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JOEL SWISHER
ROBERT REDLINGER
PLANEJAMENTO INTEGRADO DE
RECURSOS ENERGÉTICOS
Oferta, demanda e suas interfaces
2ª edição
Campinas
IEI Brasil
2018
APRESENTAÇÃO
A IEI Brasil apresenta a segunda edição do livro “Planejamento Integrado de Recursos
Energéticos”, escrito originalmente pelos pesquisadores Gilberto de Martino Jannuzzi, diretor da
IEI Brasil, e por Joel Swisher e Robert Redlinger, ambos do United Nations Environment
Programme (UNEP) Centre for Energy and Environment.
A nova edição, que contém atualização de termos, conceitos e bibliografias, ganhou o título
de “Planejamento Integrado de Recursos Energéticos: oferta, demanda e suas interfaces”. Esta nova
versão foi disponibilizada de forma fracionada no site da IEI Brasil (http://iei-brasil.org/livro-pir/),
capítulo a capítulo, enquanto seu processo de revisão estava em andamento. Essa medida objetivou
que estudantes, pesquisadores e demais interessados na área tivessem acesso ao conteúdo, composto
também por apêndices, exercícios práticos e suas respostas. Os quatro capítulos que compõem a
obra agora estão consolidados neste livro digital. As soluções dos exercícios apresentados ao longo
dos capítulos podem ser acessadas em uma planilha disponibilizada nesse link.
O livro foi revisado por estudantes e colaboradores do professor Gilberto Jannuzzi, em
especial o professor Everthon T. Sica do Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC (Florianópolis)
e João B. Marques que revisaram exercícios e atualizaram algumas referências. A publicação
também contou com a revisão textual e a diagramação da jornalista Gabrielle Adabo da IEI Brasil.
A primeira versão da obra foi publicada há 20 anos, em inglês, sob o título “Tools and
Methods for Integrated Resource Planning”. Em 1997, uma versão impressa em português foi
elaborada por Jannuzzi e Swisher, com o apoio do Procel e do PNUD, porém se encontra esgotada.
Nessas últimas duas décadas, experimentamos muitas e relevantes transformações na
indústria de energia, bem como nas tecnologias, leis e regulações. A revisão do conteúdo deste livro
se fazia necessária para contemplar a realidade da geração distribuída, das tecnologias de
armazenamento de energia e, mesmo, da maior disseminação de tecnologias mais eficientes de uso
final.
IEI Brasil
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
1.1. INTRODUÇÃO
Sabemos que a energia é necessária para atender às demandas básicas do ser humano
moderno: iluminação, aquecimento/ventilação, energia para cocção, refrigeração, força motriz etc.
Serviços de energia são essenciais para promover o desenvolvimento socioeconômico das
populações e buscar maneiras de prover esses serviços com o menor impacto ambiental é um dos
grandes desafios do século XXI. A produção e o uso de energia são algumas das atividades de maior
impacto no meio ambiente, seja ele no âmbito local ou global. São evidentes os esforços para
controlar as emissões de gases de efeito estufa decorrentes dessas atividades, como demonstra o
resultado da COP 21, a 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
Alterações Climáticas, realizada em Paris no final de 2015. É crescente a preocupação em promover
maior participação de fontes renováveis na matriz energética do futuro e o uso eficiente da energia.
Nas últimas quatro décadas, o planejamento de recursos energéticos migrou da abordagem de custo
mínimo para outra, mais abrangente, integrando os usuários e a geração de energia descentralizada,
a maior consideração com os impactos ambientais e os programas de eficiência energética.
Acidentes nucleares e a preocupação com segurança energética forçaram países a dedicarem maior
atenção a programas de eficiência energética e de inserção de energia renovável em grande escala,
como é o caso da política de estado Energiewende da Alemanha (Strunz 2014). Embora a grande
maioria dos países ainda realize seu planejamento fortemente focado no suprimento, é crescente a
preocupação com o planejamento da demanda de energia. A necessidade de prover acesso a serviços
de energia e atender à elevada demanda de países como China e Índia demonstraram claramente os
limites do planejamento da oferta e a necessidade de promover maior eficiência nos setores de
consumo de energia, incluindo mudanças de hábitos e padrões de consumo.
O aumento da participação de fontes renováveis, inclusive por meio de sistemas de geração
distribuída1, e as vantagens da instalação de redes inteligentes2 (smart grids, em inglês) evidenciam
a importância de se conhecer a demanda e o consumidor de energia. Essa nova dimensão deve,
portanto, ser incorporada no processo de planejamento, que definiremos mais adiante como
Planejamento Integrado de Recursos (PIR).
A metodologia PIR (Planejamento Integrado de Recursos), embora originada nos Estados
Unidos e no Canadá (IRP3), é, hoje, aplicada em muitos países desenvolvidos e em
desenvolvimento, onde a preocupação com o meio ambiente e com o uso racional dos recursos
energéticos ocupa cada vez mais a agenda dos governos locais. As fontes alternativas de energia,
demandadas por uma sociedade que aposta em um futuro em que o uso dos recursos será ditado
pelo meio ambiente, vêm se impondo com mais intensidade para escrever uma nova fase a partir da
primeira década do século XXI. Essa tendência exige um tratamento diferenciado no PIR, dado que
os custos de substituição de fontes tradicionais e os benefícios decorrentes, principalmente por
1
Chamados de geração distribuída aqueles sistemas de geração de eletricidade de pequeno porte instalados junto a
consumidores de eletricidade e que são conectados ao sistema de distribuição podendo, desse modo, disponibilizar a
energia não consumida localmente para os demais consumidores do sistema elétrico.
2
Redes inteligentes são um conjunto de tecnologias de gerenciamento e controle de sistemas elétricos com tecnologias
de informação e comunicação que permitem o fluxo bidirecional de informação e energia entre um usuário em particular
e o sistema elétrico como um todo.
3
IRP é a sigla em inglês de Integrated Resources Planninig (PIR, em português).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 13
reduzir as emissões de gases de efeito estufa, implicam em aspectos ainda mais complexos do
planejamento energético.
Neste capítulo, abordaremos as principais motivações para se pensar em um planejamento
energético que considere de maneira explícita também o consumo de energia e não apenas a oferta.
4
O IDH é um índice criado e monitorado pela ONU para medir o nível de desenvolvimento humano dos países a partir
de indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB
per capita). O valor do IDH (0 a 1) é uma ponderação desses indicadores: IDH=(IDHeducação×IDHlongevidade×IDHrenda)1/3.
14 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
Após esse choque5, talvez o mais determinante entre as demais crises do petróleo que se
sucederam, os países em desenvolvimento se viram na obrigação de diversificar suas matrizes de
produção de energia primária, a exemplo do Brasil. O preço do petróleo durante os anos de 1970
determinou maiores esforços em termos de redução da dependência externa desse combustível, por
exemplo, por meio da destinação de investimentos para exploração e produção nacional de óleo
bruto e maior uso de hidroeletricidade. As iniciativas para substituir o petróleo importado mostram
a relativa estabilidade de seu consumo durante a década de 80 e início da década de 90. Programas
de substituição de combustíveis foram iniciados durante aquela época, como o Programa Nacional
do Álcool (Proálcool6), com o objetivo de aumentar a produção doméstica de combustível como
uma mercadoria estratégica. Esse programa de produção de energia no Brasil está em meio aos de
maior sucesso e maior duração dentre aqueles que se iniciaram na década de 1970. Hoje, a matriz
brasileira conta com uma expressiva participação de produtos derivados da cana-de-açúcar, a
principal biomassa na produção de energia no país (ver evolução na Figura 1-2).
5
Pode-se contabilizar cinco crises ou fases de preço do petróleo depois da Segunda Guerra Mundial: 1956 (após o
presidente Gamal Nasser nacionalizar o canal de Suez); 1973 (países da OPEP aumentaram o preço do petróleo em
mais de 300% em protesto ao apoio prestado pelos Estados Unidos a Israel durante a guerra do Yom Kippur); 1979
(crise política no Irã e a consequente deposição do xá Reza Pahlevi); 1991 (guerra do Golfo); 2008 (os preços subiram
mais de 100% entre janeiro e julho em virtude de movimentos especulativos em nível global).
6
O Proálcool foi um programa financiado pelo governo brasileiro a partir de 1975 para substituição em larga escala
dos combustíveis veiculares derivados de petróleo por álcool.
16 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
140.000
120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
-20.000
-40.000
-60.000
1984
1998
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1986
1988
1990
1992
1994
1996
2000
2002
2004
2006
2008
2010
2012
2014
PRODUÇÃO IMPORTAÇÃO
CONSUMO TOTAL EXPORTAÇÃO
Figura 1-3 – Evolução da produção e do consumo de petróleo no Brasil (1970-2014) (mil m3)
Fonte: EPE/MME (2015)
Com base na Figura 1-2, pode-se dizer que o Brasil reduziu a participação da lenha e migrou
para o petróleo e o gás natural em quatro décadas (1970 a 2010). Em relação às fontes renováveis,
sua participação é significativa (46,4% em 2013), dada a crescente participação dos produtos da
cana-de-açúcar nesse mesmo período. Já a partir de 2013, a participação da geração térmica é
crescente devido a largo período de estiagem e aumento de consumo de eletricidade.
Após a crise do petróleo da década de 1970, portanto, outras fontes de energia, até então não
interessantes economicamente, passaram a ser consideradas no planejamento. Além disso, o
conceito de segurança energética se tornou parte da política energética de diversos países. Em anos
mais recentes, a energia eólica tem aumentado sua participação, assim como a energia solar
fotovoltaica.
de emissões de gases de efeito estufa (na sua grande parte originárias das atividades de produção e
uso de energia) vêm influindo de maneira significativa nas opções energéticas dos países.
Nas últimas décadas, e de forma mais acentuada na primeira década do século XXI, a pressão
da sociedade para o uso de energia limpa vem contribuindo para alterar o perfil da matriz energética
mundial, ainda que lentamente. Os relatórios de organismos internacionais, como o Painel
Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC),que são periodicamente publicados, apontam
os impactos sobre o clima provocados por usos de fontes energéticas poluentes, indicando a
necessidade urgente de mitigação desses efeitos (IPCC 2014). As ações são diversas: aumento da
eficiência energética das fontes atuais (poluentes e não poluentes), substituições das fontes
poluentes por fontes alternativas menos poluentes, metas negociadas de emissão, mudança do perfil
do consumidor etc. Pode-se afirmar, a despeito de eventuais controvérsias suscitadas contra esses
relatórios, que o futuro será de energia limpa. No entanto, as fontes fósseis ainda permanecerão na
matriz energética mundial por algumas décadas (ver evolução segundo a IEA na Figura 1-4).
Para atingir as metas de redução programadas, sem mencionar aquelas necessárias para
estabilizar a atmosfera, serão necessárias mudanças tecnológicas para diminuir a intensidade do uso
de combustíveis fósseis na maioria dos sistemas energéticos e aumentar a eficiência no uso de
combustíveis e eletricidade7. Os possíveis instrumentos políticos com os quais se estimulariam essas
mudanças são muitos. Internacionalmente, a maioria das discussões se concentra nas várias formas
de impostos sobre a emissão de carbono e, para algumas regiões, no balanço de emissões negociadas
ou permitidas. Na esfera nacional, diversos países têm implementado regulamentações que
restrinjam o consumo de energia e visem à uma maior eficiência energética, além de estimularem,
por meio de mecanismos econômicos, investimentos que promovam um uso energético mais
racional ou incentivem um maior fomento das fontes alternativas de geração de energia.
Nota: Refere-se a um dos cenários da IEA, chamado de New Policies Scenario, que pressupõe a introdução de
novas medidas, de forma relativamente moderada, para implementar os compromissos de política geral que já foram
anunciados, incluindo aqueles para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e, em certos países, os planos para
eliminar gradualmente os subsídios à energia fóssil.
7
É importante lembrar que cerca de 30% das emissões globais de CO2 advém da operação de centrais termoelétricas.
18 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
A participação dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural) ainda será
significativa em 2035, próxima de ¾ da matriz de energia primária mundial. Apesar do alto custo
de produção em algumas regiões no mundo, dadas as circunstâncias adversas da ocorrência de
formações geológicas onde se encontram esses recursos, não se discute que o petróleo e o carvão
são fontes acessíveis, eficientes e relativamente baratas, embora poluentes.
Os custos da geração de eletricidade a partir de fontes renováveis, notadamente a geração
eólica e a solar fotovoltaica, vêm caindo constantemente e de modo significativo na última década,
a ponto de já serem competitivos comercialmente em muitas regiões e em muitos países.
A energia pode ser vista pela sociedade de várias formas, dependendo do nível de decisão,
influência e necessidades inerentes aos diferentes grupos sociais. Entender essas distintas
percepções é relevante porque elas condicionam a maneira de se realizar o planejamento energético
e como decisões serão tomadas com relação a fontes, tecnologias e usos finais. A energia pode ser
tratada como uma mercadoria (commodity), uma necessidade social ou um recurso estratégico ou
ecológico. À parte dos aspectos técnicos nos quais o conhecimento das leis físicas é necessário para
se entender as diferentes formas de conversão de energia (Patterson 1996), a tomada de decisão
energética é muito influenciada pelo modo como é compreendida pelos agentes que participam
desse processo.
Para melhor entender o que é o PIR, é importante estender o conceito técnico de energia,
conforme bem observaram Stern e Aronson (1984), refletindo o aprendizado sobre os impactos dos
preços de petróleo no comportamento dos consumidores, das corporações e das políticas públicas
de energia desde a década de 1970.
20 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
8
Dentre outros acidentes, os mais notórios ocorreram na usina de Three Mile Island em 1979 (Harrisburg, Pensilvânia),
na usina de Chernobyl em 1986 (maior da história até hoje, atingindo regiões da Bielo-Rússia, Ucrânia e Rússia) e na
usina de Fukushima em 2011 (Japão).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 21
Substituição de
energéticos, GLD,
Família
Materiais "smart"(redes,
Tecnologias de interface Armazenamento medição,
de energia equipamentos)
Desenvolvimento
Combustíves
Eficiência Eletricidade Recursos de Oferta
energética Calor
O avanço tecnológico está tornando mais difusa a separação entre oferta e demanda de
energia. Por essa razão, incluímos, também, uma classe de tecnologias que chamamos de
tecnologias de interface que possibilitam fluxos bidirecionais de energia, ou seja, o consumidor
pode passar a ser um produtor de energia e pode vender sua geração para o sistema elétrico (Demand
Response). No PIR essas possibilidades também devem ser avaliadas, são novos recursos
energéticos que surgem e que devem ser considerados como opções. A Figura 1-6 ilustra esse
conjunto de possibilidades tanto do lado da oferta, quanto do lado da demanda e das tecnologias de
9
Cabe citar as referências disponíveis em português nos seguintes endereços: http://seeds.usp.br/pir/,
http://seeds.usp.br/pir/pir/pir2.html, http://seeds.usp.br/portal/uploads/09-002.pdf.
22 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
Conceituar energia não é trivial. Nesta seção são apresentados alguns conceitos elementares
sobre energia a partir de seus aspectos técnicos e dentro de um sistema energético, no qual energia
é convertida continuamente de uma forma a outra. Para os objetivos deste capítulo inicial é adotada
uma definição que faça menção ao conceito de desenvolvimento sustentável, sem transgredir o que
é entendido formalmente pela Física: energia é a força motriz (ou trabalho) oriunda de fontes
diversas e, quando aproveitada de forma consciente, promove o desenvolvimento humano dentro
dos limites impostos pelo meio ambiente.
O sistema energético compreende um conjunto de atividades que pode ser dividido em três
níveis:
• Produção e conversão de fontes em vetores energéticos;
• Armazenamento e distribuição dos vetores; e
• Consumo final.
Cada nível inclui uma complexa rede de atividades com o objetivo de extrair energia das
fontes encontradas na natureza e entregá-la ao ponto de consumo. Fontes de energia são as formas
em que a energia é encontrada na natureza. As várias fontes são processadas e convertidas em
vetores que, por sua vez, são armazenados ou distribuídos para os consumidores finais. Dependendo
das atividades nos setores de consumo, a energia é usada para operar máquinas, motores, lâmpadas,
transporte de bens e pessoas, com o objetivo de satisfazer as necessidades de força motriz,
iluminação, cocção, climatização, entre outras. Essas diversas funções são chamadas usos finais
energéticos ou serviços de energia. A Tabela 1-1 exemplifica os componentes de um sistema
energético.
De maneira análoga, fontes de energia são consideradas não renováveis se suas reposições
naturais levarem muitos séculos ou milênios sob condições muito particulares, tais como para o
petróleo, e sua reposição artificial é absolutamente impraticável, envolvendo processos com gastos
de energia igual ou maior que a quantidade de energia obtida ou com custos proibitivos (ver Tabela
1-2).
10
Alguns combustíveis nucleares (plutônio, por exemplo) não são encontrados na natureza em qualquer quantidade,
portanto são considerados energias secundárias.
24 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
A energia final inclui algumas formas de recursos primários e secundários que estão
disponíveis para o consumidor, descontando perdas da produção, armazenamento e distribuição.
Esse recurso é convertido em energia útil no ponto do uso final. Energia útil é a energia realmente
demandada pelo consumidor, como calor, luz ou movimento mecânico. A quantidade de energia
útil aproveitada de uma dada quantidade de energia final depende da eficiência da tecnologia do
uso final.
A energia é transformada por meio de uma cadeia de eventos e de conversões. O recurso
primário existe na forma natural, por exemplo, de um combustível fóssil que é extraído de um
depósito sedimentar. Depois de uma série de transformações, a energia se torna disponível para o
consumidor, que a converte em formas úteis que são os serviços de energia (ver Figura 1-7).
Se TRE<1, diz-se que o método de exploração para obtenção dessa fonte é o do tipo
sumidouro. Nesse caso, não há ganho de energia. O ganho líquido de energia Enet está relacionado
com a taxa de retorno energético conforme a Eq. (1.3) a seguir:
Enet + Einvestida
TRE = Edisponível para conversão = Enet + Einvestida (1.3)
Einvestida
A eficiência de um sistema de conversão, além do índice S, pode ser avaliada também pela
TRE, que, quanto maior, indica que mais eficiente ou mais tecnológico é o sistema. Já as máquinas
térmicas (unidades de um sistema) são avaliadas pelo que elas podem fornecer em termos de
trabalho a partir do uso do calor. O rendimento de uma máquina térmica é dado por:
W
T = (1.4)
Qdisponível
Onde Qdisponível é a energia disponível e W é o trabalho obtido com a energia útil. Em todo
sistema térmico parte do calor é utilizada em forma de trabalho (energia útil) e parte é dissipada,
portanto W=Qdisponível–Qdissipada. Assim, o rendimento de uma máquina térmica é:
11
Taxa de Retorno Energético (TRE). O termo em inglês é conhecido como Energy Returned On Energy Invested
(EROEI).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 25
A energia útil, como já mencionada, é aquela que chega até o consumidor promovendo algum
tipo de serviço. Serviços de energia incluem, por exemplo, iluminação, conforto térmico,
refrigeração de alimentos, transporte, manufatura de produto etc. Geralmente se discute a eficiência
do uso final energético com atenção à conversão de energia final para energia útil realizada em um
determinado equipamento. Esse conceito, na verdade, é mais abrangente. Por exemplo, um ar-
condicionado eficiente pode reduzir a demanda de eletricidade de um prédio comercial, mas uma
construção bem projetada poderia promover o mesmo serviço de energia (conforto térmico) sem o
ar-condicionado. A Figura 1-8 é um exemplo que ilustra o efeito das melhorias na eficiência do uso
final reduzindo os requisitos de entrada energética enquanto mantém o mesmo nível de saída de
serviço para o caso de um motor elétrico (força motriz).
Melhorias técnicas, nos processos e equipamentos, podem aumentar a eficiência de um
sistema típico de motor bomba de 31% (ver Figura 1-8) para 70%. Só a introdução de um
controlador eletrônico de velocidade já produz efeitos na eficiência dos outros componentes. Seja
qual for a configuração de um sistema para fornecer um serviço de energia, a introdução de
melhorias pode reduzir substancialmente o consumo de energia na entrada do sistema e, com isso,
diminuir consideravelmente os custos com energia, além de cobrir o investimento realizado com as
melhorias técnicas.
12
Nicolas Léonard Sadi Carnot (1796 a 1832). Físico, matemático e engenheiro. Autor do primeiro modelo teórico
sobre máquinas térmicas (ciclo de Carnot). Também apresentou os fundamentos da segunda lei da termodinâmica.
26 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
Motor 90%
Tabela 1-3 – Exemplos de eficiência de conversão da energia final para energia útil
Eficiência Eficiência
Sistema Sistema
energética, energética,
Motor a combustão interna 10-50% Turbina a gás até 40%
O balanço energético pode ser feito por meio de uma matriz, também chamada de matriz
energética13, na qual todas as formas de energia, suas conversões, perdas e usos em um dado período
são registradas em uma mesma unidade de medida. Um balanço energético pode ser apresentado de
diversas formas, cada uma com suas próprias convenções e proposições. A forma mais comum
inclui colunas com quantidades de fontes ou vetores de energia usados e linhas com dados sobre as
transformações energéticas e os setores consumidores. No Brasil, a EPE14 é a empresa subordinada
ao Ministério de Minas e Energia responsável por emitir o balanço energético do país, além de
prestar serviços na área de estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor
energético brasileiro.
A Tabela 1-4 a seguir indica parte de um balanço energético primário do Brasil no ano de
2010 publicado pela EPE.
13
Alguns autores usam a expressão matriz energética se referindo a um balanço energético ideal proposto pelos
planejadores. Balanço energético se refere a uma contabilidade presente ou do passado.
14
Empresa de Pesquisa Energética, criada pela Lei 10.847, de 15 de março de 2004.
28 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
Unidades e conversão
Existe uma variedade de medidas físicas nas quais os fluxos de energia podem ser expressos
e, muitas vezes, essas quantidades não são necessariamente compatíveis entre si. Por exemplo,
gasolina e etanol são geralmente medidos em litros, consumo de eletricidade em quilowatt-hora
(kWh), carvão em toneladas, petróleo em barris etc. Dessa forma, é necessário e conveniente
expressar as diferentes formas de energia por meio da mesma unidade de medida. O conteúdo
térmico de cada combustível é a forma usada para a contabilização das quantidades de energia, que
podem ser expressas como calorias (cal), joules (J), toneladas equivalentes de petróleo (TEP),
toneladas equivalentes de carvão (TEC), terawatt-hora (TWh) etc.
O conteúdo térmico ou poder calorífico de um combustível é medido por meio de um
calorímetro, que pode determinar o poder calorífico superior (PCS), quando se inclui a quantidade
de calor liberada pela condensação do vapor d'água formado durante a combustão ou o poder
calorífico inferior (PCI), quando esse componente é excluído. O PCS é usado para estimar a
quantidade de energia disponível para o usuário. Na maioria dos países das Américas do Norte e do
Sul, o PCS é usado para as conversões necessárias nas contabilidades de energia nacional e nas
tabelas do balanço energético. Na Europa, o PCI é mais utilizado. Para expressar o conteúdo térmico
de um combustível, estabelece-se uma unidade de medida, mas é sempre desejável indicar o valor
em unidades no sistema SI. Por exemplo, quando se usa a unidade toneladas equivalentes de
petróleo (TEP), é apropriado notar que 1,0TEP = 7,2BEP = 41,87GJ e assim por diante. O Apêndice
A, ao final deste livro, indica diversas unidades de medidas de energia com fatores de conversão
e/ou relações de equivalência energética.
A seguir são apresentados alguns exemplos genéricos para que o leitor se familiarize com
cálculos elementares sobre energia e suas unidades.
_____________________________
EXEMPLO 1.1 – Tomando como base a cotação do carvão e do
petróleo WTI do dia 20/04/2011 na Bolsa de Nova York (U$77,33/ton.
e U$111,66/bbl respectivamente), calcule a relação U$ BTUcarvão/U$
BTUpetróleo. Mais exatamente: quanto vale 1 BTU de petróleo em
relação à mesma energia oriunda do carvão?15
Solução
De acordo com o Apêndice A, uma tonelada equivalente de carvão
(TEC) equivale a 27,78106 BTU ou seja:
77,33
106 BTU carvão = = U$2,78 (1.8)
27,78
Um barril de óleo equivalente tem aproximadamente 5,51106 BTU,
assim:
111,66
106 BTU petróleo = = U$20,26 (1.9)
5,51
Assim, tem-se que:
15
Basicamente são dois tipos de cotação para a commodity Petróleo: o WTI (West Texas Intermediate) – refere-se ao
petróleo comercializado na Bolsa de Nova York (extraído principalmente na região do Golfo do México) e o Brent, que
é comercializado na Bolsa de Londres (extraído no Mar do Norte e no Oriente Médio). O WTI é referência para o
mercado americano e o Brent para o mercado europeu. A Petrobras utiliza em seus projetos a cotação Brent.
30 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
Solução
De acordo com os fatores de conversão do Apêndice A, obtêm-se
os resultados indicados na Tabela 1-5 a seguir:
Usando informações do
Apêndice A
Possíveis substituições:
% dif.
De Para KWh/mês Lumens
Incandescente Fluorescente eficiente
convencional (100W) (16W) -7,56 2,9%
Incandescente Fluorescente convencional
convencional (100W) (20W) -7,20 -4,3%
Incandescente eficiente Fluorescente eficiente
(90W) (16W) -6,66 14,3%
Incandescente eficiente Fluorescente convencional
(90W) (20W) -6,30 6,3%
Nota: Sugere-se ao leitor levantar informações sobre lâmpadas LED e realizar
os cálculos correspondentes. A planilha de cálculo disponível possibilita
considerar essa alternativa.
_____________________________
Na década de 1970, as projeções de demanda de energia eram feitas baseadas nas previsões
macroeconômicas, que extrapolavam essencialmente as relações econômico-energéticas do passado
para o futuro. Essas projeções indicavam invariavelmente um crescimento muito alto da demanda
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 33
A principal característica do processo PIR, como foi mencionado, é a análise de ações tanto
no lado da oferta quanto no da demanda de energia. Para o setor elétrico, isso significa trabalhar
tanto com a estrutura de oferta de eletricidade como com a estrutura da demanda. Dado que existem
dificuldades para armazenar a eletricidade produzida, deve haver uma perfeita sincronia entre a
demanda ao longo do dia e a produção de eletricidade nas usinas. O PIR implica em um
conhecimento detalhado das características do mercado consumidor (tecnologias, hábitos dos
consumidores etc.), bem como das peculiaridades do sistema elétrico em operação e sua perspectiva
de expansão. Apresentamos aqui algumas informações que são tradicionalmente utilizadas no
planejamento da expansão do setor elétrico e, nos capítulos seguintes, adicionaremos outras noções
que são importantes para a melhor compreensão do PIR.
Potência demandada
duração de carga da companhia elétrica (Figura 1-10). Essa curva representa o número de horas no
ano em que se registram níveis determinados de demanda. De maneira geral, ela mostra poucas
horas de demanda típica de pico e uma redução gradual da carga com um aumento da frequência
acumulada.
A curva de duração de carga pode ser dividida em três níveis, que indicam as diferentes
categorias de operação dos recursos de oferta. A carga mínima é somente o nível mais baixo de
demanda que a companhia identifica, sendo a carga de base aquela que é atingida em 100% do
tempo. As usinas de geração que funcionam na maior parte do tempo (>80% do tempo) numa carga
mínima e constante são os recursos de carga de base. A carga intermediária é o nível de demanda
que ocorre entre 20% e 80% do tempo e as usinas que funcionam para essa fração do ano são
recursos da carga intermediária. A carga de pico é o nível que é excedido em menos de 20% do ano
e a carga máxima é o nível da demanda mais alta do ano. Usinas que trabalham somente durante
essas horas de demanda máxima são recursos de carga de pico.
A frequência do uso de uma usina elétrica afeta tanto sua operação como seu desempenho
econômico. Algumas usinas são capazes de operar acompanhando a carga, variando sua produção
de acordo com o nível da demanda. Tais usinas são bem adequadas para aplicações de carga
intermediária e de pico. Em outras usinas, pode ser difícil e caro mudar o nível de produção
rapidamente, portanto são mais apropriadas para as aplicações de carga de base. Somando-se a isso,
usinas com custos operacionais baixos são mais econômicas como usinas de carga de base, mesmo
que seus custos de capital sejam altos, por causa do seu longo tempo de operação. Usinas com
custos baixos de capital, por sua vez, são econômicas como usinas de carga de pico, sem levar em
consideração seus custos operacionais, pois elas funcionam poucas horas durante o ano.
Frequentemente é necessário conhecer curvas de carga diárias e fazer projeções futuras para
se planejar corretamente a expansão e a operação de um sistema elétrico. No Capítulo 4, esse tema
é tratado novamente no contexto da integração das opções da oferta e da demanda. A Figura 1-11 a
seguir ilustra um exemplo de curva de carga diária mostrando a formação de um pico de demanda
no final do dia. Cabe ressaltar que, recentemente, em diversas ocasiões, o pico de consumo de
energia se deslocou para o período de meio de tarde, em que o consumo principalmente de ar
condicionado atingia níveis elevados. Dado um cenário hidrológico estressado e o registro de
elevadas temperaturas, em alguns casos, fez-se necessário que o Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS) adotasse medidas de redução de fornecimento devido a restrições elétricas nas linhas
de transmissão e restrições de transferência de energia e sobrecarga da demanda. Essas
considerações devem ser contempladas no planejamento da oferta e da demanda energética, a fim
de otimizar o uso dos recursos.
energética e a gestão de carga no lado da demanda, assim como fontes de geração descentralizadas
e produtores independentes. Mas quer dizer, também, integrar uma faixa mais ampla dos
componentes do custo, incluindo custos ambientais e outros sociais, dentro da avaliação e da seleção
das alternativas técnicas potenciais.
Figura 1-13 – Modelo integrado de carga e custo de produção elétrica a custo mínimo
Fonte: elaboração própria
O resultado esperado das mudanças trazidas pelo PIR é o de criar um ambiente econômico
mais favorável para o desenvolvimento e a aplicação de tecnologias de uso final eficientes,
tecnologias limpas e tecnologias de produção de energia menos centralizadas, incluindo fontes
renováveis. O planejamento baseado no conceito de PIR implica na consideração dessas opções e,
com a inclusão dos custos ambientais, significa que elas poderão parecer relativamente atraentes,
comparadas com as opções de oferta tradicionais.
A dificuldade de implementação de tais mudanças na economia de mercado reside no fato de
que o valor da qualidade ambiental não possui uma conotação econômica clara, já que ela é um bem
social comum e que os benefícios das tecnologias mais limpas e da eficiência energética não são
captados pelo mercado, devido às suas várias distorções e às barreiras institucionais que têm sido
extensivamente documentadas (Fisher and Rothkopf 1989). Assim, planejamento e regulamentação
têm sido usados para corrigir esses problemas e dar incentivos para direcionar o mercado às
tecnologias de energia mais eficientes e menos poluidoras. Preços mais altos da eletricidade são
frequentemente necessários para implementar os planos e as alocações de recursos resultantes do
PIR. No entanto, preços não são uma solução suficiente para um mercado de competição imperfeita
e de informação incompleta.
O PIR é um processo que combina opções de tecnologias de oferta de eletricidade e de
melhorias de eficiência energética, incluindo opções de gerenciamento do lado da demanda (GLD),
para prover serviços de energia a menores custos, incluindo custos sociais e ambientais. A
implementação do PIR requer, em geral, as seguintes etapas:
• a coleta de dados confiáveis sobre padrões de uso final de eletricidade e alternativas
técnicas para melhorar suas eficiências energéticas ou perfil de carga (o tratamento da
demanda deve ser mais em termos dos serviços de energia do que estritamente em kWh);
• a definição e a projeção das demandas de serviços de energia;
• o cálculo dos custos e dos impactos na curva de carga das alternativas do lado da demanda;
• a comparação dos custos das alternativas do lado da demanda com os custos, benefícios e
os impactos ambientais das ofertas de eletricidade (alternativa e convencional);
• a elaboração de um plano integrado de opções de oferta e de ações no lado da demanda
que satisfaçam critérios acordados de custos e qualidade ambiental; e
38 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
• a implementação do plano.
As duas etapas iniciais serão tratadas no Capítulo 2. A demanda total de eletricidade é
desagregada por setor, por uso final e por tecnologias, com o maior detalhamento possível a partir
dos dados disponíveis. Em muitas situações, novas pesquisas são realizadas para levantamento de
informações. As projeções desagregadas dos níveis futuros de serviços de energia podem ser feitas
tomando como base essas informações e os cenários existentes de demanda elétrica.
Na terceira etapa, a ser tratada no Capítulo 3, são identificadas as tecnologias para melhorar
a eficiência do uso final energético ou influenciar o modelo de carga. Os impactos técnicos e
econômicos dessas alternativas são estimados, comparados e ordenados de acordo com seus custos.
Baseados nesses resultados, os programas GLD e outras estratégias de eficiência energética são
analisados em termos dos seus custos totais e das taxas de penetração no mercado dentro do
horizonte de planejamento.
Na quarta etapa, tratada no Capítulo 4, a análise do custo de alternativas de oferta de
eletricidade existentes e novas é usada para ordená-las de acordo com o custo marginal. Os
resultados são comparados com os custos marginais das opções do lado da demanda, incluindo
custos socioambientais. Os dois conjuntos de opções são, então, contrapostos e combinados para
produzir o plano de eletricidade integrado a custo mínimo, incluindo os custos sociais e ambientais.
A implementação efetiva de um PIR vai além do escopo deste livro, embora algumas questões
relevantes sejam discutidas em vários pontos nos capítulos seguintes. O plano integrado de
eletricidade deve ser assunto para novos estudos de política energética, incluindo avaliação
financeira, análise de sensibilidade, análise de incertezas e planejamento de implementação antes
que o plano final seja completado. A incorporação dessas questões deve ordenar a classificação de
alguns planos integrados ou excluir certos recursos do plano. Em geral, esse passo pode ser visto
como a sintonia final dos resultados do PIR por contar com questões específicas e opções inerentes
ao cenário nacional ou local.
De uma maneira resumida, a Figura 1-14 compara o planejamento convencional com o PIR.
No PIR os cenários projetados para o desenvolvimento socioeconômico são traduzidos em serviços
de energia, que são requeridos, e é feita uma avaliação dos recursos disponíveis para atender a essa
demanda de serviços. O planejamento convencional se preocupa em projetar necessidades de kWh
e, a partir desse valor, a expansão da geração é planejada.
O PIR procura considerar de maneira explícita uma gama maior de opções de investimentos
para expandir os serviços de energia. A seguir apresentamos algumas das principais ações a serem
estudadas dentro de um PIR.
17
Atualmente, o consumidor passa a ter um papel de produtor de energia por meio de sistemas de geração distribuída
assim como possui a figura de um agente que pode vender sua “demanda evitada”, o que se conhece como Demand
Response, na literatura.
40 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
demanda que poderiam fornecer os serviços de energia necessários, começando pelas oportunidades
de menor custo. O PIR requer que o governo ou uma entidade que oferte energia seja capaz de
escolher entre financiar eficiência energética ou pagar os custos marginais da nova eletricidade
sobre bases relativamente iguais, uma vez que se entende que o sucesso da implementação das
medidas de eficiência de uso final não depende somente do critério econômico e da decisão dos
consumidores de energia. As taxas de desconto implícitas aplicadas pelos usuários de energia para
investimentos em eficiência energética, por exemplo, variam de 20% a 200%, comparadas com as
taxas de desconto de 6% a 10% das CEs (Ruderman, Levine, and McMahon 1987). Assim, não se
pode esperar que impostos ecológicos e aumentos no preço da energia levem, por parte dos
consumidores, a investimentos suficientes em tecnologias eficientes de energia. A necessidade de
outras medidas para efetivamente promover a implementação da eficiência energética é justificativa
para uma atuação governamental direta e para a criação de programas de companhias elétricas, tais
como GLD. O processo PIR possibilita uma avaliação rigorosa entre essas medidas e as opções de
oferta.
Um exemplo interessante de aplicação do processo PIR é o caso do Northwest Power and
Conservation Council (NWPCC) nos Estados Unidos. Periodicamente, esse conselho produz
cenários de projeção de demanda para os próximos 20 anos e cenários descrevendo os recursos
existentes para atender à demanda de serviços de eletricidade. O NWPCC fez duas mudanças
importantes no planejamento energético para a região na década de 1990. Primeiro, os cenários
energéticos consideram explicitamente a incerteza da demanda. Segundo, as melhorias de eficiência
energética são tratadas como parte do recurso de oferta de eletricidade. Os cenários distinguem
recursos de oferta de eletricidade existentes e novos, as oportunidades de eficiência energética já
absorvidas pelos consumidores e pelos programas promovidos pelo conselho e outros agentes, e,
também, o potencial de eficiência energética projetado para o futuro. As estimativas do potencial
futuro de eficiência energética levam em conta a penetração do mercado atingível no tempo
projetado, os custos administrativos e as incertezas associadas com a implementação dos
programas. O cenário mais recente identifica, como recurso de custo mais baixo, o potencial de
economias de energia a ser conseguido por meio de programas de eficiência. Isso é suficiente para
satisfazer toda a nova demanda nos cenários que assumem taxas de crescimento econômico baixo
e médio. Já os cenários de alto crescimento requerem recursos adicionais de geração (NWPPC
1991). Os EUA, assim como outros países, vêm realizando, tanto em âmbito estadual como federal,
um planejamento energético que procura incorporar ações de eficiência energética e, também, de
fontes renováveis de energia (Smith and Rogers 2006).
A implementação de medidas de eficiência energética via GLD é a mudança mais comum que
se verifica com o uso do PIR. Entretanto, a estrutura de planejamento necessária para as atividades
do PIR é projetada para acomodar não só opções de gerenciamento de carga e eficiência nos usos
finais, mas, também, medidas de eficiência do lado da oferta, produção independente, geração
elétrica convencional e opções de distribuição. O PIR pode ser particularmente apropriado para
países em desenvolvimento, onde sempre existem severas restrições ao capital e um potencial para
redução de demanda ainda não explorado. Considerações ambientais representam hoje um papel
maior nas decisões de planejamento nesses países e essas características também podem ser
captadas na estrutura do PIR.
18
O PURPA (Public Utilities Regulatory Policy Act) foi aprovado pelo Congresso dos EUA em 1978 e referendado
pelo Federal Power Act. Ele estabelece procedimentos e exigências para guiar as comissões regulamentadoras estaduais
no que diz respeito a tarifas e normas de atuação. O PURPA organiza o desenvolvimento da produção de energia por
produtores independentes (IPP) e promove a conservação de energia, o uso eficiente da capacidade existente e tarifas
razoáveis para os consumidores.
42 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
globais como locais. Para reduzir esses problemas com melhorias técnicas, iniciativas inovadoras
de eficiência energética surgem como uma solução economicamente competitiva.
Os custos ambientais das emissões da produção de eletricidade devem ser considerados como
parte daqueles evitados com programas de eficiência e GLD e com o uso de fontes renováveis.
Esses custos podem ser apresentados na forma de taxas cobradas por emissões e pagas pela
companhia elétrica ou podem ser valores simbólicos, usados apenas para priorizar e selecionar
opções de oferta e de programas de eficiência e GLD no processo PIR. A experiência nos EUA e
no Canadá com tais valores mostrou que eles têm pouco efeito nos programas de eficiência e GLD
até agora, mesmo sob uma estrutura de planejamento regulamentada. Sob uma estrutura
desregulamentada, os custos ambientais teriam que ser, de fato, pagos pela companhia elétrica para
ter algum efeito sobre suas prioridades na seleção dos recursos.
De qualquer maneira, independentemente de como os custos ambientais são calculados e
quais são as tecnologias escolhidas para mitigar tais custos, a avaliação dos custos sociais e
ambientais é uma meta importante do PIR como um dos critérios para determinar como a demanda
por serviços de energia deveria ser atingida. As opções tecnológicas para reduzir os efeitos
ambientais incluem eficiência energética via GLD e outros programas, substituição de combustíveis
tanto do lado da oferta quanto da demanda, fontes renováveis, utilização de equipamentos de
controle de emissão para usinas elétricas e compensação de emissões. Incluir os custos
socioambientais no processo PIR torna possível ponderar os prováveis benefícios socioambientais
dessas opções contra seus custos econômicos.
O conceito do PIR foi desenvolvido dentro do contexto norte-americano dos monopólios das
companhias elétricas privadas, reguladas em níveis estadual e federal. As companhias elétricas
foram compelidas por suas comissões reguladoras a adotar o PIR para identificar e captar o
potencial de melhoria de eficiência energética que poderia ser obtido a custos socialmente menores
que os custos de geração. As medidas de eficiência são implementadas pelas companhias elétricas
por meio de programas de gerenciamento do lado da demanda. Outras medidas de eficiência podem
ser adotadas por outros agentes, conforme será visto no Capítulo 3.
Assim, PIR e GLD têm sido vistos como atividades de companhias elétricas e elas se
identificam com o contexto norte-americano das companhias elétricas privadas regulamentadas,
contexto este que está mudando. A maioria dos países, entretanto, possui estruturas de companhias
elétricas muito diferentes do modelo pelo qual o PIR foi desenvolvido originalmente. Alguns países
44 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos
têm órgãos nacionais que controlam o setor elétrico. Outros têm grandes companhias elétricas
privadas, mas com menos regulamentação que no modelo norte-americano. Outros, ainda, têm
muitas companhias de distribuição locais pequenas comprando de uma companhia de oferta
nacional e alguns desses países estão começando a introduzir a competição no setor energético.
Nesses outros casos, pode ser difícil criar incentivos para as companhias elétricas se
engajarem no PIR e implementarem eficiência energética por meio de programas GLD financiados
pela própria companhia. Alguns países, tanto os industrializados como os em desenvolvimento, têm
começado a experimentar novos modelos de PIR e GLD, mas esses esforços não têm sido muito
ambiciosos até agora. Ao mesmo tempo, existem muitos tipos de políticas e programas para
implementar melhorias de eficiência energética, incluindo campanhas de informação, incentivos
nos preços, padrões de regulamentação, políticas de compra etc. Tais instrumentos são geralmente
aplicados pelas agências de governo.
Como fazer esses esforços se ajustarem ao PIR e ao GLD da companhia elétrica e como fazer
o PIR ser executado em um país sem incentivos para o GLD da companhia? Neste livro é dada uma
visão relativamente geral do PIR. Ele é dirigido a todos os tipos de programas de eficiência
energética, assim como aos de gerenciamento da carga e da substituição de combustível e fornece
ferramentas para comparar os custos e benefícios desses programas para a expansão da oferta de
eletricidade. Dessa forma, busca-se dar uma visão abrangente do PIR, na qual a composição ótima
de recursos de oferta e de demanda para atender às necessidades de serviços de energia pode ser
identificada. Sabe-se que essas ferramentas não poderão ser sempre aplicadas, mas a metodologia
do PIR e as ferramentas aqui apresentadas deveriam auxiliar a melhorar as decisões de planejamento
energético, ao invés de somente se considerar um conjunto parcial de soluções, como ainda se
verifica.
É difícil dizer como companhias elétricas de um determinado país ou região devem conduzir
um PIR e quando o GLD é uma opção para elas. No entanto, espera-se que a análise do PIR possa
ser usada pelos planejadores das companhias seguindo de perto o modelo norte-americano, por
exemplo. Quando isso não for possível, a análise do PIR poderá ser realizada pelo ministério da
energia ou do meio ambiente para priorizar programas e fornecer opções de políticas energéticas,
caso o governo tenha interesse em promover a eficiência energética para atingir as metas
econômicas e ambientais. Tais opções podem incluir aquelas a serem implementadas por meio de
companhias elétricas, talvez como uma condição para a aprovação de novos projetos de expansão
da oferta energética. Tal metodologia pode se tornar mais relevante à medida em que os governos
se esforcem em criar comissões de regulamentação e comitês com a finalidade de reduzir as
emissões de dióxido de carbono e outras emissões do setor energético.
O PIR deve ser diferenciado de alguns dos conceitos de Planejamento Energético Nacional
Integrado (PENI) que foram introduzidos em países em desenvolvimento por volta de 1980. O PENI
é uma metodologia hierárquica para integrar os setores de demanda e de oferta de energia com
planejamento e administração da economia e política de preços nacional (Munasinghe 2013). Esse
tipo de planejamento se tornou tão abrangente e tão interligado com outras prioridades político-
econômicas nacionais que os processos PENI não foram implementados de maneira significativa e
não resultaram em nenhuma diferença considerável em planejamento energético e decisões de
investimento.
Embora o PIR seja mais abrangente que os planos tradicionais de oferta das companhias
elétricas, ele está longe da limitação do grau de integração encontrado no PENI. Os conceitos do
PIR são tão bem aplicáveis em nível nacional quanto em sistemas energéticos regionais ou
municipais. Para pequenos países, o nível nacional e o sistema da companhia elétrica podem ser o
mesmo e, nesse caso, o PIR nacional faz sentido. Para grandes países, o PIR pode ser conduzido
em nível nacional e/ou em nível local, mas muitas medidas deverão ser conduzidas por meio de
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 45
estruturas relativamente descentralizadas. Embora o PIR possa e sempre faça uso de políticas de
preços de energia, ele não é caracterizado tão somente por isso.
_____________________________
Exercícios finais do capítulo
1) O que é PIR?
2) Discuta com suas palavras e dê exemplos para explicar as
diferentes maneiras de se entender o papel da energia na sociedade
atual.
3) Descreva o fluxo de conversões energéticas desde as fontes
primárias até os serviços de energia especificados: refrigeração
doméstica, aquecimento de água industrial e transporte de
passageiros (público e privado). Apresente o máximo de rotas de
conversão possíveis e aponte quais podem ser as mais eficientes
(com menores perdas de conversão).
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48 Projeções de demanda de energia
CAPÍTULO 2
2.1. INTRODUÇÃO
específicas do setor de energia. Podemos, por exemplo, sugerir as seguintes prioridades, entre
outras:
• o desenvolvimento econômico privilegiando determinado tipo de indústria;
• a garantia de acesso universal aos serviços de energia;
• o aumento do nível de consumo ao invés de serviços da população;
• a promoção da descarbonização da economia;
• a redução das emissões de gases tóxicos;
• o planejamento de futuras demandas, identificando medidas de conservação; e
• a priorização de um sistema de energia sustentável.
É importante lembrar que os trabalhos realizados no contexto de planejamento têm o
propósito de oferecer suporte para tomada de decisão. O maior mérito do PIR é o de oferecer uma
gama mais abrangente de alternativas, quando comparadas ao planejamento convencional, para que
o tomador de decisão possa escolher conhecendo seus impactos na sociedade, na economia e no
meio ambiente.
Figura 2-1 – Visão geral dos principais elementos para suporte à tomada de decisão em planejamento
Figura 2-2 – O planejamento da demanda, os cenários de demanda e oferta e sua relação com os objetivos
de desenvolvimento nacional
O PIR utiliza as mesmas ferramentas de planejamento que são usadas pelo planejamento
convencional. Aí se incluem os modelos energéticos. Nesta seção descrevemos as principais
famílias de modelos.
Não existe um consenso sobre uma classificação dos modelos energéticos, no entanto, de
modo geral, eles são divididos de acordo com os seguintes critérios:
• quanto à estratégia de abordagem (modelos agregados e desagregados);
• quanto à técnica matemática utilizada (usos finais ou técnico-econômico, econometria,
regressão univariada e multivariada, matriz insumo-produto, séries temporais, algoritmo
genético, lógica fuzzy, simulação e otimização por meio de funções objetivo etc.);
• quanto à evolução (estático ou dinâmico);
• quanto ao horizonte temporal (curto, médio e longo prazo);
• quanto ao alcance geográfico (local, regional, nacional e mundial);
• quanto ao tratamento das incertezas (determinístico, estocástico, cenários, análise
multicritério etc.); e
Projeções de demanda de energia 51
1
MARKAL, LEAP, MEDEE, UNIDO, ELFIN, MURELEC, EFOM, WASP, MESAP, NEMS, ENPEP, IDEE, IIASA,
CIRED, MUSE, WISE etc. Outras ferramentas são listadas em Connolly et al. (2010).
52 Projeções de demanda de energia
Exemplos: Markal (IEA 2013; Fishbone and Abilock 1981), EFOM (Van der Voort 1982),
entre outros.
• Modelos de simulação: a partir de regras ou padrões estabelecidos, procuram simular o
comportamento do consumidor ou do mercado de energia, considerando preços,
preferências, políticas e mecanismos de incentivos. Exemplo: ENPEB-BALANCE
(OpenEI 2014).
• Modelos contábeis: esses modelos têm como funções principais organizar e manter
coerência entre dados e resultados. São muito utilizados para realizar análises
exploratórias e cenários energéticos. Exemplos: LEAP (LEAP 2011) e MEDEE (Enerdata
2013; Lapillonne and Chateau 1981).
• Modelos híbridos: são modelos que combinam as diversas abordagens descritas acima.
Muitos modelos utilizados atualmente fazem essas combinações. As últimas versões do
LEAP, por exemplo, incluem módulos de otimização dos recursos de oferta, os
procedimentos de contabilidade energética entre oferta e demanda e permitem aos
analistas realizarem simulações.
2.3.1. Top-Down
No caso de uma abordagem top-down para previsão de demanda de energia com base na
produção de um setor da economia, por exemplo, tenta-se representá-la por meio de um número
pequeno de variáveis agregadas2. Nesse modelo, os parâmetros da função de produção podem ser
calculados para cada setor e as entradas e saídas reproduzem valores de um período por vez,
normalmente um ano. A gama de variáveis de entrada requerida para a produção de uma unidade
de saída de cada setor pode variar de acordo com o parâmetro de elasticidade de substituição
selecionado pelo usuário. Uma função genérica para a produção setorial, por exemplo, pode assumir
a seguinte expressão:
2
Nos modelos top-down é assumido que o nível de entrada e saídas de cada setor está em equilíbrio durante o período
de análise. Embora outros fatores possam ser adicionados ao modelo, os mais utilizados são: o trabalho, a energia e o
capital. O trabalho pode ser subdividido em várias categorias.
Projeções de demanda de energia 53
2.3.2. Bottom-Up
A abordagem bottom-up, por outro lado, apresenta detalhes focando principalmente o fluxo
de energia de toda uma economia. A função de produção é construída implicitamente, ao invés de
explicitamente como nos modelos mais agregados. A maioria destes modelos envolve software e,
essencialmente, trata o sistema de energia por meio de subsistemas que possibilitem obter dados de
entrada e saída de cada componente. Os modelos integrados de energia do tipo bottom-up são
baseados em variáveis técnicas e variáveis econômicas, com cada tecnologia identificada por suas
entradas, saídas, custos unitários etc. Uma fonte de energia pode ser tratada por uma ou mais
tecnologias disponíveis e uma unidade de saída, por exemplo, o serviço de um milhão de
passageiro-km3, é produzido usando uma combinação de tecnologias individuais. Mais exatamente,
cada setor é projetado por meio de uma combinação de tecnologias, no qual são configurados os
fluxos de energia, materiais, emissões e demandas de serviços. O equilíbrio parcial por setor é
computado via integração da oferta e da demanda, enquanto outras simulações são realizadas em
função do comportamento de outras variáveis econômicas.
A análise bottom-up é particularmente importante para o PIR, pois possibilita explicitar e
quantificar o potencial de recursos existentes do lado da demanda, como será visto adiante.
Basicamente, nesse tipo de análise, a demanda de energia é o produto entre o nível de serviço
de energia exigido e a intensidade energética de cada tecnologia incluída na estrutura de oferta, ou
seja:
Ei ,b ,c ,t = Qi ,b ,c ,t I i ,b ,c ,t (2.2)
3
Passageiro-km é uma das unidades de serviço de energia. Outras unidades são: t-km, veículo-km, lúmen-hora, kg-oC,
m3-oC etc.
54 Projeções de demanda de energia
Onde VPs(i,b) é o valor presente dos custos de produção de energia oriunda da fonte i com a
tecnologia b para atender um serviço s; Ci,b,s(t) é o custo anual da energia oriunda da fonte i com a
tecnologia b para atendimento do serviço s no período t; r é a taxa de desconto (taxa de atratividade);
n é o número de períodos; N e M são as possíveis tecnologias e fontes, respectivamente. O custo
unitário é função da fonte e da tecnologia escolhida para produzir uma unidade de serviço. O custo
total para atendimento de todas as demandas de serviços é a soma de todos os custos de produção
de energia de cada fonte com suas respectivas tecnologias incluídos na estrutura de oferta. Assim,
para uma demanda de diferentes serviços, o PIR deve buscar minimizar a função-objetivo de custos
totais:
S
VPt = VPs (i, b) (2.4)
s =1
4
Existem diversos manuais que explicam os procedimentos utilizados para esse tipo de análise que cada vez mais se
torna padrão para estudos comparativos entre processos e tecnologias. Ao final deste capítulo indicamos algumas
sugestões de leitura.
Projeções de demanda de energia 55
Onde z é uma das Z regiões e VPs,z(iz,bz) é o valor presente de custo mínimo do serviço s
incorrido na região z, função dos custos da fonte e da tecnologia regionais. Em um sistema integrado
de oferta e demanda, enquanto a função de custo total (ou de emissão de poluentes) é minimizada,
outras equações de limitações físicas e/ou lógicas devem ser satisfeitas de modo a representar
adequadamente o sistema de energia associado, tais como: demanda atendida, limite de capacidade
de transferência entre regiões, fator de utilização de cada tecnologia, fatores de disponibilidade
sazonal, limite de emissão etc. O que se pode afirmar, dadas as diversas configurações possíveis, é
que não há solução única, pois além das variáveis já comentadas deve-se considerar que o consumo
de energia de um país é também reflexo de fatores socioculturais (preferências) e, mesmo, impactos
de clima e crises econômicas de difícil previsão ou modelagem.
As funções de demanda de energia, conforme obtidas na econometria, podem auxiliar na
validação da Eq. (2.2). A demanda de energia de uma dada fonte i com uma tecnologia b, por
exemplo, é função do preço e pode ser determinada utilizando-se do coeficiente de elasticidade
preço de acordo com a Eq. (2.6) a seguir:
− i ,b ,c
Ei ,b ,c = aPi ,b ,c Ei ,b ,c ,t = Qi ,b ,c ,t I i ,b ,c ,t (2.6)
Onde Ei,b,c é a demanda de energia da fonte i conforme tecnologia b e cenário c; Pi,b,c é o preço
tomado pelo custo marginal; βi,b,c é a elasticidade preço-demanda; e a é um fator de escala.
Dependendo da relação da demanda com outras variáveis socioeconômicas regionais, outros
coeficientes de elasticidade podem ser agrupados na Eq. (2.6)6. Note que o preço da energia oriunda
de uma fonte i e uma tecnologia b qualquer é fortemente influenciado pelo cenário c (fatores
socioeconômicos) e o tempo t.
Diversos métodos podem ser usados nas projeções de demanda de energia. Alguns modelos
podem ser aplicados na previsão de demanda de recursos energéticos primários ou integrando a
demanda de energia compondo toda a cadeia de transformação, desde recursos energéticos
primários, secundários, até seu uso final.
Os dois principais procedimentos em uso corrente pela maioria das empresas de energia,
sobretudo as companhias de eletricidade, são essencialmente baseados nos modelos denominados
técnico-econômicos ou em modelos econométricos. Além das diferentes feições dentro do processo
de planejamento de serviços de energia desses modelos, outra grande diferença, como já
mencionado, é o nível de agregação dos dados de entrada. Os modelos econométricos são mais
agregados e baseiam-se essencialmente nos preços, renda (ou outros indicadores socioeconômicos
como trabalho, capital etc.) e suas relações com a demanda de energia. Já os modelos técnico-
econômicos apresentam detalhes do fluxo de energia de todos os setores de uma economia.
Dividimos os modelos de demanda de energia em duas categorias: específicos e gerais. No
caso de modelos específicos, escolhemos dois exemplos: usos finais e modelos de decomposição.
5
Em países com diferenças econômicas regionais acentuadas, como no Brasil, é interessante tratar as funções de custos
conforme a região.
6
Ver mais detalhes de modelos econométricos de energia no item 2.5.2.
56 Projeções de demanda de energia
No caso de modelos gerais, são detalhados três exemplos: regressão, econometria e séries
temporais. Para este último, é importante que o leitor conheça alguns fundamentos estatísticos de
processos estocásticos que envolvem as séries temporais. O Apêndice C ao final deste livro foi
preparado com esse fim, ainda que o conteúdo seja apenas uma introdução ao assunto. Após esses
exemplos, é abordada a metodologia de matriz insumo-produto, também útil para projeções de
demanda de energia, sobretudo para o setor industrial.
Os modelos de projeção de usos finais (ou modelos técnico-econômicos) são do tipo bottom-
up. São modelos detalhados, embora de formulações analíticas bastante simples. Esse procedimento
se ajusta muito bem aos propósitos de projeções de eficiência energética porque é possível explicitar
mudanças nos níveis de serviço e de tecnologia.
A demanda de energia para cada atividade é considerada como o produto de dois fatores: o
nível da atividade (ou serviço de energia) e a intensidade energética (ou uso de energia por unidade
de serviço), conforme Eq. (2.2). Deve-se tomar cuidado com situações nas quais o nível de atividade
ou de consumo de energia não é realizado plenamente, por exemplo, quando consumidores não
podem utilizar seus equipamentos ou o consumo não é atendido por alguma limitação (motores ou
frota de veículos em manutenção, cortes de energia, rede elétrica subdimensionada etc.).
No caso da iluminação de uma loja que possua uma determinada área a ser iluminada durante
o período comercial, por exemplo, o nível de atividade pode ser o número de lúmens7-hora
(quantidade de luz) necessária para suas atividades. A intensidade de energia é a quantidade de kWh
necessária para prover cada lúmen-hora, que depende da tecnologia e do projeto de iluminação da
loja. Outro exemplo de nível de atividade é a quantidade de passageiros-km de uma estrutura de
transporte coletivo (ônibus, metrôs etc.). Neste caso, a intensidade energética correspondente é a
quantidade de kWh (ou barris de diesel) necessária para transportar um passageiro por uma distância
de um quilômetro, que depende de todas as variáveis relacionadas à eficiência do sistema de
transporte.
Ao contrário dos modelos mais agregados, aqui é necessário classificar as diferentes
atividades que formam a estrutura de demanda em categorias homogêneas quanto às atividades
econômicas e aos usos finais de energia. É uma atividade que requer dados detalhados a partir de
intensivos levantamentos e pesquisas de campo. O nível de atividade que implica em maiores
necessidades de serviços de energia depende da população, da renda, da produção econômica etc.
O nível da intensidade energética depende da eficiência energética, incluindo tanto aspectos
operacionais quanto tecnológicos. A somatória dos produtos desses dois fatores sobre todos os
serviços requeridos fornece a demanda total de energia, ou seja:
n
Uso de Energia = E = Qi I i (2.7)
i =1
7
Um lúmen é o fluxo emitido por um ponto luminoso com intensidade de um candela em todas as direções a partir de
um cone de um esferorradiano. Uma candela é a intensidade luminosa emitida em uma direção por uma fonte de luz
monocromática de frequência 540x1012 hertz e cuja intensidade de radiação em tal direção é de 1/683 watts por
esferorradiano. Essa frequência é percebida como luz verde, para a qual o olho humano possui a melhor capacidade de
absorção. São unidades do padrão SI.
Projeções de demanda de energia 57
8
Corresponde à incidência perpendicular de um lúmen em uma superfície de um m2.
58 Projeções de demanda de energia
A análise botom-up exige uma estimativa da estrutura de consumo segundo os usos finais.
Com isso, se determina quais são os usos mais relevantes para a avaliação das oportunidades de
aumento da eficiência energética. A Tabela 1-1 a seguir ilustra alguns usos finais comuns com suas
tecnologias e/ou dispositivos.
Transporte de Veículos leves, ônibus, aviões, navios, metrôs, motos, bicicletas, etc.
pessoas
Incandescente, fluorescente com reator eletromagnético ou eletrônico, vapor de
Iluminação mercúrio,
Iluminação com sensores, iluminação reflexiva, natural etc.
Resfriamento Ventiladores, ar-condicionado, ventilação natural, resfriamento passivo.
Calefação Lareira a lenha, sistema de calefação a gás, elétrico, aquecimento central, cogeração etc.
Refrigeração Refrigeradores eficientes, refrigeração natural.
Assumindo que cada lâmpada substituiu outra que queimou ao final de sua vida útil (VU em
horas) e conhecido o número total de lâmpadas vendidas em um ano, resulta para aquele tipo de
lâmpada que:
E anual = (venda de lâmpadas/ano) (média da potência) (vida da lâmpada) (2.9)
Para os dados de vendas de lâmpadas, considerou-se a venda anual média de 1985 a 1989,
como mostra a última coluna da Tabela 2-3, e as informações adicionais dos fabricantes com relação
60 Projeções de demanda de energia
à magnitude das vendas de acordo com a potência da lâmpada. Os dados de vendas, a vida relativa
da lâmpada e o consumo de energia anual implícita estão na Tabela 2-4.
Tabela 2-4 – Estimativa de consumo de energia para os principais tipos de lâmpadas, México (1985-89)
Incandescente
25 1.000 6.650 0,166
40 1.000 13.300 0,532
60 1.000 39.900 2,394
75 1.000 19.950 1,496
100 1.000 53.200 5,320
100 – 1.500 (média 200) 1.000 2.200 0,440
Subtotal 10,349
Fluorescente
20, 40 (média 30) 12.000 3.620 1,303
39, 55, 75 (média 56,33) 12.000 10.280 6,949
Outros (média 30) 12.000 1.340 0,482
Subtotal 8,734
Note que a Tabela 2-4 não inclui o consumo de energia dos reatores das lâmpadas
fluorescentes. Supondo que os reatores adicionam 20% ao consumo das lâmpadas fluorescentes, o
consumo total de energia utilizada seria o mostrado na Tabela 2-5.
Tipo de Consumo
lâmpada (TWh/ano)
Incandescente 10,349
Fluorescente 10,481
Para aparelhos de vida útil mais longa e que estão aumentando suas vendas anuais, tais como
ares-condicionados, o estoque existente deve ser maior que aquele indicado pela média de vendas
anuais e isso deverá ser refletido nas estimativas de estoque de equipamentos em uso que consomem
eletricidade. Em tais casos, portanto, o uso de energia anual calculado pela Eq. (2.9) seria
subestimado. Esse é apenas um exemplo que mostra a necessidade de considerar os detalhes em
uma análise bottom-up para previsão de demanda de energia.
Setor residencial
O uso total de energia residencial ER é a soma da energia demandada por todos os usos finais
residenciais, tais como iluminação, calefação, resfriamento ambiental, refrigeração, televisão,
chuveiro, entretenimento etc. Assim, tem-se que:
n
ER = ERi (2.10)
i =1
ERi = Qi I i (2.11)
Onde N é o número de residências eleito por uso final i, P é o nível (%) de penetração dos
aparelhos por uso final i sobre as residências eleitas, M é o número de horas, graus, dia ou frequência
do uso por serviço de energia i. De acordo com essa formulação, podem-se projetar os níveis de N
e P e manter M e I constantes para o cenário de eficiência congelada ou diminuí-los, assumindo que
medidas de eficiência serão adotadas. Quando os requisitos de serviços de energia variam por meio
das classes de renda e por região, é adequado reescrever a Eq. (2.11) como:
n,o, p
ER = E Ri, j ,k (2.13)
i , j , k =1
ECi , j = Qi j I i j (2.15)
Onde Iij é a média de watts do uso final i instalada por metro quadrado no setor ou tipo de
construção j. Note que tipos diferentes de construções ou áreas para usos específicos podem ter
diferentes níveis de serviços de energia 9 e, por consequência, diferentes intensidades. Aqui, o nível
de serviços de energia Q é identificado como:
Qi j = Ai j Pi j M i j (2.16)
Em que Aij é a área total do setor j (ou tipo de construção j) servida pelo uso final i; Pij é a
percentagem da área de superfície total servida pelo uso final i; e Mij é o número de horas, graus,
dia ou frequência do uso por serviço de energia i. A atividade econômica futura influencia a taxa
9
Por exemplo, a intensidade de iluminação em corredores não é a mesma em salas de escritório ou de aulas.
62 Projeções de demanda de energia
de crescimento da área construída dos setores comercial e de serviços, o que pode acarretar maior
uso do ar-condicionado ou aumento no número de horas que os aparelhos serão usados, por
exemplo. Na Eq. (2.16) uma melhoria técnica, por exemplo, pode ser representada por uma
diminuição do número de watts utilizados por metro quadrado.
Setor industrial
Onde k é o tipo de motor usado em cada subsetor industrial j. Note que o uso final, nesse caso,
é a força motriz. A quantidade dos serviços de energia Q é dada por:
Q j ,k = N j ,k M j ,k (2.18)
Onde Nj,k é o número de motores por tipo k por subsetor j e Mj,k é o uso do motor por tipo k
por subsetor j (horas/ano). A intensidade de energia Ij,k pode ser definida como a potência por tipo
de motor k por subsetor j. Outra forma de descrever o setor industrial é considerar o número de
toneladas do produto k por subsetor j requerendo o serviço de energia do uso final i. A intensidade
de energia I, nesse caso, pode ser definida como a quantidade de energia demandada por tonelada
produzida (ou outro indicador físico) do produto k no subsetor j, que demande o serviço de energia
i. A Tabela 2-6 a seguir mostra um quadro resumo das equações citadas.
Note que as equações da Tabela 2-6 podem ser aplicadas para estimar a demanda de energia
de uso final não elétrico. Por exemplo, para o setor de transporte movido a combustíveis líquidos
ou gasosos, Nj,k é o número de veículos por tipo k por região j, Mj,k é o uso do veículo por tipo k
(km/ano) por região j e Ij,k pode ser definido como o consumo de combustíveis por tipo de veículo
k por km rodado em cada ano em cada região j. Como já mencionado, independentemente da
definição de cada parâmetro, o fundamental é que as unidades sejam compatíveis.
Projeções de demanda de energia 63
Hibridização de modelos
Os métodos de projeção de energia por usos finais podem ser combinados com outros
métodos, por exemplo, com modelos econométricos. Nesse caso, a relação econométrica entre o
nível de atividade de um setor com o resto da economia pode ser utilizada no cálculo da demanda
com base nos usos finais e, ainda, permite uma avaliação explícita das melhorias tecnológicas para
cada uso final. Por exemplo, a projeção da área construída para edifícios pode ser representada por
uma expressão econométrica a partir do PIB do setor comercial. A projeção é feita em dois estágios:
primeiro a projeção da área construída como função do PIB e do coeficiente de elasticidade renda,
seguida da projeção de energia requerida para a área projetada, conforme Eqs. (2.19) a (2.21) a
seguir:
A = a PIB (2.19)
Onde Mluz representa as horas de uso de iluminação para um dado nível de iluminação. Para
o cálculo da energia de iluminação (Eluz), tem-se que:
Eluz = A M luz I luz (2.21)
Solução
Há um arquivo de trabalho (Barkimpur.xlsx) disponível em uma
página da internet10 com as soluções distribuídas em planilhas
(Residencial, Comercial e Industrial). A ideia é que o leitor faça
uso das tabelas apresentadas a seguir e tente reproduzir os
resultados apresentados nas planilhas. Nesse arquivo, cada planilha
é dividida em duas partes: a primeira refere-se aos assuntos
abordados neste capítulo (Parte I – Capítulo 2); e a segunda parte
refere-se aos assuntos do Capítulo 4 (Parte II – Capítulo 4).
Setor residencial
Tabela 2-12 – Dispositivo por classe de renda (P=%) e consumo médio por
dispositivo (I=W)
Dispositivo por classe de Consumo médio por
Uso final renda (%) dispositivo (W)
0–2 2–5 5–10 +10 0–2 2–5 5–10 +10
Lâmpada
incandescente 100% 200% 400% 700% 60 60 60 100
Lâmpada
fluorescente 100% 100% 250% 300% 20 20 20 20
Ferro elétrico 80% 81% 85% 85% 2.300 2.300 2.300 2.300
TV 65% 70% 85% 112% 100 100 100 100
Máquina de lavar
roupas 0% 4% 15% 31% 600 600 600 600
Ar-condicionado 0% 20% 70% 95% 350 350 400 400
Freezer 0% 6% 20% 35% 700 700 700 800
Geladeira 70% 79% 83% 100% 230 230 230 230
Ventiladores 71% 71% 78% 78% 200 200 200 200
Aquecedor de
água 9% 80% 60% 70% 2.500 2.500 2.500 3.000
Outros 50% 100% 150% 200% 60 60 60 100
10
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Projeções de demanda de energia 67
Questões
Quais os usos finais com maior consumo de GWh e com menor
consumo?
Quais usos finais seriam interessantes para fazer um plano de
conservação?
Recalcule a Tabela 2-15 mantendo a mesma distribuição de renda
do ano de referência e explique o que acontece.
Considere uma mudança na distribuição de renda, na penetração
dos aparelhos e no consumo de acordo com a realidade de sua região.
Faça hipóteses, descreva-as e faça as mudanças necessárias na
planilha de cálculo. Você pode consultar o IBGE, a FGV, o IPEA, os
Balanços Estaduais de Energia e o Balanço Energético Nacional.
Setor comercial
O mesmo pode ser feito para o setor comercial, trocando o N
(número de residências) por A (área comercial expressa em m2). Para
esse exemplo, considere que o setor comercial seja responsável por
aproximadamente 15% do consumo de eletricidade do país. Os mais
importantes subsetores são: comércio pequeno, shopping-center,
hotéis, bancos e escolas; e os usos finais identificados no setor
comercial são: iluminação, ar-condicionado, cocção elétrica,
refrigeração e equipamentos. A Tabela 2-16 a seguir apresenta o
consumo de eletricidade do ano de referência por grupos e por usos
finais do setor comercial de Brakimpur.
Questões
Observando os resultados que você projetou, quais são os
subsetores comerciais com maior consumo de MWh? Quais são os
subsetores comerciais com menor consumo?
Quais usos finais são interessantes para um plano de
conservação? Discuta algumas razões que poderiam explicar as
diferenças observadas.
70 Projeções de demanda de energia
Setor industrial
Para o setor industrial, a atenção se volta para um importante
uso final: o uso de eletricidade em motores. Em média, mais de 95%
do uso de energia elétrica nos subsetores industriais é destinado
ao serviço de energia oriundo de motores de diversas capacidades
(força motriz).
O conteúdo das tabelas de dados de entrada produzidos pelo
setor industrial está descrito a seguir. Note que o consumo total
de energia elétrica destinada à força motriz é obtido com base em
dados agregados (PIB – ver Tabela 2-20). O mesmo valor também é
obtido com base nos desempenhos dos motores (ver Tabela 2-23).
Tabela 2-20 – Distribuição (D=%) e consumo por tipo de motor (CV) por
subsetor – E(X)×C×D em GWh/Ano
Subsetor <10 10<P<40 40<P<100 100<P<200 200<P<300 Total
Metalurgia 13% 1,50 25% 2,88 23% 2,65 27% 3,11 12% 1,38 100% 12
Elétrico/
Eletrônica 25% 902,14 35% 1.262,99 40% 1.443,42 0% 0,00 0% 0,00 100% 3.609
Madeira 15% 125,91 33% 277,01 30% 251,83 12% 100,73 10% 83,94 100% 839
Químico 12% 185,99 35% 542,47 25% 387,48 13% 201,49 15% 232,49 100% 1.550
Têxtil 12% 102,16 35% 297,98 25% 212,84 13% 110,68 15% 127,71 100% 851
Alimentos e
Bebidas 10% 10,64 19% 20,22 40% 42,58 19% 20,22 12% 12,77 100% 106
Transporte 5% 49,94 25% 249,70 18% 179,78 27% 269,68 25% 249,70 100% 999
Outros 13% 555,33 25% 1.067,94 23% 982,50 24% 1.025,22 15% 640,76 100% 4.272
TOTAL 13% 1.933,62 25% 3.721,20 23% 3.503,09 27% 1.731,13 12% 1.348,75 100% 12.238
Projeções de demanda de energia 71
Questões
Quais tipos de motores são interessantes, economicamente, para
um plano de conservação de energia? Por quê?
Considere uma substituição de motores, considerando que 10% dos
motores de 40 a 100 kW estão sobredimensionados e poderiam ser
substituídos por motores de 10 a 40 kW. Qual o efeito sobre o
consumo de energia para cada subsetor industrial?
_____________________________
Os modelos de decomposição são feitos com base na variação do consumo de energia segundo
três fatores: (i) variações do conteúdo energético; (ii) variações da estrutura econômica; e (iii) nível
de atividade econômica. Esses modelos têm sido estudados desde a década de 70, inicialmente
72 Projeções de demanda de energia
Onde:
Ei (t )
Ci (t ) = (2.25)
Ai (t )
Representa o conteúdo energético do setor i e:
Ai (t )
Si (t ) = (2.26)
PIB (t )
O índice de estrutura econômica desse mesmo setor. Para uma variação anual do consumo de
energia de todos os setores, tem-se que:
Etotal = Etotal (t ) − Etotal (t − 1) (2.27)
Onde:
n
Etotal (t ) = Ei (t ), n setores (2.28)
i =1
O que se busca nessa modelagem é a variação de três efeitos: o efeito conteúdo, o efeito
estrutura e o efeito atividade. Mais exatamente, esse modelo afirma que a variação do consumo
final de energia de um país depende da variação do conteúdo energético em cada setor (efeito
conteúdo), da mudança na estrutura da economia (efeito estrutura) e da variação do crescimento
econômico (efeito atividade). Assim, tem-se que:
n n n
Etotal = Ci Si PIB + Ci Si PIB + Ci Si PIB + (2.29)
i i i
Onde n é o número de setores da economia. De acordo com a Eq. (2.29), a variação total do
consumo de energia em um período é igual à variação dos três efeitos de todos os setores da
economia durante o mesmo período. As taxas de variações do conteúdo energético, do índice de
estrutura e da atividade em um determinado tempo tk podem ser definidas, respectivamente, com as
expressões a seguir:
ci (tk ) = log[ Ci (tk ) / Ci (tk −1 )] (2.30)
si (t k ) = log[ S i (t k ) / Si (t k −1 )] (2.31)
E:
Projeções de demanda de energia 73
As equações para o efeito estrutura ESi(tk) e o efeito atividade EPIB(tk) podem ser escritas de
forma similar. Por exemplo, para estimar a demanda do ano seguinte (t a t+1) podem-se utilizar os
efeitos de cada setor relativo ao período anterior ou a média de cada efeito dos últimos anos ou,
ainda, um modelo de regressão para os respectivos efeitos.
Devido aos outros fatores que interferem na variação total do consumo, a soma desses três
efeitos com base em dados anteriores não corresponde à variação total de energia consumida para
o período seguinte, pois há sempre um resíduo devido aos efeitos de segunda, terceira e demais
ordens. Considerando pequenos intervalos, é possível desconsiderar os erros de ordem superior.
Assim, pode-se reescrever a Eq. (2.29) para um determinado setor como:
dEi (t ) = dCi (t ) Si (t ) PIB (t ) + Ci (t ) dSi (t ) PIB (t ) + Ci (t ) Si (t ) dPIB(t ) (2.35)
A Eq. (2.35) considera que as variações não são as mesmas no tempo e que as medidas
utilizadas são amostragens discretas no tempo. Em outras palavras, o diferencial de consumo do
setor i é a soma exata dos diferenciais dos efeitos:
dEi (t ) = dECi (t ) + dES i (t ) + dEPIB (t ) (2.36)
Ou:
tf tf tf
Ei (t f ) − Ei (ti ) = dECi (t ) + dES i (t ) + dEPIB (t ) (2.37)
ti ti ti
Conhecendo as funções Ci(t), Si(t) e PIB(t) para o intervalo de tempo inicial e final, torna-se
possível calcular a variação do consumo de energia do setor i de forma exata. O mesmo
procedimento pode ser realizado para os demais setores para obter a variação do consumo global
de uma economia. No entanto, é pouco provável obter essas funções em tempo contínuo, o mais
usual são as medições espaçadas e o uso de técnicas de interpolação (função linear ou exponencial)
para os intervalos não medidos. Sun (2001), por exemplo, utilizou um modelo de previsão de
demanda com base em técnicas de decomposição dos efeitos para 15 países da União Europeia.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.7 – Calcule o efeito conteúdo ECi(tk), o efeito
estrutura ESi(tk) e o efeito atividade EPIB(tk) para os setores da
economia brasileira nos anos de 2001 a 2010 com base nos dados da
Tabela 2-24 e Eqs. (2.30) a (2.34). Estime o consumo de energia em
milhões de TEP/ano do setor de transporte, indústria e setor
energético para o ano de 2020, considerando que durante o período
de 2011 a 2020 a variação do consumo anual de cada setor é a soma
dos valores médios dos três efeitos observados nos dez anos
74 Projeções de demanda de energia
Consumo (106
TEP) 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Transporte 47,4 47,8 49,2 48,2 51,5 52,5 53,3 57,6 62,4 62,7 69,4
Agropecuário 7,3 7,7 7,8 8,2 8,3 8,4 8,6 9,1 9,9 9,5 9,9
Indústria 61,2 61,5 65,4 68,4 72,2 73,5 76,8 81,9 82,3 76,4 85,7
Comercial e
Público 8,2 7,9 8,1 8,2 8,5 8,9 9,1 9,5 9,8 10,0 10,2
Setor
Energético 12,8 13,6 14,4 15,8 16,4 17,6 18,8 21,0 24,5 24,4 25,3
Num modelo de regressão busca-se estabelecer as relações entre uma variável de interesse e
outras supostamente causais. Por exemplo, a demanda de energia residencial de um país pode estar
relacionada linearmente com o número de residências. O consumo de combustíveis líquidos está
relacionado, evidentemente, com a frota de veículos e assim por diante.
Um modelo de regressão é chamado simples quando a variável dependente é explicada por
uma única variável independente e chamado de multivariado quando há uma relação linear entre
uma variável dependente y e k variáveis independentes xj (j=1,...,k). As variáveis dos modelos de
regressão de demanda de energia mais comuns são: o PIB, a renda, a população e o preço da
eletricidade. Jannuzzi e Schipper (1991), por exemplo, examinaram o consumo elétrico residencial
do Brasil com base em modelo de regressão e verificaram que a taxa de crescimento na demanda
de eletricidade é superior à da renda. Em casos específicos, faz-se uso de variáveis relacionadas ao
número de turistas, variação da temperatura local, radiação solar etc.
O’Neill e Desai (2005) projetaram o consumo de energia nos Estados Unidos com modelo de
regressão baseado nos dados do período de 1982 a 2000 publicados pela EIA (Energy Information
Administration). Nesse modelo de regressão, foram integrados o crescimento do PIB americano e a
intensidade energética para as previsões futuras de consumo de energia.
A Tabela 2-25 a seguir indica um esquema prático de um sistema linear para regressão
multivariada.
Onde:
y1 1 x11 ... x1k 0 1
y 1 x21 ...
x2 k
Y = 2 , X= , β = 1 , ε = 2 (2.40)
... ... ... ... ... ... ...
yn 1 xn1 ... xnk k n
Os parâmetros desconhecidos (0, 1, 2,..., k) podem ser estimados de acordo com o método
dos mínimos quadrados11 (MMQ). O principal requisito para o método dos mínimos quadrados é
que os desvios sejam distribuídos aleatoriamente e essa distribuição seja normal e independente. O
estimador do MMQ é um dos mais utilizados na econometria. Trata-se de um estimador que
minimiza a soma dos quadrados dos resíduos, ou seja:
n n
SQR = i2 = ( yi − 0 − 1xi1 − 2 xi 2 − ... − k xik )2 (2.41)
i =1 i =1
De tal modo que o ajuste do modelo aos dados observados apresenta erros mínimos possíveis.
Se a matriz X tem posto completo, então XTX tem inversa e a solução do sistema linear da
Eq. (2.39) tem solução única, que é dada por:
β k +11 = XTnk +1X nk +1 X
−1 T
nk +1Yn1 (2.42)
11
O método de estimação baseado nos mínimos quadrados pertence à inferência clássica, na qual os parâmetros do
modelo de regressão são imaginados como fixos apesar de desconhecidos. Outro método é a função de máxima
verossimilhança. Outros métodos usuais de estimação vêm da análise bayesiana, na qual o conhecimento dos
parâmetros é quantificado por meio de uma distribuição de probabilidade.
Projeções de demanda de energia 77
_____________________________
E = aY P − (2.45)
por energia varia em função da mudança no preço da commodity e na renda dos consumidores,
respectivamente. A elasticidade renda é, portanto, definida como:
dE E
= (2.46)
dY Y
Onde E é a demanda por energia e Y é a renda (PIB). A elasticidade preço é definida de forma
similar em relação ao preço pago pelos consumidores:
dE E
= (2.47)
dP P
Em que E é a demanda de energia e P é o preço da energia. Os modelos econométricos
utilizam dados do passado para estimar estatisticamente os parâmetros da elasticidade renda e
elasticidade preço por meio de análise de regressão, por exemplo. Esses modelos foram amplamente
usados nos estudos de projeções de demanda de energia até a década de 1970 quando representavam
satisfatoriamente o comportamento da demanda de energia. Ainda hoje são ferramentas importantes
para compreender a natureza agregada da demanda de energia e dois de seus determinantes – preço
e renda.
Atualmente, considera-se que a estimativa das elasticidades dos fatores determinantes usando
dados do passado é apenas uma indicação para o futuro. Desde a década de 1970, existe uma
crescente evidência mostrando que esse relacionamento pode variar, sendo influenciadas por
mudanças na estrutura tecnológica da demanda de energia, no comportamento do consumidor,
legislação, normas de uso de energia etc. São fatores não necessariamente relacionados ao preço ou
à renda. O choque de preços de petróleo mostrou também aos analistas de energia que alguns usos
já se encontravam saturados em países industrializados e que novas informações deveriam ser
incorporadas para explicar a evolução do consumo de energia.
O modelo econométrico é muito utilizado para fornecer uma referência à projeção do
crescimento dos serviços de energia. Se a estrutura tecnológica da demanda de energia permanece
constante ou segue uma trajetória que pode ser extrapolada do passado, então o crescimento no
consumo de energia projetado é idêntico ao crescimento nos serviços de energia. Esse tipo de
projeção também é referido como um cenário de eficiência congelada. Outros modelos
econométricos de demanda de energia desdobram a função geral de Cobb&Douglas. Neste caso, a
equação geral resultaria na seguinte expressão:
n
E ( x1 , x2 ,... xn ) = k xi i (2.48)
i =1
Solução
A Figura 2-7 a seguir indica o modelo econométrico (gráfico
lado esquerdo) e a previsão de consumo de petróleo para 2020,
estimados de acordo com o modelo e as premissas indicadas na Figura
2-7 (lado direito).
Projeções de demanda de energia 81
_____________________________
Uma formulação econométrica e prática para projeção de demanda de energia, já utilizada
por diversos autores, segue a seguinte estrutura:
PIB P
Et + n = Et t +n
t + n (1 − ) n (2.51)
PIB t Pt
Onde Et+n é o consumo de energia elétrica previsto para n anos após o ano t; P é o preço da
eletricidade; α é a elasticidade renda; é a elasticidade preço sobre a demanda de energia; e é a
taxa de crescimento anual da eficiência energética. Possivelmente, a variável mais incerta nesse
modelo é o preço futuro da energia. Em países com relativa estabilidade econômica, a variância do
preço da energia é certamente menor e, por esse motivo, os resultados com base na Eq. (2.51) são
mais confiáveis. O interessante nesse modelo é permitir a inclusão da variação da eficiência
energética.
12
Em síntese, uma série estacionária é aquela que oscila em torno de uma média, ao passo que uma série não estacionária
tem uma tendência (deriva). As séries não estacionárias não têm médias e nem variâncias constantes.
82 Projeções de demanda de energia
A Matriz Insumo-Produto (MIP) segue uma metodologia definida, na qual os fluxos de bens
e serviços (ou fluxos de energia) entre os vários setores da economia de uma região ou país, aberta
ou fechada, são visualizados por meio de matrizes. A análise de insumo-produto, teoria proposta
inicialmente por Wassily Leontief, em 1936, é adequada para diversos estudos da economia
aplicada, desde a oferta de recursos e usos dos bens e serviços ou fluxos de energia até estudos
sobre a poluição ambiental ou emprego associado à produção industrial etc. São modelos que não
dependem de testes estatísticos para validação dos resultados, mas requerem atualizações constantes
das informações contidas na matriz. Segundo Carvalheiro (1998), a MIP é considerada, também,
um instrumento apropriado para analisar os efeitos estruturais de choques na economia, sejam
mudanças bruscas do preço do petróleo ou variações incomuns nas taxas de câmbio etc. Trata-se de
uma ferramenta poderosa para compreender a sistemática de cálculo do PIB de um país, da produção
e inter-relações dos setores de uma economia, onde certamente a energia é um dos principais
insumos.
Neste item é exposta a metodologia da Matriz Insumo-Produto e seus conceitos mais
importantes. As possibilidades de uso dessa metodologia em trabalhos de demanda de energia são
diversificadas e ficará a cargo do leitor aplicá-la conforme suposições assumidas em trabalhos de
pesquisa sobre energia.
A MIP aplicada para vários setores tem como pressuposto fundamental a interdependência e
o equilíbrio econômico entre os diversos setores da economia de um país ou região, onde as
unidades produtoras de um ou mais setores repassam seus bens intermediários para serem
processados em um ou mais setores e daí para o consumo final (ver esquema básico na Tabela 2-29).
Onde a variável z1j define o suprimento do setor 1 para o setor j; ∑z1j define a demanda de
bens intermediários atendida pelo setor 1 para os n setores da economia; e d1 define o consumo final
demandado do setor 1. A MIP é atendida pela seguinte expressão contábil:
n
xi = zi1 + zi 2 + ... + zin + d i = d i + zij (2.52)
j =1
Projeções de demanda de energia 83
Onde xi é a produção do setor i. Mais exatamente, uma linha i da matriz indica quais os
aproveitamentos da produção total de um setor e uma coluna j mostra todos os custos da produção
necessários para obtê-la.
De acordo com Miller e Blair (2009), o modelo MIP impõe que cada setor produza um único
tipo de produto sob duas hipóteses fundamentais: equilíbrio geral da economia para um dado nível
de preços e retornos constantes de escala13. A ideia básica da matriz de Leontief, seguindo essas
hipóteses, consiste em determinar os coeficientes técnicos de produção com o seguinte raciocínio:
suponha uma economia com n setores e que cada i-ésimo setor produza xi unidades de um único
produto. Assuma que para o i-ésimo setor produzir uma unidade do produto deva consumir aij
unidades de produto de cada setor. Admita, ainda, que cada setor venda algumas unidades para
outros setores (bens intermediários) e as demais unidades para o consumo (demanda final). Dessa
forma, a Eq. (2.52) é reescrita como:
xi = ai1 x1 + ai 2 x2 + ... + ain xn + d i (2.53)
Onde aij são os coeficientes técnicos de produção (insumos do setor i demandados pelo setor
j para cada unidade de produção), ou seja:
zij
aij = (2.54)
xj
Onde xj é a produção do setor j (não confundir com o dispêndio bruto do setor j). Em outras
palavras, a Eq. (2.53) informa que o total de produtos acabados para consumo é a soma dos insumos
intermediários mais as unidades disponibilizadas para a demanda final. Em termos de notação
matricial, tem-se que:
x n1 = A nn x n1 + d n1 (2.55)
Ou:
(I − A)x = d x = (I − A) −1 d (2.56)
Onde a matriz (I–A)–1 é denominada de matriz inversa de Leontief (ou matriz B) e a matriz
A é chamada de matriz dos coeficientes aij. É esta a matriz que se busca com esse modelo, aquela
que indica os coeficientes técnicos de produção de cada setor da economia. A Eq. (2.56) pode ser
reescrita como:
1 − a11 − a12 ... − a1n x1 d1
−a
21 1 − a22 ... − a2 n x2 d 2
= (2.57)
... ... ... ... ... ...
− an1 − an 2 ... 1 − ann xn d n
Se a matriz (I–A) estiver inversa, tem-se um sistema linear com solução única. Uma vez
definida a matriz dos coeficientes técnicos de produção, torna-se fácil resolver problemas de
previsão para o caso de aumento da demanda de cada setor ou que nova matriz os setores devem
apresentar para atender uma meta de crescimento das demandas setoriais. Esta análise pode ser
realizada com respeito ao consumo de energia por setor.
13
Uma atividade produtiva apresenta retornos constantes de escala quando os fatores de produção são aumentados em
x vezes e a quantidade produzida também aumenta em x vezes.
84 Projeções de demanda de energia
Como bem anotado por Carvalheiro (1998), a metodologia de matriz insumo-produto tem
algumas limitações, embora apresente inúmeras vantagens para a análise estrutural da economia e
em modelos de previsão de consumo de energia, dada a consistência da apresentação de suas
informações. As duas limitações mais significativas são: o modelo assume retornos constantes de
escala, ou seja, para qualquer quantidade produzida são utilizadas as mesmas combinações relativas
de fatores produtivos e assume-se que os coeficientes técnicos não mudam ao longo do tempo. Esta
última anotação implica que não são considerados os efeitos em termos de mudanças de preços ou
evoluções tecnológicas ou alteração na produtividade marginal do trabalho. Outras restrições
importantes dizem respeito à elaboração das matrizes insumo-produto, pois além de assumir
hipóteses simplificadoras quanto aos insumos, a defasagem decorrida entre a coleta e a publicação
dos dados é relativamente longa.
- Níveis de serviços de energia por usos finais medidas e tecnologias eficientes no mercado
SERVIÇOS DE ENERGIA para o ano projetado
Ano de projeção
Potencial econômico
Informações requeridas
Implementação de sucesso das opções de
- Projeção de cenários socioeconômicos custo efetivo em todos os consumidores
- Crescimento populacional
- Atividade econômica
- Níveis de serviços de energia (saturação dos
aparelhos etc.) Potencial de mercado
- Coeficientes de elasticidades de energia Implementação de sucesso das opções
economicamente atraentes
Cenários de energia para o ano projetado
Potencial de mercado atingível
Cenário de eficiência congelada Implementação de sucesso das opções de custo
Mantém o mesmo padrão de eficiência das efetivo em uma fração realista dos consumidores
tecnologias de uso final do ano de referência escolhidos
por exemplo, um cenário de alto crescimento econômico e outro de menor crescimento. Isso permite
fazer uma análise de sensibilidade em parâmetros socioeconômicos que podem ter impacto maior
na demanda de energia (ver Figura 2-8).
Pelo menos dois cenários de uso final são necessários: um cenário de referência e outro que
considere melhorias na eficiência de uso final. O cenário de referência pode manter os níveis atuais
de eficiência de energia e, nesse caso, é chamado cenário de eficiência congelada ou pode ser,
também, um cenário tendencial (Figura 2-8). O cenário eficiente pode ser derivado por uma medida
de uso final ou um conjunto de melhorias em diversos setores e usos finais. Existem diversos tipos
de cenários eficientes, incluindo o cenário potencial técnico, o cenário potencial econômico e o
potencial de mercado, que estão descritos a seguir.
O cenário de referência eficiência congelada não é um cenário realista, porque caso não sejam
feitos esforços no sentido de aumentar a penetração de novas tecnologias e medidas de eficiência,
existe um sucateamento natural de equipamentos e tecnologias e a sua reposição por modelos mais
novos, geralmente mais eficientes. Assim, o cenário de eficiência congelada pode ser usado para
representar o crescimento futuro de serviços de energia. O nível de serviços de energia pode ser
difícil de ser estabelecido de maneira homogênea entre os vários setores porque podem ser medidos
em unidades diversas tais como lúmen-hora de iluminação, grau-dia-metros quadrados do ambiente
aquecido ou da área construída com ar condicionado, toneladas de produtos manufaturados etc.
Alguns serviços de energia, tais como cocção, diversões eletrônicas ou serviços de escritórios são
de difíceis quantificações. Indexando os níveis de serviços ao consumo de energia presente e
representando-os em um cenário de eficiência congelada, simplifica-se o problema.
O cenário tendencial supõe que a evolução atual é mantida com relação ao uso de energia,
penetração de equipamentos (modelos eficientes e menos eficientes) etc., que seriam esperados sem
que houvesse uma interferência de políticas de transformação de mercado de energia. Em países
onde o PIR não é uma prática comum, esse cenário deve coincidir com a previsão oficial.
Este cenário considera todas as possíveis melhorias técnicas nos equipamentos, construções
e processos que podem ser introduzidos no ano projetado. Representa, portanto, as economias
hipotéticas que poderiam ser atingidas se todos os sistemas pudessem ser retirados e substituídos
por outros mais eficientes.
Também é possível distinguir um potencial teórico de eficiência energética, que pode ser
definido de acordo com os limites termodinâmicos das conversões entre as formas de energia
envolvidas. Por exemplo, se toda a energia usada por uma lâmpada elétrica fosse convertida
preferencialmente em luz que em calor, a eficácia da lâmpada (uma medida de eficiência de energia)
seria muitas vezes maior que as melhores lâmpadas hoje disponíveis. Similarmente, os limites de
eficiência de aquecimento e resfriamento podem ser determinados pelos limites de eficiência
termodinâmica para uma bomba de calor operando entre as temperaturas internas e externas.
O potencial técnico de eficiência energética pode ser definido como uma melhoria na
eficiência de energia do uso final que poderia resultar se as tecnologias eficientes disponíveis hoje
pudessem atingir 100% da saturação do mercado durante a vida útil das tecnologias (10 a 20 anos,
Faruqui et al. 1990). Claramente, essa definição também é específica para cada tecnologia, já que
melhorias de projeto de sistema ou construção sempre podem reduzir a necessidade de energia,
além das melhorias de equipamentos. Na prática, o potencial de eficiência técnica está sempre
mudando com a disponibilidade de novas tecnologias. O potencial técnico dá uma indicação para
86 Projeções de demanda de energia
Este tipo de cenário considera somente aquelas alternativas que possuem uma avaliação de
benefício econômico para os agentes que estão elaborando o PIR. As alternativas do lado da
demanda são restritas somente àquelas medidas que satisfazem um dado limite de custo. Esse limite
é uma referência para se verificar se uma dada medida é considerada lucrativa para a sociedade,
para os consumidores, para a companhia de eletricidade ou para outra agência que execute o PIR.
Os custos competitivos das alternativas do lado da oferta são levados em conta e os custos
ambientais e outras externalidades podem ser também incluídos.
Assim, o potencial econômico de eficiência energética é uma função do limite de custo das
medidas, baseado no tempo de retorno dos investimentos, na taxa interna de retorno ou no custo de
energia economizada. Tomando por base esse conceito, é comum representar esse potencial na
forma de curvas de custo marginal (algumas vezes chamadas de "curvas de oferta") da energia
economizada.
A Figura 2-9 a seguir apresenta uma amostra da curva de custo para o potencial de eficiência
energética no setor de serviços da Suécia (Swisher 1994). O eixo horizontal mostra a fração de
energia de iluminação que pode ser economizada a um dado custo marginal, em quatro diferentes
anos de projeção. A base para essas economias é o consumo resultante quando todos os
equipamentos instalados (novos e substituídos) após 1990 possuem a mesma eficiência média que
em 1990. Esse valor de consumo-base aumenta com o tempo. A um dado nível de custo marginal,
as economias de energia incluem os efeitos de todas as medidas de eficiência com um custo de
energia economizada menor que o nível de custo marginal. Essas curvas de custo mostram o
potencial de eficiência em um dado ano a um dado nível de custo, mas elas não indicam quanto
daquele potencial pode ser atingido por intermédio de um programa real ou quanto seria atingido
sem o programa.
Notas: As economias de energia em um dado ano são medidas pelo consumo projetado, supondo que todos os
equipamentos instalados após 1990 possuem a mesma média de eficiência que aqueles instalados em 1990, e expressas
Projeções de demanda de energia 87
como uma percentagem do consumo projetado. Os custos unitários são em coroas suecas, SEK/kWh. Em 1990,
7SEK=1US$.
Note-se que algumas economias identificadas na Figura 2-9 estão disponíveis a custo
negativo, como economias de custo de manutenção, já que estas podem compensar os custos iniciais
de tecnologia. No outro extremo da escala, o potencial de economia energética a custos marginais
relativamente altos deve ser subestimado em tais análises de uso final. Esses estudos são baseados
em análise técnica de medidas próprias para serem implementadas num curto prazo, os quais sempre
excluem medidas que não parecem ser interessantes sob as atuais condições econômicas. Isso
explica o aumento excessivo nos custos marginais com altos níveis de economias de energia na
Figura 2-9, que provavelmente mostrariam maiores economias nesses níveis se mais informações
estivessem disponíveis sobre tais medidas.
Nem todas as medidas, mesmo aquelas que apresentam custos atraentes, podem ser
implementadas com sucesso por meio de GLD ou outros programas de eficiência energética.
Embora a substituição de lâmpadas incandescentes15 por lâmpadas compactas fluorescentes (LCF),
por exemplo, possa ser economicamente interessante para a sociedade (ver, por exemplo, Mills
1991), nem todos os consumidores querem instalá-las em suas casas. Assim, o cenário potencial de
mercado captará a distinta quantidade de economia que efetivamente será implementada,
considerando as condições que limitam a abrangência e a penetração de uma medida no mercado
consumidor. Além dos custos da tecnologia, as medidas de eficiência energética consideradas nesse
cenário incluem também os custos administrativos dos programas de eficiência e GLD, a
possibilidade técnica e institucional das medidas, a aceitação e a participação do consumidor.
Atingir o potencial pleno de mercado leva tempo e uma penetração de mercado de 100%16
não pode ser atingida na maioria dos casos. Mesmo com fortes incentivos, as novas tecnologias
levam tempo para absorver uma grande fatia de mercado. Assim, o potencial de mercado atingível
inclui uma crescente fração do potencial de mercado total no tempo. Esse potencial é uma função
do tempo permitido, do tipo de programas e instituições envolvidas e da relação de custo-benefício
das medidas envolvidas. O cenário de mercado atingível captará as melhorias de eficiências
disponíveis por meio de programas reais e os limites de penetração de mercado existentes ao longo
do período de planejamento.
15
Muito embora muitos exemplos citados aqui incluem o caso de lâmpadas incandescentes, é fato que elas já não estão
sendo comercializadas no Brasil desde 2016, seguindo o exemplo de muitos outros países que as estão substituindo por
tecnologias mais eficientes, seja compactas fluorescentes ou LED mais recentemente.
16
Esse potencial pleno de mercado não representa necessariamente o potencial técnico descrito na seção anterior .
88 Projeções de demanda de energia
custos, mas também incorpora os custos ocorridos com a conservação de eletricidade via programas
GLD e de eficiência. No Capítulo 3, veremos detalhes sobre os custos dos programas e o Apêndice
B mostra como estimar os custos de conservar eletricidade.
também existir interesses diferentes dependendo, por exemplo, se ele é alguém que se beneficia dos
incentivos financeiros de um programa de conservação da companhia de eletricidade, se ele é um
consumidor que não utiliza a medida ou, então, se escolhe não participar do programa. Como um
não-participante poderia dizer, por exemplo: "Eu já modifiquei todo o sistema de iluminação de
minha loja sem nenhuma ajuda da companhia e agora você está oferecendo um apoio financeiro aos
meus vizinhos se eles fizerem isso...isso não é justo".
Para ilustrar o processo de escolha das opções do lado da demanda que serão consideradas no
plano PIR, são apresentados a seguir os critérios desenvolvidos pela California Energy Commission
e a California Public Utilities Commission em um processo chamado de California Collaborative.
Esse teste, chamado Rate Impact Measure – RIM, é uma medida do que acontece com as
tarifas da companhia de eletricidade (i.e. os preços de energia em $/kWh que os consumidores
pagam) ao serem incluídos os custos de um programa GLD/eficiência. Se o programa causa um
aumento nas tarifas, os não-participantes, que não mudaram seus usos de energia, terão aumentos
em suas contas. Os participantes, por outro lado, com o mesmo aumento de taxa, devem ter suas
contas totais de energia diminuídas, uma vez que estão consumindo menos energia (de fato, elas
irão cair se o programa de conservação passa pelo Teste do Participante).
As tarifas praticadas pela companhia aumentarão se os benefícios para ela forem menores que
os custos decorrentes da implementação do programa. Os benefícios calculados no teste RIM são
as economias que a companhia de eletricidade realiza ao evitar custos de oferta. Esses custos
evitados são os custos marginais dos recursos de oferta substituídos pelo programa de conservação.
Eles incluem a redução da transmissão, da distribuição, da geração e dos custos de capacidade dos
períodos quando a carga foi reduzida (assumindo que o propósito do GLD seja reduzir cargas). Os
custos calculados no teste RIM incluem custos do programa (incentivos pagos para os participantes,
custos administrativos do programa) e quedas nas receitas das vendas de eletricidade.
Para um programa ser economicamente atraente, usando o teste RIM, as tarifas da companhia
de eletricidade devem aumentar, isto é, os não-participantes não devem ver nenhum aumento nas
suas contas de eletricidade. Enquanto esse programa é algumas vezes descrito como o teste dos
"não-perdedores", um teste verdadeiro de "não-perdedores" deveria comparar as tarifas
considerando a situação com os programas de GLD/eficiência sem os mesmos. Ou seja, sem os
90 Projeções de demanda de energia
programas de conservação a companhia de eletricidade deverá construir uma nova usina, subindo
as tarifas de todos os consumidores para remunerar esse novo investimento.
É útil ilustrar a essência do teste RIM com um exemplo. Suponha que se inicie com a
companhia de eletricidade no ponto A, ver Figura 2-11 (Caso A) a seguir. O declive da linha da
origem para o ponto A é o preço médio, antes do programa de conservação, de um kWh a fim de
que a companhia de eletricidade gere a receita necessária para cobrir seus custos. Para o primeiro
exemplo, suponha que o custo marginal de eletricidade é muito alto, como indicado pelo grau de
inclinação da curva de receita da companhia.
Figura 2-11 – Caso A - Teste RIM quando os custos marginais são altos; caso B - Teste RIM - custos
marginais menores que o custo médio (tarifas)
não será satisfatório para o cenário considerado. Note que quando os custos marginais são menores
que os custos médios, algumas reduções nas vendas (de A para B) fazem as tarifas aumentarem.
Note também, entretanto, que, nesse caso, a conta de eletricidade é menor no ponto B que no ponto
A, embora as tarifas sempre tenham aumentado.
Novas tarifas
após GLD
Figura 2-12 – Caso A - Teste CTR falha, já passado o teste RIM; Caso B - passa o teste CTR, Mas não no
teste RIM
92 Projeções de demanda de energia
No Caso A, a soma dos custos do GLD com os custos do consumidor (do ponto B para o
ponto D) é superior ao valor dos custos evitados. Dessa forma, apesar da medida ser aprovada pelo
teste RIM, não passou no teste CTR. Para o Caso B, o oposto ocorre, sendo os custos evitados
superiores ao custo de implementação da medida GLD. Apesar de não passar pelo teste RIM, passou
pelo teste CTR.
O Teste dos Custos Sociais é uma variação do Teste do Custo Total do Recurso (CTR) no
qual são incluídos os efeitos de externalidades (tais como custos ambientais) na contabilização dos
custos e benefícios das medidas consideradas no cenário.
A Tabela 2-30 mostra um sumário dos testes de custo descritos. Os três testes mais utilizados
são o do Não-participante (RIM), o do Custo Total do Recurso (CTR) e o do Custo da CE.
O teste RIM surge para verificar o comportamento das tarifas da companhia de eletricidade
em função dos programas de conservação considerados no cenário. Para uma medida GLD passar
pelo teste RIM, as tarifas não devem subir muito, para que os não-participantes não tenham aumento
nas contas de eletricidade. Para passar pelo teste RIM, os custos marginais da eletricidade devem
ser maiores que os custos médios e a diferença entre eles é a quantidade máxima que pode ser gasta
implementando o GLD.
O teste CTR basicamente pergunta se a sociedade em geral se beneficia com as medidas
consideradas. Se o teste CTR é satisfeito, o custo total de conservação da companhia de eletricidade
e dos consumidores que implementam as medidas é menor que operar ou expandir o sistema de
oferta de energia da companhia de eletricidade. Enquanto as contas médias dos consumidores caem,
as tarifas podem subir e, assim, os não-participantes devem ter contas mais altas. O teste CTR é a
medida mais usada para testar o mérito econômico dos cenários.
O teste do Custo da Companhia de Eletricidade simplesmente analisa se a companhia
economiza mais recursos em custos evitados do que gasta em programa de conservação. As contas
médias de energia dos consumidores são reduzidas. Os não-participantes, entretanto, devem ter
contas mais altas enquanto os consumidores que participam do programa amortizam os
investimentos realizados e a companhia de eletricidade recupera os investimentos do programa. A
sociedade como um todo pode estar gastando mais com os serviços de energia que anteriormente,
mesmo que o programa satisfaça esse teste.
Uma finalidade importante do PIR é tratar programas GLD e eficiência como recursos, junto
das opções tradicionais do lado da oferta, e, então, escolher a combinação de mais baixo custo (se
esse for o critério adotado) dos mesmos para atender às necessidades de serviços de energia
projetados (ver Capítulo 1). Custos evitados por meio da conservação devem incluir mais que
apenas os investimentos associados para construir e operar usinas de eletricidade. Custos não
monetários dos impactos ao meio ambiente associados aos recursos do lado da oferta, conhecidos
como externalidades, também podem ser considerados como um custo evitado. Maiores detalhes
serão tratados no Capítulo 4.
Diversos países europeus contabilizam externalidades ambientais em algumas de suas regiões
impondo impostos sobre emissões decorrentes do uso do combustível fóssil. Nos Estados Unidos,
diversos estados têm adotado regras ou políticas para incorporar externalidades ambientais.
As externalidades podem ser captadas por meio de procedimentos qualitativos ou como um
valor expresso por meio de custos. Os custos dessas externalidades podem ser expressos a partir de
impostos ou taxas associadas a quantias de emissão de certos gases e são pagos pela companhia de
eletricidade. Isso vai afetar os custos de eletricidade produzida de acordo com a tecnologia e o
recurso energético primário utilizado. Sob uma estrutura desregu1amentada (ou não regulamentada)
dos serviços de eletricidade, os custos ambientais devem ser pagos pela companhia de eletricidade,
a fim de afetar a demanda via tarifas mais altas. Esse tem sido o objetivo das taxas de emissões
colocadas em prática na Europa.
Alguns estados dos EUA (e.g., Minnesota) tratam externalidades de forma qualitativa, dando
preferência para as fontes de energia menos poluidoras sem tentar quantificá-las. Outros (e.g.,
Vermont) usam um fator chamado de percentagem adicional (percentage odder) que aumenta o
custo do recurso do lado da oferta ou diminui o custo do lado da demanda em algum percentual.
Outros estados, por exemplo, o de Nova Iorque, incluem estimativas em valores monetários das
externalidades ambientais ao determinar o custo-benefício dos recursos de GLD (Eto, Destribats,
and Schultz 1992).
94 Projeções de demanda de energia
Diversos métodos analíticos têm sido usados para estimar o valor econômico das
externalidades do meio ambiente. Alguns mais qualitativos e outros mais quantitativos. A seguir,
estão relacionados alguns dos métodos mais utilizados, ordenados desde o mais subjetivo ao mais
quantitativo: codificação de valor subjetivo, método de ponderação/ordenação, custos marginais da
mitigação do impacto, demanda implícita por amenidades ambientais e cálculo direto dos custos
dos danos.
Método de ponderação/ordenação
Esse método pretende esclarecer os critérios para escolha de tecnologia e codificar seus
valores relativos, incluindo impacto ambiental de equidade social. O processo na Alemanha, por
exemplo, orientou uma coleta de opiniões de diversos critérios de planejamento energético entre
entidades de classe. Nesse trabalho, as várias opiniões foram hierarquizadas segundo o nível de
determinadas categorias de critérios para também identificar áreas de consenso entre os diferentes
grupos. Embora esse procedimento incorpore a opinião pública para as decisões de planejamento
de energia, o processo de ponderar os diferentes valores pode ser tão complexo e difícil quanto os
métodos mais quantitativos abaixo descritos.
É difícil estimar diretamente o valor da qualidade ambiental e, por sua vez, o custo da
poluição. Um procedimento seria usar a análise estatística das escolhas dos consumidores para
estimar a função de demanda implícita de certos parâmetros ambientais (qualidade do ar, por
exemplo). Esse método tem sido aplicado para estimar os gastos, considerando, por exemplo, lagos
e reservatórios, tomando como base o que o consumidor paga em custos de viagem e transporte
Projeções de demanda de energia 95
para ir a esses locais e usufruir desses recursos. Entretanto, é difícil identificar quanto as pessoas
estão desejando pagar para evitar os efeitos dos poluentes emitidos no ar ou na água.
(União Europeia 2014) (Ang 2004) (Achão and Schaeffer 2009) (Chateau and Lapillone 1982) (Richardson
1972) (G. M. Jannuzzi et al. 2002)
Projeções de demanda de energia 97
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Projeções de demanda de energia 99
CAPÍTULO 3
DISTRIBUÍDA
3.1. INTRODUÇÃO
1
Entende-se aqui principalmente o uso e a geração de energia a partir de fontes renováveis e sistemas de cogeração
(que podem utilizar fontes fósseis de maneira mais eficiente).
2
Programas de eficiência energética são entendidos aqui como ações organizadas e implementadas por outros agentes
que não as companhias de eletricidade. Programas de GLD (Gerenciamento do Lado da Demanda) ou DSM (Demand-
Side Management) são ações concebidas, implementadas e fundamentadas historicamente no contexto de companhias
de eletricidade.
3
Uma discussão mais detalhada sobre essa experiência é abordada no Capítulo 6 do livro “Geração distribuída e
eficiência energética: Reflexões para o setor elétrico de hoje e do futuro” (Bajay et al. 2018).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 101
de maior uso de fontes renováveis4. Um Plano Integrado de Recursos inclui, também, questões de
custos e de impactos desses programas na curva de carga do sistema elétrico e no consumo de
eletricidade. Em níveis mais detalhados, o PIR também inclui projetos específicos 5, tempo de
implementação e a avaliação dos programas. No final deste capítulo, estão alguns exemplos
quantitativos que incorporam os custos e os efeitos potenciais dos programas nos cenários de
demanda projetada de energia. Embora seja difícil estimar precisamente os custos e os efeitos dos
programas, os exemplos apresentados aqui mostram caminhos atuais e simples para a contabilização
desses parâmetros, assim como uma análise mais rigorosa para as opções do lado da demanda.
3.2.1. Informação
4
Alguns programas dirigidos ao mercado consumidor de energia têm implicações para a evolução do sistema de oferta
de energia centralizado. Programas de informação ou de preços, por exemplo, fazem com que consumidores passem a
ter preferência por compra de eletricidade de origem renovável. Isso já vem acontecendo em alguns países da Europa e
nos EUA.
5
Chama-se “projeto específico” um componente de um programa. Por exemplo, um programa de iluminação eficiente
para o setor residencial pode ser constituído de um projeto de marketing e informação, outro de substituição de lâmpadas
por meio de incentivos financeiros, outro de substituição por meio de leasing de equipamentos etc.
102 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
6
Chamamos aqui de tecnologias de interface um conjunto de tecnologias e materiais que incluem desde materiais
supercondutores a edifícios eficientes, smart grids, smart metering e smart appliances.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 103
taxa de retorno social. O lucro de uma companhia de eletricidade também necessita ser dissociado
da necessidade de aumento das vendas de energia, o que não é o caso do Brasil. As companhias
elétricas não devem ser penalizadas por rendimentos menores, em função da diminuição de suas
vendas decorrente dos programas de sucesso que reduziram o consumo de energia. Essas são
barreiras fortes e que impedem a elaboração e a futura implementação de um PIR.
No caso do Brasil, as barreiras institucionais, tarifárias, financeiras, de acesso à tecnologia,
entre outras, dificultam a promoção de um planejamento integrado de recursos e o atingimento do
potencial máximo de conservação de energia previsto, o que se torna um desafio para o país superar.
No Plano Nacional de Energia (PNE) para 2030, o potencial de eficiência energética até 2030 é
dividido em três categorias: potencial de mercado, econômico e técnico. O potencial de mercado
inclui medidas que podem ser introduzidas “por si mesmas”, ou seja, aquelas cuja adoção traria
redução de custos ao usuário. O potencial econômico compreende um conjunto de medidas que
tenham viabilidade econômica, porém exige condições de contorno que induzam à sua efetiva
implantação. O potencial técnico estabelece um limite teórico para a penetração das medidas de
eficiência energética dado pela substituição de todos os usos da energia considerados por
equivalentes com a tecnologia mais eficiente disponível. No PNE 2030 entende-se que seja possível
atingir em 2030, com a continuidade das ações tomadas até agora, um montante de energia
conservada limitado ao equivalente do potencial dito de mercado, devido às barreiras citadas. Outras
medidas devem ser tomadas para a maximização da conservação de energia, objetivando atingir um
valor próximo do potencial total (EPE 2007).
A maioria dos consumidores não faz investimentos em eficiência de energia porque não
possui capital para comprar equipamentos mais eficientes ou para fazer melhorias em suas
instalações. Certas medidas podem ser vantajosas para o consumidor, com rápido retorno do
investimento inicial, mas elas não são implementadas porque ele não tem capital necessário para
realizar esse investimento.
Capital, no entanto, não é o único fator financeiro de restrição. Um consumidor pode ter
capital, mas a eficiência energética pode não ser sua prioridade para investimentos. Por exemplo,
um consumidor que pretende comprar um novo refrigerador, pode preferir um modelo menos
eficiente se este estiver disponível na cor que ele prefere. Um consumidor industrial pode preferir
gastar capital em uma nova linha de produtos e desconsiderar investimentos na melhoria das
instalações elétricas existentes.
Algumas vezes, a pessoa que paga a conta de energia não é a responsável pela seleção e
compra do equipamento. Esse é especialmente o caso de construções, onde arquitetos, construtores
e proprietários selecionam elementos da construção e equipamentos, mas são os compradores e os
locatários que pagarão as despesas de energia.
Tipos diferentes de consumidores têm maneiras distintas de estimar os retornos econômicos
sobre seus investimentos em eficiência de energia, como será visto mais adiante. Os programas que
promovem medidas de eficiência podem direcionar essas questões específicas, oferecendo
empréstimos a taxas de juros atrativas, de modo a terem investimentos em medidas de energia
eficientes consideradas como prioritárias para cada agente relevante.
104 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
As tarifas de eletricidade, em muitos casos, têm sido uma barreira para atrair consumidores e
investimentos em eficiência de energia. Em muitos países, as tarifas são fixadas
administrativamente pelas agências do governo, que podem ter uma faixa ampla de critério a
considerar. Em muitos casos, se observa que as tarifas cobradas não refletem os custos marginais
de produção de eletricidade. Em outros países, as tarifas são baseadas nos custos médios de
produção de eletricidade e estes, muitas vezes, não refletem os custos reais de produção da
eletricidade. Por exemplo, poucos consumidores pagam taxas mais altas por serviços no pico,
embora o custo para a CE fornecer essa energia seja sempre substancialmente mais alto que o custo
médio. Outra prática é dar subsídios aos consumidores de determinadas regiões. Essas medidas
impedem a utilização de recursos regionais para produzir eletricidade e a introdução de programas
de eficiência ou/e a adoção de medidas ou tecnologias eficientes justamente onde faria mais sentido
implementá-las.
A maneira tradicional de se calcular as tarifas de uma empresa tende a encorajar as vendas de
kWh (para uma CE), conforme já mencionado, desestimulando as medidas de eficiência que ela
possa induzir no seu mercado consumidor. Para compreender esse processo, considere o gráfico
simplificado de receitas de uma empresa de eletricidade que são necessárias para cobrir os custos
de produção versus a venda de energia (ver Figura 3-1).
No exemplo da Figura 3-1, as vendas anuais estimadas de 1 bilhão de kWh requereriam $40
milhões em receitas, assim as tarifas seriam de 0,04 $/kWh. Note que nesse exemplo fictício existe
um montante anual fixo de $30 milhões necessário para recuperar os custos de capital dos
investimentos realizados pela CE e ter lucros considerados aceitáveis, mais uma quantidade
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 105
adicional (custo marginal de curto prazo ou custo variável) de 0,01 $/kWh, que depende da
quantidade de kWh que são gerados. Esses custos fixos mais os variáveis estão associados com os
recursos de capacidade instalada existentes; os custos marginais de longo prazo incluem os custos
de capital de nova capacidade de geração. Num caso geral, a CE estima as vendas anuais totais de
kWh e a receita necessária para cobrir suas despesas. A relação dos dois valores fornece a tarifa de
eletricidade que poderia ser estabelecida para cobrir os custos. Nesse exemplo, se as vendas são
estimadas em 1 bilhão de kWh/ano e são necessários rendimentos anuais de $40 milhões para a CE,
a relação dos dois é uma tarifa média de 0,04 $/kWh, que é aquela que a CE deve cobrar.
Considere agora os incentivos "perversos" que encorajam a CE a vender mais kWh que a
quantidade estimada mostrada na Figura 3-1. Tendo estabelecido um preço de 0,04 $/kWh para
todas as vendas de eletricidade, as vendas acima de 1 bilhão de kWh produzirão rendimentos para
a CE de 0,04 US$ para cada kWh extra vendido. Uma vez que cada kWh extra gerado tem um custo
marginal para a CE de somente 0,01 $/kWh, haverá um lucro líquido de $0,03 para cada kWh extra
vendido. Note que, no exemplo, a CE perde dinheiro se ela vende menos do que 1 bilhão de kWh.
Gerar um kWh a menos reduz os custos em $0,01, mas reduz as receitas em $0,04. Em outras
palavras, essa prática de estimar vendas de eletricidade e rendimentos como um caminho para
estabelecer a tarifa base não somente encoraja as vendas de kWh adicionais, mas também
desencoraja fortemente a conservação, que reduziria as vendas de kWh.
Em um PIR, a decisão sobre investimentos envolve pelo menos três agentes diferentes: o setor
energético (ou companhia de energia), o consumidor e a sociedade (que inclui consumidores de
energia, não consumidores e o setor energético). Cada um desses atores quando consideram um
novo investimento levam em conta pelo menos os seguintes fatores:
• a taxa de desconto usada para avaliar os benefícios e os custos resultantes de uma medida;
• a avaliação futura dos custos e dos preços de energia; e
• a percepção dos impactos ambientais para suas atividades, riscos e incertezas envolvidas
para adotar uma medida.
A maioria das CEs, dos grandes consumidores e o governo 7 têm acesso ao capital com taxas
de juros mais baixas, o que não é o caso da maioria dos consumidores, como apresentado na Tabela
1-1. Um governo ou uma CE pode ter recursos para fazer investimentos por prazos mais longos,
com tempo de retorno do pagamento mais longo e esparso. Por isso, o setor energético e o governo
tendem a assumir uma taxa de desconto mais baixa, quando comparada com o consumidor de
energia, refletindo seu maior acesso ao capital mesmo quando se consideram ações do lado da
demanda.
Taxa de desconto
Agentes
(% a.a.)
Governos 4–12
Banco Mundial 10
Companhia Elétrica Pública (EUA, Suécia) 6–12
Indústria 15–20
Consumidor residencial 35–70
A percepção dos riscos futuros também é refletida nas taxas usadas para descontar os custos
e os benefícios futuros, conforme explicitado no Quadro 3-1. Diferentes agentes podem aplicar
diferentes taxas de descontos em seus fluxos de custos e benefícios. Uma taxa de desconto mais
baixa para as companhias elétricas, que pode ser a mesma utilizada para avaliar os investimentos
em geração de energia, por exemplo, fará com que investimentos em eficiência energética tenham
um retorno mais rápido, quando comparados com o caso dos investimentos nas mesmas medidas
realizadas pelos consumidores.
Quadro 3-1 – Comparação de oportunidades de investimento e riscos nas usinas de geração de eletricidade
pelas companhias elétricas e pelos consumidores
Para comparar os riscos de dois projetos alternativos, uma companhia elétrica deve considerar a figura
a seguir:
7
Neste texto, usa-se o governo como representante das percepções da sociedade.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 107
O Plano A consiste em uma nova usina de baixo custo de capital, mas de altos custos operacionais
(turbinas a gás, por exemplo). O Plano B representa uma usina hidroelétrica que possui características
opostas. Qual plano é o melhor?
Ambos os projetos possuem os mesmos custos esperados considerando a vida da usina. Entretanto,
devido à incerteza dos preços futuros de combustível para o Plano A, ele possui uma faixa de custo ($/MWh)
maior que a variação do Plano B.
O risco associado com o Plano A é óbvio – que os custos do combustível poderão ser altos e qualquer
variação afetará a rentabilidade do negócio. O risco associado com o Plano B, por outro lado, é muito menos
aparente. Seria razoável supor que tanto consumidores quanto companhias elétricas prefeririam o Plano B.
Entretanto, esse não é o caso. Enquanto os consumidores optariam pelo Plano B, as companhias escolheriam
o Plano A. Existem três razões para essa preferência das CEs:
• Se o preço do gás determinar o preço da eletricidade no ponto baixo (Plano A) e a CE tiver optado
pelo Plano B, então a companhia elétrica pode perder consumidores para outras CEs que utilizam a
tecnologia do Plano A.
• Se a CE decidir pelo Plano A, é muito provável que outras CEs, também considerando planos de
investimentos, igualmente o façam. Isso implica que os riscos associados à exposição a altos custos
de combustível são igualmente repartidos e, portanto, minimizados.
• Sempre existe a prática de se realizar contratos prevendo uma determinada evolução de preços para
os combustíveis durante um período de tempo. A variabilidade dos custos de combustíveis para uma
CE não chega a ser um fator de grande risco para elas. As agências regulamentadoras do setor
energético que autorizam aumentos tarifários podem também influir nos aumentos dos custos dos
insumos energéticos para a produção de eletricidade. Caso existam dificuldades é muito provável que
os aumentos sejam repassados aos consumidores, sem que haja questionamento se tal usina foi
construída ou não. A prática demonstra que, de fato, o Plano A oferece um baixo risco para a CE,
embora seja de alto risco para os consumidores (como tem sido o caso da introdução em 2015 das
bandeiras tarifárias no Brasil, cuja função é repassar ao consumidor os custos de aumento da geração
termoelétrica).
Esse exemplo ilustra a grande disparidade de contextos que condicionam a tomada de decisão.
_____________________________
EXEMPLO 3.1 – Calcule a taxa de desconto para um investimento
em um compressor eficiente considerando as condições dos seguintes
agentes: a) que o consumidor exija um retorno do investimento em
2,5 anos; b) que a CE queira um retorno do investimento em 10 anos
e c) que o governo queira um retorno do investimento em 20 anos.
108 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
Solução
Para o consumidor, que deseja um retorno de $230 em 2,5 anos
com um aporte de investimento de $100, vale a seguinte relação:
VPLC = 100(1 + i) 2,5 (3.1)
A estrutura de preço adotada pelo setor elétrico geralmente considera que diferentes
consumidores devem ter tarifas também diferentes. Em países em desenvolvimento, esse sistema é
usado como um instrumento de política econômica para compensar a distribuição desigual de
riqueza ou para promover e estimular setores específicos da economia. Algumas vezes, a variação
entre a tarifa mais baixa e a mais alta pode atingir 1000%. Existem alguns casos, como já foi dito,
em que o preço médio da energia paga não é sequer suficiente para assegurar a taxa de retorno
necessária para financiar a expansão futura do sistema e, portanto, outros mecanismos devem ser
aplicados.
As tarifas de energia elétrica variam no tempo, dependendo da evolução da demanda, da curva
de carga, das tecnologias envolvidas na produção de energia, dos preços dos combustíveis ou da
disponibilidade de recursos hídricos no caso de geração hidroelétrica. É importante conhecer como
os consumidores reagem às mudanças dos preços de energia. Essa reação é medida por meio da
elasticidade energia-preço. Em alguns casos, o aumento do preço da eletricidade pode levar os
consumidores a substituí-la por outros combustíveis (gás ou energia solar, por exemplo) ou, em
outros, induzir os consumidores a usar eletricidade mais eficientemente. Preços são bons
instrumentos de política quando a elasticidade energia-preço é fortemente negativa, ou seja, quando
o aumento do preço é acompanhado por uma redução substancial da demanda de energia. É
importante lembrar que na teoria econômica existe uma relação entre preço e demanda, que é
perfeitamente adaptável para preços e conservação de energia.
Alguns países introduziram uma política de preços de energia que estimula a eficiência,
tornando os investimentos em novas tecnologias eficientes mais atrativos e, também, influindo no
comportamento dos consumidores em relação ao uso de energia. Preços de eletricidade são
instrumentos para guiar alguns consumidores na direção de tecnologias ou práticas de eficiência de
energia. Outro aspecto importante é o método a ser adotado para o cálculo da tarifa, de modo a
contabilizar a recuperação dos investimentos das companhias elétricas, assim como as perdas de
faturamento (diminuição de venda de eletricidade) com os programas de eficiência. Existem
diferentes maneiras de se estabelecer tarifas para o uso de energia. Nas seções seguintes são
apresentadas algumas práticas utilizadas.
Um dos modos de se cobrar pelo uso de eletricidade é por meio da estrutura de tarifa em
bloco, na qual o preço pago por cada kWh varia de acordo com os diferentes patamares de consumo.
Isso tem sido aplicado para o setor residencial, principalmente, admitindo-se que as residências de
maior renda, que tenham maiores níveis de consumo de eletricidade, subsidiarão a tarifa paga pelas
residências de renda mais baixa.
Em outros casos, a tarifa em bloco é feita para que consumidores que contratam grandes
blocos de energia junto às companhias de eletricidade paguem preços unitários menores quando
comparados com consumidores de menor porte. Isso é feito considerando economias de escala na
produção, transmissão e distribuição de eletricidade e o mercado garantido pelos contratos com
esses consumidores.
110 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
O papel dos preços numa economia de mercado pode ser dividido em três:
• alocar recursos eficientemente para as atividades produtivas;
• fornecer aos consumidores sinais com relação ao valor de diferentes bens e serviços; e
• prover recursos suficientes para cobrir os custos de produção de bens e serviços.
No contexto do setor elétrico, os preços da eletricidade deveriam: (i) gerar rendimentos para
a CE; (ii) sinalizar quantidades adequadas a serem consumidas; e (iii) indicar aos provedores de
serviços de energia o montante de recursos a ser alocado para atender à demanda futura de serviços
de eletricidade.
A análise econômica demonstra que o preço apropriado que acompanha essas três metas é
igual ao Custo Marginal de Longo Prazo (CMLP). Igualando o preço de um bem com o custo
marginal das diferentes fontes para aquele bem, estabelece-se uma condição padrão ótima para
todos os tipos de análise microeconômica. No caso de um bem intensivo em capital, tal como a
eletricidade, distingue-se o Custo Marginal de Curto Prazo (CMCP), que é o custo de produzir a
próxima unidade sem expandir a capacidade de produção total, e o CMLP, que é o custo de prover
um aumento futuro da produção num dado horizonte de tempo, permitindo a expansão e a
otimização da capacidade.
A relação entre o CMLP e a demanda do sistema é mostrada de forma idealizada na Figura
3-2. Uma parcela dos custos de produção de eletricidade pode ser atribuída à recuperação dos
investimentos existentes e de outros custos fixos independentemente da demanda. Com o aumento
desta, os custos de produção de eletricidade aumentam de acordo com os custos variáveis de
operação da capacidade existente, o que é indicado pelo CMCP. Em alguns pontos, a demanda é tal
que a capacidade existente não é mais adequada e deve ser expandida. Recursos de oferta de
eletricidade tendem a ser investimentos feitos em blocos que são possíveis somente em incrementos
discretos, por isso a descontinuidade na Figura 3-2, que corresponde aos custos dos aumentos
incrementais na capacidade. No ponto onde a capacidade deve aumentar, o custo marginal
(inclinação) é infinito, mas o investimento requerido não pode ser atribuído inteiramente ao
aumento marginal da demanda. O CMLP, que inclui os rendimentos requeridos para a expansão da
capacidade, é de fato "suavizado" por meio de diversos incrementos na demanda, como mostrado
na Figura 3-2.
Uma estrutura de tarifas, baseada no CMLP, deverá compreender, também, um valor para
cobrir os custos fixos que não dependem do nível de consumo. Além disso, o preço deverá incluir
o valor dos impactos ambientais e outras externalidades, apontando, assim, informações apropriadas
do custo total do uso da eletricidade para os consumidores. Na prática, nem todos esses refinamentos
e nem os critérios básicos para estabelecer tarifas segundo o CMLP são usados rotineiramente. Ao
8
Isso quando o consumo nesse período pode ser atendido com a capacidade existente.
112 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
invés disso, os preços são baseados, em sua maioria, nos custos médios históricos, incluindo
componentes fixos e variáveis (CMCP), como se mostra na Figura 3-2. Existem diversas razões
para essa divergência da teoria econômica, algumas de ordem técnica e outras de cunho político.
As razões técnicas referem-se ao fato de que os investimentos de oferta de eletricidade tendem
a ser feitos em blocos. Se o CMLP está decrescendo com o tempo, como ocorreu em nível mundial
durante grande parte do período antes de 1970, então o CMLP é menor do que o custo médio.
Estabelecer tarifas de acordo com esse valor, tornaria difícil aumentar os rendimentos o suficiente
para operar e expandir o sistema elétrico. Tal condição resultaria na competição entre fornecedores
e essa é uma razão pela qual a oferta de eletricidade tem sido tratada como um monopólio natural
na maioria dos países. Tarifas baseadas em custos médios históricos garantem com mais segurança
a recuperação de investimentos quando o CMLP diminui.
Nos anos 1970 e 80, os custos dos combustíveis e as taxas de juros causaram o aumento do
CMLP da eletricidade na maioria dos países. Embora os preços baseados no CMLP possam sinalizar
aos consumidores o valor futuro da eletricidade, se eles fossem assim estabelecidos nesse momento
isso provocaria uma transferência substancial de recursos financeiros dos consumidores para os
produtores de eletricidade. Isso ocasionou, essencialmente em países em desenvolvimento,
considerável resistência quanto à aplicação do CMLP tanto do ponto de vista político como de
equidade social. Hoje parece que o CMLP da oferta de eletricidade está novamente decrescendo e
as companhias elétricas já estão preocupadas com as dificuldades potenciais da recuperação dos
custos fixos de suas capacidades existentes.
A principal razão política para evitar o estabelecimento de tarifas baseadas no CMCP é que
esse procedimento pode levar a grandes diferenças de preços de eletricidade entre os consumidores,
podendo tornar o serviço não disponível para consumidores de baixa renda ou geograficamente
muito dispersos, por exemplo. Historicamente, a eletricidade tem sido vista como um componente
essencial para o desenvolvimento da infraestrutura que ajudou a integrar as áreas rurais e distantes
dentro de um país. Embora seja relativamente caro servir a essas áreas, não seria politicamente
aceitável praticar preços para refletir tais diferenças. Em muitos países em desenvolvimento, a
eletricidade é subsidiada nos pontos onde as companhias elétricas não são capazes de cobrir seus
custos, criando um obstáculo óbvio para a expansão e a operação de um sistema eficiente.
Alguns critérios para a expansão ótima do sistema elétrico podem ser definidos. A evolução
ótima de custo mínimo de um sistema elétrico, de modo geral, caracteriza-se pela igualdade, em
cada instante, entre o custo marginal de operação, ou custo marginal de curto prazo, e o custo
marginal de expansão, ou custo marginal de longo prazo. Essa condição reflete o raciocínio de que,
antes de se decidir pela incorporação ao sistema de uma nova usina geradora, qualquer acréscimo
de carga deve ser atendido pelo sistema existente, incorrendo-se em um aumento dos custos
operacionais. Isso será feito até o momento em que esse acréscimo dos custos operacionais for
maior do que o custo de expansão do sistema com uma nova obra. Enquanto o custo marginal de
operação for menor do que o de expansão, será mais econômico suprir um acréscimo de carga pelo
sistema existente até o momento em que a confiabilidade do sistema deixar de atender ao nível
adequado. Quando isso ocorre, o custo marginal associado ao risco de déficit cresce, fazendo com
que o custo marginal de operação seja maior do que o custo marginal de longo prazo de expansão
(conforme a Figura 3-3).
Uma aplicação direta do preço de eletricidade a custo marginal pode ser encontrada no sistema
de tarifa conhecido como tarifa horo-sazonal aplicável para consumidores comerciais e industriais
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 113
atendidos em alta tensão (conforme Aneel nas modalidades tarifárias Azul e Verde) e, desde 2015,
para consumidores residenciais atendidos em baixa tensão (conforme Aneel na modalidade tarifária
Branca). É possível mudar o comportamento do consumidor com relação ao uso de energia durante
o dia ou durante alguns períodos do ano. As tarifas podem variar entre horas de pico (normalmente
das 18:00 às 21:00 ou 22:00 horas) e horas fora de pico e entre estação seca e úmida (importante
num sistema hidroelétrico).
Alguns consumidores pagam dois tipos de tarifas: uma pela energia consumida (kWh) e outra
por uma demanda máxima contratada (kW). Os preços de eletricidade são mais altos durante certos
períodos do dia ou do ano9. Essa é uma maneira de mudar o perfil de carga do consumidor,
possibilitando a introdução de tecnologias mais eficientes ou mudanças nos horários de maior
utilização de eletricidade. Desse modo, esse mecanismo de preço pode ser usado para promover
mudanças na curva de carga do sistema elétrico.
Em alguns países, esse mecanismo de preços foi usado de modo a favorecer a introdução das
fontes renováveis. Nesse caso, essa é uma taxa que o consumidor concorda em pagar sobre a tarifa
normal (5 a 10% da tarifa existente), de modo a sustentar o desenvolvimento e o uso das fontes
renováveis que podem custar ligeiramente mais do que as fontes convencionais. Isso tem sido
aplicado na Dinamarca, por exemplo, onde os consumidores podem optar por uma certa fração de
seu consumo a ser fornecido por meio de geração eólica. As taxas funcionam como incentivo aos
produtores de eletricidade a partir de fontes renováveis mais competitivas em relação às fontes
convencionais.
No Brasil, dentre os encargos legais incluídos na composição da tarifa elétrica, merece
destaque a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que tem como objetivo propiciar o
desenvolvimento energético a partir de fontes alternativas, além de promover a universalização do
serviço de energia residencial para as classes de baixa renda.
Os mecanismos tradicionais para estabelecer tarifas que estimulem uma crescente venda de
eletricidade, de modo a garantir receitas adequadas para a companhia, têm o efeito de serem graves
empecilhos para uma efetiva participação da mesma em iniciativas de conservação de energia,
conforme discutido anteriormente. É necessário introduzir maneiras alternativas para procurar
eliminar a relação direta entre vendas de kWh e lucros da CE. Essas estratégias já vem sendo
empregadas há bastante tempo, como pode ser visto adiante.
Quando a CE encoraja seus consumidores a conservar energia, oferecendo incentivos
(programas de informação, descontos etc.), isso acarreta custos adicionais que necessitam ser
recuperados. Assim como os gastos do lado da oferta são recuperados por meio de tarifas, os
programas de eficiência e GLD também devem ser considerados dessa maneira. Pode-se
argumentar, entretanto, que a introdução de novas taxas para cobrir os custos desses programas
pode aumentar o custo de conservação para os consumidores e pode permitir que as companhias
elétricas obtenham lucros com seus programas GLD e de eficiência. Se os custos dos programas
9
No Brasil, as tarifas de demanda são cinco vezes mais caras durante as horas de pico e 10% mais caras durante a
estação de seca para os consumidores industriais de alta voltagem.
114 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
Para que o GLD seja considerado pela CE é essencial um desacoplamento entre as vendas de
energia (kWh) e as receitas (R$) da companhia. O estado da Califórnia iniciou esse procedimento
em 1978 para o setor de gás natural, dissociando a necessidade de aumento das vendas para
assegurar rendimentos adequados para a companhia desse estado. Depois, em 1982, começou a
aplicar o mesmo procedimento para suas companhias de eletricidade, por meio de um programa de
recuperação de rede chamado de ERAM (Electric Revenue Adjustment Mechanism). Outros estados
dos EUA adotaram mecanismos de desacoplamento entre vendas e rendimento semelhantes. Uma
apresentação excelente do ERAM é dada em Marnay e Comnes (1992). Os parágrafos seguintes
estão baseados nesse trabalho. O programa ERAM foi abandonado em 1996, após a
desregulamentação do mercado da eletricidade, mas configurações desse mecanismo foram
restabelecidas em 2001, após a crise de energia da Califórnia (Donnelly, Christian-Smith, and
Cooley 2013).
A ideia básica do ERAM é simples: a CE deve manter somente a receita acordada advinda da
tarifa básica autorizada pelo órgão regulador. Qualquer rendimento extra ou menor, em um dado
ano, é colocado em uma conta separada. Esse balanço contábil que inclui juros é "zerado" a cada
ano usando uma taxa adicional (que pode ser positiva ou negativa) a ser incluída nas tarifas do ano
seguinte. O exemplo da Tabela 3-3 ilustra o cálculo, que foi simplificado, pois não inclui os efeitos
de taxa de juros ou outra remuneração financeira na contabilidade do balanço ERAM.
Considere os dados da Tabela 3-3. Na primeira linha do Ano 1, $300 milhões representam os
ativos da CE que são "baseados na tarifa". O órgão regulador local permite uma taxa de retorno de
10% ($30 milhões/ano, linha 3). A linha 4 mostra as vendas de kWh previstas para o próximo ano
(1 bilhão de kWh). Multiplicando as vendas previstas pelos custos operacionais, 0,01$/kWh, obtém-
se o total necessário para cobrir os custos operacionais ($10 milhões, linha 6). A linha 7 mostra os
rendimentos totais baseados na taxa autorizada ($30 milhões de retorno sobre investimento + $10
milhões de custos operacionais = $40 milhões). A receita da companhia com a tarifa básica
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 115
autorizada é então ajustada para contabilizar o balanço do ERAM do ano anterior (no ano 1, este é
$0), dando um rendimento total autorizado ($40 milhões, linha 9). Dividindo os rendimentos totais
autorizados pelas vendas kWh previstas, tem-se a tarifa básica que a CE pode cobrar para seus
consumidores naquele ano ($40 milhões/1 bilhão kWh = $0,04/kWh, linha 10).
No primeiro ano, as vendas realizadas (1,1 bilhão de kWh) estiveram acima das vendas
previstas (1,0 bilhão de kWh), tanto que a CE coletou um extra de $4 milhões ($44 - $40, linha 13).
Esse rendimento extra coletado é levado em consideração na contabilidade de balanço ERAM, para
ser devolvido (se positivo) ou ressarcido (se negativo) no ano seguinte (linha 8). Nesse exemplo, os
efeitos da taxa de juros ou outra remuneração financeira na contabilidade ERAM não foram
considerados.
As vendas de kWh realizadas no Ano 1 são maiores do que os rendimentos extras projetados
que são devolvidos no Ano 2. No Ano 2, as vendas de kWh são menores que as projetadas e não
são coletados suficientes rendimentos. Aquele déficit no rendimento no Ano 2 é coletado no Ano 3
e assim por diante. O efeito do ERAM é, então, a remoção dos incentivos para vender mais kWh e
a remoção dos obstáculos para conservar kWh.
Apesar do ERAM ser bastante aceito na Califórnia, ele não é o único método de
desacoplamento (veja, por exemplo, a descrição do desacoplamento rendimento por consumidor em
Moskovitz e Swofford 1992). Enquanto o desacoplamento entre vendas e rendimentos de uma
companhia é uma condição necessária para que o GLD tenha um impacto, ele não recompensa
companhias elétricas por seus programas de conservação e, assim, não é uma condição suficiente
para que elas promovam programas de conservação.
Existem dois métodos para as CEs recuperarem os custos dos programas do lado da demanda
ou do lado da oferta: os custos podem ser recuperados no ano em que a despesa com o programa é
feita ou então os custos são incorporados na tarifa básica e são recuperados ao longo de um
determinado tempo. Os investimentos da CE em sistemas de geração, transmissão e distribuição
são, geralmente, incluídos nas tarifas e são recuperados ao longo do tempo, enquanto outros custos
com programas de GLD ou eficiência tendem a ser encarados como despesas operacionais anuais.
Existem inúmeras razões pelas quais os custos de GLD seriam melhor considerados se fossem
incluídos nas tarifas básicas de eletricidade do que se fossem contabilizados como custos
operacionais (Reid, Brown, and Deem 1993):
• Os custos contabilizados na tarifa básica são passíveis de ser remunerados com taxas de
lucros para a CE. Isto é, como mostrado na Tabela 1-1, as despesas baseadas nas tarifas
ganham uma taxa de retorno sobre o investimento. Os itens gastos anualmente não. Os
custos operacionais são simplesmente passados para os consumidores;
• Uma vez que os custos totais de um item de despesa são recuperados no ano em que foram
feitos, podem existir imprevistos e aumentos anuais irregulares nas tarifas cobradas pela
CE aos seus consumidores e esse efeito desencorajar despesas em grandes programas de
GLD. Quando os custos dos programas são amortizados no tempo, as tarifas mudam mais
lentamente;
• Na medida em que os equipamentos/instalações de geração, transmissão e distribuição são
depreciados, a tarifa básica declina. Investidores, no entanto, tendem a retrair seus
116 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
O ERAM teve um impacto no início, mas, sem incentivos específicos para que promovessem
programas de GLD, as CEs da Califórnia retomaram seus investimentos do lado da oferta. Somente
no início dos anos 90 houve uma retomada no interesse, por meio das iniciativas que são abordadas
a seguir.
• California Collaborative
Devido ao declínio no interesse em programas de conservação das companhias da Califórnia
(ver Figura 3-4), o Conselho de Defesa dos Recursos Naturais (Natural Resources Defense Council
– NRDC) convenceu a CPUC (California Public Utilities Commission)10 a manter uma audiência
especial em 1989 sobre o futuro dos programas de conservação na Califórnia. A audiência resultou
10
Praticamente todos os estados americanos possuem um órgão que regula preços, taxas de retorno e o desempenho
geral das companhias públicas e privadas de energia elétrica, gás, água e saneamento. Devido às características
predominantes de monopólio na estrutura de suprimento de eletricidade em nível estadual, as políticas públicas do setor
têm sido elaboradas pela agência federal PUC (Public Utilities Commision). O CPUC é o órgão que regulamenta e
fiscaliza o setor elétrico do estado da Califórnia.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 117
Onde:
Custo Evitado = Redução de Carga(kW ou kWh) Custo de Oferta Evitado ($/kW ou $/kWh) (3.4)
Enquanto os acionistas da PG&E obtêm uma recompensa de 15% para a conservação que
excede um limite de desempenho preestabelecido, há também uma penalidade de 15% que é
aplicada se as economias caem abaixo de outro limite inferior11.
_____________________________
EXEMPLO 3.5 – Suponha que a PG&E promova um programa de
substituição de lâmpadas oferecendo um desconto de $5 em cada
lâmpada compacta fluorescente (LCF) de 18 Watts, equivalente a uma
lâmpada incandescente de 75 Watts, e que dure 10.000 horas. Suponha
que:
• O custo adicional para a PG&E administrar o programa seja de
$1;
• O custo marginal da eletricidade para a PG&E seja de 0,04
US$/kWh.
Encontre os ganhos possíveis para os acionistas da PG&E se 1
milhão de consumidores participarem do programa.
Solução:
De acordo com a Eq. (3.4), o custo evitado para a PG&E é:
Custo Evitado = (75 − 18) 10000 0,04 110 6 10 −3 = $22,8 milhões (3.5)
O CustoPrograma seria:
11
A avaliação de desempenho de um programa é realizada por meio de uma taxa de participação no programa e não
pelas economias de energia deste.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 119
Solução:
Novamente assumindo que 1 milhão de LCFs sejam compradas, o
custo social para a CE e para seus consumidores é:
Custo Social = Custo Programa + Custo Consumidor = (6 + 2,52) 10 6 + (15 − 5) 10 6 = $18,52 10 6 (3.9)
De um modo geral, a tarifa elétrica deve ser suficiente para remunerar os custos de geração,
transmissão (monopólio natural) e a distribuição, além dos encargos e tributos determinados por lei.
Em cada elo da cadeia do sistema elétrico, o valor da remuneração recebido pela venda de energia
deve cobrir, no mínimo, os custos operacionais (fixos e variáveis) e um lucro que garanta a expansão
do sistema.
120 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
Figura 3-6 – Composição do preço da tarifa de energia elétrica (BRASIL, 2006 versus EUA, 2011)
12
Sugerimos ler o Capítulo 3 de Bajay et al. (2018) para melhor compreensão da estrutura das tarifas de eletricidade
no Brasil.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 121
Pode-se analisar o desempenho relativo das tecnologias de usos finais de gás e eletricidade de
acordo com seus usos, emissões e custos de energia anuais. Veja o exemplo a seguir:
_____________________________
EXEMPLO 3.7 – Compare o uso de energia, as emissões de carbono
e os custos para substituir um aquecedor de água elétrico por um a
gás pela Companhia de Energia de Brakimpur. A energia útil do
consumidor necessária para o aquecimento da água é 3,5 MWh por ano.
O aquecedor de água elétrico tem eficiência de 90% e custa $200,
enquanto o equipamento a gás é 65% eficiente e custa $400. Para
essa CE, a oferta de eletricidade marginal usada durante o ano para
abastecer o aquecedor de água produz 0,18 tCO2 por MWh. A combustão
do gás, por outro lado, produz 14 kgCO2 por GJ ou 0,05 tCO2 por MWh
equivalente. O gás custa $5/GJ ou $18/MWh e a eletricidade custa
$65/MWh.
A vida útil dos dois aquecedores é de 15 anos e a taxa de
desconto é 6%, que dá um FRC (Fator de Recuperação de Capital) de
0,10. Existe benefício econômico em se promover a substituição do
aquecedor elétrico por outro a gás? Existe redução de emissões de
CO2? Considere as seguintes definições:
• E(MWh/ano)=Carga(MWh/ano)/Ef;
• TE(t/ano)=E(MWh/ano)×DEC/DE(t/MWh);
• CA($/ano)=Ccap($)×FRC(ano–1)+E(MWh/ano)×Ccomb($/MWh),
Onde E é o uso de energia anual (MWh/ano); Carga (ou Potência)
é a carga de energia útil anual (MWh/ano); Ef é a eficiência da
tecnologia do uso final; TE é a taxa de emissão anual (t/ano);
DEC/DE é a intensidade de emissão do combustível ou eletricidade
(t/MWh); CA é o custo anual do serviço ($/ano); Ccap é o custo de
capital da tecnologia de uso final ($); FRC é o fator de recuperação
de capital e Ccomb é o custo unitário do combustível ou eletricidade
($/MWh ou $/GJ).
Solução:
Para o aquecedor a gás:
𝐸𝐺á𝑠 = 3,5/0,65 = 5,4 MWh/ano, 𝑇𝐸𝐺á𝑠 = 5,4 × 0,05 = 0,27 tCO2 /ano (3.11)
E:
CAGás = 400 0,10 + 5,4 18 = $137 / ano (3.12)
Apesar da presença de luz solar em todas as áreas da Terra, o uso desse tipo de energia é mais
viável nas regiões de baixa latitude (entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio). Iluminação,
calefação e aquecimento de água são os principais usos finais nos quais há oportunidades para a
utilização de energia solar a custos competitivos com fontes de energia e tecnologias convencionais.
É necessário analisar cada caso particular para determinar os custos e os benefícios da
substituição de eletricidade por energia solar. O aproveitamento da iluminação natural, por meio de
materiais e projetos de construção adequados, é uma maneira de economizar eletricidade. Uma
arquitetura adequada pode, também, aproveitar a luz do sol, proporcionando, dessa forma, ganho
de calor, nos climas frios, para dentro das construções. O uso da energia solar também é uma boa
alternativa para substituir os sistemas de aquecimento de água baseados em eletricidade, como pode
ser visto no exemplo a seguir.
_____________________________
EXEMPLO 3.9 – Calcule a economia considerando um investimento
em substituição de um chuveiro elétrico por um sistema de pré-
aquecimento solar – chuveiro de baixa potência – para a
13
O coeficiente de performance foi criado para comparar as bombas de calor de acordo com a sua eficiência energética.
Um valor maior indica uma maior eficiência. Para aquecimento, COPheating = Thot/(Thot – Tcold); para resfriamento,
COPcooling = Tcold/(Thot – Tcold).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 123
3.4.3. Cogeração
14
Potência e calor combinado (CHP) é o termo mais comum usado na Europa para tecnologia de cogeração.
124 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
Do ponto de vista energético, a grande vantagem da cogeração reside nas altas eficiências
globais de conversão, da ordem de 75-90%, muito superiores àquelas alcançadas por sistemas
independentes de calor e potência. Nesse sentido, a cogeração pode ser entendida como uma
tecnologia energética eficiente e, do ponto de vista do sistema elétrico, como uma opção de geração
descentralizada, nos setores industrial e comercial.
A cogeração é amplamente conhecida e bastante utilizada atualmente. Foi a tecnologia
empregada no princípio da eletrificação industrial, especialmente nas indústrias energointensivas,
como forma de suprir suas necessidades de eletricidade e calor, geralmente na forma de vapor. Até
meados da década de 1970, a cogeração foi perdendo importância junto da maioria das outras fontes
descentralizadas de eletricidade, de maneira mais ou menos acentuada, de acordo com as condições
particulares de cada país.
A cogeração readquiriu importância durante os anos 80, com a desregulamentação do setor
elétrico em alguns países e a adoção de políticas de racionalização do uso de energia de longo prazo.
Hoje é uma prioridade no contexto das políticas energéticas que visam à minimização dos impactos
ambientais.
A cogeração é um processo de conversão de energia que depende de várias condições:
• Das formas de energia disponíveis: a potência mecânica ou elétrica, processos de
aquecimento ou refrigeração por absorção;
• Se a energia elétrica é consumida pela própria unidade que realiza a cogeração ou vendida
para outros consumidores via rede de eletricidade;
• Se o sistema de cogeração é de propriedade de um consumidor de eletricidade, de um
produtor independente ou de uma CE;
• Do porte do sistema (pode variar de uns poucos kW para muitos MW).
O princípio de produção combinada de calor e potência pode ser aplicado em três concepções
distintas. A primeira é associada com o funcionamento das centrais termoelétricas, de maneira que
o calor rejeitado na operação do ciclo termodinâmico é recuperado e usado na forma de um fluxo
de calor, para aquecimento ambiental. Tais plantas de cogeração utilizam e algumas vendem vapor
de baixa pressão para instalações industriais. Nessa concepção, a quantidade de calor produzida é
significativa, atendendo total ou parcialmente às necessidades energéticas das comunidades
próximas à central termoelétrica.
O princípio dos sistemas de cogeração é conhecido como redes de calor ou sistema de calor
distrital (district heating). Uma forma alternativa de sistema de calor distrital pode ser encontrada
em instalações de incineração de lixo. Existem vários sistemas de calor distrital na Europa,
especialmente na Europa Oriental, Alemanha, Áustria e Escandinávia. O padrão da reconstrução no
pós-guerra, as condições climáticas, a ação do Estado no planejamento da infraestrutura e a prática
da descentralização com maior autonomia das comunidades locais são fatores que explicam a
importância dessa forma de cogeração nesses países. As instalações de calor distrital são,
geralmente, desenvolvidas e operadas sob forte influência do poder público.
A segunda possibilidade de implementação da cogeração está nas instalações industriais, nas
quais a potência produzida pode atender parcial ou totalmente às necessidades da própria planta
industrial, sendo possível produzir um excedente de potência para vender à rede da CE local. Os
fluxos de energia térmica são utilizados como calor de processo. A viabilidade técnico-econômica
da cogeração em instalações industriais é melhorada se a demanda de energia térmica for
significativa e constante. Em particular, esse é o caso da indústria química, das refinarias de
petróleo, das indústrias siderúrgicas e metalúrgicas de grande porte, das indústrias de papel e
celulose e de grandes indústrias de produção de alimentos. Nesse aspecto, a cogeração é igualmente
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 125
atrativa em processos de fabricação de produtos que geram resíduos que podem ser utilizados como
combustível. São exemplos as fábricas de celulose que queimam a lixívia negra e as usinas de açúcar
que usam o bagaço. No caso das usinas de açúcar, no Brasil são empregados como combustíveis
tanto o bagaço de cana, que é um produto residual do processo de moagem, como a palha de cana,
que após a imposição de restrições legais de proibição da queima da cana antes da colheita
permanece em campo para ser recolhida e processada como combustível adicional.
A terceira possibilidade é a cogeração no setor comercial. Nesse caso, toda a demanda de
calor e potência pode ser atendida pelo mesmo sistema e tais configurações são chamadas sistemas
integrados de energia ou sistemas de energia total. Das três concepções de cogeração, esta última é
a que foi mais recentemente desenvolvida, tanto da perspectiva do mercado, quanto da tecnologia.
Assim como no caso da cogeração industrial, a quantidade de energia produzida pode ser menor,
igual ou maior do que a demanda local. O calor obtido do sistema é geralmente empregado no
aquecimento de grandes volumes de água destinados para uma diversidade de usos, incluindo
resfriamento por absorção. Sistemas integrados de energia são encontrados em escolas,
universidades, hotéis, hospitais, conjuntos residenciais, centros de lazer, centros de pesquisa,
supermercados, bancos e instalações de tratamento de lixo. As limitações da tecnologia de
cogeração nesse setor estão associadas com suas próprias características, tais como os baixos
requisitos de potência, horas reduzidas de operação e cargas térmicas sazonais. Esses aspectos quase
sempre resultam em uma condição de viabilidade econômica relativamente frágil. A viabilização
econômica da cogeração, no setor comercial, foi ampliada em alguns lugares pela redução dos
custos de investimento por meio de subsídios.
O desenvolvimento da cogeração foi significativo em dois casos e ambos associados a certo
grau de descentralização do sistema energético. O primeiro diz respeito às regiões onde os sistemas
de calor distrital foram historicamente importantes e, por consequência, a tecnologia de cogeração
está naturalmente inserida no planejamento energético local, tais como na Alemanha, Dinamarca e
Finlândia. O segundo caso é o dos países onde a cogeração nunca teve tradição ou deixou de ser
importante entre 1950 e 1980. Problemas de natureza diversa, associados ao planejamento
energético global ou setorial, permitiram, atualmente, o retorno da cogeração, principalmente nos
setores industrial e comercial.
No segundo grupo estão os Estados Unidos, a Itália e o Japão. É interessante notar que a
importância da cogeração varia nos diferentes países entre as três concepções. Por exemplo, na
Alemanha a cogeração é importante na indústria e nos sistemas de calor distrital, enquanto que na
Dinamarca ela é importante apenas com relação ao calor distrital. Nos Estados Unidos, a cogeração
teve uma maior explosão e adquiriu importância durante os anos 80 no setor industrial e em menor
escala no setor comercial. Na Itália, por outro lado, todas as três concepções foram valorizadas,
principalmente na indústria.
Embora seja simples em seus princípios, a cogeração é uma tecnologia complexa dentro de
um processo produtivo ou num sistema energético, em virtude das funções associadas e dos
interesses que podem ser afetados. A difusão efetiva dessa tecnologia depende de vários fatores,
incluindo o político, o econômico, o ambiental, os aspectos estratégicos e os institucionais da
estrutura do setor energético e dos interesses dos atores envolvidos, que são decisivos na definição
de um quadro favorável à cogeração. Da perspectiva do empreendedor, a cogeração é
essencialmente uma oportunidade de investimento que se justifica quando a plena garantia de oferta
da cidade é fundamental à manutenção das atividades ou porque vender os excedentes de
eletricidade produzida para a rede é um bom negócio. A economia da geração depende fortemente
dos preços da eletricidade e dos combustíveis. A cogeração só é economicamente viável quando as
126 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
tarifas de energia elétrica são compatíveis com os custos reais de oferta e quando os preços dos
combustíveis utilizados no sistema de cogeração forem elevados em termos relativos.
O papel das companhias de energia elétrica é decisivo. Excluída a alternativa de possibilidade
de wheeling15, as companhias de energia elétrica têm a particularidade de serem a única opção de
compra de eletricidade produzida pela cogeração e, ao mesmo, a única opção de venda de energia
aos cogeradores, quando seus equipamentos não estão operando. Num ambiente não
adequadamente regulamentado para o desenvolvimento da cogeração, esse tipo de mercado confere
às companhias elétricas um poder especial de inviabilizar o desenvolvimento da cogeração
simplesmente recusando comprar a energia de autoprodutores ou ao estabelecer condições
desfavoráveis quanto ao nível das tarifas, nas condições contratuais ou nos requisitos técnicos.
Pelo menos num primeiro instante, as companhias elétricas tendem a desenvolver a cogeração
como uma alternativa de expansão do sistema ao vislumbrar dificuldades no gerenciamento, perdas
de receita ou perda do controle do seu negócio. Numa perspectiva de longo prazo, no entanto, as
companhias elétricas tendem a acreditar que a cogeração pode contribuir para uma redução nos seus
custos marginais, bem como para um aumento na capacidade de reserva. Acima dos interesses
específicos dos empreendedores e do setor elétrico, a cogeração é uma opção tecnológica que pode
beneficiar a sociedade, dadas suas vantagens potenciais com relação à eficiência de energia e ao
meio ambiente. Os interesses da sociedade deveriam ser defendidos por instituições com poder de
regulamentar as partes envolvidas, se elas procurassem maximizar a viabilidade do potencial
disponível de cogeração.
15
Wheeling é a possibilidade de uma companhia de eletricidade vender energia diretamente para um consumidor mesmo
que ele esteja situado numa área servida por outra companhia.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 127
Os custos desses programas variam muito de acordo com a sua área de abrangência e o uso
de meios eletrônicos de difusão. A eficácia dessas iniciativas é muito debatida, especialmente em
relação à sua duração. Os consumidores tendem a retornar aos seus hábitos anteriores quando a
eficiência de energia perde sua prioridade ou deixa de ser lembrada pelos meios de informação. Os
programas de informação funcionam melhor quando vinculados a outras iniciativas (preços, por
exemplo) e a outros programas tais como descontos e auditorias de energia. De uma maneira geral,
somente aqueles consumidores que são mais inovadores tendem a fazer os investimentos
necessários em eficiência, estimulados inicialmente por programas de informação.
Alguns programas de informação possuem maiores repercussões e produzem efeitos
duradouros. Um exemplo é quando as questões de eficiência de energia são inseridas no currículo
de arquitetos e engenheiros. Quando esses programas de informação são direcionados para pessoal
mais especializado e têm o objetivo de dar informação gerencial técnica, eles também tendem a ser
mais efetivos. Esse é o caso de grandes consumidores industriais e comerciais, pois a maioria deles
tem um departamento de manutenção (e utilidades) dentro de suas organizações, que pode
influenciar na introdução e na permanência de medidas de eficiência de energia, caso essa
preocupação seja considerada uma prioridade.
A etiquetagem geralmente é feita em cooperação com fabricantes de aparelhos e consiste em
submeter seus produtos a um conjunto de testes de desempenho, nos quais a eficiência de energia
do aparelho é avaliada. As etiquetas usualmente são dadas por uma organização independente (uma
agência de governo ou laboratório, companhia de energia ou ONG ambiental), com o objetivo de
informar ao comprador a qualidade e a eficácia do aparelho e o consumo de energia anual estimado
de um tipo particular de equipamento. Algumas etiquetas incluem a escala, que classifica o aparelho
em relação ao mercado. Desse modo, o consumidor pode incluir o desempenho energético como
um critério adicional quando decidir pela compra de um equipamento.
No Brasil, em 1984, o Inmetro16 iniciou discussões para a criação de programas de avaliação
de desempenho visando contribuir para a racionalização do uso da energia no Brasil. Com efeito,
criou-se no Brasil o PBE (Programa Brasileiro de Etiquetagem), coordenado pelo Inmetro em
parceria com o Programa Nacional da Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás
Natural (Conpet) e o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel). Esses são
exemplos de iniciativas governamentais de programas de informação e etiquetagem.
Dependendo do país, um padrão pode ser entendido como código, guia, norma, lei, protocolo,
recomendação, critério ou regra. Padrões podem ser introduzidos para novos equipamentos que
consomem energia, materiais e construções. O principal objetivo desse tipo de iniciativa é criar um
sistema regulador para que novos produtos tenham níveis de consumo menores que aqueles que
estão sendo substituídos. Esses padrões podem ser voluntários durante certo período e depois eles
tendem a se tornar compulsórios. No Quadro 3.2 a seguir estão muitos exemplos de padrões de
energia introduzidos com sucesso em alguns países (Janda and Busch 1994).
Os padrões de desempenho energético são úteis em situações em que a melhoria da eficiência
de energia não pode ser atingida de outra forma. Os padrões de desempenho para edificações são
um bom exemplo, porque os empreiteiros e os construtores, ou os projetistas de construções,
16
Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da
Indústria, Comércio Exterior e Serviços.
128 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
frequentemente não são aqueles que farão uso das instalações e que pagarão as respectivas contas
de eletricidade. Embora as construções tenham uma vida útil longa, os custos de manutenção de
energia são considerados irrelevantes durante as fases de projeto e construção, quando outros itens
têm custos mais altos e, devido a isso, não se investe em instalações que minimizem as necessidades
energéticas de edificações.
A etiquetagem de refrigeradores foi introduzida no Brasil em 1987 pelo Procel (Programa Nacional
de Conservação de Eletricidade). Os resultados apareceram logo depois com uma redução de 10% no
consumo de eletricidade na maioria dos modelos vendidos. Alguns modelos de mais alto consumo mudaram
sua eficiência drasticamente, de forma a se tornarem mais competitivos em relação a outros modelos de
tamanhos similares; outros, inclusive, deixaram de ser produzidos. Mais tarde, outros equipamentos foram
introduzidos no Programa de Etiquetagem do Procel tais como freezers, chuveiros elétricos e aparelhos de
ar condicionado.
Nos EUA, inicialmente foram introduzidos padrões de desempenho energético para equipamentos em
nível estadual pela Califórnia, sendo adotados em nível nacional em 1990 para refrigeradores residenciais,
freezers, aquecedores de água, fornos e aparelhos de ar condicionado. Os padrões de desempenho produziram
bons resultados, por exemplo, reduzindo o uso de eletricidade de novos refrigeradores e freezers em mais de
60%, com baixo custo para os consumidores – menos que $0,03/kWh conservado, incluindo custos
administrativos (McMahon, Chan, and Chaitkin 2001). Não existe evidência de que essas melhorias de
eficiência teriam ocorrido na ausência dos padrões.
Os padrões de desempenho de energia foram estendidos para alguns tipos de lâmpadas, motores,
instalações hidráulicas e equipamentos de ar condicionado. Enquanto isso, muitos estados e municípios dos
Estados Unidos adotaram padrões de energia em construções. A Califórnia possui um código particularmente
sofisticado que combina medidas prescritivas com outras mandatórias baseadas no desempenho energético.
Os códigos de construção (ou Código de Obras) que abordam a eficiência da iluminação e de operação de ar
condicionado são também usados em diversos outros estados, incluindo a Califórnia, e estão sendo
desenvolvidos em nível nacional para aquele país.
A Suécia tem alguns dos mais rigorosos padrões técnicos de construções no mundo e, como resultado,
as casas suecas estão entre as mais confortáveis e eficientes do ponto de vista energético, apesar do clima
severo do país. A Dinamarca também teve a preocupação de reforçar as especificações técnicas de seus
códigos de obras, aproximando-se bastante às da Suécia (Unander et al. 2004; Lichtenberg and Schipper
1977).
Um estudo internacional identificou aproximadamente 30 países que possuem padrões obrigatórios de
eficiência energética em atuação para as construções e outros 15 onde tais padrões são propostos ou
voluntários (Janda and Busch 1994). A maioria desses padrões se encontram nos países industrializados,
embora diversos países em desenvolvimento, particularmente no sudeste da Ásia, tenham pelo menos
padrões propostos ou voluntários. Muitos dos padrões são derivados daqueles desenvolvidos em outros
países, tais como os Estados Unidos e a Alemanha, e adaptados para o clima local e as práticas de construção.
O incremento de padrões é geralmente limitado, especialmente nos países em desenvolvimento, pela falta de
dados de consumo energético e práticas de construção, pela ausência de verificação de regras e
procedimentos de esforços e pela inexistência de teste de desempenho e desenvolvimento de equipamentos.
Outros exemplos de padrões de eficiência energética incluem os padrões da Corporate Average Fuel
Economy (CAFE), que dobrou a eficiência do combustível de veículos em menos de dez anos. A maioria das
melhorias foi atingida por meio da eficiência técnica e de projeto (Union of Concerned Scientists 2017).
Existem dois tipos básicos de padrões de eficiência energética: padrões prescritivos e padrões
de desempenho. Os padrões prescritivos especificam determinadas tecnologias ou configurações de
sistema que devem ser consideradas numa construção. Por exemplo, um padrão prescritivo
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 129
Tabela 3-5 – Códigos de energia de construções: limites para capacidade instalada de iluminação
Os padrões de eficiência de energia podem ser um meio efetivo para retirar do mercado os
produtos que consomem energia de modo exagerado. Entretanto, isso depende, também, da
dinâmica da evolução de uma determinada tecnologia através do tempo.
A Figura 3-8 ilustra o caso de melhoria do consumo de energia em refrigeradores, durante um
período, na Suécia. Caso fossem introduzidos padrões obrigatórios de eficiência por volta do ano
2000 (curva A), os níveis de eficiência, se fossem regulados por padrões, poderiam ser a norma já
em 2002, mas muitos anos antes esse nível de eficiência seria atingido sem nenhuma interferência
(Swisher 1994). Isso porque esses níveis de eficiência são tecnicamente viáveis e seus custos
econômicos não são significativos.
O gráfico mostra a evolução do melhor modelo, da média do estoque de equipamentos e da
média dos novos modelos de equipamentos em comparação com a eficiência esperada com a adoção
de padrões ao longo do tempo (Swisher 1994). A Figura 3-8 mostra que, em 1992, já estava
disponível no mercado um modelo com menor consumo (curva B) que aquele estabelecido na norma
(curva A) até o ano 2005. Isso sugere situações nas quais níveis de eficiência podem ser
tecnicamente viáveis a custos competitivos, uma vez que o modelo eficiente estava sendo
comercializado em 1992 sem a necessidade de normas. A introdução de normas garante que seja
acelerada a redução do consumo médio do estoque de equipamentos se a introdução de padrões for
feita por meio de licitações tecnológicas ou não – curvas C e A, respectivamente (Figura 3-8).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 131
Figura 3-8 – Tendências históricas e padrões de eficiência das geladeiras e dos freezers na Suécia
remove uma grande parte do risco de se introduzir novos modelos de maior eficiência energética nas suas
linhas produtivas.
Esse processo foi realizado com sucesso em 1991 para os modelos combinados de refrigeradores-
freezers, sendo que o consumo de energia do modelo ganhador foi 30% abaixo do melhor modelo disponível
anteriormente e 50% abaixo da média do mercado. Embora o modelo ganhador tenha entrado no mercado
com uma redução promocional de preço de aproximadamente 50%, após um ano essa redução representou
cerca de 10% e uma outra empresa concorrente ofereceu um novo modelo com uso de energia comparável
ao ganhador e um preço próximo dos outros modelos do mercado (Lewald and Bowie 1993).
O processo de aquisição também foi aplicado na Suécia para janelas com alto desempenho energético,
para reatores eletrônicos de alta frequência para lâmpadas, para monitores de computador que desligam
automaticamente e, mais recentemente, para as máquinas de lavar usadas nas residências. As novas janelas
possuem resistência térmica cerca de três vezes maior quando comparadas com as convencionais e esses
produtos melhorados estão agora entrando tanto no mercado da Europa quanto da América do Norte.
O NUTEK conduziu uma aquisição pública tecnológica de sucesso para monitores de computador de
desligamento automático. Na época, existia um grande potencial de melhoria em eficiência energética em
computadores e em outros equipamentos de escritório que podem atingir um custo incremental muito baixo.
Com os monitores de desligamento automático e outros equipamentos de escritório de eficiência energética
esperava-se ganhar uma grande fatia do mercado em gerações seguintes de tecnologia de equipamentos de
escritório (Dandridge et al. 1993), com economias de energia maiores que 50% comparadas aos modelos de
equipamentos sem desligamento automático. Essas economias tomaram lugar rapidamente por causa do
rápido retorno dos equipamentos eletrônicos. As melhorias são levadas a rápidos avanços tecnológicos nessa
área, deixando pouca necessidade de programas adicionais para acelerar ainda mais a penetração de produtos
eficientes no mercado, uma vez que eles tenham sido introduzidos (Stigh 2007).
Um programa norte-americano similar, o Energy Star, conduzido pela Environmental Protection
Agency (EPA), modificou o mercado de computadores, introduzindo quase 100% dos microcomputadores
com dispositivo de controle de consumo a um custo mínimo. Esse programa é voluntário e certifica
computadores e equipamentos periféricos eficientes com a etiqueta Energy Star. É provável que as melhorias
de eficiência que estão sendo conseguidas em escala mundial não teriam acontecido tão cedo sem o
envolvimento da EPA com os fabricantes de computadores.
A EPA iniciou também outro programa, o Green Lights, programa voluntário de eficiência energética
de iluminação. Centenas de grandes empresas comerciais, representando porcentagem significativa de área
construída comercial nacional, se juntaram ao programa e se comprometeram a realizar melhorias nos seus
sistemas de iluminação, cobrindo 90% de sua área construída. A demanda gerada por esse programa teve um
efeito significante em termos de levar a indústria de equipamentos de iluminação em direção a maiores
eficiências energéticas.
O Programa do Refrigerador Super Eficiente, ou Golden Carrot, nos EUA, é uma variação do
programa de aquisição de tecnologia da Suécia. Nesse caso, grandes CEs criaram um incentivo coletivo, que
foi oferecido aos fabricantes como prêmio em uma competição para desenvolver um refrigerador-freezer
livre de CFC e de alta eficiência. O incentivo foi pago pelas CEs por cada unidade de modelo ganhador
vendida nas suas áreas de serviço. O programa também foi estendido para máquinas de lavar roupa e
aparelhos de ar condicionado. O progresso tecnológico estimulado por esse programa tornou possível atingir
o complemento dos padrões de eficiência energética do refrigerador-freezer em 1998, uma mudança que
provavelmente não teria sido possível sem o programa.
O efeito da aquisição tecnológica e das metodologias desse tipo – technology push – é acelerar os
ganhos de eficiência energética pelo aumento da eficiência final do mercado, que serve para acelerar o
potencial de conservar energia mais cedo no tempo e é particularmente efetivo na combinação com padrões
de desempenho energético. Os padrões eliminam os modelos menos eficientes do mercado, mas seus
impactos na conservação de energia são limitados pelas tecnologias disponíveis atualmente porque elas não
podem melhorar a alta eficiência final do mercado. É possível, entretanto, que sem um mecanismo de
134 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
technology push tal como o processo de aquisição de tecnologia, o desenvolvimento de novos produtos
eficientes não ocorra. A introdução de novos modelos de alta eficiência no mercado leva a um aumento da
eficiência média, sem a imposição de padrões de eficiência energética, mas seus impactos totais no mercado
podem ser ampliados pela presença de padrões progressivos que removem produtos menos eficientes
(Swisher 1994).
Os bancos nacionais e as agências de fomento podem ter linhas de crédito especiais para
empréstimos dedicados à compra de produtos de uso eficiente de energia. No caso do Brasil, a Finep
– Financiadora de Estudos e Projetos – e o BNDES possuem linhas de crédito especiais para
financiamentos de projetos de conservação de energia, seja para adquirir máquinas e equipamentos
mais eficientes ou para indústrias que desejem desenvolver lâmpadas mais econômicas etc.
Infelizmente, esse tipo de iniciativa ainda é tímida, devido a uma série de fatores que afastam o
interesse do investidor.
17
Isso acontece principalmente quando a CE é uma companhia estatal.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 135
Esses programas incluem medidas que objetivam evitar o aumento de capacidade de produção
de eletricidade ou fazer melhor uso daquela existente. A meta é modificar o perfil de carga, podendo
o consumo total de energia permanecer constante ou mesmo crescer. Os seis diagramas da Figura
3-9 ilustram as mudanças que podem ser introduzidas deliberadamente nos perfis de carga das CEs.
Por isso, o gerenciamento de carga não significa economizar o combustível usado nas usinas
térmicas (ou água na usinas hidroelétricas) para gerar eletricidade.
É muito importante conhecer a estrutura do perfil de carga da CE para cada classe
consumidora (industrial, comercial, residencial etc.) e as tecnologias de uso final (iluminação, força
motriz, aquecimento de água) para determinar o programa mais apropriado (substituição de
lâmpadas, motores eficientes, aquecimento solar).
O gerenciamento de carga pode também ser feito por meio de mudanças na estrutura tarifária,
controle direto da carga ou pela introdução de tecnologias específicas. Como visto na Seção 3.3, as
136 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
tarifas especiais para horas de pico podem resultar em corte de pico ou deslocamento de carga. O
controle de carga direto pode ser atingido pela instalação de limitadores de demanda nas
acomodações dos consumidores ou por introduzir contrato e medidores de demandas. Os programas
que introduzem tecnologias específicas podem também mudar o padrão de carga de uma CE dentro
do desejável. Esse é o caso da substituição dos aquecedores elétricos de água na demanda por
equipamentos que utilizam a energia elétrica mais barata do período noturno e acumulam o calor
que é dissipado durante o dia. Esse tipo de equipamento foi largamente difundido em diversos países
europeus.
Esse tipo de gerenciamento do lado da demanda leva em consideração os esforços feitos pela
CE para diminuir o consumo unitário de um particular uso final de energia. Essas medidas podem
ser um subconjunto daquelas descritas anteriormente e são essencialmente dirigidas às tecnologias.
Aqui a CE quer reduzir o consumo de energia ou diminuir sua taxa de crescimento e, por isso, esses
programas evitam a expansão da capacidade de produção e economizam combustível (para usinas
térmicas). Existem diversos tipos de programas de companhias elétricas que podem atingir esse
objetivo:
Auditorias e informação
As auditorias de energia nos setores industrial e comercial foram um dos programas mais
usados em diversos países. Elas podem ser executadas como uma atividade de governo ou da CE e
consistem basicamente em visitas e entrevistas com consumidores de energia.
As auditorias são necessárias quando se requer informações detalhadas das tecnologias de uso
final e de como elas são operadas pelos consumidores. Essa informação é, geralmente, usada para
alimentar modelos computacionais que avaliam as oportunidades de economia energética dos
consumidores devido a mudanças na estrutura tarifária, na tecnologia ou no uso do equipamento.
Com maior disseminação das tecnologias de redes e de informação essas tarefas se tornarão mais
sistemáticas.
As auditorias têm um custo relativamente baixo e podem coletar dados relevantes sobre o
comportamento do consumidor, que são úteis para avaliar as campanhas de informação. Sua
implementação exige pessoal qualificado (ou bem treinado) e demanda tempo para execução.
Frequentemente, as auditorias incluem medições e monitoramento das unidades consumidoras e
esses dados quantitativos oferecem maior rigor e precisão para as avaliações que servirão de base
para as ações de GLD.
Incentivos e empréstimos
Os incentivos financeiros vão desde empréstimos com taxas de juros mais baixas e
pagamentos parcelados até subsídios e descontos para a compra de equipamentos mais eficientes.
Os programas que oferecem empréstimos não têm tido tanto sucesso quando comparados com
programas de desconto. Os programas que oferecem descontos para a compra de equipamentos
foram os que tiveram mais sucesso e são recomendados especialmente para os mercados que
apresentam índices de saturação bastante elevados (iluminação e refrigeradores em alguns países).
Embora tenham tido mais sucesso que programas de empréstimos, os programas de desconto ainda
não fornecem para a CE nenhum controle direto sobre o nível de economia de energia ou de
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 137
demanda de pico e esses programas, algumas vezes, possuem altos custos administrativos,
especialmente aqueles direcionados para o setor residencial. Antes de financiar medidas específicas,
deve-se executar, também, uma avaliação detalhada da tecnologia e de como ela será efetivamente
usada pelo consumidor.
Os programas de instalação direta18 são mais caros, mas têm a vantagem de serem mais
simples e oferecerem maior segurança quanto à quantidade de energia conservada, sendo, por isso,
mais garantidos quanto ao retorno econômico para a CE que os programas de incentivos. Esse tipo
de programa é frequentemente implementado por meio de uma Companhia de Serviço Energético
(Energy Services Company – Esco). As Escos operam em alguns países fornecendo ou facilitando
a introdução de medidas de conservação (como instalar novos equipamentos) e recebendo o
pagamento por esse serviço, como o valor da redução verificada na conta de energia do consumidor,
entre outras formas.
Os programas de instalação direta evitam os problemas da falta de informação dos
consumidores e são recomendados para setores tais como residências e escritórios. Tais programas
têm maiores taxas de participação do consumidor que os programas de incentivos.
Uma Esco tem o objetivo de executar atividades de gerenciamento de energia, podendo
funcionar como companhia que comercializa ou arrenda equipamentos de eficiência energética ou
atuando como um órgão de energia, provendo auditorias, negociações tarifárias e serviços de
modernização de instalações elétricas. Muito frequentemente, elas são financiadas por meio das
próprias economias resultantes nas contas de energia de seus clientes.
Existem Escos que pertencem a CEs e que procuram, por meio delas, uma diferenciação de
produtos para suas atividades econômicas, adicionando informação e ajudando o consumidor a
tomar decisões sobre seu suprimento. A Esco tem sido responsável pelo padrão de um mercado de
energia mais competitivo e é um exemplo concreto da possibilidade de melhorar a eficiência do
mercado de energia. Numa situação na qual os ganhos marginais de oferta de eletricidade se tornam
muito pequenos, ocorre a possibilidade de aumentar os lucros por meio de novos serviços de
energia, como já descrito. As Escos também podem ser independentes das companhias elétricas. A
Tabela 3-7 indica as vantagens e as desvantagens de uma Esco para uma CE.
Vantagens Desvantagens
Investimentos suspensos Impacto na oferta de negócios
Estabelecer boa imagem e relações públicas Impacto na distribuição de negócios
Assuntos ambientais e propaganda Pode aumentar os custos de capital e de staff
GLD
companhias elétricas dos EUA, que dão incentivos financeiros para fabricantes de lâmpadas
compactas fluorescentes (ao invés de dá-las aos consumidores). Outro procedimento que também
tem tido sucesso são os protocolos assinados entre CEs, agências de governo e fabricantes que
permitiram uma redução nos padrões de emissão e melhoraram a eficiência de energia em muitos
aparelhos e automóveis.
Avaliação do processo
Avaliação de impacto
O progresso técnico e a adoção de tecnologias eficientes pelo mercado consumidor leva a economias
significativas de energia mesmo sem programas GLD. Isso significa que existem consumidores que podem
se beneficiar de programas de incentivos financiados pela companhia elétrica, mas muitos teriam investido
em medidas de eficiência mesmo sem os incentivos, os chamados free riders. Embora os free riders não
imponham custos adicionais à sociedade (exceto custos administrativos), para a companhia elétrica isso
significa que está pagando desnecessariamente tanto os incentivos quanto o custo administrativo do
programa para a sua participação. Avaliações dos programas GLD da América do Norte relatam frações de
free riders de menos de 10% a mais de 50%, dependendo do tipo de programa, e a experiência tem mostrado
que os programas podem ser projetados para evitar um excesso de free riders (Nadel 1990). Quando a
companhia tenta captar as medidas de eficiência de menor custo, que geralmente incluem introdução ou
substituição de novos equipamentos, tende a haver uma alta fração de free riders, o que aumenta
desnecessariamente o custo da companhia elétrica.
Somando-se aos free riders, custos de transações significantes existem para muitas opções de
eficiência energética. Algumas vezes é possível identificar que esses custos são altos e a razão principal pela
qual as tecnologias mais eficientes ainda não são mais adotadas pelos mercados. Em alguns estudos de
potencial técnico, os custos de transação foram implicitamente assumidos como zero. De fato, tais custos e
limitações existem e podem ser medidos e explicitamente incluídos nas análises bottom-up. Entretanto, os
custos de implementação e os limites de penetração variam largamente com a tecnologia e o tipo de programa
aplicado. Os custos de transação podem ser estimados tanto em termos do custo da procura dos
consumidores, do tempo e dos problemas acarretados com a aquisição de produtos mais eficientes e são mais
difíceis de se estimar que os custos administrativos dos programas de eficiência energética. Por exemplo, o
programa para a compra dos refrigeradores/freezers eficientes promovido pelo governo sueco reduziu o uso
de energia nos novos modelos em 30% com um custo de transação estimado de $0,001/kWh. Para os
programas GLD das companhias elétricas dos EUA, os custos administrativos somam em média de 10 a 30%
dos custos diretos com a tecnologia. Esses custos tendem a diminuir com o aumento das taxas de
participação, que reduzem a importância dos custos fixos do programa.
Os custos de transação do consumidor para adquirir produtos eficientes são mais difíceis de estimar
(em torno de 15 a 30% dos custos do equipamento da tecnologia). Isso é significante, mas certamente não
explica o gap mostrado de retorno do pagamento do consumidor devido às taxas de desconto muito altas.
Esse gap deve ser explicado por outras barreiras descritas anteriormente. Supondo que a maioria das medidas
de eficiência energética incluem custos de transação tanto do consumidor como do programa, ou talvez uma
combinação de ambos, elas parecem estar numa estimativa conservadora com um custo adicional de cerca
de 30% do custo da tecnologia, embora muitos programas possam ser implementados com menor custo
administrativo e com pequeno esforço do consumidor. Enquanto os custos de transação são um custo real
que deve ser incluído num planejamento GLD, eles não podem explicar as barreiras para o investimento de
eficiência energética, nem fazê-los indicar que tais barreiras representam custos irredutíveis.
Outros fatores podem, também, induzir o consumidor a conservar energia independentemente de um
programa, por exemplo, como o de mudanças nos preços da energia, mudanças na renda ou na atividade
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 141
econômica. Ao avaliar os resultados do programa deve-se separar essas economias atribuídas aos programas
dos outros fatores.
Os custos dos programas GLD variam amplamente e são maiores que o simples custo direto da
tecnologia, como já discutido. A maioria dos programas relatam custos de energia conservada de $0,02/kWh
ou menos (Nadel 1990; Nadel, Elliott, and Langer 2015). Geralmente, os programas com altas taxas de free
riders envolvem medidas que são menos atraentes e possuem baixo custo de tecnologia. Alguns críticos
apontam a incerteza desses custos e argumentam que os programas GLD são muito mais caros que os
divulgados pelas companhias elétricas (Joskow and Marron 1992). Entretanto, eles ignoram as incertezas
que poderiam reduzir tais custos, tais como os free riders (Bronfman et al. 1991).
Custos diretos
Custos indiretos
Há diversos programas de GLD que podem ser conduzidos pelas CEs em parceria com o
governo e empresas. Esses programas envolvem, de modo geral, informações para agentes
diferentes, financiamento direto para equipamentos, instalação de equipamentos, financiamento
indireto de instalações, desenvolvimento e implementação de leis mandatórias etc. As
possibilidades de elaboração de estratégias são, na prática, ilimitadas. A lista a seguir é um exemplo
de uma estratégia de implementação de eficiência de energia contemplando dez programas GLD:
1. Um programa de assistência a projetos para novas construções comerciais, no qual um
centro ou uma associação daria assistência técnica para arquitetos e engenheiros projetando
novas construções (Projeto);
2. Uma lei energética mandatória para novas construções comerciais (Código de Obras);
144 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
19
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 145
b) Questões
(Reddy 1991) (H. S. Geller 1994) (Scientific American 1990) (Howarth and Andersson 1993)
(Orlando 1991) (Brun 1989) (Horlock 1987) (Hu 1985) (Marecki 1988) (Ohta 1994) (Payne
1991) (Ahmed 1994) (Levine et al. 1994) (GOV.UK 2018) (Green Deal Initiative 2017)
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 147
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148 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída
CAPÍTULO 4
4.1. INTRODUÇÃO
1
Fator de capacidade e fator de carga – ver itens 4.4.3 e 4.4.4, respectivamente.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 151
medida que mais informações de crescimento e recursos se tornem possíveis. Além dos recursos
convencionais das fontes de potência térmica e hidráulica, o processo PIR descrito neste capítulo
pode incluir opções tais como GLD (Gestão do Lado da Demanda), cogeração de calor e potência
e fontes renováveis e intermitentes (solar, eólica, biomassas etc.). A comparação preliminar entre
essas opções é geralmente feita com base no custo marginal da energia de longo prazo, embora
outras medidas sejam também utilizadas.
Enquanto o custo marginal de longo prazo for o critério importante no planejamento de novos
recursos, a escolha de cada recurso existente que irá operar em um dado tempo dependerá do custo
marginal de curto prazo, que depende de custos de combustível, operação, manutenção etc. A
estratégia tradicional do despacho econômico classifica as fontes pelo custo variável para
determinar a ordem de despacho. A fonte mais cara operando num dado momento é chamada de
fonte marginal e ela varia conforme a carga do sistema. Outra maneira de ordenar é o despacho
ambiental, que considera as emissões das fontes existentes e ordena de acordo com uma combinação
de custos e taxas de emissão de poluentes. No PIR, os impactos ambientais podem ser utilizados
para classificar as novas fontes de recursos energéticos de acordo com o custo da emissão evitada
ou adicionando impostos, de acordo com o grau de poluentes da fonte, aos custos de produção de
eletricidade.
Sujeita a:
E + D = ES (4.2)
Onde C(D) é o custo dos programas GLD; CCEP(E,R,D) é o custo de controle de emissões de
poluentes (depende da energia ofertada E, da quantidade de redução de emissão de poluentes R e
dos programas de GLD); CR(R) é o custo das reduções de emissão de poluentes; D é a quantia de
eletricidade conservada por meio de GLD e outras medidas; e ES é o nível desejado de serviços de
energia.
A restrição nesse problema de minimização de custo – Eq. (4.2) – é que a mesma quantidade
total de serviços de energia deve ser atingida produzindo energia elétrica ou economizando-a via
GLD ou outros programas de eficiência. Esse critério não significa que os serviços de energia sejam
constantes no tempo; de fato, pode-se esperar que eles cresçam. Isso não significa que o cenário de
referência é uma tendência fixa que é conhecida com certeza. Uma visão mais realista do cenário
152 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
de referência é que este pode ser composto por diferentes cenários bases, por exemplo, refletindo
diferentes taxas de crescimento socioeconômico futuro. O critério do PIR requer simplesmente que,
para cada um dos cenários de referência de crescimento dos serviços de energia, o nível de serviço
de energia seja definido. A demanda por serviço de energia deve ser satisfeita, conforme visto no
Capítulo 2, segundo os vários cenários energéticos propostos.
Usando esse critério, pode-se descrever e avaliar as alternativas do lado da demanda e do lado
da oferta de eletricidade por meio de cenários energéticos. Tendo já analisado as opções GLD e de
eficiência de energia nos Capítulos 2 e 3, a próxima questão é avaliar os custos das opções do lado
da oferta, incluindo fontes não convencionais. Pode-se, então, estimar os impactos ambientais das
diferentes opções e, se possível, seus efeitos nos custos de oferta. Finalmente, classificam-se as
opções de acordo com o custo e constroem-se os cenários integrados de recursos. Esses cenários
combinam opções do lado da oferta e da demanda, junto da implementação de programas e planos
de operação para atingir um plano integrado de custo mínimo ou um conjunto de planos, baseados
na análise de sensibilidade de hipóteses fundamentais.
2
Mais recentemente tem-se utilizado a expressão “recursos energéticos distribuídos - REDs”. Estão incluídos
nos REDs não só as iniciativas em eficiência energética e GLD, como também a geração distribuída, o
armazenamento de energia e a integração com o transporte elétrico. Para uma análise mais completa sobre
os efeitos desses fatores nas receitas das concessionárias que produzem e distribuem eletricidade de modo
centralizado, são apresentadas algumas sugestões de leituras ao final deste capítulo.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 153
n
R (t )
VP ( R ) = R0 + (4.3)
t =1 (1 + r )
t
Onde I(t) é o investimento de capital no ano t; Ex(t) são os gastos operacionais totais no ano
t; e T(t) são as taxas no ano t. Os investimentos de capital3 incluem os custos de capital dos
equipamentos de geração (Cg), transmissão (Ct) e distribuição (Cd). Logo:
I (t ) = C g (t ) + Ct (t ) + Cd (t ) (4.5)
Onde Ccomb(t) são os gastos de combustível no ano t; Cvar(t) são os custos de manutenção e
operação variáveis no ano t; Cfixo(t) são os custos de manutenção e operação fixos no ano t. Neste
capítulo, por questão de simplificação, os valores do capital investido I(t) já incluem os efeitos das
taxas T(t). Portanto, a Eq. (4.3) pode ser reescrita como:
n I (t ) + Ccomb (t ) + C var (t ) + C fixo (t )
VP( R ) = R0 + (4.7)
t =1 (1 + r ) t
_____________________________
EXEMPLO 4.1 – Um plano de expansão para o período 2015-2025 em
uma PCH inclui investimentos em aumento de capacidade instalada de
$7 milhões em 2017, $2 milhões em 2019 e $1 milhão em 2020. O custo
anual de operação durante o período é constante e de R$1 milhão.
Qual é o valor presente dos rendimentos requeridos para o plano?
Use uma taxa de desconto anual de 6% ao ano e suponha R0=0.
Solução
Inicialmente somam-se as componentes dos custos para encontrar
o rendimento anual requerido. Depois toma-se o valor presente (6%
ao ano) de cada valor anual. A soma da série dos valores presentes
anuais é o valor presente dos rendimentos requeridos (ver
resultados na Tabela 4-1).
3
É comum adotar o termo CAPEX (Capital Expenditure) para as despesas ou o investimento em bens de capital de
uma empresa.
4
É comum adotar o termo OPEX (Operational Expenditure) para os custos de operação e manutenção dos ativos físicos
de uma empresa.
154 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Uma análise de minimização de custo, segundo as Equações (1.7) e (4.2), mostra que a
combinação a custo mínimo de diferentes recursos é aquela em que o custo marginal de cada recurso
é o mesmo. À medida que a oferta total aumenta, o custo marginal também aumenta e indica o
quanto de cada recurso deveria ser incluído no conjunto de custo mínimo. Na prática, uma vez que
a hipótese de expansão ótima e contínua raramente é atingida e onde os recursos de GLD e oferta
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 155
de energia estão disponíveis em quantidades finitas, a combinação de custo mínimo pode ser obtida
pela classificação dos recursos disponíveis segundo seus custos marginais e pela seleção daqueles
com os custos marginais menores. Esse processo continua até que a oferta total satisfaça a demanda
projetada.
De modo geral, o custo marginal de expansão (longo prazo) é reportado pelo seu valor
presente5 e expresso em $/kW, ao passo que o custo marginal de operação (curto prazo) é reportado
anualmente e expresso em $/kWh. Assim, o custo marginal6 é calculado com a seguinte expressão:
CMO kWh
CM = CME kW + (4.8)
FRC
Onde kW é o acréscimo na capacidade de produção; kWh é o incremento de produção de
energia; e FRC é o fator de recuperação de capital:
r (1 + r ) n
FRC = (4.9)
(1 + r ) n − 1
Na prática, cada um dos termos da Eq. (4.10) é avaliado para cada hora do ano e os resultados
são somados para estimar o custo marginal de operação. Os custos marginais de operação horários,
5
O CME, em alguns fluxos de caixa, pode ser reportado anualmente.
6
Na Eq. (4.8), o termo CM (Custo Marginal) está expresso em $. Esse valor pode ser normalizado e reportado em $/kW
ou $/kWh – ver mais adiante.
7
Note que os custos de capital e fixos de operação são parte do custo marginal de expansão de uma oferta que ainda
não foi construída. De certo modo, esse é um custo variável com relação aos níveis futuros de oferta. Uma vez que a
capacidade é construída, esses custos fixos estão embutidos e não são a maior parte dos custos marginais da companhia
elétrica. Note, ainda, que os custos fixos são anualizados e, para somar ao custo de investimento (em valor presente),
seus valores devem ser reportados também para o valor presente.
156 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
CMO(h), dependem das fontes de oferta utilizadas num dado tempo. Esses valores podem ser
derivados diretamente dos modelos de custo da produção e podem ser ajustados para contabilizar
as perdas de transmissão e distribuição:
1 8760 Cenergia (h)
CMO(h) =
8760 h =1 kWh
(4.11)
Onde:
'
Cenergia (h) = Ccomb (h) + Cvar
'
(h) E ger (h) (4.12)
CMO(h) =
'
1 8760 Ccomb
(h) + C var
'
( h) L ( h) (4.13)
8760 h =1 kWh[1 − Fpe (h)]
Onde:
E p ( h) E ger (h) − L(h) L ( h)
Fpe (h) = = = 1− (4.14)
E ger (h) E ger (h) E ger (h)
Em que Fpe(h) é a fração de perda de energia horária; L(h) é a carga total horária vendida;
Ep(h) são as perdas de transmissão e distribuição (T&D) horárias.
Os termos de custo na Eq. (4.10) são geralmente definidos por modelos de custo de produção
que determinam a capacidade requerida do sistema e minimizam os custos operacionais variáveis
(incluindo combustível) por um programa de despacho otimizado das várias fontes de geração,
sujeito a um determinado critério de confiabilidade.
Um modo usual para estabelecer limites de confiabilidade é a probabilidade de perda de carga 8
máxima anual (PPC), que pode derivar de modelos de custo da produção. Um critério mais simples
para a segurança da oferta é meramente o excesso da capacidade de oferta ou margem de reserva,
que pode ser estimada sem uma análise complexa envolvendo modelos de custo da produção. Uma
maneira usual de determinar a confiabilidade do sistema de distribuição é usar dois critérios de
segurança contingente (Crane and Roy 1992). O critério normal é que as cargas planejadas podem
ser atingidas sem sobrecarregar nenhum equipamento no sistema e o critério de emergência é que a
falha de qualquer equipamento pode ser compensada por outros equipamentos sem exceder suas
capacidades de emergência por um tempo limitado.
Uma forma de avaliar o Custo Marginal de Expansão9 (CME) de um sistema elétrico é por
meio da média dos custos de expansão das diversas alternativas ponderados pela previsão de
expansão, conforme a Eq. (4.15) a seguir:
8
PPC (Probabilidade de Perda de Carga ou LOLP – Loss Of Load Probability). Existem outros índices que medem a
confiabilidade dos sistemas de fornecimento de energia: LOLF (Loss of Load Frequency ou Frequência de Perda de
Carga), LOLD (Loss of Load Duration ou Duração Média de Perda de Carga), EPNS (Expected Power Not Suplied ou
Valor Esperado da Potência Não Suprida) e EENS (Expected Energy Not Suplied ou Valor Esperado da Energia Não
Suprida).
9
Essa equação é aceita nas metodologias do MME (Ministério de Minas e Energia – Brasil).
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 157
n
kWi CME i
CME sistema = i =1
n (4.15)
kWi
i =1
Onde kWi é a expansão de capacidade prevista para a alternativa i (fonte i); CMEi é o custo
marginal de expansão da fonte i; e n é o número de fontes alternativas.
_____________________________
EXEMPLO 4.2 – Calcule o Custo Marginal de Operação (CMO) para
uma usina a carvão com os dados da Tabela 4-2.
Solução
Para o caso do carvão, o custo marginal do combustível e o
custo marginal variável são, respectivamente:
10 1
'
Ccomb = = 0,01$ / kWh (4.16)
1000
E:
'
Cvar = 0,02$ / kWh CMO = 0,01 + 0,02 = 0,03$ / kWh (4.17)
_____________________________
EXEMPLO 4.3 – Calcular os valores do CMO para as outras fontes
do EXEMPLO 4.2 e o CMOex-ante sistema elétrico. Admitir que as usinas
que operam na ponta funcionam 1.200 horas/ano; as usinas
intermediárias operam, ainda, 3.000 horas/ano adicionais; as usinas
que operam na base funcionam 8.760 horas/ano e as intermitentes
operam 800 horas durante cada um dos três períodos de despacho.
Admitir que para o cálculo do CMO do sistema elétrico serão
desconsideradas as restrições de transmissão, o custo de déficit e
que todas as fontes são necessárias para atender à demanda. Lembre-
se de que a fonte marginal durante um período de despacho é aquela
cujo custo de energia é maior.
_____________________________
EXEMPLO 4.4 – Calcular o CME total e seu valor anualizado para
uma usina eólica de geração de eletricidade a partir dos dados da
158 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Solução
A usina eólica, assim como as demais, tem a construção encerrada
no final do ano 5 e inicia-se a operação no início do ano 6.
Calculam-se os valores do CME como valores presentes no ano 5. Para
a usina eólica, o tempo de construção é de dois anos, assim, a
metade do investimento ($35 milhões) incorre durante um ano antes
da operação (ano 4) e a outra metade no ano 5. O valor presente no
ano 0 é 35/(1,06)4 + 35/(1,06)5 = $53,88 milhões. Note que, por causa
do tempo de construção, o custo total no ano das usinas entrarem
em operação é mais alto que o custo do capital inicial. O FRC para
um tempo de amortização de 20 anos é:
0,06 (1,06 ) 20
FRC = = 0,087 (4.18)
(1,06 ) 20 − 1
O valor presente do custo fixo é o custo fixo anual dividido
pelo FRC, ou seja, 1,2/0,087 = $13,76 milhões. Esse valor presente
está temporalmente no final do ano 5, pois a usina começa a operação
no início do ano 6. O CME total é obtido transportando o custo fixo
anual para o ano 0 e somando com o valor presente do investimento
– portanto, 10,29 + 53,88 = 64,16 milhões – e, então, dividindo-o
pela capacidade da usina, ou seja, 1,28 $/MW. Para obter o valor
do CME anualizado, a partir do ano 0 (lembre-se que a usina entra
em operação no ano 6), multiplica-se pela FRC, ou seja, CME =
1283,25 × 0,087 = 111,87 $/kW por ano.
_____________________________
EXEMPLO 4.5 – Calcular o CME e seu valor anualizado para as
outras fontes da Tabela 4-3 e o CME do sistema elétrico (consultar
solução nas planilhas disponíveis no endereço da internet10).
_____________________________
10
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 159
O Custo Marginal de Expansão (CME) depende do valor dos novos investimentos necessários
em geração e transmissão da expansão da capacidade. O roteiro dos investimentos planejados pode
ser tomado do plano de expansão da companhia elétrica, que dá a programação e a combinação de
usinas para produzir eletricidade, incluindo reservas marginais. As chamadas usinas de base são
necessárias para atingir a carga mínima constante, enquanto as usinas de carga de pico necessitam
trabalhar somente durante umas poucas horas de demanda de pico e as usinas de carga intermediária
durante muitas, mas não todas, as horas do ano. Somando-se a isso, o plano de expansão de
distribuição inclui investimentos em linhas de transmissão, torres, postes, condutores, subestações
etc.
Um plano de expansão da oferta é desenvolvido adotando-se os seguintes passos11:
• Subtrair da capacidade de oferta atual a demanda atual mais possíveis reformas planejadas
para aumento da capacidade de oferta para determinar o excesso de capacidade por meio
da margem de reserva requerida;
• Dividir o excesso de capacidade pelo crescimento de carga anual projetado para determinar
o tempo no qual a capacidade atual será superada;
• Identificar os recursos de oferta disponíveis para atingir as necessidades futuras; e
• Preparar um plano de capacidade de expansão a custo mínimo para satisfazer o crescimento
de carga projetado usando os recursos disponíveis sob critérios reais de engenharia
aceitáveis.
O plano desses investimentos fornece os dados a partir dos quais os custos marginais podem
ser estimados. Estimativas do CME requerem um método de custo que capte a natureza dos
investimentos de capacidade de oferta. Usinas para carga de base são geralmente da ordem de
diversas centenas de MW, enquanto as outras para carga de pico são dimensionadas em dezenas de
MW. O mesmo acontece com equipamentos de distribuição. Os transformadores, por exemplo, têm
tipicamente 10, 25, 37½, 100, 176, 250, 333 ou 500 kVA de capacidade. Ou seja, a expansão se
realiza a taxas incrementais discretas.
Por causa dos investimentos na capacidade de oferta serem em montantes discretos, fica difícil
identificar um incremento da capacidade como uma unidade marginal, porque é improvável que tal
unidade terá o mesmo tamanho e plano de operação que a variação marginal de carga que está sendo
considerada. Em vez disso, é mais esperado que a mudança na carga requererá o atraso ou a
aceleração de um investimento particular ou um conjunto de investimentos.
O método apropriado para as avaliações de custo de expansão é a metodologia do valor
presente, que determina o valor de um plano de expansão por um dado período de tempo. A
necessidade de uma expansão eminente tende a aumentar os custos marginais de expansão, uma vez
que o valor presente descontado dos custos seria menor se eles ocorressem em um período mais
longo. Assim, os CMEs dependem do horizonte de tempo considerado e do custo marginal de
expansão, devido a um incremento discreto de capacidade. O CME pode ser calculado de forma
relativa, ou seja:
n [ I A (t ) + C fixoA (t )] − [ I B (t ) + C fixoB (t )]
CME = (4.19)
t =0 kWA / B (1 + r ) t
Onde IA(t), IB(t) são os investimentos no ano t em capacidade de oferta no caso A e B e CfixoA(t)
e CfixoB(t) são os custos fixos de operação e manutenção no ano t para os casos A e B,
respectivamente; kWA/B é o incremento marginal na capacidade para o caso A relativo a B e r é a
taxa de desconto.
11
Neste capítulo estamos supondo que o plano de expansão de oferta central a custo mínimo da companhia elétrica é
dado e o processo PIR envolve somar alternativas do lado da demanda com outras para o plano existente.
160 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Onde f é a taxa líquida de inflação de uma tecnologia específica do progresso técnico; s são
os anos de dilatamento (kW/crescimento de carga anual); kW é a capacidade de geração da
unidade marginal e r é a taxa de desconto. Por causa da natureza dos investimentos em capacidade
de oferta, o plano de expansão deve possibilitar a agregação de novos recursos antes que sua
capacidade total seja realmente necessária.
O planejador pode ter que escolher, por exemplo, entre uma grande usina que causará excesso
de capacidade durante diversos anos ou, então, diversas usinas pequenas que entrarão em operação
sucessivamente de acordo com as necessidades. Além disso, o espaço de tempo requerido para
construir novas usinas significa que os investimentos devem ser feitos antecipadamente e só serão
remunerados à medida que entrem em operação e a energia possa ser vendida. O valor do CME
tende a aumentar quando as novas capacidades são construídas e, então, caem após sua conclusão
quando os custos são amortizados (ver Figura 4-2).
Figura 4-2 – Expansão da oferta para atingir o crescimento da demanda de pico – EXEMPLO 4.4
Essa variação no tempo surge porque a metodologia do valor presente ignora os investimentos
passados e atribui um alto valor para os investimentos necessários para prevenir um "déficit" futuro
de capacidade. Uma vez que o investimento é realizado e seu custo é amortizado, o excesso de
capacidade resultante empurra os investimentos futuros para mais longe do horizonte de tempo do
planejamento e o método do valor presente dá um custo marginal de expansão tendendo a zero.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 161
Os custos, CME e CMO, podem ser alocados para cada hora do ano de acordo com a
contribuição horária na Probabilidade de Perda de Carga (PPC) anual (Vardi, Zahavi, and Avi-
Itzhak 1977).
P ( h) P ( h)
Ccap (h) = CME kW, Cenergia (h) = CMO kWh (4.21)
PPC FRC PPC
Onde P(h) é a contribuição da hora h para o PPC anual; PPC é a probabilidade de perda de
carga (ou LOLP); Ccap(h) é o custo de expansão alocado para a hora h e Cenergia(h) é o custo de
produção alocado para a hora h (ou custo da energia na hora h). Note que o valor de custo incorrido
em uma hora considera a contribuição desse tempo no PPC, que por definição é a razão entre a
energia solicitada pelo usuário não suprida pelo sistema e a energia total demandada. Normalmente,
a medição considera um tempo longo (10 anos) e representa, em síntese, a probabilidade do usuário
permanecer sem energia elétrica. A determinação desses índices é realizada por meio de modelos
estocásticos do tipo Markoviano. Essa é uma proposição de normalização de custo útil para
comparar medidas alternativas que depositam no índice de confiabilidade do sistema elétrico sua
principal motivação.
As equações em (4.21) podem ser usadas para obter o valor do custo horário evitado, ou seja:
C cap ( h) C energia ( h)
CM( h) = + (4.22)
kW L ( h)
Onde L(h) é a energia suprida (kWh) durante a hora h. Note que o termo Cenergia(h) na Eq.
(4.21) difere do valor calculado na Eq. (4.12).
O custo marginal de energia expresso em $, conforme definido na Eq. (4.8), pode também ser
normalizado para dar estimativas do custo marginal por capacidade ofertada ou por unidade de
energia produzida. Dessa forma, definem-se as seguintes relações:
CM CM FRC
CM kW = ; CM kWh = (4.23)
kW kWh
Onde CMkW é o custo marginal de energia por unidade de capacidade ofertada e CM kWh é o
custo marginal de energia por unidade de energia produzida. Esses valores são úteis também para
comparar medidas alternativas como os programas de GLD e de eficiência de energia. Em tal
comparação, por exemplo, o CMkW é tratado como o custo marginal que é evitado pela substituição
de melhorias de eficiência de energia e outras medidas em lugar dos recursos de oferta incrementais
no plano de expansão existente.
A extensão pela qual a usina de geração é operada durante o ano é medida pelo seu fator de
capacidade (Fcap) que é a relação de sua produção média pela sua produção de pico ou sua produção
total pela sua produção potencial, se operada constantemente a plena capacidade:
Eletricidade produzida (kWh/ano)
𝐹𝑐𝑎𝑝 = (4.24)
Capacidade de pico (kW) × (8760h/ano)
O fator de capacidade pode ser usado nas Equações em (4.23), resultando após substituição
do termo CM definido na Eq. (4.8) em:
162 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Solução
A usina geotérmica produzirá 8760 × 20 × 0,80 = 140,2 GWh/ano
e a turbina a combustão produzirá 8760 × 50 × 0,30 = 131,4 GWh/ano.
_____________________________
EXEMPLO 4.7 – Calcule o CMkW (anualizado) e o CMkWh de cada usina
com os custos e os fatores de capacidade mostrados na Tabela 4-4.
Use a Eq. (4.15) para calcular o CME anualizado do sistema de
expansão (usinas novas) e a variação do CMkWh considerando a
expansão. Considere os dados de vida útil dos empreendimentos
conforme a Tabela 4-3 (do EXEMPLO 4.4) e a taxa de 6% a.a.
Solução
O CME anualizado do sistema de expansão, conforme dados da
Tabela 4-4 e da Eq. (4.15), é de $147,83/kW. O CMkWh do sistema
considerando apenas as usinas existentes é de $0,131/kWh, passando
para $0,310/kWh com a expansão do sistema. Consulte a solução
completa nas planilhas disponíveis no endereço da internet12.
_____________________________
A Figura 4-3 a seguir traz os custos marginais de energia por unidade de capacidade ofertada
e por unidade de energia produzida segundo os fatores de capacidade das usinas indicadas na Tabela
12
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 163
4-4. Note que os valores de CMkW aumentam com o fator de capacidade Fcap – ver Eq. (4.25).
Naturalmente, o CMkWh decresce com o aumento do fator de capacidade, uma vez que os custos
fixos e de capital são distribuídos por mais kWh de produção de energia (ver exemplos na Figura
4-3). O fator de capacidade não é inerente ao projeto de uma usina, ele depende de como a usina é
usada de acordo com o seu lugar no plano de expansão e a classificação de ordem de despacho. Para
avaliar os recursos de oferta, por exemplo, o valor do CMkW deve ser aplicado somente a um
incremento específico de um determinado plano de expansão e comparado com o CME, valor este
que independe das horas de operação ou do fator de capacidade.
O conjunto de recursos da Tabela 4-4 e Figura 4-3 será usado nos exemplos de análise do PIR
mais adiante.
A razão entre a demanda média anual e a demanda máxima do período de pico é chamada de
fator de carga, que é uma medição da variabilidade da carga de uma companhia de eletricidade, ou
seja:
Eletricidade consumida (kWh/ano)
𝐹𝐶 = (4.26)
Demanda de pico (kW) × (8760h/ano)
Uma CE com demanda constante possui um fator de carga igual a 1, enquanto outra CE que
apresenta um pico de demanda bastante acentuado tem um fator de carga baixo (menor que 1).
Graficamente, o fator de carga é a relação entre a demanda média (área da curva de carga) e a
demanda máxima em um intervalo de tempo t (normalmente um ano):
n
FC =
D
=
1 1 D(t )dt (4.27)
Dmáx Dmax t
Onde n é o número de intervalos da curva de carga e a integral da Eq. (4.27) é a área de todos
os intervalos da curva de carga indicada para um período t (ver Figura 4-4).
164 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
_____________________________
EXEMPLO 4.8 – Qual é o fator de carga para um uso final que tem
um perfil diário conforme a Tabela 4-5 indicada a seguir durante
um ano? Qual é a energia total utilizada no ano?
Solução:
O consumo total anual é 365×[(6×1)+(6×3)+...+(4×2,5)]=25,185
GWh e o fator de carga é:
25185
FC = = 0,575 (4.28)
5 8760
_____________________________
EXEMPLO 4.9 – Qual é o fator de carga para a demanda de
eletricidade descrita pela curva de duração de carga da Figura 4-5
(lado esquerdo)? Qual é o consumo anual de energia?
_____________________________
O fator de carga pode ser calculado para todo o sistema elétrico, para classes específicas de
consumidores ou por uso final e este valor depende do período de tempo considerado. Isto é, análogo
ao fator de capacidade, que depende do tempo e do nível de produção que o sistema de fornecimento
opera como um todo.
_____________________________
EXEMPLO 4.10 – As tarifas de eletricidade são instrumentos
importantes na mudança do perfil dos consumidores de modo a
economizar energia e capacidade de pico. Considere o caso de uma
fábrica têxtil que possa escolher entre diferentes esquemas de
tarifas. Estime o custo de produção unitário considerando somente
custos de mão de obra e energia. Faça as estimativas usando os três
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 165
A - Esquema
B – Esquema de tarifa de
de tarifa C – Esquema horo-sazonal
bloco
simples
$/MWh Consumo (kWh/mês) $/MWh Período $/MWh
0 – 1.000 650 D 08:00 – 12:00 600 D e C
C 12:00 – 18:00 D e C
920
1.000 – 1.500 750 (ponta) 1.000
sobre 1.500 1.000 demais horários 600 D e C
Que tarifa elétrica você sugere que essa fábrica deveria ter
para baixar seu custo de energia? Isso baixa seu custo total de
produção? Refaça o cálculo do custo de produção unitário
considerando um preço médio de energia em função do fator de carga
e outras variáveis conforme as relações a seguir:
Tarifa de demanda
Tarifa em bloco = Pm = + Tarifa de consumo (4.29)
FC p (8760 / 720)
E:
166 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
D p TD p TD fp h
+ TC p FC p + + TC fp FC fp fp
D fp h p hp hp
Tarifa hora - sazonal = Pm = (4.30)
Dp h
FC p + FC fp fp
D fp hp
A Figura 4-5 a seguir ilustra a curva de duração de carga e os parâmetros dos custos marginais
(CMkW anualizado e CMkWh) dos diferentes tipos de fontes de oferta do EXEMPLO 4.7. Algumas
usinas, tais como as com turbinas a combustão, têm baixos custos de capital e altos custos variáveis
operacionais e de combustível e são indicadas para carga de pico. Outras usinas, tais como
hidroelétricas e centrais a carvão, têm custos de operação variáveis e de combustível mais baixos e
podem ser usadas para fornecer a carga de base. As existentes, excetuando a usina a carvão
recondicionada, têm custos menores porque seus custos de capital já estão amortizados. Nesses
casos, somente os custos de operação (variáveis e fixos) ou os custos incrementais de medidas de
readaptação, como no caso da usina a carvão recondicionada, são contabilizados.
A elaboração de um plano de oferta de custo mínimo depende do fator de capacidade
necessário para atingir a demanda incremental da nova capacidade. Das novas usinas apresentadas
na Figura 4-5, as mais baratas14 operando com Fcap acima de 52% são as usinas a carvão para carga
de base, seguidas das usinas a gás para carga intermediária. A turbina a combustão operando acima
de 52% ou a usina a carvão com filtro removedor de SO2 serviria como carga de pico. Note que o
custo marginal de produção de energia das usinas eólicas é alto, devido ao seu baixo fator de
capacidade, podendo também ser utilizada para carga de pico. Em locais onde os ventos ao longo
do dia são mais intensos do que os ventos no período da noite, a carga de pico irá ocorrer durante o
dia e pode complementar a carga base. Se a carga de pico ocorrer durante a noite, fora do pico de
consumo, pode ser necessário estocar a energia ou consumi-la, poupando outras fontes estocáveis.
Ao longo do tempo, pode-se combinar usinas de pico de baixo Fcap (por exemplo, até 20%) com
usinas de carga intermediária de médio Fcap e com usinas de carga de base de alto Fcap. A
combinação de custo mínimo dependerá, entretanto, da frequência dos diferentes níveis de demanda
durante o ano.
A utilização da curva de duração de carga pode ser ilustrada considerando os valores de custo
e determinando uma composição dos três tipos de usinas (baixo, médio e alto Fcap) combinada com
13
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
14
Utilizando-se do critério de custo marginal por capacidade ofertada, CMkW.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 167
fatores de capacidade que apresentem o menor custo total. Das novas usinas, para um fator de
capacidade de 52% ou mais, as usinas de carga de base a carvão são mais baratas. Considerando
três usinas para cada tipo, incluindo as existentes, isso corresponde a uma demanda de 5.700 MW
de capacidade de carga de base15. Para os 15% do tempo em que a carga está entre 5.700 MW e
6.500 MW, a usina mais barata, operando num intervalo de fator de capacidade acima de 52%, é a
usina a gás, podendo atingir um acréscimo de 800 MW se adequações nos fatores de capacidade
das usinas de base forem realizadas. A capacidade de pico pode ser obtida com a usina a carvão
com filtro, a usina eólica e a turbina a combustão, incluindo adequações no fator de carga das usinas
de base e intermediária. Note que, para um fator de capacidade de 52% ou menos, as turbinas a
combustão são as menos caras, podendo, assim, compor combinações como carga de base ou
intermediária.
O exemplo ilustrado pela Figura 4-5 admite que toda capacidade consiste em novas adições
de capacidade térmica somada às alterações no fator de capacidade das usinas instaladas, incluindo
o potencial hidroelétrico existente. Tal análise requer cálculos interativos de sistemas de equações
lineares que estão além do escopo da presente discussão. Entretanto, pode-se ilustrar a metodologia
com o exemplo simplificado baseado também na curva de duração de carga (ver Figura 4-6). Neste
caso, as capacidades instaladas da carga de base (usinas a carvão) e das cargas intermediárias (usinas
a gás e eólicas, nessa combinação específica) são representadas pelos retângulos indicando as
produções obtidas conforme fatores de capacidade ajustados. A área de cada retângulo é a produção
de energia anual dos recursos correspondentes.
A capacidade hidroelétrica é mostrada por um retângulo adicional na Figura 4-6 onde se
verifica que a produção total dessa usina está acima da demanda. Embora sua capacidade total seja
fixa, pode-se supor que seja possível variar sua produção média e aumentar as horas de operação,
como se esse recurso tivesse uma capacidade instalada mais baixa e um fator de capacidade mais
alto. Isso é possível porque a produção potencial de uma usina de recurso hídrico é determinada
pela quantidade anual de água captada e estocada em reservatório. O excesso de energia
hidroelétrica verificado é deslocado para fornecer uma carga de base adicional. Sem essa adição, a
carga de base requerida seria maior que a indicada na Figura 4-6. Embora o deslocamento da energia
hidroelétrica em excesso reduza esses requerimentos, ainda serão necessárias capacidade de carga
de base e de pico. Outras combinações podem ser simuladas até que uma ordem de despacho que
represente menor custo de operação seja adotada para o pleno atendimento da demanda.
15
Existem diversas combinações para compor a curva da Figura 4-5. Seja alterando o fator de capacidade das usinas já
em operação, seja com a entrada de novas usinas etc. Consulte esse exemplo em
http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
168 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
O planejamento real da oferta elétrica, usando a curva de duração de carga, é mais complexo
que o processo ilustrado na Figura 4-6. As cargas são variáveis e difíceis de serem previstas e os
recursos de oferta podem não estar disponíveis a todo momento16. Essas incertezas são as razões
para a manutenção de uma reserva marginal, tal que a capacidade total de oferta nos níveis de
geração, transmissão e distribuição exceda quase sempre a demanda máxima esperada. O critério
para determinar quando e quanto da capacidade de oferta deve ser adicionado é geralmente baseado
no atendimento da demanda de pico do sistema. Já a capacidade do sistema de distribuição é
determinada pelos picos de área. Uma vez que a capacidade total de geração e transmissão sejam
suficientes para atenderem ao pico, supõe-se que as usinas de geração devam estar funcionando a
um fator de capacidade suficiente para atingir a demanda total de energia, ou seja:
𝐸𝑙𝑒𝑡𝑟𝑖𝑐𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑧𝑖𝑑𝑎 > 𝐸𝑙𝑒𝑡𝑟𝑖𝑐𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑢𝑚𝑖𝑑𝑎 (4.31)
Substituindo as definições de fator de capacidade e fator de carga:
𝐹𝑐𝑎𝑝 do sistema (capacidade de pico kW) > FC do sistema (demanda de pico kW) (4.32)
16
A própria operação dos sistemas de eletricidade possui suas complexidades e incertezas.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 169
(4.31) a (4.33) não sejam satisfeitas e uma capacidade de geração adicional seja necessária para
atender às necessidades de energia do mercado consumidor.
Como mostra a Figura 4-3, os custos variáveis de operação das usinas hidroelétricas são
baixos. Então, esperar-se-ia que tais usinas fossem operadas como capacidade de carga de base e
funcionassem tanto tempo quanto possível. Entretanto, a água que alimenta as usinas hidroelétricas
pode não estar disponível em quantidades uniformes durante o ano. Se há uma estação úmida
pronunciada, o máximo de água que ela pode acumular é o que pode ser estocado no reservatório,
devendo ser turbinada para gerar potência, mantida no reservatório ou mesmo vertida. Os recursos
hidroelétricos são similares aos recursos renováveis intermitentes, quando a fio d’água ou com
reservatório de regularização, especialmente aqueles com estoque parcial, tal como algumas
tecnologias de energia solar.
A produção máxima hidroelétrica pode ou não coincidir com a ocorrência de demanda de
pico. O impacto no sistema de oferta térmico pode ser analisado tratando a produção hidroelétrica
como uma carga negativa, que reduza a carga que deveria ser atingida pelas usinas térmicas (Figura
4-7A e Figura 4-7B). Essa metodologia requer igualar a produção hidroelétrica horária com as
cargas para as horas correspondentes. Se a demanda de pico está na estação úmida, a carga
remanescente (base e intermediária) é mais uniforme, o que resulta em alto fator de carga – ver Eq.
(4.27). Assim, pode-se operar com usinas térmicas funcionando com um fator de capacidade alto
para a carga de base (Figura 4-7A). Se a demanda de pico está na estação seca, entretanto, a carga
remanescente das usinas térmicas seria grande na estação seca e pequena na estação úmida,
resultando em baixo fator de carga, indicando, também, um baixo fator de capacidade para algumas
das usinas térmicas de base (Figura 4-7B).
Figura 4-7 – Curva de duração de carga – sistema dominado por hidroelétricas (estação úmida e seca)
A maior parte da discussão feita aqui sobre opções de oferta de eletricidade se refere ao
planejamento da geração e não entraremos em detalhes quanto ao planejamento da transmissão. De
preferência, modelos complexos de fluxos de potência são usados para projetar sistemas de
transmissão e este tópico vai além do escopo deste texto. Pode-se supor simplesmente que os
requisitos de capacidade e os custos de investimento para a maior parte dos equipamentos de
transmissão são quase proporcionais à capacidade total de geração e que esses custos podem ser
tratados tal como os custos de geração. Consideramos de maneira aproximada o efeito do sistema
de transmissão no planejamento do sistema elétrico usando o fator de perda descrito mais adiante.
Supomos que esse valor se aplica uniformemente à energia elétrica gerada. No entanto, trata-se de
uma grande simplificação, pois as perdas têm uma relação não linear com a demanda do sistema.
As exigências de distribuição e transmissão locais, por outro lado, dependem mais dos níveis
de demanda da área de distribuição que podem não corresponder com os parâmetros da oferta ou
da demanda do nível do sistema. A análise das redes de distribuição é outra questão complexa que
170 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
está além do escopo deste livro, mas essa informação pode ser usada para desenvolver estimativas
de custos específicos da área para os propósitos do planejamento, como explicado no Apêndice B.
A informação da Figura 4-3, que resume algumas das relações-chave entre as componentes
de custo marginal da oferta, pode ser usada para identificar quais recursos de oferta deveriam ser
selecionados para um plano de expansão da companhia elétrica. Uma vez que as usinas já estão em
operação, entretanto, os custos de capital podem estar amortizados e então somente os custos de
combustível e os de operação e manutenção é que determinam como as usinas existentes devem ser
operadas. A ordem da seleção do uso (ou despacho) das usinas geralmente está de acordo com o
menor custo variável, incluindo o combustível. Isso é chamado de despacho econômico.
Usinas hidroelétricas em geral têm custos variáveis muito baixos e devem, portanto, ser
operadas o maior tempo possível. Todavia, existem limitações de quando e quanto desses recursos
estão disponíveis, sendo tratados, mais simplificadamente, como cargas negativas baseadas na sua
disponibilidade e produção. A demanda remanescente em sistemas termoelétricos deve ser atingida
pelo despacho de estações térmicas, geralmente sob um critério econômico17.
Para fins de planejamento, é mais simples tratar os custos variáveis como constantes para um
dado tipo de usina, independentemente de sua produção. Na prática, entretanto, a eficiência da usina
térmica e, portanto, seus custos de operação e de combustível dependem do seu nível de produção.
A teoria econômica indica que a combinação a custo mínimo dos recursos é aquela que iguala os
custos marginais dos diferentes recursos. Existem limitantes de curto prazo nas decisões de
despacho, tais como a rapidez (ou não) com que as usinas podem ser colocadas em operação e como
pode ser aumentado ou diminuído seu nível de produção. Algumas usinas possuem níveis mínimos
de produção, abaixo dos quais elas não podem ser operadas seguramente. Geralmente, as usinas de
carga de base são aquelas com baixos custos variáveis e parâmetros de operação menos flexíveis,
enquanto as usinas de pico têm os mais altos custos variáveis e são operadas com maior
flexibilidade. A produção hidroelétrica é relativamente flexível para acompanhar a variação de
demanda dos consumidores, mas é sujeita a restrições de energia baseadas nas variações sazonais
de disponibilidade de água e de operação baseadas nas características hidráulicas, como as
representadas na Curva Colina da Turbina.
Um método para reduzir o impacto ambiental da produção de eletricidade é alterar a ordem
do despacho para dar maior prioridade às usinas menos poluidoras, embora talvez sejam as mais
caras. Esse método, chamado despacho ambiental, geralmente acrescenta uma componente ao custo
variável de operação da usina na proporção de suas emissões. Esse incremento de custo pode ser
uma carga de emissão real que é paga ou pode ser um "somador" artificial que é usado para guiar
as decisões de despacho por meio das fontes de menor emissão.
Dependendo da combinação dos recursos disponíveis, dos parâmetros de custo e de emissão,
o despacho ambiental pode diminuir significativamente as emissões, mesmo a custos mais altos.
Para alguns tipos de emissões, tais como poluentes locais que podem se concentrar durante períodos
de pico, o despacho ambiental pode fornecer importantes benefícios a um custo adicional pequeno.
Essa estratégia está sempre sujeita à flexibilidade da operação e à habilidade de atender à carga das
fontes de oferta disponíveis no sistema da companhia elétrica.
17
Existe um despacho fora da ordem de mérito econômico denominado “despacho por restrições elétricas”.
Normalmente esse despacho busca atender requisitos de tensão, de frequência e de carregamento de linhas de
transmissão e de subestações de potência.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 171
Para melhorar a eficiência do uso final via programas GLD e outros, o PIR deve também
melhorar a eficiência no lado da oferta. Uma das opções é reduzir a taxa de perdas no sistema de
geração, transmissão e distribuição. Após o sistema de geração, a soma das perdas em Transmissão
e Distribuição (T&D) é a diferença entre a energia gerada e a energia consumida:
E p = Ptransmissão + Pdistribuição (4.34)
Figura 4-8 – Evolução das perdas de eletricidade – Brasil, China e EUA (1980 a 2010)
Fonte: OECD/IEA (2018)
As perdas T&D podem ser classificadas como perdas técnicas ou não técnicas. As perdas não
técnicas, ou perdas comerciais, resultam de conexões clandestinas, adulteração do contador de
leitura, erros de leitura etc. Tais perdas afetam o faturamento da companhia elétrica (ver Figura 4-
9).
172 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
As perdas técnicas referem-se à energia que é dissipada por meio de elementos do sistema
T&D (transformadores, condutores etc.). Conforme comentários anteriores, a fração de perda
horária de energia é a relação entre a energia não aproveitada e a energia gerada:
E p ( h) E ger (h) − L(h) L ( h)
Fpe (h) = = = 1− (4.35)
E ger (h) E ger (h) E ger (h)
Onde L(h) é a carga total horária vendida; Ep(h) são as perdas de transmissão e distribuição
(T&D) horárias e Eger(h) é a energia horária gerada. No entanto, é conveniente para as práticas de
medição de uma CE definir um fator de perdas a partir da demanda máxima de potência ou de
corrente, com o qual se infere as perdas de energia. Define-se o fator de perdas de potência Fp como
a relação entre a perda média e a perda máxima de potência em um período t, ou seja:
n
P
Fp = médio =
1 0 P(t )dt (4.36)
Pmáx Pmáx t
Onde n é o número de intervalos da curva de carga. Com esse fator, obtêm-se a perda de
energia para um período qualquer:
E p = Fp Pmáx t (4.37)
As perdas T&D consistem, basicamente, em perdas nos condutores que variam com a corrente
e, portanto, com a carga e as perdas dos transformadores. Estas últimas ocorrem em dois metais: no
ferro e no cobre. Diferentemente das perdas no cobre, as perdas ocorridas no ferro não dependem
da corrente de carga. Os fornecedores de transformadores informam as perdas nominais do ferro e
do cobre, valores normalmente obtidos por meio de testes laboratoriais. As perdas em T&D são
graves porque as companhias elétricas provocam custos ambientais e econômicos para a produção
de eletricidade e essa parcela perdida não beneficia nenhum consumidor, nem fornece rendimentos
à companhia.
Existem diversos métodos para se determinar as perdas de eletricidade em um sistema de
fornecimento elétrico. O procedimento comum nesses métodos é a determinação do valor das
perdas técnicas para cada uma das fases T&D. No cálculo, determina-se inicialmente as perdas de
18
ERGEG (European Regulators Group for Electricity and Gas) – é um grupo de reguladores consultivo para a
Comissão Europeia sobre questões de mercado interno de energia na Europa.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 173
potência (demanda) seguidas das perdas de energia. Para os transformadores, o fator de perda é
definido como:
Ptl
Ftl = (4.38)
Pger
Onde Ftl(h) é o fator de perda do transformador na hora h; Ptl(h) é a perda de potência do
transformador em W (ou múltiplo); e Pger(h) é a potência do sistema de geração. O objetivo principal
na redução das perdas técnicas é diminuir as perdas de energia nos condutores, que são
proporcionais ao produto da resistência do condutor e o quadrado da corrente (lei de Ohm):
I 2Rf
Pd I R f Fd =
2
(4.39)
Pger
Onde Pd é a perda dos condutores em W (ou múltiplo) no sistema de distribuição; I é a
corrente; Rf é a resistência elétrica dos condutores de eletricidade; e Fd é o fator de perdas dos
condutores. Há, também, uma queda da tensão no sistema de T&D devido tanto à carga reativa
quanto à resistência dos condutores, que são medidas pela impedância:
V = I Z f (4.40)
tendem a reduzir o fator de potência19. Essa relação é natural em qualquer sistema elétrico. Para que
um aparelho indutivo funcione (motor ou transformador, por exemplo) é necessário armazenar
energia em forma de um campo magnético. Esse campo se opõe à variação da intensidade da
corrente, causando um atraso da corrente em relação à tensão. Com isso, parte da corrente ativa não
realiza trabalho útil. Essa parcela de energia é denominada energia reativa.
É importante considerar, por questões econômicas, a previsão da potência reativa de um
sistema elétrico nos programas de GLD, sobretudo no setor industrial. No Brasil, por exemplo, a
cada ano se intensifica o uso dos sistemas de transmissão sem a contrapartida proporcional de
compensação reativa nos sistemas de distribuição. É parte do PIR, em programas integrados com a
indústria, estabelecer critérios e arranjos técnico-operacionais que resultem na operação confiável
e econômica do sistema de fornecimento de energia elétrica.
O fator de perda em T&D, compondo as perdas dos transformadores e dos condutores, tem a
seguinte expressão:
Pger Ftl + Pd
Fp = = Ftl + Fd (4.42)
Pger
Onde:
R f V
k (4.43)
Fd ( pico ) = Z V
FP
Onde Fd é o fator de perda anual dos condutores; Fd(pico) é o fator de perda de pico dos
condutores; e k é uma constante de proporcionalidade que depende da configuração do sistema de
distribuição. Pelo fato das perdas dos transformadores serem aproximadamente constantes, sua
contribuição relativa para a taxa de perda em T&D anual depende da relação da energia total gerada
no período de pico, isto é, o fator de carga. Geralmente, a taxa anual das perdas T&D do condutor
é aproximadamente 2/3 daquela taxa de perda durante as horas de demanda de pico, embora essa
relação também dependa do fator de carga. Assim:
2
Fp = Ftl + Fd ( pico ) (4.44)
3
E incluindo o fator de carga FC, resulta que:
Ptl 2
Fp = Ftl + Fd = + Fd ( pico ) (4.45)
FC Ppico 3
19
A Aneel estabelece por resolução (09/2010) que o fator de potência nas unidades consumidoras seja superior a 0,92
capacitivo durante seis horas da madrugada e 0,92 indutivo durante as demais horas do dia. O descumprimento dessa
resolução pode ser multado e o valor é calculado em função do fator de potência medido e a energia consumida ao
longo de um mês.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 175
as perdas podem ser reduzidas diminuindo o comprimento e/ou a resistência das linhas condutoras.
O comprimento pode ser reduzido localizando os transformadores mais próximos dos centros de
cargas e a resistência pode ser reduzida usando condutores dimensionados adequadamente.
Uma vez que o fator Fp é proporcional à taxa de queda de tensão V e inversamente
proporcional à tensão V, os sistemas de transmissão de eletricidade a longa distância usam altos
níveis de tensão e a maioria de suas perdas T&D ocorrem no sistema de distribuição. As perdas
podem ser diminuídas pelo uso de distribuição em tensões maiores e pela redução das quedas de
tensão no sistema de distribuição (o que também aumenta a segurança).
Ainda, como Fp é inversamente proporcional ao FP, as perdas podem ser reduzidas pela
diminuição das cargas reativas e pelo aumento do fator de potência. Embora as cargas reativas não
aumentem diretamente a demanda de energia, elas aumentam as perdas. Então, a correção do fator
de potência, usando capacitores nas subestações de distribuição de modo a balancear as cargas
reativas, pode aumentar a segurança e economizar energia.
_____________________________
EXEMPLO 4.11 – A Companhia Elétrica Brakimpur (BECO), uma
companhia de distribuição, tem perdas de 20% anuais na sua rede de
T&D de 230V. As perdas dos transformadores são estimadas em 4% ao
ano. O sistema de distribuição existente tem Rf/Z de 0,9, um fator
de potência também de 0,9 e uma queda de tensão de 30%, de 230V
para 160V. A Beco investiu $1 milhão para melhorar o sistema,
aumentando o fator de potência para 0,95 e diminuindo o Rf/Z para
0,85; com isso, reduziu as perdas de transformador para 3% e a
queda de tensão para 12% em grande parte pelo aumento do número de
transformadores e a sua localização perto das cargas. A redução das
perdas levou a Beco a aumentar as vendas, enquanto, junto a um
programa de gerenciamento de carga, o fator de carga passou de 0,54
para 0,72 e a oferta de pico do sistema de geração permaneceu a
mesma. Qual é a taxa de perda anual depois do programa de melhoria?
Solução
Dos 20% de perdas anuais, 4% são perdas de transformadores e
os 16% restantes são perdas de condutores e, assim, a taxa de perda
de pico do condutor é de 24%. Da Eq. (4.43), o valor de k é:
3 k 0,9 0,3 0,24 0,9
Pd (pico) = 0,16 = k= = 0,79 (4.46)
2 0,9 0,9 0,3
As perdas de pico do condutor para o sistema melhorado, após o
investimento, são, então:
k 0,85 0,12
Pd (pico) = 0,085 (4.47)
0,95
Ou 8,5%. Isso corresponde a uma taxa de perda anual dos
condutores de 5,6% (2/3 da perda de pico). Da Eq. (4.45), pode-se
deduzir que:
Ptl
= Ftl FC = 0,04 0,54 = 0,216 (4.48)
Ppico
176 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Solução:
O custo anual do programa é (0,07)×($1.000.000)=$70.000. A
energia economizada (conservada) é a diferença nas taxas de perda
multiplicada pela energia total fornecida pelo sistema de geração.
A oferta total é calculada pela oferta de pico de 10MW. A oferta
de energia inicial foi (10MW)×(8.760 h/ano)×(0,54)=47,3 GWh e,
corrigindo pelas perdas, resulta (47,3)×(1–0,20)=37,8 GWh. Esse
valor é a venda total. O sistema de oferta melhorado é (10MW)×(8.760
h/ano)×(0,72)=63,1 GWh e as vendas, portanto, são (63,1)×(1–
0,086)=57,7 GWh. Desse modo, tem-se um custo marginal de
$0,004/kWh. Se esse nível de oferta fosse produzido com as taxas
de perdas originais, as vendas seriam (63,1)×(1–0,20)=50,5 GWh.
Então, a energia incremental fornecida é de 57,4–50,4=7,0 GWh por
ano a um custo de $70.000 por ano ou $0,01/kWh.
_____________________________
As dificuldades de despacho de energia gerada por essas fontes não podem ser rigorosamente
comparadas com as fontes convencionais, somente por meio de fator de capacidade, como foi feito
no exemplo da Figura 4-3. Em muitos países, o regime de produção máximo das fontes renováveis
ainda não é previsto com a segurança necessária para que elas sejam consideradas nos cálculos de
carga de reserva do sistema elétrico. Esse conceito, valor de capacidade (capacity value), será
discutido mais adiante.
Por outro lado, nos últimos 15 anos, as energias renováveis foram se incorporando ao PIR de
muitos países e hoje são consideradas alternativas viáveis tecnicamente e economicamente. Os
investimentos em tecnologia de processos de conversão de biomassas, de eficiência de turbinas
eólicas, painéis e coletores solares e a mudança do modelo de grandes usinas hidroelétricas para
PCHs consolidaram a participação das fontes renováveis também para sistemas de larga escala. A
inserção dessas alternativas em sistemas de larga escala o tornam mais flexível do ponto de vista
operacional, incluindo mudanças significativas na sua ordem de despacho. No caso brasileiro, de
acordo com estudos do Nipe/Unicamp20, por meio de programas de GLD e de eficiência energética,
em 2050 as energias renováveis serão responsáveis por 85% da eletricidade total e a participação
da energia nuclear, do carvão e dos derivados de petróleo (diesel e óleo combustível) serão
marginais. Esse cenário impõe, naturalmente, revisões de práticas de ordem de despacho nos
sistemas de fornecimento de energia elétrica do Brasil.
20
Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Universidade Estadual de Campinas - São Paulo).
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 177
Uma das características importantes do PIR é incluir novos critérios de avaliação na seleção
de recursos e tecnologias para atender à demanda de serviços de energia. Um dos aspectos mais
relevantes dessa análise mais ampla é a consideração dos impactos ambientais, que de certo modo
favorece as opções relativamente limpas, tais como GLD e fontes renováveis. A discussão a seguir
focaliza os impactos ambientais, especialmente emissões atmosféricas, embora as técnicas descritas
possam ser aplicadas para outros tipos de custos sociais não monetários.
O setor elétrico cria diferentes tipos de impactos ambientais, a maioria dos quais ocorre no
processo de geração de eletricidade. Os vários impactos podem ser classificados como segue:
Uso do solo
Armazenamento de resíduos
A geração de eletricidade produz diferentes tipos de resíduos, que devem ser manuseados de
modo seguro. Os grandes volumes de cinzas criados pela combustão do carvão e o resíduo
sedimentado dos equipamentos de controle de poluição do ar criam um problema de armazenamento
de resíduos, alguns dos quais são radioativos e altamente tóxicos. Apesar de extensiva pesquisa e
programas de demonstração, o depósito de lixo radioativo de usinas térmicas nucleares permanece
não resolvido.
Resfriamento
Todas as usinas nucleares e a carvão, e também algumas usinas térmicas de queima de óleo
diesel ou combustível, usam turbinas de vapor de ciclo Rankine21 para converter a energia térmica
em potência elétrica. Esses ciclos requerem uma grande quantidade de resfriamento para manter as
condições de operação eficientes, geralmente de 2MW (térmico) para cada MW (elétrico) em usinas
nucleares e uma relação um pouco menor nas usinas que utilizam combustíveis fósseis. Em razão
da capacidade térmica do ar ser muito baixa para remover efetivamente esse calor, grandes
quantidades de água fria devem ser utilizadas. A geração de eletricidade é o segundo maior
21
Trata-se de um ciclo termodinâmico reversível que converte calor em trabalho (William John Macquorn Rankine).
178 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
consumidor de água nos Estados Unidos, depois da agricultura. A água pode remover tanto o calor
por evaporação, consumindo aproximadamente 3m3 por MWh, quanto por aquecimento e
consequente descarga dessa água aquecida no ambiente. Essa poluição térmica pode ser um
problema por causa das temperaturas mais altas diminuírem o conteúdo de oxigênio dissolvido na
água, o que é perigoso para a vida aquática em locais já poluídos por outros agentes.
Emissões atmosféricas
22
Smog (smoke e fog) - designa um nevoeiro contaminado por fumaças – poluição amosférica derivada de emissões de
subprodutos de combustão interna, fumos industriais etc., que reagem na atmosfera com a luz solar para formar
poluentes secundários que, por sua vez, se combinam com as emissões primárias formando o smog fotoquímico.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 179
O ácido nítrico, assim como o ácido sulfúrico, pode ser depositado longe da fonte original da
poluição. Esses dois poluentes baixam o pH da chuva, da neblina e da neve. Essa precipitação ácida
ameaça a vida aquática e das plantas tanto diretamente, quanto por meio do maior lixiviamento23
de minerais perigosos, tais como o alumínio. As regulamentações de emissões para controlar tanto
a deposição seca quanto a precipitação ácida, incluindo deposição transfronteira, têm sido
intensamente debatidas na Europa e nos EUA.
As emissões de NOX são controladas pela modificação do processo de combustão ou por
controles pós-combustão. O controle acurado da quantidade de ar para minimizar o excesso durante
a combustão pode reduzir as emissões de NOX de 15 a 50% e novos queimadores de baixa emissão
de NOX, que usam combustão em múltiplos estágios, podem fornecer reduções de 40 a 60%. As
tecnologias de pós-combustão incluem injeção de ureia (reduz 35 a 75% do gás NO X da chaminé),
água e redução catalítica seletiva, que atinge 80 a 90% de remoção de NO X misturando este gás
com amônia.
23
Lixiviação é o processo de extração de uma substância presente em componentes sólidos por meio da sua dissolução
num líquido. É um termo utilizado em vários campos da ciência, tal como geologia, ciência do solo, metalurgia e
química.
24
No Brasil, algumas leis estaduais sobre mudança do clima vêm sendo instituídas visando estabelecer princípios,
objetivos, diretrizes e instrumentos aplicáveis para prevenir e mitigar os efeitos de gases estufas.
25
A redação dessa convenção foi dada em 9 de maio de 1992 na sede das Nações Unidas em Nova York e aberta para
assinatura em junho de 1992 na Cúpula da Terra no Rio de Janeiro (ECO 92 - 154 países, incluindo a Comunidade
Europeia). A Conferência das Partes (COP) é o órgão supremo dessa convenção e se reuniu pela primeira vez no início
de 1995 em Berlim.
26
A 15ª Conferência das Partes ocorreu em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro de 2009.
180 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Para relacionar os impactos ambientais nos ecossistemas e/ou na saúde humana com as
emissões resultantes da operação de uma usina elétrica é necessário uma série de modelos e técnicas
analíticas. A cadeia completa de passos analíticos está além do escopo deste livro. O ponto-chave é
que existem métodos e modelos para traduzir as emissões em impactos e em valores de custo social
e ambiental (pelo menos na teoria). No contexto do PIR, isso significa que o potencial de oferta de
energia ou as opções do lado da demanda podem ser comparados tanto em bases ambientais quanto
como custos econômicos. Se os custos ambientais não podem ser monetizados de forma segura,
estes podem ser considerados proporcionais às emissões e, assim, se pode classificar medidas
diferentes de acordo com seus valores de emissão.
A análise dos custos ambientais, monetizados ou não, requer uma contabilidade consistente
de taxas de emissão. Para o sistema elétrico, a análise e a projeção da demanda, junto da análise do
lado da oferta e a modelagem de custos de produção, fornecem cenários para a instalação e a
operação das estações de geração e outros equipamentos. Cada kWh de eletricidade produzido pode
estar associado a taxas de emissões para cada poluente por meio de um fator de emissão. O fator de
emissão é a relação das emissões de poluentes pela energia produzida ou o combustível consumido,
sendo expresso em unidades de toneladas por unidade de energia, por exemplo t SO2/GWh.
Os coeficientes do fator de emissão podem estar numa base de dados e, quando multiplicados
pelas quantidades de energia, tais como GWh das diferentes fontes de eletricidade, determinam as
emissões totais para cenários num processo PIR. Geralmente, as emissões diretas das usinas
elétricas de potência são a preocupação primária, mas é também possível contabilizar os efeitos
indiretos, como as emissões produzidas em toda a cadeia energética. Tanto os coeficientes do fator
de emissão diretos quanto os indiretos estão incorporados em pacotes de modelos de contabilidade
ambiental, como o Environmental Data Base, que é parte do modelo LEAP largamente utilizado
por instituições acadêmicas e governos 27.
4.6.3. Externalidades
De forma ideal, os custos das emissões ambientais relacionados com a oferta de eletricidade
deveriam ser considerados parte do custo da oferta. A inclusão de tais custos de externalidades
27
O LEAP (Long-range Energy Alternatives Planing System) é uma ferramenta de análise de planejamento energético
e mitigação de efeitos quanto à mudança de clima desenvolvida pelo Stockolm Enviroment Institute. É adotada por mais
de 150 países em agências de governo, consultorias privadas, por acadêmicos e organizações não governamentais. É
um sistema integrado usado para acompanhar a demanda, a produção e os recursos de todos os setores de uma economia,
desde cidades, estados e nações até a avaliação global.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 181
ambientais permitiria fazer uma comparação econômica direta entre tecnologias convencionais e
aquelas mais "limpas", porém mais caras. Em razão das opções de eficiência energética GLD e de
fontes de energia renováveis tenderem a produzir baixas emissões de poluentes, a inclusão de custos
ambientais em uma análise PIR tende a fazer essas opções parecerem mais favoráveis
comparativamente aos custos de oferta que podem ser evitados.
Para um dado combustível e tipo de usina, as emissões são basicamente proporcionais à
quantidade de energia elétrica gerada. A relação é o fator de emissão. Os custos marginais
ambientais, portanto, tendem a complementar o CMO (Custo Marginal de Operação) e sua inclusão
tende a favorecer as medidas GLD que implicam em conservações de energia e menos aquelas
opções de gerenciamento de carga que reduzem a demanda de pico. Os valores do CMO e do CMkWh
podem ser aumentados para incluir os custos ambientais e outras externalidades de acordo com a
equação:
n
CMOex = CMO + Cem ,i Fem ,i (4.49)
i =1
Onde Cem,i é o custo externo das emissões para o impacto i ($/kg); Fem,i é o fator de emissão
para o impacto i (kg/kWh); n é o número de diferente impactos e:
CMO ex FRC
CM ex,kWh = (4.50)
kWh
Esses custos externos podem ser valores pagos pelas CEs ou podem ser valores usados para
priorizar e selecionar opções do lado de demanda e de oferta num processo PIR. Experiências na
América do Norte com tais valores mostraram pouco efeito na atividade GLD, mesmo sob uma
estrutura de planejamento regulamentada (Rosenfeld et al. 1995).
Onde CAE é o custo de emissões evitadas; CMkWh,A é o custo marginal da energia para a
opção A (opção de redução de emissão); CMkWh,B é o custo marginal da energia para a opção B
(opção de referência); MERA é a taxa de emissão marginal para a opção base A; e MERB é a taxa
de emissão marginal para a opção B.
_____________________________
EXEMPLO 4.1 – Qual é o CAE (NOX) para as seguintes situações:
• Uma nova usina a gás substituindo uma usina a carvão
existente?
• Uma usina eólica substituindo uma usina a carvão?
• Uma usina eólica substituindo uma usina a gás?
182 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Solução:
• Para a usina a gás como opção A, a base B é a usina a carvão,
então CAE=106kWh/GWh×(0,055–0,030)/(11–5)=$4.167/t.
• Para a usina eólica como opção A, a base B é a usina a carvão,
então CAE=106kWh/GWh×(0,067–0,030)/(11–0)=$3.364/t.
• Para a usina eólica como opção A, a base B é a usina a gás,
então CAE=106kWh/GWh×(0,067–0,055)/(5–0)=$2.400/t.
Os resultados desse tipo de análise são os custos incrementais
das reduções de emissões comparados ao plano de expansão base da
companhia elétrica. No contexto do PIR, os custos GLD são combinados
com os custos marginais de oferta da companhia elétrica (os custos
evitados) e com as reduções potenciais de emissões para determinar
o custo do ponto de vista da companhia elétrica e do GLD como uma
estratégia de redução das emissões.
_____________________________
dos existentes, das novas opções consideradas, do horizonte de tempo, da taxa de crescimento
econômico, dos serviços energéticos, da taxa de desconto e outros parâmetros econômicos e do uso
de valores de custo ambiental e externalidades.
Além disso, o plano de eletricidade integrado deve ter uma avaliação política, financeira,
análise de sensibilidade e planejamento de implementação antes que o plano final possa ser
completado. A incorporação dessas questões pode reordenar a classificação do plano integrado ou
excluir certos recursos do plano. Esses passos vão além do escopo do presente trabalho, embora as
questões relevantes tenham sido levantadas e discutidas em vários pontos nos capítulos anteriores.
Cenários adicionais poderiam refletir aumento das penetrações das tecnologias de eficiência
energética por meio de GLD ou outros programas, ou escolhas de diferentes recursos de oferta. Dos
cenários possíveis, pode-se identificar um cenário de custo mínimo, onde os aumentos na oferta de
eletricidade custariam mais que os aumentos de conservação por meio da eficiência de energia e
vice-versa (ver Figura 4-10). Com uma faixa complexa de opções, podem ser usados modelos de
184 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
otimização lineares para ajudar a identificar o sistema de energia a custo mínimo. Outros cenários
poderiam ilustrar casos nos quais a pesquisa e o desenvolvimento tornam disponíveis novas ofertas
ou a eficiência energética e estes penetram o mercado o bastante para mudar a combinação de oferta
de energia, emissões e custos.
O gráfico do lado esquerdo da Figura 4-10 ilustra o desenvolvimento do uso de energia sobre
o ano base do estudo e mostra cinco cenários com diferentes níveis de energia de demanda para o
ano final do estudo. Note que todos os valores se aplicam para um dado ano. O lado direito da
Figura 4-10 ilustra a curva de oferta de eficiência de energia. Esta é construída do nível de
eficiências congeladas do ano base. Ela começa com as medidas de custos negativos, que são as
medidas que reduzirão os custos da obtenção de serviços de energia. A demanda de serviço de
energia que não é atendida pelas medidas de eficiência de energia do uso final deve ser obtida pelas
opções de oferta.
28
HVAC – Heating, Ventilation and Air Conditioning.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 185
O valor de custo fixo marginal (CME anual) é praticamente zero para usinas que já foram
construídas (usinas existentes, exceto a usina a carvão que foi recondicionada) e, em tal caso, os
custos de capital estão amortizados e os custos operacionais fixos devem ser pagos sem considerar
o quanto a usina está produzindo (isso é uma simplificação; na prática alguns custos fixos poderiam
ser evitados se a usina fosse retirada de serviço). É importante notar, entretanto, que esses custos
ainda existem e fazem parte dos rendimentos totais requeridos pela companhia elétrica, devendo ser
recuperados pelas tarifas de eletricidade pagas pelos consumidores. Enquanto as tarifas são
baseadas geralmente nos custos médios, a seleção de novos recursos está baseada nos custos
marginais.
186 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Somado aos recursos existentes e às novas ofertas potenciais, três opções GLD são dadas:
dois programas de eficiência energética e um programa de gerenciamento de carga 29. Os parâmetros
de desempenho para essas opções são diferentes das opções do lado da oferta. Uma vez que os
programas de eficiência energética não são despacháveis, seu fator de capacidade (Fcap) não é
verdadeiramente comparável com aqueles das opções de oferta, sendo simplesmente o fator de carga
da demanda que seria reduzido. Seus custos variáveis são baseados na definição de custo total de
recurso (CTR) e são negativos por causa do potencial de reduzir os custos dos consumidores. Os
rendimentos perdidos não são contados como custo de GLD sob a definição CTR. Para a opção de
gerenciamento de carga, a contribuição de energia anual e o fator de capacidade são negativos,
porque essa opção consome uma pequena quantidade de energia enquanto reduz a carga de pico.
Os custos marginais do conjunto de recursos considerados são mostrados na Tabela 4-12. A
primeira coluna mostra o custo marginal CMkWh, que é a soma dos custos fixos e variáveis anuais,
incluindo os custos anuais de capital, normalizados por kWh de energia produzida ou conservada.
Esses valores são obtidos com a Eq. (4.25).
_____________________________
EXEMPLO 4.14 – Reproduza os valores CAE de SO2 e NOx de cada um
dos recursos novos e recuperados (usina a carvão recondicionada)
indicados na Tabela 4-12. Utilize a (Eq. 4.53) para o cálculo dos
custos de emissões evitadas e use como referência:
• Usina nova a carvão;
• Usina a carvão existente;
• Usina a gás existente.
_____________________________
29
Os programas GLD dados neste exemplo são hipotéticos. A maioria dos programas reais são menores em proporção
aos demais dados. Para atingir um impacto tão grande quanto mostrado neste exemplo, normalmente seria necessário
agregar diversos programas menores, cada um com seus próprios custos e impactos.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 187
Do ponto de vista do custo marginal por unidade de energia produzida ($/kWh), os recursos
mais baratos são os da oferta existente, que têm custos de capital zero, e a opção GLD 1, que tem
custos variáveis insignificantes. Os recursos mais caros incluem turbinas de combustão com seus
altos custos de combustível, a usina eólica com alto custo de capital e baixo fator de capacidade e a
nova usina a carvão com filtro para remover as emissões de SO 2. Embora a usina a carvão
recondicionada já exista, o custo de capital para adicionar um equipamento removedor de emissão
aumenta seus custos marginais fixos.
A Tabela 4-13 mostra os custos marginais e as emissões tanto do SO2 quanto do NOX.. Os
custos das emissões reduzidas devem ser relativos a uma opção de referência, isto é, algum recurso
que está no plano existente e que produza o tipo de emissão a ser reduzida. Tanto as usinas a carvão
existentes quanto as novas emitem SO2 e o NOX é emitido por usinas a carvão e usinas a gás. Assim,
substituir usinas a carvão por opções alternativas pode reduzir as emissões de SO 2 enquanto
substituir as usinas a gás ou a carvão pode reduzir NOX.
Para opções alternativas com menores emissões, a diferença no custo marginal por kWh
dividido pela diferença nas emissões por kWh dá o custo das emissões evitadas (CAE) – ver Eq.
(4.51). A opção GLD 2 e as novas usinas a gás têm os menores valores CAE, devido a seus baixos
custos de capital. A opção GLD 1 realmente tem um CAE negativo, porque seu custo marginal total
é menor que aquele das usinas a combustível fóssil existentes. É mais caro reduzir emissões
comparadas com uma usina a carvão existente do que uma usina a carvão nova, porque as duas
usinas têm taxas de emissão similares e a nova usina tem custos marginais significativamente mais
altos – CMkWh,B na Eq. (4.51).
A combinação a mínimo custo desses recursos é dada na Tabela 4-13, junto das suas
capacidades resultantes e contribuições de energia, custos marginais e emissões. Essa lista de
recursos é determinada por:
• Classificação das fontes em ordem do custo marginal; e
• Seleção dos recursos menos caros até que suas energias totais e capacidade sejam
suficientes para atingir a demanda projetada.
Na Tabela 4-13, supomos uma demanda de 13 TWh por ano, com uma demanda de pico de
2.600 MW e um fator de carga de 57%. As usinas existentes, a opção GLD 1 e a usina nova a carvão
(sem filtros) têm os menores custos marginais. Quando a usina nova a carvão é somada à lista, a
energia e a capacidade total excedem a demanda projetada. O custo marginal é aquele da nova usina
a carvão ($0,053/kWh), mas o custo médio ponderado é somente de $0,03/kWh, devido às opções
menos caras de GLD e de oferta existente.
Note que a ordem de despacho, ou a prioridade de operação de cada unidade, depende do
custo variável em lugar do custo marginal total, que governa a escolha de nova capacidade e que
188 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
inclui os custos fixos dos novos recursos. Assim, as usinas com os menores custos variáveis seriam
operadas tanto quanto possível. A opção GLD 1 não é despachável, assim ela deve ser tratada como
uma redução na carga projetada.
Segundo o despacho econômico, o baixo custo variável da usina hidroelétrica faz com que
esta seja operada em um regime que maximize sua produção, dependendo de seus níveis de
reservatório. O padrão diário de operação para uma usina hidroelétrica poderia ser o de acompanhar
a carga, isto é, respondendo às variações na demanda. As usinas a carvão, geralmente, seriam
acionadas como carga de base e trabalham o tanto quanto possível devido a seus baixos custos
variáveis. Devido ao fato de que a demanda total excede a usina a gás com os maiores custos
variáveis, não será operada a plena carga, mas será um recurso de carga de pico ou intermediária
fornecendo reserva marginal adicional. Assim, sua produção anual seria menor que o valor máximo
mostrado na Tabela 4-13.
A Tabela 4-14 a seguir mostra o sistema não integrado, isto é, a combinação a mínimo custo
somente dos recursos de oferta, de acordo com a metodologia de planejamento convencional. A
diferença entre as duas soluções é que o plano integrado inclui a opção GLD 1, enquanto o plano
não integrado simplesmente adiciona uma segunda unidade de nova usina a carvão (com capacidade
de produção igual ao GLD 1). Embora o custo marginal seja o mesmo que o do plano integrado, o
custo médio é $0,33/kWh, cerca de 8% maior. As emissões de SO2 são aumentadas em mais de
30% e as de NOX em mais de 20%.
O PIR deve incluir um critério adicional ao lado dos custos econômicos, como discutido nos
capítulos anteriores. Por definição, reduzir emissões de um plano a mínimo custo aumenta os custos
do sistema. Entretanto, muitas vezes reduzir as emissões de um plano não integrado, como o
mostrado na Tabela 4-14, para um plano integrado a mínimo custo, mostrado na Tabela 4-13, pode
também reduzir custos.
Os seguintes casos mostram situações em que se quer reduzir emissões de alguns poluentes
que têm origem no setor elétrico utilizando a metodologia PIR. As medidas de redução de emissões
a custo mínimo são identificadas segundo seus valores CAE – Eq. (4.51). O sistema resultante a
custo mínimo, considerando uma restrição de 30% nas emissões de SO 2 comparadas ao caso de
referência (sistema integrado, de 20.000 t/ano para < 14.000 t/ano), está mostrado na Tabela 4-15.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 189
Tabela 4-15 – Desempenho para um sistema integrado de custo-mínimo com 30% de redução de SO2
Os resultados correspondentes para uma redução de emissão de SO 2 de (mais de) 90% (<
2.000 t/ano) estão na Tabela 4-16. Começando por um sistema de custo mínimo como o caso de
referência, são feitas modificações para selecionar a opção com o menor CAE por SO 2. Esse valor
corresponde a uma usina nova a gás substituindo uma usina nova a carvão, em relação ao sistema
integrado da Tabela 4-13.
Tabela 4-16 – Desempenho para um sistema a custo mínimo com 90% de redução de SO2
Pelo fato de a capacidade e a produção anual dessas duas usinas serem comparáveis, a usina
a gás pode ser substituída por uma usina a carvão no plano. O resultado é que a demanda será
atingida com 30% a menos de emissões e com custos um pouco maiores. Como no caso de
referência (Tabela 4-13), sob uma prioridade de despacho econômico, a usina a gás existente tem o
maior custo variável e seria operada com capacidade total menor. Entretanto, se a prioridade de
despacho é mudada para o despacho ambiental, a usina com a maior taxa de emissão, neste caso a
usina a carvão existente, seria a usina marginal operada com capacidade total menor.
Para reduzir as emissões em 90%, o primeiro passo é novamente substituir a nova usina a
carvão pela nova usina a gás. A medida seguinte mais barata mostrada na Tabela 4-12 é a opção de
GLD 2, substituindo a usina a carvão nova, mas que pode não ser selecionada, porque a nova usina
a carvão já foi substituída pela nova usina a gás. A próxima opção deve ser escolhida entre aquelas
que podem substituir a usina a carvão existente. Essas opções incluem a usina a carvão
recondicionada, que pode somente substituir a usina a carvão existente, e essa medida tem o CAE
marginal mais baixo que a opção GLD 2, a próxima opção mais barata. Note que, embora a usina a
carvão recondicionada tenha um custo marginal mais baixo que a nova usina a gás, essa é uma
medida de redução de emissão mais cara porque ela substitui uma opção muito mais barata, a usina
a carvão existente. Nesse caso, a usina a carvão recondicionada é a usina marginal, baseada no
critério de despacho econômico ou de despacho de emissões. A adição dessa medida cara leva a um
aumento significante (cerca de 12%) nos custos totais do sistema.
190 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Resultados similares estão mostrados na Tabela 4-17 e na Tabela 4-18 para o caso da redução
de emissões de NOX de 20 e 60%, respectivamente. Em relação à Tabela 4-13, entretanto, como as
taxas de emissões de NOX não são reduzidas tão facilmente pela troca do carvão pelo gás, a
metodologia de custo mínimo para redução de emissão de NO X é diferente daquela para SO2. A
Tabela 4-12 mostra que a opção de redução de emissão de NOX a custo mínimo é a substituição da
nova usina a carvão pela opção GLD 2. Só essa opção reduz as emissões de NOX em mais de 20%
(de 59.000 t/ano para 46.000) e atende à demanda projetada com custos levemente mais altos. Nesse
caso, como naquele das reduções de 30% de SO2, a usina a gás existente é a usina marginal sob o
despacho econômico e a carvão existente se torna a usina marginal sob o despacho de emissões.
Com a nova usina a carvão já retirada das opções consideradas, o próximo menor CAE
comparado com a usina a carvão existente seria a usina eólica. Como a usina eólica não produz
energia suficiente para substituir completamente a usina a carvão, deve-se passar para a próxima
opção, que é a nova usina a gás. Essas duas opções juntas podem substituir a usina a carvão existente
em termos de capacidade e produção anual e a redução de emissões ultrapassar os 60% (para 22.000
t/ano). Essa solução significa que a capacidade atual, com seus custos já embutidos, seria fechada
e substituída por duas novas fontes de geração (ver Tabela 4-18).
Como consequência, o custo total aumenta em mais de 20%. Tanto para o caso da redução de
emissão em 60% de NOX, como no caso da redução de 90% de SO2 a usina a gás existente é a usina
marginal sob o critério de despacho econômico e no de despacho de emissões. Note que a
capacidade total nesses dois casos é mais alta que no caso de referência. Isso indica que algumas
usinas, tais como a hidroelétrica, seriam operadas no tempo com um fator de capacidade menor,
seguindo de perto o padrão diário das flutuações de carga.
Tabela 4-17 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 20% de redução de NOX
Os resultados mostrados para reduzir a emissão de NOX são similares àqueles que se
encontraria para analisar a emissão de CO2. Os fatores de emissões relativos são semelhantes para
os dois poluentes, pois o gás natural emite cerca de 60% de CO2 por unidade de energia comparado
com o carvão (comparado com os 50% de redução de NOX). Os GLDs e as fontes renováveis têm
emissões insignificantes.
Tabela 4-18 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 60% de redução de NOX
_____________________________
EXEMPLO 4.15 – Recalcule os custos marginais para cada usina
mostrada na Tabela 4-11, usando uma carga de emissão de:
• Dois níveis de SO2 ($600/t SO2 e $4500/t SO2);
• Dois níveis de NOx ($600/t NOX e $4500/t NOX);
• Um nível combinado de SO2 e NOX ($3000/t SO2 e $2000/t NOX)
Solução
A Tabela 4-19 a seguir mostra os custos marginais totais do
conjunto das opções, incluindo custos de emissão baseada em dois
níveis de custos para emissão de SO2, dois níveis para NOX e um
plano combinado de custos para SO2 e NOX.
Os exemplos citados são simples o suficiente para que o plano integrado a mínimo custo possa
ser identificado imediatamente. Se a lista de alternativas fosse muito maior e mais complexa, por
exemplo, envolvendo passos de operações de uma usina (com variações no seu fator de capacidade
mínimo e máximo) ou muitas opções individuais GLD, seria necessária uma metodologia mais
sofisticada para a solução do problema. Modelos de otimização mais complexos podem ser
aplicados com a função objetivo minimizando os custos, isto é, os rendimentos requeridos como
nas Eqs. (1.7) e (4.2). Tais modelos podem ser usados para achar soluções sob outro critério, por
exemplo, a redução de emissões a um dado nível enquanto se minimizam os custos totais.
Modelos de otimização podem ser difíceis para a construção de cenários que não são os ótimos
de acordo com um critério específico, como um sistema a mínimo custo. Por exemplo, os casos de
redução de emissão analisados requereriam a imposição de restrições adicionais em um modelo de
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 193
otimização ou a inclusão de custos de emissões (ou preços sombra) para forçar o modelo a achar
um cenário ótimo de baixa emissão. A teoria das técnicas de otimização indica que num ponto ótimo
os efeitos marginais de algumas das cargas possíveis deveriam ser iguais. Em termos econômicos,
os custos marginais dos diferentes tipos de medidas – por exemplo, para fornecer serviços de energia
ou emissões reduzidas – deveriam ser iguais para um conjunto de medidas para ser a solução de
mínimo custo.
Quando é dado um critério específico, como por exemplo a quantidade de emissão permitida
ou um determinado nível de custo de emissão, pode-se analisar o efeito de uma faixa de valores
possíveis. Uma aplicação desse tipo de análise é a construção da curva de custo marginal de redução
das emissões. Modelos de otimização podem ser usados nesse caso se for possível variar por
incrementos os valores das restrições da função objetivo para produzir uma série de soluções com
diferentes níveis de emissões. Para cada nível de emissão, a solução ótima pode ser comparada em
termos de custos do sistema. Resultados similares também podem ser obtidos usando os métodos
simples mostrados aqui, baseados na classificação das medidas de acordo com seus valores CAE
requeridos.
A Eq. (4.51) indica que o CAE é baseado nas diferenças, tanto em termos de custos como de
emissões, entre a opção de redução (A) e o caso de referência (B). Isso significa que caso os custos
e emissões mudem de uma opção para a outra, o valor de referência correspondente também pode
mudar. Por exemplo, se calcularmos o CAE por redução de emissão de NO X, seriam comparados
os custos do GLD das novas usinas a gás e eólicas com aqueles dos recursos marginais e se
classificariam as medidas de acordo com os valores CAE mostrados na Tabela 4-15. Portanto,
quando se considera um plano que exija múltiplas medidas para atingir um nível de redução, não se
pode usar a mesma referência para todas as medidas sucessivas. Mais exatamente, o CAE marginal
depende da ordem em que as medidas são consideradas. Por exemplo, a nova usina a gás possui um
CAE de $391/t NOX comparado ao recurso marginal, a nova usina a carvão (ver Tabela 4-12). Mas
se a usina a carvão é substituída por medidas com um CAE menor, então a nova usina a gás deve
ser comparada a uma nova referência, a usina a carvão existente, contra a qual possui um CAE
muito maior ($4.131/t NOX). Caso se necessite de reduções posteriores após a usina a carvão
existente ter sido substituída, a usina a gás existente se torna a usina de referência e o CAE marginal
aumenta para $14.787/t NOX. Esse é um processo dinâmico de reduções das emissões.
Na análise apresentada até agora, os custos são estimados de acordo com a definição de custo
total do recurso. Essa metodologia minimiza os custos do sistema, mas não minimiza
necessariamente as tarifas de eletricidade. Como foi discutido no Capítulo 2, as medidas GLD
podem reduzir mais as vendas e os rendimentos da CE que seus custos, aumentando assim as tarifas.
Tais medidas de GLD são economicamente atraentes com a definição de custo total do recurso, mas
não são pelas medidas de taxa de impacto de custo-efetividade, que se pauta mais nas taxas que nos
custos totais. Desse modo, uma combinação de recursos que satisfaça o teste do custo total do
recurso pode não cumprir o teste RIM (Rate Impact Measure) visto no Capítulo 2.
O conceito-chave usando a definição de custo total do recurso é o tratamento dos serviços de
energia como um produto em lugar de uma mercadoria gerada e vendida em MWh. Fazendo uma
análise em bases dos serviços de energia, torna-se possível comparar a energia ofertada e a energia
demandada em bases comuns. Entretanto, energia conservada não é vendida da mesma forma que
a eletricidade. Idealmente, seus custos e rendimentos perdidos deveriam ser recuperados dos
mesmos consumidores ou, pelo menos, da mesma classe de consumidor na qual a conservação
ocorre. Esse não é o caso frequente e os custos podem ser recuperados por meio da tarifa geral base.
194 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Onde CMkWh é o custo marginal de oferta ou recurso GLD; kWhj é o incremento na oferta
de energia anual ou economias do recurso; e kWhk é o incremento na oferta de energia anual do
recurso.
Os efeitos dos planos de recursos mostrados da Tabela 4-13 a Tabela 4-18 são comparados
na Tabela 4-20. Nesta tabela, os custos médios e as tarifas médias incluem $105 milhões em custos
fixos para a capacidade existente. As tarifas são os rendimentos requeridos pelo sistema, incluindo
os custos marginais para todas as ofertas selecionadas e recursos GLD mais os custos fixos das
usinas existentes divididos pelas vendas, excluindo as economias de GLD. Assim, os custos GLD
são alocados na tarifa base geral. Uma metodologia mais equitativa seria alocar os custos GLD
somente para os consumidores participantes, entretanto, isso é difícil na prática. A maioria das
estruturas das tarifas existentes contém outras distorções e desequilíbrios, como já comentado.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 195
Tabela 4-20 – Comparação das tarifas e dos custos – modelos de planos de recurso elétrico
Os resultados da Tabela 4-20 mostram que, embora o plano integrado a custo mínimo possua
tarifas médias 10% mais altas que os custos médios de oferta, essas taxas são iguais no plano não
integrado, mas os custos médios do plano integrado são 7% menores que no plano não integrado.
O caso 3 (90% de redução de SO2) e o caso 4 (20% de redução de NOX) mostram tarifas
significativamente mais altas. Entretanto, os custos médios para o caso 3 são apenas 5% maiores
que o plano não integrado e os custos do caso 4 são mais baixos, iguais ao plano de custo integrado.
O caso 5 (60% de redução de NOX) possui taxas e custos mais altos.
Esses resultados também mostram os efeitos importantes dos programas GLD em termos de
custos reduzidos, embora as tarifas possam aumentar. A razão para tais efeitos é que, no caso da
opção GLD 1, por exemplo, o custo do GLD é aproximadamente igual à diferença entre o custo de
oferta marginal e a tarifa média. Isso significa que os custos de oferta economizados, descontada a
receita perdida, equilibram os custos do GLD e permitem que as tarifas variem muito pouco e os
custos totais sejam reduzidos. No caso no qual o custo marginal de oferta é menor que a taxa média,
o GLD aumenta as tarifas.
suficiente e estocada nos reservatórios é que se pode supor que esse recurso seja totalmente
despachável.
Outros recursos renováveis, tais como a energia solar e, especialmente, a energia eólica, não
são despacháveis do mesmo modo que as usinas térmicas e hidroelétricas, como já foi dito
anteriormente. Mais exatamente, a disponibilidade desses tipos de capacidade nos períodos de
demanda de pico depende da probabilidade de suas operações durante esses períodos. Se a demanda
de pico ocorre durante a estação de vento, existe uma alta probabilidade de que a energia eólica
possa atingir uma parte da demanda de pico. Entretanto, a probabilidade de que a capacidade eólica
operará a força total durante as horas de pico é menor que da usina térmica. A situação é similar
com a energia solar, exceto que a energia térmica solar pode ser estocada e, então, estar disponível
e ser expedida com maior segurança. Somando-se a isso, é possível que o recurso de energia solar
como esperado seja mais coincidente com os períodos de demanda de pico das cargas dirigidas às
condições do tempo, tais como aparelhos de ar condicionado.
Como esses recursos de oferta intermitentes não são totalmente seguros, eles não podem ser
comparados diretamente com a capacidade térmica em seus fatores de capacidade, por exemplo,
usando as curvas mostradas na Figura 4-3. Como comparação, suponha que a fonte de oferta esteja
disponível quando necessária durante os períodos de demanda de pico e que, caso trabalhe a um
fator de capacidade abaixo de seu máximo, sua operação pode estar de acordo com a demanda de
pico.
A maioria dos programas de eficiência energética também não são totalmente despacháveis.
Assim, seus fatores de capacidade não são comparáveis àqueles das opções de oferta. Mais
exatamente, esse é simplesmente o fator de carga da quantidade de carga que seria reduzida. O fator
de carga de um uso final afetado pelo GLD (exceto pelas opções de gerenciamento de carga
despacháveis como estoque térmico e controle direto de carga) não é comparável ao fator de
capacidade de uma usina de potência despachável. As horas de uso que fornecem o fator de carga
para uma opção GLD podem ou não corresponder aos períodos de demanda de pico locais ou do
sistema, nos quais a companhia elétrica necessita de capacidade, e nem é despachável nesse sentido.
Assim, o valor do recurso GLD, em termos de capacidade de pico, não é o mesmo que do recurso
do lado da oferta com um equivalente fator de capacidade. O valor da capacidade do GLD pode ser
menor.
Essas complicações no ajuste e na disponibilidade do GLD e dos recursos intermitentes têm
levado a extensivas análises para determinar o valor da capacidade desses recursos que podem ser
consideradas ao calcular a margem de reserva do sistema. O conceito de valor da capacidade é a
capacidade esperada disponível nos períodos de demanda de pico com aproximadamente a mesma
segurança que uma usina térmica convencional. Esse tipo de análise está além do objetivo deste
livro; entretanto, pode-se ilustrar como o conceito deve ser usado.
A Tabela 4-21 mostra um possível resultado da análise do valor da capacidade para os
recursos considerados. As usinas térmicas são definidas tendo 100% de crédito de capacidade e os
outros recursos são avaliados com relação a esse valor. Supõe-se que a opção de gerenciamento de
carga seja projetada especificamente para reduzir a demanda de pico e, assim, recebe 100% do
crédito de capacidade. As opções GLD são avaliadas com base nas reduções de carga atingidas,
relativas às reduções máximas, durante os períodos de demanda de pico. A carga para GLD 1 é
relativamente coincidente com o pico, dando 67% do crédito de capacidade e, assim, o GLD 2 é
menor, com 33%. A usina eólica, como discutida anteriormente, é um caso complicado, mas supõe-
se que cerca de 40% de sua produção possa estar disponível durante as horas de pico.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 197
Quando os resultados da Tabela 4-21 são aplicados aos cálculos de capacidade mostrados da
Tabela 4-13 a Tabela 4-18, os totais de capacidade revisados estarão todos na faixa 2.620 a 2.720
MW, em lugar da faixa original 2.620 a 3.625MW. Embora a usina eólica e as opções GLD reduzam
o valor de capacidade do sistema, comparado a sua capacidade nominal, cada caso ainda possui
capacidade suficiente para atingir a demanda de pico projetada.
_____________________________
EXEMPLO 4.16 – Suponha que a demanda de pico projetada de 2.600
MW não possua uma reserva marginal suficiente e que 10% a mais deva
ser fornecido para manter adequada a segurança do sistema. Qual é
a capacidade a mínimo custo adicional para atingir esse requisito?
Solução
Isso significa que os planos mostrados da Tabela 4-13 a Tabela
4-18 requerem 140 a 240 MW adicionais de capacidade para atingir
essa meta (considerando as capacidades totais revisadas), embora a
demanda de energia total anual já esteja satisfeita. Assim, é
necessário nova capacidade com um fator baixo de capacidade e,
ainda mais importante, baixo custo por kW. Combustível e outros
custos variáveis e custos de emissões são menos importantes porque
a capacidade não será usada com frequência. A opção com o menor
custo de capacidade é a de gerenciamento de carga de 100 MW. Embora
essa opção consuma energia, a produção de energia líquida total
ainda atinge a demanda anual. O adicional de 40 a 140 MW de
capacidade seria fornecido por turbinas de combustão mais caras.
Embora essas unidades produzam eletricidade relativamente mais cara
a baixos fatores de capacidade, elas são mais baratas que outras
usinas com mais altos custos de capacidade, como mostrado na Figura
4-3. A taxa de emissão também pode ser relativamente alta, mas
somente por poucas horas por ano. No entanto, se episódios de
extrema poluição durante tempos de demanda elétrica de pico são uma
importante restrição ambiental, tais usinas de pico deveriam ser
consideradas com cautela.
_____________________________
(Bajay, Jannuzzi, Heideier, Vilela, Paccola, and Gomes 2018) (Bajay, Vilela, et al. 2018) (Bajay, Jannuzzi, Heideier, Vilela, Paccola, Gomes, et al. 2018) (Jannuzzi, Bajay, et al. 2018) (Jannuzzi, Heideier, et al. 2018)
198 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda
Bajay, Sergio Valdir, Gilberto De Martino Jannuzzi, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro
Vilela, José Angelo Paccola, and Rodolfo Dourado Maia Gomes. 2018. Geração Distribuída
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Apêndice A 199
APÊNDICE A
MULTIPLICADORES
Multiplicador Símbolo Fator
Quilo k 103
Mega M 106
Giga G 109
Tera T 1012
Peta P 1015
Exa E 1018
Exemplo: 1 ton. de carvão 3.100 (kcal/kg) = 0,421 TEC. Fonte: EPE (2010)
APÊNDICE B:
CONCEITOS E DEFINIÇÕES
Período 0 1 2 3 4
Investimento inicial (1.000) (200)
Receitas 800 700 600
Custos fixos (30) (30) (30)
Despesas operacionais (60) (60) (70)
Receita líquida 710 610 500
Fluxo de caixa líquido (1.000) (200) 710 610 500
1
Onde não especificado, o termo projeto utilizado neste Apêndice refere-se aos programas de GLD, projetos de
expansão de fornecimento de energia, projetos de novas usinas etc. Trata-se, portanto, de um termo geral.
Apêndice B 203
_____________________________
EXEMPLO B.1 – Um investimento realizado em 2006 (valor presente)
no valor de $200,00 com uma taxa de 15% a.a. tem um valor atualizado
para 2012 (valor futuro) de:
_____________________________
Se o fluxo de caixa for do tipo série uniforme, a equação toma a seguinte forma:
(1 + i )n − 1 = VP = 1
(B.3)
i(1 + i) n
R FRC
Onde FRC é chamado de fator de recuperação de capital. Note que o FRC é função da taxa e
do número de períodos, FRC(i, n). Se o valor presente de um empréstimo contraído de uma
instituição financeira para ser aplicado em um investimento, por exemplo, for multiplicado pelo
FRC resulta na anualidade a ser paga à instituição financeira, ou seja:
R = VP FRC (i, n) (B.4)
c) Taxa de desconto r
Da mesma forma que se corrige um investimento atual para obter seu valor no futuro,
investimentos futuros podem ser corrigidos para valores atuais pela taxa de desconto. Por exemplo,
um investimento que será realizado daqui a n anos terá seu valor corrigido para hoje conforme
expressão de acordo com a taxa de desconto r:
VF
VP = (B.5)
(1 + r ) n
_____________________________
EXEMPLO B.2 – Para um investimento no valor de $400,00 a ser
realizado no ano de 2017 (valor futuro), seu valor atualizado para
o ano de 2012 (valor presente) a uma taxa de desconto de 12% a.a.
será de:
400,00
VP = = $226,97 (B.6)
(1 + 0,12) 5
_____________________________
d) Taxa de inflação
Tanto a taxa de atualização como a taxa de desconto têm incorporado em seus valores a taxa
de inflação. Se necessário, a taxa real de desconto, ou a taxa real de atualização, pode ser calculada
conforme Eq. (B.7) a seguir:
(1 + rreal ) (1 + f ) = (1 + r ) (B.7)
Onde:
(r − f )
rreal = (B.8)
(1 + f )
Em que f é a taxa de inflação e rreal é a taxa de desconto real.
_____________________________
EXEMPLO B.3 – Suponha uma taxa de desconto de 15% a.a. e uma
taxa de inflação de 8% a.a. Qual a taxa real de desconto?
Solução
(0,15 − 0,08)
rreal = = 0,0648 ou 6,48% (B.9)
(1 + 0,08)
_____________________________
uma proposta. Isso significa que quando a empresa decide aplicar recursos em uma proposta de
investimento abre mão de investir na taxa mínima de atratividade, sempre disponível.
A TMA é lastreada na taxa de juro que, por sua vez, é, em essência, um elemento de política
econômica utilizado pelos governos para manter o equilíbrio da economia de um país. A taxa de
desconto depende de fatores como as incertezas (técnica, política e econômica) e os riscos a que
está sujeito o investimento.
g) Custo de oportunidade
Ao aplicar um capital num determinado projeto de energia, o investidor deixa de auferir
rentabilidade em outros projetos alternativos. Para que um investimento seja atrativo, este deve
remunerar melhor que as oportunidades perdidas devido à sua escolha. Se o mercado financeiro
estiver remunerando o capital a 10% ao ano, por exemplo, e a empresa retém recursos em caixa, o
custo de oportunidade é de 10% ao ano, pela não remuneração do seu capital. O custo de
oportunidade de manter o dinheiro aplicado num banco pode ser nulo, desde que a empresa não
tenha alternativa com rentabilidade superior. Se, entretanto, existir a possibilidade de aplicar esse
capital num investimento produtivo com rentabilidade de 30% ao ano, aí então o custo de
oportunidade de manter o dinheiro no banco a 10% será de 20% ao ano.
2
Nos modelos de previsão de energia com base em séries temporais, matriz insumo-produto, modelos econométricos
etc., pode-se trabalhar com a variância de alguns parâmetros do projeto, por exemplo, o preço futuro da energia, a
produção futura etc.
206 Apêndice B
Solução
Para se chegar ao tempo de retorno do capital empregado, deve-
se atualizar cada receita com a taxa de atratividade e verificar
graficamente em qual período o capital de 2.000 é recuperado. Para
isso, recomenda-se construir um diagrama valor atual acumulado
versus período de tempo conforme indicado na Tabela B.2 a seguir.
Valor Soma
n Receitas atual Acumulado (Acumulado –
Rn/(1+i)n $2.000)
1 800,00 762,00 762,00 –1.238,00
2 700,00 635,00 1.397,00 –603,00
3 600,00 519,00 1.915,00 –85,00
4 200,00 165,00 2.080,00 +80,00
5 100,00 78,00 2.158,00 +158,00
Apêndice B 207
b) Simple payback
O termo simple payback (SPB) tem seu significado intrínseco incorporado ao termo em inglês
e corresponde ao tempo necessário para a recuperação do capital investido, ou seja, é o tempo para
o qual a simples soma dos benefícios anuais totais se iguala ao capital investido, não se levando em
conta a taxa de desconto, nem o tempo do projeto ou outros custos. Dessa forma:
CC
SPB = (B.10)
Fk
Onde CC é o custo de capital investido e Fk são os benefícios totais. Por exemplo, se para um
investimento de capital de $200 em um programa de GLD consegue-se uma economia de 1,0
MWh/ano, sendo o custo da energia igual a $50/MWh, tem-se:
200
SPB = = 4 anos (B.11)
50
Onde Vj é o valor monetário líquido ocorrido ao final do período j (as entradas são valores
positivos e as saídas são valores negativos); TMA é a taxa mínima de atratividade; j=0,1,2...n; onde
208 Apêndice B
VPL Decisão
VPL>0 aceitar – viável
VPL=0 indiferente
VPL<0 rejeitar – inviável
De uma maneira bem simples, o VPL, se positivo, pode ser encarado como sendo o benefício
obtido acima do produzido pela TMA. Para melhor entendimento do significado do VPL, veja um
exemplo numérico simples. Seja o fluxo indicado na Tabela B.4 a seguir:
ANO 0 1 2 3
Valor ($) 1.000 500 500 500
Portanto, se for aplicado no projeto $1.000 hoje, obter-se-á $337,00 a mais do que se forem
deixados $1.000,00 aplicados na TMA.
TIR Decisão
TIR>TMA aceitar – viável
TIR=TMA indiferente
TIR<TMA rejeitar – inviável
Por exemplo, para um projeto de expansão de energia, a taxa interna de retorno (TIR) é o
valor da taxa de desconto para a qual o fluxo de caixa descontado para o valor atual à taxa TMA
(VPL) é igual a zero, ou seja:
n Vj
VPL = j
=0 (B.14)
j = 0 (1 + TIR )
O valor da TIR é determinado por uma solução iterativa. Toda vez que a TIR de um programa
ou projeto for maior que a TMA, pode-se interpretar que o valor do investimento inicial pode ser
Apêndice B 209
tomado por empréstimo à uma taxa de juros de no máximo igual à TIR, de modo que os rendimentos
do programa sejam suficientes para pagar o valor do empréstimo mais os respectivos juros. Se o
fluxo de caixa possui várias TIR reais e positivas, ou não possui TIR real, não se deve utilizar a taxa
interna de retorno como critério de decisão. Neste caso, é melhor considerar que o fluxo de caixa
não possui TIR.
_____________________________
EXEMPLO B.5 – Determine a TIR de um projeto hipotético de
energia que apresente o seguinte fluxo de caixa:
Solução
A TIR é a taxa i que satisfaz a seguinte igualdade:
− 1.000 200 300 400 500
VPL = + + + + =0 (B.15)
(1 + i) 0 (1 + i)1 (1 + i) 2 (1 + i)3 (1 + i) 4
No caso de fluxo de caixa genérico, existe uma função no Excel
que permite determinar a taxa interna de retorno, ou seja:
TAXA( valor1 ; valor2 ; ...; valorn ; estimativa) (B.16)
_____________________________
210 Apêndice B
Onde FRC é o fator de recuperação de capital – ver Eq. (B.3). Há programas em que o
intervalo de tempo ideal não é de um ano. São programas em que há necessidade de investimentos
uniformes em períodos diferentes de um ano. Nesses casos, pode-se especificar um intervalo de
tempo otimizado (n0) e os fatores para o cálculo do valor presente passam a ser:
t
t0 = = tempo de vida do projeto, em intervalo otimizado (B.19)
n0
E:
𝑟0 = (1 + 𝑟)𝑛0 − 1 = taxa de desconto equivalente para o intervalo de tempo n0 (B.20)
Por exemplo, se o intervalo de tempo otimizado para uniformizar custos for de dois anos, para
um programa de vida econômica de 10 anos, e a taxa de retorno for de 10% a.a., tem-se que:
10
t0 = =5 (B.21)
2
E:
r0 = (1 + 0,10) 2 − 1 = 0,21 (B.22)
Onde:
r0 (1 + r0 ) t 0 0,21(1 + 0,21) 5
FRC = = = 0,3417 (B.23)
(1 + r0 ) − 1 (1 + 0,21) − 1
t0 5
3
Aqui os benefícios são quaisquer benefícios relacionados ao programa: custos evitados em substituições de
equipamentos, energia conservada etc.
Apêndice B 211
O custo total do programa (CTP) e o custo anual equivalente (CAE) são critérios eventuais
de análises de projeto de investimentos das empresas de energia, porém dependem fortemente da
magnitude do investimento, não levando em consideração a eficácia global do programa. O mais
indicado é utilizar os critérios de VPL, TIR, payback conforme indicado neste Apêndice.
Recomenda-se, dentro do possível, considerar as incertezas nos fluxos de caixa dos programas.
Logo:
50,00
SPB = = 5 anos (B.29)
10
E:
CAE = 0,25(50,00) − 10 = 2,5$ / ano (B.30)
212 Apêndice B
Portanto:
2,5
CCE = = 0,021$ / kWh evitado (B.31)
120
_____________________________
APÊNDICE C:
Neste Apêndice são apresentados alguns conceitos de estatística úteis para validar os modelos
de previsão de demanda de energia, sobretudo os que envolvem método de regressão, econometria
e modelos de séries temporais. Duas referências foram utilizadas para a preparação deste Apêndice:
a segunda edição do livro de William W. S. Wei, intitulado Time Series Analysis (Univariate and
Mutivariate Methods), publicada em 2006, e outro mais recente, publicado em 2012, por R. L. S.
Bueno sob o título Econometria de Séries Temporais.
Quando uma variável assume resultados diversos entre uma observação e outra em razão de
fatores relacionados à chance, ela é chamada de variável aleatória.
Definição: seja x uma variável aleatória. Se o número de valores possíveis de x for finito ou
infinito enumerável, então x é denominada de variável aleatória discreta. A cada resultado possível
xi está associada uma probabilidade de ocorrência p(xi) com as seguintes condições para todo i:
p ( xi ) 0 p( x ) = 1
i =1
i (C.1)
Definição: diz-se que x é uma variável aleatória contínua se existir uma função f, denominada
de função densidade de probabilidade fdp de x, que satisfaça as seguintes condições:
+
f ( x) 0 −
f ( x)dx = 1 (C.2)
Definição: seja x uma variável aleatória discreta. Define-se a função F como a função de
distribuição acumulada da variável aleatória x como:
1
Este apêndice foi escrito por Dr. João B. Marques (jbdmarques@gmail.com).
214 Apêndice C
F ( x) = p( x )
j
j (C.4)
Onde o termo de soma é estendido a todos os índices j que satisfaçam a condição xjx. Se x
for uma variável aleatória contínua, então:
x
F ( x) = −
f ( s )ds (C.5)
Onde s é uma variável muda de integração. Observe que se F(x) é a função de distribuição
acumulada da variável aleatória contínua x, com fdp f(x), então:
dF ( x )
= f ( x) (C.6)
dx
Para todo x no qual F seja derivável.
O valor esperado de uma variável aleatória discreta, ou simplesmente esperança, é a soma das
probabilidades de ocorrência de cada evento multiplicada pelo seu valor. É o valor médio esperado
de um experimento se ele for repetido muitas vezes, portanto:
n
E ( x) = xi p( xi ) (C.7)
i =1
Se a variável for contínua com fdp igual a f(x), então a esperança é dada por:
+
E ( x ) = − xf ( x ) dx (C.8)
Esses conceitos são fundamentais em econometria de séries temporais, uma vez que a ordem
dos dados do conjunto da população é uma condicionante. Considere o espaço amostral a
esperança não condicional (ou incondicional) de uma variável aleatória x, que é definida por:
E ( x | ) = E ( x) (C.12)
Apêndice C 215
Onde o conjunto a que pertence a esperança não está definida claramente no espaço amostral.
A lei das expectativas totais afirma que:
E[ E ( x | )] = E ( x | ) = E ( x) (C.13)
Seja todos os subconjuntos do espaço amostral sobre o qual a variável aleatória x está
inserida. A lei das expectativas iteradas, aplicada a dois conjuntos A, B , é definida por:
E[ E ( x | A, B) | A] = E ( x | A) (C.14)
O que implica que é sobre o menor conjunto de informação que se determina a esperança
condicional.
VARIÂNCIA
Definição: seja x uma variável aleatória. Define-se a variância de x, denotada por Var(x) ou
x , como:
2
A raiz quadrada positiva de Var(x) é denominada de desvio padrão. Outra forma de expressar
a Var(x) é:
a) Propriedades da variância
E:
Var (ax) = a 2 Var ( x) Var (ax + b) = a 2 Var ( x) (C.18)
Também:
Var ( x + y ) = Var ( x) + Var ( y ) + 2Cov( x, y ) (C.19)
Onde x e y são as médias das distribuições das variáveis x e y, cuja função de correlação é:
Cov( x, y )
( x , y ) = (C.21)
2x 2y
216 Apêndice C
Um processo estocástico é uma família de variáveis aleatórias Z(,t) indexada no tempo, onde
pertence ao espaço amostral e t refere-se ao tempo. Para um determinado t, Z(.,t) é uma variável
aleatória e para um dado espaço amostral , Z(,.) é uma realização e Z(,t) é um número real.
Uma população que consista de todas as possíveis realizações é chamada de processo estocástico
gerador de dados. Portanto, uma série temporal é uma realização ordenada de um processo
estocástico qualquer.
Suponha infinitas medições da temperatura do convés de n sondas de petróleo durante o dia.
Assim, seria possível montar um conjunto com as n sequências seguintes:
(Z t
(1)
t =−
, Z t( 2)
t =−
,..., Z t( n )
t =−
) (C.22)
Z t
(1)
, Zt( 2) ,..., Zt( n) (C.23)
Onde f(Zt) é a função densidade de probabilidade – ver Eq. (C.8). Note que a esperança é a
média esperada de uma distribuição de frequência. A função de variância de um processo
estocástico é:
t2 = E ( Z t − t ) 2 (C.25)
AUTOCOVARIÂNCIA, AUTOCORRELAÇÃO
a) Autocovariância
constante, desde que E(Zt)<∞ e a variância t2=2 para todo t seja também uma constante. Assim,
define-se a autocovariância como:
k = Cov( Z t , Z t + k ) = E (Z t − t )( Z t + k − t + k = E (Z t − )( Z t + k − (C.28)
Note que, por definição, 0 é a própria variância. Observe também que, de acordo com
definição em (C.28), as variâncias não condicionais de Zt=+t e Zt=t+t são idênticas.
b) Autocorrelação
Onde Var(Zt)=Var(Zt+k)=0.
Solução
De acordo com a Eq. (C.28) tem-se que:
2 , k = 0
k = E (Z t − )( Z t + k − =
0, k 0
(C.30)
1, k = 0
k = k = k2 =
0 0, k 0
_____________________________
Além da autocorrelação entre Zt e Zt+k, pode-se investigar a correlação entre Zt e Zt+k após
remoção da dependência linear destas variáveis com as variáveis intervenientes Zt+1, Zt+2,...,Zt+k-1.
218 Apêndice C
Mais exatamente, podem-se investigar os erros destas variáveis obtidas de suas melhores
estimativas por método de regressão linear.
Considere {Zt} um processo estacionário e, sem perda de generalidades, assuma que E(Zt)=0.
Considere a expressão a seguir o melhor estimador de Zt+k:
E ( Z t + k − Zˆ t + k ) 2 (C.33)
E ( Z t − Zˆ t ) 2 (C.35)
Assim, a função de autocorrelação parcial kk entre Zt e Zt+k é definida como a correlação
ordinária entre (Zt– Ẑ t ) e (Zt+k– Zˆ t +k ), ou seja:
Cov[( Z t − Zˆ t ), ( Z t + k − Zˆ t + k )]
kk = (C.36)
Var ( Z t − Zˆ t ) Var ( Z t + k − Zˆ t + k )
Ou de forma genérica:
1 1 2 ... k − 2 1
1 1 1 ... k −3 2
... ... ... ... ... ...
k −1 k − 2 k −3 ... 1 k
kk = (C.38)
1 1 2 ... k − 2 k −1
1 1 1 ... k −3 k −2
... ... ... ... ... ...
k −1 k − 2 k −3 ... 1 1
Apêndice C 219
e) Média amostral
1 n 1
E (Z t ) =
n i =1
E (Z t ) = n =
n
(C.40)
E ( ˆ k ) k −
k
n
n−k
k −
n
Var ( Z ) e ( )
E ˆˆ k = k − Var ( Z ) (C.42)
Para uma dada realização de uma série temporal, a função de autocorrelação amostral é
definida como:
n−k
ˆ (Z t − Z )( Z t + k − Z )
t =1
ˆ k = k = , k = 0,1,2,... (C.43)
ˆ 0 n
(Z t − Z )
t =1
_____________________________
EXEMPLO C.2 – Considere os dez valores de uma série temporal
conforme Tabela C.1:
220 Apêndice C
_____________________________
k
ˆ k +1 − ˆ kj ˆ k +1− j
ˆ k +1, k +1 = ˆ k +1, j = ˆ kj − ˆ k +1, k +1 ˆ k , k +1− j ,
j =1
k
e j = 1,2,...k (C.45)
1 − ˆ kj ˆ j
j =1
_____________________________
EXEMPLO C.3 – Usando os dados do exemplo anterior, determine
ˆ 11, ˆ 22, ˆ 21, e ̂ 33 .
Solução
Partindo das Eqs. (C.37) e (C.38) tem-se que:
ˆ 11 = ˆ 1 = −0,188
ˆ − ˆ 2 − 0,201 − (−0,188)
ˆ 22 = 2 21 = (C.46)
1 − ˆ 1 1 − (−0,188) 2
ˆ 21 = ˆ 11 − ˆ 22 ˆ 11 = (−0,188) − (−0,245)( −0,188) = −0,234
_____________________________
a) Estacionaridade
A primeira condição assegura que o segundo momento não centrado é finito (podendo ser
diferente para diferentes períodos). A segunda condição exige igualdade entre as médias (as
distribuições podem sofrer alterações com o tempo). A terceira condição é que a variância seja igual
para todo o período e independentemente do tempo.
b) Ergocidade
Para estimar uma série temporal é necessário atender à propriedade de ergocidade, além da
estacionaridade. Suponha que uma realização Z(,.) é uma realização de um processo estocástico.
A média temporal é definida por:
222 Apêndice C
1 n ()
Z ( ) = Zt
n t =1
(C.49)
Se Z () convergir para E( Z () ), então existe ergocidade. Como as médias são todas iguais
para diferentes intervalos de tempo, basta uma realização para se ter a média. O que se pretende é
que a esperança de cada observação seja igual (estacionaridade) e se possa estimar essa esperança
tomando-se a média temporal das observações (ergocidade). Pode-se provar que, se a soma das
covariâncias for finita, Zt é ergódico para o primeiro momento.
c) Ruído branco
Uma sequência de realizações {t} é um ruído branco se a média for zero em cada realização
e se a variância for constante e não for correlacionada a qualquer outra realização da própria série.
Se uma sequência de realizações { t }t= − atende às condições em (C.50):
E ( t ) = 0
E ( t2 ) = 2 para todo t (C.50)
E ( t t − j ) = 0, para todo j 0
Para entender esta metodologia de George Box e Gwilym Jenkins (1970), é conveniente
iniciar com a definição do que seja uma série temporal autorregressiva AR(p), que é determinada
por:
p
Z t = + 1Z t −1 + 2 Z t −2 + ... + p Z t − p + t = + j Z t − j + t (C.51)
j =1
2
Uma sequência t é um ruído branco se a média (por conveniência) for zero e a variância constante e não correlacionada
a qualquer outra simulação da própria série.
Apêndice C 223
p
Z t = 1Z t −1 + 2 Z t − 2 + ... + p Z t − p + t = j Z t − j + t (C.52)
j =1
Onde Zt = Z t − . É comum também usar operadores que defasam as variáveis no tempo para
representação de séries temporais de modo mais compacto. Por exemplo, pode-se reescrever a Eq.
(C.51) com operadores, assim tem-se que:
Z t = + 1 BZ t + 2 B 2 Z t + ... + p B p Z t + t (C.53)
Onde Zt–1=BZt e B(BZt)=B2Zt. De maneira geral, BpZt=Zt–p. Assim, a Eq. (C.53) pode ser
resumida para:
p ( B) Z t = + t (C.54)
Ou seja:
k = 1 k −1 , k 1 (C.57)
k = 1 k −1 k 1 (C.58)
= 1 , k = 1
kk 1 (C.59)
0, k 2
O processo autorregressivo de segunda ordem AR(2) é definido como:
Z t = 1Z t −1 + 2 Z t − 2 + t , ou (1 − 1 B − 2 B 2 ) Z t = t (C.60)
k = 1 k −1 + 2 k − 2 , k 1, k = 1 k −1 + 2 k − 2 , k 1
1
1 = 1 − , k =1
2
−
2
(C.61)
kk = 2 21 , k=2
1 − 1
0, k =3
_____________________________
EXEMPLO C.4 – Simule 250 valores a partir de um processo
estocástico AR(1), conforme modelo indicado na Eq. (C.62) a seguir,
e elabore dois gráficos indicando os valores das funções de
autocorrelação amostral (FAC) e autocorrelação parcial amostral
(FACP) para 10 passos de defasagem k.
(1 − 1 B)(Z t − 10) = t , com 1 = 0,9 (C.62)
Solução
O modelo descrito na Eq. (C.62) pode ser reescrito como:
____________________________
O modelo AR(1) pode ser útil para representar diversas séries temporais de variáveis
econômicas ou variáveis de interesse nas análises de produção e preço de energia. Por exemplo, a
inflação medida pelo IPCA entre janeiro de 1995 e dezembro de 2009 segue um modelo AR(1) em
Apêndice C 225
que 1=0,55. Veja na Figura C.3 o índice mensal de inflação (IPCA) durante o período de 1995 a
2009 e uma simulação AR(1), onde Zt=1Zt-1+t (onde Zt-1=1,7% em janeiro de 1995).
____________________________
E:
− 1k (1 − 12 )
kk = , k 1 (C.67)
1 − 12( k +1)
O processo de médias móveis de segunda ordem MA(2) é definido como:
Z t = (1 − 1 B − 2 B 2 ) t (C.68)
226 Apêndice C
E:
1 , k = 1,
− 2
kk = 2 21 , k =2 (C.70)
1 − 1
3 − (2 − )
1 2 1 22 2
, k =3
1 − 2 − 21 (1 − 2 )
Uma extensão natural é a composição de um processo puro AR(p) com outro MA(q),
formando, assim, um processo estocástico ARMA(p,q). O processo geral ARMA(p,q) é definido
como:
p ( B) Z t = q ( B) t (C.71)
Muitas variáveis econômicas são séries temporais não estacionárias, particularmente aquelas
relacionadas ao crescimento das atividades produtivas. Em geral, a média e a variância das séries
temporais não estacionárias não são constantes e dependem do tempo t. Por exemplo, o PIB do
Brasil entre os anos de 1950 e 2000 forma uma série temporal não estacionária, no entanto,
possivelmente a taxa de crescimento no PIB pode ser uma série estacionária. De um modo geral,
algumas séries não estacionárias homogêneas tornam-se estacionárias após alguns filtros ou
derivações.
2 Z t = Z t = ( Z t − Z t −1 ) = Z t − Z t −1 − (Z t −1 − Z t − 2 ) = Z t − 2Z t −1 + Z t − 2 (C.75)
Ou:
2 Z t = (1 − B) 2 Z t = (1 − 2B + B 2 )Z t d Z t = (1 − B) d Z t (C.76)
b) Invertibilidade
Outra forma útil para descrever um processo estocástico autorregressivo AR é regredir o valor
de Z com suas variáveis passadas somadas a um ruído branco (choque), ou seja:
Z t = 1 Z t −1 + 2 Z t − 2 + ... + t = t + j Z t − j (C.77)
j =1
Ou:
( B) Z t = t (C.78)
Onde:
( B ) = 1 − j B j , com 1 + j (C.79)
j =1 j =1
228 Apêndice C
De acordo com Box e Jenkins (1976), um processo é invertível se for possível reescrevê-lo
na forma da Eq. (C.77), conforme condição estabelecida na Eq.(C.79). Note que, para um processo
linear Zt=t(B)t ser invertível é necessário reescrevê-lo na forma de um processo AR. Isso se faz
substituindo Zt na Eq. (C.78), ou seja:
( B ) ( B ) t = t (C.80)
Portanto:
1
( B)( B) = 1 ( B) = = −1 ( B) (C.81)
( B)
A condição de invertibilidade garante que os pesos dos valores passados (π j) podem ser
obtidos a partir dos pesos dos choques passados j, o ruído branco (white noise). Além da
estacionaridade, essa condição garante que os pesos π j decaem à medida que a série é deslocada
para trás. Mais exatamente, os maiores pesos devem ser atribuídos às observações mais recentes.
Portanto, conforme argumenta Box e Jenkins (1976), se um processo é não invertível, a previsão
por meio dele não faz sentido.
ds Z t = (1 − Bs ) d Z t − s (C.83)
p
Z t = + 1Z t − s + 2 Z t − 2 s + ... + p Z t − ps + t = + j Z t − js + t (C.84)
j =1
De forma similar, um modelo SMA(q) é dito de médias móveis sazonal de ordem q, quando
representado por:
q
Z t = + t − 1 t − s − 2 t − 2 s − ... − q t − qs = + j t − js , 0 = 1 (C.85)
j =0
Por analogia, um modelo SARMA(p,q) nada mais é do que uma combinação de dois termos,
um SAR(p) e um SMA(q), de modo que:
Autorregressivo
Média móvel
p q
Z t = + i Z t −is + j t − js , 0 = 1 (C.86)
i =1 j =0
Do mesmo modo, se a d-ésima diferenciação de uma série reproduz uma série estacionária do
tipo SARMA(p,q), diz-se que esta série é integrada com ordem d, ou seja, um modelo
SARIMA(p,d,q).
Para determinar o erro de dados previstos pelo método dos mínimos quadrados para um
modelo ARMA, deve-se inicialmente assumir um caso onde d=0 e µ=0, ou seja:
( B) Z t = ( B) t (C.88)
Uma vez que o modelo é estacionário, pode-se representá-lo a partir de um processo de médias
móveis, ou seja:
( B )
Z t = ( B ) t = t = t + 1 t −1 + 1 t − 2 + ... = j t − j , com 0 = 1 (C.89)
( B ) j =0
Onde:
( B) = j B j (C.90)
j =0
230 Apêndice C
Suponha agora que se conheçam as observações até t=n e seja necessário estimar l-passo a
frente, ou seja, o valor de Zt+l como uma combinação linear das observações conhecidas, Zn, Zn-1,
Zn-2,..., uma vez que Zt pode ser escrito conforme Eq. (C.89). Assim, conforme notação, o valor
estimado Zˆ n (l ) de Zn+l é escrito como:
Zˆ n (l ) = *l n + *l +1 n −1 + *l + 2 n − 2 + ... = *l + j n − j (C.92)
j =0
Onde os coeficientes podem ser determinados. Pode-se demonstrar facilmente que o erro é
minimizado quando:
*l + j = l + j (C.93)
Mais exatamente, a melhor estimativa da variável l-passo a frente é dada pela esperança
condicionada ao conjunto de dados disponíveis, ou seja:
Cujo erro:
l −1
en (l ) = Z n + l − Zˆ n (l ) = j n + l − j Zˆ n (l ) = Z n + l − en (l ) (C.95)
j =0
Com isso, pode-se estimar a variável para qualquer passo além dos n dados disponíveis. Em
um processo normal, caso se deseje estabelecer os desvios, limitando a variável para uma faixa de
(1–)100% de possíveis resultados, calcula-se com a expressão a seguir:
1/ 2
l −1 2
Z n (l ) N / 2 1 + j
ˆ (C.96)
j =1
Onde N/2 é o desvio padrão normal tal que P(N>N/2)=/2.
Partindo do modelo geral, Eq. (C.87), pode-se reescrevê-lo para prever Zt+l conforme processo
AR, uma vez que o processo ARIMA é invertível. Ou seja:
( B) Z t +l = t +l (C.97)
Onde:
( B)(1 − B) d
( B) = 1 − j B j = (C.98)
j =1 ( B)
Apêndice C 231
Note que a Eq. (C.100) é idêntica à Eq. (C.95). Assim, a estimativa para um processo
estocástico ARIMA é descrita com uma média ponderada das estimativas prévias. Ou seja:
Zˆ n (l ) = j Zˆ n (l − j ), com l 1 (C.102)
j =1
Pode-se perceber para t≤n, por processo recursivo, que a estimativa acaba sendo expressa
como a soma ponderada dos valores correntes. Por exemplo:
Zˆ n (1) = 1Z n + 2 Z n −1 + 3 Z n − 2 + ... = j Z n +1− j (C.103)
j =1
E:
Zˆ n ( 2) = 1Zˆ n (1) + 2 Z n + 3 Z n −1 + ... = 1 j Z n +1− j + j +1Z n +1− j = (j2 ) Z n +1− j (C.104)
j =1 j =1 j =1
Onde:
Onde:
l −1
= 1(l −i ) + j +l −1 ,
(l )
j para l 1, e (1)
j = j (C.107)
i =1
3
Consultar demonstração em Wei (2006).
232 Apêndice C
IDENTIFICAÇÃO DE MODELOS
Figura C.4 – Padrões das funções FAC E FACP para os processos AR(1), MA(1) E ARMA(1,1)
Tabela C.2 – Características das funções FAC e FACP
A Tabela C.2 indica as características teóricas gerais das funções FAC e FACP para os
processos AR(p), MA(q) e ARMA(p,q) e a Figura C.4 exemplifica os padrões para os casos
específicos AR(1), MA(1) e ARMA(1,1).
Passeio aleatório
O passeio aleatório é um caso particular do modelo ARIMA(p,d,q). Se p=0, d=1 e q=0, a Eq.
(C.82) se reduz a:
(1 − B) Z t = t Z t = Z t −1 + t (C.108)
Note que o passeio aleatório é um caso particular, também, do modelo AR(1) quando 1=1 –
ver Eq. (C.55).
O processo mais simples de Wiener é o movimento browniano com deriva, ou seja, drift:
dZ = dt + dz (C.109)
Figura C.5 – Exemplo de MB com tendência (período 1950 - 2000, amostragem mensal)
234 Apêndice C
A Figura C.6 mostra a melhor estimativa de um processo estocástico do tipo MB com drift.
Utilizando-se da Eq. (C.110) para representar as primeiras 288 amostras (24 anos de 12 meses),
constroem-se curvas de previsão para as demais amostras (600–288=312). Por se tratar de um
processo de Markov, é necessária apenas a última informação (dez/1974) para se construir uma
curva de previsão. A previsão dos valores de x para um tempo T é dada pela seguinte equação:
xˆ1974+T = x1974 + 0.01667T (C.111)
O gráfico indica uma curva tipo MAB com três outras curvas de intervalos de confiança, ou
seja, as trajetórias dos valores previstos para x(t) são obtidas com valor indicado na Eq. (C.111)
adicionado ou subtraído de um, dois ou três desvios-padrão.
Figura C.6 – Melhor estimativa para um MB com drift (intervalo de confiança: 68,4%, 95,5% e 99,7%)
A variância do processo de Wiener cresce linearmente com o tempo e o desvio padrão com a
raiz quadrada do tempo. Portanto, para uma trajetória com intervalo de confiança de 68,4% (um
desvio-padrão) a previsão de T meses é:
O processo de Wiener serve para representar uma gama vasta de processos aleatórios. Os
processos indicados aqui são casos especiais do movimento Browniano generalizado com drift, cuja
equação é:
dx = a( x, t )dt + b( x, t )dz (C.113)
Onde dz, novamente, é o incremento do processo de Wiener e a(x,t) e b(x,t) são funções não
aleatórias conhecidas. Note que o drift e o coeficiente da variância são funções do tempo. O
processo contínuo definido na Eq. (C.113) é chamado de processo de Itô.
Considere a média e a variância desse processo. Uma vez que E(dz)=0, E(dx)=a(x,t)dt, a
variância de dx é igual a E[dx2]–(E[dx]2), o qual contém termos dt, (dt)2 e termos em (dt)(dz) com
ordem (dt)3/2. Para um dt infinitesimal, os termos em (dt)2 e (dt)3/2 podem ser ignorados e a variância
resulta em:
Var[dx] = b 2 ( x, t )dt (C.114)
Apêndice C 235
O termo a(x,t) refere-se à taxa instantânea esperada do processo de Itô e o termo b2(x,t) como
a taxa de variância instantânea.
Um caso especial da Eq. (C.113) é o movimento geométrico Browniano com deriva, drift, em
que a(x,t)=x e b(x,t)=t, onde e são constantes. Nesse caso, a Eq. (C.113) se torna:
dx = xdt + xdz (C.115)
O resultado da esperança do MGB pode ser usado para o cálculo do valor presente esperado
descontado sobre um período de tempo. Por exemplo, note que:
Com x1950=100. Note que 9% a.a. equivale a 0,75% a.m. (1/12 de 9%) e 0,2 de desvio padrão
ao ano equivale a 0,13, ou seja, raiz quadrada de 0,2/12 e t é tomado de uma distribuição normal
com média zero e desvio padrão unitário. Assim, o valor 0,0577 representa α/.
Na Figura C.8 estão indicadas a linha de tendência média e as linhas de previsões com
intervalo de confiança de 66% (dados amostrados a partir de 1970 – 300 amostras mensais), sendo
que as curvas superior e inferior foram feitas a partir de 1974 (48 amostras iniciais). Como o MGB
segue um processo de Markov, apenas o valor x(t) de dezembro de 1974 é necessário para construir
as curvas de previsão. A linha de tendência média é dada por:
xˆ1974+T = (1.0075 )T x1974 (C.122)
(1.0075)T (1.0577) T
x1974 , e (1.0075)T (1.0577) − T
x1974 (C.123)
Figura C.8 – Melhor estimativa para um MGB (intervalo de confiança de 66%, período de 1970 a 1995,
amostragem mensal)
Apêndice C 237
E a variância de ( xt − x ) é:
2
Var[ xt − x ] = (1 − e − 2 t ) (C.126)
2
Note que o valor esperado de xt converge para x à medida que o tempo cresce e a variância
converge para 2/2. Se →, Var[xt]→0, o que implica que a variável x nunca se desvia do valor
x , mesmo que momentaneamente, e se →0, Var[xt]→ 2/t, ou seja, comporta-se como um
processo de movimento Browniano simples.
A Eq. (C.124) é uma versão de um processo autorregressivo de primeira ordem de tempo
discreto, AR(1). Especificamente, a Eq. (C.124) é o caso limite quanto t→0 do seguinte processo
AR(1):
=
2
2
2
(
1 − e −2 ) (C.128)
4
Por exemplo, o preço do óleo pode flutuar em função de guerras e/ou revoluções envolvendo países produtores de
petróleo ou mesmo devido a determinações dos países da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).
Apesar dessa modelagem ser utilizada para essa commodity, é importante observar que os preços marginais em cada
país produtor diferem substancialmente da cotação internacional, uma vez que os custos de exploração são
diversificados em função das condições geológicas de cada jazida.
238 Apêndice C
O parâmetro da Eq. (C.124) pode ser estimado usando dados de tempo discreto disponíveis
na seguinte regressão:
xt − xt −1 = a + bxt −1 + t (C.129)
log(1 + bˆ)
ˆ =
ˆ (C.130)
(1 + bˆ) 2 − 1
LEMA DE ITÔ
F F 1 2F 1 3F
dF = dx + dt + (dx) +
2
(dx)3 + ... (C.134)
x t 2 x 2
6 x 3
Os termos de ordem superior (terceira, quarta etc) podem ser desprezados. Assim, o Lema de
Itô fica definido pela seguinte equação:
F F 1 2F
dF = dt + dx + (dx) 2 (C.135)
t x 2 x 2
Substituindo dx da equação que define o processo de Itô – Eq. (C.113) – , resulta em:
F F 1 2 2F F
dF = + a ( x, t ) + b ( x, t ) 2 dt + b( x, t ) dz (C.136)
t x 2 x x
Pode-se facilmente estender a expansão da série de Taylor para funções de vários processos
de Itô. Por exemplo, supondo que F=F(x1,x2,...,xm,t) seja uma função temporal de m processos de
Itô x1,x2,...,xm, onde:
dxi = ai ( x1 , x2 ,..., xm , t )dt + bi ( x1 , x2 ,..., xm , t )dzi , i = 1,2,..., m (C.137)
Com E(dzi,dzj)=ijdt. Então, aplicando-se o Lema de Itô, resulta a seguinte diferencial dF:
F m
F 1 m m 2F
dF = dt + dxi + dxi dx j (C.138)
t i =1 xi 2 i =1 j =1 xi x j
Assim, substituindo dxi da Eq. (C.137), resulta:
F m
F 1 m 2 2F
dF = + ai ( x1 , x2 ,..., xm , t ) + bi ( x1 , x2 ,..., xm , t ) 2
t i =1 xi 2 i =1 xI
(C.139)
1 m 2
F m
F
2 i j
ij bi ( x1 , x2 ,..., xm , t ) dt + bi ( x1 , x2 ,..., xm , t )
xi x j i =1 xi
dzi
_____________________________
EXEMPLO C.5 – Considere a função F(x)=xβ, onde x segue um
comportamento tipo MGB de acordo com a Eq. (C.115). Indique como
calcular a esperança do valor presente descontado de uma taxa r
definida por:
Solução
O Lema de Itô pode ser aplicado na função F, resultando em:
Simplificando, chega-se a:
1
dF = + ( − 1) 2 Fdt + Fdx (C.142)
2
Note que a Eq. (C.142) indica que F segue um MGB. Assim, pode-
se usar a Eq. (C.120) para dedução do valor esperado, ou seja:
xo
dF =
1 2 (C.143)
r − − 2 ( − 1)
Box, G. E. P., and G. M. Jenkins. 1976. Time Series Analysis, Forecasting, and Control. San
Francisco: Holden-Day, Inc.
BUENO, R. L. S. 2012. Econometria de Séries Temporais. 2nd ed. São Paulo: Editora Cengage
Learning.
Montgomery, C.D., and L.A. Johnson. 1976. Forecasting and Time Series Analysis. New York:
McGraw-Hill.
Morettin, P.A., and C.M.C. Toloi. 1985. Previsão de Séries Temporais. 2nd ed. São Paulo: Atual
Editora.
Wei, W. W. S. 2006. Time Series Analysis – Univariate and Multivariate Methods. 2nd ed.
Boston: Pearson Education.
(BUENO 2012)
242 Apêndice D
APÊNDICE D:
DISTRIBUIÇÕES DE PROBABILIDADES
DISTRIBUIÇÕES DISCRETAS
a) Distribuição binomial
Onde:
n! n
C xn = = (D.2)
x!( n − x)! x
Onde x é a variável aleatória binomial, significando o número de sucessos em n repetições do
experimento; p(x) é a probabilidade de obter x sucessos em n tentativas independentes do
experimento; p é a probabilidade de sucesso para uma única tentativa; 1–p é a probabilidade
complementar (fracasso); e n é o número de vezes que o experimento é realizado. Na distribuição
binomial tem-se, portanto, como características: (a) somente dois eventos podem ocorrer; (b) cada
tentativa no experimento é independente das outras; e (c) a probabilidade de cada ocorrência se
mantém constante para cada tentativa. Uma forma mais descritiva de apresentar a distribuição
binominal é:
n
p ( x) = p (sucesso ) p (falha )
x n− x
(D.3)
x
Em algumas situações se deseja obter a probabilidade combinada de um grupo de resultados.
Esses resultados normalmente são do tipo “mais do que” ou “menos do que” determinado valor. No
caso de distribuição binomial cumulativa, a expressão corresponde à soma das probabilidades
consideradas, ou seja:
n
p( x) = C xn p x (1 − p) n− x (D.4)
x =k
1
Originária da distribuição de Bernoulli – essa distribuição é discreta de espaço amostral {0, 1}, com probabilidade
p(0)=1–p e p(1)=p. O cientista suíço Jakob Bernoulli (1654-1705) foi o primeiro matemático a desenvolver o cálculo
diferencial para além do que fora feito por Newton e Leibniz, aplicando-o a novos problemas. Se x1, x2,...,xn são n
distribuições de Bernoulli independentes com o mesmo parâmetro p, então sua soma x=x é uma distribuição binomial.
Apêndice D 243
A distribuição binomial pode aproximar-se da distribuição normal nos casos em que n for
muito grande e p não seja próximo de zero. A aproximação é tão mais verdadeira quanto mais o
valor de p se aproxima de 0,5 ou quando se verifica a condição dada pela Eq. (D.5) a seguir:
np(1 − p ) 25 (D.5)
A esperança e a variância de uma variável aleatória x que tem distribuição binomial são,
respectivamente:
E ( x) = np e 2 = np(1 − p) (D.6)
b) Distribuição de Poisson
e − t ( t ) x
p ( x) = (D.7)
x!
Onde x é o número de ocorrências; é a taxa média por unidade de medida; e t é o número
de unidades. O valor t representa a média de ocorrências no intervalo de medida t, portanto: t=µ.
Assim, a Eq. (D.7) se torna:
e − () x
p( x) = (D.8)
x!
Note que a distribuição de Poisson é caracterizada por um único parâmetro, sua média. Tanto
o valor esperado como a variância de uma distribuição de Poisson é a sua média, t.
DISTRIBUIÇÕES CONTÍNUAS
a) Distribuição uniforme
2
A distribuição de Poisson foi apresentada por Siméon-Denis Poisson (1781-1840) e publicada com a sua teoria da
probabilidade em 1838 no seu trabalho “Recherches sur la probabilité des jugements en matières criminelles et matière
civile”.
244 Apêndice D
tratamento de erros. Observe na Figura D.1 que todos os valores de x entre xmin e xmax têm a mesma
probabilidade de ocorrência.
xa 0; x a
0; x − a
f ( x) = (b − a) −1 , a x b, F ( x) = , a xb (D.9)
0; x b b − a
1; x b
_______________________
EXEMPLO D.1 – Com base na definição do valor esperado e da
variância dados pelas Eqs. (C.8) e (C.16) (do Apêndice C)
respectivamente, determine E(x) e var(x) para uma distribuição
uniforme.
Solução
De acordo com a definição do valor esperado de uma distribuição
contínua, tem-se que:
b b x
E ( x) = xf ( x)dx =
a
a b−a
dx (D.10)
Ou:
b
1 x2 (b 2 − a 2 ) (b + a )(b − a ) a + b
E ( x) = = = = (D.11)
(b − a ) 2 a
2(b − a ) 2(b − a ) 2
Logo:
b 3 − a 3 ( a + b) 2
var( x) = E ( x 2 ) − E ( x) = −
2
(D.13)
3(b − a) 4
Que resulta em:
(b − a ) 2
var( x) = (D.14)
12
_______________________
Os simuladores estatísticos ou planilhas de cálculo possuem um gerador de números
aleatórios que gera valores entre 0 e 1 seguindo uma distribuição uniforme. A simulação Monte
Carlos, por exemplo, utiliza esse recurso. Esse número é chamado de pseudoaleatório, uma vez que
é possível repetir a mesma sequência a partir de uma “semente aleatória” 3.
b) Distribuição normal
3
A semente aleatória é um número ou vetor usado para iniciar um algoritmo gerador de números pseudoaleatórios –
gera uma sequência de números aproximadamente independentes uns dos outros. Existe um hardware para geração de
número verdadeiramente aleatório.
4
Abraham de Moivre (1667-1754) – matemático francês. Ficou famoso com a publicação da Fórmula de Moivre, que
relaciona os números complexos com a trigonometria e por seus trabalhos relacionados à teoria de probabilidade, a
distribuição normal. De Moivre foi o primeiro a usar princípios atuariais e bases científicas para o cálculo de seguros
de vida no ano de 1725.
246 Apêndice D
A curva do lado esquerdo da Figura D.2 ilustra uma curva de distribuição normal com as
respectivas áreas de acordo com o desvio padrão. A do lado direito indica a função densidade de
probabilidade e a função distribuição acumulada.
O domínio da função normal estende-se de −∞ até +∞. O valor da média divide a curva em
duas partes e o valor do desvio padrão determina a extensão do espalhamento ou dispersão da
variável. Como a área total sob a curva é igual a 1, conclui-se que, quando a média (altura) é
reduzida, a curva deve espalhar-se para as laterais para manter a mesma área total unitária. Adota-
se a seguinte notação quando uma variável aleatória x tem uma distribuição normal:
x N (, 2 ) (D.16)
Quando =0 e 2=1, reduz-se para a curva normal padrão cuja função densidade e
distribuição de frequência acumulada são respectivamente:
1 − x2 / 2 1 −t 2 / 2
f ( x) =
2
e , erfc( x) = F ( x) = e dt
2 x
(D.17)
x−
z= (D.18)
Onde x é um valor específico da variável de interesse, μ é a sua média e σ é o seu desvio
padrão. Essa expressão permite determinar o ponto z sobre a curva normal padrão que corresponde
a qualquer ponto x sobre a curva normal. A curva mais simples para se trabalhar é a que tem média
igual a 0 e desvio padrão igual a 1, razão pela qual se transformam as curvas normais para essa
curva padrão. Como a distribuição é simétrica em torno da média, é comum apresentar a tabela para
a metade da distribuição. A tabela é destinada a determinar a área para a variável z sob a metade
direita da curva normal que tem como média 0 e desvio padrão 1. A área sob a curva de uma
distribuição normal N(0, 1) compreendida entre a e b (ver Figura D.3) é calculada com a seguinte
expressão:
1 b − x2 / 2
p ( a x b) =
2 a e dx (D.19)
Um teorema importante da distribuição normal diz que, se uma variável aleatória x tiver uma
distribuição normal N(µ, 2) e se y=ax+b, então y terá uma distribuição normal N(aµ+b, a22).
c) Distribuição exponencial
Onde representa as ocorrências durante um intervalo. Assim, o espaço (ou tempo etc.) entre
ocorrências durante esse intervalo é 1/. A Eq. (D.20) pode ser representada por um gráfico
conforme indicado na Figura D.5.
248 Apêndice D
d) Distribuição lognormal
1 (ln( x) − ) 2
f ( x) = exp −
(D.21)
x 2 2 2
Observe que a distribuição lognormal é caracterizada pela média e pelo desvio padrão. Sabe-
se também que, se ln(x)=y e x é uma variável aleatória com distribuição lognormal, então y é uma
variável aleatória com distribuição normal. A Figura D.6 mostra algumas curvas com distribuição
lognormal.
Pode-se demonstrar que o valor esperado de uma variável que tem distribuição lognormal é:
As distribuições contínuas seguintes são as mais comuns da literatura e são mostradas nesta
revisão apenas a título de informação. Algumas delas podem ser úteis em estudos específicos de
algumas variáveis de natureza diversa.
e) Distribuição de Rayleigh
(
F ( x) = 1 − e− x
2
/ 2b 2
) (D.25)
4− 2
E ( x) = e var( x) = (D.26)
2 2
A distribuição de Rayleigh é utilizada, por exemplo, para representar a magnitude dos vetores
velocidades ortogonais do vento durante um ano, desde que se assuma que tais vetores tenham
5
John William Strutt, 3º Baron Rayleigh (1842-1919) – físico inglês. Junto de William Ramsay, descobriu o elemento
argônio e recebeu por isso o prêmio Nobel de Física em 1904. Ele também explicou porque o céu é azul e fez predições
sobre as superfícies de ondas, hoje conhecidas como ondas Rayleigh.
250 Apêndice D
distribuição normal com igual variância e não sejam correlacionados. Outras aplicações dessa
distribuição estão relacionadas à superfície de ondas e sinais de rádio.
Se x e y são variáveis independentes com distribuição normal N(0,2), então a variável a
seguir:
R = x2 + y 2 (D.27)
Distribuição Gama
Normalmente, a distribuição Gama é parametrizada com =k e =1/. Assim, com essa
parametrização, tem-se a seguinte fdp:
−1 −x
x e x0 , 0
f ( x, , ) = () (D.29)
0 x0
A função Gama é uma extensão da função fatorial para números complexos, definida por:
Apêndice D 251
( ) = 0
t −1e − t dt (D.30)
Onde t é uma variável muda de integração. Essa função, de modo geral, tem a seguinte relação
de recorrência:
(n) = (n − 1)(n − 1) = (n − 1)(n − 2)(n − 2) = ... = (n − 1)(n − 2)...(1) (D.31)
1
= (D.33)
2
O valor esperado da distribuição gama é E(x)=/ e a variância é var(x)=/ 2. Os casos
particulares dessa distribuição são:
• Se =1, resulta que f(x)=e–x, que equivale à distribuição exponencial onde =. Portanto,
a distribuição exponencial é um caso particular da distribuição Gama;
• Se =1/2 e =k/2, onde k é um inteiro positivo maior que zero, a função Gama assume a
seguinte fdp:
1
k/2 x k / 2 −1e − x / 2 , x 0
f ( x, k ) = 2 (k / 2) (D.34)
0, x 0
Essa fdp representa a distribuição qui-quadrada 2(k) com k graus de liberdade, com E(x)=k e
a variância var(x)=2k. Essa distribuição é muito utilizada em testes de significância de várias
amostras para estimar proporções.
Se =k, onde k é um inteiro positivo maior que zero, a distribuição Gama se transforma na
distribuição de Erlang6 com a seguinte fdp:
k
f ( x, k , ) = x k −1e − x x, 0 (D.35)
(k − 1)!
Uma notação usual utilizada em algumas publicações é feita com o auxílio de indicadores
com os quais fica explícito que, fora do intervalo especificado no indicador, a função densidade se
anula. Por exemplo, a fdp da Eq. (D.35) pode ser reescrita incluindo uma função indicadora:
1
f ( x, k ) = x k / 2 −1e− x / 2 I[0, ) ( x) (D.36)
2 (k / 2)
k/2
Onde:
6
Agner Krarup Erlang (1878-1929) – foi matemático, estatístico e engenheiro, pioneiro na Engenharia de Tráfico e
publicou excelentes trabalhos sobre a teoria das filas em estudos de telecomunicações. A distribuição de Erlang é usada
em processos estocásticos da biomatemática.
252 Apêndice D
1; se a x b
I [ a ,b ] = (D.37)
0; para qualquer outro valor de x
Distribuição de Weibull
Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição de Weibull7 com parâmetros k e
, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme Eq. (D.38) a seguir:
k x k −1 −( x / )k
e , x 0
f ( x; , k ) = (D.38)
0, x 0
Onde k>0 é um parâmetro de forma e é um parâmetro de escala. O valor esperado e a
variância da distribuição de Weibull são dados por:
1 2 1
E ( x) = 1 + ; var( x) = 2 1 + − 2 1 + (D.39)
k k k
Distribuição de Cauchy
A distribuição de Cauchy8 se caracteriza por não possuir uma média definida, portanto
também não se pode definir seu desvio padrão. A distribuição de Cauchy tem pouca utilidade em
análise de risco. É usada com frequência na mecânica e na elétrica e em problemas de medição e
calibração.
Essa distribuição pode ser obtida por simulação entre duas distribuições normais
independentes. A função de distribuição de frequência definida é:
1
f ( x) = 2 (D.40)
( x − x0 ) +
2
7
Ernst Hjalmar Waloddi Weibull (1887-1979) – engenheiro e matemático sueco. É reconhecido pelo seu trabalho na
área de fadiga de materiais e na estatística por sua contribuição – a distribuição de Weibull.
8
Também chamada de distribuição de Cauchy-Lorentz em homenagem a Augustin-Louis Cauchy (1789-1857) –
matemático francês e Hendrik Lorentz (1853-1928) – físico premiado com o Nobel em 1902 por seu trabalho sobre
radiações eletromagnéticas.
Apêndice D 253
1
f ( x) = (D.42)
( x 2 + 1)
Distribuição Beta
x −1 (1 − x) −1
F ( x) = 1 (D.43)
0
s −1 (1 − s) −1 ds
Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição de Fischer-Snedecor, com
parâmetros n e d, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme a Eq. (D.45)
a seguir:
n n+ d
n −
1 n 2 2 −1 n 2
f ( x; n, d ) = x 1 + x
n d d (D.45)
xB , d
2 2
Distribuição t de Student
Se uma variável z tem uma distribuição normal N(0, 1) e V tem distribuição qui-quadrado
com k grau de liberdade, então a variável x conforme Eq. (D.48) tem distribuição t de Student com
k graus de liberdade.
z
x= (D.48)
V /k
Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição t de Student com k graus de
liberdade, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme a Eq. (D.49) a
seguir:
k +1
1
− ( k +1)
2
f ( x) =
2 x 2
1+ (D.49)
k k
k
2
Onde é a função gama e com a seguinte propriedade:
k +1
2 = (k − 1)(k − 3)....5 3
(D.50)
k
k 2 k (k − 2)(k − 4)...4 2
2
A distribuição t de Student é aplicada nos problemas de determinação da média a partir de
uma amostra de uma população que segue uma distribuição normal. Nesses problemas, a média ou
o desvio padrão da população são desconhecidos.
Prefixo Editorial: 53193
Número ISBN: 978-85-53193-01-1
Título: Planejamento Integrado de Recursos Energéticos: oferta, demanda e suas
interfaces
Tipo de Suporte: Internet
iei-brasil.org