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Gestão de

fornecedores
na cadeia da
construção civil
Item 1.1.i – Estudo Setorial Construção Civil
São Paulo, Dezembro de 2015
Esta publicação “Gestão de Fornecedores na Construção Civil” foi financiada pelo Programa Valor em Cadeia - Desenvolvimento de um modelo de negócio sustentável
para o aprimoramento de micro, pequenas e médias empresas no Brasil (ANT/ME 14644/BR).
É permitida a reprodução parcial ou integral desta publicação, desde que citada a fonte e com autorização prévia do Uniethos e do Fundo Multilateral de Investimentos
(FUMIN).

execução
Uniethos
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Tel.: (11) 3897 2439
Site: www.uniethos.org.br

Financiamento
BID FUMIN
Instituto Cyrela

autores
Renata Rugierro Moraes - Consultora
Regi Magalhães - Uniethos
Raquel Carlesso - Uniethos

fotografia
Bancos de imagens: Shutterstock

projeto gráfico
Casa36
2

Sumário

1. Introdução 4
1.1 O mercado imobiliário no Brasil: a evolução do setor na última década e o modelo de negócio das incorporadoras e construtoras do país 6
1.2. Um setor intensivo em mão de obra, carente de profissionalização e com baixo nível de produtividade 10
1.3. A fragilidade da gestão de suprimentos e os riscos socioambientais na cadeia produtiva 13

2. O perfil do subempreiteiro da construção civil no Brasil 17


2.1. Origem e experiência profissional 19
2.2. Gestão carente de profissionalização 21
2.3. Alta rotatividade da mão de obra e baixa capacidade de planejamento e de gestão da produção 22
2.4. Limitantes da produtividade 24

3. Melhores práticas das principais construtoras brasileiras 27


3.1. Verticalização e contratação apenas de fornecedores locais de serviços especializados 29
3.2. Centralização da área de suprimentos e negociação antecipada de pacotes de serviços para várias obras 31
3.2.1. Especialização da equipe de suprimentos por tipo de insumo 31
3.2.2. Modelo de remuneração variável específico para a equipe de suprimentos 32
3.3. Práticas de conformidade 33
3.3.1. Controle das obrigações legais dos fornecedores 34
3.3.2. Fiscalização das condições de saúde e segurança do trabalho nas obras e nos alojamentos 35
3.3.3 Portal de gestão de documentação de fornecedores 36
3.3.4. Controle de acesso ao canteiro de obra 37
3.3.5. Suporte administrativo aos fornecedores 37
3.3.6. Seguro contra riscos trabalhistas 38
3.4. Critérios de seleção e de avaliação de fornecedores 39
3.5. Planejamento de obra 40
3

3.6. Estímulo à ampliação da capacidade de atendimento de fornecedores 44


3.7. Padronização dos processos construtivos 45
3.8. Inovação em tecnologia e sistemas construtivos 46
3.9. Programa de desenvolvimento de fornecedores 49

4. Conclusão 54
- Fatores de competitividade: inovação tecnológica, eficiência nos processos e qualificação profissional

5. Metodologia 61
4

1. Introdução

O principal objetivo deste estudo


é mapear as práticas responsáveis
de gestão de fornecedores adota-
das pelas principais empresas do
setor da construção civil, analisan-
do a sua eficácia e se são suficien-
tes para responder às diversas
questões socioambientais, mais
especificamente problemas traba-
lhistas e de condições precárias de
trabalho, bastante frequentes ao
longo de toda a cadeia produtiva.
5

Longe de apontar vilões, o estudo deixa claro que se de gestão de fornecedores desenvolvidas pelas principais
trata de um desafio setorial, e que, portanto, requer o construtoras do Brasil, ilustrando, com exemplos reais,
entendimento sistêmico da dinâmica de funcionamento como já estão ocorrendo avanços nesse campo, mesmo
desse mercado, assim como de seu modelo de negócio que ainda modestos, mas capazes de inspirar o mercado
e dos desafios de seus principais agentes, além do con- a desenvolver cadeias produtivas sustentáveis.
texto temporal e socioeconômico no qual está inserido. Sendo a produtividade o fator básico para o cres-
Para isso, iniciaremos com um breve relato sobre cimento em longo prazo, destacaremos, por fim, al-
a evolução da indústria da construção civil na última gumas tendências nacionais e internacionais na cons-
década, assim como do modelo de negócio que sus- trução civil, por meio das quais se espera obter ganhos
tenta as principais empresas do setor, seguido da expressivos de produtividade, maior eficiência na
descrição dos fatores produtivos (mão de obra e capital) operação, redução de custos e dos prazos, incremento
característicos desse mercado, em paralelo com o no desempenho e melhoria na gestão de riscos, cul-
desenvolvimento do seu nível de produtividade. Tam- minando, consequentemente, na redução dos proble-
bém abordaremos a fragilidade das atuais políticas mas socioambientais presentes nesse setor.
corporativas de gestão de suprimentos, inclusive no Vale ressaltar que o enfoque desse estudo será o
relacionamento entre as construtoras e seus fornece- mercado imobiliário brasileiro e suas principais incorpo-
dores, demonstrando que parte dos principais riscos radoras e construtoras, a quem gostaríamos de agradecer
socioambientais na cadeia produtiva é, em grande pela rica contribuição: Cyrela, Even, Brookfield, Gafisa,
medida, decorrente das características, dinâmica e Tecnisa, Eztec, MRV, Direcional e Moura Dubeux.
estímulos gerados pelos próprios agentes do setor. No que se refere à classificação dos fornecedores, No que se refere à
Em seguida, será apresentado o perfil majoritário a análise focará os prestadores de serviço, que são os classificação dos
dos subempreiteiros da construção civil no Brasil, por agentes responsáveis pelos maiores riscos em toda a fornecedores, a análise
meio do relato resumido das origens e experiências cadeia produtiva. Longe da pretensão de trazer solu- focará os prestadores
profissionais desses empresários, assim como da des- ções e esgotar a discussão sobre o tema, nosso objetivo de serviço, que são os
crição das principais características de seus negócios, foi o de apresentar uma reflexão holística sobre a agentes responsáveis pelos
carências, desafios e limitantes da produtividade. questão, mostrando sua complexidade para fomentar maiores riscos em toda
Serão expostas, na sequência, as melhores práticas o debate entre os profissionais da construção civil. a cadeia produtiva
6

1.1 O mercado imobiliário no Brasil: a evolução de negócios bastante favorável.


do setor na última década e o modelo de negócio Nada menos que 25 empresas do mercado imo-
das incorporadoras e construtoras do país biliário, apenas no período de 2005 a 2007, fizeram
IPO (Initial Public Offering), captando, conjuntamente,
A indústria da construção civil é uma das mais uma quantia estimada entre R$ 19 bilhões e R$ 20
2
importantes para a economia brasileira, tanto que o bilhões para sustentar seus planos de crescimento .
desenvolvimento e a capacidade de produção nacional Influenciadas pela ótica do mercado de capitais, muitas
estão diretamente relacionados ao crescimento desse passaram a adquirir áreas expressivas de terrenos,
setor. Em 2013, o número de empresas voltadas para contando com a valorização futura do preço de venda;
a indústria da construção foi de aproximadamente 111 ampliaram sua atuação geográfica por meio da aqui-
mil, empregando quase 3 milhões de pessoas – o sição ou parceria estratégica com empresas locais,
equivalente a 5,4% do total de pessoas ocupadas no terceirizando a construção e outras atividades; também
país –, gerando uma receita bruta (valor das incorpo- ampliaram seu portfólio de produtos e segmentos de
rações, obras e serviços) da ordem de R$ 357,7 bilhões, mercado, com forte tendência à oferta de imóveis para
1
segundo o IBGE . a população de baixa renda.
Entre 2005 e 2013, o segmento passou por um A crise internacional de 2008 e 2009 representou
significativo processo de expansão, com o PIB do para o mercado um momento de reajuste de rota, com
setor crescendo 1,8 vezes mais do que o PIB nacional a necessidade de uma estratégia que trouxesse maior
entre 2007 e 2012. Tal crescimento foi fortemente previsibilidade e eficiência na operação. Nesse período,
impulsionado pelo aquecimento da economia, dimi- muitos desvios de custo, atrasos e problemas na qua-
nuição das taxas de juros, aumento da oferta de fi- lidade das obras foram identificados, obrigando as
nanciamento imobiliário e do prazo de pagamento, incorporadoras a reduzir o número de lançamentos e
melhoria na distribuição de renda, crescimento da redimensionar sua atuação geográfica, desfazendo
classe média com grande potencial de consumo, parcerias estratégicas que não foram bem-sucedidas,
maior credibilidade do país diante dos investimentos para que pudessem retomar a trajetória de crescimento,
estrangeiros, abertura do capital de empresas do setor, porém com maior controle das operações. Em 2009, 1. IBGE, Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2013.

entre diversos outros fatores que tornaram o ambiente o governo federal lançou o programa Minha Casa 2. Capital Aberto, ano 5, n. 52, nov.-dez. 2007.
7

Minha Vida, que também foi um forte estímulo para março de 2015, quando o valor por metro quadrado
o setor, em especial para as empresas que atuavam chegou a R$ 9.054,00, segundo dados do Departa-
no segmento de habitações populares. mento de Economia e Estatística do Secovi-SP.
Durante todo esse círculo virtuoso, que teve início Segundo estudo da EY realizado em parceria com
3
de forma intensa em 2005 e se manteve até 2013, a Escola Politécnica da USP , outro movimento cons-
pôde-se verificar um aumento expressivo das contra- tatado nesse período, por meio da análise combinada
tações na construção civil, com a criação anual média dos relatórios anuais de administração de sete das
de 161 mil postos de trabalho (considerando os em- maiores incorporadoras e construtoras de capital
pregos formais) no período entre 2004 e 2014, segundo aberto no ranking ITC (Inteligência Empresarial da
o Ministério do Trabalho e Emprego. A carência de Construção), foi que os custos cresceram em taxas
mão de obra qualificada e de outros recursos produ- superiores ao crescimento das receitas, comprome-
tivos, como equipamentos e materiais, mesmo que tendo a margem de lucro. A análise, realizada entre
em menor escala, além de limitar o potencial de cres- 2007 e 2011, indica que essas empresas apresentaram
cimento das empresas, implicou a elevação relativa conjuntamente forte crescimento de lançamentos
do custo da mão de obra, sem o incremento propor- (em metros quadrados), na ordem de 24% ao ano.
cional da produtividade, criando fortes pressões in- Somado a isso, o aumento do preço dos imóveis no
flacionárias e fazendo com que o INCC (Índice Nacional mercado fez a receita líquida combinada das empresas
de Custo da Construção) acumulasse alta de 43,4%, crescer 50% ao ano. Ao mesmo tempo, porém, os
entre 2007 e 2012, superando o IPCA (Índice Nacional custos cresceram a taxas maiores, cerca de 60% ao
de Preços ao Consumidor Amplo), que acumulou alta ano. A consequência foi a redução das margens de
de 31,9% no mesmo período, segundo dados do IBGE lucro do negócio – o EBITDA (Earnings Before Interest,
e da FGV. Além do peso crescente da matriz de custos, Taxes, Depreciation and Amortization) combinado
a desarmonia entre demanda e oferta de imóveis, além caiu de 21%, em 2007, para 16% em 2011.
do aumento expressivo do financiamento imobiliário
no período, criou condições favoráveis para a elevação
exponencial do preço de venda dos terrenos em área
3. EY, Estudo sobre Produtividade na Construção Civil: Desafios e
útil na cidade de São Paulo, atingindo o ápice em Tendências no Brasil, 2014.
8

FIGURA 1 – Gráfico: Evolução dos resultados agregados (lançamentos, receita líquida e custos combinados), entre 2007 e 2011,

de sete das maiores incorporadoras e construtoras de capital aberto no Brasil, em comparação à evolução do EBITDA

combinado.

Fonte: EY, Estudo sobre Produtividade na Construção Civil: Desafios e Tendências no Brasil, 2014.

A partir de 2014, o cenário da construção civil mudou incorporadoras de capital aberto tiveram prejuízo líquido
radicalmente. O círculo virtuoso de crescimento e geração combinado de R$ 262,19 milhões no segundo trimestre
de empregos foi interrompido por uma série de fatores de 2015, ante o lucro líquido combinado de R$ 483,58
– recessão da economia, aumento da inflação e das milhões obtido no mesmo período do ano anterior.
taxas de juros, restrições de crédito, aumento do de- Na tentativa de reduzir os efeitos da crise, as in-
semprego, queda nas vendas, aumento da inadimplência corporadoras reduziram significativamente seus lan-
e dos distratos –, fazendo que o lucro das incorporadoras çamentos, focando os esforços nas vendas do estoque
se transformasse em perda. Segundo levantamento de imóveis. Demitiram funcionários, inicialmente do
4 Chiara Quintão, “Incorporadoras Saem de Lucro para Perda”,
4
realizado pelo jornal Valor Econômico , as dezessete setor administrativo e de projetos, mas posteriormente, Valor Econômico, 18 ago. 2015.
9

à medida que as obras foram se encerrando, os fun- uma defasagem entre o momento de melhora da Na tentativa de reduzir
cionários de produção, na tentativa de reduzir as economia e a retomada maciça dos lançamentos. os efeitos da crise, as
despesas gerais e administrativas, adequando suas O modelo de negócio das incorporadoras e cons- incorporadoras reduziram
estruturas às necessidades do momento. Ainda se- trutoras no Brasil explica, em grande medida, a grande significativamente seus
gundo o jornal Valor Econômico, no primeiro semestre suscetibilidade do mercado imobiliário às oscilações lançamentos, focando os
de 2015 os lançamentos somaram R$ 4,94 bilhões, o da economia. Trata-se de um modelo que integra as esforços nas vendas do
que corresponde à metade dos lançamentos no mesmo atividades de incorporação com as de construção e, estoque de imóveis.
período em 2014, enquanto as vendas encolheram em alguns casos, também com as de vendas e serviços.
27% em relação ao ano anterior. Como consequência, Isso permite maior integração entre o planejamento
se verificou um leve ajuste dos preços de venda dos e a execução das obras, proporcionando melhor gestão
imóveis, com o índice de preço médio dos imóveis para se obter resultados financeiros e garantir o cum-
residenciais acumulado, de janeiro a março de 2015, primento dos prazos e do padrão de qualidade ao
recuando 1,54% em comparação à elevação do IPCA cliente final. Com o bom planejamento que a integração
desse mesmo período, que foi de 3,83%, segundo oferece, as informações sobre os custos das empresas
dados do Secovi-SP. são mais precisos, e ao mesmo tempo são menores
O único segmento que não está sofrendo os impactos os riscos na execução das obras, além de tornar pos-
das recentes mudanças na economia, principalmente sível a sinergia operacional e a economia de escala
das restrições do crédito imobiliário, é o das incorpora- nas grandes aquisições.
doras e construtoras que atuam no programa habitacional O ciclo de produção das incorporadoras e construtoras
Minha Casa Minha Vida, iniciativa governamental fi- é longo, durando em torno de 48 meses entre a aquisição
nanciada com recursos do FGTS (Fundo de Garantia do do terreno e a entrega do imóvel ao cliente final. Essa
Tempo de Serviço). Algumas dessas empresas apre- característica do negócio eleva os riscos devido ao tempo
sentaram resultados recordes nos últimos anos. necessário para adequação das estratégias e, conse-
De modo geral, as expectativas do mercado indicam quentemente, dos resultados financeiros em relação às
que o fraco desempenho operacional das incorpora- condições do mercado. Portanto, quando a economia
doras e construtoras continuará em 2016, com recu- desacelera, gerando um ambiente de incerteza e queda
peração somente no médio prazo. Também é esperada no índice de confiança do consumidor, as incorporadoras
10

e construtoras são diretamente afetadas, por que elas FIGURA 2 – Ciclo de projeto padrão das incorporadoras e construtoras.

conseguem reduzir seus lançamentos, mas continuam


precisando entregar os empreendimentos já lançados.
Compra do terreno Lançamento Início da obra Término da obra
Do mesmo modo, nos períodos de aquecimento da
economia, os resultados da retomada das empresas são
retardados em função do longo ciclo de produção, sendo
necessário reforçar bancos de terrenos e aprovar projetos 6 a 12 meses 8 a 10 meses 24 a 36 meses

de novos empreendimentos.
Se por um lado o modelo de negócios imobiliário traz 1.2. Um setor intensivo em mão de obra,
riscos, ele também oferece benefícios, como na realização carente de profissionalização e com baixo nível
de planejamentos de médio prazo. O risco principal se de produtividade
refere ao eventual desequilíbrio entre o volume de
negócios e os custos planejados no início do projeto Apesar dos avanços recentes, ainda que modestos,
– quando a maior parte do investimento é realizada –, em relação à adoção de novas tecnologias e à industria-
e as condições de mercado no período de vendas, lização da construção, o setor continua caracterizado pelo
momento em que ocorre a maior parte dos retornos uso intensivo de mão de obra, predominantemente de
financeiros. Entretanto, isso pode ser compensado pela baixa escolaridade, e um elevado índice de informalidade.
maior capacidade de planejamento e pelos ganhos de Mesmo que o custo com os empregados tenha aumentado
escala resultantes do grande número de projetos. nos últimos anos, o uso de recursos humanos ainda é
Apesar dos riscos de mercado, certos fatores – como visto como uma alternativa mais vantajosa do que a in-
o longo prazo do ciclo de produção, maior capacidade trodução de processos construtivos industrializados.
de planejamento, a recente tendência à concentração Em 2003, os trabalhadores sem ensino fundamental
geográfica da operação de várias incorporadoras e cons- completo correspondiam a 54% da mão de obra com
trutoras, além dos produtos com características padro- registro em carteira. Seis anos depois, a participação
nizadas – contribuem para a maior estabilidade da cadeia desse grupo caiu para 40%, e em 2011 passou a ser
5. Sebrae e Dieese, Anuário do Trabalho na Micro e Pequena
produtiva se comparados às empresas que trabalham 33% das pessoas ocupadas na construção em regiões
Empresa, 2012; e MTE, Relação Anual de Informações Sociais
5
com obras variadas e dispersas geograficamente. metropolitanas . Apesar do avanço no grau de instrução, (RAIS), 2003-2008.
11

nota-se que o profissional da construção médio, em túlio Vargas e a Câmara Brasileira da Indústria da
7 8
termos de experiência em atividades do setor, ainda é Construção , a produtividade total dos fatores (PTF)
desqualificado. Isso ocorre porque, com a carência da da construção aumentou a uma taxa média anual de
mão de obra verificada nos últimos anos, muitas pessoas 1,2% entre 2003 e 2009. Isso significa que os ganhos
com pouca ou nenhuma prática ingressaram nesse de produtividade acumulados no período totalizaram
mercado, reduzindo a participação dos profissionais 7,2%, e que se fosse empregada a mesma dotação de
especializados. Além disso, também se verificou que, capital físico e de trabalho, o produto da construção
nesse mesmo período, muitos operários da construção de 2009 seria 7,2% superior ao de 2003.
se tornaram empresários prestadores de serviço. Ainda Assim, o intenso crescimento econômico do setor,
que esse movimento tenha representado uma oportu- sobretudo após 2005; a crescente formalização das
nidade de ascensão profissional, boa parte desses novos empresas e da mão de obra ocupada na construção; o
empreendedores chegou ao mercado sem preparo aumento no nível de instrução dos trabalhadores do setor
algum para a gestão de negócios, o que acarreta inú- e a forte expansão de investimentos em capital físico
meros desafios para a cadeia produtiva. (máquinas, equipamentos, material de transporte, terrenos,
O setor da construção civil é formado pelo conjunto entre outros) por parte das empresas são os principais
das empresas legalmente constituídas, empresas informais fatores verificados na última década que ajudam a
e unidades autônomas de produção, também chamadas explicar o incremento da produtividade no período.
de “autoconstrução” (obras de pequeno porte realizadas Apesar dos índices positivos apresentados pelo
pelas próprias famílias ou por trabalhadores contratados estudo indicado, se o resultado da PTF for aberto e o
informalmente). Ao longo da última década, se verificou foco recair na análise individual da evolução da pro-
um processo de crescente formalização das empresas dutividade, tanto do trabalho quanto do capital, algumas
e dos profissionais da área, como se verifica na elevação conclusões importantes podem ser obtidas.
do índice de trabalhadores com vínculo formal de em- De 2003 a 2009, a produtividade do trabalhador das
6. IBGE, Sistema de Contas Nacionais, 2003-2009.
6
prego, de 19,5%, em 2003, para 30,1% em 2009 . Porém, empresas formais (com cinco ou mais pessoas) cresceu
7. FGV e CBIC, A Produtividade da Construção Civil Brasileira, 2012.
vale observar que a parcela do setor caracterizada pela em média 5,8% ao ano. Tal elevação da produtividade
8. A produtividade total dos fatores é a relação entre a produtivi-
informalidade ainda é bastante significativa. está relacionada não apenas à melhoria da qualificação
dade do trabalho e a produtividade do capital em um determinado
Segundo estudo desenvolvido pela Fundação Ge- profissional, mas também ao veemente investimento nível de tecnologia aplicada.
12

das construtoras em capital físico. Nesse mesmo período, se que as frequentes oscilações da economia brasileira
os salários reais subiram em média 4,5% ao ano, ficando, acabam por desestimular tanto os fornecedores, que não
portanto, abaixo da taxa de crescimento da produtividade desenvolvem nem prospectam novas tecnologias, quanto
do trabalho. Porém, as taxas referentes aos anos de 2006 às construtoras, que não experimentam novas práticas
a 2009 mostram uma tendência preocupante para as em suas obras devido ao grande risco ao qual se expõem.
empresas do setor: os salários médios subiram 6,5% em Isso se soma ao despreparo dos trabalhadores para a
2008, e 7,6% em 2009, enquanto que a produtividade implantação das novas tecnologias na construção, além
do trabalhador se manteve estável em 2008, registrando de certa “resistência cultural” de parte dos agentes da
aumento de 4,2% em 2009. Em síntese, foi a escassez cadeia produtiva – incluindo fornecedores (em especial
da mão de obra verificada no período que pressionou os prestadores de serviço), construtoras e clientes finais
os salários para cima, sendo que os ganhos de produ- – para a adoção de algumas das inovações.
tividade do trabalhador não foram suficientes para cobrir
esse custo adicional.
Em relação à evolução da produtividade do capital,
apesar de modesta (como mostra a tabela a seguir),
nota-se que houve um crescimento de 17,6% ao ano nos
investimentos das empresas entre 2003 e 2009. A in-
corporação de novas gerações de bens de capital permitiu A incorporação de novas
ao setor não apenas elevar a capacidade de atender a gerações de bens de
um mercado em expansão, como também contribuiu, capital permitiu ao setor
de forma moderada, para a substituição da mão de obra não apenas elevar a
por capital físico. Ainda que se tenha verificado avanços capacidade de atender a
recentes na industrialização e na mecanização da pro- um mercado em expansão,
dução nos canteiros de obra, o mercado da construção como também contribuiu,
civil brasileiro ainda é caracterizado pela reduzida oferta de forma moderada, para
e relutância à implantação de novas tecnologias. Uma a substituição da mão de
série de razões poderia explicar esse fato, mas acredita- obra por capital físico.
13

A análise dos dados ao lado claro que a produtividade FIGURA 3 – Tabela: Crescimento anual da produtividade do

é o elemento básico do crescimento em longo prazo. trabalho, capital e PTF (produtividade total dos fatores).

A importância desse tema no debate da construção


civil já vinha desde o período de forte crescimento do
mercado, tendo se intensificado recentemente, com Produtividade do trabalho, capital e PTF (crescimento anual)
a desaceleração da economia e seus reflexos no setor. Produtividade
Tornou-se consenso que, para retomar o crescimento, Períodos Produto/Trabalhador Produto/Capital total dos fatores
a indústria da construção civil precisa elevar seu nível 5,8% -3,5% 1,2%
de produtividade, isto é, utilizar de maneira mais
eficiente os recursos disponíveis, além de promover 7,2% -8,3% -0,8%

avanços na tecnologia adotada. 4,4% 1,6% 3,1%

Fonte: FGV com dados de IBGE, Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2013.

1.3. A fragilidade da gestão de suprimentos e os


riscos socioambientais na cadeia produtiva

A cadeia de fornecedores da construção civil é uma construtoras no Brasil são as empresas de pequeno
complexa rede de micro, pequenas, médias e grandes e médio porte, intensivas em mão de obra, que ge-
empresas de vários setores. A maioria das grandes ralmente apresentam problemas de gestão do negócio,
incorporadoras e construtoras terceiriza parte consi- com consequências no desempenho e nas condições
derável da mão de obra em seus canteiros, e a forma de trabalho.
como a cadeia se organiza tem impacto direto no Dois fatores podem comprometer o desempenho
custo, qualidade, prazo e risco das obras. Dadas essas econômico e social na cadeia de fornecedores da
características do modelo de negócio, da estrutura construção civil. O primeiro se relaciona com fragili-
empresarial e da mão de obra, a gestão de fornecedores dades típicas das pequenas empresas intensivas em
no setor da construção é um grande desafio. mão de obra pouco qualificada. Essas empresas têm
Um dos motivos de preocupação para as grandes gestão financeira precária, não conseguem antecipar
14

ou controlar todos os seus gastos, nem planejar o fluxo O defeito em um equipamento, por exemplo, atrasa
de caixa. Também apresentam dificuldades na seleção, a realização de um serviço que seria executado por
gerenciamento e qualificação dos funcionários, que outro fornecedor. Os pagamentos para esse fornecedor
têm alta rotatividade. Manter em dia todas as questões são adiados, o que pode comprometer seu fluxo de
tributárias, trabalhistas e as certificações técnicas é caixa e, por sua vez, a remuneração dos subcontratados
um grande desafio do dia a dia dessas empresas, que, que, eventualmente, também podem atrasar o paga-
em geral, também não atendem integralmente às mento de seus funcionários.
exigências legais de segurança e saúde. Quanto mais longe estiverem do cliente final, maio-
O segundo fator é dado pelo alto grau de incerteza res serão os impactos. A incerteza aumenta conforme
decorrente da complexidade dos grandes projetos. A haja mais níveis de subcontratação na cadeia e, quanto
execução de uma obra é normalmente sujeita a alte- menor for a empresa subcontratada, menor será sua
rações e atrasos, que aumentam os custos para a capacidade para enfrentar as incertezas. Em geral, os
construtora e provocam incertezas na sua cadeia de custos de transação serão maiores quanto mais difícil
fornecedores. O impacto das mudanças repentinas for o fluxo de informação entre as empresas. As cadeias
em uma obra se propaga ao longo de toda a cadeia e de fornecedores da construção civil, por terem carac-
se torna cada vez mais intenso, no chamado bullwhip terísticas bastante peculiares – são cadeias temporárias,
effect (efeito chicote). formadas para cada projeto específico, fragmentadas

FIGURA 4 – Bullwhip effect (efeito chicote).

INCERTEZA

CLIENTE FORNECEDORES
15

também são graves e, no ano de 2012, dos acidentes das companhias), como também riscos legais e de
de trabalho registrados no Ministério da Previdência, reputação, refletindo negativamente nas marcas e em
9% ocorreram no setor da construção civil. sua credibilidade perante os consumidores.
Por outro lado, as exigências das empresas aos for- Dessa forma, pode-se concluir que a relação entre
necedores, em termos de compliance e gestão de riscos, as construtoras e seus fornecedores é essencialmente
cada vez mais restritivas, além dos custos adicionais que contratual, e que não é compreendida como uma parceria
acarretam, muitas vezes acabam dificultando a con- de longo prazo, mesmo quando são negociados pacotes
tratação, o que se torna um grande problema, princi- de serviços em mais de uma obra. As iniciativas de
palmente nos momentos de carência de mão de obra. desenvolvimento e relacionamento com fornecedores
Sendo assim, existem motivos para acreditar que são mínimas, não há registro de trabalhos de inovação
os próprios mecanismos de estímulo gerados pelos junto aos prestadores de serviço no setor, negligenciados
diversos agentes da cadeia produtiva, somados às porque se trata de uma base bastante ampla, de alta
fragilidades de gestão e de gerenciamento de riscos rotatividade. A gestão da cadeia produtiva pelas grandes
das empresas, são responsáveis por grande parte dos empresas foca apenas na relação da construtora com
riscos socioambientais presentes na cadeia produtiva seu fornecedor direto, sem considerar a cadeia de modo
da construção civil. Essa conclusão não se restringe abrangente e, consequentemente, sem considerar a
às questões socioambientais, já que preços mais baixos potencial sinergia que poderia maximizar o processo
tendem a gerar custos mais elevados em toda a cadeia, integrado, gerando ganhos para todos os envolvidos. A gestão da cadeia
devido ao aumento nos custos de transação e nas Na prática, o que se combate é uma lógica bastante produtiva pelas grandes
despesas de monitoramento, perdas causadas por conhecida e disseminada: cada agente da cadeia se empresas foca apenas na
atrasos e retrabalho, baixa produtividade, pagamento guia apenas por suas vantagens individuais em detri- relação da construtora
de déficits trabalhistas, e redução da qualidade final mento da dos parceiros, sem considerar que a falta de com seu fornecedor direto,
do produto. Além disso, não atentar para a responsa- sincronia entre eles irá elevar os custos em algum mo- sem considerar a cadeia
bilidade social e ambiental dos fornecedores pode mento. Uma visão míope que não leva em conta a de modo abrangente e
acarretar grandes riscos, não apenas financeiros (como crescente complexidade do ambiente de negócios e a a potencial sinergia que
aumento das despesas e do custo de capital, dificul- abordagem sistêmica na busca por soluções para os poderia gerar ganhos
dade de acesso ao crédito e queda do valor de mercado desafios dos tempos atuais. para todos os envolvidos.
16

e instáveis –, implicam um alto grau de incerteza. FIGURA 5 – Mecanismo de geração dos problemas econômicos e sociais na cadeia produtiva.

Habitualmente, o modelo de seleção de fornece-


dores desse setor se baseia principalmente nos preços
problemas
cobrados pelo serviço. Como há uma grande diferença Incerteza na econômicos Seleção
cadeia de e sociais orientada por
no poder de barganha das grandes incorporadoras e
fornecedores na cadeia de baixo preço
construtoras em relação às pequenas empresas pres- fornecedores

tadoras de serviço, o resultado é a redução de preços


por parte do fornecedor para viabilizar o negócio, mas
que não se sustenta na redução de custos. Desse modo, Fragilidades
como se diz no mercado, “o preço dos serviços é de- na gestão de
fornecedores
terminado pelas construtoras”. O processo de nego-
ciação acaba sobrecarregando as pequenas empresas
e cria um mecanismo de seleção adversa. contratuais e mecanismos de auditoria, cada vez mais
Apesar da redução de preços, a cadeia perde em rígidos, para controle das condições de trabalho. Porém,
eficiência, porque as empresas que aceitam preços com frequência são surpreendidas por fornecedores
mais baixos são as que operam com mão de obra que descumprem a legislação, muitas vezes mantendo
menos qualificada, com estrutura de gestão precária os trabalhadores em péssimas condições de trabalho,
e, portanto, com menor capacidade para realizar ser- segurança, moradia e alimentação, além de submetê
viços de qualidade e atender os quesitos técnicos, -los a jornadas excessivas e atrasos ou retenção do
trabalhistas, tributários, de saúde e segurança, entre pagamento dos salários e benefícios.
outros. O monitoramento das condições de trabalho Na lista suja do trabalho escravo, 7% dos registros
nas pequenas empresas, por exemplo, é um processo são de empresas do setor da construção. Considerando
complexo, caro e nem sempre efetivo. Todas as grandes todas as atividades relacionadas à sua cadeia produtiva,
incorporadoras e construtoras adotam critérios adi- como a produção de artefatos de cimento, de estruturas
cionais para a seleção de fornecedores, tais como metálicas e, principalmente, de madeira, a participação
experiência técnica, qualidade, prazo, conformidade do setor no total de casos de trabalho análogo à escra-
9. MTE, Cadastro de Empresas e Pessoas Autuadas por Exploração
9
à legislação, além de códigos de conduta, cláusulas vidão chega a 30% . Os problemas de saúde e segurança do Trabalho Escravo, 2014.
17

2. O perfil do
subempreiteiro
da construção
civil no Brasil

O crescimento da construção civil


brasileira tem se refletido em avan-
ços qualitativos importantes, não
apenas na melhoria do grau de
escolaridade dos trabalhadores e
aumento do número de empregos
com carteira assinada, mas tam-
bém no crescimento da participa-
ção das empresas formais no PIB
setorial durante a última década.
18

FIGURA 6 – Gráfico: Evolução do número de empresas ativas na indústria da construção civil (com uma ou mais pessoas

ocupadas) no Brasil entre 2009 e 2013

12 000
11 931
106 097

92 735

76 308

63 731

0
2009 2010 2011 2012 2013
Fonte: IBGE, Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2009-2013.

Segundo estudo realizado pela Câmara Brasileira da total eram de empresas com até 29 funcionários, se-
11.
Indústria da Construção, entre 2003 e 2009 a taxa gundo dados do IBGE
média de crescimento das empresas formais de cons- Apesar de contribuírem de forma moderada para a
trução (com cinco ou mais pessoas ocupadas) foi de receita bruta do setor, chegando a R$ 66 bilhões, e terem
11,2% ao ano, mais do que o dobro da taxa do setor, de participação de 18% no mercado em 2013, as empresas
10
5,1% ao ano . Essa tendência se intensificou nos últimos com até 29 funcionários são de grande importância setorial,
anos (como mostra o gráfico), e em 2013 a indústria da porque empregam um enorme contingente de trabalha-
10. FGV e CBIC, A Produtividade da Construção Civil Brasileira, 2012.
construção civil totalizava 111.931 empresas ativas (com dores e concretizam parte dos principais riscos socioam- 11. IBGE, Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2009-2013.
12.
uma ou mais pessoas ocupadas), sendo que 89% desse bientais presentes na cadeia produtiva da construção 12. Idem, ibidem.
19

2.1 Origem e experiência profissional genharia civil, por si só, não garante a solução de alguns O crescimento recente
problemas enfrentados no cotidiano de uma obra. do número de empresas
O crescimento recente do número de empresas Quando ingressaram nesse ramo, geralmente ainda ativas na construção é
ativas na construção é decorrente das condições so- bem jovens e oriundos de classes com baixo poder decorrente das condições
cioeconômicas da última década, e principalmente aquisitivo, vislumbraram na construção civil uma opor- socioeconômicas da última
da forte demanda por mão de obra no setor. tunidade de trabalho e de aumentar a renda. década, e principalmente
Além disso, grande parte dessas novas empresas Originários de várias regiões do país, os subem- da forte demanda por mão
prestadoras de serviço apresenta uma história em preiteiros atualmente concentram suas atividades na de obra no setor.
comum. Vários operários que atuavam nos canteiros região Sudeste (conclusão obtida do cruzamento do
de obras, muitos oriundos de famílias com tradição número de pessoal ocupado em 2013 e do valor das
de trabalho no setor, após ganharem experiência nas incorporações, obras e serviços da construção no
técnicas de construção, vislumbrando a possibilidade mesmo ano). Segundo dados do IBGE referentes ao
de ascender profissionalmente, iniciaram seus negócios ano de 2013, a região Sudeste lidera o ranking, com
próprios como fornecedores de serviços de mão de 54,5% do pessoal ocupado na construção, seguida das
obra. Para isso, alguns deles chegaram a receber in- regiões Nordeste (19,6%), Sul (13,9%), Centro-Oeste
13
centivos formais ou informais das construtoras em (7,6%) e Norte (4,4%) .
que trabalhavam. A questão central, na qual reside
boa parte dos desafios atuais presentes na cadeia
produtiva, é que esses novos empreendedores che-
garam ao mercado sem preparo algum para o plane-
jamento ou a gestão dos negócios.
A maioria dos subempreiteiros da construção civil
não tem formação acadêmica nem técnica. Seu conhe-
cimento prático vem, em alguns casos, dos ensina-
mentos passados de pai para filho, mas principalmente
dos anos de trabalho nos canteiros de obras – o que é
de grande valia para o setor, dado que a teoria da en- 13. Idem, ibidem.
20

ADM Construções: fruto do sonho de como sócio um dos seus dez irmãos. A sociedade
um empreendedor nordestino incansável durou oito anos, até os dois decidirem se separar, cada
Foi atrás de um sonho que o jovem nascido na pe- um tocando seu próprio negócio.
quena Mirindiba, município de São Miguel do Tapuio, O empresário Antonio Domingos é hoje proprietário
no Piauí, decidiu deixar suas origens e partir rumo a São da ADM Construções, empresa especializada em
Paulo. A data ele lembra bem: 9 de abril de 1989. Nesse trabalhos de médio e alto padrão, que emprega cerca
dia, Antonio Domingos pegou um ônibus em frente à de mil funcionários, a maioria piauiense, com mais de
antiga fábrica da Cachaça Beija-Flor, com lágrimas nos quatrocentas obras realizadas em seus vinte anos de
olhos e um desejo imenso de ter sucesso na vida. trajetória. A ADM tem, entre seus clientes, praticamente
Antonio seguiu viagem apostando na sorte e na todas as maiores incorporadoras e construtoras do
sua capacidade de fazer negócios. Começou traba- Brasil. Segundo Domingos, a contratação dos serviços
lhando como a maioria dos outros nordestinos: na de sua empresa acontece, principalmente, pelo rela-
construção civil. Com espírito empreendedor, apesar cionamento de confiança desenvolvido ao longo dos
de trabalhar como auxiliar de limpeza nas obras da anos com os engenheiros das construtoras.
OAS, Domingos passou a fornecer marmita e a vender Mas o empresário ainda guarda outro sonho, o de
doces nos canteiros, negócio que acabou prosperando voltar para sua terra natal e realizar muitos projetos
com a ajuda da esposa. que já tem em mente. “Da vida nada se leva, tenho a
Já com muita prática no ramo da construção civil, convicção de que já consegui muito mais do que
e o sonho latente de ser dono do próprio negócio, em imaginava e, como gosto muito do Piauí, pretendo
14
1995 o então empregado abriu sua empresa, tendo morar lá novamente”, revela o empresário.

14. Citações e dados retirados do artigo “Empresário Conta Sua Trajetória de Sucesso e Fala de Projetos para a Castelo”, Portal DCP, ago. 2013.
21

2.2. Gestão carente de profissionalização um portfólio mínimo o suficiente para garantir esta-
bilidade de receitas permite maior equilíbrio do fluxo
A partir de entrevistas realizadas com uma amostra de caixa e a redução dos riscos, sem exigir grande
aleatória de fornecedores das empresas participantes número de funcionários administrativos nem a gestão
deste estudo, foi possível a obtenção de algumas in- complexa de um portfólio variado.
formações importantes. As empresas são lideradas geralmente por profis-
A maioria dos subempreiteiros entrevistados possui sionais da construção civil de nível médio, sendo que
entre dez e 49 funcionários, sendo classificados como em muitos casos a gestão é conduzida por grupos
pequenas empresas (segundo os critérios adotados familiares, ou até mesmo pelo empreendedor indivi-
pelo IBGE), e são poucos os que empregam mais de dualmente, no caso das microempresas. Como estra-
99 pessoas. Os empreendedores relatam que evitam tégia para a redução dos custos tributários e traba-
contratar mais de cem funcionários para não incorrer lhistas, é comum que os grupos familiares tenham
nos custos adicionais das exigências trabalhistas, além mais de uma empresa, mas a incapacidade de dissociar
de grande parte dos prestadores de serviço não pos- as finanças pessoais das corporativas é uma dificuldade
suírem os recursos necessários para a gestão de um recorrente entre esses empreendedores.
grande número de funcionários. De maneira geral, trata-se de empresários que
Em relação ao faturamento, a maior parte das em- ascenderam profissional e financeiramente, mas sem
presas entrevistadas declarou ter receita anual na faixa grandes aspirações para suas empresas nem para a
Grande parte dos de R$ 360 mil a R$ 3,6 milhões, o que as classifica como renovação dos serviços ou da gestão. Além da ausência
fornecedores afirmou empresas de pequeno porte. É importante destacar que, de estímulos, também se verifica certa resistência às
prestar serviços para mais segundo os entrevistados, o nível das atividades de 2014 inovações trazidas pelo mercado e pelas construtoras,
de cinco clientes, o que para 2015 foi reduzido devido à situação econômica do que muitas vezes são encaradas como ameaças.
pode ser interpretado país, o que afetou o faturamento no período. Mesmo compreendendo os benefícios que trazem
como uma condição Grande parte dos fornecedores afirmou prestar para a realização dos serviços, muitos subempreiteiros
importante para a serviços para mais de cinco clientes, o que pode ser não querem ter como consequência a redução de seu
estabilidade financeira interpretado como uma condição importante para a faturamento por trabalho, uma vez que a modernização
dessas empresas. estabilidade financeira dessas empresas. A gestão de pode reduzir a necessidade de mão de obra.
22

Para assuntos como contabilidade e questões ju- 2.3. Alta rotatividade da mão de obra e baixa
rídicas, os subempreiteiros contam com o apoio de capacidade de planejamento e de gestão da
profissionais terceirizados, o que não garante, neces- produção
sariamente, um trabalho de qualidade, pois existem
profissionais que oferecem serviços especializados a Em termos da composição dos recursos produtivos,
custos acessíveis, porém com baixa qualificação. os subempreiteiros da construção civil são caracteri-
Muitas vezes os empresários são surpreendidos por zados como empresas intensivas em mão de obra, cujo
irregularidades na gestão, decorrentes de seu próprio principal desafio é a gestão de trabalhadores de alta
desconhecimento da legislação, mas também de rotatividade, baixo nível de escolaridade e pouca ca-
orientações equivocadas, seja por parte de sua equipe pacitação técnica. Muitos funcionários são amigos ou
administrativa ou dos profissionais terceirizados. indicados por conhecidos dos empreendedores, vindos
Quando questionados sobre seus diferenciais com- de outras regiões em busca de melhores oportunidades
petitivos e objetivos empresariais, mais da metade de emprego. A retenção dos funcionários pelos subem-
dos subempreiteiros entrevistados alegaram que sua preiteiros só é possível quando o término de uma obra
principal vantagem em relação aos concorrentes é a coincide com o início de outra, preferencialmente na
qualidade dos seus serviços, mesmo que seu principal mesma localidade. A alta rotatividade da mão de obra
objetivo seja elevar essa qualidade a um nível maior. acaba por dificultar qualquer ação possível de capaci-
Apesar de a maioria das empresas considerar que o tação profissional, o que contribui para o aumento das
preço é o principal critério utilizado pelas construtoras causas trabalhistas, que com o fluxo de caixa repre-
para a seleção dos fornecedores, apenas uma pequena sentam os maiores riscos para esse tipo de empresa
parte afirma possuir custos mais baixos que as demais pelos elevados custos ao empregador.
empresas do mercado. Geralmente suas margens de lucro são baixas e as
reservas pequenas, sendo que grande parte dos for-
necedores entrevistados afirmou ter reservas finan-
ceiras para cerca de dois meses apenas. Pequenos
atrasos de pagamento, erros no cálculo do orçamento
dos serviços ou atrasos na execução das obras podem
23

provocar o desequilíbrio nas contas do subempreiteiro, comercial perante as construtoras e o risco de não
atraso do salário dos funcionários e, nos casos mais concretizar vários negócios. A única solução para esse
críticos, levá-lo à falência. Quando pressionados pelas dilema é o empenho em aumentar a produtividade,
construtoras durante as negociações comerciais, o que possibilitará a redução dos custos de operação
muitas vezes acabam abrindo mão do cumprimento e a manutenção das margens.
de algumas obrigações legais para, assim, reduzir os É difícil incluir um planejamento otimizado nos
custos de operação, manter a margem e viabilizar o orçamentos, visto que os subempreiteiros não contam
negócio, enquadrando o orçamento no preço de mer- com o apoio de engenheiros para identificar métodos
cado. Em momentos de crise esse problema se acentua, construtivos e processos de trabalho que reduzam os
já que as pequenas margens se reduzem ainda mais. custos e garantam maior agilidade na execução. O
Para garantir o mínimo de lucro, sem negligenciar as auxílio especializado também contribuiria para definir
obrigações legais, se torna necessário o aumento da o nível técnico necessário, a quantidade ideal de mão
produtividade do trabalho, não em relação ao total de de obra e sua melhor alocação a fim de obter a máxima
horas trabalhadas pelos funcionários, mas à produção produtividade da equipe e, e consequentemente, o
por funcionário no mesmo período. aumento da eficiência, a redução de prazos, a mini-
A orçamentação é a etapa mais crítica para os mização dos riscos e o aumento dos resultados eco-
fornecedores de mão de obra, principalmente no caso nômicos. A dificuldade em cumprir os prazos, verificada
de serviços complexos, com grande variabilidade de com frequência nas obras, é uma das consequências
custos. Os cálculos do orçamento são elaborados com mais imediatas da falta de planejamento e orçamen-
base na experiência prática do dono da empresa, que tação adequados, já que a realização de uma empreitada
se limita a aplicar os preços de mercado à metragem com um número de trabalhadores menor que o ne-
do projeto, sem conhecimento preciso dos custos cessário, o acúmulo de serviços acima da capacidade
nem definição clara das margens de lucro, descon- de execução ou a baixa qualificação da mão de obra Em momentos de crise,
siderando custos indiretos ou os riscos. Por outro lado, são os principais motivos para os atrasos. para garantir o mínimo de
se todos os custos fossem de fato considerados no Considerando as principais características e defi- lucro se torna necessário o
orçamento, os subempreiteiros enfrentariam uma ciências apresentadas até o momento, não é difícil aumento da produtividade
situação bastante adversa: a falta de competitividade constatar quais são os maiores problemas de gestão do trabalho
24

relatados pelos subempreiteiros entrevistados. A gestão subempreiteiros, é importante ressaltar que o aumento
de pessoas é tida como a principal delas, sendo que as da produtividade total dos fatores (PTF) da construção
questões mais críticas relacionadas ao tema são a di- civil depende também dos processos produtivos e da
ficuldade para encontrar mão de obra qualificada, a alta logística do canteiro definida pela construtora, já que,
rotatividade de funcionários e os frequentes conflitos em média, apenas 30% do tempo dos trabalhadores
trabalhistas. A gestão financeira e a produtividade estão é considerado produtivo. O restante da jornada de
em segundo e terceiro lugar entre os principais proble- trabalho é dividia entre a espera por material e finali-
mas de gestão. zação dos serviços executados por outros fornecedores,
Em relação aos clientes, a negociação de preços é e o tempo de descanso.
considerada a maior dificuldade no relacionamento Dessa forma, podemos concluir que a alta rotatividade
comercial. A falta de planejamento dos serviços por e a baixa produtividade da mão de obra da construção
parte dos clientes também é apontada pelos subem- civil, resultante do baixo nível de qualificação dos traba-
preiteiros entrevistados como um problema crítico, que lhadores e, principalmente, de uma limitada capacidade
acarreta uma série de consequências negativas para dos subempreiteiros para planejar, orçar e gerir a produção,
os fornecedores de mão de obra em termos de plane- acabam por aumentar os riscos econômicos e socioam-
jamento, prazo, custos e resultados. bientais ao longo da cadeia produtiva. A solução para
reduzir esses riscos e retomar a capacidade de crescimento
do setor reside no aumento da produtividade total dos
2.4. Limitantes da produtividade fatores (PTF), sendo que, para isso, torna-se imperativa
a ação integrada entre construtoras e subempreiteiros, a
Apesar das inúmeras possibilidades de melhorar fim de potencializar seus esforços e multiplicar os ganhos:
os processos para ganho de eficiência por parte dos um exemplo típico de relação ganha-ganha.
25

Constata Construções: valorização do trabalhador, presa, criando um forte vínculo com a corporação. Esse
gestão profissional e inovação é um valor cultivado desde o início pelo fundador da
Fundada em 1988, a Constata é especializada na Constata, Sr. Noel, e preservado até hoje, mesmo com
prestação de serviços de estrutura em concreto, re- o crescimento das operações na última década.
vestimento externo e recuperação de fachadas. Par- Afastado das questões cotidianas desde que passou
ticipou da realização de mais de seiscentas obras, que a contar com a experiência técnica e o apoio adminis-
somam milhares de metros quadrados. Mais do que trativo de seus três sócios, engenheiros e ex-clientes,
isso, ao longo dos últimos 27 anos a empresa construiu Sr. Noel se dedica a conversar com os funcionários,
uma história de sucesso baseada no aprendizado, novos ou antigos na casa. São cerca de quarenta con-
crescimento, inovação, relacionamento e, principal- versas por dia, dos mais variados assuntos. Essa ca-
mente, na valorização do ser humano como principal racterística pessoal foi incorporada pela cultura da
ativo de seu negócio. empresa, possibilitando à Constata cultivar alguns de
O foco da empresa nunca foi o crescimento por si seus principais diferenciais: baixa rotatividade dos
só, mas sempre prezou a produtividade e a rentabili- funcionários, maior investimento na capacitação da
dade. Seu destaque no mercado decorre de seus equipe e reduzido volume de passivos trabalhistas, que
principais atributos – alta qualidade, bom atendimento representam apenas 1% das rescisões nos últimos anos.
e cumprimento dos prazos – garantidos pela padro- Com uma gestão descentralizada e fundamentada
nização dos processos de execução, do treinamento na meritocracia, as metas são definidas a cada obra,
permanente das equipes e da escolha da melhor lo- e caso os resultados esperados sejam alcançados, a
gística de abastecimento. equipe é premiada com bonificações. A responsabi-
Para cada tipo de serviço é formada uma equipe lidade pelas obras é compartilhada por uma equipe
específica pela empresa, que conta com cerca de 3.000 de diretores, gerentes e coordenadores de engenharia,
colaboradores, atuando em 105 obras em todas as com formação superior ou técnica. Somado à qualidade
regiões do país. Mesmo com o expressivo volume de dos funcionários, há o bom relacionamento com os
operações, apenas um terço da mão de obra é tempo- clientes, o que garante à Constata parcerias comerciais
rária. Essa relativa estabilidade permitiu a formação de exclusividade com algumas construtoras e a ne-
de muitos profissionais que seguiram carreira na em- gociação de grandes pacotes de obras.
26

A segurança do trabalho não é entendida como


uma obrigação legal, mas como uma responsabilidade
corporativa, intrínseca à natureza da empresa. São
cerca de sessenta profissionais, entre coordenadores
e técnicos, dedicados unicamente a cuidar da segu-
rança no trabalho. Além de orientar os trabalhadores
em campo, visitam semanalmente os alojamentos
administrados pela empresa para garantir boas con-
dições de higiene e moradia, além do atendimento
15
integral aos requisitos da NR18 . A alimentação dos
funcionários é fornecida por uma empresa especiali-
zada, inclusive aos domingos, prezando a saúde e a
nutrição de sua equipe.
As inovações para a Constata nunca foram alvo de
resistência, já que seus administradores estão cientes
de que, se bem aplicadas, podem aumentar a produti-
vidade e, consequentemente, os resultados econômicos.
Desse modo, o processo de inovação é sistemático,
sendo que a empresa implanta pelo menos um novo
processo por ano. As novidades técnicas chegam pelo
mercado (construtoras e parceiros) ou pela visita a feiras
internacionais do setor da construção civil. A Constata,
então, faz um investimento inicial até que a empresa
se adapte, o que depende da correta aplicação do novo
processo e o treinamento da mão de obra, para depois 15. Informações colhidas em entrevista com sócios da Constata.
16
colher os bons resultados em produtividade. 16. Norma Regulamentadora 18 - Condições e Meio Ambiente de
Trabalho na Indústria da Construção.
27

3. Melhores
práticas das
principais
construtoras
brasileiras

A gestão de fornecedores, até en-


tão vista por muitos executivos
como questão de relativa impor-
tância no âmbito da gestão em-
presarial, ganhou recentemente
posição de destaque em diversos
setores da economia.
28

A indústria da construção civil busca agora a maior FIGURA 7 – Principais diretrizes estratégicas para a gestão de fornecedores. *

eficiência e a gestão de riscos na cadeia produtiva,


assim como a fidelização dos principais parceiros co- progressão
merciais. Essa tendência é motivada pela recente ca- criação de novos
rência de mão de obra e pelo ingresso de diversos padrões de mercado
diferenciação
prestadores de serviço no mercado, além da pressão
formação
para reduzir os custos da construção e, consequente, de uma cadeia
retomar o lucro das principais incorporadoras do país. de fornecedores
restruturação
única
Somado a isso, existe a opinião pública que cada vez adaptação da
mais exige a atuação ética e responsável das empresas, cadeia ao modelo
de negócio
e o enrijecimento das instituições fiscalizadoras contra
eficiência
irregularidades nas condições de trabalho, saúde, se- aumento da
gurança, moradia e alimentação dos trabalhadores. produtividade
e da qualidade
Os recentes casos de inclusão de empresas da cons-
conformidade
trução na lista suja do trabalho escravo e o aumento das certificação/
punições aos seus responsáveis são resultados do esforço auditoriais
do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério
Público do Trabalho no combate a condições degradantes Ao longo deste capítulo, analisaremos algumas das
de trabalho. A imprensa e algumas entidades do terceiro principais práticas de gestão de fornecedores adotadas
setor, como a Repórter Brasil e o InPACTO (Instituto Pacto pelas maiores incorporadoras e construtoras do Brasil.
Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo), também Cabe ressaltar que muitas outras iniciativas, não abor-
têm sido protagonistas nesse cenário por seu poder de dadas neste estudo, complementam os processos de
influência sob à opinião pública, que consegue atingir a suprimentos das nove empresas participantes, mas
reputação das marcas e, consequentemente, o resultado buscamos elencar práticas variadas, de modo a mostrar
financeiro das empresas. com clareza a essência da gestão de fornecedores na
*Fonte: Balkan Cetinkaya et al., Sustainable Supply Chain Manage-
As estratégias de gestão de fornecedores podem seguir construção civil e identificar janelas de oportunidade
ment: Practical Ideas for Moving Towards Best Practice, Springer,
diferentes caminhos, como mostra a imagem ao lado. que podem ser exploradas nesse campo. jan. 2011.
29

3.1 Verticalização e contratação apenas de ceiros, busca-se ao máximo que seja de fornecedores
fornecedores locais de serviços especializados locais. Atualmente a empresa possui em torno de 13.000
funcionários, sendo que parte deles, após o encerra-
A MVR e a Direcional Engenharia são as maiores mento de um empreendimento, é deslocada para outra
incorporadoras e construtoras do Brasil especializadas obra na mesma região ou então é desligada da cons-
no desenvolvimento de empreendimentos populares trutora. A rotatividade dos fornecedores, porém, costuma
de grande porte em todo o território nacional. Em ser baixa, o que permite à empresa traçar iniciativas
parceria com o governo federal, atuam na execução voltadas para a fidelização e o desenvolvimento dos
do programa habitacional Minha Casa Minha Vida. principais parceiros comerciais.
O extenso prazo de construção dos grandes em- A MRV, por sua vez, inicialmente optava por um
preendimentos justifica o desenvolvimento de estruturas contingente proporcionalmente maior de prestadores
verticalizadas de trabalho. Tal estratégia privilegia o de serviço em relação à sua própria equipe. Entretanto,
acompanhamento da execução das obras, de modo a essa diretriz se inverteu em função de ocorrências
garantir o cumprimento dos prazos, maior produtividade, relacionadas aos prazos e condições de trabalho por
menor custo e maior controle da qualidade e dos riscos. parte de alguns fornecedores de mão de obra durante
Assim, as empresas podem concentrar a operação em o período de rápido crescimento da empresa. A MRV,
um menor número de empreendimentos, facilitando o então, formalizou sua adesão ao Compromisso Na-
gerenciamento das obras e gerando ganhos de escala. cional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na
Desde sua fundação, a Direcional tem como estra- Indústria da Construção, sendo a primeira e única
tégia trabalhar com a verticalização e especialização empresa do setor de construção leve a integrá-lo.
das equipes em cada um dos processos básicos de uma Atualmente, a meta da MRV é reduzir ao máximo o
construção. Fornecedores de mão de obra são contra- emprego de mão de obra terceirizada, assumindo esse
tados somente para determinados serviços que exijam compromisso perante o Ministério Público do Trabalho
alto grau de especialização e que sejam de curta duração. (MPT) por meio de um TAC (Termo de Ajustamento
A empresa recorre aos fornecedores de serviços gerais de Conduta). O acordo inédito passou a determinar
apenas em situações de carência de mão de obra. De quais eram as atividades passíveis de terceirização
qualquer forma, sempre que há a contratação de ter- no trabalho da companhia, o que trouxe segurança
30

jurídica para que a MRV pudesse desenvolver sua


operação e promover o bem estar social de seus co-
laboradores, inaugurando uma nova etapa de relacio-
namento com o MPT. Em 2014, segundo seu relatório
de sustentabilidade, a empresa já contava com 22.605
colaboradores próprios, que representavam cerca de
70% de sua força de trabalho.
Outras construtoras, mesmo com atuação em
segmentos diferentes e empreendimentos de menor
porte, também adotam a estratégia de verticalização.
É o caso da Moura Dubeux, incorporadora e construtora
que predominantemente atua na região Nordeste, e
que conta com cerca de 70% de mão de obra própria
(aproximadamente 5.000 colaboradores), contratando
apenas os fornecedores de serviços especializados. A
Tecnisa também é reconhecida pelo mercado como
uma das incorporadoras e construtoras de maior
verticalização dentro do segmento residencial. Essa
estratégia torna-se vantajosa nos momentos de au-
mento da demanda, quando é possível a alocação de
toda a equipe de forma ininterrupta. Atualmente, com
a diminuição da demanda, a Tecnisa reduziu o per-
centual de funcionários próprios, conseguindo, assim,
maior flexibilidade para enfrentar os momentos de
desaquecimento do mercado. Hoje a empresa conta
com uma equipe de 2.820 colaboradores, que repre-
senta apenas 33% de sua força de trabalho.
31

3.2 Centralização da área de suprimentos e ne- centralizado de suprimentos. Por outro lado, esse modelo
gociação antecipada de pacotes de serviços para geralmente aumenta o tempo necessário para a reali-
várias obras zação do ciclo de contratação, além de concentrar o
volume de trabalho nas áreas de apoio, o que pode
Uma característica comum a quase todas as em- elevar as despesas administrativas das companhias.
presas do mercado imobiliário brasileiro, e que resulta
em grande medida do seu modelo de negócio, é a
centralização da área de suprimentos. Por se tratar de 3.2.1 Especialização da equipe de suprimentos
um segmento com projetos padronizados, é preferível por tipo de insumo
que as demandas por materiais e serviços das várias
obras sejam reunidas em grandes pacotes e negociadas A Brookfield, construtora e incorporadora de em-
com os diversos fornecedores por uma única equipe preendimentos residenciais e comerciais, iniciou seu
administrativa. Essa estratégia garante às empresas processo de reestruturação da gestão de suprimentos
uma série de vantagens, principalmente as decorrentes em 2012, quando passou a centralizar, inicialmente,
do ganho de escala, da abordagem integrada da cadeia a aquisição de materiais e, posteriormente, a contra-
produtiva e do maior nível de governança. tação de serviços.
A redução dos preços em função do volume de Para que os benefícios da centralização pudessem
material ou serviço contratado; a realização de um ser obtidos em sua plenitude, a empresa optou por
planejamento de suprimentos corporativo, que contribua compradores especializados em cada tipo de insumo
para a alocação otimizada dos principais fornecedores; e serviço. Esse novo foco da equipe de suprimentos
a contratação de materiais e serviços com maior ante- permitiu que seus profissionais se tornassem profundos Para que os benefícios da
cedência, de forma com que os parceiros tenham conhecedores de cada um dos mercados. Com isso, centralização pudessem
melhores condições de se planejar; a coordenação mais foi possível melhorar o conhecimento sobre a realidade ser obtidos em sua
eficiente do relacionamento da empresa com seus e os pontos de atenção de cada empresa, aumentando plenitude, a empresa
fornecedores; a padronização dos processos de con- a eficiência do processo de seleção de fornecedores, optou por compradores
tratação; a redução dos desperdícios e da quantidade além de facilitar a comunicação em proveito do rela- especializados em cada
de aditivos são apenas alguns dos benefícios do modelo cionamento com os parceiros e as equipes de obra. tipo de insumo e serviço.
32

Os demais benefícios da centralização, como a


redução de preços e desperdícios e a padronização
dos fechamentos contratuais, também se traduziram
em ganhos para a empresa. Outra conquista impor-
tante foi a redução dos aditivos, considerado uma das
principais causas dos conflitos entre as construtoras
e seus fornecedores.

3.2.2. Modelo de remuneração variável específico


para a equipe de suprimentos

O ano de 2000 marcou o início do processo de


reestruturação da área de suprimentos da MRV. O
pessoal desse departamento passou de três para 172
profissionais a partir do movimento de centralização
das aquisições de materiais, equipamentos e serviços
estratégicos com maior valor agregado (fundações,
demolições, terraplenagens, pavimentações, redes
elétricas, entre outros), em um trabalho conjunto com
a área de produção.
O que difere a gestão de suprimentos da MRV em
relação às demais construtoras é a criação de um me-
canismo de remuneração variável para a equipe dire-
tamente envolvida nas contratações. Os profissionais
da área de suprimentos são divididos em trinta equipes,
que possuem tanto metas coletivas quanto individuais.
33

O prêmio adicional, porém, se dá por equipe, e não


individualmente, o que estimula a colaboração do grupo
para se atingir as metas individuais. Essas metas são
compostas por diversos fatores, como preço, prazo de
pagamento, qualidade, pontualidade, além de critérios
trabalhistas rígidos, que incluem a proibição do uso de
trabalho infantil, trabalho escravo ou práticas discrimi-
natórias. O mecanismo de bonificação trouxe resultados
crescentes para a empresa nos últimos anos. FIGURA 8 – Mecanismo de geração dos problemas sociais na cadeia produtiva (círculo vicioso)

Baixa produtividade
das pequenas e
3.3 Práticas de conformidade médias empresas

Por meio da análise das principais estratégias de


Precarização das
gestão de fornecedores das construtoras brasileiras,
condições de trabalho
fica bastante evidente a convergência na questão da
conformidade, de modo a minimizar os riscos para a
empresa e seus dirigentes, mas sem sugerir uma ação
Aumento
abrangente e eficaz para reduzir os problemas sociais
dos custos
na cadeia produtiva. De qualquer maneira, é essencial
ressaltar a necessidade das medidas de conformidade,
ainda que insuficientes, uma vez que as rigorosas
exigências das empresas aos seus fornecedores aca-
Aumento da pressão
social e fiscalização
bam por encarecer os custos, ampliando o problema
da falta de competitividade dos fornecedores, o que
contribui para a manutenção dos problemas sociais. Maior controle da
cadeia (auditoriais)
34

3.3.1 Controle das obrigações legais dos informando se o fornecedor possui alojamentos, quais
fornecedores os respectivos endereços, e a relação dos nomes e do-
cumentos de identidade e de procedência dos trabalha-
O crescente processo de formalização das empresas dores alojados. Muitas construtoras previamente visitam
e dos profissionais do setor, a intensificação da fisca- os alojamentos administrados pelos prestadores para
lização em relação às condições de trabalho, saúde e verificar se atendem à legislação vigente. Os contratos
segurança na construção civil e as cobranças do de prestação de serviço também passaram a incluir,
mercado financeiro e de capitais por avanços nos além de cláusulas específicas anticorrupção e de proi-
padrões de governança corporativa contribuem para bição do trabalho infantil e do análogo ao escravo, uma
a melhoria dos mecanismos de controle das grandes série de multas e condicionantes, culminando na rescisão
construtoras sobre o cumprimento das obrigações contratual, caso seja identificado o descumprimento
legais em sua cadeia produtiva. integral ou parcial das obrigações trabalhistas, tributárias
Várias medidas foram implementadas com esse e relativas à saúde e segurança do trabalho. Os fornece-
objetivo. Durante o processo de cadastramento de novos dores também devem apresentar à construtora, antes
fornecedores, por exemplo, é exigida uma série de do- de iniciar os serviços, os documentos pessoais dos
cumentos e certidões; são realizadas visitas técnicas empregados que atuarão na obra, como carteira de
para verificar o histórico de desempenho e a saúde fi- trabalho, atestado de saúde ocupacional (ASO), certificado
nanceira das empresas prestadoras de serviço e seus de treinamento da integração de segurança do trabalho,
sócios, assim como de outras empresas de propriedade além das documentações exigidas pela lei, para que a
dos mesmos controladores, ativas ou já extintas, com contratação possa ser efetivada e a entrada dos traba-
consultas a órgãos de proteção ao crédito, agentes do lhadores seja autorizada no canteiro.
mercado imobiliário e outras fontes de informação. Durante a execução dos serviços, as construtoras
Após o cadastramento, os fornecedores passam por intensificam o rigor e a frequência das ações de acom-
verificações ainda mais rigorosas durante o processo de panhamento das prestadoras. Medidas como a retenção
concorrência para contratação. Além da atualização dos de pagamento ao fornecedor no caso de entrega inade-
dados, documentação e certidões exigidos no processo quada dos comprovantes de depósito dos salários, dos
anterior, é comum a assinatura de um termo específico benefícios aos trabalhadores e do recolhimento de im-
35

postos, ou na ausência de envio do termo atualizado 3.3.2. Fiscalização das condições de


com as informações sobre os alojamentos, têm sido saúde e segurança do trabalho nas obras
bastante comuns. Muitas construtoras continuam e nos alojamentos
acompanhando a condição econômico-financeira de
seus fornecedores, de modo a prevenir irregularidades, Outra prática que se tornou frequente nos últimos
tendo condições de intervir com antecedência caso anos é a realização de auditorias internas e externas
constatem alguma situação de risco. Dessa forma, em relação ao atendimento das obrigações por parte
reduzem-se as chances de que os custos das regula- dos fornecedores. Tais auditorias se responsabilizam
rizações trabalhistas por parte de seus fornecedores pela verificação da documentação dos fornecedores e
recaiam sobre as empresas contratantes. de seus empregados, checam as condições de segu-
A Moura Dubeux é uma incorporadora e construtora rança ao longo de toda a obra e frequentemente visitam
que segue rigidamente essas práticas. Ciente de que seu os alojamentos administrados pelos prestadores de
campo de conhecimento e seu diferencial competitivo serviço contratados. Geralmente, as auditorias trabalham
não estão relacionados à natureza da atividade de com- com base em uma amostra representativa e possuem
pliance, optou por trabalhar com uma empresa terceirizada periodicidade variada, podendo ser bimestral ou até
que, atualmente, é responsável pelo controle das obriga- semanal nos casos mais críticos. O produto desse tra-
ções legais de todos os seus fornecedores. Nesse caso, balho são informações em tempo real sobre eventuais
o trabalho não se baseia em uma amostra, mas sim no irregularidades, assim como orientações para que elas
controle integral. Trata-se de uma empresa especializada sejam sanadas. Algumas empresas apresentam essas
que, no lugar da construtora, faz esse trabalho com muito informações à sua diretoria por meio de um portal de Geralmente, as auditorias
mais eficiência, de forma a eliminar qualquer possível gestão das obras, com fotos e outras evidências, ou trabalham com base
conflito de interesse e diminuir o risco trabalhista. Segundo mesmo por meio dos tradicionais relatórios impressos, em uma amostra
a Moura Dubeux, sua cadeia produtiva é relativamente de modo a garantir a documentação do processo de representativa e possuem
estável e seu processo de homologação bastante exigente, monitoramento. Quando se trata de auditorias internas, periodicidade variada,
o que acaba restringindo o número de parceiros habilitados usualmente estas são realizadas pela equipe de segu- podendo ser bimestral
a trabalhar com a construtora, mas que contribui para a rança do trabalho, mas muitas empresas já contam ou até semanal nos casos
redução do risco na gestão de suprimentos. com o apoio de empresas de auditoria terceirizadas, o mais críticos
36

que garante maior nível de governança ao processo. mento, arquivamento e transferência de dados. Isso
Ao constatarem irregularidades, algumas construtoras inclui uma série de softwares, como o CAD (Computer
exigem a sua imediata solução pelos fornecedores, Aided Design), o BIM (Building Information Modeling)
enquanto que outras se antecipam, sanando a questão e sistemas de gestão, que tornam mais eficientes os
por conta própria, descontando os custos dos valores processos de logística, o controle de documentações,
a serem pagos aos subempreiteiros. o acompanhamento de indicadores e a redução de
Como dito anteriormente, esses processos de despesas administrativas por viabilizarem a integração
acompanhamento da cadeia produtiva representam de todos os stakeholders envolvidos no projeto.
altos gastos para as construtoras, tanto financeiros Uma iniciativa neste sentido foi encabeçada pela
quanto de tempo da equipe interna, muitas vezes Even, construtora e incorporadora do segmento resi-
chegando a desviar o foco dos funcionários em relação dencial. Se por um lado o aumento do rigor das cons-
à atividade principal da empresa: incorporação e trutoras no acompanhamento da documentação de
construção. Tais custos não devem ser desconside- seus fornecedores e de seus trabalhadores representa
rados na análise dos processos de gestão de supri- a melhora da gestão de riscos na cadeia produtiva, por
mentos, pois a economia que se tem ao contratar um outro lado acarreta maiores custos administrativos para
fornecedor com preço muito abaixo de seus concor- as construtoras, uma vez que esse controle normalmente
rentes pode acarretar elevados custos de monitora- é feito em cada obra e, até pouco tempo atrás, por meio
mento e gestão de riscos, tornando a relação custo de processos manuais, que requeriam recursos humanos
-benefício desvantajosa para a empresa. e consumiam muito tempo, além de serem mais sus-
cetíveis a falhas na verificação e no processamento das
informações. Do ponto de vista dos subempreiteiros, o
3.3.3 Portal de gestão de documentação de processo era altamente ineficiente e custoso, porque a
fornecedores cada nova obra o fornecedor precisava entregar nova-
mente toda a documentação de sua empresa e dos
Uma tendência mundialmente verificada na in- trabalhadores que atuariam na obra, mesmo que já
dústria da construção civil é a utilização da Tecnologia tivesse prestado ou até mesmo estivesse prestando
de Informação e Comunicação (TIC) para processa- serviços para a construtora em outra obra.
37

Ciente da ineficiência causada por esse gargalo de desenvolvimento, elas deixaram de aproveitar a
operacional, a Even desenvolveu com uma empresa sinergia com as demais construtoras, em um campo
de tecnologia um sistema de gestão que pudesse facilitar no qual se ganha colaborando, não competindo.
o arquivamento e acompanhamento da documentação
das empresas prestadoras de serviços e de seus fun-
cionários. A partir desse sistema, o fornecedor necessita 3.3.4. Controle de acesso ao canteiro de obra
apenas atualizar as informações e seus comprovantes,
além de poder compartilhar esse cadastro com outras Além dos benefícios relatados anteriormente, os
empresas que utilizem o mesmo sistema. Essa iniciativa sistemas de gestão da documentação de terceiros
possibilitou a redução de custos, o aumento de eficiência também permitem a restrição automatizada do acesso
e da governança para as construtoras, porém o mais de funcionários com documentação irregular ao local
importante foi a significativa redução de custo e de de trabalho. Dada a quantidade de operários que
retrabalho operacional para os subempreiteiros. circula diariamente nos canteiros durante uma obra,
Outras construtoras e incorporadoras, como a essa preocupação não deve ser desprezada.
Cyrela, presente há mais de cinquenta anos no mer- O controle de acesso ao canteiro de obras via
cado imobiliário brasileiro, e a Tecnisa, também se- catraca, crachá, biometria ou outros mecanismos de
guem a tendência de informatização da gestão de segurança já são adotados por várias construtoras,
suas cadeias produtivas, desenvolvendo sistemas de como Cyrela, Tecnisa e Brookfield, que relatam só
informática próprios ou usando tecnologias do mer- terem se beneficiado com a prática.
cado. Apesar do ganho de eficiência gerado por ini-
ciativas individuais como essas, o esforço coletivo no
desenvolvimento de um sistema único que reunisse 3.3.5. Suporte administrativo aos fornecedores O controle de acesso
informações dos prestadores de serviço de todo o ao canteiro de obras via
mercado seria muito mais vantajoso, uma vez que as Mesmo tendo reduzido significativamente o seu catraca, crachá, biometria
grandes construtoras costumam trabalhar com vários contingente de trabalhadores terceirizados, a MRV ou outros mecanismos de
fornecedores em comum. Se cada empresa encabeçar continua investindo para oferecer apoio e orientação segurança já são adotados
isoladamente projetos como esse, além do alto custo à sua equipe de prestadores de serviços, de modo a por várias construtoras
38

minimizar qualquer possibilidade de precarização 3.3.6. Seguro contra riscos trabalhistas


das relações entre fornecedores e seus trabalhadores.
A empresa criou o Departamento de Apoio ao Em- Uma prática recente no mercado da construção
preiteiro (DAE), responsável por orientar os fornece- civil brasileiro é a análise do passivo trabalhista (valor
dores sobre as diversas legislações aplicáveis a eles, das ações trabalhistas e volume relativo de ações em
além de esclarecer dúvidas a respeito dos procedi- relação à quantidade de trabalhadores) dos fornecedores
mentos exigidos pela própria empresa. Mais do que no momento da contratação do serviço. Não é novidade
contribuir para a redução dos riscos na cadeia pro- que, quando uma empresa prestadora de serviços
dutiva, essa iniciativa acaba por acelerar o processo quebra, são as grandes construtoras que acabam por
de desenvolvimento e adequação de seus fornecedores arcar com os custos da regularização das rescisões
a diversas obrigações legais, garantindo maiores trabalhistas. Mesmo que o fornecedor não quebre, os
chances de que os funcionários terceirizados estejam processos trabalhistas representam um dos maiores
trabalhando em condições regulares e dignas. riscos das empresas de mão de obra, e muitas vezes
Na Tecnisa, o empreendedorismo é estimulado recaem sobre as construtoras contratantes.
entre os funcionários que se destacam, e sua contra- Para evitar surpresas no desempenho das obras, a
tação é priorizada pela construtora, que oferece a eles Brookfield passou a exigir de seus fornecedores a assi-
apoio administrativo em diversos campos. Isso está natura de um seguro contra riscos trabalhistas. Atual-
longe de ser uma estratégia para baratear custos, uma mente, esse plano cobre em média 25% do valor do
vez que a terceirização não garante necessariamente contrato com o prestador de serviço, sendo que seu custo
a redução das despesas e ainda aumenta os riscos da é arcado pelo próprio fornecedor, representando apro-
operação. A iniciativa da empresa se baseia na tese de ximadamente 2% do valor do contrato. Para cobrir essa
que incentivar os profissionais competentes a em- despesa adicional, certamente os fornecedores acabam
preenderem contribui para avanços não só no desem- por inserir o custo do seguro em seus orçamentos,
penho técnico, mas também na condição socioeco- acrescendo, assim, o custo final da obra. De qualquer
nômica do profissional, que deixa de ser funcionário maneira, esta iniciativa garante maior segurança para a
e passa a ser um empresário, com boas chances de Brookfield, além de maior previsibilidade sobre o de-
crescimento, caso o negócio seja bem administrado. sempenho financeiro de seu portfólio de construções.
39

3.4 Critérios de seleção e de avaliação de acompanhamento sejam intensificados, na tentativa


fornecedores de mitigar ao máximo o risco assumido.
Entretanto, a contratação de fornecedores que
É comum a adoção de critérios de seleção e ava- representam grandes riscos ainda é prática recorrente
liação de fornecedores que contemplem capacitação nas grandes construtoras. A evolução verificada re-
técnica, histórico de desempenho, qualidade do centemente foi em relação à percepção e ao compar-
serviço, prazo para execução das atividades, além tilhamento do nível de risco dentro das companhias,
das condições comerciais e de conformidade legal. e aos rigorosos processos de monitoramento que se
A novidade verificada nos departamentos de supri- desenrolam ao longo da obra.
mentos de algumas das grandes construtoras, ainda O caminho oposto, ou seja, o de tentar reduzir ao
que em fase inicial, é uma abordagem que incorpora máximo o nível de risco desde a seleção dos prestadores
a gestão de riscos de modo sistemático e intencional, de serviço, também é trilhado por algumas outras grandes
assim como a de aspectos técnicos e comerciais. Os construtoras, a exemplo da Moura Dubeux, onde as
compradores e gestores passaram, então, a ser re- exigências para o processo de homologação são tão
conhecidos e cobrados não apenas pelas boas ne- grandes que acabam reduzindo significativamente o
gociações realizadas. Espera-se que seu comporta- número de fornecedores habilitados a trabalhar para a
mento seja semelhante ao dos profissionais de empresa. Trata-se de um trade-off entre ter maior dis- A novidade verificada
investimento na análise das concorrências e avaliação ponibilidade de prestadores de serviço ou manter os nos departamentos de
do desempenho dos fornecedores ao longo da obra. riscos em um nível aceitável, devendo a empresa buscar suprimentos de algumas
Considerando esta lógica, geralmente os altos ganhos um ponto de equilíbrio nesse dilema corporativo. das grandes construtoras,
acompanham riscos elevados. A melhoria dos processos de suprimentos também ainda que em fase inicial,
No caso das construtoras que já incorporam essa se traduz no maior nível de governança e transparência é uma abordagem que
interpretação ao processo de seleção e avaliação dos para as construtoras, por meio do compartilhamento incorpora a gestão de
fornecedores, como é o caso da Even, é importante da tomada de decisão em comitês específicos e da riscos de modo sistemático
que as contratações de prestadores de serviço que corresponsabilidade no caso de perdas causadas por e intencional, assim
impliquem grande risco à companhia tenham o aval escolhas malsucedidas, atingindo direta ou indireta- como a de aspectos
da direção da empresa, e que seus mecanismos de mente os principais envolvidos. técnicos e comerciais.
40

Ainda assim, são poucas as construtoras que real- FIGURA 9 – Gráfico: Relevância das alavancas de produtividade.

mente adotam critérios de sustentabilidade na seleção


e avaliação dos prestadores de serviço, sendo que, Planejamento de
geralmente, o fazem por força de alguma legislação epreendimentos

específica. Isso cria um amplo espaço de oportunidades


para aperfeiçoar as práticas de gestão de fornecedores, Melhorias
já que o maior peso na análise dos processos de con- de projeto

corrência continua a recair sobre os critérios técnicos


Qualificação
e, principalmente, comerciais. da mão de obra

Métodos 9%
3.5 Planejamento de obra de gestão

Uma prática em que grande parte das construtoras Métodos


construtivos
teria espaço para evoluir, com impactos positivos no
desempenho financeiro. É a isso que se refere o pla-
Equipamentos
nejamento de obra.
Segundo pesquisa realizada pela EY, em parceria
17
com a Escola Politécnica da USP , com 74 executivos Materiais
da construção civil no Brasil, a principal alavanca para
o aumento da produtividade no setor é o planejamento
dos empreendimentos, já que este continua sendo um
entrave, apesar de ter sido aprimorado nos últimos
anos. Também foram citados na pesquisa, e conside-
rados como muito relevantes, as melhorias de projetos,
a qualificação da mão de obra e a adoção de métodos Fonte: EY, Estudo sobre Produtividade na Construção Civil: Desafios e 17. EY, Estudo sobre Produtividade na Construção Civil: Desafios e
de gestão (como ilustra a figura a seguir). Tendências no Brasil, 2014. Tendências no Brasil, 2014.
41

Os resultados dos últimos anos da Eztec – incor- assim a exposição de capital necessária para viabilizar
poradora e construtora com sede em São Paulo, res- a construção, sendo esses alguns dos fatores deter-
ponsável também pela venda de seus imóveis resi- minantes da rentabilidade do empreendimento.
denciais e comerciais –, confirmam essa ideia. Em No que se refere aos fornecedores, o detalhamento
2007, a empresa concretizou a compra de uma com- do planejamento da obra e o compartilhamento an-
panhia especializada no planejamento de obras, com- tecipado dos dados relacionados aos serviços torna o
posta por profissionais altamente qualificados no tema, trabalho mais previsível. O subempreiteiro consegue
que continuaram a trabalhar de modo independente dimensionar e reservar a equipe necessária, reduzir
ao da equipe de execução da obra, garantindo o rígido custos evitando retrabalhos e atrasos inesperados, e
controle interno de custos, prazos e qualidade. Trata- diminuir o nível de incertezas devido ao maior deta-
se de uma aquisição estratégica, porque investir em lhamento do projeto, entre outras vantagens. Para que
um bom planejamento certamente trará uma série de isso seja possível, em decorrência também da con-
benefícios, como a redução de custos e elevação das centração geográfica de sua área de atuação, a Eztec
margens de lucro, conhecimento profundo dos riscos trabalha com um número reduzido de fornecedores
e a implementação de ações para sua mitigação, di- de mão de obra (cerca de cinquenta prestadores de
minuição da quantidade da mão de obra necessária, serviço), que se tornaram parceiros estratégicos, dando
equilíbrio financeiro pela ausência de endividamento preferência por trabalhar com a construtora, inclusive
corporativo, além da possibilidade de reduzir o prazo oferecendo benefícios comerciais por conta do rela-
de construção, entre diversas outras vantagens. cionamento de longo prazo.
Desde a compra do terreno até o lançamento do Outra empresa que igualmente investe na etapa
empreendimento, a Eztec leva em torno de dois anos, de planejamento das obras é a Cyrela, que estimula a
pois se preocupa em lançar um produto adequado e participação conjunta das áreas de desenvolvimento
planejado com precisão, já que os ganhos decorrentes imobiliário, planejamento de obra e engenharia desde
desse trabalho detalhado compensarão o acréscimo a compra do terreno, garantindo que as premissas da
de tempo à execução do projeto. Isso se confirma com definição do produto, elaboração do projeto, do orça-
o fato de que a empresa apresenta um dos melhores mento, e estudo de viabilidade sejam factíveis e ali-
índices de vendas a partir do lançamento, reduzindo nhadas previamente. Isso envolve a análise de questões
42

técnicas, financeiras, de recursos humanos e relacio- clusão do pavimento térreo, a liderança da execução é
nadas ao prazo, de modo que todas sejam definidas, transferida para o engenheiro responsável. Assim como
em comum acordo, antes do lançamento do empreen- no caso da Eztec, o maior alinhamento entre os envol-
dimento. Essa corresponsabilidade pode ser ilustrada vidos e o aumento da previsibilidade garantida pelo
pelo fato de a implantação da obra e o início de sua bom planejamento da obra conferem benefícios seme-
execução ficarem a cargo do gestor que realizou seu lhantes à Cyrela, além de possibilitar a sinergia opera-
planejamento. É ele quem define a equipe de enge- cional e a economia de escala nas negociações ante-
nheiros e técnicos, contrata o projeto executivo, implanta cipadas dos pacotes de materiais e de serviços para
o canteiro, atualiza o orçamento da obra e seleciona várias obras. Assim, a empresa também acaba por fi-
alguns dos fornecedores, em especial os relacionados delizar os seus principais fornecedores, desenvolvendo
aos serviços gerais e à fundação. Somente após a con- uma relação estável e de longo prazo.
43

Skanska & Rockwool: uma parceria de sucesso portanto, dependia da completa confiança entre as
na cadeia produtiva empresas, principalmente porque todas as informações
de custos tinham que ser reveladas.
Em 1994, a Skanska, empresa líder em construção Um fator fundamental para o sucesso da iniciativa
civil na Suécia, decidiu firmar contratos de longo prazo foi a inclusão, no acordo de parceria, da definição prévia
com seus fornecedores mais importantes, visando sobre como seria a distribuição dos resultados da re-
aumentar a eficiência na cadeia produtiva. A Rockwool dução dos custos entre as duas empresas. Isso porque,
era um fornecedor de material isolante para a Skanska. em alguns casos, havia a necessidade de aumentar os
As duas empresas formaram uma parceria de três custos em uma parte do processo, mas apenas como
anos, com o objetivo de reduzir os custos na produção estratégia para aumentar a eficiência e permitir a re-
e no fornecimento do produto. dução dos custos em toda a cadeia produtiva. Houve
O ponto de partida foi a realização de um levanta- muita discussão para se chegar a um acordo sobre
mento detalhado dos custos totais envolvidos na como “dividir o bolo” e como “fazer o bolo crescer”, mas
produção e na distribuição. Entretanto, é comum que os resultados obtidos pela parceria mais que compen-
parte dos custos não seja conhecida com exatidão, e saram os impactos das mudanças realizadas.
seja desconsiderada no cálculo dos preços e nas ne- A Skanska adotou, posteriormente, o mesmo mo-
gociações entre as empresas da cadeia, mesmo que delo com seus principais fornecedores, o que possi-
contínuas e regulares. Isso acontece, por exemplo, bilitou reduzir de mil para oitenta o número de forne-
com os custos de transação e de comunicação. O cedores, além de garantir excelentes resultados
18
acordo de parceria entre a Skanska e a Rockwool, operacionais e financeiros.

18 Informações retiradas de Thomas E. Vollmann, Carlos Cordon e Jussi Heikkila, Skanska & Rockwool: Making the Supply Chain Partnership
Work, IMD, 2003.
44

3.6. Estímulo à ampliação da capacidade de


atendimento de fornecedores

Além de contribuir para o aumento da previsibilidade


e da fidelização de fornecedores, um bom planejamento
permite à construtora detectar períodos e insumos
críticos ao longo da obra, assim como desenvolver
ações para evitar suas consequências negativas.
Nos momentos de maior aquecimento do mercado,
além da orientação oferecida pelo DAE (Departamento
de Apoio ao Empreiteiro), a MRV adotou como estra-
tégia o incentivo à ampliação da capacidade de pro-
dução de alguns de seus fornecedores por meio do
estímulo ao financiamento via agente financeiro do
grupo MRV – Banco Intermedium.
Com essa iniciativa, a construtora ganhou a pre-
ferência de seus parceiros comerciais mais importantes,
garantindo assim os recursos humanos e materiais
para a viabilização de seus empreendimentos.
Para os fornecedores, o capital investido garante
a concretização dos negócios futuros com a MRV,
permitindo que possam se organizar com antecedência
e até expandir suas atividades.
45

3.7. Padronização dos processos construtivos da Cyrela por um sistema de informação interno. Esses
registros são continuamente revisados, de modo a
O modelo de negócio das principais incorporadoras incorporar as inovações testadas e aprovadas pela
e construtoras brasileiras pressupõe o desenvolvimento empresa, com foco na melhoria constante da produ-
e a implantação de projetos padronizados em uma tividade. Para isso, os fornecedores contratados tam-
mesma empresa, com alguma diferenciação dos pro- bém têm acesso às informações dos processos sob
dutos por segmento, principalmente no que se refere sua responsabilidade. Além de contribuir para a qua-
à planta, fachada e tipo de acabamento. De qualquer lidade, essa medida torna mais produtiva a execução
forma, em relação aos processos construtivos, existe do trabalho pelo prestador de serviço, favorecendo,
uma grande padronização das técnicas adotadas. assim, a redução de custos e de retrabalhos, o que
Para garantir o máximo de qualidade do produto facilita o cumprimento dos prazos.
final e a satisfação do cliente, assim como a redução A padronização dos processos construtivos também
de prazos, custos e retrabalhos, tanto a Cyrela quanto é uma prática frequente nas incorporadoras e cons-
a Eztec investiram na padronização e registro de todos trutoras que atendem o Programa Minha Casa Minha
os seus processos construtivos. Quando se tem a qua- Vida. Nesse caso, todas as edificações são similares,
lidade como um dos seus principais atributos, como é fazendo com que o canteiro se transforme em uma
o caso da Cyrela, as práticas de gestão do conhecimento grande linha de produção. Além da padronização, os
se tornam fundamentais para corresponder às expec- processos são pautados por metas de construção e
tativas criadas pela reputação da empresa. Além disso, executados pelas próprias equipes, divididas em células
o negócio da construção é uma atividade dependente especializadas, o que permite a replicação em larga A padronização dos
da expertise técnica dos profissionais que a conduzem, escala, com rapidez e eficiência, mantendo os custos processos construtivos
de modo que criar formas de sistematizar e institucio- e a rentabilidade em níveis bastante competitivos. também é uma
nalizar o conhecimento acumulado ao longo de toda a prática frequente
trajetória da empresa é a melhor maneira de valorizar nas incorporadoras e
ainda mais o seu principal ativo . construtoras que atendem
Orientações detalhadas para a realização dos pro- o Programa Minha Casa
cessos construtivos estão disponíveis aos colaboradores Minha Vida.
46

3.8. Inovação em tecnologia e sistemas Alguns equipamentos também têm sido utilizados
construtivos para melhorar a produtividade e a qualidade, além de
reduzir a demanda por mão de obra devido aos sis-
Ainda que tenham sido verificados avanços recentes temas de informação e projetos digitais. O equipamento
no que se refere à inovação de materiais e processos de hidrodemolição, o robô de controle de qualidade
construtivos, o mercado brasileiro ainda é caracterizado da execução, a máquina de rebocar, o construtor de
pelas reduzidas oferta e adoção de novas tecnologias paredes, a pavimentadora de pisos de concreto inter-
quando comparado ao resto do mundo. travados são alguns exemplos dos avanços no campo
A construção híbrida (combinação de elementos da mecanização do trabalho.
moldados in loco e pré-fabricados), a construção No Brasil, tanto a Tecnisa quanto a Gafisa – incor-
modular (unidades bi ou tridimensionais produzidas poradora e construtora com atuação no Rio de Janeiro
antes do transporte ao canteiro), além dos pré-fabri- e em São Paulo –, estão constantemente buscando
cados (peças já prontas para instalação), são sistemas novos materiais e processos construtivos que tragam
construtivos encontrados com bastante frequência vantagens operacionais e maior qualidade para o
nos grandes empreendimentos do país. cliente final. Melhorias simples, como a colocação de
Em relação aos materiais, podem ser destacadas andaimes com blocos na mesma altura da execução
algumas tendências setoriais. O concreto autoadensável do serviço ou a utilização de bisnagas de argamassa,
aumentou a produtividade exigindo menos mão de já são consideradas práticas comuns. No caso do
obra, além de diminuir falhas na concretagem por sua programa Minha Casa Minha Vida e outros grandes
elevada fluidez dispensar o adensamento na aplicação. empreendimentos, torna-se viável a implantação de
O impacto da utilização desse tipo de concreto sobre fôrmas de alumínio para a execução de paredes de
a produtividade, em obras convencionais, pode ser concreto, o que, segundo a MRV, reduz o prazo da
medido pela redução da equipe de concretagem, que etapa construtiva de um bloco de cinco pavimentos
19
passou de doze para dois trabalhadores . Outro exem- de doze para oito meses.
plo são os ligantes de baixo impacto ambiental, que Apesar disso, umas das principais dificuldades
são produzidos pela ação de bactérias e reduzem o apontadas pelas construtoras é a falta de padronização 19. FIESC, PDIC2022: Programa de Desenvolvimento Industrial
consumo de cimento tradicional. nas medidas dos materiais de construção dos diversos Catarinense, 2013.
47

fabricantes, além do fato de a elaboração dos projetos os próprios fabricantes de materiais passassem a exe-
arquitetônicos não optar por metragens que contribuam cutar os serviços de implantação de seus produtos nas
para a otimização da construção. Nesse caso, o objetivo obras, como fizeram os fabricantes de portas e caixilhos
principal é o máximo aproveitamento do terreno, vi- de alumínio. Além disso, deveriam ser criados estímulos,
sando a viabilidade financeira do empreendimento e, tanto para os fornecedores desenvolverem novas tec-
em segundo plano, amenizar os impactos negativos nologias quanto para o mercado da construção civil
causados pela obra. prosseguir, de modo constante, a adotar inovações em
Outra dificuldade indicada pelas construtoras é a materiais, sistemas ou processos construtivos.
resistência de grande parte dos fornecedores de mão
de obra em adotar novos materiais e tecnologias que
contribuam para a produtividade dos serviços. É o
caso das telas soldadas para concreto armado, mais
caras que o material convencional para a execução
da armação, mas que em compensação aumentam
significativamente a velocidade do serviço. Uma vez
que a construtora é responsável pela aquisição dos
materiais e assume o custo pela compra das telas, o
prestador responsável por esta atividade poderia con-
ceder um desconto no preço final, visto que seu trabalho Apesar de reconhecerem
será bastante facilitado, reduzindo o número de tra- a contribuição para o seu
balhadores e o prazo necessário para sua execução. negócio, os fornecedores
Na prática, porém, não é o que ocorre. Apesar de re- não concordam que seu
conhecerem a contribuição para o seu negócio, os faturamento seja alterado
fornecedores não concordam que seu faturamento e, assim, não incentivam
seja alterado e, assim, não incentivam as construtoras as construtoras a investir
a investir na melhoria dos processos nas obras. na melhoria dos processos
Uma solução para esses entraves seria possível caso nas obras.
48

Precon Engenharia: prédios quase prontos antes samente iguais, construídos dessa maneira na região
de a obra começar metropolitana de Belo Horizonte.
Seguindo um sistema baseado em estruturas pré- Os benefícios do modelo são amplos. A geração
fabricadas, a construtora mineira entrega prédios na de resíduos é reduzida em 85%, contribuindo para a
metade do tempo, causando menos impactos ambientais. diminuição do consumo de água, energia e outros
Vista de cima, a construção pela Precon de dois recursos naturais. Como o ciclo da obra é curto, os
edifícios de oito andares parece até um brinquedo de compradores, que adquirem o imóvel pelo programa
montar. Um a um, pilares, vigas, paredes, lajes – trazidos Minha Casa Minha Vida, conseguem se mudar o
prontos da fábrica – são encaixados entre si em poucos quanto antes. Já a maioria dos funcionários da Precon,
minutos. E assim, sem quebradeira nem desperdício, com o tempo, acabam deixando o canteiro de obras
dez profissionais entregam o empreendimento pronto para trabalhar na unidade industrial da empresa, onde
em apenas quarenta dias, menos da metade do tempo são produzidas as estruturas pré-fabricadas, num
gasto em uma obra convencional. ambiente mais seguro e estável.
Fruto de quinze anos de pesquisa e desenvolvi- Desde 2010, quando fez o projeto piloto do novo
mento, o sistema construtivo da Precon Engenharia, modelo, a construtora vem ajustando a linha de produção
especializada em estruturas pré-fabricadas de concreto e as obras, no empenho por maior eficiência. A empresa
e incorporação imobiliária, é a primeira experiência pretende continuar o investimento em inovação nos
em larga escala, no Brasil, da aplicação de conceitos próximos anos, com a vontade de reduzir em 6% o custo
de industrialização na área habitacional. Por ano, são de cada apartamento, em 25% o prazo de montagem
20
2.000 apartamentos de 47 metros quadrados, rigoro- da obra, e em 10% a geração de resíduos.

20. Informações retiradas do Guia Exame de Sustentabilidade 2015.


49

3.9. Programa de desenvolvimento de


fornecedores

Cientes do grau de interdependência e dos riscos


aos quais estão expostas em função de sua cadeia pro-
dutiva, seja em termos de respeito à legislação ou de
satisfação do cliente, algumas construtoras desenvol-
veram programas para a capacitação de seus fornece-
dores. Essas iniciativas variam em termos de abrangência,
assim como de formato e de conteúdo abordado.
No ano de 2012, a Even realizou um programa de
desenvolvimento para fornecedores de serviços reali-
zado em parceria com o Sebrae. A iniciativa teve como
foco aprimorar o conhecimento técnico dos fornece-
dores, de modo que consigam melhorar o controle de
caixa e aumentar o capital de giro, ampliar a sensibili-
zação interna sobre as práticas sustentáveis e motivar
os colaboradores para torná-las mais modernas, pro-
dutivas e competitivas. O programa foi realizado em
21
três módulos com a participação de 19 empresas .
A Gafisa, por sua vez, iniciou um programa de
capacitação de fornecedores em 2014, também em
parceria com o Sebrae. Visando reduzir o volume de
reclamações recebidas no atendimento pós-obra, a
iniciativa teve como meta aprimorar o nível de conhe-
cimento técnico e de gestão dos pequenos fornecedores
de assistência técnica. 21 Even, Relatório Anual e de Sustentabilidade 2012, 2013.
50

Com o objetivo de garantir condutas responsáveis da motivação original pela qual foram criados. Certa-
e práticas alinhadas aos seus valores corporativos, a mente quando as iniciativas de desenvolvimento da
Tecnisa realiza workshops periódicos com seus prin- cadeia produtiva passarem a focar a produtividade e a
cipais fornecedores para tratar sobre as principais geração de valor, tanto para os subempreiteiros e seus
políticas da empresa no que se refere às ações e práticas empregados quanto para as empresas, os resultados
de compliance, assim como para conscientizá-los e se tornarão evidentes, e a relevância de tais programas
orientá-los sobre questões sociais relativas ao trabalho será percebida por todos os stakeholders envolvidos.
escravo, infantil e medidas anticorrupção, entre outras
de relevância para o setor.
Em relação à capacitação dos trabalhadores ter-
ceirizados, praticamente todas as grandes incorpora-
doras e construtoras desenvolvem alguma iniciativa
nesse sentido. São programas de alfabetização e de
inclusão digital no canteiro de obra, ou cursos profis-
sionalizantes em especialidades do setor, geralmente
desenvolvidos em parceria com o Sesi e Senai, ou Ainda que os avanços
mesmo ministrados por colaboradores próprios. verificados no campo
Ainda que os avanços verificados no campo do do desenvolvimento de
desenvolvimento de fornecedores no Brasil contribuam fornecedores no Brasil
para melhorar a eficiência da cadeia produtiva, as contribuam para melhorar
iniciativas existentes na construção civil ainda são a eficiência da cadeia
pouco abrangentes em termos de conteúdo e de pú- produtiva, as iniciativas
blico beneficiado. Desconsideram os desafios indivi- existentes na construção
duais de cada negócio, não apresentam inovação em civil ainda são pouco
seu formato, nem aferem os resultados econômicos, abrangentes em termos
sociais e ambientais. Talvez os efeitos ainda modestos de conteúdo e de
de tais programas sejam, em boa medida, consequência público beneficiado
51

Seconci, Sinduscon e Sebrae: unindo esforços gestão das empresas.


para o desenvolvimento do setor Complementando as oficinas coletivas, conduzidas
por profissionais das três instituições, a metodologia
No ano de 2013, o Seconci-Rio, o Sinduscon-Rio também contou com consultorias individualizadas,
e o Sebrae-RJ conceberam o Programa de Desenvol- realizadas por uma equipe do Sebrae nas dependências
vimento de Empreiteiras. A iniciativa partiu de uma das empresas participantes, para facilitar a compreen-
solicitação da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria são dos problemas específicos e oferecer uma orien-
da Construção), com o objetivo de combater a preca- tação adaptada a cada negócio.
rização do trabalho no setor e contribuir para a regu- O conteúdo programático abordou temas como plano
lamentação dos serviços terceirizados. de negócios, planejamento estratégico, marketing,
A principal função da iniciativa foi orientar os su- atendimento ao cliente, gestão comercial, gestão de
bempreiteiros para uma gestão empresarial mais pessoas, legislação trabalhista, qualidade e produtividade,
eficiente. O programa se baseou em capacitações negociação, estoque, logística, finanças (formação de
sobre conformidade legal e administrativa, recursos preços, controles, crédito e cobrança), análise e plane-
humanos, saúde, segurança e meio ambiente, além jamento financeiro, aspectos fiscais, entre outros.
de gestão financeira e de planejamento estratégico. No total, foram realizadas 76 horas de oficinas
Após a execução do programa, espera-se a melhoria coletivas, 36 horas de consultoria por empresa, e
nos resultados financeiros, o aumento da competiti- encontros de oito horas, na abertura e no encerramento
vidade e da qualidade, e a redução dos custos de do programa, ao longo de nove meses.
52

Como pudemos ver neste capítulo, muitas empresas qualidade começam a surgir no setor, trazendo re-
líderes do setor de incorporação e construção estão sultados positivos e diferenciais para os envolvidos,
adotando procedimentos para a melhoria dos seus sejam construtoras, fornecedores ou empregados.
processos de gestão de fornecedores, seguindo, pre- Estratégias de reestruturação, diferenciação e pro-
dominantemente, a estratégia de focar na conformi- gressão, que considerem seus impactos sobre a cadeia
dade, por meio de mecanismos corporativos de seleção produtiva, ainda são raras nesse mercado, principal-
e avaliação, assim como pela realização de auditorias mente no Brasil, o que abre um caminho repleto de
nas empresas da cadeia produtiva. Algumas iniciativas oportunidades para a evolução da gestão de forne-
voltadas para a ampliação da produtividade e da cedores na construção civil.
53

Supply Chain Sustainability School: a colaboração entre empresas vale a pena?

Diante dessa pergunta, 34 das principais empresas - Registro gratuito: permite às empresas o acesso
do setor da construção civil no Reino Unido acreditam a mais de seiscentos recursos em dez áreas da sus-
que a colaboração vale a pena. Parceiras da Supply tentabilidade, incluindo eventos e workshops;
Chain Sustainability School, elas encaram a iniciativa - Autoavaliação: o questionário ajuda a empresa a
como um recurso para o desenvolvimento de suas identificar a sua situação em relação à sustentabilidade;
cadeias produtivas. - Plano de ação: possibilita o acesso a recursos de
A estratégia de construção do Reino Unido para ensino à distância, workshops, guias e ferramentas,
2025 define como metas a redução de 50% das que auxiliam a ampliar os conhecimentos e compe-
emissões de CO2, 50% de redução do tempo de exe- tências nas áreas da sustentabilidade;
cução dos serviços e 33% de redução dos custos. Para - Acompanhamento do progresso: a empresa pode
alcançar esses objetivos, ficou evidente a necessidade monitorar a sua evolução em comparação com outros
de mais conhecimento para ajudar os líderes e gestores membros da escola.
a adaptar os seus negócios. A Supply Chain Sustainability School é gerida
A iniciativa foi lançada em 2012 como uma abor- por uma administração independente – a Action
dagem coletiva para a integração da sustentabilidade Sustainability –, de modo a garantir a confidencia-
às cadeias produtivas da construção civil. Atualmente, lidade das informações fornecidas pelos participan-
a escola conta com mais de 10 mil membros e oferece tes. Esse compromisso é declarado no código de
suporte prático por meio de módulos de ensino à ética da instituição e assinado por todas as cons-
distância, ferramenta de autoavaliação, planos de trutoras parceiras.
ação, treinamento em sustentabilidade, e oportunidade A governança da escola é baseada na existência
para networking entre as empresas. de um conselho formado por nove representantes
Os recursos da escola podem ser utilizados após das empresas parceiras, responsável pelo controle
22
os seguintes passos: fiscal e direcionamento estratégico da iniciativa.

22. Informações retiradas de Skanska, Sustainability Review, 2013.


54

4. Conclusão

Fatores de competitividade: inovação


tecnológica, eficiência nos processos
e qualificação profissional
55

23
Segundo o relatório Global Construction 2020 , a panhias seguirem a saída, já comum, de estrangula-
expectativa é de que o setor da construção nos mercados mento dos fornecedores nas negociações comerciais,
emergentes dobre seu tamanho nos próximos cinco que é possível pelo desproporcional poder de barganha
anos, tornando-se um negócio de aproximadamente das grandes construtoras em relação aos demais da
US$ 6,7 trilhões, sendo responsável por quase 55% da cadeia de produção. Se nada mudar na forma de
produção global gerada pela indústria da construção conduzir as políticas de gestão de fornecedores, o
Para que seja possível aproveitar todas as oportunidades futuro não será promissor. Muitos prestadores de
desse fato, é necessário que as empresas do setor serviço não conseguirão manter seus negócios, trans-
adotem novos modelos de negócio. As incorporadoras ferindo as despesas trabalhistas para as construtoras.
e construtoras precisarão aprender como se posicionar Ou então, caso consigam manter suas empresas, a
para conquistar a demanda crescente e gerenciar suas drástica redução de suas margens fará com que muitos
cadeias produtivas. fornecedores, para viabilizar o fechamento de contratos,
Ainda que o atual cenário econômico doméstico abram mão de cumprir parte das obrigações legais
não seja dos mais otimistas, o setor imobiliário no Brasil – em termos de recolhimento de tributos, garantia de
apresenta grande potencial de crescimento, visto o boas condições de trabalho, saúde e segurança, entre
tamanho do mercado interno e do déficit habitacional, outros –, o que aumentará ainda mais os custos e
com uma enorme parcela da população morando de riscos para as construtoras de forma geral.
aluguel, além da lacuna existente para o possível au- Analisando por outra perspectiva, também é pos-
mento da oferta de financiamento imobiliário no país. sível encarar a situação atual como um momento de
Para que essa realidade se concretize, o setor deverá grandes oportunidades, mesmo que por necessidade,
superar a crise que pressiona as margens de lucro das de se trabalhar intensamente em favor da produtividade
incorporadoras para baixo e que, desse modo, aumenta do setor. No contexto vigente, esse passa a ser o único
a urgência de reduzir os custos de construção. caminho para garantir a manutenção das margens e 23. Global Construction Perspectives e Oxford Economics, Global

O momento pode ser desastroso se todas as com- a sobrevivência das empresas da cadeia produtiva. Construction 2020, 2011.
56

Alavancas da produtividade na construção civil


Segundo estudo sobre a construção civil realizado pela EY em parceria com a Escola
24
Politécnica da USP , a organização em sete alavancas relevantes de produtividade
visa permitir que empresas e profissionais do setor visualizem e avaliem os esforços
para ganhos de eficiência na produção.

1 Planejamento da execução dos empreendimentos 4 Materiais


- Planejamento da necessidade de recursos e de materiais no curto, médio e longo prazo. - Adoção de novos materiais mais eficientes
- Processos estruturados de atualização do planejamento conforme a execução. (concreto autocurativo, cimento magnesiano etc.).
- Escritório integrado de gestão de projetos (PMO: Project Management Office).
- Aplicação de softwares tipo BIM (Building Information Modeling). 5 Métodos construtivos
- Aplicação de métodos construtivos mais eficientes
2 Adoção de métodos de gestão (vigas pré-moldadas, alvenaria estrutural, estruturas metálicas etc.).
- Lean Construction: construção baseada na redução de desperdícios
(método Toyota de produção). 6 Melhorias de projeto
- Mais sincronização do empreendimento e eficiência no fluxo de materiais, eliminando - Foco na melhoria dos projetos e na sua adequação à execução da obra.
atividades que não agregam valor.
- Strategic Sourcing: otimização dos fornecedores e das compras. 7 Qualificação da mão de obra
- Ações para aprimorar o recrutamento.
3 Equipamentos - Iniciativas para aumentar a qualificação atual
- Modernização dos equipamentos (gruas flexíveis, elevadores mais rápidos etc.). (treinamento, motivação etc.).
- Melhor uso dos equipamentos. - Plano para retenção de profissionais.

24. EY, Estudo sobre Produtividade na Construção Civil: Desafios e Tendências no Brasil, 2014.
57

Esforços individuais de cada agente da cadeia trarão adequadas ao projeto, além de outros esforços cole-
ganhos de produtividade, mas insuficientes para mudar tivos, que culminem, por fim, na redução de custos e
o cenário como um todo. Torna-se fundamental, por- prazos, além do aumento da produtividade, gerando
tanto, a maior integração da cadeia de suprimentos de ganhos reais para as duas partes.
cada construtora, de modo a reavaliar os processos ao Pela ótica da gestão integrada da cadeia produtiva,
longo do ciclo de fornecimento e, se for necessário, até cujos principais conceitos e teorias foram originados
reinventá-los, com o compromisso de que as mudanças no segmento industrial e amplamente adotados pelo
propostas sejam benéficas para o conjunto. setor automobilístico, iniciativas para promover o de-
Relações de parceria entre as construtoras e seus senvolvimento técnico e gerencial dos fornecedores
principais fornecedores, baseadas na confiança mútua passam a ser não apenas recomendáveis, mas também
e na perspectiva de longo prazo, tornaram-se neces- consideradas como um investimento dos líderes do
sárias, exigindo o compartilhamento dos valores das setor. Além de estimular a criação de vínculos duradouros
companhias, modelos de negócio, planejamentos, entre as empresas, trazendo maior estabilidade para a
sistemas de informação, entre outros. Ambas as partes cadeia, a gestão integrada de fornecedores acaba por
envolvidas devem quebrar paradigmas e divulgar criar condições favoráveis para investimentos na qua-
Relações de parceria informações que até então eram tidas como confi- lificação dos trabalhadores, seja pelos subempreiteiros
entre as construtoras denciais, mas que isoladas não conferem vantagens ou pelas construtoras, assim como para a experimen-
e seus principais reais para seus detentores. Nesse cenário, além dos tação de novas tecnologias e sistemas construtivos.
fornecedores, baseadas princípios de conduta, as construtoras passam a com- Como consequência, torna-se mais fácil trabalhar na
na confiança mútua partilhar o planejamento de obras e de suprimentos melhoria dos processos de todos os agentes, assim
e na perspectiva de longo com os principais fornecedores. Os subempreiteiros, como no sincronismo da atuação de cada um na cadeia
prazo, tornaram-se por sua vez, passam a fazer abertamente seu orça- produtiva, de modo a buscar a máxima produtividade
necessárias, exigindo mento e planejamento de produção. Assim, o conhe- ao longo de todo o ciclo de fornecimento.
o compartilhamento cimento técnico e a experiência prática dos engenheiros Muitas das tendências apontadas para o desen-
dos valores das das construtoras podem contribuir para a identificação, volvimento da construção também dependem da
companhias, modelos junto com o fornecedor, de estratégias diversas para abordagem integrada da cadeia produtiva para que
de negócio, a otimização da produção, técnicas construtivas mais sejam viáveis e contribuam com o máximo de seu
58

potencial. É o caso dos novos sistemas de Tecnologia a quantidade de mão de obra necessária para a cons-
da Informação e Comunicação (TIC), como o CAD trução, também é possível reduzir a complexidade e o
(Computer Aided Design) 3D, 4D e 5D, que possibilitam risco das atividades realizadas no canteiro de obra.
desde a modelagem virtual (virtual design) e a simulação O uso de novos materiais, com níveis de tecnologia,
da construção com a inclusão de modelos de crono- sustentabilidade e qualidade mais altos, assim como
grama (time/schedule), até a gestão da alocação de a adoção de novos equipamentos – que permitem
recursos e o controle de custos e insumos (cost/financial). maior mecanização do trabalho, melhor logística e
A integração entre toda a cadeia também passa a ser mais organização do canteiro, além da redução de
condição necessária para a plena utilização do BIM espera e da quantidade de trabalhadores –, também
(Building Information Modeling), que integra digital- exigem alto grau de coordenação por parte da cadeia
mente todos os agentes envolvidos em um mesmo de suprimentos.
projeto (proprietário, gerenciadora, arquiteto, consultores, No campo das construções sustentáveis, é igual-
construtora e fornecedores), permitindo que a comu- mente improvável imaginar a rápida evolução no de-
nicação seja simultânea e imparcial. Dessa forma, o senvolvimento e na aplicação de soluções, que levem
sistema permite a economia de tempo – por meio de em consideração o desempenho do sistema ou do
processos de produção e monitoramento mais ágeis –, produto ao longo de todo o seu ciclo, sem que isso seja
a redução dos custos de transação, a minimização dos adotado como um valor ou mesmo uma obrigação
retrabalhos e desperdícios, além da realização de si- compartilhada pelas construtoras e seus principais
mulações diversas e do cálculo de seus impactos na fornecedores. Avanços significativos em relação à
atividade das demais empresas, assim como dos efeitos eficiência energética, ao reuso de água, à redução no
sobre o prazo e o custo total da construção. consumo de recursos naturais e da geração de resíduos,
A implantação de novos métodos construtivos – assim como na emissão de gases do efeito estufa, ainda
como banheiros prontos, dry wall, steel frame e outros que distantes das metas a serem atingidas na próxima
–, que aumentam o uso dos componentes industriali- década, só se tornaram viáveis depois que boa parte
zados e transferem parte da produção para a cadeia do mercado da construção civil percebeu a sustenta-
produtiva, igualmente necessita de planejamento con- bilidade como oportuna e, assim, buscou o desenvol-
junto com os fornecedores. Nesse caso, além de diminuir vimento de inovações coletivas nesse campo.
59

Outro ponto fundamental para o aumento da pro- fornecedores para a padronização dos materiais ou
dutividade do setor é a qualificação dos subempreiteiros para que estes também executem a prestação de
e dos trabalhadores da construção civil. A urgência por serviços; implantação de um sistema de informação
iniciativas nesse sentido não reside apenas na neces- único para compartilhamento da documentação dos
sidade de otimização do trabalho e de redução dos subempreiteiros e empregados; e a requisição de linhas
custos, mas também no fato de que tanto os fornece- de financiamento para subsidiar o desenvolvimento
dores de mão de obra quanto seus trabalhadores devem e a aplicação de novas tecnologias na construção.
estar aptos a implantar todas as novas tecnologias. Em suma, progressos significativos na produtividade
Nesse campo, é essencial o planejamento integrado e da construção civil só serão vistos quando as iniciativas
a ação coordenada entre o governo, as empresas, as contemplarem o seguinte tripé: inovação tecnológica,
associações, o “sistema S” (Senai, Sesi, Sebrae etc.), as eficiência nos processos e qualificação profissional.
universidades, os sindicatos, além de outras organiza-
ções representativas do setor, uma vez que a capacitação FIGURA 10 – Tripé da produtividade (inovação tecnológica,

é necessária em todos os níveis da construção, desde eficiência nos processos e qualificação profissional).

os arquitetos, projetistas, engenheiros, gestores e téc-

Produtividade
nicos, até os subempreiteiros e os empregados.
A mobilização setorial é outro tema que ainda
carece de investimentos no Brasil, e o momento atual
pode ser uma excelente oportunidade para isso. É
necessário o desenvolvimento de iniciativas conjuntas
por várias empresas do setor, em campos onde elas
inovação
não disputem entre si, de modo a viabilizar a criação
tecnológica
de um ambiente de negócios mais consistente, redu-
zindo os riscos e custos de transação. Diversos exem-
plos de ações colaborativas poderiam ser elencados,
qualificação eficiência
tais como: desenvolvimento de um programa de ca- profissional nos processos
pacitação de subempreiteiros; discussão coletiva com
60

A inovação viabilizada pelas novas tecnologias, Como já dizia John Nash, a respeito da Teoria dos
que possibilita aumentos significativos de produtivi- Jogos, em um sistema interdependente, o equilíbrio
dade, tem caráter disruptivo, enquanto que o aumento apenas se torna possível a partir do entendimento de
da eficiência, causado por melhorias nos processos que cada decisão não ocorre isoladamente, sendo que
da construção, garante avanços incrementais de pro- a situação de máximo benefício para os envolvidos
dutividade. Nos dois casos, é essencial promover a depende de várias ações em cadeia, que tenham a
qualificação profissional de toda a cadeia produtiva. visão sistêmica e a colaboração como protagonistas
É inquestionável a importância da gestão integrada na busca por soluções eficientes no longo prazo. Mais
da cadeia produtiva para garantir a evolução simultânea que uma teoria sobre estratégia, essa lógica é uma
dos três pilares. Sem uma visão compartilhada, o poderosa metáfora do comportamento humano, aju-
sistema fica míope. Todos os agentes acabam, por dando a compreender inúmeros relacionamentos
inércia, dando continuidade ao seu comportamento sociais e econômicos que apresentam a mesma es-
corporativo individual, buscando o máximo de van- trutura de incentivos.
tagens para si em detrimento dos demais e, dessa
forma, deixando de assumir grande parte das exter- Como vivemos em
nalidades geradas no processo. uma sociedade cada vez
No caso da construção civil, quem acaba sofrendo mais interdependente,
os principais efeitos nocivos desse sistema viciado a miopia está em
são os trabalhadores, o elo mais fraco da cadeia pro- não enxergar que
dutiva, apesar de somarem, juntos, milhões de pessoas. o descompasso de
Como vivemos em uma sociedade cada vez mais privilégios, cedo ou tarde,
interdependente, a miopia está em não enxergar que retornará para o ciclo,
o descompasso de privilégios, cedo ou tarde, retornará atingindo todos aqueles
para o ciclo, atingindo todos aqueles que até então que até então estavam
estavam comodamente satisfeitos com seus desem- comodamente satisfeitos
penhos exemplares, sem considerar as condições com seus desempenhos
necessárias para sua própria permanência no jogo. exemplares.
61

5. Metodologia

O Programa Valor em Cadeia uti-


liza uma metodologia de análise
das redes e da gestão de fornece-
dores a partir do conhecimento
sobre as principais tendências do
setor e dos modelos de negócios
das empresas – ou seja, sobre as
formas como estão organizados
os processos de criação de valor,
tanto econômico quanto social,
nas próprias empresas e ao longo
de suas cadeias de produção.
62

O passo seguinte é a análise das condições na cadeia No planejamento de programas de gestão e de


que afetam o desempenho das empresas, principalmente desenvolvimento dos fornecedores, o objetivo principal
as pequenas e médias, no curto e médio prazo, verificando é encontrar os caminhos para integrar as empresas e
quais são as condições para que elas se adaptem aos seus fornecedores em uma estratégia comum – para
modelos de negócios predominantes no setor. reduzir riscos e aumentar oportunidades –, gerando
valor econômico, social e ambiental.
Metodologia de análise dos modelos de negócios
e cadeias de fornecedores A empresa tem uma cadeia de fornecedoresadaptada ao seu modelo de negócios?

Análise do setor
Características econômicas e institucionais do Se é um modelo de negócios Qual o nível de
setor, principais tendências e inovações que se baseia em produtos e produtividade da cadeia
serviços de baixo preço de fornecedores?

Estratégia da empresa
Se é um modelo que se Qual o nível de qualidade
Modelo de negócios, características do profuto
baseia em produtos e dos produtos e serviços da
e gestão da cadeia de fornecedores
serviços premium cadeia de fornecedores?

Estrutura da cadeia
Se é um modelo de negócios Qual o nível de
Características da cadeia, produtos e serviços, que busca respostas rápidas às flexibilidade e agilidade da
principais formas de relacionamento demandas dos consumidores cadeia de fornecedores?

Desempenho do fornecedor Se é um modelo de negócios Qual a capacidade de


que se baseia em produtos inovação da cadeia de
Análise da gestão e do desempenho diferenciados fornecedores?
econômico e socioambiental das empresas
63

Esse estudo compartilha dessa perspectiva e se


baseia na experiência de especialistas no desenvol-
vimento e na prática de estratégias da gestão de
fornecedores do setor da construção civil. Foram
realizadas entrevistas com representantes de nove
incorporadoras e construtoras, seis fornecedores de
serviços de mão de obra e seis consultores do setor
imobiliário brasileiro. Também foram analisados di-
versos artigos e pesquisas sobre as principais tendên-
cias da área junto com o levantamento de benchmarks
nacionais e internacionais relacionados ao tema.
Em cada uma das incorporadoras e construtoras foi
realizado o diagnóstico dos modelos de negócios, assim
como a listagem e a análise das suas principais práticas
de gestão de fornecedores. A pesquisa sobre os forne-
cedores de mão de obra, por sua vez, focou no perfil
padrão dessas empresas e em sua capacidade de gestão
financeira, planejamento e produção, considerando os
impactos nas condições de trabalho. As análises sobre
o desempenho e a competência tiveram uma perspectiva
integrada, observando as conexões entre as empresas
e as consequências sobre a competitividade nas cadeias
como um todo. Por fim, as análises sobre as empresas
individuais buscaram a abordagem conjunta dos de-
sempenhos financeiro e social.
64

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