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A DITADURA MILITAR BRASILEIRA:

A TRANSIÇÃO NEGOCIADA CONTRA OS

INTERESSES POPULARES
Ivan Seixas1

Apresentação

A História é sempre uma sucessão de acontecimentos encadeados. Não


existe começo, meio ou fim na História, como se vê em filmes ou novelas de
televisão. O que vivemos hoje é consequência do que aconteceu no passado e vai
gerar consequências para o que ainda está para acontecer no futuro.

O objetivo deste trabalho é dar elementos para todas as pessoas que se


interessam por entender nosso país e querem ajudar a construir um futuro sem
preconceitos, sem injustiças e sem permitir que existam pessoas acima da lei.
Conhecer a História é passo fundamental para que se entenda o momento em que
se vive e se possa construir o futuro. Conhecendo o passado se entende o presente
e pode-se ter condições de construir o futuro sem cometer os mesmos erros
cometidos no passado.

Do mesmo modo, conhecer conceitos políticos, a estrutura e o funcionamento


do Estado permite entender nossos direitos e nossas capacidades para interferir na
História de nosso país. Só assim não se reivindica coisas para o agente errado. Ou
deixa-se de exigir o que é um direito fundamental para os seres humanos.

1
Ivan Seixas, jornalista, durante a ditadura militar foi membro do MRT (Movimento Revolucionário
Tiradentes), organização de resistência armada à ditadura e ao imperialismo norte-americano. Foi capturado e
passou quase 6 anos nas mãos do regime de terrorismo de Estado. Solto no processo de “abertura lenta, gradual e
segura” do ditador Ernesto Geisel, se engajou imediatamente nas lutas populares pela reconquista das liberdades
democráticas e da reconstrução da democracia no Brasil. Foi presidente do CONDEPE – Conselho Estadual de
Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo, Coordenador da Comissão Estadual da Verdade de São
Paulo e assessor da Comissão Nacional da Verdade. Atualmente é o Coordenador do Projeto Direito à Memória
e à Verdade da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
A atividade humana chamada política deve ser vista como algo muito salutar
e importante para o desenvolvimento da sociedade. E os jovens devem ter interesse
em participar dela como modo único de interferir e mudar os rumos do seu país. De
nada adianta reclamar que as coisas estão ruins, se quem reclama não participa das
mudanças. Para participar, é preciso entender o mundo para não ser manipulado.

Conhecendo um pouco da nossa História e um pouco de como funciona o


nosso país, será possível atuar para mudar o que está errado, tirar entraves que
impedem a evolução de nossa sociedade e acertar os caminhos melhores para o
coletivo, sem cometer os erros já cometidos anteriormente.

Aqui, apresentaremos um pouco da História de nosso país e pretendemos


mostrar como se comportaram os personagens desse período. Só assim se fará
justiça com quem merece ser louvado ou merece ser colocado em seu devido lugar.

O objetivo maior deste trabalho é despertar o interesse para que mais


pessoas participem da História hoje e possamos deixar um país melhor para nossos
filhos e netos. Pessoas que participem de forma consciente e organizada.

O que é o Direito à Memória e à Verdade

Uma das peças básicas para a compreensão da História é a busca da


Verdade, pois a partir dela se tem os elementos fundamentais. A explicação é que
nada se constrói sobre a mentira a não ser a própria mentira. A Verdade dos fatos
permite a real compreensão e a transformação e o desenvolvimento. A verdade só
interessa para quem quer transformar o mundo.

Na moderna ideia de resgate da História Humana recente a Memória e a


Verdade são colocadas como um direito, muito mais do que uma simples percepção.
Não se trata de se ter a História como parte do país e de seu povo, mas de uso
dessa História como parte da vivência presente e sempre atual do povo. E, para se
ter essa História contada e vivida, é fundamental se ter a Verdade como princípio. A
exigência de nunca se ter omitida uma parte sequer da experiência vivida pelo povo
passa a ser um direito e também uma necessidade para se continuar o processo.

A ideia da defesa dos Direitos Humanos é sempre atacada como se fosse a


defesa de criminosos ou a defesa de privilégios para quem cometeu crimes. Quem
fala isso, na realidade, está defendendo a instalação da barbárie e a lei do mais
forte, baseado na intolerância e no preconceito. A defesa dos Direitos Humanos é
acima de tudo a defesa da Justiça, a legalidade e do Direito. Não se faz Justiça
cometendo o atropelo do Direito ou da Legalidade. A defesa da Justiça é antes de
tudo uma atividade democrática e republicana.

Para se entender o que vem a ser uma atividade republicana ou um


comportamento republicano, deve-se entender que na República as pessoas têm
direitos iguais e deveres iguais também. Perante a lei o trabalhador tem direito a um
voto, do mesmo modo que seu patrão também o tem. Ambos são iguais perante a
lei. Ninguém é mais do que o outro. Quem ocupa a presidência da República tem
que cumprir a lei do mesmo modo que o cidadão comum, sem cargo público.

O que é uma ditadura?

É comum as pessoas falarem sobre a ditadura como se fosse um governo


que, de uma hora para outra, passa a reprimir seu povo, torturar e matar sem motivo
aparente ou explicável. Esse tipo de visão está totalmente errado.

Ditadura é uma forma de governo em que os direitos não são respeitados e


todos os poderes estão concentrados em um indivíduo ou grupo de indivíduos. Para
que essa concentração de poder aconteça é preciso que a divisão de poder,
característica da Democracia, seja ignorada ou destruída. Na Democracia há uma
divisão de poderes, que se completam e organizam a vida das pessoas. Em tese, na
Democracia como a conhecemos são três os poderes existentes: Executivo,
Legislativo e Judiciário. O Poder Legislativo tem a tarefa de criar as leis, que
regulamentam a convivência entre as pessoas, diz o que pode e o que não pode ser
feito, o que deve e o que não deve ser feito pelos governantes, etc. O Poder
Judiciário julga o respeito e pune os que desrespeitam as Leis. Já o Poder Executivo
faz toda a máquina do Estado funcionar.

Nas ditaduras, o Poder Executivo assume o controle sobre os demais


Poderes e extrapola suas atribuições, com o uso das Forças Armadas e das
polícias, que tem o direito do uso da força dado pela lei. Nas ditaduras, o Poder
Legislativo perde força e é obrigado a fazer o que lhe impõe o Poder Executivo,
quando não é fechado. O mesmo acontece com o Poder Judiciário, que passa a
cumprir as leis impostas pelos ocupantes do Poder Executivo forte.

Quem concentra o poder durante as ditaduras representa um setor da


sociedade, que quer ver seus projetos políticos, econômicos e sociais impostos. Em
geral, as ditaduras são o instrumento de execução de um projeto da classe
econômica e politicamente dominante sobre os demais segmentos da sociedade.
Não há registro na História de ditaduras existirem para atender o capricho de uma
pessoa. Isso é coisa de filme, sem base na realidade histórica.

A manutenção das ditaduras é sempre feita com muita repressão e a prática


de muita violência sobre todas as camadas da sociedade. A censura e o
cerceamento do poder de crítica são a base do poder ditatorial. O uso de
propaganda e a mentira através dos meios de comunicação garantem que a
população não desperte para um sentimento de oposição.

O que é golpe de Estado?

Estado é a estrutura de organização das sociedades, que garante o


funcionamento das leis e de suas instituições. Se o Estado é capitalista, por
exemplo, todas as leis e instituições existem para garantir a produção do capital e
para garantir um mínimo de respeito aos que trabalham na produção do capital para
o capitalista. Para aqueles que possam ou tentem desrespeitar a lógica do
capitalismo existem as leis e instituições para fazer seu enquadramento e punição.
Do mesmo modo, isso acontece nos Estados que tem o socialismo como objetivo.
Todas as leis e instituições existem para garantir que a produção da riqueza coletiva
e a manutenção do Estado socialista. E nos países que o Estado é baseado numa
determinada religião a legislação e instituições existem para manter toda a
sociedade respeitadora dos preceitos daquela religião.

Em todos os Estados que funcionam em condições normais a divisão dos


Poderes Constituídos é respeitada. O Legislativo faz as leis, o Judiciário julga o
respeito a elas e o Executivo age para o funcionamento de toda a máquina estatal.
O golpe de Estado acontece quando um dos poderes impede o
funcionamento dos demais e passa a agir de forma impositiva sobre a sociedade.
Em muitos casos, há o assalto ao poder. Nesses casos, o uso da força derruba o
poder instituído e quebra a ordem jurídica existente. Em geral, são usadas as Forças
Armadas para fazer esse assalto ao poder, quando o presidente é derrubado, os
meios de comunicação são censurados, a liberdade dos cidadãos é tirada e os
poderes do Estado são impedidos de funcionar. Poucas vezes na História um
presidente deu um golpe, assumindo o controle do Estado sozinho, pois para isso
precisaria também do apoio das Forças Armadas.

No Brasil, em 1964, as Forças Armadas deram um golpe de Estado para


implantar uma ditadura militar, que atendia os interesses estrangeiros,
principalmente dos EUA, era contrária aos direitos dos pobres e cometeu violência
contra a população, em geral. Esse projeto econômico, político e social era contrário
ao que estava sendo levado a efeito pelo Presidente João Goulart e as forças
políticas e sociais que o apoiavam. Jango, como era conhecido o presidente, era
nacionalista e tinha uma política em defesa dos direitos dos trabalhadores, e tinha
respeito pelos direitos de todos os cidadãos brasileiros, principalmente os pobres.

Pretextos para o golpe de Estado de 1964

O governo de João Goulart tinha como grande marca a aplicação das


chamadas Reformas de Base, que tentavam levar um desenvolvimento mínimo ao
país. Muito longe de ser uma revolução social ou política, essas reformas estruturais
tentavam dar ao país condições de desenvolvimento e à população pobre um pouco
de condições de vida. Eram a Reforma Agrária (distribuição de terras aos
camponeses), Reforma Urbana (programas habitacionais com a construção de
casas para a população pobre morar), Reforma Educacional (programas
educacionais para os filhos de trabalhadores estudarem e cursarem universidades),
Reforma Fiscal (para fazer os ricos pagarem impostos e não apenas as camadas
médias e trabalhadores) e a Lei de Remessa de Lucros ao exterior (que obrigava as
multinacionais a deixarem no Brasil 10% dos seus lucros como reinvestimento e
geração de empregos). Era, portanto, um governo nacionalista, com preocupações
populares e democráticas.
Sindicalistas, partidos políticos de esquerda, intelectuais progressistas e a
população trabalhadora das periferias apoiavam o governo popular de João Goulart
e se mobilizava em defesa dessas reformas. Isso aumentou muito a popularidade do
Presidente e as eleições presidenciais, que aconteceriam em 1965, seriam muito
influenciadas por ele. A candidatura apoiada por Jango teria muita chance de ser
eleita e a bancada parlamentar de esquerda também. Essa possibilidade assustava
a direita brasileira. Além disso, o comportamento do povo brasileiro não era
favorável aos planos golpistas ou eleitorais da direita. Esse povo já tinha evitado o
golpe quando houve o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, e garantiu a posse de
João Goulart quando Jânio Quadros renunciou, em 1961. A participação popular
atrapalhava os planos dos golpistas.

Pesquisas realizadas pouco antes do golpe de Estado indicavam que João


Goulart era muito popular e as reformas propostas por ele tinham o apoio da maioria
da população, em geral. Mais de sessenta por cento da população aprovava o
governo de Jango e quase setenta por cento apoiava as Reformas de Base proposta
pelo governo de João Goulart. As chances eleitorais da direita eram mínimas. Pelo
voto nunca teriam o apoio da população, que aprovava a política econômica e social
do governo trabalhista. Só restava à direita brasileira o golpe de Estado.

Além dos empresários aliados dos EUA e interessados na instalação de um


governo que tirasse os direitos trabalhistas, a liberdade sindical, a liberdade de
opinião e expressão, quem se colocou a favor do golpe de Estado foi a chamada
classe média, iludida pela propaganda conservadora, moralista e anticomunista da
campanha de desestabilização do governo, feita pelos grupos criados pelos
golpistas para criar o clima de caos no país.

As forças que deram o golpe de Estado de 1964 e implantaram uma ditadura,


que durou 21 anos, tentavam esse assalto ao poder desde o fim do regime do
Estado Novo, de Getúlio Vargas. Seguiam as orientações do Departamento de
Estado dos EUA, que estava empenhado na chamada Guerra Fria. Essa Guerra Fria
era o confronto ideológico entre o capitalismo, representado pelos EUA, e os países
de economia socialista, representados pela União Soviética. Não era uma guerra
aberta, mas um confronto de cunho ideológico e propagandístico contra o perigo de
uma suposta dominação comunista nos países sob influência norte-americana. Os
militares brasileiros e a parte mais conservadora e reacionária da burguesia
brasileira passaram a combater tudo o que poderia ser uma movimentação de cunho
progressista, renovador ou que pudesse parecer revolucionário.

Conseguiram eleger o presidente Eurico Gaspar Dutra, que teve um governo


autoritário e cerceador de atividades populares e políticas. Fechou o Partido
Comunista, restringiu a atividade sindical e reprimiu atividades culturais ousadas.
Mais importante ainda, criou a Escola Superior de Guerra, órgão maior da paranoia
anticomunista e centro articulador da direita conservadora do país. Com a eleição de
Getúlio Vargas para a presidência da república, essa articulação política de direita
passou a conspirar contra o governo e fazer oposição aberta, que levou ao suicídio
do presidente da República. A morte de Getúlio Vargas gera uma monumental
manifestação popular, que impede o golpe de Estado em 1954.

A mesma pressão contra a democracia se dá com o governo de Juscelino


Kubistcheck de Oliveira, que tomou posse enfrentando uma crise militar séria
mobilizada por esse mesmo grupo. A pressão continua até chegar a posse de João
Goulart, em 1961, depois de nova crise militar resultante da renúncia de Jânio
Quadros. Nesse momento, outra vez a população toma partido em defesa da
democracia e da legalidade democrática e republicana.

Para fazer a campanha contra o governo democrático de João Goulart, os


golpistas criaram alguns institutos de fachada para a conspiração. Eram o chamado
IBAD – Instituto Brasileiro de Ação Democrática, que fazia a agitação de rua contra o
governo, baseada em propaganda contra o comunismo, e o chamado IPES –
Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, que produzia propaganda anticomunista e
tinha um serviço secreto particular para perseguir opositores. Além disso, tinha uma
tal CAMDE – Campanha da Mulher pela Democracia, suposta entidade
representativa das mulheres cristãs e moralistas. Todas essas entidades faziam
campanha de calúnias e difamação contra o governo e contra o presidente João
Goulart, com apoio da imprensa conservadora.

Houve uma desestabilização do governo, as empresas passaram a esconder


alimentos para deixar a população apavorada, os serviços públicos passaram a
sofrer com problemas técnicos inexplicáveis e o país parecia estar em um caos
completo. Era um caos provocado pela elite burguesa e seus parceiros. Com esse
clima terrível, as Forças Armadas se apresentaram para fazer o assalto ao poder.
Não era uma vontade da maioria das Forças Armadas, mas vários coronéis e
generais se colocaram contra o governo e manifestaram o desejo de derrubar o
governo o quanto antes. Começava a destruição da Democracia e começava a ser
implantada a mais longa ditadura que o país já viu.

Militares deflagram o golpe de Estado e assaltam o poder

Na madrugada de 31 de março para primeiro de abril de 1964 tropas do


exército se deslocam de Juiz de Fora para tomar a cidade do Rio de Janeiro. O
comandante dessas tropas, que começaram o assalto ao poder, era o general
Olímpio Mourão Filho, de formação fascista, integrante do Partido Integralista e
redator do texto do chamado Plano Cohen, um falso plano de tomada do poder
pelos comunistas, em 1937, que justificou o golpe de Estado que implantou a
ditadura do Estado Novo (de 1937 até 1945).

Quase todos os meios de comunicação foram invadidos para garantir que não
haveria resistência e que os jornalistas não divulgariam notas de protestos contra o
golpe. A sede da UNE – União Nacional dos Estudantes foi invadida e depois foi
incendiada por militares e membros de grupos paramilitares de direita. Antes de
queimar a sede da UNE, tudo de valor foi roubado e muita documentação perdida.
Quase todos os sindicatos foram invadidos, sofreram saques, suas diretorias foram
presas ou tiveram que fugir para não serem presas e passaram a ter interventores.
O país entrava num clima de brutalidade do Estado usurpado pelos militares, muitas
pessoas eram intimadas a depor em IPM – Inquéritos Policiais Militares e apareciam
mortas como se tivessem se suicidado inexplicavelmente.

Manifestações de rua foram reprimidas a tiros de fuzil e várias pessoas


morreram. Em Recife, o líder camponês comunista Gregório Bezerra foi torturado
em praça pública e seu corpo foi arrastado pelas ruas da capital pernambucana,
numa cena de horror aplaudida por senhoras católicas ligadas ao IBAD. O Coronel
Alfeu de Alcântara Monteiro foi assassinado por se recusar a entregar a Base Aérea
de Canoas aos golpistas. Mostravam, assim, que não iriam permitir resistência e que
estavam ali para matar quem resistisse ou tentasse reverter o assalto ao poder.

O primeiro país a reconhecer a ditadura foi o dos EUA, como era de se


esperar, pois o governo daquele país deu apoio, dinheiro e orientação ao golpe.
Desde o início a participação do governo dos EUA atuou abertamente contra o Brasil
e a favor dos golpistas. O embaixador Lincoln Gordon e seu assessor Vernon
Walters nunca esconderam que financiaram os institutos golpistas e o próprio golpe.
Muitos são os documentos do governo americano que provam essa intervenção dos
EUA no Brasil e sua participação direta no assalto ao poder.

Ditadura com fachada de democracia

Uma característica da ditadura militar brasileira foi a de manter uma aparência


de legalidade e de normalidade no país. O Estado brasileiro funcionaria de modo
muito parecido com a democracia. Aparentemente, os poderes funcionariam de
forma harmônica e complementar, um Poder respeitaria os outros e tudo pareceria
ser democrático. O Poder Executivo tinha eleições e a cada quatro anos mudaria o
ocupante da presidência da república, haveria eleições que renovariam o Poder
Legislativo periodicamente e o Poder Judiciário funcionaria normalmente. E, além
disso, a imprensa trabalharia livremente. No entanto, não era bem assim.

Durante toda a ditadura, a Presidência da República só era ocupada por um


General de Exército escolhido entre os membros do Estado Maior das Forças
Armadas. Não podia ser um general de brigada ou de Divisão, e nem mesmo podia
ser um almirante ou brigadeiro. Isso mostrava o predomínio do Exército sobre a
Marinha e a Aeronáutica. Depois de escolhido entre os militares, o nome era
apresentado para uma votação simbólica no Congresso Nacional, que só podia
acatar a decisão. Governadores eram indicados pelo ocupante da Presidência da
República e os prefeitos eram indicados por esses governadores.

O Poder Legislativo tinha uma aparência de normalidade, pois os deputados e


senadores eram eleitos pelo voto dos cidadãos. Na realidade, o Congresso Nacional
foi fechado várias vezes, várias vezes as tropas do exército cercaram a sede do
Congresso Nacional numa atitude ameaçadora, muitos deputados e senadores
tiveram seus mandatos cassados por não obedecerem às ordens da ditadura e,
portanto, o legislativo brasileiro vivia sob tensão absoluta e constante.

O Poder Judiciário também funcionava em aparente normalidade, mas teve


vários de seus ministros do Supremo Tribunal Federal cassados nos primeiros
meses da ditadura e muitos outros juízes de esferas inferiores também. Os ministros
e juízes, que não foram cassados, foram aconselhados a pedir aposentadoria antes
do tempo para não serem presos ou cassados sem muitas explicações.

E como se comportou a imprensa nesse momento? A maioria dos órgãos de


comunicação do país apoiou o golpe e também a ditadura. Os veículos mais
importantes do país foram coniventes e colaboradores com os crimes da ditadura.
Não foram poucos os que se beneficiaram com a ditadura. Lógico que uma imprensa
assim não iria denunciar ou se dedicar a criticar os desmandos da ditadura. Passado
o primeiro momento da violência do golpe de estado, o Brasil passou a ser visto no
exterior como uma democracia que funcionava e onde tudo estava normal.

Essa aparência de legalidade não foi por acaso. Foi premeditadamente criada
para garantir o reconhecimento internacional e a respeitabilidade fora das fronteiras
do país. Com isso, imaginavam eles, ninguém pressionaria ou criticaria o Brasil
como uma ditadura. As exportações aconteceriam e tudo correria tranquilo. Durante
muitos anos ninguém sabia que o país vivia sob ditadura e que no Brasil havia
torturas, mortes e desaparecimentos de opositores políticos.

Essa aparência de democracia serviu para enganar os demais países e serviu


também para esconder dos cidadãos brasileiros a dura realidade existente. A
censura era implacável com os jornais de oposição e de baixa circulação, enquanto
que os grandes veículos de comunicação, que apoiavam a ditadura, não tinham nem
mesmo a preocupação de publicar algo nesse sentido. Os de oposição tinham um
censor dentro da redação, enquanto que os colaboradores faziam a autocensura.

O que é terrorismo de Estado?

As ditaduras, para não terem oposição ou para não correrem o risco de serem
derrubadas pela população, implantam o que se chama de Terrorismo de Estado.

O povo vive sob intenso e ostensivo controle, espiões do governo monitoram


todos os movimentos de políticos populares, demonstrações de violência dos
agentes desse Estado usurpado ou de seus grupos de apoiadores contra a
população, presença agressiva de policiais nas ruas, manifestações populares
dissolvidas com extrema violência, direito de reunião abolido expressamente, do
mesmo modo que o direito de expressão.
A imprensa não pode informar e as expressões artísticas devem ser
censuradas sem muitas explicações. Isso significa que a população não pode ser
informada e que não pode ter o senso crítico despertado.

A repressão oficial se comporta como verdadeira organização criminosa e


passa a agir de forma agressivamente ostensiva contra o povo. O uso de torturas é
transformado em prática corriqueira e banal, quase que abertamente oficial.

Esse clima de terror garante a apatia da população e que não haja


contestação ou oposição de militantes políticos. Aqueles que ousarem fazer
oposição serão reprimidos e aqueles que se interessarem ou apoiarem essa
oposição também serão duramente reprimidos, torturados e, talvez, mortos.

O terrorismo de Estado implantado no país

Em junho de 1964, pouco mais de dois meses depois do golpe, foi criado o
SNI – Serviço Nacional de Informações, a grande e impiedosa rede de espionagem,
repressão, controle da sociedade e aniquilamento de opositores que a ditadura usou
durante os seus vinte e um anos de existência. Seu criador foi o general Golbery do
Couto e Silva, também criador do IPES e membro ativo da Escola Superior de
Guerra. Quando tomaram o poder, Golbery levou todas as informações do serviço
secreto do IPES para o novo órgão de controle e repressão da ditadura.

O SNI tinha a tarefa de comandar todos os esquemas de espionagem, civis e


militares, coordenar todas as ações de repressão e planejar o ataque à oposição de
forma política ou mesmo militar. Tudo sabia e a todos reprimia.

A enorme rede de espionagem e repressão se estendia por todo o aparato do


Estado e controlava todas as atividades dos funcionários públicos, dos estudantes e
contava com a colaboração da segurança interna contratada pelas empresas, que
repassava todas as informações para que fossem feitas as prisões dos militantes
sindicais ou trabalhadores que insistiam em reivindicar seus direitos.

O que norteava a estrutura de repressão era a chamada Doutrina de


Segurança Nacional, importada dos EUA e França, dentro da paranoia de Guerra
Fria. O combate ao chamado inimigo interno era a grande preocupação. Segundo
essa mentalidade militar, todo cidadão era suspeito de ser ou colaborar com os
comunistas. Toda e qualquer manifestação de crítica ao capitalismo ou à
insensibilidade da sociedade capitalista era vista como “subversão”. Essa palavra
serviu para destruir a vida de muitas pessoas.

Esses “ensinamentos” foram recebidos de técnicos de repressão dos EUA e


militares franceses, que reprimiram e massacraram o povo da Argélia, durante a
guerra de libertação nacional daquele país. A base dos “ensinamentos” era a tortura
e o assassinato. Instrutores militares da França e dos EUA vieram ao país para
ensinar as técnicas de torturas e de repressão aos movimentos populares.

No campo militar, foi criada uma máquina de guerra para combater, reprimir e
sufocar as organizações clandestinas de oposição ao regime de terror implantado.
De alto abaixo, a estrutura do estado foi usada como parte do aparelho de repressão
aos movimentos populares e às organizações política de oposição. Cada repartição
pública tinha um espião, que observava todos os movimentos dos funcionários e
apontava os que eram suspeitos de serem oposicionistas para os órgãos de
repressão prender, torturar e tentar encontrar aliados nas organizações políticas.
Dentro das Universidades foram criadas as ASI - Assessorias de Segurança e
Informação, que monitorava os estudantes e professores suspeitos de não serem
simpatizantes do governo da ditadura. Para o ambiente estudantil foi criada uma
legislação específica, o Decreto Lei 477, que promovia a expulsão dos estudantes e
os impedia de estudar em qualquer lugar, enquanto que os professores eram
demitidos e impedidos de lecionar em qualquer escola.

Nas fábricas e empresas privadas a coisa era um pouco diferente. Em geral,


os empresários, grandes incentivadores e beneficiários da ditadura, montaram
serviços secretos particulares para espionar seus empregados e entregar seus
nomes para a repressão oficial prender, torturar e ameaçar de morte aqueles que
insistissem em continuar reivindicando melhores salários ou condições de trabalho.
Depois da prisão, os patrões se sentiam livres para demitir os empregados sob a
desculpa que eram inimigos do regime e com problemas com a polícia.

Os DOI-CODIs e seus herdeiros atuais

A estrutura militar mais conhecida da repressão foram os chamados DOI-


CODI – Destacamento de Operação de Informação dos Centros de Operações de
Defesa Interna. Temidos pelas torturas e assassinatos, até os dias de hoje são
sinônimo de violência militar. Entre os componentes desses organismos de
repressão estavam militares do Exército, que os comandavam, da Aeronáutica, da
Marinha, das Polícias Civis e Militares. Nos locais oficiais desses DOI-CODIs as
torturas eram feitas sem esconder da população moradora das redondezas. Em São
Paulo, funcionava dentro de uma delegacia, num bairro de classe média, enquanto
que nos demais estados funcionavam em quartéis do Exército.

Depois de algum tempo de repressão oficial e ostensiva, a ditadura criou uma


rede de locais secretos onde torturava e matava os militantes políticos. Depois seus
corpos eram jogados em locais até hoje não descobertos. O mais famoso local de
tortura conhecido foi a chamada Casa da Morte de Petrópolis, de propriedade de um
antigo espião nazista, que passou a colaborar com a ditadura militar.

A prática de torturas e aniquilamento de opositores deixou como herança as


práticas das polícias, que apesar de não ser generalizada como nos tempos da
ditadura, muitas vezes reproduz esses crimes por parte dos agentes do Estado. Em
muitas delegacias ainda há casos de pessoas serem presas e torturadas. E a
sociedade precisa colocar um fim nesse tipo de crime impune. A impunidade dos
torturadores do tempo da ditadura é um incentivo para que essa prática criminosa se
repita e se reproduza em novos torturadores. Os programas de combate à prática de
tortura precisam ser assumidos pelos governos estaduais e todos os democratas
atuarem juntos em defesa dos cidadãos brasileiros, principalmente os pobres,
negros e moradores de áreas de periferia das grandes cidades.

O Esquadrão da Morte e seus herdeiros atuais

Os primeiros instrutores de torturas aos militares foram os policiais dos


chamados Esquadrões da Morte. Depois vieram os instrutores estrangeiros. Em São
Paulo, as torturas foram ensinadas pelos policiais comandados pelo delegado Sérgio
Fleury, chefe do Esquadrão da Morte de São Paulo.

Esses grupos de assassinos faziam chacinas de dezenas de pessoas. As


alegações em defesa desses crimes afirmavam sempre que era a forma de
combater os criminosos com violência para servir de exemplo. Na realidade, eram
bandos de criminosos matando pessoas do povo para levar o Terrorismo de Estado
ao cidadão comum e ameaçar aqueles que pudessem se levantar contra a ditadura.

Como no passado, os chamados grupos de extermínio de hoje tem a mesma


prática e tem a mesma preocupação em ameaçar a população pobre trabalhadora,
que reivindica melhores condições de vida. Já está mais do que conhecido o
envolvimento de policiais militares nesses grupos de extermínio. Esse é mais um
problema que se deve enfrentar para acabar com a matança de cidadãos pobres,
em geral, negros e moradores das periferias.

A Lei de Segurança Nacional e a visão repressiva atual

O Brasil foi o único país do mundo que usou tribunais de guerra para julgar
civis em tempos de paz. Para isso usou a Lei de Segurança Nacional, que previa
pena de morte, prisão perpétua e prisão para quem pertencesse a organizações não
reconhecidas pelo governo ditatorial. Nem precisava ser uma organização política de
luta armada ou clandestina. Bastava não ser reconhecida pela ditadura e podia ser
um movimento de oposição sindical ou uma comunidade de base. As penas
variavam de seis meses até cinco anos de prisão.

O que orientava a Lei de Segurança Nacional dos tempos da ditadura era a


chamada Doutrina de Segurança Nacional, que perseguia, prendia e condenava o
que chamavam de inimigos internos. Essa visão da existência de inimigos internos
era a característica da guerra fria e os inimigos eram os comunistas, mas hoje ela
permanece e os inimigos internos são os militantes de movimentos populares.

Houve resistência à ditadura?

A ditadura foi cruel, prendeu milhares de pessoas em todo o país, torturou


muita gente, perseguiu, controlou as vidas dos cidadãos, deixou milhares de filhos
na fome por causa do desemprego de seus pais, proibiu estudantes de estudar e
professores de ensinar, criou gerações de jovens com medo das autoridades e
matou centenas de homens e mulheres. Os corpos de muitas dessas pessoas estão
desaparecidos até os dias de hoje. Mas, o povo brasileiro não aceitou tudo isso
passivamente. Desde o primeiro momento, houve luta contra a ditadura.
A luta institucional

As pessoas lutaram em todos os lugares que podiam. A preocupação sempre foi


informar a população de que a ditadura precisava acabar e que precisava voltar a
democracia. Outra ação era a de despertar a necessidade de derrubar a ditadura.

A oposição à ditadura atuou nos sindicatos que voltaram a ter diretorias


escolhidas pela base, apesar da repressão militar, a mesma coisa acontecia nos
grêmios estudantis e centros acadêmicos de universidades e em todos os espaços
institucionais com um mínimo de condições e repercussão na vida cotidiana das
pessoas. Até mesmo no único partido político que a ditadura permitiu cumprir o
papel de oposição teve atuação oposicionista. Vários parlamentares foram eleitos e
usavam a tribuna para denunciar os crimes da ditadura.

A luta dentro dos sindicatos

Como os sindicatos sofreram feroz repressão, suas diretorias foram


cassadas, perseguidas e presas, os militantes sindicais desenvolveram uma intensa
atividade de oposição sindical para tirar os interventores ou trabalhadores que traiam
sua classe e serviam ao governo ditatorial. As assembleias sindicais tinham sempre
a presença de agentes da repressão da ditadura, que anotavam os nomes dos
destacados ativistas e os denunciavam para que a perseguição ocorresse. Os
militantes sindicais tinham que fazer suas atividades secretamente, com medo de
serem presos, torturados ou mortos, como aconteceu muitas vezes.

As Comunidades Eclesiais de Base

As igrejas, em sua maioria, deram espaço para a organização popular e para


a atuação de oposição à ditadura. Principalmente na igreja católica isso aconteceu.
As CEBs – Comunidades Eclesiais de Base permitiam que a população encontrasse
espaços de organização e de atuação para reivindicar condições melhores de vida e
de luta por liberdade para o país. Todas essas comunidades sofreram o controle da
ditadura, que mandava seus agentes para espionar e detectar quais as pessoas que
poderiam ser militantes também de organizações políticas perseguidas e proibidas.
Essas Comunidades eram também abrigo para os militantes das oposições
sindicais e para os que queriam derrubar a ditadura e ter a democracia para o país.
A figura mais conhecida dessas que atuavam nas Comunidades de Igreja e também
na oposição sindical foi o metalúrgico Santo Dias da Silva, que foi assassinado pela
Polícia Militar durante uma greve, zona Sul de São Paulo, na frente de uma fábrica.

A censura à cultura

Os artistas também sofreram muito com a ditadura. Peças de teatro, filmes e


músicas sofreram a mais forte censura já vista. E todos se dedicavam a encontrar
meios de fazer seu trabalho e, ao mesmo tempo, passar mensagens de esperança e
de luta para a população. Muitos cantores e artistas de teatro chegaram a ser presos
e torturados como forma de intimidação, na tentativa de calar a expressão artística.

A ditadura tinha uma preocupação obsessiva com as manifestações artísticas


e culturais, pois fazem refletir, pensar e colocar em dúvida a ordem estabelecida.
Peças teatrais eram censuradas com medo de que passassem mensagens
contrárias ao governo ou contra a ordem capitalista. Também a literatura, as artes
plásticas, a produção literária e cinematográfica. Por exemplo, Raul Seixas foi
perseguido por causa da música Sociedade Alternativa.

A luta armada contra a ditadura

Grande parte das pessoas que lutaram contra a ditadura entendeu que contra
a violência dos militares só havia a luta armada como resposta. Muitas organizações
lutaram de armas na mão e fizeram a guerrilha urbana e rural. Foram realizados
ataques contra quartéis, delegacias de polícia e contra agentes da repressão.
Quatro diplomatas chegaram a ser sequestrados para serem trocados por pessoas
que estavam presas e sendo muito torturadas. Como não eram ações de criminosos,
mas sim de uma luta política contra a ditadura, a vida do diplomata era trocada pela
vida de pessoas que corriam o risco de serem assassinadas em longas sessões de
tortura. Essas ações serviam também para denunciar os crimes da ditadura.
A repressão à resistência foi implacável e cruel

Por causa de todas essas formas de resistência, o Terrorismo de Estado, que


a ditadura implantou no país, se abateu pesado e cruel sobre toda a sociedade
brasileira. Não houve um setor ou pessoa que não tenha sentido o peso da
repressão política, seja por ter sofrido na pele a marca da repressão, seja por um
intenso e insuperável medo do aparato repressivo do Estado ditatorial.

O tratamento de operação de guerra contra seu próprio povo que a Doutrina


de Segurança Nacional empreendeu nos vinte e um anos que durou a ditadura,
deixou marcas que até os dias de hoje estão presentes e que se reproduzem nas
práticas autoritárias do Estado Democrático de Direito. O trabalho das pessoas que
não concordam com a cultura da violência e com o autoritarismo tem hoje, com os
olhos no futuro, é desmontar as armadilhas deixadas pela ditadura e que estão
presentes na cabeça das pessoas responsáveis pelo Estado de hoje.

Ditaduras causam estragos enormes

A transição para a democracia tem o papel de desconstruir os estragos


causados pela ditadura. A legislação autoritária tem que ser mudada, as práticas
autoritárias devem ser abolidas e banidas do cotidiano das pessoas e a cultura da
violência, com certeza o pior dos danos causados às sociedades que viveram sob
ditaduras, precisa ser desmontada. A impunidade dos torturadores é, sem dúvida,
um problema definitivo para que a transição seja um sucesso. Aqueles agentes do
Estado que atuaram na repressão política ou os policiais envolvidos em torturas e
mortes nos tempos da ditadura são péssimos exemplos para os atuais policiais.

Os profissionais da educação tem uma preocupação importante para tirar a


visão autoritária do currículo escolar. Tem também a preocupação de tirar o caráter
autoritário da relação dentro da sala de aula. Na cultura é preciso lutar contra a
tendência autoritária de censurar por constrangimento as peças e obras de arte.

Não só a legislação, mas também as práticas governamentais são herança da


ditadura e a cultura da violência do Estado contra o cidadão. Procedimentos
autoritários, comportamentos semelhantes ao dos ditadores ou seus servidores,
visões autoritárias e a ideia de que o semelhante não tem direitos é muito comum.
A luta por Liberdades Democráticas

Para se fazer a redemocratização do país houve muita luta e muitas


dificuldades para sua conquista. O que se tem hoje é fruto dessas lutas e as
conquistas precisam ser preservadas a todo custo, pois tem muito valor.

A batalha mais geral do período final da ditadura tinha como chave a palavra
de ordem que era a conquista de Liberdades Democráticas. Isso englobava uma
série de medidas fundamentais para se atingir a democracia. A oposição consentida
conseguiu o fim da censura prévia aos meios de comunicação, mas deixou de lado
várias outras medidas redemocratizantes, por considera-las “inoportunas”.

A primeira delas foi a Anistia Política, que tornaria sem efeito a legislação
ditatorial, principalmente a Lei de Segurança Nacional, e tiraria das prisões as
pessoas condenadas pela ditadura, permitiria a volta dos exilados políticos e a saída
da clandestinidade daqueles ainda estavam escondidos, com medo das torturas.
Todos precisavam de garantias de que poderiam voltar a ter de volta suas vidas
comuns e poderiam voltar a fazer política sem serem presos e torturados. As
lideranças do partido de oposição consentida, Ulisses Guimarães e Tancredo Neves,
articularam a aprovação de uma lei de Anistia restrita e parcial, para garantir que a
ditadura não pudesse ser contestada de imediato.

A segunda grande luta por liberdade democrática foi por eleições diretas, pois
a população queria ter o direito de votar para presidente, para governador e para
prefeitos de capitais e outras áreas consideradas de Segurança Nacional. Milhões
de pessoas saíram às ruas para protestar e pedir eleições diretas. Foi a chamada
campanha das Diretas Já!. Outra vez as lideranças do partido de oposição
consentida negociaram com a ditadura e esse direito não foi conquistado. Isso só
aconteceria com a nova Constituição aprovada em 1988.

Os partidos políticos existentes eram apenas dois. O partido de apoio


ostensivo à ditadura era a ARENA – Aliança Renovadora Nacional, presidida por
José Sarney durante muito tempo, enquanto que o partido de oposição consentida
era o MDB – Movimento Democrático Brasileiro, presidido por Ulisses Guimarães e
entre suas lideranças mais influentes estava Tancredo Neves. Era preciso fazer a
Reformulação Partidária e criar novos partidos mais representativos. A luta foi
intensa e a ditadura permitiu a criação de apenas cinco partidos. A ARENA virou
PDS – Partido Democrático Social, o MDB virou o PMDB – Partido do Movimento
Democrático Brasileiro e foram criados três outros partidos: o PT – Partido dos
Trabalhadores, o PDT – Partido Democrático Trabalhista e o PTB – Partido
Trabalhista Brasileiro, que usava a sigla do antigo partido do João Goulart e Getúlio
Vargas, mas que nada tinha com ele.

Para se ter uma nova Constituição era preciso haver uma Constituinte, que é
a assembleia parlamentar que redige uma nova Constituição. Essa luta só obteve
êxito quando o primeiro presidente civil tomou posse. José Sarney, o antigo
presidente do partido da ditadura, passou a se dizer defensor da democracia e foi
eleito como vice presidente na chapa de Tancredo Neves. Este último morreu antes
de tomar posse e quem assumiu foi Sarney, que convocou a eleição de uma
Assembleia Nacional Constituinte, escolhida pelo povo. A nova Constituição
devolveu minimamente as Liberdades Democráticas ao país e garantiu uma série de
direitos antes abolidos pela ditadura.

A Transição negociada para a democracia

A grande característica da transição da ditadura para a democracia no Brasil


é que tudo foi feito de modo a ignorar a vontade da população. Apenas a visão da
ditadura e dos seus colaboradores, abrigados dentro da oposição consentida, é que
tiveram voz. Por ser uma transição feita pela elite, os interesses e anseios da
população trabalhadora e dos militantes de oposição foram ignorados totalmente.

A transição política foi feita de forma desigual. A ditadura ainda funcionava,


com o os DOI-CODIs ainda ativos e reprimindo ostensivamente, e a sociedade ainda
estava assustada com o Terrorismo de Estado, brutalizada com tanta repressão e
assassinatos. Os partidos políticos não tinham nenhuma representação ou força,
devido à repressão sanguinária. Apenas o MDB - Movimento Democrático Brasileiro,
partido criado pela ditadura para ser a fachada de democracia, que só interessava à
ditadura, tinha existência legal reconhecida e era dirigido por políticos sem
compromisso com as lutas populares em defesa da redemocratização e a destruição
política da ditadura. Aceitavam a ditadura e discordavam dela em aspectos
secundários apenas.
O encaminhamento da transição política da ditadura para a democracia foi
feita por essas personalidades comprometidas com uma solução conciliadora e nada
efetiva, em parceria com a própria ditadura. Representando a ditadura estavam o
próprio ditador General João Figueiredo e seu mentor intelectual General Golbery do
Couto e Silva, articulador do golpe e figura presente em todos os momentos da
ditadura. Pela oposição consentida, estavam Ulisses Guimarães e Tancredo Neves,
que não consultaram ninguém, nem as forças políticas dentro de seu partido
consentido. Fizeram reuniões com a ditadura para conversar e decidir juntos sobre
assuntos inegociáveis para as forças de oposição.

O que saiu dessas reuniões de conciliação não foi o que a sociedade


precisava. Só saiu o que poderia ser chamado de uma saída honrosa para a
ditadura, que dava o controle e a tutela às Forças Armadas sobre o processo de
redemocratização política do país.

O que é Justiça de Transição?

Diferente do conceito de Justiça comum aos cidadãos, é um tipo específico de


justiça para se fazer a passagem de uma ditadura para a democracia. Mais do que o
conceito geral de Justiça é preciso se fazer uma ligação direta com a História e
garantir a superação de fatores relacionados à ditadura, que precisa ser
desmontada, e a Democracia, que precisa ser exaltada e afirmada a cada momento.

Na Justiça de Transição estão englobados vários aspectos coletivos e outros


individuais da Justiça. A noção de direito coletivo se liga ao direito individual pela
interpretação histórica de que é preciso desmontar a ditadura que perdura e ainda
sacrifica a população vítima do autoritarismo.

Entre os aspectos históricos que trata a Justiça de Transição está a punição


dos torturadores, para que a noção de impunidade dos criminosos do passado não
persista no presente e não influenciem no futuro do país. Outro ponto importante é
tornar públicos meios e métodos da ditadura, que são inaceitáveis num Regime
Democrático de Direito.

O Brasil assinou vários acordos internacionais que garantem direitos do país


com relação a negociações comerciais internacionais, direitos trabalhistas
reconhecidos internacionalmente e convenções militares ou de cuidados com a
ecologia. Assinou também acordos de combate à prática de tortura e de preservação
de direitos individuais de criança, mulheres e idosos. Todos devem ser respeitados.

No Direito Internacional há convenções que obrigam o Brasil a fazer a Justiça


de Transição. O grande entrave para que o país aceite essas convenções como
válidas e execute a punição aos torturadores, mandantes e financiadores das
torturas praticadas durante a ditadura, é justamente os acordos desconhecidos feitos
pela oposição consentida e a ditadura, que pretende garantir a impunidade dos
criminosos do passado. A cumplicidade de alguns meios de comunicação,
envolvidos e beneficiários da ditadura, amplia a rejeição do cumprimento das
normas e convenções internacionais de Justiça de Transição.

O PNDH-3 – Programa Nacional de Direitos Humanos

Desde a redemocratização que a sociedade brasileira luta para limpar os


restos danosos da ditadura. O Brasil participou e segue as orientações de uma
convenção internacional realizada em Viena, Suiça, em 1993, que determinou que
os Estado membros da ONU - Organização das Nações Unidas deveriam constituir
Programas Nacionais de Direitos Humanos.

Já em 1996, o Brasil redigiu seu primeiro Programa Nacional de Direitos


Humanos, construído a partir de Conferências municipais, estaduais e uma nacional
mais ampla e abrangente. As reivindicações e anseios da população reunida nessas
conferencias municipais e estaduais foram reunidas e deram origem ao PNDH-1
primeiro Plano Nacional de Direitos Humanos. O PNDH-2 aconteceu em 2002 e o
PNDH-3 acontece em 2010.

A diferença entre eles é muito pequena. Porém, uma grande diferença se


encontra no PNDH-3, que introduziu a questão da Memória e Verdade sobre o
período da Ditadura e estabeleceu a necessidade de criação de uma Comissão
Nacional da Verdade, para apurar os crimes cometidos pela ditadura militar. Isso
contrariou os interesses das pessoas, órgãos e empresas envolvidas,
comprometidas e beneficiárias dos crimes cometidos pela ditadura e pelos
torturadores, que mataram centenas de pessoas.

A rejeição ao PNDH-3 foi basicamente contra a criação da Comissão da


Verdade e da possibilidade de julgamento dos crimes da ditadura. Por decorrência,
houve uma rejeição também a apuração dos crimes de hoje e a punição dos
torturadores como exemplo de que a sociedade não aceita a impunidade desses
crimes. A condenação dos crimes de tortura nos dias de hoje ainda é um problema a
ser solucionado e superado pela sociedade, que vê com tolerância essa prática
odiosa e considerada pela própria lei brasileira como crime hediondo e inafiançável.

O PNDH-3 também é a garantia de que a proteção dos direitos da criança e


dos adolescentes impedirá a redução da maioridade penal, que criminalizaria os
filhos de pobres e não resolveria o problema de criminalidade no país.

Outro ponto de rejeição do PNDH-3 foi a proposta de democratização e o


controle social dos meios de comunicação. Foi alegada a liberdade de imprensa,
mas o grande problema é o monopólio do poder de influencia que a mídia tem desde
os tempos da ditadura, da qual boa parte foi colaboradora e beneficiária.

A Comissão Nacional da Verdade

A Comissão Nacional da Verdade foi criada para apurar os fatos e os crimes


cometidos por agentes do Estado durante a ditadura militar. O objetivo da apuração
desses fatos é entender como aconteceu, tentar evitar que se repitam no país e que
se construa uma nova realidade para que as gerações futuras não tenham que
enfrentar outras ditaduras.

O trabalho da Comissão da Verdade deveria ter sido criada logo após o fim da
ditadura militar, mas só aconteceu em 2012, trinta e oito anos depois do golpe de
Estado de 1964 e da instalação da ditadura militar. Isso não aconteceu naquele
momento de entrega do poder para os civis e a volta à democracia mais uma vez
pela ação daqueles lideres da oposição consentida, que negociaram por baixo do
pano com a ditadura militar e garantiram, assim, a impunidade de torturadores e o
desconhecimento dos fatos pelas novas gerações nascidas em democracia.

A Comissão Nacional da Verdade não tem o poder de Justiça, mas tem a


tarefa de apurar os fatos, concluir sobra a gravidade deles e fazer recomendações
para que o Estado brasileiro consiga desmontar a ditadura que ainda está em prática
no país. Isso quer dizer que seu trabalho é a própria Justiça de transição que não
houve por tanto tempo.
Para ajudar na apuração dos fatos, foram criadas várias Comissões
Estaduais, Municipais, em Universidades e em sindicatos. Essa rede de comissões
tem o trabalho de apurar e fornecer à Comissão Nacional da Verdade as
informações que possam ajudar nas conclusões e recomendações ao Estado
Nacional. Essa rede ajudou a conhecer mais detalhes e forneceu informações que
nunca conseguiriam ser apuradas por um órgão nacional e centralizado.

As recomendações indicam o que deve ser feito em termos de novas leis para
garantir os direitos individuais e coletivos da população brasileira. Cada segmento
atingido ou cada individuo deve ser atendido por essas recomendações de modo a
criar uma nova realidade, sem a cultura da violência, que é a violência do Estado
contra o cidadão pobre e trabalhador. A juventude tem que receber um país mais
justo, mais respeitador de direitos e mais democrático.

Esse é o trabalho fundamental da Justiça de Transição.

Construção da Memoria

A História é o conhecimento de uma sucessão de fatos que serve para se


compreender o que aconteceu e para o seu registro. O estudo científico dos fatos
conhecidos ajuda a entender a evolução da sociedade e como os processos
humanos se deram. No entanto, isso não permanece no cotidiano das pessoas e a
sociedade não se apropria desses fatos e não os usa para prosseguir sua trajetória.

Para que as pessoas se apropriem dos fatos históricos e os usem no seu


cotidiano é preciso construir a memória social desses fatos. Usar a história como
referência atual é fazer a Memória Política. Os fatos usados como referência dão
sentido à História e a população passa a refletir sobre como esses fatos lhe dizem
respeito. Entender que não é coisa passada ou que não tem importância para sua
vida e para os caminhos que a sociedade percorrerá.

Memória Política serve para que as pessoas valorizem as escolhas de seus


antepassados e não permitam a repetição do que foi feito de execrável antes delas.
Do mesmo modo, serve para valorizar os atos heroicos e para que o povo possa
entender que nem tudo foi covardia ou omissão. Só interessa o esquecimento para
aqueles que pretendem manter as pessoas na ignorância e na apatia política.
É importante perceber que as pessoas e grupos que rejeitam a construção da
memória política não se importam com o estudo acadêmico da História. Estudar e
não popularizar a História é a garantia de que a sociedade não se apropriará dos
fatos e não fará juízo de valor sobre o que aconteceu. Isso quer dizer que a
sociedade não fará o julgamento dos atos que essas pessoas e grupos fizeram nos
tempos cruéis da ditadura. O medo que tem desse julgamento histórico e moral
mobiliza a todos os que devem explicações à sociedade.

Deixar os fatos na esfera de estudo é esquecer e segregar a História. Fazer a


Memória Política é dar material para as pessoas refletirem, terem uma visão crítica e
uma participação ativa e construtiva da História. Esse é o nosso desafio de sempre.

Conclusão

Tudo o que o país viveu durante os vinte e um anos de ditadura somados com
os anos de turbulência, que prepararam o assalto ao poder por parte dos militares e
também os anos de reconstrução democrática, marcaram nosso país de forma muito
profunda. Ignorar isso é permitir que tais fatos lamentáveis se repitam e voltem a se
abater sobre a população. Não foi pequeno o estrago causado pela ditadura.

Por outro lado, não aprender com os erros do passado é algo muito grave. As
manipulações, as jogadas políticas e, principalmente, as reais intenções nunca
mostradas devem ser identificadas para que esse tipo de coisa não tenha mais
espaço. E acontecem ainda nos dias de hoje. É fundamental ver os reais interesses
em jogo e como argumentos são usados para escondê-los. Esse é o real sentido de
conhecer a História, para entender o presente e construir o futuro diferente.

O comportamento autoritário de muitos governantes e o medo de reivindicar


direitos de muitas pessoas da população indicam que a ditadura ainda está nas
cabeças das pessoas. O comportamento autoritário de governantes é um vicio
recorrente e uma atração muito forte de quem não gosta e não quer ser contestado.
Já o medo de reivindicar ou afirmar seus direitos indica que a submissão é o maior
dano ainda presente entre as pessoas do povo.

Não podemos permitir que os governantes se imponham pela força, pois não
foram eleitos para impor coisa alguma. Foram eleitos para representar a população
e encaminhar as demandas e necessidades em nome do povo e em benefício dele
também. Toda e qualquer manifestação de autoritarismo deve ser repudiada e
condenada de imediato. Governantes assim não devem ter espaço em uma
democracia e, portanto, não merecem o voto dos cidadãos.

Agora que já temos o trabalho da Comissão da Verdade revelando o que a


ditadura fez com nosso país, que as organizações sociais se interessam por mudar
o país e que o cidadão tem democracia, já é um bom começo para construir o futuro
que o país merece. É possível acreditar que, depois do conhecimento de nossa
História e dos muitos personagens envolvidos, agora o cidadão tem condições de
separar o que lhe interessa do que é manipulação. Tem condições também de
repudiar ditaduras, torturas e assassinatos pelos agentes do Estado.

A escolha agora só sua. O poder de decisão está nas suas mãos.


Linha do tempo

Estado Novo – regime autoritário, encabeçado por Getúlio Vargas, que realizou
reformas estruturais na economia, na política e nas relações trabalhistas do país.
Nesse período foram conquistados alguns dos modernos direitos dos trabalhadores
brasileiros, como salário mínimo, definição de carga horária máxima de trabalho,
horas extras trabalhadas, etc. O pretexto para o golpe de Estado deflagrado por
Getúlio Vargas foi a existência de um suposto plano de tomada do poder pelos
comunistas. A farsa da existência de um plano dos comunistas foi montada pelo
então capitão Olympio Mourão Filho, militante do Partido Integralista, versão
brasileira do nazi-fascismo, e depois desmascarada. Esse mesmo militar foi quem
começou o deslocamento de tropas de Minas Gerais para o Rio de Janeiro,
detonando o golpe militar de 1964. O Estado Novo tinha como marca ser um regime
de centralização total do poder na pessoa de Getúlio Vargas, de nacionalismo
extremo e de anticomunismo.

Governante: Getúlio Vargas

Período: de 1937 até 1945

Redemocratização: Com o fim da II Guerra Mundial, o mundo passou por intenso


movimento de rejeição das ditaduras. Imediatamente após o fim do conflito armado,
que matou milhões de pessoas, começa a ser elaborada a Declaração Universal dos
Direitos Humanos. Todos os regimes ditatoriais começam a ser questionados e a
ditadura do Estado Novo, no Brasil, não passou despercebida. Rapidamente, a
ditadura acaba e uma nova Constituição é redigida e aprovada. A Constituição de
1946 é considerada como a mais democrática do Brasil e, entre outras coisas,
permite a legalização do Partido Comunista e dá ampla liberdade de organização e
expressão aos brasileiros.

Ano: 1945

Governo Dutra: Com a deposição do regime de Estado Novo, encabeçado por


Getúlio Vargas, por um golpe de Estado realizado pelos ministros militares, houve
um rápido processo de redemocratização. O presidente do Supremo Tribunal
Federal assumiu a presidência da República e convocou uma eleição indireta pelo
Congresso Nacional, como mandava a Constituição autoritária vigente desde o início
da ditadura do Estado Novo, em 1937. Foi eleito o General Eurico Gaspar Dutra.

Dutra teve o apoio ostensivo de Getúlio Vargas e deu inicio a um governo


conservador e de cunho anticomunista. Proibiu os jogos de azar, deu preferência à
uma aliança com os EUA e fez o rompimento de relações com a União Soviética,
que vivia experiência socialista e foi determinante na derrota da Alemanha Nazista.
Em seu governo os sindicatos tiveram sua atuação bastante dificultada e vários
direitos trabalhistas foram ameaçados. A onda conservadora de Dutra levou a
Justiça a cassar o registro eleitoral do Partido Comunista, que havia eleito uma
bancada considerável de representantes (14 deputados e um senador), inclusive
com a eleição de Luis Carlos Prestes, seu líder maior, para o cargo de senador.

Período: de 1945 até 1950

Governo Getúlio Vargas: O ex-ditador Getúlio Dorneles Vargas, que não estava
inativo na política desde sua deposição, em 1945, pois foi eleito senador, voltou à
presidência da república pelo voto popular após uma campanha massiva que tinha
como slogan Queremos Getúlio. Era o Movimento Queremista. Esse movimento
pede sua volta ao comando da nação através de uma eleição direta e popular e ele
diz que aceita o desafio. Foi eleito para um mandato de cinco anos a começar em
1951 e com término previsto para 31 de janeiro de 1956.

Sofre intenso bombardeio por ter se distanciado dos EUA, por ter uma política
nacionalista e por dar atenção às reivindicações trabalhistas. Seu governo sofre forte
campanha de denúncias de corrupção e várias pequenas crises. A maior delas foi o
aumento de 100% para o salário mínimo, proposto pelo ministro do trabalho João
Goulart e combatido pelo ministro da Justiça de seu governo, Tancredo Neves. A
oposição de Tancredo leva os militares a um pronunciamento através de um
Manifesto dos Coronéis, encabeçado pelo então coronel Golbery do Couto e Silva,
peça central também depois do golpe militar de Estado de 1964. Getúlio demite seu
ministro do trabalho, mas mantém o aumento de salário mínimo.

As denúncias de corrupção se avolumam e Getúlio não vê outra saída a não ser o


suicídio. Na madrugada do dia 24 de agosto de 1954, Getúlio Dorneles Vargas deu
um tiro no coração e interrompeu um golpe militar de Estado, que se formava.
Multidões de pessoas do povo saíram às ruas protestando contra as pressões que
levaram seu líder ao ato extremo de tirar a própria vida e denunciavam as pressões
dos EUA contra o país.

O grande acusador de Getúlio, que fazia denúncias escandalosas através de seu


jornal Tribuna de Imprensa, era Carlos Lacerda, que foi peça chave também
igualmente do golpe militar de 1964, teve que fugir do país com medo dos protestos.

Período: de 1951 até 1954

Governo Juscelino: O rápido período de transição entre a morte de Getúlio Vargas


e a eleição de Juscelino Kubitschek de Oliveira, popularmente conhecido como
JK, foi conturbado também. Os direitistas tentaram impugnar sua candidatura por
ele supostamente ter o apoio dos comunistas e por não ter obtido uma vitória com a
maioria absoluta de votos, numa alegação sem base legal. Ele só pôde tomar posse
por causa de um levante militar feito pelo ministro da Guerra, Henrique Lott, que
garantiu a legalidade da eleição e a posse dos eleitos JK e João Goulart, seu vice.

Para acalmar a pressão direitista, JK fez uma viagem internacional antes de tomar
posse. O primeiro país que visitou foram os EUA, que estavam questionando se seu
governo teria o apoio dos comunistas.

Seu governo foi caracterizado pelo desenvolvimentismo e pela liberdade cultural do


país. A indústria nacional se desenvolveu muito com seu governo, principalmente a
indústria automobilística. Várias montadoras estrangeiras começaram a produzir os
primeiros carros em solo brasileiro. Construiu usinas hidrelétricas e siderúrgicas,
impôs uma política de substituição de importações (o país deixa de importar e
produz aqui mesmo, sem enviar dinheiro para fora), fortaleceu os bancos de
incentivo da produção como o BNDES, criou a SUDENE – Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste e construiu várias rodovias importantes para a
integração nacional, como a Belém-Brasília, a Regis Bitencourt e a Fernão Dias.

Período: 31 de janeiro de 1956 até 31 de janeiro 1961

Governo Jânio Quadros: A eleição presidencial de 1960 teve como marca as


denúncias de corrupção contra o presidente JK. O lema da campanha de Jânio
Quadros foi uma vassoura, numa referência ao seu bigode e à alegada necessidade
de fazer uma faxina no governo que estaria cheio de práticas corruptas. Esse apelo
popularesco tomou conta da campanha eleitoral, mas Jânio precisava de votos.
Como seu candidato à Vice presidente não era muito popular e, portanto, não tinha
votos, Jânio usou de uma artimanha eleitoral. Nessa época, como os vices eram
eleitos em eleições simultâneas ao do cargo majoritário, ele fez uma campanha não
oficial de uma dobrada entre ele e o candidato da chapa adversária, que pudesse
puxar votos para sua eleição. O Vice da chapa adversária era João Goulart, líder do
trabalhismo, visto como o herdeiro de Getúlio Vargas, que nas eleições anteriores
teve mais votos do que o cabeça de sua chapa. Ele teve mais votos do que JK, por
exemplo, e passou a ser o vice cobiçado por quem queria ser presidente. Jânio,
raposa da política, cria a chapa informal Jan-Jan, que era a união de Jânio e Jango.

Sua coligação era de base direitista e tinha como força maior a UDN – União
Democrática Nacional, ativa nas denúncias, mas sem apelo popular e de votos.

A UDN teve como marca os ataques contra Getúlio, contra JK e tinha muita ligação
com os militares. Entre seus membros mais destacados estavam os políticos que
deram posteriormente o golpe de Estado de 1964.

Jânio Quadros teve uma atuação sem muita coerência nos seus poucos meses de
governo. No lugar de se atrelar aos EUA, como sinalizava fazer, condecorou o
guerrilheiro Ernesto Che Guevara, um dos líderes da revolução comunista de Cuba
ao mesmo tempo em que tinha uma política moralista para os costumes, como por
exemplo, proibir as mulheres de usar biquíni. A UDN começou a fazer forte oposição
a Jânio Quadros e ele se lançou numa aventura improvável de renunciar ao cargo,
na esperança de ser convidado a voltar com poderes totais. O parlamento não
aceitou e sua renúncia foi aceita como uma decisão unilateral.

Período: 31 de janeiro de 1961 até 25 de agosto de 1961 (menos de 8 meses)

Crise da Renúncia: A decisão de Jânio Quadros renunciar levou a uma crise


institucional no país. Aparentemente, a renúncia foi uma jogada calculada do ex-
presidente, que mandara seu Vice, João Goulart, para a China comunista e isso
seria visto pelos militares e golpistas no geral como pretexto impeditivo para assumir
a presidência da República. Com a crise instalada, veriam que a volta de Jânio
Quadros, com poderes ditatoriais, seria uma ótima solução para a direita brasileira.
Mas, o golpe fracassou, o Congresso Nacional entendeu que a renúncia era um ato
unilateral e não tinha como voltar atrás na decisão.

O país precisava empossar seu vice-Presidente na condução do Brasil, mas os


militares e seus aliados golpistas civis voltaram a atacar. Com a alegação de que o
Vice-Presidente estava em visita a um país comunista e que isso revelava a sua
ideologia secreta, passaram a defender a tese de que João Goulart não poderia
assumir a Presidência da República por ser comunista. Como se comunismo fosse
uma doença contagiosa e bastava a pessoa ir para China que viraria comunista. Era
só um pretexto para o golpe, que tramavam há anos.

No Rio Grande do Sul, o governador Leonel Brizola começou uma campanha pelo
respeito à legalidade constitucional e, portanto, a posse de Jango como legítimo
presidente da República, como seus milhões de votos determinaram. A campanha
toma conta do país através das ondas do rádio, pois nesse tempo não havia satélite,
internet ou telefonia ágil e eficiente. A participação popular mais uma vez frustra os
golpistas e o golpe é adiado. Como saída honrosa, os militares conseguem que o
parlamentarismo seja adotado pela Constituição e os poderes do Presidente da
República sejam reduzidos ao mínimo possível. Quem passaria a ter poderes para
governar seria um Primeiro Ministro, indicado pelo Parlamento.

Com esse acordo para evitar o golpe de Estado, o país passa a ter um governo
parlamentarista e os poderes do presidente são reduzidos ao mínimo possível.
Depois poderia haver um plebiscito para saber se a população aprovava a mudança.

Ano: 1961

Parlamentarismo: No dia 2 de setembro de 1961 o Congresso Nacional aprovou


uma emenda Constitucional, sob forte pressão dos militares golpistas, instituindo o
regime parlamentarista no Brasil para tirar poderes do presidente Constitucional.
Seis dias depois tomaram posse o presidente João Goulart, com poderes reduzidos,
e o primeiro ministro, pessoa de confiança da direita brasileira, Tancredo Neves, do
PSD. Sem muita competência ou habilidade, Tancredo cai alguns meses depois e
dá lugar a Brochado da Rocha, também do PSD – Partido Social Democrático, que
governa de 12 de julho de 1962 a 18 de setembro de 1962, e Hermes Lima, sem
filiação partidária, que governa de 18 de setembro de 1962 a 24 de janeiro de 1963,
com a tarefa de ajudar a devolver o presidencialismo, pois o parlamentarismo se
mostrou um fracasso total.

Período: de 2 de setembro de 1961 até 24 de janeiro de 1963.

Plebiscito: Os sucessivos fracassos deixam clara a necessidade da devolução dos


poderes constitucionais ao Presidente João Goulart e para isso seria necessário
antecipar a consulta popular, o plebiscito, previsto na emenda constitucional, que
instituiu o regime parlamentarista. Pela medida aprovada pelo Congresso, quando
houve a tentativa de golpe militar, após a renúncia de Jânio Quadros, uma consulta
popular deveria ser feita nove meses antes de encerrar o mandato do Presidente
Constitucional, em 1965. No dia 15 de setembro de 1962, o Congresso Nacional
decidiu antecipar a data do plebiscito para 6 de janeiro de 1963.
Uma acirrada disputa acontece na campanha e o povo brasileiro decide devolver os
poderes ao Presidente João Goulart em sua plenitude. A decisão é incontestável. A
volta do presidencialismo recebe 9 milhões e meio de votos, enquanto que a
manutenção do parlamentarismo recebe pouco mais de 2 milhões de votos.
No dia 25 de janeiro de 1963 o presidente João Goulart recebe de volta seus
poderes e passa a governar plenamente o país. Começa aí uma intensa campanha
contra ele e contra a democracia, com um processo que envolve as Forças
Armadas, a elite empresarial aliada e sob as ordens da embaixada dos EUA. A
derrubada do regime democrático foi decida quando a direita golpista percebeu que
não teria o apoio eleitoral do povo brasileiro.

Data: 6 de janeiro de 1963

Comício da Central do Brasil: Uma grande manifestação popular de apoio ao


Presidente João Goulart foi realizada na frente da estação de trens da Estrada de
Ferro Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Nessa ocasião, o presidente anunciou as
Reformas de Base que o país precisava, que transformaria o país e daria condições
dignas de vida ao povo trabalhador. A multidão acreditava assim que estava aberto
o caminho para um Brasil desenvolvido, soberano e sem miséria.

Data: 13 de março de 1964


Marcha da família: Como resposta à manifestação de apoio ao presidente e às
Reformas de Base, uma grande mobilização conservadora e reacionária foi montada
em São Paulo para dar uma demonstração de anticomunismo contra o governo de
João Goulart. A elite militar reacionária, junto com a cúpula conservadora da Igreja
Católica e empresários reacionários, afirmando que o país corria o risco de se
transformar num regime comunista, que destruiria os valores cristãos e outras
alegações absurdas do gênero, organizaram uma passeata com o pomposo nome
de Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu senhoras
conservadoras assustadas com a possibilidade do Brasil se transformar numa
“grande Cuba”, pela omissão ou participação do governo reformista de João
Goulart. Foi o pretexto com cara de participação popular conseguido pelos golpistas
militares e civis para o assalto ao poder.

Data: 19 de março de 1964

Assembleia dos Marinheiros: Para mostrar que nem todos os militares eram
golpistas e que a base militar estava ligada aos trabalhadores, foi realizada uma
assembleia de marinheiros, soldados e sargentos de todas as três forças armadas
dentro do Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, numa demonstração de
aliança militar e trabalhadores. Tropas são mandadas para reprimir a reunião, mas
aderem ao movimento e depositam suas armas e capacetes na porta do sindicato.
Isso é usado pelos golpistas como se fosse a quebra da hierarquia militar e o
começo de uma rebelião comunista dentro das Forças Armadas. Na realidade, a
quebra da hierarquia acontecia pela conspiração dos generais contra o presidente
da República, que é o Comandante-em-Chefe das Forças Armadas.

Data: 25 de março de 1964

O assalto ao poder: Na madrugada de 31 de março para 1º de abril de 1964, o


general Olympio Morão Filho, reconhecidamente fascista, se desloca de Juiz de
Fora para o Rio de Janeiro, iniciando o assalto ao poder, que derruba o Presidente
da República, constitucionalmente eleito pelo voto popular, João Belchior Marques
Goulart. O país inicia um longo período sob o jugo da mais terrível e sanguinária
ditadura. Todas as liberdades democráticas são retiradas da população e todas
normas constitucionais são desrespeitadas pela ditadura militar por 21 anos
seguidos.

Data: Primeiro de abril de 1964

Saque e incêndio do prédio da UNE: No dia do golpe um bando de militantes do


MAC – Movimento Anti-Comunista, junto com membros da guarda palaciana do
governador Carlos Lacerda e militares do Exército atacam, roubam tudo de valor que
havia dentro do prédio sede da UNE – União Nacional dos Estudantes e depois o
incendeiam. O incêndio, saque e destruição do edifício sede da UNE foi o símbolo
da selvageria dos golpistas, pois demonstrou que a ditadura seria violenta.

Data: 1º de abril de 1964

Declaração de ausência do presidente: Com as tropas militares dominando tudo


no país e assaltando todos os prédios significativos da democracia, ainda havia o
problema da representação do poder, que era a figura do presidente da República.
Nenhum país poderia reconhecer o poder usurpado com o presidente ainda
formalmente no exercício do cargo. Os golpistas precisavam forjar a legalidade. O
presidente do Congresso Nacional, senador Auro de Moura Andrade declarou que o
presidente havia fugido do país e a presidência da República estava vaga. Uma nota
do governo, enviada pelo Ministro Darcy Ribeiro, afirmava que Jango ainda estava
em solo brasileiro e que ninguém poderia ocupar o posto de chefe da nação. Aos
berros, Auro diz que é mentira, declara a vacância da presidência da República,
empossa às pressas o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazilli, como
presidente provisório, manda desligar as luzes e microfones do Congresso e a
evacuação da sede do parlamento brasileiro.

Data: 2 de abril de 1964

EUA reconhecem ditadura: O governo dos EUA reconheceu o grupo que assaltou
o poder no Brasil, com seu apoio e financiamento, muito tempo antes de haver
alguém respondendo oficialmente pelo país. A simples declaração de vacância da
presidência da República, feita pelo golpista Auro Moura Andrade, bastou como
desculpa para que Lindon Johnson, presidente dos EUA, anunciasse que reconhecia
a ditadura militar brasileira. Outros países só fariam a mesma coisa dias depois.

Data: 2 de abril de 1964

Assassinato do Coronel legalista: Três dias depois do golpe de Estado, o


Comandante da Base Aérea de Canoas, no Rio Grande do Sul, viu sua unidade
militar ser invadida por militares golpistas, que cobravam dele uma posição em favor
do golpe de Estado. O Coronel Alfeu de Alcântara Monteiro reage e diz que continua
leal à democracia, que jurou defender, e ao presidente da República
constitucionalmente eleito, João Goulart. Os militares golpistas gritam contra ele, há
uma troca de insultos e o Coronel legalista Alfeu de Alcântara Monteiro é
assassinado com uma rajada de metralhadora. No entanto, alegam depois, num IPM
– Inquérito Policial Militar, instaurado para apurar os fatos, de que Alfeu teria dado
um tiro de revólver contra seu assassino, que para se defender atirou e o matou.
Participaram da cena do crime o Brigadeiro Nelson Lavanére Wanderley e o
Coronel-aviador Roberto Hipólito da Costa, conhecido pelo plano de derrubar o
avião da FAB que transportava o presidente João Goulart. Duas semanas após o
assassinato do Coronel Alfeu, o ditador Castelo Branco premiou o Brigadeiro
Lananére Wanderley nomeando-o ministro da Aeronáutica.

Data: 4 de abril de 1964

Ato Institucional número 1: A ditadura se instalou pela força e fez uma declaração
de que era o poder de fato com a publicação do chamado Ato Institucional, que
afirmava que se legitimava “em si mesma”, sem precisar de medidas legais ou
aprovação popular. Quem assina essa declaração são os três ministros militares,
que afirmam que usarão todos os meios para impor a nova ordem. Além disso,
publicam uma lista de 102 nomes de pessoas que passam a ser proibidas de
exercer seus direitos políticos por dez anos. A lista é encabeçada pelo Presidente
João Goulart e por Luis Carlos Prestes, líder do Partido Comunista, além de várias
outras pessoas que eram defensoras da democracia destruída pelo golpe militar.
Outras listas e outras medidas de cerceamento de direitos foram agregadas através
de outros quatro Atos Complementares.

Data: 9 e 10 de abril de 1964

Invasão da Universidade de Brasília: Antes de ser empossado como ditador-


presidente, o Marechal Humberto Alencar Castelo Branco ordenou que 400 soldados
invadissem a Universidade de Brasília, sob a alegação de que havia movimentação
de resistência ao novo regime.

Data: 13 de abril de 1964

Posse de Castelo Branco: Depois de uma eleição formal, realizada pelo Congresso
Nacional nas mãos de parlamentares de direita, a começar pelo presidente do
Senado, Auro Moura Andrade, que deu o golpe da ausência do presidente João
Goulart, no dia 11 de abril de 1964, Castelo Branco toma posse da presidência da
República e dá início a uma sucessão de generais no comando da mais longa e
violenta ditadura que o país já teve.

Data: 15 de abril de 1964

Atentado contra Marighella: O líder comunista Carlos Marighella foi cercado e


baleado dentro de um cinema lotado no centro do Rio de Janeiro, numa clara
demonstração da violência que a ditadura tinha guardado contra seu povo. A
intenção não era prender Marighella, mas assassiná-lo. Alguns anos depois, ele vai
ser o líder de uma das Organizações de combate à ditadura, a ALN – Ação
Libertadora Nacional, junto com Joaquim Câmara Ferreira.

Data: 9 de maio de 1964

Criação do SNI: A ditadura oficializa sua máquina de guerra contra seu povo
quando cria a mais dura e implacável rede de espiões e repressores do movimento
popular, que foi o SNI – Serviço Nacional de Informações. Esse organismo
respondia apenas ao general ocupante da presidência da República e não tinha
limites legais de forma a controlá-lo ou impedir suas ilegalidades.

Data: 23 de junho de 1964

Fechamento da UNE: O Congresso Nacional decide pelo fechamento da UNE para


oficializar o que foi feito nos primeiros dias da ditadura pelo bando que saqueou e
incendiou a sede da entidade estudantil.

Data: 27 de outubro de 1964

Inaugurada a Rede Globo: Surge a rede de comunicação que vai dar apoio e
legitimidade aparente á ditadura nos seus 21 anos de violência e agressão de
direitos contra o povo brasileiro. Numa relação nunca esclarecida entre o grupo de
Roberto Marinho e o Grupo Time-Life, dos EUA, a rede se forma com recursos em
torno de 6 milhões de dólares americanos. Essa relação é denunciada e uma CPI –
Comissão Parlamentar de Inquérito é formada. Para evitar mais embaraços o
procurador geral da União, Adroaldo Mesquita da Costa, dá um parecer em que
afirma não haver certeza da existência de uma sociedade entre os dois grupos. O
dono da rede Globo, Roberto Marinho, decide romper a sociedade e paga o
empréstimo com recursos de bancos nacionais.

Data: 26 de abril de 1965

Ditadura perde eleição: A ditadura faz um teste de popularidade permitindo a


realização de eleições diretas para os governos de 11 estados. Sofre uma derrota
flagrante em cinco deles e vê dois opositores serem eleitos em Minas Gerais e Rio
de Janeiro. Israel Pinheiro, ligado à Juscelino Kubistcheck, e Francisco Negrão de
Lima, com longa tradição de participação nas lutas dos trabalhistas, ligado ao
presidente João Goulart e Getúlio Vargas, recebem o apoio da população, que
demonstra a rejeição ao golpe e à ditadura militar.

Data: 3 de outubro de 1965


Ditadura acaba com partidos políticos: Com a derrota sofrida nas eleições quatro
meses antes, a ditadura edita o AI-2 – Ato Institucional Número 2, extingue os
partidos políticos e cria apenas dois. A ARENA – Aliança Renovadora Nacional
surge no lugar da UDN – União Democrática Nacional e passa dar apoio ostensivo à
toda a política repressiva dos militares nos 21 anos de regime autoritário. Com a
redemocratização, a ARENA passou a ser o PDS – Partido Democrático Social e
uma parte passou a ser Frente liberal, depois chamada de PFL - Partido da Frente
Liberal e recentemente se transformou no DEM, partido denominado Democratas.
Para fazer a oposição consentida à ditadura é criado o MDB – Movimento
Democrático Brasileiro, que hoje é o PMDB – Partido do Movimento Democrático
Brasileiro.

Data: 27 de outubro de 1965

Ditadura cria a eleição indireta: A derrota não caiu bem para a ditadura e ela
continuou a destruir o pouco de possibilidades de o povo participar. Depois de
acabar com os partidos políticos, a ditadura acabou também com o voto direto dos
cidadãos. O AI-3 – Ato Institucional Número 3 tira o direito de voto das pessoas e dá
ao ditador o poder de indicar os governadores e esses ganham o direito de escolher
os prefeitos das capitais e das chamadas áreas de segurança nacional, cidades
consideradas estratégicas pela ditadura. Além disso, formaliza que a escolha do
ocupante da presidência será feita no meio militar e apenas referendado pelo
Congresso Nacional. Isso queria dizer que seria mantida a fachada de democracia,
mas as decisões seriam exclusivas do poder militar.

Data: 5 de fevereiro de 1966

Atentado ao general Costa e Silva: O indicado para ocupar a vaga de presidente


da República no lugar de Castelo Branco, o também general de Exército Arthur da
Costa e Silva, é alvo de um atentado à bomba no aeroporto de Guararapes, em
Recife, capital de Pernambuco. Num episódio não muito esclarecido até hoje, Costa
e Silva deveria chegar de avião, mas vai de carro para a sede da SUDENE e não
para o aeroporto. Uma bomba mata o secretario de governo do estado de
Pernambuco, jornalista Edson Régis de Carvalho e o Almirante Nelson Gomes
Fernandes. Embora muitas versões apontem para as organizações de esquerda,
nunca se soube quem foi responsável por esse atentado.

Data: 25 de julho de 1966.

Costa e Silva toma posse: As primeiras eleições indiretas pelo Congresso Nacional
para oficializar a escolha feita no Estado Maior das Forças Armadas aconteceram e,
como já era conhecido de todos, o general Arthur da Costa e Silva passa a ser o
novo ocupante da presidência da república no lugar do general Castelo Branco.

Data: 3 de outubro de 1966

Ditadura promulga Constituição: Para manter a fachada de democracia e tirar os


entraves ao poder total que precisava para usar a força contra a população e as
instituições, a ditadura promulga, uma nova Constituição.

Data: 24 de janeiro de 1967

Criada a Lei de Imprensa: Para se garantir contra eventuais denúncias através da


imprensa, a ditadura edita uma Lei de imprensa, que impõe penas duras para os
jornalistas que ousarem desafiar o poder ditatorial. Os donos das empresas
jornalísticas eram adeptos da ditadura, mas os jornalistas não se comportavam
como apoiadores ou simpatizantes dos desmandos da ditadura.

Data: 9 de fevereiro de 1967

Estudante é assassinado: O estudante Edson Luis de Lima Souto é assassinado


durante a repressão a estudantes dentro do restaurante Calabouço no Rio de
Janeiro. Um capitão da Polícia Militar atirou contra o estudante e este fato
foipresenciado por muitos estudantes presentes no local.

Data: 28 de março de 1968


Criação do AI-5: A ditadura faz uma verdadeira declaração de guerra ao povo
brasileiro com a edição do chamado AI-5 – Ato Institucional Número 5, que tira o
instituto do Habeas Corpus, direito universal de defesa dos cidadãos, reconhecido
no mundo todo como um direito intocável. Além disso, determina o julgamento por
tribunais de guerra militares de civis considerados inimigos do regime e a censura é
instituída sem limites.

Data: 13 de dezembro de 1968

Criação da OBAN: Em São Paulo, uma articulação ilegal, mas totalmente pública
cria a chamada OBAN – Operação Bandeirante, a mais cruel estrutura de tortura e
extermínio de opositores políticos. Com o apoio e financiamento de empresários,
instalações do governo do estado e torturadores cedidos pelas Forças Armadas,
esse organismo de repressão foi o responsável pelas torturas a milhares de pessoas
e dezenas de mortes de opositores políticos. Depois, a estrutura foi oficializada e
legalizada com o nome de DOI-CODI – Destacamento de Operações de
Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, ligado ao general ocupante
da presidência da República.

Data: 1 de julho de 1969

Junta militar governa: Com a doença do general Costa e Silva, assume o controle
do país uma Junta Militar, formada pelos ministros militares de então. O advogado
Pedro Aleixo, participante do golpe, apoiador da ditadura e que ocupava o cargo de
vice-presidente, é impedido de ocupar o lugar do general presidente.

Data: 31de agosto de 1969

Embaixador americano sequestrado: Um grupo de guerrilheiros da ALN – Ação


Libertadora Nacional e do MR-8 – Movimento Revolucionário 8 de outubro captura o
embaixador dos EUA, Charles Burcke Elbrick, e exige a publicação de um manifesto
com denúncias contra a ditadura e a libertação de 15 prisioneiros políticos, ainda
sofrendo torturas. O desafio dos guerrilheiros coloca a ditadura contra a parede, que
se submete a todas as exigências e o mundo fica sabendo o que se passa no Brasil.
Os prisioneiros políticos, quando libertados, estarrecem o mundo com denúncias de
torturas inimagináveis por que passaram e a ditadura fica desmascarada perante a
comunidade internacional.

Data: 4 de setembro de 1969.

Médici vira presidente: A Junta Militar conduz o processo de escolha do futuro


general presidente e o escolhido é Emilio Garrastazu Médici, até ali chefe do SNI, a
temida máquina de espionagem e repressão.

Data: 30 de outubro de 1969

Marighella é assassinado: O líder comunista Carlos Marighella sofre uma


emboscada e é morto pela repressão política, composto por membros do Esquadrão
da Morte de São Paulo.

Data: 4 de novembro de 1969

Censura a livros: A Câmara dos Deputados aprova decreto da ditadura de censura


a livros e publicações periódicas.

Data: 26 de janeiro de 1970

Criada a lei da impunidade: Para proteger o chefe dos assassinos do Esquadrão


da Morte e membro da repressão política, delgado Sérgio Fleury, condenado pela
Justiça por várias mortes, é criada uma lei especialmente para que ele não seja
preso. É a chamada Lei Fleury ou Lei da Impunidade.

Data: 22 de novembro de 1973

Rádios e TVs sob censura: A ditadura tira mais espaço da imprensa com medo das
denúncias que não param de crescer. É imposta a censura prévia para emissoras de
rádio e televisões. A partir dali nada poderia ser divulgado sem que um censor,
presente dentro das redações autorizasse.
Data: 22 de janeiro de 1974

Geisel vira presidente: O quarto general assume o lugar de presidente da


República. Ernesto Beckmann Geisel é escolhido pelo Estado Maior das Forças
Armadas e o Congresso Nacional referenda sua nomeação como presidente. Sua
promessa é fazer uma “abertura lenta, gradual e segura” para devolver o país a algo
mais parecido com a normalidade democrática. No entanto, Geisel não demonstra
sinais de que o país voltaria para a democracia e o poder aos civis. Por outro lado,
durante seu governo aconteceram quase todos os casos de desaparecimentos
políticos. Se com Garrastazu Médici o aparato de repressão militar prendia, torturava
e matava oficialmente, com o uso de versões mentirosas de suicídios,
atropelamentos ou resistência seguida de morte, com Geisel as pessoas eram
também presas, torturadas, mortas e seus corpos escondidos em locais secretos.

Data: 15 de março de 1974

Oposição derrota ditadura: As organizações de oposição à ditadura, dizimadas


pela repressão militar, passam a atuar dentro do partido de oposição consentida, o
MDB –Movimento Democrático Brasileiro. Usando uma regra criada pela ditadura
quando as eleições de 1970 teve muitos votos em brancos e nulos, o MDB
consegue eleger uma enorme bancada no Congresso Nacional e a ditadura fica
desmoralizada. Segundo a regra criada pela ditadura, todos os votos em branco
iriam para o partido que obtive a maioria da votação. Com isso, os votos de
protestos seriam aproveitados pela máquina do Estado usurpado pelos militares. A
oposição com mais votos do que a ditadura recebe os votos em branco e aumenta
sua bancada.

Data: 15 de novembro de 1974

Morte de Herzog e o massacre de comunistas: A parte mais raivosa da ditadura


fez intensa campanha denunciando a “infiltração comunista na máquina do Estado”.
Depois passou a prender e matar militantes comunistas no meio da imprensa. O
DOI-CODI do II Exército tortura e mata militantes do PCB – Partido Comunista
Brasileiro durante o ano de 1975. Primeiro assassinou o Tenente José Ferreira de
Almeida e o Coronel José Maximino de Andrade, ambos policiais militares de São
Paulo, no mês de julho de 1975. Depois assassinou o jornalista Wladimir Herzog.
Seu assassinato produziu um importante ato político de protesto comandado por
Dom Paulo Evaristo Arns, da Igreja Católica, Jaime Wright, da igreja Metodista, e o
rabino Henri Sobel. Meses depois o DOI-CODI de São Paulo volta a matar. Desta
vez é o operário Manoel Fiel Filho, cuja morte e suas consequências são mais
importantes para a História do que a que aconteceu com a morte de Herzog. A
reação de Ernesto Geisel, que ocupava a presidência da República naquele
momento, foi enérgica e imediata. Demitiu o Comandante do II Exército, que era o
chefe das torturas do DOI-CODI e colocou em seu lugar um general mais afinado
com seu projeto de abertura política.

Período: de julho de 1975 até fevereiro de 1976

A Lei Falcão: A ditadura se prepara para as eleições de novembro e edita a Lei


Falcão, que leva o nome do ministro da Justiça da ditadura daquele momento. Essa
lei simplesmente tira o direito de os candidatos falarem durante a propaganda
eleitoral. Aparecia apenas a foto da pessoa e um locutor deveria ler sua biografia e o
que pretendia fazer se eleito. Assim, evitavam o risco de acontecerem denúncias
contra os crimes da ditadura.

Data: 1º de julho de 1976

Direita faz atentados: A ditadura começa a naufragar e sua parte mais raivosa
começa a fazer atentados a bomba. O atentado à sede da ABI- Associação
Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro, mostra que a direita estava com medo
das denúncias que ocorriam através da imprensa, que já não suportava a censura.

Data: 19 de agosto

Pacote de abril: A ditadura, comandada por Ernesto Geisel tinha medo de que a
oposição vencesse outra vez as eleições para o Congresso Nacional, como
aconteceu em 1974. Para preparar para as eleições do mês de novembro e garantir
o controle político formal do país, Geisel fechou o Congresso Nacional e outorgou
uma emenda constitucional e seis decretos-lei, que, dentre outras barbaridades,
criavam os senadores biônicos (um terço do Senado Federal passava a ser
nomeado pela ditadura e não mais eleito pelo povo) e reduzia o quórum mínimo para
aprovação de emendas constitucionais de dois terços para maioria absoluta.

Data: 13 de abril de 1977

Lei repressiva mais amena: Como forma de demonstrar que estava preocupado
em fazer uma abertura política, Ernesto Geisel sanciona uma nova Lei de Segurança
Nacional com penas bem mais brandas do que havia até ali. O Brasil usou leis,
tribunais de guerra e a chamada Justiça Militar para julgar civis em tempos de paz.
As penas por pertencer a organizações não reconhecidas pela ditadura eram
severas e não precisava ser uma organização clandestina de luta armada. Bastava
ser militante de associação de cidadãos em busca de alguma liberdade para ser
enquadrado na terrível Lei de Segurança Nacional.

Data: 29 de dezembro de 1978

AI-5 é revogado: Depois de ser a mais terrível forma de ameaça sobre a oposição e
sobre o povo, em geral, o AI-5 – Ato Institucional Número 5 foi revogado. A chamada
abertura lenta, gradual e segura, que Geisel prometera, precisava abrir mão de sua
mais forte arma contra a oposição.

Data: 1º de janeiro de 1979

Figueiredo vira presidente: O chefe do SNI – Serviço Nacional de Informações,


João Baptista de Oliveira Figueiredo, passa a ser o novo ocupante da presidência da
República. O mesmo ritual é usado. As Forças Armadas escolhem o nome, o
Congresso Nacional aceita e ele toma posse formalmente. Este general terá a tarefa
de completar a chamada “abertura lenta, gradual e segura” começada por Geisel.
Entre outras coisas terá que conduzir a libertação dos presos políticos através de
uma anistia política. Truculento, Figueiredo se notabilizou por frases grosseiras, tais
como: “Vou fazer a abertura política e quem for contra eu prendo e arrebento” e
também a pérola “prefiro o cheiro de cavalo do que o cheiro do povo”

Data: 15 de março de 1979

Campanha pela Anistia: Mesmo com o aparato de repressão militar, com os DOI-
CODIs à frente, ainda ameaçando toda a oposição, um grande movimento exige a
adoção de uma anistia política, que tire os presos das cadeias e traga de volta do
exílio milhares de militantes. Depois de muito debate e traições dos chefes do
partido de oposição consentida, foi aprovada e promulgada a Lei de Anistia Política.
Foi uma lei restrita e parcial, que tirou poucas pessoas das prisões e não deu
garantias de que elas poderiam exercer suas atividades sem a perseguição política.
Um de seus artigos até os dias de hoje causa dificuldades para a punição aos
torturadores, pois afirma de forma dúbia que também estariam anistiados os
chamados “crimes conexos”.

Data: 28 de agosto de 1979

Voltam os partidos: Uma das mais importantes conquistas desse período foi a volta
do pluripartidarismo. Como dito anteriormente, os partidos políticos foram extintos
pela ditadura, em 1966, e foram criados apenas dois partidos, um de apoio e outro
de oposição formal. O lento processo de redemocratização levou à quebra dessa
amarra partidária e permitiu uma reorganização em cinco partidos. A ARENA,
partido oficial de apoio à ditadura deu lugar ao PDS – Partido Democrático Social, o
MDB, partido de oposição oficial á ditadura virou o PMDB – Partido do Movimento
Democrático Brasileiro e três novos partidos foram criados. O PT – Partido dos
Trabalhadores, sob a liderança do dirigente sindical Lula, o PDT – Partido
Democrático Trabalhista, sob a liderança de Leonel Brizolla, herdeiro do trabalhismo
de Getúlio Vargas e ex-governador do Rio Grande do Sul, que perdeu a sigla PTB –
Partido Trabalhista Brasileiro para Ivete Vargas, que recebeu a incumbência de fazer
um partido com o mesmo nome do tradicional partido de Getúlio Vargas, mas sem
os perigos de uma volta ao passado de reformas e de luta por soberania nacional.

Data: 20 de novembro de 1979


Prisão de Lula e sindicalistas: As greves por melhores salários feitas pelo
sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo são duramente reprimidas e
toda a diretoria é presa pelo DOPS – Departamento de Ordem Política e Social ,
órgão de repressão da ditadura. Lula, apelido do líder metalúrgico Luis Inácio da
Silva, que liderou a fundação do PT em 10 de fevereiro de 1980 e meses depois já
sentia o peso da repressão militar. Toda a diretoria passa um mês nas celas do
antigo DOPS, local de torturas e mortes de opositores ao regime e centro de
repressão social.

Data: 19 de abril de 1980

Oposição é vitoriosa nas eleições: As primeiras eleições diretas para governador


é uma vitória total das oposições. A ditadura é rejeitada totalmente pela população
que vota massivamente nos candidatos da oposição, notadamente no PMDB.

Data: 15 de novembro de 1982

Greve geral contra a ditadura: A primeira greve geral nacional acontece e tem o
caráter nitidamente de oposição à ditadura. É uma greve vitoriosa e mostra que a
ditadura já não tem mais condições de segurar a grande onda de protestos e de
segurar as reivindicações por liberdades democráticas.

Data: 23 de julho de 1983

Diretas Já!: Vários comícios acontecem para exigir a realização de eleições diretas
para presidente da República. O primeiro reúne 300 mil pessoas em São Paulo, o
segundo reúne um milhão em frente da Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, e o
terceiro grande comício reúne um milhão e meio de manifestantes no Vale do
Anhangabaú, em São Paulo. Tudo pela aprovação da Emenda Constitucional Dante
de Oliveira, que mudava a Constituição e permitia a eleição de presidente da
República. A votação era no Congresso Nacional, dominado pela ditadura e por
falsos oposicionistas que faziam o serviço sujo para a ditadura. Como resultado,
houve um grande acordo escuso e nunca declarado entre as lideranças moderadas
da oposição e a ditadura, que queria uma eleição controlada por ela e que uma
pessoa de sua confiança assumisse a condução do processo de passagem do poder
aos civis. No dia da votação, tropas do Exército ocupam a frente do Congresso
Nacional como demonstração da vontade da ditadura rejeitar a Emenda. Além disso,
vários parlamentares, de situação e de oposição, deixaram o plenário para não dar
quórum e a Emenda foi derrotada por não ter o número mínimo de deputados
presentes.

Período: de janeiro de 1984 até abril de 1984

Eleição de Tancredo Neves: Um grande acordo acontece depois da rejeição da


Emenda das Diretas Já!. Vários políticos do partido da ditadura, agora denominado
PDS, passam a se dizer de oposição e que querem a redemocratização do país.
Entre eles estavam o ex-presidente da ARENA, José Sarney, e Aureliano Chaves,
que ocupava o cargo de vice-presidente da República do ditador João Figueiredo,
que formam a chamada Frente Liberal e se desligam do partido da ditadura. É
formada a chapa de interesse da ditadura para a escolha controlada de um nome de
confiança que fizesse a transição para a entrega do poder aos civis. Tancredo
Neves é o nome e seu colega de chapa é ninguém menos do que José Sarney. A
dupla iria enfrentar a chapa encabeçada por Paulo Maluf, que representava o PDS,
mas que era rejeitado até pelo general João Figueiredo, por não ser confiável. A
dupla Tancredo e Sarney é escolhida pelo colégio eleitoral indireto, formado pelo
Congresso Nacional, e sua posse seria dia 15 de março de 1985. Tancredo adoece
às vésperas da posse e assume José Sarney, ex-presidente da ARENA.

Data:15 de janeiro de 1985

Assembleia Constituinte: Os parlamentares eleitos em novembro de 1986 são


transformados em Constituintes e recebem a tarefa de escrever a primeira
Constituição democrática depois da ditadura. Seria a forma de descontruir a falsa
legalidade da ditadura e criar uma nova ordem jurídica e o estabelecimento do
Estado Democrático de Direito. A presidência da Assembleia Constituinte fica com
Ulisses Guimarães, deputado moderado do PMDB.

Data: 1º de fevereiro de 1987


Primeira eleição democrática: Depois de trinta anos sem o direito de eleger seu
presidente da República, o país se mobiliza para a primeira eleição direta. Três
candidaturas significativas se apresentam: Leonel Brizolla, o histórico líder
trabalhista, o líder sindical Lula e o político de direita Fernando Collor de Mello.

Brizolla e Lula disputam o mesmo segmento eleitoral e defendem as bandeiras


históricas das lutas populares. Defendem uma política do Estado protetor dos
interesses dos trabalhadores. O primeiro deixa clara sua herança getulista e
trabalhista, enquanto que Lula apresenta a visão do novo sindicalismo. Collor faz
uma campanha baseada no moralismo e no suposto combate à “corrupção
disseminada no país”. Ele passa a ser o “caçador de marajás” e a mídia o promove
como o salvador da pátria, que livrará o Brasil da praga da corrupção. Marajá era um
apelido dado aos funcionários públicos com altos salários e muitos privilégios. O
funcionalismo é acusado de ser privilegiado e o esvaziamento da estrutura do
Estado passa a ser defendido abertamente.

O segundo turno é um enfrentamento pesado entre o neoliberal Collor, que defende


o Estado mínimo e o sindicalista Lula, que propõe a reestruturação do Estado para
defender as reivindicações dos trabalhadores. A mídia não esconde sua preferência
por Collor e se dedica a desconstruir a candidatura de Lula. A campanha é de baixo
nível, com o uso de assuntos pessoais de Lula, envolvendo até familiares. Até
mesmo o sequestro de um empresário é usado para atacar Lula. Um delegado de
polícia é acusado de colocar uma camiseta de propaganda de Lula em um dos
sequestradores presos para que a foto divulgada pela imprensa insinuasse uma
ligação entre a campanha e o sequestro do empresário.

Data: 15 de novembro de 1989 (1º turno e 17 de dezembro e 1989 (2º turno)

Aberta a Vala de Perus: Dentro do Cemitério Dom Bosco, no bairro de Perus, São
Paulo, foi descoberta uma enorme vala comum com os restos mortais de mais de mil
e quinhentas pessoas. Eram crianças vítimas da violência policial, cidadãos pobres
da cidade grande, vítimas de epidemias escondidas pela ditadura ou assassinados
pelo Esquadrão da Morte, grupo de assassinos atuando dentro da polícia de São
Paulo. Além disso, havia um número impreciso de corpos de militantes políticos
presos, torturados e mortos pela ditadura, que tentou esconder seus crimes do
conhecimento da sociedade e da História. A abertura da Vala Clandestina de Perus
só foi possível pela persistência dos familiares de mortos e desaparecidos políticos e
pela vontade política da Prefeita Luiza Erundina, que decidiu ir fundo nas
investigações e na identificação das ossadas. A exposição de tão grande crime da
ditadura causou uma comoção no Brasil e no exterior de tão grande impacto que
levou a abertura dos arquivos da repressão política civil e a uma devassa nos
procedimentos dos IML – Instituto de Medicina Legal, ligados à polícia civil.

Data: 4 de setembro de 1990

Governo Collor: A campanha eleitoral acirrada e a polarização entre duas visões


tão opostas, defesa dos trabalhadores contra o neoliberalismo, deu lugar a um
governo autoritário mesmo antes da posse. Um dia antes de receber a faixa
presidencial, Collor exige que Sarney, ainda presidente, decrete feriado bancário por
três dias como preparação de um amplo pacote de medidas chamado Plano Brasil
Novo, mas que ganhou o apelido de Plano Collor. Tirou dinheiro de circulação,
confiscou a poupança popular, bloqueou contas bancárias, congelou salários e
preços, demitiu funcionários públicos, reduziu o número de órgãos públicos e
reduziu a taxa de câmbio de forma arbitrária. A economia parou, ninguém sabia qual
a referência monetária usar, pois o dólar não tinha um valor determinado, e passou a
implementar sua política econômica surpreendente. Fez um grande plano de
privatizações, liberou importações sem controle e incentivou a entrada de empresas
estrangeiras sem restrição. Baixada a poeira do choque colorido, a população se
adaptou à vida sem dinheiro e viu o presidente da República dar shows diários para
a mídia do país. Collor voou de jato da Força Aérea, lutou karatê em público e corria
todos os dias seguido por uma multidão de assessores e jornalistas. A Casa da
Dinda, apelido da mansão milionária de Collor virou símbolo do novo poder e pouco
tempo depois virou símbolo de corrupção. O “Caçador de Marajás” passou a ser
acusado de chefe de um esquema enorme de chantagens e corrupção com
ramificações por todos os lados.

Período: 15 de março de 1990 até agosto de 1992


Impeachment de Collor: As acusações contra o presidente da República se
multiplicam e vários pedidos de cassação de seu mandato são iniciados. O país
conhece uma palavra que vai ser símbolo da vontade popular com participação:
Impeachment. É pedido formalmente ao Congresso Nacional o impedimento do
presidente da República e seu afastamento definitivo da condução do país por
incapacidade moral e ética. A mídia esquece o “Caçador de Marajás”, que havia
criado, e passa a expor as mazelas de Collor incentivando sua derrubada por via
constitucional. O Congresso Nacional, antes tão criticado, condenado como
desnecessário e taxado de antro de corruptos passa, de uma hora para a outra, a
ser o espaço cheio de paladinos da Justiça. A Câmara de Deputados aprova o
impeachment de Collor, que recorre ao Senado, mas antes de que haja o
pronunciamento da segunda casa legislativa, Fernando Collor de Mello renunciou.

Período: 29 de setembro até 29 de dezembro de 1992

Depois que a população se viu manipulada no primeiro processo eleitoral pós-


ditadura, que teve a frustração de ver o presidente eleito ser forçado a renunciar, de
ver a mídia ajudar a eleger esse presidente e em seguida ajudar a sua deposição e
de conhecer a espantosa série de denúncias de corrupção, o país conheceu um
razoável período de tranquilidade. O vice do presidente que renunciou, tomou posse
e não houve vetos ou golpes militares, muito menos a instalação de uma ditadura
sanguinária, como aconteceu em 1964. As eleições aconteceram com regularidade
e houve a mudança de governos com propostas e projetos diferentes, sem que
houvesse a traumática mutilação das instituições, como aconteceu em 1964. É
possível afirmar que esse pode ser o caminho mais razoável que temos a seguir.

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