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PAIXÃO DO SENHOR

1. Foi-nos dada a graça de nos reunirmos aqui, na Casa de Deus, nesta Sexta-Feira Santa,
para celebrarmos, unidos de alma e coração à Igreja inteira, a Una e Santa, a Paixão do
único Senhor da nossa vida, «Aquele que nos ama» (Apocalipse 1,5), Jesus Cristo.

2. E foi-nos dado seguir, passo a passo, com a conversão do coração e o louvor no coração,
o imenso relato da Paixão do único Senhor da nossa vida, a partir do Evangelho segundo S.
João (18,1-19,42). Foi assim que atravessámos o Cédron e entrámos no «jardim». É de
noite, mas arde a LUZ, a LUZ, a LUZ. É verdade que já não estamos todos. Judas perdeu-se
na NOITE, na NOITE, na NOITE (João 13,30). Virá depois com archotes e lanternas – mísero
sucedâneo da LUZ – e com armas (João 18,3). Vem prender a LUZ, mas cai encandeado
(João 18,6). Tem de ser a LUZ a ofuscar-se por amor e a entregar-se a ele por amor. Neste
ponto preciso, refere o relato de Marcos que nós fugimos todos, abandonando-o (Marcos
14,50). E fugidos andaremos, e perdidos, na noite e no frio, até sermos outra vez por Ele
encontrados e recolhidos. Mas já, entretanto, Pedro, perdido, se acolhe a outra luz e se
aquece a outro lume (João 18,18). E, interpelado, nega ter andado com Jesus, ter alguma
coisa a ver com Jesus, ter parte com Jesus. Nega mesmo conhecer Jesus (Marcos 14,67-71;
João 18,17-27).

3. Até que o galo canta, e começa a nascer o dia para Pedro (Marcos 14,72; João 18,1-27).
Notemos que quando Judas sai, é de NOITE, e que, depois da negação de Pedro, o DIA nasce
com o canto do galo. O relato de Pedro faz parte integrante do relato da Paixão, e não é um
seu acompanhamento secundário. É o relato do anunciador. O canto do galo é um sinal. Traz
para a cena a obra criadora do primeiro dia, em que, segundo o relato do Génesis, «Deus
separou a luz e as trevas» (Génesis 1,3-5). Aqui, em contraponto, estão as trevas de Judas e
a luz nascente para Pedro. Obra luminosa e criadora. Mas também anunciadora, porque este
canto exerce uma função de referência entre as fases do tempo: nenhum animal é mais
querigmático do que o galo. Iremos encontrá-lo sobre os nossos antigos campanários, mas
já, antes disso, o encontrámos muitas vezes sobre os primeiros sarcófagos cristãos. Não são
as horas do tempo que o galo anuncia; o galo anuncia o nascer de um Dia novo, sem
princípio nem fim, não sujeito aos ponteiros do relógio.

4. Mas vejamos ainda melhor a qualidade ou falta dela do testemunho que damos de Jesus.
Também aqui a página do Evangelho é admirável e implacável. Jesus acaba de dizer ao
Sumo-Sacerdote que não o interrogue a Ele, mas que interrogue aqueles que ouviram os
seus ensinamentos, pois não falou às escondidas, mas em público (João 18,19-21).
Impressionante verificarmos que, ao mesmo tempo que Jesus faz esta afirmação dentro do
Palácio, Pedro esteja a ser interrogado cá fora, e responda negando tudo! (João 18,17.25-
27).

5. Mas Jesus prossegue o seu caminho de amor até ao fim. Até à Cruz. É lá que se revela o
rosto do doentio gosto pela morte que nos habita. «Salva-te a ti mesmo!» (Lucas
23,35.37.39), gritamos nós repetidamente zombando, porque o que queremos mesmo, não
é que Ele se salve; o que queremos mesmo é assistir ao doentio espetáculo da morte! Não
quero que penseis, meus irmãos, que isto são coisas do passado, e que não têm nada a ver
connosco. Não. O que estou a dizer acerca deste doentio gosto pela morte passa-se hoje.
Como gostamos nós de ver os nossos irmãos a atolar-se na lama! A tanto chegou a nossa
malvadez! Um ódio sem motivo, sem fundo, nos habita (Salmo 35,19; 69,5; João 15,25).
Sim, Ele é o Justo. Ele é a Bondade absolutamente gratuita, sempre Primeira e radical,
igualmente sem motivo, sem fundo. Ele ama Primeiro (1 João 4,19), quando éramos ainda
pecadores (Romanos 5,8). Por isso, em vez de à nossa violência oferecer mais violência, Ele
acolhe-a e acolhe-nos por amor, e por amor a nós se entrega, declarando assim
ultrapassados e inúteis os nossos mais requintados ódios e os nossos mais sofisticados
instrumentos de guerra (cf. Isaías 2,2-4; Miqueias 4,1-3). Ali, naquele Corpo Crucificado,
morto por amor, e por amor exposto por escrito diante dos nossos olhos atónitos (Gálatas
3,1), morre o nosso desejo de morte, o nosso pecado, apagado pelo fogo do amor, que
declara o nosso pecado completamente inútil, inutilizado, anulado e ultrapassado (cf.
Colossenses 2,14).

6. Ainda vamos a tempo de ver que, sob o olhar do Crucificado, quatro soldados levam as
coisas de Jesus, que, para o efeito, dividem em quatro partes: uma para cada um deles
(João 19,23). O contraponto, belo, vem de quatro mulheres (a mãe de Jesus, / a irmã de sua
mãe, / Maria, mulher de Cléofas, / e Maria Madalena), que não levam as coisas de Jesus,
mas se abraçam à Cruz de Jesus (parà tô staurô), como se ela fosse uma pessoa (João
19,25). Elas abraçam e levam o amor de Jesus!

7. Na Cruz, Jesus reza o salmo 22, todo, desde «Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste?» (Salmo 22,2), até «Esta é a obra do Senhor!» (Salmo 22,32), que são as
últimas palavras do Salmo 22, que deixam a claro que é de Deus a obra da Cruz! É assim,
nos braços do Pai, que Jesus morre, sendo depois o seu corpo descido da Cruz e
carinhosamente envolvido em panos de linho literalmente encharcados com 32 quilos e 800
gramas de perfume! (João 19,39), à imagem do Rei messiânico cantado no Salmo 45,9. Foi
sepultado no jardim, num sepulcro novo, no qual ainda ninguém tinha sido deposto (João
19,41). O Rei é sempre o primeiro em tudo. Vem depois aquela madrugada da Ressurreição.

8. Por isso, depois disso, por causa disso, os primeiros cristãos rapidamente fizeram deste
Santo Sepulcro o seu primeiro e mais venerado lugar de culto. O Imperador Adriano (117-
138) soterrou o Santo Sepulcro e paganizou-o, estabelecendo ali cultos pagãos com a clara
intenção de afastar os cristãos: no lugar do Santo Sepulcro, pôs a estátua de Júpiter, e, no
Calvário, pôs uma estátua de Vénus em mármore. O mesmo fez, de resto, em todos os
lugares santos da Palestina. Todavia, quando em 13 de Setembro de 326, por indicação de
um habitante de Jerusalém, Santa Helena, mãe do imperador Constantino, descobriu a Cruz
do Senhor, mandou logo demolir as construções pagãs. Foi assim que vieram à luz outra vez
os primitivos e venerados lugares cristãos, que foram então englobados num magnífico
edifício Constantiniano, consagrado no dia 13 de Setembro do ano 335, e que era formado
pela basílica da Anástasis, que guardava no centro o Santo Sepulcro, o Triplo Pórtico, que
abrigava o rochedo do Gólgota e o Martyrium, que guardava o lugar da crucifixão e morte do
Senhor. No dia imediatamente a seguir à dedicação da Basílica, 14 de Setembro desse ano
335, teve lugar e origem a adoração da Cruz de Cristo, hoje, Festa da Exaltação da Santa
Cruz. A peregrina Egéria, da Galiza, que em finais do século IV, visitou demoradamente os
Lugares Santos, diz-nos que a Santa Cruz era então exposta à adoração dos fiéis duas vezes
no ano: em 14 de Setembro e em Sexta-Feira Santa. Egéria descreve assim a adoração de
Sexta-Feira Santa: «desde as 08h00 da manhã até ao meio-dia», «todos passavam, um por
um: inclinam-se, tocam a Cruz com a fronte, e depois com os olhos a Cruz e a inscrição, a
seguir beijam a Cruz e saem, sem que ninguém toque com a mão na Cruz» (Itinerarium,
36,5; 37,3).

9. Adoremos nós também, com amor, neste Dia de Sexta-Feira Santa, a Santa Cruz do único
Senhor da nossa vida.

Esta sexta-feira é Santa. Grande. Autêntica.


Vê-se Jesus exposto na Cruz por todo o lado.

Solene exposição.

Mesmo fechando os olhos, as janelas e as portas,

Tu rebentas as comportas com jatos de Luz,

E saltas as trincheiras do meu coração.

Vem, Senhor Jesus,

Entra pela janela dos meus olhos,

Enche todos os recantos do meu ser,

Ilumina todos os redutos,

E faz-me ver que todo o comodismo e egoísmo

É sem raiz nem flor nem frutos.

Irei, Senhor,

Em procissão de amor,

Beijar a tua Cruz.

E quando eu olhar para ti,

Para o teu rosto ferido e desfigurado,

Para as tuas muitas chagas a sangrar,

Dá-me a graça de aí ver bem o meu pecado.

E quando Tu, Senhor, olhares para mim,

Com esse meigo olhar de serena compaixão,

Dá-me a graça de ver o teu perdão nunca poupado,

E de sair com o coração transfigurado.


António Couto

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