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PELLAUER, David. Compreender Ricouer.

- Ricouer tinha o “compromisso de entender a existência humana como uma existência


incorporada no mundo.” (PELLAUER, p. 25)

- “No argumento do cartesiano do cogito, uma das coisas que impressionam é o sujeito
ciente de si; ele sabe que conhece, que pensa. Ricoeur situa-se também nessa tradição
reflexiva que enfatiza a autoconsciência e, com ela, nosso conhecimento, além do
conhecimento que temos do mundo, mesmo admitindo que o autoconhecimento
depende sempre do nosso conhecimento do mundo. Modificará, no entanto, essa
tradição reflexiva, ao sustentar que nunca temos conhecimento direto ou imediato de
nós mesmos. Conhecemos a nós mesmos apenas indiretamente, em termos do mundo
objetivo e de nossas ações nele.” (PELLAUER, p. 26)

- O ‘eu’ “É alcançável apenas através da reflexão, mas reflexão que é agora ela própria
um processo de interpretação, processo que começa a partir do objeto, não do sujeito. É
por isso que diz: ‘A primeira verdade – sou, penso, permanece tão abstrata e vazia
quanto invencível; tem que ser ‘mediada’ pelas ideias, ações, obras, instituições e
monumentos que a objetivam’ (Da interpretação). Por isso, a reflexão não pode ser
simplesmente uma questão para uma teoria epistemológica que vise a justificar a ciência
ou mesmo, como Kant, a dúvida. Tem que ser entendida como um reapropriação do
nosso esforço para existir [...]”(PELLAUER, p. 68-69)

- “O que Ricoeur primeiro critica nesse tipo de abordagem [(estruturalista)] é o fato de


ela pôr de lado qualquer consideração sobre o tempo, assim ignorando a questão de
compreender tradições que podem mudar, mas continuam a existir com o tempo, do
mesmo modo que as formas sociais baseadas nelas, tradições que se reconhecem vivas
na história. Ligada a essa havia também a preocupação de como lidar com mudanças de
significado e, para além disso, com a possibilidade de novos significados. [...] O que
rejeita, entretanto, é a subordinação da diacronia – o desenvolvimento no tempo – à
sincronia, fatia atemporal do sistema considerado. Ele acha que isso elimina qualquer
possibilidade de mudanças de significado, uma vez que as estruturas descobertas são
tidas não só como atemporais, mas também universais. Já o que Ricoeur enfatiza é o
que começava a chamar de compreensão hermenêutica, que acreditava ter que enfocar
as coisas exatamente da maneira oposta – isto é, para uma filosofia hermenêutica a
diacronia é mais importante que a sincronia.” (PELLAUER, p. 81-82)
- “[...] para retornar a sua discussão inicial do estruturalismo e à introdução da ideia de
discurso, podemos dizer que o que Ricoeur vê é que, como palavras no dicionário, as
palavras no nível da langue são polissêmicas. Têm mais de um sentido, dependendo das
relações entre si em determinada estrutura. Devido a essa polissemia, no nível da langue
as palavras ainda não ‘dizem’ nada nem se referem a coisa alguma além de si mesmas,
dada a natureza fechada de sua estrutura constitutiva. São simples signos e, como tais,
condições necessárias, mas não ainda suficientes para o discurso, que é o nível onde
efetivamente alguma coisa é dita. Para algo significativo ser dito, uma sintaxe ou
gramática que possibilita uma sentença também é exigida. Com isso vem o problema da
predicação, que terá importantes consequências quando Ricoeur voltar-se para a questão
do discurso metafórico. A unidade mínima do discurso, portanto, é a sentença, que serve
para limitar pela sintaxe a polissemia de suas palavras, sem necessariamente eliminá-la
por completo. As sentenças geralmente não são unívocas de sentido, mas sim
plurívocas. Podem significar mais de uma coisa. [...]. A maioria das vezes [...] as
sentenças requerem alguma referência de contexto para serem entendidas. À medida que
desenvolve sua teoria hermenêutica, Ricoeur vai continuar elaborando a questão do que
conta como contexto e como isso afeta o significado do discurso.” (PELLAUER, p. 83-
84)

- “O discurso, por fim, sempre ocorre como um evento real no tempo, ao contrário das
estruturas abstratas atemporais descobertas pelo estruturalismo. Essas estruturas de fato
persistem de algum modo, no sentido de que podem ser identificadas a qualquer tempo
(e, se mudam, fazem-no apenas lentamente ao longo do tempo), mas os eventos do
discurso são passageiros. Pode-se dizer mesmo que eles desapareceram.”(PELLAUER,
p. 85)

- “A alegação-chave de Ricoeur nesse ponto é que, embora um evento do discurso


desapareça, ao menos por ser tornar passado, seu significado pode perdurar. É isso que a
teoria hermenêutica tem que explicar, pois se os significados persistem quando o evento
passou, tais significados podem ser ‘tomados’ – apropriados vai virar o termo técnico
aplicável- por novos sujeitos em novas épocas e novos contextos. Essa possibilidade de
o significado assim perdurar, diz Ricoeur, pode ser confirmada se mudarmos o foco de
atenção do discurso falado para o discurso escrito (ou que Ricoeur chama de inscrito).
Pois se o evento da fala some, os textos permanecem e podem ser lidos por qualquer um
que saiba ler.”(PELLAUER, p. 85)
- “[...] o evento original do discurso que produz um texto desaparece, como finalmente
também desaparecem seu autor, seu público original e o cenário cultural. Mas o
argumento de Ricoeur é que o discurso transmitido por um texto permanece
potencialmente significativo se ele ainda puder ser lido. Sua alegação, antes de mais
nada, é que tal leitura é possível porque o que o texto diz tem tanto sentido quanto
referência: tanto diz algo significativo quanto se refere a algo além de si mesmo. [...]. O
mais importante, porém, é que, enquanto inteligível, um texto (e por analogia qualquer
instância do discurso) é significativo por combinar sentido e referência. Esse significado
mais amplo não deve ser identificado com algo supostamente na mente do autor ou
mesmo com sua intenção ao produzir o texto. Nem é o que o público original
interpretou do texto, embora seja possível tentar redescobrir o que um texto pode ter
significado para o seu primeiro público ou tentar escrever uma história da recepção do
seu significado como tarefa secundária. Não, o que torna um texto significativo, em
primeiro lugar, dando-lhe tanto sentido quanto referência, é o que Ricoeur chama de o
mundo do texto.Trata-se de algo que o texto, por assim dizer, projeta não atrás, mas à
frente de si. Dissemos que o discurso é sempre sobre algo. Os textos são, em última
análise, sobre esse ‘mundo’ que os leitores podem se imaginar habitando. Daí
compreender um texto (ou qualquer instância de discurso) depende, para Ricoeur, de
captar o mundo do texto (ou do que é dito) como um mundo que eu posso ou nós
podemos imaginar habitando. Mas uma vez que o ‘eu (ou nós) em questão difere do
tempo, assim também o significado do texto de que alguém se apropria vai diferir de
alguma forma de uma época para outra e de um lugar para outro, sem por isso se tornar
sem significado.” (PELLAUER, p. 86-87)

- “Ricoeur começa a discussão da metáfora com um retorno a Aristóteles, que abordou o


assunto em sua Poética e no seu livro sobre retórica. Aristóteles considerava que o
discurso retórico e o discurso poético – até dado o uso que fazem da metáfora e outras
formas figurativas – sobrepunham-se à lógica por [acaba p. 94] causa do apelo de
ambos a algum tipo de argumentação. Essa ênfase no argumento é importante porque o
argumento retórico introduz a ideia de criatividade (no sentido de encontrar um
argumento persuasivo) e também lança mão de uma ideia de prova. A poesia também é
criativa, mas, ao contrário da lógica, ‘não busca provar nada absolutamente: seu projeto
é mimético, seu objetivo [...] é compor uma representação essencial das ações humanas’
(Metáfora viva, p. 13). A metáfora, como uma forma de inovação semântica,
desempenha um papel tanto na retórica, considerada uma teoria da argumentação,
quanto na poesia e no drama como as tragédias gregas, que Aristóteles afirmava serem
mais verdadeiras que a história porque nos mostram não tanto como as coisas são, mas
como devem ser. Em ambos os casos de linguagem, a metáfora trabalha com uma língua
já existente na qual introduz uma ‘distorção’ ou desvio que a faz dizer algo novo; daí
que a inovação semântica mesma da metáfora é o que a torna capaz de criar novo
significado ao perturbar a ordem lógica existente, ao mesmo tempo que o gera sob nova
forma. E o faz, como já percebera Aristóteles, porque nos leva a ‘ver’ as coisas de modo
diferente, não imitando-as – no sentido de produzir uma cópia -, mas redescrevendo-as.
É por isso que a metáfora tem uma função referencial e, em última análise, ontológica,
assim como uma função criativa.” (PELLAUER, p. 94-95)

- “[...] a metáfora viva suspende a maneira corriqueira de referirmos a realidade, em prol


de uma referência de segunda ordem que redescreve a realidade. Mas essa redescrição
mesma é sempre uma outra interpretação de que realmente são as coisas.”
(PELLAUER, p. 97)

- “A teoria da narrativa é uma das mais desenvolvidas e influentes contribuições de


Ricoeur ao conhecimento. Estende-se pelos três volumes de Tempo e Narrativa, junto
com um número de ensaios que abordam partes do tema ou servem para preparar os
alicerces desses volumes. [...]. Sua tese é de que ‘o tempo se torna humano na medida
em que é organizado à maneira de uma narrativa; e a narrativa tem sentido, por sua vez,
na medida em que retrata os aspectos da experiência temporal’ (Tempo e Narrativa I, p.
3). [Mas], como dirá Ricoeur no volume três da obra, toda tentativa filosófica de
entender o tempo acaba pagando o preço de novas aporias, novas questões, por cada
ganho obtido [acaba p. 99]. Daí não poder haver nenhuma resposta teórica final sobre o
significado do tempo, só respostas práticas como as que fazem uso da narrativa para
contar a história da ação humana e do mundo em que ocorre.” (PELLAUER, p. 99-100)

- “O que distingue a narrativa como forma de discurso é que ela sempre tem uma trama.
Essa trama ou enredo produz o seguinte: combina os episódios e a história como um
todo num conjunto significativo. E o faz pela capacidade da trama de reconfigurar em
narrativa o que já estava configurado na língua anteriormente, através da rede conceitual
que já nos permite falar significativamente sobre a ação humana. Essa rede conceitual é
muito heterogênea. Inclui conceitos tais como causa, razão, motivo, ação e paixão,
trabalho, agente, paciente, objetivo e assim por diante. Tais conceitos já podem ser
combinados em sentenças de ação com fim em aberto. [...]. O que a narrativa faz é
tomar tal discurso, já mimético por significar ou [acaba p. 100] ‘figurar’ ação em
linguagem, e acrescentar-lhe novas características discursivas que lhe dão novo
significado ao torná-lo história de ‘algum feito’. Ao mesmo tempo, a narrativa oferece a
possibilidade do discurso estendido sobre a ação, discurso que vai além do nível das
sentenças de ação, discurso que vai além de ações individuais para falar de coisas que
acontecem não apenas no tempo, mas também ao longo do tempo, incluindo possíveis
consequências ao longo do prazo e mesmo desconhecidas anteriormente. A narrativa faz
isso contando uma história sobre a ação humana e seu significado. Tal história, por sua
vez, pode ser ouvida ou lida e, quando compreendida, contribui para reconfigurar nosso
entendimento da ação humana e suas possibilidades. Essa nova forma de inovação
semântica ocorre porque a narrativa enxerta novos elementos temporais às
configurações pré-narrativas da ação e, através deles, à nossa compreensão tanto da
ação humana quanto do próprio tempo. Será tarefa de uma hermenêutica do discurso
narrativo reconstruir e assim tornar inteligível toda essa sequência, da experiência
vivida à narrativa e desta novamente de volta à experiência vivida.” (PELLAUER, p.
100-101)

- “A narrativa funciona aqui introduzindo mediações entre os eventos, incidentes ou


episódios individuais na trama e na história como um todo. Assim, faz uso de uma
ampla gama de elementos heterogêneos que incluem agentes, objetivos, meios,
interações, circunstâncias, reviravoltas e mesmo resultados inesperados. Em outras
palavras, a trama constitutiva da narrativa, extraindo uma configuração de uma
sequência de eventos compreensível, combina uma dimensão cronológica e outra não
cronológica num todo significativo. [acaba p. 101]. [...]. No discurso narrativo, portanto,
podemos encontrar um tempo reconfigurado que, na melhor das hipóteses, nos ajuda a
entender melhor o tempo comum de nossas vidas cotidianas, assim como suas situações
limites. Essa compreensão melhorada do tempo e da ação humana pode
subsequentemente dar origem a novas formas de configurações narrativas. Mais: pode
melhorar a compreensão da própria realidade enquanto algo temporal. Como coloca
Ricoeur, ‘fazer uma narrativa é ressignificar o mundo na sua dimensão temporal, na
medida em que narrar, contar, recitar é refazer a ação seguindo o convite do poema’
(Tempo e narrativa I, p. 81), em que este mundo e a ação referida já eram significados
pela linguagem sobre as nossas ações no nível pré-narrativo. Daí, mesmo que o próprio
tempo não seja nunca diretamente observado, ele pode ser narrado e, ao sê-lo, pode ser
compreendido de forma prática.” (PELLAUER, p. 101-102)

- “A ficção, como o outro grande tipo de narrativa, nos dá mais percepção de como a
narrativa configura e em última análise, reconfigura o tempo. Ricoeur considera vários
pontos [acaba p. 106] ao examinar a ficção, mas sempre com vistas a dar suporte a sua
tese básica sobre a relação entre tempo e narrativa. Antes de mais nada, analisa a
questão específica do tempo na narrativa ficcional, notando que a possível lista de
gêneros narrativos não está fechada. Isso é demonstrado pela descoberta (ou invenção)
do romance como uma nova forma de escrever ficção. O romance é notável por sua
variedade em se tratando de exemplos concretos, mas de modo mais geral Ricoeur
observa que, em comparação com formas anteriores, incluindo o drama, como na
tragédia grega, ele amplia a esfera social na qual se desenrola a ação ao dar atenção a
pessoas comuns. Também introduz uma ênfase maior nas personagens como indivíduos
nos quais devemos pensar como pessoas reais e não como meros tipos ideais ou míticos
como o herói ou o vilão. Com isso vem uma ênfase crescente na complexidade social e
psicológica, combinada com novas maneiras de conceber a vida interior, culminando no
século 20 com a corrente do romance de consciência. ‘No entanto nada nessas
sucessivas expansões do personagem em detrimento do enredo escapa ao princípio
formal da configuração e, portanto, ao conceito de trama.’ (Tempo e narrativa II, p. 10).
O que é mais importante sobre o romance, no entanto, é que ele leva a novos
desenvolvimentos da técnica narrativa por se tratar de um gênero que constantemente
luta para não ser reduzido a um conjunto fixo de convenções ao mesmo tempo que
confronta os leitores com a questão: estamos diante da ilusão ou da semelhança com a
realidade? A resposta de Ricoeur a essa questão leva-o a abandonar o seu uso anterior
da ideia de ‘redescrição’ para caracterizar o que acontece com a metáfora viva,
passando à ideia de ‘reconfiguração’ a fim de captar o que acontece através da narrativa
quando é ouvida ou lida e entendida. Isso porque, como toda narrativa, a ficção nos
apresenta um mundo do texto no qual se supõe o desenrolar da história e este é um
mundo que podemos nós mesmos imaginar habitando. Daí, com base nisso, a ficção
narrativa é uma forma de ver o mundo diferentemente, mas também de modos que
podem ser verdadeiros acerca do mundo tal como ele efetivamente é ou pode ser.
(PELLAUER, p. 106-107)
- “[...] Ricoeur tem mais a dizer sobre a ficção e suas possibilidades. Considera, por
exemplo, a questão de saber se os desenvolvimentos da técnica narrativa serão jamais
exauridos, questão que surge tão logo reconhecemos que eles podem mudar. Sua
resposta é que não temos como conceber tal coisa, uma vez que nos deixaria sem
nenhum meio de compreender o tempo mais. Com efeito, não temos ideia do que seria a
cultura se ninguém mais soubesse o que significa narrar coisas’ (Tempo e narrativa II,
p. 28).”(PELLAUER, p. 108)

- “[...] a ficção torna-se uma forma de articular novas experiências do tempo,


experiências fictícias que têm o mundo do texto como horizonte, um mundo que nos
ajuda, nos melhores casos, a ter um entendimento maior de nosso próprio mundo. [..].
Dizer é ainda uma forma de fazer, ‘mesmo quando o dizer se refugia no discurso surdo
de um pensamento silencioso, o qual o romancista não hesita em narrar’ (Tempo e
narrativa II, p. 156).” (PELLAUER, p. 110)

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