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FACULDADE DE DIREITO
Niterói
2017
Universidade Federal Fluminense
Superintendência de Documentação
Biblioteca da Faculdade de Direto
Niterói
2017
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Orientador: Ms. Lincoln Antônio de Castro.
Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Membro: Dr. Marcelo Pereira de Almeida
Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________
Membro: Professor Ricardo Proença
Universidade Estácio de Sá
Niterói
2017
AGRADECIMENTOS
Ao professor Lincoln Antônio Castro, que esteve comigo não apenas me orientando nesse
trabalho, mas ao longo da minha graduação se mostrou um verdadeiro mestre e amigo querido.
Aos meus pais, que sempre me apoiaram, não me deixaram desistir dos meus sonhos, e me
ensinaram o melhor caminho nessa vida. A Deus, cuja fidelidade não tem fim.
(Martha Medeiros)
RESUMO
O presente trabalho trata a respeito da responsabilidade civil na alienação parental. Para tanto,
será inicialmente abordado temas como instituição familiar, seus princípios norteadores e o
exercício do poder familiar, bem como os elementos da responsabilidade civil dentro do
ordenamento jurídico pátrio, em especial o Código Civil e a Constituição Federal. Nesse
contexto, apresenta-se o instituto da alienação parental, se atendo tanto à abordagem psicológica
proposta por Richard Gardner da síndrome decorrente da alienação, quanto na Lei 12.318/2010,
que regula especificamente sobre o tema. É apresentado ainda a possibilidade de alienação
parental judicial, e a mediação como caminho alternativo competente para diminuir a prática
alienatória. Explana-se ainda sobre como o instituto da responsabilidade civil se aplica nos casos
concretos de alienação parental, discutindo-se ainda a possibilidade de danos morais e materiais
provenientes da alienação. Nessa perspectiva, se encontraria como réu o alienador, e como
vítimas, tanto o menor quanto o genitor alienado. Por fim, é apresentada selecionada
jurisprudência, afim de demonstrar o atual posicionamento dos tribunais pátrios sobre o tema.
ABSTRACT
This paper deals with civil liability in parental alienation. To do so, it will initially address issues
such as family institution, its guiding principles and the exercise of family power, as well as
elements of civil liability within the partial legal order, especially the Civil Code of 2002 and the
Federal Constitution of 1988. In this context, the institute of parental alienation is presented,
taking into account both the psychological approach proposed by Richard Gardner about the
syndrome resulting from the alienation, and juridical, in particular in Law 12.318 / 2010, which
regulates specifically on the subject. It also presents the possibility of judicial parental alienation,
and mediation as a compelling alternative way to reduce alienating practice. It is also explained
how the institute of civil liability applies in concrete cases of parental alienation, also discussing
the possibility of moral and material damages from the alienation. In this perspective, the
alienator would be found guilty, and as victims, both the minor and the alienated parent. Finally,
it is presented selected jurisprudence, in order to demonstrate the current position of the country
courts on the subject.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I- REGIME NORMATIVO DAS RELAÇÕES FAMILIARES
3.4. Jurisprudência
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
O Capítulo I versa sobre o regime normativo das relações familiares, focalizando: família
como instituição de formação e dignidade da pessoa humana; princípios do Direito de Família;
família e o poder familiar no ordenamento jurídico brasileiro; responsabilidade Civil.
Família no sentido amplíssimo seria aquela em que indivíduos estão ligados pelo
vínculo da consanguinidade ou da afinidade. Já a acepção lato sensu do vocábulo refere-
se aquela formada além dos cônjuges ou companheiros, e de seus filhos, abrange os
parentes da linha reta ou colateral, bem coo os afins (os parentes do outro cônjuge ou
companheiro). Por fim, o sentido restrito restringe a família à comunidade formada
pelos pais (matrimônio ou união estável) e a da filiação.
Para Carlos Roberto Gonçalves, o Direito de Família é o mais humano de todos os ramos
do Direito. Em razão disso, e também pelo sentido ideológico e histórico de exclusões, como
preleciona Rodrigo da Cunha3, “é que se torna imperativo pensar o Direito de Família na
contemporaneidade com a ajuda e pelo ângulo dos Direitos Humanos, cuja base e ingredientes
estão, também, diretamente relacionados à noção de cidadania”. A evolução do conhecimento
científico, os movimentos políticos e sociais do século XX e o fenômeno da globalização
provocaram mudanças profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos de todo o
mundo, acrescenta o mencionado autor, que ainda enfatiza: ‘Todas essas mudanças trouxeram
novos ideais, provocaram um declínio do patriarcalismo e lançaram as bases de sustentação e
compreensão dos Direitos Humanos, a partir da noção da dignidade da pessoa humana, hoje
insculpida em quase todas as instituições democráticas".
Dignidade é o pressuposto da ideia de justiça humana, porque ela é que dita a condição
superior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana
independe de merecimento pessoal ou social. Não se há de ser mister ter de fazer por
merecê-lá, pois ela é inerente à vida e, nessa contingência, é um direito pré-estatal.
Por fim, articula Rolf Madaleno7: "a solidariedade é princípio e oxigênio de todas as
relações familiares e afetivas, porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em
ambiente recíproco de compreensão e cooperação, ajudando-se mutuamente sempre que se fizer
necessário."
Por fim, por Princípio do Melhor Interesse do Menor entende-se a busca por preservar-se
ao máximo, aqueles que se encontram em situação de fragilidade por sua incapacidade, natural à
idade da criança e do adolescente. É, então, a garantia como direito fundamental do menor a
chegada à idade adulta sob proteção moral, física e material, preceituados nos artigo 227 da
Constituição Federal. Tem ainda status internacional, conquistado pela Convenção das Nações
Unidas sobre Direitos da Criança, regulamentada pelo decreto 99.770/1990, e ratificada pelo
Brasil, que consagrou no artigo 3º, I, que prevê que: "Todas as ações relativas às crianças,
levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da
criança.".
Por sua vez, o art. 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece a proteção
integral à criança e ao adolescente, a quem são assegurados todos os direitos fundamentais da
pessoa humana (art. 3º), independentemente da situação familiar. Desse modo, podemos
comprendê-lo como princípio que atinge todo o sistema judiciário pátrio, regindo amplamente as
relações familiares, visando impedir o abuso de poder contra o hipossuficiente. Segundo o
doutrinador Antonio Carlos Gomes da Costa8, o princípio do melhor interesse da criança:
[...] afirma o valor intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial
respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância
e da juventude, como portadora da continuidade do seu povo e da espécie e o
reconhecimento da sua vulnerabilidade, o que torna as crianças e adolescentes
merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual
deverá atuar através de políticas públicas específicas para promoção e defesa dos seus
direitos.
Porém, a evolução social trouxe também alterações legislativas diretamente voltadas para
a família, Estas mudanças trouxeram à tona um novo conceito de família, denominado
eudemonista, que prima pelo afeto entre os integrantes da família. A família tutelada pelo
código civil de 1916, fortemente patriarcalista, tinha vedação da dissolução matrimonial, "poder
de família" exclusivo ao homem, e distinção entre os filhos tidos como "legítimos" e
"ilegítimos". Podemos compreender que tais visões, hoje compreendidas por muitos como
discriminatória, era tão somente o retrato dos pensamentos e valores daquela sociedade. É que o
Direito deve servir a sua época, sem, no entanto, deixar de acompanhar as evoluções sociais, tão
necessárias para o desenvolvimento da humanidade. Atualmente, a família é objeto de proteção
constitucional, observemos o que reza o Artigo 226 da Constituição Federal: “A família, a base
da sociedade, tem especial proteção do Estado.(...) §8º. O Estado assegurará a assistência à
família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no
âmbito de suas relações”.
A nossa legislação valoriza os valores morais e éticos da formação de uma família, aquilo
que considera a base da sociedade. Nesse sentido, proteger essa pequena célula seria proteger a
própria sociedade. Gostaria de chamar atenção ao fato que o legislador, a medida que estabelece
os princípios de proteção à família, dá especial ênfase no que diz respeito ao resguardo com os
membros mais vulneráveis: os filhos. Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves9 afirma que:
No código de 1916 tínhamos o chamado "Pátrio Poder", eis que tal poder era, salvo
exceções, exclusivo à figura do pai. Atualmente, chamamos de "Poder Familiar", eis que deve
ser exercido por ambos genitores. Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves10, "Poder familiar é
o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos
menores". Devemos observar que tais direitos se manifestam em face de terceiros, e os seus
deveres, em face os filhos. Maria Helena Diniz11 em seu comentário ao artigo 1.630, define
como sendo poder familiar aquele exercido pelos entes da família: “Um conjunto de direitos e
obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido em igualdade de
condições por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica
lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção dos filhos.”
O Art. 1.632. A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram
as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua
companhia os segundos. É importante ressaltar que, segundo a leitura do artigo 1.636 do mesmo
código, fica claro que, a contração de novas núpcias, bem como o estabelecimento de união
estável não é, em relação dos filhos de relacionamento anterior, motivo de perda dos direitos
nem deveres do poder familiar, devendo o genitor exercê-lo sem qualquer interferência do novo
cônjuge ou companheiro. Nesse sentido, é importante ressaltar que a situação conjugal dos pais
não interfere no exercício do poder familiar.
Nesse sentido, a responsabilidade civil é um ramo do direito civil que trata do dever de
alguém indenizar o prejuízo sofrido por outrem, como afirma Macial Barreto Casabona12: “o
dever de respeito dos indivíduos ao direito alheio ”. Nesse sentido, podemos compreender que o
instituto da responsabilidade civil se adentra no direito de família justamente para impedir a
impunidade dos atos ilícitos no tocante às relações familiares. Tal reparação visa a compensação
pecuniária e não a reparação, eis que afeta direitos da personalidade, e não, necessariamente,
patrimoniais. A responsabilidade civil pode ser classificada como objetiva, isto é, aquela que
existe independente da culpa, somente ocorrendo nos casos expressamente previstos em lei, ou
subjetiva, aquela na qual o dever de indenizar exige que o autor do dano tenha agido com dolo
ou culpa, sendo a regra no Código Civil sendo a classificação adotada no Direito de Família.
Pode ainda ser considerada contratual ou aquiliana, também chamada de extracontratual, que é a
que nos interessa nesse tema eis que surge na violação do dever de cuidado, como prevê o artigo
186, do Código Civil: "Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito."
Importante ressaltar que a Alienação Parental também pode ser instaurada por um
terceiro, interessado, por algum motivo, na destruição familiar: a avó, uma tia, um (a) amigo (a)
da família que dá conselhos insensatos, um profissional antiético (psicólogo, advogado,
assistente social, médico, delegado, conselheiro tutelar etc.) Também pode ser instaurado contra
alguma dessas figuras familiares importantes para a criança, como por exemplo os avós. Com o
aumento da expectativa de vida e a inserção da mulher no mercado de trabalho, não é incomum
que os avós passem a maior parte do tempo com os netos, muitas vezes até mesmo ocupando o
lugar dos genitores, os provendo de cuidados e sustento. Nesse sentido, João Andrade de
Carvalho 15 prediz:
Sabe-se que dinâmica familiar é um dos fatores ambientais que mais favorecem o
desencadeamento de transtornos como depressão e ansiedade na infância. Em realidade, a falta
de convivência com o genitor e os conflitos entre os pais são muito mais negativos para as
crianças do que a mera separação do casal, e pode desencadear agressividade, inibições, medo,
tiques nervosos, somatizações e bloqueios na aprendizagem, além da falta de identificação com o
genitor alienado. Silveiro 16
adverte que, “em graus de SAP mais elevados, a criança pode
apresentar como a depressão crônica, transtornos de identidade e de imagem, incapacidade de
adaptação, isolamento, incontrolável sentimento de culpa, desorganização, comportamento
hostil, dupla personalidade, envolvimento com entorpecentes, violência e até mesmo suicídio”.
Os efeitos negativos da Síndrome variam de acordo com o temperamento, personalidade, idade e
maturidade psicológica da criança, dentre outros fatores. Porém, o mais preocupante é que
segundo pesquisas, nos casos de divórcio ou de separação dos pais, 80% dos filhos sofreram
algum tipo de alienação, e que mais de 25 milhões de crianças no mundo padecem desse tipo de
violência.
Com base nas estatísticas fornecidas pelo IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de
Família 17, Pinto 18 relata algumas consequências da ausência ou distanciamento por parte de um
dos genitores na vida do menor: (i) 72% de adolescentes que cometem crimes graves e
homicídios vivem em lares de pais separados; (ii) 70% dos delinquentes adolescentes e pré-
adolescentes cresceram distantes de um genitor; (iii) Crianças sem a presença do pai têm 2 vezes
mais probabilidades de baixo rendimento escolar e desenvolverem quadros de rebeldia a partir da
3ª infância; (iii) A taxa de suicídio (ou tentativa) entre adolescentes de 16 e 19 anos de idade
triplicou nos últimos 5 anos, sendo que 75% deles ocorreram em lares de pais ausentes ou
distantes; (iv) Crianças na ausência do modelo do pai estão mais propensas ao uso de álcool e
tabagismo e outras drogas; (v) Filhas distantes de pai têm 3 vezes mais chances de engravidarem
ou abortarem ao longo da adolescência; (vi) Crianças na ausência do pai são mais vulneráveis a
sofrer acidentes, dificuldade de concentração, mentir e desenvolver dificuldades de fala e asma;
(vii) Vivendo em uma família sem o pai, a disciplina cai vertiginosamente e as chances da
criança se graduar com êxito em nível superior cai em 30%; (viii) Meninas que crescem apenas
com a mãe têm o dobro de probabilidade de se divorciarem; (ix) Meninas que crescem distantes
da figura do pai têm 5 vezes mais chances de perderem a virgindade antes da adolescência; (x)
Meninas distantes do pai têm 3 vezes mais chances serem vítimas de pedofilia ou mesmo de
procurarem afeto em qualquer figura masculina mais velha;
Desse modo, fica evidente a gravidade da alienação parental, bem como os danos, não
raramente, irreparáveis aos menores. O ato de criar falsas memórias, destruir vínculos e dificultar
o contato do filho com o genitor, dentre outros, constitui covarde violência à saúde emocional e
psiquíca da criança, provocado pelo sentimento de rancor e revanchismo pela frustração do fim
do relacionamento de dois adultos.
A referida lei prevê medidas para que, constatada a alienação, caiba ao Juiz: a) Fazer com
que o processo tramite prioritariamente, já que, envolvendo possíveis abusos psicológicos à
criança, a resolução deve ser imediata; b) Determinar medidas que preservem a integridade
psicológica da criança ou adolescente; c) Determinar a elaboração, de laudo pericial, no qual o
perito terá o prazo de 90 dias, prorrogáveis por autorização judicial, para apresentar o laudo; d)
Advertir o alienador; e) Ampliar a convivência da vítima com o genitor prejudicado, podendo-se
até determinar eventual alteração da guarda para compartilhada ou, ainda, invertê-la. Visa
promover o fortalecimento de vínculos que possam ter sido enfraquecidos, evitando danos
maiores ao menor; f) Estipular multa ao alienador. Tal medida se mostra pouco eficaz, eis que há
omissão legal quanto ao valor e destinação da multa, além de prejudicar a criança-vítima, eis que
ela é, na maior parte das vezes, dependente financeiramente do alienador; g) Determinar
acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial.
A alienação Parental pode ser considerada uma forma de tortura psicológica. Esse é o
entendimento do Desembargador Caetano Lagrasta Neto do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, que afirma19: "Sempre fui defensor, em julgados ou em obras de doutrina, da aplicação da
pena de acordo com a gravidade do delito praticado e não resta dúvida que a alienação parental
dependendo do grau de dolo é, tipicamente, um crime de tortura."
E salienta:
No que se refere às medidas repressivas, nota-se que a lei não trouxe grande inovação, eis
que apresenta os mecanismos já presentes no Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu
artigo 129, incisos III, VII, X c/c 213, parágrafo 2. O artigo 7° vem ao encontro do código Civil
e ao Estatuto da Criança e do adolescente, no que tange à atribuição da guarda e alteração, e que,
no caso da hipótese de não haver condições de compartilhar a guarda ela será unilateral, será
conferida ao genitor que oferecer melhores condições ao menor. De todo modo, observa-se que
essas medidas, analisando-se caso a caso, poderão ser tomadas, independentemente, de eventual
responsabilização civil ou criminal do alienador, levando-se em conta o grau de evolução da
Síndrome de Alienação Parental e sua natureza punitiva. Vale ressaltar que a lei não especifica o
grau da alienação parental, eis que tal tarefa incumbe a área da saúde e psicossocial. Por fim,
temos instituída a irrelevância do domicílio da criança, para determinar as competências dos
genitores ou responsáveis no exercício de prestar os direitos fundamentais dos menores, com a
observação do consenso entre as partes ou da decisão judicial.
Em suma, temos que a referida lei representa um grande avanço, à medida que protege os
Direitos Fundamentais de crianças e adolescentes, tão estão vulneráveis a tal abuso. A partir do
momento que se tem uma lei específica, indicando e punindo os responsáveis, há maior
efetividade na garantia desses Direitos e na promoção da dignidade da criança e do adolescente,
bem como do genitor alienado, sempre com o objetivo do melhor interesse do menor. A Lei da
Alienação Parental, que tornou o Brasil pioneiro na América Latina na criação de uma lei sobre o
tema, cria mecanismos para inibir os atos alienantes, visando a proteção do menor, a manutenção
dos sistemas de guarda vigentes no nosso direito, bem como a perpetuação dos laços familiares.
A alienação parental não é fato novo, porém a sua respectiva lei o é. Essa norma tem o intuito de
devolver à família um direito assegurado constitucionalmente, conferindo efetividade e
celeridade ao processo, princípios indispensáveis para que a justiça tome medidas adequadas e
necessárias, pois, uma justiça tardia poderá ter efeitos por vezes irreversíveis diante deste tema
tão complexo e cada vez mais comum na sociedade moderna.
Artigo 2 "§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho,
encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a
guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja
a guarda do menor.
Grande parte desse problema se dá por decisões construídas por pessoas que não são
magistrados, e sim por uma "assessoria" não tem capacidade de atuar em um ramo tão sensível
como o Direito de família, ou mesmo que, frequentemente, apenas reproduzem decisões
anteriores, de forma quase que mecânica. Suas decisões são, quase sempre, no sentido de não
aplicação da guarda compartilhada, desrespeitando o disposto no artigo 1.583 § 2, do nosso
código civil. Tal omissão judiciária, com aval no Ministério Público, dificulta a manutenção de
vínculos familiares e fere o princípio do Maior Interesse da Criança. Observemos a definição
presente na Lei nº 12.318:
Art. 2º: “Ao magistrado impõe-se primar pelo respeito à Constituição da República e às
leis do País, buscando o fortalecimento das instituições e a plena realização dos valores
democráticos.”
Art. 3º: “A atividade judicial deve desenvolver-se de modo a garantir e fomentar a
dignidade da pessoa humana, objetivando assegurar e promover a solidariedade e a
justiça na relação entre as pessoas"
Também há omissão do Ministério Público, responsável por zelar pelo efetivo respeito
aos direitos e garantiras legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas
judiciais e extrajudiciais cabíveis em razão de desrespeito, como prevê o artigo 201, VIII, da
Constituição Federal, e que dificilmente se posiciona nos casos de desrespeito a Lei da Alienação
Parental e da Guarda Compartilhada. O legislativo, no entanto, exerceu o seu papel, eis que
apresenta inúmeros e suficientes dispositivos para promoção da proteção do menor, por exemplo,
Constituição, em seu artigo 227, bem como no Código Civil, no Estatuto da Criança e do
Adolescente, e nas exaustivamente mencionadas Lei de Alienação Parental e Lei da Guarda
compartilhada.
Um caso famoso de alienação parental judicial é o do menino Bernardo Bolrini, que foi
assassinado pela madrasta em abril de 2014, aos 11 anos. Órfão de mãe, o menino morava com
pai, com autorização do juiz da vara da Infância e Juventude, já havendo instauração de
investigação, por parte do Ministério Público, contra o genitor, por negligência afetiva e
abandono familiar. No caso, havia clara alienação parental em relação à avó materna, uma vez
que havia constante impedimento, por parte do pai, da convivência da criança com a mesma após
o falecimento da genitora. Porém, o juiz não observou a situação de alienação parental, que
ensejaria estabelecimento de regime mínimo de convivência familiar em favor da avó, de acordo
com o artigo 6, II, da Lei 12.318, que assevera:
A falta de aplicação da Lei de Alienação, nesse caso concreto, poderia ter evitado o
assassinato de Bernardo, eis que com a presença da avó e os demais parentes maternos, o menor
teria mais chances de ser protegido.
Assim, temos que nos ater a responsabilidade do judiciário de prevenir casos de alienação
e resguardar os interesses do menor, garantindo o direito de convivência familiar, e observando
as leis de proteção do menor, sobretudo as que dizem respeito à Alienação Parental e Guarda
Compartilhada. É, ainda, de suma importância que hajam sanções à prática de alienação parental
judicial, que apesar de não ser citada na Lei nº 12.318, é uma forma extremamente grave e
comum de Alienação Parental, lamentavelmente praticada por quem tem o dever de combatê-la.
Dado o desgaste físico, financeiro e emocional que os processos judiciais causam nas
pessoas, tem-se, cada vez mais, intensificado a busca de resolução de conflitos por meio da
mediação, como um meio de soluções de conflitos que favoreçam o diálogo e o entendimento
entre as partes. Além disso, se mostra como uma solução flexível e criativa para a morosidade e
barreiras burocráticas presentes no nosso judiciário.
A importância da mediação é ainda melhor no que diz respeito ao Direito de Família, área
carregada de subjetividades e conflitos sentimentais com os quais os profissionais de Direito não
estão preparados para lidar. Observe a opinião de Maria Berenice Dias e a psicóloga Ivone
Coelho Souza21:
Às vezes, pode ser muito mais difícil mediar um conflito do que obter uma decisão
judicial. Mas os resultados serão, certamente, mais duradouros e mais profundos quando
as partes resolverem seus conflitos, livremente, através da Mediação. As transformações
subjetivas permanecem, enquanto as decisões objetivas, não raro, são ineficazes para
corrigir os problemas que tentam resolver. É preciso tentar desenvolver a experiência da
Mediação como uma possibilidade de superar a Dogmática Jurídica que não responde,
adequadamente, às necessidades do mundo atual.
Por fim, podemos concluir que o instituto da Mediação representa grandes contribuições
no sentido de descentralizar do Judiciário os conflitos familiares ( que, além de morosos,
prejudicam ainda mais os conflitos litigantes entre as pessoas, criando emoções de perda, ódio,
revanchismo), efetivar a garantia constitucional de duração razoável do processo, agilizando os
processos, minimizando os custos, além de auxiliar as partes a manter um diálogo saudável sobre
assuntos realmente importantes, em especial no que diz respeito ao desenvolvimento saudável
dos filhos.
CAPÍTULO III- RESPONSABILIDADE CIVIL NA ALIENAÇÃO PARENTAL
A prática de alienação parental, sabidamente tratada em lei, é ato ilícito em que o genitor
alienado é impedido de conviver e desenvolver o afeto com o seu filho, que por sua vez também
sofre, não apenas com a falta do genitor alienado, como também com a influência negativa do
genitor alienante, configurando-se danos irreparáveis a ambas as vítimas. Há que se ressaltar que
a Lei da Alienação Parental versa em seu artigo 3 a respeito da conduta ilícita do alienante,
classificado expressamente como abuso moral, e que gera, portanto, o dever de indenizar.
Importante ressaltar que a Lei 12.318 observa a responsabilização civil e criminal do alienante
frente ao menor e ao genitor alienado, consagrando, assim, a ilicitude da prática de alienação
parental.
Por fim, deve-se ressaltar que o genitor alienado também é vítima, e assim, integra o polo
passivo da alienação parental, cabendo também a ele o direito de requerer a responsabilização do
alienante por seus atos danosos. O dano suportado pelo genitor alienado se perfaz tanto pela
campanha difamatória realizada pelo alienador contra o mesmo, que lhe causa dor, sofrimento e
humilhação, e em casos mais graves, até prejuízo da vida social e profissional (como é o caso da
falsa denúncia de abuso sexual, por exemplo), bem como pelos danos no relacionamento com o
filho, cujos laços afetivos podem nunca virem a ser refeitos e momentos importantes (como
aniversários, dia dos pais, férias, etc) jamais voltar. Nesse sentido, Fábio Bauab Boschi27 afirma
que a responsabilidade civil do alienante é patente pois, o dano moral do visitante reflete-se na
esfera sentimental e emotiva do visitado, que é, aliás, o detentor do maior interesse; então, ao
ofender-se a moral de um, ofende-se, em muitos casos, os sentimentos do outro, de forma que
ambos serão vítimas de um mesmo ato lesivo. Assim, cabe ao genitor vítima de alienação buscar
os meios legais para que a mesma seja cessada, podendo ainda pleitear judicialmente indenização
em favor de sí mesmo e do menor, por ele representado. A ação de reparação de danos com
fundamento na responsabilidade civil, pode ser proposta na vara da família, não apenas por
iniciativa do alienado, como também do Ministério Público ou até mesmo de ofício pelo juiz, ao
deparar-se com casos graves de alienação parental.
No mesmo entendimento, o autor Marcelo Junqueira Calixto31 ressalta que: “Nas relações
familiares quando no exercício do poder familiar não há de se imputar culpa, pois os pais têm
esse dever conferido pelo Estado de cuidar dos filhos. Nesse sentido a responsabilidade civil se
desdobra para a caracterização da objetividade”.
Danos morais são as perdas sofridas por um ataque à moral e à dignidade das pessoas,
caracterizados como uma ofensa à reputação da vítima. Se configura o dano moral quando é
atingido um direito de personalidade, no que diz respeito a sua liberdade, honra, saúde (mental
ou física) e imagem, afetando dimensões físicas, psíquicas, morais e intelectuais. Tais direitos
fazem parte do leque dos direitos fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal, que
prevê, em seu artigo 5, incisos V e X:
O dano moral também tem previsão no Código Civil: "Art. 186. Aquele que, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito."
Conforme o entendimento de Yussef Said Cahali32, o que enseja dano moral é “tudo
aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais
inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado”.
Pablo Stolze e Pamplona Filho33 tratando do dano moral, afirmam que o dano moral
consiste na lesão de direitos cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a
dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a esfera
personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando, por exemplo, sua
intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente. Clayton
Reis34 adiciona que: “a indenização dos danos ocorridos no ambiente familiar, diferentemente
do que se observa no ambiente contratual ou negocial, deverá restringir-se aos danos
imateriais, ou seja, danos morais”.
Apesar da Lei nº 12.318/2010, dispor em seu artigo 6, III a aplicação de multa do genitor
alienador, ela é omissa ao disciplinar a reparação de danos ao alienado. Porém, é inegável que o
genitor alienado perde algo muito precioso, muitas vezes irreparável: momentos, lembranças,
toda a infância e até mesmo o amor do próprio filho. Além disso, tem inúmeras lesões no que diz
respeito a sua vida particular e social, provenientes das mentiras do alienante, que podem chegar
a extremos de falsas acusações de maus tratos e abusos sexuais. Pacificado o princípio da
reparabilidade do dano moral, podemos concluir que o magistrado ao fixar o valor indenizatório
do dano moral deve levar em conta tanto a ofensa do atingido como a capacidade financeira do
ofensor. Tal condenação teria dupla função: indenizar o alienado pelo seu sofrimento e
desestimular os atos de alienação, eis que nem sempre a lei é suficiente para coagi-los.
Por fim, há que se ressaltar que dentro do âmbito familiar, a indenização por dano moral
deve ser analisada no caso concreto, com provas contundentes, de modo a evitar a ocorrência da
banalização do dano moral. Ainda há dificuldade, por parte da doutrina e jurisprudência, na
valoração do dano moral, eis o caráter subjetivo da lesão aos sentimentos humanos. Logo, na
fixação da quantia, devem ser levados em consideração a gravidade da conduta e os resultados
do dano, bem como a possibilidade financeira do indenizador, guardando-se a devida
proporcionalidade. Deve-se entender que, apesar da indenização não por fim ao sofrimento
gerado, pode minimizar suas sequelas, através da possibilidade de se arcar com os custos de
tratamentos psicológicos aliados a uma melhor qualidade de vida e a gradual aproximação das
partes alienadas.
3.3 Jurisprudência
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. Ed. Revista dos Tribunais, 2ª edição, pp. 699/700.
CARVALHO, João Andrade. Tutela, curatela, visita e pátrio poder. Rio de Janeiro: Aide,
1995.
DIAS. Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8ª Edição. Revista, atualizada e
ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
DIAS, Maria Berenice; SOUZA, Ivone Coelho. Separação litigiosa, na esquina com a
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RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 447.584-7-RJ - Relator: Ministro CEZAR PELUSO -
Recorrente: Jornal do Brasil S. A. Advogados: Clério Borges Martins e outros Recorrido: José
Paulo Bisol. Advogados: Carlos Henrique de Carvalho Fróes e outros.
Apelação Cível Nº 70073665267, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 20/07/2017
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