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1.

1 A personagem chama-se George e caminha numa rua longa, mas familiar, uma vez
que é a “rua onde George volta a passar depois de mais de vinte anos” (ll. 3-4).

2.1 A construção do retrato faz-se, aparentemente, com apelo à memória. O rosto da


jovem vai surgindo aos poucos e vai ganhando contornos mais definidos à medida que vai
ficando mais presente. Inicialmente é desfocado, “vago e sem contornos” (l. 12), como se se
tratasse de uma mancha. Vai ganhando, depois, feições, ainda que “incertas”. Ao ficar mais
próximo, destacam-se os olhos largos, semicerrados, a boca fina e os cabelos lisos escuros
“sobre um pescoço alto de Modigliani” (ll. 21-22).

2.2 As sensações visuais dominam a construção do retrato, tal como se de uma pintura
se tratasse, desde a descrição dos vestidos, “claros, amplos” (l. 9), ao seu movimento e à
composição do rosto, “vago e sem contornos” (l. 12), “pincelada clara” (ll. 12-13), “mancha
pálida” (l. 16), “olhos largos” (l. 20) e “pescoço alto” (l. 21). Existe também o recurso à
sensação auditiva na referência à voz “real e viva” (l. 17).

3. Simbolicamente, estas alusões dão conta do desdobramento da personagem,


comprovável pelo movimento dos vestidos (que são muito semelhantes), pela fotografia que
George tem guardado ao longo da vida, e que constitui o seu único “fetiche”, e que é, afinal, a
imagem “da mais nova”, e, por fim, pela voz que se mantém clara como no passado, apesar de
todas as perturbações da vida de George. Todas estas referências indicam que se trata de uma
recordação e não da realidade, o que se comprova por meio da expressão “nesse tempo,
dantes, não sabia quem era Modigliani”.

4. Ironia, uma vez que pretende evidenciar as diferenças culturais entre George, que
era conhecedora de literatura, cinema e pintura, e os seus pais, que ela considera quase
ignorantes, o que acaba por influenciar a sua decisão de partir.

5. A interrogação pretende reforçar a inconstância e o caráter plural de George, ideia


que percorre todo o parágrafo. Em primeiro lugar, as várias transmutações físicas,
evidenciadas na mudança da cor dos cabelos, sem, contudo, se aproximarem da cor
primordial; em segundo lugar, as vivências amorosas (“Teve muitos amores”, l. 36, “casou-se,
divorciou-se”, l. 37) e o movimento físico que caracteriza a sua vida, “partiu, chegou, voltou a
partir” (l. 38).

6. George desloca-se à vila após a morte dos pais, para vender a casa que herdou. Esta
ação originou o reencontro da mulher adulta com a jovem que foi no passado (“cujo nome
quase quis esquecer, quase esqueceu”, ll. 8-9), mas de quem nunca se tinha libertado
(guardou sempre a sua fotografia), o que acabará por suceder agora, já que o frágil elo que
ainda a ligava ao passado (a casa) se quebrou, afastando por completo Gi (“o esquecimento
desceu sobre ambas”) e o espaço natal (“Árvores, casas e mulher acabam agora mesmo de
morrer”, ll. 123-124).

7.1 Ambos ambicionam coisas diferentes da vida. Carlos pretende “criar” raízes na vila;
construir uma casa, o que poderá ser entendido com obtenção de estabilidade e fixação ao
local. Gi, por seu lado, pretende ver o mundo, partir, vontade que não concretizará se tiver a
casa; por isso, vive em casas arrendadas, não estando presa a pormenores: a casa alugada é a
certeza de “rua nova à espera dos seus pés” (l. 48).

8.1 A velocidade do comboio associada à simbologia do termo “fugir” significa o corte


radical com o passado. Quebrado o laço umbilical com o berço materno – a casa –, nada mais a
ligará a quem foi.

9.1 O processo de construção é semelhante ao da figura feminina mais jovem, Gi. A


figura vai-se criando “aos poucos como um puzzle gasoso, inquieto, informe”, até se
corporizar, neste caso, numa “mulher velha” (l. 136).

10. O discurso direto evidencia a personagem e a relevância da sua voz; o diálogo


entre o presente, George, e o passado, Gi, funcionando como uma analepse através da qual
são revelados aspetos do passado da personagem e confirmadas algumas informações do
presente – vive em Amesterdão. Já no confronto com o futuro, a personagem autoassume o
seu receio da passagem do tempo e as repercussões que isso terá no plano pessoal (“cheguei à
ignomínia de pedir […] retratos da minha família”, ll. 156-157) e profissional (“um dia vai
reparar […] que as mãos lhe tremem”, ll. 165-166).

11. As três fases da vida humana aparecem fragmentadas e são corporizadas pela
memória e pela imaginação, estando representadas no nome que a personagem vai
assumindo ao longo dos tempos: Gi, uma jovem de 18 anos, repleta de sonhos e de projetos,
que anseia abandonar a terra natal para os cumprir. George, adulta, no apogeu da vida, tem 45
anos, pintora bem-sucedida, “já com nome nos marchands das grandes cidades da Europa”,
mulher independente a todos os níveis – financeiro, profissional, amoroso. Georgina,
precursora do futuro de George, antevendo os temores emocionais, anuncia a solidão (“vivo
tão só”) e o envelhecimento físico.

12. A viagem física de George dá origem a uma viagem interior. Desta forma, por um
lado, dá-se o reencontro com o seu passado e a revisitação, através da memória, desse tempo
e dos sonhos que a povoavam e a impeliam a partir; por outro, através de uma idealização, é
possível antever o envelhecimento físico e a solidão causadas pelo desprendimento emocional
em que George vive. Comprova-se, assim, prevalência do espaço psicológico.

13. O nome da personagem, aparentemente masculino, dever-se-á à sua maneira de


ser, mulher independente, liberta, também no campo amoroso, e com vontade de vencer no
mundo da pintura, isto é, uma mulher que é o oposto das suas contemporâneas e
conterrâneas, muito mais dedicadas a tarefas ditas ou consideradas mais apropriadas às
mulheres.

14. Trata-se de um conto em virtude da concentração espacial e temporal. A história


desenrola-se em dois espaços: numa rua (da vila natal de George) e no comboio que leva a
personagem de regresso a Amesterdão. Decorre num curto período de tempo:
correspondendo ao curto diálogo de George com o seu “eu” do passado e à antevisão do “eu”
do futuro. E a ação é única: uma viagem interior da pintora. Está também presente uma
personagem única.

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