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O Brincar no Hospital 33

Estudos de Psicologia
2001, Vol 18, no 3, 33-42

O Brincar no Hospital: Análise de Estratégias e Recursos


Lúdicos Utilizados com Crianças

Rita Márcia Aragão1


Maria Rita Zoega Soares Azevedo2

Esta pesquisa buscou caracterizar a preferência de recursos e atividades lúdicas de acordo


com faixas etárias e, de modo geral, investigar a efetividade desses recursos e atividades no
atendimento a crianças hospitalizadas, facilitando a expressão de sentimentos e aquisição de
conceitos relacionados ao contexto hospitalar. A população-alvo consistiu de trinta e seis
sujeitos, sendo vinte e três do sexo masculino e treze do sexo feminino, com idade entre nove
meses a doze anos, internados no setor de enfermaria pediátrica de um hospital público da
cidade de Londrina. A coleta de dados foi realizada através do relato das observações de
atividades desenvolvidas e do material lúdico utilizado com cada um dos sujeitos. Verifi-
cou-se a relação entre a freqüência de utilização de um determinado material e a atividade
para cada faixa etária o Concluiu-se que atividades ou recursos puderam ser explorados em
determinadas idades, enquanto outras foram aceitas em diversas faixas etárias, contudo com
objetivos diferentes. De modo geral, pode-se dizer que os recursos foram efetivos, possibili-
tando a expressão de sentimentos relacionados à hospitalização.
Palavras-chave: crianças hospitalizadas, hospitalização infantil, psicologia hospitalar, estraté-
gias lúdicas.

Abstract
Playing at the Hospital: Analysis of Strategies and Resources of the Used with Children
These research had the objectives to characterize the preference of resources and activities of
the games in agreement with the age groups and, in general to investigate the effectiveness of
those resources and activities in the attendance to hospitalized children, facilitating the
expression of feelings and acquisition of concepts related to the hospital context. The target
people were thirty six subjects, twenty three male and thirteen female, with ages between
nine months and twelve years old, interned in the children ward section of a Londrina's
Public Hospital. The data collection was accomplished through the observations reported
among the activities developed, and the gaming material used with one of the subjects. Was
verifyed the relation between the frequency of using a kind of material and activity for each
age groups. Deduced that activities or resources they could be explored in certain ages, while
others were accepted in several age groups, however, with different objectives. In general, it
can be said that the resources were effective, making possible the expression of feelings
related to the hospitalization.
Key words: hospitalized children, infantile hospitalization, hospital psychology, activities
of the games.
1. Discente do Curso de Especialização em Psicoterapia na Análise do Comportamento da Universidade Estadual
de Londrina-UEL
Endereço para correspondência: Rua Itálial, 254, Jardim Igapó, Londrina, PR - CEP: 86046-130.
2. Docente da UEL.
Endereço para correspondência: Rua Prefeito Hugo Cabral, 1062, aptO142, Londrina, PR - CEP: 86020-917.
Pesquisa derivada de monografia realizada no curso de Especialização em Psicoterapia na Análise do
Comportamento (UEL), cuja coleta de dados foi realizada em hospital público de Londrina.

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Introdução hospitalização. Essa situação pode criar


ameaças reais ou imaginárias, que podem ser
A importância do brincar expressas através do medo de médicos, choro,
O brincar tem sido o foco de interesse de agressividade, dependência, ansiedade, depres-
muitas pesquisas que consideram essa atividade são, distúrbio do sono, evitação dos procedi-
necessária à aprendizagem de conceitos em crian- mentos médicos e outras formas de respostas
ças (Azevedo, 1999; Whaley & Wong, 1989; (Domingos, 1993).
Bontempo, 1986; Lindquist, 1992; Santos, 1997).
A hospitalização modifica a vida da
Whaley & Wong (1989) consideram que criança, pois ela sofre com a doença, é afastada
crianças podem desenvolver conceitos relacio- da família, da escola e dos objetos pessoais,
nados ao seu ambiente e estratégias para lidar perdendo grande parte de suas referências.
com ele através do brincar, praticando como Além disso, pode-se encontrar no hospital um
lidar com as situações complicadas da vida, ambiente hostil, com procedimentos invasivos
comunicando-se e estabelecendo relações satis- e uma atmosfera geralmente tensa e ameaça-
fatórias com outras pessoas, estimulando e apri- dora (Sagguese & Maciel, 1997).
morando seu desenvolvimento social e suas
Quando se trata da hospitalização infan-
relações interpessoais.
til, deve-se considerar o ambiente novo, as
Conforme os autores citados anterior- pessoas que cuidarão dela e a doença como con-
mente, crianças pequenas participam de brin- dições estranhas ao paciente. Assim, a equipe
cadeiras simples e imitativas; pré-escolares do hospital precisa estar hábil para lidar com as
aprendem e divertem-se com jogos convencio- crianças e seus pais, pois, caso contrário, a inter-
nais, iniciando com brincadeiras ritualistas e nação pode ficar complicada. A forma como a
progredindo para jogos com regras, competi- hospitalização e a doença são vivenciadas pode
tivos e cooperativos. influenciar no surgimento de dificuldades rela-
Segundo Guimarães (1988) brincar im- cionadas à adaptação (Gaetan, 1997).
plica na interação com o ambiente, geralmente Laurent & Rumeu (1990) afirmam que
de modo relaxado e envolvendo afeto positivo.
fatores pessoais (idade, desenvolvimento biopsi-
Crianças brincam com temas relacionados ao
cossocial do paciente, natureza e grau de severi-
seu ambiente diário, e se esse contexto muda, as
dade da enfermidade, experiências prévias com
brincadeiras também podem mudar.
médicos e hospitais), familiares (maneira dos
A criança hospitalizada pais, irmãos, familiares e companheiros respon-
derem à hospitalização) e hospitalares (contato
A condição de hospitalização desempenha
com ambiente estranho, mudanças do pessoal do
um papel importante na manutenção da saúde de
hospital, duração da internação, características e
crianças enfermas. No entanto, nessa situação po-
dem surgir condições que dificultam a adaptação organização do centro hospitalar, ausência de
a esse contexto (Laurent & Rumeu, 1990). informações e privação cultural, social e escolar)
podem interferir na hospitalização infantil.
Gaetan (1997) discute que tanto a hospi-
talização como a doença podem provocar Para Guimarães (1988) a falta de varie-
estresse à criança. Angerami (1994) considera dade, de estrutura, de organização dos estímulos e
que a criança pode entrar num nível de sofri- atividades para a interação da criança são fatores
mento emocional e físico, em decorrência da que dificultam a adaptação ao contexto hospitalar.

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Guimarães (1988) e Azevedo (1999) des- Lindquist (1993) fala do direito da criança
creveram a hospitalização como uma oportuni- à informação sobre sua enfermidade e dos proce-
dade para a criança e a família enriquecerem seu dimentos médicos a que será submetida. O brin-
repertório comportamental. Para isso, profis- quedo pode ser utilizado como recurso para
sionais da área de saúde devem considerar a informá-Ia e prepará-Ia para esses procedimentos.
criança hospitalizada como um todo biopsicos-
Domingos (1993) discute que é preciso
social em crescente desenvolvimento.
esclarecer o processo aos pais e criança
A preparação para a hospitalização deve (explicando o que vai acontecer), encorajar
ter como objetivos reduzir os efeitos negativos expressões emocionais e estabelecer clima de
que a mesma exerce sobre a criança e fornecer confiança na relação com a equipe hospitalar.
informações que a deixem menos vulnerável às
Devem ser levados em conta idade, nível
experiências negativas (Laurent & Rumeu,
de desenvolvimento e o local onde possa brincar,
1990; Méndez, Ortigosa e Pedroche, 1996).
ajustando o programa de preparo às necessidades
Para Ortigosa, Méndez & Quiles (1996), da mesma e à sua capacidade de entendimento
a falta de informações relacionadas à situação (Domingos, 1993; Lindiquist, 1975).
hospitalar pode tomar-se potencial estressor.
O brincar pode ser explorado para propor-
Porém, a informação precisa e adequada ajuda a
cionar oportunidade de desenvolvimento huma-
diminuir o estresse.
no, pois é uma forma de interagir com o ambiente;
a criança interage com seu meio à medida em que
O brincar no contexto hospitalar oportunidades lhe são oferecidas, provocando
modificações no seu repertório comportamental e
O brincar é essencial para a criança, na natureza funcional do meio.
inclusive hospitalizada. Mesmo em situações
estressantes ela pode beneficiar-se dele, "O atendimento por profissionais quali-
possibilitando relaxamento e compreensão da ficados na ciência do comportamento pode
situação (Ribeiro, 1998). prover, junto à equipe pediátrica, recursos
técnicos para minimizar possíveis perdas ou
Azevedo (1999) e Méndez et aI. (1996)
atrasos no desenvolvimento que poderia sofrer
falam da importância de tomar as enfermarias
uma criança em situação hospitalar", conside-
pediátricas mais adequadas ao serviço prestado
rando sua condição socioeconômica e religiosa,
às crianças, salientando que os pacientes devem
ambiente físico e características das fases do
ser preparados para a hospitalização e procedi-
desenvolvimento infantil (Guimarães, 1988).
mentos médicos.
Pesquisas demonstram que a preparação Para organizar atividades, deve-se consi-
para esses procedimentos amenizam o medo e a derar a idade da criança, porque, quanto mais
ansiedade, podendo exercer efeitos positivos nova, maior a dificuldade em compreender a
sobre a recuperação do paciente. Atividades situação e exprimir sentimentos (Azevedo,
lúdicas devem ter a função de intervenção 1999). Crianças em idade escolar devem ter
terapêutica no contexto hospitalar porque, melhor repertório para verbalizar medo e dor. O
brincando, a criança pode incrementar seu fornecimento de informações e oportunidades
repertório comportamental e experimentar lúdicas diversas parecem ser eficientes (Do-
diferentes respostas de ajustamento ao meio mingos, 1993). Assim, a presença de brinque-
(Whaley & Wong, 1989; Domingos, 1993; dos adequados às faixas etárias pode melhorar a
Sagguese & Maciel, 1997). condição de preparo para o contexto hospitalar.

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O mesmo material pode ser usado com cri- Recursos humanos


anças de idades diferentes e de diferentes maneiras.
Participaram da pesquisa uma aluna do
Tais materiais devem ser usados em atividades que
curso de pós-graduação em Psicoterapia na
desafiam, sem produzir frustração elevada.
Análise do Comportamento, três estagiárias de
Lindquist (1992) sugere que criança e Psicologia da UEL, sendo supervisionadas por
pais devem encontrar no hospital um espaço uma docente do departamento de Psicologia.
dedicado ao jogo. Dessa forma, criança e pais
podem perceber que há preocupação com a
saúde global do paciente. Recursos materiais
A Psicologia Hospitalar é considerada Os brinquedos foram: boneca (Baby-
um campo recente de intervenção. Há necessi- toys), massa de modelar (Acrilex), carrinho
dade de verificar se os recursos e atividades (Toys), chocalhos (BabyToys; Toys Super),
utilizadas com as crianças hospitalizadas são bichinhos emborrachados (Walt Disney), bola
efetivos, diminuindo conseqüências negativas de espuma;jogos: dominó (Omotcha Indústria
advindas dessa condição. de Brinquedos), boliche (Móbile), quebra-gelo
(Grow), quebra-cabeças (Grow), basquete
Este trabalho buscou caracterizar a
(Aim N' Shoot Basketball Set); material sucata;
preferência de recursos e atividades lúdicas,
livro de história (O coelhinho azul e o remédio
de acordo com as faixas etárias, identificar
mágico - ed. EKO); materiais de desenho: giz
e analisar a efetividade destes, facilitando
de cera (Acrilex), sulfite (Chamequinho), lápis
expressão de sentimentos e aquisição de
conceitos relacionados ao contexto hospitalar. de cor (Faber-Castel), tinta guache; dobradura e
materiais hospitalares (luvas cirúrgicas, gaze,
Tal condição pode fazer com que a Psic- esparadrapo e bolsa de primeiros socorros).
ologia contribua na melhora do repertório,
socializando a criança no contexto hospitalar, O livro infantil foi selecionado porque
generalizando tais ganhos para as diversas referia-se à situação específica de enfermidade.
situações.
Procedimento

Metodologia A pesquisa foi realizada no período de


junho a outubro de 1999. Os sujeitos foram sele-
Local
cionados através de fichas de identificação
O trabalho foi desenvolvido em um utilizadas no próprio hospital, levando-se em
hospital público da cidade de Londrina, PR. consideração a idade de cada um. Estagiárias
esclareceram os objetivos do trabalho e solici-
População-alvo taram permissão aos responsáveis para que a
Trinta e seis pacientes com idade entre 09 criança pudesse participar da pesquisa. Os pais
meses e 12 anos, internados no setor de enfer- foram informados de que estavam livres para
maria pediátrica no referido hospital, com nível permanecerem ou não junto à criança. A
socioeconômico baixo, foram submetidos ao intervenção foi desenvolvida por estagiárias do
trabalho proposto. curso de Psicologia da UEL, durante um dia no
período de internamento de cada criança.
Onze dos sujeitos pertenciam à faixa
etária entre os 2 anos, dez à faixa etária entre 3 e O trabalho foi realizado na enfermaria do
5 anos, quatorze crianças entre 6 e 8 anos, e uma hospital, oferecendo-se às crianças diversos
criança na faixa etária entre 9 e 12 anos. brinquedos para que optassem pelo material de

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sua preferência. Os recursos foram pré-selecio- Nessa faixa etária, as intervenções ocor-
nados segundo os critérios utilizados por reram com 100% de freqüência na presença das
Azevedo (1999) e os brinquedos foram ofere- mães, que receberam informações e orientações
cidos de acordo com a faixa etária de cada em relação à situação hospitalar e ao desenvol-
criança: 0-2 anos (bichinhos emborrachados, vimento da criança. Na maioria das vezes, as
chocalho, carrinho, quebra-gelo, boneca, bola mesmas atividades e materiais foram utilizados
de espuma); 3-5 anos (materiais de desenho, para ambos os sexos.
quebra-cabeças, carrinho, massa de modelar, Com bichinhos emborrachados e choca-
boneca, livro infantil, jogo de basquete, mate- lhos procurou-se produzir estimulação tátil,
riais hospitalares); 6-8 anos (materiais de dese- visual e auditiva, através da demonstração do
nho, carrinho, dominó, quebra-cabeças, sucata, brinquedo à criança, buscando chamar sua aten-
boliche, massa de modelar, dobradura, mate- ção, fazendo movimentos e sons. Observou-se
riais hospitalares); 9-12 anos (materiais de que, no início, a criança apenas olhava, mas
desenho, dominó, quebra-cabeças, dobradura, depois passou a interagir, mantendo contato
visual, sorrindo, manuseando o brinquedo e
livro infantil, materiais hospitalares).
produzindo sons.
Os dados foram descritos pelas esta-
Tal recurso foi também utilizado para con-
giárias através de registro cursivo após cada tar histórias, incluindo noções sobre procedimen-
intervenção e analisados posteriormente. tos médicos realizados e sua função. Observou-se
que, após tal atividade, crianças que se submetiam
Análise de dados à inalação segurando o brinquedo, diminuíam
Os dados coletados foram analisados quan- respostas relacionadas ao choro e de oposição.
titativamente (através de porcentagens) e qualita- Bonecas, carrinhos, quebra-gelo e bola de
tivamente (descrição das atividades realizadas). espuma também foram utilizados no preparo para
Para facilitar a análise, as crianças foram procedimentos médicos e compreensão de aspec-
divididas em subgrupos, de acordo com cada tos relacionados à hospitalização. Tal material
faixa etária, segundo sugestão de Azevedo também foi explorado através do brincar livre.
(1999). Passar o carrinho pelo braço da criança,
simulando uma "estrada" foi uma das estraté-
Resultados gias utilizadas, e tal condição produzia respos-
Como o objetivo do trabalho foi considerar tas relacionadas ao sorriso, contato visual e
e descrever os materiais utilizados para cada faixa emissão de sons. Tais comportamentos também
etária, não se explicitou o que foi usado por cada foram observados durante o martelar blocos do
criança especificamente. As atividades foram quebra-gelo e o jogar bola.
oferecidas por estagiárias, que observaram o Na faixa etária compreendida entre 3-5
comportamento da criança em relação ao objeto anos, materiais de desenho (papel, giz de cera,
oferecido. lápis de cor) e quebra-cabeças foram utilizados
Na faixa etária compreendida entre 0-2 anos em 60% das intervenções; o carrinho em 50%
pôde-se constatar que o carrinho, o chocalho e os delas, a massa de modelar e a boneca em 30% das
bichinhos emborrachados foram os que obtiveram atividades. Nessa faixa etária, 80% dos acompa-
maior freqüência de utilização nas atividades nhantes deixaram as crianças com as estagiárias,
propostas, com 36%, 45% e 54% respectivamente. saindo do quarto durante a intervenção.

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Foi incentivado o desenho livre nesta gaze e esparadrapo para que pudessem manu-
situação. Constatou-se que produziam desde seá-Ios de forma menos aversiva, incentivando
rabiscos no papel até desenhos mais elaborados. expressão de sentimentos e uso de fantasias em
Ao término do desenho, foram questionadas relação à hospitalização. As crianças questiona-
sobre o que haviam desenhado e seu signifi- ram sobre aspectos relacionados ao contexto
cado. Algumas crianças tiveram dificuldade hospitalar e suas próprias condições de saúde.
para verbalizar o que tinham feito. Outras Tais questões foram respondidas e dramati-
zadas através do uso deste material.
relataram fatos sobre suas vidas e sentimentos
em relação à hospitalização. Os desenhos foram Entre os sujeitos de 6-8 anos, materiais
colocados na parede da enfermaria e cedidos de desenho foram os mais utilizados (64% das
para as crianças após a alta. O livro de história intervenções). Nessa faixa etária, 85% dos
foi lido e questionado a partir do tema, visando acompanhantes também saíram do quarto
a compreensão do conteúdo. A atividade foi durante a intervenção.
finalizada com a solicitação de desenhos Materiais de desenho foram utilizados
referentes à história lida. incentivando-se o desenho livre envolvendo
situações relacionadas ao dia-a-dia da criança.
Quebra-cabeças foram montados com o Desenhos também foram feitos, com a inicia-
auxílio da estagiária e as crianças tiveram opor- tiva da própria criança, para presentear outras
tunidade de conversar sobre suas vidas e relatar crianças e membros da família. Em muitas
sentimentos frente à hospitalização. Com as bo- situações, as crianças escreveram dedicatórias
necas, crianças verbalizaram sobre suas vidas expressando o que sentiam pela pessoa a quem
dentro e fora de hospital. Tal material também era dedicado o desenho. Desenhos também
foi utilizado para demonstrar procedimentos foram colocados na parede ou levados para casa
médicos como: colocar curativos, puncionar após a alta.
veias, tomar medicamentos e aplicar injeções. Enquanto executavam essa atividade, as
Com carrinhos, as crianças construíram crianças puderam relatar sobre suas vidas e
circuitos de corrida, simulando acidentes reais que expressar sentimentos através da escolha de
cores, relacionando-as com o que sentiam
tinham acontecido com elas. Enquanto brinca-
naquele momento.
vam, também verbalizaram sobre suas vidas e
sentimentos percebidos naquele contexto. Houve Com carrinhos, as crianças simulavam
grande preferência pela utilização de carrinhos circuitos de corridas e trombadas, demons-
nessa faixa etária, provavelmente pelo fato de a trando acidentes acontecidos na família.
maioria dos sujeitos ser do sexo masculino e cul- Também se explorou o verbalizar sentimentos
turalmente tal brinquedo ser bastante incentivado. acerca de procedimentos médicos utilizados,
bem como a função de cada um deles.
Com a massa de modelar, através de
manipulação livre, buscou-se incentivar a inte- O dominó foi usado explicitando as
regras do jogo, incentivando tanto competição
ração entre estagiária e paciente, pois podiam
como cooperação. Pôde-se constatar o padrão
construir juntos, utilizando o mesmo material.
comportamental das crianças frente a tal
As crianças foram questionadas acerca das
atividade (trapacear, desistir, ajudar). Enquanto
cores e formas utilizadas.
jogavam falavam sobre suas vidas e expressa-
Materiais hospitalares foram usados vam sentimentos diante da hospitalização. O
buscando aumentar o contato dos pacientes com boliche também foi utilizado buscando tais
luvas cirúrgicas, bolsa de primeiros socorros, objetivos.

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Quebra-cabeças foram montados com o Para Azevedo (1999), quanto mais nova,
auxílio de estagiárias, buscando favorecer a maior a dificuldade da criança em compreender
interação. Tal condição pode ser efetiva no sen- a situação e expressar o que sente. A utilização
tido de evitar que o paciente se frustre por não de tais recursos pode facilitar para que o profis-
conseguir montar, o que não seria indicado para sional trabalhe com ela, principalmente dentro
a condição de hospitalização. Tal atividade do hospital.
oportunizou verbalizações sobre suas vidas,
Através da análise dos dados, obser-
bem como sentimentos envolvidos no contexto.
vou-se que a faixa etária entre 0-2 anos utilizou
O material sucata foi utilizado para que a com maior freqüência bichinhos emborra-
criança também tivesse oportunidade de criar chados e chocalhos. Tal condição pode estar
brinquedos, generalizando tal padrão compor- relacionada ao fato de o material permitir opor-
tamental para outras situações. Após terem tunidade para trabalhar estimulação tátil, visual
construído os próprios brinquedos, demonstra- e auditiva. Crianças pequenas participaram de
ram satisfação, exibindo o que tinham feito para brincadeiras simples e imitativas, necessitando
outras pessoas. receber tal estimulação, pois estariam iniciando
a exploração e a descoberta do mundo, mesmo
A massa de modelar foi utilizada explo-
hospitalizadas (Azevedo, 1999).
rando-se a criatividade e dramatização de situa-
ções. Tal recurso demonstrou ser efetivo para Com sujeitos de aproximadamente 2
expressão de sentimentos nesse contexto. anos, explicaram-se procedimentos médicos, a
função de cada um, utilizando jogos direcio-
O sulfite foi explorado para confecção de
nados a outras faixas etárias. Segundo Lindquist
animais ou objetos através de dobraduras. As
(1975), o jogo deve ser adaptado ao nível de
crianças participaram observando as estagiárias
desenvolvimento da criança e pode ser utilizado
e auxiliando-as nas dobraduras. A seguir, foram
sem seguir suas instruções, adaptando a ativi-
incentivadas a pintar e colar a produção na
dade à condição de cada uma. Assim, consta-
parede da enfermaria.
tou-se que tal recurso auxiliou na interação
Entre 9-12 anos, apenas o dominó foi entre crianças e profissionais, possibilitando a
utilizado no desenvolvimento da atividade. expressão de sentimentos através de sorrisos e
Nessa faixa etária, as crianças não ficavam na verbalizações.
presença de acompanhantes. Observou-se,
O quebra-gelo, carrinho e bola de espu-
nessa situação, aumento na freqüência de
ma foram utilizados também com o objetivo de
verbalizações sobre aspectos de sua vida e seus
promover relaxamento e a expressão de senti-
sentimentos em relação à condição hospitalar.
mentos. Guimarães (1988) e Ribeiro (1998)
afirmaram que o comportamento de brincar
Discussão
implica na interação com o ambiente, de modo
A exploração de recursos lúdicos no relaxado e envolvendo afeto positivo, possibili-
contexto hospitalar foi tema de interesse dessa tando maior compreensão da situação estres-
pesquisa porque tem demonstrado efetividade sante. Consideramos que tais formas de brincar
no trabalho com crianças, facilitando com- favoreceram para que a criança vivenciasse
preensão dos sentimentos dos pacientes pediá- seus medos e ansiedades, proporcionando-lhe
tricos, bem como fornecendo informações desenvolvimento no repertório para enfrentar
adaptadas à idade de cada um. condições adversas.

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Outro aspecto considerado importante instruções relativas ao jogo. Segundo Whaley


foi a orientação às mães e a importância de seu & Wong (1989), nesta fase as crianças progri-
incentivo e estimulação, para que a criança não dem para jogos com regras, competitivos e
tenha seu desenvolvimento comprometido. cooperativos.
Lindquist (1992) sugeriu que, com o espaço de-
Constatou-se que é necessário que se
dicado ao brincar no hospital, não só a criança,
explorem vários materiais para que a criança
mas os pais podem perceber que há uma preocu-
demonstre interesse por algum deles, exigindo
pação com a saúde global da criança.
do estagiário elevado investimento pessoal para
Em crianças com idade entre 3-5 anos, conseguir desenvolver qualquer atividade.
verificou-se maior freqüência na utilização de Dessa forma, o profissional deve estar atento
materiais de desenho e quebra-cabeças. Nessa para orientar atividades que se adaptem e auxi-
fase, a criança estaria aprimorando a coorde- liem a criança a lidar com dificuldades. Quando
nação motora fina (Gesell, 1985) e, talvez as crianças não demonstram interesse pela brin-
devido a esse fator, tal atividade tenha sido cadeira e não procuram interagir, deve-se levar
selecionada por muitas crianças nessa faixa em conta a possibilidade de dificuldades rela-
etária. Tal fato também tem relação com a cionadas a fatores familiares, pessoais e hospi-
condição de que as crianças já freqüentavam a talares, já descritos por Laurent & Rumeu
pré-escola, e possuíam repertório desenvol- (1990). Guimarães(1988) ressalta que a organi-
vido para desenvolver tais atividades. Esses zação e estrutura do ambiente e atividades
materiais devem ser usados em atividades que adequadas ao nível de desenvolvimento são
desafiam, sem produzir frustração elevada. necessárias para proporcionarem ao indivíduo
condições de participação nas brincadeiras.
Entre 6-8 anos, as crianças também
optaram por materiais relacionados ao desenho. Lindquist (1993) descreveu a importân-
Considerou-se que as crianças nessa faixa cia de cada paciente receber informações sobre
etária estavam freqüentando a escola e tinham sua enfermidade e procedimentos médicos,
conhecimento das possibilidades desse material para diminuir a freqüência de respostas de medo
(Piaget, 1964). A criatividade da criança foi e ansiedade, podendo colaborar com tais proce-
incentivada para que pudessem elaborar ativi- dimentos. O fornecimento de orientações em
dade onde a expressão de sentimentos fosse relação a procedimentos médicos foi realizado
mais facilmente trabalhada. através de linguagem adaptada ao nível de
desenvolvimento do paciente. A criança tem
Nessa fase também estavam presentes a
direito a receber informações sobre sua enfer-
utilização de jogos com regras e brincadeiras
midade e os procedimentos médicos a que será
ritualistas e perpetuantes, como Whaley &
submetida.
Wong (1989) já definiram. Tais recursos
foram explorados como estratégias para o De modo geral, observou-se que todos os
trabalho favorecendo a interação, possibili- recursos contribuíram para a expressão de senti-
tando a verbalização sobre aspectos relacio- mentos e vivência de situações relacionadas à
nados à sua vida e sentimentos. hospitalização, verificadas através das verbali-
zações das crianças, em praticamente todas
Na faixa entre 9-12 anos, observou-se
as faixas etárias. Observou-se que o lúdico
que a criança utilizou predominantemente o
dominó e demonstrou compreender regras e contribuiu para a realização de procedimentos

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médicos. Diante de histórias onde o persona- verbalização de sentimentos e maior aceitação


gem teria de passar por tal condição, a criança dos procedimentos médicos, além da diminui-
parou de chorar e aceitou submeter-se a proce- ção na freqüência de respostas de choro diante
dimentos clínicos. Lindquist (1992) ressaltou da realização desses procedimentos.
que brinquedos podem ser usados para esclare- Faz-se importante a realização de pesqui-
cer aspectos do contexto hospitalar, facilitando sas que demonstrem a efetividade desses recur-
contato com a criança e aumentando sua cola- sos na aceitação de procedimentos médicos e
boração. expressão de sentimentos relativos à hospitali-
zação. De acordo com a análise do comporta-
Domingos (1993) demonstrou a impor-
mento, expressar sentimentos, ou verbalizá-los,
tância de os pais participarem do processo junto
pode contribuir para a diminuição da ansiedade
à criança, pois podem desenvolver repertório
frente aos procedimentos médicos, porque pode
alternativo para lidar com ela. Apesar disso, na diminuir o sentimento de incontrolabilidade
faixa etária entre 3-12 anos, 84% dos acompa- diante da situação de hospitalização, além de
nhantes optaram por deixar os filhos sozinhos modificar a função da condição estimuladora.
com as estagiárias durante as intervenções. Tal condição deveria ter como objetivo a manu-
Azevedo (1999) descreveu que, nessa situação, tenção da saúde da criança e o desenvolvimento
pode ser importante que pais também descan- de repertório útil, quando generalizado para
sem e se envolvam com suas próprias coisas, lidar com condições de vida adversas, além de
facilitando, no retomo ao hospital, o convívio aumentar a socialização no contexto hospitalar.
com a criança.
Referências Bibliográficas
Percebeu-se que atividades como dese-
nhar, jogar, modelar, conversar e recursos como Angerami, V. A. (1994). O psicólogo no hospital. In:
carrinho, massinha e quebra-cabeças foram util- V. A. Angerami, Psicologia hospitalar. São
Paulo: [s.n.] .
izados em várias fases de desenvolvimento da
criança, mas de maneiras diferentes. Conside- Azevedo, M. R. Z. S. (1999). O papel e importância
ra-se que as mesmas atividades podem ser uti- do lúdico para profissionais da saúde: Análise
lizadas em diferentes fases do desenvolvimento de jogos e brincadeiras no contexto hospitalar.
da criança, só que com objetivos diferentes, (Dissertação de Mestrado em Educação, Univer-
sidade Estadual de Londrina).
adaptando-se ao sexo, nível de desenvolvimen-
to e ambiente no qual o indivíduo está inserido. Bontempo, E. (1986). Psicologia do brinquedo:
Aspectos teóricos e metodológicos. São Paulo:
Para a maioria das crianças, as atividades
Nova Stella.
foram bem aceitas e favoreceram a interação,
expressão de sentimentos e verbalizações. Domingos, N. A. M. (1993). Preparo para cirurgia:
Constatou-se que carrinho, boneca e bichinhos Teste de programas psicológicos na redução de
emborrachados favoreceram a verbalização de ansiedade de crianças e mães. Dissertação de
Mestrado (PUC). Campinas.
histórias com temas relacionados a acidentes,
hospitalização e morte, além de oportunidade Gaetan, R. H. M. C. (1997). O estresse na criança.
de explicitarem procedimentos médicos. Seminário de Psicologia da Saúde. São José do
Rio Preto: UNORP.
De modo geral, percebeu-se que a maio-
ria dos recursos foram efetivos, permitindo ma- Gesell, A. (1985). A criança dos 0 aos 5 anos. São
ior interação entre criança e profissional, Paulo: Martins Fontes.

Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 18, n. 3, pp. 33-42, setembro/ dezembro 2001
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