Vous êtes sur la page 1sur 80

Paul Krugman, a atual crise, sushis e a

importância da teoria do capital

economia

Robert P. Murphy

quinta-feira, 23 out 2008

[N. do T.: o texto a seguir foi considerado pelos leitores do mises.org um dos mais
divertidos e elucidativos já divulgados.]

Quanto mais leio inúmeros analistas, incluindo economistas profissionais,


oferecendo "soluções" para a crise financeira, mais me convenço da
importância da teoria do capital. Essa importância é exacerbada quando você
vê a dicotomia que as pessoas insistem em traçar entre os mercados
financeiros e a "economia real", uma distinção que é útil para alguns
propósitos, mas que, nesse contexto, apenas reforça a idéia de que a bolsa de
valores nada mais é do que um cassino.[1]
Quando o plano de socorro financeiro do Secretário do Tesouro Henry
Paulson estava começando a tomar forma, até mesmo os pensadores mais
sagazes e pró-livre mercado, que outrora se mostraram muito coerentes,
recomendaram que, na verdade, uma "recapitalização bancária" seria o jeito
certo de corrigir a bagunça. Mas se considerarmos que todos os problemas
advêm do fato de que recursos reais foram erroneamente desviados para o
setor imobiliário - muitas e enormes casas foram construídas em detrimento
de vários outros possíveis usos para aqueles insumos - então qualquer
transferência financeira feita pelo governo não irá por si só ajudar em nada, a
não ser na redistribuição dos prejuízos.

Uma vez que compreendemos que os atuais problemas se devem às


distorções induzidas pelo Fed na estrutura do capital, torna-se claro que a
pior recomendação para a crise é que o Fed corte as taxas de juros e injete
ainda mais "liquidez". Foi o crédito artificialmente barato que estimulou o
boom imobiliário, pra início de conversa. Alan Greenspan jogou a taxa básica
de juros (nos EUA chamada de Federal Funds Rate) para o ridículo nível de
1% - o que significa que a taxa de juros era de fato negativa, quando ajustada
pela inflação dos preços - e a manteve nesse nível por um ano. Ele fez isso com
a intenção (aparente) de evitar uma áspera recessão na "economia real" -
recessão necessária para corrigir os maus investimentos e a má alocação de
recursos - após o colapso das ações das empresas pontocom (empresas que
comercializavam produtos ou serviços relacionados de alguma maneira à
Internet). Mas, na realidade, o que ele fez foi plantar as sementes de toda a
atual crise. Se Bernanke continuar canalizando centenas de bilhões de dólares
para banqueiros necessitados, daqui a cinco anos os americanos (e o resto do
mundo) irão olhar afetuosamente para a atual crise da mesma maneira que
hoje olhamos saudosos para a recessão de 2001, que sob as atuais
circunstâncias parece que foi uma amena inconveniência.

Paul Krugman e Tyler Cowen ridicularizam a Teoria da "Ressaca"

Ao invés de começar do zero, nesse artigo vou ilustrar a importância de uma


sólida teoria do capital, mostrando como que economistas muito inteligentes
- um dos quais é hoje um ganhador do Nobel - cometem erros elementares em
suas críticas à teoria austríaca dos ciclos econômicos (TACE). Em prol da
brevidade, não irei recapitular a teoria aqui; nos links acima você pode ver
minhas sucintas explicações, ou você ir aqui para ver a incrível
apresentação em Power Point [em português] feita por Roger Garrison,
ou aqui para uma introdução mais abrangente.

E então, assumindo que o leitor entende o básico da teoria austríaca, vou


transcrever uma recente discussão que Tyler Cowen[2]fez a respeito
da crítica de Paul Krugman à TACE:

[Paul Krugman:] Aqui está o problema: por uma questão de simples aritmética,
o gasto total em uma economia é necessariamente igual à renda total (cada
venda é também uma compra, e vice versa). Portanto, se as pessoas decidem
gastar menos em bens de capital, será que isso não significa que elas devem ter
decidido gastar mais em bens de consumo - o que implica que uma queda no
investimento deve sempre ser acompanhada de um correspondente aumento no
consumo? E, sendo assim, por que deveria haver um aumento no desemprego?

[Tyler Cowen comentando a fala acima:] Mas eu creio que o ponto será mais
efetivo se tomado ao inverso. Por que é que, pra começo de conversa, o boom
(forte crescimento econômico) é realmente um boom? A retirada de recursos da
produção de bens de consumo, e sua transferência para a produção de bens de
capital, deveria gerar queda no salário real, e não aumento. Em outras palavras,
a teoria austríaca não gera o altíssimo grau de co-movimento encontrado nos
dados.

Esses são na verdade dois argumentos distintos; ou seja, Cowen fez mais do
que simplesmente "inverter" o argumento, ele alterou-o ligeiramente. Para
ajudar o leitor a entender minha resposta, deixe-me parafrasear (aquelas que
considero ser) as objeções similares (porém distintas) de Krugman e Cowen
à teoria de Mises e Hayek.

A teoria austríaca, em linhas bem gerais, diz que durante o boom econômico
artificial a mão-de-obra dos trabalhadores e outros recursos serão desviados
para projetos de investimento que não são compatíveis com o nível total da
poupança real. Mais cedo ou mais tarde a realidade vai impor sua face
medonha e os projetos insustentáveis terão de ser abandonados antes de
serem finalizados (a menos que o crédito continue sendo injetado na
economia em volumes cada vez maiores, o que geraria um colapso total dos
preços). Os empreendedores percebem que eles se enganaram terrivelmente
durante o boom, todos se sentem mais pobres e cortam o consumo, e muitos
trabalhadores perdem seus empregos até que a estrutura de produção seja
reconfigurada à luz dessa revelação.

Não obstante, Krugman diz que isso não faz sentido. Podemos estipular que
alguns produtores (construtores, por exemplo) expandem suas atividades
muito agressivamente durante um boom, e então repentinamente descobrem
que seus clientes não mais querem comprar seus produtos (prédios
comerciais urbanos, digamos). Mas, explica Krugman, as pessoas na economia
têm de gastar sua renda com alguma coisa. Se a renda não está sendo
direcionada a prédios comerciais de $10 milhões, então ela tem de estar
sendo canalizada para ingressos de cinema, ou para geradores elétricos, ou
para cópias do livro de Peter Schiff[3]. Portanto não é nada óbvio, conclui
Krugman, por que haverá um maciço desemprego no início da "ressaca"
oriunda da farra do crédito. Os empregos destruídos nos estágios "mais altos"
da produção (no jargão austríaco, aqueles que estão no início da cadeia
produtiva, como o setor de máquinas e equipamentos) deverão ser
compensados por empregos recém criados nos estágios mais baixos (aqueles
dos setores de bens de consumo final e serviços).

A objeção de Tyler Cowen é similar, mas, como eu disse, não é bem a mesma.
Cowen quer saber por que as pessoas deveriam se sentir ricas durante o boom
induzido pelo banco central - como os austríacos alegam que ocorreria. Posto
que mão-de-obra e materiais estão sendo desviados para a produção de bens
de ordem mais alta - como tratores e cones alaranjados utilizados durante a
reparação de estradas -, a escassez inerente aos fatores de produção implica
que deveria haver menosbens de consumo (TVs, churrascarias, carros
esportivos) sendo jogados no mercado durante o boom. Se menos bens de
consumo estão sendo produzidos, então a renda real per capita tem de cair, o
que novamente é o oposto do que os austríacos alegam.

Fiz o meu melhor para parafrasear o que entendo ser as posições de Krugman
e Cowen. Devo confessar que, mesmo enquanto digitava, o non sequitur[4]de
cada objeção saltava à vista. Em relação a Krugman, seu argumento se baseia
em uma concepção estática da renda e do gasto. Usando essa mesma
tautologia contábil - sem relacioná-la ao tempo - Krugman poderia também
argumentar que a renda real em uma economia jamais pode ser alterada,
mesmo se o governo anunciar que os 10% mais produtivos trabalhadores de
cada empresa seriam mortos. (Afinal, a renda total ainda assim seria igual ao
gasto total.)

Quanto a Cowen, ele parece estar assumindo que a "renda real" é equivalente
ao "consumo real". Não sei o que dizer, exceto que "Não, não é". Se um
trabalhador arruma um emprego em uma mina de prata e é pago em onças de
prata, as quais ele estoca no porão da sua casa, ele pode ter um "salário real"
muito alto ainda que seu consumo seja muito baixo. Para ser justo, convém
considerarmos que Cowen disparou as bobagens acima apenas em seu blog,
e não em algum jornal acadêmico; eu odiaria ver uma coletânea das coisas
mais estúpidas que já falei em meu blog. Portanto, vamos assumir que ele quis
dizer que a TACE nos faz crer que o consumo real (e não a renda) irá cair
durante o período do boom. O argumento de Cowen é que isso não bate com
os dados. Durante o boom, vemos um aumento dos investimentos em projetos
novos (e mais "indiretos", para usar a linguagem austríaca) e vemos os
trabalhadores sendo mais bem pagos e portanto comprando mais bens de
consumo. Porém, pergunta Cowen, não deveria isso ser impossível já que,
como alegam os austríacos, durante o boom os recursos são retirados dos
bens de consumo (como iPhones) e são redirecionados para a produção de
bens de capital (como tratores e carretas)? Na seção seguinte veremos o que
Cowen está negligenciando.

Um modelo de consumo de capital baseado em sushis

Acima, eu apontei algumas das falhas básicas nos argumentos de Krugman e


Cowen. (Outros austríacos já responderam Krugman no passado. Vejas as
respostas de Garrison e Cochran). Em termos mais gerais, ambos estão
ignorando a noção extremamente importante do consumo de capital. É por
isso que é necessário entender bem a teoria do capital, como fizeram
pioneiramente Carl Menger e Eugen von Böhm-Bawerk, para compreender
direito o que diabos aconteceu com a economia americana. Qualquer
palpiteiro da grande mídia que não entenda sobre consumo de capital irá
certamente dar horrendas recomendações políticas.
Quando ainda estava pensando nesse artigo, estava indeciso quanto ao seu
formato. E então decidi que deveria utilizar um "modelo" de complexidade
intermediária, pois se eu simplificasse muito, a argumentação poderia não
estimular o leitor; por outro lado, se eu exagerasse na dose, ninguém em seu
juízo perfeito iria terminar de ler o artigo. Sem mais delongas, vamos
examinar uma hipotética ilha cuja economia seja formada por 100
pessoas (os ilhéus) e que o único bem de consumo seja rolinhos de sushi.

A ilha começa em um equilíbrio inicial que é indefinidamente sustentável.


Todo dia, 25pessoas vão para o mar com seus barcos a remo e utilizam redes
para pegar peixes. Outras 25 vão para os arrozais colher arroz.
Outras 25 utilizam o arroz e os peixes (coletados no dia anterior, é claro) e
fazem tentadores rolinhos de sushi. Finalmente, os restantes 25 ilhéus
dedicam seus dias fazendo manutenção nos barcos e nas redes. Dessa forma,
todo dia são produzidos um total de, digamos, 500 rolinhos de sushi, o que
permite que cada ilhéu coma 5 rolinhos de sushi por dia, todos os dias. Uma
vida nada ruim, convenhamos, principalmente quando se leva em
consideração a vista oceânica e a completa ausência de Jim Cramer.[5]

Mas, infelizmente, eis que um dia Paul Krugman surge na ilha, após o
naufrágio do seu barco. Depois de ser reanimado pelos ilhéus, ele analisa a
humilde economia da ilha e começa a dar palpites e conselhos sobre o que os
ilhéus devem fazer para elevar seu padrão de vida a níveis americanos. Ele
mostra o motor de popa (ainda cheio de gasolina) do seu barco naufragado, e
os ilhéus ficam intrigados. Leigos em economia, eles acham os argumentos
krugmanianos irresistíveis e concordam em seguir todas as suas
recomendações dali pra frente.

Assim, a original e até então sustentável distribuição do trabalho entre os


ilhéus é alterada. Sob o Plano Krugman Para a Prosperidade, 30 ilhéus ficam
por conta de levar os barcos (um deles agora com motor) com as redes para
o mar para pegar peixes. Outros 30 ficam por conta de colher arroz.
Outros 30 utilizam os peixes e o arroz para fazer os rolinhos de sushi. 5 ilhéus
assumem a função de percorrer a ilha em busca de materiais necessários para
fazer a manutenção do motor; afinal, todo os dias o motor queima gasolina e
o seu óleo se torna mais sujo. Mas, obviamente, tudo isso deixa
apenas 5 ilhéus por conta da manutenção dos barcos e das redes, o que eles
continuam a fazer todos os dias. (Se o leitor está curioso, Krugman não
trabalha na produção dos sushis. Ele passa o dia inteiro deitado numa rede
escrevendo ensaios que dizem que a pobreza dos ilhéus é culpa da
mesquinhez dos coqueiros).

Por alguns meses, os ilhéus se mostram convencidos de que aquele pálido


prêmio Nobel é de fato um gênio. Todos os dias, 606 rolinhos de sushi são
produzidos, o que significa que todos os habitantes (inclusive Krugman)
passam a comer 6 rolinhos por dia, ao invés dos 5 aos quais eles estavam
acostumados. Os ilhéus acreditam que esse aumento se deve ao uso do motor,
mas na realidade ele se deve simplesmente ao rearranjo das tarefas. Antes,
apenas 25 pessoas se dedicavam à pesca, à coleta de arroz e à preparação de
sushi. Agora, 30 pessoas se dedicam a cada uma dessas áreas. Portanto,
mesmo sem o motor, a produção diária total de sushis teria aumentado em
20% (de 5 pra 6), assumindo-se que os ilhéus são igualmente bons nas várias
tarefas, e que há uma abundância de peixe e arroz fornecidos pela natureza.
(E, na verdade, a única contribuição do motor foram os 6 rolinhos extras
necessários para alimentar Krugman).

Porém, infelizmente, a redução na manutenção dos barcos e das redes começa


a surtir efeito e a produção passa a ser afetada. Com apenas 5 ilhéus dedicados
a essa tarefa, ao invés dos 25 originais, alguma coisa teria de ocorrer. As redes
vão se tornando cada vez mais desgastadas com o tempo, e os barcos
começam a apresentar pequenos vazamentos. Isso significa que os 30
pescadores passam a retornar todos os dias com uma quantidade menor de
peixes, uma vez que seus equipamentos já não são tão bons quanto antes. Os
30 ilhéus responsáveis pela manufatura dos sushis repentinamente se vêem
numa sinuca, pois agora há um desequilíbrio entre arroz e peixes. Eles
começam então a trapacear, colocando pedaços menores de peixe em cada
rolinho. Todos os ilhéus continuam recebendo 6 rolinhos por dia, só que agora
cada rolinho tem menos peixe dentro. Os ilhéus descobrem a trapaça e ficam
furiosos - exceto aqueles que têm repulsa pela idéia de ingerir peixe cru.

Sendo um economista treinado, Krugman sabe bem o que fazer. Ele sugere
que 2 dos colhedores de arroz e 2 dos enroladores de sushi mudem de tarefa
e passem a ajudar os pescadores. Agora com 34 pescadores, os ilhéus se
mostram aptos a pescar a mesma quantidade de peixes que pescavam nos
meses anteriores, mesmo que agora eles estejam utilizando redes
esfarrapadas e barcos dilapidados. Krugman - sendo muito esperto com
números - deslocou o número exato de trabalhadores de modo a fazer com
que a quantidade de peixes pescada pelos 34 ilhéus fosse perfeitamente
compatível com a quantidade de arroz colhida pelos 28 ilhéus que vão para
os arrozeiros todos os dias. Com essa quantidade de peixe e arroz, os 28
trabalhadores ocupados na manufatura de rolinhos são capazes de produzir
556 rolinhos de sushi por dia. Isso permite que cada habitante consuma 5
rolinhos e meio por dia, com um rolinho extra deixado como bônus para
Krugman.
Mas os ilhéus começam a ficar preocupados. Quando começaram a seguir os
conselhos de Krugman, o consumo pulou de 5 rolinhos por dia para 6. E então,
quando as coisas começaram a degringolar, Krugman foi capaz de corrigir o
problema da descoordenação. Não obstante, ainda assim o consumo caiu para
5,5 rolinhos por dia. Krugmam, temeroso, lembra aos ilhéus que 5,5 ainda é
melhor do que 5. Os ilhéus, contudo, ainda não se mostram satisfeitos. Nosso
herói só consegue dispersar a turba inquieta quando começa a falar sobre as
"funções de produção Cobb-Douglas" e a desenhar curvas IS-LM na areia.

Como esse é um website voltado para a família, vamos parar a história por
aqui. Desnecessário dizer que, em algum momento, os 5 ilhéus voltados para
a manutenção das redes e barcos irão decidir que eles têm de cortar seus
prejuízos. Ao invés de tentar manter a frota original de barcos e a coleção
original de redes com apenas 5 trabalhadores, ante os 25 originais, eles irão
concentrar seus esforços nos 20% melhores barcos e redes, e tentar mantê-
los em boas condições. Nesse ponto, será fisicamente impossível para os
ilhéus sustentar sua produção diária de sushis. Para poderem retornar ao
nível original e sustentável de 5 rolinhos de sushi por pessoa por dia, os ilhéus
terão de sofrer um período de privação em que muitos deles serão
redirecionados para a produção de mais barcos e redes. (Só nos resta torcer
para que, a essa altura, o professor Krugman já tenha sido resgatado pelos
suecos).

Os 5 ilhéus que estavam pesquisando maneiras de sintetizar gasolina e óleo


de motor terão de abandonar essa tarefa, pois ela jamais se mostrou
apropriada para a estrutura primitiva do capital da ilha. Os ilhéus irão
obviamente descartar o motor trazido à ilha por Krugman assim que acabar a
gasolina.

Finalmente, podemos prever que durante o período de transição alguns


ilhéus nada terão pra fazer. Afinal, o total de mão-de-obra necessária para a
pesca utilizando os barcos e redes aproveitáveis já está preenchido, bem
como o número necessário de ilhéus voltados para a coleta de arroz e para a
manufatura de sushis. Esse número é pequeno dado o pequeno volume de
pesca diária. Não haveria razão em adicionar mão-de-obra extra na produção
de barcos e redes porque isso faria com que construíssem mais do que o
sustentável no longo prazo. Logo, os mais velhos entram num esquema de
rotação, em que 10 pessoas ficam à toa diariamente. Essas pessoas
obviamente poderiam ir tentar pegar peixes com suas próprias mãos, ou ir
colher arroz que daria apenas para eles próprios comerem, se tanto; mas
todos decidem que isso seria uma perda de tempo. Dada a realidade, decide-
se que durante a transição, 10 pessoas ficam à toa diariamente, ainda que
todos estejam com fome. Isso mostra o quão ruim foi o conselho de Krugman.

Conclusão
Como nossa simples história ilustra, nas modernas economias os
trabalhadores utilizam bens de capital para aprimorar sua mão-de-obra, o
que os ajuda a transformar os dons da natureza em bens de consumo. Por
causa da estrutura temporal da produção, é possível turbinar
temporariamente o consumo de todos, mas somente em detrimento da
manutenção dos bens de capital (os barcos e as redes), que então são
"consumidos". Em algum ponto, a realidade da engenharia se impõe e
nenhuma política de estímulo poderá impedir uma queda profunda do
consumo.

Conquanto a história da economia do sushi tenha sido simples, espero que ela
tenha ilustrado as características essenciais do ciclo de expansão (boom) e
recessão. Quando os ilhéus primeiramente implementaram os conselhos de
Krugman, todos se sentiram mais ricos. Afinal, eles de fato estavam comendo
6 rolinhos de sushi por dia, ao invés dos 5 habituais; não há como argumentar
contra os resultados. E eles não tinham razão para suspeitar que essa seria
uma reestruturação insustentável: afinal, eles estavam utilizando um novo
motor de popa. Isso é análogo aos argumentos que utilizaram para descrever
a "Nova Economia" durante o boom das empresas pontocom do final da
década de 90 ou à confiança depositada nos novos instrumentos financeiros
utilizados durante o boom imobiliário. Durante cada novo boom, as pessoas
sempre surgem com novas justificativas para dizer que "dessa vez é
diferente".

Na economia do sushi, a prosperidade inicial era ilusória. Ainda que de fato


tenha havido benefícios advindos da nova tecnologia, o grosso desse consumo
extra estava sendo financiado por meio do consumo de capital, isto é, pela
deterioração consentida dos barcos e das redes. Isso é análogo aos
americanos que consumiram uma quantidade maciça de bens de consumo
importados durante o boom imobiliário porque erroneamente acreditavam
que o valor crescente de seus imóveis iria mais do que compensar essa farra
(uma vez que essa valorização dos imóveis era utilizada como garantia para
novos empréstimos, isto é, para mais endividamentos). Em outras palavras,
tivessem os americanos percebido que o valor de seus imóveis iria despencar
nos anos seguintes, eles não teriam consumido tanto. Eles estavam
consumindo capital sem se dar conta disso, assim como os ilhéus não
perceberam que seu consumo extra de sushi era em grande parte financiado
pela negligência em relação aos seus barcos e redes.

Observe também que esse aspecto da história responde à objeção de Cowen:


as pessoas consomem mais durante o boom - ou seja, os ilhéus comem mais
sushis por dia - mesmo enquanto novos e insustentáveis projetos estão sendo
iniciados. (Na nossa economia do sushi, o projeto insustentável era a procura
por gasolina para o desnecessário motor de popa). Cowen está certo quando
diz que um alongamento sustentável da estrutura do capital inicialmente
requer uma redução do consumo; o que acontece nesse caso é que os
investidores se abstêm de consumir e direcionam sua poupança para os novos
projetos de investimento. Mas durante um boom induzido pelo banco central,
não há poupança real acumulada para financiar os novos investimentos. Há
simplesmente uma criação de crédito. É por isso que o boom é insustentável.
E é por isso também que, nesse cenário de intervenção, o consumo também
aumenta simultaneamente (afinal, não se requer poupança real para
sustentar os projetos de investimento). É verdade que isso é impossível no
longo prazo, mas no curto prazo é sim possível aumentar o investimento em
novos projetos e simultaneamente aumentar o consumo. O que é
negligenciado nesse cenário é a manutenção dada a bens intermediários
críticos, assim como nossos ilhéus fizeram com os barcos e redes. Não
obstante essa negligência, eles foram capazes de levar a cabo sua façanha por
alguns meses. Uma economia moderna é muito complexa e pode levar alguns
anos até que uma estrutura insustentável seja reconhecida como tal.

Finalmente, nossa economia sushi mostrou por que o desemprego aumenta


durante a retração. Em um cenário normal, as pessoas não gostam de
trabalhar; elas preferem ficar recostadas ou passeando por aí. Para que seja
recompensador abrir mão do lazer, os salários pagos pelo trabalho devem ser
altos o suficiente. Durante um período de "recessão", quando os ilhéus
tiveram de cortar bastante a produção dos setores de pesca, colheita de arroz
e manufatura de sushis, não havia 100 tarefas diferentes que fossem
vantajosas de serem executadas. Na nossa história, estipulamos que apenas
90 pessoas poderiam ser proveitosamente integradas à estrutura de
produção, pelo menos até que a frota de barcos e o suprimento de redes
começassem a ser restaurados, o que permitiria que alguns dos
"desempregados" ilhéus tivessem novamente algo de útil para fazer.

No mundo real, isso também acontece: durante a recessão, que vem após um
período de crescimento artificial, os recursos precisam ser rearranjados;
certos projetos precisam ser abandonados (como a procura por gasolina na
economia do sushi); e bens intermediários críticos (como os barcos e as
redes) precisam ser repostos, já que foram ignorados durante o boom.
Leva tempo para que todos os milhões de diferentes tipos de materiais,
ferramentas, máquinas e equipamentos sejam reorganizados de forma a
reiniciar o crescimento normal. Durante essa transição, a contribuição da
mão-de-obra de algumas pessoas é tão baixa que não vale a pena contratá-las
(principalmente com as leis do salário mínimo e de outras regulamentações
trabalhistas).

A falha elementar da objeção de Krugman é que ele ignora a estrutura


temporal da produção. Quando os trabalhadores das indústrias que
produzem bens de capital são demitidos, eles não podem simplesmente
mudar para o setor de churrascaria ou para uma loja de TVs. Isso porque a
produção de TVs e de carne depende dos bens de capital que já têm de ter sido
produzidos. Na nossa economia sushi, os ilhéus desempregados não podiam
entrar no ramo da manufatura dos sushis porque não havia peixe suficiente
sendo produzido (pescado). E eles não podiam se aventurar no ramo da pesca
porque não havia barcos e redes para auxiliar seus esforços. E, finalmente,
eles não podiam entrar na produção de barcos e redes porque já havia um
número suficiente de ilhéus trabalhando naquela área para restaurar a frota
e a coleção de redes de volta ao nível sustentável de longo prazo.

As pessoas na minha pós-graduação algumas vezes me perguntavam por que


eu perdia tempo com uma "obsoleta" escola de pensamento. Ao responder, eu
não me dava ao trabalho de falar sobre subjetivismo, teoria monetária ou
mesmo empreendedorismo, conquanto todas essas sejam áreas em que a
escola austríaca é superior ao mainstream neoclássico. Não, eu sempre dizia
que "a teoria do capital e a teoria dos ciclos econômicos da escola austríaca
são as melhores que eu já vi". Nossa atual crise econômica - e o fato de que os
nobéis sequer entendam o que está acontecendo - mostra que eu escolhi
sabiamente.

__________________________________________________

[1] A revista Veja, por exemplo, é pródiga nessa comparação. [N. do T.]

[2] Professor da George Mason University e dono do popular blog Marginal


Revolution. [N. do T.]

[3] Economista americano, seguidor da escola austríaca, que previu a atual


crise - como comprova seu livro, lançado em 2007. Veja esse incrível vídeo, de
agosto de 2006, no qual, em um debate contra um arrogante Arthur Laffer,
Schiff prevê a crise com grande acurácia. Um outro vídeo, ainda melhor, é este,
no qual ele debate com vários economistas mainstream a crise que ainda está
por vir. Note a arrogância e o completo despreparo deles perante a segurança
e tranquilidade de Schiff que, afinal, mostrou saber muito bem sobre o que
falava.[N. do T.]

[4] Argumento no qual a conclusão não segue as premissas; uma falácia


lógica. [N. do T.]

[5] Histérico - e sempre errado - apresentador do programa Mad Money, da


rede americana CNBC. [N. do T.]

Paul Krugman, como sempre, não entendeu


nada
economia

Peter Schiff

sexta-feira, 19 mar 2010

Em sua última coluna semanal no The New York Times, o vencedor do Prêmio
Nobel Paul Krugman esgrime argumentos tão inacreditáveis, que o comitê do
Nobel de Economia em Estocolmo deveria pedir a devolução da medalha.

Antes de comentar alguns parágrafos, permita-me apenas mencionar a única


coisa que Krugman acerta em sua coluna: ele menciona o fato de que a moeda
chinesa, o renminbi, está artificialmente subvalorizada; e que, como resultado
disso, ela está causando distúrbios na economia global.

Quanto a isso, ele está certo. Mas a questão é que ele realmente desconhece
quais são os reais problemas e o que ocorrerá tão logo a moeda chinesa seja
valorizada. Sim, ele de fato ganhou o Prêmio Nobel de Economia; porém, se o
comitê adotasse a política de pedir a devolução de seus prêmios para aqueles
laureados que demonstrassem uma completa falta de noções econômicas,
certamente Paul Krugman seria o primeiro nome da lista de chamada. Com
efeito, após essa última coluna ele realmente deveria devolver
espontaneamente sua medalha, pois ficou claro que não há motivos para ele
mantê-la.
Eis um dos parágrafos de seu artigo:

O que você deve perguntar é: o que aconteceria se a China tentasse vender uma
grande parte de seus títulos americanos? As taxas de juro iriam disparar? As
taxas de juro de curto prazo dos Estados Unidos não se alterariam: elas já vêm
sendo mantidas próximo de zero pelo Fed (Federal Reserve, o banco central
americano), que não irá elevá-las enquanto a taxa de desemprego não cair. As
taxas de longo prazo poderiam aumentar levemente, mas elas são determinadas
principalmente pelas expectativas de mercado quanto às taxas de curto prazo
futuras.

Não, elas não são! As taxas de juros de longo prazo [aquelas vigentes para
títulos com prazo de maturação maiores que dois anos] se formam de acordo
com as expectativas de inflação. E se os credores perceberem que a política
monetária do Fed está muito frouxa, que ele está mantendo a taxa básica de
juros em níveis extremamente baixos, as taxas de juros de longo prazo irão
subir. Krugman se perdeu e entendeu tudo errado.

E aí ele finaliza o parágrafo:

Além disso, se os chineses pararem de comprar títulos americanos, o Fed poderia


compensar o impacto que isso teria sobre as taxas de juros aumentando suas
próprias aquisições de títulos de longo prazo.

É aqui que ele se revela. O que Paul Krugman está sugerindo é que, se a China
parar de comprar títulos da dívida americana, não haverá problemas, pois o
Fed poderá comprá-los - é só imprimir dinheiro.

Ora, uma coisa é haver compradores legítimos para os títulos da dívida; outra,
totalmente diferente, é colocar o Fed para monetizar a dívida, isto é, imprimir
dinheiro para comprar os títulos. Quando o governo chinês compra os títulos
do governo americano, é a oferta monetária chinesa que cresce [como a taxa
de câmbio entre o dólar e o renminbi é fixa, o banco central chinês tem de
imprimir dinheiro para comprar dólares para poder comprar os títulos];
porém, quando é o Fed quem compra os títulos americanos, é a oferta
monetária dos EUA que cresce. Há uma enorme diferença entre os dois
métodos.

Se o que Krugman está falando estivesse certo, se o fato de não haver


demanda (interna e externa) pelos títulos da dívida do governo de um país
não fosse algo importante, e se, consequentemente, cada país pudesse sair
imprimindo dinheiro para comprar esses títulos que ninguém quer, então
nunca haveria hiperinflação. O Zimbábue seria hoje uma potência.

Outra coisa que Krugman não entende é que não seria apenas a China quem
estaria se livrando dos títulos americanos. Se o Fed realmente começasse a
fazer o que Krugman está sugerindo - colocar as impressoras a pleno para
comprar todos os títulos americanos que os chineses quisessem vender -,
então todos os outros países que também possuem títulos do governo
americano iriam fazer o mesmo: os japoneses, os sauditas, os europeus, os
latino-americanos, todos eles também começariam a vender os títulos
americanos. Ninguém iria querer ficar por último, com o risco de não receber
nada.

E, é claro, uma outra coisa que Krugman não entende é que os chineses não
precisam ter o trabalho de vender os títulos americanos que possuem. Eles
simplesmente podem não aceitar rolá-los [trocar um título vincendo por outro
com prazo de maturação maior]. Como o grosso da dívida dos EUA é de curto
prazo, os chineses nem precisam vender os títulos que possuem; tudo o que
precisam fazer é esperar os títulos maturarem e simplesmente pedir o
pagamento do principal.

Agora leia o parágrafo seguinte, no qual ele vai do sublime ao ridículo:

É verdade que, se a China liquidasse seus ativos dos Estados Unidos, o valor do
dólar cairia frente ao de outras moedas importantes, como o euro. Mas isso seria
bom para os Estados Unidos,

Ou seja, o dólar perdendo valor é uma coisa boa para os EUA. Eis o porquê,
segundo Krugman:

uma vez que tornaria nossos bens mais competitivos e reduziria nosso déficit
comercial.

De quais bens ele está falando? O déficit comercial americano não vai cair
porque as suas exportações ficarão mais competitivas; ele vai cair porque os
EUA não serão mais capazes de importar. O resultado imediato de uma queda
do dólar não será uma explosão das exportações; será um colapso das
importações. E o fato de os americanos não mais terem acesso a esses
produtos importados não vai ajudar em nada a economia dos EUA. No longo
prazo, é claro que isso terá de acontecer, mas Krugman acha que tal medida é
uma panacéia. Não é. É um remédio extremamente amargo que os
americanos terão de engolir. E, no final, quem sairá perdendo serão os
americanos, e não os chineses.

Finalmente,

Por outro lado, seria ruim para a China, que sofreria grandes perdas em seu
patrimônio em dólares. Em resumo, agora os Estados Unidos colocaram a China
em uma sinuca, não o contrário.

Ou seja, se o dólar entrar em colapso, a China sofrerá um baque por causa de


suas enormes reservas em dólares. Mas, e os americanos? Qual será o
baque? Tudo o que os americanos têm são dólares. A poupança, os salários,
tudo está em dólar. É verdade que a China tem um trilhão de dólares em
reservas, mas isso é apenas uma parte do seu portfólio. A moeda dos chineses
é o renminbi, seus salários estão em renminbi, o grosso de sua poupança está
em renminbi. Mesmo que o dólar perca seu valor, os chineses ainda terão sua
capacidade produtiva, sua mão-de-obra, suas indústrias e seu capital. Sim,
eles sofrerão um baque; eles descobrirão que estavam financiando a fundo
perdido os americanos, e, consequentemente, vão parar de fazer isso. Mas o
maior estrago ocorrerá nos EUA. Com uma moeda sem valor, toda a poupança
e poder de compra do país serão aniquilados.

A título de comparação, pense no final da década de 1990, no estouro da bolha


das empresas pontocom. Várias empresas estavam financiando as pontocom,
emprestando dinheiro para que elas comprassem produtos. Quando a bolha
estourou, essas empresas financiadoras sofreram grandes baques em suas
receitas; porém elas sobreviveram e prosperaram. Já as pontocom
sumiram. É isso que vai acontecer entre China (empresas financiadoras) e
EUA (as pontocom); trata-se de uma relação que não pode persistir. O modo
como Krugman analisa a relação comercial entre os dois países é mais insana
do que o modo como as pessoas pensavam que a bolha imobiliária americana
era algo sólido e que iria durar para sempre.

A ideia de que uma economia como a chinesa depende de exportações é uma


falácia. Ela depende de produção. O fato de que eles decidiram exportar sua
produção é, na verdade, uma perda. Eles estariam em melhor situação se
estivessem eles próprios consumindo sua produção - algo que eles poderiam
facilmente fazer caso o governo permitisse que o renminbi se apreciasse, o
que geraria um declínio nos preços internos.

As pessoas creem que os chineses são muito pobres, e que não há demanda
suficiente na China para consumir toda a sua produção. Tolice. Como ensinou
Jean-Baptiste Say, a oferta cria demanda; o fato de que os chineses podem
produzir significa que eles podem consumir. O que faz uma pessoa produzir
é justamente seu desejo de consumir. Ninguém produz por esporte. E o fato
de que os EUA não mais podem produzir significa que eles não mais deveriam
consumir - não no nível atual.

Os EUA só continuam consumindo no nível atual porque outras nações


produtivas estão permitindo isso. Elas exportam sua produção para os EUA e
ao mesmo tempo emprestam o dinheiro para os americanos pagar por
elas. Isso um dia vai acabar.

Infelizmente, pessoas como Paul Krugman ainda não entenderam isso, ainda
não conseguiram ligar os pontos. Elas percebem que há um problema, mas
não conseguem entendê-lo. Acham ridiculamente que os americanos
colocaram os chineses numa sinuca, quando a situação é praticamente
oposta. E essa ideia, então, de que os chineses irão financiar os americanos
eternamente, e que outros países farão o mesmo, apenas porque não querem
perder o dinheiro de seus investimentos? Acham que os americanos poderão
impunemente continuar pegando dinheiro do resto do mundo? E que, caso
esse processo seja interrompido, os americanos poderão simplesmente
imprimir todo o dinheiro que quiserem sem que isso cause inflação de preços
e sem que afete os juros? Que teoria é essa?

De acordo com Krugman, enquanto os EUA tiverem uma alta taxa de


desemprego, o país poderá imprimir o tanto de dinheiro que quiser, pois os
juros não subirão e não haverá inflação.

Aviso àqueles que pensam assim, inclusive Krugman: o despertar para a


realidade será mórbido. Tal postura, repito, é ainda mais irracional do que a
daquelas pessoas que acreditavam que a bolha das pontocom representava
uma nova era da economia e que os altos preços imobiliários eram
justificáveis pelos fundamentos, sendo que, por isso, eles iriam subir
eternamente.

No futuro, quando historiadores estiverem escrevendo sobre esse período, as


pessoas que lerem vão dizer: "É inacreditável que as pessoas daquela época
tenham sido tão idiotas assim".

Paul Krugman e a terceira depressão - uma


mente confusa

economia

Leandro Roque
segunda-feira, 5 jul 2010

É fácil entender por que Paul Krugman é o preferido dos economistas pró-
establishment, dos empresários com grandes conexões com o governo e de
todos aqueles que dependem do auxílio do dinheiro estatal para sua
sobrevivência.

Em coluna publicada no dia 28 de junho no The New Yok Times (onde mais?),
o iluminado volta a professar sua fé inabalável naquele imperecível fetiche
keynesiano (que beira o erotismo): a expansão do crédito e a criação de
dinheiro pelos bancos centrais mundiais farão "o milagre ... de transformar
pedras em pães". (Keynes de fato disse isso em 1943.)

O bom de Krugman é que você não precisa se esforçar muito para entender
sua obra. Se você ler um artigo dele, você já leu todos. Isso poupa tempo e lhe
permite aprofundar seus estudos em coisas mais sérias — além da vantagem
de não se deixar contaminar pelas informações francamente falsas que ele
passa, como veremos mais abaixo.

A teoria krugmaniana presente em todos os seus artigos que versam sobre a


atual crise mundial (aquela mesma que o próprio Krugman, dois anos atrás,
disse que seria debelada pelas políticas keynesianas diligentemente
implantadas por Gordon Brown no Reino Unido) é gostosamente simples: se
os governos se endividarem, imprimirem dinheiro e gastaram até os tubos, a
economia mundial não apenas não cairá em uma depressão, como, muito pelo
contrário, criará riqueza. A cada dólar, euro e real impressos há uma
correspondente criação de bens. A cada endividamento estatal corresponde
o surgimento de um insumo agrícola e industrial. A cada real gasto pelo
governo brasileiro há o simultâneo aparecimento de um laptop. Basta o
governo mexer com dinheiro, que haverá magicamente o surgimento de
algum bem.

Expandir o crédito e criar dinheiro é a mesma coisa que criar riqueza. Vai
dizer que uma teoria dessas não tem apelo?

Entretanto, se me permitem uma confissão sádica, está cada vez mais


divertido ler as colunas de Krugman. O Nobel está inconsolado, injuriado
mesmo, com o indelével fato de que suas teorias keynesianas excêntricas
estão, novamente e pela zilionésima vez, caindo em total descrédito. Quando
até mesmo as sociais-democracias europeias começam a falar em corte de
gastos, principalmente durante uma recessão, é porque as teorias propaladas
por sujeitos até então influentes como Krugman já foram solapados pelas
invioláveis leis econômicas.

Embora todos os seus artigos sejam iguais, este em especial contém algumas
passagens interessantes e que merecem ser analisadas e comentadas. É o que
farei agora.

Uma mente confusa

Krugman, que nunca decepciona, já começa seu artigo mostrando que está em
grande forma: mente nos dois parágrafos iniciais e tira uma conclusão
involuntariamente cômica no terceiro parágrafo. Acompanhe. Ele vai de
vermelho, eu vou de preto.

Recessões são comuns; depressões são raras. Até onde sei, houve somente duas
eras na História da economia que foram amplamente descritas como
"depressões" na época: os anos de deflação e instabilidade que se seguiram ao
Pânico de 1873 e os anos de desemprego em massa que acompanharam a crise
financeira de 1929-31.

Nem a Longa Depressão do século 19, nem a Grande Depressão do século 20


foram eras de um declínio contínuo — pelo contrário, ambas incluíram períodos
em que a economia cresceu. Mas esses episódios de melhora nunca foram
suficientes para desfazer o prejuízo da crise inicial, e foram seguidos de
recaídas.

Temo que agora estejamos nos estágios iniciais de uma terceira depressão. Ela
provavelmente se parecerá mais com a Longa Depressão do que com a
Grande Depressão, que foi muito mais grave. Mas o custo — para a economia
mundial e, acima de tudo, para os milhões de pessoas arruinadas pela falta de
emprego — será imenso.

Esse Pânico de 1873 — que supostamente teria gerado a "Longa Depressão"


— é normalmente citado como uma das maiores recessões americanas do
século XIX, uma época em que o mercado era muito mais livre do que viria a
ser no século XX. Sendo assim, vale a pena nos determos um pouco mais
meticulosamente nesse evento.

Apenas contextualizando: em 1873 houve uma crise que começou a ser


gestada ainda em 1863 e 1864 com a promulgação dos National Banking Acts,
duas leis federais que tinham o propósito de criar uma moeda nacional
lastreada em títulos do governo americano. A ideia principal era criar uma
autoridade monetária capaz de exercer alguma política monetária. Como é
sabido, nessa época os EUA ainda estavam no padrão-ouro clássico.

Esse sistema foi descrito por F.A. Hayek como um "sistema monetário com um
banco central semi-oficial". Como consequência, a criação desse sistema
inflacionário desencadeou um ciclo de expansão e recessão econômica, do
tipo previsto pela teoria austríaca. Os anos que precederam o Pânico de 1873
vivenciaram uma enorme expansão do sistema ferroviário americano, que foi
estimulado tanto pela expansão de crédito fácil quanto pela concessão de
terras feita pelo governo americano. Puxados por essa expansão, setores
relacionados ao transporte e à mineração (por causa do ferro) também
vivenciaram um grande crescimento, bem como os salários relacionados a
esses setores.

Até aí há uma convergência entre os historiadores. Os fenômenos acima de


fato ocorreram. Já em 1873 houve uma contração do crédito inicialmente
expandido com as leis de 1863 e 1864, fazendo com que houvesse uma
inevitável recessão em 1873.

Krugman, entretanto, mostra que está desinformado a respeito da história


econômica de seu próprio país quando passa a comentar o período da
recessão pós-1873. E tudo que ele precisava fazer era ler o livro de Milton
Friedman e Anna Schwartz, A Monetary History of the United States, 1867-
1960. Com os dados ali fornecidos, ele concluiria que, dado o atual cenário,
tudo o que os americanos mais queriam era que a atual recessão fosse
semelhante a essa "Longa Depressão" iniciada em 1873.

Foi Murray Rothbard quem melhor desmitificou esse mito da "Longa


Depressão" de 1873 em seu livro History of Money and Banking in the United
States. Segue um trecho:

Historiadores econômicos ortodoxos sempre comentam pesarosamente a


respeito da "grande depressão" que alegadamente assolou os Estados Unidos
após o pânico de 1873 e que durou inéditos seis anos, até 1879. Grande parte
dessa estagnação supostamente foi causada por uma contração monetária que
fez com que os pagamentos em espécie (em ouro ao invés de em notas
bancárias) fossem retomados em 1879.

Entretanto, que tipo de "depressão" foi essa que vivenciou uma expansão
extraordinariamente vasta da indústria, das ferrovias, da produção de bens, do
produto nacional líquido ou da renda per capita real? Como Friedman e
Schwartz admitem, o período de 1869 a 1879 viu um crescimento anual de 3%
no produto nacional nominal, um crescimento anual de 6,8% no produto
nacional real, e um aumento fenomenal de 4,5% ao ano no produto per capita
real. Mesmo a alegada "contração monetária" nunca ocorreu, tendo a oferta
monetária aumentado em 2,7% ao ano nesse período. De 1873 a 1878, ano em
que ocorreu outro surto de expansão monetária, a oferta total de moeda
bancária aumentou de $1,964 bilhão para $2,221 bilhões — um aumento de
13,1%, ou de 2,6% ao ano. Ou seja, um amento modesto, porém um aumento —
dificilmente uma contração.
Já deveria estar claro, portanto, que a "grande depressão" da década de 1870 é
meramente um mito — um mito criado pela interpretação equivocada do fato
de que os preços caíram acentuadamente durante todo o período. Com efeito,
eles caíram desde o fim da Guerra Civil até 1879. Friedman e Schwartz
estimaram que os preços em geral caíram 3,8% ao ano, de 1869 a
1879. Infelizmente, a maioria dos historiadores e economistas está
adestrada a acreditar que uma queda constante e acentuada dos preços
tem inevitavelmente de resultar em uma depressão: daí seu assombro
com a óbvia prosperidade e crescimento econômico dessa era. Pois eles
ignoram o fato de que, no desenrolar natural dos eventos, quando o governo e o
sistema bancário não aumentam a oferta monetária muito rapidamente, o
capitalismo de livre mercado irá gerar um aumento tão grande da produção e
do crescimento econômico, que o aumento da oferta monetária será
solapado. Os preços irão cair, e as consequências não serão a depressão ou a
estagnação, mas a prosperidade (já que os custos estão caindo também), o
crescimento econômico, e a propagação de um maior padrão de vida para todos
os consumidores.

Ou seja, por algum motivo, crê-se que a crise de 1873 não apenas durou seis
anos, como também crê-se que foram 6 anos de grande penúria, quando a
realidade foi exatamente o oposto disso. Esse é um daqueles mitos que, assim
como a crise de 1929, perduram não se sabe por quê.

Houve, no máximo, uma curta recessão em 1873. De resto, aquela década


vivenciou o que hoje alguns consideram ter sido o maior período de
crescimento sustentável da história americana. O emprego cresceu
vigorosamente, maior até mesmo que a taxa de imigração; o consumo tanto
de comida quanto de outros bens cresceu em todas as faixas de renda. No
final da década, a população americana estava com melhores moradias,
possuía melhores roupas e, no caso da população do campo, vivam em
maiores fazendas. As lojas de departamento surgiam até mesmo nas cidades
de médio porte. Foi nessa época que os EUA de fato se transformaram na
primeira sociedade de consumo em massa do mundo.

Porém, as pessoas estavam confusas com o comportamento dos preços, que


estavam caindo acentuadamente — coisa inédita até então. E isso gerou
insatisfações. Os fazendeiros, por exemplo, achavam que a queda nos preços
dos grãos significava que estavam ficando mais pobres. Porém eles não
notavam que os preços de todo o resto estavam caindo também. Quando se
analisa os termos de troca dos fazendeiros — isto é, a diferença de preços
entre o que eles vendiam e o que eles compravam —, é possível comprovar
que eles obtiveram sólidos ganhos na década de 1870.

O emprego no setor industrial, por exemplo, aumentou de 2,47 milhões em


1870 para 3,29 milhões em 1880. Na agricultura, nesse mesmo período,
pulou de 12,9 milhões para 17,4 milhões (Jeremy Atack e Peter Passel, A New
Economic View of American
History, www.questia.com/PM.qst?a=o&d=101476878).

E o que é mais interessante: como a produtividade estava aumentando


exponencialmente nesse período, um número cada vez menor de pessoas era
necessário para produzir a mesma quantidade de bens do que antes. Assim,
qualquer aumento no número de empregos no setor manufatureiro nesse
período indica que esse setor estava se expandindo significativa e
saudavelmente durante uma "recessão".

Enfim, Krugman, talvez por malícia, talvez por conveniência, está disposto a
ignorar a realidade econômica que perdurou durante a "Longa Depressão"
americana do século XIX. Tenho certeza que os americanos reviveriam com
gosto aquele período.

Prossegue o sábio:

E esta terceira depressão será, basicamente, um fracasso de política. Em todo o


mundo - mais recentemente no extremamente desanimador encontro do G20 do
último fim de semana - os governos estão obcecados com a inflação, quando a
verdadeira ameaça é a deflação, pregando a necessidade de apertar os cintos,
quando o verdadeiro problema são os gastos inadequados.

Em 2008 e 2009, parecia que tínhamos aprendido com a História. Ao contrário


de seus predecessores, que elevaram as taxas de juros diante da crise financeira,
os atuais líderes do Federal Reserve e do Banco Central Europeu cortaram os
juros e passaram a apoiar os mercados de crédito. Ao contrário dos governos do
passado, que tentaram equilibrar orçamentos diante de uma economia em
declínio, os governos de hoje permitiram que os déficits aumentassem. E
melhores políticas ajudaram o mundo a evitar o colapso total: pode-se dizer que
a recessão trazida pela crise financeira terminou no verão passado.

Krugman é inconstante. Ele começa o texto alertando para uma depressão


iminente. Cinco parágrafos depois ele diz que o mundo sequer está em
recessão. Por que o truque? Simples. Como nesse parágrafo ele admitiu que
os governos praticaram déficits e imprimiram dinheiro ("cortaram juros"),
então, para dar sustento à sua teoria, ele tem de falar que isso foi positivo e
que a recessão sumiu.

O problema é que a realidade insiste em contrariá-lo. Nos EUA, por exemplo,


os gastos continuam aumentando, o déficit continua se expandindo e... o
desemprego continua aumentando. Dados divulgados na quinta feira, 01/07,
mostram que "o número de trabalhadores norte-americanos que entraram
pela primeira vez com pedido de auxílio-desemprego subiu 13 mil, para 472
mil [...] Os economistas esperavam queda de 2 mil pedidos[...] Na semana
encerrada em 19 de junho, o número total de norte-americanos que recebiam
auxílio-desemprego subiu 43 mil, para 4,616 milhões."
Como se vê, dois anos de políticas genuinamente krugmanianas deixaram o
país muito pior do que antes da adoção desses "estímulos".

Outra mentira de Krugman está no último parágrafo: tanto na recessão


americana de 1920 quanto na de 1982, os governos aumentaram os
juros. Não houve inflação monetária. Os déficits ocorridos se deram em
decorrência do corte de impostos e não do aumento dos gastos.

Ademais, como pode Krugman atualmente falar em "gastos


inadequados"? Olhando os dois gráficos abaixo, o que o governo americano
mais fez nesses últimos anos foi aumentar o gasto e o déficit (o aumento deste
último, então, foi selvagem). Pela teoria de Krugman, a economia americana
deveria estar em crescimento exponencial.

Déficit:

Gastos:
No parágrafo seguinte, Krugman novamente volta a se contradizer em relação
ao parágrafo imediatamente anterior, admitindo um desemprego alto, sem,
no entanto, admitir que a recessão nunca terminou:

Mas futuros historiadores nos dirão que isso não foi o fim da terceira depressão,
assim como a recuperação econômica que começou em 1933 não foi o fim da
Grande Depressão. Afinal, o desemprego - especialmente o desemprego a longo
prazo - permanece em níveis que teriam sido considerados catastróficos há
alguns anos, e não dá sinais de diminuir tão cedo. E tanto os Estados Unidos
como a Europa estão se encaminhando para cair em armadilhas deflacionárias
como as do Japão.

E tem mais:

Diante desse quadro sombrio, você poderia esperar que os responsáveis pelas
diretrizes políticas percebessem que ainda não fizeram o suficiente para
promover a recuperação. Mas não: nos últimos meses, houve um surpreendente
ressurgimento da ortodoxia do equilíbrio orçamentário e da moeda forte.

No que diz respeito à retórica, o ressurgimento da antiga doutrina é mais


evidente na Europa, onde autoridades parecem usar argumentos dos discursos
de Herbert Hoover, inclusive a afirmação de queelevar impostos e cortar
gastos na verdade expandirá a economia, ao aumentar a confiança nos
negócios.

Ou foi um ato falho ou foi um mea culpa. Qualquer que seja, tudo indica que
nem o próprio Krugman tolerava mais suas desinformações. Essa é a
primeira vez que um keynesiano empedernido admite que Herbert Hoover —
até então tido como um indiscutível adepto da 'mão invisível' — elevou
impostos durante a Grande Depressão. Para ser um relato completo, faltou
apenas falar o quanto o sujeito elevou os impostos: a alíquota máxima do
imposto de renda, por exemplo, subiu de 25% para módicos 63% em apenas
um ano!

Outra acusação comum que os keynesianos fazem a Hoover é que ele tentou
equilibrar o orçamento durante a Depressão. Só que eles convenientemente
deixam de lado dois detalhes fundamentais:

1) isso só ocorreu após ele ter deixado os déficits explodirem (de meados de
1931 a meados de 1932, o déficit pulou de 0,5% para 4%); e

2) a correção se deu via aumento de impostos e nunca via corte de


gastos. Estes só fizeram subir, como mostra essa tabela.

Portanto, Krugman merece aplausos por essa tímida mea culpa. Nem ele
acredita mais nessa história de que Herbert Hoover era adepto do laissez-
faire. (Para mais informações, leia os artigos sobre Hoover indicados ao final
desse texto.)

Por fim, Krugman conclui em grande estilo:

Mas em termos práticos, os Estados Unidos não estão se saindo muito melhor. O
Fed parece ciente dos riscos de deflação - mas o que ele propõe fazer a respeito
desses riscos é, bem... nada. A administração Obama entende os perigos de uma
austeridade fiscal prematura - mas como os republicanos e os democratas
conservadores do Congresso não autorizarão uma ajuda adicional aos governos
estaduais, essa austeridade virá de qualquer jeito, na forma de cortes
orçamentais em níveis estaduais e municipais.

Por que se erra o caminho na política? Os radicais muitas vezes mencionam as


dificuldades enfrentadas pela Grécia e outras nações na periferia da Europa
para justificar suas ações. E é verdade que investidores de títulos dependiam de
governos com déficits incontroláveis. Mas não há nenhuma evidência de que
uma austeridade fiscal a curto prazo, diante de uma economia deprimida,
tranquilizará investidores. Pelo contrário: a Grécia concordou em adotar um
plano severo de austeridade, mas viu seus riscos se ampliando cada vez mais; a
Irlanda efetuou cortes radicais nos gastos públicos, mas foi tratada pelos
mercados como um risco pior que a Espanha, que relutou bem mais em adotar
a solução dos radicais.

É como se os mercados financeiros entendessem o que os responsáveis pelas


diretrizes políticas aparentemente não entendem: que, embora a
responsabilidade fiscal a longo prazo seja importante, cortar gastos no meio de
uma depressão, que aprofunda essa depressão e abre caminho para a deflação,
na verdade é autodestrutivo.
Então não acredito que isso tenha a ver de fato com a Grécia, ou com qualquer
apreciação realista das trocas entre déficits e empregos. Na verdade é a vitória
de uma ortodoxia que pouco tem a ver com análises racionais, cujo principal
dogma é que, em tempos difíceis, é preciso impor sofrimento aos outros para
mostrar liderança.

E quem pagará o preço desse triunfo da ortodoxia? A resposta é: dezenas de


milhões de trabalhadores desempregados, dos quais muitos permanecerão sem
emprego por anos, e alguns nunca mais voltarão a trabalhar.

Resumindo: os mesmos líderes mundiais que, durante anos, mantiveram


orçamentos deficitários e gastos exorbitantes — exatamente aquilo que
Krugman diz ser o ideal para evitar recessões —, lograram um resultado
exatamente inverso daquele prometido por Krugman e os keynesianos:
criaram uma crise financeira e monetária sem precedentes. Agora, porém,
esses mesmos keynesianos fervorosos, um tanto assustados com o resultado
prático de suas políticas, resolveram dizer que vão praticar um pouco de
orçamento equilibrado, apenas para tentar impedir a catástrofe que
criaram. E é isso, segundo Krugman, que irá destruir as economias destes
países.

Conclusão

Krugman em momento algum ataca o real problema: gastos do governo não


criam riqueza. E é exatamente a criação de riqueza o único artifício que irá
tirar os EUA e o mundo da atual recessão. As recomendações políticas de
Krugman — aumentar o déficit, aumentar os gastos e diminuir ainda mais os
juros por meio da simples criação de dinheiro — nada fazem para corrigir os
atuais desequilíbrios econômicos, principalmente todos os investimentos
errôneos que foram criados em decorrência das manipulações monetárias
feitas pelos governos mundiais, que reduziram os juros para níveis abaixo dos
de mercado. As recomendações krugmanianas não apenas não corrigem
esses desequilíbrios, como também, pior ainda, intensificam-nos.

Por fim, uma palavrinha sobre déficits, essa medida tido como redentora em
períodos de crise por todos os keynesianos. Se um governo reduzir seus
gastos a ponto de zerar seu déficit orçamentário (em termos nominais), ele
não mais precisará pegar dinheiro emprestado para fechar seu
orçamento. Ou seja, ela não mais precisará recorrer à poupança dos
cidadãos. Isso fará com que haja mais fundos disponíveis para serem
emprestados ao setor privado, tanto às empresas quanto aos
consumidores. A poupança que o governo teria absorvido vendendo títulos
agora estará disponível para ser utilizada de maneira mais proveitosa por
empreendedores e consumidores.

Para agradar aos moderados, nem é preciso complicar as coisas fazendo


reduções tributárias. A questão principal é que o déficit deve ser reduzido. E
para que isso ocorra, tudo que o governo deve fazer é reduzir gastos, e nada
mais.

Sim, seria perfeito se o governo reduzisse seus gastos a ponto não apenas de
eliminar completamente o déficit, mas também de tornar possível uma
redução radical, quiçá uma completa eliminação, de todos os impostos que
incidem sobre a poupança. Melhor ainda seria se, além dos impostos sobre a
poupança, houvesse a máxima redução possível dos impostos que incidem
sobre o consumo.

Desta forma, a demanda por bens de capital e por mão-de-obra da parte das
empresas seria a mais próxima possível das preferências dos consumidores,
e todos iriam usufruir ao máximo possível os benefícios de sua própria
riqueza e renda. O efeito desse aumento na poupança disponível e nos
consequentes investimentos seria um aumento acentuado no progresso
econômico do país em questão.

Apenas isso pode acabar com recessões. Mas qual governo vai permitir isso?

________________________________________________

Notas

Artigos sobre Herbert Hoover:

Minha resposta a Paul Krugman sobre a


teoria austríaca dos ciclos econômicos

economia
Robert P. Murphy

quinta-feira, 27 jan 2011

Como muitos leitores já sabem, na semana passada Paul Krugman citou em


seu blog no The New York Times um dos meus artigos publicados no Mises
Institute que fala sobre a importância da teoria do capital em qualquer
discussão sobre ciclos econômicos. Embora Krugman graciosamente tenha
descrito minha fábula sobre ilhéus comedores de sushi como sendo "a melhor
explicação que já vi sobre a visão austríaca", ele naturalmente ridicularizou a
abordagem como sendo um "grande salto para trás" e um repúdio a 75 anos
de progresso econômico desde a obra de John Maynard Keynes. Para reforçar
sua rejeição ao meu artigo, Krugman listou vários problemas que ele vê na
abordagem austríaca.

Neste artigo irei primeiro resumir a posição austríaca (na tradição de Ludwig
von Mises) em relação à teoria do capital, dos juros e dos ciclos
econômicos. Ato contínuo, irei então responder às objeções específicas de
Krugman.

Os austríacos e o capital

Contrastando com os modelos convencionais da teoria macroeconômica, os


quais não descrevem de forma alguma a estrutura do capital de uma
economia — ou, quando muito, denotam todo o capital como sendo um
estoque homogêneo do tamanho "K" —, a teoria austríaca explicitamente
trata a estrutura do capital de uma economia como sendo um complexo
agrupamento de diferentesferramentas, equipamentos, maquinários,
estoques e outros bens em produção. Grande parte da perspectiva austríaca
depende dessa rica visão acerca da estrutura do capital da economia, e os
economistas convencionais omitem várias dessas constatações austríacas
quando eles fazem a "conveniente" suposição de que a economia possui
apenas um bem. (Krugman ficará feliz em saber que, sim, eu posso explicar
tudo isso claramente em um modelo formal — e um modelo que o árbitro Paul
Samuelson, keynesiano convicto, relutantemente aprovou.)

Krugman e outros keynesianos enfatizam a primazia da demanda: eles


continuamente afirmam que o dono de uma loja de eletroeletrônicos, por
exemplo, não terá o incentivo para contratar mais empregados, e comprar
mais estoques, caso ele não tenha a expectativa de que os consumidores irão
aparecer com dinheiro para gastar em novos aparelhos de televisão ou
laptops.
Porém, os austríacos afirmam que a demanda por si só está longe de ser o
principal ponto: independentemente de quantas cédulas de dinheiro os
clientes tenham, ou de quanto crédito a loja pode conseguir no banco,
será fisicamente impossível para essa loja de eletroeletrônicos encher suas
prateleiras com novas televisões e laptops caso os fabricantes desses itens já
não os tenham produzido. E, por sua vez, os fabricantes não podem
magicamente criar aparelhos de televisão e laptops simplesmente porque a
demanda por seus produtos aumentou; para fazê-lo, eles dependem de outros
setores da economia já terem anteriormente feito sua parte, como a extração
dos metais necessários para a manufatura desses aparelhos, a montagem da
quantidade certa de caminhões e carretas necessários para transportar os
bens das fábricas para os centros de produção e montagem, e assim por
diante.

Essas observações podem parecer triviais para alguns, indignas de serem


levadas em conta por economistas sérios. Porém, essa indiferença para com
esse processo só existe porque normalmente uma economia de mercado
soluciona "espontaneamente" esse enorme problema de coordenação por
meio do sistema de preços e dos correspondentes sinais emitidos pelo
sistema de lucros e prejuízos. São a livre formação de preços e o sistema de
lucros e prejuízos que coordenam automaticamente todo o processo de
produção. Se alguém tivesse de planejar centralmente toda uma economia
desde o zero, haveria todos os tipos de estrangulamentos, gargalos e
desperdícios — como a experiência real do socialismo já demonstrou.

Sem a orientação dos preços de mercado, jamais observaríamos uma


economia funcionando harmonicamente, em que os recursos naturais se
movem ao longo da cadeia de produção — desde o processo de mineração dos
metais, passando pelo processamento, pela manufatura dos bens, pelas
vendas no atacado até finalmente chegarem ao varejo — como é ilustrado
jeitosamente nos manuais de macroeconomia.

Ao contrário, veríamos uma bagunça caótica, em que vários processos


integrados jamais iriam se concatenar harmonicamente. Haveria muitos
martelos e poucos pregos, muitos alimentos perecíveis e poucos caminhões e
vagões refrigerados para fazer seu transporte, e por aí vai.

Os austríacos e os juros

Quanto à explicação da função coordenadora dos preços de mercado, os


austríacos atribuem um papel extremamente importante às taxas de juros de
mercado, pois são elas que direcionam a distribuição e a disposição de
recursos ao longo do tempo. Falando em termos mais gerais, uma taxa de
juros alta significa que os consumidores estão relativamente impacientes,
querendo consumir mais no presente e poucos dispostos a poupar. Isso
significa que aqueles empreendedores que comprometerem muitos recursos
em projetos de longo prazo serão pesadamente punidos.
Por outro lado, uma baixa taxa de juros significa que o mercado está dizendo
para os empreendedores que os consumidores estão dispostos a esperar mais
tempo até que os produtos finais sejam criados; portanto, passa a ser aceitável
direcionar e comprometer recursos em projetos que irão produzir bens e
serviços valorosos em uma data mais tardia.

Na concepção austríaca, são as taxas de juros que permitem que as decisões


financeiras das famílias interajam com a estrutura física do capital, de modo
que os produtores passam a ser guiados a transformar os recursos da maneira
que melhor satisfaça as preferências dos consumidores. Considere este
exemplo simples que eu uso para meus alunos de graduação: suponha que a
economia esteja em um equilíbrio inicial em que as famílias poupam (deixam
de consumir) 5% de sua renda. E então, um belo dia, elas decidem que
querem ter mais dinheiro durante seus anos de aposentadoria, pois não
querem que seu padrão de vida caia quando pararem de
trabalhar. Consequentemente, todas as famílias da comunidade começam a
poupar 10% de sua renda.

Na visão austríaca, a taxa de juros é o principal mecanismo por meio do qual


a economia se ajusta a qualquer mudança na preferência dos
consumidores. (Não é que as pessoas deixem de consumir cachorros-quentes
e passem a consumir hambúrgueres; o que ocorre é que elas reduzem o
"consumo atual" com vistas a aumentar o "consumo futuro"). O aumento da
poupança das famílias reduz as taxas de juros e, com os juros mais baixos,
empreendedores podem agora começar projetos de longo prazo. Do ponto de
vista de empreendedor individual, a taxa de juros afeta muito mais a
lucratividade de projetos de prazo mais longo do que de projetos de prazo
mais curto. Ou seja: quanto mais tempo durar um projeto, mais sensível ele
será aos juros. (Qualquer cálculo que envolve "valor presente descontado"
pode mostrar isso.) Portanto, uma taxa de juros mais baixa não apenas
estimula o "investimento" como também dá uma maior atratividade a
investimentos em bens duráveis e de longo prazo, em oposição a
investimentos em bens não duráveis e de menor prazo de maturação.

Como é possível que a comunidade como um todo possa ter mais renda em,
digamos, 30 anos? Obviamente, as famílias creem
ser financeiramente possível, pois seus saldos bancários crescem
exponencialmente com as agora maiores taxas de
poupança. Porém, tecnologicamente falando, isso será possível porque a
composição dos bens produzidos irá mudar. As famílias reduzem os gastos
com jantares fora de casa, compras de iPods e outros apetrechos com o intuito
de dobrar sua taxa de poupança. Isso significa que restaurantes, lojas da
Apple e outros negócios voltados para a satisfação do consumo imediato terão
de demitir empregados e reduzir suas operações. Mas isso significa apenas
que mão-de-obra e outros recursos estão sendo liberados para expandir a
produção nos setores mais intensivos em capital, setores que fabricam brocas
e furadeiras mecânicas, tratores e novas indústrias.

Em 30 anos, a economia estará fisicamente capaz de produzir muito mais


bens (inclusive a produção de bens de consumo), pois os trabalhadores
estarão utilizando um maior estoque de capital, o qual foi sendo acumulado
durante as três décadas anteriores. É assim que o padrão de vida de toda
economia aumenta: por meio da poupança.

Os austríacos e os ciclos econômicos

Agora que já fiz um resumo da visão austríaca acerca do capital e dos juros,
temos a recompensa: a explicação para os ciclos econômicos. Quando as taxas
de juros são diminuídas para níveis abaixodaqueles que predominariam em
um mercado livre e desimpedido (por meio de uma política monetária
expansionista do banco central, por exemplo), isso desencadeia os mesmos
processos que ocorreriam caso tivesse havido um aumento na poupança. Em
outras palavras, a essas taxas de juros mais baixas, os empreendedores creem
ser lucrativo iniciar projetos de longo prazo; os setores da economia que são
intensivos em capital começam a contratar trabalhadores e a aumentar a
produção.

Entretanto, essa expansão dos setores de bens de capital não é


contrabalançada por uma redução nos setores de bens de consumo, como
ocorreria caso as famílias de fato estivessem poupando mais. Ao contrário, as
famílias irão consumir mais também, por causa dos juros menores.

Consequentemente, dá-se início a uma expansão econômica insustentável, um


período temporário de prosperidade ilusória. Como cada setor da economia
está se expandindo, há uma sensação geral de euforia; parece que cada setor
está tendo um "grande ano", e a taxa de desemprego cai abaixo de seu nível
"natural".

Infelizmente, em algum momento, a realidade irá se impor. O banco central


não criou mais recursos simplesmente por ter criado mais dinheiro e
reduzido os juros. É fisicamente impossível para a economia continuar
produzindo simultaneamente um maior volume de bens de consumo e um
maior volume de bens de capital. No final, alguém terá de ceder. O ajuste virá
tanto mais cedo se a elevação dos preços dos ativos ou dos bens de consumo
fizer o banco central reverter sua política e elevar a taxa básica de juros da
economia. Porém, mesmo se o banco central mantiver os juros
permanentemente baixos, em algum momento a realidade física irá se
manifestar (não há uma quantidade suficiente de bens para ser utilizada nos
processos de produção) e a economia entrará em colapso.

Durante a fase da recessão, os empreendedores irão reavaliar a


situação. Caso o governo e o banco central não interfiram, os preços irão se
reajustar e, com isso, enviarão sinais corretos informando quais empresas e
empreendimentos têm futuro e quais devem ser liquidados. Aqueles
trabalhadores empregados em empreendimentos insustentáveis serão
demitidos. Levará algum tempo até eles encontrarem oportunidades em
outras áreas que estarão surgindo agora, bem como encontrarem um nicho
que seja compatível com suas habilidades e que seja sustentável nessa nova
economia.

Durante esse período de reavaliação e procura, a taxa de desemprego ficará


anormalmente alta. Não é que os trabalhadores estejam "ociosos", ou que sua
produtividade tenha repentinamente caído para zero (como Krugman
tenta ridicularizar); o que ocorre é que eles precisam ser realocados para
outras áreas de produção — e, em uma economia moderna e complexa, isso
toma tempo. Essa demora pode ser simplesmente por uma questão de
procura, uma vez que os trabalhadores desempregados têm de pesquisar até
encontrar a melhor oportunidade que já existe "lá fora", ou pode ser devido
ao fato de que eles têm de esperar até que outros trabalhadores "voltem a
produzir", o que rearranjaria toda a cadeia de produção, fazendo com que, só
então, os desempregados possam voltar a estar empregados. (Foi isso que
aconteceu na minha história do sushi).

Vou encerrar aqui o resumo da teoria austríaca dos ciclos econômicos. O


leitor interessado na questão dos ciclos econômicos pode ler exposições mais
técnicas (embora acessíveis) aqui. Uma introdução sucinta, porém completa,
pode ser vista aqui. Já aqueles mais interessados em uma exposição gráfica
(utilizando conceitos da macroeconomia convencional, como 'fronteira de
possibilidade de produção') devem recorrer a essa fantástica apresentação
em PowerPoint elaborada pelo professor Roger Garrison.

[Para uma aplicação da teoria austríaca dos ciclos econômicos na economia


brasileira recente, veja este artigo].

Respondendo Krugman

Fiz esse comprido resumo apenas porque tenho a impressão de que Krugman,
apesar de falar muito, simplesmente ainda não conseguiu entender a posição
austríaca. Por exemplo, ele pergunta "Por que existe uma acachapante
evidência de que quando os bancos centrais decidem desacelerar a economia,
a economia de fato se desacelera?" Ora, como a teoria austríaca diz que a
recessão ocorre quando o banco central reduz a expansão monetária e
permite que os juros subam para seu nível "correto", essa objeção de
Krugman não faz sentido algum. Com efeito, se os bancos centrais não
pudessem desacelerar a economia, aí sim um economista austríaco teria de
ficar preocupado com sua teoria.

Krugman também pergunta sobre inflação (de preços) e a conexão entre PIB
nominal e real (o PIB real é simplesmente o PIB nominal ajustado pela
inflação de preços, cujo cálculo utiliza um deflator). Mas creio que aqui ele
está apenas fazendo mais confusão descabida. Os austríacos sabem que as
influências monetárias podem ter efeitos reais. Repetindo: esta é exatamente
a essência da teoria de Mises-Hayek.

Embora a maioria das objeções de Krugman advenha de seu desconhecimento


da real teoria austríaca, parece que uma das fontes de sua confusão veio
justamente de uma ilustração em particular que utilizei no meu
artigo. Primeiro, permitam-me contextualizar a situação citando o próprio
Krugman:

Portanto, qual é a essência dessa história austríaca? Basicamente, ela diz que
aquilo que chamamos de crescimento econômico é na realidade algo como o
desastroso Grande Salto para Frente feito pela China, o qual gerou um surto
temporário no consumo, mas somente à custa da degradação da capacidade
produtiva do país. E o subsequente desemprego é o resultado dessa
degradação: simplesmente não há nada de útil para os trabalhadores
desempregados fazerem.

Eu gosto dessa história, e provavelmente há outros casos para os quais ela é


válida, além da China de 1958—1961. Porém, quais os motivos para
acreditarmos que essa história tenha algo a ver com os ciclos econômicos que
de fato vemos nas economias de mercado?

Primeiro, eu gostaria de dizer que fico feliz pelo fato de Krugman ao menos
ter admitido que a explicação austríaca não apenas faz sentido teórico como
também acontece no mundo real — vindo do sujeito que em 1998 se referiu
a ela como o equivalente à "teoria flogista do fogo", trata-se de um progresso
e tanto!

Entretanto, Krugman ainda não apreendeu corretamente a visão austríaca a


respeito do "consumo de capital" que ocorre durante a expansão econômica
insustentável. Como eu disse acima, nesse quesito em particular a culpa é do
necessariamente simplista "modelo do sushi" que eu utilizei no artigo que
Krugman leu.

Naquele artigo, com o intuito de garantir que o leitor realmente iria entender
por que Krugman (e Tyler Cowen) estava ignorando algo básico, descrevi uma
situação na qual os ilhéus aumentavam substancialmente seu consumo diário
de sushi ao mesmo tempo em que desenvolviam uma nova tecnologia para
ajudar a aumentar sua pesca. Assim, durante esse período de "crescimento",
um ilhéu mais tolo acreditaria que tanto o consumo quanto o investimento
estavam aumentando.

Na minha fábula, isso era fisicamente possível porque os ilhéus


negligenciaram a manutenção de rotina de seus barcos e redes de pesca. Essa
negligência não apareceria da noite para o dia; porém, no final, a economia da
ilha iria inevitavelmente entrar em colapso. Repetindo: escolhi esse exemplo
para ilustrar questões básicas a respeito da estrutura do capital e para
mostrar como uma explosão no consumo presente pode ser fisicamente
possível, embora inevitavelmente irá cobrar um preço no longo prazo.

Infelizmente, minha fábula e as lições que extraí dela deram a impressão de


que os austríacos pensam que o "consumo de capital" que ocorre durante o
crescimento econômico insustentável implica necessariamente uma redução
de gastos em coisas como manutenção de equipamentos e de estruturas, ou
mesmo em coisas ainda mais simples, como o dono de uma frota de
caminhões deixando de fazer rodízio de pneus.

Na realidade, é mais correto dizer que, durante o período da expansão


econômica insustentável, os empreendedores (guiados por sinais errôneos,
como os juros artificiais) investem em projetos que individualmente são
racionais e "eficientes", mas que não se integram uns com os outros. Em
outras palavras, não se está dizendo que um agricultor irá se esquecer de
plantar algumas sementes e, com isso, terá sua futura colheita
comprometida. Não. O que se está dizendo é que o agricultor vai querer
expandir sua produção e, para isso, ele irá plantar muito mais do que plantou
no passado. Porém, sem ser do seu conhecimento, os donos dos silos, dos
caminhões, dos trens e das ferrovias (necessários para levar a safra ao
mercado) não estão expandindo suas operações no mesmo ritmo.

Em resumo, não é que os austríacos achem que uma inspeção em uma


empresa individual irá revelar uma deficiência tecnológica. A questão é que
todos os empreendedores estão sempre "um passo a frente deles próprios",
tentando se desenvolver muito rapidamente. E não há poupança real
(recursos físicos disponíveis) suficiente para permitir que todos esses novos
processos sejam finalizados. Como consequência, haverá um momento em
que os preços começarão a subir. E isso complicará todos os projetos de
investimento de longo prazo.

Para apreender melhor esse aspecto da teoria austríaca, a analogia que Mises
fez com um mestre-de-obras (que faz o projeto de uma casa achando que tem
mais tijolos do que efetivamente possui) ainda é a melhor.

Krugman quer saber: Onde está a evidência?

O que nos leva à reclamação central de Krugman:

Oh, e qual a evidência de que a capacidade da economia é afetada durante as


expansões econômicas insustentáveis? O investimento não cai durante as
expansões; ele aumenta. Sim, eu sei que os austríacos se refugiam em conversas
cósmicas a respeito da complexidade da produção e de como o investimento —
da maneira como ele é mensurado — pode não mostrar o que realmente está
acontecendo etc. Mas onde está a evidência positiva disso que eles alegam?
Eu simpatizo com essa exigência de Krugman, mas não há uma estatística
simples para a qual podemos apontar. Os austríacos estão corretos em dizer
que "o investimento — da maneira como ele é mensurado — pode não
mostrar o que realmente está acontecendo", e estão corretos em dizer que a
estrutura de produção é algo muito mais complexo do que aquilo que é
descrito nos modelos de Krugman. Não se trata de nenhuma "conversa
cósmica", mas sim de uma afirmação sobre fatos básicos.

Mas, para responder a essa questão, os austríacos certamente podem mostrar


uma evidência positiva de sua teoria. Por exemplo, os austríacos argumentam
que, nos EUA, durante os anos de farra do setor imobiliário, os americanos
não poupavam quase nada de seus salários, pois foram iludidos a crer que
estavam muito mais ricos do que de fato eram (por causa do contínuo
aumento nos preços de seus imóveis). E então, quando a realidade se impôs,
a ilusão foi despedaçada, e o valor de seus ativos caiu acentuadamente. Ao
perceberem que haviam tomado péssimas decisões durante os anos da
expansão econômica insustentável, os americanos passaram a aumentar sua
poupança. Os dados são perfeitamente compatíveis com essa história:

Em azul, a taxa de poupança individual (eixo à esquerda); em vermelho, o


índice S&P 500 (eixo à direita). A área sombreada indica recessão.

O gráfico acima mostra que a taxa de poupança despencou durante os anos de


pico da bolha imobiliária, quando o S&P 500 disparou. E então, no final de
2007, a bolsa de valores começou a cair, ao passo que a taxa de poupança
aumentou acentuadamente. A bolsa de valores começou a se recuperar no
início de 2009, porém, sob a perspectiva austríaca, isso ocorreu porque as
maciças intervenções do Banco Central americano — que culminaram na
primeira rodada de "afrouxamento quantitativo" (o qual foi anunciado
naquela época) — começaram a estimular novamente os preços dos ativos.

Também é possível obter um forte suporte empírico para a alegação austríaca


de que a expansão imobiliária desviou uma quantidade insustentável de
recursos reais (inclusive mão-de-obra) para aquele setor, o qual no fim das
contas entrou em colapso e provocou um aumento agudo no desemprego. O
gráfico a seguir compara o emprego total na construção civil (linha azul, eixo
da esquerda) com a taxa de desocupação dos imóveis (linha vermelha, eixo da
direita), mostrando claramente uma bolha especulativa: as pessoas estavam
comprando casas não para morar nelas, ou mesmo para alugá-las, mas apenas
para revendê-las quando o preço subisse. Observe a conexão entre a bolha
especulativa imobiliária e os trabalhadores atraídos para a — e depois
expelidos da — construção civil:

Quando se trata de aplicar a teoria austríaca genérica para o recente ciclo de


expansão e recessão, é preciso pensar globalmente. Durante a expansão
econômica, grande parte do crescente fluxo de bens de consumo usufruído
pelos americanos foi fisicamente produzida na China e em outros países
estrangeiros. Colocando em termos que Krugman irá apreciar, podemos dizer
que o crescimento das importações (que entram na equação do
PIB subtraindo) ocorrido nesse período foi consistente com uma "saudável"
sequência de aumentos no PIB, não porque houve um aumento nas
exportações (não houve), mas sim porque os cidadãos americanos e seu
governo continuaram gastando cada vez mais a cada ano (desta forma
impulsionando C, I e G), de modo que isso mais do que compensou o crescente
déficit na balança comercial.

Não há nada de errado com um déficit na balança comercial (ou, mais


corretamente, um déficit na conta-corrente) per se. Em outro
artigo, expliquei como uma economia muito saudável e com crescimento
sustentável pode apresentar uma sequência indefinida de tais déficits, à
medida que o resto do mundo corria para investir em um país dotado de
políticas atrativas.

Porém, quando se trata do boom imobiliário ocorrido sob George W. Bush, o


acúmulo de utilitários esportivos, TVs de plasma e consoles de videogame nas
casas dos americanos era algo claramente insustentável. Não porque — como
na minha história do sushi — os americanos estavam se esquecendo de fazer
as manutenções de rotina, mas sim porque era impossível que os americanos
mantivessem a "produção total" — a qual é muito imperfeitamente capturada
pelos números oficiais do PIB — no estonteante nível necessário para
sustentar a extravagância.

Falando mais claro: os americanos compravam casas na esperança de que elas


se valorizariam para sempre, o que lhes dava a sensação de enriquecimento
eterno. Baseando-se nessa errônea noção, os americanos refinanciavam suas
hipotecas (conseguiam mais empréstimos nos bancos dando seus imóveis
como garantia, os quais se valorizavam continuamente, o que facilitava novos
empréstimos) e gastavam todo o dinheiro recém-emprestado comprando e
importando bens de consumo (o que aumentava o déficit na conta-
corrente). Essa farra só poderia ser mantida caso os investidores
estrangeiros continuassem comprando papeis de hipotecas vendidos pelos
bancos. (Esse financiamento estrangeiro permitia que os americanos
continuassem importando bens para satisfazer seu desejo de consumo).

Tão logo houvesse uma desvalorização nesses imóveis, todo o castelo de


cartas cairia.

Para ter certeza de que essa história intuitiva bate com os fatos, podemos
fazer um gráfico comparando um índice de preços dos imóveis (linha azul,
eixo da esquerda) ao saldo da conta-corrente (linha vermelha, eixo da
direita). O gráfico abaixo mostra perfeitamente que, à medida que a bolha
imobiliária ia inflando, a conta-corrente foi se tornado cada vez mais negativa
(as importações iam aumentando). E então, quando a bolha imobiliária
estourou, o déficit na conta-corrente começou a diminuir praticamente ao
mesmo tempo, que foi quando os consumidores americanos (e os
investidores estrangeiros) voltaram à racionalidade.

É claro que os modelos de Krugman, bem como sua interpretação, também


podem incorporar as evidências acima. Logo, ele compreensivelmente
poderia alegar que não há motivo para dar mais crédito para a teoria austríaca
do que para a teoria dele próprio.

Mas, por outro lado, eu posso apontar pelo menos dois episódios em que a
teoria do "reajuste dos setores" defendida pelos austríacos claramente possui
mais poder explanatório do que a teoria de "demanda insuficiente" defendida
por Krugman. Mais especificamente, no final de 2008, Krugman
argumentou que o estouro da bolha imobiliária pouco tinha a ver com a
recessão, pois as últimas estatísticas haviam mostrado que o desemprego no
nível estadual tinha pouca relação com os declínios nos preços dos imóveis
ocorridos nos estados.

Entretanto, eu mostrei que olhar a mudança anual no desemprego tomando


por base o final do ano de 2008 não poderia de modo algum ser considerado
um teste honesto. Se olhássemos as mudanças no desemprego a partir do
momento em que a bolha imobiliária estourou, então cinco dos seis estados
que vivenciaram os maiores declínios imobiliários estavam também na lista
dos seis estados que tiveram os maiores aumentos no desemprego.

Em outra ocasião (em meados de 2010), Krugman mais uma vez imaginou ter
desferido um golpe fatal na teoria do reajuste dos setores ao apontar que o
setor industrial havia perdido mais empregos do que o setor da construção
civil. Eu mostreique isso também era um engodo, pois, pra começar, o setor
industrial tinha muito mais empregados. E quando se analisava os declínios
em termos percentuais, a construção civil de fato havia contraído muito mais
severamente que o setor industrial. Ademais — e exatamente como prevê a
teoria austríaca —, o declínio do emprego na indústria de bens de
consumoduráveis foi pior do que na indústria de bens de consumo não
duráveis, ao passo que o declínio no setor varejista foi o mais brando dentre
os quatro.

Esses são episódios muito importantes. Quando Krugman achava que os


números estavam a seu favor, ele alegremente difamava a teoria do ajuste dos
setores; ele supôs que seu próprio modelo era perfeitamente capaz de
explicar a situação caso o colapso imobiliário realmente nãotivesse muito a
ver com o cataclismo que varreu o mercado de trabalho. E, como o próprio
Krugman argumentou, tivesse ele utilizado testes válidos, os resultados de
fato teriam desafiado a teoria austríaca.

Portanto, agora que vimos que as mudanças no emprego realmente estão de


acordo com a explicação austríaca, deveríamos estar mais confiantes de que
ela apreende ao menos uma parte importante de toda a
história. Repetindo: eu não planejei encontrar dados que fossem compatíveis
com a exposição misesiana para, só então, finalmente criar alguns gráficos
que chegassem ao resultado desejado. Ao contrário: Krugman imaginou ter
encontrado uma falsificação da teoria, mas o fato é que tudo o que ele
conseguiu fazer foi apenas conduzir um experimento ruim.

Como foi Krugman quem armou e criou as condições para esses dois desafios,
é bastante significativo que a teoria austríaca tenha sido aprovada com
distinção. Mais ainda: é significativo que a própria teoria de Krugman não
consiga explicar as reais mudanças ocorridas no mercado de trabalho
americano. Lembre-se: Krugman não se sentiu nem um pouco constrangido
pelos dados quando ele (erroneamente) imaginou que a bolha imobiliária não
tivesse praticamente nada a ver com o problema do desemprego.

Isso é muito importante porque foi Krugman quem notoriamente defendeu


(em 2002) e depois defendeu novamente (com advertências em 2006) a
criação de uma bolha imobiliária para estimular a economia americana.

Não estou aqui querendo praticar um ataque à pessoa de Krugman ao dizer


isso: é bastante significativo que o modelo defendido por Krugman tenha
recomendado uma bolha imobiliária como solução para a recessão criada pelo
estouro da bolha das empresas de internet no início da década de 2000,
mesmo sabendo-se que — como vimos — o modelo de Krugman é
obviamente inferior à explicação austríaca quando se trata de avaliar o efeito
colateral da bolha imobiliária.

Conclusão

Não afirmo que a teoria austríaca dos ciclos econômicos apreenda cada
pertinente detalhe das atuais recessões. O que eu realmente afirmo é que
uma teoria — incluindo-se aí quaisquer modelos keynesianos de Paul
Krugman — que ignore a distorção que ocorre na estrutura do capital durante
períodos de expansões econômicas insustentáveis não pode de maneira
alguma receitar corretamente soluções para uma recessão.

[Para acompanhar o desafio público que Murphy fez a Krugman,


acesse www.krugmandebate.com]

O livre comércio nos enriquece e o


protecionismo nos empobrece - como
reconhece Paul Krugman

economia

Diversos Autores
terça-feira, 5 jul 2016

Enterrada em uma recente postagem de blog feita por Paul Krugman estava a
seguinte e surpreendente declaração:

"Sim, o protecionismo reduz a renda mundial."

A frase está perfeitamente correta, e sintetiza praticamente tudo o que você


precisa saber sobre o protecionismo: ele reduz a renda mundial da população,
principalmente dos mais pobres.

O protecionismo, como o próprio nome diz, serve para proteger as empresas


nacionais ruins e blindá-las contra os desejos dos consumidores —
principalmente dos mais pobres, que ficam sem poder aquisitivo para
comprar produtos bons e baratos feitos no exterior.

Para os protecionistas, as indústrias nacionais não devem ser submetidas à


liberdade de escolha dos consumidores nacionais. Os consumidores não
devem ter o direito de escolher produtos estrangeiros. Eles devem ser
obrigados a comprar apenas produtos nacionais mais caros.

Sem a concorrência de produtos estrangeiros, e com aqueles cidadãos mais


pobres podendo comprar apenas produtos mais caros fabricados
nacionalmente, os grandes empresários industriais do país não têm motivo
nenhum para reduzir seus preços e elevar a qualidade de seus produtos. Eles
passam a usufruir um mercado cativo.

E os consumidores, principalmente os mais pobres, passam a ser tratados


como gado em um curral: ficam proibidos de comprar produtos estrangeiros
baratos e são obrigados a comprar apenas os produtos nacionais mais caros
desses empresários privilegiados.

Enquanto os lucros destes se tornam inabalados, a renda disponível dos mais


pobres vai definhando.

Qual é a melhor maneira de eliminar o protecionismo — se por meio


de acordos unilaterais, bilaterais, continentais etc. — é algo que pode ser
debatido, mas não deveria haver dúvida de que o protecionismo deveria ser
abolido por causa de seu impacto negativo sobre a renda.

No entanto, e estranhamente, Krugman não termina por aí. Algo ainda o


incomoda. Em todo o restante de sua postagem, bem como em todas as outras
em que ele aborda o assunto, ele inventa explicações forçadas e convolutas
para justificar por que o protecionismo não deve ser atacado.
Por exemplo, imediatamente após ter feito essa afirmação contra o
protecionismo, ele diz que:

"mas se você quiser argumentar que a liberalização comercial foi o principal


motor do crescimento econômico, ou qualquer coisa nesse sentido, bem, os
modelos não indicam isso."

A liberalização comercial é o "principal motor do crescimento


econômico"? Não sei se é o "principal motor do crescimento
econômico". Aliás, não se conhece algum modelo que afirme que a
liberalização comercial, por si só, seja o "principal motor do crescimento
econômico". Mas o que realmente se sabe, e o próprio Krugman reconhece, é
que o protecionismo "reduz a renda mundial da população".

Isso, e apenas isso, já não seria o bastante para condená-lo?

Em outra ocasião, Krugman afirmou o seguinte:

"Com efeito, a defesa elitista de um comércio cada vez mais livre é uma
enganação. [...] O que os modelos de comércio internacional utilizados pelos
verdadeiros especialistas dizem é que, no geral, acordos comerciais não geram
mais comércio e nem criam e nem destroem empregos."

Sim, isso parece estar correto. O livre comércio não deve ser buscado com o
intuito de "aumentar empregos", mas sim com o intuito de aumentar a renda e
a qualidade de vida. E, sobre a renda, lembre-se de que, segundo o próprio
Krugman, o protecionismo "reduz a renda mundial"!

Livre comércio e empregos

Agora, é verdade que uma maior concorrência entre trabalhadores nacionais


e estrangeiros pode levar a um declínio nos salários (e no emprego) em alguns
setoresda economia. Porém, esse seria apenas um efeito de curto prazo. A
livre concorrência entre produtores domésticos e estrangeiros também leva
a uma redução nos preços dos bens e serviços, os quais podem agora ser
livremente importados de fora. Portanto, ao passo que os salários nominais
podem cair em alguns setores, os salários reaissobem para todos, pois estará
havendo um declínio geral de preços na economia.

Graças ao livre comércio, os consumidores agora irão gastar menos dinheiro


em bens e em vários serviços. Consequentemente, eles poderão agora gastar
mais dinheiro em outros bens e serviços, levando a um aumento da demanda
e, logo, dos lucros nos setores que fornecem estes bens e
serviços. Consequentemente, haverá mais investimentos nestes setores. E
essa maior taxa de investimento naturalmente levará à criação de mais
empregos nestes setores, desta maneira contrabalançando qualquer eventual
aumento no desemprego que possa ter ocorrido.
Alternativamente, os consumidores podem optar por poupar essa renda extra
possibilitada pelo declínio nos preços. Esse aumento na taxa de poupança
tende a gerar um declínio nas taxas de juros, tornando mais lucrativos
determinados investimentos de longo prazo e intensivos em capital, os quais
não eram viáveis antes. Aproveitando a oportunidade fornecida por esse
aumento na poupança, empreendedores irão tomar emprestado para investir
nesses projetos de longo prazo e intensivos em capital, os quais, por si sós,
não apenas criam mais empregos, como também geram um aumento na
demanda por bens de capital, o que eleva os lucros nas indústrias produtoras
de bens de capital e, consequentemente, levam a mais investimentos e
empregos nestes setores.

Livre comércio e especialização

Fabricada na Malásia utilizando máquinas feitas na Alemanha, algodão


proveniente da Índia, forros de colarinho do Brasil, e tecido de Portugal, em
seguida sendo vendida no varejo em Sidney, em Montreal e em várias cidades
dos países em desenvolvimento (ao menos naqueles que são mais abertos ao
comércio exterior), a camisa típica da atualidade é o produto dos esforços de
diversas pessoas ao redor do mundo. E, notavelmente, o custo de uma camisa
típica é equivalente aos rendimentos de apenas umas poucas horas de
trabalho de um cidadão comum do mundo industrializado.

Obviamente, o que é verdadeiro para uma camisa vale também para


incontáveis produtos disponíveis à venda nos países capitalistas modernos.

Como é possível que, atualmente, um trabalhador comum seja capaz de


adquirir facilmente uma ampla variedade de bens e serviços, cuja produção
requer os esforços coordenados de milhões de trabalhadores? A resposta é
que cada um desses trabalhadores faz parte de um mercado tão vasto e
abrangente, que passa a ser vantajoso para muitos empreendedores e
investidores organizarem operações de produção altamente especializadas,
as quais são lucrativas somente porque o mercado para seus produtos é
grande.

Esta especialização tanto do trabalho quanto da produção, ao longo de


diferentes setores industriais ao redor do mundo, é exatamente o fenômeno
da globalização.

Suponha, por exemplo, que as camisas possam ser feitas somente de duas
maneiras. A primeira é manualmente. Para um fabricante de camisas que
utiliza este método — independentemente de quantas camisas produz —, o
custo para produzir cada camisa é de $ 250. Trabalhando em tempo integral
na produção manual de camisas, o camiseiro consegue produzir dez camisas
por mês.
A segunda maneira é produzindo as camisas em uma fábrica altamente
mecanizada. Se a fábrica funciona ao máximo de sua capacidade de um milhão
de camisas por mês, cada camisa tem um custo de produção de $ 5. Porém,
como as instalações e todo o maquinário da fábrica exigem um grande
investimento inicial, operar a fábrica abaixo de sua capacidade máxima faz
com que o custo de cada camisa aumente. A razão para este aumento é que
produzir menos camisas — já tendo incorrido em um investimento alto —
impede o fabricante de diluir todo o custo do investimento, algo que só ocorre
quando a produção é máxima. Quanto menor for a produção da
fábrica, maior será o custo por camisa produzida.

Sendo assim, qual método de produção seria utilizado pelo fabricante? A


resposta é: depende do tamanho de seu mercado.

Se um fabricante de camisas pretende servir a um mercado de milhões de


pessoas, ele utilizará o método da fábrica. Contudo, se ele espera atender a
um mercado de apenas umas poucas dúzias de clientes em potencial, ele
optará por produzir as camisas manualmente. Se cada fabricante de camisas
tivesse acesso somente a mercados pequenos, o preço das camisas seria mais
elevado do que se os fabricantes tivessem acesso aos mercados maiores.

Este exemplo proporciona um importante argumento em prol do livre


comércio: ao expandir os mercados para além das fronteiras políticas, as
empresas podem aproveitar melhor as vantagens daquilo que os economistas
chamam de "economias de escala", possibilitando assim que os consumidores
usufruam preços mais baixos.

Outra vantagem da especialização é que ela permite aos consumidores


aproveitarem ao máximo os recursos e talentos localizados em lugares
distantes. Canadenses podem desfrutar dos abacaxis cultivados no Havaí, ao
passo que havaianos podem desfrutar do xarope de maple produzido no
Canadá; os franceses aproveitam a expertise financeira concentrada na cidade
de Londres, enquanto os londrinos desfrutam dos vinhos da Borgonha e
Bordeaux. Brasileiros se beneficiam de produtos tecnológicos manufaturados
na China, ao passo que os chineses usufruem a carne e o café produzidos no
Brasil.

Embora outros fatores estejam sempre presentes, as características


geográficas de uma região — por exemplo, seu clima, topologia e reservas de
minerais —, assim como os talentos especiais de sua força de trabalho,
determinam quais são os bens e serviços que podem ser produzidos nessa
região com o menor custo — ou, como dizem os economistas, "com vantagem
comparativa".

Quanto mais livre for o comércio, maior a probabilidade de que regiões se


especializem na produção daqueles bens e serviços que sua população local é
capaz de produzir com mais eficiência, e em seguida importem aqueles bens
e serviços que são produzidos de maneira mais eficiente em outras
localidades.

O livre comércio proporciona aos consumidores a oportunidade de comprar


bens e serviços dos melhores produtores do mundo. Se as camisas pudessem
ser mais bem produzidas domesticamente, então o livre comércio ajudaria a
manter esses produtores lucrativamente no negócio (não haveria outros
locais de onde importar camisas melhores e mais baratas). Alternativamente,
se as camisas fossem mais bem produzidas no exterior, os consumidores
domésticos somente poderiam ter pronto acesso a essas camisas por meio do
comércio.

Assim, o livre comércio faz com que os ineficientes produtores domésticos de


camisas tenham de redirecionar seus talentos para outros setores em que
sejam mais capacitados, removendo-os da produção de camisas e alocando-
os para outras atividades produtivas. Isso beneficia os
consumidores. Empreendimentos ineficientes são ruins para uma
sociedade. Eles consomem recursos escassos e não entregam valor. Na
prática, eles subtraem valor da sociedade. Não faz sentido econômico manter
uma fábrica de pentes em um país se sua população está mais bem servida
comprando pentes melhores e mais baratos de outros produtores.

Ao redirecionar os recursos ao redor do globo para aquelas tarefas nas quais


cada recurso aplicado faz um trabalho melhor, o livre comércio rearranja os
recursos mundiais de maneira a gerar a maior produção possível, ao mesmo
tempo em que proporciona aos consumidores o máximo acesso (mais fácil e
mais barato) a essa produção.

Ausência de livre comércio é escravidão

Apenas imagine viver em uma sociedade na qual nosso trabalho diário serve
unicamente ao propósito de sobrevivermos, e não para desenvolver nossos
talentos. Pois essa é a realidade nos países que mais restringem o livre
comércio: as pessoas, ao serem praticamente proibidas de utilizar os frutos
do seu trabalho para adquirir aqueles bens e serviços que são mais bem
produzidos por estrangeiros, acabam sendo obrigadas a desempenhar várias
atividades nas quais não têm nenhuma habilidade.

Uma pessoa boa em informática acaba tendo de trabalhar como operário em


uma siderurgia, pois seu governo restringe a importação de aço, que poderia
ser adquirido mais barato de estrangeiros.

Estando isoladas da divisão mundial do trabalho, tais pessoas trabalham


apenas para sobreviver, e não para desenvolver seus talentos. Elas não podem
trabalhar naquilo em que realmente são boas, pois a restrição ao livre
comércio obriga os cidadãos a fazerem de tudo, inclusive aquilo de que não
entendem.
Isso é uma vida cruel.

Apenas imagine como seria sua vida se você tivesse de fabricar seu
computador (ou tablet ou smartphone), cultivar a comida que você come,
criar as roupas que você veste, e construir a estrutura na qual você mora. Caso
tivesse de fazer tudo isso, você certamente morreria esquálido, faminto, nu,
desabrigado e desempregado.

Graças ao livre comércio, no entanto, você não é obrigado a se concentrar


naquilo em que você não é bom. Em vez disso, você pode apenas trocar os
frutos do seu trabalho por todos aqueles bens de consumo que você não é
capaz de fabricar. Nesse cenário, quanto maior a sua liberdade para adquirir
esses bens — não importa se eles foram fabricados na sua cidade ou em uma
indústria do Vietnã —, melhor.

O protecionismo nos torna mais pobres

O protecionismo não apenas protege os ineficientes, garante seus lucros, e


obriga os consumidores a pagarem preços maiores (o que configura uma
redistribuição de recursos dos consumidores domésticos para os produtores
domésticos), como também interrompe todo o processo de especialização
descrito acima, desta maneira impedindo que o padrão de vida aumente no
longo prazo — podendo, inclusive, levar ao seu declínio.

Ao dar uma sobrevida a empresas ineficientes, as tarifas protecionistas


impedem que a mão-de-obra seja retirada dos setores menos eficientes e seja
alocada para os comparativamente mais eficientes. Consequentemente, dado
que o protecionismo impede um maior grau de especialização, ou mesmo a
reverte, os benefícios da especialização não podem ser obtidos. A
produtividade não aumenta (ou, no mínimo, não aumenta como poderia) e,
consequentemente, os salários reais não sobem.

Contrariamente à retórica popular, o livre comércio não "destrói


empregos". Ele apenas leva a uma mudança de alocação de recursos (mão-
de-obra, capital e outros fatores), retirando-os dos setores comparativamente
ineficientes da economia doméstica para outros mais comparativamente
eficientes. Esse processo de especialização nas linhas de produção
comparativamente mais vantajosas não apenas não destrói empregos, como
também permite grandes ganhos em eficiência e produtividade, o que leva a
um aumento na renda real.

É assim que, longe de prejudicar os trabalhadores domésticos, o livre


comércio faz exatamente o oposto — ele os enriquece. Com efeito, é
o protecionismo o que nos deixa mais pobres, trabalhadores inclusos, ao
artificialmente proteger as empresas ineficientes, levando a uma má alocação
de recursos e a um declínio no padrão de vida de todos.

___________________________________________
Georgi Vuldzhev é graduando em ciências econômicas e membro do
Instituto para a Economia de Mercado, em Sofia, na Bulgária.

John Tamny é o editor do site Real Clear Markets e contribui para a revista
Forbes.

Donald Boudreaux foi presidente da Foudation for Economic Education,


leciona economia na George Mason University e é o autor do livro Hypocrites
and Half-Wits.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises


Brasil.

 PODCAST
 MULTIMÍDIA
 AGENDA
 LOJA

 Artigos
 artigo do dia
 economia
 direito
 filosofia
 política
 comitê editorial
 arquivo
 autores

Paul Krugman e a economia da França -


um caso de amor e de traição

economia
Louis Rouanet

domingo, 3 0aio 2015

Nos últimos anos, Paul Krugman vem incansavelmente defendendo a França e seu estado
assistencialista, chegando até mesmo ao ponto de alegar que a economia francesa estava
em melhores condições do que a britânica.
De acordo com ele, "grande parte do problema da França em 2014 advém de uma
hipocondria, a crença de que sofre de doenças que na verdade não a afligem."

No entanto, com exceção de alguns propagandistas keynesianos, ninguém hoje nega que a
economia francesa esteja em uma crise profunda, e nunca esteve tão óbvio que Krugman
esteve errado todo esse tempo.

O Reino Unido, por outro lado, está crescendo mais rapidamente do que qualquer outra
economia desenvolvida. O crescimento acelerou desde o primeiro trimestre de 2013, e foi
de 2,6% em 2014, sete vezes maior do que a taxa francesa. O emprego na Grã-Bretanha,
tanto em termos absolutos quanto como percentual da população adulta, nunca esteve tão
alto. Até os salários, que estavam deprimidos desde a crise de 2008, começaram a subir
novamente.

Como é de costume, políticos britânicos se aproveitaram do bom desempenho da economia


da terra da rainha para tirar sarro da França. O Ministro da Fazenda britânico (lá chamado
pomposamente de Chanceler do Exchequer) George Osborne declarou: "E qual distrito
criou mais empregos do que a França inteira? O grande distrito de Yorkshire", depois de as
últimas estatísticas terem mostrado emprego recorde.

O primeiro-ministro conservador David Cameron recentemente disse que o Partido


Trabalhista "nos deixaria tão mal quanto a França." Deve-se descontar o fato de que
esculachar os franceses é um passatempo nacional britânico, mas, no momento, o Reino
Unido realmente está em melhor situação que a França.

Austeridade fiscal vs. Austeridade pródiga

Desde 2009, a França e o Reino Unido têm utilizado políticas econômicas opostas. A França
aumentou os impostos e não reduziu os gastos do governo. Já o Reino Unido, por sua vez,
cortou os gastos estatais, mas não aumentou impostos. Entre 2010 e 2013, o Reino Unido
reduziu o seu déficit estrutural em 4,7% do PIB, mais do que qualquer outra economia
desenvolvida.

Se você é um seguidor das ideias de Krugman, tais medidas fariam você acreditar que a
França cresceu mais do que o Reino Unido. No entanto, e nada surpreendentemente, o que
ocorreu foi exatamente o contrário: enquanto a economia francesa está estagnada, o Reino
Unido está acumulando uma recuperação econômica.

Os gastos do governo francês estão atualmente onze pontos percentuais do PIB acima dos
gastos do governo do Reino Unido. Os impostos também são muito mais altos na França do
que no Reino Unido, e as regulações governamentais, particularmente no mercado de
trabalho, são menos problemáticas no Reino Unidodo que na França. Dessa forma, a
estrutura de produção se reestruturou com mais facilidade no Reino Unido após a crise.

Ao passo que o setor público encolheu no Reino Unido, ele cresceu na França. Sendo assim,
medir progresso econômico utilizando apenas o PIB, um método profundamente
falho, subestima o real desenvolvimento da economia britânica.

Os indivíduos que são forçados a financiar o setor público por meio de impostos não estão
expressando suas reais preferências. Como explicado neste artigo: " É realmente verdade
que, da maneira como o PIB é calculado, uma redução nos gastos reais do governo gera uma
redução na taxa de crescimento real do PIB. No entanto, [...] a redução nos gastos do
governo não retarda o crescimento da produção de bens que satisfazem as demandas dos
consumidores. Ao contrário até: pode acelerá-la.

Gráfico 1: à esquerda, os gastos do governo (linha contínua) e as receitas do governo (linha


pontilhada) francês. À direita, o mesmo padrão para o governo do Reino Unido.

Mas mesmo que a economia francesa estivesse tão bem quanto Krugman diz que está,
então por que tantos franceses estão saindo de seu país para atravessar o Canal da
Mancha? Sempre que você quiser saber como está uma economia, observe de que forma
as pessoas estão votando com os pés.

Se Krugman tivesse feito isso, ele teria verificado que são principalmente os franceses que
estão se mudando para Londres, e não os britânicos para Paris. O prefeito de Londres, Boris
Johnson, gosta de dizer que ele é o prefeito da sexta maior cidade francesa do mundo. Hoje,
há mais de 200.000 imigrantes franceses vivendo em Londres.

É claro que o Reino Unido está longe de ser perfeito. A dívida pública e o déficit
permanecem muito altos e ainda há muito a ser feito, principalmente no sistema de saúde
estatal britânico, uma vaca sagrada na qual nenhum partido tem coragem de tocar. O gasto
público com a saúde continua crescendo — a uma média de 4% entre 2010 e 2011, e
novamente entre 2013 e 2014. Além do mais, o Banco Central da Inglaterra tem conduzido
uma política monetária de juros extremamente baixos, o que pode levar a instabilidades e
novas crises. É bem possível, por exemplo, que haja uma nova bolha imobiliária sendo
inflada na Inglaterra.

Os dados de Krugman vs. Os dados reais

No dia 8 de novembro de 2013, Krugman atacou a decisão da Standard & Poor's de reduzir
a nota de crédito da França:

Lamento, mas acredito que quando a S&P reclama da falta de reformas, ela na verdade está
reclamando que François Hollande está aumentando os impostos sobre os ricos em vez de
cortá-los, e que o presidente francês não é suficientemente a favor do livre mercado para o
gosto do pessoal de Davos.

Alguns dias depois de Krugman ter escrito essas linhas, números de emprego melhores do
que o esperado foram divulgados na Grã-Bretanha, ao passo que a França já alcançava
um desemprego de dois dígitos. Já em 2013 era visível que algo estava errado com as
políticas econômicas da França. Mas Krugman estava certo de que esse não era o caso.

No início de Janeiro de 2015, Krugman publicou outro artigo com o objetivo de demonstrar
a superioridade da economia francesa sobre a britânica. E, novamente, não demorou muito
para que novas estatísticas mostrassem que o que Krugman dizia estava simplesmente
errado. Para apoiar seu argumento, ele publicou o seguinte gráfico, sem citar nenhuma
fonte:

Gráfico 2: um gráfico sem fontes publicado por Paul Krugman, comparando a evolução da
renda per capita de EUA (azul), França (vermelho) e Reino Unido (verde)
Krugman escreveu:

O triunfo da austeridade. Ou não. Parte disso é a falácia da taxa de crescimento — não


importa quão ruim tenha estado uma economia por um período prolongado; é fácil
proclamar sucesso depois de um ano ou dois de bom crescimento.

Há dois problemas graves com a alegação de Krugman. Primeiro, se você olhar para o
crescimento do PIB per capita — que é o que realmente interessa — desde 2000, o Reino
Unido cresce mais rapidamente do que a França. Segundo, o gráfico de Krugman está
errado. Não importa se você está olhando para os dados do FMI, do Banco Mundial, ou da
agência Eurostat da União Européia: nenhuma estatística bate com os números de
Krugman.

O gráfico real se parece com esse:

Gráfico 3: a verdadeira evolução do PIB per capita do Reino Unido (azul) e da França
(vermelho). Fonte: Eurostat

Adicionalmente, as políticas de austeridade no Reino Unido foram introduzidas apenas


depois de 2009. Dessa forma, o keynesianismo ortodoxo não é capaz de explicar por que
fenômenos aparentemente contraditórios como, de um lado, crescimento econômico e
queda no desemprego, e de outro, austeridade, aconteceram ao mesmo tempo. Krugman
não ofereceu nenhuma explicação.

Desemprego

De Dezembro de 2009 a Dezembro de 2014, na Grã-Bretanha, o número de empregados no


setor público caiu de 6.370.000 para 5.397.000, ao mesmo tempo em que o número total de
empregos subiu em cerca de 1.700.00. De um lado, os números dessa estatística foram
afetados por várias reclassificações metodológicas, em que organizações que empregam
grandes números de pessoas foram transferidas entre os setores público e privado. No
entanto, mesmo levando isso em consideração, o número de empregos criados pelo setor
privado é impressionante.

Por outro lado, o número de funcionários públicos na França nunca parou de crescer, e o
desemprego ainda está em um nível muito alto. Os keynesianos não explicam como isso
ocorreu. Eles esperavam que a austeridade gerasse um forte efeito recessivo. Mas isso não
foi observado.

Gráfico 4: taxa de desemprego na França (linha azul) e no Reino Unido (linha vermelha)

Para aqueles que são imunes ao charme do keynesianismo, o gráfico acima é fácil de ser
compreendido, bem como os níveis de crescimento superiores do Reino Unido. Uma
redução no número de funcionários públicos é boa, pois isso significa que há mais força de
trabalho disponível para empresas privadas. Consequentemente, os salários caem. Essa
queda torna viáveis novos projetos de investimento. Quando o setor público encolhe,
torna-se comparativamente mais atraente trabalhar no setor privado. Só então as energias
empreendedoras podem ser direcionadas para mais bem servir os consumidores no
mercado, em vez de buscarem privilégios no setor público.

Por outro lado, se um governo aumenta seus gastos, os incentivos para o empreendimento
privado são reduzidos. Por que você vai abrir uma padaria, um restaurante, um comércio
ou uma atividade de serviços se você pode se tornar um burocrata bem pago trabalhando
em uma repartição pública? Por que uma pessoa qualificada vai querer fazer algum estágio
em uma firma de engenharia se o governo abriu vários concursos públicos que prometem
salários nababescos e estabilidade no emprego? Enfim, por que se arriscar no setor
privado, sofrendo cobranças e tendo de apresentar eficiência, se você pode simplesmente
ganhar muito no setor público, tendo estabilidade no emprego e sem ter de apresentar
resultados?

Conclusão
O futuro da França não é tão brilhante quanto Krugman diz, e as suas recomendações estão
longe de serem validadas tanto pela teoria quanto pelos fatos.

Durante uma crise, a melhor regra que um governo pode seguir, como escreveuRothbard,
é não interferir com o processo de ajuste do mercado. Outra coisa que o governo pode fazer
é cortar gastos e impostos. De forma limitada, foi isso que foi feito no Reino Unido,
principalmente em comparação com a França.

Uma depressão é uma época de dificuldade econômica. Quaisquer reduções de impostos


ou de regulações que interferem na liberdade de mercado irão estimular um crescimento
saudável da atividade econômica; qualquer aumento de impostos vai deprimir ainda mais
a economia.

Expansões econômicas e “gastos


estimulantes” - e Paul Krugman, mais uma
vez

economia

William L. Anderson

sexta-feira, 11 jan 2013


Uma das principais diferenças entre a Escola Austríaca de economia e a
economia convencional neoclássica é a visão acerca do indivíduo e seu
comportamento. Os austríacos veem os indivíduos como seres que atuam
visando a um determinado propósito; já a maioria dos neoclássicos vê apenas
pessoas atuando de forma mais mecanizada. Desta visão de mundo dos
neoclássicos advém o raciocínio de que aquilo que é bom para indivíduos
pode ir contra aquilo que é supostamente "bom" para a sociedade como um
todo.
E não me refiro a comportamentos violentos ou coercivos, como quando uma
pessoa rouba outra e em consequência melhora sua situação ao mesmo tempo
em que faz com que o roubado fique em pior situação. Não. Refiro-me a
transações econômicas pacíficas e voluntárias, decisões que envolvem a
minha pessoa ou minha família — este é o cerne da teoria austríaca. Mises
escreveu que indivíduos irão agir com o intuito de melhorar sua situação; e
quando essa ação ocorre por meio de trocas comerciais voluntárias e
mutuamente benéficas junto a terceiros, a ação pode ter efeitos sociais
positivos.

Por exemplo, quando vou ao supermercado e faço uma transação comercial,


estou comprando alimentos que, em minha crença, me deixarão em melhor
situação no futuro, seja aliviando minha fome, seja me propiciando saudáveis
benefícios pessoais. Da mesma forma, as pessoas que trabalham no
supermercado — proprietário e empregados — irão receber meu dinheiro e
poderão utilizá-lo para alcançar seus objetivos pessoais. Isso não é um
comportamento "insensível", como vários críticos marxistas do capitalismo
gostam de afirmar; trata-se, isso sim, de um comportamento propositado e
voluntário, e não baseado em coerções.

Sim, concordo que isso que descrevi até aqui é exatamente aquela economia
básica que você encontra nos principais livros-textos da disciplina,
especialmente nos convencionais. Mas os austríacos divergem dos
economistas convencionais quando a análise parte para um ponto de vista
mais amplo acerca da sociedade. Falando mais claramente, os austríacos
acreditam que a liberdade individual para se comercializar as próprias posses
— sejam essas posses a riqueza acumulada na forma de dinheiro ou de bens,
ou a mão-de-obra ou os talentos dessa pessoa — terão efeitos sociais e
econômicos positivos sobre toda a economia, desde que, é claro, os indivíduos
sejam livres para incorrer nesses atos, sem nenhuma coerção. Este é,
simplesmente, o princípio da não-agressão em funcionamento.

Já os keynesianos, como Paul Krugman, veem as coisas de maneira distinta. O


que é bom para um indivíduo quase sempre não é bom para a economia como
um todo. Em sua recente coluna, Krugman escreveu:
... a economia não funciona como as famílias. As famílias podem decidir gastar
menos e tentar ganhar mais. Mas, na economia como um todo, gastos e receitas
caminham juntos: minha despesa é sua receita e sua despesa é minha receita. Se
todo mundo tenta cortar os gastos ao mesmo tempo, os rendimentos vão cair —
e o desemprego vai disparar.

Isso é algo que, intuitivamente, parece estar certo, mas que na realidade se
baseia em um princípio fundamentado na crença de que ações individuais e
transações comerciais mutuamente acordadas podem ser deletérias para
toda a economia, e que, mais sespecificamente, se várias pessoas decidirem,
por exemplo, poupar mais dinheiro, isso irá gerar desemprego. Esse ponto
keynesiano-krugmaniano já foi feito em várias ocasiões, e não creio estar
sendo controverso quando o cito desta forma.

Em um dado nível, se várias pessoas repentinamente decidirem parar de


gastar toda a sua renda e decidirem poupar boa parte dela com a intenção de
consumir apenas no futuro, isso obviamente terá certos efeitos sobre parte da
economia, uma vez que haverá menos demanda por certos tipos de bens e
serviços. Isso é algo óbvio e nada controverso.

Há, no entanto, uma questão mais ampla que Krugman e os keynesianos


ignoram, e é por causa dela que ocorreu esta mudança de comportamento. Na
visão keynesiana, a mesma que Malthus teve, esta mudança não é uma
resposta racional a determinadas alterações nas condições econômicas; ao
contrário, trata-se de um comportamento irracional, de um "espírito
animal". É algo que acontece do nada. As pessoas simplesmente param de
gastar e começam a poupar, e então toda a Falácia da Composição entra em
cena e derruba a economia.

Os austríacos observam que, quando o crescimento artificial da economia


chega ao fim — e isso sempre ocorre — e o nível de atividade vigente em
determinados setores não mais pode ser mantido por meio das transações
econômicas normais, então as pessoas irão inevitavelmente ajustar seu
comportamento. Adicionalmente, os austríacos afirmam que todo
crescimento econômico artificial — isto é, gerado por expansões artificiais do
crédito — (1) resulta em recursos escassos investidos erroneamente, em
setores para os quais não há uma genuína demanda dos consumidores, (2) é
financiado por meio de dinheiro emprestado que, mais cedo ou mais tarde,
terá de ser quitado, e (3) cria condições que inevitavelmente levarão a uma
"correção" dentro da economia tão logo o período de expansão econômica
termine.

Além do mais, os austríacos também creem que, se o governo não interferir


no sistema de preços e salários (não criar pacotes de estímulos que interfiram
neste segmento), e não interferir na criação e na maneira como os recursos
escassos são direcionados durante uma recessão, os empreendedores
procurarão e descobrirão aquelas linhas de produção que são compatíveis
com as recessivas condições econômicas vigentes. São estes investimentos
nestas linhas de produção que levarão a uma recuperação.

Mesmo Krugman tem de admitir que a bolha imobiliária americana não


poderia ser mantida por muito mais tempo, embora ele não irá admitir que
recursos escassos foram "investidos erroneamente", pois dizer isso seria
conceder uma importante vitória intelectual aos austríacos, e isso não é algo
do feitio de Krugman. Ainda assim, o que seria uma "bolha" se não uma série
de investimentos ruins, com recursos alocados de forma
insustentável? Krugman certamente não afirmaria que a bolha imobiliária era
infinitamente sustentável; mas, ora, se um conjunto de investimentos não
pode mais ser sustentado tão logo outros fatores de produção (como mão-de-
obra e bens de capital) exponham a real situação deste mercado, então
estamos lidando com recursos que foram mal investidos. Ponto. Que ele se
recuse a utilizar o termo 'investimento errôneo' não altera em nada a
realidade do fato.

Certo. Agora vamos à resposta sobre o que deveria ter sido feito quando os
mercados expuseram os investimentos errôneos. (Observo aqui que
Krugman acredita que, a menos que burocratas do governo estejam ditando
ordens para cidadãos que estejam praticando transações de mercado
pacíficas e voluntárias, os mercados irão para o abismo, arrastando todas as
pessoas junto a ele. No entanto, foram os mercado que expuseram a bolha
imobiliária, assim como foram os mercados que expuseram o esquema
fraudulento de Bernie Madoff, e não as agências reguladoras do governo
americano).

A resposta de Krugman é que o governo deveria criar ainda mais bolhas para
compensar a bolha que estourou, assim como deveria estimular ainda mais
investimentos ruins para compensar aqueles que entraram em colapso, neste
processo desperdiçando ainda mais recursos escassos. Sim, há aquela infame
frase de Krugman, proferida há uma década, dizendo que Alan Greenspan
deveria criar uma bolha imobiliária para compensar o estouro da bolha das
ações pontocom, mas não é a isso que me refiro. A questão é que Krugman
acredita que os governos deveriam tomar dinheiro emprestado ou imprimir
dinheiro (ou ambos) para poderem sair gastando com o intuito de preencher
um "buraco" surgido nos gastos dos consumidores e dos investidores, uma
vez que, sem essa intervenção, não mais haveria dinheiro sendo direcionado
para aquela parte da economia que entrou em colapso (ao menos, não no
mesmo volume de antes) — neste caso, o setor imobiliário.

(Por exemplo, Krugman repetidas vezes mostrou seu contumaz endosso a


políticas insensatas e improdutivas como energia eólica e carros elétricos
maciçamente subsidiados. No entanto, o fato de que tais investimentos
necessitam de contínuos subsídios para se manterem operantes mostra
claramente sua sustentabilidade econômica. São investimentos errôneos e
insensatos, sem meios termos. Ainda assim, Krugman e Obama querem que
acreditemos que este tipo de investimento subsidiado pode fazer a economia
voltar a crescer solidamente).

Os keynesianos argumentam que, se há "recursos ociosos ou não


empregados", então não é possível haver investimentos errôneos, pois a
economia poderá absorver um volume maior de gastos sem que o nível geral
de preços suba. Tal raciocínio ignora a questão do real motivo de estes
recursos estarem "ociosos" em primeiro lugar. Krugman alegaria que eles
estão "ociosos" porque as pessoas não estão gastando dinheiro; sendo assim,
o governo deve entrar em cena e assumir o lugar de todos os cidadãos e sair
gastando com o intuito de aditivar a economia novamente, criando aquele
efeito de "gotejamento" que supostamente turbinaria a economia.

Mas a verdade é que esses recursos estão ociosos porque os investimentos


anteriores que foram feitos com eles não mais podem ser mantidos. Seu valor
contábil já caiu. Os mercados estão emitindo este alerta, mas os keynesianos
ignoram o óbvio e preferem continuar exigindo que estes setores recebam
injeções extras de gastos governamentais.

Com efeito, Krugman e os keynesianos alegam que a Lei da Escassez, a mais


básica lei da economia, é abolida durante severas retrações econômicas. No
entanto, ainda pelo raciocínio deles, a menos que o governo comece a se
endividar mais intensamente e saia gastando feito um marinheiro bêbado,
todos os cidadãos estarão severamente limitados pela escassez. Famílias
estarão limitadas pela escassez, mas não o governo, que opera em outra
dimensão.

Para que ninguém pense que estou criando um espantalho e deturpando a


posição de Krugman, ei-lo aqui em suas próprias palavras:

Então, o que pode ser feito? Um choque financeiro de menor porte, como o
estouro da bolha das ações pontocom, ocorrido no final da década de 1990,
poderia ser resolvido por meio de um corte das taxas de juros. Mas a crise de
2008 foi muito maior, e até mesmo cortar as taxas de juros, reduzindo-as a zero,
não foi suficiente.

Nesse ponto, os governos precisaram intervir, passando a sustentar suas


economias enquanto o setor privado se reequilibrava. E, em certa medida, isso
realmente aconteceu: a receita caiu drasticamente durante a crise, mas os
gastos aumentaram enquanto programas e benefícios como o seguro-
desemprego foram ampliados e estímulos econômicos temporários entraram
em vigor. Os déficits orçamentários aumentaram, mas, na realidade, isso foi
uma coisa boa — provavelmente eles foram o principal motivo que impediu um
replay completo da Grande Depressão.
Mas por que o setor privado iria se "reequilibrar"? Como isso
ocorreria? Afinal, se transações comerciais mutuamente benéficas possuem
efeitos nocivos, e se a tendência natural de uma economia de mercado é de
implodir sempre que as pessoas aumentam suas poupanças, então por que
deveríamos esperar qualquer tipo de recuperação? E por que os governos
deveriam em algum momento reduzir sua gastança maciça? Por que não
continuá-la aumentando seguidamente, até o infinito, sem se preocupar com
déficits?

Se você enxerga os gastos individuais como sendo algo mecânico em vez de


algo propositado, então o ponto de vista keynesiano pode fazer sentido. Sob
este prisma, uma economia é pouco mais do que uma máquina em moto-
perpétuo, que funciona por meio de gastos que se movem em um fluxo
circular, com recursos homogêneos.

Ou seja, não há uma estrutura do capital complexa, não há varias etapas de


produção, não há preferências temporais. Há apenas gastos, os quais fazem
automaticamente o serviço de "gerar crescimento". (Veja mais aqui).

Há um último ponto que deve ser enfatizado. Krugman alega que a


recuperação econômica americana está mais fraca do que deveria porque o
governo federal não está tributando, imprimindo e tomando dinheiro
emprestado na quantidade em que deveria, e que se o governo gastasse ainda
mais do que já gasta — por exemplo, se fizesse preparativos para combater
uma imaginária invasão de alienígenas —, então tudo estaria perfeito com o
mundo e estaríamos hoje vivenciando uma sólida e esplêndida recuperação.

Em minha concepção, os EUA ainda não vivenciaram uma real recuperação


por várias razões, dentre elas a insistência do governo em forçar um
redirecionamento de recursos, retirando-os de setores onde são mais
valorados e canalizando-os para onde são menos valorados (investimentos
em "energia verde" são um bom ponto). O governo federal, e especialmente
a administração Obama, demonstram aberta hostilidade a empreendedores
que não são ligados às classes políticas, e a redução da taxa básica de juros
para quase zero feita pelo Fed não apenas aboliu qualquer incentivo para as
pessoas pouparem, como também está enviando sinais errôneos e confusos
para o mercado, tornando ainda mais difícil para os empreendedores
descobrirem linhas de produção que sejam genuinamente lucrativas e que
estejam sob sólida demanda dos consumidores.

Krugman acredita que tudo o que é necessário para uma recuperação


econômica sólida é que o governo saia despejando dinheiro sobre aqueles
empreendimentos politicamente preferidos. Isso fará com que os gastos
tenham aquele efeito de "gotejamento" sobre todos os cidadãos da economia.

Sim, se todos os recursos da economia fossem puramente homogêneos e se


os indivíduos não agissem propositadamente, então Krugman teria alguma
razão. Mas, dado que a realidade não é esta, então ele está simplesmente
exigindo que o governo continue exatamente com o mesmo tipo de
comportamento que gerou esta depressão.
Paul Krugman e a economia da França – um caso de
amor e de traição

Nos últimos anos, Paul


Krugman vem incansavelmente defendendo a França e seu estado
assistencialista, chegando até mesmo ao ponto de alegar que a economia
francesa estava em melhores condições do que a britânica.

De acordo com ele, “grande parte do problema da França em 2014 advém de uma
hipocondria, a crença de que sofre de doenças que na verdade não a afligem.”

No entanto, com exceção de alguns propagandistas keynesianos, ninguém hoje


nega que a economia francesa esteja em uma crise profunda, e nunca esteve tão
óbvio que Krugman esteve errado todo esse tempo.

O Reino Unido, por outro lado, está crescendo mais rapidamente do que qualquer
outra economia desenvolvida. O crescimento acelerou desde o primeiro trimestre
de 2013, e foi de 2,6% em 2014, sete vezes maior do que a taxa francesa. O
emprego na Grã-Bretanha, tanto em termos absolutos quanto como percentual da
população adulta, nunca esteve tão alto. Até os salários, que estavam deprimidos
desde a crise de 2008, começaram a subir novamente.

Como é de costume, políticos britânicos se aproveitaram do bom desempenho da


economia da terra da rainha para tirar sarro da França. O Ministro da Fazenda
britânico (lá chamado pomposamente de Chanceler do Exchequer) George
Osborne declarou: “E qual distrito criou mais empregos do que a França inteira? O
grande distrito de Yorkshire”, depois de as últimas estatísticas terem mostrado
emprego recorde.

O primeiro-ministro conservador David Cameron recentemente disse que o Partido


Trabalhista “nos deixaria tão mal quanto a França.” Deve-se descontar o fato de
que esculachar os franceses é um passatempo nacional britânico, mas, no
momento, o Reino Unido realmente está em melhor situação que a França.
Austeridade fiscal vs. Austeridade pródiga

Desde 2009, a França e o Reino Unido têm utilizado políticas econômicas opostas.
A França aumentou os impostos e não reduziu os gastos do governo. Já o Reino
Unido, por sua vez, cortou os gastos estatais, mas não aumentou impostos. Entre
2010 e 2013, o Reino Unido reduziu o seu déficit estrutural em 4,7% do PIB, mais
do que qualquer outra economia desenvolvida.

Se você é um seguidor das ideias de Krugman, tais medidas fariam você acreditar
que a França cresceu mais do que o Reino Unido. No entanto, e nada
surpreendentemente, o que ocorreu foi exatamente o contrário: enquanto a
economia francesa está estagnada, o Reino Unido está acumulando
uma recuperação econômica.

Os gastos do governo francês estão atualmente onze pontos percentuais do PIB


acima dos gastos do governo do Reino Unido. Os impostos também são muito
mais altos na França do que no Reino Unido, e as regulações governamentais,
particularmente no mercado de trabalho, são menos problemáticas no Reino
Unidodo que naFrança. Dessa forma, a estrutura de produção se reestruturou com
mais facilidade no Reino Unido após a crise.

Ao passo que o setor público encolheu no Reino Unido, ele cresceu na


França. Sendo assim, medir progresso econômico utilizando apenas o PIB, um
método profundamente falho, subestima o real desenvolvimento da economia
britânica.

Os indivíduos que são forçados a financiar o setor público por meio de impostos
não estão expressando suas reais preferências. Como explicado neste artigo: ” É
realmente verdade que, da maneira como o PIB é calculado, uma redução nos
gastos reais do governo gera uma redução na taxa de crescimento real do
PIB. No entanto, […] a redução nos gastos do governo não retarda o crescimento
da produção de bens que satisfazem as demandas dos consumidores. Ao
contrário até: pode acelerá-la.
Gráfico 1: à esquerda, os gastos do governo (linha contínua) e as receitas do
governo (linha pontilhada) francês. À direita, o mesmo padrão para o governo do
Reino Unido.

Mas mesmo que a economia francesa estivesse tão bem quanto Krugman diz que
está, então por que tantos franceses estão saindo de seu país para atravessar o
Canal da Mancha? Sempre que você quiser saber como está uma economia,
observe de que forma as pessoas estão votando com os pés.

Se Krugman tivesse feito isso, ele teria verificado que são principalmente os
franceses que estão se mudando para Londres, e não os britânicos para Paris. O
prefeito de Londres, Boris Johnson, gosta de dizer que ele é o prefeito da sexta
maior cidade francesa do mundo. Hoje, há mais de 200.000 imigrantes franceses
vivendo em Londres.

É claro que o Reino Unido está longe de ser perfeito. A dívida pública e o déficit
permanecem muito altos e ainda há muito a ser feito, principalmente no sistema de
saúde estatal britânico, uma vaca sagrada na qual nenhum partido tem coragem
de tocar. O gasto público com a saúde continua crescendo — a uma média de 4%
entre 2010 e 2011, e novamente entre 2013 e 2014. Além do mais, o Banco
Central da Inglaterra tem conduzido uma política monetária de juros extremamente
baixos, o que pode levar a instabilidades e novas crises. É bem possível, por
exemplo, que haja uma nova bolha imobiliária sendo inflada na Inglaterra.

Os dados de Krugman vs. Os dados reais

No dia 8 de novembro de 2013, Krugman atacou a decisão da Standard & Poor’s


de reduzir a nota de crédito da França:

Lamento, mas acredito que quando a S&P reclama da


falta de reformas, ela na verdade está reclamando que
François Hollande está aumentando os impostos
sobre os ricos em vez de cortá-los, e que o presidente
francês não é suficientemente a favor do livre mercado
para o gosto do pessoal de Davos.

Alguns dias depois de Krugman ter escrito essas linhas, números de emprego
melhores do que o esperado foram divulgados na Grã-Bretanha, ao passo que a
França já alcançava um desemprego de dois dígitos. Já em 2013 era visível que
algo estava errado com as políticas econômicas da França. Mas Krugman estava
certo de que esse não era o caso.

No início de Janeiro de 2015, Krugman publicou outro artigo com o objetivo de


demonstrar a superioridade da economia francesa sobre a britânica. E,
novamente, não demorou muito para que novas estatísticas mostrassem que o
que Krugman dizia estava simplesmente errado. Para apoiar seu argumento, ele
publicou o seguinte gráfico, sem citar nenhuma fonte:
Gráfico 2: um gráfico sem fontes publicado por Paul Krugman, comparando a
evolução da renda per capita de EUA (azul), França (vermelho) e Reino Unido
(verde)

Krugman escreveu:

O triunfo da austeridade. Ou não. Parte disso é a


falácia da taxa de crescimento — não importa quão
ruim tenha estado uma economia por um período
prolongado; é fácil proclamar sucesso depois de um
ano ou dois de bom crescimento.

Há dois problemas graves com a alegação de Krugman. Primeiro, se você olhar


para o crescimento do PIB per capita — que é o que realmente interessa — desde
2000, o Reino Unido cresce mais rapidamente do que a França. Segundo, o
gráfico de Krugman está errado. Não importa se você está olhando para os dados
do FMI, do Banco Mundial, ou da agência Eurostat da União Européia: nenhuma
estatística bate com os números de Krugman.

O gráfico real se parece com esse:


Gráfico 3: a verdadeira evolução do PIB per capita do Reino Unido (azul) e da
França (vermelho). Fonte: Eurostat

Adicionalmente, as políticas de austeridade no Reino Unido foram introduzidas


apenas depois de 2009. Dessa forma, o keynesianismo ortodoxo não é capaz de
explicar por que fenômenos aparentemente contraditórios como, de um lado,
crescimento econômico e queda no desemprego, e de outro, austeridade,
aconteceram ao mesmo tempo. Krugman não ofereceu nenhuma explicação.

Desemprego

De Dezembro de 2009 a Dezembro de 2014, na Grã-Bretanha, o número de


empregados no setor público caiu de 6.370.000 para 5.397.000, ao mesmo tempo
em que o número total de empregos subiu em cerca de 1.700.00. De um lado, os
números dessa estatística foram afetados por várias reclassificações
metodológicas, em que organizações que empregam grandes números de
pessoas foram transferidas entre os setores público e privado. No entanto, mesmo
levando isso em consideração, o número de empregos criados pelo setor privado é
impressionante.

Por outro lado, o número de funcionários públicos na França nunca parou de


crescer, e o desemprego ainda está em um nível muito alto. Os keynesianos não
explicam como isso ocorreu. Eles esperavam que a austeridade gerasse um forte
efeito recessivo. Mas isso não foi observado.
Gráfico 4: taxa de desemprego na França (linha azul) e no Reino Unido (linha
vermelha)

Para aqueles que são imunes ao charme do keynesianismo, o gráfico acima é fácil
de ser compreendido, bem como os níveis de crescimento superiores do Reino
Unido. Uma redução no número de funcionários públicos é boa, pois isso significa
que há mais força de trabalho disponível para empresas
privadas. Consequentemente, os salários caem. Essa queda torna viáveis novos
projetos de investimento. Quando o setor público encolhe, torna-se
comparativamente mais atraente trabalhar no setor privado. Só então as energias
empreendedoras podem ser direcionadas para mais bem servir os consumidores
no mercado, em vez de buscarem privilégios no setor público.

Por outro lado, se um governo aumenta seus gastos, os incentivos para o


empreendimento privado são reduzidos. Por que você vai abrir uma padaria, um
restaurante, um comércio ou uma atividade de serviços se você pode se tornar um
burocrata bem pago trabalhando em uma repartição pública? Por que uma pessoa
qualificada vai querer fazer algum estágio em uma firma de engenharia se o
governo abriu vários concursos públicos que prometem salários nababescos e
estabilidade no emprego? Enfim, por que se arriscar no setor privado, sofrendo
cobranças e tendo de apresentar eficiência, se você pode simplesmente ganhar
muito no setor público, tendo estabilidade no emprego e sem ter de apresentar
resultados?

Conclusão

O futuro da França não é tão brilhante quanto Krugman diz, e as suas


recomendações estão longe de serem validadas tanto pela teoria quanto pelos
fatos.
Durante uma crise, a melhor regra que um governo pode seguir, como escreveu
Rothbard, é não interferir com o processo de ajuste do mercado. Outra coisa que o
governo pode fazer é cortar gastos e impostos. De forma limitada, foi isso que foi
feito no Reino Unido, principalmente em comparação com a França.

Uma depressão é uma época de dificuldade econômica. Quaisquer reduções de


impostos ou de regulações que interferem na liberdade de mercado irão estimular
um crescimento saudável da atividade econômica; qualquer aumento de impostos
vai deprimir ainda mais a economia.

A situação espanhola, Paul Krugman e a paixão dos


banqueiros pelo keynesianismo

Banqueiros tolos adoram pacotes de socorro


dos governos. Keynesianos também. Banqueiros tolos detestam as
consequências negativas de suas decisões idiotas. Keynesianos
também. Banqueiros tolos adoram a inflação monetária que leva a lucros
bancários altos. Keynesianos também. Banqueiros tolos adoram governos
grandes o bastante para socorrer os grandes bancos. Keynesianos
também. Banqueiros tolos odeiam corridas bancárias. Keynesianos
também. Banqueiros tolos querem exercer seus cargos mas sem ter arcar com
suas responsabilidades. Keynesianos também.

Paul Krugman é o porta-voz principal do keynesianismo em nossa era. Sua função


é assegurar que os pagadores de impostos aceitem de bom grado entregar seu
dinheiro para os governos socorrerem os grandes bancos multinacionais. Sempre
que estes pagadores de impostos oferecem resistência, Krugman os ridiculariza,
rotula-os de reacionários e os acusa de serem tacanhos de mentalidade estreita.

Mas Krugman é esperto: ele sabe ocultar seus interesses. Em vez de se declarar
abertamente como um defensor dos interesses dos grandes bancos, ele posa de
defensor dos trabalhadores. Mas a realidade é inocultável: o socorro aos grandes
bancos é a implicação inescapável das políticas que ele recomenda. Krugman é o
melhor amigo dos banqueiros multinacionais. O mesmo pode ser dito sobre o seu
colega de Princeton, Ben Bernanke.
Podemos ver isso claramente em seu recente artigo, no qual ele exorta o governo
alemão, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu a
emprestarem mais dinheiro para o governo espanhol, mesmo com este se
recusando a cortar gastos.

Krugman quer que a economia espanhola não tenha de passar pelos custos de
quitar os empréstimos tomados junto aos países do continente europeu, mais
especificamente a Alemanha. Sendo assim, ele quer que o governo alemão, o FMI
e o BCE dêem mais dinheiro para o governo espanhol para que este possa
repassar mais subsídios, mais assistencialismos e maiores salários para os
cidadãos em sua folha de pagamento. Estes irão gastar mais, e isso fará com que
a economia deslanche. E isso, por sua vez, permitirá aos devedores espanhóis
pagar os juros que devem aos bancos alemães.

Portanto, após caírem na armadilha de terem concedido empréstimos ruins para


caloteiros, os bancos devem conceder mais uma rodada de empréstimos ruins. E
por que eles fariam isso? Porque o governo alemão, o Banco Central Europeu e o
FMI irão continuar comprando títulos do governo espanhol.

Se isso se parece com aquilo que Bernanke e Henry Paulson fizeram em 2008, é
porque foram eles que criaram esse padrão.

A Europa está entrando em recessão. Há uma crise fiscal contínua na Grécia, em


Portugal e na Espanha. A crise é enorme. A Alemanha acabou de sinalizar que
está entrando em recessão. A Grã-Bretanha provavelmente já entrou.

Krugman está estarrecido com a exigência do FMI, do BCE e dos políticos


alemães de que uma redução nos gastos dos governos dos PIIGS seja uma
precondição para receberem ajuda do FMI e da Alemanha. Ele é um
keynesiano. Ele odeia a ideia de austeridade, pois isso significa austeridade para
as burocracias estatais. Ele quer que os governos gastem mais.

A refutação de um artigo de Krugman sempre possibilita a geração de um artigo


inteiro. Ele, obviamente, é contra qualquer austeridade; ele gosta de déficits.

O BCE vai ao resgate

Krugman começa seu artigo fazendo um resumo da promessa feita pelo Banco
Central Europeu de que manteria os governos solventes por meio da compra dos
títulos de suas dívidas. Tal medida era ilegal no passado. Mas o BCE quebrou as
regras do tratado que criou a zona do euro. Esta violação das regras “acalmou” os
mercados, diz Krugman. Tudo o que um país endividado tinha de fazer era pedir
ajuda — no caso, socorro na forma de dinheiro.

E então várias greves irromperam na Grécia e na Espanha para protestar contra a


“austeridade”, no caso, cortes no orçamento dos governos. Isso seria
economicamente muito ruim, diz Krugman. “Com o desemprego em níveis dignos
da Grande Depressão e com trabalhadores da outrora classe média reduzidos a
terem de vasculhar o lixo em busca de comida, a austeridade já foi longe demais.
E isso quer dizer que é possível que, no final, não haja nenhum acordo.”
Ele resumiu a posição da mídia financeira, a qual crê que os PIIGS irão dar o
calote de qualquer jeito.

Muitos comentários sugerem que os cidadãos da


Espanha e Grécia estão apenas protelando o
inevitável, protestando contra sacrifícios que terão que
ser feitos de qualquer maneira. Mas a verdade é que
os manifestantes estão certos. Mais austeridade não
servirá a nenhuma finalidade útil. Os atores
verdadeiramente irracionais aqui são as autoridades e
os políticos supostamente sérios, que exigem cada
vez mais sofrimento.

Isso é Krugman em estado puro. Ele jamais viu um déficit de que ele não tenha
gostado. Ele jamais conheceu um sindicato de funcionários públicos do qual ele
não tenha gostado.

Ele disse que a Espanha está sofrendo em decorrência do estouro de sua bolha
imobiliária. Ele disse que tal bolha gerou uma forte expansão econômica que
elevou os preços e, consequentemente, deixou indústria espanhola pouco
competitiva em comparação com a do resto da Europa. Mas ele não explica o que
causou a bolha. Por que os preços dos imóveis subiram? Taxas de juros muito
baixas. Por que as taxas de juros estavam baixas? Porque os bancos do
continente europeu, sob a supervisão do BCE, emprestaram volumosas quantias
de dinheiro criado por meio de suas reservas fracionárias tanto para o governo
espanhol quanto para as construtoras espanholas. Dentre estes bancos, os
alemães eram a maioria.

Quando a bolha estourou, a Espanha ficou com o


difícil problema de recuperar sua competitividade, um
processo doloroso que levará anos. A não ser que a
Espanha deixe a zona do euro — um passo que
ninguém quer dar —, ela está condenada a anos de
desemprego alto.

Para começar, a Espanha nunca teve muita competitividade dentro da


Europa. Este foi o núcleo do problema. Não obstante, os espanhóis mesmo assim
conseguiram empréstimos a juros equivalentes aos cobradas dos alemães, que
são competitivos. Isso foi uma grande estupidez da parte dos banqueiros
alemães, que agora estão repletos de empréstimos ruins concedidos a uma nação
que nunca foi competitiva — desde o século XVII.
Mas este sofrimento, que pode ser visto como
inevitável, está sendo amplamente intensificado pelos
rígidos cortes nos gastos públicos; e esses cortes nos
gastos são um exemplo de como se provoca
sofrimento pelo simples intuito de provocar sofrimento.

Isso é retórica keynesiana. Os cortes não estão sendo exigidos apenas pelo
sadismo de se infligir dor. Os cortes estão sendo exigidos porque a Espanha está
incorrendo em um grande déficit orçamentário. Os emprestadores querem receber
seus juros corretamente, e em euros.

Ele diz que o governo espanhol apresentou um pequeno superávit até


2009. “Grandes déficits surgiram apenas quando a economia entrou em recessão,
o que derrubou as receitas do governo; mesmo assim, a Espanha não parece ter
uma dívida tão grande assim.”

Então o que realmente aconteceu? Simples: banqueiros tolos do continente


europeu emprestaram euros aos espanhóis a juros baixos. Quando banqueiros
tolos mantêm juros em níveis baixos, isso derruba também os juros de outras
dívidas de longo prazo. Consequentemente, os empréstimos para hipotecas
dispararam. A bolha cresceu. Krugman ignora esta bonança artificial, e não aceita
que ela tenha consequências ruins.

É verdade que a Espanha agora está encontrando


dificuldades para conseguir empréstimos para
financiar seus déficits. Mas isso está acontecendo
principalmente em função dos receios provocados
pelas outras grandes dificuldades do país — entre
eles, o medo de uma inquietação política em função
do desemprego muito alto. E eliminar alguns
percentuais do déficit orçamentário não vai resolver
esses receios. Na realidade, pesquisas do FMI
sugerem que a redução dos gastos públicos em
economias profundamente deprimidas pode fazer
diminuir a confiança dos investidores, porque isso
acelera o ritmo de declínio econômico.

Então a redução dos gastos do governo acelera o declínio econômico? Por


quê? E se a redução for acompanhada de cortes de impostos (o que exigiria uma
redução de gastos ainda mais intensa)? Isso também seria ruim? Por que seria
improdutivo deixar o setor privado ficar com mais dinheiro em suas mãos? Este é
o cerne do erro keynesiano desde o seu início.
Em outras palavras, a simples realidade econômica da
situação indica que a Espanha não precisa de mais
austeridade. Ela não deveria dar uma festa, e, na
realidade, provavelmente não tem alternativa
(excetuando a saída da zona do euro) a um período
prolongado de tempos difíceis. Mas cortes selvagens
nos serviços públicos essenciais, na ajuda aos
necessitados e afins na realidade prejudicam as
perspectivas de um ajuste bem-sucedido para o país.

Pense no que ele está dizendo. Cortes são “selvagens”. Qual é a evidência? O
que constitui ‘cortes selvagens’? Para um keynesiano, quaisquer cortes são
selvagens.

Ele disse que haverá “um período prolongado de tempos difíceis”. Concordo. Os
tempos atuais já são muito difíceis. O desemprego é de 50% entre pessoas na
casa dos vinte anos de idade. Mas por que a Espanha “não tem alternativa
(excetuando a saída da zona do euro)”?

Saindo da zona do euro

Neste ponto, tenho de fazer algumas perguntas resolutamente não-


keynesianas. Primeiro, por que uma eventual saída da Espanha da zona do euro
evitaria tempos difíceis? É exatamente isso o que Krugman diz que aconteceria,
mas não é nada óbvio para mim por que seria esse o caso. Qual a lógica de
Krugman?

Em primeiro lugar, é necessário fazer a seguinte pergunta: qual é a característica


do euro — mais especificamente, o uso do euro dentro de uma zona de livre
comércio — que criou estes tempos tão difíceis para a Espanha?

Um euro forte está criando dificuldades para a Espanha porque não há quase nada
que a Espanha possa exportar que alguém no resto da Europa queira
comprar. Sendo assim, por não terem muito o que exportar, os espanhóis não
conseguem “importar” novos euros que poderiam ser coletados pelo governo via
impostos para pagar os juros de sua dívida.

Em outras palavras, durante a fase do crescimento econômico artificial, governo


espanhol conseguiu vender tranquilamente os títulos de sua dívida. Da mesma
forma, as empresas espanholas conseguiram empréstimos fáceis dos bancos de
toda a zona do euro. Naquela época, era fácil conseguir financiamento farto. Mas
a economia entrou em colapso. E ela continua em colapso porque as ineficiências
da produção espanhola não permitem que o país possa competir eficazmente com
as outras economias da zona do euro.

Tendo em mente este cenário, por que sair da zona do euro ajudaria a
Espanha? Sim, poderia haver algum aumento das exportações, mas somente se a
nova moeda, provavelmente a peseta, fosse acentuadamente desvalorizada em
reação ao euro. Por que isso poderia ocorrer? Porque o Banco Central espanhol
agora teria legalmente o poder de imprimir pesetas em grandes quantidades. Ele
estaria livre para inflacionar a moeda. Isto reduziria o valor da peseta em relação
ao euro. Assim, a Espanha conseguiria exportar mais. Porém, em contraste, os
cidadãos da Espanha não conseguiriam importar muita coisa de fora da
Espanha. Com as importações dramaticamente reduzidas, os preços domésticos
estariam livres para subir, pois não haveria a concorrência dos importados. O
público não mais conseguiria comprar tantos bens e serviços como faz atualmente,
exatamente porque a oferta vinda da Alemanha e dos outros países seria
financeiramente inviável.

A redução da oferta de bens oriundos do resto da Europa significaria uma forte


austeridade para o público. Significaria que as pessoas teriam de cortar
fortemente seus gastos. Haveria uma real privação para aquelas pessoas que
ainda tivessem empregos.

Aqueles espanhóis que pudessem mudar de país se dariam bem. Os outros — a


maioria — perderiam com esse novo arranjo. Caso saia do euro, a única coisa
que o governo espanhol conseguirá fazer é redistribuir o sofrimento; e ele o
redistribuiria na direção daqueles cidadãos que gostam de comprar bens de alta
qualidade dos outros países da zona do euro. Isso iria beneficiar enormemente
aqueles produtores ineficientes que são membros dos sindicatos espanhóis, mas
certamente não ajudaria em nada os consumidores espanhóis.

Krugman quer saber por que alguém recomendaria austeridade. Para ele, todo
mundo parece estar recomendando austeridade.

Parte da explicação é que na Europa, assim como na


América, uma quantidade excessiva de Pessoas Muito
Sérias se deixou convencer pelo culto à austeridade,
pela crença de que os déficits orçamentários, e não o
desemprego em massa, constituem o perigo real e
imediato e que reduzir o déficit vai de alguma maneira
solucionar um problema suscitado por excessos do
setor privado.

Ele ironicamente escreve “pessoas muito sérias” em maiúsculas porque julga que
elas não são pessoas economicamente inteligentes. Elas apenas são sérias. Mas
elas não são keynesianas. Elas não entendem que déficits orçamentários são
excelentes para as economias.

Donde surge minha segunda pergunta. O que os déficits orçamentários têm a ver
com uma retirada da zona do euro? Como é que uma saída da zona do euro irá
permitir ao governo central restaurar a economia ao meramente incorrer em
déficits orçamentários? Qual é a mágica das pesetas que fará com que o governo
espanhol supere as atuais agruras econômicas por meio de déficits orçamentários,
sendo que ele não consegue superar estas mesmas agruras ao incorrer em
déficits denominados em euros? Em outras palavras, o que faz do keynesianismo
uma ideologia tão eficaz em reduzir o desemprego? A resposta é clara, de acordo
com os keynesianos: a capacidade do banco central de criar quantias maciças de
dinheiro e emprestá-las para o governo. O governo, sabendo que será livremente
financiado pelo seu próprio banco central (o que não ocorre na zona do euro), irá
incorrer sem temores em déficits substanciais. E isso irá recuperar toda a
economia.

Próxima pergunta. De onde virá esta recém-descoberta produtividade? Por que


incorrer em enormes déficits em moeda fiduciária é a maneira de escapar dos
efeitos de uma bolha estourada no setor imobiliário? Krugman em momento algum
discute isso. Em nenhum artigo seu. Mas esta relação é a essência do sistema
keynesiano. Déficits maciços financiados por moeda fiduciária são a cura
advogada pelos keynesianos para toda e qualquer recessão econômica.

A resistência alemã

Mas essa não é uma explicação boa o bastante para Krugman. Ele quer outra
explicação — neste caso, uma explicação política. Parece que uma ideia ousada
está se espalhando incontrolavelmente pela Alemanha: não é sensato que os
banqueiros alemães concedam novos empréstimos aos espanhóis a juros
baixos. Foi isso que eles fizeram no passado, e foi isso que criou a bolha
imobiliária. Os eleitores alemães creem que seu governo emprestar mais dinheiro
para a Espanha — mais especificamente para o governo espanhol — é o
equivalente a jogar dinheiro de impostos no esgoto.

Os bancos alemães compraram dívidas emitidas por tomadores de empréstimos


espanhóis, e agora estes não conseguem pagar suas dívidas. É claro que não
conseguem. Era simplesmente impossível que eles conseguissem a quantia de
euros necessária para pagar a dívida. Os euros que eles tomaram emprestado
foram exportados em troca da importação de bens e serviços; e eles não têm o
que exportar em troca de euros que os permitiria pagar suas dívidas.

Agora os juros espanhóis estão subindo. Consequentemente, o valor de mercado


dos títulos espanhóis em posse dos bancos alemães está caindo, e a ameaça de
um calote só aumenta. (Sair da zona do euro seria um calote parcial). Grande
surpresa. Banqueiros tolos fazem coisas tolas, e os alemães estão cansados de
socorrer banqueiros tolos. Mas isso ainda não satisfaz Krugman.

Além disso, uma parte importante da opinião pública


no núcleo da Europa — sobretudo na Alemanha —
está profundamente engajada em uma visão
equivocada da situação. Quando se fala com
autoridades alemãs, elas retratam a crise do euro
como um drama de moralidade, uma história sobre
países que gastaram mais do que tinham e que agora
enfrentam as consequências inevitáveis. Não importa
que não tenha sido isso o que aconteceu na realidade,
nem o fato igualmente inconveniente de que bancos
alemães exerceram um papel importante na inflação
da bolha imobiliária espanhola. Para essas pessoas,
é tudo uma questão de ‘pecado e suas
consequências’, e elas não abrem mão deste
raciocínio.

Não, Dr. Krugman, o pecado e suas consequências não são o problema. Mais
especificamente, foram os parvos banqueiros alemães que não perceberam que
os juros baixos que estavam recebendo quando compraram dívidas espanholas
envolviam um enorme risco de calote. Os tolos banqueiros alemães não se
entregaram ao pecado, mas sim à estupidez econômica. Eles acreditaram que os
PIIGS seriam capazes de quitar suas dívidas, o que significa dizer que eles
imaginaram que os PIIGS tinham algo de valioso para exportar, sendo que eles
não tinham. Agora estes bancos estão à deriva.

Pior ainda, é também nisso que acreditam muitos


eleitores alemães, em grande medida porque é o que
os políticos lhes disseram. E o medo de uma reação
negativa de eleitores que pensam, equivocadamente,
que estarão pagando pelas consequências de
irresponsabilidade na Europa meridional faz com que
os políticos alemães não queiram aprovar
empréstimos emergenciais essenciais para a Espanha
e outros países com problemas, a não ser que os
devedores sejam castigados primeiro.

Os eleitores de fato estão na cabeceira da mesa, só esperando a conta


chegar. Não há dúvidas de que uma ocorrerá maciça redistribuição de renda, de
um jeito ou de outro. O governo irá fornecer um socorro para os bancos alemães,
à custa dos pagadores de impostos. A única questão é como isso ocorrerá: ou o
dinheiro será dado diretamente aos bancos ou será emprestado ao governo
espanhol, o qual irá pagar juros com estes euros que lhe foram emprestados.

Isso vai durar para sempre. Ninguém confiará novamente nos espanhóis que
tomarem empréstimos, a menos que os pagadores de impostos alemães estejam
na cabeceira da mesa garantindo a conta destas dívidas da Espanha.

É claro que não é assim que essas exigências são


descritas. Mas é a isso que a coisa se resume, na
realidade. E já passou há muito tempo da hora de pôr
fim a essa insensatez cruel.

Não se trata de insensatez e tampouco de crueldade. Trata-se simplesmente de


uma inevitável consequência de empréstimos irresponsáveis feitos por banqueiros
alemães a empresas e governos caloteiros na zona do Mediterrâneo. Os
banqueiros sabem que já perderam centenas de bilhões de euro porque as dívidas
não podem ser quitadas, e eles querem que alguém os socorra. Afinal, é isso que
banqueiros sempre querem.

Os pagadores de impostos alemães sabem que eles são as ovelhas que serão
sacrificadas para salvar o couro dos banqueiros alemães. E eles
compreensivelmente não gostam desta ideia. Eles preferiam que as dívidas
fossem pagas pelos espanhóis que pegaram o dinheiro emprestado. Eles creem
que, já que foram os espanhóis que pegaram o dinheiro emprestado, então eles é
que deveriam quitar a dívida. Essa perspectiva, é claro, é radicalmente anti-
keynesiana. No sistema keynesiano, dívidas supostamente nunca devem ser
quitadas. Eles apenas devem crescer continuamente.

Até a bolha estourar. Quando a bolha estoura, alguém inevitavelmente fica em


posse de uma montanha de dívida sem valor. Esse alguém sempre são os
banqueiros — neste caso, os banqueiros alemães.

Se a Alemanha quer realmente salvar o euro, deve


deixar o Banco Central Europeu fazer o que é preciso
para resgatar os países devedores — e deve fazê-lo
sem exigir mais sofrimento inútil.

Esse é o discurso infatigável de todo economista keynesiano. Ninguém jamais


deve sofrer em decorrência de suas decisões ruins tomadas anteriormente. Estas
decisões ruins acabaram se revelando desastrosas. Os parvos banqueiros
alemães já entenderam isso. Consequentemente, eles se ofendem a qualquer
menção de que não deve haver mais empréstimos governamentais, nem mais
empréstimos do FMI, nem mais inflação do Banco Central Europeu que
possibilitem aos devedores espanhóis pagarem os juros de empréstimos que eles
jamais conseguirão quitar. Isso irá apenas aumentar o total que eles devem aos
tolos banqueiros alemães.

É por isso que os eleitores alemães querem interromper este processo. Não é
porque eles são sádicos que querem infligir dor e sofrimento aos espanhóis.

Tudo se resume a isso. No final, todo mundo quer ser socorrido. Todos aqueles
que ganham muito dinheiro na época da bonança artificial querem ser protegidos
por uma rede de segurança, financiada por terceiros, quando a bonança acaba e
se transforma em depressão.

No universo keynesiano, nunca deve haver consequências para as ações das


pessoas. Nunca deve haver sanções negativas que imponham perdas a
banqueiros que fizeram empréstimos idiotas. Nunca deve haver uma reação
negativa que relembre aos banqueiros que eles cometeram erros e que os
acionistas de seus bancos devem sofrer prejuízos. Os banqueiros americanos não
quiseram isso nos EUA em 2008 e os banqueiros alemães não querem isso em
2012.
Conclusão

Paul Krugman, na condição de dignitário eclesiástico dos economistas


keynesianos da atualidade, preconiza as mesmas e velhas soluções: maciços
déficits orçamentários e uma maciça inflação monetária. O show deve
continuar. Aqueles que cometeram erros não devem sofrer por ter cometido esses
erros.

Foi uma parvoíce ter emprestado euros para empresas espanholas a juros
baixos. A solução keynesiana para essa parvoíce é fazer uma série infindável de
empréstimos a juros baixos para as mesmas empresas espanholas e para os
mesmos bancos espanhóis, os quais devem emprestar para as empresas
espnholas. Em outras palavras, os erros, uma vez cometidos, devem ser
socorridos com novos e piores erros. A ideia é seguir gastando dinheiro, não
importa em quê. Esta é a essência do keynesianismo.

É por isso que os banqueiros adoram o keynesianismo.

Paul Krugman ataca a Escola Austríaca – e, como de


praxe, deturpa suas ideias

Paul Krugman está nitidamente


desesperado. Um claro sintoma de desespero intelectual ocorre quando um
indivíduo, ao ver toda a sua ideologia sendo implacavelmente refutada tanto pela
teoria quanto pela prática, sai estabanadamente atacando os responsáveis pela
munição teórica ao mesmo tempo em que adultera os fatos da realidade prática.

Recentemente, Krugman publicou uma coluna no The New York Times atacando
Ron Paul e sua crença na Escola Austríaca de pensamento econômico (um ótimo
sinal). Krugman alega que Ron Paul só conseguiu sua fama de consistente
porque ele ignora a realidade. O problema é que, se há uma coisa que a
“realidade” demonstrou, foi justamente o quão corretas eram as ideias propagadas
por Ron Paul e pela Escola Austríaca.
A seguir, o trecho relevante da coluna de Krugman (a mídia brasileira, com sua
tradicional competência em assuntos externos, inexplicavelmente creditou
a coluna a Thomas Friedman):

[Ron] Paul tem se mostrado altamente consistente. Eu


aposto que ninguém encontrará vídeos de alguns anos
atrás nos quais ele tenha dito o oposto do que está
dizendo no momento.

Infelizmente, a forma que ele escolheu para manter a


sua consistência foi ignorar a realidade, agarrando-se
à sua ideologia, ainda que os fatos demonstrem que
tal ideologia é equivocada. E, ainda mais infeliz é o
fato de a ideologia de Paul atualmente dominar um
Partido Republicano que costumava ser mais sábio.

[…]

Ron Paul se apresenta como um adepto da economia


“austríaca” — uma doutrina que rejeita John Maynard
Keynes mas que repele com veemência quase igual
as ideias de Milton Friedman. Isso porque os
seguidores da escola austríaca acreditam que o
“papel-moeda fiduciário de curso forçado”, o dinheiro
que é simplesmente impresso sem ser lastreado por
ouro, é a raiz de todos os males. Isso significa que
eles se opõem veementemente àquele tipo de
expansão monetária que Friedman afirmou que
poderia ter prevenido a “Grande Depressão” — e que
foi na verdade implementada desta vez por Ben
Bernanke.

Bem, uma breve digressão: na verdade o Federal


Reserve não imprime dinheiro (quem faz isso é o
Tesouro). Mas o Fed controla a “base monetária”, a
soma das reservas bancárias e da moeda em
circulação. Assim, quando as pessoas falam que
Bernanke está imprimindo dinheiro, o que elas querem
dizer de fato é que o Fed expandiu a base monetária.

E houve, realmente, uma enorme expansão da base


monetária. Após a queda do Lehman Brothers, o Fed
passou a emprestar somas enormes aos bancos e
também a adquirir uma ampla gama de outros ativos,
em uma tentativa (bem sucedida) de estabilizar os
mercados financeiros. E, durante o processo, ele
acrescentou vastas quantias às reservas
bancárias. No outono norte-americano de 2010, o Fed
deu início a uma nova série de aquisições, em uma
tentativa menos exitosa de estimular o crescimento
econômico. O efeito combinado dessas ações foi que
a base monetária mais do que triplicou de volume.

Os “austríacos”, e na verdade muitos economistas de


direita, tinham certeza do que aconteceria como
resultado dessas medidas: haveria uma inflação
devastadora. Peter Schiff, um analista famoso, que
pertence à escola austríaca e que já foi assessor da
campanha de Ron Paul em 2008, chegou a advertir
(no programa de televisão de Glenn Beck) para a
possibilidade de uma hiperinflação de estilo
zimbabuano no futuro próximo.

Assim, aqui estamos nós, três anos depois. E como


andam as coisas? A inflação flutuou mas, no fim das
contas, os preços para o consumidor subiram apenas
4,5%, o que significa uma taxa de inflação média
anual de apenas 1,5%. Quem poderia ter previsto que
a emissão de tanto dinheiro provocaria tão pouca
inflação? Bem, eu poderia. E de fato previ. E
também outros economistas que entendem os ataques
de Paul à economia keynesiana. Mas os apoiadores
de Paul continuam a alegar que, de alguma forma, ele
ainda tem razão quanto a tudo.

Mesmo assim, embora os proponentes originais da


doutrina sequer admitam que estavam errados —
segundo a minha experiência, nenhum integrante do
mundo político jamais admite ter cometido um erro em
relação a algo —, você poderia achar que o fato de
eles terem errado tanto em relação a algo tão
fundamental para o seu sistema de crenças teria feito
com que os “austríacos” perdessem popularidade,
mesmo dentro do Partido Republicano. Afinal, ainda
nos anos Bush, muitos republicanos defendiam
ferrenhamente a impressão de dinheiro quando a
economia sofresse desaquecimento. “Uma política
monetária agressiva pode reduzir a gravidade de uma
recessão”, declarou o Relatório Econômico do
Presidente de 2004.
Vamos então por partes.

O primeiro ataque de Krugman é direcionado à ideia austríaca de que o papel-


moeda é a raiz de todas as políticas econômicas perversas. Para Krugman, como
todos sabem, um dinheiro de papel manipulado pelo governo é simplesmente o
sistema monetário ideal, e apenas pessoas descoladas da realidade podem ser
contra ele. No entanto, é justamente a realidade histórica o que derruba essa
crença krugmaniana. Basta perguntar aos romanos, aos franceses, aos britânicos,
aos alemães, aos zimbabuanos, aos húngaros e aos sul-americanos quais foram
as experiências maravilhosas que eles já vivenciaram sob um sistema de papel-
moeda controlado pelos seus respectivos governos. O grande economista Joseph
Schumpeter certa feita escreveu que, mesmo que uma pessoa não acreditasse
nos méritos do padrão-ouro e fosse um defensor de um estado inchado, ela ainda
assim iria querer viver sob um padrão-ouro, pois só assim poderia se proteger
contra exatamente o tipo de bagunça econômica em que o mundo se encontra
atualmente.

Em seguida, Krugman parte para uma nova linha de ataque, supostamente sua
evidência contra um dos pilares da Escola Austríaca: a base monetária americana
aumentou substancialmente, mas o Índice de Preços ao Consumidor aumentou
muito pouco. Esse é realmente aquele tipo de “evidência” que poderíamos esperar
apenas do nosso barbeiro e de um economista ganhador do Prêmio Nobel de
economista.

Em primeiro lugar, vale ressaltar que Krugman deturpa por completo a posição
austríaca a respeito do dinheiro, escrevendo que todos os austríacos acreditam
que a base monetária é exatamente a mesma coisa que dinheiro circulando na
economia. Não é, e isso sempre foi explicitado pelos austríacos.

Segundo, o Índice de Preços ao Consumidor representa uma mensuração


bastante inexata do impacto de uma inflação monetária sobre o poder de compra
dos consumidores. A maioria dos economistas questiona a validade e a precisão
do IPC. O IPC nunca teve a intenção de mensurar todo o impacto de uma inflação
monetária sobre a economia, exceto para os “ingênuos” economistas seguidores
da teoria quantitativa.

Terceiro, como mostra o gráfico abaixo, embora a base monetária tenha explodido
desde setembro de 2008 — indo de pouco mais de $800 bilhões para US$2,7
trilhões —, o M1 teve crescimento bem mais discreto. Isso ocorreu porque a
quase totalidade do aumento da base monetária transformou-se em “reservas em
excesso”. “Reservas em excesso” são as reservas que os bancos mantêm
voluntariamente depositadas junto ao Fed (o Banco Central americano), além do
volume determinado pelo compulsório. Como a base monetária é igual ao papel-
moeda criado pelo Fed mais as reservas bancárias depositadas junto ao Fed (o
compulsório), conclui-se que uma substancial fatia do aumento da base monetária
foi convertida em reservas em excesso. Os bancos optaram por manter a quase
totalidade de suas reservas (as quais eles podiam utilizar para fazer empréstimos
e, com isso, aumentar o M1) voluntariamente depositadas junto ao Fed, que está
pagando juros sobre elas. Ao fazer isso, o Fed impediu que as reservas bancárias
se transformassem em depósitos em conta-corrente, o que elevaria o M1 — esse é
um dos motivos de a inflação de preços ainda estar contida nos EUA.
O gráfico acima mostra três variáveis: a base monetária (azul), o M1 (verde) e as
“reservas em excesso” (vermelho).

Quarto, alguns austríacos disseram que, cedo ou tarde, quando esse dinheiro que
está represado no sistema bancário “vazar” para a economia — isto é, se esse
aumento na base monetária se transformar em empréstimos em larga escala —,
haverá inflação de preços. Isso é algo óbvio. No entanto, como alguns austríacos
disseram que tal inflação de preços pode vir a ocorrer mais cedo do que mais
tarde, então, de acordo com Krugman, isso significa que toda a teoria monetária
austríaca está errada. (Tal raciocínio representa aquilo que gregos e romanos
chamaram de non sequitur; porém, sem o apelo ao non sequitur, Krugman
simplesmente não teria como escrever colunas).

Quinto, a inflação monetária pode impactar vários setores da economia, e o faz


com intensidades totalmente distintas. Basta nos lembrarmos de que, no caso
americano, durante a bolha imobiliária, os preços dos imóveis dispararam para
níveis recordes e insustentáveis, ao mesmo tempo em que os níveis do IPC
permaneceram “sob controle”. Há vários tipos de bens cujos preços são
impactados pela inflação e que não estão incluídos no IPC, desde obras de arte
até bens comercializados no mercado negro, passando por salários de atletas
profissionais e terrenos agrícolas.
Sexto, o impacto da inflação monetária sobre a economia como um todo é algo
que leva tempo. O dinheiro que entra na economia vai se movendo de um setor
para o outro aos poucos, até finalmente perpassar quase toda a economia. E é
durante esse processo que os preços vão aumentando, sempre de maneira
desigual. Qualquer pessoa minimamente familiarizada com noções básicas de
teoria monetária e sistema bancário sabe disso. Adicionalmente, seria de se
esperar que um economista como Krugman estivesse informado do fato de que, do
aumento de quase US$2 trilhões ocorrido na base monetária americana, os
bancos estão atualmente “sentados” sobre quase US$1,6 trilhão (valor das
reservas em excesso), o que significa que esse foi o total de dinheiro criado
que ainda não entrou na economia.

A “evidência” de Krugman nada mais é do que a evidência de sua própria


ignorância sobre questões básicas de economia. Ainda assim, vale ressaltar um
importante ponto adicional: a ideia de que aumentos na oferta de dinheiro (isto é,
inflação monetária) levam a aumentos nos preços (isto é, inflação de preços) é
uma afirmação teórica, e economistas de todas as estirpes expressam tal
declaração em termos de ceteris paribus, ou, tudo o mais constante. Bem, as
coisas não têm estado exatamente muito constantes ultimamente, certo, Paul?

Mas o fato é que os austríacos não estão nem um pouco surpresos com o que
vem acontecendo com a economia americana. Graças aos pacotes de socorro e
aos pacotes de estímulo, à explosão no número de regulamentações e à retórica
incendiária que emana da Casa Branca, a economia americana está atolada em
uma depressão — exatamente como os austríacos previram que estaria caso as
políticas dos últimos quatros anos continuassem sendo seguidas. Enquanto a
base monetária continuar sendo apenas isso — uma base — e o dinheiro não
circular, a taxa oficial de inflação de preços continuará baixa.

Por outro lado, se os austríacos estiverem errados em sua crença de que uma
expansão na quantidade de dinheiro em circulação irá estimular um aumento de
preços (e é isso que Krugman está insinuando), então toda a teoria monetária está
de cabeça para baixo. A insistência krugmaniana de que os austríacos são
ignorantes em termos monetários é em si um exemplo de ignorância. Os
austríacos enfatizam que o dinheiro é um bem secundário cuja principal utilidade é
facilitar as trocas; e sua produtividade jaz no fato de que ele permite que ocorram
trocas que não ocorreriam em uma economia de escambo. Adicionalmente, os
austríacos afirmam que o dinheiro, assim como quaisquer outros bens, também
está sujeito a todas as leis da ciência econômica, inclusive a Lei da Utilidade
Marginal (não, nós não cremos que ele seja apenas uma quantia variável).

No entanto, um dos mais importantes aspectos do pensamento austríaco a


respeito da moeda é a ênfase dada a como se dá o mecanismo de transmissão do
dinheiro recém-criado que adentra a economia. Essa transmissãonão é neutra, de
modo que aqueles que recebem esse dinheiro antes do restante da população são
beneficiados por um repentino aumento em seu poder de compra, tornando-se
capazes de adquirir bens a preços ainda inalterados — os preços ainda estão
inalterados, só que a renda desse grupo agora aumentou. Essa visão é
diametralmente oposta ao ponto de vista keynesiano, que afirma que a
transmissão monetária é neutra, e que a única coisa que importa é que o dinheiro
seja injetado na economia de modo que alguém possa gastá-lo.
Ademais, os austríacos também afirmam
que a injeção de dinheiro recém-criado na
economia irá alterar os preços relativosdos
bens da economia, e que essas relações
continuarão sendo alteradas à medida que o
dinheiro continue sendo injetado. Isso
também contrasta com a visão krugmaniana
de que o dinheiro recém-criado não gera tal
efeito, e que todas as pessoas se
beneficiam igualmente de qualquer injeção
monetária. (No mundo de Krugman, embora
a inflação beneficie os devedores à custa
dos credores, isso é ótimo, pois ele
falsamente pressupõe que todos os
credores pertencem ao “um por cento” da
população mais rica, ao passo que todos os
devedores estão na categoria oposta.)

Portanto, dado que a hiperinflação ainda


não apareceu, os austríacos são totalmente
ignorantes sobre teoria monetária, e isso
inclui Ron Paul. O problema é que estamos lidando aqui com cronometragem, e
não com teoria monetária; e Krugman, ao confundir uma com a outra, apenas
demonstra sua falta de conhecimento em questões monetárias.

Tivessem os EUA não seguido os conselhos de Krugman, Bernanke, Geithner,


Summers, Paulson, Goldman Sachs etc., mas sim os conselhos de Ron Paul, essa
crise já teria acabado há muito tempo. Em vez disso, todos os americanos estão
sendo forçados a lidar com as insanidades defendidas por Paul Krugman e Ben
Bernanke.

___________________________________________

P.S.: Peter Schiff jamais afirmou que haveria inflação ao estilo Zimbábue nos EUA
e desafiou Krugman para um debatea qualquer momento, em qualquer local, sob
quaisquer termos.

P.S.2: A prova mais cabal da ignorância da teoria econômica de Krugman pode ser
vista nesta compilação de artigos seus, nos quais ele diz que a cura sustentável
para a recessão de 2001 era, adivinhe só!, a criação de uma bolha imobiliária.

P.S.3: Tenham a bondade de ler nossos artigos sobre Krugman:

Krugman concorda com os austríacos – mas por motivos completamente opostos

Minha resposta a Paul Krugman sobre a teoria austríaca dos ciclos econômicos

Paul Krugman e a terceira depressão – uma mente confusa

Paul Krugman, como sempre, não entendeu nada


Paul Krugman, a atual crise, sushis e a importância da teoria do capital

Imprimir

Por Mark Thornton e William Anderson| 18

Vous aimerez peut-être aussi