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significa passagem.
Muitas pessoas mesmo que ainda estejam vivas, enquanto não vivem no amor, na paz, na
justiça e na alegria que Deus nos oferece, mas que preferem viver dominadas pelo ódio, pela
mentira, pela vingança, pela injustiça e pelo desamor, estão mortas para Vida. E quando uma
dessas pessoas percebe que Jesus lhes oferece uma nova vida de amor e a Ele aderem, e
mudam totalmente de vida, fazem assim digamos uma ressurreição, como em Lc15,32.
Um estudo sobre a origem da Páscoa
Estudo produzido pelo prof. Tércio Machado Siqueira, professor de Antigo Testamento da
FaTeo.
O nome e o significado da palavra "páscoa"
O nome que a Bíblia Hebraica usa para denominar "páscoa" é pesah. Com a palavra pesah o
texto bíblico quer significar duas coisas:
O substantivo pesah/páscoa vem da raiz verbal psh que aparece três vezes nos relatos pascais
(Ex 12.13,23,27; ler também Is 31.5; 1 Rs 18.21,26). Assim, o verbo pasah passar por cima,
saltar por cima é o significado que prevalece nos usos deste termo pelos escritores e escritoras
da Bíblia. O Prof. Luiz Roberto Alves assim definiu o termo pesah/ páscoa:
"O verbo que dá base ao substantivo pesah tem o sentido de salto, movimento,
caminhada, travessia. Todas as palavras têm história e essa história corresponde às
ações dos homens e mulheres. Os hebreus juntaram à idéia do pesah vários
acontecimentos ligados à idéia de travessia" (Expositor Cristão, 2a. Quinzena, 1984,p. 12).
A origem da Páscoa
Falar de origem da Páscoa é entrar no campo das suposições, pois não há dados suficientes
que ajudam a esclarecer sobre essa celebração no período pré-mosaico. Todavia, os textos do
Antigo Testamento fornecem indicações que a Páscoa, em suas origens, foi um ritual ou
cerimônia que incluía as seguintes características:
a) O ritual era realizado no seio da família ou clã; não tinha altares, santuários e sacerdotes ou
qualquer influência do culto oficial;
d) A cerimônia ocorria no fim da primavera e início do verão (mês de abril), numa noite de
lua cheia;
f) Parece que o objetivo dessa cerimônia era pedir proteção divina, para a família e o seu
rebanho de animais menores contra o exterminador (no hebraico, maxehit - Ex 12.13, 23) ou
saqueador, bando de destruição (1 Sm 13.17; 14.15; Pr 18.9). O exterminador maxehit pode
ser qualquer tipo de agressor, desgraça, enfermidade, peste ou acidente que poderia ocorrer
com qualquer membro da família ou os seus animais.
g) Provavelmente, esse ritual foi celebrado por Abraão, Isaac e Jacó, pois eles eram pastores.
A cada ano, na primavera, quando o vento quente do deserto, anunciando o verão, atingia e
queimava as parcas pastagens das ovelhas, os pastores, suas famílias, bem como os seus
rebanhos eram obrigados a buscar outros lugares para dar de comer as suas ovelhas.
A Páscoa celebrada pelos israelitas: da sedentarização até o início da Monarquia (1200 - 1040
a.C.).
Evidentemente que o sistema de vida dos israelitas mudou substancialmente após a chegada a
Canaã.
a) O povo israelita deixou de ser semi-nômade e deu início ao processo de sedentarização.
Paulatinamente, o povo foi se tornando agricultor, embora parte dele continuou na vida
pastoril, especialmente, as clãs que permaneceram vivendo nas localidades periféricas do
território da terra de Israel.
b) Ao se fixar nas terras agrícolas, os israelitas aproximaram-se dos cananeus. Foi aí que o
povo do êxodo conheceu algumas festas relacionadas ao mundo agrícola. Entre essas
instituições estão as festas agrícolas, como Ázimos, Semanas e Colheitas.
c)Foi nesse período de difícil adaptação que se dá a integração da Festa dos Pães Ázimos e a
Páscoa. As duas celebrações ocorriam no mesmo período.
Tirai,
Tomai um animal do rebanho segundo as vossas famílias e
Imolai a Páscoa.
Tomai alguns ramos de hissopo,
Molhai-o no sangue que estiver na bacia, e
Marcai a travessa da porta e
os seus marcos com o sangue que estiver na bacia;
Nenhum de vós saia da porta de casa até pela manhã
Comentando:
Primeiro, o texto mostra Moisés convocando os anciãos do povo, a mando de Javé (conforme
Ex 12.1), para preparar a festa da Páscoa (v. 21b-22).
Segundo, Moisés instrui, com detalhes, os anciãos para preparar os elementos que comporiam
o ritual (v.21b-22).
Terceiro, Moisés fornece as razões para aquele ritual, bem como o uso do sangue de uma
ovelha e o hissopo (planta aromática - Nm 19.6; Sl 51.9): o motivo da festa é afugentar o
medo do vento exterminador que ameaça as casas do povo hebreu (v. 23).
Quarto, a ordem para celebrar a Páscoa tem uma dimensão profética. A Páscoa vai além da
contagem do tempo humano, cronológico. A celebração não encerra um simples
agradecimento, pela libertação da escravidão e a concessão da terra para morar, criar a família
e plantar para obter o alimento. A celebração possui a dimensão profética da contínua
presença salvadora de Deus junto ao seu povo. Jesus captou essa amplitude da celebração
quando disse: "Fazei isso em memória de mim... até que Ele venha" (1 Co 11.24b e 26b).
Sexto: os versos 27b-28 assinalam o cumprimento da ordem divina para celebrar a Páscoa.
Observações
(1) A prescrição sobre a celebração da Páscoa (Ex 12.21-28) é legitimada pelo editor do livro
de Êxodo. Assim, o cabeçalho deste capítulo (Ex 12.1) afirma que a prescrição da Páscoa
(12.21-28) é autorizada por Javé. Eis a sua lógica:
(2) A celebração continuava a ser celebrada em família. A Bíblia ensina que a família
constitui o fundamento para o projeto de sociedade que Deus propõe para a humanidade.
(3) Foram mantidos vários elementos na celebração: ovelhas e ramos de hissopo (erva
aromática). Evidentemente que houve algumas modificações, em razão da nova situação de
vida do povo, agora, vivendo em Canaã.
(4) Todavia, a antiga Páscoa foi "relida" e "re-significada". O antigo culto dos pastores semi-
nômades possuía a função de controlar as forças da natureza. Por exemplo, os povos
anteriores aos hebreus acreditavam que oferecendo em sacrifício o filho primogênito, poderia
controlar a bênção e a ira divina. Como na cerimônia da primitiva páscoa, os pastores
acreditavam que poderiam amenizar a ira divina do "vento destruidor".
(5) Na verdade, o povo bíblico tomou antigos costumes dos povos vizinhos e os converteu em
instrumentos de preservação e ensino da fé. No caso da Páscoa, o povo bíblico tomou uma
cerimônia pagã, que girava em torno de uma magia, e a transformou em um sinal da presença
salvadora de Javé. Em outras palavras, a nova celebração da Páscoa mostra que a fé não é um
dado doutrinário ou mágico, mas um gesto história de Javé.
Após os acontecimentos que envolveram a saída do Egito - a difícil caminhada pelos desertos,
os muitos "sinais e maravilhas" realizados por Javé e o cumprimento da promessa de "uma
terra que mana leite e mel" - o povo bíblico juntou à idéia da Páscoa aos acontecimentos
acima descritos. A Páscoa dos nômades deixou de ser uma cerimônia mágica que procurava
afugentar o medo do "exterminador", que se supunha estava próximo, para se tornar uma
afirmação concreta da plena liberdade que Javé dá.
Foi nesse momento que o povo bíblico tomou consciência que a sua fé em Javé não era
uma formalidade a mais entre os povos do Antigo Oriente. Javé não é definido pelo seu ser,
mas pela sua atuação na história: Ele ouviu o grito angustiado dos/as escravos/as do Egito e
providenciou os meios para a libertação deles (Ex 3-4);
A celebração da Páscoa, agora reformulada e "re-significada", passa afirmar que a fé
bíblica é histórica, e que tem seu fundamento nos acontecimentos salvíficos relatados nos
livros de Êxodo, Números e Deuteronômio, especialmente;
A história da salvação do Egito não é ensinada, nas casas e nos cultos, como uma doutrina,
mas como um fato histórico, isto é, um milagre de Deus ocorrido na história de seus pais;
A fé em Javé, através da celebração da Páscoa, tornou-se uma força transformadora;
do medo à coragem;
da magia a atos concretos da atuação de Javé;
da escravidão à liberdade.
O nome da festa, pesah saltar - o saltar do vento destruidor, demoníaco - passa significar,
em conexão com a história de libertação dos hebreus, passar por cima de, saltar para a
liberdade;
O sacrifício de um cordeiro deixa de ser um simples sacrifício de sangue para se tornar uma
memória dos atos salvíficos de Javé. Por isso, a celebração da Páscoa passa a ser prescrita
como "um Páscoa para Javé".
Há silêncio sobre a celebração da Páscoa, exceto o profeta do Reino do Norte Oséias que
critica o povo pela ausência da celebração Os 12 ).
O rei Josias (642-609 antes de Cristo) empreendeu uma ampla reforma no Reino de Judá (O
Reino de Israel já tinha sido destruído em 722 a.C.).
Por determinação do rei Josias, a Páscoa passou a ser celebrada, oficialmente, no Templo,
em Jerusalém (Dt 16.1-8);
A reforma equipara a Páscoa a uma festa de peregrinação (ver a coleção "Salmos das
Subidas" (Sl 120-134);
O gado maior (boi ) passa a ser admitido como vítima para o sacrifício;
Surgiu a permissão para cozer a vítima, em lugar de assá-la;
A memória do êxodo do Egito continuou sendo o motivo principal da celebração.
Durante o exílio na Babilônia, o povo exilado desenvolveu a esperança de que Javé poderia
libertar, de novo, Israel. Este tema é muito abordado pelo profeta anônimo do exílio, cujas
palavras foram editadas no livro de Isaías, capítulos 40 a 55.
Começou aparecer uma distinção entre Páscoa e Ázimos, como celebrações distintas:
Resumindo
A Páscoa pré-mosaica é marcada pelo medo do exterminador maxehit. O ritual tinha algo de
"magia" para afugentar os males. É bom lembrar que, nessa época, o povo sacrificava os
primogênitos recém-nascidos para ganhar favores divinos (conforme Gn 22);
O povo bíblico tomou todos os costumes e práticas pagãs e os passou pelo crivo da fé javista.
Tanto no sacrifício dos primogênitos (Gn 22), como no ritual da Páscoa, o povo bíblico
converteu tais cerimônias às práticas e confissões de fé javistas. Em ambas situações, o medo
prendia as pessoas e forçava-as a praticarem cerimônias inúteis e criminosas. Foi Javé quem
abriu os olhos do povo bíblico. Este se tornou um missionário entre as nações para anunciar
as boas novas: "Não temais! Eis que vos trago uma boa nova que será para todo o povo" (Lc
2.10). A Páscoa anuncia o fim do medo e, conseqüentemente, a confirmação da confiança em
Deus.
A celebração da Páscoa não é uma cerimônia de nostalgia do passado; não é uma festa da
saudade onde heróis e heroínas são lembrados/as por seus atos de valentia; também não é um
ritual que procura romantizar o passado, lembrando e homenageando certas figuras da
história.
Na Bíblia, dois verbos sobressaem-se: "lembrar" e "esquecer". Quando a Bíblia apela para que
o povo lembre dos grandes atos de Javé (conforme Ex 13.3), ela está procurando construir o
futuro da nação. A memória dos grandes atos salvíficos de Deus mobiliza a fé da sociedade e
fortalece o povo para esperar as boas novas do Reino de Deus. Esquecer o que Deus fez e faz
significa a tragédia da humanidade.
Celebrar a Páscoa é resgatar os atos salvíficos de Deus no passado, acreditando que Ele possa
fazer o mesmo, entre nós, no dia de hoje. A memória do passado salvífico - seja da libertação
no Egito, seja da vida e obra de Jesus Cristo - restaura as forças dos/as crentes celebrantes
para o testemunho.
Na verdade, a memória carrega o sentido de redenção, seja dos atos salvíficos de Deus,
através da história, bem como a redenção das causas justas do passado. Assim, a memória
resgata tanto a vida e obra de Jesus como a luta dos pobres pela dignidade de viver. Pela
memória, redimimos o desejo e a luta deles. Assim, se esquecermos os desafios do povo de
Deus no Antigo Testamento, os ensinos de Jesus Cristo ou os anseios justos do povo fiel,
pomos a perder o sentido desses projetos. A intenção da celebração da Páscoa afirmar que
cada geração de celebrante tem o dever de pôr em prática os verdadeiros e justos projetos das
gerações do passado.