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Fundamentos Epistemológicos

do Ensino Religioso
É um fato a educação depender da cosmovisão, do modo de se conhecer e projetar a vida.
A concepção de mundo da cultura ocidental é a dos séculos XVI e XVII, que muda radicalmente a
noção de um universo orgânico vivo e espiritual da Idade Média e estabelece a noção de mundo, de vida,
como máquina pronta, estática e manipulável, da mesma forma que o mecanismo de um relógio.
Essa cosmovisão da Era Moderna, determinada pela mudança na Física e na Astronomia, através
de revoluções como as de Copérnico, Galilei e Newton, tem, com o considerado fundador da Filosofia
Moderna, Descartes, a ênfase no pensamento racional e no conhecimento científico como único.
A partir do pensamento de Descartes, o filósofo do “penso, logo existo”, a cultura ocidental pas-
sa a ser marcada pela visão linear, concentrada, fragmentária, que recoloca o Ser Humano no centro
do universo, estimula a competição, legitima a exploração e a manipulação no e do planeta. O “penso
logo existo”, com o passar dos tempos, foi se ampliando e ganhando espaços: “se penso, posso”, “se
posso, conquisto”, “se conquisto, possuo...”.
A filosofia cartesiana e a consequente cosmovisão têm suporte na certeza do conhecimento
científico.
Essa crença na Ciência, a partir de Descartes, que enfatiza o pensamento racional e induz à
visão linear e concentrada, é, ainda hoje, muito difundida, chegando ao cientificismo que caracteriza
a cultura ocidental.
Os efeitos dessa visão repercutem na Escola, instituição socialmente organizada a partir das
necessidades de padronizar a forma sistematizada de ensinar os conhecimentos historicamente acu-
mulados. Assim, tanto o que se ensina como o modo de ensinar da Escola estão fundamentados na
Ciência. E o método analítico da Ciência centra-se no intelecto: discriminar, medir, classificar cada
parte para chegar ao todo.
A Escola, com a finalidade de ensinar, pedagogicamente fragmenta ainda mais o conhecimento
dito científico, e o resultado do ensino fica reduzido a conclusões, soluções e conceitos fixos, no qual
o processo dialético das inter-relações é desconhecido. E o desenvolvimento das capacidades cognos-
citivas, a formação intelectual, dá-se apenas pela apropriação de conhecimentos já sistematizados.
Considerando que o Ensino Religioso se desenvolve nessa realidade de Escola, há algumas
questões a ele relacionadas que se coimplicam, como:
a carência de uma fundamentação nas diferentes ciências, não só afins do Ensino Religioso –
Psicologia, Filosofia, Sociologia e Teologia – como também a Física, a Química, a Biologia,
dos últimos tempos;
a identificação histórica do Ensino Religioso como Ensino de Religião, seus princípios, sua
doutrina e normas, em que fica explícita a separação entre esse Ensino e a Ciência;
a ausência científica da Didática, já que esse modelo de Ensino Religioso como Ensino de Reli-
gião dispensa princípios norteadores que consideram as interdependências e as inter-relações.
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Essa posição contrária à Ciência, não como forma de questionar o seu cien-
tificismo, mas como atitude de incompatibilidade entre Fé e Ciência, está presente
no Ensino Religioso. Daí que, frente ao significado de ensinar, que compreende
ações, meios e condições para formação intelectual, em nível teórico, o Ensino
Religioso se apresenta como formação da dimensão religiosa. Mas, por força de
sua caracterização de ensino, ele necessita propiciar que experiências, conheci-
mentos, valores e qualidades veiculadas tornem-se princípios reguladores da ação
humana de educadores e educandos, e que são vivenciados em convicções e ati-
tudes reais no cotidiano.
A questão do epistemológico no Ensino Religioso, portanto, passa não apenas
pelo suporte científico na evidência desse ensino, como pela forma de sua operacio-
nalização. Nela, prepondera a aquisição de conhecimentos via intelecto, racional, e
não via imaginário, no qual o numinoso (termo assumido por Jung para designar o
religioso como segurança para a pessoa) se desenvolve. Assim, urge, no Ensino Re-
ligioso, suprir a carência epistemológica desse Ensino via imaginário, para que sua
prática não se esvazie em “pedagogias” que buscam explicitar a construção lógica
do conhecimento, a ampliação do universo, a busca na pesquisa etc., todas voltadas
mais para o desenvolvimento do intelecto, do racional dos educandos.
E, nesse sentido, há muito que percorrer ainda com o Ensino Religioso, vis-
to que ele se fundamenta e se sustenta basicamente no teórico de currículos, livros
didáticos, programas e projetos preestabelecidos, repletos de elementos e compo-
nentes técnicos do modelo escolar... Decorre daí que a prática acaba se transfor-
mando num ritualismo desatualizado, superficial, inadequado, inconsciente e até
mesmo inconsequente.
Portanto, a prática pedagógica no e do Ensino Religioso, em sua relação
epistemológica, é perpassada pelo cientificismo cultural e pelo modelo de Escola,
donde decorrem outros aspectos, como a linguagem, a avaliação, o fazer e agir do
profissional, as relações de enfoques da realidade etc.
Na medida em que o Ensino Religioso assume a caracterização de Ensino
nas múltiplas relações do bio-psico-racional-imaginário, a sua prática pedagógica
adquire uma unidade fundamentada muito mais na perspectiva do ato de conhe-
cer do que adquirir conhecimentos, de facilitar, de criar condições favoráveis para
se aprender a caminhar, “de dar as razões de sua esperança, sua vida”.

Panorâmica do Ensino Religioso


na História do Brasil
Compreender a história do Ensino Religioso no Brasil é entendê-lo no bojo da
educação, desenvolvida nas múltiplas relações do contexto político-educacional:
político – por meio dos encaminhamentos dados pelo Estado e Igreja(s)
ao longo de nossa história, pela força do poder estabelecido;
educacional – pelos modelos de escolas de nossos pais.

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Assim, falar de Ensino Religioso é entender o seu desenvolvimento a partir


da política educacional, como está pontuado abaixo.
No Brasil Colônia, a religião é resultante do poder estabelecido, em de-
corrência do regime de padroado. É catequização de índios, colonos e
negros. Como as escolas eram de “missão” (conversão dos gentios), não
há Ensino Religioso propriamente dito.
No período do Império, a religião é vítima do regalismo; a escola pública
tem início com o Colégio D. Pedro II, no Rio de Janeiro, e já há grande
número de escolas religiosas. Logo, continua o processo de ensino da
religião.
Na República, há a separação Igreja-Estado, e o ensino denominado lei-
go aponta um novo modelo que exclui o ensino da religião na escola.
No período da Revolução de 30, fala-se pela primeira vez de Ensino Re-
ligioso, mas o entendimento continuava sendo o do ensino da religião.
O Ensino Religioso inicia sua trajetória de força de lei. Simplesmente
permitido, deixa transparecer o grau de neutralidade da Lei: “O ensino
religioso poderá ser contemplado como matéria do curso ordinário das
escolas primárias, normais e secundárias. Não poderá, porém, constituir
objeto de obrigação dos mestres ou professores, nem de frequência com-
pulsória por parte dos alunos” (Art. 133 da Carta de 37).
Na Constituição de 1946, o Ensino Religioso estava contemplado:
Art. 168. O Ensino Religioso constituirá disciplina dos horários das
escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo
com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz,
ou pelo seu representante legal ou responsável.
na Constituição de 1967 e Emenda Constitucional n.º 1, de 1969, rea-
firma o Ensino Religioso:
Art. 168. [...]
Art. 176. [...]
V – o Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina
dos horários normais das escolas oficiais de grau primário e médio.
Na Constituição Cidadã de 1988, o Ensino Religioso está contemplado
no art. 210: “O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constitui dis-
ciplina dos horários normais das escolas públicas”.
Resultante da primeira emenda popular, com mais de 75 000 assinaturas,
essa redação do artigo 210 não retratou o que as assinaturas subscreviam: “A Edu-
cação Religiosa será garantida pelo Estado no Ensino de 1.o e 2.o Graus como
elemento integrante da oferta curricular, respeitando a pluralidade cultural
e a liberdade religiosa.”
Decorrentes do determinado pela nossa lei maior, a Constituição, são as Leis
Orgânicas, em nosso caso, as Leis de Ensino.

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Analise o que rezam as nossas três Leis de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional, quanto ao Ensino Religioso.

Lei 4.024/61
Art. 97. O Ensino Religioso constitui disciplina dos horários normais
das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado sem ônus
para os poderes públicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, mani-
festada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável.
§1.º – A formação de classe para o ensino independe de número mínimo
de alunos.
§2.º – O registro de professores de Ensino Religioso será realizado
perante a autoridade religiosa, respectiva.

Lei 5.692/71
Art. 7.º [...]
Parágrafo único. O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, consti-
tuirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos de 1.º e 2.º graus.

Lei 9.394/96
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui discipli-
na dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, sendo
oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências
manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:
I – confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu
responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos
preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades re-
ligiosas; ou
II – interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades
religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo
programa.

Uma Grande Mudança no


Ensino Religioso: Lei 9.475/97
Você deve se lembrar do que ocorreu com o Ensino Religioso. Depois de
ter sido totalmente desorganizado devido à confusão introduzida pela nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96-LDBEN), a reação de
professores, de organizações sociais e igrejas resultou na proposição de projetos
para mudar essa lei.

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Na Câmara dos Deputados, Padre Roque foi o responsável pela construção


de uma legislação alternativa. Com um grande esforço, depois de muitos, longos
e profundos debates, chegou-se à mudança na LDBEN, por sinal, a primeira e
única, por enquanto.
Este esforço resultou na aprovação da nova lei do Ensino Religioso, a
Lei 9.475/97. Ela é fruto, como disse Padre Roque, de um grande consenso.
“O sentido da lei está em garantir que a escola de ensino fundamental opor-
tunize aos alunos o acesso ao conhecimento religioso. Não é seu interesse fazer
com que a escola garanta aos estudantes o acesso às formas institucionalizadas
de religião – isto é competência das próprias igrejas e crenças religiosas. À escola
compete garantir o acesso ao conhecimento religioso, a seus componentes episte-
mológicos, sociológicos e históricos. Pode, naturalmente, servir-se do fenômeno
religioso e de sua diversidade, sem, contudo, erigir uma ou outra forma de reli-
giosidade em objeto de aprendizagem escolar. Na aula de Ensino Religioso nossas
crianças têm que ter acesso ao conhecimento religioso, não aos preceitos de
uma ou de outra religião” (Pe. Roque).

1. Sintetizar alguns elementos determinantes na história do Ensino Religioso no Brasil.

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2. Apontar aspectos da concepção de Ensino Religioso que se repetiram nas legislações.

Lei 9.475, de 22 de julho de 1997


Dá nova redação ao art. 33 da
Lei 9.394, de 20 de dezembro de
1996, que estabelece as Diretrizes
e Bases da Educação Nacional.

O Presidente da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1.º O art. 33 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vi-
gorar com a seguinte redação:
Art. 33. O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante
da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das
escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
§1.º – Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para
a definição dos conteúdos do Ensino Religioso e estabelecerão as
normas para a habilitação e admissão dos professores.
§2.º – Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos
do ensino religioso.

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Art. 2.º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.


Art. 3.º Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 22 de julho de 1997, 176.º da Independência e 109.º da República.

Fernando Henrique Cardoso


Paulo Renato Souza

O Novo Paradigma do Ensino


Religioso a partir da Lei 9.475/97
Sete novos enfoques na leitura do artigo 33 (nova redação):
o Ensino Religioso é parte integrante da formação básica do cidadão;
no Ensino Religioso, é assegurado o respeito à diversidade cultural e
religiosa do Brasil;
no Ensino Religioso, são vedadas quaisquer formas de proselitismo;
o Ensino Religioso é disciplina dos sistemas de ensino;
o Ensino Religioso deve contar com professores habilitados e admitidos
para ministrar essa disciplina;
o Ensino Religioso tem na entidade civil a sua representante para acom-
panhar o seu desenvolvimento;
a entidade civil do Ensino Religioso é constituída pelas diferentes deno-
minações religiosas.
O Ensino Religioso, a partir de julho de 1997, insere-se num novo paradig-
ma, como o Professor Ubiratam D’Ambrósio aponta nos itens a seguir:

O Ensino Religioso é parte


integrante da formação básica do cidadão
“A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ao reconhe-
cer que o Ensino Religioso é parte integrante da formação básica do cidadão,
assegura, inequivocadamente, o respeito à diversidade cultural-religiosa do
Brasil e veda quaisquer formas de proselitismo.
Como preliminar às reflexões sobre como o preceito legal poderá ser
incorporado à prática escolar, é importante tecer algumas breves conside-
rações sobre o surgimento das religiões e das denominações religiosas.
É fácil reconhecer que isso é um fato histórico que responde às neces-

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sidades básicas do ser humano de sobreviver, dar continuidade à estirpe


e transcender sua existência, explorando e explicando suas origens (his-
tória), procurando saber e possivelmente influenciar o futuro (ciências).
Um estudo, mesmo superficial, da evolução do comportamento humano
nos mostra que o grande motivador dessa evolução tem sido a busca de
sobrevivência e de transcendência, em total simbiose. Assim se originam
as diferentes manifestações culturais da espécie humana, focalizadas na
linguagem, nas artes, nas ciências, nas técnicas e nas religiões. Equivo-
cadamente, a satisfação das necessidades de sobrevivência e de transcen-
dência têm sido mostradas como aspectos distintos, mesmo dicotômicos,
da natureza humana, identificados respectivamente com o material e o
espiritual, com o corpo e a mente.”

No Ensino Religioso, é assegurado o


respeito à diversidade cultural do cidadão
“A diversidade religiosa a que se refere o texto da lei é notada em di-
versas formas. Primeiro, na formação do país, em que as populações nativas
foram sujeitas a um processo de conversão ao cristianismo, o mesmo acon-
tecendo com os escravos trazidos da África. Esses povos foram convertidos
e assimilados pela Igreja Católica, mantendo porém vivas as suas tradições
religiosas na forma de sincretismo tipicamente brasileiro. Surgiram, então, di-
versas variantes religiosas, mescla dessas tradições e do catolicismo, que estão
presentes, por exemplo, nos cultos de candomblé e rituais de umbanda, bem
como em várias crenças e práticas populares. A partir das grandes correntes
migratórias, desde o final do século XVIII, instalaram-se no país tradições
religiosas não cristãs, bem como diversas igrejas protestantes.
Já durante o século XIX vão surgindo novas denominações protestan-
tes, que proliferaram na segunda metade do século XX. Embora com menor
visibilidade, a Igreja Católica também apresenta algumas dissidências. Desde
cedo, as novas denominações religiosas procuram se instalar, inicialmente em
todo o continente americano, e, posteriormente, em outros continentes.”

No Ensino Religioso, são vedadas


quaisquer formas de proselitismo
“Ao mencionar o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, o
legislador quis garantir a presença de todas essas variantes no sistema escolar.
Isso impossibilita, do ponto de vista legal, a predominância de qualquer reli-
gião nos sistemas escolares.
Acredito que esse problema, no qual reside a grande dificuldade da
implementação do texto legal, pode ser superado se interpretarmos adequa­
damente o significado do ensino religioso.

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Acredito que o Ensino Religioso, focalizado sob essa ética, evita o pro-
selitismo, que é vedado nos termos da lei, e facilita o diálogo inter-religioso,
essencial para assegurar o respeito à diversidade cultural e religiosa. A orga-
nização de conteúdos de ensino religioso em torno dessa ética possibilitará aos
sistemas de ensino atingir os objetivos maiores que determinaram a inclusão
do ensino religioso nos sistemas educacionais.”

O Ensino Religioso é
disciplina dos sistemas de ensino
“É inegável a incapacidade dos atuais sistemas educacionais de preen-
cherem o vazio mencionado acima. Na organização curricular em disciplinas
a que as escolas estão subordinadas, não há espaço para essas reflexões. Isso
não está nos programas! Uma organização escolar transdisciplinar, na qual a
construção do conhecimento repousa sobre a conjugação da dimensão senso-
rial, intuitiva, emocional e racional, contempla naturalmente essas reflexões.
Porém, a educação transdisciplinar é ainda restrita a poucas escolas experi-
mentais. A quase totalidade das escolas está subordinada ao esquema disci-
plinar. Assim, foi necessário criar, por lei, o Ensino Religioso, com o objetivo
explícito de recuperar o aspecto espiritual da existência humana. Equivalente-
mente, de preencher o vazio mencionado acima.
Na verdade, o que se quer é reincorporar a espiritualidade/transcendên-
cia como elemento indispensável na formação integral do ser humano. Sobre-
tudo no decorrer deste século XX, os sistemas escolares vêm dando prioridade
à formação do indivíduo para a vida diária, para as profissões e para a expli-
cação das coisas ao seu redor, animadas e inanimadas. Daí a ênfase, desde a
escola primária, no ler, escrever e contar, e a apresentação dessas práticas e
habilidades via esquemas racionais, formalizados.
As teorias de aprendizado mais correntes privilegiam desmesuradamen-
te o racional, ignorando a dimensão sensorial, a intuitiva e a emocional na
construção do conhecimento.
Ao privilegiar o racional, abre-se a possibilidade de o aspecto material
da existência humana ser o dominante nos sistemas escolares. Novas teorias
de aprendizado, como inteligências múltiplas e mesmo inteligência emocional,
que procuram quebrar a dominância, quase exclusiva, do aspecto racional na
construção do conhecimento, têm sido ainda pouco aceitas em educação.
Sobretudo com o advento da imprensa, e principalmente da televisão,
a criança sabe de fatos e assiste a cenas que não se constituem parte do que
estuda na escola. Muitas vezes, procura-se evitar esses assuntos. A vida em
família oferece pouco espaço para discutir temas que impactam, e obviamente
preocupam a criança de hoje.”

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O Ensino Religioso deve contar com profes-


sores habilitados e admitidos para ministrar
essa disciplina
O Ministério da Educação, pela primeira vez na história do Ensino Re-
ligioso, tem indicado a necessidade de habilitar profissionais para esse ensino,
agora constituído disciplina integrante dos horários normais das escolas pú-
blicas do ensino fundamental. O próprio Conselho Nacional de Educação, em
Parecer, antes mesmo da nova redação do artigo 33, já sugeria tal formação.
E é também a respeito dessa mesma capacitação que Padre Roque quer se re-
ferir ao mencionar: “... Basta que tenha honestidade científica e competência
profissional.”

O Ensino Religioso na entidade civil e


sua entidade de classe para acompanhar seu
desenvolvimento
A disciplina Ensino Religioso, no espírito da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional 9.394/96, tem a entidade de classe onde o professor
pode encontrar apoio e orientações.
Essa entidade, nos Estados, tem diversos nomes, mas sua função é sem-
pre de Conselho e sua denominação varia conforme a história de uma entidade
que já existia nesse Estado:
PA – AIEPA: Associação Interconfessional de Educação do Pará;
SP – CONER/SP: Conselho de Ensino Religioso de São Paulo;
RO – CONER/RO: Conselho de Ensino Religioso de Rondônia;
MT – CONINTER: Conselho Interdenominal do Ensino Religioso.
A entidade civil do Ensino Religioso é constituída pelas diferentes de-
nominações religiosas.
A entidade civil do Ensino Religioso para dezessete estados brasileiros
não se constitui numa novidade, visto que neles já existiam diferentes orga-
nismos para o Ensino Religioso, como o Conselho de Igrejas para Educação
Religiosa (CIER) em Santa Catarina. O novo está na missão e na constituição
dessa entidade:
ser essa entidade o conselho referencial para o conteúdo do Ensino
Religioso, entendido tanto o veiculado na prática das escolas, quanto
o dos cursos de capacitação, dos manuais etc;
ser composta pelas diferentes denominações religiosas, conforme a
realidade local, e aberta a todas as denominações interessadas.

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Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino


Religioso
Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso constituem
um marco histórico da educação brasileira:
Pela primeira vez, pessoas de várias tradições religiosas, enquanto educadores, con-
seguiram juntas encontrar o que há de comum numa proposta educacional que tem
como objeto o Transcendente.
Por tradições religiosas, aqui se compreende a sistematização do fenômeno religioso
a partir de suas raízes orientais, ocidentais, indígenas e africanas, que exige, para seu
ministério (ou mister), um profissional de educação sensível à pluralidade, consciente
da complexidade sociocultural da questão religiosa e que garanta a liberdade do edu-
cando sem proselitismo.
Esta proposta original responde à necessidade de fundamentar a elaboração dos di-
versos currículos do Ensino Religioso na pluralidade cultural do Brasil.

Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso

A história do desenvolvimento da disciplina Ensino Religioso desenrola-se


no bojo da tradição pedagógica do Brasil, marcada, fundamentalmente, por uma
tendência tradicional de escola, em que predominam:
a visão acumulativa de conteúdos (programas a serem ensinados);
a concepção bancária de aprendizagem (conteúdos a serem adquiridos
pelos educandos);
a função reprodutiva de professor (propostas pré-elaboradas por especia-
listas, autores etc.).
Uma panorâmica sobre os currículos de Ensino Religioso, vigentes até 1998
no Brasil, com raras exceções, demonstra essa prática levantada pelo Fórum Na-
cional Permanente do Ensino Religioso:
A concepção de currículo é perpassada pela elaboração de um rol de
conteúdos, compreendido como programa a ser desenvolvido. Importa o
que ensinar e o para que ensinar; o sentido, a utilidade e o domínio real
do que deve ser aprendido são de menor importância. Assim, a maioria
das propostas curriculares do Ensino Religioso se resume em conteúdos
a serem repassados.
Na construção de propostas curriculares do Ensino Religioso, predomina
a exposição de valores a serem absorvidos e vivenciados pelos educan-
dos. E essa forma tradicional de repassar conteúdos “acerca de” demons-
tra um descompasso entre os propósitos do currículo: “preparar os edu-
candos para serem cidadãos críticos, membros solidários, participativos,
justos e fraternos numa sociedade democrática”, e a prática que impede
os educandos de, entre outras coisas, tomar decisões, solicitar a colabo-
ração dos companheiros, a debater e se expor sem medo de ser sanciona-

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do negativamente por ter uma opinião diferente daquela que a chamada


maioria professa, ou mesmo de não tê-la.
A prática pedagógica demonstra que a construção de currículos é feita
por técnicos, especialistas, cabendo ao professorado apenas a formula-
ção de objetivos e metodologias para seu desenvolvimento. Dessa forma,
criou-se a mentalidade de que os conteúdos apresentados nos livros didá-
ticos são os únicos possíveis e pensáveis, mesmo que apresentados por
outras pessoas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais apontam a necessidade
de explicitação sobre a concepção de ensino e aprendizagem que de-
Você sabia que os termina a compreensão dos papéis:
Parâmetros Curriculares de professor e aluno;
Nacionais do Ensino da metodologia;
Religioso foram
da função social da escola;
elaborados pelo
Fórum em 1996 e orien- dos conteúdos a serem trabalhados na busca de coerência entre o
que se pensa estar fazendo e o que se faz!
taram a nova
redação do art. 33 Nesse contexto, pode-se afirmar que, desde 1995, fatos mar-
da LDBEN 9.394/96, no cantes determinam e impulsionam um novo paradigma para o Ensino
ano de 1997? Religioso, a partir:
da instalação do Fórum Nacional Permanente do Ensino
Religioso;
do art. 33 da LDBEN em sua nova redação;
dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso;
das determinações das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental.

Para você, qual(is) a(s) novidade(s) mais significativa(s) apontada(s) pela nova redação do art. 33
da nossa LDBEN?
Tente redigir sua resposta na forma de “Você sabia?”

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Resolução n.º 2/98 da Câmara de Educação


Básica do Conselho Nacional de Educação
(...)
Art. 3.º [...]
IV – Em todas as escolas deverá ser garantida a igualdade de acesso
para alunos a uma Base Nacional Comum, de maneira a legitimar a
unidade e a qualidade da ação pedagógica na diversidade nacional.
A Base Nacional Comum e sua Parte Diversificada deverão integrar-
se em torno do paradigma curricular, que vise estabelecer a relação
entre a Educação Fundamental e:
a) a vida cidadã através de sua articulação entre vários dos seus
aspectos como:
1. a Saúde
2. a Sexualidade
3. a Vida familiar e Social
4. o Meio Ambiente
5. o Trabalho
6. a Ciência e a Tecnologia
7. a Cultura
8. as Linguagens
b) as áreas de conhecimento:
1. Língua Portuguesa
2. Língua Materna (para populações indígenas e migrantes)
3. Matemática
4. Ciências
5. Geografia
6. História
7. Língua estrangeira
8. Educação Artística
9. Educação Física
10. Educação Religiosa (na forma do art. 33 da LDB)

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Relacione um ou mais valores da Vida Cidadã que perpassam o Ensino Religioso em sua escola.

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Nem aula de “Dentro do espírito da nova lei do Ensino Religioso, é preciso ter presen-
te que não se deseja dar catequese na escola pública, mas fazer um ensino que
religião nem respeite a pluralidade cultural e a diversidade religiosa inerente à maior parte
de nossa população estudantil. Não é função da escola pública educar a fé,
catequese. nem fazer proselitismo, isto é, propaganda de uma outra confissão religiosa. O
objetivo é apresentar o transcendente, tal como é concebido nas mais variadas
culturas e tradições religiosas.”

Paradigma de Ensino Religioso


A partir desta nova realidade que se criou com a aprovação do substitu-
tivo do art. 33 da LDB 9.394/96, dá-se atenção ao fenômeno religioso, que é
universal e tem muitas formas culturais e religiosas de se apresentar, e não se
restringe mais apenas a uma religião.
Precisamos respeitar as diferentes concepções a respeito da vida, da dor,
do sofrimento, da morte, e a respeito da vida depois da morte.
Está claramente expresso na própria lei que quem formula os conteúdos
é o sistema educacional.

Parâmetros Curriculares Nacionais do


Ensino Religioso: o específico do Ensino
De acordo com o que se lê nos Parâmetros Curriculares Nacionais, que
apresentam o que pessoas de várias tradições religiosas, enquanto educadores,
con­seguiram juntos encontrar de comum numa proposta educacional, exige-se
um pro­fissional de educação sensível à pluralidade, consciente da complexi-
dade socio­cultural da questão religiosa e que garanta a liberdade do educando
sem prose­litismo.
Esse mesmo documento apresenta, como lugar privilegiado para a expe-
riência da fé e para a opção religiosa, a família e a comunidade religiosa.
Segundo tais parâmetros, o Ensino Religioso na escola pública não pode
comunicar experiências e vivências religiosas.
De acordo com os Parâmetros, a escola é o espaço socializador do co-
nhecimento, que, através dos conteúdos, tem a responsabilidade de fornecer
as informações e responder aos aspectos principais do fenômeno religioso,
presente em todas as culturas e em todas as épocas. Todos precisam da escola
para conhecer o fenômeno religioso.
O Ensino Religioso é um processo que antecede a qualquer opção religiosa
e independe dessa mesma opção. Não é inter-religioso nem ecumênico, mas é an-
tecedente à opção religiosa, que se fará na família ou na comunidade religiosa.
Por isso mesmo, é fundamental que se defina de uma vez que o Ensino
Religioso a ser ministrado na escola pública não é “aula de religião”, muito
menos “catequese”.
Pe. Zeno

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O Conhecimento Religioso
O conhecimento é a maneira como cada pessoa capta, aprende e explica
todos os acontecimentos da vida: o trabalho, as relações pessoais, grupais e so-
ciais, os fenômenos (sejam físicos, naturais, químicos, culturais ou religiosos), os
valores, enfim, a própria vida. Todos têm a sua explicação dos fatos, dos aconte-
cimentos, justamente porque todos pensam e refletem sobre eles a partir de sua
experiência de vida.
Assim, a construção do conhecimento na escola necessita contemplar todas
as dimensões que constituem a totalidade humana, sem supervalorizar o cogniti-
vo e/ou o racional, pois:
reduzir o ser humano à razão significa deixar de captar toda a complexi-
dade que o caracteriza;
reduzir o conhecimento ao cognitivo significa deixar de captar toda a
complexidade que caracteriza o processo de aprender a criar e ignorar
que a construção de saberes pode tanto ser incentivada como bloqueada
pela intuição e imaginação, assim como pelos sentimentos, desejos, afe-
to, corpo, prazer etc.
Trabalhar o conhecimento religioso é pensar, refletir com base em fun-
damentos epistemológicos. Logo, conhecimento religioso tem a ver com episte-
mologia e não com apreensão de conteúdos programados anteriormente.

Epistemologia
“A epistemologia é um ramo particular da pesquisa filosófica que tem por
objeto os problemas mais gerais colocados pelo saber científico, tanto nas formas
das disciplinas lógicas e matemáticas, quanto nas formas das ciências naturais e
humanas (física, química, biologia, psicologia, sociologia, historiografia etc.).
Considerada, em sentido rigoroso, como pesquisa (ela própria é de natureza
científica), a epistemologia é uma disciplina relativamente recente (séc. XIX). Isso
não significa que antes de tal período não sejam encontradas antecipações preci-
sas da atual problemática epistemológica:
a discussão platônica acerca dos caracteres distintivos da episteme (co-
nhecimento fundamental) com relação à doxa (opinião);
a doutrina aristotélica da ciência: técnica (filosofia, matemática);
a doutrina do método, elaborada entre o séc. XVI e XVII por autores
como Francis Bacon, Galileu e Descartes;
todo o debate metodológico que acompanhou o nascimento e desen­
volvimento da ciência moderna;
e, enfim, o tipo de pesquisa gnosiológica ou crítica desenvolvida por
Kant (Prolegômeno a qualquer futura metafísica, Primeiros princí-
pios de uma ciência da natureza, Crítica da Razão pura).

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Todavia, somente no século XIX, em conexão com as profundas transfor-


mações experimentais e conceituais das ciências físicas e lógico-matemáticas,
começa o seu processo de crescimento e de emancipação que a teria levado a se
constituir numa disciplina especial, bastante autônoma, sobretudo em relação à
gnosiologia ou teoria do conhecimento.”
Pe. Domênico

A professora Cleide Rita1 caracteriza, num currículo, o conhecimento e nele,


o papel do Ensino Religioso:

“Tanto a escola como a sociedade, preocupadas com um projeto educa­


cional dinâmico, crítico e criativo, devem procurar orientar-se levando em
conta pelo menos quatro aspectos fundamentais:
Entender o conhecimento como um processo em construção em que
se aproveitam as situações oferecidas como oportunidades de reflexão. Assim
como um jardineiro dedicado rega diariamente as sementes, é necessário cul-
tivar o pensamento e a curiosidade que impulsionam a investigação.
Pensar a pessoa como totalidade que envolve corpo, espírito, razão,
emoção, intuição e o aspecto lúdico, estético, ético, histórico, social, econô-
mico e político.
Dialogar com a diversidade, entendendo que a riqueza dos seres huma-
nos reside na diferença, que é importante ver o outro como outro, e não querer
transformá-lo em mesmo. A homogeneização é a demolição dos seres humanos.
O coletivo se constrói com respeito e acolhida às diversas individualidades.
Preservar a memória como referência da própria identidade, quer seja
de um país, do grupo ou do próprio indivíduo. Trabalhar com a memória é
trabalhar com raízes e significados. Ninguém é fruto de si próprio, mas esta-
belece vínculos com todos que o antecederam e com os que o sucederão. Uma
sociedade como a nossa, que valoriza tudo que é útil e pragmático, despreza a
memória porque ela carrega como núcleo os fios da história que possibilitam
ofertar sentido e compreensão.
Nesta perspectiva, vale observar que a disciplina de ensino religioso tem
uma contribuição significativa a oferecer, pois se entendermos a religião – do
latim religare – como atitude de religamento, e que os seres humanos sempre
foram fazedores de religião, isto significa que uma das formas de superar o
estilhaçamento, a fragmentação da vida, da consciência e do conhecimento é
compreendendo a religião como oportunidade de reflexão, cultivo, totalidade,
1 Cleide Rita Silvério
d e A l m e i d a é P r ofessora
diversidade e memória.”
universitária, chefe do “O Ensino Religioso como disciplina, agora, tem a oportunidade de entrar
Departamento de Teologia
e Ciências da Religião na escola pela porta principal, que é a porta do conhecimento, apresentando a
da PUC-SP. Licenciada
em Filosofia, Mestre em dimensão religiosa do ser humano e da realidade. Essa dimensão está inscrita no
Educação e Currículo e
Doutora em Administração plano das relações simbólicas que desafiam o ser humano a aprofundar e desen-
Escolar pela Universidade
de São Paulo – USP e con-
volver sua humanidade através de toda a rede de símbolos que atravessa não só a
sultora do Fórum Nacional religião, mas também a linguagem, a arte, os sistemas de valores, entre outros.”
Permanente do Ensino Re-
ligioso – Revista Diálogo.

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“A religião é a memória de uma unidade perdida e a nostalgia por um


futuro de reconciliação.” (Rubem Alves)
“Essa cadeia de símbolos da qual a religiosidade é parte integrante é o
que qualifica o ser humano e o diferencia do animal. A humanidade não se
expressa apenas na ordem racional, mas fundamentalmente se humaniza por-
que é construtora de processos simbólicos. Conhecer a realidade através dessa
ótica é tarefa do ensino religioso que, ao buscar as ligações de significado
que os seres humanos tiveram em toda a sua história com a sociedade e com
a perspectiva da transcendência que se expressou em múltiplas formas, vai
travar um diálogo efetivo com contextos culturais diversificados, permitindo
desenvolver, ao mesmo tempo, compreensão e respeito ao outro.”

É a concepção do mundo que vai determinar que conhecimentos são exigi-


dos da escola e os que são rejeitados. É pela mesma concepção que a pessoa julga
a veracidade dos conhecimentos e a legitimidade de quem os produziu. A função
da escola é a de ajudar o aluno a ultrapassar o domínio da subjetividade, através
do rigor metodológico da ciência e da estrutura lógica do pensar. Trata-se de ins-
trumentos universais que auxiliam o ser humano a superar as contradições das
respostas isoladas e a procurar atribuir coerência à sua concepção de mundo.
O conhecimento religioso na escola tem a ver com o modo pelo qual essas
transformações foram construídas, transmitidas e interpretadas pelas Tradições
Religiosas frente às perguntas existenciais do ser humano.

Visão de mundo sem “conteúdo”?


Visão de mundo é a forma como entendemos a sociedade em que vivemos,
são as crenças que orientam a nossa ação. É constituída pela leitura que fazemos
da realidade, pelas formas como organizamos nossa ação neste mesmo mundo
e pelos ideais que temos em relação a ele conforme deveria ser. Tem, portanto,
elementos de juízo e de vontade, ambos nas mais diferentes gradações e profundi-
dades. Este juízo pode oscilar da verificação de uma situação em que haja a incor-
poração passiva de análises feitas pela mídia, até a posição do sujeito que reflete a
respeito da sociedade com critérios científicos. A vontade também pode oscilar de
um desejo sem muita articulação a um projeto de transformação da sociedade.
Em todas estas gradações, há visões de mundo, algumas construídas exte­
riormente, mas incorporadas pela pessoa, e outras autoconstruídas. Nenhuma das
visões de mundo, ao contrário do que se poderia pensar, é passiva. São sempre
ativas nos sujeitos, independente de onde elas foram desenvolvidas e se estão
explicitadas. Todos baseamos nossa ação cotidiana em visões de mundo. Daí a
importância de se refletir sobre esta questão em educação. Se esta visão de mundo
não é autorreconhecida, consciente, autoconstruída, ela sempre está constituída
de valores e crenças da cultura dominante.

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Todo conhecimento representa uma relação entre o sujeito cognoscente e o


objeto conhecido, relação de assimilação do objeto pelo sujeito, relação de coin-
cidência ou identificação. Logo, o conhecimento supõe e exige três elementos
também para o conhecimento religioso:
a) sujeito, ou seja, a consciência cognoscente: o educando;
b) objeto, aquilo ao qual o sujeito se dirige para conhecer: o fenômeno reli-
gioso;
c) imagem, que representa o ponto de coincidência entre o objeto e o sujei-
to: a idiossincrasia.
Educando Fenômeno Religioso
(Sujeito) (Objeto)

Conhecimento
(Objetivo)

“A humanidade foi construindo ao longo da história diversas formas de


responder às perguntas fundamentais. Elas se expressam nas diferentes manei-
ras de conhecer, cada uma delas respondendo às suas próprias condições de
legitimação. Ou seja, um determinado tipo de conhecimento tem seu próprio
estatuto que não se repete nos outros, pelo menos especificamente. Assim, o co-
nhecimento presente no bom senso, no senso comum que se funda na autoridade
e na evidência imediata, difere do conhecimento crítico que busca evidenciar as
mediações que legitimam o conhecimento e, mesmo no conhecimento crítico,
podem permanecer a autoridade e a evidência imediatas, porém, como fatores
outros, mesmo que muitas vezes determinantes. Entre os conhecimentos críti-
cos ou reflexivos, estão o conhecimento científico, o conhecimento filosófico e
o conhecimento teológico.
O conhecimento científico se caracteriza por buscar a legitimação de suas
respostas através da prova empírica; ou seja, pela verificação metodologicamente
controlada, o cientista procura estabelecer as provas de suas teses. Suas teses são
sempre falíveis, já que se sustentam enquanto não aparecerem novas provas em-
píricas que tenham força suficiente para derrubar as provas até então admitidas.
De qualquer forma, um conhecimento científico não se sustenta senão na base da
prova empírica. Note-se que a pretensa neutralidade do sujeito que conhece é um
mito da ciência, já que é ele que intencionalmente controla os processos de cons-
trução das provas. Assim não fosse, nenhum peru bem alimentado morreria na
véspera. Por mais que a ciência tenha pretendido ser a resposta mais legítima para
todas as perguntas humanas, classificando todas as demais como parciais e insu-
ficientes por sua carência de sentido, as próprias respostas científicas encontram
seu sentido lá onde todos os demais conhecimentos também o encontram, ou seja,
na sua capacidade de legitimação.

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O conhecimento filosófico constrói suas respostas legitimando-as nas ra-


zões que as sustentam; ou seja, o conhecimento filosófico pretende levar às úl-
timas consequências todas as afirmações e todos os conhecimentos humanos,
perguntando-se por seu fundamento racional. O conhecimento filosófico ques-
tiona inclusive a prova, ou a necessidade de prova, seja de qual espécie for, para
sustentar o conhecimento. As condições de sua legitimação estão nas condições
apresentadas no próprio processo de legitimação, o que não significa cair num
círculo vicioso, já que não se sustenta nenhum conhecimento filosófico sem ultra-
passar a contradição performativa que lhe possa ser imputada. O conhecimento
filosófico, por excelência, leva a própria legitimação ao questionamento, não se
contenta com uma forma específica de justificação do conhecimento.
O conhecimento teológico legitima suas respostas na revelação, exigindo
sempre a aceitação da fé para que possa se estabelecer. Sem acreditar que a re-
velação é palavra da autoridade maior ou das maiores autoridades, não há como
legitimar um determinado conhecimento teológico, seja ele patrimônio histórico
dessa ou daquela confissão religiosa. Como a autoridade ou as autoridades são di-
versas, cada confissão religiosa constrói sua própria teologia, seu próprio discurso
legítimo sobre a divindade que a sustenta. Admitir, portanto, a autoridade do que
revela é premissa necessária e suficiente para que um determinado conhecimento
teológico possa ser admitido como legítimo. De qualquer modo, ele é também um
discurso racional sobre a divindade, o mistério ou o nada, que deles depende para
encontrar legitimidade.
O conhecimento religioso se inscreve no interstício desses diversos cam-
pos ou tipos de conhecimento, muito mais próximo, é claro, do conhecimento
teológico. Ele não é um conhecimento teológico stricto sensu, pois não se funda
na autoridade reveladora desse ou daquele tipo, mas no fenômeno histórico-antro-
pológico que manifesta o seguimento de uma ou de outra dessas autoridades. Daí
que a legitimação está na sua capacidade de estabelecer o fenômeno religioso
como um problema passível de respostas diversas. Historicamente, o fenômeno
religioso se constitui num problema para a Ciência, especialmente para as Ciên-
cias Humanas, para a Filosofia e também para a Teologia. Ocupa-se, portanto, das
diversas respostas dadas a esse problema histórico-antropológico. Sua legitimida-
de está, por consequência, condicionada ao tipo de resposta dado aos problemas
por ele suscitados: se for científica, aos moldes da Ciência; se filosófica, aos mol-
des da Filosofia; se teológica, aos moldes da Teologia.
O conhecimento religioso é crítico, pois procura exatamente ser uma resposta
legítima para o necessário equilíbrio entre a autoridade que dá segurança e a liber-
dade que permite contestar qualquer tipo de autoridade, sem se fundar necessaria-
mente na autoridade. Quando a resposta equilibradora desse conflito for novamente
a autoridade, então o conhecimento religioso se converte em conhecimento teológi-
co, passando a necessitar de uma nova confessionalidade para ser organizado histo-
ricamente ou se adequar a uma das que já existe. De outro lado, pode-se converter
em simples senso comum por se contentar com a autoridade, associada à evidência
imediata do que o sustenta, resultando numa tranquilidade existencial ingênua. Cir-
cunscrever, portanto, o fenômeno religioso é condição para que se possa sustentar a
legitimidade do conhecimento religioso como conhecimento crítico.”
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“O enfoque dessa reflexão é a investigação da raiz do fenômeno religioso,


enquanto fenômeno humano.
Partimos do pressuposto de que todo ser humano faz perguntas e interroga.
A pergunta surge sempre que a curiosidade for provocada por objetos e situações
não totalmente conhecidos. A provocação não é feita pelo objeto enquanto conhe-
cido, mas por aquilo que o objeto mantém oculto, ou seja, desconhecido. Podemos
dizer que o objeto, ao revelar-se pelo conhecimento, esconde uma face. Essa face
oculta pode ser denominada, também, mistério. Trata-se de um oculto sugerido. É
como um horizonte. Olhamos para o horizonte, sabemos que no além-horizonte o
mundo existe, mas não sabemos que realidade lá se encontra.
A curiosidade nasce do desejo de saber o que é essa face oculta do objeto
ou que realidades existem além-horizonte. Então perguntamos sobre essa rea-
lidade desconhecida, porém, sugerida. Mas por que desejamos saber? Ora, se
desejamos saber é porque não sabemos tudo. Somos criaturas humanas, seres
em construção.
O conhecimento produzido pela observação, pelo estudo e investigação se
traduz em resposta. Faz cessar a curiosidade e elimina as perguntas.
Se, porém, o objeto enquanto desconhecido for ameaçador, provocando
medo e insegurança, o conhecimento é insuficiente. O ser humano, então, busca
nos rituais poderes sobre-humanos para dominar tais forças ameaçadoras. Esse
fenômeno é comum por ocasião de um temporal, guerra, peste, doença e outras
situações caóticas. Assim, também o ser humano sente-se frágil e impotente dian-
te do mundo e de suas ameaças.
Há, porém, outras situações desconhecidas, mas sugeridas pela inteligência
humana, muitas vezes ameaçadoras, como a morte e o futuro, que o estudo e a
ciência não conseguem esclarecer e dominar. Sobre estas questões, o ser humano
interroga e se interroga. Procura respostas, mas nenhuma é definitiva. O mistério
permanece mistério, provocador e interrogante. Sempre desafiou e continua desa-
fiando o ser humano.
Quando o ser humano consegue conhecer os objetos e situações, domina-
os, sente-se seguro, deixa de perguntar. Se não consegue conhecer e dominar,
como no caso das situações ameaçadoras e das interrogações irrespondíveis, o ser
humano experimenta a insegurança existencial e a ameaça de sua destruição. Este
é o espaço gerador do religioso.
Como a insegurança é indesejável, o ser humano responde às interroga-
ções, ou através da criação de teorias religiosas que, aliadas à produção de ritu-
ais, constituem as religiões, os mitos e todas as formas exóticas de manifestações
religiosas que encontramos hoje no mundo moderno; ou o ser humano, reconhe-
cendo seus limites como criatura, percebendo sua fragilidade, sua insegurança
e impotência, busca e requer a existência de um Ser Superior, Transcendente e
Absoluto, capaz de responder às suas interrogações. Aqui entra o domínio da
revelação e da fé.”
Pe. Roque e Paulo Carbonari

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“A escola, por sua natureza histórica, tem uma dupla função: trabalhar com
os conhecimentos humanos sistematizados, historicamente produzidos e acumu-
lados e criar novos conhecimentos. Os conhecimentos humanos são produtos da
experiência individual (senso comum), da Ciência, Filosofia e Teologia.
Todo conhecimento humano, independente da forma como foi produzido,
uma vez elaborado, torna-se patrimônio da humanidade.
Como todo conhecimento humano é sempre patrimônio da humanidade e está
disponível à escola, o conhecimento religioso, por ser um conhecimento humano,
deve também estar disponível a todos os que a ele queiram ter acesso. Contudo, por
questões éticas e religiosas, e pela própria natureza da escola, não é função de sua res-
ponsabilidade propor aos alunos a adesão e vivência desses conhecimentos enquanto
princípios de conduta religiosa e confessional, já que esses conhecimentos revelados
(que supõem adesão de fé) são sempre propriedades de uma determinada religião.
A escola é o espaço de construção de conhecimentos, mas, principalmente,
de socialização dos conhecimentos historicamente produzidos e acumulados.

A produção do conhecimento religioso


A pergunta
Todo ser humano faz perguntas. Ele interroga a si mesmo e ao mundo. Ao
interrogar-se, procura saber quem ele é, para onde vai e de onde veio.
Na experiência do cotidiano existencial, a pergunta rompe o equilíbrio do
intelecto. Provoca novas situações. Faz emergir o universo oculto. Esse totalmente
oculto não se apresenta como mistério, pois ele ainda não o é. O manifesto, en-
quanto manifesto, já é conhecido e por isso não é mais provocador. O objeto mani-
festo, porém, guarda sempre outra face como desconhecida, mas sugerida. É um
oculto vislumbrado no horizonte. A esse desconhecido que está além-horizonte
denominamos mistério.
Quando o mistério for ameaçado, pode ser também denominado caos. E a
instalação do caos na consciência humana acontece também quando a inteligência
não consegue compreender e dominar os fenômenos que se manifestam, como o
temporal, a morte, a doença, a guerra. A dominação do caos se dá pelo conheci-
mento do fenômeno e pela força de um ritual.
A pergunta surge de um espaço ainda não dominado pelo conhecimento.
Por isso, a pergunta põe a inteligência humana em desequilíbrio. Enquanto não
encontra uma resposta à pergunta, a curiosidade mantém a inteligência em dese-
quilíbrio. A resposta é o conhecimento construído sobre o mistério e traduzido em
fenômeno. E esse conhecimento devolve o equilíbrio intelectual, elimina a curio-
sidade e se apropria da face oculta do objeto. Incorporado ao mundo existencial,
o objeto se torna familiar e cotidiano.
O conhecimento religioso, assim como todo conhecimento humano, é o con-
junto das respostas sistematizadas às questões e problemas fundamentais que fazem
parte da vida humana. Assim, conhecer é, antes de mais nada, formular problemas
que inquietam a inteligência e construir respostas sistematizadas e legítimas.
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E... “nenhum ser humano, por mais cético que seja, consegue permanecer
sempre na dúvida”. (Carbonari e Zimmermann)

A escola é um espaço em que professor e alunos se fazem perguntas. Jun-


tos buscam respostas. Põem-se em desequilíbrio mútuo. Sobre situações sociais,
políticas e religiosas e sobre objetos que já receberam respostas, professor e aluno
refazem as mesmas perguntas. As respostas poderão ser encontradas junto aos
conhecimentos já produzidos e disponíveis na escola. O fato de o conhecimento já
ter sido produzido não significa que já tenha se transformado em posse para todos.
Os alunos precisam refazer, com o auxílio do professor, os mesmos processos para
satisfazerem suas interrogações, provocadas pelos fenômenos que se apresentam
de forma espontânea ou instigados pelo professor.
A escola não pode fazer proselitismo, impondo ou convencendo os alunos
a aceitarem e assumirem este ou aquele conhecimento revelado (objeto de adesão
de fé), mas também não pode se negar a colocar tais conhecimentos à disposição
de todos, uma vez que eles também se constituem em patrimônio cultural.
Perguntas fundamentais e perguntas que geram respostas religiosas:
— Quem sou?
— De onde vim?
— Para que vivo?
— Para onde vou?

As respostas
Respostas específicas
Cada pergunta requer uma resposta específica. Para ser aceita a resposta,
a pessoa estabelece condições. Exige que as respostas sejam legítimas. A veraci-
dade, critério para se aceitar um conhecimento, fica condicionada à legitimidade.
Ora, quem pode conceder respostas? Não podemos esquecer que as respostas são
sempre conhecimentos. A questão pode ser colocada da seguinte maneira: ‘Quem
possui conhecimentos sobre o mistério?’ Para esclarecer a questão, tentaremos
verificar os níveis de conhecimento.
O primeiro nível de conhecimento indica a existência de conhecimentos
adquiridos pela experiência pessoal, que denominaremos práticos; e conhecimen-
tos adquiridos através da informação, referidos como teóricos. Os primeiros são
legitimados pela evidência da experiência. Esta evidência pode ser posta em dú-
vida, na medida em que for possível formular outras perguntas sobre o objeto já
experienciado, ou quando a própria estrutura da experiência é posta em dúvida no
sentido de tornar-se problemática.
A autoridade, enquanto legítima, é aceita como fonte reveladora de conhe-
cimento, na qual é depositado o ato daquele que pergunta. É por isso que neste
nível de conhecimento aparecem com muito vigor os sábios, as lideranças e as
autoridades instituídas política e socialmente como fonte de conhecimento.
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A concepção do mundo
Cada pergunta requer uma resposta. Como as perguntas nascem de um con-
texto específico, as respostas também são específicas. A prática cotidiana mostra
existirem muitas respostas para uma mesma pergunta, dependendo de quem ofe-
rece a resposta. Por isso, muitas respostas não conseguem construir coerência en-
tre si por serem contraditórias. Há assim necessidade de uma ‘instância’ que seja
capaz de ordenar os conhecimentos recebidos como resposta e possibilitar uma
visão global do mundo. Podemos chamar a essa potência (instância) de ‘concep-
ção do mundo’. A concepção do mundo é a maneira como cada ser humano com-
preende o mundo. A concepção do mundo assume o encargo de acolher ou rejeitar
as respostas que se enquadram ou não na compreensão que temos do mundo. A
religião, a política e a ideologia se apresentam como estruturantes da concepção
do mundo. Em algumas pessoas, a concepção do mundo se apresenta com muita
rigidez e inflexibilidade; noutras, mais aberta e sem critérios de julgamento. Em
determinados momentos, a religião aparece como determinante da estrutura da
concepção do mundo; noutros, aparece a ideologia, a política ou a tradição e o
contexto sociocultural.
Buscar coerência na compreensão que cada um de nós possui do mundo não
significa abdicar dos fundamentos estruturantes da concepção do mundo, como
no caso da religião e da cultura. Ao contrário, a própria religião, a cultura e a ide-
ologia necessitam da reflexão para purificar suas contradições.
Parece haver uma ação evidente entre a insegurança do ser humano, pro-
vocada pelo mistério ou pelo caos, com a necessidade de respostas dogmatizadas
através de uma autoridade legítima, detentora do conhecimento sobre o mistério.
É evidente também o fenômeno de apossamento dos objetos e do domínio sobre o
mistério através do conhecimento.”
Pe. Elli Beninca

Categorias Saber em si Saber em relação Saber de si


Informação Informação Informação
Conhecimento inquestionável localizada interpretada
(racionalidade) (historicidade) (hermenêutica)

Domínio do Ação reflexiva do Interpretação do


Currículo conhecimento conhecimento conhecimento
acumulado acumulado acumulado

Pensamento Convergente Dialético Dialogial

Reprodução Ressignificação
Aula Experienciação
dos conteúdos dos conteúdos

Síntese Análise crítica da Releitura do


Aprendizagem
pré-elaborada realidade fenômeno religioso

Antropologia Fenomenologia
Ciência fundante Teologia
religiosa religiosa

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O conhecimento do fenômeno religioso está fundamentado nas ciências hu-


manas, sociais e da religião, suporte mínimo necessário para o desen­volvimento
do Ensino Religioso como um saber. Assim, esse conhecimento na disciplina de
Ensino Religioso remete para a construção do saber, entendido em suas diversas
nuances.
As diferenças básicas determinadas pelo encaminhamento do Ensino Reli-
gioso no fazer pedagógico mesclam-se nas diferentes tendências que perpassam
a escola.
Assim, o saber decorrente pode ser classificado em:
— saber em si, que é o olhar acerca de algo, alguém, algum lugar etc.;
— saber em relação, que é o saber a partir das múltiplas relações sociais,
políticas, econômicas, ideológicas etc.;
— saber de si, que é o saber algo a partir de si mesmo (Quem sou? De onde
vim? Para onde vou? Por que vivo?).
Nessa perspectiva, o saber construído no Ensino Religioso a partir de con-
teúdos teológicos das tradições religiosas e culturais, como divindades, textos sa-
grados, símbolos, doutrinas, verdades de fé moral etc., é caracterizado um saber
em si, mesmo que veiculado na perspectiva da pluralidade (mais de uma).
Esse mesmo saber (conteúdos), enfocado na perspectiva da historicidade,
desencadeia uma relação e valoração de moral (comportamento decorrente). É o
saber, em relação hoje aos PCN, explorado como tema transversal para todas as
disciplinas. E o seu fundamento está na Antropologia.
Já o saber de si, o entendimento de si, se dá na reconstrução de significados
pela releitura dos elementos do fenômeno religioso (pois, para todo ser humano,
culturas e tradições religiosas são elementos significativos, densos e tensos que
se conectam na formação do cidadão). Assim, o saber de si fundamenta-se na
Fenomenologia religiosa.
O saber construído estabelece um pensamento decorrente no ensino e na
aprendizagem. Daí serem decorrentes as diferentes concepções de Ensino Reli-
gioso veiculadas na história:
aula de religião (Teologia);
aula de vivência religiosa (Antropologia);
aula de interpretação e análise do conhecimento religioso (Fenomenolo-
gia religiosa).

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Você deve ter acompanhado os diferentes modelos de Ensino Religioso, como aluno(a),
professor(a) e/ou pais ou cidadão(ã).
Pense nos conteúdos veiculados e relacione-os aqui.
a) Ensino Religioso = aula de religião.

b) Ensino Religioso = aula de Antropologia religiosa.

c) Ensino Religioso = aula de Fenomenologia religiosa.

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Fenômeno Religioso:
objeto do Estudo Religioso
Assim, a disciplina de Ensino Religioso tem como objeto de estudo o fenô-
meno religioso.

Por fenômeno religioso, entende-se o processo de busca que o ser huma-


no realiza na procura de transcendência, desde a experiência pessoal do Trans-
cendente até a experiência religiosa na partilha de grupo; desde a vivência em
comunidade até a institucionalização pelas Tradições Religiosas.

Ensino Religioso

Fenômeno Religioso

Culturas Tradições Religiosas

Diálogo e Reverência

O fenômeno religioso se estrutura na bipolarização: cultura e tradição


religiosa, visto que toda cultura tem em seu substrato a presença do religioso e
que toda tradição religiosa constitui-se no bojo de uma cultura, num processo
simultâneo, interativo.

Na Escola, perante a pluralidade de culturas e tradições religiosas em que o


educando se insere, o Ensino Religioso, pelo estudo do fenômeno religioso, desen-
cadeia o diálogo e a reverência. Pode-se dizer que estas são as grandes finalidades
dessa disciplina na escola: diálogo e reverência.
Diálogo a partir do entendimento da palavra: diá-logo.
Diá: prefixo grego = diferentes, opostos.
Logos: sufixo grego = palavra, discurso articulado.
Portanto, diálogo é a realidade que se estabelece a partir da palavra de dife-
rentes, de opostos. Na homogeneidade, não há diálogo, somente repetição. O diá-

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logo como meta do Ensino Religioso é possível pela diversidade cultural-religiosa


do Brasil, presente no convívio social. Diálogo como processo de construção do
conhecimento, de modo que possa contribuir para a formação de identidades afir-
mativas, persistentes e capazes de protagonizar ações solidárias e autônomas de
constituição de valores indispensáveis à vida cidadã (Parecer n.º 04/98 da CEB/
Conselho Nacional de Educação).
Reverência – significa acatamento às coisas sagradas, ao que é digno de
respeito, veneração, mesura, cortesia, genuflexão.
Quando se usa o termo reverência (ao Transcendente no outro) no Ensino
Religioso, quer-se ir mais longe, além do simples entendimento encontrado no
senso comum; vai do respeito à tolerância para com o diferente. Usa-se o termo
com o sentido da consciência do direito que cada um tem a essa diferença ditada
pela Constituição Brasileira.
Diálogo construído a partir do diferente (o outro) e reverência ao mesmo
Transcendente (Deus) presente no outro de modo diferente, na certeza de que
Deus é um e mais.
Culturas e tradições religiosas se constituem em um dos eixos organizado-
res do conteúdo do Ensino Religioso contido nos Parâmetros Curriculares Nacio-
nais do Ensino Religioso. Para Edivaldo Bortoleto:
desenvolver esse tema na estrutura de um texto possibilitador de um aprofundamento
mínimo sobre o referido eixo, supõe, já de antemão, o ter que reconhecer a vastidão e
extensão do próprio objeto em questão, ou seja, o de que rastrear o objeto é já rastrear
o próprio percurso da espécie humana mesma no curso do tempo/espaço, portanto, das
culturas e de todas as formas simbólicas.
O primeiro momento dessa reflexão sobre Culturas e Tradições Religiosas se desenvolve em
torno dos conceitos mesmos, sem deixar de lado os seus respectivos conteúdos materiais e
possíveis engates existentes entre eles. Ainda aqui se quer explorar o conceito de diálogo e
da questão do outro. Isto porque não se pode falar de culturas e tradições religiosas se não se
incluir nesta reflexão outros dois, ou seja, o de diálogo e a questão da alteridade.
Edivaldo Bortoleto

Assim, a relação Culturas e Tradições Religiosas é trabalhada pelo autor


por meio dos conceitos aqui apresentados a você:
cultura;
religião (entenda-se Tradição Religiosa);
tradição;
diálogo;
alteridade.
Esse estudo se dá na ética da diversidade cultural-religiosa do Brasil.
“Falar de cultura, tradição e religião significa falar de elementos que se
conectam, ou seja, que se coimplicam, pois estão em relação. E dessas relações
muito pouco sabemos. É por isso que não se pode pensá-los em separado pela
lógica da disjunção nem pela lógica da abstração, então.”
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“Cultura, tradição e religião são significantes densos e tensos que perderam


o vigor e frescor no bojo da lógica da redutibilidade. Isto por causa, dentre várias
razões e motivos, de um critério único, simplificador e redutor advindo de uma
visão epistemológica positivista.” (Pe. Joachim).

Religião – Cultura – Culto – Tradição


Religião – do verbo latino religare – é então aproximação de pessoas em
crenças comuns.
A religião é o mais antigo sistema simbólico de aproximação de pessoas
numa mesma cultura.
Sempre que você encontrar neste estudo o termo religião, leia-o na perspec-
tiva de tradição religiosa.
Cultura, culto e religião, para Bortoleto, enquanto formas de um complexo
sistema simbólico, implicam aproximação do outro, junto com outros em adoração
ao outro-transcendente – este núcleo “ético-mítico” – de uma cultura. Como diz
Cassirer – o espaço e o tempo são a estrutura em que toda a realidade está conti-
da. Não podemos conceber qualquer coisa real exceto sob as condições do espaço
e do tempo. Nada no mundo, segundo Heráclito, pode exceder suas medidas – e
estas são limitações espaciais e temporais. No pensamento mítico, o espaço e o
tempo nunca são considerados como formas puras ou vazias. São vistos como as
grandes forças misteriosas que governam todas as coisas que regem e determinam
não só a nossa vida mortal, mas também a vida dos deuses.
Isto posto, pode-se dizer que há um movimento temporal e espacial da cul-
tura, que tem a ver com o passado/presente/futuro. Aqui se faz necessário, e já
parece ser pertinente, fazer um engate com um outro conceito: o de tradição.
A tradição, segundo Arcângelo R. Buzzi, é “o liame vivo com o passado! A
tradição nos faz sentir o quanto estamos unidos aos que nos precederam, o quanto
eles continuam atuantes no íntimo de nosso ser.”
A tradição implica o gesto de retomada do passado para se projetar o futu-
ro. Daí entendermos melhor o sentido da utopia, o sentido da escatologia. O gesto
de retomada do passado não vai na direção de resgatar a identidade perdida, mas,
sim, resgatar as relações e conexões possíveis para se garantirem os processos.
Garantir os processos no mundo da cultura a partir da valoração e do rendi-
mento, como diz Arcângelo R. Buzzi: “A valoração da herança recebida provém
de seu aproveitamento”. Assim, pode-se dizer da tradição enquanto “tesouro sig-
nificante”: “Escolhemos da tradição aqueles modos de viver e de pensar, aqueles
conhecimentos úteis para nosso desenvolvimento”, rendimento da tradição.
Desta forma, afirma-se que “ela (a tradição) não é pois uma objetividade in-
questionável, mas uma fonte de diálogo”. Tal diálogo faz-se com nossa capacidade de
pensar. Portanto, “tradição e pensamento devem ser vividos numa relação dialógica”.
O conceito de tradição – na perspectiva para a qual está-se caminhando –
supõe a ideia de alteridade e de diálogo, portanto; bem como o próprio conceito de
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cultura, ou seja, o lugar da falta supõe necessariamente o reconhecimento do outro em sua diferença,
a falta é lugar possibilitador da alteridade e também do diálogo, então. Creio ser graças a ela que
podemos sair de nós mesmos, em gestos de generosidade, compaixão, comiseração, solidariedade e
comunhão pelo outro (outro semelhante, outro natureza, outro cultura, outro universo, outro absolu-
to), bem como de diálogo com esse outro que sempre é diferente e distinto.
A falta, enquanto lugar possibilitador da alteridade e do diálogo, é também lugar de solidão e
de silêncio. Solidão e silêncio são lugares do reconhecimento da “miséria e da indigência ontológica”.
Também a solidão e o silêncio são, epistemologicamente falando, lugares de conhecimento do misté-
rio da realidade do outro enquanto outro e sempre de relação dialógica (cabem aqui todos os níveis de
alteridade; e as ciências e saberes e o modo como se organizam hoje devem reconhecer e aprender a
noção de falta, solidão e silêncio, como lugar-fundante, pois o universo em expansão também é cons-
tituído por esse lugar-fundante).
Falar da cultura, culto e religião como um sistema de proteção, em nenhum momento, supõe o
ter de negar ou descartar o dado da falta. Mesmo em um sistema de proteção, a falta é uma realidade,
ela é real .

“Há sempre uma crença, um mito, um ‘deus’ por trás das criações
culturais da humanidade – sejam elas ilustres ou desconhecidas. E tais
crenças são como o ar que respiramos. A sensação que temos é a de ter de
levá-las para onde quer que andemos...”

Esse sistema complexo de rede de linguagens que possibilita a aproximação do outro funcionou
e funciona como um sistema de proteção. Assim, John Bonker fala que cultura, culto e religião for-
mam o mais antigo sistema de proteção. Prossegue ele dizendo que: “E ele funcionou: aqui estamos
nós; e, sem uma boa proteção no passado, hoje poderíamos estar como os dinossauros ou dodôs –
extintos.”
Por mais que a religião seja um sistema de proteção, ela já também é fundamentalmente – como
também em outras formas simbólicas da cultura (a linguagem, a arte, a história, a ciência, o poder, a
família, as instituições, enfim) –, o lugar da falta. Mais, a religião é o lugar enquanto a ausência do
outro grande absoluto.
A religião é o lugar do deus absconditus (deus oculto).
O deus absconditus é já o próprio mistério. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Religioso assim apresentam esta realidade: “A esse desconhecido que está além-horizonte denomi-
namos mistério.”
Veja, falar que a religião é um complexo sistema simbólico e o lugar, enquanto a ausência do ou-
tro grande absoluto, não é negar a existência desse outro grande absoluto. Não. Mas é falar justamente
que Deus é impossível desde a medida do homem e a medida do mundo. E que o homem e o mundo
são imagens e ao mesmo tempo realidades escondidas também.
A religião, então, mais do que resolver e solucionar, aprofunda e agrava muito mais o mistério
que é Deus, o homem e o próprio mundo. Diante desta perspectiva, não se pode concordar que ela
seja “ópio”, “consolo”, “amuleto” etc. É bem verdade que a religião, bem como os demais sistemas de
linguagem, pode prestar-se à alienação, e a práticas holocáusticas ao longo da história da espécie. Os
exemplos não faltam.

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O Ensino Religioso pluralista deve apresentar uma visão positiva da diversidade religiosa, situ-
ando-a como parte de um contexto democrático, no qual a liberdade de pensamento e de credo pode
se expressar. Nesse sentido, deve estimular o diálogo e a interação entre os alunos de diferentes tradi-
ções religiosas, buscando superar os preconceitos e revelar seus pontos de convergência.
A seguir, uma tentativa de caracterizar a cultura no Oriente e Ocidente, tendo a consciência de
que é uma tentativa, pois o assunto é muito complexo.

Ocidente Oriente
Percebe a realidade como fatos. Percebe os fatos como elementos secundários
dentro da realidade.

Considera o universo a partir dos aspectos Considera o universo a partir dos aspectos
externos. internos.

Precisa do ato de fé para admitir o transcendente. O visível deriva do invisível.

Concebe o transcendente como o altíssimo que Há um princípio que tudo controla a partir de
governa o mundo das alturas, através de leis dentro.
divinas que são repassadas aos homens.

Tem uma visão dualista e mecanicista do mundo, Tem uma visão de mundo orgânica, todos os fatos
do ser humano e da vida. A razão é fonte do percebidos pelos sentidos estão inter-relacionados,
conhecimento; corpo e mente não constituem sendo aspectos diversos de uma mesma realidade.
uma só realidade. O ser humano se percebe O cosmo é uma realidade inseparável, em eterno
como superior à natureza e não como parte dela. movimento, vivo, orgânico, espiritual e material
Reducionismo científico (reduzir o complexo ao mesmo tempo; visão holística (compreender a
para o simples, a fim de poder compreendê-lo – parte a partir do todo).
compreender o todo a partir das partes).

Dificuldade de aceitar, entender e conviver Os contrários, os diferentes se completam e se


com o diferente; os contrários são excludentes. harmonizam.
Padroniza-se tudo e pelos padrões se orienta.

Religiosamente, parte-se da ideia da exterioridade. A interioridade é privilegiada, a solução não


A solução para os problemas virá sempre de fora. está fora, mas dentro do próprio homem: “só
transformamos o que está fora se transformamos o
que está dentro”.

Privilegia-se a razão. Privilegia-se a intuição.

O misticismo está distante da ciência, é visto O misticismo faz parte da vida.


como um conhecimento exótico.

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O fenômeno religioso
Instituição
Indivíduo Grupo Comunidade
Religiosa
Experiência Experiência Experiência Experiência
Espiritual Religiosa Comunitária Institucional

O fenômeno religioso não é redutível nem à Antropologia, nem à Filosofia,


nem à Psicologia. O fenômeno religioso só poderá ser adequadamente entendido
quando for focalizado no seu modo próprio de ser, isto é, na perspectiva religiosa.
É isto exatamente o que pretende fazer a Fenomenologia religiosa.
Estudar o fenômeno religioso é apreender o significado último de suas ma-
nifestações e expressões sensíveis, pois:
o fenômeno religioso é um verdadeiro fenômeno humano, que se traduz
por atitudes e costumes característicos, nos quais podemos observar tan-
to o acontecimento religioso quanto a sua significação religiosa; basta
considerar a sua manifestação mais típica, a oração;
o fenômeno religioso radica-se na própria natureza humana, pelo que é
possível, neste princípio de unidade, chegar à sua própria essência;
o fenômeno religioso é decisivo para o comportamento humano e para a
estruturação da sociedade e, por isso, deve ter um significado próprio e
profundo.

O Ensino Religioso tem no fenômeno religioso o seu objeto de estudo.


E, em sua prática de sala de aula, ele se desenvolve a partir da decodificação
desse fenômeno. Não se trata, portanto, de codificar com os educandos os
elementos constitutivos do fenômeno religioso. Tratar da decodificação do fe-
nômeno religioso é observar como se dá essa busca de transcendência a partir
da experiência que pode ser: espiritual, religiosa, comunitária e institucional.

Uma questão de capital importância é definir quais fenômenos se devem


considerar de ordem religiosa. Sobre esse ponto, não há uma concordância de opi-
niões. Contudo, geralmente admitem-se como essenciais ao fenômeno religioso
os seguintes elementos: um conjunto de crenças e de práticas concernentes a uma
realidade considerada objetiva, de algum modo pessoal, suprema, em relação à
qual o homem professa uma dependência e da qual espera favores e salvação.

“Fenomenologia da Religião é a ciência que, através das formas reli-


giosas, procura decifrar, descrevendo, segundo o método fenomenológico, a
essência da Religião. Assim, é analisado e comparado entre si tudo o que nas
ciências da Religião é apresentado como religioso. Deste estudo comparativo
global surgiu o conceito de sagrado, uma categoria universal, especificativa
do religioso. Lugares, templos, objetos, ritos, palavras serão considerados re-
ligiosos quando sagrados. A interpretação fenomenológica está em certa de-

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pendência de pressupostos filosóficos, não exceptuando a de R. Otto e a de G.


Mensching. Uma reformulação da fenomenologia do religioso foi empreendi-
da por Van Der Leeuw. Muitos fenomenólogos o sucederam no campo da mo-
nografia científica. Modernamente, entre os principais seguidores do método
fenomenológico na investigação religiosa, contam-se F. Heilei, J. Wach, G.
Mensching e M. Eliade.”
(GOMES, F. Soares. Enciclopédia “Verbo”, v. 16. p. 248.)

O Ensino Religioso, tendo como objeto de estudo o fenômeno religioso, bus-


ca compreender o seu significado existencial para as pessoas, grupos e culturas
através da observação objetiva e não da interpretação pessoal e/ou social.

“A fenomenologia da Religião estuda a manifestação dos fatos religio-


sos, estuda a religião como um fenômeno humano. Por isso, é fortemente des-
critiva. Ela não se limita de maneira alguma a ‘fazer uma fotografia’ dos fe-
nômenos religiosos do homem mas, sendo ciência, recolhe neles e com eles as
relações dos vários momentos do fenômeno em si. Ela quer chegar à essência
da religião colhendo a verdade, seja da religião, ou da experiência que o ho-
mem faz. É claro que ela se serve muito da história comparada das religiões,
em cujos confrontos exprime uma reserva sobre a sua pretensa neutralidade.
Para o fenomenólogo da religião, é indispensável uma certa participação com
aqueles que creem.”
(BUCARO, G. Filosofia della religione forme e figure. 3. ed. Roma : Città Nuova, 1992. p. 14.)

Fenômeno é a realidade que a consciência capta nas coisas. Para a Feno-


menologia religiosa, essa realidade é a religião, aqui tratada como Tradição
Religiosa.

Definição de Religião
Do ponto de vista da sociologia, é possível enumerar múltiplas definições do
que é ou de como se apresenta o fato religioso na vida coletiva dos grupos sociais.
A dificuldade começa com a própria palavra religião. Só uma coisa é certa:
vem do latim religio; o resto é discutível.
Cícero utiliza-a como relegere, significando refletir, meditar sobre coisas
importantes, recolher-se e também cumprir escrupulosamente os deveres para
com a autoridade superior.
Lactâncio, por sua vez, a utiliza como religare, tratando-se, então, de uma
relação, um liame com a divindade.
Na China, a religião se diz kiao, isto é, doutrina.
Na Índia, gharma, a imutável ordem cósmica.
Entre os árabes, din, o que é devido.

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Para os germânicos, ê, costume e também lei divina.


Na Bíblia, a palavra religião só foi usada três vezes e, no Novo Testamento,
parte dos cristãos.
Há numerosas observações sobre a definição de religião.
Para Kant, a religião é “o conhecimento de nossos deveres enquanto nos são
impostos pela divindade.”
Para Augusto Comte – pai do Positivismo – “é o culto dos homens.”
Emile Durkheim diz que “a religião é um sistema de crenças e práticas
relativas a coisas sagradas que une, na mesma comunidade moral, todos os que a
ela aderem.”
Rudolf Otto diz que “religião é um deslumbramento diante do sagrado, o
sentimento do misterioso (numinoso).”
E, para Karl Marx, “a religião é o anseio da criatura abatida pela desgraça,
a alma de um mundo sem coração, o espírito de uma época sem espírito. É o ópio
do povo.”

A Regra de Ouro
“O que vós não quereis que vos façam,
não façais aos outros.”
(Jesus Cristo)
“Tudo aquilo, portanto, que quereis que
os outros vos façam, fazei-o vós a eles.”
(Jesus Cristo)
“Não firais aos outros com o que vos
fere.”
(Buda)
“Nenhum de vós sois um crente até devotar pelo
próximo o amor que devotares a vós mesmos.”
(Maomé) “Eis a súmula de todo dever: não façais
aos outros o que, se fosse feito a vós, vos
causaria dor.”

“O que é odioso a vós não o façais aos (Mahabharata, épico hindu)


outros.”
(Hillel, um mestre judeu)

Palavras são para transmitir significados. Importa guardar o significado


para poder vivê-lo.

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A Função da Tradição Religiosa


A passagem do sagrado à tradição religiosa determina as finalidades prin-
cipais da experiência religiosa e da instituição social religiosa. Dentre essas fina-
lidades, destacamos:
proteger os seres humanos contra o medo da natureza, nela encontrando
forças benéficas, contrapostas às maléficas e destruidoras;
dar aos homens um acesso à verdade do mundo, encontrando explicações
para a origem, a forma, a vida e a morte de todos os seres e dos próprios
homens;
oferecer aos homens a esperança de vida após a morte, seja sob a forma
de reencarnação perene, seja sob a forma de reencarnação purificadora,
seja sob a forma de imortalidade individual, que permite o retorno do
homem ao convívio direto com a divindade, seja sob a forma de fusão do
espírito do morto no seio da divindade. As religiões da salvação, tanto as
de tipo judaico-cristão quanto as de tipo oriental, prometem aos homens
libertá-los da pena e da dor da existência terrena;
oferecer consolo aos aflitos, dando-lhes uma explicação para a dor, seja
ela física ou psíquica;
garantir o respeito às normas, às regras e aos valores da moralidade es-
tabelecidos pela sociedade. Em geral, os valores morais são estabeleci-
dos pela própria religião, sob a forma de mandamentos divinos, isto é, a
religião reelabora as relações sociais existentes como regras e normas,
expressões da vontade dos deuses ou de Deus, garantindo a obrigatorie-
dade da obediência a elas, sob pena de sanções sobrenaturais;
em síntese, podemos atualmente atribuir à religião a função de: educar
o ser humano para a vida, dando a ele a capacidade de vivê-la em ple-
nitude a partir do encontro consigo mesmo, com o seu próximo e com
Deus;
proporcionando condições de vida espiritual, eclesial, comunitária e so-
cial;
tirando o homem da barbárie, dando-lhe condições de civilidade.

“Tradição Religiosa é a forma concreta, visível e social de relacionamento


pessoal e comunitário do homem com Deus.”

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Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso apontam, como


centro do fenômeno religioso, as respostas elaboradas pela humanidade para a
vida além-morte, e que são norteadoras do sentido da vida dos fiéis:
a ressurreição;
a reencarnação;
o ancestral;
o nada.
Estas são as respostas mais conhecidas no Brasil para a pergunta feita pe-
rante o limite da morte:
— Para onde vou?
Respostas que são veiculadas por todos os meios de comunicação e no dia a
dia das pessoas. Dessas, um grupo responde: – Morreu, acabou. Não existe nada
além. Outras apresentam a ressurreição, a reencarnação e o ancestral.
Essas respostas dadas pelas Tradições Religiosas exprimem, num conjunto
de gestos e palavras, as atitudes interiores de sua crença que são os ritos de pas-
sagem (cultos como dos ancestrais, das almas, dos crânios, do céu, dos mortos).
Assim, a morte, considerada a última das “passagens”, é também objeto de ritos
cuja complexidade está em estreita relação com a complexidade das crenças que
exprimem.

Ressurreição
Ação de voltar à vida. Deve ser entendida como a sobrevivência do mesmo
sujeito, não precisamente com as mesmas células, as quais se corrompem no se-
pulcro (além do que, durante a vida, elas vão se renovando), de modo que, após
sete ou oito anos, desaparece tudo o que temos como corpo.
A Ressurreição é crença nas Tradições Religiosas:
Judaísmo;
Cristianismo;
Islamismo.

No Judaísmo
A esperança de um ressuscitamento para uma existência de constituição
corporal após a morte constitui uma doutrina central.
Visto que a Antropologia vétero-israelita-hebraica não conhece um dualis-
mo de corpo e alma, mas concebe o ser humano em sua participação em esferas de
vida e de morte, não admira que encontremos afirmações sobre o ressuscitamento
para uma nova vida no contexto de cura, nascimento, crescimento vegetativo ou
reconstituição política do povo.

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A partir de quando essas afirmações, para além de seu sentido literal, têm a
função de interpretações de uma fé na ressurreição é uma questão que dificilmen-
te se pode distinguir em seus pormenores. No confronto em torno da significação
do corpo, fica claro o interesse central dos rabinos pela integridade e pelo caráter
definitivo da responsabilidade humana.
Assim Iehuda Ha-Nasi responde à pergunta se um dia o corpo ou a alma
serão julgados, como na parábola do rei que fez um coxo e um cego vigiarem seu
pomar. Ao ser inquirido a respeito das frutas que haviam sido roubadas durante
a ausência do rei, o coxo respondeu: “Acaso tenho pés com os quais pudesse an-
dar?” Da mesma maneira lhe respondeu o cego: “Acaso tenho olhos com os quais
o pudesse ver?” O que fez o rei então? Colocou o coxo sobre o cego e os julgou
em conjunto. “Assim também o Santo, louvado seja Ele, faz a alma voltar para o
corpo e os julga em conjunto” (bSanh 911a-b).

No Cristianismo
O termo ressurreição, em forma verbal: “ressurgir, ressuscitar, elevar”,
compreende uma matéria à qual se tem um acesso apenas incompleto, com a ex-
pressão ressurreição a partir “de mortos”/“dos mortos”.
Na perspectiva cristã, o enunciado da ressurreição obtém seu significado a
partir da confissão da ressurreição de Jesus.
Na confissão da ressurreição de Jesus, o túmulo vazio não é suficiente, mes-
mo que o consideremos não histórico (Atos dos Apóstolos 2:24-32).
A razão ou base histórica para expressar a confissão deve ter-se refletido
nos assim chamados relatos de aparição (l Carta aos Coríntios 15:5-8; Lucas
24-34; Mateus 28:9s; At 9:1-8) e na fórmula ôphthê neles contida, já que o enun-
ciado da ressurreição significa primeiramente a confissão do Deus que agiu em
Jesus (l Carta aos Coríntios 15:15); a fórmula ôphthê também deveria ser tradu-
zida por “ele (Deus) o (Jesus) fez ser visto”, o que então contém o “fazer-se ver
(de Jesus)”.2

No Islamismo
A fé na ressurreição dos seres humanos para o juízo faz parte dos conteúdos
mais importantes do credo islâmico.
Em muitas passagens, o Corão adverte: Deus “certamente vos congregará
para o dia da ressurreição, do qual não é possível duvidar”. (cf. 4, 87 e, entre ou-
tras, 23,15-16; 6,12.36.38, 2,113; 3,9.25 etc.).
Os teólogos muçulmanos altercaram a respeito da questão se é ressuscitado
só o corpo separado da alma através da morte ou o ser humano todo, que, na opi-
nião de muitos eruditos, compõe-se de um corpo e de uma outra parte material
mais fina (=  alma). Em todo caso, a ressurreição, segundo a opinião corrente, 2 As indicações feitas
abrangerá o corpo e a alma, pois, em sua atuação, a alma depende do corpo, e o são dos textos da Bíblia
(Novo Testamento – parte
ser humano só está completo quando seu corpo e sua alma são reunidos. dos cristãos).

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Reencarnação
Existem duas concepções de reencarnação: a oriental, que prega a evolução
e involução espiritual, e a ocidental (do espiritismo), que prega a evolução como
único caminho de iluminação do espírito.
Podemos definir a reencarnação como crença doutrinal em que todo indiví-
duo possui um elemento, independente de seu ser físico, que, após a morte, pode
renascer em outro corpo, num processo de expiação, evolução e autorredenção.
A doutrina da reencarnação afirma que as vidas do ser humano são como
elos de uma corrente; a cada vez, ele retoma a sua evolução, involução ou estag-
nação, dependendo da medida em que viveu sua vida anterior.
As religiões orientais desenvolveram, em associação com a doutrina da re-
encarnação, a doutrina do carma/karma, que passou a representar um princípio
de retribuição moral com implicações físicas, segundo a qual as ações humanas
acarretam consequências inevitáveis, tanto na ordem moral como física, deter-
minando o ciclo das reencarnações futuras que podem ser tanto evolutivas como
regressivas, vindo o espírito a reencarnar em estado animal ou mesmo mineral.
Concepções de reencarnação, renascimento, transmigração, palingenesia e
metempsicose são encontradas em diversos estágios de reflexão teórica em muitas
culturas (vinculadas a concepções animistas, crenças totêmicas). Foram elabora-
das sistematicamente, principalmente no Hinduísmo, Budismo e na Grécia.
O Espiritismo (religião codificada por Allan Kardec no séc. XIX) não admi-
te a regressão ou involução espiritual. Algumas correntes defendem a estagnação,
outras não admitem nem a estagnação, partindo do argumento de que a vida é
um processo tão dinâmico que dificilmente um espírito encarnado deixaria de
construir algo positivo.
Para o espiritismo, a prática do amor e da caridade são condições essenciais
para o caminho da iluminação.

Ancestral
Crença de que há algo no ser humano que sobrevive à morte. Com essa
crença se associa, em primeiro lugar, a noção de que os mortos considerados
“poderosos” exercem uma influência positiva ou negativa, que deve ser garantida
ou rechaçada com oferendas sacrificiais. Em segundo lugar, a maneira como se
concebe esta sobrevivência determina as respectivas formas de sepultamento ou
conservação do corpo dos mortos.
Devido à crença de que os mortos, e respectivamente suas almas, continuam
vivos e influenciam o destino dos vivos (dando proteção aos familiares, promo-
vendo ações de vingança contra os inimigos), os mortos são enterrados com as
mais diversas oferendas de sepultamento: recursos de que necessitam para em-
preender a difícil viagem para o além, repleta de perigos até o local de descanso
definitivo, onde serão assumidos pela entidade maior.

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Nas tradições religiosas de matriz indígena e africana, o fiel está convicto


de que os ancestrais beneficentes e tementes a Deus estão especificamente incum-
bidos de cuidar da vida de seus descendentes. Por outro lado, os antepassados
sobrevivem nestes, de modo que a felicidade no além não vigora sem que haja
coparticipação na comunhão terrena. Por isso, os vivos têm de manter viva a me-
mória de seus ancestrais por meio de orações, refeições e oferendas especiais.
“É por uma religião que o ser humano se define no mundo e para com seus
semelhantes. É a religião que empresta um sentido e constitui para seus fiéis uma
fonte real de informações. Ela funciona como um modelo para o mundo e, ao
mesmo tempo, como modelo do mundo. Ela é, pois, para seus crentes, modelo de
ações e de explicação, porque fornece uma resposta às três ameaças que pesam
sobre toda a vida humana: o sofrimento, a ignorância e a injustiça.”
(MESLIN, M. A Experiência Humana do Divino:
fundamentos de uma antropologia religiosa. Petrópolis: Vozes, 1992. p. 21.)

Você sabia que:


religião (aqui sempre entendida como Tradição Religiosa) é um ter-
mo ausente em muitas línguas e dialetos?
muitos povos, cuja cultura manifesta um sentido real do sagrado e
que, em sua vida diária, recorrem a numerosas práticas culturais e
rituais, ignoram o conceito de religião?
a palavra religião vem do termo religio, da língua latina?
religião, em latim religio, é um termo que, entre os romanos, signi-
ficava: conjunto de crenças e práticas tradicionais, próprias de uma
cultura, de uma sociedade humana particular que assim honra seus
deuses?
religio (religião) deu origem aos verbos: reeligere (reeleger uma ver-
dade para a vida); reeligare (religar a pessoa a si mesma, aos outros,
ao mundo e ao transcendente, Deus); relegere (reler o fenômeno
religioso)?
pela concepção de Ensino Religioso, são veiculados esses três senti-
dos de religião:
reeleger: sempre que se trabalha a partir dos ensinamentos de
apenas uma denominação religiosa como verdade única;
religare: sempre que se desenvolve a vivência religiosa do valor
antropológico de relacionamento consigo mesmo, com os outros,
com o mundo (natureza) e com o absoluto (Deus);
relegere: é a forma prevista pelo art. 33 da LDBEN 9.394/96 que
atende à diversidade cultural-religiosa do Brasil?

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Que tal você elaborar um glossário com a explicação de temas cujos conceitos foram aqui tra-
tados, como:
conhecimento teológico;
cultura;
tradição religiosa;
ressurreição;
ancestralidade;
conhecimento religioso;
religião;
fenômeno religioso;
reencarnação;
religiosidade;
e outras que para você são novidades?

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Religiosidade
Tradução prática da atitude religiosa. A atitude é o fundo religioso da pes-
soa; a religiosidade é a expressão dessa atitude, que sempre está também condicio-
nada por fatores externos, como o caráter pessoal e o meio cultural.

Religiosidade horizontal
Conceito que indica um relacionamento indireto e mediato com Deus e o
mundo sobrenatural, onde predominam os aspectos político e racional: político,
porque a fé exige uma atitude de engajamento e compromisso com relação à his-
tória dos homens; racional, porque todo comportamento religioso passa por um
processo de racionalização ou conscientização, não se impondo mais a lei pela lei
ou a tradição pela tradição. O comportamento do fiel nesta religiosidade é o de
uma consciência histórica, comunitária e positiva.

Religiosidade vertical
Conceito que indica um relacionamento direto e imediato com Deus e com
o mundo sobrenatural. São três os seus aspectos predominantes:
milagreiro – porque visa primordialmente à obtenção de graças ou mila-
gres, mediante a apresentação de alguma dádiva pessoal;
pietista – porque busca a santificação pessoal da vida mediante a ob-
servância fiel dos ritos e das devoções tradicionais, prescritos pela pie-
dade;
penitente – porque a vida religiosa requer ascese e penitência, não per-
mitindo qualquer mácula da parte do mundo sujo ou mundano. O com-
portamento do fiel, nesta religiosidade, é passivo, individualista e nega-
tivista.

Religiosidade popular
Forma cultural que um povo adota em relação a uma religião. Ela é vivida
de preferência pelas camadas mais simples do povo. Os valores da religiosidade
popular possuem capacidade de responder às grandes interrogações da existência
humana e de poder sintetizar o divino e o humano, comunhão e instituição, pessoa
e comunidade, fé e pátria, inteligência e afeto. Esta religiosidade se expressa em
forma de festas e romarias, numa piedade popular dependente de Deus e do culto
aos santos.
A religiosidade popular se manifesta, geralmente, de maneira indiferente
e passiva diante de problemas públicos e da ordem social. Ela se retrai dentro do
recinto sagrado da pessoa e ou dos santuários, sem conseguir encarnar-se na vida
pública de cada dia. É desta religiosidade que derivam as devoções – rosário, no-
venas, peregrinações, celebrações sacramentais etc.
Esta religiosidade (se não for devidamente trabalhada pelo credo) não pro-
porciona a verdadeira adesão de fé, podendo facilmente transformar-se em novas
superstições e até seitas.
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Religiosidade ontográfica
Tipo de religiosidade popular, que busca intermediários bem acessíveis e sensíveis para mante-
rem relacionamento com o sobrenatural. Recorre ao uso de imagens, medalhas, rosários, patuás, ben-
tinhos e fitas. É assídua à prática das benzeções. Defende-se, com ritos, contra doenças, quebranto,
macumba, feitiço, mau-olhado e outras superstições. Reza orações fortes contra os inimigos. Cumpre
promessas e mantém certo relacionamento temeroso com as almas do além, num misto de respeito
e piedade.

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