Vous êtes sur la page 1sur 6

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS


PROGRAMA ASSOCIADO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA UFC-UNILAB
TEORIA ANTROPOLÓGICA II
PROF. GEORGE PAULINO
BRUNO ALVES DE SOUSA
MATRÍCULA Nº 431718

Trabalho final de Teoria Antropológica II

O presente trabalho tem por objetivo dissertar acerca de dois autores cujos
textos foram discutidos na disciplina de Teoria Antropológica II. Escolhi escrever sobre
as premissas de Clifford Geertz e sua antropologia interpretativa, bem como James
Clifford e sua discussão sobre autoridade etnográfica, visões de poder e diálogo na
etnografia.
Clifford Geertz (1926 -2006) foi um dos mais importantes antropólogos dos
Estados Unidos. Principal fundador da Antropologia Interpretativa (ou Hermenêutica),
defende em sua proposta metodológica que uma sociedade é como um texto a ser lido
em que o ser humano está imerso. O esforço do antropólogo é tentar deslindá-lo para se
tornar compreensível, usando as lentes do sujeito de pesquisa e não as do pesquisador.
Seus estudos se concentraram na Indonésia (ao descobrir a icônica briga de galos
balineses) e no Marrocos (quando estudou a religiosidade islâmica).
Em “Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa da cultura”,
Geertz observa inicialmente como uma ideia nova é rapidamente recepcionada como
chave explicativa em detrimento das demais existentes. Num tom crítico e ácido,
observa essa flutuação e essa pretensão um tanto globalizante no conceito de cultura.
Por isso, propõe um conceito mais limitado e menos confuso em detrimento da
complexificação de Tylor. Almeja reduzi-lo a uma dimensão mais justa.
Se a cultura pode ser definida por outros autores como “modo de vida global
de um povo”, “aprendizagem em comum”, “mecanismo para regulamentação normativa
do comportamento”, ou ainda “precipitado da história”, Geertz apresenta uma
proposição de um conceito semiótico de cultura, uma vez que “o homem é um animal
amarrado a uma teia de significados que ele mesmo teceu” e a cultura se constitui
nessas teias e sua análise respectiva. A antropologia não é uma ciência em busca de
regularidades e leis, mas uma ciência interpretativa em busca de significado. A prática
científica é a etnografia, em que o pesquisador estabelece relações, seleciona
informantes, transcreve textos, levanta genealogias, mapeia campos, elabora diário. Não
são essas técnicas que definem o empreendimento, mas o esforço intelectual de uma
“descrição densa”. O autor ilustra com o exemplo da piscadela que pode ter múltiplos
significados: desde um tique involuntário, um concurso conspiratório, até uma imitação
ou careta com fins de achincalhamento.
O que o antropólogo chama de seus dados são, na verdade, a elaboração
pessoal das elaborações pessoais de outros autores. Antes de a coisa em si ser
examinada, há um background nas produções que facilitam a sua compreensão. Toda
análise é uma escolha entre estruturas de significados. E a etnografia é, pois, uma
descrição densa. O etnógrafo, diante da multiplicidade de estruturas complexas, deve
primeiramente apreendê-las no campo para posteriormente apresentá-las num texto. O
ato de etnografar é “tentar ler (no sentido de ‘construir uma leitura de’) um manuscrito
estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários
tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos
transitórios de comportamento modelado”. Eis aqui uma crítica ao estruturalismo levi-
straussiano, uma vez que leva em consideração a peculiaridade e a inexatidão.
A cultura é pública porque o significado o é. Apesar de ser ideação, não
existe na cabeça de alguém. Para o autor, perde o sentido tentar entender se a cultura é
conduta padronizada ou um estado da mente ou as duas coisas. O que se deve indagar é
a sua importância, o que está sendo transmitido. Ora reificada, ora reduzida. Ora um
subjetivismo, ora um formalismo extremo.
Por fim, a cultura consiste nas estruturas de significado socialmente
estabelecidas, nos termos de que as pessoas fazem certas coisas como sinais de
conspiração e se aliam ou percebem os insultos e respondem a eles, não é mais do que
dizer que esse é um fenômeno psicológico. A reação demanda e pressupõe familiaridade
com o universo imaginativo em que os atos ocorrem, e mesmo empatia com os
interlocutores. Todavia, um ser humano é um enigma para outro. Compreender um povo
e suas tradições é bastante difícil, ainda que se domine sua língua.
A pesquisa etnográfica como experiência pessoal não objetiva que o
pesquisador torne-se um nativo. O que se procura é conversar com eles. A cultura não é
um poder, mas um contexto. Compreender a cultura de um povo expõe sua normalidade
sem reduzir sua particularidade. Quanto mais se tentar seguir os sujeitos da pesquisa,
mais lógicos e singulares eles parecem ao pesquisador, com sua análise êmica (universo
da experiência do interlocutor). Os textos antropológicos são eles mesmos
interpretações e, na verdade, constantemente de segunda e terceira mão ou até de quarta
mão. Apenas o “nativo” faz a interpretação em primeiro mão (e em alguns casos,
mesmo ele faz em segunda mão). Tratam-se de ficções, como “algo construído”.
O pulo do gato da etnografia não é tanto esmiuçar os fatos diferentes da
realidade do autor da pesquisa para evidenciar perplexidade inerente ao estranho no
relato etnográfico, mas ir além de descrições superficiais, aprofundar o significado de
práticas culturais apreendendo o ponto de vista do nativo, conseguindo distinguir
atitudes que parecem ser idênticas. Não busca irrefutabilidade de explicações, mas uma
compreensão da lógica informal da vida real.
A cultura como um sistema simbólico hermético não daria vazão à sua
dinamicidade na vida cotidiana. Os acontecimentos empíricos não são entidades
abstratas observáveis. Por mais importante que seja a coerência num sistema cultural,
não deve ser o principal critério de validação. Ora, se a interpretação antropológica é
construir uma leitura do que acontece, divorciá-la do que ocorre é divorciá-la das suas
aplicações e torná-la vazia.
O etnógrafo inscreve o discurso social, anota-o, fixa-o numa forma
inspecionável. Ao fazê-lo, transforma de acontecimento passado em um relato que
poderá ser consultado posteriormente. A escrita fixa o acontecimento de fala. No ato de
registro, o que se inscreve não é o discurso bruto, mas a parte que os interlocutores nos
podem levar a compreender (ainda há os casos de má-fé de alguns sujeitos). Portanto,
uma reconstrução incompleta.
Para Geertz, a descrição etnográfica tem algumas características:
a) é interpretativa;
b) interpreta o fluxo do discurso social;
c) tenta salvar o “dito” da possibilidade de extinção e fixa-o em formas pesquisáveis;
d) é microscópica, pois confronta grandes realidades com conjunturas mais decisivas em
dados contextos. Mas a busca de uma essência é um tanto absurdo.
O antropólogo não estuda as aldeias, mas nas aldeias. O diverso reforçaria a
visão colonial etnocêntrica. Além disso, a circunstancialidade é a marca de um trabalho
etnográfico. Um obsessivo trabalho de campo, qualitativo, altamente participante, em
que megaconceitos são pensados concretamente, de forma criativa e conjunta.
Em última análise, o objetivo seria tirar grandes conclusões a partir de fatos
pequenos, mas densamente entrelaçados. Para tal, é requerida habilidade. Não se visa a
generalizar através dos casos, mas generalizar dentro desses casos. Entender
internamente e não tentar entender com a construção de uma interpretação mais ampla.
Aliás, a teoria deve estar mais próxima do terreno e não o sobrevoando, longe da
superfície em que incide concretamente. A análise cultural é fadada a incompletude or
mais profundidade que alcance. Também não deve flutuar muito a perder de vista as
“superfícies duras da vida”, numa crítica aguda ao evolucionismo. Tenta resistir ao
subjetivismo, mas também ao objetivismo. Chega a propor que “é melhor que os
sentimentos levem a melhor”, contanto que se mergulhe nas dimensões simbólicas da
ação social.
Já James Clifford (1945- ...)foi um antropólogo estadunidense, aluno de
Clifford Geertz, que estudou a história da antropologia. Buscou entender a moderna
noção antropológica de cultura, com ênfase nos contextos colonial e pós-colonial. Sua
formação original é enquanto historiador. É conhecido como metaetnógrafo por
produzir textos reflexivos sobre etnografias, apesar de não ter tido nenhum trabalho de
campo em alguma comunidade específica.
Para ele, o antropólogo moderno se profissionalizou como etnógrafo,
adquirindo a etnografia uma centralidade metodológica, ainda que realizada de
diferentes perspectivas diante da multiplicidade de arranjos entre etnógrafo,
interlocutores e outros personagens. Trata-se de um trabalho em interface com
literatura, mas vai além, pois experimenta relações de poder geralmente assimétricas.
Em “Sobre a Autoridade Etnográfica”, extraído do livro “A Experiência
Etnográfica: antropologia e literatura no século XX”, Clifford disserta sobre a
desconstrução da etnografia clássica, os antropólogos sendo vistos como “nativos”.
Aborda que a concretização do texto é uma problemática da etnografia contemporânea.
Ao dissertar no início que Malinovski edificou sua legitimidade de autoridade
etnográfica estrategicamente no critério de “estar lá”, da “experiência”, o autor comenta
agora a desintegração da autoridade etnográfica ao longo do século XX, após a
descolonização afro-asiática, em que há uma maior redistribuição de poder. O Ocidente
não pode mais se apresentar como único provedor de conhecimento sobre o outro.
O espaço agora é frutífero para a heteroglossia de Bakhtin em que se dá
ênfase às multivocalidades das diversidades humanas. Ainda que se opere com
dicotomias, pelo menos não se reforcem abstracionismo e a-historicidade. Também
condiciona tal situação discursiva a um conjunto de relações históricas de diálogo e de
dominação. Se as etnografias são invenções, o são contingenciadas num dado momento
histórico e numa dada correlação de forças específicas.
A etnografia demanda sensibilidade, envolvimento direto, conversação e
desarranjo de expectativas pessoais. Seu desenvolvimento perpassa pela noção de
construção de alteridade. Do século XIX até a década de 1960, as matrizes
estadunidense e europeia tinham hegemonia no trabalho de campo com descrições
culturais intensivas feitas por profissionais. A produção escrita do intérprete era
individualizada e obscurecia relações de poder. Desde Malinovski, passando por Boas,
Mead, Cushing, Radcliffe Brown e Pritchard, a etnografia constituiu-se um poderoso
gênero científico-literário com observação participante, mas de elevado rigor científico.
Seja pela convivência intensiva (alguns aprendendo a língua nativa, aliás), seja pela
construção impessoal de narrativas envolventes de um “presente etnográfico”. Buscava
se “chegar ao cerne” de uma cultura rapidamente, ainda que para tanto precisasse
suspeitar de relatos de interlocutores privilegiados e focalizar em instituições
específicas, chegando ao todo através de partes (microcosmos).
Com o tempo foi se deslocando de experiência para interpretação. A
experiência foi resultando em trabalhos subjetivos do etnógrafo sobre “seu povo”. As
críticas foram se avolumando até culminar na atual crise de autoridade. Geertz aponta a
necessidade de interpretação de uma “textualização” de experiência, com um dado
corpus à disposição, num dado contexto. Ricoeur evidencia a relação necessária entre
texto e “mundo”. Etnografar é interpretar culturas. O etnógrafo sempre vai embora
levando com ele os textos para uma posetrior interpretação inaudita partes. A real
elaboração etnográfica é longe do campo, com os dados que nele foram constituídos.
A antropologia interpretativa de Geertz contribuiu para o questionamento
dessa autoridade etnográfica, mas não escapa aos limites apontados por críticos pós--
coloniais. A qualidade de não reciprocidade se mantém, por exemplo. Urge após 1950 e
1960 uma negociação construtiva entre sujeitos conscientes e politicamente
significativos. Dessa forma, a experiência e a interpretação vêm cedendo espaço não só
para heteoglossia, mas para polifonia e também ao diálogo. A escrita etnográfica não
pode ser entendida monologicamente nem neutra nos campos discursivos de poder.
Tenta-se rejeitar uma separação nítida entre o eu que interpreta e o outro que textualiza.
Almeja um diálogo em que interlocutores negociam uma visão compartilhada da
realidade. Ainda assim, há reducionismo e conduções de diálogo pelo pesquisador.
Griaule é apresentado como um pioneiro no exercício de uma narração
etnográfica dialógica. Reflete sobre ele e sua relação com os dogon em outro texto:
“Poder e diálogo na etnografia: a iniciação de Marcel Griaule”. Deram seguimento a
esse empreendimento etnográfico Dwyer e Crapanzano. Mais à frente, foi aprofundado
tal pensamento por Turner e Casagrande, valorizando a polifonia nas suas etnografias.
Na escrita etnográfica atual, o controle do interlocutor sobre o conhecimento
adquirido no campo pode ser considerável, visto que busca adequadamente representar
uma autoridade também desses “informantes” (termo agora considerado inadequado).
Por isso, tenta-se evitar o discurso indireto livre, por exemplo, em que se suprime
indiretamente e controla um discurso do interlocutor. As citações têm aparecido cada
vez mais. Ainda se vê como utopia uma etnografia inteiramente eivada de citações. Por
sua vez, os “interlocutores” têm sido citados com mais regularidade, com seus nomes
próprios. Nativos e etnógrafos apresentados com vozes diferentes.
Ainda assim, Clifford reconhece a autoria plural como uma utopia, pois na
sua visão o etnógrafo exercerá inevitavelmente a posição editorial final no relato, além
de a autoria plural desafiar a identificação ocidental de associar um texto a uma
intencionalidade de um único autor. Tornam-se livros incomuns, mas os exercícios são
interessantes de serem estudados.
Por fim, a consciência etnográfica não pode mais ser um monopólio
ocidental. Os modelos de autoridade elencados (experiencial, interpretativo, dialógico e
polifônico) estão à disposição para o etnógrafo. Nenhum está obsoleto. Todos têm em
algum grau um controle de autoridade, ou seja, não há pureza. Está imersa num campo
de lutas.

Vous aimerez peut-être aussi