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A análise da performance nos jogos desportivos.

Revisão acerca da análise do jogo


Júlio Garganta
Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física,
Universidade do Porto

1. INTRODUÇÃO Neste quadro de problemas, os investigadores têm


O estudo do jogo a partir da observação do procurado esclarecimentos acerca da performance
comportamento dos jogadores e das equipas não é diferencial dos jogadores e das equipas (Janeira,
recente, tendo emergido a par com os imperativos da 1998), na tentativa de identificarem os factores que
especialização, no âmbito da prestação desportiva. condicionam significativamente o rendimento
Na literatura, as áreas de produção de estudos desportivo e, sobretudo a forma como eles se
realizados neste âmbito são referenciadas a partir de entrecruzam para induzirem eficácia.
diferentes denominações, de entre as quais se Em síntese, pode dizer-se que a análise da
destacam: observação do jogo (game observation), performance nos jogos desportivos tem possibilitado:
análise do jogo (match analysis) e análise notacional
(notational analysis). Todavia, a expressão mais 1) configurar modelos da actividade dos jogadores e
utilizada na literatura é análise do jogo (Garganta, das equipas;
1997) considerando-se que engloba diferentes fases 2) identificar os traços da actividade cuja presença/
do processo, nomeadamente a observação dos ausência se correlaciona com a eficácia de
acontecimentos, a notação dos dados e a sua processos e a obtenção de resultados positivos;
interpretação (Franks & Goodman, 1986; Hughes, 3) promover o desenvolvimento de métodos de
1996). treino que garantam uma maior especificidade e,
Dispondo hoje em dia de uma vasta gama de meios e portanto, superior transferibilidade;
métodos, aperfeiçoados ao longo dos anos, 4) indiciar tendências evolutivas das diferentes
treinadores e investigadores procuram aceder à modalidades desportivas.
informação veiculada através da análise do jogo e
nela procuram benefícios para aumentarem os 2. ESTADO DA ARTE
conhecimentos acerca do jogo e melhorarem a Dos anos trinta até aos nossos dias, aumentou
qualidade da prestação desportiva dos jogadores e consideravelmente o volume de estudos de âmbito
das equipas. científico realizados através do recurso à observação
A informação recolhida a partir da análise do e análise do jogo.
comportamento dos atletas em contextos naturais No Quadro 1 pode observar-se a referência a cerca
(treino e competição) é actualmente considerada uma de centena e meia de trabalhos realizados com
das variáveis que mais afectam a aprendizagem e a recurso à análise do jogo, provenientes de diferentes
eficácia da acção desportiva (Hughes & Franks, quadrantes geográficos e contemplando diversos
1997). Por isso, o conhecimento acerca da proficiência jogos desportivos. Diga-se que nele apenas estão
com que os jogadores e as equipas realizam as inventariados alguns estudos e que, numa busca
diferentes tarefas tem-se revelado fundamental para mais exaustiva, seria possível duplicarmos, em
aferir a congruência da sua prestação em relação aos número, os aqui receberam menção, facto que nos
modelos de jogo e de treino preconizados. permite perceber a enorme expressão que a análise

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do jogo tem vindo a assumir no quadro da Ohashi et al. (Japão) Futebol


Olsen (Noruega) Futebol
investigação aplicada aos jogos desportivos. Pollard et al. (Inglaterra) Futebol
Esta constatação é extensiva para o âmbito das Rhode & Espersen (Dinamarca) Futebol
actividades académicas, e pode ser atestada pelo Van Gool et al. (Bélgica) Futebol
1989 Aguado & Riera (Espanha) Polo Aquático
número considerável de teses de mestrado e de Alexander & Boreskie (EUA) Andebol
doutoramento, surgidas sobretudo a partir de 1993, Dufour (Bélgica) Futebol
nas quais os respectivos autores recorreram à análise Gréhaigne (França) Futebol (PhD)
1990 Ali & Farrally (Inglaterra) Futebol
do jogo, enquanto instrumento fundamental. Greco e Vieira (Brasil) Andebol
O interesse verificado neste domínio tem-se ainda Marques (Portugal) Basquetebol (MSci)
ampliado para outros territórios, dos quais o exemplo 1991 Grosgeorge et al. (França) Basquetebol
Mombaerts (França) Futebol
mais flagrante é a comunicação social, cujos órgãos Partridge & Franks (Canadá) Futebol
vêm difundindo, com insistência, alguns indicadores Reilly et al. (Inglaterra) Futebol
quantitativos, disponibilizando cifras sobre os eventos 1992 Castelo (Portugal) Futebol (PhD)
D´ Ottavio & Tranquilli (Itália) Futebol
do jogo e dando forma ao que alguém, curiosamente, Doggart et al. (País de Gales) Futebol Gaélico
já chamou de “estatística popular”. Eom & Schutz (Canadá) Voleibol
Erdman & Dargiewicz (Polónia) Andebol
Quadro 1 - Alguns estudos de análise do jogo, realizados no âmbito do Handford & Smith (Voleibol) Voleibol
treino e da competição nos JD, nos últimos setenta anos (1930 a 2000). Loy (Alemanha) Futebol
Smith & Hughes (País de Gales) Polo Aquático
DATA AUTOR/PAÍS MODALIDADE Stanhope & Hughes (P. Gales) Raguebi
Wilkins et al. (Canadá) Hóquei sobre o gelo
1931 Messersmith & Corey (EUA) Basquetebol Winkler (Alemanha) Futebol
1932 Messersmith & Fay (EUA) Futebol Americano 1993 Anton & Romance (França) Andebol
1938 Fay & Messersmith (EUA) Basquetebol Bishovets et al. (Rússia) Futebol
1939 Messersmith & Bucher (EUA) Basquetebol Claudino (Portugal) Futebol (MSci)
1940 Messersmith et al. (EUA) Basquetebol Gerish & Reichelt (Alemanha) Futebol
1942 Messersmith (EUA) Basquetebol Jinshan et al. (Japão) Futebol
1944 Messersmith (EUA) Basquetebol (PhD) Luhtanen (Finlândia) Futebol
1952 Winterbottom (Inglaterra) Futebol Moutinho (Portugal) Voleibol (MSci)
1968 Reep & Benjamin (Inglaterra) Futebol Rebelo (Portugal) Futebol (MSci)
1976 Reilly & Thomas (Inglaterra) Futebol Yamanaka et al. (Japão) Futebol
1977 Sanderson & Way (Inglaterra) Squash 1994 Czerwinski (Polónia) Andebol
Schutz & Kinsey (Inglaterra) Squash Janeira (Portugal) Basquetebol
1980 Gayoso (Espanha) Futebol Lloret (Espanha) Polo Aquático (PhD)
Hughes (País de Gales) Squash Lothian & Farraly (Inglaterra) Hóquei em Campo
1981 Wrzos (Polónia) Futebol McGarry & Franks (Canadá) Squash
1982 Withers et al. (Austrália) Futebol Sarmento (Portugal) Polo Aquático (PhD)
1983 Franks et al. (Canadá) Futebol 1995 Bacconi & Marella (Itália) Futebol
1984 Espeçado & Cruz (Espanha) Andebol Barreto (Portugal) Basquetebol (PhD)
Hart (Canadá) Polo Aquático Bezerra (Portugal) Futebol (MSci)
1985 Mayhew & Wenger (Canadá) Futebol Fröner (Alemanha) Voleibol
Penner (Alemanha) Voleibol Luhtanen et al. (Finlândia) Futebol
Talaga (Hungria) Futebol Melli (Itália) Futebol
Van Gool & Tilborgh (Bélgica) Futebol Richers (Inglaterra) Ténis
1986 Church & Hughes (Inglaterra) Futebol Silva (Portugal) Futebol
Hughes & Billingham (P. Gales) Hóquei em Campo 1996 Borges (Portugal) Andebol (MSci)
Hughes & Feery (País de Gales) Basquetebol Garbarino (França) Futebol (PhD)
1987 Hernandez Moreno (Espanha) Basquetebol (PhD) Garganta & Gonçalves (Portugal) Futebol
Martins (Portugal) Hóquei em Patins Hernandez Mendo (Espanha) Vários (PhD)
Sledziewski (Polónia) Futebol Larson et al. (Noruega) Futebol
1988 Ali (Inglaterra) Futebol Liddle et al. (Inglaterra) Badminton
Bangsbo & Mizuno (Dinamarca) Futebol Loy (Alemanha) Futebol
Chervenjakov et al. (Bulgária) Futebol Mendes (Portugal) Basquetebol (MSci)
Docherty et al. (Canadá) Raguebi Oliveira (Portugal) Andebol (MSci)
Hughes & Charlish (P. Gales) Futebol Americano Safon-Tria (Espanha) Futebol
Luhtanen (Finlândia) Futebol Sampedro (Espanha) Futsal (PhD)
McKenna et al. (Austrália) Futebol Australiano 1997 Garganta (Portugal) Futebol (PhD)

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Garganta et al. (Portugal) Futebol distâncias percorridas.


Kingman & Dyson (Inglaterra) Hóquei em Patins
Maçãs (Portugal) Futebol (MSci)
Um dos primeiros, senão o primeiro, dos estudos
Olsen & Larsen (Noruega) Futebol que se conhecem no âmbito da análise do jogo nos
Sampaio (Portugal) Basquetebol (MSci) JD, foi realizado pelo norte-americano Lloyd Lowell
Vaslin et al. (França) Voleibol
Verlinden (Bélgica) Futebol
Messersmith, com a colaboração de S. Corey, em
Xie (China) Basquetebol 1931 (Messersmiyh & Corey, 1931), no qual os
1998 Araújo (Portugal) Futebol (MSci) autores dão a conhecer um método para determinar
Ardá (Espanha) Futebol (PhD)
Ferreira da Silva (Portugal) Futebol (MSci)
as distâncias percorridas por um jogador de
Leitão (Portugal) Andebol (MSci) Basquetebol. No ano seguinte surge um outro
Silva (Portugal) Futebol (MSci) estudo, também liderado por Messersmith, com a
Vales (Espanha) Futebol (PhD)
1999 Barbosa (Portugal) Andebol (MSci)
colaboração de Fay (Messersmith & Fay, 1932), no
D´Ottavio & Castagna (Itália) Futebol qual os autores aplicam o método já desenvolvido
Fonseca (Portugal) Andebol (MSci) para o Basquetebol, para determinar a distância
Gorospe (Espanha) Ténis (PhD)
McGarry et al. (Canadá) Squash
percorrida por jogadores de Futebol Americano.
Mortágua (Portugal) Andebol (MSci) Refira-se, a título de exemplo, que entre 1930 e
Neves da Silva (Portugal) Futebol (MSci) 1944 podemos encontrar mais de uma dezena de
Santos (Portugal) Andebol (MSci)
2000 Argudo (Espanha) Polo Aquático (PhD)
estudos, realizados nos Estados Unidos da
Castellano (Espanha) Basquetebol (PhD) América, orientados para a determinação das
Hernandez Mendo & Anguera distâncias percorridas por jogadores de Basquetebol
(Espanha) Hóquei em Patins
Lago (Espanha) Vários (PhD)
(Lyons, 1998).
McErlean et al. (Irlanda) Futebol Gaélico O direccionamento das linhas de investigação foi
Moutinho (Portugal) Voleibol (PhD) ampliando o seu campo de análise, evoluindo para a
Ortega (Espanha) Futebol
Silva (Portugal) Andebol (MSci)
denominada análise do tempo-movimento, através
Sousa (Portugal) Voleibol (MSci) da qual se procura identificar, detalhadamente, o
número, tipo e frequência das tarefas motoras
MSci – Dissertações de Mestrado; realizadas pelos jogadores ao longo do jogo.
PhD – Dissertações de Doutoramento Para além do paradigmático trabalho de Reilly &
Thomas (1976), levado a cabo no âmbito do Futebol,
Partindo do princípio que as incidências do jogo outros estudos têm sido realizados nesta
obedecem a uma lógica interna particular modalidade, e.g. Withers et al. (1982), Mayhew &
(Teodorescu, 1985; Hernandez-Pérez, 1994; Garganta, Wenger (1985), Ohashi et al. (1988), D´Ottavio
1997), vários autores têm procurado perceber os &Tranquilli, 1992) e Rebelo (1993).
constrangimentos que caracterizam os diferentes JD, Na mesma linha, várias pesquisas vêm sendo
no sentido de modelar um quadro de exigências que realizadas no Andebol (Alexander & Boreskie,
se constitua como referência fundamental para o 1989; Borges, 1996), no Badminton (Liddle et al.,
treino (Reep & Benjamin, 1968; Gréhaigne, 1989; 1996), no Basquetebol (Janeira, 1994; Sampaio,
Dufour & Verlinden, 1994; Garganta, 1997; McGarry 1997), no Hóquei em Campo (Lothian & Farraly,
et al., 1999; Castellano, 2000; Moutinho, 2000). 1994), no Hóquei no Gelo (Wilkins et al., 1992),
Do conteúdo da literatura, ressalta que os no Raguebi (Docherty et al., 1988) e no Ténis
investigadores têm recorrido a diversas categorias de (Richers, 1995), entre outras.
observação e a distintos níveis de análise. Com o A análise das habilidades técnicas tem sido outro
intuito de proceder à caracterização da actividade dos campos explorados na análise do jogo (Dufour,
desenvolvida pelos jogadores e as equipas durante as 1989; Partridge, & Franks, 1991; Mesquita, 1998;
partidas, os especialistas focalizaram, inicialmente, Hoff & Haaland, 1999).
os seus estudos na actividade física imposta aos Contudo, a inépcia das conclusões decorrentes dos
jogadores, nomeadamente no que respeita às resultados provenientes de estudos quantitativos,
centrados nas acções técnicas individuais, levaram

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os analistas a questionar a pouca relevância jogo mais representativas, ou críticas, com o intuito
contextual dos dados recolhidos e a duvidar da sua de perceber os factores que induzem perturbação ou
pertinência e utilidade. desequilíbrio no balanço ataque/defesa. Neste
Esta questão fez sobressair a necessidade de se sentido, os analistas procuram detectar e interpretar
considerar a dimensão técnica em relação com os a permanência e/ou ausência de traços
condicionalismos tácticos, já que aquela não pode comportamentais na variabilidade de acções de jogo
perfilar per se os traços dominantes do jogo (McGarry & Franks, 1996).
(Gréhaigne, 1989; Dufour, 1993; Garganta, 1997).
A consciência de que a expressão táctica assume 3. EVOLUÇÃO METODOLÓGICA
uma importância capital nos JD, fez com que a partir E INSTRUMENTAL DA ANÁLISE DO JOGO
da segunda metade da década de oitenta, a O processo de recolha, colecção, tratamento e
identificação de regularidades reveladas pelos análise dos dados obtidos a partir da observação do
jogadores e pelas equipas, no quadro das acções jogo, assume-se como um aspecto cada vez mais
colectivas, tivesse despontado enquanto nova importante na procura da optimização do
tendência de investigação (Gréhaigne, 1989; Lloret, rendimento dos jogadores e das equipas. Neste
1994; Hernandez Mendo, 1996; Garganta, 1997) sentido, através dos denominados sistemas de
Neste âmbito, os analistas têm procurado coligir e observação, os especialistas procuram desenvolver
confrontar dados relativos aos comportamentos instrumentos e métodos que lhes permitam reunir
expressos no jogo, no sentido de tipificarem as informação substantiva sobre as partidas.
acções que se associam à eficácia dos jogadores e das O processo de observação e análise do jogo tem
equipas. Esta procura aponta três vias preferenciais: experimentado uma evolução evidente ao nível dos
sistemas utilizados, a qual se tem processado por
1) uma que consiste em reunir e caracterizar blocos etapas, em cada uma das quais o sistema
quantitativos de dados; desenvolvido surge no sentido de aperfeiçoar os
2) outra mais centrada na dimensão qualitativa dos precedentes.
comportamentos, e na qual o aspecto quantitativo Nos primórdios as observações realizavam-se ao
funciona como suporte à caracterização das acções, vivo, eram assistemáticas e subjectivas,
de acordo com a efectividade destas no jogo; impressionistas. Os registos dos comportamentos
3) uma terceira, voltada para a modelação do jogo, a dos atletas e das equipas eram realizados a partir da
partir da observação de variáveis técnicas e técnica denominada “papel e lápis”, com recurso à
tácticas e da análise da sua covariação. notação manual.
Embora esta fase inicial se tivesse pautado por um
Sabe-se que as equipas podem variar os seu padrões forte pendor acumulacionista, à vontade de coligir
de jogo de acordo com as características da oposição uma enorme quantidade de dados parciais, sucedeu a
oferecida pelo adversário (Hughes, 1996). Todavia, de elaborar instrumentos de observação. Mais
poucos investigadores têm tomado em conta este recentemente, a profissionalização das práticas de alta
aspecto (Gréhaigne, 1989; Garganta, 1997). competição, os meios financeiros disponíveis e a
A necessidade de interpretar os dados recolhidos em utilização do desporto como terreno de aplicação da
função das características específicas das partidas, tecnologia suscitaram novas investigações, o que
tem levado os analistas a focalizarem cada vez mais a conduziu a que a informática, ao substituir as técnicas
sua atenção na relevância contextual dos manuais, tenha permitido uma maior e mais rápida
comportamentos dos participantes, o que justifica o recolha de informação, bem como um acesso mais
estudo da organização do jogo das equipas em rápido aos dados disponíveis (Grosgeorge, 1990).
confronto (Hughes et al., 1988; Gréhaigne, 1989; Na medida em que as técnicas e os sistemas de
Gréhaigne & Bouthier, 1994; Garganta, 1997). observação diferem segundo as disciplinas
Uma das tendências que se perfilam prende-se com a desportivas (Franks & Goodman, 1986; Dufour,
detecção de padrões de jogo, a partir das acções de 1989; Grosgeorge et al., 1991), para analisar os

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comportamentos nos JD torna-se necessário


desenvolver métodos de recolha e de análise Quando se utilizam computadores, as categorias e os
específicos. indicadores seleccionados para a entrada de
Com o advento dos meios informáticos, os analistas informação, ou input, procuram responder a quatro
do jogo têm assistido ao alargamento progressivo do questões:
espectro de possibilidades instrumentais colocadas à
sua disposição. Nos anos mais recentes tem-se (i) quem executa a acção?
verificado uma aposta clara na utilização de ii) qual - como e de que tipo - é a acção realizada?
metodologias com recurso a instrumentos cada vez (iii) onde se realiza a acção?
mais sofisticados, e.g. a análise do jogo apoiada por (iv) quando é realizada a acção?
computador, os quais pelas suas elevadas
capacidades de registo e memorização tendem a O teclado convencional do computador (QWERTY)
constituir-se como um equipamento importante para raramente preenche os requisitos necessários a um
o treinador e para o investigador (Franks, 1987; rápido e eficaz input dos dados. Por isso, em
Grosgeorge, 1990; Dufour, 1993). alternativa, tem sido substituído por teclados
Duma forma sintética é possível estabelecer uma especialmente concebidos, onde figuram as
cronologia relativa ao desenvolvimento de tais meios: categorias - concept keyboard (Church & Hughes,
1986) e por uma mesa de digitalização - digital panel,
1. Sistemas de notação manual com recurso à na qual se assinala a espacialização das acções
designada técnica de papel e lápis (Reep & (Dufour, 1991). Nalguns sistemas, mesa de
Benjamin, 1968). digitalização e teclado constituem uma única peça
2. Combinação de notação manual com relato oral informática denominada touchpad (Hughes et al.,
para ditafone (Reilly & Thomas, 1976). 1988; Partridge et al., 1993). Noutros, as células
3. Utilização do computador a posteriori da com as categorias a digitar figuram directamente
observação, para registo, armazenamento e sobre a representação gráfica do terreno de jogo.
tratamento dos dados (Ali, 1988). Este tipo de aparelho designa-se por playpad
4. Utilização do computador para registo dos dados (Partridge & Franks, 1989).
em simultâneo com a observação, em directo ou
em diferido (Dufour, 1989). 4. TENDÊNCIAS DA ANÁLISE DO JOGO
5. A introdução de dados no computador através do Nos últimos anos tem-se assistido a uma
reconhecimento de categorias veiculadas pela voz proliferação de alternativas para analisar a prestação
(voice-over) é um sistema que tem vindo a ser dos desportistas e das equipas, consubstanciada na
desenvolvido (Taylor & Hughes, 1988) e que, disparidade de indicadores e de procedimentos
segundo Hughes (1993), no futuro poderá facilitar adoptados para tal efeito.
a recolha de dados, mesmo a não especialistas. A Nos estudos produzidos no âmbito da análise dos
utilização do CD-Rom, para aumentar a JD, constata-se que os autores vêm recorrendo a
capacidade de memória para armazenamento dos metodologias diversas, como a análise sequencial
dados, é outra das possibilidades a explorar (Hernandéz Mendo, 1996; Ardá, 1998), a análise de
(Hughes, 1996). unidades tácticas e de clusters (Garganta, 1997;
6. O sistema mais evoluído que se conhece dá pelo Sousa, 2000), a análise de coordenadas polares
nome de AMISCO e permite digitalizar semi- (Gorospe, 1999) e o estudo das unidades de
automaticamente as acções realizadas pelos competição (Alvaro et al., 1995).
jogadores e pelas equipas, seguindo o jogo em Cada vez mais se procura, a partir da análise de bases
tempo real e visualizando todo o terreno de jogo. de dados, configurar modelos de jogo (Bishovets et
Com base na utilização de 8, 10 ou 12 cameras al., 1993; McGarry & Franks, 1995a) que permitam
fixas é possível monitorizar e registar toda a definir asserções preditivas acerca da táctica eficaz -
actividade dos jogadores.

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winning tactic (McGarry & Franks, 1995b). (categorias e indicadores) e da sua reformulação.
Todavia, este entendimento tem gerado alguma Nesta medida, os sistemas devem ter a abertura
controvérsia, questionando-se os métodos estatísticos suficiente para permitirem, sempre que necessário,
utilizados (Hughes, 1996) e a sua aplicabilidade face à uma reformulação de categorias e indicadores, no
aleatoriedade e imprevisibilidade dos sentido de garantir o seu permanente
comportamentos que caracterizam os JD. Deste aperfeiçoamento e adequação.
modo, alguns investigadores têm vindo a abandonar
os modelos estocásticos, em que se utiliza o qui- 4.1. Dados ou informação?
quadrado enquanto teste estatístico (Kenyon & Na sua essência, o processo de treino visa induzir
Schutz, 1970), em favor dos modelos log-lineares modificações observáveis no comportamento dos
(Eom & Schutz, 1992). praticantes (Hughes & Franks, 1997), no sentido em
Diga-se, contudo, que os problemas relacionados que as mesmas adquiram o máximo de transfere
com a modelação do jogo transcendem largamente a positivo para os contextos de competição.
questão dos métodos estatísticos. Como evidencia O jogo, enquanto confronto de duas entidades, com
Dufour (1991), as dificuldades encontradas na objectivos antagónicos, emerge do entrelaçamento
definição de categorias de observação, bem como na das acções desenvolvidas pelos jogadores/equipas. A
construção de um algoritmo adequado, têm maior ou menor adequação de uma determinada
entravado um melhor entendimento do jogo, acção face ao contexto que a suscita, decorre de
dificultando uma célere evolução dos JD. lógicas intimamente ligadas à forma como os actores
Ao nível do entendimento da organização do jogo, (jogadores) apreendem as linhas de força do jogo e
gerou-se, durante alguns anos, um impasse ao nível de conhecimento táctico (declarativo e
metodológico importante, devido ao recurso a processual) que os mesmos denotam.
métodos exclusivamente algorítmicos, em detrimento Não é de admirar, portanto, que a solução
de métodos heurísticos (Gréhaigne, 1989). encontrada por um jogador, para resolver uma
Nos JD, o algoritmo, para ser exaustivo, deveria ter situação de jogo, comporte quase sempre uma
em conta todas as alternativas possíveis, o que colide margem considerável de subjectividade. Esta é
com a natureza das numerosas e diversas situações extensiva a todos os observadores e aumenta com o
que ocorrem num jogo. Neste sentido, os número e a variabilidade dos eventos de jogo, pelo
procedimentos heurísticos, porque não preconizam que a análise sistemática do jogo apenas é fiável se
uma tal exaustividade, parecem revelar-se mais os seus propósitos estiverem claramente definidos.
apropriados ao carácter não totalmente previsível do Não obstante a análise do jogo possa disponibilizar
jogo (Gréhaigne, 1992). informação importante, permanece ainda uma certa
No entanto, ambos os procedimentos, algorítmicos e resistência à sua utilização, baseada na visão
heurísticos, são importantes na codificação e tradicional de que os treinadores experientes podem
interpretação das acções realizadas pelos jogadores e observar um jogo sem qualquer sistema de apoio à
pelas equipas (Garganta, 1997). O problema coloca- observação, e que retêm com precisão os elementos
se, sobretudo, ao nível da sua complementaridade e críticos do jogo (Franks & McGarry 1996).
compatibilização. Estudos realizados pelos canadianos Franks &
Os procedimentos algorítmicos, porque comportam Miller, em 1986, demonstraram que treinadores de
a identificação dos estados cruciais para a selecção Futebol, quando instados a descrever os
das operações, são úteis na sistematização e acontecimentos ocorridos em 45 minutos de uma
ordenamento dos descritores, desde que não partida de Futebol obtiveram valores inferiores a
provoquem um “fechamento” do sistema de 45% de respostas certas.
observação. Os procedimentos heurísticos, porque Em 1993, Franks realizou um estudo em que
relacionados com os atributos do pensamento comparou a apreciação de treinadores experientes
criador e da descoberta, revelam-se importantes nas com treinadores principiantes, face à performance
fases de selecção dos descritores das acções de jogo realizada por atletas. Os treinadores experientes

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produziram mais falsas respostas do que os novatos jogo a partir das características das sequências de
e detectaram diferenças onde elas não existiam. Para acções (unidades tácticas) das equipas em confronto;
além disso, mostraram-se mais confiantes, mesmo (2) os tipos de sequências que geram acções
quando errados nas suas apreciações. positivas; (3) as situações que induzam ruptura ou
Estes estudos atestam que a observação é tão perturbação no balanço ofensivo e defensivo das
necessária quanto falível, tornando-se equipas que se defrontam; (4) as quantidades da
imprescindível conhecer o seu alcance e os seus qualidade das acções de jogo.
limites. Comprovam também que a memória
humana é limitada, sendo praticamente impossível 4.2. Encontrar primeiro; procurar depois!
relembrar todos os acontecimentos que ocorrem No domínio particular da análise do jogo, tem-se
durante uma partida (Hughes & Franks, 1997) e verificado que, não raramente, os sistemas de
menos ainda as ocorrências de vários jogos, ao longo observação e registo perdem eficácia pelo facto do
de um ou vários campeonatos. caudal de dados obtido se afigurar confuso (Gerish
Sabendo-se que o processamento da informação & Reichelt, 1993), porquanto constitui material
visual é extremamente complexo e que os disperso e retalhado. Quer isto dizer que, não
treinadores estão submetidos à forte pressão das obstante o recurso a meios sofisticados, a
emoções e à parcialidade, como alternativa à proliferação de bases de dados não garante, por si só,
observação casual e subjectiva, tem-se sugerido e o acesso a informação pertinente para treinadores e
utilizado a observação sistemática e objectiva, a qual investigadores. Para contornar este problema torna-
tem permitido recolher um número significativo de se imprescindível dar um sentido ao dados
dados sobre o jogo, nomeadamente através de recolhidos, explorando-os de forma a garantirem o
sistemas computadorizados. acesso à informação considerada importante
Mas, há que estar atento ao objectivo paradoxal que (Garganta, 1997).
aqui se perfila, pois trata-se de objectivar a Assim, a viabilização duma observação e análise do
subjectividade. A intenção última é identificar os jogo ajustadas impõe, para além dos instrumentos
elementos críticos do sucesso na prestação tecnológicos, a definição clara de instrumentos
desportiva, traduzindo “dados” em informação conceptuais (modelos) que balizem a elaboração e
fiável e útil. aplicação de metodologias congruentes com a
Percorrendo vários estudos que se debruçam sobre a natureza do jogo (Pinto & Garganta, 1989).
observação e análise do jogo nos JD, verifica-se que Habitualmente diz-se que para encontrar algo, há
os sistemas de observação utilizados têm que procurá-lo. No contexto da observação e análise
privilegiado, na sua maioria, a análise do jogo, a lógica é inversa, ou seja, primeiro
descontextualizada das acções do jogador, o produto encontra-se (configura-se) as categorias e os
das acções ou comportamentos, a dimensão indicadores e só depois se procura e se afere as suas
quantitativa das acções e as situações que originam formas de expressão no jogo. Apenas deste modo os
golo ou ponto. sistemas computadorizados podem constituir-se
Para treinadores e investigadores, as análises que como aliados na resolução eficaz de problemas.
salientam o comportamento da equipa e dos As condições instáveis e aleatórias em que ocorrem
jogadores, através da identificação das regularidades os JD, embora confiram originalidade e interesse às
e variações das acções de jogo, afiguram-se situações, tornam mais delicada a tarefa do
claramente mais profícuas do que a exaustividade de observador e do experimentador.
elementos quantitativos, relativos a acções Nos desportos individuais, desde há muito que a
individuais e não contextualizadas. observação incide preferencialmente nos aspectos
Face às necessidades e particularidades dos JD, técnicos da execução. Nestas modalidades, as
justifica-se a construção de sistemas elaborados a análises biomecânicas podem bastar para informar
partir de categorias integrativas, configuradas para com exactidão sobre o comportamento do atleta e,
caracterizar (Garganta, 1997): (1) a organização do assim, fornecer dados suficientes que permitam

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JÚLIO GARGANTA

estabelecer um plano de treino ou detectar talentos. qualidade e a celeridade do processo de observação e


Pelo contrário, nos JD as capacidades dos atletas são análise desde de que dela se faça o uso adequado.
condicionadas fundamentalmente pelas imposições Não desdenhando do progresso, entendemos que o
do meio, isto é, pelas sucessivas configurações que o frenesim da sofisticação tecnológica, não raramente
jogo vai experimentando e, por tal motivo, a com objectivos de marketing científico, pode conduzir
observação de todos os jogadores em movimento a que os analistas sejam cada vez mais especialistas
torna-se extremamente complexa. Para além disso, a de informática e cada vez menos especialistas do
interdependência dos comportamentos constitui um jogo. A suceder, este facto representa a desvirtuação
obstáculo difícil de ultrapassar. do objecto de estudo (o jogo e o treino) e a alienação
A metodologia observacional (Anguera, 1999) e a do móbil da investigação, i.e., o conhecimento da
análise de dados abrem territórios fecundos de lógica que governa a actividade desportiva nestes
investigação no domínio das Ciências do Desporto, contextos particulares.
nomeadamente no que respeita ao entendimento das Na ausência de um modelo teórico que garanta o
condições que concorrem para o sucesso nos jogos enquadramento e a interpretação dos dados obtidos,
desportivos. Todavia, para que tal se concretize, importa deparamos com uma massa de números com fraco
passar de uma observação passiva, portanto sem problema poder informativo (Gréhaigne, 1992). Impõe-se,
definido, com baixo controlo externo e carente de assim, que à sofisticação tecnológica dos sistemas de
sistematização, para uma observação activa, i.e., observação, corresponda o progressivo refinamento e
sistematizada, balizada por um problema e obedecendo extensão das categorias que os integram, no sentido
a um controlo externo (Anguera et al., 2000). de aumentar o seu potencial descritivo relativamente
às acções de jogo consideradas mais representativas
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS (Garganta, 1997).
A parafernália tecnológica não aumenta, Pelo que foi referido, parece curial manter no
necessariamente, a eficácia da observação nem os horizonte a máxima de Poincaré: a ciência é feita de
conhecimentos sobre uma determinada realidade. dados, como uma casa é feita de pedras. Mas um conjunto
Mas a tecnologia pode aumentar significativamente a de dados não é ciência, tal como um conjunto de pedras não
é uma casa.

6. REFERÊNCIAS

Por imperativos de gestão dos espaços de publicação, o elenco


de menções bibliográficas não é aqui apresentado, dado o
elevado número de referências que integra (150). Os
interessados poderão solicitá-las ao autor, cujo endereço
electrónico é: jgargant@fcdef.up.pt

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