado, a ser assinado apresentam os resultados de uma pesquisa, de uma maneira que
pelos pesquisados, após receber as informações do pesquisador
facilita a visão do conjunto de uma vez só.
sobre os objetivos da pesquisa e a garantia de sigilo sobre a fonte
Os gráficos lineares são os mais usados, apresentado os dados
de informação.
através de linhas retas ou curvas: são muito interessantes para
Fase de Execução Trabalho de Campo e Análise dos Dados demonstrar a tendência de variação das informações colhidas e do
problema de pesquisa.
Segundo Cruz Neto, (1994), a aproximação do pesquisador Há ainda os gráficos de coluna (usa-se retângulos alongados
das pessoas selecionadas para a pesquisa, poderá ser facilitada no sentido vertical) e os gráficos de barra (retângulos no sentido
se o pesquisador já tiver um relacionamento anterior com elas horizontal).
ou se puder contar com a ajuda de outras pessoas para facilitar E há os gráficos circulares, sendo o mais usado o de setores,
a aproximação. É importante apresentar de início a proposta de mostrando a proporção de cada elemento no conjunto.
pesquisa aos grupos envolvidos e incorporar as contribuições que
essas pessoas possam dar à proposta. Os pesquisadores, além de Análise de Dados Qualitativos
registrarem as informações obtidas nas entrevistas, questionários
e observações planejadas, devem fazer anotações de tudo que Para pesquisas que usam entrevistas semiestruturadas, histórias
acontece no trabalho de campo (Caderno ou Diário de Campo). de vida, depoimentos, artigos, documentos, filmes, cartazes,
As entrevistas devem ser agendadas com antecedência, em desenhos etc. Esses tipos de instrumentos de pesquisa permitem
local adequado, solicitando- se quando for o caso, permissão dos revelar sentimentos, valores ou concepções mais profundas dos
pesquisados para gravá-las. A aplicação de formulários deve seguir entrevistados do que os questionários e formulários, que no geral,
o mesmo procedimento. É preciso prever o tempo que levará obtém informações mais superficiais, opiniões mais estereotipadas
cada procedimento, contar com recusas ou perdas de pessoas e racionalizadas. Procede-se análise da seguinte forma:
selecionadas (daí ter uma reserva maior de pessoas selecionadas a) Elaboração e preparação do material: realizadas e gravadas
nas amostras). as entrevistas, depoimentos ou histórias de vida, elas deverão
ser transcritas, na íntegra ou através de recortes sobre o tema em
Preparo dos Dados para Análise Quantitativa questão; a transcrição deve ser realizada logo após a gravação, e,
se possível, pelo pesquisador ou por quem realizou as entrevistas,
A “análise” é um processo de descrição dos dados coletados para garantir a fidedignidade ao que foi dito pelos pesquisados;
e a “interpretação” é um processo de reflexão sobre o que foi b) Definição das categorias de análise: ou pelo menos deve-
descrito, à luz de conhecimentos mais amplos, que extrapolam os
se definir linhas orientadoras para a análise (Queiroz, 1988). Ler
dados da pesquisa ou comparam esses dados com outras pesquisas
mais de uma vez todo o material transcrito ou os documentos
semelhantes. A análise de dados quantitativos passa pelas seguintes
selecionados e levantar as categorias de análise, isto é, as questões
operações:
a) estabelecimento de categorias para a análise; que aparecem no material coletado e como os pesquisados se
b) codificação das informações; posicionam frente a eles. As categorias de análise são os recortes a
c) tabulação e distribuição de frequências: colocação dos partir dos quais o material coletado no campo será analisado;
dados em tabelas para verificar as relações que apresentam entre c) Para Michelat (apud Thiollent, 1987), as pesquisas que
si, e apresentação dos dados sob a forma de frequências absolutas usam entrevistas não diretivas, histórias de vida ou mesmo
(n.º), frequências relativas (%) e frequências acumuladas. Podemos entrevistas menos estruturadas, são realizadas com um número
também cruzar uma ou mais variáveis entre si, como por exemplo: reduzido de entrevistados e quantificar os resultados não tem
escolaridade e acesso aos serviços de saúde. valor estatístico. Recomenda-se uma apresentação inicial do perfil
social dos entrevistados (sexo, idade, profissão, escolaridade,
Análise Estatística e Construção de Tabelas, Quadros e procedência etc.), para que se possa saber de que “lugar social”
Gráficos. fala o entrevistado;
d) Análise de conteúdo: Pode-se inicialmente proceder a análise
As medidas de Posição Central mais usadas são: semântica (do vocabulário usado) e proceder depois à análise do
a) Moda (Mo): é o valor mais frequente encontrado na conteúdo, isto é, das ideias contidas nos vários instrumentos de
distribuição das respostas, aquele que se repete o maior número de comunicação. Há técnicas de análise de caráter quantitativo e de
vezes. Quando temos mais de um valor que se repete, neste caso caráter qualitativo na análise de conteúdo. Organização do material

Didatismo e Conhecimento 93
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
após uma leitura profunda para definir: as unidades de registro
(palavras, frases, orações, temas, acontecimentos, personagens...); 7 PLANEJAMENTO DE PLANOS,
as unidades de contexto (contexto do qual faz parte a mensagem); PROGRAMAS E PROJETOS SOCIAIS.
as categorias de análise e separar os trechos mais significativos;
proceder a análise propriamente dita do material.
Bardin, (1979) apresenta várias técnicas de análise de conteúdo
e Minayo, (1992) faz uma proposta para análise de conteúdo em Nossa vida cotidiana é cercada de planejamento, o homem em
dois níveis: sua essência planeja desde que toma consciência de sua importância
No primeiro, apresentar a conjuntura socioeconômica e e contribuição para o meio social. Assim, serão apresentadas neste
política da qual faz parte o grupo de entrevistados, sua história e trabalho as aproximações que compõe o processo de planejamento
inserção no contexto sócio histórico mais geral; e que exige do planejador o movimento de reflexão-decisão-
No segundo, apresentar as observações de condutas, costumes, ação. O planejamento é um processo racional que precisa de uma
o teor das comunicações de cada indivíduo. sequência antecipada de tempo não se manifestando em um dado
momento, mas sim realizando-se de foram contínua ao longo da
Conclusões, Recomendações, Divulgação e Relatório. história passando por vários estágios.
O planejamento social é um instrumento de fundamental
A conclusão da pesquisa deve compreender quatro partes: importância para o desenvolvimento de trabalho do profissional
a) Retrospectiva rápida do que se pretendia com o trabalho de Serviço Social, pois este tem necessidades de conhecer e
(objetivos, hipóteses mais importantes, conceitos que a embasaram) compreender a realidade do planejamento para que o profissional
e procedimentos que utilizou; consiga realizar intervenções com qualidade. Serão apresentadas
b) Apresentação dos principais resultados a que chegou; as etapas do planejamento, a divisão de conceitos e a importância
c) Contribuições para o conhecimento da temática que do mesmo para a profissão e para o profissional.
abordou novas questões que suscitou;
d) Recomendações de ordem pratica ou profissional se for o A importância do planejamento social
caso;
e) Devolução dos resultados aos pesquisados: estes devem O presente texto se apropria das ideias de Marx para
constituir o primeiro grupo a tomar conhecimento dos resultados compreender seu método de interpretação da realidade social para,
preliminares para que possam pronunciar-se, fazer sugestões e então, aplicá-lo no âmbito da profissão de serviço social. O modo
ouvir as explicações dos pesquisadores. Estes devem incorporar como Marx compreende a práxis do planejamento, possibilita
o máximo possível, as sugestões dos entrevistados no Relatório entender de maneira mais completa a totalidade social e todas as
Final para divulgação; suas contradições. Marx compreende que o ato de planejar é de
f) Divulgação dos resultados: o mesmo material deve ser natureza do ser humano, o ser humano projeta em sua mente o ato
apresentado em várias “versões”: uma para o meio científico, para depois executar e antes de executar qualquer ato ele planeja.
outra mais resumida para as reuniões, uma cartilha ou manual para Isso é consciência teleológica.
a população, um artigo para revista especializada, um texto para O planejamento social busca utilizar de forma harmônica o
divulgação na mídia; planejamento estratégico, ampliando a participação dos vários
g) relatório final: deve estar constituído pelas seguintes partes: níveis profissionais existentes dentro da sociedade. Nesse
- Capa (título, autor, orientador, entidade responsável, data, sentido, a tomada de decisão se torna elemento fundamental, pois
cidade); corresponde com as diferentes escolhas dentro do processo. Um
- Folha de Rosto (idem acima); elemento importante no planejamento social é a operacionalização,
- Agradecimentos (se houver); onde relaciona as atividades necessárias para efetuar as decisões
- Resumo (de uma página); tomadas. Nessa fase o planejador social (o assistente social)
- Relação de tabelas e gráficos (se existirem); deve acompanhar a implantação, o controle e a avaliação do
- Sumário; planejamento do projeto social que o mesmo for implantar em
1 - Introdução (pesquisa realizada, importância, objeto, determinada instituição pública ou privada. O planejamento é
objetivos, disposição dos capítulos); um processo contínuo e dinâmico, tendo o planejamento como
2 - Revisão da bibliografia relacionada ao tema; uma decisão de planejar o movimento de reflexão-decisão-ação
3 - Esquema de Investigação (procedimentos empregados, que o caracteriza vai se realizando de acordo com as seguintes
fontes de dados, metodologia e organização da pesquisa de campo); aproximações. São elas:
4 - Apresentação, análise e interpretação dos resultados; - 1ª a 5ª aproximação: Reflexão
5 - Resumo e Conclusões; Delimitação do objeto/reconstrução do objeto; Estudo
6 – Recomendações; de situação; Construção de referenciais teórico-práticos;
7 - Anexos (se houver: figuras, questionários ou roteiros, Levantamento de hipóteses preliminares e Coleta de dados.
documentos, circulares etc.). - 6ª a 8ª aproximação: Decisão
8 – Bibliografia. (Texto adaptado de MARSIGLIA, R. M. G.). Organização e análise; Identificação de prioridades de
intervenção e Definição de objetivos e estabelecimento de metas.
- 9ª a 13ª aproximação: Ação

Didatismo e Conhecimento 94
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
Planificação; Implementação; Implantação e execução e O planejamento é um processo feito a partir de uma realidade,
Definição de parâmetros de avaliação e Controle. de um estudo de uma situação, que deve ser considerado sob o
Estas aproximações são apresentadas nessa sequência, mas panorama de um conjunto dinâmico de informações durante esse
na prática esses processos muitas vezes alteram essa ordem. processo. Esse conjunto de informações deverão se constituir
Compreende-se que as aproximações da 1ª a 5ª relacionam-se como em recursos básicos e permanentes para o planejamento da ação,
fase de reflexão, as aproximações de 6ª a 8ª são reconhecidas como localizando, compreendendo, controlando e prevendo as situações
fase de decisão e as aproximações de 9ª a 13ª são reconhecidas de um modo geral, fornecendo elementos que permita mostrar
como fase de ação. Podemos assim entender que o processo de
alternativas de intervenção. O estudo da situação nada mais
planejamento faz parte de uma contínua análise, ou seja, se inicia
é que a reflexão, a compreensão, a explicação e a expressão de
com a reflexão de uma situação e simultaneamente o processo,
devendo ser este contínuo, cíclico e reflexivo. Marx denomina este causas antes dos dados da realidade em relação ao seu conjunto de
processo de união do pensamento e da ação como práxis social. aspectos especiais.
É neste cotidiano que estabelecemos a compreensão para que as - Construção de referenciais teórico-práticos
decisões elaboradas no planejamento sejam concluídas. Para a construção de referenciais teóricos temos que entendê-
A realidade social, ou seja, a práxis, é determinante das los como conhecimentos que alimentam o estudo das situações
relações sociais, fato que engloba aspectos políticos e econômicos. para que haja o planejamento e podem ser de natureza: cientifica,
Dessa maneira, entendemos que é dentro da realidade que o documental, técnicos e periódicos. Seu principal objetivo é a
planejamento torna-se etapa indispensável para que se chegue a análise e a exposição da realidade que será planejada. Nesse
um resultado final dentro do processo. Para tanto, detalharemos processo precisamos conhecer a realidade de um modo geral,
todas as três fases do Planejamento outrora mencionado. São elas: torna-se necessário a união do pensamento e da ação, a realidade
- (Re)Construção do objeto social apresenta várias dimensões, sendo elas: sociais, culturais,
Essa aproximação é o primeiro passo para o processo de psicológicas, políticas e econômicas.
planejamento social. É necessário saber o que planejar e qual o
Os estudos devem ser organizados de uma forma simples
segmento da realidade que será colocado em desafio, inicia-se
assim essa etapa compreendida como processo de reflexão. Nesta e clara para que possa ser confrontado com os dados concretos,
etapa consideramos a realidade onde será formulado o conjunto sendo assim deve se fazer uma operacionalização dos conceitos
de proposições para uma intervenção mais qualificada, e ao que serão ou foram trabalhados. A operacionalização dos
delimitarmos o objeto de intervenção, estaremos olhando de fora conceitos é o estabelecimento da relação entre os elementos da
para dentro, confrontando as ações planejadas com as mudanças situação juntamente com os elementos que não são observáveis.
que ocorrem na realidade. Para operacionalizar os conceitos é necessário observar o objeto
É importante ter em mente qual planejamento que será de estudo e os fatos a ele relacionados, com a observação de
realizado em uma realidade, em qual conjuntura, em qual estudo podem-se encontrar diferentes elementos para serem
organização especifica e quais práticas que serão utilizadas, e trabalhados. Desta maneira, segundo Baptista o profissional deve
assim têm-se a capacidade de formular mudanças. sempre compreender essa realidade posta de forma que “essa
A reconstrução do objeto é o movimento que traduz a relação, teoria possibilite formular seu esquema de análise trazendo-lhe
a ação e o conhecimento. Segundo Baptista, “o profissional precisa referência, supostos, concepções amplas [...] que lhe vai permitir
se preparar, [...] conhecer suas representações, seus sistemas e
apreender a realidade” (BAPTISTA, 2007).
valores, suas noções e práticas [...]” (BAPTISTA, 2007). A cada
mudança que o planejador faz ele está construindo um novo - Levantamento de pressupostos
conhecimento sobre novas situações e esse processo é cíclico e O levantamento de pressupostos ou hipóteses é estabelecido
constante em todas as relações sociais. na hora da elaboração teórica podendo ser desenvolvido de forma
- Estudo de situação implícita ou explícita, como o planejamento social trabalha com
Segundo Baptista (2007), o estudo de situação compõe-se da o ser humano, e por esses estarem sob um processo de evolução
descrição interpretativa, da caracterização, da compreensão e da constante, os resultados ficam aproximados e não exatos, uma vez
explicação de uma situação para o planejamento, determinando que há mudanças constantes nas estruturas sociais e políticas a que
suas limitações. O estudo da situação é o conjunto de informações os indivíduos estão inseridos. Assim, segundo Marx,
que provém em contribuição para tomar decisões, ampliando o “O fato, portanto, é o seguinte: indivíduos determinados,
conhecimento das realidades concretas. O objeto do planejamento que como produtores atuam de um modo também determinado,
não pode ser tratado separadamente, devem se levar em estabelecem entre si relações políticas e sociais determinadas.
consideração as propostas que estejam abertas às modificações É preciso que, em cada caso particular, a observação empírica
perante a sociedade. Alguns objetivos, segundo Mattelart podem
coloque necessariamente em relevo empiricamente e sem qualquer
ser considerados como estudo de situação:
especulação ou mistificação - a conexão entre a estrutura social e
“Configuração do marco de situações ou de antecedentes,
acompanhada de análise compreensiva e explicativa de suas política e a produção.” (MARX, 1996).
determinações; a Identificação sistemática e contínua das áreas - Coleta de dados
críticas e de necessidades, a que se pode acrescentar, ainda, de A partir da busca e do levantamento de informações, dá-se
oportunidade e de ameaças; a Determinação de elementos que início a coleta de dados, onde o planejador consegue relacionar
permitam justificar a ação sobre o objeto; o Estabelecimento de as informações que já foram anteriormente organizadas, consegue
prioridades; a Análise dos instrumentos e técnicas que podem ser programar as investigações e pesquisa as situações que forem
operados na ação; a Identificação de alternativas de intervenção.” necessárias para que haja um aprofundamento para iniciar a
(Mattelart apud BATISTA, 2007). tomada de decisão.

Didatismo e Conhecimento 95
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
A coleta de dados deve se ater a alguns aspectos como: coleta planificação da ação, o projeto pressupõe a indicação aos resultados
de dados de situação; dados da instituição; dados das políticas perseguidos. É o instrumental mais próximo da execução, devendo
públicas, da legislação, do planejamento jurídico, da rede de apoio detalhar as atividades a serem desenvolvidas, estabelecer prazos e
existente e os dados da prática. Os dados de situação constituem- especificar recursos”.
se em objetivos do estudo. Estes estabelecem a compreensão - Implementação
do objeto que está em ação, estabelecendo assim a natureza e a Para a implementação, destacamos a estratégia como um
problemática desse objeto. Os dados levantados estão ligados à conjunto de ações e está ligada à realidade do homem desde os
realidade e com os fatores de ordem social, econômica e cultural primórdios, sendo que esta se constitui em um conjunto amplo
que compõem os problemas e as possibilidades. Sendo assim os de ações e providências “destinado a viabilizar o seu avanço
dados de situação procura entender a dimensão do objeto da ação com a maior segurança possível [...]. Mobilizando, motivando e
que está em questão, como está sendo percebido pelas pessoas, condicionando colaboradores para atingir um elenco de objetivos
pela sociedade e pelos profissionais. previamente estabelecidos” (PINTO, 2004).
- Organização e análise Dessa maneira, a implementação abrange a coordenação e
A fase de organização e análise inicia um novo processo que a integração de todas as áreas do planejamento de um processo,
não se desmembra dos demais, todavia inicia uma nova fase que é a precisa da colaboração, da competência técnica e gerencial de
da decisão. É nessa fase que o planejador social deve se aprofundar todos os envolvidos para a resolução das problemáticas, assim faz-
na observação, pois nessa fase que se descrevem os dados e os se necessário a articulação e interdisciplinaridade para que haja a
interpreta de maneira organizada, sistemática e analítica. Observar implementação das soluções.
se os dados obtidos durante a investigação são suficientes para - Implantação e execução
proporcionar respostas ao objetivo proposto. Depois destas A implantação é instituir na prática todas as ações que já foram
observações damos início ao processo de olhar atentamente para planejadas, arquitetadas e avaliadas ao longo do tempo, passando a
os dados coletados cumprir os passos dos objetivos estabelecidos de forma criteriosa
- Definição de objetivos e estabelecimento de metas para que essa execução se dê de forma contundente. Todavia, é
A definição dos objetivos e o estabelecimento das metas dão o naturalmente compreensível que onde o plano estabelecido for
real sentido e fundamento ao processo de planejamento. A função implantado tornar-se alvo de insatisfação e/ou incompreensão por
específica do objetivo é posicionar a organização, orientar a ação, razões de peculiaridades, uma vez que ao se trabalhar com pessoas,
definir o ritmo do planejamento, motivar os atores envolvidos atores de sua própria história haja opiniões distintas.
no processo, facilitar a avaliação de desempenho e incorporar a
- Parâmetros de Avaliação e Controle
racionalidade, entre outros. Este pode também ser classificado em
A avaliação é o caminho onde o planejador poderá aferir a
três aspectos: Se é um objetivo geral ou específico; a média de
efetividade e o impacto que sua ação e decisão tiveram sobre as
tempo previsto a ser utilizado; se é a longo, médio ou curto prazo
outras etapas do processo. Por ser este processo dinâmico e contínuo
e a delimitação de forma, se são quantitativos e/ou qualitativos.
deve ser pautado sempre na reflexão. Já o controle é o instrumento
Dessa maneira, os objetivos e metas “deverão ser conquistados
que verifica o que já foi previsto e o que está acontecendo. O
para transformar a visão em realidade, [...] (pois) buscam alcançar
controle define os parâmetros de avaliação, o estabelecimento
resultados especificados em um tempo pré-estipulado” (TAVARES,
e a verificação dos pontos de controle, a correção dos possíveis
2005).
Após todas as etapas anteriores que foram a Reflexão e a desafios e a reflexão contínua do processo em análise.
Decisão, temos uma nova etapa que não se desmembra das demais, Mesmo que por algum motivo o planejador social venha a se
mas as completa de forma sucinta e eficiente que é a fase da Ação. desviar de seus propósitos iniciais há que se voltar atrás, avaliar o
- Planificação refletir cautelosamente a respeito das decisões tomadas a respeito
No processo de planejamento, e a planificação é realizada de seu trabalho, para que futuras falhas e erros não impeçam o
depois de passar por um conjunto de decisões. Decisões essas que contínuo andamento desse processo que deve ser dinâmico e
são sistematizadas, interpretadas e detalhadas em documentos que responsável em todas as esferas da vida social dos cidadãos que
apresentem níveis de decisão composto por diversificados planos, dele necessitarem.
programas e projetos. Contudo, o planejamento é um importante aliado ao exercício
O plano demarca as decisões gerais do sistema, suas estratégias do trabalho profissional, pois permite antecipar possíveis e certas
e suas diretrizes e deve ser formulado de forma clara e simples. mudanças do ambiente externo em que a sociedade está inserida
São organizados os objetivos e metas. continuamente. O planejamento deve ser tratado como um
O programa detalha os documentos por setores, ou seja, processo primordial ao trabalho profissional, pois é um método
faz projeções detalhadas das informações que são consideradas aplicado para a intervenção profissional, ou seja, o profissional
específicas em relação aos níveis, modalidade e especificação do deve investigar e analisar a realidade para assim propor uma
setor. intervenção eficaz.
O projeto estabelece-se como documento que estabelece um Para o profissional de serviço social o planejamento deixa de
plano prévio da operação de um conjunto de ações, é também a ser um método de estudo e passa a ser um procedimento importante
racionalização das decisões. Na planificação o projeto vem antes para a profissão, torna-se instrumento essencial para compreender
da indicação dos resultados, é instrumento que está mais próximo a profissão que trabalha com e na realidade, profissão esta que
da execução, sendo assim faz-se o detalhamento das atividades que precisa repensar suas práticas para atender as mais diversas
serão desenvolvidas estabelecendo-se os prazos e especificando os realidades e expressões da questão social que surgem no cotidiano
recursos que serão utilizados. Para Zanoni e Bogado (2009) “como profissional. (Texto adaptado de VIEIRA, R. C.)

Didatismo e Conhecimento 96
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
da PNAS e para a implementação do Sistema Único de Assistência
8 AVALIAÇÃO DE PROGRAMAS Social - SUAS. Trata-se, pois, de construção prioritária e
SOCIAIS. fundamental que deve ser coletiva e envolver esforços dos três
entes da federação”. Assim as igrejas, entidades, ONG´s têm papel
investigativo e de alta relevância à sociedade.
Segundo Evelyne Leandro, em seu artigo “Avaliação e
A partir da compreensão da complexidade das políticas monitoramento de projetos” as ONG´s em sua maioria procuram
públicas e de sua importância na construção da hegemonia atentar mais focadamente ao funcionamento do serviço público
política, a avaliação e monitoramento dos projetos sociais nos por meio do fortalecimento dos conselhos gestores e movimentos
aspectos macro e micros sociais, torna processo de avaliação e sociais. Mas com a inserção do capital privado, como também
monitoramento etapa crucial, principalmente os de relevância na participação de entidades não governamentais, entidades
social. associativas, igrejas na prestação de serviços públicos, sobretudo no
Avaliação e monitoramento são concebidos segundo Samira controle social, recai sobre as tais, a responsabilidade implementar
Kauchakje (2007), em seu livro Gestão Públicos de Serviços processos continuados de avaliação e monitoramentos dos projetos
Sociais, como: e programas sociais, que garantam a transparência na aplicação dos
“(...) processo contínuo, estando presente em todos os momentos financiamentos. Logo as iniciativas privadas (igrejas, associações
do projeto. Permite identificar problemas no desenvolvimento do etc.) também se tornaram alvo de monitoração e avaliação por
projeto e suas possíveis causas, de modo a antecipar medidas para parte do governo e da sociedade em geral.
a recondução das atividades conforme o planejado ou de acordo Para Eveline a monitoração e a avaliação precisam acontecer
com necessidade de novos direcionamentos” respectivamente, pois:
Logo, avaliação enquanto processo continuado e “O monitoramento consiste, basicamente, em acompanhar o
sistematizado traz aos projetos a possibilidade de readequação as andamento do projeto no dia-a-dia (...) possibilita a identificação
diversas variações das premissas que podem levar ao sucesso ou de problemas e possibilita solução. A avaliação, por sua vez,
a ineficiência de sua execução. Conforme Samira, a avaliação não destina-se a verificação dos indicadores quantitativos e qualitativos
deve ser executada como etapa final de implementação de projetos, (...) onde são postos à prova os mecanismos de gestão adotados
mas devem ser conjugados a cada etapa de execução. pela entidade. A avaliação permite identificar pontos críticos
Neste sentido, destaca Kauchakje a correlação quanto ao e proporciona a resolução desses antes que comprometam o
objetivo da avaliação e aquilo que se deseja dar visibilidade. resultado final do projeto.”
Destacam-se as seguintes metodologias e seus objetivos: Verifica-se então que o sucesso do projeto está intimamente
a) Avaliação de processo _ relação custo e benefício _
ligado a um bom processo de monitoramento e avaliação do
eficácia e eficiência;
mesmo atrelado à capacidade de interpretação e problematização
b) Avaliação de impacto _ impacto sobre o diagnóstico _
das premissas que lhe são inerentes.
efetividade;
Destaca-se ainda que o acesso a financiamentos sociais, ou a
c) Avaliação política _ processo de aprendizado _ impactos
continuidade de seu fornecimento tem como pré-requisito básico
sociais;
a transparência do emprego destes recursos, que só podem ser
Evidencia-se, portanto, a inevitabilidade de se diagnosticar
obtidas através da contínua avaliação e monitoração dos serviços
a situação na qual imerge o objeto de intervenção missionária
e assim se possa inferir medidas, ações, alterações no projeto executados pelos mesmos.
confessional que está sendo executado a fim de que este alcance os Contudo, a avaliação social teve no Brasil seu tardio
resultados planejados. reconhecimento enquanto ferramenta de validação de projetos
Da mesma forma, pode-se atribuir a capacidade de explicitar sociais. A importância, embora indiscutível na atualidade, é
possíveis premissas que oferecem risco ou podem potencializar contraposta às poucas inovações postas nos projetos sociais.
a missão, à atividade avaliativa (inserida no processo). São a A crescente demanda por serviços públicos, advindos do
partir destas práticas que se desenham ações interventivas que acirramento das desigualdades sociais, da falta de acesso às
culminarão no êxito do programa ou de um projeto. riquezas produzidas pela sociedade, traz ao programa/projeto,
profissional na assistência social, a dificuldade de se reservar
De avaliadores e monitoradores a avaliados e monitorados tempo para validar dados, elaborar documentos, sistematizar
atendimentos, reduzindo a atuação profissional ao atendimento das
A sociedade civil, segundo Gramsci, tem sua definição demandas sociais.
delineada enquanto “Estado Ético” como classe (aparelho privado, A incorporação de meios de avaliação e monitoração de
no qual a igreja constitui-se como meio) que busca a hegemonia projetos ou de programas assistenciais representa um grande
e tem por meio do consenso e da coerção, estratégias de galgar o desafio aos assistentes sociais. A capacidade de focar atividades
poder. Por conseguinte configura-se imprescindível sua fiscalização e delas extrair indicadores sociais requer do programa/projeto o
do funcionamento do equipamento público seja na monitoração ou domínio metodológico e um acúmulo teórico-prático das diversas
na avaliação através dos conselhos gestores. dimensões da assistência social.
Segundo a PNAS no item 3.1.7 sobre a Informação, O fortalecimento da igreja, da sociedade civil e dos movimentos
Monitoramento e Avaliação, contata-se e o processo continuado sociais em espaços que possibilitem o controle e a participação
de avaliação e monitoramento “são providências urgentes e social é essencial à consolidação das políticas públicas e legitima
ferramentas essenciais a serem desencadeadas para a consolidação meios democráticos do país.

Didatismo e Conhecimento 97
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
É preciso, portanto buscar a superação de ações cujo a) Contribuir para a viabilização da participação efetiva da
planejamento equivocado às necessidades sociais que acarretarão população usuária nas decisões institucionais.
no desperdício do financiamento público, da igreja, dos b) Denunciar falhas nos regulamentos, normas e programas da
mantenedores, além de reproduzirem diferenças sociais que instituição em que trabalha, quando os mesmos estiverem ferindo
assolam a população brasileira. (Texto adaptado de RIBAS, S. os princípios e diretrizes deste Código, mobilizando, inclusive, o
Gestão de Políticas, Programas e Projetos Sociais). Conselho Regional, caso se faça necessário.
c) Devolver as informações colhidas nos estudos e pesquisas
QUESTÕES aos/às usuários/as, no sentido de que estes possam usá-los para o
fortalecimento dos seus interesses.
1 - A Questão social, reformulada e redefinida nos diferentes d) Esclarecer aos/às usuários/as, ao iniciar o trabalho, sobre os
estágios capitalistas, persiste substantivamente em saber a mesma. objetivos e a amplitude de sua atuação profissional.
Julgue as afirmativas acerca dos pilares centrais da estrutura da
questão social: 6 - A utilização de instrumentos e técnicas que operacionalizam
I - Relação capital/Trabalho.
a ação profissional do assistente social é fundamental, mas é
II - Problemas e grupos sociais que podem colocar em xeque
preciso considerar que as técnicas (instrumentos) por si só não
a ordem social.
conseguirão compreender a realidade social do indivíduo, por que:
III - Expressão das manifestações das desigualdades e
a) É necessário o conhecimento teórico do profissional
antagonismo ancorados nas condições próprias da sociedade.
embutido nesses instrumentos.
Assinale a alternativa CORRETA:
a) Apenas as afirmativas I e II estão corretas. b) É necessário que o profissional saiba utilizar corretamente
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas. as técnicas.
c) Apenas a afirmativa III está correta. c) O profissional deve buscar sempre novas técnicas para
d) Todas as afirmativas estão corretas. auxiliá-lo em seu cotidiano profissional.
d) Não é necessário conhecimento teórico do profissional
2 - As funções de Proteção Social, de Vigilância embutido nesses instrumentos.
Socioassistencial e de Defesa de Direitos, de acordo com a Lei
Orgânica da Assistência Social (Lei nº. 8.742/93 e alterações 7 - Sobre a evolução histórica do Serviço Social no Brasil
posteriores) são consideradas: assinale a alternativa “incorreta”:
a) Objetivos da Política de Assistência Social. a) Nos anos 20 e 30 ocorre a emergência e institucionalização
b) Benefícios da Política de Assistência Social. do Serviço Social como especialização do trabalho, sob influência
c) Serviços da Política de Assistência Social. católica europeia. Com ênfase nas ideias de Mary Richmond e nos
d) Programas e Projetos da Política de Assistência Social. fundamentos do Serviço Social de Caso, a técnica está a serviço da
doutrina social da Igreja.
3 - A Proteção Social no Brasil é configurada pelo tripé da b) Nos anos 40 e 50 o Serviço Social brasileiro recebe
Seguridade Social, que de acordo com Constituição Federal de influência mexicana. Marcado pelo tecnicismo bebe na fonte
1988 compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa da psicanálise, bem como da sociologia de base positivista e
dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os funcionalista/sistêmica. Sua ênfase está na ideia de ajustamento e
direitos relativos à: de ajuda psicossocial.
a) Saúde, Previdência e Assistência Social. c) Nos anos 60 e 70 há um movimento de renovação na
b) Previdência Social, Saúde e Educação. profissão, que se expressa em termos tanto da reatualização do
c) Saúde, Assistência Social e Educação. tradicionalismo profissional, quanto de uma busca de ruptura
d) Previdência e Assistência Social. com o conservadorismo. O Serviço Social se laiciza e passa a
incorporar nos seus quadros segmentos dos setores subalternizados
4 - A liberdade, primeiro princípio defendido pelo Código de
da sociedade. Estabelece interlocução com as Ciências Sociais
Ética do Assistente Social de 1993, tem como valor os seguintes
e se aproxima dos movimentos “de esquerda”, sobretudo do
componentes:
sindicalismo combativo e classista que se revigora nesse contexto.
a) Compromisso com a autonomia, a expansão do
d) Nos anos 80, inaugura-se o debate da Ética no Serviço
assalariamento e a estatização plena.
b) Compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena Social, buscando-se romper com a ética da neutralidade e com
expansão do assalariamento. o tradicionalismo filosófico fundado na ética neotomista e no
c) Compromisso com a autonomia, o pluralismo e o controle humanismo cristão.
dos movimentos sociais.
d) Compromisso com a autonomia, emancipação e plena 8 - A constituição da saúde, como direito do cidadão brasileiro,
expansão dos indivíduos sociais. remete à busca da equidade, em termos de:
a) Qualidade, acesso e disponibilidade.
5 - De acordo com Código de Ética do Assistente Social de b) Qualidade, disponibilidade e focalização.
1993, são deveres do (a) assistente social nas suas relações com os c) Acesso, organização e centralização.
(as) usuários (a)s, EXCETO: d) Acesso, focalização e centralização.

Didatismo e Conhecimento 98
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
9 - Qual é a denominação que se dá ao processo de participação o predomínio do direito privado. Em um contexto no qual o trabalho
popular que visa definir, executar e acompanhar as políticas é a pedra angular da ordem social, exsurgiu a seguridade social como
públicas e as políticas de governo é chamado de: elemento de relevância nuclear para o desenvolvimento e a manutenção
a) Integração social. da dignidade da pessoa humana, sendo-lhe atribuída a tarefa hercúlea -
b) Controle social. ideal quase inatingível, mas que deve ser incessantemente perseguido
c) Ação social e comunitária. - de garantir a todos um mínimo de bem-estar nas situações geradoras
d) Controle das políticas. de necessidade social. (Daniel Machado da Rocha, José Paulo
Baltazer Júnior e Andrei Ptten Velloso. Comentários à lei do custeio
10 - Sobre a recente evolução do conceito de responsabilidade da seguridade social. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora,
social, considere as afirmativas abaixo. 2005, p. 23-4 (com adaptações)).
I - O conceito de responsabilidade social corporativa vem
amadurecendo quanto à capacidade de sua operacionalização Tendo o texto acima como referência inicial, assinale a opção
e mensuração, subdividindo-se em vertentes do conhecimento, incorreta.
tais como, por exemplo: responsividade social corporativa, a) A formação de um sistema de proteção social no Brasil, a
performance social corporativa e inovação social, entre outras. exemplo do que se verificou na Europa, se deu por um lento processo
II - Desde o início do século XX, após os debates filosóficos de reconhecimento da necessidade de que o Estado intervenha para
sobre a obrigação de as corporações promoverem o avanço suprir deficiências da liberdade absoluta - postulado fundamental
tecnológico, os termos responsabilidade social corporativa e do liberalismo clássico -, partindo do assistencialismo para o
responsividade social corporativa passaram a ter seus conceitos seguro social, e deste para a formação da seguridade social.
associados. b) O Brasil só veio a conhecer verdadeiras regras de caráter
III - No final do século XX, a literatura sobre responsabilidade geral em matéria de previdência social no século XX. Antes,
e responsividade social corporativa, por ter passado a ser alvo de apesar de haver previsão constitucional a respeito do tema, apenas
atenção de autores da área acadêmica ligada à ética dos negócios, em diplomas isolados aparecia alguma forma de proteção contra
assumiu um aspecto mais normativo. infortúnios.
É correto o que se afirma em c) A doutrina majoritária considera como marco inicial da
a) I, apenas previdência social brasileira a publicação do Decreto Legislativo
b) II, apenas n.º 4.682/1923, mais conhecido como Lei Eloy Chaves, que criou
c) I e III, apenas as caixas de aposentadoria e pensões nas empresas de estradas
d) II e III, apenas de ferro existentes, sistema mantido e administrado pelo Estado,
e) I, II e III sendo certo que, antes da referida norma, não havia no Brasil
diploma legislativo instituidor de aposentadorias e pensões.
11 - Com relação à responsabilidade corporativa, analise as d) A Constituição de 1934 foi a primeira a estabelecer, em
afirmativas a seguir. texto constitucional, a forma tripartite de custeio: contribuição dos
I. O comportamento ético-social das empresas é determinante trabalhadores, dos empregadores e do poder público.
no exercício da responsabilidade social interna. e) O RGPS, nos temos da CF atual, não abriga a totalidade
II. O comportamento ético-social das empresas é determinante da população economicamente ativa, mas somente aqueles
no exercício da responsabilidade social externa. que, mediante contribuição e nos termos da lei, fizerem jus aos
III. O comportamento ético-social das empresas pode ser benefícios, não sendo abrangidos por outros regimes específicos
determinante no exercício da responsabilidade social interna e de seguro social.
externa.
Assinale: Obs. Nas alternativas 13 a 15 utilizar C – certo e E - errado
a) se somente a afirmativa I estiver correta.
b) se somente a afirmativa II estiver correta. 13. Acerca das demandas e estratégias do serviço social em
c) se somente a afirmativa III estiver correta. empresas, julgue os itens subsequentes como certo (C) ou errado (E).
d) se somente as afirmativas I e II estiverem corretas.
e) se todas as afirmativas estiverem corretas. a. A técnica do trabalho com redes é uma estratégia de
intervenção capaz de atender às mais diversas demandas, em
12 - Após lenta evolução do sentimento de responsabilidade conformidade com a atuação multiprofissional do serviço social
social pelo infortúnio alheio, e em face das preocupantes convulsões nas empresas, podendo ser utilizada de forma genérica e por
que afetavam o tecido social, o Estado restou obrigado a abandonar qualquer profissional, visto que não requer abordagem específica.
a postura de mero espectador da atividade econômica e social, b. Além de trabalhar com responsabilidade e certificação
com o objetivo de restabelecer um equilíbrio mínimo nas relações social, o profissional da área de serviço social é requisitado para
sociais. Essa situação é realizada mediante a edição de leis que intervir em problemas que, de alguma forma, interferem no
alteram a disciplina geral do direito privado, reduzindo o espaço processo de produção da empresa, como acidentes, alcoolismo,
até então ilimitado da autonomia da vontade, e pela instituição de absenteísmo e conflitos familiares.
políticas de inclusão social, as quais geram obrigações jurídicas c. O trabalho do serviço social tem a peculiaridade de atuar na
para o Estado no atendimento aos mais necessitados. Surgiu o contradição capital/trabalho, pois o assistente social age tanto no
estado de bem-estar social ou welfare state, que, propiciando uma processo de produção e reprodução dos interesses de preservação
integração mais efetiva entre o Estado e a sociedade, acabou com do capital, quanto nas demandas do trabalhador.

Didatismo e Conhecimento 99
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social
d. A entrevista do assistente social, instrumento importante 9. B
no atendimento às demandas dos trabalhadores e de suas famílias, 10. C
deve ser realizada com planejamento prévio, finalidade clara e 11. E
disposição para escuta. 12. C
e. A flexibilização dos processos de trabalho, bem como a 13. a. E b. C c. C d. C e. C
acumulação capitalista e as inovações tecnológicas causaram 14. a. C b. C c. E
efeitos também para os assistentes sociais nas empresas, traduzidos 15. a. C b. C c. C d. E e. E
na exigência de um profissional multidisciplinar, com raciocínio
lógico e disposição para novas aptidões.

14. A respeito de planejamento e intervenção na área social, ANOTAÇÕES


julgue os itens a seguir como certo (C) ou errado (E)..
a. A fim de que a organização possa de fato alcançar os
objetivos propostos, o planejamento estratégico deve prever o
consenso, uma vez que nas instituições e organizações existem
conflitos e interesses contraditórios.
—————————————————————————
b. Compatibilidade e coerência interna são qualidades
esperadas de um projeto nas relações entre suas partes e nas —————————————————————————
relações com outros níveis de programação.
c. O planejamento é a etapa de sistematização das atividades e —————————————————————————
procedimentos necessários ao alcance de resultados e metas, cuja
unidade básica e elementar é o programa. —————————————————————————
—————————————————————————
15. Julgue os itens seguintes, acerca da saúde do trabalhador e
das exigências apresentadas a assistentes sociais. —————————————————————————
a. A expressão saúde do trabalhador surgiu no final dos anos
70 do século passado no contexto de debates relativos à reforma —————————————————————————
sanitária brasileira, influenciada pelo movimento da reforma —————————————————————————
sanitária italiana.
b. O trabalho do assistente social no campo da saúde do —————————————————————————
trabalhador deve ser realizado em consonância com o projeto
profissional atual, segundo o qual cabe ao profissional mediar —————————————————————————
com o coletivo de trabalhadores e intervir sobre determinantes de —————————————————————————
problemas relacionados ao processo produtivo.
c. Novas formas de gestão da força de trabalho e precarização —————————————————————————
de relações sob a reestruturação produtiva contribuem para
surgimentos de patologias decorrentes da sobrecarga, como —————————————————————————
o burnout, uma síndrome psicológica resultante de estresses —————————————————————————
interpessoais crônicos no trabalho.
d. Os programas de saúde devem priorizar atividades de —————————————————————————
recuperação da saúde daqueles trabalhadores que já adoeceram
ou sofreram algum acidente em detrimento de trabalhadores que —————————————————————————
ainda não tiveram manifestações de problemas de saúde.
—————————————————————————
e. A necessidade de uma direção essencialmente técnica para
desenvolvimento de ações nesse campo predomina em debates —————————————————————————
profissionais de assistentes sociais acerca da saúde do trabalhador,
que é entendida como expressão concreta das contradições das —————————————————————————
relações sociais de produção.
—————————————————————————
Gabarito —————————————————————————

1. D —————————————————————————
2. A
—————————————————————————
3. A
4. D —————————————————————————
5. B
6. A —————————————————————————
7. B
8. A —————————————————————————

Didatismo e Conhecimento 100


CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social

ANOTAÇÕES

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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social

ANOTAÇÕES

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ANOTAÇÕES

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