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GILBERTO DE MARTINO JANNUZZI

JOEL SWISHER
ROBERT REDLINGER

PLANEJAMENTO INTEGRADO DE
RECURSOS ENERGÉTICOS
Oferta, demanda e suas interfaces

2ª edição

Campinas
IEI Brasil
2018
APRESENTAÇÃO
A IEI Brasil apresenta a segunda edição do livro “Planejamento Integrado de Recursos
Energéticos”, escrito originalmente pelos pesquisadores Gilberto de Martino Jannuzzi, diretor da
IEI Brasil, e por Joel Swisher e Robert Redlinger, ambos do United Nations Environment
Programme (UNEP) Centre for Energy and Environment.
A nova edição, que contém atualização de termos, conceitos e bibliografias, ganhou o título
de “Planejamento Integrado de Recursos Energéticos: oferta, demanda e suas interfaces”. Esta nova
versão foi disponibilizada de forma fracionada no site da IEI Brasil (http://iei-brasil.org/livro-pir/),
capítulo a capítulo, enquanto seu processo de revisão estava em andamento. Essa medida objetivou
que estudantes, pesquisadores e demais interessados na área tivessem acesso ao conteúdo, composto
também por apêndices, exercícios práticos e suas respostas. Os quatro capítulos que compõem a
obra agora estão consolidados neste livro digital. As soluções dos exercícios apresentados ao longo
dos capítulos podem ser acessadas em uma planilha disponibilizada nesse link.
O livro foi revisado por estudantes e colaboradores do professor Gilberto Jannuzzi, em
especial o professor Everthon T. Sica do Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC (Florianópolis)
e João B. Marques que revisaram exercícios e atualizaram algumas referências. A publicação
também contou com a revisão textual e a diagramação da jornalista Gabrielle Adabo da IEI Brasil.
A primeira versão da obra foi publicada há 20 anos, em inglês, sob o título “Tools and
Methods for Integrated Resource Planning”. Em 1997, uma versão impressa em português foi
elaborada por Jannuzzi e Swisher, com o apoio do Procel e do PNUD, porém se encontra esgotada.
Nessas últimas duas décadas, experimentamos muitas e relevantes transformações na
indústria de energia, bem como nas tecnologias, leis e regulações. A revisão do conteúdo deste livro
se fazia necessária para contemplar a realidade da geração distribuída, das tecnologias de
armazenamento de energia e, mesmo, da maior disseminação de tecnologias mais eficientes de uso
final.

Campinas, outubro de 2018

IEI Brasil
SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS ENERGÉTICOS ...... 12

1.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 12

1.2. POR QUE PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS? ................................. 13


1.2.1. O preço do petróleo: crise da década de 1970 ................................................................ 14
1.2.2. A questão ambiental ....................................................................................................... 16
1.2.3. A eficiência energética ................................................................................................... 18
1.2.4. A dimensão humana da energia ..................................................................................... 19
1.2.5. A necessidade de novo enfoque para o planejamento .................................................... 20

1.3. FUNDAMENTOS SOBRE ENERGIA E SISTEMA ENERGÉTICO .......................... 22


1.3.1. As fontes de energia, vetores e usos ............................................................................... 22
1.3.2. Recursos energéticos primários e secundários ............................................................... 22
1.3.3. Eficiência dos sistemas de conversão............................................................................. 24
1.3.4. Energia útil ..................................................................................................................... 25
1.3.5. Contabilidade energética ................................................................................................ 26

1.4. SERVIÇOS DE ENERGIA E A OFERTA DE ELETRICIDADE ................................ 32


1.4.1. Projeções da demanda de energia................................................................................... 32
1.4.2. Objetivos da análise bottom-up ...................................................................................... 33
1.4.3. A estrutura de oferta de eletricidade .............................................................................. 34

1.5. O QUE É PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS?................................... 36


1.5.1. O PIR e o planejamento tradicional ............................................................................... 36
1.5.2. Possibilidades do PIR ..................................................................................................... 39
1.5.3. Os elementos essenciais do PIR ..................................................................................... 43
1.5.4. Quem executa a análise do PIR? .................................................................................... 43

1.6. REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS ................................................................ 46

CAPÍTULO 2 PROJEÇÕES DE DEMANDA DE ENERGIA .............................................. 48

2.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 48

2.2. FINALIDADE, CLASSIFICAÇÃO E EVOLUÇÃO DOS MODELOS DE ENERGIA


50

2.3. ABORDAGEM TOP-DOWN E BOTTOM-UP EM MODELAGEM ............................. 52


2.3.1. Top-Down ....................................................................................................................... 52
2.3.2. Bottom-Up ...................................................................................................................... 53

2.4. MODELOS DE DEMANDA DE ENERGIA (Bottom-up) .............................................. 55


2.4.1. Modelo de usos finais..................................................................................................... 56
2.4.2. Modelo de decomposição ............................................................................................... 71

2.5. MODELOS DE DEMANDA DE ENERGIA (AGREGADO) ........................................ 75


2.5.1. Modelos de regressão ..................................................................................................... 75
2.5.2. Modelo econométrico..................................................................................................... 78
2.5.3. Modelos de séries temporais........................................................................................... 81

2.6. MATRIZ INSUMO-PRODUTO ........................................................................................ 82

2.7. ESTRUTURA E TIPOS DE CENÁRIOS DE PROJEÇÕES ......................................... 84


2.7.1. Cenário de referência ...................................................................................................... 85
2.7.2. Cenário de potencial técnico........................................................................................... 85
2.7.3. Cenário de potencial econômico..................................................................................... 86
2.7.4. Cenário de potencial de mercado.................................................................................... 87

2.8. CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DE CENÁRIOS: CUSTOS E EXTERNALIDADES


87
2.8.1. Teste do Participante....................................................................................................... 89
2.8.2. Teste do Não-participante (RIM).................................................................................... 89
2.8.3. Teste do Custo Total do Recurso (CTR) ........................................................................ 91
2.8.4. Teste do Custo da CE ..................................................................................................... 92
2.8.5. Teste dos Custos Sociais................................................................................................. 92
2.8.6. Sumário dos testes de custo ............................................................................................ 92
2.8.7. Externalidades ambientais .............................................................................................. 93
2.8.8. Benefícios não monetários da eficiência energética ....................................................... 95

2.9. REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS ................................................................. 97

CAPÍTULO 3 PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA, GLD E GERAÇÃO


DISTRIBUÍDA 100

3.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 100

3.2. EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E FONTES RENOVÁVEIS: BARREIRAS ............... 101


3.2.1. Informação .................................................................................................................... 101
3.2.2. Barreiras legais, regulatórias e institucionais ............................................................... 102
3.2.3. Barreiras financeiras e decisões de investimentos ........................................................ 103
3.2.4. Barreiras tecnológicas e de infraestrutura..................................................................... 104
3.2.5. Tarifas e custos de energia ............................................................................................ 104
3.2.6. Diversidade de atores e de expectativas ....................................................................... 105

3.3. TARIFAS, EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E FONTES RENOVÁVEIS ..................... 109


3.3.1. Tarifas em bloco ........................................................................................................... 109
3.3.2. Tarifas a custo marginal................................................................................................ 110
3.3.3. Tarifa horo-sazonal ....................................................................................................... 112
3.3.4. Tarifa verde e subsídios para fontes renováveis ........................................................... 113
3.3.5. Tarifas, custos dos programas de eficiência energética e GLD .................................... 113
3.3.6. Composição da tarifa .................................................................................................... 119

3.4. FONTES RENOVÁVEIS E PROGRAMAS DE SUBSTITUIÇÃO DE ENERGIA .. 120


3.4.1. Substituição entre eletricidade e gás ............................................................................. 120
3.4.2. Substituição entre eletricidade e energia solar.............................................................. 122
3.4.3. Cogeração ..................................................................................................................... 123

3.5. INICIATIVAS GOVERNAMENTAIS ........................................................................... 126


3.5.1. Informação e etiquetagem............................................................................................. 126
3.5.2. Padrões de desempenho e regulamentação ................................................................... 127
3.5.3. Os efeitos dos padrões através do tempo ..................................................................... 130
3.5.4. Licitações tecnológicas ................................................................................................ 132
3.5.5. Mecanismos financeiros e fiscais ................................................................................. 134

3.6. ESTRATÉGIAS DE GERENCIAMENTO DO LADO DA DEMANDA (GLD) ....... 134


3.6.1. Gerenciamento da carga ............................................................................................... 135
3.6.2. Investimentos em eficiência de energia ....................................................................... 136
3.6.3. Avaliação dos programas de GLD ............................................................................... 138
3.6.4. Estimando economias dos programas de GLD ............................................................ 141
3.6.5. Componentes de custo dos programas de GLD ........................................................... 142
3.6.6. Estratégias e programas................................................................................................ 143

3.7. REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS .............................................................. 147

CAPÍTULO 4 INTEGRANDO AS OPÇÕES DO LADO DA OFERTA E DA DEMANDA


150

4.1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 150

4.2. FUNDAMENTOS DO PLANEJAMENTO DA OFERTA DE ELETRICIDADE ..... 150

4.3. CRITÉRIOS PARA PLANEJAMENTO DE CUSTO MÍNIMO ................................ 151

4.4. CUSTOS DE PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE ....................................................... 152


4.4.1. Rendimentos requeridos da companhia elétrica ........................................................... 152
4.4.2. Custos Marginais de Expansão e de Operação (CME e CMO) ................................... 154
4.4.3. Fator de capacidade ...................................................................................................... 161
4.4.4. Fator de Carga (FC)...................................................................................................... 163

4.5. INTEGRAÇÃO DO FORNECIMENTO E OUTRAS AÇÕES DO LADO DA


OFERTA ...................................................................................................................................... 166
4.5.1. A escolha entre fontes/sistemas de produção de eletricidade ...................................... 166
4.5.2. Estratégias de despacho ................................................................................................ 170
4.5.3. Redução de perdas do lado da oferta ............................................................................ 171
4.5.4. Fontes renováveis e problemas de despacho ................................................................ 176

4.6. ANÁLISE DO CUSTO SOCIAL E AMBIENTAL ....................................................... 177


4.6.1. Impactos ambientais da produção de eletricidade ........................................................ 177
4.6.2. Contabilidade das emissões e dos impactos ambientais ............................................... 180
4.6.3. Externalidades .............................................................................................................. 180
4.6.4. Custos das reduções de emissão ................................................................................... 181

4.7. CENÁRIOS DE OFERTA E DEMANDA DE ENERGIA ........................................... 182


4.7.1. Definição de cenários e o cenário de referência ........................................................... 183
4.7.2. Combinando opções de GLD e recursos de oferta ....................................................... 184
4.7.3. Classificando as opções de recurso pelo custo marginal .............................................. 185
4.7.4. Medidas de reduções de emissões pelo custo de emissões conservadas ...................... 188
4.7.5. Inclusão de custos de emissões nos custos marginais .................................................. 191
4.7.6. Escolha da opção pelo custo de redução de emissão ................................................... 192
4.7.7. Estimando impactos nas tarifas de eletricidade ............................................................ 193
4.7.8. Contabilizando os recursos de oferta intermitentes...................................................... 195
4.8. REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS ............................................................... 198

APÊNDICE A .............................................................................................................................. 199

APÊNDICE B: FUNDAMENTOS DE ANÁLISE ECONÔMICA ......................................... 202

APÊNDICE C: FUNDAMENTOS ESTATÍSTICOS – SÉRIES TEMPORAIS ................... 213

APÊNDICE D: DISTRIBUIÇÕES DE PROBABILIDADES ................................................ 242


LISTA DE FIGURAS
Figura 1-1 – Consumo per capita de energia × IDH (130 países) .................................................. 14
Figura 1-2 – Evolução da matriz energética primária do Brasil ..................................................... 15
Figura 1-3 – Evolução da produção e do consumo de petróleo no Brasil (1970-2014) (mil m3) ... 16
Figura 1-4 – Previsão da matriz energética primária mundial em 2035 ......................................... 17
Figura 1-5 – Tipos de eficiência energética .................................................................................... 19
Figura 1-6 – Uma visão do Planejamento Integrado de Recursos .................................................. 21
Figura 1-7 – Fluxo de energia ......................................................................................................... 23
Figura 1-8 – Eficiência do uso final................................................................................................ 26
Figura 1-9 – Visão simplificada do balanço de energia do Brasil – 2010 ...................................... 28
Figura 1-10 – Exemplo de curva de duração de carga .................................................................... 34
Figura 1-11 – Exemplo de curva de carga ...................................................................................... 35
Figura 1-12 – O tradicional modelo de planejamento elétrico a custo mínimo .............................. 36
Figura 1-13 – Modelo integrado de carga e custo de produção elétrica a custo mínimo ............... 37
Figura 1-14 – Comparação entre o planejamento energético convencional e o PIR ...................... 38
Figura 2-1 – Visão geral dos principais elementos para suporte à tomada de decisão em
planejamento ................................................................................................................................... 49
Figura 2-2 – O planejamento da demanda, os cenários de demanda e oferta e sua relação com os
objetivos de desenvolvimento nacional .......................................................................................... 50
Figura 2-3 – Evolução dos modelos de demanda de energia .......................................................... 51
Figura 2-4 – Intensidade energética de transporte entre 2000 e 2010 ............................................ 59
Figura 2-5 – Demanda pelo método de decomposição e conteúdo energético (2000 a 2010) –
EXERCÍCIO 2.7 ............................................................................................................................. 74
Figura 2-6 – Consumo de petróleo no Brasil com base em modelo de regressão – EXERCÍCIO 2.8
......................................................................................................................................................... 78
Figura 2-7 – Consumo de petróleo no Brasil com base em modelo econométrico – EXERCÍCIO
2.9.................................................................................................................................................... 81
Figura 2-8 – Etapas para elaborar cenários de eficiência de demanda de energia .......................... 84
Figura 2-9 – Curvas de custo marginal – eficiência de energia em iluminação – Suécia............... 86
Figura 2-10 – Fluxograma dos custos de energia ........................................................................... 88
Figura 2-11 – Caso A - Teste RIM quando os custos marginais são altos; caso B - Teste RIM -
custos marginais menores que o custo médio (tarifas) ................................................................... 90
Figura 2-12 – Caso A - Teste CTR falha, já passado o teste RIM; Caso B - passa o teste CTR, Mas
não no teste RIM ............................................................................................................................. 91
Figura 3-1 – Vendas de eletricidade ............................................................................................. 105
Figura 3-2 – Efeito da expansão da capacidade nos custos marginais ......................................... 110
Figura 3-3 – Figura do princípio da otimalidade .......................................................................... 111
Figura 3-4 – Investimentos em conservação em companhias de energia da Califórnia ............... 116
Figura 3-5 – Método de economias compartilhadas da PG&E ..................................................... 118
Figura 3-6 – Composição do preço da tarifa de energia elétrica (BRASIL, 2006 versus EUA,
2011) ............................................................................................................................................. 120
Figura 3-7 – Esquema de um sistema de cogeração ..................................................................... 123
Figura 3-8 – Tendências históricas e padrões de eficiência das geladeiras e dos freezers na Suécia
....................................................................................................................................................... 131
Figura 3-9 – Estratégias de gerenciamento da curva de carga ...................................................... 135
Figura 4-1 – Curvas de custos (CM, CMO, CME e Custo Mínimo) ............................................ 154
Figura 4-2 – Expansão da oferta para atingir o crescimento da demanda de pico – EXEMPLO 4.4
....................................................................................................................................................... 160
Figura 4-3 – Custos marginais – EXEMPLO 4.7 ......................................................................... 163
Figura 4-4 – Fator de carga – obtenção gráfica ............................................................................ 164
Figura 4-5 – Modelo de curva de duração de carga ...................................................................... 167
Figura 4-6 – Modelo de curva de duração de carga incluindo a capacidade existente ................. 168
Figura 4-7 – Curva de duração de carga – sistema dominado por hidroelétricas (estação úmida e
seca) ............................................................................................................................................... 169
Figura 4-8 – Evolução das perdas de eletricidade – Brasil, China e EUA (1980 a 2010) ............ 171
Figura 4-9 – Categorias de perdas ................................................................................................. 172
Figura 4-10 – Relacionamento entre cenários de energia bottom-up e custos marginais ............. 183
LISTA DE TABELAS
Tabela 1-1 – Sistema energético: exemplo ..................................................................................... 22
Tabela 1-2 – Classificações de fontes de energia – exemplos ........................................................ 23
Tabela 1-3 – Exemplos de eficiência de conversão da energia final para energia útil ................... 26
Tabela 1-4 – Balanço energético - exemplo ................................................................................... 27
Tabela 1-5 – Resultados da conversão ............................................................................................ 31
Tabela 1-6 – Fatores de emissão de gás carbono e de carbono por fonte de combustível .............. 31
Tabela 1-7 – Tecnologias de iluminação e suas eficiências em termos de lúmens (Watt) ............. 32
Tabela 2-1 – Exemplo de informação requerida para modelos uso final ....................................... 58
Tabela 2-2 – Penetração de tecnologias de uso final no setor residencial (%) ............................... 58
Tabela 2-3 – Vendas de lâmpadas no México (milhões de unidades) ............................................ 59
Tabela 2-4 – Estimativa de consumo de energia para os principais tipos de lâmpadas, México
(1985-89)......................................................................................................................................... 60
Tabela 2-5 – Consumo de eletricidade incluindo reatores – México (1985-89)............................. 60
Tabela 2-6 – Quadro resumo – modelo básico de usos finais......................................................... 62
Tabela 2-7 – Vendas de equipamentos no Brasil (×1.000) ............................................................. 63
Tabela 2-8 – Consumo anual por aparelho e por residência em Manaus ....................................... 64
Tabela 2-9 – A estrutura de consumo de eletricidade segundo usos finais em alguns países em
percentual (1993) ............................................................................................................................ 64
Tabela 2-10 – Planos de crescimento de Brakimpur ...................................................................... 65
Tabela 2-11 – Indicadores socioeconômicos de demanda de energia – ano de referência X ......... 66
Tabela 2-12 – Dispositivo por classe de renda (P=%) e consumo médio por dispositivo (I=W) ... 66
Tabela 2-13 – Uso (M=Horas/Ano) e consumo E=N×P×M×I (GWh/Ano) ................................... 67
Tabela 2-14 – Cenário socioeconômico – ano projetado (X+10) ................................................... 67
Tabela 2-15 – Consumo de energia – ano projetado E(X+10)=N(X+10)×P×M×I (GWh/Ano) .... 67
Tabela 2-16 – Setor comercial de Brakimpur – consumo do ano de referência (MWh) ................ 68
Tabela 2-17 – Setor comercial de Brakimpur – hipóteses para projeção ....................................... 69
Tabela 2-18 – Consumo projetado por subsetor industrial E(X)=PIB(X)×M×I ............................. 70
Tabela 2-19 – Consumo de eletricidade por uso final por subsetor industrial (C=%) .................... 70
Tabela 2-20 – Distribuição (D=%) e consumo por tipo de motor (CV) por subsetor – E(X)×C×D
em GWh/Ano .................................................................................................................................. 70
Tabela 2-21 – Uso do motor (M em Horas/Ano) e intensidade (I em kW/Motor) ......................... 71
Tabela 2-22 – Número de motores por tipo por subsetor (N)(milhões) ......................................... 71
Tabela 2-23 – Consumo: ano de referência, E(X)=N×I×M e ano projetado,
E(X+10)=N(X+10)×I×M (GWh) .................................................................................................... 71
Tabela 2-24 – Consumo de recursos energéticos primários e PIB por setor do Brasil –
EXERCÍCIO 2.7 ............................................................................................................................. 74
Tabela 2-25 – Modelo de regressão multivariada ........................................................................... 75
Tabela 2-26 – Dados do Brasil – EXERCÍCIO 2.8 ........................................................................ 77
Tabela 2-27 – Cenários – EXERCÍCIO 2.8 .................................................................................... 77
Tabela 2-28 – Dados do Balanço Energético Nacional (EPE 2010) e IBGE – EXERCÍCIO 2.9 .. 80
Tabela 2-29 – Matriz insumo-produto de Leontief ......................................................................... 82
Tabela 2-30 – Testes econômicos primários - custos e benefícios de cenários - DMS/Eficiência . 92
Tabela 3-1 – Taxas de descontos reais implícitas usadas em projetos energéticos ...................... 106
Tabela 3-2 – Dados do EXEMPLO 3.4 ........................................................................................ 108
Tabela 3-3 – Decomposição usando ERAM ................................................................................. 114
Tabela 3-4 – Dados de substituição – EXEMPLO 3.9 ................................................................. 123
Tabela 3-5 – Códigos de energia de construções: limites para capacidade instalada de iluminação
....................................................................................................................................................... 129
Tabela 3-6 – Brakimpur – Idade do estoque de refrigeradores no ano base ................................. 131
Tabela 3-7 – Vantagens e desvantagens de uma Esco para a CE.................................................. 137
Tabela 3-8 – Simulação de custos totais de um programa de descontos para lâmpadas eficientes
....................................................................................................................................................... 142
Tabela 4-1 – Resultados – EXEMPLO 4.1 ................................................................................... 154
Tabela 4-2 – Dados – EXEMPLO 4.2 ........................................................................................... 157
Tabela 4-3 – Dados – EXEMPLO 4.4 ........................................................................................... 158
Tabela 4-4 – Recursos de oferta – EXEMPLO 4.7 ....................................................................... 162
Tabela 4-5 – Perfil de demanda de eletricidade – EXEMPLO 4.8 ............................................... 164
Tabela 4-6 – Esquemas de tarifas – EXEMPLO 4.10 ................................................................... 165
Tabela 4-7 – Gastos com pessoal – EXEMPLO 4.10 ................................................................... 165
Tabela 4-8 – Perfil de carga – EXEMPLO 4.10............................................................................ 165
Tabela 4-9 – Perdas de energia elétrica em alguns países ............................................................. 171
Tabela 4-10 – Dados - EXEMPLO 4.13 ....................................................................................... 182
Tabela 4-11 – Conjunto de exemplos de recursos e seus parâmetros ........................................... 185
Tabela 4-12 – Parâmetros de custo marginal para um conjunto de modelos de recursos ............. 186
Tabela 4-13 – Desempenho para a combinação a custo-mínimo dos recursos ............................. 187
Tabela 4-14 – Desempenho para a combinação a custo-mínimo dos recursos – oferta................ 188
Tabela 4-15 – Desempenho para um sistema integrado de custo-mínimo com 30% de redução de
SO2 ................................................................................................................................................ 189
Tabela 4-16 – Desempenho para um sistema a custo mínimo com 90% de redução de SO 2 ....... 189
Tabela 4-17 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 20% de redução de
NOX ............................................................................................................................................... 190
Tabela 4-18 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 60% de redução de
NOX ............................................................................................................................................... 190
Tabela 4-19 – Custos marginais ($/KWh) incluindo os custos de emissão .................................. 191
Tabela 4-20 – Comparação das tarifas e dos custos – modelos de planos de recurso elétrico...... 195
Tabela 4-21 – Crédito de capacidade para conjunto de modelos de novos recursos .................... 197
12 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

CAPÍTULO 1

PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS ENERGÉTICOS

1.1. INTRODUÇÃO

Sabemos que a energia é necessária para atender às demandas básicas do ser humano
moderno: iluminação, aquecimento/ventilação, energia para cocção, refrigeração, força motriz etc.
Serviços de energia são essenciais para promover o desenvolvimento socioeconômico das
populações e buscar maneiras de prover esses serviços com o menor impacto ambiental é um dos
grandes desafios do século XXI. A produção e o uso de energia são algumas das atividades de maior
impacto no meio ambiente, seja ele no âmbito local ou global. São evidentes os esforços para
controlar as emissões de gases de efeito estufa decorrentes dessas atividades, como demonstra o
resultado da COP 21, a 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
Alterações Climáticas, realizada em Paris no final de 2015. É crescente a preocupação em promover
maior participação de fontes renováveis na matriz energética do futuro e o uso eficiente da energia.
Nas últimas quatro décadas, o planejamento de recursos energéticos migrou da abordagem de custo
mínimo para outra, mais abrangente, integrando os usuários e a geração de energia descentralizada,
a maior consideração com os impactos ambientais e os programas de eficiência energética.
Acidentes nucleares e a preocupação com segurança energética forçaram países a dedicarem maior
atenção a programas de eficiência energética e de inserção de energia renovável em grande escala,
como é o caso da política de estado Energiewende da Alemanha (Strunz 2014). Embora a grande
maioria dos países ainda realize seu planejamento fortemente focado no suprimento, é crescente a
preocupação com o planejamento da demanda de energia. A necessidade de prover acesso a serviços
de energia e atender à elevada demanda de países como China e Índia demonstraram claramente os
limites do planejamento da oferta e a necessidade de promover maior eficiência nos setores de
consumo de energia, incluindo mudanças de hábitos e padrões de consumo.
O aumento da participação de fontes renováveis, inclusive por meio de sistemas de geração
distribuída1, e as vantagens da instalação de redes inteligentes2 (smart grids, em inglês) evidenciam
a importância de se conhecer a demanda e o consumidor de energia. Essa nova dimensão deve,
portanto, ser incorporada no processo de planejamento, que definiremos mais adiante como
Planejamento Integrado de Recursos (PIR).
A metodologia PIR (Planejamento Integrado de Recursos), embora originada nos Estados
Unidos e no Canadá (IRP3), é, hoje, aplicada em muitos países desenvolvidos e em
desenvolvimento, onde a preocupação com o meio ambiente e com o uso racional dos recursos
energéticos ocupa cada vez mais a agenda dos governos locais. As fontes alternativas de energia,
demandadas por uma sociedade que aposta em um futuro em que o uso dos recursos será ditado
pelo meio ambiente, vêm se impondo com mais intensidade para escrever uma nova fase a partir da
primeira década do século XXI. Essa tendência exige um tratamento diferenciado no PIR, dado que
os custos de substituição de fontes tradicionais e os benefícios decorrentes, principalmente por

1
Chamados de geração distribuída aqueles sistemas de geração de eletricidade de pequeno porte instalados junto a
consumidores de eletricidade e que são conectados ao sistema de distribuição podendo, desse modo, disponibilizar a
energia não consumida localmente para os demais consumidores do sistema elétrico.
2
Redes inteligentes são um conjunto de tecnologias de gerenciamento e controle de sistemas elétricos com tecnologias
de informação e comunicação que permitem o fluxo bidirecional de informação e energia entre um usuário em particular
e o sistema elétrico como um todo.
3
IRP é a sigla em inglês de Integrated Resources Planninig (PIR, em português).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 13

reduzir as emissões de gases de efeito estufa, implicam em aspectos ainda mais complexos do
planejamento energético.
Neste capítulo, abordaremos as principais motivações para se pensar em um planejamento
energético que considere de maneira explícita também o consumo de energia e não apenas a oferta.

1.2. POR QUE PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS?

Um maior crescimento econômico tem resultado em aumento de demanda de energia,


especialmente nos setores industrial, comercial e residencial em países em desenvolvimento.
Durante muito tempo, houve a preocupação em vincular o crescimento econômico, medido por
meio do PIB, com o crescimento da demanda de energia. Se isso foi muito evidente no passado,
desde as últimas décadas se observou um desacoplamento entre o crescimento do PIB per capita e
o aumento da demanda energética (Goldemberg et al. 1988; Ockwell 2008). Não obstante, passou-
se a utilizar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 4 como um indicador mais assertivo para
mensurar o desenvolvimento econômico dos países. Conforme se observa na Figura 1-1, existe uma
relação entre o consumo de energia per capita dos países e o correspondente IDH. No entanto, é
importante observar que essa relação não é constante de acordo com a fase de desenvolvimento dos
países. Mesmo entre países aparentemente similares e, portanto, com IDHs muito próximos, pode
haver diferenças muito significativas entre seu consumo energético. O consumo de energia é
particularmente importante para aumentar o IDH naqueles países mais pobres, porém, na medida
em que se avança no IDH, o consumo de energia parece ter menor influência. Na verdade, esse
desacoplamento pode ser visto também ao se analisar emissões de carbono per capita e IDH como
demonstram diversas análises realizadas (Steinberger 2016; Correa and Steinberger 2016; Fischer-
Kowalski et al. 2010). Ao longo do tempo, devido principalmente a melhorias tecnológicas, tem
diminuído a necessidade de energia para se conseguir os mesmos valores de IDH obtidos
anteriormente (Steinberger and Roberts 2009) e, portanto, mesmo que se insistam em vincular
desenvolvimento socioeconômico com crescentes necessidades de energia e de emissões, é
fundamental entender que essa relação está mudando rapidamente e que é importante estabelecer
uma rota de desenvolvimento que promova cada vez mais esse desacoplamento. Esse é um dos
pilares do processo de PIR.
A urbanização e a industrialização têm procurado seguir padrões intensivos em energia
copiados dos países industrializados. A população demanda transporte de bens e pessoas, novos
produtos industriais e outros serviços como saneamento, saúde, comércio etc., que dependem de
energia. Desse modo, construir e operar equipamentos da infraestrutura urbana industrial e
comercial requer energia, especialmente eletricidade, e aumentar padrões de vida material da
população resulta em grandes demandas por novos serviços que também consomem energia. No
entanto, à medida em que essa infraestrutura é estabelecida, o impacto do consumo energético no
IDH é menor.
Quando pensamos nas necessidades futuras de energia, é importante saber para quais fins ela
será necessária, avaliando quais setores e usos finais deverão ser atendidos. Quais serão as
tecnologias que produzirão e utilizarão energia no futuro? Como serão as cidades e seus habitantes?
Será possível atender a uma demanda energética para uma população crescente, com padrões tão
intensivos em energia como aqueles dos EUA ou do Canadá? Essas são algumas das questões que
deverão ser elucidadas.

4
O IDH é um índice criado e monitorado pela ONU para medir o nível de desenvolvimento humano dos países a partir
de indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB
per capita). O valor do IDH (0 a 1) é uma ponderação desses indicadores: IDH=(IDHeducação×IDHlongevidade×IDHrenda)1/3.
14 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

Figura 1-1 – Consumo per capita de energia × IDH (130 países)


Fonte: elaborado a partir de dados da Energy Information Administration dos EUA (EIA 2010)

Na verdade, um conceito central dentro do Planejamento Integrado de Recursos é o interesse


em perceber que almejamos os serviços executados por meio de insumos energéticos. Não nos
preocupa quantos kWh ou litros de gasolina são consumidos e, sim, o que efetivamente fazemos
com esses insumos energéticos. Esse conceito foi introduzido na década de 80 e, nessa época, foi
bastante revolucionário (Goldemberg et al. 1985).
A necessidade de suprir a futura demanda de energia, observando os critérios de
sustentabilidade, modicidade de preços e de segurança energética, é o grande desafio do
planejamento energético atual. Se, por um lado, o planejamento convencional é basicamente focado
na valoração dos recursos e na expansão da oferta para atender a uma demanda de energia
determinada, o PIR procura estimar o que chamamos de recursos da demanda e apontar diferentes
maneiras de se atender aos serviços de energia da população considerando os critérios acima
mencionados.
Nas próximas seções definiremos o que são serviços de energia, recursos de demanda e, de
maneira mais formal, conceituaremos o que é o PIR. Inicialmente, abordaremos alguns fatos que
alteraram o desenvolvimento do setor energético e o seu planejamento nas últimas décadas.

1.2.1. O preço do petróleo: crise da década de 1970

O dramático aumento do preço do petróleo na década de 1970, combinado com a elevação


das taxas de juros, repentinamente terminou com a era da energia barata, levando a um
questionamento do modelo de desenvolvimento adotado até então, baseado essencialmente nessa
fonte energética. A energia se tornou um forte limitante para o progresso econômico de muitos
países em desenvolvimento. Enquanto os consumidores nos países industrializados foram afetados
de maneira relativamente branda e puderam superar seus problemas com maior agilidade, esse não
foi o caso de vários países em desenvolvimento, os quais tiveram que promover cortes do
combustível que necessitavam para atividades essenciais, como a produção de fertilizantes,
defensivos agrícolas, cocção e calefação.
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 15

Após esse choque5, talvez o mais determinante entre as demais crises do petróleo que se
sucederam, os países em desenvolvimento se viram na obrigação de diversificar suas matrizes de
produção de energia primária, a exemplo do Brasil. O preço do petróleo durante os anos de 1970
determinou maiores esforços em termos de redução da dependência externa desse combustível, por
exemplo, por meio da destinação de investimentos para exploração e produção nacional de óleo
bruto e maior uso de hidroeletricidade. As iniciativas para substituir o petróleo importado mostram
a relativa estabilidade de seu consumo durante a década de 80 e início da década de 90. Programas
de substituição de combustíveis foram iniciados durante aquela época, como o Programa Nacional
do Álcool (Proálcool6), com o objetivo de aumentar a produção doméstica de combustível como
uma mercadoria estratégica. Esse programa de produção de energia no Brasil está em meio aos de
maior sucesso e maior duração dentre aqueles que se iniciaram na década de 1970. Hoje, a matriz
brasileira conta com uma expressiva participação de produtos derivados da cana-de-açúcar, a
principal biomassa na produção de energia no país (ver evolução na Figura 1-2).

Figura 1-2 – Evolução da matriz energética primária do Brasil


Fonte: EPE/MME (2012)

A escalada do preço do petróleo, em 2008, tornou a situação energética de alguns países


importadores bastante vulnerável e a volatilidade desses preços indica que a maior diversificação
da matriz energética deve ser um fator importante da estratégia dos países. No Brasil, que havia
sofrido impactos significativos na década de 1970 com a sua dependência do petróleo importado,
não se observaram reflexos negativos em relação à segurança energética, uma vez que a importação
de óleo bruto, em 2008, foi consideravelmente menor (em termos relativos) do que na década de
1970 (Figura 1-3).

5
Pode-se contabilizar cinco crises ou fases de preço do petróleo depois da Segunda Guerra Mundial: 1956 (após o
presidente Gamal Nasser nacionalizar o canal de Suez); 1973 (países da OPEP aumentaram o preço do petróleo em
mais de 300% em protesto ao apoio prestado pelos Estados Unidos a Israel durante a guerra do Yom Kippur); 1979
(crise política no Irã e a consequente deposição do xá Reza Pahlevi); 1991 (guerra do Golfo); 2008 (os preços subiram
mais de 100% entre janeiro e julho em virtude de movimentos especulativos em nível global).
6
O Proálcool foi um programa financiado pelo governo brasileiro a partir de 1975 para substituição em larga escala
dos combustíveis veiculares derivados de petróleo por álcool.
16 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

140.000

120.000

100.000

80.000

60.000

40.000

20.000

-20.000

-40.000

-60.000
1984

1998
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982

1986
1988
1990
1992
1994
1996

2000
2002
2004
2006
2008
2010
2012
2014
PRODUÇÃO IMPORTAÇÃO
CONSUMO TOTAL EXPORTAÇÃO

Figura 1-3 – Evolução da produção e do consumo de petróleo no Brasil (1970-2014) (mil m3)
Fonte: EPE/MME (2015)

Com base na Figura 1-2, pode-se dizer que o Brasil reduziu a participação da lenha e migrou
para o petróleo e o gás natural em quatro décadas (1970 a 2010). Em relação às fontes renováveis,
sua participação é significativa (46,4% em 2013), dada a crescente participação dos produtos da
cana-de-açúcar nesse mesmo período. Já a partir de 2013, a participação da geração térmica é
crescente devido a largo período de estiagem e aumento de consumo de eletricidade.
Após a crise do petróleo da década de 1970, portanto, outras fontes de energia, até então não
interessantes economicamente, passaram a ser consideradas no planejamento. Além disso, o
conceito de segurança energética se tornou parte da política energética de diversos países. Em anos
mais recentes, a energia eólica tem aumentado sua participação, assim como a energia solar
fotovoltaica.

1.2.2. A questão ambiental

O crescimento rápido e mal planejado da produção e do consumo energético levam a impactos


ambientais que podem, inclusive, comprometer o desenvolvimento econômico e social. O uso de
energia, seja por meio de combustíveis fósseis ou nucleares, da exploração em grande escala da
hidroeletricidade ou, ainda, de recursos de biomassa, provoca os mais severos impactos ambientais
tanto em nações em desenvolvimento como naquelas industrializadas. Isso inclui poluição do ar,
geração de lixo radioativo, sedimentação das bacias dos rios, desmatamento, erosão do solo etc. A
crescente percepção ambiental tem oferecido importantes resistências ao desenvolvimento do uso
de algumas fontes energéticas e, também, condicionado a liberação de empréstimos de órgãos
multilaterais ou governamentais sob o aparato de legislações ambientais mais restritivas.
No passado, as questões ambientais eram consideradas secundárias e acessórias à necessidade
do contínuo crescimento econômico das nações. Recentemente, tanto impactos ambientais globais
como locais têm sido identificados como uma restrição potencial ao desenvolvimento. Os avanços
do conhecimento científico no que se refere às mudanças climáticas e sua relação com o aumento
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 17

de emissões de gases de efeito estufa (na sua grande parte originárias das atividades de produção e
uso de energia) vêm influindo de maneira significativa nas opções energéticas dos países.
Nas últimas décadas, e de forma mais acentuada na primeira década do século XXI, a pressão
da sociedade para o uso de energia limpa vem contribuindo para alterar o perfil da matriz energética
mundial, ainda que lentamente. Os relatórios de organismos internacionais, como o Painel
Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC),que são periodicamente publicados, apontam
os impactos sobre o clima provocados por usos de fontes energéticas poluentes, indicando a
necessidade urgente de mitigação desses efeitos (IPCC 2014). As ações são diversas: aumento da
eficiência energética das fontes atuais (poluentes e não poluentes), substituições das fontes
poluentes por fontes alternativas menos poluentes, metas negociadas de emissão, mudança do perfil
do consumidor etc. Pode-se afirmar, a despeito de eventuais controvérsias suscitadas contra esses
relatórios, que o futuro será de energia limpa. No entanto, as fontes fósseis ainda permanecerão na
matriz energética mundial por algumas décadas (ver evolução segundo a IEA na Figura 1-4).
Para atingir as metas de redução programadas, sem mencionar aquelas necessárias para
estabilizar a atmosfera, serão necessárias mudanças tecnológicas para diminuir a intensidade do uso
de combustíveis fósseis na maioria dos sistemas energéticos e aumentar a eficiência no uso de
combustíveis e eletricidade7. Os possíveis instrumentos políticos com os quais se estimulariam essas
mudanças são muitos. Internacionalmente, a maioria das discussões se concentra nas várias formas
de impostos sobre a emissão de carbono e, para algumas regiões, no balanço de emissões negociadas
ou permitidas. Na esfera nacional, diversos países têm implementado regulamentações que
restrinjam o consumo de energia e visem à uma maior eficiência energética, além de estimularem,
por meio de mecanismos econômicos, investimentos que promovam um uso energético mais
racional ou incentivem um maior fomento das fontes alternativas de geração de energia.

Figura 1-4 – Previsão da matriz energética primária mundial em 2035


Fonte: IEA (2010)

Nota: Refere-se a um dos cenários da IEA, chamado de New Policies Scenario, que pressupõe a introdução de
novas medidas, de forma relativamente moderada, para implementar os compromissos de política geral que já foram
anunciados, incluindo aqueles para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e, em certos países, os planos para
eliminar gradualmente os subsídios à energia fóssil.

7
É importante lembrar que cerca de 30% das emissões globais de CO2 advém da operação de centrais termoelétricas.
18 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

A participação dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural) ainda será
significativa em 2035, próxima de ¾ da matriz de energia primária mundial. Apesar do alto custo
de produção em algumas regiões no mundo, dadas as circunstâncias adversas da ocorrência de
formações geológicas onde se encontram esses recursos, não se discute que o petróleo e o carvão
são fontes acessíveis, eficientes e relativamente baratas, embora poluentes.
Os custos da geração de eletricidade a partir de fontes renováveis, notadamente a geração
eólica e a solar fotovoltaica, vêm caindo constantemente e de modo significativo na última década,
a ponto de já serem competitivos comercialmente em muitas regiões e em muitos países.

1.2.3. A eficiência energética

A possibilidade de oferecer um serviço que dependa de menos energia e a constatação de que


o crescimento econômico não está necessariamente atrelado a um maior consumo energético
colocaram em xeque os fundamentos do planejamento dominante até meados da década de 1970
(Ockwell 2008). Outro reflexo da crise do petróleo desse período foi o reconhecimento da grande
ineficiência dos veículos e equipamentos em operação, o que resultou na introdução de políticas de
desenvolvimento tecnológico a fim de inserir no mercado produtos com menor consumo de energia,
ou seja, mais eficientes.
No entanto, talvez a mais convincente vantagem da eficiência energética, até hoje, é a de que
ela é quase sempre mais econômica que a produção de energia. Não resta dúvida que, na maioria
das vezes, investir em tecnologia eficiente para os vários usos finais requererá, também, maiores
gastos de capital. Sistemas e equipamentos eficientes são geralmente mais caros que as tecnologias
que eles substituem, salvo exceções. Entretanto, o custo de conservar 1 kWh é geralmente mais
barato que a sua produção. Ainda, em muitas aplicações, o custo da eficiência é uma pequena fração
dos custos da produção de energia. No entanto, tradicionalmente, esses custos são contabilizados
por agentes diferentes, sendo ora debitados ao consumidor, ora à companhia de energia ou ao
próprio governo.
Podemos classificar em três categorias de Eficiência Energética (EE): EE do lado da oferta,
ou seja, da indústria de produção de energia; EE do lado da demanda ou dos serviços de energia,
ou, ainda, dos chamados usos finais de energia; e, finalmente, uma terceira categoria relacionada a
comportamentos de consumidores, sejam eles indivíduos ou então instituições e corporações
(Figura 1-5).
O fluxo de energia, como será visto adiante, é permeado por uma série de tecnologias cuja
função é converter diversas formas de energia nos serviços desejados, conforme mencionamos. A
indústria de produção de energia é naturalmente estimulada a gerá-la de maneira mais eficiente
porque assim terá mais lucros com a venda de seu produto. Grande parte dos esforços em pesquisa
e desenvolvimento estão, justamente, buscando formas de se extrair e de produzir energia com
menores perdas.
O que chamamos de eficiência energética do lado da demanda ou dos serviços de energia é,
ainda, a categoria que possui o maior potencial de eficiência energética. A dinâmica do mercado, a
estratégia dos fornecedores de equipamentos e os altos custos de transação para substituir ou
modificar as tecnologias em uso, têm oferecido entraves significativos para acelerar a introdução e
a disseminação de novas tecnologias mais eficientes. Frequentemente é necessário recorrer a
instrumentos regulatórios ou legislativos para possibilitar a comercialização de equipamentos mais
eficientes. Incentivos financeiros acoplados a especificações técnicas que garantam o desempenho
energético dentro de padrões cada vez menores de consumo têm sido utilizados para várias
tecnologias de uso final, como motores, refrigeradores, lâmpadas e, inclusive, edificações.
O usuário final é o terceiro elemento fundamental para um sistema energético eficiente. Além
da contribuição importante das tecnologias de conversão energética e da infraestrutura que
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 19

estabelece padrões físicos de eficiência das duas categorias anteriores, o comportamento do


consumidor (e das firmas e corporações) é essencial. Dele dependem decisões importantes como
compra, instalação e operação e uso de equipamentos e processos que consomem energia. Seu
padrão de consumo e estilo de vida determinam, em última análise, a produção, a distribuição e o
consumo de energia de toda a cadeia de produção de bens e serviços de um país ou região. Acesso
à informação, poder aquisitivo, cultura e preferências influem de maneira complexa nas interações
dos consumidores com tecnologias e na demanda final de energia.

Figura 1-5 – Tipos de eficiência energética


Fonte: elaboração própria

1.2.4. A dimensão humana da energia

A energia pode ser vista pela sociedade de várias formas, dependendo do nível de decisão,
influência e necessidades inerentes aos diferentes grupos sociais. Entender essas distintas
percepções é relevante porque elas condicionam a maneira de se realizar o planejamento energético
e como decisões serão tomadas com relação a fontes, tecnologias e usos finais. A energia pode ser
tratada como uma mercadoria (commodity), uma necessidade social ou um recurso estratégico ou
ecológico. À parte dos aspectos técnicos nos quais o conhecimento das leis físicas é necessário para
se entender as diferentes formas de conversão de energia (Patterson 1996), a tomada de decisão
energética é muito influenciada pelo modo como é compreendida pelos agentes que participam
desse processo.
Para melhor entender o que é o PIR, é importante estender o conceito técnico de energia,
conforme bem observaram Stern e Aronson (1984), refletindo o aprendizado sobre os impactos dos
preços de petróleo no comportamento dos consumidores, das corporações e das políticas públicas
de energia desde a década de 1970.
20 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

A visão da energia como commodity aparece em alguns setores importantes da economia,


como os representados por companhias energéticas e os grandes consumidores. São agentes que
dependem da produção, da venda ou da compra de energia. Esse ponto de vista reflete uma gama
de valores baseados no relacionamento comprador-preço-vendedor e exclui, em geral, outros
aspectos não relacionados à transação comercial. Os grandes consumidores, tais como indústrias
eletrointensivas, também compartilham desse enfoque. Esse tipo de visão é dominante naquelas
empresas de energia que somente consideram as vendas de kWh ou barris de petróleo como fonte
de receitas. No caso do setor elétrico essa é a filosofia que tem influenciado as iniciativas de
expansão da oferta e os estímulos ao aumento do mercado de consumo.
A visão ecológica surgiu nos anos de 1970, quando as crises do petróleo obrigaram alguns
países industrializados a usarem mais carvão e energia nuclear como fontes de energia. Diversos
acidentes levantaram a questão da segurança nuclear8, aumentando os cuidados e os investimentos
nesse setor. Os conceitos de poluição ambiental, recursos renováveis e desenvolvimento sustentável
têm sido introduzidos desde então e foram disseminados por grupos e organizações que se
caracterizam por fortes pressões para manter o controle sobre a expansão de atividades do setor
energético. Esses grupos, apesar de não participarem diretamente do mercado de energia comercial,
seja como produtor ou consumidor, sofreram ou se tornaram sensíveis aos efeitos da instalação
nuclear, das grandes instalações hidroelétricas e de combustíveis fósseis com maiores impactos
ambientais e têm sido capazes de influenciar nas decisões político-energéticas.
A energia também pode ser entendida como uma necessidade da sociedade moderna, uma vez
que seus serviços são considerados tão básicos como a infraestrutura de provisão de água,
saneamento, transportes, saúde pública etc. Em muitos países existem medidas para socializar seu
uso, como, por exemplo, subsídios em combustíveis usados por grupos de baixa renda ou para
programas de eletrificação rural. Há setores da sociedade e órgãos públicos que são caracterizados
por desenvolver atividades para manter o acesso de certos grupos de consumidores a serviços
modernos de energia.
Por fim, o aspecto estratégico tem sido determinado de acordo com a localização geográfica
de certas fontes energéticas e da orientação política atual. Ele tem feito muitos países investirem na
exploração de fontes domésticas ou procurarem alternativas mais seguras, apesar de muitas vezes
essas iniciativas envolverem altos custos iniciais. A energia se tornou uma questão de segurança
nacional e tem contribuído decisivamente como justificativa de alguns países para a intervenção
militar em regiões produtoras, o que se evidenciou na guerra do Golfo Pérsico em 1991 e em muitas
outras.

1.2.5. A necessidade de novo enfoque para o planejamento

Os fatores supramencionados começaram a exigir que o suprimento das necessidades de


energia da população fosse mais barato e com menor impacto ambiental. Nesse contexto, surge o
chamado Planejamento Integrado de Recursos. O PIR, como será definido no item 1.5, é o
desenvolvimento combinado da oferta de eletricidade e de opções de gerenciamento do lado da
demanda para fornecer serviços de energia a custo mínimo, incluindo custos sociais e ambientais.
Esse tipo de planejamento incorpora o esforço de se contabilizar o potencial de recursos em
melhorias do uso de energia com o mesmo rigor empregado para se inventariar os recursos de oferta
de energia.

8
Dentre outros acidentes, os mais notórios ocorreram na usina de Three Mile Island em 1979 (Harrisburg, Pensilvânia),
na usina de Chernobyl em 1986 (maior da história até hoje, atingindo regiões da Bielo-Rússia, Ucrânia e Rússia) e na
usina de Fukushima em 2011 (Japão).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 21

Embora a literatura existente sobre Gerenciamento do Lado da Demanda (GLD) e


Planejamento Integrado de Recursos seja considerável, não existe material de ensino suficiente
sobre essas questões ou de treinamento destinado ao público9. É esse o principal objetivo deste
livro: apresentar métodos e ferramentas para o Planejamento Integrado de Recursos. Procura-se
apresentar a metodologia de PIR e as principais ferramentas de análise de uso final de energia no
contexto dos países em desenvolvimento. O livro é destinado a estudantes dos cursos de pós-
graduação em planejamento energético, reguladores do setor de energia, agentes públicos
encarregados do planejamento setorial e também ao pessoal que trabalha em Companhias de
Eletricidade (CEs). Este livro pode ainda ser utilizado por pessoas de companhias de fornecimento
de energia em geral (que não a elétrica); é intenção oferecer-lhes uma forma a suplementar a
avaliação da oferta de fontes energéticas, cujos usos finais não se deem na forma elétrica. Cada vez
mais, uma parcela das fontes energéticas primárias, renováveis e não renováveis, concorre para que
seu uso final se dê na sua forma mais nobre, a elétrica. Este livro traz exemplos realistas, exercícios
e estudos de casos, promovendo a prática e procurando desenvolver no aluno a capacidade de
apreciar e oferecer soluções de problemas relacionados com o planejamento energético em países
em desenvolvimento. Alguns exercícios estão resolvidos e outros são deixados para que o leitor
tente resolver.
Sustentabilidade

Substituição de
energéticos, GLD,

PIR: integrando as opções de recursos


geração Eficiência,
distribuída, "Demand Recursos de demanda
mudança de Response" e
padrões de conservação
consumo
institucionais
Aspectos

Família
Materiais "smart"(redes,
Tecnologias de interface Armazenamento medição,
de energia equipamentos)
Desenvolvimento

Combustíves
Eficiência Eletricidade Recursos de Oferta
energética Calor

Figura 1-6 – Uma visão do Planejamento Integrado de Recursos


Fonte: elaboração própria

O avanço tecnológico está tornando mais difusa a separação entre oferta e demanda de
energia. Por essa razão, incluímos, também, uma classe de tecnologias que chamamos de
tecnologias de interface que possibilitam fluxos bidirecionais de energia, ou seja, o consumidor
pode passar a ser um produtor de energia e pode vender sua geração para o sistema elétrico (Demand
Response). No PIR essas possibilidades também devem ser avaliadas, são novos recursos
energéticos que surgem e que devem ser considerados como opções. A Figura 1-6 ilustra esse
conjunto de possibilidades tanto do lado da oferta, quanto do lado da demanda e das tecnologias de

9
Cabe citar as referências disponíveis em português nos seguintes endereços: http://seeds.usp.br/pir/,
http://seeds.usp.br/pir/pir/pir2.html, http://seeds.usp.br/portal/uploads/09-002.pdf.
22 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

interface. É importante, também, considerar os aspectos institucionais e regulatórios que tornarão


essas possibilidades técnicas economicamente viáveis, maximizando benefícios sociais.

1.3. FUNDAMENTOS SOBRE ENERGI A E SISTEM A ENERGÉTICO

Conceituar energia não é trivial. Nesta seção são apresentados alguns conceitos elementares
sobre energia a partir de seus aspectos técnicos e dentro de um sistema energético, no qual energia
é convertida continuamente de uma forma a outra. Para os objetivos deste capítulo inicial é adotada
uma definição que faça menção ao conceito de desenvolvimento sustentável, sem transgredir o que
é entendido formalmente pela Física: energia é a força motriz (ou trabalho) oriunda de fontes
diversas e, quando aproveitada de forma consciente, promove o desenvolvimento humano dentro
dos limites impostos pelo meio ambiente.

1.3.1. As fontes de energia, vetores e usos

O sistema energético compreende um conjunto de atividades que pode ser dividido em três
níveis:
• Produção e conversão de fontes em vetores energéticos;
• Armazenamento e distribuição dos vetores; e
• Consumo final.
Cada nível inclui uma complexa rede de atividades com o objetivo de extrair energia das
fontes encontradas na natureza e entregá-la ao ponto de consumo. Fontes de energia são as formas
em que a energia é encontrada na natureza. As várias fontes são processadas e convertidas em
vetores que, por sua vez, são armazenados ou distribuídos para os consumidores finais. Dependendo
das atividades nos setores de consumo, a energia é usada para operar máquinas, motores, lâmpadas,
transporte de bens e pessoas, com o objetivo de satisfazer as necessidades de força motriz,
iluminação, cocção, climatização, entre outras. Essas diversas funções são chamadas usos finais
energéticos ou serviços de energia. A Tabela 1-1 exemplifica os componentes de um sistema
energético.

Tabela 1-1 – Sistema energético: exemplo

Fontes Petróleo Carvão Gás Solar Biomassa


Extração,
poço de petróleo mina de carvão poço de gás – agricultura
tratamento
Conversão, célula
refinaria termoelétrica processamento –
tecnologia voltaica
gasolina, diesel, óleo metano, etano, etanol, metanol
Vetores eletricidade eletricidade
combustível etc. GLP etc. etc.
Distribuição e distribuição de gasodutos, rede elétrica, caminhões,
rede elétrica
armazenamento derivados rede de gás uso local dutos
lâmpadas
Consumo final automóveis ar-condicionado fogão a gás automóveis
fluorescentes
Serviços de qualidade do ar,
transporte cocção iluminação transporte
energia conforto térmico

1.3.2. Recursos en ergéticos primári os e secundários

O recurso primário, subdividido em renovável e não renovável, é a energia encontrada na


natureza ainda não submetida a qualquer processo de conversão ou transformação. O conceito de
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 23

recurso primário é usado especialmente em análise de dados estatísticos na composição do balanço


de energia. São exemplos de recurso primário: combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás),
biomassas, energia geotérmica, energia de ondas e marés, energia hidráulica, energia solar, eólica
e energia nuclear10. O recurso secundário, de consumo mais conveniente, provém do recurso
primário por processo de conversão ou transformação (refinarias, destilarias de álcool, usinas de
produção de eletricidade etc.). Os exemplos de recursos secundários mais comuns para efeito de
balanço são: energia elétrica, combustíveis refinados ou sintéticos e o calor. No contexto da Física,
a energia se manifesta nas mais variadas formas: energia química, magnética e em forma de radiação
eletromagnética, térmica, sonora, energia mecânica, potencial, cinética, energia em forma de luz
etc.
A classificação das fontes energéticas como renováveis ou não renováveis pode ser discutível.
A princípio, nenhuma fonte pode ser considerada absolutamente inesgotável. Todavia, fontes de
energia são consideradas renováveis se seu uso pela humanidade não causa uma variação
significativa nos seus potenciais e se suas reposições em curto prazo são relativamente certas. Por
exemplo, a energia solar é considerada renovável, embora ela seja originada de reações de fusão
nuclear que, por sua vez, são irreversíveis. Como exemplo, a Tabela 1-2 apresenta as fontes
energéticas classificadas em recursos primários e secundários renováveis e não renováveis.

Tabela 1-2 – Classificações de fontes de energia – exemplos

Fonte Renovável Não renovável


Recurso primário Hidráulica, biomassas, solar, Carvão, petróleo, gás natural, urânio etc.
eólica etc.
Recurso secundário Hidroeletricidade, biogás, vegetal Gasolina, óleo diesel, termoeletricidade
etc. etc.

De maneira análoga, fontes de energia são consideradas não renováveis se suas reposições
naturais levarem muitos séculos ou milênios sob condições muito particulares, tais como para o
petróleo, e sua reposição artificial é absolutamente impraticável, envolvendo processos com gastos
de energia igual ou maior que a quantidade de energia obtida ou com custos proibitivos (ver Tabela
1-2).

Figura 1-7 – Fluxo de energia


Fonte: elaboração própria

10
Alguns combustíveis nucleares (plutônio, por exemplo) não são encontrados na natureza em qualquer quantidade,
portanto são considerados energias secundárias.
24 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

A energia final inclui algumas formas de recursos primários e secundários que estão
disponíveis para o consumidor, descontando perdas da produção, armazenamento e distribuição.
Esse recurso é convertido em energia útil no ponto do uso final. Energia útil é a energia realmente
demandada pelo consumidor, como calor, luz ou movimento mecânico. A quantidade de energia
útil aproveitada de uma dada quantidade de energia final depende da eficiência da tecnologia do
uso final.
A energia é transformada por meio de uma cadeia de eventos e de conversões. O recurso
primário existe na forma natural, por exemplo, de um combustível fóssil que é extraído de um
depósito sedimentar. Depois de uma série de transformações, a energia se torna disponível para o
consumidor, que a converte em formas úteis que são os serviços de energia (ver Figura 1-7).

1.3.3. Eficiência dos sistemas de conversão

Durante toda a sequência de transformações energéticas representadas na Figura 1-7 existem


perdas, cabendo ao planejador a tarefa de idealizar um sistema que procure reduzi-las de maneira
economicamente atraente e ambientalmente mais segura. Entende-se por eficiência de um sistema
de conversão energética (seja eólico, solar ou de uma termoelétrica qualquer) a razão entre a energia
investida (potência máxima teórica do recurso energético) e a produzida:
Einvestida
S = (1.1)
E produzida
Onde S representa a eficiência do sistema de conversão, sendo que 0<S<1. É comum
definir uma taxa de retorno energético11. A TRE é definida como a razão entre a energia disponível
em uma determinada fonte para aproveitamento em um sistema de conversão e a energia investida
para obtê-la:
Edisponível para conversão
TRE = (1.2)
Einvestida

Se TRE<1, diz-se que o método de exploração para obtenção dessa fonte é o do tipo
sumidouro. Nesse caso, não há ganho de energia. O ganho líquido de energia Enet está relacionado
com a taxa de retorno energético conforme a Eq. (1.3) a seguir:
Enet + Einvestida
TRE =  Edisponível para conversão = Enet + Einvestida (1.3)
Einvestida

A eficiência de um sistema de conversão, além do índice S, pode ser avaliada também pela
TRE, que, quanto maior, indica que mais eficiente ou mais tecnológico é o sistema. Já as máquinas
térmicas (unidades de um sistema) são avaliadas pelo que elas podem fornecer em termos de
trabalho a partir do uso do calor. O rendimento de uma máquina térmica é dado por:
W
T = (1.4)
Qdisponível

Onde Qdisponível é a energia disponível e W é o trabalho obtido com a energia útil. Em todo
sistema térmico parte do calor é utilizada em forma de trabalho (energia útil) e parte é dissipada,
portanto W=Qdisponível–Qdissipada. Assim, o rendimento de uma máquina térmica é:

11
Taxa de Retorno Energético (TRE). O termo em inglês é conhecido como Energy Returned On Energy Invested
(EROEI).
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 25

Qdisponível − Qdissipada Qdissipada


T = = 1− (1.5)
Qdisponível Qdisponível

Logo, quanto menos a energia em forma de calor é dissipada, maior é o rendimento da


máquina térmica.
As máquinas térmicas e outros dispositivos que funcionam por ciclos utilizam normalmente
um fluido para receber e ceder calor. Esse fluido é denominado fluido de trabalho, o qual recebe
calor de uma fonte quente a uma determina temperatura Tq (reator nuclear, queima de combustíveis,
energia solar, energia geotérmica etc.) e rejeita calor não utlizado para um reservatório ou fonte fria,
a uma temperatura Tf. Segundo o Físico francês Nicolas Carnot12, uma máquina térmica tem
rendimento máximo conforme a Eq. (1.6) a seguir:
mín
Tf Tf Qdissipada
Tmáx = 1 − onde = (1.6)
Tq Tq Qdisponível

O rendimento segundo o ciclo de Carnot é teórico, pois se baseia em transformações (duas


isotérmicas e duas adiabáticas) perfeitamente reversíveis, o que na prática é impossível. No entanto,
é útil para avaliar o quão próximo o rendimento de uma máquina térmica real está de uma máquina
teórica ou perfeita. Em outras palavras, a energia dissipada de qualquer máquina térmica é sempre
maior que a mínima teórica.

1.3.4. Energia útil

A energia útil, como já mencionada, é aquela que chega até o consumidor promovendo algum
tipo de serviço. Serviços de energia incluem, por exemplo, iluminação, conforto térmico,
refrigeração de alimentos, transporte, manufatura de produto etc. Geralmente se discute a eficiência
do uso final energético com atenção à conversão de energia final para energia útil realizada em um
determinado equipamento. Esse conceito, na verdade, é mais abrangente. Por exemplo, um ar-
condicionado eficiente pode reduzir a demanda de eletricidade de um prédio comercial, mas uma
construção bem projetada poderia promover o mesmo serviço de energia (conforto térmico) sem o
ar-condicionado. A Figura 1-8 é um exemplo que ilustra o efeito das melhorias na eficiência do uso
final reduzindo os requisitos de entrada energética enquanto mantém o mesmo nível de saída de
serviço para o caso de um motor elétrico (força motriz).
Melhorias técnicas, nos processos e equipamentos, podem aumentar a eficiência de um
sistema típico de motor bomba de 31% (ver Figura 1-8) para 70%. Só a introdução de um
controlador eletrônico de velocidade já produz efeitos na eficiência dos outros componentes. Seja
qual for a configuração de um sistema para fornecer um serviço de energia, a introdução de
melhorias pode reduzir substancialmente o consumo de energia na entrada do sistema e, com isso,
diminuir consideravelmente os custos com energia, além de cobrir o investimento realizado com as
melhorias técnicas.

12
Nicolas Léonard Sadi Carnot (1796 a 1832). Físico, matemático e engenheiro. Autor do primeiro modelo teórico
sobre máquinas térmicas (ciclo de Carnot). Também apresentou os fundamentos da segunda lei da termodinâmica.
26 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

Motor 90%

Figura 1-8 – Eficiência do uso final


Fonte: a partir de Lovins, Fickett e Gellings (1990)

A Tabela 1-3 apresenta exemplos de eficiência energética em sistemas ou serviços de energia.

Tabela 1-3 – Exemplos de eficiência de conversão da energia final para energia útil

Eficiência Eficiência
Sistema Sistema
energética,  energética, 
Motor a combustão interna 10-50% Turbina a gás até 40%

Ciclo combinado de turbina a


até 60% Turbina d’água até 90%
gás e turbina a vapor
6 a 40% (depende da
Turbina eólica até 60% Célula solar
tecnologia)
30-60% (<10W);
Célula combustível até 85% Motor elétrico 50-90% (10-200W);
70-99% (>200W)
Lâmpada de vapor de
Lâmpada fluorescente 28% 40%
sódio
Lâmpada incandescente 5-10% Eletrólise da água 50-70%

1.3.5. Contabilidade energética

Balanço de energia e matriz energética

Um balanço de energia é um sistema de contabilidade que descreve o fluxo de energia por


meio de uma economia durante um dado período, geralmente um ano. Esse conjunto de informações
é atualmente a mais completa fonte disponível de estatísticas de energia oficiais sobre produção,
conversão e consumo, assim como importação e exportação de vetores de energia. O principal
objetivo de um balanço energético é prover informação para o planejamento de investimentos nos
diferentes setores do sistema econômico. Ele também deve indicar onde realizar investimentos em
pesquisa e desenvolvimento para tecnologias de geração e uso mais eficientes.
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 27

O balanço energético pode ser feito por meio de uma matriz, também chamada de matriz
energética13, na qual todas as formas de energia, suas conversões, perdas e usos em um dado período
são registradas em uma mesma unidade de medida. Um balanço energético pode ser apresentado de
diversas formas, cada uma com suas próprias convenções e proposições. A forma mais comum
inclui colunas com quantidades de fontes ou vetores de energia usados e linhas com dados sobre as
transformações energéticas e os setores consumidores. No Brasil, a EPE14 é a empresa subordinada
ao Ministério de Minas e Energia responsável por emitir o balanço energético do país, além de
prestar serviços na área de estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor
energético brasileiro.
A Tabela 1-4 a seguir indica parte de um balanço energético primário do Brasil no ano de
2010 publicado pela EPE.

Tabela 1-4 – Balanço energético - exemplo

(×103 TEP) Petróleo Gás Produtos da Energia


natural cana primária total
Produção, P 106.439 22.771 48.852 253.554
Importação, I 17.496 11.130 0 42.078
Variação de estoques, Vs 959 0 0 2.329
Oferta total, (P+I+Vs) 124.894 33.900 48.852 297.959
Exportação, X –32.614 0 0 –32.614
Perdas na produção, Pprod 0 –6.185 0 –6.185
Oferta interna bruta 92.280 27.716 48.852 259.161
Total de transformação, L –92.304 –10.409 –17.422 –183.681
Refinarias de petróleo –92.304 0 0 –94.279
Plantas de gás natural 0 –2.860 0 –1.139
Centrais elétricas 0 –7.294 –2.716 –49.791
Destilarias 0 0 –14.706 –14.706
Demais transformações 0 –254 0 –23.766
Perdas na conversão e na
distribuição, Pconv 0 –65 –439 –534
Consumo final não
energético 0 736 0 736
Consumo final energético 0 16.532 30.991 74.258
Setor energético 0 5.007 13.171 18.183
Residencial 0 255 0 7.531
Comercial e público 0 262 0 351
Agropecuário 0 2 0 2.525
Transporte 0 1.767 0 1.767
Indústria 0 9.239 17.821 43.902
Ajustes 24 27 0 49

O nome "balanço" se refere ao fato de que as quantidades do recurso energético primário


produzidas devem ser necessariamente iguais às quantidades consumidas, depois de contabilizadas
por mudanças nos estoques, importações e exportações e o valor usado para a conversão em
produtos de recurso secundário, incluindo perdas. Portanto, tem-se que:
P + I + Vs − X − Pprod = L + C FE + C FNE + Pconv + Ajustes (1.7)

13
Alguns autores usam a expressão matriz energética se referindo a um balanço energético ideal proposto pelos
planejadores. Balanço energético se refere a uma contabilidade presente ou do passado.
14
Empresa de Pesquisa Energética, criada pela Lei 10.847, de 15 de março de 2004.
28 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

Onde P é a energia total produzida; I as importações; Vs a variação nos estoques; X as


exportações; e Pprod são as perdas de produção primária. O total de todos os termos do lado esquerdo
da Eq. (1.7) representa a oferta interna bruta. Do lado direito, L refere-se à conversão das fontes de
recurso primário para recurso secundário (vetores), incluindo a produção de derivados de petróleo,
eletricidade, etanol etc.; CFE é o consumo final energético (industrial, residencial, comercial,
transporte etc.); CFNE é o consumo final não energético (i.e. gás natural como um produto
petroquímico); Pconv refere-se às perdas no setor de conversão energética. É comum o balanço
apresentar algumas diferenças líquidas (ajustes). A matriz é preenchida, então, por cada tipo de
produto energético em uso. Os elementos P, I e X se referem ao setor de recurso primário. O termo
CFE pode ainda ser desagregado em subsetores ou desmembrado de acordo com o tipo de uso final,
tais como iluminação, força motriz, condicionamento de ar, aquecimento da água, calor de processo
etc.
Um balanço de energia pode ser expresso em termos de energia útil, agregando dados
referentes à eficiência do uso final energético. Para calcular essa eficiência, é necessário distinguir
dois passos no processo do uso final energético. O primeiro ocorre quando o vetor energético é
transformado em um vetor final de energia e o segundo passo se refere ao caminho do uso desse
vetor energético para produzir bens ou promover o serviço desejado. Por exemplo, o diesel pode
ser usado para produzir vapor em uma caldeira, com uma eficiência de 60%, e o vapor produzido
será distribuído para outras partes de uma indústria onde essa energia será usada. Esse segundo
passo pode ter uma nova eficiência relacionada com a forma na qual o sistema de vapor é projetado
e operado. O exemplo apresentado na Figura 1-9 ilustra também esse aspecto.
Um balanço energético em termos de energia útil requer dados detalhados com relação às
tecnologias de uso final e como elas são utilizadas. Frequentemente, utiliza-se a primeira lei da
termodinâmica. Mais recentemente, discussões com relação ao problema de mudança climática
global, resultante da contínua emissão de dióxido de carbono originário da combustão dos fósseis,
têm levado ao uso de um balanço energético em termos de toneladas de carbono liberado na
produção de energia e nos setores de consumo.

Figura 1-9 – Visão simplificada do balanço de energia do Brasil – 2010


Fonte: elaboração própria
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 29

Unidades e conversão

Existe uma variedade de medidas físicas nas quais os fluxos de energia podem ser expressos
e, muitas vezes, essas quantidades não são necessariamente compatíveis entre si. Por exemplo,
gasolina e etanol são geralmente medidos em litros, consumo de eletricidade em quilowatt-hora
(kWh), carvão em toneladas, petróleo em barris etc. Dessa forma, é necessário e conveniente
expressar as diferentes formas de energia por meio da mesma unidade de medida. O conteúdo
térmico de cada combustível é a forma usada para a contabilização das quantidades de energia, que
podem ser expressas como calorias (cal), joules (J), toneladas equivalentes de petróleo (TEP),
toneladas equivalentes de carvão (TEC), terawatt-hora (TWh) etc.
O conteúdo térmico ou poder calorífico de um combustível é medido por meio de um
calorímetro, que pode determinar o poder calorífico superior (PCS), quando se inclui a quantidade
de calor liberada pela condensação do vapor d'água formado durante a combustão ou o poder
calorífico inferior (PCI), quando esse componente é excluído. O PCS é usado para estimar a
quantidade de energia disponível para o usuário. Na maioria dos países das Américas do Norte e do
Sul, o PCS é usado para as conversões necessárias nas contabilidades de energia nacional e nas
tabelas do balanço energético. Na Europa, o PCI é mais utilizado. Para expressar o conteúdo térmico
de um combustível, estabelece-se uma unidade de medida, mas é sempre desejável indicar o valor
em unidades no sistema SI. Por exemplo, quando se usa a unidade toneladas equivalentes de
petróleo (TEP), é apropriado notar que 1,0TEP = 7,2BEP = 41,87GJ e assim por diante. O Apêndice
A, ao final deste livro, indica diversas unidades de medidas de energia com fatores de conversão
e/ou relações de equivalência energética.
A seguir são apresentados alguns exemplos genéricos para que o leitor se familiarize com
cálculos elementares sobre energia e suas unidades.
_____________________________
EXEMPLO 1.1 – Tomando como base a cotação do carvão e do
petróleo WTI do dia 20/04/2011 na Bolsa de Nova York (U$77,33/ton.
e U$111,66/bbl respectivamente), calcule a relação U$ BTUcarvão/U$
BTUpetróleo. Mais exatamente: quanto vale 1 BTU de petróleo em
relação à mesma energia oriunda do carvão?15

Solução
De acordo com o Apêndice A, uma tonelada equivalente de carvão
(TEC) equivale a 27,78106 BTU ou seja:
77,33
106 BTU carvão = = U$2,78 (1.8)
27,78
Um barril de óleo equivalente tem aproximadamente 5,51106 BTU,
assim:
111,66
106 BTU petróleo = = U$20,26 (1.9)
5,51
Assim, tem-se que:

15
Basicamente são dois tipos de cotação para a commodity Petróleo: o WTI (West Texas Intermediate) – refere-se ao
petróleo comercializado na Bolsa de Nova York (extraído principalmente na região do Golfo do México) e o Brent, que
é comercializado na Bolsa de Londres (extraído no Mar do Norte e no Oriente Médio). O WTI é referência para o
mercado americano e o Brent para o mercado europeu. A Petrobras utiliza em seus projetos a cotação Brent.
30 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

BTU petróleo 20,26


= = 7,28 (1.10)
BTU carvão 2,78
Em outras palavras, uma unidade de BTU oriunda do petróleo
custa mais de sete vezes a mesma energia do carvão. Essa diferença
é explicada pela alta flexibilidade no uso da energia oriunda do
petróleo sobre as possibilidades de uso da energia da fonte carvão.
Encontre, seguindo o mesmo raciocínio, uma relação entre o petróleo
e o gás natural e reflita sobre os resultados.
_____________________________
EXEMPLO 1.2 – Admita que um gerador de vapor que opere com
eficiência de 75% usando óleo combustível consome 65 kg do
combustível por hora a um custo de 81,50 U$/BEP16. Calcule a energia
necessária e o custo para gerar a mesma quantidade de vapor para
as diferentes possibilidades de combustível e de tecnologia a
seguir:
Óleo diesel com gerador de vapor de 85% de eficiência (190,60
U$/BEP);
Gás natural com gerador de vapor de 90% de eficiência (74,20
U$/BEP);
Lenha com gerador de vapor de 35% de eficiência (10,80 U$/BEP);
Carvão com gerador de vapor de 55% de eficiência (47,60 U$/BEP).
Utilizando-se dos dados listados no Apêndice A, qual é o sistema
mais eficiente do ponto de vista energético e econômico?

Solução
De acordo com os fatores de conversão do Apêndice A, obtêm-se
os resultados indicados na Tabela 1-5 a seguir:

Usando informações do
Apêndice A

PCS Óleo Comb. 42,2 GJ/t = 0,0422 GJ/kg


Eficiência
Gerador 75%
Consumo 65 kg/ t vapor
Custo 81,5 U$/BEP = 14,02 U$/GJ

Energia Total 2,74 GJ


Energia
Necessária 2,06 GJ
Custo 1 t
vapor 38,4 U$

Para os demais combustíveis:


16
Os custos são referentes ao ano de 2010. O dólar corrente convertido a dólar constante de 2010 pelo IPC (CPI-U) dos
Estados Unidos.
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 31

Tabela 1-5 – Resultados da conversão


PCS Energia Custo 1 t
GJ/t Eficiência total GJ U$/BEP U$/GJ vapor
Óleo
diesel 44,98 85% 2,42 190,60 32,78 79,33
Gás
natural 38,73 90% 2,29 74,20 12,76 29,17
Lenha 13,81 35% 5,88 10,80 1,86 10,92
Carvão 28,45 55% 3,74 47,60 8,19 30,62

Note que, do ponto de vista energético, o gás natural é melhor


que os demais (dado pela eficiência do gerador de vapor) e, do
ponto de vista econômico, é a lenha, seguida do gás natural. Reflita
sobre os resultados.
_____________________________
EXEMPLO 1.3 – A partir da Tabela 1-6, calcule os fatores de
emissão de gás carbono e de carbono dos cinco sistemas: óleo
combustível, óleo diesel, gás natural, lenha e carvão vegetal.
Discuta os resultados indicando os que possuem menores
contribuições para o aumento de emissões de carbono.
Solução
Utilizando os fatores de emissão fornecidos e os valores de PCS
da Tabela 1-5 chega-se aos resultados indicados na Tabela 1-6:

Tabela 1-6 – Fatores de emissão de gás carbono e de carbono por fonte


de combustível
Fator de Fator de Fator de
Combustível emissão emissão emissão
(kg CO2/kg) (kg CO2/GJ) (kg C/GJ)
Óleo
combustível 3,09436 73,3 20,0
Óleo diesel 3,11997 69,3 18,9
Gás natural 2.01703 52,0 14,2
Lenha 1,44741 104,8 28,6
Carvão
vegetal 3,01621 105,9 28,9

Fonte: Cetesb (2009)

No caso considerado, existe alguma relação entre sistemas


energeticamente eficientes e aqueles com menores taxas de emissões
de carbono?
_____________________________
EXEMPLO 1.4 – Considere a Tabela 1-7 a seguir:
32 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

Tabela 1-7 – Tecnologias de iluminação e suas eficiências em termos de


lúmens (Watt)

Tipos mais comuns


Tecnologia
Lumens/Watts Watt Lumens/Watts Watt
Incandescente
10 60 14 100
convencional
Incandescente
12 10 22 100
halógena
Incandescente
13 54 14 90
eficiente
Fluorescente
67 20 67 90
convencional
Fluorescente
90 32
eficiente 90 16
Fluorescente
65 13
compacta 57 5

Supondo que você queira substituir as tecnologias ineficientes,


encontre casos (substituições) nos quais é possível utilizar outra
tecnologia que mantenha tão próximo quanto possível o mesmo nível
de serviço de energia – iluminação – e que represente uma redução
na conta mensal. Considere três horas de uso diário.

Possíveis substituições:

% dif.
De Para KWh/mês Lumens
Incandescente Fluorescente eficiente
convencional (100W) (16W) -7,56 2,9%
Incandescente Fluorescente convencional
convencional (100W) (20W) -7,20 -4,3%
Incandescente eficiente Fluorescente eficiente
(90W) (16W) -6,66 14,3%
Incandescente eficiente Fluorescente convencional
(90W) (20W) -6,30 6,3%
Nota: Sugere-se ao leitor levantar informações sobre lâmpadas LED e realizar
os cálculos correspondentes. A planilha de cálculo disponível possibilita
considerar essa alternativa.
_____________________________

1.4. SERVIÇOS DE ENERGI A E A O FERT A DE ELETRICIDADE

1.4.1. Projeções da demanda de energia

Na década de 1970, as projeções de demanda de energia eram feitas baseadas nas previsões
macroeconômicas, que extrapolavam essencialmente as relações econômico-energéticas do passado
para o futuro. Essas projeções indicavam invariavelmente um crescimento muito alto da demanda
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 33

de energia e resultavam, em nível internacional, por exemplo, em planos de grande expansão da


capacidade de oferta de energia, especialmente para a geração de eletricidade nuclear e a de carvão.
Esse tipo de análise, também chamada de análise top-down, é caracterizada por considerar a
demanda de energia de forma bastante agregada e não existe preocupação com tecnologias e usos.
A partir de meados dessa década, esse tipo de abordagem já não conseguia projetar a demanda
futura com alguma precisão, estimulando o trabalho de analistas para a compreensão das razões
subjacentes.
Um dos principais resultados dessa análise foi a constatação de que os mercados de serviços
de energia não se comportam como se supunham nos modelos usados e, consequentemente, as
projeções baseadas nesses modelos não refletiam a realidade. Estudos posteriores formaram as
bases da metodologia bottom-up para análises energéticas envolvendo modelos desagregados dos
sistemas que fornecem serviços de energia. Essa metodologia considera tanto oferta de energia
quanto alternativas de uso final e os custos dessas alternativas. Dessa forma, o foco está sobre as
medidas que promovem serviços de energia, em lugar de tratar a energia como uma mercadoria
como era o caso nos modelos até a década de 1970. Essa é uma visão mais ampla em relação à
perspectiva convencional do setor energético, que inclui somente a oferta de energia. Esse tipo de
análise constatou que, em geral, muitos bens e serviços energointensivos estavam atingindo pontos
de saturação nos países industrializados e que diversas melhorias técnicas na eficiência do uso final
de energia estavam se tornando disponíveis. Esses resultados sugeriam que o crescimento
econômico e o bem-estar material poderiam ser mantidos com uma oferta de energia e um impacto
ambiental significativamente menores que os indicados nas projeções até então existentes.
Durante a década seguinte, quase todos os países da OECD (Organization for Economic
Cooperation and Development) revisaram suas projeções de demanda de energia, diminuindo-as
drasticamente. Mais recentemente, o potencial para o uso de energia eficiente como uma estratégia
de desenvolvimento se tornou amplamente reconhecido nos países em desenvolvimento. As
análises bottom-up tornaram-se uma ferramenta de uso comum no panorama da demanda, nas
agências do governo e no planejamento de programas de eficiência energética das CEs (Companhias
Energéticas).

1.4.2. Objetivos da análise bottom-up

O principal objetivo da análise bottom-up é criar uma descrição quantitativa da estrutura


tecnológica da conversão e do uso da energia. Isso começa com uma estimativa atual da demanda
desagregada por serviços de energia, tais como conforto e locomoção e, a partir dessa base, são
propostos cenários futuros, usando diferentes combinações de tecnologias para oferta e demanda
energética. Os cenários de demanda são baseados nos dados de quantidades físicas, que identificam
tecnologias alternativas para cada uso final, avaliando o impacto de seu desempenho e os custos. A
descrição física proporciona um panorama analítico para comparar tecnologias, seus diferentes
desempenhos energéticos, custos e políticas que podem ser adotadas para influenciar suas taxas de
desenvolvimento e uso.
A utilização de cenários é um caminho para se comparar diferentes combinações de
alternativas tecnológicas com o objetivo de proporcionar o mesmo nível de serviços de energia.
Esse nível de serviços deve ser satisfeito por meio de uma combinação de melhorias de eficiência,
além da oferta convencional de energia. É essencial definir um cenário base ou um cenário de
referência como ponto de partida para a análise das melhorias de eficiência energética. O cenário
base para níveis futuros de demanda de serviços de energia é sempre tratado à parte da análise
bottom-up. Ele pode, por exemplo, ser representado pelas projeções oficiais do governo de
crescimento de serviços de energia e da estrutura básica da economia futura.
34 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

Além de procurar identificar os potenciais tecnológicos, a análise bottom-up pode descrever


as limitações e as barreiras do mercado, como taxas de reposição de equipamentos e requisitos de
capital, que restrinjam a implementação de eficiência energética. Sem mudanças políticas, as
distorções do mercado e as barreiras institucionais impedirão o alcance dos potenciais identificados.
Desse modo, cenários alternativos devem ser vistos como atingíveis sob a perspectiva de que os
mercados são reformuláveis e as políticas são destinadas a remover as barreiras identificadas. No
Capítulo 2 é apresentado com detalhes o método de previsão de demanda com base em análise
bottom-up.

1.4.3. A estrutura de oferta de eletri cidade

A principal característica do processo PIR, como foi mencionado, é a análise de ações tanto
no lado da oferta quanto no da demanda de energia. Para o setor elétrico, isso significa trabalhar
tanto com a estrutura de oferta de eletricidade como com a estrutura da demanda. Dado que existem
dificuldades para armazenar a eletricidade produzida, deve haver uma perfeita sincronia entre a
demanda ao longo do dia e a produção de eletricidade nas usinas. O PIR implica em um
conhecimento detalhado das características do mercado consumidor (tecnologias, hábitos dos
consumidores etc.), bem como das peculiaridades do sistema elétrico em operação e sua perspectiva
de expansão. Apresentamos aqui algumas informações que são tradicionalmente utilizadas no
planejamento da expansão do setor elétrico e, nos capítulos seguintes, adicionaremos outras noções
que são importantes para a melhor compreensão do PIR.
Potência demandada

Figura 1-10 – Exemplo de curva de duração de carga


Fonte: elaboração própria

A demanda típica de eletricidade varia consideravelmente durante o curso do dia e do ano.


Geralmente são poucas as horas de demanda de pico (demanda máxima) a cada dia, quando os usos
comerciais e residenciais e a iluminação pública se sobrepõem no final da tarde, restando diversas
horas de baixa demanda durante a noite e o início da manhã. Somando-se a isso, existe, geralmente,
uma época do ano de demanda relativamente alta, devido à sazonalidade dos usos finais de acordo
com o tempo, tais como o uso de ar-condicionado ou de calefação. É fundamental ter esse tipo de
informação para escolher o tipo e as dimensões das usinas a serem construídas para que, quando
colocadas em funcionamento, atendam à demanda prevista. A magnitude da demanda total de
eletricidade de uma região em cada hora do ano pode ser analisada de acordo com sua frequência
de ocorrência. A distribuição acumulada da frequência dos níveis de carga é mostrada na curva de
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 35

duração de carga da companhia elétrica (Figura 1-10). Essa curva representa o número de horas no
ano em que se registram níveis determinados de demanda. De maneira geral, ela mostra poucas
horas de demanda típica de pico e uma redução gradual da carga com um aumento da frequência
acumulada.
A curva de duração de carga pode ser dividida em três níveis, que indicam as diferentes
categorias de operação dos recursos de oferta. A carga mínima é somente o nível mais baixo de
demanda que a companhia identifica, sendo a carga de base aquela que é atingida em 100% do
tempo. As usinas de geração que funcionam na maior parte do tempo (>80% do tempo) numa carga
mínima e constante são os recursos de carga de base. A carga intermediária é o nível de demanda
que ocorre entre 20% e 80% do tempo e as usinas que funcionam para essa fração do ano são
recursos da carga intermediária. A carga de pico é o nível que é excedido em menos de 20% do ano
e a carga máxima é o nível da demanda mais alta do ano. Usinas que trabalham somente durante
essas horas de demanda máxima são recursos de carga de pico.
A frequência do uso de uma usina elétrica afeta tanto sua operação como seu desempenho
econômico. Algumas usinas são capazes de operar acompanhando a carga, variando sua produção
de acordo com o nível da demanda. Tais usinas são bem adequadas para aplicações de carga
intermediária e de pico. Em outras usinas, pode ser difícil e caro mudar o nível de produção
rapidamente, portanto são mais apropriadas para as aplicações de carga de base. Somando-se a isso,
usinas com custos operacionais baixos são mais econômicas como usinas de carga de base, mesmo
que seus custos de capital sejam altos, por causa do seu longo tempo de operação. Usinas com
custos baixos de capital, por sua vez, são econômicas como usinas de carga de pico, sem levar em
consideração seus custos operacionais, pois elas funcionam poucas horas durante o ano.
Frequentemente é necessário conhecer curvas de carga diárias e fazer projeções futuras para
se planejar corretamente a expansão e a operação de um sistema elétrico. No Capítulo 4, esse tema
é tratado novamente no contexto da integração das opções da oferta e da demanda. A Figura 1-11 a
seguir ilustra um exemplo de curva de carga diária mostrando a formação de um pico de demanda
no final do dia. Cabe ressaltar que, recentemente, em diversas ocasiões, o pico de consumo de
energia se deslocou para o período de meio de tarde, em que o consumo principalmente de ar
condicionado atingia níveis elevados. Dado um cenário hidrológico estressado e o registro de
elevadas temperaturas, em alguns casos, fez-se necessário que o Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS) adotasse medidas de redução de fornecimento devido a restrições elétricas nas linhas
de transmissão e restrições de transferência de energia e sobrecarga da demanda. Essas
considerações devem ser contempladas no planejamento da oferta e da demanda energética, a fim
de otimizar o uso dos recursos.

Figura 1-11 – Exemplo de curva de carga


Fonte: elaboração própria
36 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

No Capítulo 4 mostraremos também como relacionar o perfil de carga e de energia na forma


de um fator de carga e de uma curva de duração de carga.

1.5. O QUE É PL ANEJ AMENTO INTEGRADO DE RECURSOS?

1.5.1. O PIR e o planejamento tradicional

O planejamento do setor elétrico moderno necessita contemplar múltiplos objetivos


econômicos, sociais e ambientais. Requer, para tanto, a aplicação de um processo de planejamento
mais complexo que integre esses objetivos quase sempre conflitantes e, ao mesmo tempo, considere
a utilização dos recursos energéticos alternativos e convencionais o mais amplamente possível. Ao
longo deste livro, ao descrever a elaboração e a avaliação de um processo de Planejamento Integrado
de Recursos (PIR), espera-se mostrar métodos úteis para integrar as opções de eficiência energética
e os aspectos socioambientais no planejamento elétrico. Fora do setor elétrico, embora não sendo a
abordagem tradicional, o PIR pode, por exemplo, exercer, também, seu papel na indicação das
melhores alternativas de planejamento da produção de derivados de petróleo. Afinal, hoje no setor
de transporte rodoviário (coletivo e individual) há a opção de escolha entre um veículo de
combustão interna, um elétrico ou, ainda, um híbrido. Desse modo, cada vez mais a fonte fóssil
petróleo integra-se ao setor elétrico concorrendo para o mesmo uso final.
O planejamento elétrico tradicional tem procurado expandir os recursos de oferta com o
propósito de atender ao crescimento da demanda futura com segurança e minimizar os custos
econômicos dessa expansão (ver Figura 1-12). Esses critérios, somados aos aumentos das
economias de escala na geração elétrica obtidos até o momento, levaram a uma estratégia quase que
universal de rápida expansão da capacidade e de promoção do crescimento da demanda, com pouca
consideração sobre a necessidade ou a eficiência do uso energético. Mais recentemente, entretanto,
o aumento dos custos da oferta e as restrições ambientais têm sido suficientes para colocar em xeque
esse conceito de planejamento do setor elétrico de expansão da geração a custo mínimo (least cost
planning). Em alguns países, inclusive, o conceito foi completamente redefinido. Particularmente
no caso brasileiro, a recente crise energética, decorrente de hidrologia desfavorável e falhas no
planejamento, deve servir de insumo para uma revisão da planificação do sistema elétrico, tendo
em vista os alarmantes sinais de preço de energia elétrica resultantes desse cenário.

Figura 1-12 – O tradicional modelo de planejamento elétrico a custo mínimo


Fonte: elaboração própria

O planejamento da CE moderna está evoluindo em direção ao PIR e, cada vez menos, se


pratica preferencialmente a expansão da oferta a custo mínimo (ver Figura 1-13). Isso significa
integrar uma gama mais ampla de opções tecnológicas, incluindo tecnologias para a eficiência
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 37

energética e a gestão de carga no lado da demanda, assim como fontes de geração descentralizadas
e produtores independentes. Mas quer dizer, também, integrar uma faixa mais ampla dos
componentes do custo, incluindo custos ambientais e outros sociais, dentro da avaliação e da seleção
das alternativas técnicas potenciais.

Figura 1-13 – Modelo integrado de carga e custo de produção elétrica a custo mínimo
Fonte: elaboração própria

O resultado esperado das mudanças trazidas pelo PIR é o de criar um ambiente econômico
mais favorável para o desenvolvimento e a aplicação de tecnologias de uso final eficientes,
tecnologias limpas e tecnologias de produção de energia menos centralizadas, incluindo fontes
renováveis. O planejamento baseado no conceito de PIR implica na consideração dessas opções e,
com a inclusão dos custos ambientais, significa que elas poderão parecer relativamente atraentes,
comparadas com as opções de oferta tradicionais.
A dificuldade de implementação de tais mudanças na economia de mercado reside no fato de
que o valor da qualidade ambiental não possui uma conotação econômica clara, já que ela é um bem
social comum e que os benefícios das tecnologias mais limpas e da eficiência energética não são
captados pelo mercado, devido às suas várias distorções e às barreiras institucionais que têm sido
extensivamente documentadas (Fisher and Rothkopf 1989). Assim, planejamento e regulamentação
têm sido usados para corrigir esses problemas e dar incentivos para direcionar o mercado às
tecnologias de energia mais eficientes e menos poluidoras. Preços mais altos da eletricidade são
frequentemente necessários para implementar os planos e as alocações de recursos resultantes do
PIR. No entanto, preços não são uma solução suficiente para um mercado de competição imperfeita
e de informação incompleta.
O PIR é um processo que combina opções de tecnologias de oferta de eletricidade e de
melhorias de eficiência energética, incluindo opções de gerenciamento do lado da demanda (GLD),
para prover serviços de energia a menores custos, incluindo custos sociais e ambientais. A
implementação do PIR requer, em geral, as seguintes etapas:
• a coleta de dados confiáveis sobre padrões de uso final de eletricidade e alternativas
técnicas para melhorar suas eficiências energéticas ou perfil de carga (o tratamento da
demanda deve ser mais em termos dos serviços de energia do que estritamente em kWh);
• a definição e a projeção das demandas de serviços de energia;
• o cálculo dos custos e dos impactos na curva de carga das alternativas do lado da demanda;
• a comparação dos custos das alternativas do lado da demanda com os custos, benefícios e
os impactos ambientais das ofertas de eletricidade (alternativa e convencional);
• a elaboração de um plano integrado de opções de oferta e de ações no lado da demanda
que satisfaçam critérios acordados de custos e qualidade ambiental; e
38 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

• a implementação do plano.
As duas etapas iniciais serão tratadas no Capítulo 2. A demanda total de eletricidade é
desagregada por setor, por uso final e por tecnologias, com o maior detalhamento possível a partir
dos dados disponíveis. Em muitas situações, novas pesquisas são realizadas para levantamento de
informações. As projeções desagregadas dos níveis futuros de serviços de energia podem ser feitas
tomando como base essas informações e os cenários existentes de demanda elétrica.
Na terceira etapa, a ser tratada no Capítulo 3, são identificadas as tecnologias para melhorar
a eficiência do uso final energético ou influenciar o modelo de carga. Os impactos técnicos e
econômicos dessas alternativas são estimados, comparados e ordenados de acordo com seus custos.
Baseados nesses resultados, os programas GLD e outras estratégias de eficiência energética são
analisados em termos dos seus custos totais e das taxas de penetração no mercado dentro do
horizonte de planejamento.
Na quarta etapa, tratada no Capítulo 4, a análise do custo de alternativas de oferta de
eletricidade existentes e novas é usada para ordená-las de acordo com o custo marginal. Os
resultados são comparados com os custos marginais das opções do lado da demanda, incluindo
custos socioambientais. Os dois conjuntos de opções são, então, contrapostos e combinados para
produzir o plano de eletricidade integrado a custo mínimo, incluindo os custos sociais e ambientais.
A implementação efetiva de um PIR vai além do escopo deste livro, embora algumas questões
relevantes sejam discutidas em vários pontos nos capítulos seguintes. O plano integrado de
eletricidade deve ser assunto para novos estudos de política energética, incluindo avaliação
financeira, análise de sensibilidade, análise de incertezas e planejamento de implementação antes
que o plano final seja completado. A incorporação dessas questões deve ordenar a classificação de
alguns planos integrados ou excluir certos recursos do plano. Em geral, esse passo pode ser visto
como a sintonia final dos resultados do PIR por contar com questões específicas e opções inerentes
ao cenário nacional ou local.

Figura 1-14 – Comparação entre o planejamento energético convencional e o PIR


Fonte: elaboração própria
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 39

De uma maneira resumida, a Figura 1-14 compara o planejamento convencional com o PIR.
No PIR os cenários projetados para o desenvolvimento socioeconômico são traduzidos em serviços
de energia, que são requeridos, e é feita uma avaliação dos recursos disponíveis para atender a essa
demanda de serviços. O planejamento convencional se preocupa em projetar necessidades de kWh
e, a partir desse valor, a expansão da geração é planejada.

Incertezas do planejamento da oferta e da demanda

Erroneamente maiores incertezas são associadas ao sucesso de ações do lado da demanda


quando comparadas àquelas referentes às medidas de expansão do suprimento de energia. Existem
diversas dificuldades relacionadas às previsões de produção e aos custos de energia elétrica. As
economias de escalas associadas aos grandes empreendimentos de geração de eletricidade foram
questionadas pelos fatos. As incertezas com relação ao tempo de construção de grandes usinas,
aliadas à variação de juros de financiamentos, resultaram na multiplicação dos custos das usinas
projetadas durante as últimas décadas. Certos impactos socioambientais são difíceis de serem
previstos antes da instalação de um empreendimento e podem onerar ou mesmo inviabilizar a
produção de energia após a conclusão da construção de uma usina hidroelétrica. Preços de insumos
ou combustíveis também afetam o custo final da eletricidade produzida em uma termoelétrica e
estão sujeitos a incertezas futuras. A própria operação do sistema elétrico possui incertezas, sejam
aquelas associadas ao regime de chuvas em sistemas hidroelétricos, como ao desempenho e à
manutenção dos equipamentos do sistema de geração, transmissão e distribuição.
Do lado da demanda, as maiores dificuldades estão relacionadas com a efetiva mensuração
dos efeitos dos programas de eficiência, seja em termos de kWh e kW conservados como, também,
nos seus custos. Ainda é necessário mais pesquisa para se entender com segurança os fatores de
participação do consumidor e a persistência das medidas introduzidas.

1.5.2. Possibilidades do PIR

O PIR procura considerar de maneira explícita uma gama maior de opções de investimentos
para expandir os serviços de energia. A seguir apresentamos algumas das principais ações a serem
estudadas dentro de um PIR.

Ações de GLD e reduções de perda

Como foi dito, um elemento-chave do processo PIR é a avaliação econômica e técnica da


melhoria de eficiência energética nas mesmas bases da expansão da oferta. Nos EUA e no Canadá,
a regulamentação estadual e federal tem feito desse tipo de avaliação uma rotina das atividades da
companhia elétrica. Nesses locais, um fator que torna interessante esse tipo de análise para as
companhias é que muitas possuem uma estrutura verticalmente integrada e têm, portanto, atividades
de geração, transmissão e distribuição de eletricidade. A regulamentação e a fiscalização realizadas
pelas comissões das companhias elétricas públicas (PUCs) têm estimulado uma ampla aplicação e
disseminação dos programas de GLD nas companhias elétricas, reduzindo a demanda de
eletricidade sem comprometer as necessidades de serviços de energia do consumidor 17.
Os investimentos em eficiência energética são avaliados em um processo PIR usando a
mesma taxa de desconto empregada nas análises de investimentos do lado da oferta. Planejadores
avaliam e hierarquizam as opções de oferta, programas de eficiência e outras medidas do lado da

17
Atualmente, o consumidor passa a ter um papel de produtor de energia por meio de sistemas de geração distribuída
assim como possui a figura de um agente que pode vender sua “demanda evitada”, o que se conhece como Demand
Response, na literatura.
40 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

demanda que poderiam fornecer os serviços de energia necessários, começando pelas oportunidades
de menor custo. O PIR requer que o governo ou uma entidade que oferte energia seja capaz de
escolher entre financiar eficiência energética ou pagar os custos marginais da nova eletricidade
sobre bases relativamente iguais, uma vez que se entende que o sucesso da implementação das
medidas de eficiência de uso final não depende somente do critério econômico e da decisão dos
consumidores de energia. As taxas de desconto implícitas aplicadas pelos usuários de energia para
investimentos em eficiência energética, por exemplo, variam de 20% a 200%, comparadas com as
taxas de desconto de 6% a 10% das CEs (Ruderman, Levine, and McMahon 1987). Assim, não se
pode esperar que impostos ecológicos e aumentos no preço da energia levem, por parte dos
consumidores, a investimentos suficientes em tecnologias eficientes de energia. A necessidade de
outras medidas para efetivamente promover a implementação da eficiência energética é justificativa
para uma atuação governamental direta e para a criação de programas de companhias elétricas, tais
como GLD. O processo PIR possibilita uma avaliação rigorosa entre essas medidas e as opções de
oferta.
Um exemplo interessante de aplicação do processo PIR é o caso do Northwest Power and
Conservation Council (NWPCC) nos Estados Unidos. Periodicamente, esse conselho produz
cenários de projeção de demanda para os próximos 20 anos e cenários descrevendo os recursos
existentes para atender à demanda de serviços de eletricidade. O NWPCC fez duas mudanças
importantes no planejamento energético para a região na década de 1990. Primeiro, os cenários
energéticos consideram explicitamente a incerteza da demanda. Segundo, as melhorias de eficiência
energética são tratadas como parte do recurso de oferta de eletricidade. Os cenários distinguem
recursos de oferta de eletricidade existentes e novos, as oportunidades de eficiência energética já
absorvidas pelos consumidores e pelos programas promovidos pelo conselho e outros agentes, e,
também, o potencial de eficiência energética projetado para o futuro. As estimativas do potencial
futuro de eficiência energética levam em conta a penetração do mercado atingível no tempo
projetado, os custos administrativos e as incertezas associadas com a implementação dos
programas. O cenário mais recente identifica, como recurso de custo mais baixo, o potencial de
economias de energia a ser conseguido por meio de programas de eficiência. Isso é suficiente para
satisfazer toda a nova demanda nos cenários que assumem taxas de crescimento econômico baixo
e médio. Já os cenários de alto crescimento requerem recursos adicionais de geração (NWPPC
1991). Os EUA, assim como outros países, vêm realizando, tanto em âmbito estadual como federal,
um planejamento energético que procura incorporar ações de eficiência energética e, também, de
fontes renováveis de energia (Smith and Rogers 2006).
A implementação de medidas de eficiência energética via GLD é a mudança mais comum que
se verifica com o uso do PIR. Entretanto, a estrutura de planejamento necessária para as atividades
do PIR é projetada para acomodar não só opções de gerenciamento de carga e eficiência nos usos
finais, mas, também, medidas de eficiência do lado da oferta, produção independente, geração
elétrica convencional e opções de distribuição. O PIR pode ser particularmente apropriado para
países em desenvolvimento, onde sempre existem severas restrições ao capital e um potencial para
redução de demanda ainda não explorado. Considerações ambientais representam hoje um papel
maior nas decisões de planejamento nesses países e essas características também podem ser
captadas na estrutura do PIR.

Produtores independentes e cogeração

Em anos recentes, verificou-se, em muitos países, um abandono da estratégia de construção


de grandes usinas de geração de eletricidade. Isso pode ser o resultado de duas tendências opostas.
A primeira é uma adoção ampla do GLD, que foi o caso nos EUA e no Canadá, especialmente nos
estados e províncias com agendas ambientais ambiciosas. Tal regulamentação está presente em
outros países que têm encorajado a eficiência energética em seus vários graus por meio de
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 41

informação, de preço, de regulamentação e de outras medidas positivas. A segunda tendência em


vários países é a desregulamentação do setor elétrico, tanto nas regiões industrializadas do mundo,
como naquelas em desenvolvimento. Ainda nos EUA, onde a influência da regulamentação em
nível federal tem permanecido forte, a legislação do PURPA18 estimulou a ampla introdução dos
pequenos produtores independentes na indústria de oferta de eletricidade. Essa mudança está
direcionando para o advento de maior competição na produção de eletricidade e para uma
desregulamentação mais geral do setor energético.
Em muitos outros países, a ênfase está claramente na desregulamentação e/ou na privatização
do setor elétrico, como é o caso do Brasil, com pouca consideração nas implicações diretas pela
eficiência energética e pelo GLD, no âmbito do planejamento do setor. No caso brasileiro,
entretanto, é necessário fazer uma ressalva: desde a década de 90, quando se iniciaram as
privatizações do setor elétrico, outras medidas foram tomadas para garantir investimentos em
programas de eficiência energética e, também, em pesquisa e desenvolvimento (Jannuzzi 2000). No
entanto, essas ações foram efetivamente realizadas por meio das companhias de energia e muito
pouco articuladas por meio de políticas públicas de longo prazo.
As enormes economias de escala, que reduziram os custos de geração constantemente até
1970, determinaram os métodos de planejamento e as decisões na direção de grandes centrais de
geração. Entretanto, a realidade já é outra e as economias de escala nas tecnologias de geração têm
sido bastante reduzidas. Opções descentralizadas, incluindo tecnologias GLD para eficiência
energética e gerenciamento de carga, assim como tecnologias de geração renováveis e pequenas
centrais a gás, especialmente aquelas envolvendo a cogeração de calor e potência, tornaram-se
alternativas bastante competitivas com tecnologias convencionais. A tendência à
desregulamentação poderá acentuar as vantagens dos recursos descentralizados, diminuindo o
horizonte de tempo para planejar e aumentando o risco dos grandes empreendimentos, que podem
ficar ociosos durante certo período.
Nos países em desenvolvimento, o alto crescimento das taxas de demanda por serviços de
energia ainda requererá a expansão da capacidade de geração usando as tecnologias convencionais
e centralizadas. Entretanto, o potencial de introdução de fontes de menor escala e descentralizadas,
incluindo cogeração e produtores independentes, deve ser significativo em muitos países. Um
objetivo do PIR é permitir a avaliação de tais fontes nas mesmas bases da expansão central da oferta.

Impactos ambientais e riscos

Como já mencionado, os padrões ambientais são um dos fatores primordiais motivadores da


aplicação do PIR. Uma das principais razões para perseguir as melhorias de eficiência energética é
que o consumo de energia conduz a consequências negativas, variando da poluição local e de gases
de efeito estufa global para riscos de segurança nuclear e de suprimento de energia, que não são
refletidos nos custos de oferta de energia e nos esforços de planejamento. Por exemplo, o
cumprimento de determinados padrões para controlar impactos ambientais de grandes hidroelétricas
tem influenciado o sistema de planejamento em diversos países como Canadá, Índia, China e Brasil.
Questões ambientais são cada vez mais importantes, na medida em que é crescente a
preocupação com a qualidade e com os padrões do ambiente global e regional, incluindo-se aqui a
ameaça potencial de mudança climática global, que se torna crescentemente séria. A produção e o
uso da eletricidade são, geralmente, algumas das maiores fontes de emissões ambientais, tanto

18
O PURPA (Public Utilities Regulatory Policy Act) foi aprovado pelo Congresso dos EUA em 1978 e referendado
pelo Federal Power Act. Ele estabelece procedimentos e exigências para guiar as comissões regulamentadoras estaduais
no que diz respeito a tarifas e normas de atuação. O PURPA organiza o desenvolvimento da produção de energia por
produtores independentes (IPP) e promove a conservação de energia, o uso eficiente da capacidade existente e tarifas
razoáveis para os consumidores.
42 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

globais como locais. Para reduzir esses problemas com melhorias técnicas, iniciativas inovadoras
de eficiência energética surgem como uma solução economicamente competitiva.
Os custos ambientais das emissões da produção de eletricidade devem ser considerados como
parte daqueles evitados com programas de eficiência e GLD e com o uso de fontes renováveis.
Esses custos podem ser apresentados na forma de taxas cobradas por emissões e pagas pela
companhia elétrica ou podem ser valores simbólicos, usados apenas para priorizar e selecionar
opções de oferta e de programas de eficiência e GLD no processo PIR. A experiência nos EUA e
no Canadá com tais valores mostrou que eles têm pouco efeito nos programas de eficiência e GLD
até agora, mesmo sob uma estrutura de planejamento regulamentada. Sob uma estrutura
desregulamentada, os custos ambientais teriam que ser, de fato, pagos pela companhia elétrica para
ter algum efeito sobre suas prioridades na seleção dos recursos.
De qualquer maneira, independentemente de como os custos ambientais são calculados e
quais são as tecnologias escolhidas para mitigar tais custos, a avaliação dos custos sociais e
ambientais é uma meta importante do PIR como um dos critérios para determinar como a demanda
por serviços de energia deveria ser atingida. As opções tecnológicas para reduzir os efeitos
ambientais incluem eficiência energética via GLD e outros programas, substituição de combustíveis
tanto do lado da oferta quanto da demanda, fontes renováveis, utilização de equipamentos de
controle de emissão para usinas elétricas e compensação de emissões. Incluir os custos
socioambientais no processo PIR torna possível ponderar os prováveis benefícios socioambientais
dessas opções contra seus custos econômicos.

Perspectiva da energia como recurso público

Em muitos países, a garantia de oferta de eletricidade é considerada um serviço público


essencial. A expansão desse serviço para todos os cidadãos é uma componente-chave no
planejamento da infraestrutura da maioria dos países em desenvolvimento, conforme vimos
anteriormente, assim como foi nos países industrializados no início do século passado. Devido à
esse aspecto de serviço público e ao monopólio natural produzido pelas fortes economias de escala
em geração e em transmissão de eletricidade até recentemente, o planejamento da energia elétrica
é conduzido, geralmente, com o objetivo do bem-estar social, propósito mais amplo do que os
interesses particulares das companhias de produção de eletricidade. Em alguns países, isso se
verificou na nacionalização das companhias elétricas ou na manutenção do monopólio e da criação
de concessões. Em outros países, as companhias elétricas privadas têm operado sob um regime de
regulamentação que concede a elas um status de monopólio e ganhos garantidos na troca pela
obrigação de servir a todos os consumidores. Nos EUA, esse conceito tem sido modificado para
incluir metas ambientais, em resposta a um reconhecimento de que os ganhos garantidos tendem a
encorajar as companhias elétricas a investir na capacidade de oferta.
A era de nacionalização de companhias elétricas deu lugar à sua privatização e, na medida em
que a desregulamentação remove os elementos principais que regiam os serviços de eletricidade, a
perspectiva do serviço público pode ainda ser preservada por meio do PIR. Isso é feito com a seleção
de tecnologias e programas para minimizar o custo total do serviço elétrico, incluindo os custos
sociais e ambientais no critério custo. O PIR torna possível projetar um plano para opções de
eletricidade para satisfazer demandas futuras sem desperdiçar recursos naturais ou econômicos
existentes. Companhias privadas que arcam com os ônus dos custos ambientais e são incentivadas
a promover o uso eficiente de energia responderão a esses sinais fazendo investimentos que vão ao
encontro do interesse público.
Em muitos países em desenvolvimento, o governo é o principal responsável pelo
gerenciamento do setor energético e, assim, ele deve ser o agente a adotar a metodologia integradora
para o planejamento energético. Para fazer isso, os governos necessitariam substituir o enfoque
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 43

baseado no desenvolvimento da expansão da oferta para a eficiência com a qual todos os


investimentos em recursos são usados. As vantagens econômicas e socioambientais da melhoria da
eficiência do lado da demanda e da oferta sobre o PIR eventualmente acelerariam o movimento por
meio de regulamentações transparentes, nas quais as companhias elétricas não somente
desfrutariam de autonomia nas suas operações, mas, também, seriam responsáveis por atingir metas
ambientais e de eficiência colocadas pela sociedade.

1.5.3. Os elementos essenciais do PIR

O planejamento energético é uma tarefa complexa que demanda considerações de diversos


setores. Na realidade, o ponto de partida, geralmente, depende de planos de desenvolvimento
econômico e social dos países, mas, em diversas outras situações, o PIR é uma exigência de agências
de regulação para que concessionárias apresentem seus planos de expansão de serviços de energia.
Os órgãos encarregados do planejamento de médio e longo prazos variam muito de país para país e
sempre existe o envolvimento de diversas outras agências públicas e privadas que são consultadas.
O PIR possui, também, potencialmente, a característica de consultar os consumidores de energia.
Em alguns países, essa é uma etapa mandatória para a aprovação do PIR. O planejamento do setor
energético envolve decisões polêmicas sobre escolhas de tecnologias e localização de
empreendimentos. Veja-se o caso de grandes hidroelétricas, como Belo Monte no Brasil, usinas
nucleares na Alemanha e, mesmo, usinas eólicas na Espanha.
Como o PIR não se restringe ao planejamento da oferta, é necessário maior conhecimento e
envolvimento do mercado consumidor, seja dos consumidores propriamente ditos, como de todos
os agentes envolvidos na construção e na manutenção do que chamamos aqui de infraestrutura de
uso final de energia (edifícios, eletrodomésticos, equipamentos consumidores de energia).
Os elementos principais de um PIR são os seguintes:
• a clara definição das instituições responsáveis e da coordenação do processo de
planejamento e articulação entre os envolvidos;
• a transparência e a participação pública;
• a apresentação de metas de curto, médio e longo prazos e maneiras de monitorar o
desenvolvimento do plano;
• os mecanismos de acompanhamento, verificação, correção de rotas; e
• a visão de longo prazo.
Esses aspectos, na verdade, devem aparecer mesmo no chamado planejamento energético
convencional.

1.5.4. Quem executa a análise do PIR?

O conceito do PIR foi desenvolvido dentro do contexto norte-americano dos monopólios das
companhias elétricas privadas, reguladas em níveis estadual e federal. As companhias elétricas
foram compelidas por suas comissões reguladoras a adotar o PIR para identificar e captar o
potencial de melhoria de eficiência energética que poderia ser obtido a custos socialmente menores
que os custos de geração. As medidas de eficiência são implementadas pelas companhias elétricas
por meio de programas de gerenciamento do lado da demanda. Outras medidas de eficiência podem
ser adotadas por outros agentes, conforme será visto no Capítulo 3.
Assim, PIR e GLD têm sido vistos como atividades de companhias elétricas e elas se
identificam com o contexto norte-americano das companhias elétricas privadas regulamentadas,
contexto este que está mudando. A maioria dos países, entretanto, possui estruturas de companhias
elétricas muito diferentes do modelo pelo qual o PIR foi desenvolvido originalmente. Alguns países
44 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

têm órgãos nacionais que controlam o setor elétrico. Outros têm grandes companhias elétricas
privadas, mas com menos regulamentação que no modelo norte-americano. Outros, ainda, têm
muitas companhias de distribuição locais pequenas comprando de uma companhia de oferta
nacional e alguns desses países estão começando a introduzir a competição no setor energético.
Nesses outros casos, pode ser difícil criar incentivos para as companhias elétricas se
engajarem no PIR e implementarem eficiência energética por meio de programas GLD financiados
pela própria companhia. Alguns países, tanto os industrializados como os em desenvolvimento, têm
começado a experimentar novos modelos de PIR e GLD, mas esses esforços não têm sido muito
ambiciosos até agora. Ao mesmo tempo, existem muitos tipos de políticas e programas para
implementar melhorias de eficiência energética, incluindo campanhas de informação, incentivos
nos preços, padrões de regulamentação, políticas de compra etc. Tais instrumentos são geralmente
aplicados pelas agências de governo.
Como fazer esses esforços se ajustarem ao PIR e ao GLD da companhia elétrica e como fazer
o PIR ser executado em um país sem incentivos para o GLD da companhia? Neste livro é dada uma
visão relativamente geral do PIR. Ele é dirigido a todos os tipos de programas de eficiência
energética, assim como aos de gerenciamento da carga e da substituição de combustível e fornece
ferramentas para comparar os custos e benefícios desses programas para a expansão da oferta de
eletricidade. Dessa forma, busca-se dar uma visão abrangente do PIR, na qual a composição ótima
de recursos de oferta e de demanda para atender às necessidades de serviços de energia pode ser
identificada. Sabe-se que essas ferramentas não poderão ser sempre aplicadas, mas a metodologia
do PIR e as ferramentas aqui apresentadas deveriam auxiliar a melhorar as decisões de planejamento
energético, ao invés de somente se considerar um conjunto parcial de soluções, como ainda se
verifica.
É difícil dizer como companhias elétricas de um determinado país ou região devem conduzir
um PIR e quando o GLD é uma opção para elas. No entanto, espera-se que a análise do PIR possa
ser usada pelos planejadores das companhias seguindo de perto o modelo norte-americano, por
exemplo. Quando isso não for possível, a análise do PIR poderá ser realizada pelo ministério da
energia ou do meio ambiente para priorizar programas e fornecer opções de políticas energéticas,
caso o governo tenha interesse em promover a eficiência energética para atingir as metas
econômicas e ambientais. Tais opções podem incluir aquelas a serem implementadas por meio de
companhias elétricas, talvez como uma condição para a aprovação de novos projetos de expansão
da oferta energética. Tal metodologia pode se tornar mais relevante à medida em que os governos
se esforcem em criar comissões de regulamentação e comitês com a finalidade de reduzir as
emissões de dióxido de carbono e outras emissões do setor energético.
O PIR deve ser diferenciado de alguns dos conceitos de Planejamento Energético Nacional
Integrado (PENI) que foram introduzidos em países em desenvolvimento por volta de 1980. O PENI
é uma metodologia hierárquica para integrar os setores de demanda e de oferta de energia com
planejamento e administração da economia e política de preços nacional (Munasinghe 2013). Esse
tipo de planejamento se tornou tão abrangente e tão interligado com outras prioridades político-
econômicas nacionais que os processos PENI não foram implementados de maneira significativa e
não resultaram em nenhuma diferença considerável em planejamento energético e decisões de
investimento.
Embora o PIR seja mais abrangente que os planos tradicionais de oferta das companhias
elétricas, ele está longe da limitação do grau de integração encontrado no PENI. Os conceitos do
PIR são tão bem aplicáveis em nível nacional quanto em sistemas energéticos regionais ou
municipais. Para pequenos países, o nível nacional e o sistema da companhia elétrica podem ser o
mesmo e, nesse caso, o PIR nacional faz sentido. Para grandes países, o PIR pode ser conduzido
em nível nacional e/ou em nível local, mas muitas medidas deverão ser conduzidas por meio de
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 45

estruturas relativamente descentralizadas. Embora o PIR possa e sempre faça uso de políticas de
preços de energia, ele não é caracterizado tão somente por isso.
_____________________________
Exercícios finais do capítulo
1) O que é PIR?
2) Discuta com suas palavras e dê exemplos para explicar as
diferentes maneiras de se entender o papel da energia na sociedade
atual.
3) Descreva o fluxo de conversões energéticas desde as fontes
primárias até os serviços de energia especificados: refrigeração
doméstica, aquecimento de água industrial e transporte de
passageiros (público e privado). Apresente o máximo de rotas de
conversão possíveis e aponte quais podem ser as mais eficientes
(com menores perdas de conversão).

(Jepma and Munasinghe 1998) (D’Sa 2005)


46 Planejamento Integrado de Recursos Energéticos

1.6. REFERÊNCI AS E LEITURAS SUGERIDAS

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http://sistemasinter.cetesb.sp.gov.br/inventariofontes/Manual_de_Preenchimento.pdf.
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berlin.de/docs/servlets/MCRFileNodeServlet/FUDOCS_derivate_000000006548/BrandxCor
reaxampxSteinbergerx-xBerlinxConferencexPaper.pdf?hosts=.
D’Sa, Antonette. 2005. “Integrated Resource Planning (IRP) and Power Sector Reform in
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Fisher, A., and M. Rothkopf. 1989. “Market Failure and Energy Policy.” Energy Policy, no.
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“Basic Needs and Much More with One Kilowatt per Capita.” Ambio 14 (4/5): 190–200.
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http://books.google.com.br/books?id=FrYrAAAAYAAJ.
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Do Brasil. Campinas: Editora Autores Associados.
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Scientific American 263 (3). http://www.scientificamerican.com/article/efficient-use-of-
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NWPPC. 1991. “Northwest Conservation and Electric Power Plan.” Portland, Oregon.
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Physical Reality.” Energy Policy 36 (12): 4600–4604. doi:10.1016/j.enpol.2008.09.005.
Patterson, Murray G. 1996. “What Is Energy Efficiency?: Concepts, Indicators and
Methodological Issues.” Energy Policy 24 (5): 377–90. doi:https://doi.org/10.1016/0301-
4215(96)00017-1.
Planejamento Integrado de Recursos Energéticos 47

Ruderman, Henry, Mark D. Levine, and James E. McMahon. 1987. “The Behavior of the Market
for Energy Efficiency in Residential Appliances Including Heating and Cooling Equipment.”
The Energy Journal 8 (1): 101–24. http://www.jstor.org/stable/41322248.
Smith, Marsha, and James E. Rogers. 2006. “National Action Plan for Energy Efficiency.”
Washington D.C. http://www.epa.gov/cleanenergy/energy-programs/napee/index.html.
Steinberger, Julia K. 2016. “DEMAND Centre Conference.” In Understanding International
Energy Sufficiency: Comparing Countries in Terms of the Role of Energy in Delivering
Human Well-Being. Lancaster.
Steinberger, Julia K., and J. T. Roberts. 2009. “Across a Moving Threshold: Energy, Carbon and
the Efficiency of Meeting Global Human Development Needs.” 114. Social Ecology
Working Paper. Vienna. http://www.uni-klu.ac.at/socec/downloads/WP114_WEB.pdf.
Stern, P., and E. Aronson. 1984. Energy Use: The Human Dimension. Washington, D.C.: The
National Academies Press.
Strunz, Sebastian. 2014. “The German Energy Transition as a Regime Shift.” Ecological
Economics 100: 150–58. doi:10.1016/j.ecolecon.2014.01.019.
48 Projeções de demanda de energia

CAPÍTULO 2

PROJEÇÕES DE DEMANDA DE ENERGIA

2.1. INTRODUÇÃO

As projeções de demanda de energia possuem um papel importante no PIR, porque elas


ajudam a avaliar a necessidade de novos recursos do lado da oferta e a identificar o potencial de
recursos do lado da demanda. Projeções feitas com grande nível de detalhe e baseadas em
informação de qualidade ajudam a determinar quais programas de eficiência e de GLD devem ser
adotados nos momentos apropriados e quais usos finais e setores de consumo devem ser priorizados.
São esses os chamados recursos do lado da demanda. É importante ressaltar que as projeções de
demanda realizadas durante o processo do PIR são projeções de serviços de energia que levam em
consideração as bases tecnológicas de tais serviços para o ano projetado, assim como os fatores
socioeconômicos que determinam os níveis de serviços de energia solicitados.
As projeções da demanda no PIR objetivam, portanto, determinar o potencial de recursos
existentes de energia a ser conservada ou mesmo evitada. O PIR faz também um planejamento da
demanda para tender a um conjunto definido de tipos e níveis de serviços de energia. Esse potencial,
como será visto neste capítulo, é a diferença entre os totais de demanda de energia de um cenário
denominado de cenário de referência (ou tendencial) e de outro cenário que considera a adoção de
medidas de eficiência energética e representa o que chamamos de recursos do lado da demanda. O
cenário de referência é também chamado aqui de cenário de eficiência congelada e pode representar
simplesmente o crescimento de serviços de energia ou pode incluir, ainda, a introdução gradativa
de novas tecnologias mais eficientes por parte dos consumidores de energia sem que exista um
esforço sistemático e planejado para a disseminação de práticas e de tecnologias mais eficientes.
No Capítulo 3 são discutidas estratégias para viabilizar as medidas de eficiência energética e de
GLD por meio de programas e outros mecanismos. Por definição, as ações de eficiência energética
são aquelas que promovem a redução da energia necessária para atender as demandas da sociedade
por serviços de energia sob a forma de luz, calor e/ou frio, força motriz, transporte e outros usos em
processos industriais. Em outras palavras, são ações que têm como objetivo atender às necessidades
dos setores de uma economia com menor uso de recursos energéticos primários.
No PIR, o estudo da demanda e sua modelagem possuem uma importância especial, pois a
intenção é determinar com a melhor precisão possível o potencial físico dos recursos do lado da
demanda, seus custos e, igualmente importante, os instrumentos necessários para atender, junto aos
recursos do lado da oferta, os serviços requeridos de energia.
O processo de planejamento de um setor de infraestrutura como é o de energia é extremante
complexo, devido ao montante de recursos econômicos necessários, ao longo prazo de maturação
dos investimentos e aos grandes impactos sociais e ambientais envolvidos. A Figura 2-1 ilustra
alguns dos grandes componentes desse processo e o papel dos modelos como maneira de organizar
a informação, elaborar alternativas e soluções tecnicamente viáveis considerando um determinado
horizonte de tempo e recursos (humanos, capital e recursos naturais) disponíveis.
Neste capítulo, iremos analisar inicialmente os principais modelos energéticos utilizados no
planejamento, mas focaremos atenção nos aspectos referentes à modelagem da demanda.
Indicaremos a maneira mais prática de fazer a projeção da demanda para utilizarmos dentro do PIR;
desse modo, explicaremos com mais detalhes o modelo de demanda que passaremos a utilizar.
É importante ressaltar, ainda, que o planejamento energético está subordinado a outras
diretrizes estratégicas desenvolvendo prioridades que muitas vezes extrapolam considerações
Projeções de demanda de energia 49

específicas do setor de energia. Podemos, por exemplo, sugerir as seguintes prioridades, entre
outras:
• o desenvolvimento econômico privilegiando determinado tipo de indústria;
• a garantia de acesso universal aos serviços de energia;
• o aumento do nível de consumo ao invés de serviços da população;
• a promoção da descarbonização da economia;
• a redução das emissões de gases tóxicos;
• o planejamento de futuras demandas, identificando medidas de conservação; e
• a priorização de um sistema de energia sustentável.
É importante lembrar que os trabalhos realizados no contexto de planejamento têm o
propósito de oferecer suporte para tomada de decisão. O maior mérito do PIR é o de oferecer uma
gama mais abrangente de alternativas, quando comparadas ao planejamento convencional, para que
o tomador de decisão possa escolher conhecendo seus impactos na sociedade, na economia e no
meio ambiente.

Figura 2-1 – Visão geral dos principais elementos para suporte à tomada de decisão em planejamento

Já a Figura 2-2 procura mostrar a subordinação do planejamento energético aos objetivos de


desenvolvimento, a determinação dos recursos disponíveis por meio de cenários e a necessidade de
estabelecimento de critérios para escolhas entre as alternativas de oferta e demanda.
50 Projeções de demanda de energia

Figura 2-2 – O planejamento da demanda, os cenários de demanda e oferta e sua relação com os objetivos
de desenvolvimento nacional

2.2. FINALIDADE, CLASSIFICAÇÃO E EVOLUÇÃO DOS MODELOS DE ENERGIA

O PIR utiliza as mesmas ferramentas de planejamento que são usadas pelo planejamento
convencional. Aí se incluem os modelos energéticos. Nesta seção descrevemos as principais
famílias de modelos.
Não existe um consenso sobre uma classificação dos modelos energéticos, no entanto, de
modo geral, eles são divididos de acordo com os seguintes critérios:
• quanto à estratégia de abordagem (modelos agregados e desagregados);
• quanto à técnica matemática utilizada (usos finais ou técnico-econômico, econometria,
regressão univariada e multivariada, matriz insumo-produto, séries temporais, algoritmo
genético, lógica fuzzy, simulação e otimização por meio de funções objetivo etc.);
• quanto à evolução (estático ou dinâmico);
• quanto ao horizonte temporal (curto, médio e longo prazo);
• quanto ao alcance geográfico (local, regional, nacional e mundial);
• quanto ao tratamento das incertezas (determinístico, estocástico, cenários, análise
multicritério etc.); e
Projeções de demanda de energia 51

• quanto à finalidade (modelos de demanda, de oferta e modelos integrados).


Ao longo das últimas décadas, a tarefa de previsão de demanda de energia evoluiu da simples
análise de extrapolação de dados do passado até o planejamento integrado dos recursos energéticos,
no qual a oferta e a demanda são investigadas sob um prisma mais interativo, levando em
consideração os cenários socioeconômicos, o meio ambiente e os efeitos climáticos numa única
abordagem (ver Figura 2-3).

Figura 2-3 – Evolução dos modelos de demanda de energia

Atualmente, as projeções de oferta e demanda de energia são resultados de sistemas


sofisticados de processamento de dados que adotam modelos técnico-econômicos integrados com
ferramentas matemáticas que auxiliam nas previsões das diversas variáveis de interesse. Existe um
grande número de simuladores que adotam modelos técnico-econômicos1 com aplicações em
instituições acadêmicas e governamentais e que estão disponíveis para estudos em planejamento
integrado de recursos energéticos. Apesar da preferência por esse tipo de abordagem, muitos
trabalhos de previsão de demanda utilizando-se de outras técnicas são de extrema utilidade. Mais
exatamente, a possibilidade de inovação nessa área da matemática e da economia é praticamente
ilimitada.
Podemos falar em uma taxonomia de modelos energéticos destinados a orientar o
planejamento energético distinguindo as principais categorias:
• Modelos de otimização: de uma maneira geral, procuram identificar configurações que
buscam minimizar custos ou emissões atendendo determinados critérios e condições. São
bastante empregados para escolhas de tecnologias e recursos de oferta de energia.

1
MARKAL, LEAP, MEDEE, UNIDO, ELFIN, MURELEC, EFOM, WASP, MESAP, NEMS, ENPEP, IDEE, IIASA,
CIRED, MUSE, WISE etc. Outras ferramentas são listadas em Connolly et al. (2010).
52 Projeções de demanda de energia

Exemplos: Markal (IEA 2013; Fishbone and Abilock 1981), EFOM (Van der Voort 1982),
entre outros.
• Modelos de simulação: a partir de regras ou padrões estabelecidos, procuram simular o
comportamento do consumidor ou do mercado de energia, considerando preços,
preferências, políticas e mecanismos de incentivos. Exemplo: ENPEB-BALANCE
(OpenEI 2014).
• Modelos contábeis: esses modelos têm como funções principais organizar e manter
coerência entre dados e resultados. São muito utilizados para realizar análises
exploratórias e cenários energéticos. Exemplos: LEAP (LEAP 2011) e MEDEE (Enerdata
2013; Lapillonne and Chateau 1981).
• Modelos híbridos: são modelos que combinam as diversas abordagens descritas acima.
Muitos modelos utilizados atualmente fazem essas combinações. As últimas versões do
LEAP, por exemplo, incluem módulos de otimização dos recursos de oferta, os
procedimentos de contabilidade energética entre oferta e demanda e permitem aos
analistas realizarem simulações.

2.3. ABO RDAGEM TOP-DOWN E BOTTOM-UP EM MODELAGEM

Como já referido, os modelos de energia podem ser classificados quanto à abordagem em


modelos agregados e desagregados. As abordagens do tipo top-down ou bottom-up referem-se às
estratégias de como as informações são ordenadas e tratadas, se de forma agregada ou desagregada.
Numa abordagem top-down, define-se um sistema como um todo e especificam-se de forma
genérica os módulos que o compõem. Se desejar, pode-se recorrer à avaliação dos módulos por
meio de submodelos, nos quais são tratados os elementos básicos de cada um destes. Por outro lado,
uma abordagem bottom-up envolve a descrição detalhada dos elementos básicos que compõem os
submodelos de um sistema. Esses submodelos são, então, organizados em diversos níveis até que
uma definição completa do sistema seja obtida.
Nos modelos top-down, as informações são tratadas de forma agregada e não é considerada
explicitamente a estrutura tecnológica do país. Procura-se representar de forma mais simplificada o
consumo energético por meio de poucas equações e, em geral, variáveis macroeconômicas. Os
modelos bottom-up buscam, por outro lado, detalhar a estrutura tecnológica da conversão e do uso
de energia. Esse tipo de modelagem permite identificar potenciais de melhorias em eficiência
energética segundo grupos de usos de energia e tecnologias de conversão.

2.3.1. Top-Down

No caso de uma abordagem top-down para previsão de demanda de energia com base na
produção de um setor da economia, por exemplo, tenta-se representá-la por meio de um número
pequeno de variáveis agregadas2. Nesse modelo, os parâmetros da função de produção podem ser
calculados para cada setor e as entradas e saídas reproduzem valores de um período por vez,
normalmente um ano. A gama de variáveis de entrada requerida para a produção de uma unidade
de saída de cada setor pode variar de acordo com o parâmetro de elasticidade de substituição
selecionado pelo usuário. Uma função genérica para a produção setorial, por exemplo, pode assumir
a seguinte expressão:

2
Nos modelos top-down é assumido que o nível de entrada e saídas de cada setor está em equilíbrio durante o período
de análise. Embora outros fatores possam ser adicionados ao modelo, os mais utilizados são: o trabalho, a energia e o
capital. O trabalho pode ser subdividido em várias categorias.
Projeções de demanda de energia 53

X s = A0 ( BK K s + BL Ls + BE Es )1/  (2.1)

Onde Xs é a saída do setor S; Ks, Ls e Es são, respectivamente, o capital, o trabalho e a energia


necessários para produzir uma unidade de saída do setor S;  é o parâmetro de elasticidade de
substituição (1); A0, BK, BL, BE são coeficientes de escala. O parâmetro  representa a facilidade
ou a dificuldade de um fator de produção ser substituído por outro, quanto menor mais fácil é a
substituição para a mesma unidade de produção do setor S. Note que o coeficiente de substituição
é o mesmo para todos os fatores, em outras palavras, a facilidade ou a dificuldade de substituir
trabalho por capital é a mesma de substituir capital por energia. Evidentemente são possíveis outras
formas de equação, por exemplo, com coeficientes de substituição diferentes para cada fator de
produção. Esses modelos e outros de tratamento agregado têm aplicações em sistemas energéticos
de baixa complexidade ou para cálculos expeditos que sirvam de suporte de modelos de sistemas
mais complexos. Para estes é recomenda uma abordagem do tipo bottom-up.

2.3.2. Bottom-Up

A abordagem bottom-up, por outro lado, apresenta detalhes focando principalmente o fluxo
de energia de toda uma economia. A função de produção é construída implicitamente, ao invés de
explicitamente como nos modelos mais agregados. A maioria destes modelos envolve software e,
essencialmente, trata o sistema de energia por meio de subsistemas que possibilitem obter dados de
entrada e saída de cada componente. Os modelos integrados de energia do tipo bottom-up são
baseados em variáveis técnicas e variáveis econômicas, com cada tecnologia identificada por suas
entradas, saídas, custos unitários etc. Uma fonte de energia pode ser tratada por uma ou mais
tecnologias disponíveis e uma unidade de saída, por exemplo, o serviço de um milhão de
passageiro-km3, é produzido usando uma combinação de tecnologias individuais. Mais exatamente,
cada setor é projetado por meio de uma combinação de tecnologias, no qual são configurados os
fluxos de energia, materiais, emissões e demandas de serviços. O equilíbrio parcial por setor é
computado via integração da oferta e da demanda, enquanto outras simulações são realizadas em
função do comportamento de outras variáveis econômicas.
A análise bottom-up é particularmente importante para o PIR, pois possibilita explicitar e
quantificar o potencial de recursos existentes do lado da demanda, como será visto adiante.
Basicamente, nesse tipo de análise, a demanda de energia é o produto entre o nível de serviço
de energia exigido e a intensidade energética de cada tecnologia incluída na estrutura de oferta, ou
seja:

Ei ,b ,c ,t = Qi ,b ,c ,t  I i ,b ,c ,t (2.2)

Onde E é a demanda de energia; Q é o nível de serviço de energia demandado; I é a intensidade


energética para cada serviço de energia; i é a fonte energética; b é a tecnologia adotada; c é o cenário;
e t é o ano. Todos os cenários partem de um cenário de referência inicial (ou cenário de eficiência
congelada), portanto para t=0 e com a tecnologia atual b, tem-se que Eb,0=Qb,0Ib,0. É importante
registar que um mesmo serviço de energia pode ser atendido por diversas tecnologias existentes que
processam uma ou mais fontes energéticas disponíveis e nem toda tecnologia deve ser incluída na
estrutura de oferta, por simples restrição operacional ou legal, por exemplo.

3
Passageiro-km é uma das unidades de serviço de energia. Outras unidades são: t-km, veículo-km, lúmen-hora, kg-oC,
m3-oC etc.
54 Projeções de demanda de energia

De modo geral, os modelos bottom-up consideram também o material, a tecnologia e seus


efeitos ambientais (emissão de poluentes), além das funções básicas de demanda e oferta de energia.
É importante ressaltar que em trabalhos mais completos de PIR são também realizados estudos que
consideram a análise de ciclo de vida (ACV)4 das diversas alternativas escolhidas. Essas análises
estimam os custos e os impactos ambientais, incorridos em toda a cadeia produtiva, de utilização e
descarte das tecnologias envolvidas e auxiliam o tomador de decisões a conhecer as implicações
mais abrangentes das escolhas de tecnologias tanto do lado da demanda como da oferta.
É comum desagregar a demanda de serviços de energia para os seguintes setores: o
residencial, o industrial, o comércio e os serviços (incluindo o setor público), a agricultura e o setor
de transporte. Além desses setores da economia existem aqueles que demandam as mesmas fontes,
mas para finalidades não energéticas, como derivados de petróleo e gás utilizados na indústria
petroquímica, por exemplo. As emissões podem ser mapeadas por indicadores de poluição e
normalmente referem-se aos gases CO2, SOx, NOx ou particulados. As tecnologias são subdividas
segundo alguns critérios: quanto ao recurso (extração, captação, importação ou exportação etc.),
quanto ao processo de conversão (refinarias, destilarias, coquerias, conversão fotovoltaica, centrais
elétricas etc.) e quanto ao dispositivo de demanda (tipo de equipamento, hibridização etc.).
Em uma abordagem que prioriza aspectos econômicos da demanda verifica-se que cada fonte
é representada por uma configuração de custos característicos de tal modo que o modelo permita
selecionar uma combinação de tecnologias que minimize o custo total (mínimo custo) ou a emissão
de gases tóxicos. A convergência das equações, solução do problema, é alcançada maximizando
(ou minimizando, a depender do tipo de função) o valor das funções-objetivo, normalmente sujeitas
às condições de contorno restritivas.
Se o objetivo é minimizar o custo de produção de energia para atender à demanda de um
serviço, por exemplo, o método de solução é direcionado para escolher o termo mínimo da seguinte
expressão:
 M N n C (t )  = tecnologia
𝑏b = tecnologias s
disponíveis
s disponívei
VPs (i, b) = termo mínimo  i ,b ,s t , {  } (2.3)
 i =1 b=1 t =0 (1 + r )  i = fontes energéticas
𝑖 = fontes energéticas 

Onde VPs(i,b) é o valor presente dos custos de produção de energia oriunda da fonte i com a
tecnologia b para atender um serviço s; Ci,b,s(t) é o custo anual da energia oriunda da fonte i com a
tecnologia b para atendimento do serviço s no período t; r é a taxa de desconto (taxa de atratividade);
n é o número de períodos; N e M são as possíveis tecnologias e fontes, respectivamente. O custo
unitário é função da fonte e da tecnologia escolhida para produzir uma unidade de serviço. O custo
total para atendimento de todas as demandas de serviços é a soma de todos os custos de produção
de energia de cada fonte com suas respectivas tecnologias incluídos na estrutura de oferta. Assim,
para uma demanda de diferentes serviços, o PIR deve buscar minimizar a função-objetivo de custos
totais:
S
VPt = VPs (i, b) (2.4)
s =1

Onde S é o número de serviços demandados e VPs(i,b) é o valor presente de custo mínimo


obtido na Eq. (2.3). O método de minimização deve indicar a combinação de fontes e alternativas
tecnológicas de menor custo (ou de menor emissão de poluentes), capaz de atender à demanda de
energia sob as condições de contorno assumidas. Para um sistema de fornecimento de energia para

4
Existem diversos manuais que explicam os procedimentos utilizados para esse tipo de análise que cada vez mais se
torna padrão para estudos comparativos entre processos e tecnologias. Ao final deste capítulo indicamos algumas
sugestões de leitura.
Projeções de demanda de energia 55

diferentes regiões com estruturas de custos de obtenção distintas5, a função-objetivo indicada na


Eq. (2.4) pode ser reescrita como:
Z S
VPt = VPs , z (i z , bz ) (2.5)
z =1 s =1

Onde z é uma das Z regiões e VPs,z(iz,bz) é o valor presente de custo mínimo do serviço s
incorrido na região z, função dos custos da fonte e da tecnologia regionais. Em um sistema integrado
de oferta e demanda, enquanto a função de custo total (ou de emissão de poluentes) é minimizada,
outras equações de limitações físicas e/ou lógicas devem ser satisfeitas de modo a representar
adequadamente o sistema de energia associado, tais como: demanda atendida, limite de capacidade
de transferência entre regiões, fator de utilização de cada tecnologia, fatores de disponibilidade
sazonal, limite de emissão etc. O que se pode afirmar, dadas as diversas configurações possíveis, é
que não há solução única, pois além das variáveis já comentadas deve-se considerar que o consumo
de energia de um país é também reflexo de fatores socioculturais (preferências) e, mesmo, impactos
de clima e crises econômicas de difícil previsão ou modelagem.
As funções de demanda de energia, conforme obtidas na econometria, podem auxiliar na
validação da Eq. (2.2). A demanda de energia de uma dada fonte i com uma tecnologia b, por
exemplo, é função do preço e pode ser determinada utilizando-se do coeficiente de elasticidade
preço de acordo com a Eq. (2.6) a seguir:
−  i ,b ,c
Ei ,b ,c = aPi ,b ,c  Ei ,b ,c ,t = Qi ,b ,c ,t  I i ,b ,c ,t (2.6)

Onde Ei,b,c é a demanda de energia da fonte i conforme tecnologia b e cenário c; Pi,b,c é o preço
tomado pelo custo marginal; βi,b,c é a elasticidade preço-demanda; e a é um fator de escala.
Dependendo da relação da demanda com outras variáveis socioeconômicas regionais, outros
coeficientes de elasticidade podem ser agrupados na Eq. (2.6)6. Note que o preço da energia oriunda
de uma fonte i e uma tecnologia b qualquer é fortemente influenciado pelo cenário c (fatores
socioeconômicos) e o tempo t.

2.4. MODELOS DE DEM AND A DE ENERGI A (Bottom-up)

Diversos métodos podem ser usados nas projeções de demanda de energia. Alguns modelos
podem ser aplicados na previsão de demanda de recursos energéticos primários ou integrando a
demanda de energia compondo toda a cadeia de transformação, desde recursos energéticos
primários, secundários, até seu uso final.
Os dois principais procedimentos em uso corrente pela maioria das empresas de energia,
sobretudo as companhias de eletricidade, são essencialmente baseados nos modelos denominados
técnico-econômicos ou em modelos econométricos. Além das diferentes feições dentro do processo
de planejamento de serviços de energia desses modelos, outra grande diferença, como já
mencionado, é o nível de agregação dos dados de entrada. Os modelos econométricos são mais
agregados e baseiam-se essencialmente nos preços, renda (ou outros indicadores socioeconômicos
como trabalho, capital etc.) e suas relações com a demanda de energia. Já os modelos técnico-
econômicos apresentam detalhes do fluxo de energia de todos os setores de uma economia.
Dividimos os modelos de demanda de energia em duas categorias: específicos e gerais. No
caso de modelos específicos, escolhemos dois exemplos: usos finais e modelos de decomposição.

5
Em países com diferenças econômicas regionais acentuadas, como no Brasil, é interessante tratar as funções de custos
conforme a região.
6
Ver mais detalhes de modelos econométricos de energia no item 2.5.2.
56 Projeções de demanda de energia

No caso de modelos gerais, são detalhados três exemplos: regressão, econometria e séries
temporais. Para este último, é importante que o leitor conheça alguns fundamentos estatísticos de
processos estocásticos que envolvem as séries temporais. O Apêndice C ao final deste livro foi
preparado com esse fim, ainda que o conteúdo seja apenas uma introdução ao assunto. Após esses
exemplos, é abordada a metodologia de matriz insumo-produto, também útil para projeções de
demanda de energia, sobretudo para o setor industrial.

2.4.1. Modelo de usos finais

Os modelos de projeção de usos finais (ou modelos técnico-econômicos) são do tipo bottom-
up. São modelos detalhados, embora de formulações analíticas bastante simples. Esse procedimento
se ajusta muito bem aos propósitos de projeções de eficiência energética porque é possível explicitar
mudanças nos níveis de serviço e de tecnologia.
A demanda de energia para cada atividade é considerada como o produto de dois fatores: o
nível da atividade (ou serviço de energia) e a intensidade energética (ou uso de energia por unidade
de serviço), conforme Eq. (2.2). Deve-se tomar cuidado com situações nas quais o nível de atividade
ou de consumo de energia não é realizado plenamente, por exemplo, quando consumidores não
podem utilizar seus equipamentos ou o consumo não é atendido por alguma limitação (motores ou
frota de veículos em manutenção, cortes de energia, rede elétrica subdimensionada etc.).
No caso da iluminação de uma loja que possua uma determinada área a ser iluminada durante
o período comercial, por exemplo, o nível de atividade pode ser o número de lúmens7-hora
(quantidade de luz) necessária para suas atividades. A intensidade de energia é a quantidade de kWh
necessária para prover cada lúmen-hora, que depende da tecnologia e do projeto de iluminação da
loja. Outro exemplo de nível de atividade é a quantidade de passageiros-km de uma estrutura de
transporte coletivo (ônibus, metrôs etc.). Neste caso, a intensidade energética correspondente é a
quantidade de kWh (ou barris de diesel) necessária para transportar um passageiro por uma distância
de um quilômetro, que depende de todas as variáveis relacionadas à eficiência do sistema de
transporte.
Ao contrário dos modelos mais agregados, aqui é necessário classificar as diferentes
atividades que formam a estrutura de demanda em categorias homogêneas quanto às atividades
econômicas e aos usos finais de energia. É uma atividade que requer dados detalhados a partir de
intensivos levantamentos e pesquisas de campo. O nível de atividade que implica em maiores
necessidades de serviços de energia depende da população, da renda, da produção econômica etc.
O nível da intensidade energética depende da eficiência energética, incluindo tanto aspectos
operacionais quanto tecnológicos. A somatória dos produtos desses dois fatores sobre todos os
serviços requeridos fornece a demanda total de energia, ou seja:
n
Uso de Energia = E =  Qi  I i (2.7)
i =1

Onde Qi é a quantidade do serviço de energia; I é a intensidade do uso energético para cada


serviço de energia i.
A intensidade Ii pode ser reduzida por meio de mudanças tecnológicas sem afetar o nível dos
serviços de energia, por exemplo, mantendo o mesmo nível de iluminação de um ambiente com
menos lúmens-hora ou a mesma distância percorrida por um veículo com menor volume de

7
Um lúmen é o fluxo emitido por um ponto luminoso com intensidade de um candela em todas as direções a partir de
um cone de um esferorradiano. Uma candela é a intensidade luminosa emitida em uma direção por uma fonte de luz
monocromática de frequência 540x1012 hertz e cuja intensidade de radiação em tal direção é de 1/683 watts por
esferorradiano. Essa frequência é percebida como luz verde, para a qual o olho humano possui a melhor capacidade de
absorção. São unidades do padrão SI.
Projeções de demanda de energia 57

combustível. Se essa redução é alcançada eliminando o uso desnecessário ou o desperdício diz-se


que houve uma melhoria de eficiência. Entretanto, se a diminuição decorre de uma redução de
conforto (por exemplo, reduzir os níveis de iluminação ou percorrer menores distâncias ao dia),
então as economias resultantes são consideradas como uma redução no nível dos serviços de
energia.
A quantidade de serviços de energia Qi depende de diversos fatores, incluindo a população, a
fração que usa o serviço do uso final e a extensão ou nível do uso de cada serviço. Assim:
Qi = N i  Pi  M i (2.8)

Em que N é o número de consumidores eleitos por uso final i, Pi é a penetração


(unidades/consumidor) do serviço do uso final i (pode ser >100%) e Mi é a magnitude ou a extensão
do uso do serviço com uso final i. O parâmetro população Ni pode ser o número de residências,
estabelecimentos comerciais, consumidores industriais ou usuários etc. O requisito é que este valor
concorde com a definição do denominador na variável penetração Pi. Esse valor é simplesmente a
fração de consumidores (ou fração de área, fração de equipamentos etc.) que usam um dado uso
final. Por exemplo, para usos finais de resfriamento/aquecimento de ambiente em construções
comerciais em geral, o parâmetro penetração Pi relaciona a área construída onde o uso final é
aplicado. Para uso final de deslocamento de pessoas em pequenos veículos, a penetração Pi
representa o número de veículos por habitante ou por residência, e assim por diante. Esse parâmetro
expressa a penetração dos dispositivos de serviços de energia tais como veículos, fogões elétricos,
máquinas de lavar, motores e outros. Alguns dispositivos podem atingir um nível de saturação acima
do qual não se espera aumentos, como TVs e geladeiras ou mesmo veículos.
O parâmetro Mi depende do uso final. Para usos finais industriais, ele pode ser um indicador
da produção física de um dado produto. Para usos finais comerciais, a variável Mi pode indicar a
quantidade de lúmens por metro quadrado de iluminação. Para eletrodomésticos Mi, pode indicar a
frequência do uso, como horas de iluminação ou horas de uso de televisão. Para usos finais de
resfriamento e aquecimento, Mi pode indicar a diferença de temperatura entre o ambiente interno e
o externo, ponderada de acordo com o número de horas utilizado para esse uso final. Na definição
do parâmetro Mi é importante que a unidade convirja com a unidade utilizada para a intensidade do
uso energético. Mais exatamente, há total liberdade nas definições dos parâmetros, mas as unidades
devem convergir conforme Eqs. (2.7) e (2.8).
Os modelos de usos finais, como já mencionado, fazem projeções para cada uso final
considerado, usando como variáveis de entrada as informações sobre o nível de serviço de energia
e a intensidade energética necessária para realizar uma unidade daquele serviço. Por exemplo,
suponha que se queira projetar a quantidade de MWh anual necessária para iluminação em edifícios
de escritórios. Tem-se a área total a ser iluminada em um dado nível, por exemplo, 400 lux8 (nível
de serviço de energia). Como parâmetro de eficiência técnica tem-se a quantidade anual de
eletricidade consumida por unidade de área (kWh/m2). O que se precisa é projetar a quantidade
futura de metros quadrados a ser atendida por aquele nível de serviço de energia e o fator de
intensidade energética, que pode ser a quantidade de kWh necessária para fornecer o nível requerido
de iluminação. Geralmente, o fator de intensidade energética e a projeção de área a ser construída
variam para diferentes cenários, enquanto o serviço de energia é constante ou varia muito pouco de
um cenário para outro.

8
Corresponde à incidência perpendicular de um lúmen em uma superfície de um m2.
58 Projeções de demanda de energia

Exemplo de informações requeridas em um modelo de uso final

A análise botom-up exige uma estimativa da estrutura de consumo segundo os usos finais.
Com isso, se determina quais são os usos mais relevantes para a avaliação das oportunidades de
aumento da eficiência energética. A Tabela 1-1 a seguir ilustra alguns usos finais comuns com suas
tecnologias e/ou dispositivos.

Tabela 2-1 – Exemplo de informação requerida para modelos uso final

Uso final Tecnologia/dispositivos


Motor convencional elétrico, motor eficiente com controle de velocidade variável etc.
Força motriz Motor de combustão interna, célula combustível, baterias eletrolíticas, motor a
hidrogênio etc.
Fornos e caldeiras a combustível fóssil, elétricos, cogeração etc.
Aquecimento
Aquecedores de água, aquecimento solar, fogões para cocção de alimentos.
Transporte de
carga Caminhões, aviões, navios, vagões ferroviários, guindastes etc.

Transporte de Veículos leves, ônibus, aviões, navios, metrôs, motos, bicicletas, etc.
pessoas
Incandescente, fluorescente com reator eletromagnético ou eletrônico, vapor de
Iluminação mercúrio,
Iluminação com sensores, iluminação reflexiva, natural etc.
Resfriamento Ventiladores, ar-condicionado, ventilação natural, resfriamento passivo.
Calefação Lareira a lenha, sistema de calefação a gás, elétrico, aquecimento central, cogeração etc.
Refrigeração Refrigeradores eficientes, refrigeração natural.

Nem sempre existem dados suficientes ou de qualidade para caracterizar a estrutura de


consumo segundo os usos finais. É nesse quesito que reside boa parte do trabalho do analista para
realizar estimativas ou elaborar procedimentos de coleta de dados e medições.

Tabela 2-2 – Penetração de tecnologias de uso final no setor residencial (%)

Beijing Manila Pune Tailândia Nanning Hong Kong Manaus


Número de
residências 2.416.918 1.520.913 323.194 1.446.262 286.533 1.030.928 201.000
Iluminação
incandescente 88 85 86 57 – – 98
Iluminação
fluorescente 93 88 84 98 – – 60
TV (preta e branca ou
colorida) 119 96 78 – – 100 114
Refrigerador 87 93 40 42 54 98 84
Chuveiro elétrico 1 – 41 5 17 10
Ar-condicionado 2 – 2 15 0 51 23
Máquina de lavar
roupa 84 – 8 20 76 89 13
Fonte: Sathaye and Tyler (1991). Nota: Valores acima de 100% indicam média de mais de um
equipamento por residência.
Projeções de demanda de energia 59

Figura 2-4 – Intensidade energética de transporte entre 2000 e 2010

Avaliações de questionários e pesquisas de campo, análise de dados de faturamento,


auditorias e medições energéticas, vendas de eletrodomésticos, dados industriais e outras
informações são necessários para a análise bottom-up. A Tabela 2-2 e a Figura 2-4 mostram
exemplos de informações que podem ser obtidas ou calculadas para o setor residencial e de
transporte, úteis para se estimar a demanda de uso final de eletricidade e/ou combustíveis,
respectivamente. A partir de dados de vendas de lâmpadas de 1985 a 89, foi estimado o uso final
de eletricidade em iluminação usando dados de vendas de lâmpadas no México mostrados na Tabela
2-3. Cada lâmpada vendida substituiu uma lâmpada que deixou de funcionar ou colocada num novo
ponto de luz. Uma vez que a demanda de energia elétrica não mostrou um rápido crescimento,
segundo o mesmo autor, pode-se supor que a maioria delas substituiu outra existente.

Tabela 2-3 – Vendas de lâmpadas no México (milhões de unidades)

1985 1986 1987 1988 1989 Média


Incandescente
Até 100 Watts 140 118,5 147 121,5 138 133
150 – 1.500 W 2,9 2,3 2,2 1,7 2,0 2,22
Fluorescente
20 & 40 W 3,8 3,3 3,8 3,5 3,7 3,62
39, 55 & 75 W 9,7 9,1 11,3 9,7 11,6 10,28
Outros 1,3 1,4 1,4 1,3 1,3 1,34
TOTAL 14,8 13,8 16,5 14,5 16,6 15,24

Assumindo que cada lâmpada substituiu outra que queimou ao final de sua vida útil (VU em
horas) e conhecido o número total de lâmpadas vendidas em um ano, resulta para aquele tipo de
lâmpada que:
E anual = (venda de lâmpadas/ano)  (média da potência) (vida da lâmpada) (2.9)

Para os dados de vendas de lâmpadas, considerou-se a venda anual média de 1985 a 1989,
como mostra a última coluna da Tabela 2-3, e as informações adicionais dos fabricantes com relação
60 Projeções de demanda de energia

à magnitude das vendas de acordo com a potência da lâmpada. Os dados de vendas, a vida relativa
da lâmpada e o consumo de energia anual implícita estão na Tabela 2-4.

Tabela 2-4 – Estimativa de consumo de energia para os principais tipos de lâmpadas, México (1985-89)

Tipo de lâmpada Vida Vendas médias Consumo de eletricidade


Potência (W) (horas) anuais (×1.000) (TWh/ano)

Incandescente
25 1.000 6.650 0,166
40 1.000 13.300 0,532
60 1.000 39.900 2,394
75 1.000 19.950 1,496
100 1.000 53.200 5,320
100 – 1.500 (média 200) 1.000 2.200 0,440
Subtotal 10,349
Fluorescente
20, 40 (média 30) 12.000 3.620 1,303
39, 55, 75 (média 56,33) 12.000 10.280 6,949
Outros (média 30) 12.000 1.340 0,482
Subtotal 8,734

Note que a Tabela 2-4 não inclui o consumo de energia dos reatores das lâmpadas
fluorescentes. Supondo que os reatores adicionam 20% ao consumo das lâmpadas fluorescentes, o
consumo total de energia utilizada seria o mostrado na Tabela 2-5.

Tabela 2-5 – Consumo de eletricidade incluindo reatores – México (1985-89)

Tipo de Consumo
lâmpada (TWh/ano)
Incandescente 10,349
Fluorescente 10,481

Para aparelhos de vida útil mais longa e que estão aumentando suas vendas anuais, tais como
ares-condicionados, o estoque existente deve ser maior que aquele indicado pela média de vendas
anuais e isso deverá ser refletido nas estimativas de estoque de equipamentos em uso que consomem
eletricidade. Em tais casos, portanto, o uso de energia anual calculado pela Eq. (2.9) seria
subestimado. Esse é apenas um exemplo que mostra a necessidade de considerar os detalhes em
uma análise bottom-up para previsão de demanda de energia.

Setor residencial

O uso total de energia residencial ER é a soma da energia demandada por todos os usos finais
residenciais, tais como iluminação, calefação, resfriamento ambiental, refrigeração, televisão,
chuveiro, entretenimento etc. Assim, tem-se que:
n
ER =  ERi (2.10)
i =1

Onde o sobrescrito i representa um uso final específico (iluminação, calefação, resfriamento


etc.). A demanda de energia para cada uso final específico tem a seguinte expressão:
Projeções de demanda de energia 61

ERi = Qi  I i (2.11)

Onde Qi é o nível de serviço do uso final i e I é a intensidade energética do dispositivo de uso


final i. Usando a Eq. (2.8) na Eq. (2.11), resulta:
n
E = N i  Pi  M i  I i  E R =  N i  Pi  M i  I i
i
R (2.12)
i =1

Onde N é o número de residências eleito por uso final i, P é o nível (%) de penetração dos
aparelhos por uso final i sobre as residências eleitas, M é o número de horas, graus, dia ou frequência
do uso por serviço de energia i. De acordo com essa formulação, podem-se projetar os níveis de N
e P e manter M e I constantes para o cenário de eficiência congelada ou diminuí-los, assumindo que
medidas de eficiência serão adotadas. Quando os requisitos de serviços de energia variam por meio
das classes de renda e por região, é adequado reescrever a Eq. (2.11) como:
n,o, p
ER =  E Ri, j ,k (2.13)
i , j , k =1

Em que i é o uso final, j é a classe de renda e k é a região.

Setor de comércio e serviços

As atividades comerciais e de serviços (incluindo os serviços do setor público) ocorrem,


essencialmente, em edificações e, assim, é recomendado desagregar a demanda de energia por tipos
de edifícios e medir a intensidade energética de uso final em termos de kWh/m2. A definição de
área em m2 deve ser consistente e deve conciliar valores estatísticos com valores técnicos e
arquitetônicos para diferentes contabilidades de áreas, seja de armazenamento, salas de aulas,
corredores etc. Assim, tem-se que:
n,o
EC =  ECi , j (2.14)
i , j =1

Em que i é o uso final e j é o setor ou o tipo de construção e:

ECi , j = Qi j  I i j (2.15)

Onde Iij é a média de watts do uso final i instalada por metro quadrado no setor ou tipo de
construção j. Note que tipos diferentes de construções ou áreas para usos específicos podem ter
diferentes níveis de serviços de energia 9 e, por consequência, diferentes intensidades. Aqui, o nível
de serviços de energia Q é identificado como:

Qi j = Ai j  Pi j  M i j (2.16)

Em que Aij é a área total do setor j (ou tipo de construção j) servida pelo uso final i; Pij é a
percentagem da área de superfície total servida pelo uso final i; e Mij é o número de horas, graus,
dia ou frequência do uso por serviço de energia i. A atividade econômica futura influencia a taxa
9
Por exemplo, a intensidade de iluminação em corredores não é a mesma em salas de escritório ou de aulas.
62 Projeções de demanda de energia

de crescimento da área construída dos setores comercial e de serviços, o que pode acarretar maior
uso do ar-condicionado ou aumento no número de horas que os aparelhos serão usados, por
exemplo. Na Eq. (2.16) uma melhoria técnica, por exemplo, pode ser representada por uma
diminuição do número de watts utilizados por metro quadrado.

Setor industrial

De modo análogo, o setor industrial deve ser desagregado em subsetores industriais


homogêneos e cada um deles nos usos finais mais importantes. Como a maior parte do consumo
elétrico do setor industrial se dá por meio da força motriz, a demanda de energia elétrica pode ser
estimada por tipo de motor por cada subsetor industrial. Assim, tem-se que:
n ,o n,o
EI = E I
j ,k
=  Q j ,k  I j ,k (2.17)
j , k =1 j , k =1

Onde k é o tipo de motor usado em cada subsetor industrial j. Note que o uso final, nesse caso,
é a força motriz. A quantidade dos serviços de energia Q é dada por:

Q j ,k = N j ,k  M j ,k (2.18)

Onde Nj,k é o número de motores por tipo k por subsetor j e Mj,k é o uso do motor por tipo k
por subsetor j (horas/ano). A intensidade de energia Ij,k pode ser definida como a potência por tipo
de motor k por subsetor j. Outra forma de descrever o setor industrial é considerar o número de
toneladas do produto k por subsetor j requerendo o serviço de energia do uso final i. A intensidade
de energia I, nesse caso, pode ser definida como a quantidade de energia demandada por tonelada
produzida (ou outro indicador físico) do produto k no subsetor j, que demande o serviço de energia
i. A Tabela 2-6 a seguir mostra um quadro resumo das equações citadas.

Tabela 2-6 – Quadro resumo – modelo básico de usos finais

Setor Equações Parâmetros


Número total de residências por faixa de renda
N
n,o, p j por região k;
Residencial ER =  ( Nij ,k  Pi j ,k  M i j ,k )  Ii j ,k P Penetração dos aparelhos por uso final i;
i , j , k =1
Número de horas, dia, frequência de uso por
M
serviço de energia.
A Área total por tipo de construção j;
n ,o Percentagem da área de superfície total
Comercial
e Público
EC =  ( Ai j  Pi j  M i j )  I i j P
servida pelo uso final i;
i , j =1
Número de horas, dia, frequência de uso por
M
serviço de energia.
Industrial n,o N Número de motores por tipo k por subsetor j;
(força- EI =  ( N j,k  M j,k )  I j,k M
Número de horas de uso do motor k por
motriz) j , k =1 subsetor j.

Note que as equações da Tabela 2-6 podem ser aplicadas para estimar a demanda de energia
de uso final não elétrico. Por exemplo, para o setor de transporte movido a combustíveis líquidos
ou gasosos, Nj,k é o número de veículos por tipo k por região j, Mj,k é o uso do veículo por tipo k
(km/ano) por região j e Ij,k pode ser definido como o consumo de combustíveis por tipo de veículo
k por km rodado em cada ano em cada região j. Como já mencionado, independentemente da
definição de cada parâmetro, o fundamental é que as unidades sejam compatíveis.
Projeções de demanda de energia 63

Hibridização de modelos

Os métodos de projeção de energia por usos finais podem ser combinados com outros
métodos, por exemplo, com modelos econométricos. Nesse caso, a relação econométrica entre o
nível de atividade de um setor com o resto da economia pode ser utilizada no cálculo da demanda
com base nos usos finais e, ainda, permite uma avaliação explícita das melhorias tecnológicas para
cada uso final. Por exemplo, a projeção da área construída para edifícios pode ser representada por
uma expressão econométrica a partir do PIB do setor comercial. A projeção é feita em dois estágios:
primeiro a projeção da área construída como função do PIB e do coeficiente de elasticidade renda,
seguida da projeção de energia requerida para a área projetada, conforme Eqs. (2.19) a (2.21) a
seguir:

A = a  PIB  (2.19)

Em que α é coeficiente de elasticidade renda, a é um fator de escala e A é a área construída


expressa em m2. Por exemplo, se considerarmos somente o uso de energia para iluminação, a
quantidade de serviço de energia é:
Qluz = A  M luz (2.20)

Onde Mluz representa as horas de uso de iluminação para um dado nível de iluminação. Para
o cálculo da energia de iluminação (Eluz), tem-se que:
Eluz = A  M luz  I luz (2.21)

Em que Iluz é a intensidade de energia em W/m2h para um dado nível de iluminação.


_____________________________
EXERCÍCIO 2.1 – A Tabela 2-7 a seguir mostra as vendas de dois
eletrodomésticos de 1985 a 1989 no Brasil. Estime o consumo de
energia ao final do ano de 1989, a partir dos dados de vendas,
admitindo as seguintes informações técnicas: vida do refrigerador
= 35.000 horas; vida do ar-condicionado = 7.200 horas; potência
média do refrigerador = 210 W; potência média do ar-condicionado =
1.415 W. Considere que o ar-condicionado seja utilizado 1.200
horas/ano e o refrigerador 3.500 horas/ano e que no início do ano
de 1985 os estoques (aparelhos que estão em funcionamento) de
refrigeradores e aparelhos de ar condicionado eram respectivamente
de 22×106 e 1×106 unidades. Considere as seguintes hipóteses:
• Das vendas anuais dos aparelhos de ar, 80% são substituições
e 20% são novas instalações;
• Das vendas anuais dos refrigeradores, 90% são substituições
e 10% são novas instalações.

Tabela 2-7 – Vendas de equipamentos no Brasil (×1.000)


Uso final 1985 1986 1987 1988 1989 Média
Refrigerador 1.689 1.963 1.907 1.651 1.931 1.828
Ar-condicionado 265 397 475 424 481 408
Fonte: Coppe/UFRJ e Eletrobras (1991)
64 Projeções de demanda de energia

É confiável uma estimativa de consumo de energia baseada nos


dados de vendas dos equipamentos? Faça uma lista das possíveis
fontes de erros e incertezas.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.2 – Supondo os valores de consumo anual por
aparelhos listados na Tabela 2-8, estime o uso de eletricidade
anual para a iluminação, a TV, o uso de refrigerador, o chuveiro,
o ar-condicionado e a máquina de lavar para as cidades listadas na
Tabela 2-2. Compare a estrutura de consumo dessas cidades e discuta
as possíveis fontes de erro nesse procedimento. Quais os usos finais
mais importantes?

Tabela 2-8 – Consumo anual por aparelho e por residência em Manaus


Uso final kWh/ano por
residência
Iluminação incandescente 110
Iluminação fluorescente 50
TV (preta e branca ou colorida) 174
Refrigerador 763
Chuveiro elétrico 431
Ar-condicionado 1.115
Máquina de lavar roupa 265
Fonte: Gadgil et al. (1999)
_____________________________
EXERCÍCIO 2.3 – A estrutura de uso final de eletricidade pode
variar significativamente entre países ou regiões. A Tabela 2-9 a
seguir ilustra o consumo de eletricidade do setor industrial e os
usos finais de alguns países para o ano de 1993.

Tabela 2-9 – A estrutura de consumo de eletricidade segundo usos finais


em alguns países em percentual (1993)

Indústria Índia Tailândia Chile Canadá Argentina Brasil


Força motriz 80 73 85 85 75 49
Iluminação 6 3 7 10 7 2
Refrigeração 2 – 3 – 3 –
Aquecimento 2 – 3 – 3 10
processo
Aquecimento – 11 – – – 32
direto
Processo 8 – 2 – 12 7
eletroquímico
Outros 2 13 – 5 – –
Fonte: Valdes-Arrieta (1993), Dutt and Tanides (1994)

Se você necessitasse fazer um único programa de eficiência de


energia para o setor industrial dos países listados na Tabela 2-9,
com quais usos finais você trabalharia? Por quê?
_____________________________
Projeções de demanda de energia 65

EXERCÍCIO 2.4 – Um consumidor residencial tem duas opções para


comprar refrigeradores: um que custa $800 e consome 600 kWh/ano
durante uma vida útil de 25 anos; ou outro refrigerador que custa
10% mais caro e consome 425 kWh/ano, também com vida útil de 25
anos. A compra do segundo refrigerador é economicamente atrativa
para o consumidor residencial? Se a companhia subsidiar em 100% a
compra do segundo refrigerador ela perde dinheiro? Suponha que a
companhia usa uma taxa de desconto de 12% e o consumidor de 60% ao
ano, que sua tarifa é de 0,09 $/kWh e o custo marginal da CE é 0,15
$/kWh.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.5 – Um consumidor industrial deve comprar um kit
com duas lâmpadas fluorescentes convencionais (40W – considerado
na resolução do exercício 2x20W) e um reator eletrônico duplo, com
FP de 0,98 e com potência e perda em 5% da potência nominal da
lâmpada – presume-se o custo do conjunto luminária (lâmpada: R$
9,70 e reator: R$24,90) em R$ 44,30 – e que tem 1.920 horas de uso
anual durante uma vida útil de cinco anos; ou outro kit que tem
duas lâmpadas fluorescentes eficientes (32W – considerado como duas
lâmpadas de 16 W na resolução do exercício) e um reator eletrônico
duplo, com FP de 0,98 e com potência e perda em 5% da potência
nominal da lâmpada – presume-se o custo do conjunto luminária
(lâmpada: R$ 10,90 e reator: R$25,90) em R$ 47,70 – e que tem as
mesmas 1.920 horas de uso anual também durante uma vida útil de
cinco anos. A compra do segundo kit é economicamente atrativa para
o consumidor industrial? Se a companhia subsidiar a compra da LFE
ela perde dinheiro? O segundo kit mantém o mesmo nível do serviço
de energia? Utilize as informações de tarifas e custo marginal do
EXERCÍCIO 2.4.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.6 – Este exemplo, mais extenso, trata do cenário
de eficiência congelada de energia compreendendo as projeções de
demanda para Brakimpur. O país Brakimpur tem uma população de 10,5
milhões e uma renda média per capita de $2.000. No ano referência,
o consumo total de energia é de 31,14 TWh ou aproximadamente 6,5
milhões de toneladas equivalentes de petróleo TEP/ano com plano de
investimento indicado na Tabela 2-10 a seguir.

Tabela 2-10 – Planos de crescimento de Brakimpur


Taxa de crescimento anual
Dados Ano de referência (X)
Ano projetado (X+10)
População 10,5 milhões 3,0%
PIB $33 bilhões 5,5%
20% agricultura 10% agricultura
50% indústria 40% indústria
Estrutura do PIB
30% comércio e 50% comércio e serviços
serviços
66 Projeções de demanda de energia

Solução
Há um arquivo de trabalho (Barkimpur.xlsx) disponível em uma
página da internet10 com as soluções distribuídas em planilhas
(Residencial, Comercial e Industrial). A ideia é que o leitor faça
uso das tabelas apresentadas a seguir e tente reproduzir os
resultados apresentados nas planilhas. Nesse arquivo, cada planilha
é dividida em duas partes: a primeira refere-se aos assuntos
abordados neste capítulo (Parte I – Capítulo 2); e a segunda parte
refere-se aos assuntos do Capítulo 4 (Parte II – Capítulo 4).

Setor residencial

Tabela 2-11 – Indicadores socioeconômicos de demanda de energia – ano


de referência X
População 10.500.000
Pessoas/residência 4,18
Número de residências N 2.511.961
Classes de renda (Salário mínimo) % de residências No de residências
0–2 15% 376.794
2–5 32% 803.828
5–10 28% 703.349
+10 25% 627.990
Total 100% 2.511.961

Tabela 2-12 – Dispositivo por classe de renda (P=%) e consumo médio por
dispositivo (I=W)
Dispositivo por classe de Consumo médio por
Uso final renda (%) dispositivo (W)
0–2 2–5 5–10 +10 0–2 2–5 5–10 +10
Lâmpada
incandescente 100% 200% 400% 700% 60 60 60 100
Lâmpada
fluorescente 100% 100% 250% 300% 20 20 20 20
Ferro elétrico 80% 81% 85% 85% 2.300 2.300 2.300 2.300
TV 65% 70% 85% 112% 100 100 100 100
Máquina de lavar
roupas 0% 4% 15% 31% 600 600 600 600
Ar-condicionado 0% 20% 70% 95% 350 350 400 400
Freezer 0% 6% 20% 35% 700 700 700 800
Geladeira 70% 79% 83% 100% 230 230 230 230
Ventiladores 71% 71% 78% 78% 200 200 200 200
Aquecedor de
água 9% 80% 60% 70% 2.500 2.500 2.500 3.000
Outros 50% 100% 150% 200% 60 60 60 100

10
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Projeções de demanda de energia 67

Tabela 2-13 – Uso (M=Horas/Ano) e consumo E=N×P×M×I (GWh/Ano)


Uso (horas/ano) Consumo (GWh/ano)
Uso final (M)
0–2 2–5 5–10 +10 0–2 2–5 5–10 +10 Total
Lâmpada
incandescente 3.330 3.000 2.500 1.000 75 289 422 440 1.226
Lâmpada
fluorescente 1.250 1.250 1.250 1.500 9 20 44 57 130
Ferro
elétrico 13 22 43 52 9 33 59 64 165
TV 1.500 1.500 1.900 2.000 37 84 114 141 375
Máquina de
lavar roupas 0 833 833 833 0 0 53 97 150
Ar-
condicionado 0 2.000 3.000 4.500 100 113 591 1.074 1.777
Freezer 0 1.286 1.286 1.500 40 43 127 264 434
Geladeira 2.609 3.043 3.478 3.913 158 444 467 565 1.635
Ventiladores 1.000 1.500 1.750 2.500 54 171 192 245 662
Aquecedor de
água 120 120 200 200 10 193 211 264 678
Outros 667 1.000 3.000 2.400 8 48 190 301 547
Totais 360 1.440 2.469 3.511 7.779

Tabela 2-14 – Cenário socioeconômico – ano projetado (X+10)


População 14.111.122
Pessoas/residência 4.00
Número de residências 3.527.780
Classes de renda (salário mínimo) % de residências Nº de residências
0–2 13% 458.611
2–5 27% 952.501
5–10 30% 1.058.334
+10 30% 1.058.334
Total 100% 3.527.780

Tabela 2-15 – Consumo de energia – ano projetado E(X+10)=N(X+10)×P×M×I


(GWh/Ano)
Uso final 0–2 2–5 5–10 +10 Total
Lâmpada incandescente 91,6 342,9 635,0 740,8 1.810,4
Lâmpada fluorescente 11,5 23,8 66,1 95,3 196,7
Ferro elétrico 11,0 39,0 89,0 107,6 246,6
TV 44,7 100,0 170,9 237,1 552,7
Máquina de lavar roupas 0,0 0,0 79,3 164,0 243,3
Ar-condicionado 0,0 133,4 889,0 1.809,8 2.832,1
Freezer 0,0 51,4 190,5 444,5 686,5
Geladeira 192,6 526,7 702,7 952,5 2.374,5
Ventiladores 65,1 202,9 288,9 412,8 969,7
Aquecedor de água 12,4 228,6 317,5 444,5 1.003,0
Outros 9,2 57,2 285,8 508,0 860,1
Total 438,1 1.705,8 3.714,8 5.916,7 11.775,4
68 Projeções de demanda de energia

Questões
Quais os usos finais com maior consumo de GWh e com menor
consumo?
Quais usos finais seriam interessantes para fazer um plano de
conservação?
Recalcule a Tabela 2-15 mantendo a mesma distribuição de renda
do ano de referência e explique o que acontece.
Considere uma mudança na distribuição de renda, na penetração
dos aparelhos e no consumo de acordo com a realidade de sua região.
Faça hipóteses, descreva-as e faça as mudanças necessárias na
planilha de cálculo. Você pode consultar o IBGE, a FGV, o IPEA, os
Balanços Estaduais de Energia e o Balanço Energético Nacional.

Setor comercial
O mesmo pode ser feito para o setor comercial, trocando o N
(número de residências) por A (área comercial expressa em m2). Para
esse exemplo, considere que o setor comercial seja responsável por
aproximadamente 15% do consumo de eletricidade do país. Os mais
importantes subsetores são: comércio pequeno, shopping-center,
hotéis, bancos e escolas; e os usos finais identificados no setor
comercial são: iluminação, ar-condicionado, cocção elétrica,
refrigeração e equipamentos. A Tabela 2-16 a seguir apresenta o
consumo de eletricidade do ano de referência por grupos e por usos
finais do setor comercial de Brakimpur.

Tabela 2-16 – Setor comercial de Brakimpur – consumo do ano de


referência (MWh)
Subsetor/ Ar- Cocção
Iluminação Refrigeração Equipamentos Total
usos finais condicionado elétrica
Comércio
pequeno 121.880 1.925 825 55.440 3.025 183.095
Shopping
center 660.000 70.000 18.000 403.200 50.000 1.201.200
Hotéis 154.000 177.188 788 176.400 5.250 513.626
Bancos 93.750 5.625 274 50.400 3.125 153.174
Escolas 1.470.000 382.813 7.875 352.800 70.000 2.283.488
TOTAL 2.499.630 637.551 27.762 1.038.240 131.400 4.334.583
Participação 58% 15% 1% 24% 3% 100%

Para o ano de referência, o consumo de eletricidade no setor


comercial é de 4.334 GWh. O uso final de maior consumo é a
iluminação (58%). A refrigeração também teve uma importante
participação com 24%, seguida pelo ar-condicionado com 15%,
equipamentos com 3% e, finalmente, cocção elétrica com 1%. O consumo
de eletricidade do setor comercial pode ser estimado com a seguinte
relação:
5, 5
E=  Pij  Aij  M ij  I ij (2.22)
i , j =1
Projeções de demanda de energia 69

Onde E é o consumo total de energia do setor comercial; Pij é a


penetração (% da área superficial total) do uso final i no subsetor
j; Aij é a área total do subsetor j com uso final i; Mij é o número
total de horas no ano de uso final i no subsetor j e Iij é a potência
consumida por unidade de área para uso final i no subsetor j. Para
o ano de referência, E(X) é conhecido. Portanto, todos os outros
parâmetros podem ser ajustados. Uma vez definido o ano de
referência, é possível projetar o consumo de energia em um horizonte
próximo, por exemplo, o ano (X+10).
Esse tipo de cenário supõe que as tendências são mantidas com
relação ao uso energético, penetração dos equipamentos etc. Em
países onde o PIR não é uma prática, esse cenário deve coincidir
com a perspectiva oficial. O consumo de eletricidade para uso final
i no subsetor j para o ano projetado (X+10) pode ser calculado com
a seguinte expressão:
Eij ( X + 10 ) = Pij  Aij ( X + 10 )  M ij  I ij = Eij ( X )  Aij ( X + 10 ) / Aij ( X ) (2.23)

Onde a área projetada é calculada com base na taxa de


crescimento para cada subsetor.

Tabela 2-17 – Setor comercial de Brakimpur – hipóteses para projeção


Ano de
% referência
Subsetor Participação (%) área uso final
a.a. (milhões de
m2)

Ilum. Ar-cond. Cocção Refrig. Equip.


Comércio 100
pequeno 12,0 55 85 10 15 85
Shopping 100
Center 10,0 40 100 60 20 100
Hotéis 8,0 35 100 50 30 100 25
Bancos 12,0 25 100 30 0 100 25
Escolas 10,0 350 90 25 10 25 25
TOTAL 10,2 505

Estime o consumo de eletricidade no ano projetado (X+10) para


um cenário de eficiência congelada, supondo o produto M×I expresso
em kWh/m2 e Pij conforme dados da Tabela 2-17. Utilize a planilha
do exemplo no endereço de internet indicado e consulte os
resultados.

Questões
Observando os resultados que você projetou, quais são os
subsetores comerciais com maior consumo de MWh? Quais são os
subsetores comerciais com menor consumo?
Quais usos finais são interessantes para um plano de
conservação? Discuta algumas razões que poderiam explicar as
diferenças observadas.
70 Projeções de demanda de energia

Setor industrial
Para o setor industrial, a atenção se volta para um importante
uso final: o uso de eletricidade em motores. Em média, mais de 95%
do uso de energia elétrica nos subsetores industriais é destinado
ao serviço de energia oriundo de motores de diversas capacidades
(força motriz).
O conteúdo das tabelas de dados de entrada produzidos pelo
setor industrial está descrito a seguir. Note que o consumo total
de energia elétrica destinada à força motriz é obtido com base em
dados agregados (PIB – ver Tabela 2-20). O mesmo valor também é
obtido com base nos desempenhos dos motores (ver Tabela 2-23).

Tabela 2-18 – Consumo projetado por subsetor industrial E(X)=PIB(X)×M×I


I PIB M E(X) Taxa E(X+10)
Subsetor
kW/U$ $×106 hora/ano GWh Crescimento GWh
Metalurgia 0,524 510 4.320 1.153,7 0,82% 1.251,9
Elétrico/
Eletrônica 0,045 18.837 4.320 3.682,2 6,91% 7.182,7
Madeira 0,822 560 1.920 883,6 3,86% 1.290,4
Químico 0,205 1.105 8.640 1.961,9 2,54% 2.521,2
Têxtil 0,559 396 4.320 956,6 3,69% 1.374,4
Alimentos e
Bebidas 0,313 875 6.480 1.774,1 1,01% 1.961,7
Transporte 0,309 623 6.480 1.248,5 3,43% 1.749,3
Outros 0,378 10.150 1.920 7.365,1 4,19% 11.103,0
TOTAL 33.056 19.025,7 28.434,5

Tabela 2-19 – Consumo de eletricidade por uso final por subsetor


industrial (C=%)
Calor de Aquecimento
Subsetor Motor processo direto Eletroquímico Iluminação Outros Total
Metalurgia 1% 0% 98% 0% 0% 1% 100%
Elétrico/
Eletrônica 98% 0% 0% 0% 2% 0% 100%
Madeira 95% 0% 0% 0% 5% 0% 100%
Químico 79% 5% 4% 9% 3% 0% 100%
Têxtil 89% 4% 1% 0% 5% 1% 100%
Alimentos e
Bebidas 6% 77% 16% 0% 1% 0% 100%
Transporte 80% 10% 5% 0% 5% 0% 100%
Outros 58% 1% 39% 0% 2% 0% 100%

Tabela 2-20 – Distribuição (D=%) e consumo por tipo de motor (CV) por
subsetor – E(X)×C×D em GWh/Ano
Subsetor <10 10<P<40 40<P<100 100<P<200 200<P<300 Total
Metalurgia 13% 1,50 25% 2,88 23% 2,65 27% 3,11 12% 1,38 100% 12
Elétrico/
Eletrônica 25% 902,14 35% 1.262,99 40% 1.443,42 0% 0,00 0% 0,00 100% 3.609
Madeira 15% 125,91 33% 277,01 30% 251,83 12% 100,73 10% 83,94 100% 839
Químico 12% 185,99 35% 542,47 25% 387,48 13% 201,49 15% 232,49 100% 1.550
Têxtil 12% 102,16 35% 297,98 25% 212,84 13% 110,68 15% 127,71 100% 851
Alimentos e
Bebidas 10% 10,64 19% 20,22 40% 42,58 19% 20,22 12% 12,77 100% 106
Transporte 5% 49,94 25% 249,70 18% 179,78 27% 269,68 25% 249,70 100% 999
Outros 13% 555,33 25% 1.067,94 23% 982,50 24% 1.025,22 15% 640,76 100% 4.272
TOTAL 13% 1.933,62 25% 3.721,20 23% 3.503,09 27% 1.731,13 12% 1.348,75 100% 12.238
Projeções de demanda de energia 71

Tabela 2-21 – Uso do motor (M em Horas/Ano) e intensidade (I em


kW/Motor)
Subsetor <10 10<P<40 40<P<100 100<P<200 200<P<300
Metalurgia 3.800 2,6 6.000 15,5 5.300 50,1 4.200 106,0 3.500 197,8
Elétrico/Eletrônica 5.700 2,7 6.300 16,0 3.500 46,9 0 0,0 0 0,0
Madeira 1.500 2,6 2.000 14,4 1.800 44,2 1.800 97,2 1.800 167,1
Químico 4.200 2,5 5.000 13,1 5.600 46,4 6.800 97,2 5.900 169,1
Têxtil 3.200 2,5 5.300 15,5 4.800 44,2 6.000 99,2 6.000 167,6
Alimentos e Bebidas 3.500 2,6 3.000 15,8 3.200 47,5 4.500 97,7 4.800 166,3
Transporte 3.900 2,5 6.000 13,1 5.300 46,3 4.500 97,1 4.000 167,4
Outros 3.700 2,2 4.900 15,1 5.000 46,9 5.100 99,4 5.500 169,3

Tabela 2-22 – Número de motores por tipo por subsetor (N)(milhões)


Subsetor <10 10<P<40 40<P<100 100<P<200 200<P<300
Metalurgia 153 31 10 7 2
Elétrico/Eletrônica 58.702 12.524 8.790 0 0
Madeira 31.984 9.650 3.168 576 279
Químico 17.542 8.305 1.492 305 233
Têxtil 12.639 3.638 1.004 186 127
Alimentos e Bebidas 1.181 426 280 46 16
Transporte 5.066 3.186 732 617 373
Outros 68.152 14.445 4.188 2.023 688

Tabela 2-23 – Consumo: ano de referência, E(X)=N×I×M e ano projetado,


E(X+10)=N(X+10)×I×M (GWh)
Subsetor <10 10<P<40 40<P<100 100<P<200 200<P<300 TOTAL
Metalurgia 1,5 1,6 2,9 3,1 2,7 2,9 3,1 3,4 1,4 1,5 11,6 12,5
Elétrico/ 3.608,7 7.039,4
Eletrônica 903,4 1.762,3 1.262,4 2.462,6 1.442,9 2.814,6 0,0 0,0 0,0 0,0
Madeira 124,7 182,2 277,9 405,9 252,0 368,1 100,8 147,2 83,9 122,6 839,4 1.225,9
Químico 184,2 236,7 544,0 699,1 387,7 498,2 201,6 259,1 232,5 298,7 1.549,9 1.991,8
Têxtil 101,1 145,3 298,9 429,4 213,0 306,0 110,7 159,1 127,7 183,5 851,4 1.223,2
Alimentos 106,5 117,8
e Bebidas 10,7 11,9 20,2 22,3 42,6 47,1 20,2 22,4 12,8 14,1
Transporte 49,4 69,2 250,4 350,9 179,6 251,7 269,6 377,7 249,8 349,9 998,8 1.399,4
Outros 554,8 836,3 1.068,8 1.611,2 982,1 1.480,5 1.025,5 1.546,0 640,6 965,8 4.271,8 6.439,8
TOTAL 1.929,9 3.245,5 3.725,5 5.984,4 3.502,5 5.769,0 1.731,6 2.514,8 1.348,6 1.936,1 12.238,1 19.449,8

Questões
Quais tipos de motores são interessantes, economicamente, para
um plano de conservação de energia? Por quê?
Considere uma substituição de motores, considerando que 10% dos
motores de 40 a 100 kW estão sobredimensionados e poderiam ser
substituídos por motores de 10 a 40 kW. Qual o efeito sobre o
consumo de energia para cada subsetor industrial?
_____________________________

2.4.2. Modelo de decomposição

Os modelos de decomposição são feitos com base na variação do consumo de energia segundo
três fatores: (i) variações do conteúdo energético; (ii) variações da estrutura econômica; e (iii) nível
de atividade econômica. Esses modelos têm sido estudados desde a década de 70, inicialmente
72 Projeções de demanda de energia

analisando as variações de mudanças na composição da produção industrial e seus efeitos no


consumo industrial de energia (J. Darmstadter, Dunkerley and Alterman 1977; Ang and Zhang
2000). Nesse tipo de modelo, Ei(t) representa o serviço de energia consumido pelo setor i no ano t,
Ai(t) o nível de atividade desse setor na economia (PIB setorial) para o mesmo ano e PIB(t) o nível
de atividade de todos os setores da economia. O modelo de decomposição segue a seguinte
expressão:
Ei (t ) A (t )
Ei (t ) =  i  PIB (t ) = Ci (t )  Si (t )  PIB (t ) (2.24)
Ai (t ) PIB (t )

Onde:
Ei (t )
Ci (t ) = (2.25)
Ai (t )
Representa o conteúdo energético do setor i e:
Ai (t )
Si (t ) = (2.26)
PIB (t )
O índice de estrutura econômica desse mesmo setor. Para uma variação anual do consumo de
energia de todos os setores, tem-se que:
Etotal = Etotal (t ) − Etotal (t − 1) (2.27)

Onde:
n
Etotal (t ) =  Ei (t ), n setores (2.28)
i =1

O que se busca nessa modelagem é a variação de três efeitos: o efeito conteúdo, o efeito
estrutura e o efeito atividade. Mais exatamente, esse modelo afirma que a variação do consumo
final de energia de um país depende da variação do conteúdo energético em cada setor (efeito
conteúdo), da mudança na estrutura da economia (efeito estrutura) e da variação do crescimento
econômico (efeito atividade). Assim, tem-se que:
n n n
Etotal =  Ci  Si  PIB +  Ci  Si  PIB +  Ci  Si  PIB +  (2.29)
i i i

Onde n é o número de setores da economia. De acordo com a Eq. (2.29), a variação total do
consumo de energia em um período é igual à variação dos três efeitos de todos os setores da
economia durante o mesmo período. As taxas de variações do conteúdo energético, do índice de
estrutura e da atividade em um determinado tempo tk podem ser definidas, respectivamente, com as
expressões a seguir:
ci (tk ) = log[ Ci (tk ) / Ci (tk −1 )] (2.30)

si (t k ) = log[ S i (t k ) / Si (t k −1 )] (2.31)

E:
Projeções de demanda de energia 73

(t k ) = log[ PIB(t k ) / PIB(t k −1 )] (2.32)

Assim, o efeito conteúdo entre o intervalo tk–1 e tk é:


ci (t k )
ECi (t k ) = Ei (t k )  (2.33)
ci (t k ) + si (t k ) + (t k )
Onde:
Ei (t k ) = Ei (t k ) − Ei (t k −1 ) (2.34)

As equações para o efeito estrutura ESi(tk) e o efeito atividade EPIB(tk) podem ser escritas de
forma similar. Por exemplo, para estimar a demanda do ano seguinte (t a t+1) podem-se utilizar os
efeitos de cada setor relativo ao período anterior ou a média de cada efeito dos últimos anos ou,
ainda, um modelo de regressão para os respectivos efeitos.
Devido aos outros fatores que interferem na variação total do consumo, a soma desses três
efeitos com base em dados anteriores não corresponde à variação total de energia consumida para
o período seguinte, pois há sempre um resíduo devido aos efeitos de segunda, terceira e demais
ordens. Considerando pequenos intervalos, é possível desconsiderar os erros de ordem superior.
Assim, pode-se reescrever a Eq. (2.29) para um determinado setor como:
dEi (t ) = dCi (t )  Si (t )  PIB (t ) + Ci (t )  dSi (t )  PIB (t ) + Ci (t )  Si (t )  dPIB(t ) (2.35)

A Eq. (2.35) considera que as variações não são as mesmas no tempo e que as medidas
utilizadas são amostragens discretas no tempo. Em outras palavras, o diferencial de consumo do
setor i é a soma exata dos diferenciais dos efeitos:
dEi (t ) = dECi (t ) + dES i (t ) + dEPIB (t ) (2.36)

Ou:
tf tf tf
Ei (t f ) − Ei (ti ) =  dECi (t ) +  dES i (t ) +  dEPIB (t ) (2.37)
ti ti ti

Conhecendo as funções Ci(t), Si(t) e PIB(t) para o intervalo de tempo inicial e final, torna-se
possível calcular a variação do consumo de energia do setor i de forma exata. O mesmo
procedimento pode ser realizado para os demais setores para obter a variação do consumo global
de uma economia. No entanto, é pouco provável obter essas funções em tempo contínuo, o mais
usual são as medições espaçadas e o uso de técnicas de interpolação (função linear ou exponencial)
para os intervalos não medidos. Sun (2001), por exemplo, utilizou um modelo de previsão de
demanda com base em técnicas de decomposição dos efeitos para 15 países da União Europeia.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.7 – Calcule o efeito conteúdo ECi(tk), o efeito
estrutura ESi(tk) e o efeito atividade EPIB(tk) para os setores da
economia brasileira nos anos de 2001 a 2010 com base nos dados da
Tabela 2-24 e Eqs. (2.30) a (2.34). Estime o consumo de energia em
milhões de TEP/ano do setor de transporte, indústria e setor
energético para o ano de 2020, considerando que durante o período
de 2011 a 2020 a variação do consumo anual de cada setor é a soma
dos valores médios dos três efeitos observados nos dez anos
74 Projeções de demanda de energia

anteriores. Indique esses valores em um gráfico e, para efeito de


comparação, os valores que seriam obtidos se a taxa de variação
anual do consumo de energia de cada setor durante os anos de 2011
a 2020 se mantivesse igual à taxa média de variação dos dez anos
anteriores.

Tabela 2-24 – Consumo de recursos energéticos primários e PIB por setor


do Brasil – EXERCÍCIO 2.7
PIB (106 U$
de 2010) 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Transporte 61 64 66 64 68 70 71 75 72 78 95
Agropecuário 72 75 80 84 86 87 91 95 101 96 103
Indústria 294 303 309 311 338 343 351 370 385 358 386
Comercial e
Público 946 985 1.010 1.020 1.073 1.113 1.165 1.241 1.314 1.329 1.413
Setor
Energético 59 62 64 67 69 72 74 77 82 82 95

Consumo (106
TEP) 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Transporte 47,4 47,8 49,2 48,2 51,5 52,5 53,3 57,6 62,4 62,7 69,4
Agropecuário 7,3 7,7 7,8 8,2 8,3 8,4 8,6 9,1 9,9 9,5 9,9
Indústria 61,2 61,5 65,4 68,4 72,2 73,5 76,8 81,9 82,3 76,4 85,7
Comercial e
Público 8,2 7,9 8,1 8,2 8,5 8,9 9,1 9,5 9,8 10,0 10,2
Setor
Energético 12,8 13,6 14,4 15,8 16,4 17,6 18,8 21,0 24,5 24,4 25,3

O gráfico do lado esquerdo da Figura 2-5 a seguir mostra as


projeções de demanda de energia primária para o setor de transporte,
indústria e o setor energético conforme suposições e, do lado
direito, o conteúdo energético de quatro setores da economia
brasileira durante o período de 2000 a 2010, com base nos dados da
Tabela 2-24.

Figura 2-5 – Demanda pelo método de decomposição e conteúdo energético


(2000 a 2010) – EXERCÍCIO 2.7
As linhas pontilhadas do gráfico do lado esquerdo da Figura 2-5
são projeções de demanda de energia considerando que as variações
Projeções de demanda de energia 75

anuais durante o período de 2011 a 2020 são as somas dos valores


médios dos efeitos conteúdo, estrutura e atividade dos respectivos
setores, tomando como base os dez anos anteriores. As linhas cheias
a partir de 2010 são projeções com base nas taxas médias de
variações dos dez anos anteriores.
____________________________

2.5. MODELOS DE DEM AND A DE ENERGI A (AGREG ADO)

Os métodos apresentados neste item tratam as variáveis de modo agregado, portanto as


variáveis relacionadas à intensidade energética dos usos finais não são consideradas. São modelos
úteis para projeções, por exemplo, da área a ser construída no setor comercial, da frota futura de
veículos, da produção industrial, da taxa de crescimento de residências e demais variáveis
socioeconômicas. Os resultados desses modelos servem de suporte para os de usos finais e outras
aplicações.

2.5.1. Modelos de regressão

Num modelo de regressão busca-se estabelecer as relações entre uma variável de interesse e
outras supostamente causais. Por exemplo, a demanda de energia residencial de um país pode estar
relacionada linearmente com o número de residências. O consumo de combustíveis líquidos está
relacionado, evidentemente, com a frota de veículos e assim por diante.
Um modelo de regressão é chamado simples quando a variável dependente é explicada por
uma única variável independente e chamado de multivariado quando há uma relação linear entre
uma variável dependente y e k variáveis independentes xj (j=1,...,k). As variáveis dos modelos de
regressão de demanda de energia mais comuns são: o PIB, a renda, a população e o preço da
eletricidade. Jannuzzi e Schipper (1991), por exemplo, examinaram o consumo elétrico residencial
do Brasil com base em modelo de regressão e verificaram que a taxa de crescimento na demanda
de eletricidade é superior à da renda. Em casos específicos, faz-se uso de variáveis relacionadas ao
número de turistas, variação da temperatura local, radiação solar etc.
O’Neill e Desai (2005) projetaram o consumo de energia nos Estados Unidos com modelo de
regressão baseado nos dados do período de 1982 a 2000 publicados pela EIA (Energy Information
Administration). Nesse modelo de regressão, foram integrados o crescimento do PIB americano e a
intensidade energética para as previsões futuras de consumo de energia.
A Tabela 2-25 a seguir indica um esquema prático de um sistema linear para regressão
multivariada.

Tabela 2-25 – Modelo de regressão multivariada

variável k variáveis independentes


observação, i
dependente, yi xi1 xi2 ... xik
1 y1 x11 x12 ... x1k
2 y2 x21 x22 ... x2k
... ... ... ... ... ...
n yn xn1 xn2 ... xnk

De onde se estabelece o seguinte modelo matemático:


76 Projeções de demanda de energia

yi = 0 + 1 xi1 + 2 xi 2 + ... + k xik + i = 0 + i +  ( j xij )


k
(2.38)
j =1

Onde  0 é o intercepto do eixo y, k são os coeficientes angulares; k é o número de variáveis


independentes e  o erro (desvio ou resíduo). A expressão matricial desse modelo pode ser escrita
conforme Eq. (2.39) a seguir:
Y( n1) = X ( nk +1) β ( k +11) + ε ( n1) (2.39)

Onde:
 y1  1 x11 ... x1k  0   1 
y  1 x21 ... 
x2 k     
Y =  2 , X= , β =  1 , ε =  2 (2.40)
 ...  ... ... ... ...   ...   ... 
       
 yn  1 xn1 ... xnk  k   n 

Os parâmetros desconhecidos (0, 1, 2,..., k) podem ser estimados de acordo com o método
dos mínimos quadrados11 (MMQ). O principal requisito para o método dos mínimos quadrados é
que os desvios sejam distribuídos aleatoriamente e essa distribuição seja normal e independente. O
estimador do MMQ é um dos mais utilizados na econometria. Trata-se de um estimador que
minimiza a soma dos quadrados dos resíduos, ou seja:
n n
SQR =  i2 =  ( yi − 0 − 1xi1 − 2 xi 2 − ... − k xik )2 (2.41)
i =1 i =1

De tal modo que o ajuste do modelo aos dados observados apresenta erros mínimos possíveis.
Se a matriz X tem posto completo, então XTX tem inversa e a solução do sistema linear da
Eq. (2.39) tem solução única, que é dada por:


β k +11 = XTnk +1X nk +1  X
−1 T
nk +1Yn1  (2.42)

É importante que as observações consideradas em um modelo de regressão sejam de amostras


não enviesadas, ou seja, um subgrupo de dados de energia deve ter a mesma probabilidade de ser
incluído no modelo que outro subgrupo. Outros problemas comuns são a ocorrência de
heterocedasticidade, autocorrelação e endogeneidade. A heterocedasticidade ocorre quando a
variância do erro não é constante em todas as observações. O contrário desse fenômeno é a
homocedasticidade, a qual confere aos dados regredidos menor dispersão em torno da reta de
regressão do modelo. Um dos testes para avaliar a homocedasticidade é o teste de White, que
consiste em testar os resíduos do modelo. A autocorrelação é uma medida que informa o quanto o
valor de uma variável aleatória é capaz de influenciar as demais variáveis vizinhas. Por exemplo,
quando a ocorrência de um dado mais alto condiciona valores também altos para as amostras
vizinhas. Em relação aos resíduos de um modelo de regressão com base em séries temporais, a
autocorrelação ocorre quando existe uma dependência temporal entre os valores sucessivos de
resíduos. Existem, dentre outros, dois testes indicados para detectar a autocorrelação dos resíduos:

11
O método de estimação baseado nos mínimos quadrados pertence à inferência clássica, na qual os parâmetros do
modelo de regressão são imaginados como fixos apesar de desconhecidos. Outro método é a função de máxima
verossimilhança. Outros métodos usuais de estimação vêm da análise bayesiana, na qual o conhecimento dos
parâmetros é quantificado por meio de uma distribuição de probabilidade.
Projeções de demanda de energia 77

o teste de Durbin-Watson e o teste de Godfrey. A endogeneidade se mostra presente em uma análise


de regressão quando a variável independente influencia a variável dependente e vice-versa. Em
modelos econométricos de demanda de energia somente a variável dependente (endógena) deve
refletir o efeito das variáveis explicativas (independentes). Um dos testes indicado para avaliar a
endogeneidade é o teste de Hausman. Recomendamos ao leitor ampla pesquisa sobre testes
estatísticos antes de qualquer conclusão com base em modelos de regressão.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.8 – Considere as séries temporais de consumo de
petróleo no Brasil indicadas na Tabela 2-26 e elabore um modelo de
regressão para estimar o consumo de petróleo (103 TEP/dia) em função
da população, PIB e frota de veículos.

Tabela 2-26 – Dados do Brasil – EXERCÍCIO 2.8


Consumo de População PIB (U$ PPP Frota de
Ano petróleo 2005) veículos
(103 TEP/dia) (milhões) (milhões) (milhões)
2001 306 175 1.398 31,9
2002 296 177 1.435 35,5
2003 286 180 1.451 36,6
2004 295 182 1.534 39,2
2005 306 184 1.583 42,1
2006 318 186 1.645 45,4
2007 327 188 1.745 49,6
2008 331 190 1.836 54,5
2009 336 192 1.824 59,3
2010 356 194 1.960 64,8

Elabore um gráfico com as estimativas de consumo de petróleo


conforme cenários indicados na Tabela 2-27 a seguir, considerando
as taxas de variações anuais para o período de 2011 a 2020.

Tabela 2-27 – Cenários – EXERCÍCIO 2.8


Taxas de variações (% a.a. entre 2011 Caso Crescimento Estagnação
e 2020) Base
População (POP) 1,1% 1,2% 1,1%
PIB (Y) 2,8% 4,5% 1,9%
Frota de veículos (FROTA) 5,0% 8,0% 2,5%
Solução
A solução para um modelo de regressão proposto pelo EXERCÍCIO
2.8 consiste em encontrar a matriz  dos coeficientes conforme Eq.
(2.42), onde:
306   1 175 ... 31,9 
296   1 177 ... 35,5
Y=  , X= (2.43)
 ...  ... ... ... ... 
   
356   1 194 ... 64,8
78 Projeções de demanda de energia

Com a ajuda de uma planilha ou de um software mais avançado


chega-se ao seguinte modelo de regressão:
Petróleo103 TEP/dia = 753,29 − 4,27(POP) MM + 0,19(PIB) U$MM + 1,04(FROTA ) MM (2.44)

A Figura 2-6 a seguir indica as estimativas de consumo de


petróleo em 103 boe/dia para o período de 2011 a 2020 para os três
cenários da Tabela 2-27. Note que os erros entre os dados estimados
pelo modelo de regressão e os dados reais são mínimos (ver período
2001 a 2010 na Figura 2-6).

Figura 2-6 – Consumo de petróleo no Brasil com base em modelo de


regressão – EXERCÍCIO 2.8

_____________________________

2.5.2. Modelo econométrico

Um modelo econométrico para estimativa da demanda de energia tem a vantagem de requerer


menos dados e de possuir base teórica estatística relevante. Geralmente, esses modelos são usados
para se estudar uma classe completa e homogênea de consumidores e não levam em conta,
necessariamente, a sua estrutura tecnológica e o uso final da energia.
Tipicamente, o modelo econométrico procura representar o consumo de energia por meio de
uma equação, que pode ser obtida por algum método de regressão ou empírico. Um dos tipos mais
comuns de equação econométrica usada em estudos de energia é baseada na função de produção de
Cobb&Douglas, que expressa a demanda de energia em função dos preços de energia e nível de
atividade econômica:

E = aY  P − (2.45)

Onde E é a demanda de energia, Y é a renda, P é o preço da energia, α é a elasticidade energia-


renda e  é a elasticidade energia-preço. Elasticidades do preço e da renda indicam como a demanda
Projeções de demanda de energia 79

por energia varia em função da mudança no preço da commodity e na renda dos consumidores,
respectivamente. A elasticidade renda é, portanto, definida como:
dE E
= (2.46)
dY Y
Onde E é a demanda por energia e Y é a renda (PIB). A elasticidade preço é definida de forma
similar em relação ao preço pago pelos consumidores:
dE E
= (2.47)
dP P
Em que E é a demanda de energia e P é o preço da energia. Os modelos econométricos
utilizam dados do passado para estimar estatisticamente os parâmetros da elasticidade renda e
elasticidade preço por meio de análise de regressão, por exemplo. Esses modelos foram amplamente
usados nos estudos de projeções de demanda de energia até a década de 1970 quando representavam
satisfatoriamente o comportamento da demanda de energia. Ainda hoje são ferramentas importantes
para compreender a natureza agregada da demanda de energia e dois de seus determinantes – preço
e renda.
Atualmente, considera-se que a estimativa das elasticidades dos fatores determinantes usando
dados do passado é apenas uma indicação para o futuro. Desde a década de 1970, existe uma
crescente evidência mostrando que esse relacionamento pode variar, sendo influenciadas por
mudanças na estrutura tecnológica da demanda de energia, no comportamento do consumidor,
legislação, normas de uso de energia etc. São fatores não necessariamente relacionados ao preço ou
à renda. O choque de preços de petróleo mostrou também aos analistas de energia que alguns usos
já se encontravam saturados em países industrializados e que novas informações deveriam ser
incorporadas para explicar a evolução do consumo de energia.
O modelo econométrico é muito utilizado para fornecer uma referência à projeção do
crescimento dos serviços de energia. Se a estrutura tecnológica da demanda de energia permanece
constante ou segue uma trajetória que pode ser extrapolada do passado, então o crescimento no
consumo de energia projetado é idêntico ao crescimento nos serviços de energia. Esse tipo de
projeção também é referido como um cenário de eficiência congelada. Outros modelos
econométricos de demanda de energia desdobram a função geral de Cobb&Douglas. Neste caso, a
equação geral resultaria na seguinte expressão:
n
E ( x1 , x2 ,... xn ) = k  xi i (2.48)
i =1

Onde k é uma constante de escala, xi são as variáveis independentes e i seus respectivos


coeficientes de elasticidade. A qualidade dos dados fornecidos pelo modelo econométrico está
relacionada à qualidade das correlações estatísticas construídas e podem ser testadas. Um modelo
econométrico simples foi utilizado por Darmstadter, Teitelbaum e Polach (1971) para avaliar a
relação entre o consumo de energia per capita e a renda per capita conforme expressão a seguir:
log( E / Pop) = a + bY / Pop (2.49)

Onde E é a energia mensurada em toneladas equivalentes de carvão, Pop representa a


população e Y/Pop a renda per capita. Posteriormente, de Janosi e Grayson (1972) deram grande
contribuição ao explicar o consumo de energia para 30 países durante o período de 1953 a 1965
relacionando o crescimento do PIB ao consumo de energia com a seguinte expressão:
80 Projeções de demanda de energia

log E = a + bPIB (2.50)

Nesses modelos, o coeficiente de elasticidade renda variava de pouco mais de 2 a valores


menores que 0,5. Os países ricos apresentavam coeficientes de elasticidade menores em
contrapartida dos valores maiores apresentados por países mais pobres. Andres e von Hirschhausen
(2000), por exemplo, utilizaram a função de Cobb&Douglas para projetar a demanda de eletricidade
da China utilizando o PIB, o preço da eletricidade e alguns coeficientes de eficiência energética.
Devido à sua simplicidade, as funções lineares de logaritmo têm sido usadas para muitos
modelos de demanda agregada de energia nas últimas décadas. Os parâmetros são interpretados de
forma direta e os dados para estimação são de fácil obtenção quando comparados com outros
modelos mais complexos. Outra vantagem é que possibilitam fazer previsões de curto, médio e
longo prazo. No entanto, como já mencionado, os modelos econométricos tiveram aplicações
significativas no passado, sobretudo antes da primeira crise energética do petróleo, quando as
variáveis macroeconômicas experimentavam pequenas volatilidades. Hoje, seu uso é indicado para
horizontes de curto prazo.
_____________________________
EXERCÍCIO 2.9 – Elabore um modelo econométrico para o consumo
de petróleo no Brasil (óleo + gás natural) conforme Eq. (2.49)
utilizando-se dos dados da Tabela 2-28 a seguir.

Tabela 2-28 – Dados do Balanço Energético Nacional (EPE 2010) e IBGE –


EXERCÍCIO 2.9
Petróleo e derivados Gás natural PIB per capita
Ano População IBGE
103 TEP 103 TEP (U$ PPP constante 2008)
2000 86.743 10.256 172.334.535 8.337
2001 87.975 12.548 174.978.844 8.292
2002 85.373 14.803 177.451.663 8.410
2003 81.069 15.512 179.824.152 8.419
2004 83.648 19.061 182.099.287 8.807
2005 84.553 20.526 184.280.045 8.982
2006 85.545 21.716 186.369.401 9.272
2007 89.239 22.165 188.370.332 9.723
2008 92.410 25.934 190.285.812 10.077
2009 92.559 21.145 192.118.819 10.078
2010 100.992 27.716 193.872.328 10.607

Estime o consumo de petróleo em 2020 com base no modelo


elaborado, considerando as mesmas taxas de variações anuais da
população e o PIB indicados na Tabela 2-27, e compare com os
resultados do EXERCÍCIO 2.9.

Solução
A Figura 2-7 a seguir indica o modelo econométrico (gráfico
lado esquerdo) e a previsão de consumo de petróleo para 2020,
estimados de acordo com o modelo e as premissas indicadas na Figura
2-7 (lado direito).
Projeções de demanda de energia 81

Figura 2-7 – Consumo de petróleo no Brasil com base em modelo


econométrico – EXERCÍCIO 2.9

_____________________________
Uma formulação econométrica e prática para projeção de demanda de energia, já utilizada
por diversos autores, segue a seguinte estrutura:
 PIB    P   
Et + n = Et   t +n
   t + n   (1 −  ) n  (2.51)
 PIB t   Pt  

Onde Et+n é o consumo de energia elétrica previsto para n anos após o ano t; P é o preço da
eletricidade; α é a elasticidade renda;  é a elasticidade preço sobre a demanda de energia; e  é a
taxa de crescimento anual da eficiência energética. Possivelmente, a variável mais incerta nesse
modelo é o preço futuro da energia. Em países com relativa estabilidade econômica, a variância do
preço da energia é certamente menor e, por esse motivo, os resultados com base na Eq. (2.51) são
mais confiáveis. O interessante nesse modelo é permitir a inclusão da variação da eficiência
energética.

2.5.3. Modelos de séries temporais

As séries temporais são utilizadas em muitos problemas que envolvem variáveis


socioeconômicas. Existem classes de modelos destinadas às variáveis estacionárias 12 e não
estacionárias que podem ser utilizadas para modelos de previsão de demanda de energia. Por
exemplo, a variação do consumo de energia e a taxa de crescimento do PIB são séries temporais
estacionárias. Já o nível de produção de uma companhia elétrica ou de petróleo são, em geral, séries
não estacionárias.
De regra, um modelo de série temporal utiliza formulação recursiva, o que lhe confere
especial valor para estimar dados futuros com programação dinâmica. O ponto fundamental desse
tipo de modelo é como tratar o termo estocástico inerente à variável de interesse. Basicamente, a
modelagem de problema de estimação de demanda de energia com base em séries temporais

12
Em síntese, uma série estacionária é aquela que oscila em torno de uma média, ao passo que uma série não estacionária
tem uma tendência (deriva). As séries não estacionárias não têm médias e nem variâncias constantes.
82 Projeções de demanda de energia

consiste em definir um processo estocástico capaz de representar no tempo as tendências das


variáveis de interesse e que possibilite prever a demanda futura por meio do algoritmo que define o
processo. Os modelos de séries temporais encontram ampla aplicação em setores como o de
produção de petróleo, gás natural e outras commodities energéticas cuja produção e oferta envolvem
incertezas, tanto de ordem econômica, como de ordem geológica ou mesmo incertezas quanto às
variáveis sociais e/ou ambientais.

2.6. MATRIZ INSUMO -PRODUTO

A Matriz Insumo-Produto (MIP) segue uma metodologia definida, na qual os fluxos de bens
e serviços (ou fluxos de energia) entre os vários setores da economia de uma região ou país, aberta
ou fechada, são visualizados por meio de matrizes. A análise de insumo-produto, teoria proposta
inicialmente por Wassily Leontief, em 1936, é adequada para diversos estudos da economia
aplicada, desde a oferta de recursos e usos dos bens e serviços ou fluxos de energia até estudos
sobre a poluição ambiental ou emprego associado à produção industrial etc. São modelos que não
dependem de testes estatísticos para validação dos resultados, mas requerem atualizações constantes
das informações contidas na matriz. Segundo Carvalheiro (1998), a MIP é considerada, também,
um instrumento apropriado para analisar os efeitos estruturais de choques na economia, sejam
mudanças bruscas do preço do petróleo ou variações incomuns nas taxas de câmbio etc. Trata-se de
uma ferramenta poderosa para compreender a sistemática de cálculo do PIB de um país, da produção
e inter-relações dos setores de uma economia, onde certamente a energia é um dos principais
insumos.
Neste item é exposta a metodologia da Matriz Insumo-Produto e seus conceitos mais
importantes. As possibilidades de uso dessa metodologia em trabalhos de demanda de energia são
diversificadas e ficará a cargo do leitor aplicá-la conforme suposições assumidas em trabalhos de
pesquisa sobre energia.
A MIP aplicada para vários setores tem como pressuposto fundamental a interdependência e
o equilíbrio econômico entre os diversos setores da economia de um país ou região, onde as
unidades produtoras de um ou mais setores repassam seus bens intermediários para serem
processados em um ou mais setores e daí para o consumo final (ver esquema básico na Tabela 2-29).

Tabela 2-29 – Matriz insumo-produto de Leontief

Setor 1 Setor 2 ... Setor n Demanda Produto bruto


Setor 1 z11 z12 ... z1n d1 x1
Setor 2 z21 z22 ... z2n d2 x2
... ... ... ... ... ... ...
Setor n zn1 zn2 ... znn dn xn
Valor adicionado V1 V2 ... Vn V
Dispêndio bruto x1 x2 ... xn d x

Onde a variável z1j define o suprimento do setor 1 para o setor j; ∑z1j define a demanda de
bens intermediários atendida pelo setor 1 para os n setores da economia; e d1 define o consumo final
demandado do setor 1. A MIP é atendida pela seguinte expressão contábil:
n
xi = zi1 + zi 2 + ... + zin + d i = d i +  zij (2.52)
j =1
Projeções de demanda de energia 83

Onde xi é a produção do setor i. Mais exatamente, uma linha i da matriz indica quais os
aproveitamentos da produção total de um setor e uma coluna j mostra todos os custos da produção
necessários para obtê-la.
De acordo com Miller e Blair (2009), o modelo MIP impõe que cada setor produza um único
tipo de produto sob duas hipóteses fundamentais: equilíbrio geral da economia para um dado nível
de preços e retornos constantes de escala13. A ideia básica da matriz de Leontief, seguindo essas
hipóteses, consiste em determinar os coeficientes técnicos de produção com o seguinte raciocínio:
suponha uma economia com n setores e que cada i-ésimo setor produza xi unidades de um único
produto. Assuma que para o i-ésimo setor produzir uma unidade do produto deva consumir aij
unidades de produto de cada setor. Admita, ainda, que cada setor venda algumas unidades para
outros setores (bens intermediários) e as demais unidades para o consumo (demanda final). Dessa
forma, a Eq. (2.52) é reescrita como:
xi = ai1 x1 + ai 2 x2 + ... + ain xn + d i (2.53)

Onde aij são os coeficientes técnicos de produção (insumos do setor i demandados pelo setor
j para cada unidade de produção), ou seja:
zij
aij = (2.54)
xj

Onde xj é a produção do setor j (não confundir com o dispêndio bruto do setor j). Em outras
palavras, a Eq. (2.53) informa que o total de produtos acabados para consumo é a soma dos insumos
intermediários mais as unidades disponibilizadas para a demanda final. Em termos de notação
matricial, tem-se que:
x n1 = A nn x n1 + d n1 (2.55)

Ou:

(I − A)x = d  x = (I − A) −1 d (2.56)

Onde a matriz (I–A)–1 é denominada de matriz inversa de Leontief (ou matriz B) e a matriz
A é chamada de matriz dos coeficientes aij. É esta a matriz que se busca com esse modelo, aquela
que indica os coeficientes técnicos de produção de cada setor da economia. A Eq. (2.56) pode ser
reescrita como:
1 − a11 − a12 ... − a1n   x1  d1 
−a
 21 1 − a22 ... − a2 n   x2  d 2 
= (2.57)
 ... ... ... ...  ...  ... 
    
 − an1 − an 2 ... 1 − ann   xn  d n 

Se a matriz (I–A) estiver inversa, tem-se um sistema linear com solução única. Uma vez
definida a matriz dos coeficientes técnicos de produção, torna-se fácil resolver problemas de
previsão para o caso de aumento da demanda de cada setor ou que nova matriz os setores devem
apresentar para atender uma meta de crescimento das demandas setoriais. Esta análise pode ser
realizada com respeito ao consumo de energia por setor.

13
Uma atividade produtiva apresenta retornos constantes de escala quando os fatores de produção são aumentados em
x vezes e a quantidade produzida também aumenta em x vezes.
84 Projeções de demanda de energia

Como bem anotado por Carvalheiro (1998), a metodologia de matriz insumo-produto tem
algumas limitações, embora apresente inúmeras vantagens para a análise estrutural da economia e
em modelos de previsão de consumo de energia, dada a consistência da apresentação de suas
informações. As duas limitações mais significativas são: o modelo assume retornos constantes de
escala, ou seja, para qualquer quantidade produzida são utilizadas as mesmas combinações relativas
de fatores produtivos e assume-se que os coeficientes técnicos não mudam ao longo do tempo. Esta
última anotação implica que não são considerados os efeitos em termos de mudanças de preços ou
evoluções tecnológicas ou alteração na produtividade marginal do trabalho. Outras restrições
importantes dizem respeito à elaboração das matrizes insumo-produto, pois além de assumir
hipóteses simplificadoras quanto aos insumos, a defasagem decorrida entre a coleta e a publicação
dos dados é relativamente longa.

2.7. ESTRUTURA E TIPOS DE CENÁRIOS DE PROJEÇÕES

A análise de cenários14 é utilizada para comparar as possibilidades de atender a um dado nível


de serviços de energia. Os modelos de usos finais (bottom-up) não são modelos completos, como
foi dito anteriormente, por isso é necessário se apoiar em informações da estrutura de crescimento
econômico, ou seja, num modelo macroeconômico top-down para projetar a demanda de serviços
de energia.

Ano de referência Cenário tendencial


Informações requeridas Considera a evolução natural da introdução de
Todos os cenários desconsideram os mesmos níveis de

- Níveis de serviços de energia por usos finais medidas e tecnologias eficientes no mercado
SERVIÇOS DE ENERGIA para o ano projetado

- Intensidades de energia por usos finais


- Indicadores socioeconômicos da demanda de energia
Potencial técnico
Implementação de sucesso de todas as opções
de eficiência em todos os consumidores

Ano de projeção
Potencial econômico
Informações requeridas
Implementação de sucesso das opções de
- Projeção de cenários socioeconômicos custo efetivo em todos os consumidores
- Crescimento populacional
- Atividade econômica
- Níveis de serviços de energia (saturação dos
aparelhos etc.) Potencial de mercado
- Coeficientes de elasticidades de energia Implementação de sucesso das opções
economicamente atraentes
Cenários de energia para o ano projetado
Potencial de mercado atingível
Cenário de eficiência congelada Implementação de sucesso das opções de custo
Mantém o mesmo padrão de eficiência das efetivo em uma fração realista dos consumidores
tecnologias de uso final do ano de referência escolhidos

Figura 2-8 – Etapas para elaborar cenários de eficiência de demanda de energia

Frequentemente, começa-se com um cenário socioeconômico que fornece projeções de


população, de estrutura e de crescimento econômico para um país ou região particular, desde o
presente até o ano alvo. Algumas vezes pode-se trabalhar com mais de um cenário socioeconômico,
14
Cenário é definido aqui como sendo um conjunto de hipóteses que descrevem as características socioeconômicas, os
requerimentos de demanda de energia e as estratégias de atendimento dessa demanda.
Projeções de demanda de energia 85

por exemplo, um cenário de alto crescimento econômico e outro de menor crescimento. Isso permite
fazer uma análise de sensibilidade em parâmetros socioeconômicos que podem ter impacto maior
na demanda de energia (ver Figura 2-8).
Pelo menos dois cenários de uso final são necessários: um cenário de referência e outro que
considere melhorias na eficiência de uso final. O cenário de referência pode manter os níveis atuais
de eficiência de energia e, nesse caso, é chamado cenário de eficiência congelada ou pode ser,
também, um cenário tendencial (Figura 2-8). O cenário eficiente pode ser derivado por uma medida
de uso final ou um conjunto de melhorias em diversos setores e usos finais. Existem diversos tipos
de cenários eficientes, incluindo o cenário potencial técnico, o cenário potencial econômico e o
potencial de mercado, que estão descritos a seguir.

2.7.1. Cenário de referência

O cenário de referência eficiência congelada não é um cenário realista, porque caso não sejam
feitos esforços no sentido de aumentar a penetração de novas tecnologias e medidas de eficiência,
existe um sucateamento natural de equipamentos e tecnologias e a sua reposição por modelos mais
novos, geralmente mais eficientes. Assim, o cenário de eficiência congelada pode ser usado para
representar o crescimento futuro de serviços de energia. O nível de serviços de energia pode ser
difícil de ser estabelecido de maneira homogênea entre os vários setores porque podem ser medidos
em unidades diversas tais como lúmen-hora de iluminação, grau-dia-metros quadrados do ambiente
aquecido ou da área construída com ar condicionado, toneladas de produtos manufaturados etc.
Alguns serviços de energia, tais como cocção, diversões eletrônicas ou serviços de escritórios são
de difíceis quantificações. Indexando os níveis de serviços ao consumo de energia presente e
representando-os em um cenário de eficiência congelada, simplifica-se o problema.
O cenário tendencial supõe que a evolução atual é mantida com relação ao uso de energia,
penetração de equipamentos (modelos eficientes e menos eficientes) etc., que seriam esperados sem
que houvesse uma interferência de políticas de transformação de mercado de energia. Em países
onde o PIR não é uma prática comum, esse cenário deve coincidir com a previsão oficial.

2.7.2. Cenário de potencial técnico

Este cenário considera todas as possíveis melhorias técnicas nos equipamentos, construções
e processos que podem ser introduzidos no ano projetado. Representa, portanto, as economias
hipotéticas que poderiam ser atingidas se todos os sistemas pudessem ser retirados e substituídos
por outros mais eficientes.
Também é possível distinguir um potencial teórico de eficiência energética, que pode ser
definido de acordo com os limites termodinâmicos das conversões entre as formas de energia
envolvidas. Por exemplo, se toda a energia usada por uma lâmpada elétrica fosse convertida
preferencialmente em luz que em calor, a eficácia da lâmpada (uma medida de eficiência de energia)
seria muitas vezes maior que as melhores lâmpadas hoje disponíveis. Similarmente, os limites de
eficiência de aquecimento e resfriamento podem ser determinados pelos limites de eficiência
termodinâmica para uma bomba de calor operando entre as temperaturas internas e externas.
O potencial técnico de eficiência energética pode ser definido como uma melhoria na
eficiência de energia do uso final que poderia resultar se as tecnologias eficientes disponíveis hoje
pudessem atingir 100% da saturação do mercado durante a vida útil das tecnologias (10 a 20 anos,
Faruqui et al. 1990). Claramente, essa definição também é específica para cada tecnologia, já que
melhorias de projeto de sistema ou construção sempre podem reduzir a necessidade de energia,
além das melhorias de equipamentos. Na prática, o potencial de eficiência técnica está sempre
mudando com a disponibilidade de novas tecnologias. O potencial técnico dá uma indicação para
86 Projeções de demanda de energia

orientar os esforços e investimentos no sentido de criar mecanismos de transformação no mercado


consumidor, indicando quais novas tecnologias devem ser estimuladas para serem introduzidas.

2.7.3. Cenário de potencial econômico

Este tipo de cenário considera somente aquelas alternativas que possuem uma avaliação de
benefício econômico para os agentes que estão elaborando o PIR. As alternativas do lado da
demanda são restritas somente àquelas medidas que satisfazem um dado limite de custo. Esse limite
é uma referência para se verificar se uma dada medida é considerada lucrativa para a sociedade,
para os consumidores, para a companhia de eletricidade ou para outra agência que execute o PIR.
Os custos competitivos das alternativas do lado da oferta são levados em conta e os custos
ambientais e outras externalidades podem ser também incluídos.
Assim, o potencial econômico de eficiência energética é uma função do limite de custo das
medidas, baseado no tempo de retorno dos investimentos, na taxa interna de retorno ou no custo de
energia economizada. Tomando por base esse conceito, é comum representar esse potencial na
forma de curvas de custo marginal (algumas vezes chamadas de "curvas de oferta") da energia
economizada.
A Figura 2-9 a seguir apresenta uma amostra da curva de custo para o potencial de eficiência
energética no setor de serviços da Suécia (Swisher 1994). O eixo horizontal mostra a fração de
energia de iluminação que pode ser economizada a um dado custo marginal, em quatro diferentes
anos de projeção. A base para essas economias é o consumo resultante quando todos os
equipamentos instalados (novos e substituídos) após 1990 possuem a mesma eficiência média que
em 1990. Esse valor de consumo-base aumenta com o tempo. A um dado nível de custo marginal,
as economias de energia incluem os efeitos de todas as medidas de eficiência com um custo de
energia economizada menor que o nível de custo marginal. Essas curvas de custo mostram o
potencial de eficiência em um dado ano a um dado nível de custo, mas elas não indicam quanto
daquele potencial pode ser atingido por intermédio de um programa real ou quanto seria atingido
sem o programa.

Figura 2-9 – Curvas de custo marginal – eficiência de energia em iluminação – Suécia


Fonte: Swisher (1994)

Notas: As economias de energia em um dado ano são medidas pelo consumo projetado, supondo que todos os
equipamentos instalados após 1990 possuem a mesma média de eficiência que aqueles instalados em 1990, e expressas
Projeções de demanda de energia 87

como uma percentagem do consumo projetado. Os custos unitários são em coroas suecas, SEK/kWh. Em 1990,
7SEK=1US$.

Note-se que algumas economias identificadas na Figura 2-9 estão disponíveis a custo
negativo, como economias de custo de manutenção, já que estas podem compensar os custos iniciais
de tecnologia. No outro extremo da escala, o potencial de economia energética a custos marginais
relativamente altos deve ser subestimado em tais análises de uso final. Esses estudos são baseados
em análise técnica de medidas próprias para serem implementadas num curto prazo, os quais sempre
excluem medidas que não parecem ser interessantes sob as atuais condições econômicas. Isso
explica o aumento excessivo nos custos marginais com altos níveis de economias de energia na
Figura 2-9, que provavelmente mostrariam maiores economias nesses níveis se mais informações
estivessem disponíveis sobre tais medidas.

2.7.4. Cenário de potencial de mercado

Nem todas as medidas, mesmo aquelas que apresentam custos atraentes, podem ser
implementadas com sucesso por meio de GLD ou outros programas de eficiência energética.
Embora a substituição de lâmpadas incandescentes15 por lâmpadas compactas fluorescentes (LCF),
por exemplo, possa ser economicamente interessante para a sociedade (ver, por exemplo, Mills
1991), nem todos os consumidores querem instalá-las em suas casas. Assim, o cenário potencial de
mercado captará a distinta quantidade de economia que efetivamente será implementada,
considerando as condições que limitam a abrangência e a penetração de uma medida no mercado
consumidor. Além dos custos da tecnologia, as medidas de eficiência energética consideradas nesse
cenário incluem também os custos administrativos dos programas de eficiência e GLD, a
possibilidade técnica e institucional das medidas, a aceitação e a participação do consumidor.
Atingir o potencial pleno de mercado leva tempo e uma penetração de mercado de 100%16
não pode ser atingida na maioria dos casos. Mesmo com fortes incentivos, as novas tecnologias
levam tempo para absorver uma grande fatia de mercado. Assim, o potencial de mercado atingível
inclui uma crescente fração do potencial de mercado total no tempo. Esse potencial é uma função
do tempo permitido, do tipo de programas e instituições envolvidas e da relação de custo-benefício
das medidas envolvidas. O cenário de mercado atingível captará as melhorias de eficiências
disponíveis por meio de programas reais e os limites de penetração de mercado existentes ao longo
do período de planejamento.

2.8. CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DE CENÁRIOS: CUSTOS E EXTERNALIDADES

Cada cenário descrevendo uma demanda de energia projetada requererá investimentos em


novas usinas e/ou a implementação de programas de eficiência ou GLD ou mesmo novas estratégias
para o armazenamento de energia (o que será crucial ao se considerar uma eventual participação em
larga escala de fontes intermitentes). Nesta seção, compararemos dois tipos de intervenções: ações
(investimento) para expandir a produção de energia e, em contraste, ações para reduzir a demanda
de energia. O fluxograma apresentado na Figura 2-10 ilustra um exemplo de projeção no qual os
custos de produção de energia ($/kWh) estão associados com a eletricidade total demandada pelo
Cenário de Eficiência Congelada. Existem vários critérios para se considerar para a escolha entre
cenários, sendo “custos” apenas um desses critérios. O Cenário Potencial Econômico inclui esses

15
Muito embora muitos exemplos citados aqui incluem o caso de lâmpadas incandescentes, é fato que elas já não estão
sendo comercializadas no Brasil desde 2016, seguindo o exemplo de muitos outros países que as estão substituindo por
tecnologias mais eficientes, seja compactas fluorescentes ou LED mais recentemente.
16
Esse potencial pleno de mercado não representa necessariamente o potencial técnico descrito na seção anterior .
88 Projeções de demanda de energia

custos, mas também incorpora os custos ocorridos com a conservação de eletricidade via programas
GLD e de eficiência. No Capítulo 3, veremos detalhes sobre os custos dos programas e o Apêndice
B mostra como estimar os custos de conservar eletricidade.

Figura 2-10 – Fluxograma dos custos de energia

O processo de elaboração do PIR tem a preocupação de desenvolver critérios para escolher o


cenário que melhor represente os benefícios para o setor elétrico, os consumidores e a sociedade
em geral. Nesta seção, apresentamos alguns dos critérios que foram desenvolvidos para a realidade
norte-americana. Os cenários descritos na Seção 2.7 permitem considerações específicas das opções
do lado da demanda que devem ser complementadas com opções de oferta. Qualquer que seja o
critério escolhido, ele reflete alguma perspectiva de avaliação, que pode ser da companhia de
eletricidade (ou outra agência executora), do consumidor (participante ou não no programa GLD)
ou da sociedade como um todo. Além de custos, existem outros critérios, como impactos ambientais
e sociais, que cada vez mais estão sendo importantes na orientação da escolha de cenários e,
consequentemente, das ações e dos investimentos associados a eles. O plano resultante deve expor
claramente qual foi o critério usado para selecionar essas opções e a sensibilidade dos resultados
com relação aos dados de entrada considerados (Hirst 1994).
Uma publicação conjunta da California Energy Commission e da California Public Utilities
Commission chamada de Standard Practice Manual: Economic Analysis of Demand-Side
Management Programs (CPUC 2001) expõe as definições e os procedimentos computacionais para
determinar os custos dos cenários que incorporam medidas de GLD e de eficiência. São definidos
cinco diferentes testes: o Teste do Participante, o Teste do Não-participante (RIM), o Teste do Custo
Total do Recurso (CTR), o Teste Social e o Teste do Custo da Companhia de Eletricidade. De modo
geral, são medidas usadas para verificar a competitividade do custo dos programas de GLD e de
eficiência com as alternativas de oferta.
Como exposto em An Energy Efficiency Blueprint for California (janeiro, 1990), o objetivo
do investimento e do planejamento de recursos das companhias elétricas é minimizar o custo para
os consumidores de energia. Uma vez que o PIR considera o GLD e a introdução de medidas de
eficiência como recursos de energia do mesmo modo que as alternativas da oferta, é importante ter
procedimentos adequados para aferir os custos dessas ações. É necessário reconhecer que existem
diferentes perspectivas de avaliação e percepção de custos entre os agentes que elaboram o PIR
(consumidores, setor elétrico, por exemplo). Mesmo entre consumidores de eletricidade podem
Projeções de demanda de energia 89

também existir interesses diferentes dependendo, por exemplo, se ele é alguém que se beneficia dos
incentivos financeiros de um programa de conservação da companhia de eletricidade, se ele é um
consumidor que não utiliza a medida ou, então, se escolhe não participar do programa. Como um
não-participante poderia dizer, por exemplo: "Eu já modifiquei todo o sistema de iluminação de
minha loja sem nenhuma ajuda da companhia e agora você está oferecendo um apoio financeiro aos
meus vizinhos se eles fizerem isso...isso não é justo".
Para ilustrar o processo de escolha das opções do lado da demanda que serão consideradas no
plano PIR, são apresentados a seguir os critérios desenvolvidos pela California Energy Commission
e a California Public Utilities Commission em um processo chamado de California Collaborative.

2.8.1. Teste do Participante

O Teste do Participante mede a diferença entre custos em que um consumidor incorre ao


participar em um programa GLD/eficiência e os benefícios subsequentes recebidos por aquele
participante. Os benefícios do participante incluem a redução na sua conta de energia, eventuais
incentivos pagos pela CE ou por outra terceira parte ou alguma isenção de impostos local, estadual
ou federal. Os custos para o consumidor incluem todas as suas despesas adicionais resultantes da
participação no programa, como o custo do equipamento comprado e alguns custos de manutenção
e operação.
Na perspectiva do participante, um programa é vantajoso se o valor presente dos benefícios
excede o valor presente dos custos durante a duração das medidas propostas. Uma dificuldade com
o Teste do Participante é selecionar a taxa de desconto apropriada para analisar os custos e os
benefícios. O Teste do Participante é muito frágil como um critério de seleção de cenários, pois é
improvável que um programa GLD/eficiência seja efetivamente considerado se seus participantes
perdem dinheiro. Quando isso acontece, esses programas sequer fazem parte das medidas propostas
pelo cenário considerado.

2.8.2. Teste do Não-participante (RIM)

Esse teste, chamado Rate Impact Measure – RIM, é uma medida do que acontece com as
tarifas da companhia de eletricidade (i.e. os preços de energia em $/kWh que os consumidores
pagam) ao serem incluídos os custos de um programa GLD/eficiência. Se o programa causa um
aumento nas tarifas, os não-participantes, que não mudaram seus usos de energia, terão aumentos
em suas contas. Os participantes, por outro lado, com o mesmo aumento de taxa, devem ter suas
contas totais de energia diminuídas, uma vez que estão consumindo menos energia (de fato, elas
irão cair se o programa de conservação passa pelo Teste do Participante).
As tarifas praticadas pela companhia aumentarão se os benefícios para ela forem menores que
os custos decorrentes da implementação do programa. Os benefícios calculados no teste RIM são
as economias que a companhia de eletricidade realiza ao evitar custos de oferta. Esses custos
evitados são os custos marginais dos recursos de oferta substituídos pelo programa de conservação.
Eles incluem a redução da transmissão, da distribuição, da geração e dos custos de capacidade dos
períodos quando a carga foi reduzida (assumindo que o propósito do GLD seja reduzir cargas). Os
custos calculados no teste RIM incluem custos do programa (incentivos pagos para os participantes,
custos administrativos do programa) e quedas nas receitas das vendas de eletricidade.
Para um programa ser economicamente atraente, usando o teste RIM, as tarifas da companhia
de eletricidade devem aumentar, isto é, os não-participantes não devem ver nenhum aumento nas
suas contas de eletricidade. Enquanto esse programa é algumas vezes descrito como o teste dos
"não-perdedores", um teste verdadeiro de "não-perdedores" deveria comparar as tarifas
considerando a situação com os programas de GLD/eficiência sem os mesmos. Ou seja, sem os
90 Projeções de demanda de energia

programas de conservação a companhia de eletricidade deverá construir uma nova usina, subindo
as tarifas de todos os consumidores para remunerar esse novo investimento.
É útil ilustrar a essência do teste RIM com um exemplo. Suponha que se inicie com a
companhia de eletricidade no ponto A, ver Figura 2-11 (Caso A) a seguir. O declive da linha da
origem para o ponto A é o preço médio, antes do programa de conservação, de um kWh a fim de
que a companhia de eletricidade gere a receita necessária para cobrir seus custos. Para o primeiro
exemplo, suponha que o custo marginal de eletricidade é muito alto, como indicado pelo grau de
inclinação da curva de receita da companhia.

Figura 2-11 – Caso A - Teste RIM quando os custos marginais são altos; caso B - Teste RIM - custos
marginais menores que o custo médio (tarifas)

Se um programa de conservação pudesse reduzir a demanda de energia a nenhum custo, então


a companhia de eletricidade poderia operar no ponto B. O programa de conservação, entretanto,
não é grátis, o que significa que a companhia de eletricidade deve gerar receita para cobrir o seu
custo, assim como os custos de geração de eletricidade, colocando-o no ponto C. Neste ponto, o
preço que a companhia de eletricidade deve cobrar por um kWh (dado pelo declive mostrado) é
menor que aquele antes do GLD. Todos os consumidores se beneficiam nesse cenário (até o não-
participante), uma vez que as tarifas caíram. Portanto, se o programa de conservação muda a
situação da companhia de eletricidade do ponto A para o ponto C, as tarifas de eletricidade caem
para todos e, assim, até os não-participantes veem reduzidas as contas de energia.
Generalizando, esse exemplo mostra o seguinte: o teste RIM será satisfatório (significando
que os consumidores não verão suas tarifas da companhia de eletricidade crescerem) na medida em
que o custo para economizar um quilowatt-hora for menor que a diferença entre o custo marginal
de produção da eletricidade e o custo médio (i.e., as tarifas).
No exemplo citado, assumiu-se que o custo marginal da eletricidade é maior que o custo
médio. Se não for esse o caso, isto é, os custos marginais menores que o custo médio, então qualquer
redução no consumo de eletricidade aumentará as tarifas mesmo se o programa de conservação for
grátis. Isso está ilustrado na Figura 2-11 (Caso B). Economizar eletricidade move a companhia de
eletricidade do ponto A para o ponto B. Note que os requisitos de receita totais para a companhia
de eletricidade são menores no ponto B, mas as tarifas necessitam crescer (o declive da origem ao
ponto B). Isso ilustra um ponto importante: a conta média de eletricidade para todos os
consumidores na Figura 2-11 (Caso B) é diminuída após o GLD, mas, uma vez que as tarifas
cresceram, os consumidores não-participantes verão suas contas aumentarem. Assim, o teste RIM
Projeções de demanda de energia 91

não será satisfatório para o cenário considerado. Note que quando os custos marginais são menores
que os custos médios, algumas reduções nas vendas (de A para B) fazem as tarifas aumentarem.
Note também, entretanto, que, nesse caso, a conta de eletricidade é menor no ponto B que no ponto
A, embora as tarifas sempre tenham aumentado.

2.8.3. Teste do Custo Total do Recurso (CTR)

O Teste do Custo Total do Recurso (CTR), também chamado de Teste de Todos os


Contribuintes, compara os custos totais do programa GLD (incluindo custos incorridos pela
companhia de eletricidade e pelo participante) e os custos médios de oferta da companhia de
eletricidade. Nessa perspectiva, um programa é economicamente interessante se os benefícios, que
são os custos totais de oferta evitados, excedem os custos totais provocados pela companhia e pelo
consumidor. O teste CTR é a medida mais usada para verificar a competitividade do custo dos
programas de GLD e de eficiência com as alternativas de oferta, desde que ela forneça uma
indicação se os custos de energia para a companhia de eletricidade e o contribuinte estão sendo
reduzidos.
De certo modo, o Teste CTR é a somatória do Teste do Participante e do teste RIM. Isto é, os
benefícios ainda são os custos totais de oferta evitados, mas os custos são agora a soma dos custos
provocados não só pelo consumidor como pela companhia de eletricidade. Por exemplo, suponha
que um programa de desconto pelo uso da LCF (Lâmpadas Compactas Fluorescentes) pela
companhia de eletricidade custe à mesma R$ 0,03 para economizar um kWh. Suponha que o
consumidor utilize uma LCF e amortize o custo líquido da lâmpada (custo varejo menos o desconto
recebido por meio do programa) durante a vida do bulbo, resultando em um custo para o consumidor
de R$ 0,02 para cada 1 kWh conservado. Os custos totais são, portanto R$ 0,05/kWh medidos no
teste CTR. Se a companhia de eletricidade economiza mais que R$ 0,05/kWh nos custos de
transmissão, distribuição e geração, então o Teste de Custo Total do Recurso para esse caso é
satisfatório.
Note que uma medida GLD pode passar pelo teste RIM e ainda assim ser reprovada no teste
CTR (ver Figura 2-12 – Caso A). De modo oposto, uma medida GLD pode ser reprovada no teste
RIM, passando ainda pelo teste CTR. No entanto, é muito mais comum que programas GLD passem
pelo teste CTR e não pelo RIM (ver Figura 2-12 – Caso B) do que vice-versa.

Novas tarifas
após GLD

Figura 2-12 – Caso A - Teste CTR falha, já passado o teste RIM; Caso B - passa o teste CTR, Mas não no
teste RIM
92 Projeções de demanda de energia

No Caso A, a soma dos custos do GLD com os custos do consumidor (do ponto B para o
ponto D) é superior ao valor dos custos evitados. Dessa forma, apesar da medida ser aprovada pelo
teste RIM, não passou no teste CTR. Para o Caso B, o oposto ocorre, sendo os custos evitados
superiores ao custo de implementação da medida GLD. Apesar de não passar pelo teste RIM, passou
pelo teste CTR.

2.8.4. Teste do Custo da CE

O Teste do Custo da Companhia de Eletricidade é outra comparação dos custos e benefícios


decorrentes de investimentos em programas de conservação que estão sendo considerados em
determinado cenário. Neste caso, como na maioria, os benefícios são resultados dos custos evitados
(custos de combustíveis para produção de eletricidade, operação e aumento da capacidade instalada)
economizados pela conservação. Os custos são aqueles associados com a execução do programa de
conservação (custos administrativos e incentivos financeiros aos consumidores). Este teste difere
do teste CTR por contabilizar somente custos da companhia de eletricidade e excluir custos
consumidor.
Quando os benefícios excedem os custos, o Teste do Custo da Companhia de Eletricidade é
satisfeito e a receita total das vendas de eletricidade da companhia cai, portanto a conta média paga
pelo consumidor diminui. Embora as receitas totais diminuam, as tarifas pagas em $/kWh devem
ser mais altas após o programa e, assim, os não-participantes devem ter suas contas aumentadas. O
Teste do Custo da Companhia de Eletricidade é mais fácil de ser satisfeito que o teste CTR. De fato,
os exemplos da Figura 2-12 (Caso A e B) satisfazem o Teste do Custo da Companhia de
Eletricidade, enquanto somente a Figura 2-12 (Caso B) satisfaz o teste CTR.

2.8.5. Teste dos Custos Sociais

O Teste dos Custos Sociais é uma variação do Teste do Custo Total do Recurso (CTR) no
qual são incluídos os efeitos de externalidades (tais como custos ambientais) na contabilização dos
custos e benefícios das medidas consideradas no cenário.

2.8.6. Sumário dos testes de custo

A Tabela 2-30 mostra um sumário dos testes de custo descritos. Os três testes mais utilizados
são o do Não-participante (RIM), o do Custo Total do Recurso (CTR) e o do Custo da CE.

Tabela 2-30 – Testes econômicos primários - custos e benefícios de cenários - DMS/Eficiência

Perspectivas Benefícios Custos


Incentivo da CE mais redução na conta de
Participante Custos diretos da participação
eletricidade (perda de receita da CE)
Custos de oferta evitados (produção, Custos do programa da CE (incluindo
Não-participante
transmissão e distribuição) baseados nas incentivos para participantes), receita líquida
(RIM)
reduções de carga e energia perdida devido às vendas reduzidas
Companhia elétrica Custos do programa da companhia elétrica
Idêntico ao anterior
(requisitos de receita) (incluindo incentivos para participantes).
Custo Total do Custos totais do programa para participantes
Idêntico ao anterior
Recurso (CTR) e para a CE (excluindo incentivos)
Idêntico ao anterior, mais benefícios de
Social externalidades, tais como poluição Idêntico ao anterior
reduzida
Projeções de demanda de energia 93

O teste RIM surge para verificar o comportamento das tarifas da companhia de eletricidade
em função dos programas de conservação considerados no cenário. Para uma medida GLD passar
pelo teste RIM, as tarifas não devem subir muito, para que os não-participantes não tenham aumento
nas contas de eletricidade. Para passar pelo teste RIM, os custos marginais da eletricidade devem
ser maiores que os custos médios e a diferença entre eles é a quantidade máxima que pode ser gasta
implementando o GLD.
O teste CTR basicamente pergunta se a sociedade em geral se beneficia com as medidas
consideradas. Se o teste CTR é satisfeito, o custo total de conservação da companhia de eletricidade
e dos consumidores que implementam as medidas é menor que operar ou expandir o sistema de
oferta de energia da companhia de eletricidade. Enquanto as contas médias dos consumidores caem,
as tarifas podem subir e, assim, os não-participantes devem ter contas mais altas. O teste CTR é a
medida mais usada para testar o mérito econômico dos cenários.
O teste do Custo da Companhia de Eletricidade simplesmente analisa se a companhia
economiza mais recursos em custos evitados do que gasta em programa de conservação. As contas
médias de energia dos consumidores são reduzidas. Os não-participantes, entretanto, devem ter
contas mais altas enquanto os consumidores que participam do programa amortizam os
investimentos realizados e a companhia de eletricidade recupera os investimentos do programa. A
sociedade como um todo pode estar gastando mais com os serviços de energia que anteriormente,
mesmo que o programa satisfaça esse teste.

2.8.7. Externalidades ambientais

Uma finalidade importante do PIR é tratar programas GLD e eficiência como recursos, junto
das opções tradicionais do lado da oferta, e, então, escolher a combinação de mais baixo custo (se
esse for o critério adotado) dos mesmos para atender às necessidades de serviços de energia
projetados (ver Capítulo 1). Custos evitados por meio da conservação devem incluir mais que
apenas os investimentos associados para construir e operar usinas de eletricidade. Custos não
monetários dos impactos ao meio ambiente associados aos recursos do lado da oferta, conhecidos
como externalidades, também podem ser considerados como um custo evitado. Maiores detalhes
serão tratados no Capítulo 4.
Diversos países europeus contabilizam externalidades ambientais em algumas de suas regiões
impondo impostos sobre emissões decorrentes do uso do combustível fóssil. Nos Estados Unidos,
diversos estados têm adotado regras ou políticas para incorporar externalidades ambientais.
As externalidades podem ser captadas por meio de procedimentos qualitativos ou como um
valor expresso por meio de custos. Os custos dessas externalidades podem ser expressos a partir de
impostos ou taxas associadas a quantias de emissão de certos gases e são pagos pela companhia de
eletricidade. Isso vai afetar os custos de eletricidade produzida de acordo com a tecnologia e o
recurso energético primário utilizado. Sob uma estrutura desregu1amentada (ou não regulamentada)
dos serviços de eletricidade, os custos ambientais devem ser pagos pela companhia de eletricidade,
a fim de afetar a demanda via tarifas mais altas. Esse tem sido o objetivo das taxas de emissões
colocadas em prática na Europa.
Alguns estados dos EUA (e.g., Minnesota) tratam externalidades de forma qualitativa, dando
preferência para as fontes de energia menos poluidoras sem tentar quantificá-las. Outros (e.g.,
Vermont) usam um fator chamado de percentagem adicional (percentage odder) que aumenta o
custo do recurso do lado da oferta ou diminui o custo do lado da demanda em algum percentual.
Outros estados, por exemplo, o de Nova Iorque, incluem estimativas em valores monetários das
externalidades ambientais ao determinar o custo-benefício dos recursos de GLD (Eto, Destribats,
and Schultz 1992).
94 Projeções de demanda de energia

Diversos métodos analíticos têm sido usados para estimar o valor econômico das
externalidades do meio ambiente. Alguns mais qualitativos e outros mais quantitativos. A seguir,
estão relacionados alguns dos métodos mais utilizados, ordenados desde o mais subjetivo ao mais
quantitativo: codificação de valor subjetivo, método de ponderação/ordenação, custos marginais da
mitigação do impacto, demanda implícita por amenidades ambientais e cálculo direto dos custos
dos danos.

Codificação de valor subjetivo

O método mais amplamente usado e mais facilmente compreendido é o das codificações


subjetivas dos valores para os custos ou para os benefícios ambientais de tecnologias. Esse método
tem, no mínimo, uma validade analítica. A ausência de dados adequados e de modelos causa-efeito
torna difícil de justificar o custo do uso de métodos mais detalhados e sofisticados. Valores
designados por esse método simples para externalidades ambientais são geralmente conservadores
e muito baixos. No entanto, se eles são menores que o custo real das externalidades, pelo menos
eles representam um avanço sobre o valor zero da avaliação de custo-benefício convencional.

Método de ponderação/ordenação

Esse método pretende esclarecer os critérios para escolha de tecnologia e codificar seus
valores relativos, incluindo impacto ambiental de equidade social. O processo na Alemanha, por
exemplo, orientou uma coleta de opiniões de diversos critérios de planejamento energético entre
entidades de classe. Nesse trabalho, as várias opiniões foram hierarquizadas segundo o nível de
determinadas categorias de critérios para também identificar áreas de consenso entre os diferentes
grupos. Embora esse procedimento incorpore a opinião pública para as decisões de planejamento
de energia, o processo de ponderar os diferentes valores pode ser tão complexo e difícil quanto os
métodos mais quantitativos abaixo descritos.

Custos marginais da mitigação do impacto

Pode-se argumentar que se as regulamentações existentes indicam uma escolha da sociedade


por um nível de poluição, então esses custos indicam o valor para o custo marginal da poluição.
Naturalmente, reduções dos níveis de poluição possuem algum valor para a sociedade e o nível
ótimo de poluição será realmente o ponto no qual esse valor se iguale ao custo marginal do controle
de poluição. Se as emissões são controladas a fim de atender às regulamentações existentes, exceder
tais regulamentações deve sempre requerer tecnologias diferentes e mais caras, portanto os custos
atuais de mitigação não necessariamente refletem os custos da mitigação anterior. Entretanto, as
medidas mais caras usadas agora em certas áreas indicariam os custos incrementais em outras áreas
que ainda não empregaram tais medidas. Esses custos podem ser prontamente quantificados para
muitas tecnologias existentes e, em alguns casos, as tecnologias que seriam usadas para redução de
emissões já são conhecidas e seus custos podem ser estimados.

Demanda implícita por amenidades ambientais

É difícil estimar diretamente o valor da qualidade ambiental e, por sua vez, o custo da
poluição. Um procedimento seria usar a análise estatística das escolhas dos consumidores para
estimar a função de demanda implícita de certos parâmetros ambientais (qualidade do ar, por
exemplo). Esse método tem sido aplicado para estimar os gastos, considerando, por exemplo, lagos
e reservatórios, tomando como base o que o consumidor paga em custos de viagem e transporte
Projeções de demanda de energia 95

para ir a esses locais e usufruir desses recursos. Entretanto, é difícil identificar quanto as pessoas
estão desejando pagar para evitar os efeitos dos poluentes emitidos no ar ou na água.

Cálculo direto dos custos dos danos

O procedimento mais detalhado e abrangente, e também o mais difícil, é estimar diretamente


os custos para a saúde e outros impactos da poluição em termos monetários. Para determinar custos
referentes à saúde, o método requer estimar o tratamento dos poluentes desde a sua fonte de
produção, o efeito dos diferentes poluentes sobre a saúde, o valor econômico das doenças e das
mortes prematuras. Danos à propriedade e à produção agrícola decorrentes de emissões de enxofre,
ozônio e outros poluentes fotoquímicos são igualmente complexos para se atribuir valores
monetários. Impactos ecológicos da chuva ácida e gases de efeito estufa são ainda mais difíceis.
Uma questão importante sempre observada nos riscos ambientais e de saúde é que o valor do dano
deveria incluir não somente o custo do que é perdido, mas também o quanto se pagaria para evitar
o dano. Esse valor deve ser consideravelmente maior que somente o custo do dano e é mais
comparável com o valor de mercado dos bens econômicos produzidos às custas de impactos
ambientais.
Um estudo utilizou um modelo simples para atribuir custos à saúde, devido à poluição
ambiental na Alemanha, para diferentes poluentes a fim de estimar o custo ambiental da produção
de eletricidade. Os resultados desse estudo sugeriram um custo ambiental de $0,02–0,03/kWh por
usina de combustível fóssil e $0,05–0,06/kWh para usinas nucleares (Hohmeyer 1988). A maioria
das estimativas dos custos ambientais diretos está sendo apresentada como limite inferior, devido
às dificuldades de contabilizar a abrangência dos impactos ambientais decorrentes do uso e da
produção de energia.

2.8.8. Benefícios não monetários da eficiência energética

Tecnologias para melhorar a eficiência do uso final de energia frequentemente oferecem


outros benefícios além de continuar garantindo o acesso aos serviços de energia. Esses benefícios
podem ser evidentes tanto no nível da sociedade como um todo quanto no nível do consumidor
individual ou da firma. Para o consumidor, esses benefícios podem ser categorizados como (Mills
and Rosenfeld 1996).
• o ambiente interno melhorado, o conforto, a saúde e a segurança (por melhor iluminação);
• os ruídos reduzidos por meio de melhor isolamento;
• as economias de tempo e trabalho (produtividade melhorada) por iluminação eficiente;
• as economias de água e a redução de desperdício por aparelhos mais eficientes;
• a diminuição ou a eliminação do equipamento de uso final (por meio de cargas reduzidas);
e
• o controle de processo melhorado (controle melhorado).
Em nível social (regional, nacional ou global), benefícios não monetários de vantagens
decorrentes de maior eficiência de uso de energia podem ser categorizados como:
• a segurança de suprimento de energia por meio de redução nas importações;
• a segurança nacional por meio de fluxo reduzido de materiais radioativos e físseis;
• a criação de emprego e o desenvolvimento econômico local;
• a redução de pressões no mercado de capitais;
• o aumento de competitividade internacional de produtos e serviços produzidos no país;
96 Projeções de demanda de energia

• a posição realçada dos produtos domésticos eficientes no mercado exportador; e


• a proteção ambiental.
A princípio, esses benefícios poderiam ser representados por quantias monetárias e aplicados
para comparações de custo de energia, como sugerido com relação às externalidades ambientais.
Na prática, entretanto, essas questões são tratadas totalmente de maneira qualitativa.

(União Europeia 2014) (Ang 2004) (Achão and Schaeffer 2009) (Chateau and Lapillone 1982) (Richardson
1972) (G. M. Jannuzzi et al. 2002)
Projeções de demanda de energia 97

2.9. REFERÊNCI AS E LEITURAS SUGERIDAS

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100 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

CAPÍTULO 3

PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA, GLD E GERAÇÃO

DISTRIBUÍDA

3.1. INTRODUÇÃO

A introdução de medidas que favorecem as tecnologias de energia distribuída1 ou de energia


mais eficiente não ocorre como um resultado natural de um Plano Integrado de Recursos ou porque
elas sejam viáveis economicamente. Essas medidas requerem mudanças significativas no
comportamento do consumidor, no modo como este e as companhias de energia tomam suas
decisões de investimentos e, principalmente, como a sociedade gerencia seus recursos energéticos.
É necessário ter um plano estratégico de modo a promover as mudanças requeridas e a
implementação efetiva dessas medidas de eficiência de energia, bem como a maior utilização de
fontes renováveis junto ao consumidor final. Essas estratégias implicam na elaboração de
programas2, que são uma série de ações coordenadas e direcionadas para fins específicos, com metas
definidas e tempo determinado. Os programas, no presente contexto, representam conjuntos de
medidas técnicas do lado da demanda (incluindo mudanças de hábitos) e dos mecanismos políticos
que são usados para implementá-los de modo sistemático. Essas ações implicam em custos
adicionais, tempo e incertezas para desenvolver os recursos do lado da demanda. O PIR deverá
apresentar essa informação assim como são apresentados os custos e o plano de expansão do sistema
de oferta de energia.
Existe uma variedade de programas com objetivos diversos, entre eles: disseminar
informações sobre tecnologias eficientes, incentivar o uso de energias renováveis (solar, eólica ou
de biomassas), substituir equipamentos por outros mais eficientes, estabelecer padrões de
desempenho energético para equipamentos, entre outros, ou tarifas especiais para incentivar o uso
de fontes renováveis, financiamento de equipamentos etc. Alguns deles podem ser e são concebidos
e implementados por companhias de eletricidade e outros são iniciativas de órgãos governamentais.
A experiência internacional recente com tarifas (feed-in e net-metering, por exemplo) para geração
distribuída (solar fotovoltaico, especialmente) foram instrumentos importantes para a disseminação
em larga escala dessas tecnologias e a consequente redução de custos das mesmas (Bajay et al.
2018)3.
As ações do lado da demanda são frequentemente organizadas sob a forma de programas
porque se reconhece, especialmente em países em desenvolvimento, que só os mecanismos de
mercado não são suficientes para atingir níveis desejáveis de eficiência de energia ou a viabilização

1
Entende-se aqui principalmente o uso e a geração de energia a partir de fontes renováveis e sistemas de cogeração
(que podem utilizar fontes fósseis de maneira mais eficiente).
2
Programas de eficiência energética são entendidos aqui como ações organizadas e implementadas por outros agentes
que não as companhias de eletricidade. Programas de GLD (Gerenciamento do Lado da Demanda) ou DSM (Demand-
Side Management) são ações concebidas, implementadas e fundamentadas historicamente no contexto de companhias
de eletricidade.
3
Uma discussão mais detalhada sobre essa experiência é abordada no Capítulo 6 do livro “Geração distribuída e
eficiência energética: Reflexões para o setor elétrico de hoje e do futuro” (Bajay et al. 2018).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 101

de maior uso de fontes renováveis4. Um Plano Integrado de Recursos inclui, também, questões de
custos e de impactos desses programas na curva de carga do sistema elétrico e no consumo de
eletricidade. Em níveis mais detalhados, o PIR também inclui projetos específicos 5, tempo de
implementação e a avaliação dos programas. No final deste capítulo, estão alguns exemplos
quantitativos que incorporam os custos e os efeitos potenciais dos programas nos cenários de
demanda projetada de energia. Embora seja difícil estimar precisamente os custos e os efeitos dos
programas, os exemplos apresentados aqui mostram caminhos atuais e simples para a contabilização
desses parâmetros, assim como uma análise mais rigorosa para as opções do lado da demanda.

3.2. EFICIÊNCI A ENERGÉTICA E FONTES RENOVÁVEIS: BARREIRAS

3.2.1. Informação

Geralmente, a primeira barreira encontrada é a falta, ou mesmo a assimetria, de informação.


O pouco conhecimento das possibilidades de melhorias no uso de energia por parte dos
consumidores, vendedores, produtores e administradores públicos dessa área pode distorcer a
introdução de medidas de eficiência ou o uso de fontes renováveis em situações em que estas já são
viáveis tanto do ponto de vista técnico como econômico.
Os consumidores geralmente não acompanham os avanços de tecnologias disponíveis para
conservar energia. Outras vezes, a informação disseminada pelos agentes usuais possui um
conteúdo muito técnico e o consumidor pode não entender as diferenças entre tecnologias ou
dimensionar o equipamento adequado para suas necessidades. Também é necessário que os
vendedores de equipamentos tenham a informação adequada. Eles estão em contato direto com os
compradores potenciais de novos equipamentos e deveriam ser capazes de aconselhá-los sobre os
melhores produtos com relação à eficiência, ao dimensionamento e à operação. Muito
frequentemente, esse tipo de público (lojas de eletrodomésticos e materiais elétricos, por exemplo)
é negligenciado em campanhas de informação. Os fabricantes de equipamentos eletroeletrônicos
também necessitam de assistência técnica, caso se inicie um programa de introdução de novos
padrões para o equipamento consumidor de energia. Construtores, arquitetos, gerentes de compras
de companhias nem sempre têm conceitos corretos sobre as tecnologias novas e emergentes. Esses
são públicos importantes para programas de informação.
Outro aspecto importante é o comportamento e a formação de hábitos de consumo de energia.
Embora seja uma área ainda pouco investigada tanto a nível do consumidor individual como do
consumidor corporativo, é crescentemente reconhecido seu papel para a transformação do mercado
de energia. Em particular, o avanço de tecnologias de geração distribuída, redes inteligentes, smart
appliances, sistemas de medição inteligentes e o papel e a contribuição do consumidor para o
sistema energético como prossumidor (produtor e consumidor) de energia fazem com que maior
atenção seja dedicada a ele.

4
Alguns programas dirigidos ao mercado consumidor de energia têm implicações para a evolução do sistema de oferta
de energia centralizado. Programas de informação ou de preços, por exemplo, fazem com que consumidores passem a
ter preferência por compra de eletricidade de origem renovável. Isso já vem acontecendo em alguns países da Europa e
nos EUA.
5
Chama-se “projeto específico” um componente de um programa. Por exemplo, um programa de iluminação eficiente
para o setor residencial pode ser constituído de um projeto de marketing e informação, outro de substituição de lâmpadas
por meio de incentivos financeiros, outro de substituição por meio de leasing de equipamentos etc.
102 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Um investimento contínuo em programas educacionais e de disseminação de boa informação


é sempre necessário para manter os consumidores atualizados sobre as tecnologias recentes e os
meios mais eficientes de utilização da energia, muito embora somente esse tipo de iniciativa, se for
feita isoladamente, não seja suficiente para racionalizar o uso da energia e promover medidas de
uso eficiente desta, tecnologias adequadas e fontes renováveis. Programas de informação devem
estar sempre acoplados a outros programas de estímulo ao uso eficiente e à tecnologias de energia
(renováveis e tecnologias de interface6).

3.2.2. Barreiras legais, regulatórias e institucionais

Essas barreiras geralmente começam dentro das companhias ou agências a serviço do


planejamento energético. O planejamento tradicional tende a associar maior credibilidade a
alternativas de geração de energia altamente centralizadas e não favorece investimentos em medidas
de conservação de energia ou em opções descentralizadas de produção de eletricidade. Essas
barreiras decorrem, principalmente, da falta de interesse de governos ou órgão de decisão públicos
ou privados por tecnologias e medidas de controle da demanda de energia.
O PIR é um processo de planejamento mais complexo e necessita de um contexto institucional
apropriado para que seja concebido e implementado. Geralmente nas agências de planejamento
convencionais falta pessoal com conhecimento do comportamento do mercado de energia e de como
implementar políticas para alterar padrões de consumo existentes e disseminar novas tecnologias.
Ao mesmo tempo, esses analistas necessitam compreender as diversas opções técnicas existentes
também do lado da oferta. As decisões com relação ao elenco de opções, tanto do lado da oferta
quanto da demanda, são feitas após comparação dos custos de operação e do capital empregado de
um número de alternativas, levando em consideração diversas projeções futuras de preços de
energia, de crescimento do consumo de eletricidade e de taxas de juros para os financiamentos que
se façam necessários. Além disso, novas questões podem ser adicionadas com relação a impactos
ambientais e sociais dos empreendimentos. Esses diversos aspectos do planejamento energético
necessitam de ferramentas e capacitação técnicas para que o potencial de medidas de GLD e de
eficiência de energia seja corretamente avaliado e os instrumentos para implementá-lo sejam
formulados.
Além dessas dificuldades, podem existir barreiras legais que limitem o objetivo das atividades
de planejamento das companhias de energia. Por exemplo, frequentemente as companhias de
energia são legalmente definidas como as responsáveis pela oferta de eletricidade e se requer que
façam investimentos somente no setor de produção de energia elétrica. Isso, por exemplo, limitará
o exame de alternativas de investimentos para outros recursos energéticos e programas de
conservação que possam substituir a eletricidade ou diminuir o seu consumo.
Procedimentos legais de contabilidade muitas vezes impedem as companhias de energia de
considerar investimentos diretos junto a seus consumidores como investimentos próprios da
companhia. Esses procedimentos impossibilitam, por exemplo, que os custos de programas de
conservação entrem no cálculo das tarifas de eletricidade. As barreiras legais e institucionais
impedem, portanto, que as tarifas permitam às companhias elétricas recuperar os custos dos
programas de conservação. O custo de um programa de GLD poderia ser tratado como um custo de
operação da companhia que deve ser coberto com as receitas anuais decorrentes das vendas anuais
de eletricidade. Outro procedimento é ter o custo do programa tratado como um ativo nos cálculos
da tarifa básica da CE. Desse modo, o custo de um programa é pago através do tempo, com uma

6
Chamamos aqui de tecnologias de interface um conjunto de tecnologias e materiais que incluem desde materiais
supercondutores a edifícios eficientes, smart grids, smart metering e smart appliances.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 103

taxa de retorno social. O lucro de uma companhia de eletricidade também necessita ser dissociado
da necessidade de aumento das vendas de energia, o que não é o caso do Brasil. As companhias
elétricas não devem ser penalizadas por rendimentos menores, em função da diminuição de suas
vendas decorrente dos programas de sucesso que reduziram o consumo de energia. Essas são
barreiras fortes e que impedem a elaboração e a futura implementação de um PIR.
No caso do Brasil, as barreiras institucionais, tarifárias, financeiras, de acesso à tecnologia,
entre outras, dificultam a promoção de um planejamento integrado de recursos e o atingimento do
potencial máximo de conservação de energia previsto, o que se torna um desafio para o país superar.
No Plano Nacional de Energia (PNE) para 2030, o potencial de eficiência energética até 2030 é
dividido em três categorias: potencial de mercado, econômico e técnico. O potencial de mercado
inclui medidas que podem ser introduzidas “por si mesmas”, ou seja, aquelas cuja adoção traria
redução de custos ao usuário. O potencial econômico compreende um conjunto de medidas que
tenham viabilidade econômica, porém exige condições de contorno que induzam à sua efetiva
implantação. O potencial técnico estabelece um limite teórico para a penetração das medidas de
eficiência energética dado pela substituição de todos os usos da energia considerados por
equivalentes com a tecnologia mais eficiente disponível. No PNE 2030 entende-se que seja possível
atingir em 2030, com a continuidade das ações tomadas até agora, um montante de energia
conservada limitado ao equivalente do potencial dito de mercado, devido às barreiras citadas. Outras
medidas devem ser tomadas para a maximização da conservação de energia, objetivando atingir um
valor próximo do potencial total (EPE 2007).

3.2.3. Barreiras financeiras e decisõ es de investimentos

A maioria dos consumidores não faz investimentos em eficiência de energia porque não
possui capital para comprar equipamentos mais eficientes ou para fazer melhorias em suas
instalações. Certas medidas podem ser vantajosas para o consumidor, com rápido retorno do
investimento inicial, mas elas não são implementadas porque ele não tem capital necessário para
realizar esse investimento.
Capital, no entanto, não é o único fator financeiro de restrição. Um consumidor pode ter
capital, mas a eficiência energética pode não ser sua prioridade para investimentos. Por exemplo,
um consumidor que pretende comprar um novo refrigerador, pode preferir um modelo menos
eficiente se este estiver disponível na cor que ele prefere. Um consumidor industrial pode preferir
gastar capital em uma nova linha de produtos e desconsiderar investimentos na melhoria das
instalações elétricas existentes.
Algumas vezes, a pessoa que paga a conta de energia não é a responsável pela seleção e
compra do equipamento. Esse é especialmente o caso de construções, onde arquitetos, construtores
e proprietários selecionam elementos da construção e equipamentos, mas são os compradores e os
locatários que pagarão as despesas de energia.
Tipos diferentes de consumidores têm maneiras distintas de estimar os retornos econômicos
sobre seus investimentos em eficiência de energia, como será visto mais adiante. Os programas que
promovem medidas de eficiência podem direcionar essas questões específicas, oferecendo
empréstimos a taxas de juros atrativas, de modo a terem investimentos em medidas de energia
eficientes consideradas como prioritárias para cada agente relevante.
104 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

3.2.4. Barreiras tecnológicas e de infraestrutura

Diversas oportunidades para produzir e conservar energia dependem de novas tecnologias,


que podem não estar disponíveis em alguns países ou regiões. A grande maioria das tecnologias
convencionais tem melhorado seu desempenho energético e diminuído seus impactos ambientais
em anos recentes. No entanto, outras tecnologias enfrentam problemas técnicos para serem
produzidas e utilizadas em algumas regiões.
A disponibilidade de produto de maior eficiência energética é importante para a criação de
um mercado sustentado de tecnologias eficientes que podem ser introduzidas a partir das ações de
GLD e outros programas. Esses produtos podem ser importados, mas a assistência técnica deve
estar localmente disponível durante o período de vida útil dos mesmos.
A qualidade do equipamento que está sendo localmente produzido (ou importado) é também
um dado importante que garante o sucesso das ações do lado da demanda e pode ter reflexos no
desempenho do próprio sistema elétrico. Por exemplo, é importante introduzir reatores eletrônicos
para lâmpadas fluorescentes, porque eles consomem menos energia quando comparados com os
eletromagnéticos, mas também é importante que eles sejam produzidos com bons fatores de
potência.
Muitas tecnologias novas e eficientes incorporam componentes eletrônicos que dependem da
boa qualidade da rede elétrica para operar. Flutuações de tensão e interrupções frequentes de energia
diminuirão a vida útil projetada dos equipamentos e, portanto, colocam em risco o mérito técnico e
econômico da medida como uma alternativa do lado da demanda. Alguns países possuem diferentes
níveis de tensão em seus territórios (220V, 127V) e isso pode constituir uma barreira para criar um
mercado adequado para uma tecnologia.

3.2.5. Tarifas e custos de energia

As tarifas de eletricidade, em muitos casos, têm sido uma barreira para atrair consumidores e
investimentos em eficiência de energia. Em muitos países, as tarifas são fixadas
administrativamente pelas agências do governo, que podem ter uma faixa ampla de critério a
considerar. Em muitos casos, se observa que as tarifas cobradas não refletem os custos marginais
de produção de eletricidade. Em outros países, as tarifas são baseadas nos custos médios de
produção de eletricidade e estes, muitas vezes, não refletem os custos reais de produção da
eletricidade. Por exemplo, poucos consumidores pagam taxas mais altas por serviços no pico,
embora o custo para a CE fornecer essa energia seja sempre substancialmente mais alto que o custo
médio. Outra prática é dar subsídios aos consumidores de determinadas regiões. Essas medidas
impedem a utilização de recursos regionais para produzir eletricidade e a introdução de programas
de eficiência ou/e a adoção de medidas ou tecnologias eficientes justamente onde faria mais sentido
implementá-las.
A maneira tradicional de se calcular as tarifas de uma empresa tende a encorajar as vendas de
kWh (para uma CE), conforme já mencionado, desestimulando as medidas de eficiência que ela
possa induzir no seu mercado consumidor. Para compreender esse processo, considere o gráfico
simplificado de receitas de uma empresa de eletricidade que são necessárias para cobrir os custos
de produção versus a venda de energia (ver Figura 3-1).
No exemplo da Figura 3-1, as vendas anuais estimadas de 1 bilhão de kWh requereriam $40
milhões em receitas, assim as tarifas seriam de 0,04 $/kWh. Note que nesse exemplo fictício existe
um montante anual fixo de $30 milhões necessário para recuperar os custos de capital dos
investimentos realizados pela CE e ter lucros considerados aceitáveis, mais uma quantidade
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 105

adicional (custo marginal de curto prazo ou custo variável) de 0,01 $/kWh, que depende da
quantidade de kWh que são gerados. Esses custos fixos mais os variáveis estão associados com os
recursos de capacidade instalada existentes; os custos marginais de longo prazo incluem os custos
de capital de nova capacidade de geração. Num caso geral, a CE estima as vendas anuais totais de
kWh e a receita necessária para cobrir suas despesas. A relação dos dois valores fornece a tarifa de
eletricidade que poderia ser estabelecida para cobrir os custos. Nesse exemplo, se as vendas são
estimadas em 1 bilhão de kWh/ano e são necessários rendimentos anuais de $40 milhões para a CE,
a relação dos dois é uma tarifa média de 0,04 $/kWh, que é aquela que a CE deve cobrar.

Figura 3-1 – Vendas de eletricidade

Considere agora os incentivos "perversos" que encorajam a CE a vender mais kWh que a
quantidade estimada mostrada na Figura 3-1. Tendo estabelecido um preço de 0,04 $/kWh para
todas as vendas de eletricidade, as vendas acima de 1 bilhão de kWh produzirão rendimentos para
a CE de 0,04 US$ para cada kWh extra vendido. Uma vez que cada kWh extra gerado tem um custo
marginal para a CE de somente 0,01 $/kWh, haverá um lucro líquido de $0,03 para cada kWh extra
vendido. Note que, no exemplo, a CE perde dinheiro se ela vende menos do que 1 bilhão de kWh.
Gerar um kWh a menos reduz os custos em $0,01, mas reduz as receitas em $0,04. Em outras
palavras, essa prática de estimar vendas de eletricidade e rendimentos como um caminho para
estabelecer a tarifa base não somente encoraja as vendas de kWh adicionais, mas também
desencoraja fortemente a conservação, que reduziria as vendas de kWh.

3.2.6. Diversidade de atores e de expectativas

Ao se fazer um PIR ou, mais especificamente, programas de GLD (programa de eficiência ou


uso de fontes renováveis) é necessário considerar a diversidade dos agentes envolvidos e as suas
diferentes percepções em relação aos impactos ambientais, aos custos e benefícios, aos riscos e às
incertezas de cada medida. Os resultados da avaliação da atratividade econômica e da conveniência
de implementar uma dada medida dependerão, portanto, de cada um desses agentes.
106 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Em um PIR, a decisão sobre investimentos envolve pelo menos três agentes diferentes: o setor
energético (ou companhia de energia), o consumidor e a sociedade (que inclui consumidores de
energia, não consumidores e o setor energético). Cada um desses atores quando consideram um
novo investimento levam em conta pelo menos os seguintes fatores:
• a taxa de desconto usada para avaliar os benefícios e os custos resultantes de uma medida;
• a avaliação futura dos custos e dos preços de energia; e
• a percepção dos impactos ambientais para suas atividades, riscos e incertezas envolvidas
para adotar uma medida.
A maioria das CEs, dos grandes consumidores e o governo 7 têm acesso ao capital com taxas
de juros mais baixas, o que não é o caso da maioria dos consumidores, como apresentado na Tabela
1-1. Um governo ou uma CE pode ter recursos para fazer investimentos por prazos mais longos,
com tempo de retorno do pagamento mais longo e esparso. Por isso, o setor energético e o governo
tendem a assumir uma taxa de desconto mais baixa, quando comparada com o consumidor de
energia, refletindo seu maior acesso ao capital mesmo quando se consideram ações do lado da
demanda.

Tabela 3-1 – Taxas de descontos reais implícitas usadas em projetos energéticos

Taxa de desconto
Agentes
(% a.a.)
Governos 4–12
Banco Mundial 10
Companhia Elétrica Pública (EUA, Suécia) 6–12
Indústria 15–20
Consumidor residencial 35–70

Fonte: estimativas do autor

A percepção dos riscos futuros também é refletida nas taxas usadas para descontar os custos
e os benefícios futuros, conforme explicitado no Quadro 3-1. Diferentes agentes podem aplicar
diferentes taxas de descontos em seus fluxos de custos e benefícios. Uma taxa de desconto mais
baixa para as companhias elétricas, que pode ser a mesma utilizada para avaliar os investimentos
em geração de energia, por exemplo, fará com que investimentos em eficiência energética tenham
um retorno mais rápido, quando comparados com o caso dos investimentos nas mesmas medidas
realizadas pelos consumidores.

Quadro 3-1 – Comparação de oportunidades de investimento e riscos nas usinas de geração de eletricidade
pelas companhias elétricas e pelos consumidores
Para comparar os riscos de dois projetos alternativos, uma companhia elétrica deve considerar a figura
a seguir:

7
Neste texto, usa-se o governo como representante das percepções da sociedade.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 107

O Plano A consiste em uma nova usina de baixo custo de capital, mas de altos custos operacionais
(turbinas a gás, por exemplo). O Plano B representa uma usina hidroelétrica que possui características
opostas. Qual plano é o melhor?
Ambos os projetos possuem os mesmos custos esperados considerando a vida da usina. Entretanto,
devido à incerteza dos preços futuros de combustível para o Plano A, ele possui uma faixa de custo ($/MWh)
maior que a variação do Plano B.
O risco associado com o Plano A é óbvio – que os custos do combustível poderão ser altos e qualquer
variação afetará a rentabilidade do negócio. O risco associado com o Plano B, por outro lado, é muito menos
aparente. Seria razoável supor que tanto consumidores quanto companhias elétricas prefeririam o Plano B.
Entretanto, esse não é o caso. Enquanto os consumidores optariam pelo Plano B, as companhias escolheriam
o Plano A. Existem três razões para essa preferência das CEs:
• Se o preço do gás determinar o preço da eletricidade no ponto baixo (Plano A) e a CE tiver optado
pelo Plano B, então a companhia elétrica pode perder consumidores para outras CEs que utilizam a
tecnologia do Plano A.
• Se a CE decidir pelo Plano A, é muito provável que outras CEs, também considerando planos de
investimentos, igualmente o façam. Isso implica que os riscos associados à exposição a altos custos
de combustível são igualmente repartidos e, portanto, minimizados.
• Sempre existe a prática de se realizar contratos prevendo uma determinada evolução de preços para
os combustíveis durante um período de tempo. A variabilidade dos custos de combustíveis para uma
CE não chega a ser um fator de grande risco para elas. As agências regulamentadoras do setor
energético que autorizam aumentos tarifários podem também influir nos aumentos dos custos dos
insumos energéticos para a produção de eletricidade. Caso existam dificuldades é muito provável que
os aumentos sejam repassados aos consumidores, sem que haja questionamento se tal usina foi
construída ou não. A prática demonstra que, de fato, o Plano A oferece um baixo risco para a CE,
embora seja de alto risco para os consumidores (como tem sido o caso da introdução em 2015 das
bandeiras tarifárias no Brasil, cuja função é repassar ao consumidor os custos de aumento da geração
termoelétrica).
Esse exemplo ilustra a grande disparidade de contextos que condicionam a tomada de decisão.

_____________________________
EXEMPLO 3.1 – Calcule a taxa de desconto para um investimento
em um compressor eficiente considerando as condições dos seguintes
agentes: a) que o consumidor exija um retorno do investimento em
2,5 anos; b) que a CE queira um retorno do investimento em 10 anos
e c) que o governo queira um retorno do investimento em 20 anos.
108 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Suponha uma vida útil de 20 anos para o compressor, seu custo de


$100,00 e que esse investimento proporcione um benefício de $230,00
ao final do período desejado por cada agente. Despreze o valor
residual e os custos anuais de operação e manutenção.

Solução
Para o consumidor, que deseja um retorno de $230 em 2,5 anos
com um aporte de investimento de $100, vale a seguinte relação:
VPLC = 100(1 + i) 2,5 (3.1)

Onde VPLC é o valor presente líquido do investimento para o


consumidor ($230,00). Da Eq. (3.1) resulta uma taxa de retorno i
de 39,54%. Para a CE, tem-se que:
VPLCE = 100 (1 + i )10 (3.2)

Que resulta uma taxa de retorno i de 8,69%. Seguindo o mesmo


raciocínio, para o governo a taxa de retorno será de 4,25%.
_____________________________
EXEMPLO 3.2 – Existe alguma relação entre a taxa de desconto
dos diferentes agentes?
_____________________________
EXEMPLO 3.3 – Identifique as principais barreiras existentes
para a introdução do método PIR para sua região, área de abrangência
da sua companhia de eletricidade ou estado, ou mesmo o país, dando
exemplos.
_____________________________
EXEMPLO 3.4 – Considere o investimento em conservação de energia
na iluminação por meio da troca de lâmpadas do modelo A para o B
(ver Tabela 3-2), usando as taxas de desconto de cada agente do
EXEMPLO 3.1. Qual seria o preço máximo para ser debitado por uma
lâmpada modelo B para consumidores, companhias elétricas e governo?
Considere o preço da energia igual a R$80,00/MWh para o consumidor,
R$15/MWh para a companhia elétrica (custo marginal) e para o governo
R$50/MWh (consumidor institucional). Considere, também, que os
modelos A e B fornecem a mesma quantidade de lúmens e que o tempo
de uso é igual para todos os agentes.

Tabela 3-2 – Dados do EXEMPLO 3.4


Lâmpada modelo A Lâmpada modelo B
Vida útil 1 ano 5 anos
Potência 100 W 20 W
Preço R$ 1,00 R$ X (para cada agente)
Uso (horas/dia) 10 horas 10 horas
Valor residual 0 0
_____________________________
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 109

3.3. T ARIF AS, EFICIÊNCI A ENERGÉTICA E FONTES RENOVÁVEIS

A estrutura de preço adotada pelo setor elétrico geralmente considera que diferentes
consumidores devem ter tarifas também diferentes. Em países em desenvolvimento, esse sistema é
usado como um instrumento de política econômica para compensar a distribuição desigual de
riqueza ou para promover e estimular setores específicos da economia. Algumas vezes, a variação
entre a tarifa mais baixa e a mais alta pode atingir 1000%. Existem alguns casos, como já foi dito,
em que o preço médio da energia paga não é sequer suficiente para assegurar a taxa de retorno
necessária para financiar a expansão futura do sistema e, portanto, outros mecanismos devem ser
aplicados.
As tarifas de energia elétrica variam no tempo, dependendo da evolução da demanda, da curva
de carga, das tecnologias envolvidas na produção de energia, dos preços dos combustíveis ou da
disponibilidade de recursos hídricos no caso de geração hidroelétrica. É importante conhecer como
os consumidores reagem às mudanças dos preços de energia. Essa reação é medida por meio da
elasticidade energia-preço. Em alguns casos, o aumento do preço da eletricidade pode levar os
consumidores a substituí-la por outros combustíveis (gás ou energia solar, por exemplo) ou, em
outros, induzir os consumidores a usar eletricidade mais eficientemente. Preços são bons
instrumentos de política quando a elasticidade energia-preço é fortemente negativa, ou seja, quando
o aumento do preço é acompanhado por uma redução substancial da demanda de energia. É
importante lembrar que na teoria econômica existe uma relação entre preço e demanda, que é
perfeitamente adaptável para preços e conservação de energia.
Alguns países introduziram uma política de preços de energia que estimula a eficiência,
tornando os investimentos em novas tecnologias eficientes mais atrativos e, também, influindo no
comportamento dos consumidores em relação ao uso de energia. Preços de eletricidade são
instrumentos para guiar alguns consumidores na direção de tecnologias ou práticas de eficiência de
energia. Outro aspecto importante é o método a ser adotado para o cálculo da tarifa, de modo a
contabilizar a recuperação dos investimentos das companhias elétricas, assim como as perdas de
faturamento (diminuição de venda de eletricidade) com os programas de eficiência. Existem
diferentes maneiras de se estabelecer tarifas para o uso de energia. Nas seções seguintes são
apresentadas algumas práticas utilizadas.

3.3.1. Tarifas em bloco

Um dos modos de se cobrar pelo uso de eletricidade é por meio da estrutura de tarifa em
bloco, na qual o preço pago por cada kWh varia de acordo com os diferentes patamares de consumo.
Isso tem sido aplicado para o setor residencial, principalmente, admitindo-se que as residências de
maior renda, que tenham maiores níveis de consumo de eletricidade, subsidiarão a tarifa paga pelas
residências de renda mais baixa.
Em outros casos, a tarifa em bloco é feita para que consumidores que contratam grandes
blocos de energia junto às companhias de eletricidade paguem preços unitários menores quando
comparados com consumidores de menor porte. Isso é feito considerando economias de escala na
produção, transmissão e distribuição de eletricidade e o mercado garantido pelos contratos com
esses consumidores.
110 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

3.3.2. Tarifas a custo marginal

O papel dos preços numa economia de mercado pode ser dividido em três:
• alocar recursos eficientemente para as atividades produtivas;
• fornecer aos consumidores sinais com relação ao valor de diferentes bens e serviços; e
• prover recursos suficientes para cobrir os custos de produção de bens e serviços.
No contexto do setor elétrico, os preços da eletricidade deveriam: (i) gerar rendimentos para
a CE; (ii) sinalizar quantidades adequadas a serem consumidas; e (iii) indicar aos provedores de
serviços de energia o montante de recursos a ser alocado para atender à demanda futura de serviços
de eletricidade.
A análise econômica demonstra que o preço apropriado que acompanha essas três metas é
igual ao Custo Marginal de Longo Prazo (CMLP). Igualando o preço de um bem com o custo
marginal das diferentes fontes para aquele bem, estabelece-se uma condição padrão ótima para
todos os tipos de análise microeconômica. No caso de um bem intensivo em capital, tal como a
eletricidade, distingue-se o Custo Marginal de Curto Prazo (CMCP), que é o custo de produzir a
próxima unidade sem expandir a capacidade de produção total, e o CMLP, que é o custo de prover
um aumento futuro da produção num dado horizonte de tempo, permitindo a expansão e a
otimização da capacidade.
A relação entre o CMLP e a demanda do sistema é mostrada de forma idealizada na Figura
3-2. Uma parcela dos custos de produção de eletricidade pode ser atribuída à recuperação dos
investimentos existentes e de outros custos fixos independentemente da demanda. Com o aumento
desta, os custos de produção de eletricidade aumentam de acordo com os custos variáveis de
operação da capacidade existente, o que é indicado pelo CMCP. Em alguns pontos, a demanda é tal
que a capacidade existente não é mais adequada e deve ser expandida. Recursos de oferta de
eletricidade tendem a ser investimentos feitos em blocos que são possíveis somente em incrementos
discretos, por isso a descontinuidade na Figura 3-2, que corresponde aos custos dos aumentos
incrementais na capacidade. No ponto onde a capacidade deve aumentar, o custo marginal
(inclinação) é infinito, mas o investimento requerido não pode ser atribuído inteiramente ao
aumento marginal da demanda. O CMLP, que inclui os rendimentos requeridos para a expansão da
capacidade, é de fato "suavizado" por meio de diversos incrementos na demanda, como mostrado
na Figura 3-2.

Figura 3-2 – Efeito da expansão da capacidade nos custos marginais


Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 111

Teoricamente, vender eletricidade segundo o CMLP produzirá resultados adequados ao setor


elétrico porque a CE receberá rendimento suficiente para cobrir o custo do recurso marginal,
necessário para ofertar a quantidade de eletricidade que os consumidores estarão desejando
comprar. O método CMLP deve distinguir entre os tipos de demanda futura dos consumidores: a
que implica realmente em aumentos da capacidade instalada; e a que pode ser conseguida por meio
da otimização da capacidade existente. Essa diferença pode ser classificada de acordo com as
categorias de consumidores, os tempos de uso ou a localização geográfica, dependendo dos fatores
que tendem a justificar a expansão.
O procedimento mais comum para alocar o CMLP entre consumidores é distinguir a parcela
do consumo realizado durante o período de pico, que determina a expansão da capacidade instalada,
e a parcela fora desse período. O preço fora de pico é simplesmente o CMCP, que indica o custo de
fornecer energia sem nenhum custo de nova capacidade8. Esse valor pode variar sazonalmente, por
exemplo, em um sistema hidroelétrico, onde o custo da energia é alto durante a estação seca. O
preço durante o período de pico inclui o CMCP e o incremento relacionado à expansão da
capacidade, fornecendo o CMLP. O custo da capacidade pode ser cobrado do consumidor de acordo
com seu consumo total durante as horas de pico ou pode ser baseado na demanda máxima durante
aquele período. A combinação desses valores pode variar ao longo do ano, dependendo da dinâmica
do perfil de demanda do sistema da CE e do consumidor.

Figura 3-3 – Figura do princípio da otimalidade

Uma estrutura de tarifas, baseada no CMLP, deverá compreender, também, um valor para
cobrir os custos fixos que não dependem do nível de consumo. Além disso, o preço deverá incluir
o valor dos impactos ambientais e outras externalidades, apontando, assim, informações apropriadas
do custo total do uso da eletricidade para os consumidores. Na prática, nem todos esses refinamentos
e nem os critérios básicos para estabelecer tarifas segundo o CMLP são usados rotineiramente. Ao

8
Isso quando o consumo nesse período pode ser atendido com a capacidade existente.
112 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

invés disso, os preços são baseados, em sua maioria, nos custos médios históricos, incluindo
componentes fixos e variáveis (CMCP), como se mostra na Figura 3-2. Existem diversas razões
para essa divergência da teoria econômica, algumas de ordem técnica e outras de cunho político.
As razões técnicas referem-se ao fato de que os investimentos de oferta de eletricidade tendem
a ser feitos em blocos. Se o CMLP está decrescendo com o tempo, como ocorreu em nível mundial
durante grande parte do período antes de 1970, então o CMLP é menor do que o custo médio.
Estabelecer tarifas de acordo com esse valor, tornaria difícil aumentar os rendimentos o suficiente
para operar e expandir o sistema elétrico. Tal condição resultaria na competição entre fornecedores
e essa é uma razão pela qual a oferta de eletricidade tem sido tratada como um monopólio natural
na maioria dos países. Tarifas baseadas em custos médios históricos garantem com mais segurança
a recuperação de investimentos quando o CMLP diminui.
Nos anos 1970 e 80, os custos dos combustíveis e as taxas de juros causaram o aumento do
CMLP da eletricidade na maioria dos países. Embora os preços baseados no CMLP possam sinalizar
aos consumidores o valor futuro da eletricidade, se eles fossem assim estabelecidos nesse momento
isso provocaria uma transferência substancial de recursos financeiros dos consumidores para os
produtores de eletricidade. Isso ocasionou, essencialmente em países em desenvolvimento,
considerável resistência quanto à aplicação do CMLP tanto do ponto de vista político como de
equidade social. Hoje parece que o CMLP da oferta de eletricidade está novamente decrescendo e
as companhias elétricas já estão preocupadas com as dificuldades potenciais da recuperação dos
custos fixos de suas capacidades existentes.
A principal razão política para evitar o estabelecimento de tarifas baseadas no CMCP é que
esse procedimento pode levar a grandes diferenças de preços de eletricidade entre os consumidores,
podendo tornar o serviço não disponível para consumidores de baixa renda ou geograficamente
muito dispersos, por exemplo. Historicamente, a eletricidade tem sido vista como um componente
essencial para o desenvolvimento da infraestrutura que ajudou a integrar as áreas rurais e distantes
dentro de um país. Embora seja relativamente caro servir a essas áreas, não seria politicamente
aceitável praticar preços para refletir tais diferenças. Em muitos países em desenvolvimento, a
eletricidade é subsidiada nos pontos onde as companhias elétricas não são capazes de cobrir seus
custos, criando um obstáculo óbvio para a expansão e a operação de um sistema eficiente.
Alguns critérios para a expansão ótima do sistema elétrico podem ser definidos. A evolução
ótima de custo mínimo de um sistema elétrico, de modo geral, caracteriza-se pela igualdade, em
cada instante, entre o custo marginal de operação, ou custo marginal de curto prazo, e o custo
marginal de expansão, ou custo marginal de longo prazo. Essa condição reflete o raciocínio de que,
antes de se decidir pela incorporação ao sistema de uma nova usina geradora, qualquer acréscimo
de carga deve ser atendido pelo sistema existente, incorrendo-se em um aumento dos custos
operacionais. Isso será feito até o momento em que esse acréscimo dos custos operacionais for
maior do que o custo de expansão do sistema com uma nova obra. Enquanto o custo marginal de
operação for menor do que o de expansão, será mais econômico suprir um acréscimo de carga pelo
sistema existente até o momento em que a confiabilidade do sistema deixar de atender ao nível
adequado. Quando isso ocorre, o custo marginal associado ao risco de déficit cresce, fazendo com
que o custo marginal de operação seja maior do que o custo marginal de longo prazo de expansão
(conforme a Figura 3-3).

3.3.3. Tarifa horo-sazonal

Uma aplicação direta do preço de eletricidade a custo marginal pode ser encontrada no sistema
de tarifa conhecido como tarifa horo-sazonal aplicável para consumidores comerciais e industriais
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 113

atendidos em alta tensão (conforme Aneel nas modalidades tarifárias Azul e Verde) e, desde 2015,
para consumidores residenciais atendidos em baixa tensão (conforme Aneel na modalidade tarifária
Branca). É possível mudar o comportamento do consumidor com relação ao uso de energia durante
o dia ou durante alguns períodos do ano. As tarifas podem variar entre horas de pico (normalmente
das 18:00 às 21:00 ou 22:00 horas) e horas fora de pico e entre estação seca e úmida (importante
num sistema hidroelétrico).
Alguns consumidores pagam dois tipos de tarifas: uma pela energia consumida (kWh) e outra
por uma demanda máxima contratada (kW). Os preços de eletricidade são mais altos durante certos
períodos do dia ou do ano9. Essa é uma maneira de mudar o perfil de carga do consumidor,
possibilitando a introdução de tecnologias mais eficientes ou mudanças nos horários de maior
utilização de eletricidade. Desse modo, esse mecanismo de preço pode ser usado para promover
mudanças na curva de carga do sistema elétrico.

3.3.4. Tarifa verde e subsídios para fontes renováveis

Em alguns países, esse mecanismo de preços foi usado de modo a favorecer a introdução das
fontes renováveis. Nesse caso, essa é uma taxa que o consumidor concorda em pagar sobre a tarifa
normal (5 a 10% da tarifa existente), de modo a sustentar o desenvolvimento e o uso das fontes
renováveis que podem custar ligeiramente mais do que as fontes convencionais. Isso tem sido
aplicado na Dinamarca, por exemplo, onde os consumidores podem optar por uma certa fração de
seu consumo a ser fornecido por meio de geração eólica. As taxas funcionam como incentivo aos
produtores de eletricidade a partir de fontes renováveis mais competitivas em relação às fontes
convencionais.
No Brasil, dentre os encargos legais incluídos na composição da tarifa elétrica, merece
destaque a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que tem como objetivo propiciar o
desenvolvimento energético a partir de fontes alternativas, além de promover a universalização do
serviço de energia residencial para as classes de baixa renda.

3.3.5. Tarifas, custos dos programas de eficiência energética e GLD

Os mecanismos tradicionais para estabelecer tarifas que estimulem uma crescente venda de
eletricidade, de modo a garantir receitas adequadas para a companhia, têm o efeito de serem graves
empecilhos para uma efetiva participação da mesma em iniciativas de conservação de energia,
conforme discutido anteriormente. É necessário introduzir maneiras alternativas para procurar
eliminar a relação direta entre vendas de kWh e lucros da CE. Essas estratégias já vem sendo
empregadas há bastante tempo, como pode ser visto adiante.
Quando a CE encoraja seus consumidores a conservar energia, oferecendo incentivos
(programas de informação, descontos etc.), isso acarreta custos adicionais que necessitam ser
recuperados. Assim como os gastos do lado da oferta são recuperados por meio de tarifas, os
programas de eficiência e GLD também devem ser considerados dessa maneira. Pode-se
argumentar, entretanto, que a introdução de novas taxas para cobrir os custos desses programas
pode aumentar o custo de conservação para os consumidores e pode permitir que as companhias
elétricas obtenham lucros com seus programas GLD e de eficiência. Se os custos dos programas

9
No Brasil, as tarifas de demanda são cinco vezes mais caras durante as horas de pico e 10% mais caras durante a
estação de seca para os consumidores industriais de alta voltagem.
114 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

fossem distribuídos sem afetar a margem de lucro da companhia de eletricidade, os custos de


conservação seriam mais atraentes. Sobre isso podem ser citados alguns exemplos de experiências
norte-americanas:

Redução de vendas de eletricidade

Para que o GLD seja considerado pela CE é essencial um desacoplamento entre as vendas de
energia (kWh) e as receitas (R$) da companhia. O estado da Califórnia iniciou esse procedimento
em 1978 para o setor de gás natural, dissociando a necessidade de aumento das vendas para
assegurar rendimentos adequados para a companhia desse estado. Depois, em 1982, começou a
aplicar o mesmo procedimento para suas companhias de eletricidade, por meio de um programa de
recuperação de rede chamado de ERAM (Electric Revenue Adjustment Mechanism). Outros estados
dos EUA adotaram mecanismos de desacoplamento entre vendas e rendimento semelhantes. Uma
apresentação excelente do ERAM é dada em Marnay e Comnes (1992). Os parágrafos seguintes
estão baseados nesse trabalho. O programa ERAM foi abandonado em 1996, após a
desregulamentação do mercado da eletricidade, mas configurações desse mecanismo foram
restabelecidas em 2001, após a crise de energia da Califórnia (Donnelly, Christian-Smith, and
Cooley 2013).
A ideia básica do ERAM é simples: a CE deve manter somente a receita acordada advinda da
tarifa básica autorizada pelo órgão regulador. Qualquer rendimento extra ou menor, em um dado
ano, é colocado em uma conta separada. Esse balanço contábil que inclui juros é "zerado" a cada
ano usando uma taxa adicional (que pode ser positiva ou negativa) a ser incluída nas tarifas do ano
seguinte. O exemplo da Tabela 3-3 ilustra o cálculo, que foi simplificado, pois não inclui os efeitos
de taxa de juros ou outra remuneração financeira na contabilidade do balanço ERAM.

Tabela 3-3 – Decomposição usando ERAM

Exemplo ERAM Califórnia Ano 1 Ano 2 Ano 3 Notas


(1) Taxa base ($ milhões) $300 $300 $300
(2) Taxa de retorno autorizada 10% 10% 10%
(3) Rendimento baseado na taxa amortizada $30 $30 $30 (1)×(2)
(4) Vendas previstas (milhões de kWh) 1.000 1.100 1.000
(5) Custos operacionais (US$/kWh) 0,01 0,01 0,01
(6) Custos previstos, exceto combustíveis $10 $11 $10 (4)×(5)/100
(7) Rendimento da taxa base amortizada $40 $41 $40 (3)+(6)
(8) Balanço ERAM $0 $4 $–3 Previsto (13)
(9) Rendimento total autorizado $40 $37 $43 (7)–(8)
(10) Tarifa base (US$/kWh) 0,0400 0,0336 0,0434 (9)×100/(4)
(11) Vendas atuais (106 kWh) 1.100 1.000 1.100
(12) Rendimentos coletados $44 $34 $48 (10)×(11)/100
(13) Rendimentos extras coletados $4 $–3 $4 (12)–(9)

Considere os dados da Tabela 3-3. Na primeira linha do Ano 1, $300 milhões representam os
ativos da CE que são "baseados na tarifa". O órgão regulador local permite uma taxa de retorno de
10% ($30 milhões/ano, linha 3). A linha 4 mostra as vendas de kWh previstas para o próximo ano
(1 bilhão de kWh). Multiplicando as vendas previstas pelos custos operacionais, 0,01$/kWh, obtém-
se o total necessário para cobrir os custos operacionais ($10 milhões, linha 6). A linha 7 mostra os
rendimentos totais baseados na taxa autorizada ($30 milhões de retorno sobre investimento + $10
milhões de custos operacionais = $40 milhões). A receita da companhia com a tarifa básica
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 115

autorizada é então ajustada para contabilizar o balanço do ERAM do ano anterior (no ano 1, este é
$0), dando um rendimento total autorizado ($40 milhões, linha 9). Dividindo os rendimentos totais
autorizados pelas vendas kWh previstas, tem-se a tarifa básica que a CE pode cobrar para seus
consumidores naquele ano ($40 milhões/1 bilhão kWh = $0,04/kWh, linha 10).
No primeiro ano, as vendas realizadas (1,1 bilhão de kWh) estiveram acima das vendas
previstas (1,0 bilhão de kWh), tanto que a CE coletou um extra de $4 milhões ($44 - $40, linha 13).
Esse rendimento extra coletado é levado em consideração na contabilidade de balanço ERAM, para
ser devolvido (se positivo) ou ressarcido (se negativo) no ano seguinte (linha 8). Nesse exemplo, os
efeitos da taxa de juros ou outra remuneração financeira na contabilidade ERAM não foram
considerados.
As vendas de kWh realizadas no Ano 1 são maiores do que os rendimentos extras projetados
que são devolvidos no Ano 2. No Ano 2, as vendas de kWh são menores que as projetadas e não
são coletados suficientes rendimentos. Aquele déficit no rendimento no Ano 2 é coletado no Ano 3
e assim por diante. O efeito do ERAM é, então, a remoção dos incentivos para vender mais kWh e
a remoção dos obstáculos para conservar kWh.
Apesar do ERAM ser bastante aceito na Califórnia, ele não é o único método de
desacoplamento (veja, por exemplo, a descrição do desacoplamento rendimento por consumidor em
Moskovitz e Swofford 1992). Enquanto o desacoplamento entre vendas e rendimentos de uma
companhia é uma condição necessária para que o GLD tenha um impacto, ele não recompensa
companhias elétricas por seus programas de conservação e, assim, não é uma condição suficiente
para que elas promovam programas de conservação.

Recuperando os custos do programa de eficiência ou GLD

Existem dois métodos para as CEs recuperarem os custos dos programas do lado da demanda
ou do lado da oferta: os custos podem ser recuperados no ano em que a despesa com o programa é
feita ou então os custos são incorporados na tarifa básica e são recuperados ao longo de um
determinado tempo. Os investimentos da CE em sistemas de geração, transmissão e distribuição
são, geralmente, incluídos nas tarifas e são recuperados ao longo do tempo, enquanto outros custos
com programas de GLD ou eficiência tendem a ser encarados como despesas operacionais anuais.
Existem inúmeras razões pelas quais os custos de GLD seriam melhor considerados se fossem
incluídos nas tarifas básicas de eletricidade do que se fossem contabilizados como custos
operacionais (Reid, Brown, and Deem 1993):
• Os custos contabilizados na tarifa básica são passíveis de ser remunerados com taxas de
lucros para a CE. Isto é, como mostrado na Tabela 1-1, as despesas baseadas nas tarifas
ganham uma taxa de retorno sobre o investimento. Os itens gastos anualmente não. Os
custos operacionais são simplesmente passados para os consumidores;
• Uma vez que os custos totais de um item de despesa são recuperados no ano em que foram
feitos, podem existir imprevistos e aumentos anuais irregulares nas tarifas cobradas pela
CE aos seus consumidores e esse efeito desencorajar despesas em grandes programas de
GLD. Quando os custos dos programas são amortizados no tempo, as tarifas mudam mais
lentamente;
• Na medida em que os equipamentos/instalações de geração, transmissão e distribuição são
depreciados, a tarifa básica declina. Investidores, no entanto, tendem a retrair seus
116 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

investimentos nas CEs quando isso acontece. Se existe a possibilidade de se incluir os


custos com programas de eficiência e GLD na tarifa base, a única possibilidade de elas
aumentarem é por meio da construção de novas usinas.

Uso de incentivos econômicos

Além dos instrumentos já discutidos que promovem a dissociação da necessidade do aumento


de vendas de energia para garantir rendimentos para a companhia e a incorporação dos custos dos
programas de conservação nas tarifas pagas, verificou-se, ainda nos EUA, que foi necessária a
introdução de incentivos diretos para fomentar os programas de conservação. A Figura 3-4 mostra
claramente o declínio do interesse das companhias em programas de conservação na segunda
metade dos anos 80 (Calwell and Cavanagh 1989).

Figura 3-4 – Investimentos em conservação em companhias de energia da Califórnia

O ERAM teve um impacto no início, mas, sem incentivos específicos para que promovessem
programas de GLD, as CEs da Califórnia retomaram seus investimentos do lado da oferta. Somente
no início dos anos 90 houve uma retomada no interesse, por meio das iniciativas que são abordadas
a seguir.
• California Collaborative
Devido ao declínio no interesse em programas de conservação das companhias da Califórnia
(ver Figura 3-4), o Conselho de Defesa dos Recursos Naturais (Natural Resources Defense Council
– NRDC) convenceu a CPUC (California Public Utilities Commission)10 a manter uma audiência
especial em 1989 sobre o futuro dos programas de conservação na Califórnia. A audiência resultou

10
Praticamente todos os estados americanos possuem um órgão que regula preços, taxas de retorno e o desempenho
geral das companhias públicas e privadas de energia elétrica, gás, água e saneamento. Devido às características
predominantes de monopólio na estrutura de suprimento de eletricidade em nível estadual, as políticas públicas do setor
têm sido elaboradas pela agência federal PUC (Public Utilities Commision). O CPUC é o órgão que regulamenta e
fiscaliza o setor elétrico do estado da Califórnia.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 117

na criação do mecanismo California Collaborative que constituiu um grupo de representantes de


15 companhias elétricas, das maiores indústrias, agências de regulamentação, de órgãos de
consumidores e das organizações ambientais (California Energy Commission 1990). O grupo tinha
como atribuição o lançamento de um plano detalhado que expandiria os programas de conservação
das companhias elétricas por meio de incentivos. O próprio processo de agrupar agentes tão diversos
foi tão extraordinário quanto os programas resultantes. Esse grupo produziu um relatório em 1990
chamado An Energy Efficiency Blueprint for California que levou, em 1990 e 1991, à aprovação da
CPUC de normas para a introdução de incentivos para uso eficiente de energia para o consumidor
(Customer Energy Efficiency – CEE). Depois que os incentivos da CEE foram introduzidos, as
práticas de conservação das companhias de eletricidade da Califórnia mudaram drasticamente.
A eficiência no uso de energia tornou-se um tema importante durante o início dos anos de
1990. No Plano de Energia da Califórnia 1992-93, por exemplo, o governador Wilson (um
conhecido republicano) solicitou à CPUC que garantisse que pelo menos três quartos das
necessidades da Califórnia de novas ofertas de eletricidade até 2001 deveriam vir de melhorias na
eficiência de energia. O estado da Califórnia tem uma longa história de apoio às energias
renováveis. Segundo a California Energy Commission (2012), cerca de 11% de toda a eletricidade
consumida naquele estado vem de recursos renováveis, como eólica, solar (fotovoltaica), biomassa,
geotérmica e outras.
• Programa de economias compartilhadas da PG&E
É interessante que nem todas as companhias elétricas norte-americanas escolheram os
mesmos tipos de incentivos para programas de conservação. Um dos mais populares é baseado no
atrelamento dos incentivos de ganhos da CE ao montante de dinheiro atualmente economizado por
meio de conservação. Tais programas são chamados de shared savings (economias compartilhadas)
e estão sendo usados por diversas companhias de eletricidade norte-americanas. Para manter essa
seção concisa será apresentada somente a metodologia de economias compartilhadas da PG&E.
Para outros exemplos e explicações mais detalhadas, consultar o Regulatory Incentives for Demand-
Side Management (Nadel, Reid, and Wolcott 1992).
Os programas de economias compartilhadas da CE estão baseados na seguinte equação:
Economia Líquida = Custo Evitado − Custo Programa (3.3)

Onde:
Custo Evitado = Redução de Carga(kW ou kWh)  Custo de Oferta Evitado ($/kW ou $/kWh) (3.4)

CustoPrograma é o custo do programa de eficiência da CE (administração, descontos, subsídios


etc.). No programa de economias compartilhadas da PG&E, somente o dinheiro gasto pela CE é
incluído no custo do programa. Algumas companhias elétricas, entretanto, incluem o dinheiro que
o consumidor gasta em conservação (assim como o custo dos incentivos dados pela CE aos seus
consumidores) quando elas contabilizam o custo do programa.
No programa da PG&E, seus acionistas podem manter 15% das economias líquidas se as
metas para economias de energia são excedidas. Os 85% remanescentes das economias líquidas
beneficiam os contribuintes como um todo, por meio dos custos reduzidos da geração de energia da
CE (os contribuintes que levam vantagem com o desconto também economizam em suas contas de
energia, já que eles estão usando menos eletricidade). A Figura 3-5 ilustra esse conceito.
118 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Figura 3-5 – Método de economias compartilhadas da PG&E

Enquanto os acionistas da PG&E obtêm uma recompensa de 15% para a conservação que
excede um limite de desempenho preestabelecido, há também uma penalidade de 15% que é
aplicada se as economias caem abaixo de outro limite inferior11.
_____________________________
EXEMPLO 3.5 – Suponha que a PG&E promova um programa de
substituição de lâmpadas oferecendo um desconto de $5 em cada
lâmpada compacta fluorescente (LCF) de 18 Watts, equivalente a uma
lâmpada incandescente de 75 Watts, e que dure 10.000 horas. Suponha
que:
• O custo adicional para a PG&E administrar o programa seja de
$1;
• O custo marginal da eletricidade para a PG&E seja de 0,04
US$/kWh.
Encontre os ganhos possíveis para os acionistas da PG&E se 1
milhão de consumidores participarem do programa.

Solução:
De acordo com a Eq. (3.4), o custo evitado para a PG&E é:
Custo Evitado = (75 − 18) 10000  0,04 110 6 10 −3 = $22,8 milhões (3.5)

O CustoPrograma seria:

11
A avaliação de desempenho de um programa é realizada por meio de uma taxa de participação no programa e não
pelas economias de energia deste.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 119

Custo Programa = (5 + 1)  1 10 6 = $6 milhões (3.6)

Assim, o benefício do acionista seria 15% de 16,8 milhões, ou


seja, $2,52 milhões. A economia líquida para os contribuintes
seria, portanto, 85% de 16,8 milhões, ou seja, $14,28 milhões.
_____________________________
Outro modo de ilustrar a vantagem do GLD é o da perspectiva da sociedade como um todo.
Por exemplo, pode-se escrever as seguintes relações:
CustoSocial = CustoPrograma + CustoConsumidor (3.7)
E:
BenefícioSocial = Custo Evitado − CustoSocial (3.8)
_____________________________
EXEMPLO 3.6 – Com os dados do EXEMPLO 3.5, estime o benefício
desse programa para a sociedade. Suponha o custo de $15 para uma
LCF numa loja local ($10 após o desconto). Qual será o custo social
do programa?

Solução:
Novamente assumindo que 1 milhão de LCFs sejam compradas, o
custo social para a CE e para seus consumidores é:
Custo Social = Custo Programa + Custo Consumidor = (6 + 2,52) 10 6 + (15 − 5) 10 6 = $18,52 10 6 (3.9)

O benefício para a sociedade é:


Benefício Social = Custo Evitado − Custo Social = (22,8 − 18,52 ) 10 6 = $4,28 10 6 (3.10)

O custo social em alguns cálculos inclui uma contribuição


adicional para os benefícios ambientais de redução do consumo de
energia. Isto é, as externalidades deveriam ser incluídas no custo
de cada opção de energia em consideração.
_____________________________

3.3.6. Composição da t arifa

De um modo geral, a tarifa elétrica deve ser suficiente para remunerar os custos de geração,
transmissão (monopólio natural) e a distribuição, além dos encargos e tributos determinados por lei.
Em cada elo da cadeia do sistema elétrico, o valor da remuneração recebido pela venda de energia
deve cobrir, no mínimo, os custos operacionais (fixos e variáveis) e um lucro que garanta a expansão
do sistema.
120 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Figura 3-6 – Composição do preço da tarifa de energia elétrica (BRASIL, 2006 versus EUA, 2011)

No caso do Brasil, a partir de 2004, o valor da geração da energia comprada pelas


distribuidoras para revenda aos seus consumidores passou a ser determinado em leilões públicos,
com o objetivo de aumentar a competição e a transparência e melhorar os níveis de preços para os
consumidores finais.
A composição da tarifa média difere substancialmente entre países ou regiões, sendo que a
participação dos tributos e taxas é, provavelmente, a que tem maior variância 12. A Figura 3-6, para
efeito de comparação, mostra a composição (%) da tarifa de energia elétrica residencial do Brasil
(2006) e nos EUA (2011). Note que a diferença mais notória diz respeito aos encargos e tributos
embutidos no preço do consumidor final.

3.4. FONTES RENOVÁVEIS E PROGRAMAS DE SUBSTITUIÇÃO DE ENERGIA

3.4.1. Substituição entre eletricidade e gás

Em muitos países, utiliza-se principalmente a energia fóssil para a produção de eletricidade.


Uma opção para economizar recurso energético primário e reduzir os custos e a emissão de
poluentes é a substituição da eletricidade em alguns usos finais por outros combustíveis, tais como
gás. Os benefícios da redução da emissão de poluentes e da economia de recurso energético primário
pela substituição de energéticos no ponto de uso final dependem de diversos fatores. Dentre eles,
estão incluídos o tipo de combustível e seu poder calorífico, a eficiência do sistema de conversão
de recurso energético primário em eletricidade e a eficiência dos sistemas de uso final. Em regiões
com grande dependência do carvão e do petróleo, a produção de eletricidade com a promoção da
substituição indicada pode resultar em expressiva diminuição de emissões de CO 2 e SO2.

12
Sugerimos ler o Capítulo 3 de Bajay et al. (2018) para melhor compreensão da estrutura das tarifas de eletricidade
no Brasil.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 121

Pode-se analisar o desempenho relativo das tecnologias de usos finais de gás e eletricidade de
acordo com seus usos, emissões e custos de energia anuais. Veja o exemplo a seguir:
_____________________________
EXEMPLO 3.7 – Compare o uso de energia, as emissões de carbono
e os custos para substituir um aquecedor de água elétrico por um a
gás pela Companhia de Energia de Brakimpur. A energia útil do
consumidor necessária para o aquecimento da água é 3,5 MWh por ano.
O aquecedor de água elétrico tem eficiência de 90% e custa $200,
enquanto o equipamento a gás é 65% eficiente e custa $400. Para
essa CE, a oferta de eletricidade marginal usada durante o ano para
abastecer o aquecedor de água produz 0,18 tCO2 por MWh. A combustão
do gás, por outro lado, produz 14 kgCO2 por GJ ou 0,05 tCO2 por MWh
equivalente. O gás custa $5/GJ ou $18/MWh e a eletricidade custa
$65/MWh.
A vida útil dos dois aquecedores é de 15 anos e a taxa de
desconto é 6%, que dá um FRC (Fator de Recuperação de Capital) de
0,10. Existe benefício econômico em se promover a substituição do
aquecedor elétrico por outro a gás? Existe redução de emissões de
CO2? Considere as seguintes definições:
• E(MWh/ano)=Carga(MWh/ano)/Ef;
• TE(t/ano)=E(MWh/ano)×DEC/DE(t/MWh);
• CA($/ano)=Ccap($)×FRC(ano–1)+E(MWh/ano)×Ccomb($/MWh),
Onde E é o uso de energia anual (MWh/ano); Carga (ou Potência)
é a carga de energia útil anual (MWh/ano); Ef é a eficiência da
tecnologia do uso final; TE é a taxa de emissão anual (t/ano);
DEC/DE é a intensidade de emissão do combustível ou eletricidade
(t/MWh); CA é o custo anual do serviço ($/ano); Ccap é o custo de
capital da tecnologia de uso final ($); FRC é o fator de recuperação
de capital e Ccomb é o custo unitário do combustível ou eletricidade
($/MWh ou $/GJ).

Solução:
Para o aquecedor a gás:
𝐸𝐺á𝑠 = 3,5/0,65 = 5,4 MWh/ano, 𝑇𝐸𝐺á𝑠 = 5,4 × 0,05 = 0,27 tCO2 /ano (3.11)
E:
CAGás = 400 0,10 + 5,4 18 = $137 / ano (3.12)

Para o aquecedor elétrico:


𝐸𝐸𝑙𝑒𝑡 = 3,5/0,9 = 3,9 MWh/ano, 𝑇𝐸𝐸𝑙𝑒𝑡 = 3,9 × 0,18 = 0,70 tCO2 /ano (3.13)
E:
CAElet = 200  0,10 + 3,9  65 = $273 / ano (3.14)
122 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Assim, as economias de custos anuais são de $136 e as economias


de emissões anuais, de 0,43 t de CO2, para substituir o aquecedor
elétrico por um a gás. Se a eletricidade possui um valor de energia
primária três vezes maior comparada ao gás, então as economias de
energia primária são (3×3,9) - 5,4 = 6,3 MWh por ano. Normalizando
de acordo com a redução no uso de eletricidade, as economias de
emissão são 0,43/3,9 = 0,11 tCO2/MWh. Excluindo o custo da
eletricidade comprada, o custo da eletricidade economizada é {400
× (0,10) + 5,4 × (18) – 200 × (0,10)}/3,9 = $30/MWh. Esse valor é
muito menor do que o preço da eletricidade ($65/MWh) e,
provavelmente, menor que o custo marginal de longo prazo da produção
($30/MWh deve estar próximo do custo marginal de curto prazo).
Assim, o custo da eletricidade conservada por essa medida de
substituição de combustível é negativo.
_____________________________
EXEMPLO 3.8 – O EXEMPLO 3.7 mostrou os benefícios de substituir
um aquecedor de resistência elétrica por um a gás. Bombas de calor
elétricas, por outro lado, podem atingir uma eficiência bastante
grande e podem deslocar as tecnologias que usam gás em alguns casos.
A eficiência típica de uso final elétrica para aquecedores de água
utilizando bomba de calor é de aproximadamente 2,1 COP (Coeficient
of Performance13). Compare o desempenho energético, as emissões e
os custos de um aquecedor de água de bomba de calor de um consumidor
da Companhia de Energia de Brakimpur e o aquecedor a gás descrito
no EXEMPLO 3.7.
_____________________________

3.4.2. Substituição entre eletricidade e energia solar

Apesar da presença de luz solar em todas as áreas da Terra, o uso desse tipo de energia é mais
viável nas regiões de baixa latitude (entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio). Iluminação,
calefação e aquecimento de água são os principais usos finais nos quais há oportunidades para a
utilização de energia solar a custos competitivos com fontes de energia e tecnologias convencionais.
É necessário analisar cada caso particular para determinar os custos e os benefícios da
substituição de eletricidade por energia solar. O aproveitamento da iluminação natural, por meio de
materiais e projetos de construção adequados, é uma maneira de economizar eletricidade. Uma
arquitetura adequada pode, também, aproveitar a luz do sol, proporcionando, dessa forma, ganho
de calor, nos climas frios, para dentro das construções. O uso da energia solar também é uma boa
alternativa para substituir os sistemas de aquecimento de água baseados em eletricidade, como pode
ser visto no exemplo a seguir.
_____________________________
EXEMPLO 3.9 – Calcule a economia considerando um investimento
em substituição de um chuveiro elétrico por um sistema de pré-
aquecimento solar – chuveiro de baixa potência – para a

13
O coeficiente de performance foi criado para comparar as bombas de calor de acordo com a sua eficiência energética.
Um valor maior indica uma maior eficiência. Para aquecimento, COPheating = Thot/(Thot – Tcold); para resfriamento,
COPcooling = Tcold/(Thot – Tcold).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 123

concessionária de eletricidade e para o consumidor, considerando a


taxa de desconto da CE de 12% e a taxa de desconto do consumidor
de 25%. Os dados para a análise econômica estão na Tabela 3-4 a
seguir. Os custos de energia para os dois agentes são os mesmos
indicados no EXEMPLO 3.7.

Tabela 3-4 – Dados de substituição – EXEMPLO 3.9


Dados Chuveiro elétrico Pré-aquecedor solar
Vida (ano) 20 20
Investimento (R$) 121 533
Consumo médio (kWh/ano) 632 126,4
Custo anual (R$) 139,04 19,21
_____________________________

3.4.3. Cogeração

A cogeração refere-se ao processo de produção combinada de calor e potência14 que permite


o uso da energia liberada pela combustão de uma fonte energética, como o apresentado na Figura
3-7. A cogeração pode ser usada em sistemas nos quais as máquinas motrizes são turbinas a vapor,
turbinas a gás ou motores de combustão interna.

Figura 3-7 – Esquema de um sistema de cogeração


Fonte: cortesia do grupo Energiestro

14
Potência e calor combinado (CHP) é o termo mais comum usado na Europa para tecnologia de cogeração.
124 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Do ponto de vista energético, a grande vantagem da cogeração reside nas altas eficiências
globais de conversão, da ordem de 75-90%, muito superiores àquelas alcançadas por sistemas
independentes de calor e potência. Nesse sentido, a cogeração pode ser entendida como uma
tecnologia energética eficiente e, do ponto de vista do sistema elétrico, como uma opção de geração
descentralizada, nos setores industrial e comercial.
A cogeração é amplamente conhecida e bastante utilizada atualmente. Foi a tecnologia
empregada no princípio da eletrificação industrial, especialmente nas indústrias energointensivas,
como forma de suprir suas necessidades de eletricidade e calor, geralmente na forma de vapor. Até
meados da década de 1970, a cogeração foi perdendo importância junto da maioria das outras fontes
descentralizadas de eletricidade, de maneira mais ou menos acentuada, de acordo com as condições
particulares de cada país.
A cogeração readquiriu importância durante os anos 80, com a desregulamentação do setor
elétrico em alguns países e a adoção de políticas de racionalização do uso de energia de longo prazo.
Hoje é uma prioridade no contexto das políticas energéticas que visam à minimização dos impactos
ambientais.
A cogeração é um processo de conversão de energia que depende de várias condições:
• Das formas de energia disponíveis: a potência mecânica ou elétrica, processos de
aquecimento ou refrigeração por absorção;
• Se a energia elétrica é consumida pela própria unidade que realiza a cogeração ou vendida
para outros consumidores via rede de eletricidade;
• Se o sistema de cogeração é de propriedade de um consumidor de eletricidade, de um
produtor independente ou de uma CE;
• Do porte do sistema (pode variar de uns poucos kW para muitos MW).
O princípio de produção combinada de calor e potência pode ser aplicado em três concepções
distintas. A primeira é associada com o funcionamento das centrais termoelétricas, de maneira que
o calor rejeitado na operação do ciclo termodinâmico é recuperado e usado na forma de um fluxo
de calor, para aquecimento ambiental. Tais plantas de cogeração utilizam e algumas vendem vapor
de baixa pressão para instalações industriais. Nessa concepção, a quantidade de calor produzida é
significativa, atendendo total ou parcialmente às necessidades energéticas das comunidades
próximas à central termoelétrica.
O princípio dos sistemas de cogeração é conhecido como redes de calor ou sistema de calor
distrital (district heating). Uma forma alternativa de sistema de calor distrital pode ser encontrada
em instalações de incineração de lixo. Existem vários sistemas de calor distrital na Europa,
especialmente na Europa Oriental, Alemanha, Áustria e Escandinávia. O padrão da reconstrução no
pós-guerra, as condições climáticas, a ação do Estado no planejamento da infraestrutura e a prática
da descentralização com maior autonomia das comunidades locais são fatores que explicam a
importância dessa forma de cogeração nesses países. As instalações de calor distrital são,
geralmente, desenvolvidas e operadas sob forte influência do poder público.
A segunda possibilidade de implementação da cogeração está nas instalações industriais, nas
quais a potência produzida pode atender parcial ou totalmente às necessidades da própria planta
industrial, sendo possível produzir um excedente de potência para vender à rede da CE local. Os
fluxos de energia térmica são utilizados como calor de processo. A viabilidade técnico-econômica
da cogeração em instalações industriais é melhorada se a demanda de energia térmica for
significativa e constante. Em particular, esse é o caso da indústria química, das refinarias de
petróleo, das indústrias siderúrgicas e metalúrgicas de grande porte, das indústrias de papel e
celulose e de grandes indústrias de produção de alimentos. Nesse aspecto, a cogeração é igualmente
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 125

atrativa em processos de fabricação de produtos que geram resíduos que podem ser utilizados como
combustível. São exemplos as fábricas de celulose que queimam a lixívia negra e as usinas de açúcar
que usam o bagaço. No caso das usinas de açúcar, no Brasil são empregados como combustíveis
tanto o bagaço de cana, que é um produto residual do processo de moagem, como a palha de cana,
que após a imposição de restrições legais de proibição da queima da cana antes da colheita
permanece em campo para ser recolhida e processada como combustível adicional.
A terceira possibilidade é a cogeração no setor comercial. Nesse caso, toda a demanda de
calor e potência pode ser atendida pelo mesmo sistema e tais configurações são chamadas sistemas
integrados de energia ou sistemas de energia total. Das três concepções de cogeração, esta última é
a que foi mais recentemente desenvolvida, tanto da perspectiva do mercado, quanto da tecnologia.
Assim como no caso da cogeração industrial, a quantidade de energia produzida pode ser menor,
igual ou maior do que a demanda local. O calor obtido do sistema é geralmente empregado no
aquecimento de grandes volumes de água destinados para uma diversidade de usos, incluindo
resfriamento por absorção. Sistemas integrados de energia são encontrados em escolas,
universidades, hotéis, hospitais, conjuntos residenciais, centros de lazer, centros de pesquisa,
supermercados, bancos e instalações de tratamento de lixo. As limitações da tecnologia de
cogeração nesse setor estão associadas com suas próprias características, tais como os baixos
requisitos de potência, horas reduzidas de operação e cargas térmicas sazonais. Esses aspectos quase
sempre resultam em uma condição de viabilidade econômica relativamente frágil. A viabilização
econômica da cogeração, no setor comercial, foi ampliada em alguns lugares pela redução dos
custos de investimento por meio de subsídios.
O desenvolvimento da cogeração foi significativo em dois casos e ambos associados a certo
grau de descentralização do sistema energético. O primeiro diz respeito às regiões onde os sistemas
de calor distrital foram historicamente importantes e, por consequência, a tecnologia de cogeração
está naturalmente inserida no planejamento energético local, tais como na Alemanha, Dinamarca e
Finlândia. O segundo caso é o dos países onde a cogeração nunca teve tradição ou deixou de ser
importante entre 1950 e 1980. Problemas de natureza diversa, associados ao planejamento
energético global ou setorial, permitiram, atualmente, o retorno da cogeração, principalmente nos
setores industrial e comercial.
No segundo grupo estão os Estados Unidos, a Itália e o Japão. É interessante notar que a
importância da cogeração varia nos diferentes países entre as três concepções. Por exemplo, na
Alemanha a cogeração é importante na indústria e nos sistemas de calor distrital, enquanto que na
Dinamarca ela é importante apenas com relação ao calor distrital. Nos Estados Unidos, a cogeração
teve uma maior explosão e adquiriu importância durante os anos 80 no setor industrial e em menor
escala no setor comercial. Na Itália, por outro lado, todas as três concepções foram valorizadas,
principalmente na indústria.
Embora seja simples em seus princípios, a cogeração é uma tecnologia complexa dentro de
um processo produtivo ou num sistema energético, em virtude das funções associadas e dos
interesses que podem ser afetados. A difusão efetiva dessa tecnologia depende de vários fatores,
incluindo o político, o econômico, o ambiental, os aspectos estratégicos e os institucionais da
estrutura do setor energético e dos interesses dos atores envolvidos, que são decisivos na definição
de um quadro favorável à cogeração. Da perspectiva do empreendedor, a cogeração é
essencialmente uma oportunidade de investimento que se justifica quando a plena garantia de oferta
da cidade é fundamental à manutenção das atividades ou porque vender os excedentes de
eletricidade produzida para a rede é um bom negócio. A economia da geração depende fortemente
dos preços da eletricidade e dos combustíveis. A cogeração só é economicamente viável quando as
126 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

tarifas de energia elétrica são compatíveis com os custos reais de oferta e quando os preços dos
combustíveis utilizados no sistema de cogeração forem elevados em termos relativos.
O papel das companhias de energia elétrica é decisivo. Excluída a alternativa de possibilidade
de wheeling15, as companhias de energia elétrica têm a particularidade de serem a única opção de
compra de eletricidade produzida pela cogeração e, ao mesmo, a única opção de venda de energia
aos cogeradores, quando seus equipamentos não estão operando. Num ambiente não
adequadamente regulamentado para o desenvolvimento da cogeração, esse tipo de mercado confere
às companhias elétricas um poder especial de inviabilizar o desenvolvimento da cogeração
simplesmente recusando comprar a energia de autoprodutores ou ao estabelecer condições
desfavoráveis quanto ao nível das tarifas, nas condições contratuais ou nos requisitos técnicos.
Pelo menos num primeiro instante, as companhias elétricas tendem a desenvolver a cogeração
como uma alternativa de expansão do sistema ao vislumbrar dificuldades no gerenciamento, perdas
de receita ou perda do controle do seu negócio. Numa perspectiva de longo prazo, no entanto, as
companhias elétricas tendem a acreditar que a cogeração pode contribuir para uma redução nos seus
custos marginais, bem como para um aumento na capacidade de reserva. Acima dos interesses
específicos dos empreendedores e do setor elétrico, a cogeração é uma opção tecnológica que pode
beneficiar a sociedade, dadas suas vantagens potenciais com relação à eficiência de energia e ao
meio ambiente. Os interesses da sociedade deveriam ser defendidos por instituições com poder de
regulamentar as partes envolvidas, se elas procurassem maximizar a viabilidade do potencial
disponível de cogeração.

3.5. INICI ATIVAS GOVERNAMENT AIS

Algumas iniciativas para conduzir programas de eficiência ou conservação de energia, assim


como a introdução de fontes renováveis, podem ser lideradas por agências governamentais e não
por CEs. Esses programas incluem campanhas de informação pública; etiquetagem de
equipamentos de energia; padrões para construções e aparelhos; aquisição de tecnologia; pesquisa,
desenvolvimento e demonstração financiados pelo governo; e mecanismos fiscais e financeiros. Os
governos geralmente têm à sua disposição diversos instrumentos que podem auxiliar e impulsionar
a introdução de medidas de eficiência energética e fontes renováveis.

3.5.1. Informação e etiquetagem

Os programas de informação podem ser desenvolvidos por agências governamentais ou por


companhias de energia. Esses programas têm como foco principal a disseminação de informação
sobre medidas de conservação de energia ou tecnologias mais eficientes. Eles podem ser
amplamente classificados como:
• Programas de educação direcionados para escolas de vários níveis;
• Seminários e workshops para audiências específicas;
• Programas de treinamento;
• Propaganda pública (rádio, TV, revistas e jornais); e
• Disseminação por meio de brochuras e vídeos para consumidores específicos.

15
Wheeling é a possibilidade de uma companhia de eletricidade vender energia diretamente para um consumidor mesmo
que ele esteja situado numa área servida por outra companhia.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 127

Os custos desses programas variam muito de acordo com a sua área de abrangência e o uso
de meios eletrônicos de difusão. A eficácia dessas iniciativas é muito debatida, especialmente em
relação à sua duração. Os consumidores tendem a retornar aos seus hábitos anteriores quando a
eficiência de energia perde sua prioridade ou deixa de ser lembrada pelos meios de informação. Os
programas de informação funcionam melhor quando vinculados a outras iniciativas (preços, por
exemplo) e a outros programas tais como descontos e auditorias de energia. De uma maneira geral,
somente aqueles consumidores que são mais inovadores tendem a fazer os investimentos
necessários em eficiência, estimulados inicialmente por programas de informação.
Alguns programas de informação possuem maiores repercussões e produzem efeitos
duradouros. Um exemplo é quando as questões de eficiência de energia são inseridas no currículo
de arquitetos e engenheiros. Quando esses programas de informação são direcionados para pessoal
mais especializado e têm o objetivo de dar informação gerencial técnica, eles também tendem a ser
mais efetivos. Esse é o caso de grandes consumidores industriais e comerciais, pois a maioria deles
tem um departamento de manutenção (e utilidades) dentro de suas organizações, que pode
influenciar na introdução e na permanência de medidas de eficiência de energia, caso essa
preocupação seja considerada uma prioridade.
A etiquetagem geralmente é feita em cooperação com fabricantes de aparelhos e consiste em
submeter seus produtos a um conjunto de testes de desempenho, nos quais a eficiência de energia
do aparelho é avaliada. As etiquetas usualmente são dadas por uma organização independente (uma
agência de governo ou laboratório, companhia de energia ou ONG ambiental), com o objetivo de
informar ao comprador a qualidade e a eficácia do aparelho e o consumo de energia anual estimado
de um tipo particular de equipamento. Algumas etiquetas incluem a escala, que classifica o aparelho
em relação ao mercado. Desse modo, o consumidor pode incluir o desempenho energético como
um critério adicional quando decidir pela compra de um equipamento.
No Brasil, em 1984, o Inmetro16 iniciou discussões para a criação de programas de avaliação
de desempenho visando contribuir para a racionalização do uso da energia no Brasil. Com efeito,
criou-se no Brasil o PBE (Programa Brasileiro de Etiquetagem), coordenado pelo Inmetro em
parceria com o Programa Nacional da Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás
Natural (Conpet) e o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel). Esses são
exemplos de iniciativas governamentais de programas de informação e etiquetagem.

3.5.2. Padrões de desempenho e regulamentação

Dependendo do país, um padrão pode ser entendido como código, guia, norma, lei, protocolo,
recomendação, critério ou regra. Padrões podem ser introduzidos para novos equipamentos que
consomem energia, materiais e construções. O principal objetivo desse tipo de iniciativa é criar um
sistema regulador para que novos produtos tenham níveis de consumo menores que aqueles que
estão sendo substituídos. Esses padrões podem ser voluntários durante certo período e depois eles
tendem a se tornar compulsórios. No Quadro 3.2 a seguir estão muitos exemplos de padrões de
energia introduzidos com sucesso em alguns países (Janda and Busch 1994).
Os padrões de desempenho energético são úteis em situações em que a melhoria da eficiência
de energia não pode ser atingida de outra forma. Os padrões de desempenho para edificações são
um bom exemplo, porque os empreiteiros e os construtores, ou os projetistas de construções,

16
Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da
Indústria, Comércio Exterior e Serviços.
128 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

frequentemente não são aqueles que farão uso das instalações e que pagarão as respectivas contas
de eletricidade. Embora as construções tenham uma vida útil longa, os custos de manutenção de
energia são considerados irrelevantes durante as fases de projeto e construção, quando outros itens
têm custos mais altos e, devido a isso, não se investe em instalações que minimizem as necessidades
energéticas de edificações.

Quadro 3.2 – Exemplos de etiquetagem e padrões de desempenho energético

A etiquetagem de refrigeradores foi introduzida no Brasil em 1987 pelo Procel (Programa Nacional
de Conservação de Eletricidade). Os resultados apareceram logo depois com uma redução de 10% no
consumo de eletricidade na maioria dos modelos vendidos. Alguns modelos de mais alto consumo mudaram
sua eficiência drasticamente, de forma a se tornarem mais competitivos em relação a outros modelos de
tamanhos similares; outros, inclusive, deixaram de ser produzidos. Mais tarde, outros equipamentos foram
introduzidos no Programa de Etiquetagem do Procel tais como freezers, chuveiros elétricos e aparelhos de
ar condicionado.
Nos EUA, inicialmente foram introduzidos padrões de desempenho energético para equipamentos em
nível estadual pela Califórnia, sendo adotados em nível nacional em 1990 para refrigeradores residenciais,
freezers, aquecedores de água, fornos e aparelhos de ar condicionado. Os padrões de desempenho produziram
bons resultados, por exemplo, reduzindo o uso de eletricidade de novos refrigeradores e freezers em mais de
60%, com baixo custo para os consumidores – menos que $0,03/kWh conservado, incluindo custos
administrativos (McMahon, Chan, and Chaitkin 2001). Não existe evidência de que essas melhorias de
eficiência teriam ocorrido na ausência dos padrões.
Os padrões de desempenho de energia foram estendidos para alguns tipos de lâmpadas, motores,
instalações hidráulicas e equipamentos de ar condicionado. Enquanto isso, muitos estados e municípios dos
Estados Unidos adotaram padrões de energia em construções. A Califórnia possui um código particularmente
sofisticado que combina medidas prescritivas com outras mandatórias baseadas no desempenho energético.
Os códigos de construção (ou Código de Obras) que abordam a eficiência da iluminação e de operação de ar
condicionado são também usados em diversos outros estados, incluindo a Califórnia, e estão sendo
desenvolvidos em nível nacional para aquele país.
A Suécia tem alguns dos mais rigorosos padrões técnicos de construções no mundo e, como resultado,
as casas suecas estão entre as mais confortáveis e eficientes do ponto de vista energético, apesar do clima
severo do país. A Dinamarca também teve a preocupação de reforçar as especificações técnicas de seus
códigos de obras, aproximando-se bastante às da Suécia (Unander et al. 2004; Lichtenberg and Schipper
1977).
Um estudo internacional identificou aproximadamente 30 países que possuem padrões obrigatórios de
eficiência energética em atuação para as construções e outros 15 onde tais padrões são propostos ou
voluntários (Janda and Busch 1994). A maioria desses padrões se encontram nos países industrializados,
embora diversos países em desenvolvimento, particularmente no sudeste da Ásia, tenham pelo menos
padrões propostos ou voluntários. Muitos dos padrões são derivados daqueles desenvolvidos em outros
países, tais como os Estados Unidos e a Alemanha, e adaptados para o clima local e as práticas de construção.
O incremento de padrões é geralmente limitado, especialmente nos países em desenvolvimento, pela falta de
dados de consumo energético e práticas de construção, pela ausência de verificação de regras e
procedimentos de esforços e pela inexistência de teste de desempenho e desenvolvimento de equipamentos.
Outros exemplos de padrões de eficiência energética incluem os padrões da Corporate Average Fuel
Economy (CAFE), que dobrou a eficiência do combustível de veículos em menos de dez anos. A maioria das
melhorias foi atingida por meio da eficiência técnica e de projeto (Union of Concerned Scientists 2017).

Existem dois tipos básicos de padrões de eficiência energética: padrões prescritivos e padrões
de desempenho. Os padrões prescritivos especificam determinadas tecnologias ou configurações de
sistema que devem ser consideradas numa construção. Por exemplo, um padrão prescritivo
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 129

determina a utilização de iluminação fluorescente em áreas comuns de construções comerciais


(frequentemente iluminadas mesmo durante o dia). Os padrões de desempenho, por sua vez, exigem
o estabelecimento de índices de consumo de energia para um aparelho ou uma construção. Por
exemplo, pode-se estabelecer que a potência máxima por metro quadrado para iluminação nas áreas
de corredores de construções comerciais seja de 10W. Nesse caso, o projetista pode fazer uso de
várias tecnologias e da iluminação natural para satisfazer esse índice. Geralmente, os padrões
prescritivos são mais simples e mais usados para garantir a melhor eficiência de vários tipos de
componentes e equipamentos de uma construção.
Os padrões de desempenho são mais flexíveis e são usados para orientar a eficiência total do
sistema de áreas funcionais ou de construções. Esses padrões são mais complexos e, geralmente,
impõem maiores requisitos para a verificação. Padrões prescritivos para componentes são também
vantajosos por melhorar o desempenho energético dos equipamentos substituídos nos prédios e nas
fábricas existentes (Atkinson et al. 1992). Nas novas construções, entretanto, os padrões de
desempenho do sistema são apropriados para oferecer maior flexibilidade aos projetistas, que
poderão explorar as interações dos sistemas, materiais e projetos para obter melhor eficiência total
da energia, com menor custo e com maior conforto do que no caso de seguir os padrões de
componentes.

Tabela 3-5 – Códigos de energia de construções: limites para capacidade instalada de iluminação

Tipo de Construção Indonésia (W/m2) Jamaica (W/m2)


(Deringer and Gilling 1992)
Escritórios 15 17
Salas de aula 15 18
Auditórios 25 –
Supermercados 20 –
Hotéis 17 13
Áreas comuns 20 11
Hospitais (áreas comuns) 15 19
Armazéns 05 03
Restaurantes 10 14

O desenvolvimento de padrões é um processo público que envolve órgãos profissionais,


associações de indústrias, companhias de energia, assim como agências públicas. É necessária,
também, a existência de laboratórios que possam testar periodicamente os aparelhos que estão sendo
produzidos, importados ou vendidos. Além disso, o programa deve incluir o desenvolvimento de
procedimentos de testes para medir eficiências nos laboratórios e metodologias para estabelecer
critérios técnico-econômicos para os níveis de padrões de eficiência que servirão de referência.
Existe, ainda, a necessidade de realizar audiências públicas, reuniões com câmaras setoriais,
publicação de leis e documentos de suporte técnico e de gerenciamento do programa.
Padrões mais rigorosos de eficiência energética implicarão em custos adicionais para o
consumidor. Muito provavelmente, eles pagarão mais caro pelos novos aparelhos que incorporem
os novos avanços. Uma combinação com outros programas, tais como empréstimos, descontos e
informação, também pode ser usada para auxiliar a criação de um mercado para esses novos
produtos, minimizando, assim, os seus impactos para o consumidor.
130 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

As relações vantajosas custo-benefício resultantes de melhoria da eficiência energética de


equipamentos ou sistemas de componentes e os baixos custos administrativos desse tipo de
programas existentes sugerem que eles podem ser iniciativas importantes para administrar a
evolução de médio e longo prazo do consumo de energia. Para o consumidor, é possível também
que os custos anuais da nova tecnologia, incluindo os custos de energia, possam ser menores que
os custos dispendidos com a tecnologia atual. Uma análise, por exemplo, do custo de melhorias nas
geladeiras e nos freezers nos países escandinavos indica que o nível de consumo energético pode
ser menor que os dos melhores modelos disponíveis atualmente, com custos não superiores para o
consumidor que a média dos novos modelos existentes hoje no mercado (Buhl Pedersen 1992).
A vantagem principal da introdução de padrões de desempenho em alguns mercados difusos,
tais como o de aparelhos domésticos, é que ela reduz o risco de se acumular estoques ou voltar a
produzir e vender equipamentos de menor eficiência. Para o consumidor, os padrões sobrepõem a
incerteza e a invisibilidade das melhorias de eficiência de energia. Para os vendedores, os padrões
convencem os consumidores que, tendo acesso à boa informação e ao marketing, comprarão os
produtos eficientes.
É difícil avaliar os impactos econômicos decorrentes da exigência de maiores padrões de
eficiência para equipamentos, componentes ou edificações. Entretanto, também é bastante possível
que, após um período de desenvolvimento, os fabricantes encontrem formas mais econômicas de
produzir produtos com boa eficiência energética. Dados americanos sugerem que os custos reais de
adaptação aos padrões de eficiência para aparelhos, em 1993, foram menores que os estimados
previamente para o desenvolvimento desses equipamentos.

3.5.3. Os efeitos dos padrões através do tempo

Os padrões de eficiência de energia podem ser um meio efetivo para retirar do mercado os
produtos que consomem energia de modo exagerado. Entretanto, isso depende, também, da
dinâmica da evolução de uma determinada tecnologia através do tempo.
A Figura 3-8 ilustra o caso de melhoria do consumo de energia em refrigeradores, durante um
período, na Suécia. Caso fossem introduzidos padrões obrigatórios de eficiência por volta do ano
2000 (curva A), os níveis de eficiência, se fossem regulados por padrões, poderiam ser a norma já
em 2002, mas muitos anos antes esse nível de eficiência seria atingido sem nenhuma interferência
(Swisher 1994). Isso porque esses níveis de eficiência são tecnicamente viáveis e seus custos
econômicos não são significativos.
O gráfico mostra a evolução do melhor modelo, da média do estoque de equipamentos e da
média dos novos modelos de equipamentos em comparação com a eficiência esperada com a adoção
de padrões ao longo do tempo (Swisher 1994). A Figura 3-8 mostra que, em 1992, já estava
disponível no mercado um modelo com menor consumo (curva B) que aquele estabelecido na norma
(curva A) até o ano 2005. Isso sugere situações nas quais níveis de eficiência podem ser
tecnicamente viáveis a custos competitivos, uma vez que o modelo eficiente estava sendo
comercializado em 1992 sem a necessidade de normas. A introdução de normas garante que seja
acelerada a redução do consumo médio do estoque de equipamentos se a introdução de padrões for
feita por meio de licitações tecnológicas ou não – curvas C e A, respectivamente (Figura 3-8).
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 131

Figura 3-8 – Tendências históricas e padrões de eficiência das geladeiras e dos freezers na Suécia

A taxa de melhoria de eficiência energética depende muito da vida útil e da taxa de


substituição do equipamento existente. Nos países em desenvolvimento, onde a penetração de
aparelhos é muito menor do que a do exemplo dado, os impactos de padrões mais rigorosos de
eficiência podem ser muito maiores na evolução da eficiência média do estoque de equipamentos.
Mas se poderia iniciar com equipamentos mais eficientes, em vez de se começar com equipamentos
de baixa eficiência e depois melhorá-los.
_____________________________
EXEMPLO 3.10 – Supondo que em Brakimpur existem somente dois
tipos de geladeiras: modelo A (800 kWh/ano – modelo antigo e fora
de fabricação) e modelo B (400 kWh/ano – um modelo novo ainda não
em uso). Considere que no ano base existem 1 milhão de geladeiras
do modelo A em uso e que suas vidas úteis são de 25 anos (período
em que elas devem ser substituídas por uma nova). Todo ano, 50.000
novas residências são construídas em Brakimpur, que demandam novas
geladeiras no mercado. As idades das geladeiras do tipo A (em uso)
estão classificadas de acordo com a Tabela 3-6 a seguir:

Tabela 3-6 – Brakimpur – Idade do estoque de refrigeradores no ano base


Idade (anos) Número (%)
25 200.000 20%
20 200.000 20%
15 150.000 15%
10 150.000 15%
5 150.000 15%
0 150.000 15%
132 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

O modelo B foi desenvolvido como parte de um programa do governo


para reduzir o consumo de energia e competirá com o modelo A nos
anos seguintes, diferenciando-se somente no consumo de energia.
Você deve considerar que quando o novo modelo for lançado:
• 5% a.a. dos usuários espontaneamente substituirão o modelo A
pelo modelo B, independentemente da sua idade atual. Os
refrigeradores substituídos por novos modelos em função da vida
útil não entram no cômputo desses 5%;
• A taxa de substituição dos modelos obsoletos dependerá dos
esforços que você, como um gerente do governo, dedica ao programa
de GLD. Em outras palavras, você pode escolher a opção entre: Plano
A – substituir a cada ano 60% dos modelos antigos por novos modelos
com altos investimentos em campanhas e subsídios; e Plano B –
substituir a cada ano apenas 30% dos modelos antigos por novos
modelos.
Trace um gráfico com a evolução do consumo de energia para uso
final de refrigeração de alimentos de Brakimpur para os próximos
25 anos pelo Plano A, Plano B e sem adoção de plano (substituição
espontânea).
_____________________________

3.5.4. Licitações tecnológicas

Organizações ou instituições de porte, especialmente agências de governo, podem ajudar a


criar um mercado para novos equipamentos eficientes ao realizar grandes compras dos mesmos.
Essas compras, que podem ser licitações públicas (editais), têm a possibilidade de especificar
padrões de desempenho que, por sua vez, estimularão diversos fabricantes a desenvolver e oferecer
o produto para atender a essa demanda.
Esse tipo de iniciativa é importante principalmente quando está relacionada com novas
tecnologias ainda não introduzidas em escala significativa no mercado. Em tais casos, os riscos de
desenvolvimento tecnológico podem ser altos para os fabricantes, caso estes não saibam se haverá
um mercado para os equipamentos produzidos. Esse tipo de iniciativa é uma maneira de assegurar
retornos financeiros para os fabricantes por meio da compra de uma quantidade grande de
equipamentos com determinadas especificações. O Quadro 3.3 apresenta exemplos de Programas
de Licitação de Tecnologias que foram realizados com sucesso em vários países, viabilizando
posteriormente a introdução dos equipamentos mais eficientes no mercado consumidor mais amplo.

Quadro 3.3 – Exemplos de programas de aquisição de tecnologias

Um exemplo de intervenção na política de inovação de eficiência energética é a aquisição, por órgãos


públicos, de tecnologia (teknik upphanding) que foi desenvolvida na Suécia (Harmelink, Nilsson, and
Harmsen 2008; Singh, Culver, and Bitlis 2012).
Esse processo combina incentivos governamentais com pedidos garantidos de grupos de compradores
(tais como associações civis, órgãos do governo) numa licitação competitiva por produtos de eficiência
energética especificada. Os fabricantes são convidados a oferecer modelos de protótipos com certas
propriedades, incluindo uma eficiência energética mínima especificada, e as ofertas são julgadas de acordo
com suas eficiências e o quanto eles satisfazem os outros requisitos. Os ganhadores recebem incentivos e
uma demanda garantida inicialmente suficiente para justificar a produção do novo modelo. Essa estratégia
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 133

remove uma grande parte do risco de se introduzir novos modelos de maior eficiência energética nas suas
linhas produtivas.
Esse processo foi realizado com sucesso em 1991 para os modelos combinados de refrigeradores-
freezers, sendo que o consumo de energia do modelo ganhador foi 30% abaixo do melhor modelo disponível
anteriormente e 50% abaixo da média do mercado. Embora o modelo ganhador tenha entrado no mercado
com uma redução promocional de preço de aproximadamente 50%, após um ano essa redução representou
cerca de 10% e uma outra empresa concorrente ofereceu um novo modelo com uso de energia comparável
ao ganhador e um preço próximo dos outros modelos do mercado (Lewald and Bowie 1993).
O processo de aquisição também foi aplicado na Suécia para janelas com alto desempenho energético,
para reatores eletrônicos de alta frequência para lâmpadas, para monitores de computador que desligam
automaticamente e, mais recentemente, para as máquinas de lavar usadas nas residências. As novas janelas
possuem resistência térmica cerca de três vezes maior quando comparadas com as convencionais e esses
produtos melhorados estão agora entrando tanto no mercado da Europa quanto da América do Norte.
O NUTEK conduziu uma aquisição pública tecnológica de sucesso para monitores de computador de
desligamento automático. Na época, existia um grande potencial de melhoria em eficiência energética em
computadores e em outros equipamentos de escritório que podem atingir um custo incremental muito baixo.
Com os monitores de desligamento automático e outros equipamentos de escritório de eficiência energética
esperava-se ganhar uma grande fatia do mercado em gerações seguintes de tecnologia de equipamentos de
escritório (Dandridge et al. 1993), com economias de energia maiores que 50% comparadas aos modelos de
equipamentos sem desligamento automático. Essas economias tomaram lugar rapidamente por causa do
rápido retorno dos equipamentos eletrônicos. As melhorias são levadas a rápidos avanços tecnológicos nessa
área, deixando pouca necessidade de programas adicionais para acelerar ainda mais a penetração de produtos
eficientes no mercado, uma vez que eles tenham sido introduzidos (Stigh 2007).
Um programa norte-americano similar, o Energy Star, conduzido pela Environmental Protection
Agency (EPA), modificou o mercado de computadores, introduzindo quase 100% dos microcomputadores
com dispositivo de controle de consumo a um custo mínimo. Esse programa é voluntário e certifica
computadores e equipamentos periféricos eficientes com a etiqueta Energy Star. É provável que as melhorias
de eficiência que estão sendo conseguidas em escala mundial não teriam acontecido tão cedo sem o
envolvimento da EPA com os fabricantes de computadores.
A EPA iniciou também outro programa, o Green Lights, programa voluntário de eficiência energética
de iluminação. Centenas de grandes empresas comerciais, representando porcentagem significativa de área
construída comercial nacional, se juntaram ao programa e se comprometeram a realizar melhorias nos seus
sistemas de iluminação, cobrindo 90% de sua área construída. A demanda gerada por esse programa teve um
efeito significante em termos de levar a indústria de equipamentos de iluminação em direção a maiores
eficiências energéticas.
O Programa do Refrigerador Super Eficiente, ou Golden Carrot, nos EUA, é uma variação do
programa de aquisição de tecnologia da Suécia. Nesse caso, grandes CEs criaram um incentivo coletivo, que
foi oferecido aos fabricantes como prêmio em uma competição para desenvolver um refrigerador-freezer
livre de CFC e de alta eficiência. O incentivo foi pago pelas CEs por cada unidade de modelo ganhador
vendida nas suas áreas de serviço. O programa também foi estendido para máquinas de lavar roupa e
aparelhos de ar condicionado. O progresso tecnológico estimulado por esse programa tornou possível atingir
o complemento dos padrões de eficiência energética do refrigerador-freezer em 1998, uma mudança que
provavelmente não teria sido possível sem o programa.
O efeito da aquisição tecnológica e das metodologias desse tipo – technology push – é acelerar os
ganhos de eficiência energética pelo aumento da eficiência final do mercado, que serve para acelerar o
potencial de conservar energia mais cedo no tempo e é particularmente efetivo na combinação com padrões
de desempenho energético. Os padrões eliminam os modelos menos eficientes do mercado, mas seus
impactos na conservação de energia são limitados pelas tecnologias disponíveis atualmente porque elas não
podem melhorar a alta eficiência final do mercado. É possível, entretanto, que sem um mecanismo de
134 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

technology push tal como o processo de aquisição de tecnologia, o desenvolvimento de novos produtos
eficientes não ocorra. A introdução de novos modelos de alta eficiência no mercado leva a um aumento da
eficiência média, sem a imposição de padrões de eficiência energética, mas seus impactos totais no mercado
podem ser ampliados pela presença de padrões progressivos que removem produtos menos eficientes
(Swisher 1994).

3.5.5. Mecanismos financeiros e fiscais

Os bancos nacionais e as agências de fomento podem ter linhas de crédito especiais para
empréstimos dedicados à compra de produtos de uso eficiente de energia. No caso do Brasil, a Finep
– Financiadora de Estudos e Projetos – e o BNDES possuem linhas de crédito especiais para
financiamentos de projetos de conservação de energia, seja para adquirir máquinas e equipamentos
mais eficientes ou para indústrias que desejem desenvolver lâmpadas mais econômicas etc.
Infelizmente, esse tipo de iniciativa ainda é tímida, devido a uma série de fatores que afastam o
interesse do investidor.

3.6. ESTRATÉGIAS DE GERENCIAMENTO DO LADO DA DEMANDA (GLD)

O Gerenciamento do Lado da Demanda (GLD) refere-se ao esforço sistemático para


promover mudanças nos padrões de uso de eletricidade. Essas mudanças incluem alteração de
hábitos, horários de utilização de equipamentos, tempo de uso, mudanças nas características
técnicas dos equipamentos etc. Os programas de GLD são atividades desenvolvidas e
implementadas essencialmente pelas companhias de eletricidade dentro de uma área geográfica,
embora em alguns países as agências de governo também tenham realizado ações de GLD17. No
Quadro 3.4 são apresentados alguns programas internacionais de GLD. Esse tipo de programa
necessita, inicialmente, de uma avaliação da evolução futura do perfil de carga e da quantidade de
energia demandada pelos consumidores da CE. As estratégias de GLD consideram diversas
iniciativas que têm como objetivo mudar a forma da curva de carga ou sua área total (a integral da
curva de carga dá a energia total consumida) ou, ainda, por uma combinação de ambas as iniciativas.
A Figura 3-9 a seguir descreve as estratégias clássicas de GLD. As CEs podem projetar programas
combinando duas ou mais estratégias, modificando os perfis de carga de seus consumidores e/ou a
demanda total de energia. Nas próximas duas seções, são explicados com mais detalhes esses tipos
de ações.
A Figura 3-9A apresenta o caso no qual o objetivo é reduzir o pico da curva de carga. Isso
pode ser atingido com o aumento das tarifas durante as horas de pico, por exemplo. A redução do
pico não implica necessariamente em um decréscimo no consumo de energia, como mostra a Figura
3-9C. É possível mudar certas quantidades de energia consumida durante as horas de pico para
outros períodos e as Figura 3-9B e Figura 3-9E ilustram o objetivo de aumento de vendas de
eletricidade. No primeiro caso, os esforços são feitos direcionando o crescimento de carga durante
períodos específicos e, no segundo caso, promove-se um crescimento geral de carga. A Figura 3-9F
representa uma situação na qual uma CE tem a possibilidade de criar uma curva de carga flexível
que pode acomodar a demanda dos consumidores e suas características operacionais. Por exemplo,
em um sistema hidroelétrico, durante a estação seca, a CE está interessada em reduzir a demanda
de eletricidade, mas durante a estação úmida, ocorre a situação oposta. A Figura 3-9D apresenta o
caso no qual a conservação de energia é o principal objetivo do esforço GLD.

17
Isso acontece principalmente quando a CE é uma companhia estatal.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 135

Figura 3-9 – Estratégias de gerenciamento da curva de carga

Quadro 3.4 – Experiência internacional de GLD

Na década de 1990, as iniciativas norte-americanas começaram a envolver não só programas de


informação geral e programas de desconto (que muitas vezes são criticados por seus altos custos e baixas
taxas de participação), mas também programas direcionados que melhor respondem às necessidades do
consumidor e levam a maiores garantias de conservação de energia (Nadel, Elliott, and Langer 2015). Nos
EUA, se dá mais atenção para as melhorias de eficiência de longo prazo que influenciem os fabricantes de
equipamentos e projetistas de construções visando oferecer produtos de maior eficiência energética.
Na Europa, entretanto, o GLD e outros programas de conservação não se desenvolveram tão
rapidamente na década de 1990, particularmente porque a integração vertical das CEs não era tão comum
como nos EUA. O tipo de companhia elétrica mais comum é a CE de distribuição municipal que compra
eletricidade das grandes companhias elétricas de geração (frequentemente nacionais).

3.6.1. Gerenciamento da carga

Esses programas incluem medidas que objetivam evitar o aumento de capacidade de produção
de eletricidade ou fazer melhor uso daquela existente. A meta é modificar o perfil de carga, podendo
o consumo total de energia permanecer constante ou mesmo crescer. Os seis diagramas da Figura
3-9 ilustram as mudanças que podem ser introduzidas deliberadamente nos perfis de carga das CEs.
Por isso, o gerenciamento de carga não significa economizar o combustível usado nas usinas
térmicas (ou água na usinas hidroelétricas) para gerar eletricidade.
É muito importante conhecer a estrutura do perfil de carga da CE para cada classe
consumidora (industrial, comercial, residencial etc.) e as tecnologias de uso final (iluminação, força
motriz, aquecimento de água) para determinar o programa mais apropriado (substituição de
lâmpadas, motores eficientes, aquecimento solar).
O gerenciamento de carga pode também ser feito por meio de mudanças na estrutura tarifária,
controle direto da carga ou pela introdução de tecnologias específicas. Como visto na Seção 3.3, as
136 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

tarifas especiais para horas de pico podem resultar em corte de pico ou deslocamento de carga. O
controle de carga direto pode ser atingido pela instalação de limitadores de demanda nas
acomodações dos consumidores ou por introduzir contrato e medidores de demandas. Os programas
que introduzem tecnologias específicas podem também mudar o padrão de carga de uma CE dentro
do desejável. Esse é o caso da substituição dos aquecedores elétricos de água na demanda por
equipamentos que utilizam a energia elétrica mais barata do período noturno e acumulam o calor
que é dissipado durante o dia. Esse tipo de equipamento foi largamente difundido em diversos países
europeus.

3.6.2. Investimentos em eficiência de energia

Esse tipo de gerenciamento do lado da demanda leva em consideração os esforços feitos pela
CE para diminuir o consumo unitário de um particular uso final de energia. Essas medidas podem
ser um subconjunto daquelas descritas anteriormente e são essencialmente dirigidas às tecnologias.
Aqui a CE quer reduzir o consumo de energia ou diminuir sua taxa de crescimento e, por isso, esses
programas evitam a expansão da capacidade de produção e economizam combustível (para usinas
térmicas). Existem diversos tipos de programas de companhias elétricas que podem atingir esse
objetivo:

Auditorias e informação

As auditorias de energia nos setores industrial e comercial foram um dos programas mais
usados em diversos países. Elas podem ser executadas como uma atividade de governo ou da CE e
consistem basicamente em visitas e entrevistas com consumidores de energia.
As auditorias são necessárias quando se requer informações detalhadas das tecnologias de uso
final e de como elas são operadas pelos consumidores. Essa informação é, geralmente, usada para
alimentar modelos computacionais que avaliam as oportunidades de economia energética dos
consumidores devido a mudanças na estrutura tarifária, na tecnologia ou no uso do equipamento.
Com maior disseminação das tecnologias de redes e de informação essas tarefas se tornarão mais
sistemáticas.
As auditorias têm um custo relativamente baixo e podem coletar dados relevantes sobre o
comportamento do consumidor, que são úteis para avaliar as campanhas de informação. Sua
implementação exige pessoal qualificado (ou bem treinado) e demanda tempo para execução.
Frequentemente, as auditorias incluem medições e monitoramento das unidades consumidoras e
esses dados quantitativos oferecem maior rigor e precisão para as avaliações que servirão de base
para as ações de GLD.

Incentivos e empréstimos

Os incentivos financeiros vão desde empréstimos com taxas de juros mais baixas e
pagamentos parcelados até subsídios e descontos para a compra de equipamentos mais eficientes.
Os programas que oferecem empréstimos não têm tido tanto sucesso quando comparados com
programas de desconto. Os programas que oferecem descontos para a compra de equipamentos
foram os que tiveram mais sucesso e são recomendados especialmente para os mercados que
apresentam índices de saturação bastante elevados (iluminação e refrigeradores em alguns países).
Embora tenham tido mais sucesso que programas de empréstimos, os programas de desconto ainda
não fornecem para a CE nenhum controle direto sobre o nível de economia de energia ou de
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 137

demanda de pico e esses programas, algumas vezes, possuem altos custos administrativos,
especialmente aqueles direcionados para o setor residencial. Antes de financiar medidas específicas,
deve-se executar, também, uma avaliação detalhada da tecnologia e de como ela será efetivamente
usada pelo consumidor.

Instalação direta da companhia de serviço de energia

Os programas de instalação direta18 são mais caros, mas têm a vantagem de serem mais
simples e oferecerem maior segurança quanto à quantidade de energia conservada, sendo, por isso,
mais garantidos quanto ao retorno econômico para a CE que os programas de incentivos. Esse tipo
de programa é frequentemente implementado por meio de uma Companhia de Serviço Energético
(Energy Services Company – Esco). As Escos operam em alguns países fornecendo ou facilitando
a introdução de medidas de conservação (como instalar novos equipamentos) e recebendo o
pagamento por esse serviço, como o valor da redução verificada na conta de energia do consumidor,
entre outras formas.
Os programas de instalação direta evitam os problemas da falta de informação dos
consumidores e são recomendados para setores tais como residências e escritórios. Tais programas
têm maiores taxas de participação do consumidor que os programas de incentivos.
Uma Esco tem o objetivo de executar atividades de gerenciamento de energia, podendo
funcionar como companhia que comercializa ou arrenda equipamentos de eficiência energética ou
atuando como um órgão de energia, provendo auditorias, negociações tarifárias e serviços de
modernização de instalações elétricas. Muito frequentemente, elas são financiadas por meio das
próprias economias resultantes nas contas de energia de seus clientes.
Existem Escos que pertencem a CEs e que procuram, por meio delas, uma diferenciação de
produtos para suas atividades econômicas, adicionando informação e ajudando o consumidor a
tomar decisões sobre seu suprimento. A Esco tem sido responsável pelo padrão de um mercado de
energia mais competitivo e é um exemplo concreto da possibilidade de melhorar a eficiência do
mercado de energia. Numa situação na qual os ganhos marginais de oferta de eletricidade se tornam
muito pequenos, ocorre a possibilidade de aumentar os lucros por meio de novos serviços de
energia, como já descrito. As Escos também podem ser independentes das companhias elétricas. A
Tabela 3-7 indica as vantagens e as desvantagens de uma Esco para uma CE.

Tabela 3-7 – Vantagens e desvantagens de uma Esco para a CE

Vantagens Desvantagens
Investimentos suspensos Impacto na oferta de negócios
Estabelecer boa imagem e relações públicas Impacto na distribuição de negócios
Assuntos ambientais e propaganda Pode aumentar os custos de capital e de staff
GLD

Fornecedores e vendedores de equipamentos

Um programa de GLD da CE também pode interagir diretamente com os fornecedores de


equipamentos, conforme Quadro 3.5. Essa é a metodologia que vem sendo usada por algumas
18
Chamamos de programas de instalação direta aqueles em que a própria CE distribui os equipamentos aos
consumidores.
138 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

companhias elétricas dos EUA, que dão incentivos financeiros para fabricantes de lâmpadas
compactas fluorescentes (ao invés de dá-las aos consumidores). Outro procedimento que também
tem tido sucesso são os protocolos assinados entre CEs, agências de governo e fabricantes que
permitiram uma redução nos padrões de emissão e melhoraram a eficiência de energia em muitos
aparelhos e automóveis.

Quadro 3.5 – Exemplos de programas GLD de companhias elétricas e de outras entidades

Um exemplo de gerenciamento do lado da demanda de companhia elétrica é o programa de motores


industriais eficientes da British Columbia Hydro, que usou tanto descontos para consumidores quanto para
os vendedores de equipamentos para aumentar a fatia de mercado dos motores eficientes de 4% a 64% em
três anos, ao custo de $0,012/kWh conservado (Nelson and Ternes 1993). A BC Hydro reduziu os
pagamentos dos descontos duas vezes após transformar o mercado e depois aplicou incentivos somente para
níveis ainda mais altos de eficiência de motores. Uma vez que vendedores tendem a estocar uma linha de
motores, essa transformação tem feito dos motores eficientes a norma, tornando desnecessários os gastos
posteriores das companhias elétricas para economias de energia futuras, uma vez que os consumidores já
estão comprando motores eficientes.
O Programa de Refrigeradores Super Eficientes dos EUA, já mencionado, é direcionado
explicitamente para a transformação do mercado. Igualmente, um consórcio de companhias elétricas a gás
dos EUA está dando suporte para a comercialização das bombas de calor a gás, que melhorarão a eficiência
do aquecimento residencial a gás. As companhias elétricas pagarão incentivos diretamente para os
fabricantes selecionados, de forma a reduzir os preços de venda ao consumidor (Eckert 1995).
O Modelo de Padrões de Conservação foi desenvolvido pela Bonneville Power Administration (BPA)
e pelo Northwest Power Planning Council (NWPPC) para encorajar os construtores a melhorar a eficiência
energética das novas casas pré-fabricadas e tornar tais melhorias suficientemente aceitáveis pelos
construtores para atingir a adoção de padrões mais rígidos de desempenho energético em construção na
região. A BPA e o NWPPC colaboraram com os fabricantes de casas pré-fabricadas dando descontos nos
primeiros quatro anos, conseguindo uma adesão de 90% para o padrão voluntário de desempenho energético
em construções. O custo de conservar energia para o programa, de 1983 a 2003, é estimado em $0,03/kWh,
mais aproximadamente $0.005 para custos de implementação (H. Geller and Nadel 1994).
No Reino Unido, o Green Deal é outra das políticas existentes, lançada em outubro de 2012 e
relançada no início de 2013. Essa política emprega um mecanismo de financiamento que reduz os custos
iniciais de medidas de eficiência energética nos setores domésticos, os quais são pagos a longo prazo
proporcionalmente à economia realizada, com uma taxa de juros fixa e determinados de acordo com o
financiamento (Warren 2014).

3.6.3. Avaliação dos programas de GLD

Conforme definem Bronfman et al. (1991), a avaliação é a medida sistemática da operação e


do desempenho dos programas e depende dos objetivos dos mesmos. A avaliação depende de
mensuração objetiva, ao invés das impressões pessoais. As avaliações usam métodos de pesquisa
comuns às ciências sociais e dados técnicos para fornecer resultados confiáveis e válidos. Esse é
um passo importante para qualquer programa de GLD, porque verifica a resposta dos consumidores
para diferentes tipos e níveis de incentivos e informação. Essa informação é necessária para projetar
melhor os programas de GLD e torná-los economicamente atraentes.
Em meados dos anos 1980, o processo de avaliação investigava se os programas poderiam ser
mais eficientes ou efetivos, examinando a confiança e a duração de seus efeitos, baseando-se
principalmente nos seguintes parâmetros:
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 139

• a aceitação do consumidor – investigação das necessidades, preferências, comportamento


e atividades do consumidor por meio de pesquisa de comportamento e utilização de taxa
de penetração das medidas e aceitação do programa;
• os procedimentos de implantação – investigação das atividades envolvidas no
planejamento e na implantação do programa. Nessa avaliação são consideradas, por
exemplo, as formas de aplicação de desconto, o suporte administrativo etc.;
• o desempenho dos equipamentos – investigação da durabilidade e da confiabilidade dos
equipamentos. O processo de avaliação era feito utilizando pesquisas qualitativas de
comportamento e o emprego de técnicas estatísticas.
Já no final da década de 1980, as empresas norte-americanas de energia passaram a
intensificar programas baseados em mecanismos de incentivo para a indução da conservação, sendo
identificados os seguintes aspectos:
• impacto na curva de carga, impacto no consumo (MWh) e demanda (MW);
• período de vida das medidas de conservação e persistência ou não das economias de
energia;
• número de participantes e custos para a empresa de energia e os consumidores
participantes;
• alterações no comportamento do consumidor.
Esses aspectos podem ser mensurados por meio de análises técnicas, análise estatística dos
dados de consumo, de medições localizadas e de pesquisas diretas (entrevistas, auditorias) junto aos
consumidores. Existem dois tipos de avaliação realizados nos Programas de GLD: avaliação do
processo e avaliação de impacto.

Avaliação do processo

A avaliação do processo está relacionada à operação do programa e investiga o seu


desempenho. Compara os objetivos projetados com os realmente ocorridos e quais as percepções
dos agentes envolvidos no programa. Analisa as eventuais barreiras para uma implementação mais
efetiva e quais etapas do programa foram boas. Esse tipo de avaliação é qualitativa, baseada em
entrevistas e tem seu foco nas operações do programa, dando sugestões para a melhoria da operação,
para projetos de novos programas, para as causas dos resultados do programa e também para
documentos históricos de um programa. Esse tipo de avaliação está relacionado com as seguintes
áreas:
• o planejamento do programa;
• a eficiência do material informativo e do marketing;
• o treinamento do pessoal envolvido;
• a administração e o gerenciamento do programa e a comunicação e a cooperação entre as
várias unidades da companhia e os órgãos envolvidos no programa;
• a qualidade dos mecanismos de controle;
• os problemas e as soluções adotadas, os orçamentos e os custos.
140 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Avaliação de impacto

Essa avaliação examina os resultados do programa em termos de energia conservada e


redução de carga. Custos e benefícios, taxas de participação e aceitação também são avaliados. O
procedimento de avaliação é mais quantitativo e pode usar análises estatísticas avançadas. Os
resultados obtidos nesse tipo de avaliação são úteis para novos projetos de programas, carga e
projeções de energia.
A relação custo-benefício dos programas de GLD depende da penetração de mercado que se
atinge, através do tempo e dos custos administrativos e das incertezas associadas à implementação,
conforme é exemplificado no Quadro 3.6:

Quadro 3.6 – Custos e benefícios dos programas de GLD

O progresso técnico e a adoção de tecnologias eficientes pelo mercado consumidor leva a economias
significativas de energia mesmo sem programas GLD. Isso significa que existem consumidores que podem
se beneficiar de programas de incentivos financiados pela companhia elétrica, mas muitos teriam investido
em medidas de eficiência mesmo sem os incentivos, os chamados free riders. Embora os free riders não
imponham custos adicionais à sociedade (exceto custos administrativos), para a companhia elétrica isso
significa que está pagando desnecessariamente tanto os incentivos quanto o custo administrativo do
programa para a sua participação. Avaliações dos programas GLD da América do Norte relatam frações de
free riders de menos de 10% a mais de 50%, dependendo do tipo de programa, e a experiência tem mostrado
que os programas podem ser projetados para evitar um excesso de free riders (Nadel 1990). Quando a
companhia tenta captar as medidas de eficiência de menor custo, que geralmente incluem introdução ou
substituição de novos equipamentos, tende a haver uma alta fração de free riders, o que aumenta
desnecessariamente o custo da companhia elétrica.
Somando-se aos free riders, custos de transações significantes existem para muitas opções de
eficiência energética. Algumas vezes é possível identificar que esses custos são altos e a razão principal pela
qual as tecnologias mais eficientes ainda não são mais adotadas pelos mercados. Em alguns estudos de
potencial técnico, os custos de transação foram implicitamente assumidos como zero. De fato, tais custos e
limitações existem e podem ser medidos e explicitamente incluídos nas análises bottom-up. Entretanto, os
custos de implementação e os limites de penetração variam largamente com a tecnologia e o tipo de programa
aplicado. Os custos de transação podem ser estimados tanto em termos do custo da procura dos
consumidores, do tempo e dos problemas acarretados com a aquisição de produtos mais eficientes e são mais
difíceis de se estimar que os custos administrativos dos programas de eficiência energética. Por exemplo, o
programa para a compra dos refrigeradores/freezers eficientes promovido pelo governo sueco reduziu o uso
de energia nos novos modelos em 30% com um custo de transação estimado de $0,001/kWh. Para os
programas GLD das companhias elétricas dos EUA, os custos administrativos somam em média de 10 a 30%
dos custos diretos com a tecnologia. Esses custos tendem a diminuir com o aumento das taxas de
participação, que reduzem a importância dos custos fixos do programa.
Os custos de transação do consumidor para adquirir produtos eficientes são mais difíceis de estimar
(em torno de 15 a 30% dos custos do equipamento da tecnologia). Isso é significante, mas certamente não
explica o gap mostrado de retorno do pagamento do consumidor devido às taxas de desconto muito altas.
Esse gap deve ser explicado por outras barreiras descritas anteriormente. Supondo que a maioria das medidas
de eficiência energética incluem custos de transação tanto do consumidor como do programa, ou talvez uma
combinação de ambos, elas parecem estar numa estimativa conservadora com um custo adicional de cerca
de 30% do custo da tecnologia, embora muitos programas possam ser implementados com menor custo
administrativo e com pequeno esforço do consumidor. Enquanto os custos de transação são um custo real
que deve ser incluído num planejamento GLD, eles não podem explicar as barreiras para o investimento de
eficiência energética, nem fazê-los indicar que tais barreiras representam custos irredutíveis.
Outros fatores podem, também, induzir o consumidor a conservar energia independentemente de um
programa, por exemplo, como o de mudanças nos preços da energia, mudanças na renda ou na atividade
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 141

econômica. Ao avaliar os resultados do programa deve-se separar essas economias atribuídas aos programas
dos outros fatores.
Os custos dos programas GLD variam amplamente e são maiores que o simples custo direto da
tecnologia, como já discutido. A maioria dos programas relatam custos de energia conservada de $0,02/kWh
ou menos (Nadel 1990; Nadel, Elliott, and Langer 2015). Geralmente, os programas com altas taxas de free
riders envolvem medidas que são menos atraentes e possuem baixo custo de tecnologia. Alguns críticos
apontam a incerteza desses custos e argumentam que os programas GLD são muito mais caros que os
divulgados pelas companhias elétricas (Joskow and Marron 1992). Entretanto, eles ignoram as incertezas
que poderiam reduzir tais custos, tais como os free riders (Bronfman et al. 1991).

3.6.4. Estimando economias dos programas de GLD

Um dado importante na avaliação de qualquer programa de GLD é estimar o montante de


economias potenciais que ele pode gerar (pré-avaliação ou análise ex ante). Uma vez lançado, deve-
se estimar as economias proporcionadas pelo programa (pós-avaliação ou análise ex post).
As análises técnicas (também chamadas de análise de engenharia) são as mais simples e
geralmente as mais baratas para se fazer a avaliação de impacto do programa. Elas envolvem
informações sobre características técnicas dos equipamentos e dados de participação dos
consumidores no programa e a limitação da análise está na não captação das mudanças do
comportamento do consumidor, que é relevante para usos finais relacionados com o aumento de
conforto do usuário. Técnicas de engenharia mais sofisticadas incluem o uso de modelos de
simulação para as estimativas de impactos.
A medição direta para pesquisar a evolução do perfil da curva de carga (antes e após o
programa de GLD) implica em instrumentação e levantamento de dados de consumidores
individuais por uso final ou da residência (ou unidade de consumo) como um todo, permitindo uma
quantificação do uso de eletricidade antes e depois da adoção da medida de conservação ou,
simultaneamente, em participantes e não participantes. Para uma interpretação correta dos dados,
esse processo implica, também, em se manter um grupo de controle. Esse método oferece maior
precisão dos impactos verificados, mas é mais caro e de difícil operacionalização (instalação e
posterior retirada de equipamentos de medição, coleta e análise de um grande número de
informações). Os custos envolvidos limitam o número de equipamentos e medições, sendo
frequente o emprego de técnicas de amostragem típica para a escolha dos consumidores a serem
monitorados.
A análise estatística das contas de energia e dos respectivos dados de consumo é de baixo
custo, permitindo o uso de amostras grandes ou mesmo de todo o universo dos consumidores e é
comumente utilizada no segmento residencial. Uma precisão maior é obtida com a análise dos dados
antes e depois da implantação das medidas de conservação, normalizando-se os efeitos de variações
climáticas, demográficas e econômicas. Esses procedimentos, no entanto, pressupõem um grande
conhecimento do mercado consumidor e boas séries históricas de dados.
A associação de dados de consumo com a posse de equipamentos e informações
socioeconômicas pode ser utilizada para a generalização de estimativas de impactos. Nesse caso, os
dados são obtidos por meio de pesquisa por amostragem, envolvendo participantes e não
participantes dos programas.
142 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

3.6.5. Componentes de custo dos programas de GLD

Custos diretos

Incluem os custos diretamente associados às medidas de eficiência. Num programa de


descontos, por exemplo, ele incluirá a quantidade de capital gasto pela CE para subsidiar a compra
de um novo equipamento.

Custos indiretos

Incluem tanto os custos variáveis quanto os fixos de gerenciamento do programa. Por


exemplo, novamente num programa de desconto, os custos indiretos incluirão a campanha de
informação, salários da equipe envolvida, a avaliação ou o monitoramento dos resultados do
programa. Alguns desses custos são fixos, outros são variáveis, dependendo da duração do
programa.
O custo total do programa é anual e representado em $/kWh (ou $/kW) para uma base de
comparação com os custos da produção da eletricidade. O custo do kWh (ou kW evitado) depende,
também, da vida útil da medida e do fator de desconto usado, além da quantidade estimada de kWh
economizado pelo programa em base anual. Bronfman et al. (1991) indicam que o desempenho de
um programa de conservação da CE depende de dois fatores: participação no programa e economias
líquidas obtidas por meio dele. As economias líquidas são:
Economia líquida do programa = Custos de oferta evitados − Custos totais do programa (3.15)
_____________________________
EXEMPLO 3.11 – Considere os dados da Tabela 3-8 a seguir,
referente a um programa de desconto para lâmpadas eficientes com
duração de cinco anos. Calcule a economia líquida desse programa
para a CE e para o consumidor.

Tabela 3-8 – Simulação de custos totais de um programa de descontos


para lâmpadas eficientes
Itens Valores Outros dados
Número de domicílios 3.000 Custo CE (lâmpada não
eficiente em $/kWh) $0,60
Número de 2 Custo CE (lâmpada eficiente
lâmpadas/domicílio em $/kWh) $0,20
Taxa de participação 80% Consumo lâmpada não
eficiente (kWh/ano) 36,5
Número total de 4.800 Consumo lâmpada eficiente
lâmpadas (kWh/ano) 18,6
Preço de mercado por $50,00 Custo de energia para o
unidade consumidor ($/kWh) $1,20
Desconto (sobre o 40% Taxa de atratividade para a
preço de mercado) CE 12%
Preço final da $30,00
lâmpada (para o Taxa de atratividade para o
consumidor) consumidor 25%
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 143

Custo para a $20,00


companhia
A – Custo fixo do $85.000,00
programa
Projeto e $5.000,00
negociação
Marketing, $80.000,00
propaganda, campanha
etc.
Propaganda $10.000,00
Campanha $50.000,00
Pessoal $15.000,00
alocado para o
programa
Treinamento de $3.000,00
pessoal
Custos $2.000,00
operacionais
(instalação)
B – Custo variável $96.000,00
Custo para a $96.000,00
companhia
CUSTO TOTAL $181.000,00
_____________________________
EXEMPLO 3.12 – Usando os resultados obtidos no EXEMPLO 3.11,
elabore um gráfico indicando a economia líquida do programa para a
CE e para o consumidor, aplicando diferentes valores de descontos
(5%, 10%, 15%,...,40%).
_____________________________
EXEMPLO 3.13 – Ainda usando os resultados obtidos no EXEMPLO
3.11, substitua a participação para 90% com um custo de propaganda
de $70.000. Calcule a economia líquida do programa para a CE.
_____________________________

3.6.6. Estratégias e programas

Há diversos programas de GLD que podem ser conduzidos pelas CEs em parceria com o
governo e empresas. Esses programas envolvem, de modo geral, informações para agentes
diferentes, financiamento direto para equipamentos, instalação de equipamentos, financiamento
indireto de instalações, desenvolvimento e implementação de leis mandatórias etc. As
possibilidades de elaboração de estratégias são, na prática, ilimitadas. A lista a seguir é um exemplo
de uma estratégia de implementação de eficiência de energia contemplando dez programas GLD:
1. Um programa de assistência a projetos para novas construções comerciais, no qual um
centro ou uma associação daria assistência técnica para arquitetos e engenheiros projetando
novas construções (Projeto);
2. Uma lei energética mandatória para novas construções comerciais (Código de Obras);
144 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

3. Auditorias industriais, oferecidas por um Centro de Conservação de Energia (Auditorias);


4. Descontos para melhorias de eficiência industrial (Eficiência Industrial);
5. Um programa de etiquetagem de refrigeradores no qual todos os refrigeradores seriam
testados nos seus consumos de energia e uma etiqueta com essa informação seria colada
em cada modelo vendido (Etiquetagem);
6. Padrões de eficiência de refrigerador nos quais o uso de eletricidade de todos os novos
refrigeradores necessitaria ser abaixo de um valor específico (Padronização);
7. Descontos para melhorias de eficiência no setor comercial (Eficiência Comercial);
8. Um programa de instalação de iluminação comercial, com instalação grátis de
equipamentos de iluminação de alta eficiência (Iluminação Comercial);
9. Um programa de incentivo e assistência técnica para câmaras frigoríficas (Refrigeração
Comercial);
10. Um programa de gerenciamento de energia industrial, no qual uma agência
patrocinadora de treinamento para gerentes industriais garanta que o dinheiro economizado
em melhorias de eficiência pagará o salário do gerente. Se o valor das economias de energia
não pagar o salário do gerente, a agência patrocinadora supre a diferença (Gerência de
Carga).
_____________________________
EXEMPLO 3.14 – Este exercício trata de estratégias de
implementação de eficiência de energia e programas GLD. Sugerimos
uma planilha de cálculo para organizar e comparar as informações
de cada estratégia/programa listado no item 3.6.6. Como exemplo,
há uma planilha de trabalho com alguns dados iniciais no endereço
da internet19. A ideia é que o leitor adapte esses dados o mais
próximo da realidade, inserindo e interpretando as informações
necessárias.

a) Estrutura da planilha de cálculo:

As linhas indicam os programas/estratégias sugeridos no item


3.6.6. Utilize taxas diferentes para os programas. As colunas são:
(A) Número do programa;
(B) Nome de cada programa;
(C) População eleita – indica a população envolvida em número
de pessoas, companhias etc. O mercado potencial máximo para
cada programa, considerando o período total de dez anos;
(D) Unidade – indica a unidade para expressar a população eleita
(descritiva);
(E) Consumo anual em MWh/unidade – indica o consumo anual de
cada unidade da população;
(F) Taxa de participação – indica a porcentagem da população
que participará do programa;

19
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 145

(G) Número de participantes do programa – deve ser calculado e


indica o número efetivo de unidades participantes. A
fórmula é: G=(C×F);
(H) Economias devido ao programa (%) – percentual do consumo
que será economizado pelos que adotarem o programa. Essa
informação indica as economias de cada consumidor;
(I) Potencial anual de economias MWh por unidade – a quantidade
de energia que será conservada por unidade que participe
do programa. A fórmula é: I=(E×H);
(J) Potencial anual de economias MWh – considerando o número
estimado de unidades participantes e as economias estimadas
por unidade, a planilha de cálculo calcula as economias
potenciais no período de dez anos. Lembre-se de que estamos
simplificando as análises, considerando o consumo médio
anual. A fórmula é J=(G×I)×10–3;
(K) Relação pico/demanda média – essa coluna é um dado de
entrada e deve refletir a relação entre a energia consumida
no pico e a demanda média;
(L) Economias anuais MW – essa coluna deve calcular as economias
de pico anuais em dez anos como resultado da medida adotada,
que possui relação direta com a nova capacidade de produção.
A fórmula é L=(J×K)×103/(24×365);
(M) Custos totais do programa para a CE/governo por unidade de
economias atingidas durante dez anos – o custo estimado
para cada programa, para o período de dez anos;
(N) Custo total anual do programa – o custo anual por unidade
multiplicado pelo número de unidades. A fórmula é
N=(G×M)/10;
(O) Custo em $ por MW evitado – essa coluna deve calcular o
custo para cada MW conservado. A fórmula é G×N/L;
(P) Vida do programa em ano – vida útil de cada medida. Note
que a vida da medida não é necessariamente igual à vida
útil do programa/política. Isso é importante para o cálculo
da coluna Q.
(Q) Custo $/MWh – essa coluna deve conter o custo por MWh
considerando a taxa de desconto e a vida útil do programa.
Lembre-se de que o programa pode ter um período mais curto
de vida útil que a disponível e isso deve ser considerado
na análise financeira.

b) Questões

Quais são os programas/políticas com as maiores economias de


MWh e MW? Quais são os programas/políticas com as menores economias?
146 Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída

Discuta algumas razões que possam explicar as diferenças


observadas.
Quais programas/políticas possuem os mais baixos custos por
kWh? Quais programas/políticas possuem os custos mais altos por
kWh? Como os custos desses programas e políticas podem ser
comparados com o custo por kWh de eletricidade de uma nova usina a
gás ou a carvão?
Calcule as economias máximas de MWh e MW que poderiam ser
atingidas se todos os dez programas e políticas fossem
implementados.
Se você tivesse que fazer uma opção por dois programas da lista,
considerando as barreiras, os problemas e as vantagens dos
programas e das políticas expostos neste capítulo, qual seria sua
decisão? Por quê?
Considere um aumento no preço da energia de 40%. Como isso
poderia afetar os custos e os resultados de cada programa? Levante
algumas hipóteses, descreva-as e faça as mudanças necessárias na
planilha de cálculo.
_____________________________

(Reddy 1991) (H. S. Geller 1994) (Scientific American 1990) (Howarth and Andersson 1993)
(Orlando 1991) (Brun 1989) (Horlock 1987) (Hu 1985) (Marecki 1988) (Ohta 1994) (Payne
1991) (Ahmed 1994) (Levine et al. 1994) (GOV.UK 2018) (Green Deal Initiative 2017)
Programas de Eficiência Energética, GLD e Geração Distribuída 147

3.7. REFERÊNCI AS E LEITURAS SUGERIDAS

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Bajay, Sergio Valdir, Gilberto de Martino Jannuzzi, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro
Vilela, José Angelo Paccola, and Rodolfo Gomes. 2018. Geração Distribuída e Eficiência
Energética: Reflexões Para o Setor Elétrico de Hoje e Do Futuro. Campinas: IEI Brasil.
Bronfman, B., G. Fitzpatrick, E. Hicks, E. Hirst, M. Hoffman, K. Keating, H. Michaels, et al.
1991. Handbook of Evaluation of Utility DSM Programs. Edited by E. Hirst and J. Reed.
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Buhl Pedersen, P. 1992. “Engineering Analysis Concerning Energy Efficiency Standards for
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150 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

CAPÍTULO 4

INTEGRANDO AS OPÇÕES DO LADO DA OFERTA E DA DEMANDA

4.1. INTRODUÇÃO

Como mencionado no Capítulo 1, o Planejamento Integrado de Recursos (PIR) procura trazer


conjuntamente, nas mesmas bases de comparação, programas de eficiência de energia e de
gerenciamento de opções para a oferta de eletricidade, incluindo a produção independente. Hoje em
dia, e cada vez mais acentuadamente, os critérios de comparação adotam uma perspectiva social e
consideram alguns custos ambientais.
Este capítulo explica como o PIR pode ser usado para trazer novos elementos de programas
de eficiência de energia e restrições ambientais no planejamento dos serviços de eletricidade.

4.2. FUNDAMENTOS DO PLANEJAMENTO DA OFERTA DE ELETRICIDADE

O modelo tradicional de planejamento elétrico inclui:


• Projeção do crescimento da demanda;
• Planejamento da expansão para determinar as fontes existentes e quando elas serão
necessárias;
• Análise do custo de produção para hierarquizar as opções de energia;
• Cálculo das tarifas e arrecadação necessária com as vendas de eletricidade.
A meta principal do planejamento tradicional de energia é satisfazer a demanda projetada pelo
menor preço de fornecimento. Essa meta é modificada no PIR para satisfazer à demanda de serviços
de energia, que permite a inclusão do GLD e de programas de eficiência de energia, conforme
discutido no Capítulo 3. Para isso, a análise do planejamento da expansão é também utilizada para
determinar um plano de menor custo para aumentar a capacidade do fornecimento de energia. O
critério principal do custo no planejamento de expansão é o da renda esperada com as vendas de
eletricidade, que deve ser suficiente para cobrir todos os custos dos serviços e dar um retorno
aceitável aos investidores. Além do critério de custos, outros parâmetros podem ser utilizados para
o PIR e esse processo é ilustrado neste capítulo. Os investimentos futuros são contabilizados em
termos de seu valor presente para refletir o valor da moeda no tempo e são comparados de acordo
com os custos marginais de longo prazo.
Como os recursos energéticos convencionais estão disponíveis em diferentes blocos de
energia, os custos marginais são usualmente normalizados para comparação em termos de $/kWh
(custo marginal da energia) ou em $/kW (custo marginal de capacidade). A razão entre esses dois
valores depende de como o recurso é utilizado ao longo do tempo, se a plena carga ou não. Essa
razão é chamada fator de capacidade, também relacionado com o fator de carga1, que mede a
variabilidade da demanda e pode ser estimada a partir da curva de duração da carga. Todos esses
parâmetros são importantes para o PIR.
Conhecendo os custos marginais como uma função do fator de capacidade ou de carga, o
planejador pode selecionar as opções potenciais para determinar o plano de expansão de custo
mínimo que atenda à demanda projetada. Esse plano deve ser periodicamente revisto e atualizado à

1
Fator de capacidade e fator de carga – ver itens 4.4.3 e 4.4.4, respectivamente.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 151

medida que mais informações de crescimento e recursos se tornem possíveis. Além dos recursos
convencionais das fontes de potência térmica e hidráulica, o processo PIR descrito neste capítulo
pode incluir opções tais como GLD (Gestão do Lado da Demanda), cogeração de calor e potência
e fontes renováveis e intermitentes (solar, eólica, biomassas etc.). A comparação preliminar entre
essas opções é geralmente feita com base no custo marginal da energia de longo prazo, embora
outras medidas sejam também utilizadas.
Enquanto o custo marginal de longo prazo for o critério importante no planejamento de novos
recursos, a escolha de cada recurso existente que irá operar em um dado tempo dependerá do custo
marginal de curto prazo, que depende de custos de combustível, operação, manutenção etc. A
estratégia tradicional do despacho econômico classifica as fontes pelo custo variável para
determinar a ordem de despacho. A fonte mais cara operando num dado momento é chamada de
fonte marginal e ela varia conforme a carga do sistema. Outra maneira de ordenar é o despacho
ambiental, que considera as emissões das fontes existentes e ordena de acordo com uma combinação
de custos e taxas de emissão de poluentes. No PIR, os impactos ambientais podem ser utilizados
para classificar as novas fontes de recursos energéticos de acordo com o custo da emissão evitada
ou adicionando impostos, de acordo com o grau de poluentes da fonte, aos custos de produção de
eletricidade.

4.3. CRITÉRIOS PARA PL ANEJAMENTO DE CUSTO MÍNIMO

No âmbito do PIR, o critério fundamental de avaliação é o fornecimento de serviços de


energia a um custo mínimo, incluindo custos de geração e distribuição de eletricidade, opções do
lado da demanda, emissões ambientais etc. Toda combinação de recursos alternativos deve ser
avaliada por meio do mesmo critério do PIR e cada uma delas deve fornecer, pelo menos, o mesmo
nível de serviços de energia e segurança de oferta, como no cenário de referência definido no
Capítulo 2.
Esse critério pode ser visto como um problema de otimização e a solução pode envolver
modelos de otimização formais ou uma série de técnicas mais simples. Além de minimizar o custo
das ofertas de eletricidade, o PIR pode contabilizar os custos sociais e ambientais da produção de
eletricidade. Pode, também, incluir a possibilidade de reduzir os custos e as emissões via GLD ou
outras opções de eficiência energética ou de redução de emissões (troca de energéticos, por
exemplo). Isso, é claro, se todos os custos são passíveis de quantificação. A função objetivo é
minimizar a seguinte relação:
C ( D) + CCEP ( E,R,D ) + C R ( R) (4.1)

Sujeita a:
E + D = ES (4.2)

Onde C(D) é o custo dos programas GLD; CCEP(E,R,D) é o custo de controle de emissões de
poluentes (depende da energia ofertada E, da quantidade de redução de emissão de poluentes R e
dos programas de GLD); CR(R) é o custo das reduções de emissão de poluentes; D é a quantia de
eletricidade conservada por meio de GLD e outras medidas; e ES é o nível desejado de serviços de
energia.
A restrição nesse problema de minimização de custo – Eq. (4.2) – é que a mesma quantidade
total de serviços de energia deve ser atingida produzindo energia elétrica ou economizando-a via
GLD ou outros programas de eficiência. Esse critério não significa que os serviços de energia sejam
constantes no tempo; de fato, pode-se esperar que eles cresçam. Isso não significa que o cenário de
referência é uma tendência fixa que é conhecida com certeza. Uma visão mais realista do cenário
152 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

de referência é que este pode ser composto por diferentes cenários bases, por exemplo, refletindo
diferentes taxas de crescimento socioeconômico futuro. O critério do PIR requer simplesmente que,
para cada um dos cenários de referência de crescimento dos serviços de energia, o nível de serviço
de energia seja definido. A demanda por serviço de energia deve ser satisfeita, conforme visto no
Capítulo 2, segundo os vários cenários energéticos propostos.
Usando esse critério, pode-se descrever e avaliar as alternativas do lado da demanda e do lado
da oferta de eletricidade por meio de cenários energéticos. Tendo já analisado as opções GLD e de
eficiência de energia nos Capítulos 2 e 3, a próxima questão é avaliar os custos das opções do lado
da oferta, incluindo fontes não convencionais. Pode-se, então, estimar os impactos ambientais das
diferentes opções e, se possível, seus efeitos nos custos de oferta. Finalmente, classificam-se as
opções de acordo com o custo e constroem-se os cenários integrados de recursos. Esses cenários
combinam opções do lado da oferta e da demanda, junto da implementação de programas e planos
de operação para atingir um plano integrado de custo mínimo ou um conjunto de planos, baseados
na análise de sensibilidade de hipóteses fundamentais.

4.4. CUSTOS DE PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE

A meta básica da análise econômica de oferta de eletricidade é estimar os custos de produção


de eletricidade tomando como base a combinação de opções de geração disponíveis. O PIR não é o
único método que procura minimizar os custos, mas ele introduz novas opções tais como GLD,
troca de energéticos e oferta de produtores independentes (incluindo geração distribuída) que não
fazem parte do processo do planejamento tradicional do setor elétrico.

4.4.1. Rendimentos requeridos da companhia elétrica 2

O procedimento padrão para contabilizar o capital e analisar os custos para as companhias


elétricas é o método de rendimentos líquidos requeridos. Rendimentos requeridos são aqueles que
fornecem um retorno mínimo aceitável para os investidores. Os rendimentos requeridos
compreendem todos os custos de serviços da companhia elétrica incluindo combustíveis quando se
tratar de termoelétricas, despesas de manutenção e operação, depreciação de capital, taxas e juros,
custos de GLD adicionais etc.
Os custos de um determinado plano de fornecimento de serviço de energia são projetados para
um período de planejamento, que deve ser, no mínimo, tão longo quanto a opção de investimento
de maior vida útil, e descontados para obter um valor presente, que pode ser comparado por meio
de diferentes cenários de investimentos. O critério básico do planejamento é minimizar o valor
presente dos rendimentos desejados da companhia elétrica. Um planejamento convencional aplica
esse critério somente para opções de oferta, enquanto o PIR inclui opções GLD e custos ambientais.
O valor presente dos rendimentos requeridos é o critério utilizado para escolher entre
alternativas que fornecem um nível equivalente de serviços. Tradicionalmente, isso tem significado
determinada garantia de energia elétrica a ser ofertada com uma determinada confiabilidade. Em
um panorama PIR, a definição dos serviços é expandida para incluir serviços de energia a um nível
de uso final, que segue a consideração das opções de GLD. A função a ser minimizada é, então:

2
Mais recentemente tem-se utilizado a expressão “recursos energéticos distribuídos - REDs”. Estão incluídos
nos REDs não só as iniciativas em eficiência energética e GLD, como também a geração distribuída, o
armazenamento de energia e a integração com o transporte elétrico. Para uma análise mais completa sobre
os efeitos desses fatores nas receitas das concessionárias que produzem e distribuem eletricidade de modo
centralizado, são apresentadas algumas sugestões de leituras ao final deste capítulo.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 153

n
R (t )
VP ( R ) = R0 +  (4.3)
t =1 (1 + r )
t

Onde VP(R) é o valor presente dos requisitos de faturamento (vendas de eletricidade); R0 é o


rendimento requerido para remunerar os gastos no ano 0; R(t) é o rendimento requerido pelos gastos
incorridos no ano t; r é a taxa de desconto; e n é o número de anos no período de planejamento. Os
rendimentos requeridos de um dado ano são a somatória dos custos de capital (investimentos),
gastos operacionais totais e taxas:
R(t ) = I (t ) + Ex(t ) + T (t ) (4.4)

Onde I(t) é o investimento de capital no ano t; Ex(t) são os gastos operacionais totais no ano
t; e T(t) são as taxas no ano t. Os investimentos de capital3 incluem os custos de capital dos
equipamentos de geração (Cg), transmissão (Ct) e distribuição (Cd). Logo:
I (t ) = C g (t ) + Ct (t ) + Cd (t ) (4.5)

Os gastos operacionais4 incluem os custos de combustível e os de manutenção e operação,


tanto fixos quanto variáveis. Os custos variáveis, assim como os custos de combustível, dependem
do montante de energia gerada em uma dada usina. Os custos fixos, por outro lado, geralmente são
expressos em valores anuais constantes, independentes da quantidade de energia gerada. Portanto:
Ex(t ) = Ccomb (t ) + Cvar (t ) + C fixo (t ) (4.6)

Onde Ccomb(t) são os gastos de combustível no ano t; Cvar(t) são os custos de manutenção e
operação variáveis no ano t; Cfixo(t) são os custos de manutenção e operação fixos no ano t. Neste
capítulo, por questão de simplificação, os valores do capital investido I(t) já incluem os efeitos das
taxas T(t). Portanto, a Eq. (4.3) pode ser reescrita como:
n I (t ) + Ccomb (t ) + C var (t ) + C fixo (t )
VP( R ) = R0 +  (4.7)
t =1 (1 + r ) t

_____________________________
EXEMPLO 4.1 – Um plano de expansão para o período 2015-2025 em
uma PCH inclui investimentos em aumento de capacidade instalada de
$7 milhões em 2017, $2 milhões em 2019 e $1 milhão em 2020. O custo
anual de operação durante o período é constante e de R$1 milhão.
Qual é o valor presente dos rendimentos requeridos para o plano?
Use uma taxa de desconto anual de 6% ao ano e suponha R0=0.

Solução
Inicialmente somam-se as componentes dos custos para encontrar
o rendimento anual requerido. Depois toma-se o valor presente (6%
ao ano) de cada valor anual. A soma da série dos valores presentes
anuais é o valor presente dos rendimentos requeridos (ver
resultados na Tabela 4-1).
3
É comum adotar o termo CAPEX (Capital Expenditure) para as despesas ou o investimento em bens de capital de
uma empresa.
4
É comum adotar o termo OPEX (Operational Expenditure) para os custos de operação e manutenção dos ativos físicos
de uma empresa.
154 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Tabela 4-1 – Resultados – EXEMPLO 4.1

Custo de Custo de Custo de Custo de


Ano VP(R) Ano VP(R)
capital operação capital operação
2015 0 1 1,00 2021 1 1 0,70
2016 0 1 0,94 2022 0 1 0,67
2017 7 1 7,12 2023 0 1 0,63
2018 0 1 0,84 2024 0 1 0,59
2019 2 1 2,38 2025 0 1 0,56
2020 0 1 1,49 Total VP(R) 16,92

O valor presente dos rendimentos requeridos por esse plano é


de $16,92 milhões para fazer face aos dispêndios durante o período
de 2015 a 2020.
_____________________________

4.4.2. Custos Marginais de Expansão e de Operação (CME e CMO)

Os custos marginais da companhia elétrica fornecem a base econômica de comparação contra


a qual um programa de GLD ou um recurso de oferta independente deve ser avaliado. O custo
marginal de energia é composto de dois termos: o CME (Custo Marginal de Expansão) e o CMO
(Custo Marginal de Operação). O CME é o acréscimo de custo para suprir um aumento unitário na
capacidade de produção de energia considerando novos investimentos, ou seja, representa a
expectativa de custo da expansão do parque de geração de energia elétrica. Ao passo que o CMO é
definido como o acréscimo de custo para suprir um aumento unitário da energia consumida em um
dado período de tempo utilizando-se da estrutura de geração instalada. O equilíbrio, na hipótese de
expansão ótima e contínua, é expresso normalmente pela igualdade entre o custo marginal de
expansão ou de longo prazo e o custo marginal de operação ou de curto prazo (ver Figura 1-11).

Figura 4-1 – Curvas de custos (CM, CMO, CME e Custo Mínimo)

Uma análise de minimização de custo, segundo as Equações (1.7) e (4.2), mostra que a
combinação a custo mínimo de diferentes recursos é aquela em que o custo marginal de cada recurso
é o mesmo. À medida que a oferta total aumenta, o custo marginal também aumenta e indica o
quanto de cada recurso deveria ser incluído no conjunto de custo mínimo. Na prática, uma vez que
a hipótese de expansão ótima e contínua raramente é atingida e onde os recursos de GLD e oferta
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 155

de energia estão disponíveis em quantidades finitas, a combinação de custo mínimo pode ser obtida
pela classificação dos recursos disponíveis segundo seus custos marginais e pela seleção daqueles
com os custos marginais menores. Esse processo continua até que a oferta total satisfaça a demanda
projetada.
De modo geral, o custo marginal de expansão (longo prazo) é reportado pelo seu valor
presente5 e expresso em $/kW, ao passo que o custo marginal de operação (curto prazo) é reportado
anualmente e expresso em $/kWh. Assim, o custo marginal6 é calculado com a seguinte expressão:
CMO  kWh
CM = CME  kW + (4.8)
FRC
Onde kW é o acréscimo na capacidade de produção; kWh é o incremento de produção de
energia; e FRC é o fator de recuperação de capital:
r (1 + r ) n
FRC = (4.9)
(1 + r ) n − 1

Onde n é o tempo de amortização do investimento e r é a taxa de desconto. Note que, ao


dividir o segundo termo da Eq. (4.8) pelo FRC, os custos anuais resultam no valor presente do custo
de operação. Para obter o CME anualizado, quando conveniente, basta multiplicá-lo pelo FRC.
Os termos de expansão e de operação na Eq. (4.8) podem estar relacionados às mudanças
incrementais na demanda elétrica, seja por meio de aumentos de serviços de energia ou na
diminuição dos programas de eficiência de energia ou, ainda, o gerenciamento de carga. Como foi
explicado nos Capítulos 2 e 3, o efeito de tais programas varia de acordo com a tecnologia usada e
com o perfil de carga do uso final de energia.
O incremento marginal na capacidade é o efeito sobre a demanda de pico que ocorre somente
durante certas horas do ano e que leva à necessidade de aumento da capacidade instalada. O valor
de kW depende, portanto, do perfil de horário da demanda do uso final e do grau de coincidência
com a demanda de pico da companhia elétrica. Se um programa tem seu efeito total durante as horas
de demanda de pico, o kW é igual à redução de demanda máxima do programa. De outro modo,
o kW seria um valor menor. Um caso extremo seria aquele no qual o programa não tivesse efeito
durante as horas de pico e o kW, então, seria zero.
Os termos de custo na Eq. (4.8) podem ser relacionados às definições de custos observando
que todos os custos de investimentos, incluindo os efeitos das taxas, são parte do custo de expansão
da capacidade, junto dos custos operacionais fixos. Então, o I(t) e Cfixo(t) são componentes do
CME7. As despesas remanescentes dos combustíveis e dos custos operacionais variáveis são
proporcionais à energia produzida. Então, Ccomb(t) e Cvar(t) são componentes do CMO. Assim, tem-
se que:
CME  f I (t ),C fixo (t ),... e CMO  f Ccomb (t ),Cvar (t ),... (4.10)

Na prática, cada um dos termos da Eq. (4.10) é avaliado para cada hora do ano e os resultados
são somados para estimar o custo marginal de operação. Os custos marginais de operação horários,
5
O CME, em alguns fluxos de caixa, pode ser reportado anualmente.
6
Na Eq. (4.8), o termo CM (Custo Marginal) está expresso em $. Esse valor pode ser normalizado e reportado em $/kW
ou $/kWh – ver mais adiante.
7
Note que os custos de capital e fixos de operação são parte do custo marginal de expansão de uma oferta que ainda
não foi construída. De certo modo, esse é um custo variável com relação aos níveis futuros de oferta. Uma vez que a
capacidade é construída, esses custos fixos estão embutidos e não são a maior parte dos custos marginais da companhia
elétrica. Note, ainda, que os custos fixos são anualizados e, para somar ao custo de investimento (em valor presente),
seus valores devem ser reportados também para o valor presente.
156 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

CMO(h), dependem das fontes de oferta utilizadas num dado tempo. Esses valores podem ser
derivados diretamente dos modelos de custo da produção e podem ser ajustados para contabilizar
as perdas de transmissão e distribuição:
1 8760 Cenergia (h)
CMO(h) = 
8760 h =1 kWh
(4.11)

Onde:
'

Cenergia (h) = Ccomb (h) + Cvar
'

(h)  E ger (h) (4.12)

Em que Cenergia(h) é o custo da energia na hora h; C'comb(h) é o custo marginal do combustível


na hora h sem contabilizar as perdas do sistema; C'var(h) é o custo marginal variável na hora h sem
as perdas do sistema; e Eger(h) é a energia gerada na hora h. Como já mencionado, esses valores
podem ser ajustados para contabilizar as perdas de transmissão e distribuição (T&D). Assim, tem-
se que:

CMO(h) =
'
1 8760 Ccomb


(h) + C var
'
( h) L ( h)  (4.13)
8760 h =1 kWh[1 − Fpe (h)]

Onde:
E p ( h) E ger (h) − L(h) L ( h)
Fpe (h) = = = 1− (4.14)
E ger (h) E ger (h) E ger (h)

Em que Fpe(h) é a fração de perda de energia horária; L(h) é a carga total horária vendida;
Ep(h) são as perdas de transmissão e distribuição (T&D) horárias.
Os termos de custo na Eq. (4.10) são geralmente definidos por modelos de custo de produção
que determinam a capacidade requerida do sistema e minimizam os custos operacionais variáveis
(incluindo combustível) por um programa de despacho otimizado das várias fontes de geração,
sujeito a um determinado critério de confiabilidade.
Um modo usual para estabelecer limites de confiabilidade é a probabilidade de perda de carga 8
máxima anual (PPC), que pode derivar de modelos de custo da produção. Um critério mais simples
para a segurança da oferta é meramente o excesso da capacidade de oferta ou margem de reserva,
que pode ser estimada sem uma análise complexa envolvendo modelos de custo da produção. Uma
maneira usual de determinar a confiabilidade do sistema de distribuição é usar dois critérios de
segurança contingente (Crane and Roy 1992). O critério normal é que as cargas planejadas podem
ser atingidas sem sobrecarregar nenhum equipamento no sistema e o critério de emergência é que a
falha de qualquer equipamento pode ser compensada por outros equipamentos sem exceder suas
capacidades de emergência por um tempo limitado.
Uma forma de avaliar o Custo Marginal de Expansão9 (CME) de um sistema elétrico é por
meio da média dos custos de expansão das diversas alternativas ponderados pela previsão de
expansão, conforme a Eq. (4.15) a seguir:

8
PPC (Probabilidade de Perda de Carga ou LOLP – Loss Of Load Probability). Existem outros índices que medem a
confiabilidade dos sistemas de fornecimento de energia: LOLF (Loss of Load Frequency ou Frequência de Perda de
Carga), LOLD (Loss of Load Duration ou Duração Média de Perda de Carga), EPNS (Expected Power Not Suplied ou
Valor Esperado da Potência Não Suprida) e EENS (Expected Energy Not Suplied ou Valor Esperado da Energia Não
Suprida).
9
Essa equação é aceita nas metodologias do MME (Ministério de Minas e Energia – Brasil).
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 157

n
 kWi  CME i
CME sistema = i =1
n (4.15)
 kWi
i =1

Onde kWi é a expansão de capacidade prevista para a alternativa i (fonte i); CMEi é o custo
marginal de expansão da fonte i; e n é o número de fontes alternativas.
_____________________________
EXEMPLO 4.2 – Calcule o Custo Marginal de Operação (CMO) para
uma usina a carvão com os dados da Tabela 4-2.

Tabela 4-2 – Dados – EXEMPLO 4.2

Poder Custo do Custo


Período Capacidade
Usina calorífico combustível variável
de despacho (MW)
(GJ/MWh) ($/GJ) ($/kWh)
Hidroelétrica s/d 0 0,020 carga de base 100
Gás 12 2 0,016 carga 200
intermediária
Carvão 10 1 0,020 carga de base 200
Turbina 15 2 0,023 carga de pico 50
combustível
Eólica s/d 0 0,010 intermitente 50

Solução
Para o caso do carvão, o custo marginal do combustível e o
custo marginal variável são, respectivamente:
10  1
'
Ccomb = = 0,01$ / kWh (4.16)
1000
E:
'
Cvar = 0,02$ / kWh  CMO = 0,01 + 0,02 = 0,03$ / kWh (4.17)

_____________________________
EXEMPLO 4.3 – Calcular os valores do CMO para as outras fontes
do EXEMPLO 4.2 e o CMOex-ante sistema elétrico. Admitir que as usinas
que operam na ponta funcionam 1.200 horas/ano; as usinas
intermediárias operam, ainda, 3.000 horas/ano adicionais; as usinas
que operam na base funcionam 8.760 horas/ano e as intermitentes
operam 800 horas durante cada um dos três períodos de despacho.
Admitir que para o cálculo do CMO do sistema elétrico serão
desconsideradas as restrições de transmissão, o custo de déficit e
que todas as fontes são necessárias para atender à demanda. Lembre-
se de que a fonte marginal durante um período de despacho é aquela
cujo custo de energia é maior.
_____________________________
EXEMPLO 4.4 – Calcular o CME total e seu valor anualizado para
uma usina eólica de geração de eletricidade a partir dos dados da
158 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Tabela 4-3 a seguir. O tempo de construção indica o tempo para se


construir a planta e supõe-se que o custo total é distribuído
uniformemente durante esse período. Use uma taxa de desconto de 6%
ao ano e suponha que qualquer planta seria construída para começar
a operar no mesmo ano (cinco anos a partir do presente). Em outras
palavras, a usina eólica começa a ser construída dois anos antes
da conclusão da usina a carvão, por exemplo.

Tabela 4-3 – Dados – EXEMPLO 4.4

Capacidade Vida Construção Custo do capital Custo fixo Período


Usina
(MW) útil (anos) ($ milhões) ($ milhões) de despacho
Hidro 100 50 2 70 0,5 base
Gás 200 30 3 275 4,5 intermediário
Carvão 200 30 5 300 5,0 base
Turbina 50 20 1 25 1,3 pico
combustível
Eólica 50 20 2 70 1,2 intermitente

Solução
A usina eólica, assim como as demais, tem a construção encerrada
no final do ano 5 e inicia-se a operação no início do ano 6.
Calculam-se os valores do CME como valores presentes no ano 5. Para
a usina eólica, o tempo de construção é de dois anos, assim, a
metade do investimento ($35 milhões) incorre durante um ano antes
da operação (ano 4) e a outra metade no ano 5. O valor presente no
ano 0 é 35/(1,06)4 + 35/(1,06)5 = $53,88 milhões. Note que, por causa
do tempo de construção, o custo total no ano das usinas entrarem
em operação é mais alto que o custo do capital inicial. O FRC para
um tempo de amortização de 20 anos é:

0,06 (1,06 ) 20
FRC = = 0,087 (4.18)
(1,06 ) 20 − 1
O valor presente do custo fixo é o custo fixo anual dividido
pelo FRC, ou seja, 1,2/0,087 = $13,76 milhões. Esse valor presente
está temporalmente no final do ano 5, pois a usina começa a operação
no início do ano 6. O CME total é obtido transportando o custo fixo
anual para o ano 0 e somando com o valor presente do investimento
– portanto, 10,29 + 53,88 = 64,16 milhões – e, então, dividindo-o
pela capacidade da usina, ou seja, 1,28 $/MW. Para obter o valor
do CME anualizado, a partir do ano 0 (lembre-se que a usina entra
em operação no ano 6), multiplica-se pela FRC, ou seja, CME =
1283,25 × 0,087 = 111,87 $/kW por ano.
_____________________________
EXEMPLO 4.5 – Calcular o CME e seu valor anualizado para as
outras fontes da Tabela 4-3 e o CME do sistema elétrico (consultar
solução nas planilhas disponíveis no endereço da internet10).
_____________________________
10
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 159

O Custo Marginal de Expansão (CME) depende do valor dos novos investimentos necessários
em geração e transmissão da expansão da capacidade. O roteiro dos investimentos planejados pode
ser tomado do plano de expansão da companhia elétrica, que dá a programação e a combinação de
usinas para produzir eletricidade, incluindo reservas marginais. As chamadas usinas de base são
necessárias para atingir a carga mínima constante, enquanto as usinas de carga de pico necessitam
trabalhar somente durante umas poucas horas de demanda de pico e as usinas de carga intermediária
durante muitas, mas não todas, as horas do ano. Somando-se a isso, o plano de expansão de
distribuição inclui investimentos em linhas de transmissão, torres, postes, condutores, subestações
etc.
Um plano de expansão da oferta é desenvolvido adotando-se os seguintes passos11:
• Subtrair da capacidade de oferta atual a demanda atual mais possíveis reformas planejadas
para aumento da capacidade de oferta para determinar o excesso de capacidade por meio
da margem de reserva requerida;
• Dividir o excesso de capacidade pelo crescimento de carga anual projetado para determinar
o tempo no qual a capacidade atual será superada;
• Identificar os recursos de oferta disponíveis para atingir as necessidades futuras; e
• Preparar um plano de capacidade de expansão a custo mínimo para satisfazer o crescimento
de carga projetado usando os recursos disponíveis sob critérios reais de engenharia
aceitáveis.
O plano desses investimentos fornece os dados a partir dos quais os custos marginais podem
ser estimados. Estimativas do CME requerem um método de custo que capte a natureza dos
investimentos de capacidade de oferta. Usinas para carga de base são geralmente da ordem de
diversas centenas de MW, enquanto as outras para carga de pico são dimensionadas em dezenas de
MW. O mesmo acontece com equipamentos de distribuição. Os transformadores, por exemplo, têm
tipicamente 10, 25, 37½, 100, 176, 250, 333 ou 500 kVA de capacidade. Ou seja, a expansão se
realiza a taxas incrementais discretas.
Por causa dos investimentos na capacidade de oferta serem em montantes discretos, fica difícil
identificar um incremento da capacidade como uma unidade marginal, porque é improvável que tal
unidade terá o mesmo tamanho e plano de operação que a variação marginal de carga que está sendo
considerada. Em vez disso, é mais esperado que a mudança na carga requererá o atraso ou a
aceleração de um investimento particular ou um conjunto de investimentos.
O método apropriado para as avaliações de custo de expansão é a metodologia do valor
presente, que determina o valor de um plano de expansão por um dado período de tempo. A
necessidade de uma expansão eminente tende a aumentar os custos marginais de expansão, uma vez
que o valor presente descontado dos custos seria menor se eles ocorressem em um período mais
longo. Assim, os CMEs dependem do horizonte de tempo considerado e do custo marginal de
expansão, devido a um incremento discreto de capacidade. O CME pode ser calculado de forma
relativa, ou seja:
n [ I A (t ) + C fixoA (t )] − [ I B (t ) + C fixoB (t )]
CME =  (4.19)
t =0 kWA / B (1 + r ) t

Onde IA(t), IB(t) são os investimentos no ano t em capacidade de oferta no caso A e B e CfixoA(t)
e CfixoB(t) são os custos fixos de operação e manutenção no ano t para os casos A e B,
respectivamente; kWA/B é o incremento marginal na capacidade para o caso A relativo a B e r é a
taxa de desconto.
11
Neste capítulo estamos supondo que o plano de expansão de oferta central a custo mínimo da companhia elétrica é
dado e o processo PIR envolve somar alternativas do lado da demanda com outras para o plano existente.
160 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

É comum que o CME de um projeto dependa do atraso ou da aceleração dos investimentos


planejados para aumento de capacidade. Em outras palavras, o caso A poderia somar as mesmas
unidades de capacidade do caso de referência B, mas algumas unidades poderiam ser construídas
mais tarde. Atrasar um investimento possibilita uma economia de capital em função do valor do
dinheiro no tempo. Ao postergar um investimento em um ano iguala-se a diferença entre o valor
presente do plano de expansão e o valor presente do plano de expansão postergado ajustado pela
inflação e pelo progresso tecnológico. Se um programa pode reduzir a demanda mais que um
crescimento de carga de um ano, o período de adiamento dos investimentos em expansão é
determinado pela relação entre a redução de carga pelo crescimento de carga base. Assim, o custo
marginal de expansão referente aos investimentos de capacidade para servir ‘s’ anos de crescimento
de carga ou para postergar a nova capacidade por ‘s’ anos é:
1 n
 I (t ) + C fixo (t ) I (t ) + C fixo (t ) 
CME =
kW
 (1 + r ) t

(1 + r ) t +s
(1 + f ) s  (4.20)
t =0  

Onde f é a taxa líquida de inflação de uma tecnologia específica do progresso técnico; s são
os anos de dilatamento (kW/crescimento de carga anual); kW é a capacidade de geração da
unidade marginal e r é a taxa de desconto. Por causa da natureza dos investimentos em capacidade
de oferta, o plano de expansão deve possibilitar a agregação de novos recursos antes que sua
capacidade total seja realmente necessária.
O planejador pode ter que escolher, por exemplo, entre uma grande usina que causará excesso
de capacidade durante diversos anos ou, então, diversas usinas pequenas que entrarão em operação
sucessivamente de acordo com as necessidades. Além disso, o espaço de tempo requerido para
construir novas usinas significa que os investimentos devem ser feitos antecipadamente e só serão
remunerados à medida que entrem em operação e a energia possa ser vendida. O valor do CME
tende a aumentar quando as novas capacidades são construídas e, então, caem após sua conclusão
quando os custos são amortizados (ver Figura 4-2).

Figura 4-2 – Expansão da oferta para atingir o crescimento da demanda de pico – EXEMPLO 4.4

Essa variação no tempo surge porque a metodologia do valor presente ignora os investimentos
passados e atribui um alto valor para os investimentos necessários para prevenir um "déficit" futuro
de capacidade. Uma vez que o investimento é realizado e seu custo é amortizado, o excesso de
capacidade resultante empurra os investimentos futuros para mais longe do horizonte de tempo do
planejamento e o método do valor presente dá um custo marginal de expansão tendendo a zero.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 161

Os custos, CME e CMO, podem ser alocados para cada hora do ano de acordo com a
contribuição horária na Probabilidade de Perda de Carga (PPC) anual (Vardi, Zahavi, and Avi-
Itzhak 1977).
P ( h) P ( h)
Ccap (h) = CME  kW, Cenergia (h) = CMO  kWh (4.21)
PPC FRC  PPC
Onde P(h) é a contribuição da hora h para o PPC anual; PPC é a probabilidade de perda de
carga (ou LOLP); Ccap(h) é o custo de expansão alocado para a hora h e Cenergia(h) é o custo de
produção alocado para a hora h (ou custo da energia na hora h). Note que o valor de custo incorrido
em uma hora considera a contribuição desse tempo no PPC, que por definição é a razão entre a
energia solicitada pelo usuário não suprida pelo sistema e a energia total demandada. Normalmente,
a medição considera um tempo longo (10 anos) e representa, em síntese, a probabilidade do usuário
permanecer sem energia elétrica. A determinação desses índices é realizada por meio de modelos
estocásticos do tipo Markoviano. Essa é uma proposição de normalização de custo útil para
comparar medidas alternativas que depositam no índice de confiabilidade do sistema elétrico sua
principal motivação.
As equações em (4.21) podem ser usadas para obter o valor do custo horário evitado, ou seja:
C cap ( h) C energia ( h)
CM( h) = + (4.22)
kW L ( h)

Onde L(h) é a energia suprida (kWh) durante a hora h. Note que o termo Cenergia(h) na Eq.
(4.21) difere do valor calculado na Eq. (4.12).
O custo marginal de energia expresso em $, conforme definido na Eq. (4.8), pode também ser
normalizado para dar estimativas do custo marginal por capacidade ofertada ou por unidade de
energia produzida. Dessa forma, definem-se as seguintes relações:
CM CM  FRC
CM kW = ; CM kWh = (4.23)
kW kWh
Onde CMkW é o custo marginal de energia por unidade de capacidade ofertada e CM kWh é o
custo marginal de energia por unidade de energia produzida. Esses valores são úteis também para
comparar medidas alternativas como os programas de GLD e de eficiência de energia. Em tal
comparação, por exemplo, o CMkW é tratado como o custo marginal que é evitado pela substituição
de melhorias de eficiência de energia e outras medidas em lugar dos recursos de oferta incrementais
no plano de expansão existente.

4.4.3. Fator de capacidade

A extensão pela qual a usina de geração é operada durante o ano é medida pelo seu fator de
capacidade (Fcap) que é a relação de sua produção média pela sua produção de pico ou sua produção
total pela sua produção potencial, se operada constantemente a plena capacidade:
Eletricidade produzida (kWh/ano)
𝐹𝑐𝑎𝑝 = (4.24)
Capacidade de pico (kW) × (8760h/ano)

O fator de capacidade pode ser usado nas Equações em (4.23), resultando após substituição
do termo CM definido na Eq. (4.8) em:
162 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

8760Fcap  CMO CME  FRC


CM kW = CME + , CM kWh = + CMO (4.25)
FRC 8760Fcap
_____________________________
EXEMPLO 4.6 – Qual é a quantidade de energia elétrica anual
produzida por uma usina geotérmica de 20 MW com um fator de
capacidade de 0,80 e por uma turbina a combustão (TC) de 50 MW com
um fator de capacidade de 0,30? Considerando a plena carga e a
operação com ausência de contingências ou de manutenção programada
durante o ano.

Solução
A usina geotérmica produzirá 8760 × 20 × 0,80 = 140,2 GWh/ano
e a turbina a combustão produzirá 8760 × 50 × 0,30 = 131,4 GWh/ano.
_____________________________
EXEMPLO 4.7 – Calcule o CMkW (anualizado) e o CMkWh de cada usina
com os custos e os fatores de capacidade mostrados na Tabela 4-4.
Use a Eq. (4.15) para calcular o CME anualizado do sistema de
expansão (usinas novas) e a variação do CMkWh considerando a
expansão. Considere os dados de vida útil dos empreendimentos
conforme a Tabela 4-3 (do EXEMPLO 4.4) e a taxa de 6% a.a.

Tabela 4-4 – Recursos de oferta – EXEMPLO 4.7

Capacidade Fator de CMO CME anualizado


Usina N°
(MW) capacidade ($/kWh) ($/kW)
Existentes
Hidroelétrica 3 1.200 0,50 0,020 0
Usina a gás 3 600 0,50 0,040 0
Usina a carvão 3 420 0,75 0,030 0
Usina a carvão 3 400 0,75 0,040 50
recondicionada
Novas
Usina a gás 3 200 0,75 0,035 130
Usina a carvão 3 200 0,75 0,030 150
Usina a carvão com 3 200 0,75 0,040 180
filtro
Usina eólica 3 500 0,30 0,010 150
Turbina a combustão 3 50 0,15 0,050 60

Solução
O CME anualizado do sistema de expansão, conforme dados da
Tabela 4-4 e da Eq. (4.15), é de $147,83/kW. O CMkWh do sistema
considerando apenas as usinas existentes é de $0,131/kWh, passando
para $0,310/kWh com a expansão do sistema. Consulte a solução
completa nas planilhas disponíveis no endereço da internet12.
_____________________________
A Figura 4-3 a seguir traz os custos marginais de energia por unidade de capacidade ofertada
e por unidade de energia produzida segundo os fatores de capacidade das usinas indicadas na Tabela
12
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 163

4-4. Note que os valores de CMkW aumentam com o fator de capacidade Fcap – ver Eq. (4.25).
Naturalmente, o CMkWh decresce com o aumento do fator de capacidade, uma vez que os custos
fixos e de capital são distribuídos por mais kWh de produção de energia (ver exemplos na Figura
4-3). O fator de capacidade não é inerente ao projeto de uma usina, ele depende de como a usina é
usada de acordo com o seu lugar no plano de expansão e a classificação de ordem de despacho. Para
avaliar os recursos de oferta, por exemplo, o valor do CMkW deve ser aplicado somente a um
incremento específico de um determinado plano de expansão e comparado com o CME, valor este
que independe das horas de operação ou do fator de capacidade.

Fator de capacidade anual, Fcap

Figura 4-3 – Custos marginais – EXEMPLO 4.7

O conjunto de recursos da Tabela 4-4 e Figura 4-3 será usado nos exemplos de análise do PIR
mais adiante.

4.4.4. Fator de Carga (FC)

A razão entre a demanda média anual e a demanda máxima do período de pico é chamada de
fator de carga, que é uma medição da variabilidade da carga de uma companhia de eletricidade, ou
seja:
Eletricidade consumida (kWh/ano)
𝐹𝐶 = (4.26)
Demanda de pico (kW) × (8760h/ano)

Uma CE com demanda constante possui um fator de carga igual a 1, enquanto outra CE que
apresenta um pico de demanda bastante acentuado tem um fator de carga baixo (menor que 1).
Graficamente, o fator de carga é a relação entre a demanda média (área da curva de carga) e a
demanda máxima em um intervalo de tempo t (normalmente um ano):
n

FC =
D
=
1 1 D(t )dt (4.27)
Dmáx Dmax t

Onde n é o número de intervalos da curva de carga e a integral da Eq. (4.27) é a área de todos
os intervalos da curva de carga indicada para um período t (ver Figura 4-4).
164 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Figura 4-4 – Fator de carga – obtenção gráfica

_____________________________
EXEMPLO 4.8 – Qual é o fator de carga para um uso final que tem
um perfil diário conforme a Tabela 4-5 indicada a seguir durante
um ano? Qual é a energia total utilizada no ano?

Tabela 4-5 – Perfil de demanda de eletricidade – EXEMPLO 4.8

Hora Demanda (MW)


0 6 1,0
6 12 3,0
12 15 4,0
15 16 5,0
16 20 4,5
20 24 2,5

Solução:
O consumo total anual é 365×[(6×1)+(6×3)+...+(4×2,5)]=25,185
GWh e o fator de carga é:
25185
FC = = 0,575 (4.28)
5  8760
_____________________________
EXEMPLO 4.9 – Qual é o fator de carga para a demanda de
eletricidade descrita pela curva de duração de carga da Figura 4-5
(lado esquerdo)? Qual é o consumo anual de energia?
_____________________________
O fator de carga pode ser calculado para todo o sistema elétrico, para classes específicas de
consumidores ou por uso final e este valor depende do período de tempo considerado. Isto é, análogo
ao fator de capacidade, que depende do tempo e do nível de produção que o sistema de fornecimento
opera como um todo.
_____________________________
EXEMPLO 4.10 – As tarifas de eletricidade são instrumentos
importantes na mudança do perfil dos consumidores de modo a
economizar energia e capacidade de pico. Considere o caso de uma
fábrica têxtil que possa escolher entre diferentes esquemas de
tarifas. Estime o custo de produção unitário considerando somente
custos de mão de obra e energia. Faça as estimativas usando os três
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 165

tipos de tarifas. Suponha um regime de trabalho de 20 dias/mês e


uma produção de 1.000 unidades por período (primeiro e segundo
período do dia). Use os dados contidos nas tabelas a seguir.

Tabela 4-6 – Esquemas de tarifas – EXEMPLO 4.10

A - Esquema
B – Esquema de tarifa de
de tarifa C – Esquema horo-sazonal
bloco
simples
$/MWh Consumo (kWh/mês) $/MWh Período $/MWh
0 – 1.000 650 D 08:00 – 12:00 600 D e C
C 12:00 – 18:00 D e C
920
1.000 – 1.500 750 (ponta) 1.000
sobre 1.500 1.000 demais horários 600 D e C

A fábrica opera em dois períodos de oito horas de trabalho/dia


e tem o staff com os salários de acordo com seus períodos de
trabalho indicados na Tabela 4-7. Considere que a fábrica tenha um
perfil de carga diário dado pela Tabela 4-8. As letras D e C
referem-se às tarifas de demanda e de consumo para os esquemas de
tarifa B e C.

Tabela 4-7 – Gastos com pessoal – EXEMPLO 4.10

Primeiro Salário ($/mês) Segundo Salário ($/mês)


Staff
período no (08:00 às 16:00 hs) período no (16:00 às 24:00 hs)
Trabalhador A 10 500 2 750
Trabalhador B 4 300 4 400
Trabalhador C 2 1.000 0 0
Trabalhador D 5 300 1 300

Tabela 4-8 – Perfil de carga – EXEMPLO 4.10

Perfil de carga Consumo kWh Consumo kWh


Período (dia de trabalho) (dia sem trabalho)
08:00 – 12:00 hs 103,0 10,3
12:00 – 14:00 hs 20,0 2,0
14:00 – 18:00 hs 95,0 9,5
18:00 – 24:00 hs 10,0 1,0
24:00 – 08:00 hs 3,0 0,3

Que tarifa elétrica você sugere que essa fábrica deveria ter
para baixar seu custo de energia? Isso baixa seu custo total de
produção? Refaça o cálculo do custo de produção unitário
considerando um preço médio de energia em função do fator de carga
e outras variáveis conforme as relações a seguir:
Tarifa de demanda
Tarifa em bloco = Pm = + Tarifa de consumo (4.29)
FC p  (8760 / 720)

E:
166 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

D p  TD p  TD fp h
 + TC p  FC p  + + TC fp  FC fp  fp

D fp  h p  hp hp
Tarifa hora - sazonal = Pm =  (4.30)
Dp h
 FC p + FC fp  fp
D fp hp

Onde Pm é o preço médio da energia; Dp é a demanda medida no


horário de ponta (8 às 18h); Dfp é a demanda medida no horário fora
de ponta; TDp é a tarifa de demanda no horário de ponta; TDfp é a
tarifa de demanda no horário fora de ponta; TCp é a tarifa de
consumo no horário de ponta; TCfp é a tarifa de consumo fora do
horário de ponta; FCp é o fator de carga no horário de ponta; FCfp
é o fator de carga no horário fora de ponta; hp é o número de horas
no mês no período de ponta e hfp é o número de horas no mês no
período fora de ponta (consultar solução no endereço da internet13).
Considere FCp = 0,80 e FCfp = 0,45.
_____________________________

4.5. INTEGRAÇÃO DO FORNECIMENTO E OUTRAS AÇÕES DO LADO DA OFERTA

4.5.1. A escolha entre fontes/sistemas de produção de eletricidade

A Figura 4-5 a seguir ilustra a curva de duração de carga e os parâmetros dos custos marginais
(CMkW anualizado e CMkWh) dos diferentes tipos de fontes de oferta do EXEMPLO 4.7. Algumas
usinas, tais como as com turbinas a combustão, têm baixos custos de capital e altos custos variáveis
operacionais e de combustível e são indicadas para carga de pico. Outras usinas, tais como
hidroelétricas e centrais a carvão, têm custos de operação variáveis e de combustível mais baixos e
podem ser usadas para fornecer a carga de base. As existentes, excetuando a usina a carvão
recondicionada, têm custos menores porque seus custos de capital já estão amortizados. Nesses
casos, somente os custos de operação (variáveis e fixos) ou os custos incrementais de medidas de
readaptação, como no caso da usina a carvão recondicionada, são contabilizados.
A elaboração de um plano de oferta de custo mínimo depende do fator de capacidade
necessário para atingir a demanda incremental da nova capacidade. Das novas usinas apresentadas
na Figura 4-5, as mais baratas14 operando com Fcap acima de 52% são as usinas a carvão para carga
de base, seguidas das usinas a gás para carga intermediária. A turbina a combustão operando acima
de 52% ou a usina a carvão com filtro removedor de SO2 serviria como carga de pico. Note que o
custo marginal de produção de energia das usinas eólicas é alto, devido ao seu baixo fator de
capacidade, podendo também ser utilizada para carga de pico. Em locais onde os ventos ao longo
do dia são mais intensos do que os ventos no período da noite, a carga de pico irá ocorrer durante o
dia e pode complementar a carga base. Se a carga de pico ocorrer durante a noite, fora do pico de
consumo, pode ser necessário estocar a energia ou consumi-la, poupando outras fontes estocáveis.
Ao longo do tempo, pode-se combinar usinas de pico de baixo Fcap (por exemplo, até 20%) com
usinas de carga intermediária de médio Fcap e com usinas de carga de base de alto Fcap. A
combinação de custo mínimo dependerá, entretanto, da frequência dos diferentes níveis de demanda
durante o ano.
A utilização da curva de duração de carga pode ser ilustrada considerando os valores de custo
e determinando uma composição dos três tipos de usinas (baixo, médio e alto Fcap) combinada com
13
Ver http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
14
Utilizando-se do critério de custo marginal por capacidade ofertada, CMkW.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 167

fatores de capacidade que apresentem o menor custo total. Das novas usinas, para um fator de
capacidade de 52% ou mais, as usinas de carga de base a carvão são mais baratas. Considerando
três usinas para cada tipo, incluindo as existentes, isso corresponde a uma demanda de 5.700 MW
de capacidade de carga de base15. Para os 15% do tempo em que a carga está entre 5.700 MW e
6.500 MW, a usina mais barata, operando num intervalo de fator de capacidade acima de 52%, é a
usina a gás, podendo atingir um acréscimo de 800 MW se adequações nos fatores de capacidade
das usinas de base forem realizadas. A capacidade de pico pode ser obtida com a usina a carvão
com filtro, a usina eólica e a turbina a combustão, incluindo adequações no fator de carga das usinas
de base e intermediária. Note que, para um fator de capacidade de 52% ou menos, as turbinas a
combustão são as menos caras, podendo, assim, compor combinações como carga de base ou
intermediária.

Fator de capacidade anual, Fcap

Figura 4-5 – Modelo de curva de duração de carga

O exemplo ilustrado pela Figura 4-5 admite que toda capacidade consiste em novas adições
de capacidade térmica somada às alterações no fator de capacidade das usinas instaladas, incluindo
o potencial hidroelétrico existente. Tal análise requer cálculos interativos de sistemas de equações
lineares que estão além do escopo da presente discussão. Entretanto, pode-se ilustrar a metodologia
com o exemplo simplificado baseado também na curva de duração de carga (ver Figura 4-6). Neste
caso, as capacidades instaladas da carga de base (usinas a carvão) e das cargas intermediárias (usinas
a gás e eólicas, nessa combinação específica) são representadas pelos retângulos indicando as
produções obtidas conforme fatores de capacidade ajustados. A área de cada retângulo é a produção
de energia anual dos recursos correspondentes.
A capacidade hidroelétrica é mostrada por um retângulo adicional na Figura 4-6 onde se
verifica que a produção total dessa usina está acima da demanda. Embora sua capacidade total seja
fixa, pode-se supor que seja possível variar sua produção média e aumentar as horas de operação,
como se esse recurso tivesse uma capacidade instalada mais baixa e um fator de capacidade mais
alto. Isso é possível porque a produção potencial de uma usina de recurso hídrico é determinada
pela quantidade anual de água captada e estocada em reservatório. O excesso de energia
hidroelétrica verificado é deslocado para fornecer uma carga de base adicional. Sem essa adição, a
carga de base requerida seria maior que a indicada na Figura 4-6. Embora o deslocamento da energia
hidroelétrica em excesso reduza esses requerimentos, ainda serão necessárias capacidade de carga
de base e de pico. Outras combinações podem ser simuladas até que uma ordem de despacho que
represente menor custo de operação seja adotada para o pleno atendimento da demanda.

15
Existem diversas combinações para compor a curva da Figura 4-5. Seja alterando o fator de capacidade das usinas já
em operação, seja com a entrada de novas usinas etc. Consulte esse exemplo em
http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi/PlanejamentoIntegradodeRecursos.htm.
168 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Figura 4-6 – Modelo de curva de duração de carga incluindo a capacidade existente

O planejamento real da oferta elétrica, usando a curva de duração de carga, é mais complexo
que o processo ilustrado na Figura 4-6. As cargas são variáveis e difíceis de serem previstas e os
recursos de oferta podem não estar disponíveis a todo momento16. Essas incertezas são as razões
para a manutenção de uma reserva marginal, tal que a capacidade total de oferta nos níveis de
geração, transmissão e distribuição exceda quase sempre a demanda máxima esperada. O critério
para determinar quando e quanto da capacidade de oferta deve ser adicionado é geralmente baseado
no atendimento da demanda de pico do sistema. Já a capacidade do sistema de distribuição é
determinada pelos picos de área. Uma vez que a capacidade total de geração e transmissão sejam
suficientes para atenderem ao pico, supõe-se que as usinas de geração devam estar funcionando a
um fator de capacidade suficiente para atingir a demanda total de energia, ou seja:
𝐸𝑙𝑒𝑡𝑟𝑖𝑐𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑧𝑖𝑑𝑎 > 𝐸𝑙𝑒𝑡𝑟𝑖𝑐𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑙 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑢𝑚𝑖𝑑𝑎 (4.31)
Substituindo as definições de fator de capacidade e fator de carga:
𝐹𝑐𝑎𝑝 do sistema (capacidade de pico kW) > FC do sistema (demanda de pico kW) (4.32)

Se a capacidade de pico é aproximadamente igual à demanda de pico, deve-se prever, então,


uma margem de reserva, portanto:
Fcap do sistema  FC do sistema (1 + margem de reserva) (4.33)

Como indicam os exemplos, os recursos hidroelétricos podem acrescentar flexibilidade à


operação do sistema, porque a energia potencial estocada em reservatórios hidroelétricos permite
que esse recurso seja utilizado como carga de base ou intermediária. Os sistemas com uma
significativa faixa de capacidade de geração hidroelétrica, como é o caso brasileiro, são mais
complexos. O critério de fator de capacidade indicado pode não ser suficiente para assegurar que a
energia total exigida seja alcançada. Isso, porque, as usinas hidroelétricas possuem restrições sobre
a quantidade total de água que elas podem captar durante o ano, ou seja, elas são um recurso de
energia limitada, em contraste com uma usina térmica, na qual sua capacidade é que determina o
limite de produção. Um sistema, dominado por usinas hidroelétricas, pode também ser de energia
limitada. Sendo assim, o fator de capacidade máxima pode ser tal que as desigualdades das Eq.

16
A própria operação dos sistemas de eletricidade possui suas complexidades e incertezas.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 169

(4.31) a (4.33) não sejam satisfeitas e uma capacidade de geração adicional seja necessária para
atender às necessidades de energia do mercado consumidor.
Como mostra a Figura 4-3, os custos variáveis de operação das usinas hidroelétricas são
baixos. Então, esperar-se-ia que tais usinas fossem operadas como capacidade de carga de base e
funcionassem tanto tempo quanto possível. Entretanto, a água que alimenta as usinas hidroelétricas
pode não estar disponível em quantidades uniformes durante o ano. Se há uma estação úmida
pronunciada, o máximo de água que ela pode acumular é o que pode ser estocado no reservatório,
devendo ser turbinada para gerar potência, mantida no reservatório ou mesmo vertida. Os recursos
hidroelétricos são similares aos recursos renováveis intermitentes, quando a fio d’água ou com
reservatório de regularização, especialmente aqueles com estoque parcial, tal como algumas
tecnologias de energia solar.
A produção máxima hidroelétrica pode ou não coincidir com a ocorrência de demanda de
pico. O impacto no sistema de oferta térmico pode ser analisado tratando a produção hidroelétrica
como uma carga negativa, que reduza a carga que deveria ser atingida pelas usinas térmicas (Figura
4-7A e Figura 4-7B). Essa metodologia requer igualar a produção hidroelétrica horária com as
cargas para as horas correspondentes. Se a demanda de pico está na estação úmida, a carga
remanescente (base e intermediária) é mais uniforme, o que resulta em alto fator de carga – ver Eq.
(4.27). Assim, pode-se operar com usinas térmicas funcionando com um fator de capacidade alto
para a carga de base (Figura 4-7A). Se a demanda de pico está na estação seca, entretanto, a carga
remanescente das usinas térmicas seria grande na estação seca e pequena na estação úmida,
resultando em baixo fator de carga, indicando, também, um baixo fator de capacidade para algumas
das usinas térmicas de base (Figura 4-7B).

Figura 4-7 – Curva de duração de carga – sistema dominado por hidroelétricas (estação úmida e seca)

A maior parte da discussão feita aqui sobre opções de oferta de eletricidade se refere ao
planejamento da geração e não entraremos em detalhes quanto ao planejamento da transmissão. De
preferência, modelos complexos de fluxos de potência são usados para projetar sistemas de
transmissão e este tópico vai além do escopo deste texto. Pode-se supor simplesmente que os
requisitos de capacidade e os custos de investimento para a maior parte dos equipamentos de
transmissão são quase proporcionais à capacidade total de geração e que esses custos podem ser
tratados tal como os custos de geração. Consideramos de maneira aproximada o efeito do sistema
de transmissão no planejamento do sistema elétrico usando o fator de perda descrito mais adiante.
Supomos que esse valor se aplica uniformemente à energia elétrica gerada. No entanto, trata-se de
uma grande simplificação, pois as perdas têm uma relação não linear com a demanda do sistema.
As exigências de distribuição e transmissão locais, por outro lado, dependem mais dos níveis
de demanda da área de distribuição que podem não corresponder com os parâmetros da oferta ou
da demanda do nível do sistema. A análise das redes de distribuição é outra questão complexa que
170 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

está além do escopo deste livro, mas essa informação pode ser usada para desenvolver estimativas
de custos específicos da área para os propósitos do planejamento, como explicado no Apêndice B.

4.5.2. Estratégias de despacho

A informação da Figura 4-3, que resume algumas das relações-chave entre as componentes
de custo marginal da oferta, pode ser usada para identificar quais recursos de oferta deveriam ser
selecionados para um plano de expansão da companhia elétrica. Uma vez que as usinas já estão em
operação, entretanto, os custos de capital podem estar amortizados e então somente os custos de
combustível e os de operação e manutenção é que determinam como as usinas existentes devem ser
operadas. A ordem da seleção do uso (ou despacho) das usinas geralmente está de acordo com o
menor custo variável, incluindo o combustível. Isso é chamado de despacho econômico.
Usinas hidroelétricas em geral têm custos variáveis muito baixos e devem, portanto, ser
operadas o maior tempo possível. Todavia, existem limitações de quando e quanto desses recursos
estão disponíveis, sendo tratados, mais simplificadamente, como cargas negativas baseadas na sua
disponibilidade e produção. A demanda remanescente em sistemas termoelétricos deve ser atingida
pelo despacho de estações térmicas, geralmente sob um critério econômico17.
Para fins de planejamento, é mais simples tratar os custos variáveis como constantes para um
dado tipo de usina, independentemente de sua produção. Na prática, entretanto, a eficiência da usina
térmica e, portanto, seus custos de operação e de combustível dependem do seu nível de produção.
A teoria econômica indica que a combinação a custo mínimo dos recursos é aquela que iguala os
custos marginais dos diferentes recursos. Existem limitantes de curto prazo nas decisões de
despacho, tais como a rapidez (ou não) com que as usinas podem ser colocadas em operação e como
pode ser aumentado ou diminuído seu nível de produção. Algumas usinas possuem níveis mínimos
de produção, abaixo dos quais elas não podem ser operadas seguramente. Geralmente, as usinas de
carga de base são aquelas com baixos custos variáveis e parâmetros de operação menos flexíveis,
enquanto as usinas de pico têm os mais altos custos variáveis e são operadas com maior
flexibilidade. A produção hidroelétrica é relativamente flexível para acompanhar a variação de
demanda dos consumidores, mas é sujeita a restrições de energia baseadas nas variações sazonais
de disponibilidade de água e de operação baseadas nas características hidráulicas, como as
representadas na Curva Colina da Turbina.
Um método para reduzir o impacto ambiental da produção de eletricidade é alterar a ordem
do despacho para dar maior prioridade às usinas menos poluidoras, embora talvez sejam as mais
caras. Esse método, chamado despacho ambiental, geralmente acrescenta uma componente ao custo
variável de operação da usina na proporção de suas emissões. Esse incremento de custo pode ser
uma carga de emissão real que é paga ou pode ser um "somador" artificial que é usado para guiar
as decisões de despacho por meio das fontes de menor emissão.
Dependendo da combinação dos recursos disponíveis, dos parâmetros de custo e de emissão,
o despacho ambiental pode diminuir significativamente as emissões, mesmo a custos mais altos.
Para alguns tipos de emissões, tais como poluentes locais que podem se concentrar durante períodos
de pico, o despacho ambiental pode fornecer importantes benefícios a um custo adicional pequeno.
Essa estratégia está sempre sujeita à flexibilidade da operação e à habilidade de atender à carga das
fontes de oferta disponíveis no sistema da companhia elétrica.

17
Existe um despacho fora da ordem de mérito econômico denominado “despacho por restrições elétricas”.
Normalmente esse despacho busca atender requisitos de tensão, de frequência e de carregamento de linhas de
transmissão e de subestações de potência.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 171

4.5.3. Redução de perdas do lado da o ferta

Para melhorar a eficiência do uso final via programas GLD e outros, o PIR deve também
melhorar a eficiência no lado da oferta. Uma das opções é reduzir a taxa de perdas no sistema de
geração, transmissão e distribuição. Após o sistema de geração, a soma das perdas em Transmissão
e Distribuição (T&D) é a diferença entre a energia gerada e a energia consumida:
E p = Ptransmissão + Pdistribuição (4.34)

Onde Ep é a perda de energia em T&D. Nos países em desenvolvimento, as perdas em T&D


estão por volta de 15 a 25% do total da eletricidade gerada, em alguns casos excedendo 35%,
comparados a um valor típico de 7 a 8% dos países industrializados. O Brasil, por exemplo, tem um
grande potencial para redução de perdas de eletricidade via programas de GLD, uma vez que as
perdas de energia elétrica ainda são elevadas (ver Tabela 4-9 e Figura 4-8).

Tabela 4-9 – Perdas de energia elétrica em alguns países

País % País % País % Região %


Estados Unidos 6,6 Austrália 6,9 Rússia 11,5 América do Norte 7,3
Argentina 15,5 Finlândia 4,1 Japão 5,1 América do Sul e Central 16,4
Bolívia 18,1 França 6,5 Índia 25,9 Europa 7,0
Brasil 17,4 Noruega 7,8 China 5,3 Eurásia 11,8
Colômbia 15,1 Portugal 8,1 Israel 4,0 Oriente Médio 12,8
Haiti 53,6 Espanha 3,6 Irã 16,8 África 12,5
Venezuela 28,6 Itália 7,5 Canadá 8,2 Ásia e Oceania 8,3

Fonte: OECD/IEA (2018)

Figura 4-8 – Evolução das perdas de eletricidade – Brasil, China e EUA (1980 a 2010)
Fonte: OECD/IEA (2018)

As perdas T&D podem ser classificadas como perdas técnicas ou não técnicas. As perdas não
técnicas, ou perdas comerciais, resultam de conexões clandestinas, adulteração do contador de
leitura, erros de leitura etc. Tais perdas afetam o faturamento da companhia elétrica (ver Figura 4-
9).
172 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Figura 4-9 – Categorias de perdas


Fonte: ERGEG (2008)18

As perdas técnicas referem-se à energia que é dissipada por meio de elementos do sistema
T&D (transformadores, condutores etc.). Conforme comentários anteriores, a fração de perda
horária de energia é a relação entre a energia não aproveitada e a energia gerada:
E p ( h) E ger (h) − L(h) L ( h)
Fpe (h) = = = 1− (4.35)
E ger (h) E ger (h) E ger (h)

Onde L(h) é a carga total horária vendida; Ep(h) são as perdas de transmissão e distribuição
(T&D) horárias e Eger(h) é a energia horária gerada. No entanto, é conveniente para as práticas de
medição de uma CE definir um fator de perdas a partir da demanda máxima de potência ou de
corrente, com o qual se infere as perdas de energia. Define-se o fator de perdas de potência Fp como
a relação entre a perda média e a perda máxima de potência em um período t, ou seja:
n
P
Fp = médio =
1 0 P(t )dt (4.36)
Pmáx Pmáx t

Onde n é o número de intervalos da curva de carga. Com esse fator, obtêm-se a perda de
energia para um período qualquer:
E p = Fp  Pmáx  t (4.37)

As perdas T&D consistem, basicamente, em perdas nos condutores que variam com a corrente
e, portanto, com a carga e as perdas dos transformadores. Estas últimas ocorrem em dois metais: no
ferro e no cobre. Diferentemente das perdas no cobre, as perdas ocorridas no ferro não dependem
da corrente de carga. Os fornecedores de transformadores informam as perdas nominais do ferro e
do cobre, valores normalmente obtidos por meio de testes laboratoriais. As perdas em T&D são
graves porque as companhias elétricas provocam custos ambientais e econômicos para a produção
de eletricidade e essa parcela perdida não beneficia nenhum consumidor, nem fornece rendimentos
à companhia.
Existem diversos métodos para se determinar as perdas de eletricidade em um sistema de
fornecimento elétrico. O procedimento comum nesses métodos é a determinação do valor das
perdas técnicas para cada uma das fases T&D. No cálculo, determina-se inicialmente as perdas de

18
ERGEG (European Regulators Group for Electricity and Gas) – é um grupo de reguladores consultivo para a
Comissão Europeia sobre questões de mercado interno de energia na Europa.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 173

potência (demanda) seguidas das perdas de energia. Para os transformadores, o fator de perda é
definido como:

Ptl
Ftl = (4.38)
Pger
Onde Ftl(h) é o fator de perda do transformador na hora h; Ptl(h) é a perda de potência do
transformador em W (ou múltiplo); e Pger(h) é a potência do sistema de geração. O objetivo principal
na redução das perdas técnicas é diminuir as perdas de energia nos condutores, que são
proporcionais ao produto da resistência do condutor e o quadrado da corrente (lei de Ohm):

I 2Rf
Pd  I R f  Fd =
2
(4.39)
Pger
Onde Pd é a perda dos condutores em W (ou múltiplo) no sistema de distribuição; I é a
corrente; Rf é a resistência elétrica dos condutores de eletricidade; e Fd é o fator de perdas dos
condutores. Há, também, uma queda da tensão no sistema de T&D devido tanto à carga reativa
quanto à resistência dos condutores, que são medidas pela impedância:
V = I  Z f (4.40)

Onde V é a queda de tensão (V) e Zf é a impedância elétrica dos condutores.


Mais especificamente, considera-se um modelo π linha de transmissão em que tem-se:

Onde Vj é a tensão a montante da linha; Vj é a tensão a jusante da linha; e I é a corrente de


carregamento da linha de transmissão ou, por simplificação:

Onde l é o comprimento da linha de transmissão; R f e Xf são os parâmetros da linha, sendo a


resistência e a indutância, respectivamente; e φ é o angulo de fase ou de carga.
Ao mesmo tempo, a potência num sistema trifásico fornecida pelo sistema de geração, através
do sistema de transmissão upstream e dos transformadores de distribuição, é proporcional ao nível
de tensão e de corrente e depende da carga reativa medida pelo fator de potência:
3(V  I  FP)
Pger = (4.41)
1 − Ftl
Onde V é a tensão de oferta; I é a corrente; e FP é o fator de potência, neste caso denominado,
também, de Fator de Deslocamento, pois considera somente a frequência fundamental da corrente
do sistema em 60 Hz. O fator de potência é a relação da potência ativa fornecida (kW) pela potência
aparente (KVA) e é igual ao cosseno do ângulo de fase entre a tensão e a corrente. Por definição, o
fator de potência é um número adimensional entre 0 e 1. Essa é uma medida da carga reativa do
sistema: uma carga inteiramente ativa (por exemplo, aquecedores a resistência) tem um fator de
potência de um, enquanto as cargas reativas (tais como motores de indução e transformadores)
174 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

tendem a reduzir o fator de potência19. Essa relação é natural em qualquer sistema elétrico. Para que
um aparelho indutivo funcione (motor ou transformador, por exemplo) é necessário armazenar
energia em forma de um campo magnético. Esse campo se opõe à variação da intensidade da
corrente, causando um atraso da corrente em relação à tensão. Com isso, parte da corrente ativa não
realiza trabalho útil. Essa parcela de energia é denominada energia reativa.
É importante considerar, por questões econômicas, a previsão da potência reativa de um
sistema elétrico nos programas de GLD, sobretudo no setor industrial. No Brasil, por exemplo, a
cada ano se intensifica o uso dos sistemas de transmissão sem a contrapartida proporcional de
compensação reativa nos sistemas de distribuição. É parte do PIR, em programas integrados com a
indústria, estabelecer critérios e arranjos técnico-operacionais que resultem na operação confiável
e econômica do sistema de fornecimento de energia elétrica.
O fator de perda em T&D, compondo as perdas dos transformadores e dos condutores, tem a
seguinte expressão:
Pger  Ftl + Pd
Fp = = Ftl + Fd (4.42)
Pger

Onde:
R f V
k (4.43)
Fd ( pico ) = Z V
FP
Onde Fd é o fator de perda anual dos condutores; Fd(pico) é o fator de perda de pico dos
condutores; e k é uma constante de proporcionalidade que depende da configuração do sistema de
distribuição. Pelo fato das perdas dos transformadores serem aproximadamente constantes, sua
contribuição relativa para a taxa de perda em T&D anual depende da relação da energia total gerada
no período de pico, isto é, o fator de carga. Geralmente, a taxa anual das perdas T&D do condutor
é aproximadamente 2/3 daquela taxa de perda durante as horas de demanda de pico, embora essa
relação também dependa do fator de carga. Assim:
2
Fp = Ftl + Fd ( pico ) (4.44)
3
E incluindo o fator de carga FC, resulta que:
Ptl 2
Fp = Ftl + Fd = + Fd ( pico ) (4.45)
FC  Ppico 3

Onde Ppico é a potência de pico do sistema de geração.


As Eqs. (4.42) e (4.43) permitem identificar as fontes importantes de perdas T&D. Como Fp
é proporcional à corrente, as perdas tendem a aumentar nos intervalos de demanda de pico,
sugerindo que as medidas de gerenciamento de carga podem reduzir as perdas tão bem quanto a
necessidade por nova capacidade de oferta. Somando-se a isso, o gerenciamento de carga para
melhorar o fator de carga pode reduzir as perdas do transformador. Como Fp é proporcional ao Rf,

19
A Aneel estabelece por resolução (09/2010) que o fator de potência nas unidades consumidoras seja superior a 0,92
capacitivo durante seis horas da madrugada e 0,92 indutivo durante as demais horas do dia. O descumprimento dessa
resolução pode ser multado e o valor é calculado em função do fator de potência medido e a energia consumida ao
longo de um mês.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 175

as perdas podem ser reduzidas diminuindo o comprimento e/ou a resistência das linhas condutoras.
O comprimento pode ser reduzido localizando os transformadores mais próximos dos centros de
cargas e a resistência pode ser reduzida usando condutores dimensionados adequadamente.
Uma vez que o fator Fp é proporcional à taxa de queda de tensão V e inversamente
proporcional à tensão V, os sistemas de transmissão de eletricidade a longa distância usam altos
níveis de tensão e a maioria de suas perdas T&D ocorrem no sistema de distribuição. As perdas
podem ser diminuídas pelo uso de distribuição em tensões maiores e pela redução das quedas de
tensão no sistema de distribuição (o que também aumenta a segurança).
Ainda, como Fp é inversamente proporcional ao FP, as perdas podem ser reduzidas pela
diminuição das cargas reativas e pelo aumento do fator de potência. Embora as cargas reativas não
aumentem diretamente a demanda de energia, elas aumentam as perdas. Então, a correção do fator
de potência, usando capacitores nas subestações de distribuição de modo a balancear as cargas
reativas, pode aumentar a segurança e economizar energia.
_____________________________
EXEMPLO 4.11 – A Companhia Elétrica Brakimpur (BECO), uma
companhia de distribuição, tem perdas de 20% anuais na sua rede de
T&D de 230V. As perdas dos transformadores são estimadas em 4% ao
ano. O sistema de distribuição existente tem Rf/Z de 0,9, um fator
de potência também de 0,9 e uma queda de tensão de 30%, de 230V
para 160V. A Beco investiu $1 milhão para melhorar o sistema,
aumentando o fator de potência para 0,95 e diminuindo o Rf/Z para
0,85; com isso, reduziu as perdas de transformador para 3% e a
queda de tensão para 12% em grande parte pelo aumento do número de
transformadores e a sua localização perto das cargas. A redução das
perdas levou a Beco a aumentar as vendas, enquanto, junto a um
programa de gerenciamento de carga, o fator de carga passou de 0,54
para 0,72 e a oferta de pico do sistema de geração permaneceu a
mesma. Qual é a taxa de perda anual depois do programa de melhoria?

Solução
Dos 20% de perdas anuais, 4% são perdas de transformadores e
os 16% restantes são perdas de condutores e, assim, a taxa de perda
de pico do condutor é de 24%. Da Eq. (4.43), o valor de k é:
3 k  0,9  0,3 0,24  0,9
Pd (pico) = 0,16 = k= = 0,79 (4.46)
2 0,9 0,9  0,3
As perdas de pico do condutor para o sistema melhorado, após o
investimento, são, então:
k  0,85  0,12
Pd (pico) =  0,085 (4.47)
0,95
Ou 8,5%. Isso corresponde a uma taxa de perda anual dos
condutores de 5,6% (2/3 da perda de pico). Da Eq. (4.45), pode-se
deduzir que:
Ptl
= Ftl  FC = 0,04  0,54 = 0,216 (4.48)
Ppico
176 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Assim, o novo fator de perdas do transformador com o


investimento é 0,216/0,72=3%. Portanto, o fator de perda em T&D
resulta Fp=0,03+0,056=8,6%, menos da metade do valor original.
_____________________________
EXEMPLO 4.12 – Qual é o custo marginal da eletricidade
economizada pelas medidas de redução das perdas do EXEMPLO 4.11?
Assuma uma taxa de desconto de 5% e uma vida útil de 25 anos
(FRC=0,07). A oferta de pico do sistema de geração é de 10 MW.

Solução:
O custo anual do programa é (0,07)×($1.000.000)=$70.000. A
energia economizada (conservada) é a diferença nas taxas de perda
multiplicada pela energia total fornecida pelo sistema de geração.
A oferta total é calculada pela oferta de pico de 10MW. A oferta
de energia inicial foi (10MW)×(8.760 h/ano)×(0,54)=47,3 GWh e,
corrigindo pelas perdas, resulta (47,3)×(1–0,20)=37,8 GWh. Esse
valor é a venda total. O sistema de oferta melhorado é (10MW)×(8.760
h/ano)×(0,72)=63,1 GWh e as vendas, portanto, são (63,1)×(1–
0,086)=57,7 GWh. Desse modo, tem-se um custo marginal de
$0,004/kWh. Se esse nível de oferta fosse produzido com as taxas
de perdas originais, as vendas seriam (63,1)×(1–0,20)=50,5 GWh.
Então, a energia incremental fornecida é de 57,4–50,4=7,0 GWh por
ano a um custo de $70.000 por ano ou $0,01/kWh.
_____________________________

4.5.4. Fontes renováveis e problemas de despacho

As dificuldades de despacho de energia gerada por essas fontes não podem ser rigorosamente
comparadas com as fontes convencionais, somente por meio de fator de capacidade, como foi feito
no exemplo da Figura 4-3. Em muitos países, o regime de produção máximo das fontes renováveis
ainda não é previsto com a segurança necessária para que elas sejam consideradas nos cálculos de
carga de reserva do sistema elétrico. Esse conceito, valor de capacidade (capacity value), será
discutido mais adiante.
Por outro lado, nos últimos 15 anos, as energias renováveis foram se incorporando ao PIR de
muitos países e hoje são consideradas alternativas viáveis tecnicamente e economicamente. Os
investimentos em tecnologia de processos de conversão de biomassas, de eficiência de turbinas
eólicas, painéis e coletores solares e a mudança do modelo de grandes usinas hidroelétricas para
PCHs consolidaram a participação das fontes renováveis também para sistemas de larga escala. A
inserção dessas alternativas em sistemas de larga escala o tornam mais flexível do ponto de vista
operacional, incluindo mudanças significativas na sua ordem de despacho. No caso brasileiro, de
acordo com estudos do Nipe/Unicamp20, por meio de programas de GLD e de eficiência energética,
em 2050 as energias renováveis serão responsáveis por 85% da eletricidade total e a participação
da energia nuclear, do carvão e dos derivados de petróleo (diesel e óleo combustível) serão
marginais. Esse cenário impõe, naturalmente, revisões de práticas de ordem de despacho nos
sistemas de fornecimento de energia elétrica do Brasil.

20
Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Universidade Estadual de Campinas - São Paulo).
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 177

4.6. ANÁLISE DO CUSTO SOCIAL E AMBIENT AL

Uma das características importantes do PIR é incluir novos critérios de avaliação na seleção
de recursos e tecnologias para atender à demanda de serviços de energia. Um dos aspectos mais
relevantes dessa análise mais ampla é a consideração dos impactos ambientais, que de certo modo
favorece as opções relativamente limpas, tais como GLD e fontes renováveis. A discussão a seguir
focaliza os impactos ambientais, especialmente emissões atmosféricas, embora as técnicas descritas
possam ser aplicadas para outros tipos de custos sociais não monetários.

4.6.1. Impactos ambientais da produção de eletricidade

O setor elétrico cria diferentes tipos de impactos ambientais, a maioria dos quais ocorre no
processo de geração de eletricidade. Os vários impactos podem ser classificados como segue:

Uso do solo

A necessidade de grandes áreas comprometidas com a crescente geração e transmissão


elétrica dificulta ou torna bastante controversa a instalação de usinas, torres e linhas de transmissão.
Existe, frequentemente, um impacto visual dessas instalações que pode desencorajar o uso
comercial e residencial nas proximidades.
A mineração a carvão, que é o principal combustível das usinas elétricas de países tão diversos
quanto China e Estados Unidos, também produz impactos severos no uso da terra, especialmente
em áreas onde a mineração a céu aberto é predominante. Outros impactos relacionados com o uso
do solo incluem inundação de áreas para os reservatórios das usinas hidroelétricas, que podem
incluir vales férteis com alto valor de biodiversidade. A área inundada depende da capacidade do
reservatório e da topografia da região. Em alguns projetos, como a represa de Balbina (situada
próxima a Manaus), a área inundada aproxima-se de um hectare por kW de capacidade de geração.
Ao passo que a área inundada para a usina de Belo Monte (Rio Xingu – proximidades de Altamira,
Pará) é de 0,004 hectare/kW.

Armazenamento de resíduos

A geração de eletricidade produz diferentes tipos de resíduos, que devem ser manuseados de
modo seguro. Os grandes volumes de cinzas criados pela combustão do carvão e o resíduo
sedimentado dos equipamentos de controle de poluição do ar criam um problema de armazenamento
de resíduos, alguns dos quais são radioativos e altamente tóxicos. Apesar de extensiva pesquisa e
programas de demonstração, o depósito de lixo radioativo de usinas térmicas nucleares permanece
não resolvido.

Resfriamento

Todas as usinas nucleares e a carvão, e também algumas usinas térmicas de queima de óleo
diesel ou combustível, usam turbinas de vapor de ciclo Rankine21 para converter a energia térmica
em potência elétrica. Esses ciclos requerem uma grande quantidade de resfriamento para manter as
condições de operação eficientes, geralmente de 2MW (térmico) para cada MW (elétrico) em usinas
nucleares e uma relação um pouco menor nas usinas que utilizam combustíveis fósseis. Em razão
da capacidade térmica do ar ser muito baixa para remover efetivamente esse calor, grandes
quantidades de água fria devem ser utilizadas. A geração de eletricidade é o segundo maior
21
Trata-se de um ciclo termodinâmico reversível que converte calor em trabalho (William John Macquorn Rankine).
178 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

consumidor de água nos Estados Unidos, depois da agricultura. A água pode remover tanto o calor
por evaporação, consumindo aproximadamente 3m3 por MWh, quanto por aquecimento e
consequente descarga dessa água aquecida no ambiente. Essa poluição térmica pode ser um
problema por causa das temperaturas mais altas diminuírem o conteúdo de oxigênio dissolvido na
água, o que é perigoso para a vida aquática em locais já poluídos por outros agentes.

Emissões atmosféricas

Em países onde o combustível fóssil é usado predominantemente, os impactos mais sérios


provenientes da geração elétrica são as emissões de gases na atmosfera como subprodutos da
combustão. O cumprimento das regulamentações de controle de poluição atmosférica é a maior
despesa das companhias elétricas norte-americanas e é provável que restrições ambientais sejam os
mais importantes itens que condicionem a operação da companhia elétrica no futuro.
Algumas emissões resultam de impurezas existentes nos combustíveis, tais como particulados
e dióxido de enxofre do carvão; outras vêm do ar usado no processo de combustão, como os óxidos
de nitrogênio; e algumas são os produtos finais inerentes da combustão de hidrocarbonetos, tais
como o dióxido de carbono e o vapor de água, embora o último seja raramente um problema.
Atualmente, as regulamentações e as despesas da CE têm concentrado os esforços na redução
das taxas de emissão de particulados, dióxido de enxofre (SO 2) e óxidos de nitrogênio (NOX). Os
particulados incluem tanto as partículas de poeira visíveis quanto as microscópicas emitidas no
processo de combustão, especialmente quando o combustível é carvão ou óleo diesel. Embora as
partículas maiores criem um impacto visual pela formação de neblina e consequente redução da
visibilidade, as partículas microscópicas podem ocasionar sérios problemas à saúde devido à sua
inalação pelas pessoas. O método mais comum para remover partículas pequenas é por meio do
precipitador eletrostático. Essa tecnologia vem sendo usada por todo o mundo.
O SO2 é um gás corrosivo, sendo um perigo direto para a saúde humana quando em altas
concentrações, especialmente quando na presença de concentrações altas de particulados. Esse gás
reage com o vapor d'água da atmosfera produzindo ácido sulfúrico que é levado pelo vento a longas
distâncias do local de emissão e contribui para elevar a acidez das chuvas. O SO 2 pode ser removido
das emissões da queima de carvão por meio de vários processos. A tecnologia convencional de
chaminé úmida utiliza uma rocha calcária pulverizada e absorve cerca de 90% do SO2 proveniente
da queima do carvão. Entretanto, o processo é caro, consumindo cerca de 5% da produção de
eletricidade da usina e produzindo grande quantidade de sedimentos.
Outras tecnologias incluem chaminés que recuperam o enxofre para outros usos comerciais e
chaminés secas que usam cal como absorvente para remover de 40 a 60% do SO2, porém a um custo
menor que o das chaminés úmidas. Na combustão em leito fluidizado, o carvão pulverizado ou as
emissões da usina a biomassa são misturados com a rocha calcária e fluidizados por um fluxo
ascendente de ar. Esse processo faz com que a rocha calcária reaja com o SO2 durante a combustão
formando um subproduto seco, reduzindo as emissões em 90%.
O NOX emitido pelas usinas termoelétricas inclui, na maioria, o NO e, em alguns casos, o
NO2. Quantidades adicionais de NO2 são formadas na atmosfera, reduzindo a visibilidade, junto de
outros produtos secundários, como o ácido nítrico e o nitrato de peroxiacetil (PAN), um irritante
dos olhos. O NOX reage com pequenas concentrações de hidrocarbonetos na presença da luz do sol
para formar o ozônio e outros constituintes do smog22 fotoquímico.

22
Smog (smoke e fog) - designa um nevoeiro contaminado por fumaças – poluição amosférica derivada de emissões de
subprodutos de combustão interna, fumos industriais etc., que reagem na atmosfera com a luz solar para formar
poluentes secundários que, por sua vez, se combinam com as emissões primárias formando o smog fotoquímico.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 179

O ácido nítrico, assim como o ácido sulfúrico, pode ser depositado longe da fonte original da
poluição. Esses dois poluentes baixam o pH da chuva, da neblina e da neve. Essa precipitação ácida
ameaça a vida aquática e das plantas tanto diretamente, quanto por meio do maior lixiviamento23
de minerais perigosos, tais como o alumínio. As regulamentações de emissões para controlar tanto
a deposição seca quanto a precipitação ácida, incluindo deposição transfronteira, têm sido
intensamente debatidas na Europa e nos EUA.
As emissões de NOX são controladas pela modificação do processo de combustão ou por
controles pós-combustão. O controle acurado da quantidade de ar para minimizar o excesso durante
a combustão pode reduzir as emissões de NOX de 15 a 50% e novos queimadores de baixa emissão
de NOX, que usam combustão em múltiplos estágios, podem fornecer reduções de 40 a 60%. As
tecnologias de pós-combustão incluem injeção de ureia (reduz 35 a 75% do gás NO X da chaminé),
água e redução catalítica seletiva, que atinge 80 a 90% de remoção de NO X misturando este gás
com amônia.

Gases de efeito estufa

As crescentes emissões atmosféricas de dióxido de carbono aumentaram as preocupações com


a ameaça potencial de mudanças climáticas globais24. A principal fonte de CO2 é a combustão de
combustível fóssil e as companhias elétricas contribuem com cerca de um terço das emissões
globais de CO2. As companhias elétricas que utilizam carvão produzem a maioria das emissões,
pois o carvão produz 24 kg de carbono por GJ de energia, comparado com 20 kg/GJ do óleo
combustível e 14 kg/GJ do gás natural.
De acordo com o Comitê Internacional de Negociação para a Convenção do Quadro sobre
Mudanças Climáticas (INC/FCCC – Framework Convention on Climate Change25), os países
industrializados devem criar comitês voluntários para estabilizar ou reduzir as emissões futuras de
carbono. Para estabilizar a concentração global de CO2 na atmosfera, as emissões dos países em
desenvolvimento também devem ser eventualmente limitadas. Como resultado, várias nações e
esforços multilaterais estão a caminho para identificar as opções de redução de emissões e
desenvolver estratégias nacionais nos países em desenvolvimento. O Brasil, por exemplo, na 15ª
edição da COP26, assumiu um compromisso voluntário de reduzir as emissões nacionais de gases
de efeito estufa entre 36 e 39% até 2020. Já em 2015, na 21ª COP houve a celebração de um acordo
entre 195 nações que se comprometeram a manter o aumento da temperatura média global até 2°C
acima dos níveis pré-industriais e a envidar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C
acima dos níveis pré-industriais. O Brasil se comprometeu a reduzir as emissões de gases de efeito
estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005, em 2025. E, ainda, a reduzir suas emissões em 43%
abaixo dos níveis de 2005, em 2030. Para isso, o país se comprometeu a aumentar a participação de
bioenergia sustentável na sua matriz energética para aproximadamente 18% até 2030, restaurar e
reflorestar 12 milhões de hectares de florestas, bem como alcançar uma participação estimada de
45% de energias renováveis na composição da matriz energética em 2030 e uma redução em 10%
do consumo de eletricidade (United Nations 2015; Brasil 2015).

23
Lixiviação é o processo de extração de uma substância presente em componentes sólidos por meio da sua dissolução
num líquido. É um termo utilizado em vários campos da ciência, tal como geologia, ciência do solo, metalurgia e
química.
24
No Brasil, algumas leis estaduais sobre mudança do clima vêm sendo instituídas visando estabelecer princípios,
objetivos, diretrizes e instrumentos aplicáveis para prevenir e mitigar os efeitos de gases estufas.
25
A redação dessa convenção foi dada em 9 de maio de 1992 na sede das Nações Unidas em Nova York e aberta para
assinatura em junho de 1992 na Cúpula da Terra no Rio de Janeiro (ECO 92 - 154 países, incluindo a Comunidade
Europeia). A Conferência das Partes (COP) é o órgão supremo dessa convenção e se reuniu pela primeira vez no início
de 1995 em Berlim.
26
A 15ª Conferência das Partes ocorreu em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro de 2009.
180 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

As tecnologias mais eficientes e o maior uso de fontes renováveis são componentes-chave de


tais estratégias. Os países industrializados são os maiores responsáveis pela ameaça de mudanças
climáticas existente e possuem, também, a maioria dos recursos financeiros e tecnológicos para o
controle de emissões. O INC/FCCC fornece mecanismos para a transferência desses recursos para
países em desenvolvimento. Esse processo, quando da implementação conjunta, poderia se tomar
uma fonte importante de apoio para as opções de energia limpa e o PIR dá um panorama ideal para
priorizar essas opções. Os relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas), estabelecido desde 1988 pela Organização Meteorológica Mundial e o Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), fornecem informações científicas, técnicas e
socioeconômicas relevantes para o direcionamento de programas gerais de uso sustentável de fontes
energéticas, sobretudo no âmbito político. A despeito de eventuais dados questionáveis, os
programas de GLD e de eficiência energética podem se valer de informações ali contidas.

4.6.2. Contabilidade das emissões e dos impactos ambientais

Para relacionar os impactos ambientais nos ecossistemas e/ou na saúde humana com as
emissões resultantes da operação de uma usina elétrica é necessário uma série de modelos e técnicas
analíticas. A cadeia completa de passos analíticos está além do escopo deste livro. O ponto-chave é
que existem métodos e modelos para traduzir as emissões em impactos e em valores de custo social
e ambiental (pelo menos na teoria). No contexto do PIR, isso significa que o potencial de oferta de
energia ou as opções do lado da demanda podem ser comparados tanto em bases ambientais quanto
como custos econômicos. Se os custos ambientais não podem ser monetizados de forma segura,
estes podem ser considerados proporcionais às emissões e, assim, se pode classificar medidas
diferentes de acordo com seus valores de emissão.
A análise dos custos ambientais, monetizados ou não, requer uma contabilidade consistente
de taxas de emissão. Para o sistema elétrico, a análise e a projeção da demanda, junto da análise do
lado da oferta e a modelagem de custos de produção, fornecem cenários para a instalação e a
operação das estações de geração e outros equipamentos. Cada kWh de eletricidade produzido pode
estar associado a taxas de emissões para cada poluente por meio de um fator de emissão. O fator de
emissão é a relação das emissões de poluentes pela energia produzida ou o combustível consumido,
sendo expresso em unidades de toneladas por unidade de energia, por exemplo t SO2/GWh.
Os coeficientes do fator de emissão podem estar numa base de dados e, quando multiplicados
pelas quantidades de energia, tais como GWh das diferentes fontes de eletricidade, determinam as
emissões totais para cenários num processo PIR. Geralmente, as emissões diretas das usinas
elétricas de potência são a preocupação primária, mas é também possível contabilizar os efeitos
indiretos, como as emissões produzidas em toda a cadeia energética. Tanto os coeficientes do fator
de emissão diretos quanto os indiretos estão incorporados em pacotes de modelos de contabilidade
ambiental, como o Environmental Data Base, que é parte do modelo LEAP largamente utilizado
por instituições acadêmicas e governos 27.

4.6.3. Externalidades

De forma ideal, os custos das emissões ambientais relacionados com a oferta de eletricidade
deveriam ser considerados parte do custo da oferta. A inclusão de tais custos de externalidades

27
O LEAP (Long-range Energy Alternatives Planing System) é uma ferramenta de análise de planejamento energético
e mitigação de efeitos quanto à mudança de clima desenvolvida pelo Stockolm Enviroment Institute. É adotada por mais
de 150 países em agências de governo, consultorias privadas, por acadêmicos e organizações não governamentais. É
um sistema integrado usado para acompanhar a demanda, a produção e os recursos de todos os setores de uma economia,
desde cidades, estados e nações até a avaliação global.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 181

ambientais permitiria fazer uma comparação econômica direta entre tecnologias convencionais e
aquelas mais "limpas", porém mais caras. Em razão das opções de eficiência energética GLD e de
fontes de energia renováveis tenderem a produzir baixas emissões de poluentes, a inclusão de custos
ambientais em uma análise PIR tende a fazer essas opções parecerem mais favoráveis
comparativamente aos custos de oferta que podem ser evitados.
Para um dado combustível e tipo de usina, as emissões são basicamente proporcionais à
quantidade de energia elétrica gerada. A relação é o fator de emissão. Os custos marginais
ambientais, portanto, tendem a complementar o CMO (Custo Marginal de Operação) e sua inclusão
tende a favorecer as medidas GLD que implicam em conservações de energia e menos aquelas
opções de gerenciamento de carga que reduzem a demanda de pico. Os valores do CMO e do CMkWh
podem ser aumentados para incluir os custos ambientais e outras externalidades de acordo com a
equação:
n
CMOex = CMO +  Cem ,i Fem ,i (4.49)
i =1

Onde Cem,i é o custo externo das emissões para o impacto i ($/kg); Fem,i é o fator de emissão
para o impacto i (kg/kWh); n é o número de diferente impactos e:
CMO ex  FRC
CM ex,kWh = (4.50)
kWh
Esses custos externos podem ser valores pagos pelas CEs ou podem ser valores usados para
priorizar e selecionar opções do lado de demanda e de oferta num processo PIR. Experiências na
América do Norte com tais valores mostraram pouco efeito na atividade GLD, mesmo sob uma
estrutura de planejamento regulamentada (Rosenfeld et al. 1995).

4.6.4. Custos das reduções de emissão

Um caminho conveniente para priorizar as opções de redução de emissões, sem o uso de


valores de externalidades ambientais, é analisar e classificar o custo incremental da redução de
emissão resultante de cada opção. Esse procedimento é similar à classificação de custo marginal de
medidas GLD e de oferta, que é uma técnica central no processo PIR. Para determinar os custos das
reduções de emissões, é sempre necessário definir uma referência para que as reduções possam ser
medidas. Assim, tem-se a seguinte expressão para o custo de emissão evitada:
CM kWh,A − CM kWh,B
CAE = (4.51)
MER B − MER A

Onde CAE é o custo de emissões evitadas; CMkWh,A é o custo marginal da energia para a
opção A (opção de redução de emissão); CMkWh,B é o custo marginal da energia para a opção B
(opção de referência); MERA é a taxa de emissão marginal para a opção base A; e MERB é a taxa
de emissão marginal para a opção B.
_____________________________
EXEMPLO 4.1 – Qual é o CAE (NOX) para as seguintes situações:
• Uma nova usina a gás substituindo uma usina a carvão
existente?
• Uma usina eólica substituindo uma usina a carvão?
• Uma usina eólica substituindo uma usina a gás?
182 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Use os dados da tabela a seguir:

Tabela 4-10 – Dados - EXEMPLO 4.13

CMkWh Fator de emissão


Fonte
($/kWh) (t NOX/GWh)
Carvão existente 0,030 11
Nova a gás 0,055 5
Usina eólica 0,067 0

Solução:
• Para a usina a gás como opção A, a base B é a usina a carvão,
então CAE=106kWh/GWh×(0,055–0,030)/(11–5)=$4.167/t.
• Para a usina eólica como opção A, a base B é a usina a carvão,
então CAE=106kWh/GWh×(0,067–0,030)/(11–0)=$3.364/t.
• Para a usina eólica como opção A, a base B é a usina a gás,
então CAE=106kWh/GWh×(0,067–0,055)/(5–0)=$2.400/t.
Os resultados desse tipo de análise são os custos incrementais
das reduções de emissões comparados ao plano de expansão base da
companhia elétrica. No contexto do PIR, os custos GLD são combinados
com os custos marginais de oferta da companhia elétrica (os custos
evitados) e com as reduções potenciais de emissões para determinar
o custo do ponto de vista da companhia elétrica e do GLD como uma
estratégia de redução das emissões.
_____________________________

4.7. CENÁRIOS DE OFERT A E DEMANDA DE ENERGI A

A análise de custo de alternativas de nova oferta de eletricidade e da existente nos permite


classificar essas alternativas segundo seus custos marginais, incluindo os custos sociais e
ambientais, na medida do possível. O próximo passo é comparar esses resultados com os custos
marginais das opções do lado da demanda tratados nos capítulos anteriores. Os dois conjuntos de
opções podem então ser combinados para produzir o plano "integrado" de eletricidade a custo social
mínimo. Como discutido anteriormente, um plano é integrado se, diferentemente do planejamento
tradicional a custo mínimo, ele incluir as opções do lado da demanda, a oferta de produtores
independentes, assim como os custos ambientais e outros impactos sociais de todas as opções
consideradas.
Foram apresentados no Capítulo 1 os passos de um processo de desenvolvimento de um plano
de energia integrado. Conforme citado, uma das hipóteses básicas do PIR é que os benefícios dos
serviços de eletricidade devem ser medidos em termos do serviço de energia fornecido, não
simplesmente pela quantidade de energia vendida. Assim, os cenários são baseados nas projeções
de crescimento dos serviços de energia.
Em seguida, é necessário estabelecer um conjunto de opções integradas, incluindo fontes de
oferta de energia de companhias e produtores independentes, assim como opções de gerenciamento
de carga e eficiência energética. A cada conjunto de opções integradas associamos um cenário de
oferta e demanda.
As opções de oferta e demanda são classificadas de acordo com seus custos marginais, o que
permite desenvolver uma função de custo marginal integrada, ou "curva de oferta", de serviços de
energia em um dado ano futuro. Os recursos disponíveis e suas relativas classificações dependem
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 183

dos existentes, das novas opções consideradas, do horizonte de tempo, da taxa de crescimento
econômico, dos serviços energéticos, da taxa de desconto e outros parâmetros econômicos e do uso
de valores de custo ambiental e externalidades.
Além disso, o plano de eletricidade integrado deve ter uma avaliação política, financeira,
análise de sensibilidade e planejamento de implementação antes que o plano final possa ser
completado. A incorporação dessas questões pode reordenar a classificação do plano integrado ou
excluir certos recursos do plano. Esses passos vão além do escopo do presente trabalho, embora as
questões relevantes tenham sido levantadas e discutidas em vários pontos nos capítulos anteriores.

4.7.1. Definição de cenários e o cenário de referência

Como discutido nos Capítulos 1 e 2, a análise de cenário é um caminho para comparar as


alternativas de combinações de opções tecnológicas para fornecer o mesmo nível de serviço de
energia. Os cenários podem ser definidos e diferenciados de acordo com:
• O nível de crescimento do serviço de energia projetado (por exemplo: alto, médio, baixo);
• O grau de implementação das melhorias de eficiência energética (por exemplo: cenários
de eficiência congelada, cenário "potencial técnico", cenário GLD etc.);
• A estratégia aplicada de oferta de energia (por exemplo: mínimo custo, mínimas emissões,
alta participação de renováveis etc.).
Um ou mais cenários de referência servem de ponto inicial para a análise de melhorias de
eficiência energética. Como apresentado nos Capítulos 2 e 3, outros cenários podem descrever
vários níveis de melhoria em eficiência de energia para um mesmo nível de demanda por serviços
de energia. Um ponto inicial poderia ser um cenário no qual a intensidade de energia é reduzida
para o nível da média dos equipamentos novos no ano base. Isso é o cenário "congelado" ou a
"eficiência dinâmica congelada", na qual o custo marginal das melhorias de eficiência é zero ou
negativo e tais melhorias não são implementadas após o ano de referência. Esse cenário, ou um que
reflita o custo marginal limite de zero para medidas de eficiência de energia, poderia representar as
tendências existentes em melhorias de eficiência energética. As tendências atuais que seriam
esperadas sem mudanças políticas ou novos programas da companhia elétrica podem ser usadas
para descrever um cenário de referência.

Figura 4-10 – Relacionamento entre cenários de energia bottom-up e custos marginais

Cenários adicionais poderiam refletir aumento das penetrações das tecnologias de eficiência
energética por meio de GLD ou outros programas, ou escolhas de diferentes recursos de oferta. Dos
cenários possíveis, pode-se identificar um cenário de custo mínimo, onde os aumentos na oferta de
eletricidade custariam mais que os aumentos de conservação por meio da eficiência de energia e
vice-versa (ver Figura 4-10). Com uma faixa complexa de opções, podem ser usados modelos de
184 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

otimização lineares para ajudar a identificar o sistema de energia a custo mínimo. Outros cenários
poderiam ilustrar casos nos quais a pesquisa e o desenvolvimento tornam disponíveis novas ofertas
ou a eficiência energética e estes penetram o mercado o bastante para mudar a combinação de oferta
de energia, emissões e custos.
O gráfico do lado esquerdo da Figura 4-10 ilustra o desenvolvimento do uso de energia sobre
o ano base do estudo e mostra cinco cenários com diferentes níveis de energia de demanda para o
ano final do estudo. Note que todos os valores se aplicam para um dado ano. O lado direito da
Figura 4-10 ilustra a curva de oferta de eficiência de energia. Esta é construída do nível de
eficiências congeladas do ano base. Ela começa com as medidas de custos negativos, que são as
medidas que reduzirão os custos da obtenção de serviços de energia. A demanda de serviço de
energia que não é atendida pelas medidas de eficiência de energia do uso final deve ser obtida pelas
opções de oferta.

4.7.2. Combinando opções de GLD e recursos de oferta

O objetivo do PIR é atingir a demanda de serviços energéticos com a combinação de recursos


disponíveis que minimizem os custos totais necessários. O método básico para a seleção de recursos
de energia dos lados da oferta e da demanda em um plano integrado é combinar as curvas de custo
marginal para cada tipo de recurso em uma curva de custo marginal integrada, que forneceria, então,
uma classificação de todos os tipos de recursos disponíveis. Para um dado nível de demanda por
serviços de energia, o plano a custo mínimo explora as menores opções de custo marginal até o
ponto onde sua energia total e capacidade de potência atinjam a demanda (ver Figura 4-10). Na
prática, algumas companhias elétricas têm conduzido seus processos PIR de um modo sequencial,
primeiro otimizando a seleção de recurso do lado da demanda ou da oferta e depois ajustando os
resultados para incluir os outros tipos de recursos. Entretanto, integrações simultâneas de todos os
recursos mostraram ser um caminho mais efetivo para identificar soluções de custo mínimo (Hill,
Hirst, and Schweitzer 1992).
Existem muitas complicações para se encontrar a função de custo marginal integrada e a
solução resultante a custo mínimo. As complicações mais evidentes são as resultantes das interações
entre as opções e os diferentes horizontes de planejamento dos sistemas de oferta e demanda. O PIR
deve considerar tanto a dinâmica da penetração de eficiência energética como o tempo de
construção e operação das opções de oferta. As tecnologias de uso final deveriam ser
cuidadosamente integradas com o plano de oferta, por exemplo, para se certificar de que as
demandas elétricas de pico sejam atingidas. Finalmente, o processo PIR deve incluir a seleção de
programas de implementação apropriados, abrangendo políticas governamentais e programas de
companhia elétrica para atingir a conservação de energia necessária.
As interações entre as opções podem levar a retornos tanto positivos como negativos. Do lado
da demanda, por exemplo, a substituição da iluminação fluorescente por iluminação LED nas
construções comerciais tende a ampliar a conservação de energia de iluminação e a redução da carga
de resfriamento (interação positiva). As melhorias na estrutura da construção podem cortar em 50%
as necessidades de energia para aquecimento, ventilação e ar condicionado (HVAC28), como podem
melhorar a eficiência do sistema HVAC. Essas duas medidas adotadas conjuntamente, entretanto,
podem reduzir as necessidades de condicionamento ambiental de 70 a 80%, não em 100%, que seria
a soma das conservações individuais das medidas (interação negativa). Do lado da oferta, a presença
dos recursos hidroelétricos existentes pode influenciar a prioridade do despacho e, portanto, o fator
de capacidade e os custos marginais de alguns recursos potenciais novos (interação positiva ou
negativa).

28
HVAC – Heating, Ventilation and Air Conditioning.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 185

4.7.3. Classificando as opções de recurso pelo custo marginal

Um exemplo simplificado de um conjunto de recursos de oferta de eletricidade e GLD é dado


na Tabela 4-4. Essa tabela mostra a capacidade de produção máxima, o fator de capacidade anual e
a produção de energia para cada usina, além dos parâmetros de custo marginal e as taxas de emissão
para dois poluentes. O parâmetro de custo variável inclui o combustível e outros custos variáveis
para produzir cada kWh adicional de eletricidade (i.e., o CMO). O parâmetro de custo fixo inclui
os custos anuais de capital, assim como os custos operacionais anuais fixos para cada kW de
capacidade (i.e., o CME anual).
A lista de recursos inclui novas opções de oferta e GLD, assim como usinas existentes. Supõe-
se que todos os recursos existentes estarão em serviço pelo menos durante o horizonte do
planejamento e que os novos recursos são necessários somente para atingir a demanda por novos
serviços de energia. Na prática, também é possível que alguns recursos existentes possam ser
desativados e necessitem de substituição durante o período de planejamento, ou que seja feita a
reforma de usinas mais velhas para aumentar seu tempo de vida útil.

Tabela 4-11 – Conjunto de exemplos de recursos e seus parâmetros

Tipo de usina Capac. Fator de GWh CMO CME Emissões Emissões


e opção GLD (MW) capac. anual ($/kWh) ($/kW-ano) (t SO2/GWh) (t NOX/GWh)
Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,50 5.256 0,020 0 0,0 0
Usina a gás 600 0,50 2.628 0,040 0 0,0 6
Usina a carvão 420 0,75 2.759 0,030 0 5,0 11
Usina a carvão
400 0,75 2.628 0,040 50 0,5 12
recondicionada
Novas
Usina a gás 200 0,75 1.314 0,035 130 0,0 5
Usina a carvão 200 0,75 1.314 0,030 150 5,0 10
Usina a carvão
200 0,75 1.314 0,040 180 0,5 11
com filtro
GLD 1 375 0,40 1.314 –0,001 100 0,0 0
GLD 2 750 0,20 1.314 –0,001 100 0,0 0
Usina eólica 500 0,30 1.314 0,010 150 0,0 0
Turbinas de
50 0,15 66 0,050 60 0,0 7
combustão
Gerenciamento
100 –0,05 –44 50 0,0 0
de carga

O valor de custo fixo marginal (CME anual) é praticamente zero para usinas que já foram
construídas (usinas existentes, exceto a usina a carvão que foi recondicionada) e, em tal caso, os
custos de capital estão amortizados e os custos operacionais fixos devem ser pagos sem considerar
o quanto a usina está produzindo (isso é uma simplificação; na prática alguns custos fixos poderiam
ser evitados se a usina fosse retirada de serviço). É importante notar, entretanto, que esses custos
ainda existem e fazem parte dos rendimentos totais requeridos pela companhia elétrica, devendo ser
recuperados pelas tarifas de eletricidade pagas pelos consumidores. Enquanto as tarifas são
baseadas geralmente nos custos médios, a seleção de novos recursos está baseada nos custos
marginais.
186 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Somado aos recursos existentes e às novas ofertas potenciais, três opções GLD são dadas:
dois programas de eficiência energética e um programa de gerenciamento de carga 29. Os parâmetros
de desempenho para essas opções são diferentes das opções do lado da oferta. Uma vez que os
programas de eficiência energética não são despacháveis, seu fator de capacidade (Fcap) não é
verdadeiramente comparável com aqueles das opções de oferta, sendo simplesmente o fator de carga
da demanda que seria reduzido. Seus custos variáveis são baseados na definição de custo total de
recurso (CTR) e são negativos por causa do potencial de reduzir os custos dos consumidores. Os
rendimentos perdidos não são contados como custo de GLD sob a definição CTR. Para a opção de
gerenciamento de carga, a contribuição de energia anual e o fator de capacidade são negativos,
porque essa opção consome uma pequena quantidade de energia enquanto reduz a carga de pico.
Os custos marginais do conjunto de recursos considerados são mostrados na Tabela 4-12. A
primeira coluna mostra o custo marginal CMkWh, que é a soma dos custos fixos e variáveis anuais,
incluindo os custos anuais de capital, normalizados por kWh de energia produzida ou conservada.
Esses valores são obtidos com a Eq. (4.25).

Tabela 4-12 – Parâmetros de custo marginal para um conjunto de modelos de recursos

Custo Custo de SO2 Custo de NOX


Tipo de usina e marginal evitado ($/t) evitado ($/t)
opção GLD CMkWh vs. nova vs. carvão vs. nova vs. carvão vs. gás existente
$/kWh a carvão existente a carvão existente (NOx)
Existentes
Hidroelétrica 0,020
Usina a gás 0,040
Usina a carvão 0,030
Usina a carvão
0,048
recondicionada –1.160 3.913 2.610 –17.610 –1.268
Novas
Usina a gás 0,055 391 4.957 391 4.131 14.787
Usina a carvão 0,053 22.831 –3.208
Usina a carvão
0,067
com filtro 3.237 8.311 –14.566 –5.479
GLD 1 0,028 –5.058 –492 –2.529 –224 –2.077
GLD 2 0,056 649 5.216 325 2.371 2.680
Usina eólica 0,067 2.849 7.416 1.425 3.371 4.513
Turbinas de
0,096
combustão 8.566 13.132 14.277 16.416 –55.662

_____________________________
EXEMPLO 4.14 – Reproduza os valores CAE de SO2 e NOx de cada um
dos recursos novos e recuperados (usina a carvão recondicionada)
indicados na Tabela 4-12. Utilize a (Eq. 4.53) para o cálculo dos
custos de emissões evitadas e use como referência:
• Usina nova a carvão;
• Usina a carvão existente;
• Usina a gás existente.
_____________________________

29
Os programas GLD dados neste exemplo são hipotéticos. A maioria dos programas reais são menores em proporção
aos demais dados. Para atingir um impacto tão grande quanto mostrado neste exemplo, normalmente seria necessário
agregar diversos programas menores, cada um com seus próprios custos e impactos.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 187

Do ponto de vista do custo marginal por unidade de energia produzida ($/kWh), os recursos
mais baratos são os da oferta existente, que têm custos de capital zero, e a opção GLD 1, que tem
custos variáveis insignificantes. Os recursos mais caros incluem turbinas de combustão com seus
altos custos de combustível, a usina eólica com alto custo de capital e baixo fator de capacidade e a
nova usina a carvão com filtro para remover as emissões de SO 2. Embora a usina a carvão
recondicionada já exista, o custo de capital para adicionar um equipamento removedor de emissão
aumenta seus custos marginais fixos.
A Tabela 4-13 mostra os custos marginais e as emissões tanto do SO2 quanto do NOX.. Os
custos das emissões reduzidas devem ser relativos a uma opção de referência, isto é, algum recurso
que está no plano existente e que produza o tipo de emissão a ser reduzida. Tanto as usinas a carvão
existentes quanto as novas emitem SO2 e o NOX é emitido por usinas a carvão e usinas a gás. Assim,
substituir usinas a carvão por opções alternativas pode reduzir as emissões de SO 2 enquanto
substituir as usinas a gás ou a carvão pode reduzir NOX.

Tabela 4-13 – Desempenho para a combinação a custo-mínimo dos recursos

Custo mínimo integrado CMkWh Energia gerada Emissões Emissões


MW
(Caso 0 – Referência) $/kWh GWh t SO2 t NOX
Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256 0 0
Usina a gás 600 0,040 2.628 0 15.768
Usina a carvão 420 0,030 2.759 13.797 30.353
Novas 0 0
Usina a carvão 200 0,053 1.314 6.570 13.140
GLD 1 375 0,028 1.314 0 0
Total ou média ponderada 2.795 0,030 13.271 20.367 59.261

Para opções alternativas com menores emissões, a diferença no custo marginal por kWh
dividido pela diferença nas emissões por kWh dá o custo das emissões evitadas (CAE) – ver Eq.
(4.51). A opção GLD 2 e as novas usinas a gás têm os menores valores CAE, devido a seus baixos
custos de capital. A opção GLD 1 realmente tem um CAE negativo, porque seu custo marginal total
é menor que aquele das usinas a combustível fóssil existentes. É mais caro reduzir emissões
comparadas com uma usina a carvão existente do que uma usina a carvão nova, porque as duas
usinas têm taxas de emissão similares e a nova usina tem custos marginais significativamente mais
altos – CMkWh,B na Eq. (4.51).
A combinação a mínimo custo desses recursos é dada na Tabela 4-13, junto das suas
capacidades resultantes e contribuições de energia, custos marginais e emissões. Essa lista de
recursos é determinada por:
• Classificação das fontes em ordem do custo marginal; e
• Seleção dos recursos menos caros até que suas energias totais e capacidade sejam
suficientes para atingir a demanda projetada.
Na Tabela 4-13, supomos uma demanda de 13 TWh por ano, com uma demanda de pico de
2.600 MW e um fator de carga de 57%. As usinas existentes, a opção GLD 1 e a usina nova a carvão
(sem filtros) têm os menores custos marginais. Quando a usina nova a carvão é somada à lista, a
energia e a capacidade total excedem a demanda projetada. O custo marginal é aquele da nova usina
a carvão ($0,053/kWh), mas o custo médio ponderado é somente de $0,03/kWh, devido às opções
menos caras de GLD e de oferta existente.
Note que a ordem de despacho, ou a prioridade de operação de cada unidade, depende do
custo variável em lugar do custo marginal total, que governa a escolha de nova capacidade e que
188 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

inclui os custos fixos dos novos recursos. Assim, as usinas com os menores custos variáveis seriam
operadas tanto quanto possível. A opção GLD 1 não é despachável, assim ela deve ser tratada como
uma redução na carga projetada.
Segundo o despacho econômico, o baixo custo variável da usina hidroelétrica faz com que
esta seja operada em um regime que maximize sua produção, dependendo de seus níveis de
reservatório. O padrão diário de operação para uma usina hidroelétrica poderia ser o de acompanhar
a carga, isto é, respondendo às variações na demanda. As usinas a carvão, geralmente, seriam
acionadas como carga de base e trabalham o tanto quanto possível devido a seus baixos custos
variáveis. Devido ao fato de que a demanda total excede a usina a gás com os maiores custos
variáveis, não será operada a plena carga, mas será um recurso de carga de pico ou intermediária
fornecendo reserva marginal adicional. Assim, sua produção anual seria menor que o valor máximo
mostrado na Tabela 4-13.
A Tabela 4-14 a seguir mostra o sistema não integrado, isto é, a combinação a mínimo custo
somente dos recursos de oferta, de acordo com a metodologia de planejamento convencional. A
diferença entre as duas soluções é que o plano integrado inclui a opção GLD 1, enquanto o plano
não integrado simplesmente adiciona uma segunda unidade de nova usina a carvão (com capacidade
de produção igual ao GLD 1). Embora o custo marginal seja o mesmo que o do plano integrado, o
custo médio é $0,33/kWh, cerca de 8% maior. As emissões de SO2 são aumentadas em mais de
30% e as de NOX em mais de 20%.

Tabela 4-14 – Desempenho para a combinação a custo-mínimo dos recursos – oferta

Custo mínimo não Custo marginal Energia


MW Emissões t SO2 Emissões t NOX
integrado $/kWh GWh
Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256 0 0
Usina a gás 600 0,040 2.628 0 15.768
Usina a carvão 420 0,030 2.759 13.797 30.353
Novas 0 0
Usina a carvão 1 200 0,053 1.314 6.570 13.140
Usina a carvão 2 200 0,053 1.314 6.570 13.140
Total ou média ponderada 2.795 0,033 13.271 26.937 72.401

4.7.4. Medidas de reduções de emissões pelo custo de emissões conservadas

O PIR deve incluir um critério adicional ao lado dos custos econômicos, como discutido nos
capítulos anteriores. Por definição, reduzir emissões de um plano a mínimo custo aumenta os custos
do sistema. Entretanto, muitas vezes reduzir as emissões de um plano não integrado, como o
mostrado na Tabela 4-14, para um plano integrado a mínimo custo, mostrado na Tabela 4-13, pode
também reduzir custos.
Os seguintes casos mostram situações em que se quer reduzir emissões de alguns poluentes
que têm origem no setor elétrico utilizando a metodologia PIR. As medidas de redução de emissões
a custo mínimo são identificadas segundo seus valores CAE – Eq. (4.51). O sistema resultante a
custo mínimo, considerando uma restrição de 30% nas emissões de SO 2 comparadas ao caso de
referência (sistema integrado, de 20.000 t/ano para < 14.000 t/ano), está mostrado na Tabela 4-15.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 189

Tabela 4-15 – Desempenho para um sistema integrado de custo-mínimo com 30% de redução de SO2

30% de redução de SO2 MW $/kWh Energia GWh Emissões t SO2


Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256
Usina a gás 600 0,040 2.628
Usina a carvão 420 0,030 2.759 13.797
Novas
Usina a gás 200 0,055 1.314
GLD 1 375 0,028 1.314
Total ou média ponderada 2.795 0,030 13.271 13.797

Os resultados correspondentes para uma redução de emissão de SO 2 de (mais de) 90% (<
2.000 t/ano) estão na Tabela 4-16. Começando por um sistema de custo mínimo como o caso de
referência, são feitas modificações para selecionar a opção com o menor CAE por SO 2. Esse valor
corresponde a uma usina nova a gás substituindo uma usina nova a carvão, em relação ao sistema
integrado da Tabela 4-13.

Tabela 4-16 – Desempenho para um sistema a custo mínimo com 90% de redução de SO2

90% de redução de SO2 MW $/kWh Energia GWh Emissões t SO2


Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256
Usina a gás 600 0,040 2.628
Usina a carvão recondicionada 400 0,048 2.628 1.314
Novas
Usina a gás 200 0,055 1.314
GLD 1 375 0,028 1.314
Total ou média ponderada 2.775 0,034 13.140 1.314

Pelo fato de a capacidade e a produção anual dessas duas usinas serem comparáveis, a usina
a gás pode ser substituída por uma usina a carvão no plano. O resultado é que a demanda será
atingida com 30% a menos de emissões e com custos um pouco maiores. Como no caso de
referência (Tabela 4-13), sob uma prioridade de despacho econômico, a usina a gás existente tem o
maior custo variável e seria operada com capacidade total menor. Entretanto, se a prioridade de
despacho é mudada para o despacho ambiental, a usina com a maior taxa de emissão, neste caso a
usina a carvão existente, seria a usina marginal operada com capacidade total menor.
Para reduzir as emissões em 90%, o primeiro passo é novamente substituir a nova usina a
carvão pela nova usina a gás. A medida seguinte mais barata mostrada na Tabela 4-12 é a opção de
GLD 2, substituindo a usina a carvão nova, mas que pode não ser selecionada, porque a nova usina
a carvão já foi substituída pela nova usina a gás. A próxima opção deve ser escolhida entre aquelas
que podem substituir a usina a carvão existente. Essas opções incluem a usina a carvão
recondicionada, que pode somente substituir a usina a carvão existente, e essa medida tem o CAE
marginal mais baixo que a opção GLD 2, a próxima opção mais barata. Note que, embora a usina a
carvão recondicionada tenha um custo marginal mais baixo que a nova usina a gás, essa é uma
medida de redução de emissão mais cara porque ela substitui uma opção muito mais barata, a usina
a carvão existente. Nesse caso, a usina a carvão recondicionada é a usina marginal, baseada no
critério de despacho econômico ou de despacho de emissões. A adição dessa medida cara leva a um
aumento significante (cerca de 12%) nos custos totais do sistema.
190 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Resultados similares estão mostrados na Tabela 4-17 e na Tabela 4-18 para o caso da redução
de emissões de NOX de 20 e 60%, respectivamente. Em relação à Tabela 4-13, entretanto, como as
taxas de emissões de NOX não são reduzidas tão facilmente pela troca do carvão pelo gás, a
metodologia de custo mínimo para redução de emissão de NO X é diferente daquela para SO2. A
Tabela 4-12 mostra que a opção de redução de emissão de NOX a custo mínimo é a substituição da
nova usina a carvão pela opção GLD 2. Só essa opção reduz as emissões de NOX em mais de 20%
(de 59.000 t/ano para 46.000) e atende à demanda projetada com custos levemente mais altos. Nesse
caso, como naquele das reduções de 30% de SO2, a usina a gás existente é a usina marginal sob o
despacho econômico e a carvão existente se torna a usina marginal sob o despacho de emissões.
Com a nova usina a carvão já retirada das opções consideradas, o próximo menor CAE
comparado com a usina a carvão existente seria a usina eólica. Como a usina eólica não produz
energia suficiente para substituir completamente a usina a carvão, deve-se passar para a próxima
opção, que é a nova usina a gás. Essas duas opções juntas podem substituir a usina a carvão existente
em termos de capacidade e produção anual e a redução de emissões ultrapassar os 60% (para 22.000
t/ano). Essa solução significa que a capacidade atual, com seus custos já embutidos, seria fechada
e substituída por duas novas fontes de geração (ver Tabela 4-18).
Como consequência, o custo total aumenta em mais de 20%. Tanto para o caso da redução de
emissão em 60% de NOX, como no caso da redução de 90% de SO2 a usina a gás existente é a usina
marginal sob o critério de despacho econômico e no de despacho de emissões. Note que a
capacidade total nesses dois casos é mais alta que no caso de referência. Isso indica que algumas
usinas, tais como a hidroelétrica, seriam operadas no tempo com um fator de capacidade menor,
seguindo de perto o padrão diário das flutuações de carga.

Tabela 4-17 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 20% de redução de NOX

20% de redução de NOX MW $/kWh Emissões t NOX Energia GWh


Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256
Usina a gás 600 0,040 15.768 2.628
Usina a carvão 420 0,030 30.353 2.759
Novas
GLD 1 375 0,028 1.314
GLD 2 750 0,056 1.314
Total ou média ponderada 3.345 0,030 46.121 13.271

Os resultados mostrados para reduzir a emissão de NOX são similares àqueles que se
encontraria para analisar a emissão de CO2. Os fatores de emissões relativos são semelhantes para
os dois poluentes, pois o gás natural emite cerca de 60% de CO2 por unidade de energia comparado
com o carvão (comparado com os 50% de redução de NOX). Os GLDs e as fontes renováveis têm
emissões insignificantes.

Tabela 4-18 – Desempenho para um sistema integrado a custo mínimo com 60% de redução de NOX

60% de redução de NOX MW $/kWh Energia GWh Emissões t NO2


Existentes
Hidroelétrica 1.200 0,020 5.256
Usina a gás 600 0,040 2.628 15.768
Novas 0
Usina a gás 200 0,055 1.314 6.570
GLD 1 375 0,028 1.314
GLD 2 750 0,056 1.314
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 191

Usina eólica 500 0,067 1.314


Total ou média ponderada 3.625 0,037 13.140 22.338

4.7.5. Inclusão de custos de emissões nos custos marginais

Outra metodologia para análise e planejamento da redução de emissões a custo mínimo é


aplicar os valores monetários para as emissões e usar os valores resultantes para determinar a
combinação de recursos com o menor custo total, incluindo as cargas de emissão – Eq. (4.49).
Conforme discutido anteriormente, as CEs podem pagar impostos pelas quantidades de suas
emissões, o que implicará em maiores custos de produção de eletricidade. Pode-se também
simplesmente adicionar novos custos sobre emissões na análise do PIR para refletir os objetivos
ambientais conforme critério adotado. Essas seriam algumas maneiras para internalizar custos de
emissões nos processos de decisões.

_____________________________
EXEMPLO 4.15 – Recalcule os custos marginais para cada usina
mostrada na Tabela 4-11, usando uma carga de emissão de:
• Dois níveis de SO2 ($600/t SO2 e $4500/t SO2);
• Dois níveis de NOx ($600/t NOX e $4500/t NOX);
• Um nível combinado de SO2 e NOX ($3000/t SO2 e $2000/t NOX)

Solução
A Tabela 4-19 a seguir mostra os custos marginais totais do
conjunto das opções, incluindo custos de emissão baseada em dois
níveis de custos para emissão de SO2, dois níveis para NOX e um
plano combinado de custos para SO2 e NOX.

Tabela 4-19 – Custos marginais ($/KWh) incluindo os custos de emissão

Custos marginais ($/kWh)


$3.000/t SO2
Recursos $600/ $600/ $4.500/
($/kWh) $4.500/t SO2 e $2.000/
t SO2 t NOX t NOX
t NOX
Existentes
Hidroelétrica 0,020 0,020 0,020 0,020 0,020 0,020
Usina a gás 0,040 0,040 0,040 0,044 0,067 0,052
Usina a carvão 0,030 0,033 0,053 0,037 0,080 0,067
Carvão
recondicionada 0,048 0,048 0,050 0,055 0,102 0,073
Novas
Usina a gás 0,055 0,055 0,055 0,058 0,077 0,065
Usina a carvão 0,053 0,056 0,075 0,059 0,098 0,088
Usina a carvão
com filtro 0,067 0,068 0,070 0,074 0,117 0,091
GLD 1 0,028 0,028 0,028 0,028 0,028 0,028
GLD 2 0,056 0,056 0,056 0,056 0,056 0,056
Usina eólica 0,067 0,067 0,067 0,067 0,067 0,067
Turbinas a
combustão 0.096 0,096 0,096 0,100 0,127 0,110

Com os custos de emissão suficientes para atingir as reduções


analisadas anteriormente (Tabela 4-15 a Tabela 4-18), os resultados
192 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

com as cargas de emissões deveriam ser os mesmos em termos das


opções de recursos selecionados. Por exemplo, uma taxa de emissão
de $600/t SO2 causa uma sobreposição do custo da nova usina a carvão
sobre o custo da usina nova a gás. Assim, a usina a gás substitui
a usina a carvão no plano, levando à redução de emissões de 30%
mostrada na Tabela 4-15.
_____________________________
Com essa abordagem, ainda é possível considerar outros critérios para realizar o despacho
baseados mais em fatores ambientais do que no simples critério de despacho econômico. Entretanto,
os custos de emissão de $600/t SO2 não aumentam os custos variáveis da usina a carvão existente a
ponto de serem maiores que o custo da usina a gás existente. Para essas usinas existentes, os custos
variáveis representam praticamente todo o custo marginal. Assim, a usina a carvão ainda seria
despachada antes da usina a gás, de acordo com o critério de despacho econômico que inclui os
custos de emissões. A Tabela 4-19 mostra que se os custos são aumentados para $4.500/t SO2, a
usina a carvão recondicionada se torna mais barata que a usina a carvão existente, o mesmo
resultado mostrado na Tabela 4-16 para o plano a mínimo custo para reduzir as emissões de SO2
em 90%. Resultados semelhantes são obtidos para a redução de emissão de NOX. Ainda na Tabela
4-19, o custo de emissão de $600/t NOX aumenta tanto o custo da nova usina a carvão como da
nova usina a gás em relação ao custo da opção GLD 2. Assim, a opção GLD 2 seria preferida no
novo plano, levando a reduções de emissões de 20%, como mostrado na Tabela 4-17. Se o custo é
$4.500/t NOX, a usina eólica e a nova usina a gás se tornam mais baratas que a usina a carvão
existente, o mesmo resultado mostrado na Tabela 4-18 para o plano a custo mínimo para reduzir a
emissão de NOX de 60%.
Os custos de emissão mostrados na Tabela 4-19 foram selecionados para atingir as mesmas
reduções que as mostradas da Tabela 4-15 a Tabela 4-18. Taxas diferentes resultariam em soluções
diferentes e níveis de emissão mais altos ou mais baixos. Por exemplo, um plano combinado de
custos para SO2 e NOX é mostrado na Tabela 4-19 e a solução para esse caso é essencialmente a
mesma de 60% de reduções de NOX mostrado na Tabela 4-18.
Com os custos de emissões incluídos, a usina a carvão existente tem o mesmo valor de custo
total que a usina eólica, mas ela não é selecionada porque somente metade da sua capacidade de
produção de energia é necessária. Note que em uma análise dinâmica mais complexa ao longo de
diversos anos, a usina a carvão pode ser favorecida especialmente se o crescimento da carga é
rápido. Embora a combinação da usina eólica e da nova usina a gás seja menos cara (incluindo os
custos de emissão) que a usina a carvão existente, a diferença é dramática em termos de emissão de
NOX e especialmente de SO2.

4.7.6. Escolha da opção pelo c usto de redução de emissão

Os exemplos citados são simples o suficiente para que o plano integrado a mínimo custo possa
ser identificado imediatamente. Se a lista de alternativas fosse muito maior e mais complexa, por
exemplo, envolvendo passos de operações de uma usina (com variações no seu fator de capacidade
mínimo e máximo) ou muitas opções individuais GLD, seria necessária uma metodologia mais
sofisticada para a solução do problema. Modelos de otimização mais complexos podem ser
aplicados com a função objetivo minimizando os custos, isto é, os rendimentos requeridos como
nas Eqs. (1.7) e (4.2). Tais modelos podem ser usados para achar soluções sob outro critério, por
exemplo, a redução de emissões a um dado nível enquanto se minimizam os custos totais.
Modelos de otimização podem ser difíceis para a construção de cenários que não são os ótimos
de acordo com um critério específico, como um sistema a mínimo custo. Por exemplo, os casos de
redução de emissão analisados requereriam a imposição de restrições adicionais em um modelo de
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 193

otimização ou a inclusão de custos de emissões (ou preços sombra) para forçar o modelo a achar
um cenário ótimo de baixa emissão. A teoria das técnicas de otimização indica que num ponto ótimo
os efeitos marginais de algumas das cargas possíveis deveriam ser iguais. Em termos econômicos,
os custos marginais dos diferentes tipos de medidas – por exemplo, para fornecer serviços de energia
ou emissões reduzidas – deveriam ser iguais para um conjunto de medidas para ser a solução de
mínimo custo.
Quando é dado um critério específico, como por exemplo a quantidade de emissão permitida
ou um determinado nível de custo de emissão, pode-se analisar o efeito de uma faixa de valores
possíveis. Uma aplicação desse tipo de análise é a construção da curva de custo marginal de redução
das emissões. Modelos de otimização podem ser usados nesse caso se for possível variar por
incrementos os valores das restrições da função objetivo para produzir uma série de soluções com
diferentes níveis de emissões. Para cada nível de emissão, a solução ótima pode ser comparada em
termos de custos do sistema. Resultados similares também podem ser obtidos usando os métodos
simples mostrados aqui, baseados na classificação das medidas de acordo com seus valores CAE
requeridos.
A Eq. (4.51) indica que o CAE é baseado nas diferenças, tanto em termos de custos como de
emissões, entre a opção de redução (A) e o caso de referência (B). Isso significa que caso os custos
e emissões mudem de uma opção para a outra, o valor de referência correspondente também pode
mudar. Por exemplo, se calcularmos o CAE por redução de emissão de NO X, seriam comparados
os custos do GLD das novas usinas a gás e eólicas com aqueles dos recursos marginais e se
classificariam as medidas de acordo com os valores CAE mostrados na Tabela 4-15. Portanto,
quando se considera um plano que exija múltiplas medidas para atingir um nível de redução, não se
pode usar a mesma referência para todas as medidas sucessivas. Mais exatamente, o CAE marginal
depende da ordem em que as medidas são consideradas. Por exemplo, a nova usina a gás possui um
CAE de $391/t NOX comparado ao recurso marginal, a nova usina a carvão (ver Tabela 4-12). Mas
se a usina a carvão é substituída por medidas com um CAE menor, então a nova usina a gás deve
ser comparada a uma nova referência, a usina a carvão existente, contra a qual possui um CAE
muito maior ($4.131/t NOX). Caso se necessite de reduções posteriores após a usina a carvão
existente ter sido substituída, a usina a gás existente se torna a usina de referência e o CAE marginal
aumenta para $14.787/t NOX. Esse é um processo dinâmico de reduções das emissões.

4.7.7. Estimando impactos nas tarifas de eletricidade

Na análise apresentada até agora, os custos são estimados de acordo com a definição de custo
total do recurso. Essa metodologia minimiza os custos do sistema, mas não minimiza
necessariamente as tarifas de eletricidade. Como foi discutido no Capítulo 2, as medidas GLD
podem reduzir mais as vendas e os rendimentos da CE que seus custos, aumentando assim as tarifas.
Tais medidas de GLD são economicamente atraentes com a definição de custo total do recurso, mas
não são pelas medidas de taxa de impacto de custo-efetividade, que se pauta mais nas taxas que nos
custos totais. Desse modo, uma combinação de recursos que satisfaça o teste do custo total do
recurso pode não cumprir o teste RIM (Rate Impact Measure) visto no Capítulo 2.
O conceito-chave usando a definição de custo total do recurso é o tratamento dos serviços de
energia como um produto em lugar de uma mercadoria gerada e vendida em MWh. Fazendo uma
análise em bases dos serviços de energia, torna-se possível comparar a energia ofertada e a energia
demandada em bases comuns. Entretanto, energia conservada não é vendida da mesma forma que
a eletricidade. Idealmente, seus custos e rendimentos perdidos deveriam ser recuperados dos
mesmos consumidores ou, pelo menos, da mesma classe de consumidor na qual a conservação
ocorre. Esse não é o caso frequente e os custos podem ser recuperados por meio da tarifa geral base.
194 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

Embora as tarifas para diferentes consumidores variem e possam envolver fórmulas


complexas, a tarifa média da companhia elétrica é, simplesmente, o valor que permite a esta
recuperar seus custos totais de suas vendas, isto é, o custo médio da eletricidade.
custo total anual ($/ano) P ( R )  FRC
Tarifa média = = 8760
 L( h)
eletricidade vendida por ano (kWh/ano) (4.52)
h =1

Substituindo na Eq. (4.7), resulta:


n I (t ) + C
 comb (t ) + C var (t ) + C fixo (t ) 
FRC R0 +  
 t =0 (1 + r ) t 
Tarifa média = 8760
(4.53)
 L ( h) h =1

Onde n é o tempo de vida útil do sistema de fornecimento; e L(h) é quantidade da energia


horária vendida. Para cada recurso a contribuição para o custo total (rendimentos requeridos) é
composta dos termos do custo operacional Ccomb(t) e Cvar(t) e pelos termos de expansão I(t) e Cfixo(t).
Esses mesmos termos constituem os custos marginais de cada recurso incremental. Os custos
marginais (CMkWh) de um plano de expansão de um dado ano podem ser somados e adicionados
aos custos fixos dos recursos existentes naquele período para fornecer uma estimativa do custo total.
Assim, tem-se que:
 n 
Custo total anual = FRC  R0 +  CM j  (4.54)
 j =1 
Onde:
CM kWh  kWh
CM = (4.55)
FRC
Logo:
n
FRC  R0 +  CM kWh j kWh j
j =1
Tarifa média = m (4.56)
 kWh k
k =1

Onde CMkWh é o custo marginal de oferta ou recurso GLD; kWhj é o incremento na oferta
de energia anual ou economias do recurso; e kWhk é o incremento na oferta de energia anual do
recurso.
Os efeitos dos planos de recursos mostrados da Tabela 4-13 a Tabela 4-18 são comparados
na Tabela 4-20. Nesta tabela, os custos médios e as tarifas médias incluem $105 milhões em custos
fixos para a capacidade existente. As tarifas são os rendimentos requeridos pelo sistema, incluindo
os custos marginais para todas as ofertas selecionadas e recursos GLD mais os custos fixos das
usinas existentes divididos pelas vendas, excluindo as economias de GLD. Assim, os custos GLD
são alocados na tarifa base geral. Uma metodologia mais equitativa seria alocar os custos GLD
somente para os consumidores participantes, entretanto, isso é difícil na prática. A maioria das
estruturas das tarifas existentes contém outras distorções e desequilíbrios, como já comentado.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 195

Tabela 4-20 – Comparação das tarifas e dos custos – modelos de planos de recurso elétrico

Tarifa Custo Custo


Casos Planos de expansão a custo mínimo Tabela média médio marginal
($/kWh) ($/kWh) ($/kWh)
Caso 0 Plano integrado Tabela 4-13 0,042 0,038 0,053
Caso 1 Plano não integrado (carvão nova) Tabela 4-14 0,040 0,040 0,053
Caso 2 30% de redução do SO2 (gás nova) 0,042 0,038 0,055
Tabela 4-15
Caso 3 90% de redução do SO2 (GLD 1) Tabela 4-16 0,046 0,042 0,055
Caso 4 20% de redução de NOX (GLD 2) Tabela 4-17 0,048 0,038 0,056
Caso 5 60% de redução de NOX (fazenda eólica) Tabela 4-18 0,056 0,045 0,067

Os resultados da Tabela 4-20 mostram que, embora o plano integrado a custo mínimo possua
tarifas médias 10% mais altas que os custos médios de oferta, essas taxas são iguais no plano não
integrado, mas os custos médios do plano integrado são 7% menores que no plano não integrado.
O caso 3 (90% de redução de SO2) e o caso 4 (20% de redução de NOX) mostram tarifas
significativamente mais altas. Entretanto, os custos médios para o caso 3 são apenas 5% maiores
que o plano não integrado e os custos do caso 4 são mais baixos, iguais ao plano de custo integrado.
O caso 5 (60% de redução de NOX) possui taxas e custos mais altos.
Esses resultados também mostram os efeitos importantes dos programas GLD em termos de
custos reduzidos, embora as tarifas possam aumentar. A razão para tais efeitos é que, no caso da
opção GLD 1, por exemplo, o custo do GLD é aproximadamente igual à diferença entre o custo de
oferta marginal e a tarifa média. Isso significa que os custos de oferta economizados, descontada a
receita perdida, equilibram os custos do GLD e permitem que as tarifas variem muito pouco e os
custos totais sejam reduzidos. No caso no qual o custo marginal de oferta é menor que a taxa média,
o GLD aumenta as tarifas.

4.7.8. Contabilizando os recursos de oferta intermitentes

Os métodos de análise apresentados aqui objetivam o fornecimento de energia suficiente na


forma de potência gerada ou economias de GLD para atingir os requisitos anuais totais projetados
(13 TWh nos exemplos citados). O planejamento elétrico deve, também, garantir capacidade de
oferta para atingir as demandas de pico. Nos exemplos dados, a capacidade total foi suficiente em
cada caso para atingir a demanda de pico projetada (2.600 MW). Existem complicações potenciais,
entretanto, que podem mudar esse resultado e requerer recursos adicionais para atingir as demandas
de pico.
Mudanças do lado da demanda podem alterar o fator de carga e aumentar a demanda de pico.
Por exemplo, em países com estações muito diferenciadas, um programa GLD de calefação poderia
reduzir o consumo total de energia sem reduzir a carga de pico do verão dirigida pelos aparelhos de
ar condicionado. Nesse caso, a capacidade de oferta de carga de pico deve garantir o pico de verão
sem levar em conta as economias do programa GLD.
Do lado da oferta, a produção de pico de uma usina, ou as economias de pico do programa
GLD, poderia não coincidir com a demanda de pico ou não estar disponível naquele período. Para
recursos de geração totalmente despacháveis, tais como as usinas a carvão e a gás, supõe-se que
estas estão disponíveis a toda capacidade durante os períodos de demanda de pico. Entretanto, esse
pode não ser o caso para alguns recursos. Como discutido anteriormente, a disponibilidade da
capacidade hidroelétrica é complexa e, para atender às flutuações de carga sazonais e diárias,
depende das estações climáticas e do tamanho dos reservatórios. Somente quando existe água
196 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

suficiente e estocada nos reservatórios é que se pode supor que esse recurso seja totalmente
despachável.
Outros recursos renováveis, tais como a energia solar e, especialmente, a energia eólica, não
são despacháveis do mesmo modo que as usinas térmicas e hidroelétricas, como já foi dito
anteriormente. Mais exatamente, a disponibilidade desses tipos de capacidade nos períodos de
demanda de pico depende da probabilidade de suas operações durante esses períodos. Se a demanda
de pico ocorre durante a estação de vento, existe uma alta probabilidade de que a energia eólica
possa atingir uma parte da demanda de pico. Entretanto, a probabilidade de que a capacidade eólica
operará a força total durante as horas de pico é menor que da usina térmica. A situação é similar
com a energia solar, exceto que a energia térmica solar pode ser estocada e, então, estar disponível
e ser expedida com maior segurança. Somando-se a isso, é possível que o recurso de energia solar
como esperado seja mais coincidente com os períodos de demanda de pico das cargas dirigidas às
condições do tempo, tais como aparelhos de ar condicionado.
Como esses recursos de oferta intermitentes não são totalmente seguros, eles não podem ser
comparados diretamente com a capacidade térmica em seus fatores de capacidade, por exemplo,
usando as curvas mostradas na Figura 4-3. Como comparação, suponha que a fonte de oferta esteja
disponível quando necessária durante os períodos de demanda de pico e que, caso trabalhe a um
fator de capacidade abaixo de seu máximo, sua operação pode estar de acordo com a demanda de
pico.
A maioria dos programas de eficiência energética também não são totalmente despacháveis.
Assim, seus fatores de capacidade não são comparáveis àqueles das opções de oferta. Mais
exatamente, esse é simplesmente o fator de carga da quantidade de carga que seria reduzida. O fator
de carga de um uso final afetado pelo GLD (exceto pelas opções de gerenciamento de carga
despacháveis como estoque térmico e controle direto de carga) não é comparável ao fator de
capacidade de uma usina de potência despachável. As horas de uso que fornecem o fator de carga
para uma opção GLD podem ou não corresponder aos períodos de demanda de pico locais ou do
sistema, nos quais a companhia elétrica necessita de capacidade, e nem é despachável nesse sentido.
Assim, o valor do recurso GLD, em termos de capacidade de pico, não é o mesmo que do recurso
do lado da oferta com um equivalente fator de capacidade. O valor da capacidade do GLD pode ser
menor.
Essas complicações no ajuste e na disponibilidade do GLD e dos recursos intermitentes têm
levado a extensivas análises para determinar o valor da capacidade desses recursos que podem ser
consideradas ao calcular a margem de reserva do sistema. O conceito de valor da capacidade é a
capacidade esperada disponível nos períodos de demanda de pico com aproximadamente a mesma
segurança que uma usina térmica convencional. Esse tipo de análise está além do objetivo deste
livro; entretanto, pode-se ilustrar como o conceito deve ser usado.
A Tabela 4-21 mostra um possível resultado da análise do valor da capacidade para os
recursos considerados. As usinas térmicas são definidas tendo 100% de crédito de capacidade e os
outros recursos são avaliados com relação a esse valor. Supõe-se que a opção de gerenciamento de
carga seja projetada especificamente para reduzir a demanda de pico e, assim, recebe 100% do
crédito de capacidade. As opções GLD são avaliadas com base nas reduções de carga atingidas,
relativas às reduções máximas, durante os períodos de demanda de pico. A carga para GLD 1 é
relativamente coincidente com o pico, dando 67% do crédito de capacidade e, assim, o GLD 2 é
menor, com 33%. A usina eólica, como discutida anteriormente, é um caso complicado, mas supõe-
se que cerca de 40% de sua produção possa estar disponível durante as horas de pico.
Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda 197

Tabela 4-21 – Crédito de capacidade para conjunto de modelos de novos recursos

Recursos Capacidade (MW) Capacidade crédito Valor de capacidade (MW)


Nova a gás 200 100% 200
Nova a carvão 200 100% 200
GLD 1 375 67% 250
GLD 2 750 33% 250
Eólica 500 40% 200
Gerenciamento de carga 100 100% 100
Turbina 50 100% 50

Quando os resultados da Tabela 4-21 são aplicados aos cálculos de capacidade mostrados da
Tabela 4-13 a Tabela 4-18, os totais de capacidade revisados estarão todos na faixa 2.620 a 2.720
MW, em lugar da faixa original 2.620 a 3.625MW. Embora a usina eólica e as opções GLD reduzam
o valor de capacidade do sistema, comparado a sua capacidade nominal, cada caso ainda possui
capacidade suficiente para atingir a demanda de pico projetada.
_____________________________
EXEMPLO 4.16 – Suponha que a demanda de pico projetada de 2.600
MW não possua uma reserva marginal suficiente e que 10% a mais deva
ser fornecido para manter adequada a segurança do sistema. Qual é
a capacidade a mínimo custo adicional para atingir esse requisito?

Solução
Isso significa que os planos mostrados da Tabela 4-13 a Tabela
4-18 requerem 140 a 240 MW adicionais de capacidade para atingir
essa meta (considerando as capacidades totais revisadas), embora a
demanda de energia total anual já esteja satisfeita. Assim, é
necessário nova capacidade com um fator baixo de capacidade e,
ainda mais importante, baixo custo por kW. Combustível e outros
custos variáveis e custos de emissões são menos importantes porque
a capacidade não será usada com frequência. A opção com o menor
custo de capacidade é a de gerenciamento de carga de 100 MW. Embora
essa opção consuma energia, a produção de energia líquida total
ainda atinge a demanda anual. O adicional de 40 a 140 MW de
capacidade seria fornecido por turbinas de combustão mais caras.
Embora essas unidades produzam eletricidade relativamente mais cara
a baixos fatores de capacidade, elas são mais baratas que outras
usinas com mais altos custos de capacidade, como mostrado na Figura
4-3. A taxa de emissão também pode ser relativamente alta, mas
somente por poucas horas por ano. No entanto, se episódios de
extrema poluição durante tempos de demanda elétrica de pico são uma
importante restrição ambiental, tais usinas de pico deveriam ser
consideradas com cautela.
_____________________________

(Bajay, Jannuzzi, Heideier, Vilela, Paccola, and Gomes 2018) (Bajay, Vilela, et al. 2018) (Bajay, Jannuzzi, Heideier, Vilela, Paccola, Gomes, et al. 2018) (Jannuzzi, Bajay, et al. 2018) (Jannuzzi, Heideier, et al. 2018)
198 Integrando as Opções do Lado da Oferta e da Demanda

4.8. REFERÊNCI AS E LEITURAS SUGERIDAS

Bajay, Sergio Valdir, Gilberto De Martino Jannuzzi, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro
Vilela, José Angelo Paccola, and Rodolfo Dourado Maia Gomes. 2018. Geração Distribuída
e Eficiência Energética: Reflexões Para o Setor Elétrico de Hoje e Do Futuro. Campinas:
IEI Brasil.
Bajay, Sergio Valdir, Gilberto De Martino Jannuzzi, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro
Vilela, José Angelo Paccola, Rodolfo Dourado Maia Gomes, and Luan Guanais. 2018.
“Maior Disseminação de Recursos Energéticos Distribuídos (REDs): Sugestões Para Mitigar
Impactos Tarifários e Orientações Para Uma Nova Política Energética.” Textos de Discussão
Sobre Energia. IEI Brasil. doi:https://doi.org/10.13140/RG.2.2.35414.91207.
Bajay, Sergio Valdir, Izana Ribeiro Vilela, Gilberto De Martino Jannuzzi, Raphael Bertrand
Heideier, José Angelo Paccola, Rodolfo Dourado Maia Gomes, and Luan Guanais. 2018. “O
Avanço Da Geração Distribuída, Da Eficiência Energética e de Outros Recursos
Distribuídos: Possíveis Soluções e Experiências No Brasil e Em Outros Países.” Textos de
Discussão Sobre Energia. IEI Brasil. doi:https://doi.org/10.13140/RG.2.2.25596.64649.
Brasil. 2015. “Contribuição Nacionalmente Determinada Para Consecução Do Objetivo Da
Convenção-Quadro Das Nações Unidas Sobre Mudança Do Clima.” Unfccc. Vol. 9.
http://www.mma.gov.br/images/arquivo/80108/BRASIL iNDC portugues FINAL.pdf.
Crane, A T, and R Roy. 1992. “Competition, Trading, and the Reliability of Electric Power
Service.” Annual Review of Energy and the Environment 17 (1): 161–86.
doi:10.1146/annurev.eg.17.110192.001113.
ERGEG. 2008. “Treatment of Losses by Network Operators - ERGEG Position Paper for Public
Consultation,” no. July. European Regulators Group for Electricity & Gas.
Hill, Lawrence J., Eric Hirst, and Martin Schweitzer. 1992. “The Process of Integrating DSM and
Supply Resources in Electric Utility Planning.” Utilities Policy 2 (2): 100–107.
doi:10.1016/0957-1787(92)90029-I.
Jannuzzi, Gilberto De Martino, Sergio Valdir Bajay, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro
Vilela, Rodolfo Dourado Maia Gomes, José Angelo Paccola, and Luan Guanais. 2018.
“Impactos Da Inserção de Geração Distribuída Fotovoltaica e de Eficiência Energética No
Setor Elétrico Brasileiro: Metodologia, Cenários e Resultados.” Textos de Discussão Sobre
Energia. IEI Brasil. doi:https://doi.org/10.13140/RG.2.2.24600.90889.
Jannuzzi, Gilberto De Martino, Raphael Bertrand Heideier, Izana Ribeiro Vilela, Rodolfo
Dourado Maia Gomes, Sergio Valdir Bajay, José Angelo Paccola, and Luan Guanais. 2018.
“Análise Do Valor Agregado e de Mudanças Tarifárias Para a Inserção de Geração
Distribuída e de Eficiência Energética No Setor Elétrico Brasileiro.” Textos de Discussão
Sobre Energia. IEI Brasil. doi:https://doi.org/10.13140/RG.2.2.15144.26887.
OECD/IEA. 2018. “Electric Power Transmission and Distribution Losses (% of Output) | Data.”
The World Bank. https://data.worldbank.org/indicator/EG.ELC.LOSS.ZS.
Rosenfeld, Arthur H., Hashem Akbari, Sarah Bretz, Beth L. Fishman, Dan M. Kurn, David Sailor,
and Haider Taha. 1995. “Mitigation of Urban Heat Islands: Materials, Utility Programs,
Updates.” Energy and Buildings 22 (3): 255–65. doi:10.1016/0378-7788(95)00927-P.
United Nations. 2015. “Adoption of the Paris Agreement.” In Conference of the Parties - Twenty-
First Session. Paris.
Vardi, Joseph, Jacob Zahavi, and Benjamin Avi-Itzhak. 1977. “Variable Load Pricing in the Face
of Loss of Load Probability.” Bell Journal of Economics 8 (1): 270–88.
Apêndice A 199

APÊNDICE A

UNIDADES E FATORES DE CONVERSÃO DE ENERGIA

British Tonelada Equivalente Tonelada Barril de Óleo


Joule Calorias Watt.h de Petróleo TEP ou Equivalente de Equivalente
Thermal Unit
J (N.m) cal Wh TOE Carvão TEC ou BOE ou BEP
BTU TCE
1 0,239 2,777×10–4 9,478×10–4 2,388×10–11 34,11×10–12 1,719×10–10
4,184 1 1,162×10–3 3,966×10–3 10–10 14,27×10–11 7,194×10–10
3,601×103 860,6 1 3,413 8,6×10–8 12,29×10–8 6,191×10–7
1055,060 252,165 0,293 1 2,52×10–8 3,6×10–8 1,814×10–7
41,87×109 10,0×109 11,63×106 39,68×106 1 1,429 7,2
29,31×109 7,0×109 8,139×106 2,778×107 0,7 1 5,039
5,815×109 13,898×108 1,615×106 5,511×106 0,1389 0,1984 1

MULTIPLICADORES
Multiplicador Símbolo Fator
Quilo k 103
Mega M 106
Giga G 109
Tera T 1012
Peta P 1015
Exa E 1018

EQUIVALÊNCIA MÉDIA PARA COMBUSTÍVEIS LÍQUIDOS


TEP TEC MWh
106
m3 Gcal (103 BEP (7.000 GJ (860
BTU
kcal/kg) kcal/kg) kcal/kWh)
Petróleo 8,90 0,890 6,27 1,271 37,25 35,30 10,35
Óleo diesel 8,48 0,848 5,97 1,212 35,52 33,66 9,87
Óleo combustível 9,59 0,959 6,75 1,370 40,15 38,05 11,15
Gasolina automotiva 7,70 0,770 5,42 1,099 32,22 30,54 8,95
Gasolina de aviação 7,63 0,763 5,37 1,090 31,95 30,28 8,88
GLP 6,11 0,611 4,30 0,872 25,56 24,22 7,10
Querosene de aviação 8,22 0,822 5,79 1,174 34,40 32,60 9,56
Álcool etílico anidro 5,34 0,534 3,76 0,763 22,35 21,19 6,21
Álcool etílico hidratado 5,01 0,510 3,59 0,728 21,34 20,22 5,93
Gás de refinaria 6,55 0,655 4,61 0,936 27,43 26,00 7,62
Coque de petróleo 8,73 0,873 6,15 1,247 36,53 34,62 10,15
Asfaltos 10,18 1,018 7,17 1,455 42,63 40,40 11,84
Lubrificantes 8,91 0,891 6,27 1,272 37,29 35,34 10,36
Solventes 7,81 0,781 5,50 1,115 32,69 30,98 9,08

Exemplo: 1 m3 de petróleo = 1,271 TEC. Fonte: EPE (2010)


200 Apêndice A

EQUIVALÊNCIA MÉDIA PARA COMBUSTÍVEIS SÓLIDOS


TEP TEC MWh
106
ton Gcal (103 BEP (7.000 GJ (860
BTU
kcal/kg) kcal/kg) kcal/kWh)
Carvão vapor 3.100 2,95 0,295 2,08 0,421 12,35 11,70 3,43
Carvão vapor 4.200 4,00 0,400 2,82 0,571 16,75 15,87 4,65
Carvão vapor 5.200 4,90 0,490 3,45 0,700 20,52 19,44 5,70
Carvão vapor 6.000 5,70 0,570 4,01 0,814 23,86 22,62 6,63
C. metalúrgico nacional 6,42 0,642 4,52 0,917 26,88 25,47 7,47
C. metalúrgico importado 7,40 0,740 5,21 1,057 30,98 29,36 8,61
Lenha 3,10 0,310 2,18 0,443 12,98 12,30 3,61
Caldo de cana 0,62 0,062 0,44 0,089 2,61 2,47 0,72
Melaço 1,85 0,185 1,30 0,264 7,75 7,34 2,15
Bagaço de cana 2,13 0,213 1,50 0,304 8,92 8,45 2,48
Lixívia 2,86 0,286 2,01 0,409 11,97 11,35 3,33
Coque de carvão mineral 6,90 0,690 4,86 0,986 28,89 27,38 8,02
Carvão vegetal 6,46 0,646 4,55 0,923 27,05 25,63 7,51

Exemplo: 1 ton. de carvão 3.100 (kcal/kg) = 0,421 TEC. Fonte: EPE (2010)

PODER CALORÍFICO (SUPERIOR E INFERIOR) E FATOR DE EMISSÃO DE COMBUSTÍVEIS

Peso Fator de emissão


PCS PCI
Combustível específico ton CO2/ton
GJ/ton GJ/ton
kg/m3
Alcatrão 1.000 37,66 35,77
Álcool etílico anidro 791 29,66 28,24 2,09057
Álcool etílico hidratado 809 27,82 26,36
Asfaltos 1.025 43,93 40,96
Bagaço de cana 130 9,44 8,91 0,88795
Biodiesel (100) 880 39,10 37,66
Caldo de cana 2,61 2,59
Carvão metalúrgico importado 32,22 30,96
Carvão metalúrgico nacional 28,45 26,86 2,63087
Carvão vapor sem especificação 12,55 11,92 1,16791
Carvão vegetal 250 28,45 27,03 3,01621
Coque de carvão mineral 600 30,54 28,87 2,72114
Coque de petróleo 1.040 35,56 35,10 3,41018
Eletricidade 3,60 3,60
Gás canalizado (Rio de Janeiro) 16,32 15,90
Gás canalizado (São Paulo) 19,66 18,83
Gás de coqueria 18,83 17,99 1,91806
Gás de refinaria 0,780 36,82 35,15 2,01703
GLP 552 49,16 46,44 2,91997
Gás natural seco 0,740 38,73 36,82 2,61934
Gás natural úmido 0,740 43,74 41,55
Gasolina automotiva 742 46,94 43,51
Apêndice A 201

Gasolina de aviação 726 47,24 44,35


Lenha catada 300 13,81 12,97
Lenha comercial 390 13,81 12,97 1,44741
Lixívia 1.090 12,68 11,97 1,13624
Lubrificantes 875 45,06 42,34
Melaço 1.420 8,08 7,74
Nafta 702 47,36 44,48 3,24824
Óleo combustível 1.000 42,20 40,12 3,09436
Óleo diesel 840 44,98 42,26 3,11997
Outros energéticos de petróleo 864 45,19 42,68 3,11685
Petróleo 884 45,19 42,63 3,11685
Querosene de aviação 799 42,22 43,51
Querosene iluminação 799 42,22 43,51 3,11726

Fonte: EPE (2010)

REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS

EPE. 2010. “Balanço Energético Nacional 2010.” Rio de Janeiro.


https://ben.epe.gov.br/downloads/Relatorio_Final_BEN_2010.pdf.
202 Apêndice B

APÊNDICE B:

FUNDAMENTOS DE ANÁLISE ECONÔMICA

A análise econômica de projetos1 de energia compara os valores dos investimentos realizados


hoje com os resultados a serem obtidos no futuro. Nessa comparação é fundamental o conceito de
valor do dinheiro no tempo. Neste Apêndice são apresentados esses conceitos e alguns critérios de
análise econômica de projetos.

CONCEITOS E DEFINIÇÕES

a) Conceito de fluxo de caixa


Um fluxo de caixa pode ser representado em uma tabela contendo informações do projeto,
onde são colocados a cada período os valores monetários de entradas e saídas de caixa, conforme
ilustrado na Tabela B.1 a seguir:

Tabela B.1 – Exemplo de um fluxo de caixa de um projeto hipotético

Período 0 1 2 3 4
Investimento inicial (1.000) (200)
Receitas 800 700 600
Custos fixos (30) (30) (30)
Despesas operacionais (60) (60) (70)
Receita líquida 710 610 500
Fluxo de caixa líquido (1.000) (200) 710 610 500

É comum representar um fluxo de caixa por meio de um gráfico chamado de diagrama de


fluxo de caixa. Nos diversos pontos que representam os períodos ao longo do horizonte temporal
são traçados segmentos verticais que podem ser considerados positivos (orientados para cima),
representando receitas ou entradas de caixa, ou negativos (orientados para baixo), representando
despesas, investimentos ou saídas de caixa.

Figura B.1 – Fluxo de caixa convencional

1
Onde não especificado, o termo projeto utilizado neste Apêndice refere-se aos programas de GLD, projetos de
expansão de fornecimento de energia, projetos de novas usinas etc. Trata-se, portanto, de um termo geral.
Apêndice B 203

b) Cálculo da taxa de atualização


A taxa de atualização é uma taxa que corrige o valor do dinheiro em função do tempo.

Figura B.2 – Taxa de atualização

Partindo da equação básica de juros compostos, deduz-se a taxa de atualização i. Ou seja:


1/ n
 VF 
VF = VP(1 + i )  i = n
 −1 (B.1)
 VP 

_____________________________
EXEMPLO B.1 – Um investimento realizado em 2006 (valor presente)
no valor de $200,00 com uma taxa de 15% a.a. tem um valor atualizado
para 2012 (valor futuro) de:

VF2012 = VP2006 (1 + i ) n = 200,00(1 + 0,15) 6 = $462,61 (B.2)

_____________________________
Se o fluxo de caixa for do tipo série uniforme, a equação toma a seguinte forma:
(1 + i )n − 1 = VP = 1
(B.3)
i(1 + i) n
R FRC

Onde FRC é chamado de fator de recuperação de capital. Note que o FRC é função da taxa e
do número de períodos, FRC(i, n). Se o valor presente de um empréstimo contraído de uma
instituição financeira para ser aplicado em um investimento, por exemplo, for multiplicado pelo
FRC resulta na anualidade a ser paga à instituição financeira, ou seja:
R = VP  FRC (i, n) (B.4)

Figura B.3 – Exemplo de fluxo de caixa – série uniforme


204 Apêndice B

c) Taxa de desconto r
Da mesma forma que se corrige um investimento atual para obter seu valor no futuro,
investimentos futuros podem ser corrigidos para valores atuais pela taxa de desconto. Por exemplo,
um investimento que será realizado daqui a n anos terá seu valor corrigido para hoje conforme
expressão de acordo com a taxa de desconto r:
VF
VP = (B.5)
(1 + r ) n

_____________________________
EXEMPLO B.2 – Para um investimento no valor de $400,00 a ser
realizado no ano de 2017 (valor futuro), seu valor atualizado para
o ano de 2012 (valor presente) a uma taxa de desconto de 12% a.a.
será de:
400,00
VP = = $226,97 (B.6)
(1 + 0,12) 5
_____________________________

d) Taxa de inflação
Tanto a taxa de atualização como a taxa de desconto têm incorporado em seus valores a taxa
de inflação. Se necessário, a taxa real de desconto, ou a taxa real de atualização, pode ser calculada
conforme Eq. (B.7) a seguir:
(1 + rreal )  (1 + f ) = (1 + r ) (B.7)

Onde:
(r − f )
rreal = (B.8)
(1 + f )
Em que f é a taxa de inflação e rreal é a taxa de desconto real.
_____________________________
EXEMPLO B.3 – Suponha uma taxa de desconto de 15% a.a. e uma
taxa de inflação de 8% a.a. Qual a taxa real de desconto?

Solução
(0,15 − 0,08)
rreal = = 0,0648 ou 6,48% (B.9)
(1 + 0,08)

_____________________________

e) Taxa mínima de atratividade (TMA)


A taxa mínima de atratividade (TMA) é uma taxa de juros que expressa a lucratividade
mínima pretendida pela empresa de energia ou pelo investidor e, teoricamente, está sempre
disponível para aplicação de capital. No processo de avaliação de projetos, existirá sempre uma taxa
de juros que sirva de comparação para permitir uma tomada de decisão, seja de aceitar ou rejeitar
Apêndice B 205

uma proposta. Isso significa que quando a empresa decide aplicar recursos em uma proposta de
investimento abre mão de investir na taxa mínima de atratividade, sempre disponível.
A TMA é lastreada na taxa de juro que, por sua vez, é, em essência, um elemento de política
econômica utilizado pelos governos para manter o equilíbrio da economia de um país. A taxa de
desconto depende de fatores como as incertezas (técnica, política e econômica) e os riscos a que
está sujeito o investimento.

f) Conceito de projeto e investimento


Uma possibilidade de investimento de capital torna-se um projeto quando há a decisão de
alocar esforços com o objetivo de criar um produto, um serviço ou um resultado útil qualquer.
Entende-se por investimento de capital o emprego de recursos financeiros visando obter benefícios
no futuro.
O estudo de viabilidade econômica de projetos de energia está sempre vinculado à duração
do projeto. Os critérios de decisão apresentados neste Apêndice apresentam algumas premissas
básicas, a saber:
• O objetivo dos empreendimentos é maximizar o retorno do capital investido;
• Será sempre considerado o valor do dinheiro no tempo (fluxo de caixa descontado);
• Teoricamente existirá sempre uma determinada taxa de juros no mercado, utilizada pelas
empresas de energia para o financiamento;
• A análise dos projetos será determinística, isto é, não existe incerteza2. Os fluxos de caixa
são considerados como exatos;
• Os estudos de viabilidade econômica são efetuados considerando sempre os valores
monetários expressos em uma moeda estável.
A característica principal dos métodos utilizados na avaliação de projetos é a adoção do
sistema de fluxo de caixa descontado, ou seja, levar em consideração o valor do dinheiro no tempo.
Esse fato evidencia a necessidade de se utilizar uma taxa de desconto aplicada sobre os fluxos de
caixa associados aos projetos.

g) Custo de oportunidade
Ao aplicar um capital num determinado projeto de energia, o investidor deixa de auferir
rentabilidade em outros projetos alternativos. Para que um investimento seja atrativo, este deve
remunerar melhor que as oportunidades perdidas devido à sua escolha. Se o mercado financeiro
estiver remunerando o capital a 10% ao ano, por exemplo, e a empresa retém recursos em caixa, o
custo de oportunidade é de 10% ao ano, pela não remuneração do seu capital. O custo de
oportunidade de manter o dinheiro aplicado num banco pode ser nulo, desde que a empresa não
tenha alternativa com rentabilidade superior. Se, entretanto, existir a possibilidade de aplicar esse
capital num investimento produtivo com rentabilidade de 30% ao ano, aí então o custo de
oportunidade de manter o dinheiro no banco a 10% será de 20% ao ano.

VIABILIDADE ECONÔMICA DE PROJETOS

Destacam-se dois critérios de avaliação econômica de projetos de investimentos: critério de


liquidez e critério de rentabilidade. O critério de liquidez diz respeito ao tempo necessário para que
o investimento efetuado seja totalmente recuperado com as receitas líquidas do projeto. Este critério

2
Nos modelos de previsão de energia com base em séries temporais, matriz insumo-produto, modelos econométricos
etc., pode-se trabalhar com a variância de alguns parâmetros do projeto, por exemplo, o preço futuro da energia, a
produção futura etc.
206 Apêndice B

é adotado, principalmente, quando existe insuficiência de caixa, ou seja, quando a empresa de


energia tem restrição de capital. Assim serão preferidos os projetos cujo tempo de retorno sejam
menores.

a) Tempo de retorno de capital – payback


Dentre os critérios de liquidez, o método mais utilizado para avaliação de projetos é o de
tempo de retorno do capital, o “payback”. O tempo de retorno do capital é definido como o tempo
necessário para que as receitas líquidas provenientes do projeto, descontadas à TMA, tenham valor
presente acumulado igual aos investimentos realizados, também descontados à TMA.
_____________________________
EXEMPLO B.4 – Determine o tempo de retorno de um capital de
$2.000,00 investido por uma empresa de energia considerando uma
taxa mínima de atratividade de 5% ao período, com receitas conforme
o fluxo de caixa da Figura B.4.

Figura B.4 – Fluxo de caixa

Solução
Para se chegar ao tempo de retorno do capital empregado, deve-
se atualizar cada receita com a taxa de atratividade e verificar
graficamente em qual período o capital de 2.000 é recuperado. Para
isso, recomenda-se construir um diagrama valor atual acumulado
versus período de tempo conforme indicado na Tabela B.2 a seguir.

Tabela B.2 – Períodos e valores da receita

Valor Soma
n Receitas atual Acumulado (Acumulado –
Rn/(1+i)n $2.000)
1 800,00 762,00 762,00 –1.238,00
2 700,00 635,00 1.397,00 –603,00
3 600,00 519,00 1.915,00 –85,00
4 200,00 165,00 2.080,00 +80,00
5 100,00 78,00 2.158,00 +158,00
Apêndice B 207

Figura B.5 – Gráfico tempo de retorno – payback

O gráfico da Figura B.5 mostra que o tempo de retorno é


aproximadamente igual a 3,5 períodos. Se os valores monetários são
considerados no final de cada período, somente no quarto período é
que o capital retorna ao seu investidor.
_____________________________

b) Simple payback
O termo simple payback (SPB) tem seu significado intrínseco incorporado ao termo em inglês
e corresponde ao tempo necessário para a recuperação do capital investido, ou seja, é o tempo para
o qual a simples soma dos benefícios anuais totais se iguala ao capital investido, não se levando em
conta a taxa de desconto, nem o tempo do projeto ou outros custos. Dessa forma:
CC
SPB = (B.10)
Fk

Onde CC é o custo de capital investido e Fk são os benefícios totais. Por exemplo, se para um
investimento de capital de $200 em um programa de GLD consegue-se uma economia de 1,0
MWh/ano, sendo o custo da energia igual a $50/MWh, tem-se:
200
SPB = = 4 anos (B.11)
50

c) Valor presente líquido (VPL)


Quando as empresas não têm problemas de caixa, isto é, não necessitam de um rápido retorno
de capital, o critério predominante nas decisões de investimento é o critério de rentabilidade. Neste
Apêndice são apresentados os dois métodos mais usuais na avaliação econômica de projetos: valor
presente líquido (VPL) e taxa interna de retorno (TIR).
O método do valor presente líquido, também conhecido como método do valor atual,
caracteriza-se pela transferência de todos os valores monetários do fluxo de caixa para o instante
zero, descontados à taxa mínima de atratividade. O valor presente líquido de um projeto de
investimento tem a seguinte expressão:
n Vj
VPL =  (B.12)
j =0 (1 + TMA ) j

Onde Vj é o valor monetário líquido ocorrido ao final do período j (as entradas são valores
positivos e as saídas são valores negativos); TMA é a taxa mínima de atratividade; j=0,1,2...n; onde
208 Apêndice B

n é o número de períodos. A regra para a utilização do valor presente líquido na análise de


investimentos é:

Tabela B.3 – Critério de aceitação pelo método do VPL

VPL Decisão
VPL>0 aceitar – viável
VPL=0 indiferente
VPL<0 rejeitar – inviável

De uma maneira bem simples, o VPL, se positivo, pode ser encarado como sendo o benefício
obtido acima do produzido pela TMA. Para melhor entendimento do significado do VPL, veja um
exemplo numérico simples. Seja o fluxo indicado na Tabela B.4 a seguir:

Tabela B.4 – Fluxo de caixa – significado do VPL

ANO 0 1 2 3
Valor ($) 1.000 500 500 500

Para uma taxa mínima de atratividade de 6% ao ano, o valor presente líquido é:


n Vj − 1.000 500 500 500
VPL =  = + + + = $337,00 (B.13)
j =0 (1 + TMA) j
(1 + 0,06) (1 + 0,06) (1 + 0,06) (1 + 0,06)3
0 1 2

Portanto, se for aplicado no projeto $1.000 hoje, obter-se-á $337,00 a mais do que se forem
deixados $1.000,00 aplicados na TMA.

d) Taxa interna de retorno (TIR)


A taxa interna de retorno de um projeto de investimento é definida como a taxa de desconto
que torna o valor presente líquido do seu fluxo de caixa igual a zero. O critério de decisão para
avaliação de um projeto de investimento se baseia na comparação da TIR com a taxa mínima de
atratividade TMA, de tal sorte que:

Tabela B.5 – Critério de aceitação pelo método TIR

TIR Decisão
TIR>TMA aceitar – viável
TIR=TMA indiferente
TIR<TMA rejeitar – inviável

Por exemplo, para um projeto de expansão de energia, a taxa interna de retorno (TIR) é o
valor da taxa de desconto para a qual o fluxo de caixa descontado para o valor atual à taxa TMA
(VPL) é igual a zero, ou seja:
n  Vj 
VPL =   j 
=0 (B.14)
j = 0  (1 + TIR ) 

O valor da TIR é determinado por uma solução iterativa. Toda vez que a TIR de um programa
ou projeto for maior que a TMA, pode-se interpretar que o valor do investimento inicial pode ser
Apêndice B 209

tomado por empréstimo à uma taxa de juros de no máximo igual à TIR, de modo que os rendimentos
do programa sejam suficientes para pagar o valor do empréstimo mais os respectivos juros. Se o
fluxo de caixa possui várias TIR reais e positivas, ou não possui TIR real, não se deve utilizar a taxa
interna de retorno como critério de decisão. Neste caso, é melhor considerar que o fluxo de caixa
não possui TIR.
_____________________________
EXEMPLO B.5 – Determine a TIR de um projeto hipotético de
energia que apresente o seguinte fluxo de caixa:

Figura B.6 – Fluxo de caixa

Solução
A TIR é a taxa i que satisfaz a seguinte igualdade:
− 1.000 200 300 400 500
VPL = + + + + =0 (B.15)
(1 + i) 0 (1 + i)1 (1 + i) 2 (1 + i)3 (1 + i) 4
No caso de fluxo de caixa genérico, existe uma função no Excel
que permite determinar a taxa interna de retorno, ou seja:
TAXA( valor1 ; valor2 ; ...; valorn ; estimativa) (B.16)

Onde: valor1; valor2, ...; valorn são os valores monetários do


fluxo de caixa e estimativa é a estimativa inicial da taxa.
Aplicando os dados desse exemplo na função do Excel resulta uma
TIR=12,8% a.p.

Figura B.7 – VPL em função da TMA e TIR (TMA onde VPL = 0)

_____________________________
210 Apêndice B

PROGRAMA DE CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

a) Custo total do programa (CTP)


O custo total do programa (CTP) é o valor presente do fluxo de caixa feito para o período da
vida econômica do programa, que inclui o custo do capital investido e os custos operacionais
previstos subtraídos dos benefícios obtidos com o programa, ou seja:
t
C n − Bn
CTP = CC +  (B.17)
n =1 (1 + r )
t

Em que CC é o custo do capital investido; Cn é o custo de operação no ano n e Bn são os


benefícios obtidos com o programa3 no ano n. Para valores uniformes de custo de operação
(Cn=Ck=cte) e de benefícios (Bn=Bk=cte), tem-se:
Ck Bk
CTP = CC + − (B.18)
FRC t , r FRC t , r

Onde FRC é o fator de recuperação de capital – ver Eq. (B.3). Há programas em que o
intervalo de tempo ideal não é de um ano. São programas em que há necessidade de investimentos
uniformes em períodos diferentes de um ano. Nesses casos, pode-se especificar um intervalo de
tempo otimizado (n0) e os fatores para o cálculo do valor presente passam a ser:
t
t0 = = tempo de vida do projeto, em intervalo otimizado (B.19)
n0

E:
𝑟0 = (1 + 𝑟)𝑛0 − 1 = taxa de desconto equivalente para o intervalo de tempo n0 (B.20)
Por exemplo, se o intervalo de tempo otimizado para uniformizar custos for de dois anos, para
um programa de vida econômica de 10 anos, e a taxa de retorno for de 10% a.a., tem-se que:
10
t0 = =5 (B.21)
2
E:
r0 = (1 + 0,10) 2 − 1 = 0,21 (B.22)

Onde:
 r0 (1 + r0 ) t 0  0,21(1 + 0,21) 5
FRC =  = = 0,3417 (B.23)
 (1 + r0 ) − 1 (1 + 0,21) − 1
t0 5

b) Custo anual equivalente (CAE)


O custo anual equivalente é o valor que, distribuído uniformemente ao longo do fluxo de
caixa, resulta num valor presente líquido igual ao custo total do programa, ou seja,
CAE = CTP  FRC (B.24)

3
Aqui os benefícios são quaisquer benefícios relacionados ao programa: custos evitados em substituições de
equipamentos, energia conservada etc.
Apêndice B 211

O custo total do programa (CTP) e o custo anual equivalente (CAE) são critérios eventuais
de análises de projeto de investimentos das empresas de energia, porém dependem fortemente da
magnitude do investimento, não levando em consideração a eficácia global do programa. O mais
indicado é utilizar os critérios de VPL, TIR, payback conforme indicado neste Apêndice.
Recomenda-se, dentro do possível, considerar as incertezas nos fluxos de caixa dos programas.

c) Custo de conservação de energia (CCE)


O custo de conservação de energia (CCE) é, talvez, o mais útil critério para avaliar
economicamente os programas de eficiência energética. O CCE informa o custo de um programa
de eficiência energética em termos de $/MWh (ou $/GJ), unidade que é normalmente utilizada pelos
fornecedores de energia. O CCE é definido como o custo anual equivalente dividido pela energia
conservada, ou seja:
CAE
CCE = (B.25)
EE
Onde EE é a energia evitada (ou conservada). Note que o CCE, conforme calculado na Eq.
(B.25), é válido para programas de eficiência energética que implicam na substituição de
equipamentos quando o valor residual destes equipamentos é nulo.
_____________________________
EXEMPLO B.6 – Suponha um programa de substituição de lâmpadas
incandescentes de 75W por lâmpadas fluorescentes de 15W com as
seguintes hipóteses:

Taxa de desconto (TMA) 8%


Vida econômica do programa 5 anos
Tarifa elétrica $0,05/kWh
Incandescente Fluorescente
Custo ($/unidade) 2,00 25,00
Vida útil (horas) 1.000 1.000
Utilização (h/ano) 2.000 2.000
Então:
 0,08 
FRC =  −5 
= 0,25 (B.26)
1 − (1 + 0,08) 
E:
EE = 2000(75 − 15) = 120 kWh/ ano (B.27)
O benefício total economizado anualmente é:
Bn = 2  2,0 + 120  0,05 = 10$ / ano (B.28)

Logo:
50,00
SPB = = 5 anos (B.29)
10
E:
CAE = 0,25(50,00) − 10 = 2,5$ / ano (B.30)
212 Apêndice B

Portanto:
2,5
CCE = = 0,021$ / kWh evitado (B.31)
120

_____________________________

d) Custo de demanda evitada (CDE)


Outro critério utilizado, particularmente para programas de gerenciamento de carga que têm
por objetivo retardar a necessidade de expansão da capacidade de oferta de energia por meio da
diminuição da demanda de pico, e não da diminuição do consumo, é a determinação do custo de
demanda evitada (CDE). Seu valor é calculado com a seguinte equação:
CTP
CDE =  H  LF (B.32)
EE
Onde H=8.760 hora/ano e:
consumo (MWh/ano) demanda média
LF = = (B.33)
demanda de pico (MWh) demanda de pico

Nota-se que o benefício da demanda de pico, ou seja, o benefício da redução da capacidade


pode ser ajustado de acordo com a fração da carga durante o horário de pico.

REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS

DERNBURG, T. F., MCDOUGALL, D. M., 1971. "Macroeconomia". Editora Mestre Jon,


São Paulo, Brasil.
MORAN, M. J., 1982. "Availability Analysis". Prentice-Hall, New Jersey.
ELETROBRAS (Comitê de Distribuição), 1982. "Planejamento de Sistemas de
Distribuição". Volume I, Editora Campus/Eletrobras. Rio de Janeiro.
Apêndice C 213

APÊNDICE C:

FUNDAMENTOS ESTATÍSTICOS – SÉRIES TEMPORAIS 1

Neste Apêndice são apresentados alguns conceitos de estatística úteis para validar os modelos
de previsão de demanda de energia, sobretudo os que envolvem método de regressão, econometria
e modelos de séries temporais. Duas referências foram utilizadas para a preparação deste Apêndice:
a segunda edição do livro de William W. S. Wei, intitulado Time Series Analysis (Univariate and
Mutivariate Methods), publicada em 2006, e outro mais recente, publicado em 2012, por R. L. S.
Bueno sob o título Econometria de Séries Temporais.

VARIÁVEL ALEATÓRIA E DISCRETA

Quando uma variável assume resultados diversos entre uma observação e outra em razão de
fatores relacionados à chance, ela é chamada de variável aleatória.

Variável aleatória discreta

Definição: seja x uma variável aleatória. Se o número de valores possíveis de x for finito ou
infinito enumerável, então x é denominada de variável aleatória discreta. A cada resultado possível
xi está associada uma probabilidade de ocorrência p(xi) com as seguintes condições para todo i:

p ( xi )  0   p( x ) = 1
i =1
i (C.1)

Variável aleatória contínua

Definição: diz-se que x é uma variável aleatória contínua se existir uma função f, denominada
de função densidade de probabilidade fdp de x, que satisfaça as seguintes condições:
+
f ( x)  0   −
f ( x)dx = 1 (C.2)

Para quaisquer a e b, com –<a<b<+, tem-se que:


b
p ( a  x  b) =  f ( x)dx
a
(C.3)

Função de distribuição acumulada

Definição: seja x uma variável aleatória discreta. Define-se a função F como a função de
distribuição acumulada da variável aleatória x como:

1
Este apêndice foi escrito por Dr. João B. Marques (jbdmarques@gmail.com).
214 Apêndice C

F ( x) =  p( x )
j
j (C.4)

Onde o termo de soma é estendido a todos os índices j que satisfaçam a condição xjx. Se x
for uma variável aleatória contínua, então:
x
F ( x) = −
f ( s )ds (C.5)

Onde s é uma variável muda de integração. Observe que se F(x) é a função de distribuição
acumulada da variável aleatória contínua x, com fdp f(x), então:
dF ( x )
= f ( x) (C.6)
dx
Para todo x no qual F seja derivável.

VALOR ESPERADO, ESPERANÇA CONDICIONAL E INCONDICIONAL

O valor esperado de uma variável aleatória discreta, ou simplesmente esperança, é a soma das
probabilidades de ocorrência de cada evento multiplicada pelo seu valor. É o valor médio esperado
de um experimento se ele for repetido muitas vezes, portanto:
n
E ( x) =  xi p( xi ) (C.7)
i =1

Se a variável for contínua com fdp igual a f(x), então a esperança é dada por:
+
E ( x ) = − xf ( x ) dx (C.8)

Duas propriedades são básicas em relação ao valor esperado, a primeira é:


E (ax + by ) = aE ( x) + bE ( y ) (C.9)

Onde a e b são constantes, e a segunda é:


E ( xy)  E ( x) E ( y ) (C.10)

Contudo, se as variáveis x e y são independentes, então:


E ( xy) = E ( x) E ( y ) (C.11)

a) Esperança condicional e não condicional

Esses conceitos são fundamentais em econometria de séries temporais, uma vez que a ordem
dos dados do conjunto da população é uma condicionante. Considere o espaço amostral  a
esperança não condicional (ou incondicional) de uma variável aleatória x, que é definida por:
E ( x | ) = E ( x) (C.12)
Apêndice C 215

Onde o conjunto a que pertence a esperança não está definida claramente no espaço amostral.
A lei das expectativas totais afirma que:
E[ E ( x |  )] = E ( x |  ) = E ( x) (C.13)

Seja  todos os subconjuntos do espaço amostral  sobre o qual a variável aleatória x está
inserida. A lei das expectativas iteradas, aplicada a dois conjuntos A, B , é definida por:
E[ E ( x | A, B) | A] = E ( x | A) (C.14)

O que implica que é sobre o menor conjunto de informação que se determina a esperança
condicional.

VARIÂNCIA

Definição: seja x uma variável aleatória. Define-se a variância de x, denotada por Var(x) ou
x , como:
2

Var ( x) = Ex − E( x)


2
(C.15)

A raiz quadrada positiva de Var(x) é denominada de desvio padrão. Outra forma de expressar
a Var(x) é:

Var ( x) = E( x2 ) − E( x)


2
(C.16)

a) Propriedades da variância

Se a e b são constantes, então:


Var ( x + a ) = Var ( x) (C.17)

E:
Var (ax) = a 2 Var ( x)  Var (ax + b) = a 2 Var ( x) (C.18)

Também:
Var ( x + y ) = Var ( x) + Var ( y ) + 2Cov( x, y ) (C.19)

Onde Cov(x,y) representa a covariância entre as variáveis aleatórias x e y:



Cov( x, y ) = E ( x −  x )( y −  y )  (C.20)

Onde x e y são as médias das distribuições das variáveis x e y, cuja função de correlação é:
Cov( x, y )
( x , y ) = (C.21)
 2x  2y
216 Apêndice C

DEFINIÇÃO DE PROCESSO ESTOCÁSTICO

Um processo estocástico é uma família de variáveis aleatórias Z(,t) indexada no tempo, onde
 pertence ao espaço amostral e t refere-se ao tempo. Para um determinado t, Z(.,t) é uma variável
aleatória e para um dado espaço amostral , Z(,.) é uma realização e Z(,t) é um número real.
Uma população que consista de todas as possíveis realizações é chamada de processo estocástico
gerador de dados. Portanto, uma série temporal é uma realização ordenada de um processo
estocástico qualquer.
Suponha infinitas medições da temperatura do convés de n sondas de petróleo durante o dia.
Assim, seria possível montar um conjunto com as n sequências seguintes:

(Z t 
(1) 
t =−

, Z t( 2)  
t =−

,..., Z t( n ) 

t =−
) (C.22)

Mais exatamente, em cada instante t existiriam n temperaturas ou n observações relacionadas


ao tempo t, ou seja:

Z t
(1)
, Zt( 2) ,..., Zt( n)  (C.23)

Esse é um conjunto de dados cuja distribuição é, possivelmente, normal. Assim, vários


momentos dessa série podem ser estimados; por exemplo, o primeiro e o segundo momentos
(esperança e variância, respectivamente). Convém suprimir o espaço amostral e simplificar Z(,t)
para Z(t) ou Zt (t=0,1, 2,...). Dessa forma, a esperança não condicional da variável aleatória Z(t),
ou simplesmente Zt é:
+
 t = E ( Z t ) = − Z t f ( Z t )dZ t (C.24)

Onde f(Zt) é a função densidade de probabilidade – ver Eq. (C.8). Note que a esperança é a
média esperada de uma distribuição de frequência. A função de variância de um processo
estocástico é:

t2 = E ( Z t −  t ) 2 (C.25)

E a função de covariância entre duas variáveis aleatórias Zt1 e Zt2 é:


 (t1 , t 2 ) = E ( Z t1 −  t1 )( Z t 2 −  t 2 ) (C.26)

Assim, por analogia, a função de correlação fica definida como:


(t1 , t2 )
(t1 , t2 ) = (C.27)
t21 t22

AUTOCOVARIÂNCIA, AUTOCORRELAÇÃO

a) Autocovariância

A autocovariância representa a covariância da variável aleatória com ela mesma defasada de


k passos, onde as séries temporais são tomadas do mesmo processo estocástico. Em um processo
estritamente estacionário, a função de distribuição é a mesma para todo t, portanto µt=µ é uma
Apêndice C 217

constante, desde que E(Zt)<∞ e a variância t2=2 para todo t seja também uma constante. Assim,
define-se a autocovariância como:
 k = Cov( Z t , Z t + k ) = E (Z t −  t )( Z t + k −  t + k  = E (Z t −  )( Z t + k −  (C.28)

Note que, por definição, 0 é a própria variância. Observe também que, de acordo com
definição em (C.28), as variâncias não condicionais de Zt=+t e Zt=t+t são idênticas.

b) Autocorrelação

A autocorrelação é definida por:


k k
k = = (C.29)
Var ( Z t ) Var ( Z t + k ) 0

Onde Var(Zt)=Var(Zt+k)=0.

c) Função de autocovariância e função de autocorrelação (FAC)

Uma vez que k e k são funções de k (defasagem), k e k são chamados de função de


autovariância e de autocorrelação, respectivamente. Esses conceitos são importantes na
determinação do melhor modelo para representar uma série temporal específica.
_____________________________
EXEMPLO C.1 – Suponha Zt=+t um processo estocástico com
ti.i.d. (0,2). Determine a função de autocovariância e a função
de autocorrelação.

Solução
De acordo com a Eq. (C.28) tem-se que:

 2 , k = 0
 k = E (Z t −  )( Z t + k −   =  
0, k  0
(C.30)
  1, k = 0
 k = k = k2 =  
0  0, k  0

Note que o ruído t é i.i.d. (idêntica e independentemente


distribuído), portanto, de acordo com a Eq. (C.11), quando k0
resulta que:
E ( t  t + k ) = E ( t ) E ( t + k ) = 0 (C.31)

_____________________________

d) Função de autocorrelação parcial (FACP)

Além da autocorrelação entre Zt e Zt+k, pode-se investigar a correlação entre Zt e Zt+k após
remoção da dependência linear destas variáveis com as variáveis intervenientes Zt+1, Zt+2,...,Zt+k-1.
218 Apêndice C

Mais exatamente, podem-se investigar os erros destas variáveis obtidas de suas melhores
estimativas por método de regressão linear.
Considere {Zt} um processo estacionário e, sem perda de generalidades, assuma que E(Zt)=0.
Considere a expressão a seguir o melhor estimador de Zt+k:

Zˆt +k = 1Zt +k −1 +  2 Zt +k −2 + ... +  k −1Zt +1 (C.32)

Onde i (1≤i≤k–1) são os coeficientes obtidos por método de regressão minimizando a


esperança do quadrado dos resíduos, ou seja:

E ( Z t + k − Zˆ t + k ) 2 (C.33)

De forma similar, considere a seguinte expressão o melhor estimador de Zt, ou seja:

Zˆt = 1Zt +1 + 2 Zt +2 + ... + k −1Zt +k −1 (C.34)

Onde  i (1≤i≤k–1) são os coeficientes obtidos por método de regressão minimizando a


esperança do quadrado dos resíduos:

E ( Z t − Zˆ t ) 2 (C.35)

Assim, a função de autocorrelação parcial kk entre Zt e Zt+k é definida como a correlação
ordinária entre (Zt– Ẑ t ) e (Zt+k– Zˆ t +k ), ou seja:

Cov[( Z t − Zˆ t ), ( Z t + k − Zˆ t + k )]
 kk = (C.36)
Var ( Z t − Zˆ t ) Var ( Z t + k − Zˆ t + k )

Utilizando as propriedades da esperança e da variância, pode-se chegar ao seguinte método


geral:
1 1 1
1 1 1 1 2
1  2 2 1  3
11 = 1 ,  22 = ,  33 = (C.37)
1 1 1 1  2
1 1 1 1 1
2 1 1

Ou de forma genérica:
1 1 2 ...  k − 2 1
1 1 1 ...  k −3 2
... ... ... ... ... ...
 k −1  k − 2  k −3 ... 1 k
 kk = (C.38)
1 1  2 ...  k − 2  k −1
1 1 1 ...  k −3 k −2
... ... ... ... ... ...
 k −1  k − 2  k −3 ... 1 1
Apêndice C 219

Onde k é a função de autocorrelação entre Zt e Zt+k.

e) Média amostral

Quando se tem apenas uma realização de um processo estacionário, o estimador natural da


média =E(Zt) é definido por:
1 n
Zt =  Zt
n i =1
(C.39)

Onde Zt é a média temporal de n observações. Note que:

1 n 1
E (Z t ) = 
n i =1
E (Z t ) =  n = 
n
(C.40)

De onde se conclui que Zt é o estimador não enviesado de .

f) Função de autocovariância amostral

De forma similar, quando se tem apenas uma realização, o estimador da autocovariância é:


1 n−k 1 n−k
ˆ k =  (Zt − Z )( Zt +k − Z ), ou ˆˆ k =  (Zt − Z )( Zt +k − Z ) (C.41)
n t =1 n − k t =1
Ambos os estimadores da Eq. (C.41) são não enviesados e pode-se demonstrar facilmente
que:

E ( ˆ k )   k −
k
n
n−k 
k − 
 n 
Var ( Z ) e ( )
E ˆˆ k =  k − Var ( Z ) (C.42)

g) Função de autocorrelação amostral (FAC)

Para uma dada realização de uma série temporal, a função de autocorrelação amostral é
definida como:
n−k

ˆ  (Z t − Z )( Z t + k − Z )
t =1
ˆ k = k = , k = 0,1,2,... (C.43)
ˆ 0 n
 (Z t − Z )
t =1

_____________________________
EXEMPLO C.2 – Considere os dez valores de uma série temporal
conforme Tabela C.1:
220 Apêndice C

Tabela C.1 – Amostras de uma série temporal (10 observações)

t Zt Zt+1 Zt+2 Zt+3 ... Zt-1 Zt-1


1 13 8 15 4
2 8 15 4 4 13
3 15 4 4 12 8 13
4 4 4 12 11 15 8
5 4 12 11 7 4 15
6 12 11 7 14 4 4
7 11 7 14 12 12 4
8 7 14 12 11 12
9 14 12 7 11
10 12 14 7
Solução
Note que a média é Z = 10 e, portanto:
(13 − 10)(8 − 10) + (8 − 10)(15 − 10) + ... + (7 − 10)(14 − 10) + (14 − 10)(12 − 10) − 27
ˆ 1 = = = −0,118
(13 − 10) 2 + (8 − 10) 2 + ...(14 − 10) 2 + (12 − 10) 2 144
(13 − 10)(15 − 10) + (8 − 10)( 4 − 10) + ... + (11 − 10)(14 − 10) + (7 − 10)(12 − 10)
ˆ 2 = = −0,201
144 (C.44)
(13 − 10)( 4 − 10) + (8 − 10)( 4 − 10) + ... + (12 − 10)(14 − 10) + (11 − 10)(12 − 10)
ˆ 3 = = 0,181
144
...
De modo geral, ˆ k = ˆ − k , ou seja, a função de autocorrelação
amostral é simétrica em relação à origem k=0. Podem-se utilizar os
dados obtidos e montar um gráfico da função de autocorrelação contra
a defasagem. Ver Figura C.1:

Figura C.1 – Função de autocorrelação amostral – FAC

_____________________________

h) Função de autocorrelação parcial amostral (FACP)

A função de autocorrelação parcial amostral ̂ kk é obtida substituindo i por ̂ i na Eq. (C.38).


No entanto, em vez de apresentá-la em forma de determinantes, é melhor utilizar a forma recursiva
a seguir:
Apêndice C 221

k
ˆ k +1 −  ˆ kj ˆ k +1− j
ˆ k +1, k +1 = ˆ k +1, j = ˆ kj − ˆ k +1, k +1  ˆ k , k +1− j ,
j =1
k
e j = 1,2,...k (C.45)
1 −  ˆ kj ˆ j
j =1

_____________________________
EXEMPLO C.3 – Usando os dados do exemplo anterior, determine
ˆ 11, ˆ 22, ˆ 21, e ̂ 33 .
Solução
Partindo das Eqs. (C.37) e (C.38) tem-se que:
ˆ 11 = ˆ 1 = −0,188
ˆ − ˆ 2 − 0,201 − (−0,188)
ˆ 22 = 2 21 = (C.46)
1 − ˆ 1 1 − (−0,188) 2
ˆ 21 = ˆ 11 − ˆ 22  ˆ 11 = (−0,188) − (−0,245)( −0,188) = −0,234

A partir da Eq. (C.45), tem-se que:

ˆ − ˆ 21ˆ 2 − ˆ 22ˆ 1 0,088


ˆ 3,3 = 3 = = 0,097 (C.47)
1 − ˆ 21ˆ 1 − ˆ 22ˆ 2 0,907

_____________________________

ESTACIONARIDADE, ERGOCIDADE E RUÍDO BRANCO

a) Estacionaridade

Por definição, se o processo estocástico Zt tem esperança e autocovariância independentes do


tempo, então se trata de uma série fracamente estacionária. Para tanto é necessário que se observe
as seguintes condições:
E (Z t ) 2  
E ( Z t ) = , para todo t  {0,1,2,...,t} (C.48)
E (Z t −  )(Z t + k −  ) =  k

A primeira condição assegura que o segundo momento não centrado é finito (podendo ser
diferente para diferentes períodos). A segunda condição exige igualdade entre as médias (as
distribuições podem sofrer alterações com o tempo). A terceira condição é que a variância seja igual
para todo o período e independentemente do tempo.

b) Ergocidade

Para estimar uma série temporal é necessário atender à propriedade de ergocidade, além da
estacionaridade. Suponha que uma realização Z(,.) é uma realização de um processo estocástico.
A média temporal é definida por:
222 Apêndice C

1 n ()
Z ( ) =  Zt
n t =1
(C.49)

Se Z () convergir para E( Z () ), então existe ergocidade. Como as médias são todas iguais
para diferentes intervalos de tempo, basta uma realização para se ter a média. O que se pretende é
que a esperança de cada observação seja igual (estacionaridade) e se possa estimar essa esperança
tomando-se a média temporal das observações (ergocidade). Pode-se provar que, se a soma das
covariâncias for finita, Zt é ergódico para o primeiro momento.

c) Ruído branco

Uma sequência de realizações {t} é um ruído branco se a média for zero em cada realização
e se a variância for constante e não for correlacionada a qualquer outra realização da própria série.
Se uma sequência de realizações { t }t= − atende às condições em (C.50):

E ( t ) = 0
E ( t2 ) =  2 para todo t (C.50)
E ( t  t − j ) = 0, para todo j  0

Então o processo { t }t= − é um ruído branco.

MODELOS DE SÉRIES TEMPORAIS ESTACIONÁRIAS

A seguir, são indicados os processos estocásticos, com suas respectivas funções de


autocovariância e autocorrelação, mais utilizados no tratamento de variáveis que interessam aos
modelos de previsão de demanda de energia. Esses processos são também largamente utilizados em
outras áreas de pesquisa, sobretudo em econometria e finanças. George Box e Gwilym Jenkins
(1976) desenvolveram uma metodologia de tratamento de séries temporais estacionárias e
popularizaram uma família de modelos denominada ARIMA (autoregressive integrated moving
average).

a) Processo autorregressivo AR(p)

Para entender esta metodologia de George Box e Gwilym Jenkins (1970), é conveniente
iniciar com a definição do que seja uma série temporal autorregressiva AR(p), que é determinada
por:
p
Z t =  + 1Z t −1 + 2 Z t −2 + ... +  p Z t − p +  t =  +   j Z t − j +  t (C.51)
j =1

Onde Zt é a observação da série no tempo t; p é o parâmetro de ordem p do modelo;  é um


número real e t é o resíduo ou erro (ruído branco2). Outra forma de apresentar uma série temporal
AR(p) é:

2
Uma sequência t é um ruído branco se a média (por conveniência) for zero e a variância constante e não correlacionada
a qualquer outra simulação da própria série.
Apêndice C 223

p
Z t = 1Z t −1 + 2 Z t − 2 + ... +  p Z t − p +  t =   j Z t − j +  t (C.52)
j =1

Onde Zt = Z t −  . É comum também usar operadores que defasam as variáveis no tempo para
representação de séries temporais de modo mais compacto. Por exemplo, pode-se reescrever a Eq.
(C.51) com operadores, assim tem-se que:

Z t =  + 1 BZ t + 2 B 2 Z t + ... +  p B p Z t +  t (C.53)

Onde Zt–1=BZt e B(BZt)=B2Zt. De maneira geral, BpZt=Zt–p. Assim, a Eq. (C.53) pode ser
resumida para:
 p ( B) Z t =  +  t (C.54)

Onde p(B)=1–1B–2B2–...–pBp. Assim, um processo autorregressivo de primeira ordem


AR(1) é dado por:
(1 − 1 B)Z t =  t , ou Z t = 1Z t −1 +  t (C.55)

A função de autocovariância k de um modelo AR(1) é obtida conforme a seguir:


 k = E(Z t Zt −k ) = E(1Zt −k Z t −1 ) + E(Zt −k t ) = 1E(Zt −k Z t −1 ) + 0 (C.56)

Ou seja:
 k = 1  k −1 , k 1 (C.57)

A função de autocorrelação se resume a:

 k = 1 k −1 k 1 (C.58)

Adotando 0=0. Nesse modelo, quando o módulo de 1<1 e se o processo é estacionário, a


função de autocorrelação decai exponencialmente de duas formas: se 0<1<1, o valor da função
decai e é sempre positiva; e se 0<1<1, a autocorrelação também decai, iniciando com valor
negativo e trocando de sinal a cada passo k. Já a função de autocorrelação parcial (FACP) é:

 = 1 , k = 1
 kk  1  (C.59)
0, k  2
O processo autorregressivo de segunda ordem AR(2) é definido como:
Z t = 1Z t −1 +  2 Z t − 2 +  t , ou (1 − 1 B −  2 B 2 ) Z t =  t (C.60)

As funções de autocovariância, autocorrelação (FAC) e autocorrelação parcial (FACP) para


o processo AR(2) são, respectivamente:
224 Apêndice C

 k = 1  k −1 +  2  k − 2 , k  1,  k = 1 k −1 +  2  k − 2 , k 1
 1
1 = 1 −  , k =1
 2


 − 
2
(C.61)
 kk =  2 21 , k=2
 1 − 1
0, k =3



_____________________________
EXEMPLO C.4 – Simule 250 valores a partir de um processo
estocástico AR(1), conforme modelo indicado na Eq. (C.62) a seguir,
e elabore dois gráficos indicando os valores das funções de
autocorrelação amostral (FAC) e autocorrelação parcial amostral
(FACP) para 10 passos de defasagem k.
(1 − 1 B)(Z t − 10) =  t , com 1 = 0,9 (C.62)

Solução
O modelo descrito na Eq. (C.62) pode ser reescrito como:

Zt = 1Zt −1 + t , onde Zt = Zt −10 = Zt −  (C.63)

Note que, de acordo com a Eq. (C.58), a forma de decaimento da


FAC depende do valor de 1, conforme comentado. Para cada simulação
realizada, há um resultado diferente para os valores da função de
autocorrelação (FAC).

Figura C.2 – Modelo AR(1)

____________________________
O modelo AR(1) pode ser útil para representar diversas séries temporais de variáveis
econômicas ou variáveis de interesse nas análises de produção e preço de energia. Por exemplo, a
inflação medida pelo IPCA entre janeiro de 1995 e dezembro de 2009 segue um modelo AR(1) em
Apêndice C 225

que 1=0,55. Veja na Figura C.3 o índice mensal de inflação (IPCA) durante o período de 1995 a
2009 e uma simulação AR(1), onde Zt=1Zt-1+t (onde Zt-1=1,7% em janeiro de 1995).

Figura C.3 – Inflação mensal IPCA – jan. 1995 a dez. 2009


Fonte: IBGE

____________________________

b) Processo de médias móveis MA(q)

O processo geral AR(p) é definido como:

Z t =  t − 1 t −1 −  2  t − 2 − ... − − q  t − q ou Z t =  q ( B) t (C.64)

Onde q(B)=(1–1B–2B2–...–qBq). Assim, o processo de médias móveis de primeira ordem


MA(1) fica reduzido a:

Z t =  t − 1 t −1 = (1 − 1 B) t (C.65)

As funções de autocovariância, autocorrelação (FAC) e autocorrelação parcial (FACP) para


o processo MA(1) são, respectivamente:
(1 + 12 ) 2 , k = 0  − 1 
   , k = 1
 k = − 1 2 , k = 1 ,  k = 1 + 12  (C.66)
0, k  1  0, k  1
  

E:
− 1k (1 − 12 )
 kk = , k 1 (C.67)
1 − 12( k +1)
O processo de médias móveis de segunda ordem MA(2) é definido como:

Z t = (1 − 1 B −  2 B 2 ) t (C.68)
226 Apêndice C

As funções de autocovariância, autocorrelação (FAC) e autocorrelação parcial (FACP) para


o processo MA(2) são, respectivamente:
 − 1 (1 −  2 ) 
 1 + 2 + 2 , k =1
(1 +  +  ) ,
2 2 2
 k = 0

1 1
  1 2 
− 1 (1 −  2 )  ,
2
k =1  − 2 
k =  , k =  , k = 2 (C.69)
1 + 1 +  2
2 2
−  2   , k = 2 
2

0, k  2 0, k  2


  
 

E:


1 , k = 1,
  −  2
 kk =  2 21 , k =2 (C.70)
 1 − 1
 3 −   (2 −  )
 1 2 1 22 2
, k =3
1 −  2 − 21 (1 −  2 )

c) Processo autorregressivo de médias móveis ARMA(p,q)

Uma extensão natural é a composição de um processo puro AR(p) com outro MA(q),
formando, assim, um processo estocástico ARMA(p,q). O processo geral ARMA(p,q) é definido
como:
 p ( B) Z t =  q ( B) t (C.71)

Onde p(B)=1–1B–2B2–...–pBp e q(B)=(1–1B–2B2–...–qBq). Assim, o processo


ARMA(1,1) fica reduzido a:
(1 − 1 B) Z t = (1 − 1 B) t (C.72)

As funções de autocovariância, autocorrelação (FAC) e autocorrelação parcial (FACP) para


o processo ARMA(1) são, respectivamente:
 1 (1 + 12 − 211 ) 2 
 , k =0 
 (1 − 12 )  1, k = 0
   
 ( − 1 )(1 − 11 )    ( − 1 )(1 − 11 ) 
2
k =  1 , k =1 , k =  1 , k =1 (C.73)
 (1 − 1
2
)   1 +  1
2
− 2 1 1 
1  k −1 , k2  1 k −1 , k  2
   

 

A função de autocorrelação do processo ARMA(1,1) e demais, além de complicada não é


necessária.
Apêndice C 227

MODELOS DE SÉRIES TEMPORAIS NÃO ESTACIONÁRIAS

Muitas variáveis econômicas são séries temporais não estacionárias, particularmente aquelas
relacionadas ao crescimento das atividades produtivas. Em geral, a média e a variância das séries
temporais não estacionárias não são constantes e dependem do tempo t. Por exemplo, o PIB do
Brasil entre os anos de 1950 e 2000 forma uma série temporal não estacionária, no entanto,
possivelmente a taxa de crescimento no PIB pode ser uma série estacionária. De um modo geral,
algumas séries não estacionárias homogêneas tornam-se estacionárias após alguns filtros ou
derivações.

a) Filtros nos processos estocásticos

É comum realizar algumas transformações em séries temporais. A essas transformações dá-


se o nome de filtragem. A metodologia de Box e Jenkins (1970) é para séries temporais
estacionárias, no entanto, se uma em especial não for estacionária, ela deve então ser diferenciada
até que se torne, para que se aplique a metodologia. A diferenciação é um tipo de filtro. Se uma
variável Zt não é estacionária, pode-se definir uma nova variável que corresponde à primeira
diferença Zt. Se a estacionaridade não for atingida com a primeira diferenciação, fazem-se novas
operações sucessivas até obter a estacionaridade. Assim, define-se a primeira diferenciação da
variável Zt com a seguinte notação:
Z t = (1 − B) Z t = Z t − Z t −1 (C.74)

A segunda diferenciação seria:

2 Z t = Z t = ( Z t − Z t −1 ) = Z t − Z t −1 − (Z t −1 − Z t − 2 ) = Z t − 2Z t −1 + Z t − 2 (C.75)

Ou:

2 Z t = (1 − B) 2 Z t = (1 − 2B + B 2 )Z t  d Z t = (1 − B) d Z t (C.76)

Com isso, pode-se definir adequadamente um modelo ARIMA.

b) Invertibilidade

Outra forma útil para descrever um processo estocástico autorregressivo AR é regredir o valor
de Z com suas variáveis passadas somadas a um ruído branco (choque), ou seja:

Z t = 1 Z t −1 +  2 Z t − 2 + ... +  t =  t +   j Z t − j (C.77)
j =1

Ou:
( B) Z t =  t (C.78)

Onde:
 
( B ) = 1 −   j B j , com 1 +   j   (C.79)
j =1 j =1
228 Apêndice C

De acordo com Box e Jenkins (1976), um processo é invertível se for possível reescrevê-lo
na forma da Eq. (C.77), conforme condição estabelecida na Eq.(C.79). Note que, para um processo
linear Zt=t(B)t ser invertível é necessário reescrevê-lo na forma de um processo AR. Isso se faz
substituindo Zt na Eq. (C.78), ou seja:
( B )  ( B )  t =  t (C.80)

Portanto:
1
( B)( B) = 1  ( B) = =  −1 ( B) (C.81)
( B)
A condição de invertibilidade garante que os pesos dos valores passados (π j) podem ser
obtidos a partir dos pesos dos choques passados  j, o ruído branco (white noise). Além da
estacionaridade, essa condição garante que os pesos π j decaem à medida que a série é deslocada
para trás. Mais exatamente, os maiores pesos devem ser atribuídos às observações mais recentes.
Portanto, conforme argumenta Box e Jenkins (1976), se um processo é não invertível, a previsão
por meio dele não faz sentido.

c) Processo ARIMA (p,d,q)

Se Zt torna-se estacionária após d diferenciações e se a série resultante for um modelo


ARMA(p,q), então diz-se que Zt é uma variável descrita por um modelo ARIMA(p,d,q). Mais
exatamente, fazendo-se d diferenciações sobre a variável Zt resulta num modelo ARMA (p,q)
semelhante ao modelo apresentado na Eq. (C.71). Ou seja, um modelo ARIMA(p,d,q) é definido
como:

 p ( B)(1 − B) d Z t = 0 + q ( B)t (C.82)

Onde o parâmetro 0 assume funções distintas dependendo do grau de diferenciação d.


Quando d=0, o processo original é estacionário 0 e representa a média do processo, ou seja:
0=(1–1–2–...–p). Se d1, 0 é chamado de termo de tendência determinística. Um modelo
ARIMA(p,d,q) refere-se, respectivamente, às ordens de autorregressão, integração e média móvel.

Processo SAR(p), SMA(q), SARMA(p,q) e SARIMA(p,d,q)

Existem variáveis que apresentam comportamento oscilatório recorrente e com periodicidade


homogênea que podem ser representadas por séries temporais. Essas séries são ditas sazonais. A
diferenciação sazonal é nada mais do que a diferenciação com defasagem de um período maior que
unitário, um período s, por exemplo. Assim, tem-se que a d-ésima diferenciação sazonal s é definida
como:

ds Z t = (1 − Bs ) d Z t − s (C.83)

Onde BspZt=Zt-ps. Um modelo estocástico autorregressivo é dito sazonal de ordem p, SAR(p),


quando seus valores são regredidos de seus valores anteriores defasados de s ou múltiplos de s.
Assim, tem-se que:
Apêndice C 229

p
Z t =  + 1Z t − s +  2 Z t − 2 s + ... +  p Z t − ps +  t =  +   j Z t − js +  t (C.84)
j =1

De forma similar, um modelo SMA(q) é dito de médias móveis sazonal de ordem q, quando
representado por:
q
Z t =  +  t − 1 t − s −  2  t − 2 s − ... −  q  t − qs =  +   j  t − js , 0 = 1 (C.85)
j =0

Por analogia, um modelo SARMA(p,q) nada mais é do que uma combinação de dois termos,
um SAR(p) e um SMA(q), de modo que:
Autorregressivo

  
Média móvel
p q
Z t =  +  i Z t −is +   j  t − js , 0 = 1 (C.86)
i =1 j =0

Do mesmo modo, se a d-ésima diferenciação de uma série reproduz uma série estacionária do
tipo SARMA(p,q), diz-se que esta série é integrada com ordem d, ou seja, um modelo
SARIMA(p,d,q).

PREVISÃO (ESTIMATIVAS FUTURAS)

Como já mencionado, as funções FAC e FACP são importantes na determinação do melhor


modelo para representar uma série temporal específica. Para esse item, considere um modelo geral
ARIMA (p,d,q):

 p ( B)(1 − B) d Z t =  q ( B) t (C.87)

Onde p(B)=(1–1B–2B–...–pB) e p(B)=(1–1B–2B–...–qB) e o tN(0,2). O parâmetro


0 foi omitido, sem perda de generalidades, por questão de simplificação.

Estimativa do erro em previsões com base num modelo ARMA

Para determinar o erro de dados previstos pelo método dos mínimos quadrados para um
modelo ARMA, deve-se inicialmente assumir um caso onde d=0 e µ=0, ou seja:
( B) Z t = ( B) t (C.88)

Uma vez que o modelo é estacionário, pode-se representá-lo a partir de um processo de médias
móveis, ou seja:
( B ) 
Z t =  ( B ) t =  t =  t + 1 t −1 + 1 t − 2 + ... =   j  t − j , com  0 = 1 (C.89)
( B ) j =0

Onde:

( B) =   j B j (C.90)
j =0
230 Apêndice C

Para t=n+l, tem-se que:



Z n +1 =   j  n + l − j (C.91)
j =0

Suponha agora que se conheçam as observações até t=n e seja necessário estimar l-passo a
frente, ou seja, o valor de Zt+l como uma combinação linear das observações conhecidas, Zn, Zn-1,
Zn-2,..., uma vez que Zt pode ser escrito conforme Eq. (C.89). Assim, conforme notação, o valor
estimado Zˆ n (l ) de Zn+l é escrito como:

Zˆ n (l ) =  *l  n +  *l +1 n −1 +  *l + 2  n − 2 + ... =   *l + j  n − j (C.92)
j =0

Onde os coeficientes podem ser determinados. Pode-se demonstrar facilmente que o erro é
minimizado quando:

 *l + j =  l + j (C.93)

Mais exatamente, a melhor estimativa da variável l-passo a frente é dada pela esperança
condicionada ao conjunto de dados disponíveis, ou seja:

Zˆ n (l ) = E (Z n+l | Z n , Z n−1 , Z n−2 ,...) (C.94)

Cujo erro:
l −1
en (l ) = Z n + l − Zˆ n (l ) =   j  n + l − j  Zˆ n (l ) = Z n + l − en (l ) (C.95)
j =0

Com isso, pode-se estimar a variável para qualquer passo além dos n dados disponíveis. Em
um processo normal, caso se deseje estabelecer os desvios, limitando a variável para uma faixa de
(1–)100% de possíveis resultados, calcula-se com a expressão a seguir:
1/ 2
 l −1 2 
Z n (l )  N  / 2 1 +   j 
ˆ  (C.96)
 j =1 
Onde N/2 é o desvio padrão normal tal que P(N>N/2)=/2.

Estimativa do erro em previsões com base num modelo ARIMA

Partindo do modelo geral, Eq. (C.87), pode-se reescrevê-lo para prever Zt+l conforme processo
AR, uma vez que o processo ARIMA é invertível. Ou seja:
( B) Z t +l =  t +l (C.97)

Onde:

( B)(1 − B) d
( B) = 1 −   j B j = (C.98)
j =1 ( B)
Apêndice C 231

Ou, de forma equivalente:



Z t +l =  t +l +   j Z t +l − j (C.99)
j =1

Pode-se demonstrar3 que:


l −1
en (l ) = Z n + l − Zˆ n (l ) =   j  n + l − j (C.100)
j =0

Onde, nesse caso:


j −1
 j =   j −1 i , com j = 1,2,...l − 1. (C.101)
i =0

Note que a Eq. (C.100) é idêntica à Eq. (C.95). Assim, a estimativa para um processo
estocástico ARIMA é descrita com uma média ponderada das estimativas prévias. Ou seja:

Zˆ n (l ) =   j Zˆ n (l − j ), com l 1 (C.102)
j =1

Pode-se perceber para t≤n, por processo recursivo, que a estimativa acaba sendo expressa
como a soma ponderada dos valores correntes. Por exemplo:

Zˆ n (1) = 1Z n +  2 Z n −1 + 3 Z n − 2 + ... =   j Z n +1− j (C.103)
j =1

E:
  
Zˆ n ( 2) = 1Zˆ n (1) +  2 Z n + 3 Z n −1 + ... = 1   j Z n +1− j +   j +1Z n +1− j =   (j2 ) Z n +1− j (C.104)
j =1 j =1 j =1

Onde:

(j2) = 1 j +  j +1 (C.105)

Portanto, de maneira geral:



Zˆ n ( 2) =   (jl ) Z n +1− j (C.106)
j =1

Onde:
l −1
 =  1(l −i ) +  j +l −1 ,
(l )
j para l  1, e (1)
j = j (C.107)
i =1

3
Consultar demonstração em Wei (2006).
232 Apêndice C

IDENTIFICAÇÃO DE MODELOS

Em análise de séries temporais, um dos passos mais importante é a determinação do modelo


que represente a série temporal disponível. Para tanto, é necessário conhecer com propriedade as
funções FAC e FACP, que, na prática, são desconhecidas. Note que as equações dessas funções
citadas até aqui só foram possíveis com o conhecimento a priori do modelo. Os padrões de
comportamento das funções FAC e FACP podem indicar os modelos geradores do processo
estocástico que os definem. Por exemplo, sabe-se que a função de autocorrelação do processo
MA(1) apresenta um decaimento exponencial para a FAC e um truncamento “cut off” após o passo
p para a função de autocorrelação parcial. Portanto, a representação dessas funções construída com
base em uma realização indica que a realização seja possivelmente gerada por um processo
estocástico MA(1).

Figura C.4 – Padrões das funções FAC E FACP para os processos AR(1), MA(1) E ARMA(1,1)
Tabela C.2 – Características das funções FAC e FACP

Processo FAC FACP


AR(p) Declínio exponencial ou onda amortecida Truncamento após o passo p
MA(q) Truncamento após o passo p Declínio exponencial ou onda amortecida
ARMA(p,q) Declínio exponencial Declínio exponencial

A Tabela C.2 indica as características teóricas gerais das funções FAC e FACP para os
processos AR(p), MA(q) e ARMA(p,q) e a Figura C.4 exemplifica os padrões para os casos
específicos AR(1), MA(1) e ARMA(1,1).

PROCESSOS ESTOCÁSTICOS DE WIENER

Uma classe de processo não estacionário estocástico é chamada de processo de Wiener,


também conhecida como movimento browniano. É um processo estocástico de tempo contínuo com
três propriedades importantes:
• É um processo de Markov – o que implica dizer que o valor corrente tem informação
suficiente para a melhor previsão do valor futuro;
Apêndice C 233

• O incremento é independente – isso significa que as distribuições de probabilidade das


alterações da variável em qualquer intervalo de tempo são independentes;
• As mudanças no processo em qualquer intervalo finito de tempo são normalmente
distribuídas, com variância crescendo linearmente com o tempo.
Essa classe de processo é bastante difundida na previsão de variáveis econômicas e pode ser
utilizada em modelos de demanda de energia agregada com modelos de econometria. Todos os
processos de passeio aleatório, tanto de estado contínuo como discreto, com ou sem deriva,
satisfazem à propriedade de um processo de Markov e são chamados, consequentemente, de
processos Markovianos.

Passeio aleatório

O passeio aleatório é um caso particular do modelo ARIMA(p,d,q). Se p=0, d=1 e q=0, a Eq.
(C.82) se reduz a:
(1 − B) Z t =  t  Z t = Z t −1 +  t (C.108)

Note que o passeio aleatório é um caso particular, também, do modelo AR(1) quando 1=1 –
ver Eq. (C.55).

Movimento browniano com drift

O processo mais simples de Wiener é o movimento browniano com deriva, ou seja, drift:
dZ = dt + dz (C.109)

Onde dz é o incremento de Wiener. Na Eq. (C.109),  é chamado de parâmetro do drift, e 


é o parâmetro da variância. Note que para qualquer intervalo t, a variação de x, denotado por x,
é normalmente distribuída, com valor esperado E(x)=t e variância Var(x)=2t. A Figura C.5
mostra quatro simulações da Eq. (C.109) com deriva =0,2 por ano e desvio padrão =1 por ano.
Realizando uma projeção de 50 anos (por exemplo, de 1950 até 2000) com x(0)=0 e tomando
amostras mensais, a trajetória para a variável x(t) resulta na seguinte equação:
Z t = Z t −1 + 0.01667 + 0.2887 t (C.110)

Figura C.5 – Exemplo de MB com tendência (período 1950 - 2000, amostragem mensal)
234 Apêndice C

A Figura C.6 mostra a melhor estimativa de um processo estocástico do tipo MB com drift.
Utilizando-se da Eq. (C.110) para representar as primeiras 288 amostras (24 anos de 12 meses),
constroem-se curvas de previsão para as demais amostras (600–288=312). Por se tratar de um
processo de Markov, é necessária apenas a última informação (dez/1974) para se construir uma
curva de previsão. A previsão dos valores de x para um tempo T é dada pela seguinte equação:
xˆ1974+T = x1974 + 0.01667T (C.111)

O gráfico indica uma curva tipo MAB com três outras curvas de intervalos de confiança, ou
seja, as trajetórias dos valores previstos para x(t) são obtidas com valor indicado na Eq. (C.111)
adicionado ou subtraído de um, dois ou três desvios-padrão.

Figura C.6 – Melhor estimativa para um MB com drift (intervalo de confiança: 68,4%, 95,5% e 99,7%)

A variância do processo de Wiener cresce linearmente com o tempo e o desvio padrão com a
raiz quadrada do tempo. Portanto, para uma trajetória com intervalo de confiança de 68,4% (um
desvio-padrão) a previsão de T meses é:

x1974 + 0,01667T  0,2887 T (C.112)

Movimento browniano generalizado – Processos de Itô

O processo de Wiener serve para representar uma gama vasta de processos aleatórios. Os
processos indicados aqui são casos especiais do movimento Browniano generalizado com drift, cuja
equação é:
dx = a( x, t )dt + b( x, t )dz (C.113)

Onde dz, novamente, é o incremento do processo de Wiener e a(x,t) e b(x,t) são funções não
aleatórias conhecidas. Note que o drift e o coeficiente da variância são funções do tempo. O
processo contínuo definido na Eq. (C.113) é chamado de processo de Itô.
Considere a média e a variância desse processo. Uma vez que E(dz)=0, E(dx)=a(x,t)dt, a
variância de dx é igual a E[dx2]–(E[dx]2), o qual contém termos dt, (dt)2 e termos em (dt)(dz) com
ordem (dt)3/2. Para um dt infinitesimal, os termos em (dt)2 e (dt)3/2 podem ser ignorados e a variância
resulta em:
Var[dx] = b 2 ( x, t )dt (C.114)
Apêndice C 235

O termo a(x,t) refere-se à taxa instantânea esperada do processo de Itô e o termo b2(x,t) como
a taxa de variância instantânea.

Movimento Browniano geométrico

Um caso especial da Eq. (C.113) é o movimento geométrico Browniano com deriva, drift, em
que a(x,t)=x e b(x,t)=t, onde  e  são constantes. Nesse caso, a Eq. (C.113) se torna:
dx = xdt + xdz (C.115)

Conforme já discutido, o percentual de variação de x, x/x, é normalmente distribuído. Já as


variações expressas em logaritmo natural de x, variações absolutas de x e x têm distribuição
lognormal. A relação entre x e seu logaritmo tem detalhes mais complicados nesse conceito. Nesta
seção é mostrado que se x(t) é dado pela Eq. (C.115), então F(x)=logx é um movimento Browniano
simples com drift:
 1 
dF =   −  2 dt + dz (C.116)
 2 
Portanto, sobre um intervalo finito de tempo t, as variações de x em termos de logaritmo são
normalmente distribuídas com média e variância, respectivamente:
1
 − 2 , 2 (C.117)
2
Para a variável x(t) em si, pode ser demonstrado que se o valor corrente é x(0)=x0, então o
valor esperado de x(t) é dado por:

E[ x(t )] = x0et (C.118)

E a variância x(t) é dada por:

Var[ x(t )] = x02 e 2 t (e  t − 1)


2
(C.119)

O resultado da esperança do MGB pode ser usado para o cálculo do valor presente esperado
descontado sobre um período de tempo. Por exemplo, note que:

E  x(t )e −rt dt  =  x0e −( r − )t dt = x0 /(r − )


 
(C.120)
 0  0
fornece a taxa de desconto r que excede a taxa de crescimento . Esse procedimento será
usado quando for necessário calcular o valor presente descontado de um fluxo de caixa de
rendimentos que segue um movimento geométrico Browniano.
O MGB é frequentemente usado para modelar preços de ativos financeiros, taxas de
atratividade ou de juros, salários, preço de produtos e outras variáveis econômicas e financeiras. A
Figura C.7 mostra três simulações da Eq. (C.115) considerando um drift =0,09 (9% ao ano) e
=0,2 (20% ao ano). Os valores adotados referem-se à taxa de crescimento anual esperada e ao
desvio padrão do índice da bolsa NYMEX, respectivamente. Nesse exemplo, o tempo refere-se ao
período entre 1950 e 2000, tomando amostras mensais. Assim, tem-se a seguinte equação para
representar a variável aleatória x(t):
236 Apêndice C

xt = 1,0075xt −1 + 0,0577xt −1t (C.121)

Com x1950=100. Note que 9% a.a. equivale a 0,75% a.m. (1/12 de 9%) e 0,2 de desvio padrão
ao ano equivale a 0,13, ou seja, raiz quadrada de 0,2/12 e t é tomado de uma distribuição normal
com média zero e desvio padrão unitário. Assim, o valor 0,0577 representa α/.

Figura C.7 – Exemplos de MGB (período 1950 - 2000, amostragem mensal)

Na Figura C.8 estão indicadas a linha de tendência média e as linhas de previsões com
intervalo de confiança de 66% (dados amostrados a partir de 1970 – 300 amostras mensais), sendo
que as curvas superior e inferior foram feitas a partir de 1974 (48 amostras iniciais). Como o MGB
segue um processo de Markov, apenas o valor x(t) de dezembro de 1974 é necessário para construir
as curvas de previsão. A linha de tendência média é dada por:
xˆ1974+T = (1.0075 )T x1974 (C.122)

Onde T é dado em meses e as curvas limites do intervalo de confiança seguem as equações


indicadas em (C.123).

(1.0075)T (1.0577) T
x1974 , e (1.0075)T (1.0577) − T
x1974 (C.123)

Figura C.8 – Melhor estimativa para um MGB (intervalo de confiança de 66%, período de 1970 a 1995,
amostragem mensal)
Apêndice C 237

Processo estocástico com reversão à média

A tendência do MB é afastar-se do ponto inicial. De fato, isso é compatível com algumas


variáveis econômicas – por exemplo, com preços de ativos especulativos – mas não com outras.
Considere por exemplo, o preço de uma lista de commodities tal como o aço e o petróleo. Embora
se possam modelar esses preços com MB, pode-se argumentar que tais preços estão relacionados
no longo prazo ao custo marginal de produção. Em outras palavras, embora o preço do óleo, por
exemplo, possa sofrer altas e quedas no mercado internacional 4, no longo prazo o preço dessa
commodity tende ao seu custo marginal. Essa condição leva ao modelo estocástico com reversão à
média. O mais simples modelo de processo estocástico de reversão à média – também conhecido
como processo de Ornstein-Uhlenbeck – segue a Eq. (C.124):
dx = ( x − x)dt + dt (C.124)

Onde  é a velocidade da reversão e x é o nível normal da variável x, isto é, o nível para o


qual x tende a reverter. Se a variável x representa o preço de uma commodity, então x pode ser o
seu custo marginal de longo prazo. Note que a variação esperada de x depende da diferença entre x
e x . Se x é maior (ou menor) que x , é mais provável que o preço caia (ou suba) no próximo intervalo
de tempo. Portanto, embora esse processo satisfaça a propriedade de um processo de Markov, os
incrementos não são independentes. Se o valor corrente x(0) é x0 e a variável x segue o processo da
Eq. (C.124), então o valor esperado em qualquer tempo t é:

E[ x(t )] = x + ( x0 − x )e−t (C.125)

E a variância de ( xt − x ) é:

2
Var[ xt − x ] = (1 − e − 2 t ) (C.126)
2
Note que o valor esperado de xt converge para x à medida que o tempo cresce e a variância
converge para 2/2. Se →, Var[xt]→0, o que implica que a variável x nunca se desvia do valor
x , mesmo que momentaneamente, e se →0, Var[xt]→ 2/t, ou seja, comporta-se como um
processo de movimento Browniano simples.
A Eq. (C.124) é uma versão de um processo autorregressivo de primeira ordem de tempo
discreto, AR(1). Especificamente, a Eq. (C.124) é o caso limite quanto t→0 do seguinte processo
AR(1):

xt − xt −1 = x (1 − e− ) + (e− −1) xt −1 + t (C.127)

Onde t é distribuído normalmente com média zero e desvio padrão , e:

 =
2

2
2
(
1 − e −2  ) (C.128)

4
Por exemplo, o preço do óleo pode flutuar em função de guerras e/ou revoluções envolvendo países produtores de
petróleo ou mesmo devido a determinações dos países da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).
Apesar dessa modelagem ser utilizada para essa commodity, é importante observar que os preços marginais em cada
país produtor diferem substancialmente da cotação internacional, uma vez que os custos de exploração são
diversificados em função das condições geológicas de cada jazida.
238 Apêndice C

O parâmetro da Eq. (C.124) pode ser estimado usando dados de tempo discreto disponíveis
na seguinte regressão:
xt − xt −1 = a + bxt −1 + t (C.129)

E a partir da equação ˆ = − log(1 + bˆ) ,


x = −a / b ,  e:

log(1 + bˆ)

ˆ =
ˆ (C.130)
(1 + bˆ) 2 − 1

Onde ̂  é o erro padrão da regressão.


É fácil generalizar a Eq. (C.124). Por exemplo, se pode esperar que x(t) convirja para x
conforme Eq. (C.124), mas a taxa de variância cresce com x. Então, pode-se usar o seguinte
processo:
dx = ( x − x)dt + xdt (C.131)

Alternativamente, modificações proporcionais na variável podem ser modeladas como um


simples processo de reversão à média. Isso equivale a descrever x(t) com o seguinte processo:
dx = x( x − x)dt + xdt (C.132)

Os diferentes processos de reversão à média têm implicações nas decisões de investimento.


A seguinte questão pode ser levantada: os preços das commodities e outros bens são modelados
adequadamente como um processo de MB ou por um processo de reversão à média? Observando
dados dos preços de petróleo de um longo tempo (120 anos, por exemplo), é fácil sugerir que esses
preços seguem um processo de reversão à média com baixa taxa de velocidade. Utilizando testes
de raiz unitários (ao invés do teste t) com 120 anos de dados, é fácil rejeitar a hipótese de passeio
aleatório. No entanto, para dados de 30 ou 40 anos, o teste de rejeição falha. Esse parece ser o caso
de muitas outras variáveis econômicas, pois, usando poucos dados, é difícil distinguir
estatisticamente os processos entre passeio aleatório e processo de reversão à média.

LEMA DE ITÔ

O processo indicado na Eq. (C.113) é de tempo contínuo e não diferenciável. No entanto, em


muitas situações se deseja trabalhar com funções de processo estocástico com suas derivadas. Por
exemplo, quando se deseja obter o valor da opção de investimento de uma plataforma como função
do preço do óleo quando esta função é representada por um processo estocástico tipo MGB. Para
isso, haverá a necessidade de diferenciar e/ou integrar funções gerais do processo de Itô. Isso é feito
utilizando-se do Lema de Itô.
O Lema de Itô é representado facilmente por uma série de expansão de Taylor. Suponha que
x(t) segue o processo indicado na Eq. (C.113) e que uma função F(x,t) seja duas vezes diferenciável
em relação a x e uma em relação a t. A regra do cálculo elementar define a diferencial de primeira
ordem de F como:
F F
dF = dx + dt (C.133)
x t
Incluindo diferenciais de ordem superior em relação à x, resulta que:
Apêndice C 239

F F 1 2F 1 3F
dF = dx + dt + (dx) +
2
(dx)3 + ... (C.134)
x t 2 x 2
6 x 3

Os termos de ordem superior (terceira, quarta etc) podem ser desprezados. Assim, o Lema de
Itô fica definido pela seguinte equação:

F F 1 2F
dF = dt + dx + (dx) 2 (C.135)
t x 2 x 2

Substituindo dx da equação que define o processo de Itô – Eq. (C.113) – , resulta em:

 F F 1 2 2F  F
dF =  + a ( x, t ) + b ( x, t ) 2  dt + b( x, t ) dz (C.136)
 t x 2 x  x

Pode-se facilmente estender a expansão da série de Taylor para funções de vários processos
de Itô. Por exemplo, supondo que F=F(x1,x2,...,xm,t) seja uma função temporal de m processos de
Itô x1,x2,...,xm, onde:
dxi = ai ( x1 , x2 ,..., xm , t )dt + bi ( x1 , x2 ,..., xm , t )dzi , i = 1,2,..., m (C.137)

Com E(dzi,dzj)=ijdt. Então, aplicando-se o Lema de Itô, resulta a seguinte diferencial dF:

F m
F 1 m m 2F
dF = dt +  dxi +  dxi dx j (C.138)
t i =1 xi 2 i =1 j =1 xi x j
Assim, substituindo dxi da Eq. (C.137), resulta:

 F m
F 1 m 2 2F
dF =  +  ai ( x1 , x2 ,..., xm , t ) +  bi ( x1 , x2 ,..., xm , t ) 2
 t i =1 xi 2 i =1 xI
(C.139)
1 m 2
 F  m
F

2 i j
 ij bi ( x1 , x2 ,..., xm , t )  dt +  bi ( x1 , x2 ,..., xm , t )
xi x j  i =1 xi
dzi

_____________________________
EXEMPLO C.5 – Considere a função F(x)=xβ, onde x segue um
comportamento tipo MGB de acordo com a Eq. (C.115). Indique como
calcular a esperança do valor presente descontado de uma taxa r
definida por:

E   F ( x(t ))e −rt 



(C.140)
 0 

Solução
O Lema de Itô pode ser aplicado na função F, resultando em:

dF =  x −1 xdt + xdz +


1
( − 1) x −2  2 x 2 dt (C.141)
2
240 Apêndice C

Simplificando, chega-se a:

 1 
dF =  + ( − 1) 2  Fdt + Fdx (C.142)
 2 
Note que a Eq. (C.142) indica que F segue um MGB. Assim, pode-
se usar a Eq. (C.120) para dedução do valor esperado, ou seja:

xo
dF =
 1 2 (C.143)
r −  − 2 ( − 1) 

Desde que o denominador seja positivo.


Para outros procedimentos de séries temporais, incluindo séries
temporais multivariadas, o leitor pode consultar Montgomery e
Johnson (1976) e Morettin e Toloi (1985). Nessas referências podem-
se consultar os passos da metodologia de Box e Jenkins (1976) e os
testes estatísticos dos parâmetros estimados e os resíduos.
_____________________________
Apêndice C 241

REFERÊNCIAS E LEITURAS SUGERIDAS

Box, G. E. P., and G. M. Jenkins. 1976. Time Series Analysis, Forecasting, and Control. San
Francisco: Holden-Day, Inc.
BUENO, R. L. S. 2012. Econometria de Séries Temporais. 2nd ed. São Paulo: Editora Cengage
Learning.
Montgomery, C.D., and L.A. Johnson. 1976. Forecasting and Time Series Analysis. New York:
McGraw-Hill.
Morettin, P.A., and C.M.C. Toloi. 1985. Previsão de Séries Temporais. 2nd ed. São Paulo: Atual
Editora.
Wei, W. W. S. 2006. Time Series Analysis – Univariate and Multivariate Methods. 2nd ed.
Boston: Pearson Education.
(BUENO 2012)
242 Apêndice D

APÊNDICE D:

DISTRIBUIÇÕES DE PROBABILIDADES

DISTRIBUIÇÕES DISCRETAS

a) Distribuição binomial

A distribuição binomial1 é a distribuição de probabilidade discreta do número de sucessos


numa sequência de n tentativas desde que as tentativas sejam independentes. Cada tentativa resulta
apenas em duas possibilidades, sucesso S ou fracasso F. A expressão que define a distribuição
binomial de probabilidade é:

p( x) = Cxn p x (1 − p) n−x (D.1)

Onde:

n! n
C xn = =   (D.2)
x!( n − x)!  x 
Onde x é a variável aleatória binomial, significando o número de sucessos em n repetições do
experimento; p(x) é a probabilidade de obter x sucessos em n tentativas independentes do
experimento; p é a probabilidade de sucesso para uma única tentativa; 1–p é a probabilidade
complementar (fracasso); e n é o número de vezes que o experimento é realizado. Na distribuição
binomial tem-se, portanto, como características: (a) somente dois eventos podem ocorrer; (b) cada
tentativa no experimento é independente das outras; e (c) a probabilidade de cada ocorrência se
mantém constante para cada tentativa. Uma forma mais descritiva de apresentar a distribuição
binominal é:
n
p ( x) =   p (sucesso )  p (falha )
x n− x
(D.3)
 x
Em algumas situações se deseja obter a probabilidade combinada de um grupo de resultados.
Esses resultados normalmente são do tipo “mais do que” ou “menos do que” determinado valor. No
caso de distribuição binomial cumulativa, a expressão corresponde à soma das probabilidades
consideradas, ou seja:
n
p( x) =  C xn p x (1 − p) n− x (D.4)
x =k

1
Originária da distribuição de Bernoulli – essa distribuição é discreta de espaço amostral {0, 1}, com probabilidade
p(0)=1–p e p(1)=p. O cientista suíço Jakob Bernoulli (1654-1705) foi o primeiro matemático a desenvolver o cálculo
diferencial para além do que fora feito por Newton e Leibniz, aplicando-o a novos problemas. Se x1, x2,...,xn são n
distribuições de Bernoulli independentes com o mesmo parâmetro p, então sua soma x=x é uma distribuição binomial.
Apêndice D 243

A distribuição binomial pode aproximar-se da distribuição normal nos casos em que n for
muito grande e p não seja próximo de zero. A aproximação é tão mais verdadeira quanto mais o
valor de p se aproxima de 0,5 ou quando se verifica a condição dada pela Eq. (D.5) a seguir:
np(1 − p )  25 (D.5)

A esperança e a variância de uma variável aleatória x que tem distribuição binomial são,
respectivamente:

E ( x) = np e 2 = np(1 − p) (D.6)

Um caso particular da distribuição binomial é a distribuição de Bernoulli, quando n=1.

b) Distribuição de Poisson

A distribuição de Poisson2 expressa a probabilidade de eventos discretos ocorrerem num


determinado intervalo de medidas contínuas, tais como o tempo, a distância, a área, o volume etc.
Exemplos de problemas que podem ser resolvidos com a distribuição de Poisson: determinação do
número de consumidores por hora em um posto de combustível, números de vezes em que um
fornecimento de energia é interrompido por semestre, pontos de corrosão por metro quadrado em
uma plataforma de petróleo, número de camadas de rochas por quilômetro de profundidade numa
formação sedimentar etc. Observe que a variável aleatória é discreta e a unidade de medida é
contínua. A distribuição de Poisson vai desde zero ocorrência até, teoricamente, um número
ilimitado de ocorrências.
Se uma variável aleatória tem distribuição de Poisson, então a probabilidade de ocorrer um
dado número de ocorrências por unidade de medida (h, m, m3, semestre etc.) é dada por:

e − t ( t ) x
p ( x) = (D.7)
x!
Onde x é o número de ocorrências;  é a taxa média por unidade de medida; e t é o número
de unidades. O valor t representa a média de ocorrências no intervalo de medida t, portanto: t=µ.
Assim, a Eq. (D.7) se torna:

e −  () x
p( x) = (D.8)
x!
Note que a distribuição de Poisson é caracterizada por um único parâmetro, sua média. Tanto
o valor esperado como a variância de uma distribuição de Poisson é a sua média, t.

DISTRIBUIÇÕES CONTÍNUAS

a) Distribuição uniforme

A distribuição uniforme caracteriza-se pelo fato de a variável aleatória assumir valores de


mesma probabilidade de ocorrência. É também chamada de distribuição retangular e utilizada em

2
A distribuição de Poisson foi apresentada por Siméon-Denis Poisson (1781-1840) e publicada com a sua teoria da
probabilidade em 1838 no seu trabalho “Recherches sur la probabilité des jugements en matières criminelles et matière
civile”.
244 Apêndice D

tratamento de erros. Observe na Figura D.1 que todos os valores de x entre xmin e xmax têm a mesma
probabilidade de ocorrência.

Figura D.1 – Distribuição uniforme

A distribuição uniforme é a distribuição na qual a probabilidade de se gerar qualquer ponto


em um intervalo contido no espaço amostral é proporcional ao tamanho do intervalo. Se [a, b]=[xmin,
xmax] for o espaço amostral, por exemplo, então a função densidade de probabilidade e frequência
cumulativa são respectivamente:

xa 0; x  a
0;  x − a 
   
f ( x) = (b − a) −1 , a  x  b, F ( x) =  , a xb  (D.9)
0; x  b  b − a 
 1; x  b 

_______________________
EXEMPLO D.1 – Com base na definição do valor esperado e da
variância dados pelas Eqs. (C.8) e (C.16) (do Apêndice C)
respectivamente, determine E(x) e var(x) para uma distribuição
uniforme.

Solução
De acordo com a definição do valor esperado de uma distribuição
contínua, tem-se que:
b b x

E ( x) = xf ( x)dx =
a 
a b−a
dx (D.10)

Ou:
b
1 x2 (b 2 − a 2 ) (b + a )(b − a ) a + b
E ( x) = = = = (D.11)
(b − a ) 2 a
2(b − a ) 2(b − a ) 2

A variância var(x) é calculada pela Eq. (C.16). Para determinar


E(x2), basta aplicar a Eq. (C.8) para a distribuição uniforme,
portanto:
b x2b b3 − a 3
E( x2 ) = 
a
x 2 f ( x)dx = 
ab−a
dx =
3(b − a)
(D.12)
Apêndice D 245

Logo:

b 3 − a 3 ( a + b) 2
var( x) = E ( x 2 ) − E ( x) = −
2
(D.13)
3(b − a) 4
Que resulta em:

(b − a ) 2
var( x) = (D.14)
12
_______________________
Os simuladores estatísticos ou planilhas de cálculo possuem um gerador de números
aleatórios que gera valores entre 0 e 1 seguindo uma distribuição uniforme. A simulação Monte
Carlos, por exemplo, utiliza esse recurso. Esse número é chamado de pseudoaleatório, uma vez que
é possível repetir a mesma sequência a partir de uma “semente aleatória” 3.

b) Distribuição normal

A distribuição normal é a mais importante e a mais empregada distribuição no estudo da


probabilidade e da estatística, também conhecida como distribuição de Gauss. A função que
representa essa distribuição foi apresentada pelo matemático francês Abraham de Moivre 4. Além
de descrever fenômenos físicos da natureza, tem sido usada também para outras áreas.
Uma distribuição normal fica perfeitamente definida por dois parâmetros, a média μ e o desvio
padrão σ. Devido à sua simetria, a média, a moda e a mediana são iguais. Assim, conhecendo-se a
média e o desvio padrão se consegue determinar qualquer probabilidade de um evento que apresente
distribuição normal. A expressão geral para a função densidade de probabilidade da distribuição
normal é:
1
e −( x− ) /( 2 2 )
2
f ( x) = (D.15)
 2

Figura D.2 – Curva de distribuição normal ou curva gaussiana

3
A semente aleatória é um número ou vetor usado para iniciar um algoritmo gerador de números pseudoaleatórios –
gera uma sequência de números aproximadamente independentes uns dos outros. Existe um hardware para geração de
número verdadeiramente aleatório.
4
Abraham de Moivre (1667-1754) – matemático francês. Ficou famoso com a publicação da Fórmula de Moivre, que
relaciona os números complexos com a trigonometria e por seus trabalhos relacionados à teoria de probabilidade, a
distribuição normal. De Moivre foi o primeiro a usar princípios atuariais e bases científicas para o cálculo de seguros
de vida no ano de 1725.
246 Apêndice D

A curva do lado esquerdo da Figura D.2 ilustra uma curva de distribuição normal com as
respectivas áreas de acordo com o desvio padrão. A do lado direito indica a função densidade de
probabilidade e a função distribuição acumulada.
O domínio da função normal estende-se de −∞ até +∞. O valor da média divide a curva em
duas partes e o valor do desvio padrão determina a extensão do espalhamento ou dispersão da
variável. Como a área total sob a curva é igual a 1, conclui-se que, quando a média (altura) é
reduzida, a curva deve espalhar-se para as laterais para manter a mesma área total unitária. Adota-
se a seguinte notação quando uma variável aleatória x tem uma distribuição normal:

x  N (,  2 ) (D.16)

Quando =0 e  2=1, reduz-se para a curva normal padrão cuja função densidade e
distribuição de frequência acumulada são respectivamente:
1 − x2 / 2 1  −t 2 / 2
f ( x) =
2
e , erfc( x) = F ( x) =  e dt
2 x
(D.17)

Onde erfc(x) é conhecida como a função erro gaussiana.


O fato de a curva normal ser perfeitamente definida pela sua média e seu desvio padrão,
permite que todas as curvas normais possam ser reduzidas a uma curva normal padrão por simples
mudança de variável. Para a leitura de determinada área cumulativa sob a curva de distribuição
normal, pode-se empregar o método da distribuição normal padrão, utilizando-se, para tanto, uma
tabela especial padronizada que apresente os valores para uma variável adimensional z definida por:

x−
z= (D.18)

Onde x é um valor específico da variável de interesse, μ é a sua média e σ é o seu desvio
padrão. Essa expressão permite determinar o ponto z sobre a curva normal padrão que corresponde
a qualquer ponto x sobre a curva normal. A curva mais simples para se trabalhar é a que tem média
igual a 0 e desvio padrão igual a 1, razão pela qual se transformam as curvas normais para essa
curva padrão. Como a distribuição é simétrica em torno da média, é comum apresentar a tabela para
a metade da distribuição. A tabela é destinada a determinar a área para a variável z sob a metade
direita da curva normal que tem como média 0 e desvio padrão 1. A área sob a curva de uma
distribuição normal N(0, 1) compreendida entre a e b (ver Figura D.3) é calculada com a seguinte
expressão:
1 b − x2 / 2
p ( a  x  b) =
2 a e dx (D.19)

Figura D.3– Área sob a curva compreendida por dois valores


Apêndice D 247

A integral da Eq. (D.19) só é obtida por métodos de integração numérica.


Há razões para a importância da distribuição normal na estatística teórica e na aplicada. Entre
essas razões podem ser citadas:
• Representam com boa aproximação para uma infinidade de fenômenos físicos e naturais;
• Servem como aproximação de distribuições binomiais quando n é grande;
• É possível estabelecer, conforme já exposto, uma curva normal padrão por meio de um
escalonamento relativo das variáveis reais (média e desvio) com a variável z. Isso torna
fácil trabalhar com a distribuição de todas as distribuições normais.
A distribuição normal representa uma família infinita de distribuições, uma para cada
combinação possível de média e desvio padrão. Cada curva da família tem a mesma área. Ver Figura
D.4.

Figura D.4 – Famílias de curvas normais (área sob a curva igual a 1)

Um teorema importante da distribuição normal diz que, se uma variável aleatória x tiver uma
distribuição normal N(µ, 2) e se y=ax+b, então y terá uma distribuição normal N(aµ+b, a22).

c) Distribuição exponencial

A distribuição exponencial trata de probabilidades de eventos ao longo do tempo ou da


distância entre ocorrências num intervalo contínuo. Exemplos de eventos que podem ser
representados por uma distribuição exponencial:
• Tempo de chegada de um cliente em um posto de abastecimento de biodiesel;
• Tempo de falhas em poços de petróleo;
• Tempo entre uma troca de broca e outra nas operações de perfuração de poços etc.
Há semelhanças entre a distribuição exponencial e a distribuição de Poisson. As
probabilidades exponenciais são expressas em termos de tempo ou distância de ocorrência entre os
eventos. A função que modela essa destruição é:

p(T  t ) = e− t  p(T  t ) = 1 − e−t (D.20)

Onde  representa as ocorrências durante um intervalo. Assim, o espaço (ou tempo etc.) entre
ocorrências durante esse intervalo é 1/. A Eq. (D.20) pode ser representada por um gráfico
conforme indicado na Figura D.5.
248 Apêndice D

Figura D.5 – Distribuição exponencial

d) Distribuição lognormal

A distribuição lognormal é uma distribuição contínua de probabilidade e semelhante à


distribuição normal com assimetria em relação ao eixo vertical. Da mesma forma que a normal, a
distribuição lognormal é definida por dois parâmetros: a média e o desvio padrão. Quando a variável
aleatória x tem distribuição lognormal, o logaritmo de x tem distribuição normal. Quando a variável
aleatória é formada pelo produto de outras variáveis aleatórias, a distribuição tende à lognormal.
A distribuição lognormal, assim como a distribuição de Weibull, é útil para modelar as
funções de tempo de vida de produtos e materiais, por exemplo: fadiga de metais em geral,
equipamento como bombas de cavidades progressivas de poços de petróleo, compressores de
unidade de gás, semicondutores etc. A função densidade para a distribuição lognormal é:

1  (ln( x) − ) 2 
f ( x) = exp  − 
 (D.21)
x 2  2  2

Observe que a distribuição lognormal é caracterizada pela média e pelo desvio padrão. Sabe-
se também que, se ln(x)=y e x é uma variável aleatória com distribuição lognormal, então y é uma
variável aleatória com distribuição normal. A Figura D.6 mostra algumas curvas com distribuição
lognormal.

Figura D.6 – Distribuição lognormal


Apêndice D 249

Pode-se demonstrar que o valor esperado de uma variável que tem distribuição lognormal é:

E ( x) = E (e y ) = e E ( y ) + 0,5 var( y ) (D.22)

Onde var(y) é a variância de y, que equivale a:

var( x) = e 2 E ( y ) + var( y ) (e var( y ) − 1) (D.23)

As distribuições contínuas seguintes são as mais comuns da literatura e são mostradas nesta
revisão apenas a título de informação. Algumas delas podem ser úteis em estudos específicos de
algumas variáveis de natureza diversa.

e) Distribuição de Rayleigh

A função densidade de probabilidade de Rayleigh 5 é definida conforme Eq. (D.24) a seguir:


x − x 2 / 2b 2
f ( x) = e (D.24)
b2
Onde b é um parâmetro de posição. A função de frequência acumulada é:

(
F ( x) = 1 − e− x
2
/ 2b 2
) (D.25)

A Figura D.7 ilustra a função densidade de probabilidade e a função de frequência acumuladas


da distribuição de Rayleigh para alguns valores de b. Essa distribuição de frequência tem valor
esperado e variância respectivamente iguais a:

 4− 2
E ( x) =  e var( x) =  (D.26)
2 2

Figura D.7 – Distribuição de Rayleig

A distribuição de Rayleigh é utilizada, por exemplo, para representar a magnitude dos vetores
velocidades ortogonais do vento durante um ano, desde que se assuma que tais vetores tenham

5
John William Strutt, 3º Baron Rayleigh (1842-1919) – físico inglês. Junto de William Ramsay, descobriu o elemento
argônio e recebeu por isso o prêmio Nobel de Física em 1904. Ele também explicou porque o céu é azul e fez predições
sobre as superfícies de ondas, hoje conhecidas como ondas Rayleigh.
250 Apêndice D

distribuição normal com igual variância e não sejam correlacionados. Outras aplicações dessa
distribuição estão relacionadas à superfície de ondas e sinais de rádio.
Se x e y são variáveis independentes com distribuição normal N(0,2), então a variável a
seguir:

R = x2 + y 2 (D.27)

Segue uma distribuição de Rayleigh. Essa distribuição é um caso especial da distribuição de


Weibull.

Distribuição Gama

Uma distribuição importante da teoria de probabilidades é a distribuição Gama. Essa


distribuição é frequentemente utilizada para modelar tempo de espera, como, por exemplo, o tempo
de vida de uma pessoa. Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição Gama com k
graus de liberdade e um parâmetro escalar  se apresentar a seguinte fdp:
 x k −1e − x /  
 x0 k ,   0
f ( x, k , ) =  k ()  (D.28)
0 x0 
 
Onde () é a função Gama. A distribuição Gama não tem uma forma simples como a
distribuição normal, a exponencial ou a lognormal – ver exemplo na Figura D.8 para alguns graus
de liberdade k e alguns valores escalares de .

Figura D.8 – Distribuição Gama

Normalmente, a distribuição Gama é parametrizada com =k e =1/. Assim, com essa
parametrização, tem-se a seguinte fdp:
   −1 −x 
 x e x0 ,   0
f ( x, , ) =  ()  (D.29)
0 x0 
 
A função Gama é uma extensão da função fatorial para números complexos, definida por:
Apêndice D 251


 ( ) = 0
t  −1e − t dt (D.30)

Onde t é uma variável muda de integração. Essa função, de modo geral, tem a seguinte relação
de recorrência:
(n) = (n − 1)(n − 1) = (n − 1)(n − 2)(n − 2) = ... = (n − 1)(n − 2)...(1) (D.31)

Como (1)=1, tem-se que:


(n) = (n − 1)! (D.32)

Com a seguinte particularidade:

1
  =  (D.33)
2
O valor esperado da distribuição gama é E(x)=/ e a variância é var(x)=/ 2. Os casos
particulares dessa distribuição são:
• Se =1, resulta que f(x)=e–x, que equivale à distribuição exponencial onde =. Portanto,
a distribuição exponencial é um caso particular da distribuição Gama;
• Se =1/2 e =k/2, onde k é um inteiro positivo maior que zero, a função Gama assume a
seguinte fdp:
 1 
 k/2 x k / 2 −1e − x / 2 , x  0 
f ( x, k ) =  2 (k / 2)  (D.34)
0, x  0
 
Essa fdp representa a distribuição qui-quadrada 2(k) com k graus de liberdade, com E(x)=k e
a variância var(x)=2k. Essa distribuição é muito utilizada em testes de significância de várias
amostras para estimar proporções.
Se =k, onde k é um inteiro positivo maior que zero, a distribuição Gama se transforma na
distribuição de Erlang6 com a seguinte fdp:

k
f ( x, k ,  ) = x k −1e − x x,   0 (D.35)
(k − 1)!
Uma notação usual utilizada em algumas publicações é feita com o auxílio de indicadores
com os quais fica explícito que, fora do intervalo especificado no indicador, a função densidade se
anula. Por exemplo, a fdp da Eq. (D.35) pode ser reescrita incluindo uma função indicadora:
1
f ( x, k ) = x k / 2 −1e− x / 2 I[0, ) ( x) (D.36)
2 (k / 2)
k/2

Onde:

6
Agner Krarup Erlang (1878-1929) – foi matemático, estatístico e engenheiro, pioneiro na Engenharia de Tráfico e
publicou excelentes trabalhos sobre a teoria das filas em estudos de telecomunicações. A distribuição de Erlang é usada
em processos estocásticos da biomatemática.
252 Apêndice D

1; se a  x  b 
I [ a ,b ] =   (D.37)
0; para qualquer outro valor de x 

Distribuição de Weibull

Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição de Weibull7 com parâmetros k e
, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme Eq. (D.38) a seguir:
 k  x  k −1 −( x /  )k 
   e , x  0
f ( x; , k ) =       (D.38)
0, x  0

Onde k>0 é um parâmetro de forma e  é um parâmetro de escala. O valor esperado e a
variância da distribuição de Weibull são dados por:
 1   2  1 
E ( x) = 1 + ; var( x) = 2 1 +  −  2 1 +  (D.39)
 k   k  k 

A distribuição de Weibull é usada em previsão de tempo de vida de equipamentos e estimativa


de tempos entre falhas.

Distribuição de Cauchy

A distribuição de Cauchy8 se caracteriza por não possuir uma média definida, portanto
também não se pode definir seu desvio padrão. A distribuição de Cauchy tem pouca utilidade em
análise de risco. É usada com frequência na mecânica e na elétrica e em problemas de medição e
calibração.
Essa distribuição pode ser obtida por simulação entre duas distribuições normais
independentes. A função de distribuição de frequência definida é:
 1 
f ( x) =  2 (D.40)
  ( x − x0 ) +  
2

Cuja distribuição de frequência acumulada é:


1 1  x − x0 
F ( x) = + arctan  (D.41)
2    
Onde o parâmetro x0 se refere à posição na qual ocorre o pico da distribuição e  é um
parâmetro de escala. Como na distribuição gaussiana, a distribuição de Cauchy tem uma forma
padrão, assim sua fdp é:

7
Ernst Hjalmar Waloddi Weibull (1887-1979) – engenheiro e matemático sueco. É reconhecido pelo seu trabalho na
área de fadiga de materiais e na estatística por sua contribuição – a distribuição de Weibull.
8
Também chamada de distribuição de Cauchy-Lorentz em homenagem a Augustin-Louis Cauchy (1789-1857) –
matemático francês e Hendrik Lorentz (1853-1928) – físico premiado com o Nobel em 1902 por seu trabalho sobre
radiações eletromagnéticas.
Apêndice D 253

1
f ( x) = (D.42)
( x 2 + 1)

Distribuição Beta

A distribuição Beta representa uma família de distribuição de probabilidade contínua definida


num intervalo de 0 a 1 e parametrizada por dois parâmetros de forma,  e . Algumas vezes, a
distribuição Beta é usada para descrever probabilidades de distribuição desconhecidas.
A função densidade que define uma distribuição Beta é:

x  −1 (1 − x) −1
F ( x) = 1 (D.43)
0
s  −1 (1 − s) −1 ds

O valor esperado e a variância da distribuição Beta são, respectivamente:


 
E ( x) = e var( x) = (D.44)
+ ( + )2 ( +  + 1)

Distribuição F de Snedecor (Fisher-Snedecor)

Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição de Fischer-Snedecor, com
parâmetros n e d, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme a Eq. (D.45)
a seguir:
n  n+ d 
n − 
1  n  2 2 −1  n   2 
f ( x; n, d ) =   x 1 + x 
n d  d (D.45)
xB ,     d 
2 2

Onde B é a função beta, definida por:


1
t
x −1
B ( x, y ) = (1 − t ) y −1 dt (D.46)
0

A função beta tem as seguintes propriedades, dentre outras:


B ( x, y ) = B ( y , x )
 ( x ) ( y )
B ( x, y ) =
( x + y )
(D.47)
n − y
 
 
 n 
B ( x, y ) = 
n =0 x + n
254 Apêndice D

Distribuição t de Student

Se uma variável z tem uma distribuição normal N(0, 1) e V tem distribuição qui-quadrado
com k grau de liberdade, então a variável x conforme Eq. (D.48) tem distribuição t de Student com
k graus de liberdade.
z
x= (D.48)
V /k
Por definição, uma variável aleatória x tem uma distribuição t de Student com k graus de
liberdade, quando sua função densidade de probabilidade se comporta conforme a Eq. (D.49) a
seguir:
 k +1
 
1
− ( k +1)
 2

f ( x) = 
2   x  2
1+  (D.49)
 k   k 
k  
2
Onde  é a função gama e com a seguinte propriedade:
 k +1
 
 2  = (k − 1)(k − 3)....5  3
(D.50)
k
k   2 k (k − 2)(k − 4)...4  2
2
A distribuição t de Student é aplicada nos problemas de determinação da média a partir de
uma amostra de uma população que segue uma distribuição normal. Nesses problemas, a média ou
o desvio padrão da população são desconhecidos.
Prefixo Editorial: 53193
Número ISBN: 978-85-53193-01-1
Título: Planejamento Integrado de Recursos Energéticos: oferta, demanda e suas
interfaces
Tipo de Suporte: Internet

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