Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
Metodologia e Prática
na Educação Infantil
Sumário
CAPÍTULO 4 – É possível aprender por meio da brincadeira?..............................................05
Introdução ....................................................................................................................05
Síntese...........................................................................................................................21
Referências Bibliográficas.................................................................................................22
03
Capítulo 4
É possível aprender por meio
da brincadeira?
Introdução
É possível ensinar as crianças por meio de brincadeiras? Qual seria a melhor forma de alfabe-
tizar e orientar o letramento na educação infantil? Quais são as metodologias mais comuns na
educação infantil? Como aprimorar a prática pedagógica de forma que nossas ações tornem-se
mais interessantes aos alunos?
Nesta unidade, responderemos tais questões e veremos qual é a importância do ato de brin-
car, isto é, da ludicidade para o desenvolvimento infantil. Partindo deste ponto, indicaremos as
potencialidades que podemos identificar em abordagens assentadas no caráter lúdico, visando
compreender como tais intervenções podem colaborar com o desenvolvimento da aprendizagem.
Destacaremos, ainda, exemplos de algumas atividades que podem ser desenvolvidas na educa-
ção infantil, a fim de ampliar as possibilidades metodológicas de ação.
Seguindo esta lógica, Wajskop (1995) nos diz que na Antiguidade toda a comunidade percebia
a criança como um adulto em miniatura. Assim, a criança não era percebida enquanto tal, mas
somente como um ser diferente dos demais, participando de todas as atividades dos adultos.
Assim, ela participava das festas, dos jogos e de tudo que era inerente aos adultos. Aliás, era
comum a noção de que a criança após os sete anos de idade já podia trabalhar.
Por isso, nesse período, de acordo com Cintra, Proença e Jesuino (2010), os jogos existentes, via
de regra, eram voltados à reprodução da vida do adulto, ou seja, da realidade vivida por ele.
Os jogos e brincadeiras, e até as danças, eram apenas uma forma de transmitir para a criança
a forma de comportamento dos adultos. A criança nada mais era do que um membro ativo da
comunidade em que nascia. Wajskop (1995) nos coloca ainda que toda a comunidade partici-
pava de jogos e demais atividades de diversão, ou seja, o brincar não era algo restrito à criança,
mas contemplava também o adulto.
05
Metodologia e Prática na Educação Infantil
Entenda de 3000 a.C. até por volta de 476 d.C., tivemos o predomínio da utilização do jogo
como uma forma da criança apreender os papéis sociais desempenhados pelos adultos. Nesse
período, começaram a surgir as primeiras cidades e, com elas, as primeiras escolas. Um dos filó-
sofos da época, Platão (427 a.C. a 347 a.C., aproximadamente), entendia que seria necessário
utilizar jogos educativos nas escolas, sobretudo nas que atendiam crianças mais jovens (CINTRA;
PROENÇA; JESUINO, 2010). Para o filósofo, esses jogos eram formas positivas de formar o
caráter das crianças. Podemos inferir que nesse momento, para Platão, o jogo deixa de ser uma
forma de imitação da vida adulta para tornar-se um meio de transmissão de valores (CINTRA;
PROENÇA; JESUINO, 2010).
VOCÊ O CONHECE?
Você certamente já ouviu falar de Platão. Platão foi um filósofo, matemático e escritor
grego. Dentre as várias obras que escreveu, destacam-se os diálogos filosóficos. Platão
também foi criador da primeira instituição de ensino superior grega, na qual atuou
como professor por vários anos. Platão era discípulo de Sócrates e com ele fundou
várias teorias que sustentaram a filosofia moderna.
Na Grécia antiga, entretanto, a perspectiva sobre os brinquedos era um pouco diferenciada das
que foram narradas acima. Os gregos compreendiam que os brinquedos deveriam ser usados como
meios para facilitar ou impulsionar os movimentos das crianças. Nesse sentido, conforme Cintra,
Proença e Jesuino (2010), era comum recorrer a jogos de ossinhos (hoje conhecido como “Cinco
Marias”), jogos de arcos, bonecas e cavalinhos. Obviamente que os brinquedos naquele período
eram construídos de forma bastante rudimentar e característicos da região onde eram produzidos.
VOCÊ SABIA?
Você sabe como jogamos “Cinco Marias”? O jogo atualmente é conhecido também
pelo termo “pipoquinha” e nele a criança brinca com sacos pequenos cheios de areia.
Os sacos são atirados ao chão e, depois, escolhe-se um deles para jogar para o alto e
tentar recuperá-lo. A criança que conseguir coletar mais sacos vence.
Quintiliano, filósofo e pedagogo que viveu em Roma, entre 35 e 95 d.C., entendia que o jogo
era fundamental para que as pessoas conseguissem aprender as letras. Ele também entendia que
o jogo e a brincadeira poderiam ser utilizados como um meio de a criança apreender as obriga-
ções sociais (CINTRA; PROENÇA; JESUINO, 2010).
VOCÊ O CONHECE?
Marco Fábio Quintiliano era filósofo, orador e professor de retórica. Quintiliano nas-
ceu e viveu em Roma e a sua principal obra foi o livro Institutos de Oratória, composto
por doze capítulos. Nele, o filósofo indica propostas para a educação romana, reco-
mendando, por exemplo, que fossem ensinadas as letras e suas formas de maneira
simultânea. Uma das grandes propostas de Quintiliano foi a inserção dos intervalos,
isto é, horários de descanso entre as aulas (Cintra; Proença; Jesuino, 2010).
O fato de a Igreja Católica gerenciar a vida da sociedade feudal trouxe muitas implicações para
a forma como o brincar e, consequentemente, o brinquedo eram compreendidos. Nesse sentido,
Cintra, Proença e Jesuino (2010) apontam que o ato de brincar foi sendo desencorajado. O
brinquedo passou a ser visto como um “luxo”, como algo que poderia até trazer prejuízos para
o desenvolvimento infantil, já que poderia estimular o ócio das pessoas, sobretudo das crianças.
Wajskop (1995) afirma também que os jogos eram associados aos prazeres carnais, ao vício e ao
azar. Assim, quem recorria a jogos estaria “pecando” contra os dogmas e também contra Deus.
Aliás, saiba que todo ser humano era considerado como grande pecador em potencial, incluindo as
crianças. Acreditava-se que a criança possuía uma espécie de predisposição que, não sendo bem-
-orientada, poderia torná-la no futuro um adulto pecador. De acordo com essa lógica, a educação
católica deveria ser o único meio capaz de evitar que a criança se transformasse eventualmente
no adulto pecador, sendo fundamental nesse processo a constituição de uma disciplina moralista.
Aqui, você deve notar que enquanto vemos o surgimento, no interior das escolas, dos jogos como
metodologias educativas, vemos também o entendimento de tais abordagens como meios para
preservar uma suposta moral socialmente esperada. Os jogos eram usados ainda como disposi-
tivos para abordar questões como a saúde e a higiene, bem como para indicar normas de como
alcançar o bem comum (WAJSKOP, 1995).
Em tese, isso representa o que Ariès (1978) descreveu como o surgimento da infância. Vimos
anteriormente que, na Antiguidade, a criança não era percebida como tal pelos adultos, e que
na Idade Média ela passou a ser considerada como um ser potencialmente pecador, porém, a
partir da Idade Moderna, vemos que a infância em si passa a ser melhor compreendida. Mas
fique atento, isto não significa que a criança foi percebida como sujeito detentor de direitos, tal
como é na contemporaneidade, e sim como um ser humano com especificidades.
Wajskop (1995) chama a nossa atenção para o fato de que mesmo dentro da Igreja Católica teria
surgido uma nova forma de entender a criança. O autor afirma que os padres jesuítas passaram a
descrever a criança comparando-a aos anjos e a Jesus (WAJSKOP, 1995). Para a Igreja, as brinca-
deiras gradativamente passaram a ser abordadas como uma referência à educação disciplinadora.
07
Metodologia e Prática na Educação Infantil
Nesse momento, o brincar também passou a ser considerado como algo necessário e inerente
à criança. Nem todas as crianças, entretanto, conseguiam fazê-lo, já que isso era destinado
especialmente à classe burguesa. Já do século XVIII em diante, teremos uma evolução do brin-
quedo que, cada vez mais, torna-se específico às peculiaridades de cada idade, nível de compre-
ensão e até mesmo poder aquisitivo da família na qual a criança está inserida.
VOCÊ SABIA?
Você sabia que a palavra “burguesia” faz menção à classe social com maior poder
aquisitivo existente em uma sociedade? Assim, burguesia relaciona-se a um determina-
do segmento social que possui renda e bens e que mantém um padrão de vida elevado.
A classe burguesa, portanto, faz menção a uma gama de pessoas que possui condição
econômica elevada em relação às demais pessoas da sociedade.
O ato de brincar atualmente, entretanto, não é o mesmo do século XVIII. Mesmo porque os brin-
quedos são outros, assim como as crianças e o modo de vida das pessoas. Hoje, temos visto o
grande desenvolvimento de brinquedos assentados nas tecnologias, por exemplo, e a tendência é
que tais mudanças sejam potencializadas a partir do desenvolvimento tecnológico experimentado
pela sociedade capitalista.
A seguir, confira a imagem de uma criança utilizando um dos brinquedos mais populares!
Figura 1 – A partir do século XVIII os brinquedos evoluíram e tornaram-se mais específicos às peculiaridades de cada idade.
Fonte: Peter Bernik, Shutterstock, 2016.
Bem, Fonseca (2008) aponta que Elkonin e Zaporozhets abordam os conceitos de imitação e de
jogo, por meio dos quais conseguiremos compreender qual era o entendimento dos autores a
respeito do ato de brincar.
Elkonin e Zaporozhets (FONSECA, 2008) afirmam que para a criança se apropriar da realidade
é fundamental que ela consiga imitar o comportamento do adulto. Quando a criança não fre-
quenta a escola, ela irá imitar o comportamento dos adultos com os quais convive, sobretudo as
pessoas que são responsáveis por seu cuidado direto. Já a criança que ingressa na escola tem
seu círculo de amigos substancialmente ampliado, passando então a copiar o comportamento
dos amigos e dos adultos presentes nesse ambiente. Ela será influenciada pelo contato que pos-
sui com o professor, além dos demais adultos com os quais se relaciona no processo de ensino.
O jogo, por outro lado, seria para Elkonin e Zaporozhets (FONSECA, 2008), uma ação que pos-
sui uma intenção, um objetivo. O jogo permite que a criança consiga recombinar e sintetizar os
saberes anteriormente adquiridos. Os conhecimentos que a criança já possui associados ao jogo
permitem que ela construa novos saberes, os quais são transmitidos ao cérebro.
Elkonin e Zaporozhets, conforme Fonseca (2008), ainda nos colocam que o jogo evoca de-
monstrações visuais, expressas nos objetos utilizados e em tudo que a criança se baseia para
desempenhá-lo. Entenda que, para os autores, a utilização de demonstrações visuais é funda-
mental para o desenvolvimento infantil. Isto porque são as demonstrações visuais que abrem a
possibilidade para o desenvolvimento verbal da criança.
Conforme nos explicam Elkonin e Zaporozhets, nas palavras de Fonseca (2008), primeiro a
criança percebe a imagem como um substituto do real, conseguindo depois integrar o que é
real ao pensamento, resultando na linguagem. Assim, a criança precisa da imagem como um
apoio para desenvolver o pensamento e também a linguagem. Isso resultará na ampliação das
possibilidades de alfabetização.
Elkonin e Zaporozhets (FONSECA, 2008) nos indicam, ainda, que o jogo faz com que as crianças
consigam dar respostas mais rápidas ao que lhes é solicitado. Conforme a análise dos autores
(FONSECA, 2008), a criança precisa de seis tentativas para solucionar uma situação que lhe é apre-
sentada apenas por sentenças verbais. Com o jogo, no entanto, ela precisará de menos tentativas,
ainda mais quando ele é baseado em imagens. Isso facilita o entendimento dos conceitos pela crian-
ça, diminuindo seu tempo de resposta aos quesitos que lhes são apresentados (FONSECA, 2008).
09
Metodologia e Prática na Educação Infantil
A abordagem de Elkonin ficou conhecida com o termo “psicologia do jogo”, exercendo grande
influência nas práticas pedagógicas, e é ainda hoje uma forte referência para as intervenções
assentadas na importância do brincar.
Elkonin e Zaporozhets indicam que, no jogo, a criança transfere o conceito ao cérebro. Primeiro
a criança se apropria do objeto, depois reconstrói essas imagens mentalmente e, por último, as
converte em símbolos, palavras e números (FONSECA, 2008). Por conseguinte, para e Zaporo-
zhets e Elkonin, o jogo é a atividade principal e predominante para uma criança e trará influências
para o seu desenvolvimento (FONSECA, 2008). Observe que os autores entendem que todas as
atividades lúdicas, se direcionadas adequadamente, podem ter a mesma potencialidade do jogo.
Cabe destacar que o jogo, de acordo com Elkonin e Zaporozh (FONSECA, 2008), possui um
caráter histórico. Nesse sentido, ambos destacam que o jogo, assim como o ato de brincar, foi se
desenvolvendo na sociedade ao longo dos séculos. Por conseguinte, o jogo também é algo social
que representa a posição assumida pela criança na sociedade. Além disso, os autores indicam
que por meio dele a criança se apropria da realidade, da cultura que foi produzida pelo gênero
humano. Isso a auxilia na aprendizagem das normas de convivência.
Na verdade, de acordo com Fonseca (2008), Elkonin e Zaporozhets defendem que o jogo surgiu
como uma forma de transmitir normas sociais à criança, por influência do desenvolvimento das
expressões artísticas. Hoje, no entanto, podemos entender que se trata da atividade que melhor
mediatiza a relação entre a criança e o mundo.
Vigotski, como nos diz Fonseca (2008), por outro lado, derivando das posições descritas, en-
tendia que o brincar viabiliza para a criança a construção da percepção do mundo. A realidade
concreta em que ela está inserida influenciará o seu brincar de tal forma que, para o psicólogo
russo, o brincar é fundamental para a criança, posto que é por meio dele que a criança amplia
seu desenvolvimento psíquico (FONSECA,2008). Assim, o brincar é essencial para o desenvolvi-
mento do ser humano. No brincar, a criança consegue simbolizar os conceitos e representá-los,
construindo o pensamento abstrato.
Vigotski, de acordo com Cordazzo e Vieira (2007), ainda nos diz que o brincar em geral é algo
mais livre, sem muitas regras, ao passo que o jogo é construído sob regras. Ambos, no entanto, são
atividades lúdicas e que colaboram parra o desenvolvimento da criança e de sua aprendizagem. O
autor ainda destaca que o jogo sempre tem regras prontas, as quais podem ser alteradas depen-
dendo da circunstância e da finalidade que se pretende alcançar. O jogo, portanto, também tem
a potencialidade de influenciar sobre o desenvolvimento psíquico da criança, colaborando para
a especialização do pensamento, da atenção voluntária, da memória e também da imaginação.
Na infância, conforme Vigotski, a brincadeira é a atividade principal, ou seja, é ela que orienta
e organiza todo o desenvolvimento da criança (CORDAZZO; VIEIRA, 2007). Como tal, sempre a
impulsiona a novos estágios de desenvolvimento. Vigotski, no dizer de Cordazzo e Vieira (2007),
afirma que a brincadeira tem o potencial de instruir estágios de desenvolvimento, levando a
criança a alcançar níveis mais elevados. Assim, se hoje a criança segura uma boneca com difi-
culdade, amanhã conseguirá segurá-la com facilidade, colocando-a no carrinho de bebê para
um passeio, por exemplo. Essas conquistas também trarão influencias para o desenvolvimento
psíquico infantil, que torna-se cada vez mais específico. Isso colabora com a aprendizagem da
criança, motivo pelo qual, para Vigotski, a aprendizagem escolar pode ser favorecida através de
brincadeiras (CORDAZZO; VIEIRA, 2007).
Para Vigotski (CORDAZZO; VIEIRA, 2007), o brincar deve estar presente na vida da criança em
todos os momentos, pois ela descobre a realidade através da ação lúdica. Na verdade, o brin-
car se desenvolve no ser humano desde que ele é bebê, quando a conotação lúdica ainda não
está tão latente. Quando bebê, o ser humano busca manipular objetos, visando conhecer suas
características. Com o tempo, esse contato com o mundo passa a ter conotação lúdica, perden-
do assim sua característica de exploração da realidade. Partindo do desenvolvimento da fala, a
criança consegue participar dos jogos simbólicos e, a partir dos 6 anos, conseguirá participar
ativamente dos jogos com regras.
Ambos os processos, de jogo e de brincadeira, são mediados pelo adulto inicialmente. A crian-
ça, com o tempo, passa a brincar com outras crianças sem a supervisão do adulto, mas é com
o adulto que ela aprende a brincar, a usar o jogo. Este fator torna o ato de brincar algo que é
apreendido e mediado na relação firmada entre adulto e criança.
VOCÊ SABIA?
Você sabia que o termo “brincar” possui diferentes designações no mundo? Nos Es-
tados Unidos, brincar é escrito por meio da palavra inglesa “play”, que designa uma
ação lúdica. Já na França, o termo corriqueiro usado é “jouer” que, por sua vez, quer
dizer tanto jogar, quanto brincar e, nesse caso, ambos relacionam-se a uma ação que
é desenvolvida pela criança.
Podemos, então, inferir que os jogos e as brincadeiras integram a ação lúdica, a qual é funda-
mental para o desenvolvimento infantil. Assim, ao passo que o brincar nos remete a uma ativida-
de lúdica não estruturada, o jogo relaciona-se a atividades lúdicas que são construídas com base
em regras sistematizadas. Devemos entender o brinquedo, por outro lado, como o objeto que
convida a criança ao ato lúdico. Assim, todas as atividades lúdicas são basais ao desenvolvi-
mento infantil e também ao desenvolvimento da aprendizagem. As imagens a seguir representam
respectivamente jogos e brincadeiras.
11
Metodologia e Prática na Educação Infantil
Na próxima imagem, você verá uma criança brincando sem recorrer a um jogo, usando apenas
o brinquedo.
Por conta disto, tivemos a organização de creches e pré-escolas, ou seja, organismos que deve-
riam se ocupar de cuidar da criança durante o horário de trabalho. Inicialmente, esses organis-
mos não possuíam uma metodologia de intervenção e acabavam apenas exercendo a atenção
das necessidades emergenciais da criança, dentre as quais alimentação, repouso e também o
brincar. Em outras palavras, temos que o brincar já fazia parte das abordagens desenvolvidas
nas primeiras creches, mesmo que na época não se tivesse ainda uma noção muito clara acerca
da importância das atividades lúdicas para o desenvolvimento infantil e para a aprendizagem.
Nesse período, entenda que existiam creches particulares, muitas delas domésticas e poucas
intervenções eram desenvolvidas pelo Estado.
Kuhlmann Jr. (2000) afirma que somente em 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, as creches e pré-escolas, destinadas a atender criança até os 6 anos de idade, foram
consideradas dispositivos de educação infantil e equipamentos importantes para compor a edu-
cação fundamental brasileira. As primeiras instituições não possuíam ainda uma metodologia
específica de intervenção, e acabaram constituindo-se como espaços apenas para receberem as
crianças sem uma abordagem mais específica e definida.
Cabe lembrar que, atualmente, conforme a Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, a educação
infantil torna-se obrigatória aos pais a partir dos 4 anos. Isso significa que a criança deve ser
inserida na escola assim que atingir essa idade. Agora reflita: como atuar junto ao público alvo
para que esta inserção de fato ocorra? É o que veremos no próximo item.
13
Metodologia e Prática na Educação Infantil
Mas o que nos diz a Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, a respeito da forma de atuação junto
à educação infantil? Bem, a legislação nos coloca que, nesse estágio, a criança não será subme-
tida à avaliação e também não será retida em nenhum ano. O documento aponta também que
a educação infantil deve atender crianças até os 5 anos, porém com a finalidade de viabilizar o
seu desenvolvimento integral. As pré-escolas, por exemplo, devem atender as crianças na faixa
etária entre 4 e 5 anos de idade. A lei, entretanto, não indica como fazê-lo. Apesar disso, pelo
estágio de desenvolvimento da criança atendida na educação infantil, as atividades lúdicas ainda
se mostram mais relevantes no sentido da construção de conceitos. Podemos inferir, dessa forma,
que é fundamental o desenvolvimento de ações lúdicas na educação infantil.
Na imagem, vemos a criança manuseando giz de cera, uma atividade lúdica de pintura, mas que
é também uma atividade de aprendizagem. Assim, apesar da legislação atual sobre a educação
não determinar claramente a metodologia de ação na educação infantil, podemos inferir que o
desenvolvimento de atividades lúdicas é essencial.
VOCÊ SABIA?
Você sabia que o termo “lúdico” não está restrito a jogos? Pois bem, a ludicidade en-
globa uma série de ações de natureza recreativa, e não deve estar aprisionada apenas
no entendimento do jogo como o único meio lúdico. Por conseguinte, as brincadeiras,
por exemplo, também são consideradas atividades lúdicas, mesmo que não sejam de-
senvolvidas por meio de jogos com regras.
Essas alterações são condicionadas pelo contato que a criança estabelece com o mundo exte-
rior. Tenha em mente que esse contato acontece em todos os momentos cotidianos, e permite
que a criança se expresse, sobretudo quando brinca. Assim, o brincar permite que ela conheça
o mundo exterior por meio do contato estabelecido com os objetos, com outros seres humanos
e com a natureza.
A linguagem, conforme Luria (1985), é desenvolvida pelo ser humano desde o nascimento. O
bebê chora, emite balbucios e gritos para tentar se relacionar com o adulto. Isso ocorre porque
a criança possui o aparelho fonoaudiológico desenvolvido, porém só consegue articulá-lo por
meio da fala porque aprende, com o adulto, que é preciso falar. A capacidade de falar, entretan-
to, é tão complexa para a criança como a possibilidade de controlar a marcha, ou seja, controlar
a fala é tão difícil quanto andar.
Após a fase dos balbucios e expressões orais desconexas, a criança começa a cantarolar. Mes-
mo que não tenha coerência, o cantarolar demonstra que a criança está se preparando para
uma fala mais articulada. O cantarolar, no entanto, só é possível quando a criança já ampliou
seu contato com a realidade, com o mundo. Assim, entenda que quanto mais experiências de
inserção com a realidade a criança possuir, mais seu universo será ampliado e mais condições
para a fala ela reunirá. Quanto mais a criança puder brincar, mais possuirá condições para o
desenvolvimento da sua oralidade.
Luria (1985) diz que antes de dominar a linguagem, a criança apoia-se também nos gestos. Para
o autor, o gesto também é uma forma de expressão, de linguagem (LURIA, 1985). Quando a
criança aponta um objeto, ela está nos dizendo que o deseja. O gesto também é um meio de
estimular as estruturas mentais da criança e de prepará-la para o domínio da linguagem formal.
CASO
Ana Paula demonstrava grande preocupação com sua filha de 4 anos, que praticamente não
falava nenhuma palavra, apenas dizia “mamãe” e “papai”. O ingresso futuro em uma escola
de educação infantil motivou Ana Paula a consultar psicólogos, fonoaudiólogos e neurologis-
tas, buscando identificar o que motivaria sua filha a não falar. Após uma série de exames, foi
constatado que a criança não possuía nenhum comprometimento biológico, sendo, em seguida,
inserida na educação infantil.
O caso nos indica que quando não há nenhum comprometimento biológico, a inserção social
da criança favorece o desenvolvimento de várias habilidades. No exemplo, a inserção da criança
na pré-escola estimulou o surgimento da fala.
O caso também nos mostra que há um aspecto fundamental para o desenvolvimento destas e
de demais habilidades: o estímulo. Como você já deve ter notado, temos reforçado que a fala
não é uma habilidade inata, mas socialmente adquirida. Para que seja desenvolvida, ela precisa
ser estimulada. Assim, quanto mais desejamos ampliar a fala da criança, mais possibilidades
devemos oferecer a ela.
Visando estabelecer uma linha mais próxima entre esses dois processos, podemos inferir que por
meio do brincar a criança reconhece o objeto, reconhece o outro e o nomeia. Com o tempo, a
criança passa a não mais precisar do objeto para se lembrar dele. Quando isso acontece, deve-
mos entender que a criança já conseguiu transferir o conceito do objeto para o cérebro. Assim,
primeiro a criança precisa da bola para compreender suas propriedades. Depois, mesmo que
a bola não esteja acessível a sua visão, a criança continua sabendo o que é uma bola. Neste
momento, portanto, dizemos que a criança alcança o desenvolvimento psíquico necessário para
controlar a linguagem.
O brincar é fundamental a esse processo de desenvolvimento psíquico, posto que, por meio dele,
a criança estabelece contato com os objetos, com as pessoas e com o ambiente em geral. Esse
contato a permite construir imagens interiores. Quando a criança consegue organizar melhor a
fala, por volta dos 7 anos, articulando pensamento e linguagem, é comum que ela fale sozinha
ou mesmo que crie amigos imaginários. Isso só é possível porque ela conseguiu recompor men-
talmente algo com o qual estabeleceu contato.
Brincar Linguagem
Sabemos que a importância do brincar surge após o período em que a criança passou a ser
compreendida enquanto tal, ou seja, ocorre no século XVIII, conforme nos indica Ariès (1978).
Como já vimos anteriormente, foi somente nesse momento que a criança deixou de ser percebida
como um adulto em miniatura, ou como um ser humano pecador. Também data do mesmo perí-
odo o surgimento e a ampliação dos colégios, o que favoreceu a construção de um novo olhar
a respeito de como ensinar.
Wajskop (1995) nos diz que pensadores com Comenius, Rosseau e Pestalozzi se levantaram em
um movimento de defesa da infância. Esses autores e filósofos defendiam a valorização da in-
fância e compreendiam que as escolas possuíam um papel fundamental nesse processo. Nesse
período, portanto, difundiu-se a crença de que a criança deveria ter seus sentidos educados, e
que tal educação deveria acontecer por meio de jogos e de brinquedos.
17
Metodologia e Prática na Educação Infantil
Algum tempo depois, mais especificamente no século XIX, conforme Wajskop (1995), difundiu-se
entre as práticas pedagógicas as concepções de Froebel. Para ele, seria necessária uma educa-
ção institucional, prestada nas escolas e baseada no brincar. Froebel propunha uma educação
sensorial que recorresse a jogos e demais materiais didáticos e entendia que os jardins da infân-
cia deveriam ser espaços em que a criança tivesse acesso a brinquedos e que os manipulasse
livremente (Wajskop, 1995).
Ao final do século XIX e início do século XX, vemos que as brincadeiras e os materiais peda-
gógicos passaram a ser considerados como o principal instrumento de trabalho nas escolas,
sobretudo naquelas de educação infantil. Anos depois, sobretudo em meados de 1920, vemos
o levante do Movimento Escola Nova, iniciado nos Estados Unidos. Dentre as requisições desse
movimento, temos o destaque à compreensão da criança como um ser ativo e lúdico por exce-
lência, compreendendo assim o brincar como algo livre e espontâneo, mas como um meio de
atuação na educação infantil.
No Brasil, o Movimento Escola Nova surgiu também em meados de 1920 e 1930. No que con-
cerne o brincar, vemos que os representantes desse movimento requeriam e conseguiram cons-
tituir escolas primárias em que o jogo era considerado um método de ensino. Saiba que, neste
momento, foram criados os parques infantis paulistas, espaços de recreação e lazer das crianças.
Já no ano de 1960, tivemos uma nova ênfase ao papel do brincar nas práticas educativas, co-
roada anos depois pelas contribuições da perspectiva sócio-história acerca da metodologia de
ensino na educação infantil. Atualmente, o brincar já é entendido como uma referência metodo-
lógica para a prática pedagógica.
Preste bastante atenção agora, pois demonstraremos algumas brincadeiras e jogos que podem
ser desenvolvidos na educação infantil.
• Conte um conto. Esse método foi desenvolvido pela UNICEF como um dispositivo
facilitador da aprendizagem, sobretudo como um meio de colaborar com a alfabetização
das crianças. Nele, o professor estimula a criança a criar histórias a partir da exposição de
imagens diversificadas. Inicialmente o professor pode estimular que a criança apresente
histórias orais e depois, com o tempo, a criança pode ser também estimulada a registrar
as histórias criadas (MACEDO; PETTY; PASSOS, 2005).
• Continue a história. Nesse método, o professor inicia a contação de uma história, que
pode ser um clássico ou algo inventado, partindo do contexto em que a criança está
inserida. O professor conta a história até certo ponto e depois solicita aos alunos que
elaborem grupalmente uma continuação. Neste caso, saiba que a elaboração da história
pode ocorrer com base na oralidade e também na escrita. O ideal é que tenha início
oralmente e, com o tempo, as crianças consigam transferir a narrativa que criaram para o
papel. Tanto o “Continue a história” quanto o “Conte um conto” podem ser inicialmente
desenvolvidos pela oralidade, o que com certeza irá estimular o desenvolvimento da
linguagem, da aprendizagem e da alfabetização infantil.
• Caixa de surpresas. A caixa de surpresa também tem sido uma abordagem muito
utilizada nas práticas pedagógicas contemporâneas, apesar de ser uma técnica bastante
simples. Nela, o professor decora uma caixa, de forma a torná-la atrativa para os alunos,
podendo até escrever “caixa de surpresas”. Há alguns pedagogos que chegam a propor
até que as próprias crianças colaborem para essa decoração da caixa. A professora
pode colocar dentro dessa caixa objetos, palavras, figuras e deve instigar as crianças a
tentarem adivinhar o que há dentro dela. A professora deve organizar os alunos em uma
roda, integrando todos na atividade antes de revelar o conteúdo da caixa de surpresa,
sendo ideal que ela seja partilhada entre os alunos. No caso do professor que optar
trabalhar com objetos, ele pode solicitar que o grupo, após sua apresentação, indique
como escreve o nome de tal objeto e qual a sua utilidade. No caso de trabalhar com
imagens, também pode abordar a escrita, e se decidir inserir na caixa apenas palavras,
pode discutir com seu significado com os alunos. Também é uma metodologia que pode
ser desenvolvida de uma forma mais simples, ascendendo depois a níveis mais elevados,
dependendo do estágio de desenvolvimento apresentado pela criança.
A imagem a seguir representa o professor contando histórias para crianças em uma sala de aula.
19
Metodologia e Prática na Educação Infantil
O rol de atividades possíveis, de caráter lúdico, é bastante amplo. Não há como detalhar todas
as metodologias que podem ser utilizadas com tal finalidade. Os exemplos que narramos ante-
riormente são apenas propostas de ações que podem ser desenvolvidas de forma lúdica, poden-
do ser aplicadas na educação infantil no auxílio da aprendizagem.
• O brincar é fundamental para o desenvolvimento infantil, sendo uma atividade que pode
orientar substancialmente os processos psíquicos da criança.
• Observamos que há uma série de técnicas que podem favorecer a aprendizagem através
da ludicidade.
21
Referências Bibliográficas
ARIÈS, Philipe. História social da infância e da família. Tradução: D. Flaksman. Rio de Janeiro:
LCT, 1978.
CORDAZZO, Scheila Tatiana Duarte; VIEIRA, Mauro Luís. A brincadeira e suas implicações
nos processos de aprendizagem e de desenvolvimento. Estud. pesqui. psicol., Rio de Janeiro,
v. 7, n. 1, jun. 2007. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1808-42812007000100009&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 17 maio 2016.
MACEDO, Lino de Macedo; PETTY, Ana Lucia Sicoli; PASSOS, Normar Christe. Os Jogos e o
Lúdico na Aprendizagem Escolar. São Paulo: Artmed, 2005.
Kuhlmann Jr, Moysés. Histórias da educação infantil brasileira. Revista Brasileira de Educação,
n. 14, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n14/n14a02>. Acesso em: 19
maio 2016.
REVISTA ESCOLA. Nova escola. 10 brincadeiras para experimentar com as turmas da creche
e da pré-escola. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/creche-pre-escola/10-
brincadeiras-experimentar-turmas-creche-pre-escola-733322.shtml>. Acesso em: 19 maio 2016.
WAJSKOP, Gisela. O brincar na educação infantil. Cadernos de Pesquisa: São Paulo, n. 02,
fev. 1995. Disponível em: <http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/arquivos/742.pdf>.
Acesso em: 17 maio 2016.