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O Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, dado este ano ao nosso

melhor crítico, Wilson Martins, chama a atenção para um lado, que é dos mais
trabalhosos, da literatura, responsável pelo aferimento do que fazemos, ou pensamos
fazer, quando mergulhamos na palavra. A bibliografia do premiado revela uma dialética de
pensamento que nos mostra, e à nossa literatura, como donos de um caminho singular,
próprio, seja em que gênero for. Em homenagem ao maior prêmio do País concedido a
Wilson Martins, desejo tratar hoje de um mestre da crítica, George Lukacs, que, no século
passado, abriu caminhos e ditou rumos.

George Lukacs chamou a atenção para o possível primado do romance sobre todas as
outras formas de literatura. Desde o começo de sua vida, esteve o húngaro Lukacs no
centro de uma transformação filosófica, a de Heildeberg, que lhe daria instrumentos para
interpretar alguns ângulos da estética do século XX, quando o centro universitário de
Heildeberg abrigou três grandes correntes do pensamento: o neo-kantismo; o
desenvolvimento e a compreensão de Dilthey; e a fenomenologia de Husserl.

Três jovens sentiram a influência dos estudos e debates então ali havidos: Heidegger,
Jaspers e Lukacs. Em 1908 publicou Lukacs o livro que em francês recebeu o nome de
"L'Ame et les formes". Já com a marca de uma dialética de pensamento que seria sempre
sua força, elaborava ele, nesse trabalho, uma síntese entre a teoria fenomenológica e a de
Dilthey - entre a "essência atemporal" e a "essência de significação" - chegando ao
postulado da "essência como estrutura significativa".

Diz Lucien Goldmann, em estudo sobre os primeiros escritos de Lukacs, que a idéia não
era inteiramente nova e que a "essência como estrutura significativa", embora não
formulada explicitamente, já constituíra o centro da dialética de Hegel e de Marx. Em sua
segunda obra, "La théorie du roman", mostrou Lukacs como o romance se havia tornado a
forma estética por excelência de nosso tempo.

Esse estudo, escrito durante o inverno de 1914-1915, saiu em 1916 (na Zeitschrift für
Asthetik und Allgemeins Kunstwissenschaft, de Max Dessoir) e em livro na cidade de
Berlim, no ano de 1920. Mas logo depois (em 1922) Lukacs repudiou o próprio
pensamento e, durante 40 anos, proibiu a reedição de "La théorie du roman", que só viria a
reaparecer em 1962, então cercado de enorme prestígio.

"Histoire et conscience de class", livro de 1923, marcaria o começo de um roteiro para


Lukacs, embora, para muitos, haja sua teoria do romance ficado como contribuição
definitiva para o aferimento do gênero. Que disse Lukacs, em linha gerais, nesse estudo?
Em primeiro lugar, que o romance é a principal forma literária de nosso tempo num mundo
em que o homem não se acha muito à vontade embora a ele indissoluvelmente atado.

Para a tragédia o homem estava em completa oposição ao mundo. O romance, como


forma dialética do épico, promove um compromisso entre o homem e o mundo. A tragédia
é a forma literária da essência pura, da "solidão e da negação de toda vida", ao passo que
o romance é "a presença na ausência". Acrescenta Lukacs que, "entre a literatura da
infância e da juventude, que é a epopéia, e a literatura da consciência e da morte que é a
tragédia, o romance é a forma literária da maturidade viril".

Filho do movimento filosófico do Sudoeste alemão tinha Lukacs de se ater a um método de


pesquisa positiva que fosse, ao mesmo tempo, compreensivo e explicativo. Tratando do
assunto, Goldman diz o que é lukacsianamente compreender: "compreender uma estrutura
é apreender a natureza e a significação dos diferentes elementos e processos que a
constituem como dependentes de suas relações com todos os outros elementos e
processos constitutivos do conjunto".

E "explicar um fato social é inseri-lo na descrição compreensiva de um processo de


estruturação dinâmica que o engloba". Com esses instrumentos preconizava Lukacs que o
exame de uma realidade fosse uma "descrição rigorosa e precisa" do real (ou de uma
obra), indo além do conceito de significação de Dilthey.

Estudando o problema das relações entre o indivíduo, a autenticidade e a morte, não se


espantou Lukacs com a chegada do primeiro conflito mundial que os filósofos oficiais não
haviam previsto. Em prefácio, escrito em julho de 1962, para a reedição de "La Théorie du
Roman", diz o autor que, no momento de elaborar essa teoria, achava-se em oposição à
guerra.

Talvez isso o haja levado a ver com mais clareza o indivíduo problemático que é o herói
típico em que essa estrutura romanesca se apresenta com uma determinada essência
significativa, ligada às condições históricas em que essa estrutura surgiu. Sendo o herói
negativo e positivo a um tempo, numa dialética interna de sua existência como habitante
de história fictícia que corresponde a uma dualidade real, na luta entre o homem de
verdade e a história entre o herói degradado da vida cotidiana e as forças gerais que o
circundam.
Distinguiu Lukacs três tipos fundamentais de romances: o romance do idealismo abstrato,
de personagem demoníaco (personagem-problema), cuja consciência é simples demais
para a complexidade do mundo ("Dom Quixote" ou "O vermelho e o negro"); o romance
psicológico de herói passivo, cuja alma é demasiadamente larga para se adaptar ao
mundo ("Educação sentimental"); e o romance pedagógico da renúncia consciente que
não é resignação nem desespero (Wilhelm Meister, de Goethe).

Como toda classificação muito esquemática possuía, esta, o defeito de deixar de fora
terrenos importantes do gênero que estudava. Assim, Balzac não tinha como ingressar
numa das três categorias e ficaria relegado a uma literatura de divertimento (de que
Graham Greene seria, mais tarde, um executor), principalmente por faltar, ao criador de
"Eugénie Grandet", o indivíduo problemático de Lukacs, embora houvesse este em outros
ensaios, realçado a evidente importância de "A comédia humana" e do romancista que a
concebeu e executou.

Pode parecer, a muitos, a teoria lukacsiana, incompleta, ou pode tê-la seu autor repudiado.
Contudo, tal como está - principalmente complementada pelos estudos sobre ensaio e
tragédia de "L'Ame et les formes", livro anterior (de 1910), e por "La signification présent
du réalisme critique", obra da maturidade de Lukacs (1957) - é um trabalho válido de que a
estética do romance não pode, em nosso tempo, se afastar de todo. O que escreveu sobre
Tolstoi no livro que renegou, e o que disse de Kafka e Thomas Mann em "La signification"
constituem peças definitivas de aferimento da ficção como obra de arte de uma época
problemática.

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