O poema "Mãe", de Antero de Quental, descreve o desejo do eu lírico de encontrar conforto nos braços de uma figura materna idealizada. Ele deseja escapar de sua existência dolorosa retornando à inocência da infância. No entanto, esta figura materna deve ser encarnada no "tu", sugerindo um hibridismo entre a relação mãe-filho e o amor romântico.
O poema "Mãe", de Antero de Quental, descreve o desejo do eu lírico de encontrar conforto nos braços de uma figura materna idealizada. Ele deseja escapar de sua existência dolorosa retornando à inocência da infância. No entanto, esta figura materna deve ser encarnada no "tu", sugerindo um hibridismo entre a relação mãe-filho e o amor romântico.
O poema "Mãe", de Antero de Quental, descreve o desejo do eu lírico de encontrar conforto nos braços de uma figura materna idealizada. Ele deseja escapar de sua existência dolorosa retornando à inocência da infância. No entanto, esta figura materna deve ser encarnada no "tu", sugerindo um hibridismo entre a relação mãe-filho e o amor romântico.
O poema que vou hoje apresentar chama-se Mãe e é de Antero
de Quental e faz parte de “sonetos completos”. Antero de Quental foi um poeta e filósofo do Romantismo, considerado um dos maiores sonetistas portugueses; integrou a questão coimbrã, na qual foi líder e traduz a ansiedade do poeta e a necessidade de se sentir protegido, para se poder afastar dela como vamos ver agora.
Podemos dividir o poema em 3 partes, a primeira (as duas
quadras em que o sujeito lírico enuncia qualidades que desejaria ver no ‘tu’. Assim, nesta parte, o eu-poético mostra-se dececionado com a vida, com a sua existência, ao ponto de desejar ser levado pela "mãe", acompanhá-Ia no sono eterno, para poder voltar a viver em paz, acarinhado por ela e desprezando a sabedoria que adquiriu enquanto adulto. Manifesta o desejo de voltar a ser criança para ser feliz, porque só assim seria inconsciente e poderia voltar a dormir em paz. O poema constitui um todo coeso, porque nele se reflete o desejo de o sujeito poético alcançar a tranquilidade nos braços daquela que identifica como mãe e que, neste sentido, o podia acarinhar e proteger Uma segunda, que compreende o primeiro terceto e os dois primeiros versos do segundo terceto, em que revela a sua reação caso do eu-poético qualidades se efetivem. O eu-poético mostra que estaria disposto a abdicar da sua dignidade e sofisticação intelectual, referências metonímicas que apontam expressivamente para a sua maturidade, regredindo então para um estado pueril, na condição de usufruir do afeto do «tu» (representado pela metáfora do «seio») E uma última, a chamada ‘chave de ouro’, em que remata o seu pensamento com um desfecho engenhoso, ou seja, que a sua felicidade depende de a amada corresponder à figura materna. Desde o ínicio do poema verificamos o tom pessimista do poeta que o faz largar tudo o que a vida terrena lhe oferecera e vemos isto em "viver dorido", "noite de tal frio", "pobre existir", “sítio mais sombrio". Desta forma o tom do poema adquire um tom de confissão devido à lamentação por ter levado uma vida que o conduziu ao desespero. Na última parte a mãe surge como uma referência idealizada, que é o garante da fuga a uma realidade adversa, que o ‘eu’ pretende ver projetada no ‘tu’. Assim, surge-nos então duas relações de natureza opostas que se fundem: a relação mãe-filho e a relação entre amantes, inferindo-se daqui que o sujeito poético parece submeter as suas emoções de ordem romântica às suas necessidades afetivas relativamente à figura materna, porventura mercê da relação afetuosa que tinha com ela — a forma de tratamento que usava para se lhe dirigir em correspondência Formalmente, antes de mais, estamos obviamente perante um soneto petrarquiano, com verso decassilábico e o esquema rimático ABBA / ABBA / CDC / EDE, ou seja, rima emparelhada e interpolada nas quadras e interpolada e cruzada nos tercetos, simetria que denuncia o primor formal dos sonetos anterianos. Em termos de desenvolvimento do tema, o texto divide-se em três sequências lógicas: uma primeira, equivalente às duas quadras, em que o sujeito lírico enuncia qualidades que desejaria ver no ‘tu’; uma segunda, compreendida entre o primeiro terceto e os dois primeiros versos do segundo terceto, em que revela a sua reação caso essas qualidades se efetivem; e uma última, a ‘chave de ouro’, em que exprime a ideia fulcral do texto, ou seja, que a sua felicidade depende de a amada corresponder à figura materna. Na primeira parte, o ‘eu’ começa por introduzir o lexema-chave, «Mãe», que destaca aqui com a aplicação do travessão (no seguimento do título «Mãe…», em que as reticências marcam já o carácter emocional da entidade materna) e passa depois a descrever as benesses que pretende que essa figura desejada lhe traga (note-se o uso do conjuntivo), nomeadamente tranquilidade (veja-se como as aflições são perifrasticamente referidas como «viver dorido» (passagem que se destaca também pelo recurso à hipálage), calor («E me vele esta noite de tal frio») e a reparação da sua desintegração – supomos – psíquica, representada pela metáfora do «fio […] meio partido» (com novo recurso à hipálage, através do adjetivo «pobre»), sendo que a multiplicidade de efeitos benéficos enumerada é realçada através da anáfora em «E». Essa «Mãe» deverá ainda protegê-lo das experiências negativas (repare-se na expressividade da imagem, com recurso à metáfora do sono, no verso «Que me leve comsigo [sic], adormecido», e da sombra, no verso «Ao passar pelo sítio mais sombrio…»), por ter um poder regenerador e esclarecedor (mais uma vez, note-se o valor expressivo das metáforas da «alma», para o seu equilíbrio emocional, e do «rio», para os poderes purificadores da entidade materna: «Me banhe e lave a alma lá no rio / Da clara luz do seu olhar querido…»). Na segunda parte do poema, o sujeito lírico descreve então as suas reações perante a consecução do seu desejo: estaria disposto a abdicar da sua dignidade e sofisticação intelectual, referências metonímicas que apontam expressivamente para a sua maturidade, regredindo então para um estado pueril, na condição de usufruir do afeto do «tu» (representado pela metáfora do «seio»): «Eu dava o meu orgulho de homem – dava / Minha esteril [sic] sciencia [sic], sem receio, / E em debil [sic] criancinha me tornava, // Descuidada, feliz, docil [sic] tambem [sic], / Se eu pudesse dormir sobre o teu seio». Finalmente, na última parte, surge, como ficou referido, a ‘chave de ouro’ do soneto: tudo isto aconteceria — as benesses maternas e o regresso à infância — se o ‘tu’, que é identificado através da apóstrofe «querida», a qual, pela sua conotação romântica, nos permite inferir que haverá entre ambos uma relação de natureza amorosa, assumisse, para alegria do sujeito poético (note-se a exclamação), a conduta de «mãe»: «Se tu fosses, querida, a minha mãe!» Verificamos, desta forma, que, neste soneto anteriano, a mãe surge como uma referência idealizada, garante da fuga a uma realidade adversa, que o ‘eu’ pretende ver projetada no ‘tu’. Assim, surge-nos um curioso hibridismo emocional, em que duas relações de natureza divergente se fundem: a relação mãe-filho e a relação entre amantes, inferindo-se daqui que o sujeito poético parece submeter as suas emoções de ordem romântica às suas necessidades afetivas relativamente à figura materna, porventura mercê da relação afetuosa que tinha com ela — a forma de tratamento que usava para se lhe dirigir em correspondência, «querida Mamã», e a fórmula de despedida «[…] seu / Filho muito obediente e amigo» serão disso prova inequívoca.