Vous êtes sur la page 1sur 14

SÍNTESE DA RELEVÂNCIA, NATUREZA E TAREFA DA TEOLOGIA

A Teologia e o Povo de Deus – Panorama Histórico

A Teologia é um termo que ainda provoca diversas reações nos evangélicos, de várias
confessionalidades, em plena pós-modernidade.
Opiniões divergentes estão em todos os grandes segmentos da Igreja Evangélica Brasileira.
No Protestantismo Histórico/Tradicional/Reformado, a Teologia ora foi vista como parceira
fundamental e ora como ameaça à Igreja; no último caso, a situação agravou-se sob a égide do
endeusamento da razão.
E há segmento que historicamente interpretou a Teologia como possível obstrução à autêntica
espiritualidade. Esse foi o caso do Pentecostalismo, sobretudo em décadas passadas. Presumia-se que
o “apego” às letras (ou seja, estudar com afinco) poderia sufocar o “fogo” do Espírito Santo.
Há também a ala dita evangélica que quer libertação plena da Teologia. E há razão para tanto. A
Teologia que tem como fundamento cabal e permanente a Bíblia, e não a demanda do mercado
religioso, jamais aprovará certos disparates que estão sendo praticados em nome de Deus no afã de
atrair pessoas, mantê-las cativas e se apropriar de suas posses. Esse é o caso do Neopentecostalismo,
no qual se encontra o que temos denominado de igrejas/religião de mercado, expoentes de ensinos
centrados exclusivamente na dimensão material da vida; a maioria das igrejas da referida modalidade,
com pouca exceção, preconiza êxito econômico-financeiro, saúde psicofísica e felicidade às pessoas
que “aceitam” Jesus Cristo, é claro, pagam para receber as compensações terrenas almejadas.

Questionamentos Iniciais relevantes

Afinal, por que a Teologia tem sido tão desprezada, tanto dentro quanto fora da ambiência
religiosa? E o que é “Teologia”? Ela tem amparo bíblico? Está restrita aos “teólogos profissionais” ou
é acessível à comunidade de fé? Quais benefícios ela pode proporcionar à Igreja Evangélica Brasileira?
Quais são as categorias principais da reflexão teológica?
Vamos, nesta disciplina de Prolegômenos, em busca de algumas respostas para os referidos
questionamentos. O primeiro desafio é procurar compreender por que a Teologia, há séculos, vem
sendo mal vista e mal interpretada, tanto dentro quanto fora da ambiência religiosa.

Hipóteses ao repúdio à reflexão teológica

Afirmar que a Teologia ainda não é bem vista no âmbito evangélico brasileiro e não analisar as
possíveis razões pouco contribui na luta para superar tal problema. Logo, embora de maneira sucinta,
apontarei pistas que há séculos podem estar por detrás da atual ojeriza à Teologia.

1. Externamente, o cenário acadêmico racional-científico-prático, há décadas, tem se mostrado


hostil à fé cristã e à Teologia.

Essa tendência ao emprego sistemático da razão amplificou-se após a Reforma Protestante. Os


racionalistas, fazendo apologia ao livre exame da realidade, preconizaram a libertação cabal do
conhecimento controlado pela tradição cristã. A Teologia, doravante, como previu Francis Bacon,
deixaria de ser a forma orientadora do pensamento. O Renascimento e o Iluminismo ajudaram a
materializar a declaração de Bacon.
Outro fator que contribuiu para conduzir e manter a Teologia numa posição marginal, inclusive
no Brasil, foi o Positivismo. Veja mais detalhes, no Manual de Iniciação à Teologia, especialmente na
primeira parte.

2. A Igreja Evangélica, por outro lado, está inserida numa sociedade cuja grande maioria da
população ironicamente se apoia na ignorância.
Luiz Sayão explica que apesar de estar equipado com as últimas novidades da ciência, o ser
humano hodierno, quando se volta para a interpretação da vida, da ética, de sua expressão religiosa, a
tendência generalizada é a de rejeitar o uso da razão.
Em síntese, a maioria das pessoas jamais vai além do “senso comum”, isto é, da forma
“ametódica de observar, vivenciar e dizer a experiência”.

3. Outro elemento determinante, nesta era pós-modernista, é o predomínio da experiência sobre a


razão.

O Dr. Roldán justificou que é conveniente notar que nestes tempos, o religioso se expressa com
forte ênfase da experiência sobre a explicação da fé (razão).6 Doravante, o analfabetismo cultural e a
imensa ignorância teológica e bíblica proliferam em muitas igrejas enquanto experiências
mirabolantes e questionáveis são aceitas e enaltecidas.

A capacitação “teológica” na História do povo de Deus – da antiguidade à atualidade

A Teologia, embora seja uma ferramenta essencial à Igreja Evangélica no Brasil, não tem sido
apreciada, reconhecida nem usada como deveria. Por isso o objetivo desta disciplina do Curso de
Capacitação Teológica é despertar no alunado o interesse pela Teologia que responda aos desafios
atuais e incentivá-lo a se qualificar para servir a Deus e às pessoas, com excelência. É vital, portanto,
compreender como essa capacitação fez parte da trajetória do povo de Deus.
A Teologia se fez presente na educação religiosa do povo judaísta, desde as eras mais remotas.
Especialistas em ensino religioso cristão, afirmam corretamente que os patriarcas, entre outras
atribuições, foram os principais encarregados de educar os filhos nos santos caminhos de Deus. A
partir de Moisés, já se percebe a formalidade presente no ensino religioso dos hebreus; o libertador de
Israel, além de promover o ensino nacional e congregacional, teria dado ênfase à instrução doméstica.
O Dr. Wander de Lara Proença, ao enfatizar mote similar, explica que a ideia de preparar
vocacionados se reporta aos tempos da Antiguidade; menciona na tradição do povo judaísta, a título de
exemplo:

1. Formação de profetas sob o mentoreamento (I Rs. 19.19; II Rs. 2.9 – 14).


2. Internato para profetas (II Rs. 4.38).
3. Internato para sacerdotes (I Sam. 1.19 – 28).

Ressalta, em seguida, a mesma prática no que tange à preparação de pessoas vocacionadas em o


Novo Testamento — João Batista, Jesus, os apóstolos, Paulo, etc. Merece destaque, nesse sentido, os
essênios, ou “monges” do judaísmo: [...] Nos dias de Jesus, os essênios, por exemplo, formavam uma
comunidade monástica no deserto do Mar Morto, onde mantinham uma escola para a formação de
novos profetas. Pais costumavam levar seus filhos ainda crianças ou adolescentes para serem educados
pelos mestres daquela escola. Os que demonstravam vocação, após longo período de estudos e
preparação, passavam a exercer semelhante função. Foi o que certamente ocorreu com João Batista,
que se tornou aluno dessa escola adquirindo ali a credencial de legitimidade para o exercício profético
na Palestina daqueles tempos, chegando mesmo a ter o reconhecimento dos mais exigentes líderes do
templo de Jerusalém (Mat. 21.23, 27).
E quais cuidados teve Jesus, referente a requisitos, antes de começar seu ministério? E como se
comportou acerca do treinamento de sua equipe?

 Primeiro, Jesus Cristo não desprezou o preparo enquanto um dos trâmites legais do exercício da
vocação nos seus dias.

Esta ressalva deve-se ao fato de que, na mentalidade de alguns cristãos, Jesus não recebeu
instrução antes de assumir sua nobre missão nem se preocupou com a arte de pensar. Ledo engano.
Henri Daniel-Rops comentou: Em sua infância, Jesus deve ter sido certamente educado como qualquer
outra criança judia; isto é, recebeu uma educação religiosa, aprendendo a ler as Escrituras na Beth ha-
Sefer, a escola de sua cidadezinha. Seus pais o ensinaram a ser um israelita piedoso, fazendo com que
os acompanhasse desde cedo em suas peregrinações a Jerusalém. [...] O episódio do Menino entre os
doutores da Lei, debatendo com eles no Templo, nos diz muito sobre a instrução bíblica por ele
recebida. Por mais sobrenaturais que tenham sido os seus dotes nas ciências teológicas, é razoável
supor que um menino de doze anos devesse ter bastante cultura para “surpreender” os rabinos com
seus conhecimentos. [...] A linguagem por ele falada não diferia de modo algum da de seus
conterrâneos - o aramaico, que Marcos não hesita em citar, colocando-o em seu texto grego[...].
Quanto ao hebraico, a língua litúrgica, a linguagem bíblica, não há dúvida de que também o conhecia,
pois fez a leitura de uma passagem das escrituras em voz alta na sinagoga e depois a comentou. [...]
Dizer que ele possuía excelente conhecimento da Bíblia é obviamente inadequado: o texto sagrado
formava parte de sua própria mente; ele o citava a toda hora, e mesmo quando não usava as palavras
exatas da Bíblia, com que frequência se referia a ela e quantas vezes fez harmonizarem-se as suas
passagens! Alguns de seus ditos mais originais não passam de citações bíblicas brilhando como uma
nova luz. [...] este era um hábito mental que devia à sua educação israelita. Basta lembrar como sua
mãe, Maria, ao improvisar o “Magnificat” o recitou do começo ao fim baseada em suas memórias do
Livro[...].
Jesus, além de preparo educacional, seguiu os principais critérios para, então, iniciar seu
ministério: esperou o marco temporal correto como estabelecia a Lei mosaica acerca da idade ideal
para o desempenho de atividades sagradas, buscou no batismo de João Batista o credenciamento para
exercer seu ministério profético-sacerdotal, etc.

 Segundo, a nobre arte de ensinar e de forjar discípulos fiéis, foi uma das marcas do ministério
de Jesus.

Ele, além de se distinguir como Mestre, treinou um grupo para levar avante sua obra. Tais
“mestres”, no início, eram homens imaturos, impulsivos, pecadores, perplexos, ignorantes, cheios de
preconceitos e instáveis. Com razão, questiona-se: “Quem escolheria, para um trabalho de implicações
de âmbito mundial, um grupo de apóstolos tão destituídos de simpatia, destreinados e sem influência?”
Jesus Cristo! Dos tais, no entanto, ele levantou sua notável “tropa de elite”, que abalou o mundo. Jesus
Cristo, a priori, chama para si aqueles que ele quis (Mc. 3.13). A lição parece clara: antes de ser
enviado para (tarefa) é indispensável estar com (aquele que salva e envia - Jesus). Veja que o
relacionamento antecede a comissão. Esta é a sequência fixada pelo Mestre: comunhão, depois
serviço. Quem despreza a primeira exigência, está desqualificado para “trabalhar” na “obra de Deus”.
Para Jesus, a convocação à intimidade antecede a designação de afazeres. Ademais, a missão não é
mera tarefa funcional, nem simples exercício de profissão; é, acima de tudo, testemunho e se funda
numa experiência vital.13 Reitero, portanto: os conceitos “estar com” e “seguir o exemplo” (tornar-se
como Jesus) são de importância vital na Teologia da educação cristã.
Mas o estar com Jesus também relaciona-se à capacitação para a realização da nobre missão
que ele estabeleceu. É erro crasso enfatizar que Jesus escolheu gente despreparada para formar sua
equipe ministerial e que, em seguida, nada fez para capacitá-la. Essa é a explicação de alguns que não
querem pagar o preço da preparação para servir a Deus e a igreja, com excelência. É preciso, sim,
resgatar a dimensão da vida intelectual, como um nobre chamado cristão, e repudiar a ideia de que a
identidade cristã é intelectualmente inaceitável.
Na verdade, o agente pastoral que quer adotar o modelo de liderança de Jesus Cristo, não pode
ignorar o treinamento e o preparo de outros líderes. Sobre essa questão, o Dr. Wander escreveu: Jesus
não atuou sozinho e nem quis exercer liderança isoladamente.
Por isso, chamou discípulos, dividindo com eles a tarefa de propagar o reino de Deus. Nesse
sentido, vale destacar a sua estratégia de constituir também uma escola para a formação teológica e
ministerial dos seus discípulos, seus primeiros pastores e missionários. Quis Ele mesmo exercer o
papel de educador e mestre de doze alunos, por aproximadamente três anos, tendo a preocupação de
bem treiná-los antes que fossem enviados ao campo. Ali aprenderam a desenvolver uma
espiritualidade cristocêntrica e solidária; a elaborar uma teologia prática voltada para o contexto em
que viviam, tendo como fundamento a Palavra que lhes era transmitida no dia a dia; e a conhecer a
importância e necessidade premente de um ministério desenvolvido sob o poder e a capacitação do
Espírito Santo (Lc. 4.16 – 21). Paulo, após ser convertido a Cristo, parece que foi rever a formação
judaica que até então defendera e se aperfeiçoar teologicamente na Arábia (Gl. 1.17, 18). Depois de
passar um período considerável revendo os fundamentos de sua Teologia, ele mesmo foi o mentor
teológico de Timóteo, Tito, Epafras, entre outros. Em Éfeso, usou o retórico grego ou “sala de
palestras”, um local de estudo e instrução intelectual, para a educação teológica (At. 19.9, 10). Paulo,
apóstolo gestado fora de tempo, tornou-se o principal sistematizador das doutrinas da Igreja Cristã.
A capacitação teológica não cessa depois de Paulo. Ainda nos primeiros séculos surgem escolas
teológicas em Alexandria (Egito) e Antioquia (da Síria), inicialmente com ideais nobres e cristãos. Em
dados momentos, também por conta da extraordinária expansão numérica da Igreja, uma das funções
dos bispos era avaliar a vocação, capacitar e ordenar a nova liderança. E ela, tendo notável
visibilidade, aliou-se ao poder dominante, transformou-se numa instituição religiosa com acentuado
ministério sacerdotal hierárquico.
Na Idade Média, com a institucionalização e a clericalização da Igreja, a Teologia passou a ser
controlada pelo influente e tendencioso clero. O saber teológico naquela periodização infelizmente foi
empregado em muitos lugares e em épocas diferentes para atender interesses particulares ao invés de
ser uma ferramenta útil ao Reino de Deus. A dominação estendeu-se basicamente até a Reforma
Protestante; em tal época a Igreja fiel experimentou algumas importantes revitalizações.
O Dr. Sérgio Lyra justifica que os reformadores, entre outras coisas, se opuseram à ideia
distorcida da autoridade e sacerdócio exclusivo de uma classe especial. Martinho Lutero declarou que
Cristo é o único mediador e, doravante, todos são sacerdotes na Igreja; ainda realçou a doutrina da
suficiência das Escrituras, defendendo que “todos os cristãos tinham o direito e privilégio de ler,
entender e ser ensinado pela Palavra, sem a necessidade de um sacerdote ordenado”. João Calvino, por
sua vez, com ressalvas, admitiu que os leigos são ministros na vida particular e na comunidade cristã.
Em síntese, o “leigo” reconquista pela Reforma:

 Autoridade para exercer a sua parcela de serviço na igreja em prol da edificação do todo;
 Ler e examinar as Escrituras sem a tutela de uma classe especial;
 Pelas Escrituras, até julgar e corrigir alguém que tenha sido ordenado.

A capacitação teológica não desapareceu do seio da Igreja depois da Reforma Protestante. Nem
deixou de ser uma prática importante no preparo de novos e fiéis líderes. A Teologia, porém, passaria
por fases delicadas nos séculos vindouros. Externamente, se fortaleceu a corrente de pensamento que
buscava, entre outras coisas, substituir antigos conceitos teológicos e filosóficos no que tange a
explicação da realidade humana. Internamente, na fase do Confessionalismo, o Protestantismo estava
dividido em várias facções e credos diferentes. De um lado, a exegese se tornou a serva do
dogmatismo e degenerou em mera pesquisa de textos-prova. Do outro, como resposta, houve desprezo
à ciência seguido de tendência ao misticismo. Outros danos floresceram no período Crítico-Histórico e
nos séculos posteriores. E a Teologia foi sendo relegada a uma posição marginal. Alguns desses pontos
serão retomados posteriormente, na disciplina de Paracletologia.

A importância da capacitação teológica na Igreja evangélica brasileira contemporânea

Na concepção de alguns crentes, educação teológica é coisa recente, idealizada por eruditos que
provavelmente não tinham algo mais importante para fazer na vida. Todavia, como sumarizado
recentemente, a história da religião judaico-cristã prova exatamente o contrário. A Bíblia nos fala de
um processo educacional religioso que antecede ao Cristianismo. Esse dado irrefutável pode ser
confirmado no estudo da importante História da Educação Cristã, pois certamente ela o ratifica com
exatidão. E, hoje, analisando a Igreja Evangélica no Brasil, constata-se a real necessidade de mais
capacitação teológica. Protestantes Históricos, Pentecostais, Neopentecostais e Independentes são
convocados à valorização e à construção de uma Teologia bíblica, atual e relevante. Desde as eras mais
remotas do próprio povo judaísta, embora inicialmente sem a intenção de formar uma categoria
privilegiada e especializada na administração do sagrado, havia preocupação legítima com a
preparação dos escolhidos para servir no ministério. Esse cuidado perpassa as páginas do Antigo e do
Novo Testamento, os primeiros séculos da era cristã, adentra à Idade Média até ser revitalizado na
Reforma Protestante, e, apesar de sentir os terríveis efeitos, consegue sobreviver ao Renascimento, ao
Iluminismo e ao Positivismo e, atualmente, à própria Pós-Modernidade.
Conquanto a Teologia autêntica ainda seja tratada com menosprezo, por pessoas que não a
conhecem o suficiente ou a desprezam por outros motivos, está clara sua presença e importância na
história do povo de Deus, do Antigo Testamento aos nossos dias. Sempre houve, ao longo das
gerações, preocupação com a capacitação bíblica e teológica das pessoas vocacionadas por Deus. E
essa preocupação precisa ser retomada.
Ferreira e Myatt, respeitados teólogos, asseguram que o estudo da Teologia foi fator essencial na
vida da Igreja. Paulo, João e os demais autores do Novo Testamento foram os primeiros teólogos
cristãos; os pais da Igreja seguiram seus passos, ensinando as doutrinas bíblicas para alimentar as
almas dos fiéis e evangelizar o mundo não cristão. Mas muitos desafios surgiram (heresias e seitas, por
exemplo), ameaçando a jovem Igreja. Novas perguntas surgiam, conduzindo o desenvolvimento
doutrinário além dos enunciados do Novo Testamento.
As passagens mais complexas das Escrituras precisaram ser interpretadas e explicadas, para a
edificação dos santos e para a defesa da fé. O crescimento da fé e da igreja necessitava do contínuo
crescimento da Teologia.
Se a Igreja Cristã, desde seu nascedouro, reconheceu a importância da reflexão bíblica e
teológica, não deveríamos fazer o mesmo?

A teologia como Parceira da Igreja

Líderes libertários, profetas, sacerdotes, pregadores carismáticos autônomos, apóstolos, cristãos


comuns, reformadores, dentre outros, via de regra recorreram a alguma capacitação no afã de servir
melhor a Deus e as pessoas. É, então, injustificável o repúdio à Teologia séria, arraigada na Bíblia.
Urge, portanto, superar a atual onda de irracionalismo que predomina em nossa sociedade e, é claro,
nas igrejas. Ameaças e desafios rondam a Igreja nesses dias conturbados.
E a reflexão é vital porque a Igreja precisa interpretar a Bíblia e a realidade atual e lhe oferecer
respostas concretas. Ariovaldo Ramos, egrégio teólogo, ratifica: A igreja precisa se incomodar com a
fome, a miséria, o descalabro, a mendicância, o fenômeno da favelização da cidade, envolvendo-se
com os famintos e os excluídos, enxergando a si mesma como resposta de Deus para a vida das
pessoas.
Outras tematizações, de caráter interno, também colocam a Igreja em estado de alerta. O
crescimento numérico em detrimento da qualidade é uma delas. Hoje a ala que mais cresce no Brasil é
a que prioriza a dimensão material da vida, que promete dinheiro, saúde e felicidade às pessoas. E os
resultados são desastrosos.
Está certo o Dr. José Miguez Bonino, célebre teólogo metodista, ao enfatizar que a Teologia
talvez não seja a mais importante nem a primeira que deve ocupar-nos, porém ela é indispensável.
Afinal, a igreja não pode existir sem interrogar-se constantemente, à luz da Escritura, acerca da
fidelidade do seu testemunho e da coerência entre sua mensagem, sua vida e seu culto.
O Dr. McGrath afirma que a maioria dos cristãos não acha importante a Teologia. Ela é vista, até
entre cristãos aplicados, como especulações sem sentido vindas de pessoas que deveriam estar fazendo
algo mais útil de sua vida – como pastorear igreja, trabalhar no campo missionário, etc. Entretanto,
justifica ele, a Teologia é muito importante – algo que traz profundidade e maravilhamento para nossa
fé.

Quem, Afinal, Precisa de capacitação teológica?

1. A Igreja Cristã – coletivamente.

Há quem pense que a Teologia é irrelevante à comunidade de fé e, doravante, ao crente que


ainda não exerce função ministerial na sua igreja. Ledo engano. A comunidade de fé precisa de sólida
capacitação teológica. Externamente, ela precisa apresentar respostas concretas e coerentes aos
numerosos e cruciais questionamentos que seu eixo contextual está fazendo na pós-modernidade.
Internamente, ela precisa de identidade e de base para nortear sua reflexão e sua ação, ou fracassará na
sua egrégia missão, por Deus confiada, o que seria terrivelmente trágico. Precisamos, portanto, de uma
Igreja viva e poderosa, mas com Teologia.
Jürgen Moltmann, renomado teólogo, afirma que a Teologia é uma tarefa conjunta de todo o
povo de Deus; a fé de toda a cristandade na Terra busca por conhecimento e compreensão, senão não é
fé cristã; assim, o fundamento de toda especialização teológica é o ministério teológico geral de todos
os crentes, como correspondente à tese reformatória de “sacerdócio geral de todos os crentes”; todos os
cristãos, jovens ou velhos, mulheres ou homens, que creem e fazem alguma reflexão sobre isso, são
teólogos.

2. Cada discípulo de Jesus – individualmente.

A Teologia é útil à Igreja enquanto comunidade de fé e é de importância e utilidade primárias na


vida de cada pessoa que reconheceu e confessou Jesus como seu Senhor e Salvador. Aliás, a igreja é a
junção de indivíduos que dela fazem parte. Logo, se a Teologia não estiver inserida no micromundo
dos fiéis, dificilmente terá maior espaço na igreja. Há vários fatores que ratificam os benefícios da
Teologia na vida do discípulo cristão e, por conseguinte, da própria comunidade de fé. Por hora, pelo
menos dois serão sumarizados:

a. A reflexão teológica correta pode desembocar numa prática correta da Palavra de Deus.

Infelizmente grassa no meio do povo de Deus o descompasso entre crença e prática; há crente
que promete e não cumpre, fala e não faz, assina contrato e não o honra. Há crente que até tem
pensamento bíblico-teológico legítimo e cuja prática, porém, é equivocada. Certamente esse é o
longevo e destrutivo problema, responsável por parte do descrédito dos cristãos – conhecer e não
praticar. Há muito tempo já se tem percebido que existe crente com credo ortodoxo e com ética
mesquinha; sua Teologia está em descompasso com a prática.
E há o outro extremo, também preocupante: crente que não pratica com precisão a Bíblia por não
conhecê-la corretamente. Zelo desprovido de entendimento não é novidade na religião judaico-cristã.
John Stott afirmou que o que o apóstolo Paulo escreveu acerca dos judeus não crentes de seu tempo
certamente poderia ser dito com respeito a alguns crentes de hoje: “Porque lhes dou testemunho de
que eles têm zelo por Deus, porém não com entendimento” (Rm. 10.2); muitos têm zelo sem
conhecimento, entusiasmo sem esclarecimento. Cita ainda uma afirmação do Dr. John Mackay: “A
entrega sem reflexão é fanatismo em ação, mas a reflexão sem entrega é a paralisia de toda a ação”.

b. Todo cristão, conscientemente ou não, segue algum sistema doutrinário/ teológico.

Cada súdito de Jesus Cristo (tradicional-histórico-reformado, pentecostal, neopentecostal ou


independente) tem um sistema doutrinário, isto é, teológico. Inclusive quem repudia a Teologia, que a
classifica pejorativamente, decerto segue alguns pressupostos que foram elaborados por alguém, de
maneira correta ou não! Portanto, o ideal é que a práxis do cristão seja decorrente de reflexão coerente.
Isso, porém, nem sempre ocorre. Há crente que, não raro, segue doutrinas que sequer questionou.
O Dr. Ryrie assevera que toda pessoa tem um sistema doutrinário, mesmo que não se dê conta
desse fato ou não o admita; pode ser algo sistemático, desorganizado ou até mesmo desleixado, mas
todos nós operamos com base em algum esquema doutrinário; é evidente que tanto o ateu liberal e o
agnóstico quanto os calvinistas e os arminianos mais estruturados têm seus sistemas; por isso, o
pregador e o professor, o profissional e o leigo precisam ler sobre Teologia não importa o tipo, lugar
ou nível de seu serviço.

c. Quem deseja servir a Deus e as pessoas, com excelência.

A Teologia ainda é vital a qualquer pessoa que foi chamada por Deus para exercer ministérios na
igreja local. Aliás, o desejo de Deus é dar a cada geração liderança segundo o seu coração, que
conduza o povo com inteligência e vida piedosa (Jr. 3.15), que agrega espiritualidade e capacidade,
poder e saber, que tem coração aquecido e mente iluminada e esclarecida.
Lamento que tenha florescido na mente de muitos líderes evangélicos a noção de que não
precisam de capacitação teológica alguma para o exercício ministerial. Essa percepção só conduz à
mediocridade, a ensinos e atitudes divorciados do Cristianismo original. Se a séria preparação bíblico-
teológica não fizer parte da base de legitimação ministerial, os descalabros permanecerão nas igrejas
cristãs. E oportunidades externas também serão perdidas.
Quando vejo, depois de tantas batalhas, as portas do Ensino Religioso se reabrindo, logo penso
como a Igreja poderia abençoar a vida de milhões de alunos(as). Então me convenço de que esta será
uma oportunidade para outras religiões. Por quê? Quem, no meio evangélico, tem estudado com afinco
culturas e tradições religiosas, textos “sagrados”, tradições orais, ritos, ethos, teologias, sem pensar
em proselitismo? Claro que a dimensão testemunhal faz parte da vida cristã, mas não ao ponto de
reduzir os discentes a meros objetos de conquista.
Internamente, como a liderança da igreja conseguirá ser instrumento de bênção na vida das
pessoas diante da multicausalidade do sofrimento que acomete a sociedade hodierna, se continuar
repudiando a capacitação teológica? Ora, as demandas do nosso tempo impõe à liderança pastoral e às
comunidades de fé evolução nas pilastras teóricas e práticas atinentes à relação de ajuda. O êxito da
orientação depende assaz do consiliário, por isso ele igualmente precisa ser cuidado. E cuidar do
cuidador implica em capacitá-lo bíblica e teologicamente, ponderar seus poderes, saberes e práticas. A
outra ala a ser capacitada é a própria igreja; ela precisa aprender a cuidar de quem cuida, afinal o
cuidador também enfrenta crises – existencial, econômica, profissional, conjugal, familiar, espiritual,
ética, etc.; e se a igreja for imatura ou refratária à educação teológica, como poderá ser um instrumento
de apoio e cura?
Outrossim, Anders Ruuth explica que não é o estudo em si o que transforma um pregador em um
bom pregador, nem é a honra de ser Doutor em Teologia que garante em absoluto a condição de
profeta; mas o estudo confere ao pregador conhecimentos formais necessários para exercer seu ofício
de pregador. Charles H. Spurgeon afirmou: “Sejam bem instruídos em Teologia, e não façam caso do
desprezo dos que fazem troça porque a ignoram. Muitos pregadores não são teólogos, e disso
procedem os erros que cometem. Em nada pode prejudicar o mais dinâmico evangelista o ser também
um teólogo sadio, e com frequência pode ser o meio que o salva de cometer enormes disparates”.

Prolegômenos: Iniciação à Teologia Disciplinar

Teologia ainda é tema dúbio, polêmico, controverso, apesar de fazer parte da Igreja desde os
alvores. Na ambiência acadêmica atual, é só uma “ciência” em situação marginal. No meio evangélico,
é definida de várias maneiras. Para um grupo menor de crentes, a Teologia é apropriada, legítima,
construtiva, límpida, oportuna, relevante, essencial. Outro grupo a vê como má, distorcida, destrutiva,
abstrusa, irrelevante, periférica. Há também um grupo que a define apenas como uma “ciência” neutra,
imprecisa, que pode ser bênção ou maldição, favorável ou maléfica, construtiva ou destrutiva. Mas a
Teologia, que se respalda coerentemente na Bíblia e que consegue dialogar com outros saberes no afã
de interpretar e transformar a realidade do seu marco temporal e espacial, é indispensável:

1. À Igreja Cristã – já analisamos que, desde os alvores, a liderança da religião judaico-cristã


reconheceu a importância de preparar aqueles que foram vocacionados por Deus para o exercício
de alguma função.
2. A cada súdito de Jesus Cristo — o conhecimento correto das Escrituras pode desembocar em
crenças, sentimentos, ensinos e práticas condizentes na vida dos cristãos, firmá-los na fé e ainda
influenciar positivamente quem ainda não confessou Jesus Cristo como seu único Senhor e
Salvador.
3. A cada pessoa chamada por Deus para desempenhar ministérios específicos na igreja ou fora
dela — Ajith Fernando afirma que a autoridade da Teologia emana da Bíblia; e a Bíblia ministra
às nossas vidas e enriquece nosso ministério. Paulo disse a Timóteo: “Propondo estas coisas aos
irmãos, serás bom ministro de Cristo Jesus, nutrido pelas palavras da fé e da boa doutrina que
tens seguido” (I Tm. 4.6); pessoas que não estão sendo constantemente treinadas e nutridas pela
Palavra perderão seu frescor no ministério; se forem pregadores tornar-se-ão secos e repetitivos;
e apesar de serem bons oradores, eles deixarão seus ouvintes mal alimentados e frustrados.
Ministérios externos, que ocorrem além das paredes dos templos cristãos, também podem ser
mais relevantes quando orientados por uma boa Teologia.

O Que É “Prolegômenos”?

Neste capítulo vamos conhecer melhor a Teologia. Nosso objetivo, primeiro, é conceituá-la e,
segundo, resumir suas principais categorias. Antes, porém, é indispensável responder a pergunta: o que
é Prolegômenos?
Uma maneira de defini-lo objetivamente é “conjunto de noções preliminares de uma ciência ou
arte”, ou seja, “as coisas que são ditas antes”.
O termo é empregado como prefácio a um estudo pormenorizado, uma análise introdutória no
afã de lançar luz sobre o assunto que será enfocado numa exploração posterior. Vem do grego “pro” –
“antes de” e “legein/legõ” – “dizer”, “falar”, por conseguinte, “falar” ou “dizer antes”.

“Prolegômenos”, na teologia cristã.

O vocábulo supracitado, como já explicado, refere-se às exposições introdutórias, às noções


preliminares, a um ensaio formal, aos princípios básicos fundamentais à análise de um mote científico
ou artístico. Portanto é certo sua importância no âmbito teológico. Ademais, a Teologia, assim como
outras áreas vitais do conhecimento humano, não pode ser construída e disseminada de maneira
ametódica, irrefletida e irresponsável. Aliás, é por falta de pilastras bíblicas e métodos consistentes que
muitas heresias estão aflorando e expandindo-se em muitas comunidades de fé.
Está claro que o vocábulo “Prolegômenos”, teologicamente falando, “está relacionado à questão
metodológica da Teologia”. E o que isso realmente significa?
O tratado teológico, principalmente o sistemático, para ser construído, depende de
procedimentos técnicos específicos. Aqui entra o Prolegômenos, indicando, sobretudo algo que é
colocado em primeiro lugar, que é exposto por antecedência.
Sumarizando, Prolegômenos refere-se às questões metodológicas geralmente encontradas nas
seções de abertura de uma Teologia Sistemática, relacionadas à natureza e à tarefa da Teologia, e
talvez à natureza e ao objetivo principal da revelação. Sua função no âmbito teológico sistemático é
ajudar o teólogo a responder algumas indagações cruciais, tais como: O que é Teologia? Por que a
Teologia é importante? Teologia é ciência? Entendido esse ponto importante, vamos conhecer melhor
o que é “Teologia”.

Conceitos Fundamentais de “teologia”

No Manual de Teologia Econômica, apresento uma série definições de Teologia, na concepção


de eruditos de várias correntes teológicas. O referido compêndio é a conjunção de vários estudos sobre
espiritualidade e prosperidade cristã, com ênfases bíblica, teológica, prática, econômico-financeira,
histórica, filosófica e sociológica, opostos à economização do sagrado e à deificação do dinheiro na
sociedade e cultura de consumo atual. Vale a pena conferir.
O Dr. Ryrie assegura que a palavra Teologia significa, simplesmente, pensar sobre Deus e
expressar esses pensamentos de alguma maneira; a palavra “teologia” é formada das partes: “theos”,
que quer dizer “Deus” e “logos”, a “expressão racional, os meios de interpretação racional da fé
cristã”; então, podemos concluir que Teologia significa “a interpretação racional da fé cristã”. Os
três elementos incluídos no conceito de Teologia são:

1. Teologia é inteligível – pode ser compreendida pela mente humana, ordenada e racionalmente.
2. Teologia requer explicação – isso envolve exegese (análise dos textos originais) e a
sistematização das ideias.
3. A fé cristã tem a sua base na Bíblia – por isso a Teologia cristã é um estudo baseado na Bíblia.
Logo, Teologia é a descoberta, a sistematização e a apresentação das verdades a respeito de
Deus.
O Dr. Erickson esclarece que o “estudo da doutrina” é conhecido como “Teologia”, “o estudo
de Deus”, a “análise e a declaração cuidadosa e sistemática da doutrina cristã”. A seguir acrescenta
certas características primordiais da natureza do labor teológico; eis algumas delas:

1. A Teologia é bíblica – ela toma seu conteúdo principal do Antigo e do Novo Testamento.
2. A Teologia é sistemática — ela não examina cada livro da Bíblia separadamente, mas procura
juntar em um todo coerente.
3. A Teologia é contemporânea — o alvo do labor teológico é reconceituar verdades bíblicas
atemporais de forma que sejam compreensíveis às pessoas que vivem hoje, etc.

Teologia, para Railey Jr. e Aker, teólogos pentecostais, definida com simplicidade, é “o estudo
de Deus e do seu relacionamento com tudo quanto Ele criou”; acrescentam que a Teologia deve
referendar como crença obrigatória somente o que a Bíblia ensina explícita ou implicitamente; a
Teologia deve também importar-se com a interpretação correta da Bíblia e sua aplicação apropriada.
A Teologia, como “ciência”, tem objeto de estudo: Deus. Todavia, como delimitar e estudar
alguém que não pode ser visto nem tocado? Ora, o fato de Deus não ser visto nem tocado pelos
humanos não inviabiliza o conhecimento sobre sua pessoa e obras. Objetivamente, a Teologia
investiga as afirmações sobre Deus, o que se falou ou escreveu sobre Deus, através de textos, cartas,
narrativas, testemunhos, etc. A Teologia tenta conhecê-lo, sobretudo através da Bíblia e de Jesus, “a
imagem do Deus invisível” (Cl 1.15). Como disse Karl Barth, Teologia é como um falar “a partir de
Deus”.

A palavra “teologia” ao longo dos séculos

A palavra “Teologia” não é de origem bíblica, como pode presumir algum evangélico que ainda
não teve oportunidade (ou o interesse) de estudá-la. Foram os gregos, e não os apóstolos, que
cunharam o termo para designar o discurso que os poetas elaboravam para os deuses. Por isso, não
deve surpreender-nos que Orfeu e Homero eram chamados de “teólogos”.
Historiadores confirmam que o termo “Teologia” foi usado pela primeira vez por Platão, em A
República, para referir-se à compreensão da natureza divina de forma racional em oposição à
compreensão literária própria da poesia tal como era conduzida pelos conterrâneos. Aristóteles, mais
tarde, o empregou em numerosas ocasiões com dois significados principais:

 Teologia como o ramo fundamental da ciência filosófica, também chamada filosofia primeira ou
ciência dos primeiros princípios, mais tarde chamada de metafísica por seus seguidores.
 Teologia como denominação do pensamento mitológico imediatamente anterior à Filosofia, com
uma conotação pejorativa e, sobretudo, utilizada para referir-se aos pensadores antigos não
filósofos.

O Dr. Roldán reitera que o uso do referido vocábulo pelos Pais da Igreja (os escritores cristãos
dos primeiros séculos) e pelos teólogos da Idade Média levou a Teologia a se constituir em ciência e
em tarefa fundamental à Igreja.
Podemos dizer que, de certo modo, a partir do momento em que começamos a refletir e a falar
acerca de Deus, estamos fazendo Teologia. Bentho, outro teólogo pentecostal, ratifica que um estudo
diacrônico revelará que o vocábulo “Teologia” não constitui um monopólio dos cristãos. Os poetas, no
grego clássico, eram chamados de “teólogos” e, através de suas narrações mitológicas, criaram uma
“teologia do mito”. Platão, mais tarde, contribuiu com a Teologia do “logos” filosófico. A Teologia, na
época da escolástica medieval, era entendida de duas maneiras: em sentido literal (doutrina de Deus) e
como a afirmação da verdade concernente a todos os ensinamentos sagrados da Igreja.
Deste modo, justifica Bentho, a Teologia tratava desde a Teologia própria até os assuntos
pertinentes à fé e à moral da Igreja.
Teologia versus “estudo da religião”

Teologia, então, não é simplesmente o estudo da religião? Teólogos são cientistas da religião?
Essa é a concepção de Teologia presente no imaginário de muitas pessoas, inclusive cristãs. E é
preciso submetê-la à revisão cuidadosa.

 Primeiro, como argumentou Hermisten Maia, teólogo reformado, definir Teologia como “ciência
da religião” exige também uma conceituação do que significa “religião”. Esta tarefa é complexa.
Há muitas possibilidades de conceituar religião, principalmente nesta era pós-moderna, marcada
pela consolidação do pluralismo religioso. Religião é uma das palavras chaves no Novo
Testamento. Barclay, estudioso de expressões gregas, relaciona diversas palavras para religião:
eusebeia (religião, piedade), eusebes (piedoso, religioso, de mentalidade religiosa), eusebein
(adorar, cumprir os deveres da religião verdadeira), theosebes (cultuando a Deus). Todas elas,
contudo, provêm de uma mesma raiz, cujo significado basilar é temor na “presença daquilo que é
mais do que humano”, que é “majestoso e divino”.
 Segundo, o teólogo não é necessariamente cientista da religião. Há notáveis distinções entre tais
estudiosos. Hans-Jürgen Greschat, docente emérito de História da Religião na Universidade de
Marburgo, esclarece a contento a questão: teólogos são especialistas religiosos; cientistas da
religião são especialistas em religião. Greschat acrescenta:
 O teólogo investiga sobretudo a religião à qual pertence. Já o cientista da religião geralmente
se ocupa de outra que não a sua própria.
 O cientista da religião opta pela pesquisa de uma específica religião. O teólogo não tem essa
liberdade – ele se ocupa de uma religião alheia quando há a necessidade de uma comparação
com a sua.
 Quando o teólogo estuda religião alheia, parte da própria fé; investiga como os outros
concebem seu deus, crença ou pecado, toma a sua religião como referência. Já o cientista da
religião não avalia outra fé com base na própria; ele tem a liberdade de pesquisar crença
alheia sem preconceito, etc. Logo, com instrumentos de orientação e liberdade, do universo de
divindades, mitos, ritos e símbolos, podem extrair conclusões diferentes do teólogo.

Vale acrescentar em tempo oportuno aos interessados nesta tematização que até o espectro
disciplinar da Ciência da Religião é diferenciado, haja vista seus amplos conectivos com a Etnologia, a
Antropologia, a História, a Sociologia, a Psicologia, a Geografia, a Estética, as Ciências Naturais, a
Filosofia e, é claro, a própria Teologia.
Ferreira e Myatt explicam que a Teologia, no contexto da fé cristã, não é o estudo de Deus como
algo abstrato, mas sim o estudo do Deus pessoal revelado na Bíblia. Necessariamente isso inclui tudo o
que é revelado sobre Deus, suas obras e relações com as criaturas. E o estudo da Teologia, corrige com
precisão, é diferente do estudo da religião (o estudo da religião inclui todas as religiões mundiais e
seitas), e usa várias metodologias (Sociologia, Antropologia, História, Psicologia, etc.); a Teologia é
mais especializada, sendo ela o estudo das doutrinas ou temas que os adeptos de uma determinada
religião creem.
Finalizando, é crucial que fique claro para os estudantes de Teologia que, para a Ciência da
Religião, a “religião” é concebida, sobretudo como objeto de análise científica sem o tradicional
pressuposto da fé. A Teologia segue a premissa da reflexão orientada, sobretudo pela fé, fator vital na
elaboração/construção e socialização/disseminação de seu relevante discurso.
Outra ressalva importante é que a Teologia cristã tem viés científico, todavia nasce a partir da fé,
pois seu objeto primeiro é o Deus que se revelou e se fez (e se faz) conhecer na História; ele é o Deus
de Abraão, de Isaque, de Jacó, ou seja, o Deus cujos registros históricos estão evidentes e abundantes
na religião judaico-cristã. Há, portanto, nesta egrégia tarefa – conhecer o Deus Pai – extremos sutis e
perniciosos a serem evitados:

1. Senso de impotência – pressupor que é impossível saber mais sobre Deus e contentar-se em
conhecê-lo apenas de “ouvir falar”, à distância. O problema é que, dependendo de quem expõe e
como expõe sua narrativa sobre Deus, o ouvinte forje ou assimile uma divindade que não se
ajusta a revelação da Bíblia e dos ensinos e vivências de Jesus Cristo. Para citar exemplo, os
meios midiáticos, com suas abordagens triunfalistas, decerto estão ajudando na construção de um
“Deus” estranho, submisso aos devotos, realizador de seus caprichos.
2. Senso de prepotência racional – presumir que a investigação teológica por si só será suficiente
para dissecar Deus totalmente. O endeusamento da razão jamais conseguirá estudar a “anatomia
de Deus”, desvendar os mistérios eternos e apresentá-lo com mais autenticidade ao ser humano.
Aliás, sob a égide do racionalismo, o que se obteve foi uma série de caricaturas deformadas,
como veremos neste Curso de Capacitação Teológica, mais especificamente na disciplina de
Teontologia.
3. É impossível esgotar todos os mistérios de Deus. Deus é mais do que as palavras podem
descrever, mais do que a mente pode abarcar! Um Deus que se submetesse a uma dissecação
teológica, filosófica ou argumentativa não seria Deus; e um Deus concebível pela mente humana
seria menor do que a própria mente, já que conseguiu abarcá-lo; esse deus seria, portanto, o
resultado dos raciocínios – um ídolo.

Análise panorâmica das divisões tradicionais da teologia e dos quatro principais eixos da
“teologia disciplinar”

A Teologia, elaborada com responsabilidade e sob a orientação do Espírito Santo, pode ser muito
útil à Igreja e à sociedade em geral. Aliás, a Teologia é inevitável na medida em que o cristão pensa de
modo coerente e inteligente acerca de Deus. E esse “pensar inteligente sobre Deus” engloba outras
áreas essenciais. E aqui temos outro grave problema: não estamos pensando de forma cristã sobre
política, afazeres sociais, indústrias, cultura, educação.
Pretendo, no desfecho desta relevante disciplina, apresentar de maneira panorâmica como a
referida ciência está distribuída na atualidade. A proposta não é enfocar os paradigmas reguladores da
Teologia, contudo ir direto ao ponto, ou seja, mostrar os quatro grandes eixos disciplinares da mesma e
como eles se organizam e se complementam. Outras informações importantes sobre Teologia
Disciplinar estão no meu Manual de Iniciação à Teologia. Releia-o, quando necessário.
A Teologia, como toda a ciência devidamente ordenada e metódica, também possui suas
divisões. Organizaram-na, enquanto atividade acadêmica, em quatro eixos disciplinares.
Tradicionalmente vem sendo disposta em quatro partes distintas, contudo, intimamente interligadas:
Teologia Sistemática, Teologia Bíblica, Teologia Histórica, Teologia Prática.

1. Teologia Bíblica – Disciplina que empenha-se em sumarizar e reformular a doutrina de um


texto ou autor bíblico sem a imposição alguma de categorias modernas de pensamento. O
objetivo é entender a “teologia” de um livro ou autor da Bíblia em seus antecedentes históricos.
Evans declara que a Teologia Bíblica se esforça para extrair Teologia com base no estudo de
textos bíblicos e subdivide-se em ramos específicos, como Teologia do Novo Testamento,
Teologia Paulina, etc.

Para o Dr. Carson, Teologia Bíblica é o ramo da Teologia cuja preocupação é estudar cada
segmento das Escrituras individualmente, especialmente quanto ao seu lugar na história da revelação
de Deus.
A Teologia Bíblica é entendida sob a perspectiva dos próprios escritores bíblicos e do seu eixo
contextual (temporal-espacial). A referida Teologia é dita “bíblica” por explicar a “teologia” da Bíblia,
limitando-se à língua, às categorias e perspectivas dos escritores bíblicos; sua finalidade é obter o
entendimento sem suposições ou preconceitos teológicos modernos.

2. Teologia Histórica – É o ramo da investigação teológica que objetiva explorar o


desenvolvimento histórico das doutrinas cristãs e identificar fatores que influenciaram sua
formulação. Trata do desenvolvimento histórico da doutrina e se preocupa com as variações
sectárias e afastamentos heréticos da verdade bíblica que aparecem durante a era cristã. Contém
duas divisões principais:
a. O estudo do desenvolvimento progressivo das doutrinas da Bíblia;
b. O exame do desenvolvimento histórico das doutrinas da Igreja desde a era apostólica; a
Teologia Histórica destaca a importância da história secular, bíblica e eclesiástica devido à
contribuição que podem oferecer à compreensão do desenvolvimento doutrinário. Abrange,
em suma:
 História da Igreja.
 História das Missões.
 História dos Credos e das Confissões.
 História das Doutrinas.

É oportuno ressaltar que o discente de Teologia pode enriquecer seus estudos se interessar-se
também pela Filosofia da História.

3. Teologia Sistemática – É uma elaboração da cosmovisão cristã baseada na Bíblia, definiram


Ferreira e Myatt; os mesmos ainda citam outros autores e suas acepções de Teologia Sistemática:
a. Teologia Sistemática é qualquer estudo que responda à pergunta: “O que a Bíblia como um
todo nos ensina hoje?” acerca de qualquer tópico (Wayne Grudem);
b. Teologia Sistemática começa com a revelação divina na sua totalidade, aplica a mente
iluminada pelo Espírito para compreender a revelação, extrai os ensinamentos das Escrituras
através de uma exegese histórico-gramatical, respeita provisoriamente o desenvolvimento da
doutrina na igreja, coloca os resultados em ordem num conjunto coerente, e aplica os
resultados a todo campo do esforço humano (Bruce Damarest);
c. Teologia Sistemática, colocada de forma mais técnica, é aquele estudo metodológico da
Bíblia que vê as Escrituras Sagradas como um todo, uma revelação completa, diferentemente
de disciplinas como a teologia do Antigo Testamento, a teologia do Novo Testamento e a
teologia bíblica que abordam as Escrituras por partes, como uma revelação desdobrada
(Robert Reymond);
d. Teologia Sistemática é aquela disciplina que tenta dar uma exposição coerente das doutrinas
da fé cristã, baseada principalmente nas Escrituras, falando às perguntas e questões da cultura
e época em que ela existe, com aplicação à vida pessoal do teólogo e outros (John Hammett).

Como se pode perceber são muitas as conceituações da Teologia Sistemática. Outras tantas
poderiam, se houvesse espaço, ser mencionadas. Mas, por enquanto, essas são suficientes. O
importante é entender que a Teologia Sistemática não examina cada livro da Bíblia separadamente,
mas procura juntar em um todo coerente o que a Escritura afirma sobre dado tópico; ela procura
sintetizar o sistema de crença da religião cristã primando pela ordem, método, sistematização e lógica;
para tanto, além da Bíblia, recorre à Filosofia, à História, à Psicologia, à Apologética, etc.
A respeito dos principais temas da Teologia Cristã, recomendamos outra obra de Franklin
Ferreira. Já entre os evangélicos em nosso País, no que tange à Teologia Sistemática, possivelmente as
seguintes tematizações, às vezes com ordem diferenciada, se tornaram mais populares:

 Prolegômenos – Doutrina da Teologia.


 Teontologia – Doutrina do Ser de Deus.
 Cristologia – Doutrina de Jesus Cristo.
 Paracletologia – Doutrina do Espírito Santo.
 Hamartiologia – Doutrina do Pecado.
 Soteriologia – Doutrina da Salvação.
 Antropologia Bíblica – Doutrina do Homem.
 Escatologia – Doutrina das Últimas Coisas.
 Eclesiologia – Doutrina da Igreja.
 Bibliologia – Doutrina da Bíblia.
4. Teologia Prática – é a parte da teologia que tem por objetivo induzir o crente a aplicar, em seu
viver diário, os princípios que se encontram nas Escrituras; a Teologia Prática utiliza-se da
Homilética e da Teologia Pastoral. Teologia Prática é a divisão da Teologia que coloca as
verdades da investigação teológica em prática na vida da comunidade dos fiéis; inclui a
pregação, o evangelismo, as missões, o atendimento e aconselhamento pastoral, a administração
pastoral, a educação na igreja, etc.
a. Em primeiro lugar, o enfoque no eixo prático da produção teológica é correto. Teologia que
não desemboca em ação (práxis) raramente será útil à igreja. A construção teológica ordeira e
benéfica seguirá as seguintes etapas:
 Etapa Hermenêutica — a escuta da fé.
 Etapa Especulativa — a experiência da fé.
 Etapa prática — a aplicação da fé.

Dagg lembra que o estudo da verdade religiosa deveria ser empreendido e continuado com base
no senso do dever, tendo como escopo o aprimoramento do coração; e uma vez aprendida, não deveria
ser guardada em uma estante, como se fosse um objeto de pesquisa; deveria, sim, ser implantada no
coração, onde o seu poder santificador pode ser sentido.
Não basta apenas investigar os mistérios da fé, sistematizá-los com precisão e, doravante, ser
impraticável. Se o labor teológico, embora criterioso e historicamente situado, não puder ser traduzido
em vivência, como edificará o povo de Deus? Disse bem Wayne Grudem: “Não creio que Deus deseje
que o estudo da teologia seja árido e enfadonho. (...) Teologia deve ser vivida, orada e cantada!”. Ela
deve iluminar corretamente o caminho que a comunidade de fé deve trilhar; e à comunidade de fé, com
o auxílio do Espírito Santo, deve permanecer no caminho que leva a Deus.

b. Em segundo lugar, a prática não pode estar circunscrita apenas ao agente pastoral. A
produção teológica deve estar acessível e ser praticável pela igreja, não ser uma propriedade
do pastor ou da hierarquia eclesiástica. Entretanto, em nosso País, a Teologia Prática, ou
Teologia Pastoral, consolidou-se de maneira reducionista simplesmente como a Teologia do
Pastor. Uma anomalia que decerto encontrou neste equívoco um solo fértil para se
desenvolver foi o pastorcentrismo.

Essa iconização da figura do líder majoritário da denominação teve sérios desdobramentos e


ainda estão em vigência em muitas igrejas: reprodução de um modelo de liderança coronelístico (com
concentração e abuso de poderes absolutos), vitalicidade no exercício de cargos eclesiásticos,
mentalidade caudilhista, inibição de iniciativa e de potencial de indivíduos que estão em posição
inferior na relação piramidal, no “ranqueamento” de poder institucional e simbólico, etc. É fato,
contudo, que este não é um problema recente. César M. Lopes sumariza como isso ocorreu: A partir do
século XIX, a distinção entre clero e laicato no exercício dos ministérios e cumprimento da missão
passa a fazer parte do próprio currículo teológico.
O processo se desenvolve com base na realidade de que nessa época a Teologia, ao lado de
outras ciências, tentava se adaptar aos novos paradigmas iluministas.
[...] As escolas de teologia começam, então, a perceber a necessidade de uma aproximação entre
o resultado da produção teológica acadêmica e o cotidiano eclesial, ou seja, a própria vivência da fé,
surgindo assim uma nova área do saber teológico voltada para questões da prática ministerial. Essa
nova área seria chamada de Teologia Prática, que em alguns seminários do Brasil é também conhecida
como Teologia Pastoral.
[...] Com o tempo, portanto, essa Teologia Prática ou Pastoral acabou de fato se tornando uma
espécie de Teologia do Pastor. Em outras palavras, [...] uma teologia para o ministério na Igreja ao
invés do que deveria ser: uma teologia do ministério da Igreja.
O Dr. Júlio Zabatiero explica que, em síntese, quando se pensa em Teologia, a maioria das
pessoas lembra das teorias pouco interessantes e relevantes para os desafios da vida cristã e da prática
ministerial. A Teologia Prática, em muitos casos, não tem passado de uma tecnologia, de uma teologia
aplicada, que acaba não sendo nem teologia, nem prática. Em ambientes acadêmicos, tende a ser
relegada a segundo plano por ser pouco teológica; em ambientes eclesiais, tende a ser desconsiderada
por ser teológica demais. Mas ela nasce da prática teológica, ou seja, todo e qualquer serviço que como
líderes do povo de Deus realizamos para a glória de Deus, a expansão do Reino, o crescimento da
igreja e a edificação do Corpo de Cristo; fazer teologia prática é refletir criticamente sobre a teologia
que praticamos em nosso contexto.
Apesar da Teologia Prática/Pastoral/Ministerial (que engloba Homilética, Organização e
Administração da Igreja, Liturgia ou Programa de Culto, Educação Religiosa, etc.) ser tratada com
desdém em alguns âmbitos acadêmicos, ela é vital à Igreja Evangélica. Afinal, a produção teológica
deve resultar em prática.
Finalizamos aqui esta breve iniciação à Teologia. Espero que este módulo introdutório, de
alguma maneira, tenha acrescentado novos saberes e, sobretudo, despertado o seu interesse pela
aprendizagem profunda e contínua, afinal, o universo teológico é bem mais amplo e enriquecedor.

Vous aimerez peut-être aussi