Gruzinski descreve o caráter híbrido atrelado ao desenvolvimento da Cidade do México,
onde povos com origens distintas se entrelaçaram a partir da conquista ibérica, visto que os indígenas exerceram participação ativa no processo, apesar das perdas culturais e explorações. O gênese desta cidade se dá justamente no local de principal ocupação indígena, tomando forma ao se inserir sobre a cultura nativa em vários âmbitos, principalmente no trabalho. O texto exemplifica que a curiosidade e notável habilidade indígena em aprender os ofícios oriundos da Espanha foi aproveitada, por intermédio de figuras religiosas, para transformá-los em mão de obra apta a servir os patrões europeus, integrando o mercado colonial ao dominarem tais técnicas – o que contraria a noção de exclusividade da imposição brutal, demonstrando também o impacto da persuasão subjetiva. Em função disso, ocorrem modificações na linguagem, misturando os vocábulos para compor o linguajar corriqueiro expressado pelos falantes deste novo meio social, a partir de neologismos criados por nativos para descrever os novos objetos que compõe seu dia a dia, até que estes se domesticassem à hispanização linguística. Entretanto, em contraponto a esse engajamento voluntário, grupos indígenas também eram encontrados trabalhando em circunstâncias precárias nas Fábricas (obrajes), condicionados a situações próximas à escravidão, justificadas pela falsa premissa de que estavam lá por vontade espontânea pelos responsáveis do estabelecimento. Na organização política, repartiu-se o povo em duas entidades, a República dos índios, denominados macehuales, um sinônimo para “plebeus”, e a República dos espanhóis; ambas subjugadas à Coroa. Foi requisitada uma grande demanda de macehuales para a reconstrução da cidade, no entanto, o índice destes indivíduos que estavam sendo dizimados por doenças recorrentes aos espanhóis era alarmante e culminou em um declínio das resistências indígenas. Além disso, a crise trazida da Europa refletiu na tentativa de submeter impostos aos grupos nativos que trabalhavam para os nobres e até os macehuales da capital. A inatividade do governador indígena frente a esses abusos fiscais desencadeou revoltas dos índios contra a forma de governo e influenciou resistência contra a imposição da Igreja, um dos meios de dominação espanhola, reconfigurando a noção de camadas populares e como estas se relacionavam com o poder na Cidade do México desde então, modificando a dicotomia hispano-indígena que categorizava os indivíduos a princípio, devido às multi-etnicidade que passou a compor a sociedade.