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Ouro Preto
2018
DIONATAN CARLOS ALVARENGA PEREIRA BARROSO
Ouro Preto
2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA
À Deus, Onipotente, que em sua imensurável Graça demonstrou sua força em cada
etapa desse curso, permitindo-nos esse encontro de saberes diversos que se confluem e
acrescentam cada vez mais;
Ao Professor, Dr. Rafael Domingues Azzi, pela orientação, por ter me mostrado em
suas correções e sugestões de leitura a possibilidade de um pensar científico no cotidiano
escolar com alunos tidos como não aprendentes;
À Professora Tutora a Distância Luciana Cota, e aos demais professores do curso, pelo
constante apoio ao longo dessa caminhada;
3. METODOLOGIA ........................................................................................................................ 22
3.1. . MODELO DE PESQUISA-AÇÃO PRÁTICA COMO AGENTE FACILITADOR DOS PROCESSOS DE ENSINAR
E APRENDER.................................................................................................................................................22
3.2. A INSTITUIÇÃO ................................................................................................................................ 23
3.3. PÚBLICO ALVO E APRESENTAÇÃO DO MÉTODO UTILIZADO .............................................................. 25
4.1. APRESENTANDO AS POSSIBILIDADES DE APRENDIZAGEM POR MEIO DOS JOGOS COM REGRAS..........29
4.2. PRIMEIROS MANEJOS COM JOGOS COMO MEDIADORES DE APRENDIZAGEM ...................................... 30
4.3. SUPERANDO OBSTÁCULOS VIVENCIAIS POR MEIO DOS JOGOS........................................................... 32
4.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................. 34
APÊNDICE...................................................................................................................38
1. INTRODUÇÃO
Basta uma breve releitura a despeito dos problemas vivenciados dentro das escolas,
por todo o Brasil, para que se tenha noção da quantidade de crianças e adolescentes tidos
como “não-aprendentes”: resistentes à aprendizagem; de difícil lida; portadores de transtorno
mental, ou dificuldade de aprendizagem. Alunos cuja relação com o professor é marcada por
conflitos constantes e, consequentemente, por um afastamento dos prazeres de ensinar e
aprender.
Na tentativa de minimizar – ou tapar – o problema tem se percebido um crescente
número de educandos que se utilizam de substâncias sugeridas por médicos, em seus
receituários, como se a questão fosse inteiramente orgânica. Como nos expõe Souza (2010;
apud CAMARGO et all, 2018) “a criança com dificuldades em leitura e escrita é
diagnosticada, procuram-se as causas, apresenta-se o diagnóstico e em seguida a medicação
ou o acompanhamento terapêutico”.
Delineando, Souza expõe sua preocupação com a maneira de conduzir o problema da
aprendizagem, para isso, propõe uma crítica à medicalização dos alunos. Diz, portanto, que se
faz preciso buscar compreender melhor as demandas apresentadas por esses discentes – em
sua particularidade – e propor ações conjuntas (escola e família) que venham ao encontro de
tais dificuldades.
Assim, se trata de propor um novo olhar sobre a dualidade professor-aluno e os
métodos educativos desenvolvidos em salas de aula. Com o passar dos anos, o perfil do
educando mudou e a escola está em processo de mudança. Exige-se mais do professor na era
da tecnologia do que antes. Tendo findada a “era da palmatória”, tem-se vivenciada a era dos
questionamentos, o que de fato desafia o educador em seu saber profissional (BARROSO,
2014).
Nesta linha, propor metodologias de trabalho – planos de aula – que de fato participem
o aluno de sua formulação e o envolva direta e ativamente na construção do saber é um dos
maiores desafios vivenciados pela escola hodierna.
Este quesito também abrange as instituições filantrópicas que trabalham com crianças
e adolescentes cujo histórico familiar vulnerável contribui para a não aprendizagem. Fala-se
aqui do mesmo aluno, do mesmo aprendiz que a escola regular recebe num dos períodos do
dia (matutino ou vespertino ou noturno).
A vantagem das instituições – não governamentais – talvez esteja no fato de ela não
precisar seguir o mesmo modelo estrutural que a escola regular, caracterizando-se como
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espaço informal de educação. Os conteúdos podem ser trabalhados na forma de oficinas
temáticas lúdicas, deixando de lado um volume extenso de matérias e o compromisso de
apresenta-las todas até o encerrar de ano letivo.
Pensando nessas nuances, a utilização de jogos no contexto educacional se apresenta
como ferramenta estratégica na lida com as dificuldades de ensinar e aprender. Nisso, pensou-
se tratar conteúdos semelhantes ao das salas de aula a partir de um olhar não rígido buscando
o favorecimento do desvelar das habilidades educacionais em adolescentes tidos como “não
aprendentes”.
Aliás, é importante destacar que os problemas instigados a despeito da prática
educativa permeiam tanto as relações pertinentes à forma de estimulação da aprendizagem
quanto o oportunizar do desenvolvimento de habilidades para a resolução de conflitos
emocionais internos, tornando a aprendizagem mais significativa aos indivíduos. Assim, este
trabalho tentou responder as seguintes indagações: Será que esses alunos realmente não
aprendem ou não houve estimulação adequada para que tais características sejam
desenvolvidas? Como construir um espaço de aprendizagem livre de estigmas e classificações
superficiais oportunizando um ambiente favorável ao questionamento que gere conhecimento
maduro e consistente? Os jogos pedagógicos podem ser utilizados, nessa citada realidade,
como ferramentas de aprendizagem? E, por fim, de que maneira será possível propor ao
aprendiz a oportunidade de participar ativamente do seu processo de “vir a ser no mundo”
enquanto aprende?
Para tanto, o estudo de caso a seguir abarca alguns dos problemas correlatos à
dificuldades de aprendizagem vivenciados em uma instituição educacional – de cunho social
– localizada numa cidade do leste mineiro. Assistidos encaminhados para o setor de
psicologia com queixas que variavam de mera resistência a atitudes de agressividades diante
do convite para desenvolver atividades educativas.
Como se verá, a partir do modelo proposto por David Tripp (2005) do referencial
teórico disponível na bibliografia impressa e/ou digital, buscou-se identificar os apontamentos
feitos ao setor de psicologia da instituição acerca de problemas e/ou dificuldades de
aprendizagem, planejar ações pedagógicas de ensino e implementá-las em forma de coletivo
utilizando-se como ferramenta a confecção/adaptação de jogos educacionais com regras.
Nesse processo, vislumbrou-se o monitoramento e a avaliação das reverberações deste
grupo com olhar interventivo nas demandas psicossociais dos educandos no sentido de
aperfeiçoar a prática tanto com viés educacional e na superação das dificuldades imbricadas,
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quanto no que tange o desenvolvimento das habilidades pertinentes a vida cotidiana - e seus
conflitos existenciais – e, assim, facilitar o vislumbre da superação de problemas internos e
externos a esses indivíduos.
1.1. Objetivos
Durante o trajeto, foi possível analisar, interpretar e clarificar os dados obtidos à luz do
referencial teórico e propor – de forma conjunta com os participantes – manejos para cada
situação. Desta forma, as ações de aprendizagem precisaram de constante avaliação para
melhor gerencia das informações e aperfeiçoamento das atividades pedagógicas trazendo
maior qualidade e dinâmica nos processos de ensinar e aprender.
Considerando o que foi dito até o presente insight, este estudo se justifica pela
necessidade pungente de se repensar a prática educativa hodierna com foco no aluno.
Desta forma, é preciso a análise de que as dificuldades de aprendizagem pertencem a
uma rede de “causas e consequências de problemas psicossociais na infância, que precisam
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receber a atenção necessária, pois ora funcionam como causa, ora como consequência de
problemas comuns na idade escolar” (MAZER; DAL BELLO; BAZON, 2009, p. 8).
A defasagem discente parece se encontrar na dependência das estruturas intra e extra
escolar que variam desde os métodos pedagógicos, professores, estrutura física, passando por
fatores políticos como a política de saúde, até os psicossociais, familiares, entre outros.
Assim, “os encaminhamentos de crianças e adolescentes com queixa de dificuldade de
aprendizagem a serviços de saúde [por exemplo] vem se mostrando como sintomático dessa
complexidade multifatorial” (FREDERICO NETO et al., 2015, p.159).
Compreendendo, portanto, que as variáveis relacionadas às dificuldades de
aprendizagens englobam tanto problemas neurológicos quanto aspectos ligados a
vulnerabilidades sociais é preciso propor novas metodologias de ensino que vislumbrem o
despertar da curiosidade. E, para isso, os jogos pedagógicos têm se mostrado importantes
ferramentas de mediação na tarefa de ensinar e aprender, justamente por sua roupagem
instigadora e desafiadora o jogo é atraente aos olhos daqueles a quem são direcionados, o
facilita em muito o trabalho do educador.
Nessa perspectiva, pode se pensar que a relevância deste trabalho está localizada em
dois aspectos, especificamente: primeiro no aspecto científico, po33‟ r se vislumbrar a
pesquisa, o método e a análise do discurso como fontes de construção do saber e, através
disso, caracteriza-lo como fonte de questionamento a despeito do fazer pedagógico; noutro
ponto, no que tange o aspecto social a prática educativa aliada ao desenvolvimento do
pensamento crítico permite ao aluno muito mais que mera atribuição de acumulação de
conteúdos e, sim, a significação da experiência transformadora de aprendizagem, “o que
possibilita – o virar do leme – o aprender de verdade, o aprender para e com a vida”
(BARROSO, 2014).
Desta forma, destaca-se o método qualitativo de pesquisa, explicitado por Neves
(1996), como ferramenta de análise e exposição de conteúdos por facilitar a descrição dos
argumentos apresentados no decorrer dos trabalhos. Como metodologia de pesquisa, optou-se
lançar mão do modelo investigativo de Pesquisa-ação estudado por David Tripp,
especialmente o de Pesquisa-ação Prática (TRIPP, 2005) que possibilita a participação ativa
do pesquisador como meio termo do processo estudado, in locus, como membro da situação
vivenciada (BARROSO, 2014).
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Neste interim, como forma de embasar uma prática educativa transformadora e
facilitar a compreensão da leitura, o trabalho foi descrito em forma de capítulos. Neste
primeiro capítulo optou-se por uma breve introdução à temática.
O capítulo seguinte buscou fundamentar a prática a partir da pesquisa em literatura,
disponível tanto no ambiente virtual, quanto em artigos e revistas impressos. Tal proposta foi
reafirmada numa discussão textual sucinta a despeito das dinâmicas de aprendizagem em
indivíduos tidos como não aprendentes e as influencias possíveis para a não apreensão do
conhecimento cujo olhar esteve focado nas características biopsicossociais e desenvolvimento
de habilidades escolares e, posteriormente, na relação dos jogos educativos – com regras –
como facilitadores desses processos em salas de aula.
O capitulo três se apresenta com uma explanação sobre a metodologia de trabalho, as
ferramentas utilizadas em sala de aula, a descrição do público alvo e da instituição onde
aconteceram as ações de aprendizagem.
Por último, expõe-se o relato de experiência vivenciada pelos assistidos/alunos
participantes desse estudo de forma descritiva e analítica, facilitado pelo diálogo com a
literatura disponível. Trata-se, portanto, de um convite a reflexão constante a despeito da
prática pedagógica por meio da utilização de jogos com regra.
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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Neste ponto, os autores reverberam Smith e Strink (2001) ao afirmarem que em alguns
casos as dificuldades de aprender se apresentam tão sutilmente que podem passar
despercebidas por pais e professores inexperientes. Comportamentos tais como falta de
atenção e concentração podem, notadamente, serem consideradas mera hesitação a dado
exercício.
Noutro ponto, tais problemas podem ser tão intensos que
muitas crianças com dificuldade de aprendizagem também lutam com
comportamentos que complicam suas dificuldades na escola. A mais saliente dessas
é a hiperatividade, uma inquietação extrema que afeta 15 a 20% das crianças com
dificuldades de aprendizagem. Alguns outros comportamentos problemáticos em
geral observados em pessoas jovens com dificuldade de aprendizagem são os
seguintes: fraco alcance, dificuldade para seguir instruções, imaturidade social,
dificuldade com a conversação, inflexibilidade, fraco planejamento e habilidades
organizacionais, distração, falta de destreza e falta de controle dos impulsos
(SMITH & STRINK, 2001, pág. 15; apud TORRES, SOARES E CONCEIÇÃO
2016, pág. 116).
Daí a necessidade de uma compreensão mais profícua do tema, pois, quando não são
devidamente absorvidos por pais e professores os alunos podem ser tidos como preguiçosos
e/ou desatentos. Interpretações essas que, se perduram, podem causar danos irreversíveis ao
desenvolvimento de habilidades essenciais para o decurso de uma vida psicossocial proativa.
Por isso, não é incomum a indicação de avaliação clínica da conduta dos alunos com
fracasso escolar. Busca-se, especialmente no caso de comportamento embotado ou agitado,
um diagnóstico – uma receita – um atestado que por um lado justifique o aluno e sua condição
de “não aprendente” e, por outro lado avalize a escola o fato de não conseguir ensiná-lo.
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Dentro desta perspectiva, TORRES, SOARES E CONCEIÇÃO (2016), expõem que a
causa dos problemas de aprendizagens apresenta-se multifacetada e que, por isso, demanda
um olhar mais atento a despeito dos fatores biopsicossociais da aprendizagem:
Neste ponto, para que a aprendizagem ocorra se faz preciso o desenvolvimento pleno e
saudável do processo de maturação fisiológica. Por exemplo: para que se possa chutar uma
bola em direção ao gol, mesmo sem muita força, é preciso um bom controle da motricidade
para exercer sobre a perna e o pé o comando de chutar em direção ao alvo. Assim, o
desenvolvimento de habilidades intrínsecas: andar, correr, sentar, pensar, analisar e resolver
problemas – só para citar algumas; só é possível se o indivíduo tiver, em si, as bases – os
signos – dessas funções do corpo humano para que, a partir delas, o comportamento possa ser
treinado e aprimorado (SANTOS 2018).
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Quando o corpo ainda não está preparado para aprender dado conhecimento – seja por
uma inabilidade orgânica permanente, ou pela imaturidade neurofisiológica naquele dado
instante – o indivíduo poderá apresentar maior grau de dificuldade para adquiri-lo ou mesmo
lidar com o novo. Daí que na adolescência, por exemplo, se vê comportamentos agressivos,
desafiadores e/ou hesitantes com relação a aprender determinadas matérias escolares. Quase
sempre alguns deles se queixando de dores no corpo, cabeça, pés, sono, apatia, e etc.; o corpo
está crescendo e, por isso, a dificuldade de concentração. São fatores fisiológicos que
influenciam o desempenho dos alunos em sala de aula.
Ainda, a despeito dos fatores fisiológicos, é importante destacar a influência dos
distúrbios de aprendizagem em relação ao desenvolvimento neuropsicomotor. Assim, “os
distúrbios de aprendizagem seriam uma perturbação no ato de aprender, isto é, uma
modificação dos padrões de aquisição, assimilação e transformação, sejam por vias internas
ou externas”. Descritos como podendo ser verbais ou não verbais. Estes, relacionadas a
problemas nas habilidades visioespacial tais como na percepção tátil e visual, coordenação
motora e dificuldade em lidar com situações novas. O que frequentemente culminam em
dificuldades acadêmicas e sociais. Os distúrbios não verbais da aprendizagem se expressam
nas inabilidades de ler e escrever; descritas como Dislexias, que vão desde a troca de letras –
dislexia Disfonética – até os problemas de leitura lenta de textos simples – dislexia
Diseidética –, podendo ainda ocorrer na forma mista, por ocorrerem os dois tipos ao mesmo
tempo (CARVALHO; CRENITE; CIASCA, 2007, pág. 230).
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2.1.3. Os fatores ambientais e a visão de mundo
De contínuo é perceptível o fato de que o homem é ser social por natureza. Não há
como viver isolado. Nesta linha, toda experiência humana de aprendizagem pode ser
caracterizada como uma ação em sociedade.
Para Moran, Masseto & Behrens (2013), aprender não é um fato isolado das relações
sociais cotidianas. Embora o foco esperado seja o de estar motivado para aprender enquanto
se está na escola, o aluno – em sala de aula – sofre influência dos fatos extra escolares:
traumas, episódios de vexação, a necessidade de contribuir com a economia familiar, baixa
estima, problemas de saúde etc. Por isso, aprender a lidar com essa série de conflitos que
podem vir em conjunto ou isoladamente, é fundamental para que o aluno compreenda o
contexto escolar como algo valioso e necessário. Pertinente para um futuro melhor.
Desta forma, o educador precisa estar sensível a essas nuances e manejar – de forma
qualitativa – sua prática pedagógica no sentido de permitir o despertar desses alunos para o
que Moran, Masseto & Behrens (2013) chamaram de o grande projeto de aprendizagem, a
vida.
Aprendemos melhor quando vivenciamos, experimentamos, sentimos. Aprendemos
quando relacionamos, estabelecemos vínculos, laços, entre o que estava solto,
caótico, disperso, integrando-o em um novo contexto, dando-lhe significado,
encontrando um novo sentido (MORAN, 2013, pág. 23).
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variar de uma matéria estudada para outra, de acordo com as preferencias e motivações dos
alunos. Assim, a dualidade professor/aluno, se faz necessária estar fortalecida.
Para tanto, a constante avaliação da prática e a proposição de novas formas de ensinar
podem ser o veio para o fortalecimento do vínculo entre o professor e o aluno. Como se verá a
seguir, os jogos com regra podem se caracterizar como ferramenta eficaz de aprendizagem.
Para que uma ação pedagógica passe, portanto, a ser contributiva ao processo de
assimilação do aluno é preciso uma olhar constante e crítico sobre os métodos de ensino em
sala de aula. A proposição de novas formas de ensinar, contextualizadas, podem ser o veio
para o fortalecimento do vínculo entre o professor e o aluno.
Neste viés, os jogos com regra podem se caracterizar como ferramentas eficazes de
aprendizagem.
Para Calomeni, Nascimento, Neto e Saint'‟Clair os jogos auxiliam
[...] no processo ensino-aprendizagem e no desenvolvimento psicomotor, isto é, no
desenvolvimento da motricidade fina e ampla [...]; no desenvolvimento de
habilidades do pensamento, como a imaginação, a interpretação, a tomada de
decisão, a criatividade, o levantamento de hipóteses, a obtenção e organização de
dados; e na [...] aplicação dos fatos e dos princípios a novas situações que, por sua
vez, acontecem quando jogamos, quando obedecemos a regras, quando vivenciamos
conflitos numa competição (CALOMENI, NASCIMENTO, NETO e
SAINT'‟CLAIR, 2012, pág. 2).
De forma descontraída e livre das couraças de ensinos com metodologias unilaterais e
fragmentadas os jogos – como se pode notar – facilitam o acesso ao saber. Mas, os autores
alertam para que o educador se aproprie de estudos sobre as fases de desenvolvimento
psicomotor para saber quais os estímulos apropriados para cada faixa etária, “pois assim, ele
estará fazendo com que o desenvolvimento seja mais harmonioso no campo motor, cognitivo
e afetivo-social” (QUINTÃO et al, 2004).
Muitas são as tentativas de definir o que podem ser considerados jogos com regras. Ao
longo da história da humanidade a utilização deste tipo de ferramenta em contextos
educativos vem sendo amplamente discutido pelos atores científicos. O que se busca,
portanto, é a compreensão de como relacionar e avaliar a eficácia desse método enquanto
instrumento de ensino-aprendizagem.
Pelo que se pode descrever, a palavra jogo tem origem na palavra latina „ludus’ e mais
tarde foi substituída pela palavra „jocu’
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que significa desenvolvimento e também pode-se considerar a atribuição de
responsabilidade a uma pessoa que, por sua vez se atribui a outra. No sentido
etimológico, portanto, expressa um divertimento, uma brincadeira, um passatempo
sujeito a regras que devem ser observadas quando se joga. Significa também
balanço, oscilação, astúcia, manobra (COSTA & SAMPAIO E MELO; in
PEREIRA, 2013, pág. 15).
Desse modo, o jogo se apresenta como ferramenta divertida de aprendizagem. Aqui,
compreendida como instrumento de facilitação do processo de ensino, em sala de aula. Para
esclarecer, é preciso lembrar que aprender não é um ato isolado da realidade social, pois,
através dos jogos com regras é possível trabalhar valores e costumes sociais. Tanto no que diz
respeito ao contexto escolar, quanto nas relações e conflitos familiares (PEREIRA, 2013).
Destarte, “é através da ludicidade que ela desenvolve não só a imaginação, mas
também fundamenta afetos, elabora conflitos e ansiedades, explora habilidades e à medida
que assume múltiplos papéis, fecunda competências cognitivas e interativas.” (ANTUNES,
2004, p. 31).
Os jogos, portanto, se caracterizam como meios lúdicos para o desenvolvimento de
habilidades sociais. Permitem aos indivíduos analisar situações problemas e resolvê-las a
partir de regras previamente impostas pelo próprio tabuleiro. Assim os jogadores precisarão
estruturar o pensamento, analisar as questões impostas, elaborar estratégias, adaptarem-se a
situações adversas, e agir dentro de um conjunto de fatores para conquistar o objetivo
desejado.
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acabadas aos seus pupilos – instrui e media o processo de aprendizagem por meio de
pequenas conduções. Que, nas práticas pedagógicas, se deva permitir ao aluno ser o
protagonista de sua aprendizagem. E que, para isso, deva se aprimorar constantemente,
estabelecendo uma relação de respeito e troca com seus alunos.
Ensinar, portanto, tem sua base no fomento de táticas interventivas que estejam o mais
próximo possível da realidade do aprendiz e que, ao mesmo tempo, o desafie, o instigue, a ir
além. Permita ao aprendiz atravessar suas dificuldades da maneira mais prazerosa e simples.
Por isso, a ludicidade – a utilização de jogos pedagógicos com regras – apresenta-se
como esse algo palpável para o aluno. O que não é coisa nova, uma vez que na antiguidade já
se vislumbrava tal ação.
Brincando, aprenderá, o futuro construtor, a medir e a usar a trena; o guerreiro, a
cavalgar e a fazer qualquer outro exercício, devendo o educador esforçar-se por
dirigir os prazeres e os gostos das crianças na direção que lhes permita alcançar a
meta a que se destinarem (PLATÃO, apud SILVEIRA, 1988, pág. 41).
A atividade lúdica, como se pode vislumbrar, é parte do dia a dia das pessoas. Por ela
se formam e se modelam culturas, se estabelecem regras de convivência e se massificam
valores essenciais a vida social. Portanto, não se trata apenas de brincar – recrear, divertir – e
sim de uma ferramenta direcionada para a aprendizagem significativa, pois, “[...] os jogos são
atividades naturais que satisfazem a atividade humana, e é necessário seu uso dentro da sala
de aula” (SANTOS, 2010, pág. 18).
Parafraseando Chateau (1987),
É pelo jogo, pelo brinquedo que crescem a alma e a inteligência [...] uma criança que
não sabe brincar, uma miniatura de velho, será um adulto que não saberá pensar.
Assim, defende-se neste estudo uma metodologia em que brincar é a ludicidade do
aprender (CHATEAU, 1987, pág. 14; apud SANTOS, 2010, pág. 19).
Deste modo, pode-se compreender que, ações lúdicas de aprendizagem se estruturam
como ambiente propício para o desenvolvimento pleno das capacidades e habilidades
cognitivas, desde a infância. Portanto, também podem ser utilizadas como ferramentas de
ensino em casos de alunos com defasagem escolar.
Na mesma lógica, consequentemente, os alunos tidos como “não aprendentes”
apresentam inúmeros fatores que podem ser incorporados como causa da má campanha
escolar. Podem-se ver, em muitos aspectos, alunos com idade cronológica superior com
extrema dificuldade de apreensão de leitura e escrita. Estudar para estes é tarefa árdua, difícil
e quase impossível. Níveis de frustração elevados e desesperançosos – convencidos até de que
são portadores de problemas mentais severos. Frutos, muitas vezes e inclusive, de uma
metodologia de ensino unilateralista, pois como se contempla
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o resultado da progressão continuada é o que está aí: alunos saem da 8ª série mal
sabendo ler e escrever e entram no ensino médio sem condições de acompanhar as
aulas por absoluta falta de conhecimentos básicos” (CAPRIGLIONE, 2007 p. C1; in
RESENDE et all, 2010, 2007, pág. 174).
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3. METODOLOGIA
3.2. A Instituição
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risco social residentes nos territórios de abrangência dos CRAS 1, em especial: -
Famílias beneficiárias de programas de transferência de renda e benefícios
assistenciais; - Famílias que atendem os critérios de elegibilidade a tais programas
ou benefícios, mas que ainda não foram contempladas; - Famílias em situação de
vulnerabilidade em decorrência de dificuldades vivenciadas por algum de seus
membros [...] (BRASIL, 2009, pág. 13; PEREIRA, 2012).
Ao pensar nessa proposta, a tarefa da Funcime passa ser compreendida como agente
de mediação de realidades. Rebuscar, de forma conjunta com os assistidos, a oportunidade de
superação dos fatores vulneráveis que atingem suas famílias. O que ocorre, normalmente, com
a oferta do trabalho aprendiz.
Até este momento, os alunos são inseridos em salas cuja função é identificar e
desenvolver habilidades – a começar pela educação, esporte, lazer; transitar na interação entre
os grupos sociais; prevenir situações de risco com palestras e dinâmicas de grupo; e incentivar
a maturidade de forma sadia e contextualizada.
Uma tarefa que de longe é árdua e cheia de agruras. Como boa parte das instituições
que atendem o mesmo público, a lida de trabalho com as turmas nas oficinas apresentavam
demandas diversas de intervenção e análise.
Por isso, neste trabalho, o foco das ações se manteve nas demandas concernentes às
dificuldades escolares. Contudo, sem deixar de fora o contexto de vida dos participantes –
uma vez que não há como seccionar o objeto de estudo de sua experiência de vida
(biopsicossocial).
Durante as reuniões de equipe técnica, oferecidas pela instituição como oportunidades
para a discussão de casos e aprimoramento da prática a partir de múltiplos conhecimentos, era
possível observar o constante reclame e confecção de encaminhamentos ao setor de psicologia
e serviço social de crianças e adolescentes que apresentavam dificuldades da aprendizagem:
ora por despreparo do profissional que lidava com o público, ora por indisciplina ou
desmotivação por parte do aprendiz. Normalmente denominados alunos Não-aprendentes.
Considerando, desta forma, as diversas nuances que permeiam o público atendido e as
peculiaridades dos contextos familiares no que tange a missão institucional de propor novos
caminhos para a superação de riscos, se faz preciso desenvolver ações que vislumbrem um
novo olhar sobre os modos de ensinar e aprender e garantam aos aprendizes a oportunidade de
desenvolver a autonomia, o pensamento, a superação de desafios e a re-formulação de ideias e
atitudes sobre si e sobre a vida.
1
CRAS – Centros de Referência da Assistência Social – Caracterizados como a porta de entrada para
acesso aos serviços ofertados pelo Ministério do Desenvolvimento Social – MDS (BRASIL, 2009, pág. 14);
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3.3. Público alvo e apresentação do método utilizado
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No decorrer das ações de ensino, que perduraram 7 encontros de 50 minutos, na sala
de psicologia – por se tratar de um espaço amplo e reservado – com cadeiras dispostas em
círculos em torno de mesas, os aprendizes e o mediador/pesquisador dialogavam sobre fatos
do cotidiano enquanto confeccionavam os jogos e/ou os praticavam. Através da dualidade
educador-educandos era possível perceber as dificuldades reais de aprendizagem e as
demandas de análise. Isso facilitava a intervenção focal e a mudança de estratégias para os
próximos encontros.
Os resultados obtidos com esse conjunto de experiências educativas facilitaram, e
muito, a descrição do estudo de caso proposto a seguir. Vale lembrar que este estudo foi
autorizado com base em termos de aceite e participação (anexo).
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4. ESTUDO DE CASO: Uma experiência de uso de jogos com regras
como mediadoras do processo de ensino aprendizagem
Deixar os alunos falarem implica usar estratégias nas quais possam discutir,
negociar significados entre si apresentar oralmente ao grande grupo o produto de
suas atividades colaborativas, receber e fazer críticas. O aluno deve ser ativo, não
passivo. Ela ou ele tem que aprender a interpretar, a negociar significados; tem que
aprender a ser crítica (o) e aceitar a crítica. (MOREIRA, 2010)
Moreira (2010) expõe que o professor deva se ater ao papel de mediador da
aprendizagem e que, o início e o fim dela é o aluno – para o qual o ensino é endereçado. Por
isso, cada etapa a seguir, tem por intuito permitir a descrição da experiência na perspectiva
deste aluno a fim de que se possa trazer à tona o resultado conciso das ações de
aprendizagem.
Como foi dito anteriormente, o primeiro passo foi reunir com a equipe técnica e
direção para o estudo dos casos pertinentes. Naquela ocasião, foi possível verificar a
incidência de que os assistidos selecionados vinham de contextos familiares complexos e
conflituosos. Dos 10 participantes 8 não convivem com pai e mãe; 9 assistiam os constantes
embates (gritos e violências) entre os genitores; que os 10 participantes presenciavam uso
abusivo – e por vezes tráfico – de substâncias psicoativas lícitas ou ilícitas no núcleo familiar.
Noutra ponta, observou-se que, dentre o grupo selecionado, a escolaridade média dos
pais é a 6ª série do ensino fundamental (hoje tida como 7º ano). Soma-se a isso a atitude dos
genitores aparentemente delegarem ao setor público de maneira geral o fator educação dos
filhos. Foram repetidas as falas dos pais, contidas nos relatórios de atendimento da instituição,
de que não sabem o que fazer com o filho: “[...] tenho que trabalhar para alimentá-lo e não
consigo fazer tudo sozinho (a) [...]”; “[...] não sei ler, nem escrever, não tenho como ajuda-
lo [...]”; e “[...] estou desesperada, preciso de ajuda com minha filha, está muito rebelde e
não me escuta [...]”. Tais relatos retratam um pouco do quadro geral familiar.
O que se percebe, portanto, é a relevância da instituição de regras sociais logo nas
fases primárias de vida, sem as quais a vida em sociedade seria insustentável.
Embora sejam, inicialmente, externas, as normas de conduta devem ser adotadas
pelo indivíduo e servir de guias que são seguidos mesmo quando a autoridade
externa não está presente. A substituição do controle externo pelo autocontrole se dá
por um processo de internalização, ou seja, pela formação de uma consciência moral
[...] a consciência moral consiste no conjunto de valores que permite ao indivíduo
distinguir entre o bem e o mal, em suas convicções sobre suas responsabilidades e
sobre o que deve ou não fazer. [...] (SANTOS, 2018, pág. 34).
Contanto que se compreenda a necessidade de que a vida cotidiana seja regida pela
assimilação de regras de convivência será igualmente possível denotar que é este o ato
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precípuo para o desenvolvimento de habilidades de organização de si, do espaço externo, de
compreensão e resolução de problemáticas diversas, ou seja, pela própria ação de
aprendizagem em si mesma. Subsidiárias da vida em grupo (SANTOS 2018).
Continuando a investigação dos relatos contidos nas pastas, notou-se que dos 10
participantes 8 fazem ou fizeram uso, nos últimos 6 meses, de alguma substância sugerida por
um médico (clínico geral, psiquiatra ou neurologista). O uso mais comum era Ritalina e/ou
Amitriptilina, indicados para déficit de atenção com ou sem hiperatividade ou para ansiedade
comportamental. No entanto, observou-se ainda que os assistidos não realizavam
acompanhamento médico, mas – ao que pareceu – não houve realização do estudo clínico
para discernir a melhor posologia farmacológica à cada caso.
Corrobora, portanto, com o que foi apontado por Mazer, Dal Bello e Bazon (2009) que
apontavam que se deva ter sensibilidade com relação aos problemas de aprendizagem, uma
vez que eles funcionariam ora como causa, ora como consequência de um incontável número
de fatores psicossociais advindos da infância e do contexto de vida desses alunos tidos como
não aprendentes. Acrescenta-se a preocupação, o uso abusivo de terapêuticas farmacológicas
utilizadas como agente de controle comportamental, apenas sugerindo períodos de alívio à
pais e professores mascarando sintomas, sem tratar de fato a causa e o problema
FREDERICO NETO et al., 2015).
A partir desta perspectiva, a principal justificativa dos pais para a descontinuidade do
tratamento era que: o filho “estava ficando muito dopado”, “sonolento” ou “zumbizando” e
“não havia melhora na qualidade de atenção ou rendimento escolar”. Tal fato denota a
preocupação desses pais/responsáveis de que houvesse superdosagem e prejuízo, invés de
beneficio.
Neste interim, se faz sumário dizer que a dificuldade de aprendizagem é resultante de
múltiplos fatores que atingem a população humana apresentando-se de forma heterogênea,
[...] assim sendo, dentro da categoria de dificuldade de aprendizagem podem ser
encontrados mais detalhadamente, alunos com: problemas situacionais de
aprendizagem – apresentando comprometimento em algumas circunstâncias e não
em outras –, problemas de comportamento, problemas emocionais, problemas de
comunicação – distúrbio da fala e da linguagem –, problemas físicos, de visão, de
audição, e por fim, problemas múltiplos – presença simultânea de mais de um dos
problemas anteriormente mencionados (MARTINS e MARCHESI, 1996; in
CALOMENI, NASCIMENTO, NETO e SAINT'‟CLAIR, 2012, 118).
Infelizmente, a escola, a sociedade e a família, apresentam pouco preparo para lidarem
com esta multiplicidade de fatores que envolvem o desenvolvimento infantil. Situações que,
como se pôde reparar, vão das mais simples as mais complicadas de se intervir. Por isso, é
preciso que o educador se proponha à prática investigativa das possibilidades educacionais –
28
adaptando o conteúdo ao grupo com o qual trabalha – no sentido de agregar valor às ações de
aprendizagem e, assim, auxiliar os alunos em seu processo de aquisição da linguagem
educativa.
Entremeio, a busca por novas técnicas e manejos de ensino aprendizagem requer do
educador um olhar atento e endereçado às demandas dos alunos. Somando-se a isso, Freire
(1996) propõe que este deva perceber o desafio de ensinar aprendizes com dificuldades como
força propulsora que o mova em direção ao conhecimento. Sem a qual “nem se ensina nem se
aprende”.
Destarte, a reunião para estudo dos casos demonstrou-se efetiva favorecendo a
compreensão de que a família pode ser parceira da escola/instituição na lida com as
dificuldades de aprendizagem e que propor metodologias “fora da caixa” para este grupo pode
estimulá-los ao desenvolvimento cognitivo e a superação das dificuldades de aprendizagem,
como se verá nas considerações analíticas a seguir:
Diante de tais informes, entendeu-se que era o momento de reunir os assistidos e expor
a proposta. Ocasião oportuna para um bate-papo e identificação de possibilidades de
aprendizagem. Por isso, embora houvesse um cronograma de apresentação pré-estabelecido e
formalizado, foi dito ao grupo que toda contribuição era bem vinda e que aquele encontro era
para se debater proposições de manejos educativos. Que era de suma importância falar a
respeito do que e como, em sua
perspectiva, lidavam com a sala de aula
e com a tarefa de aprender. E que, ao
final, deveriam sugerir propostas
conjuntas de trabalho para os encontros
posteriores.
Para facilitar, a ação de
aprendizagem iniciou-se com a
Imagem 1: Quebra-Cabeças com palitos
exposição de desafios matemáticos
simples tal como o quebra-cabeça com palitos (vide Imagem 1 – Quebra-cabeça com palitos –
acima), como forma de quebra-gelo. Por se tratar de um novo modelo de ensino, foi possível o
despertar de sentimentos tais como a curiosidade e o desejo de tentar resolver o problema.
29
Durante, o diálogo compreensivo com o pesquisador/mediador ouviu-se dos assistidos
que eram meninos “burros”, que “não conseguem aprender” ou mesmo “não vou aprender
de forma alguma esse negócio”. Ao falarem, adotavam uma postura corporal de
desmotivação e estafa, pois diziam serem tratados dessa maneira tanto em casa quanto na
escola, pois em incontáveis oportunidades ouviam que “estão na vida de passagem, não
sabem e não querem nada!”.
Tal entendimento se deve a compreensão de que nasceram sem sorte e que –
imaginativamente – romper com esse estigma requereria maior esforço do que poderiam ser
capazes de sustentar (MORAN, MASSETO & BEHRENS, 2013). Daí a urgência de se
perceber potencialidades de desenvolvimento e sugerir mudanças nos antigos métodos de
ensino-aprendizagem, como na tentativa de despertar nesses alunos um olhar diferente
daquele a que foram acostumados (ZABALA, 1998).
Como cada ação de aprendizagem requer intervenções pontuais, para além da
compreensão situacional, esta facilitou o fortalecimento de vínculos na relação
professor/mediador – alunos. Com isso, oportunizou a criação de 3 regras básicas, sugeridas
pelos próprios indivíduos do grupo com o auxílio do professor/mediador: 1) “Ninguém aqui é
burro, todos aprendemos de um jeito diferente uns dos outros”; 2) “Não será permitido rir
dos erros que cometemos”; e 3) “Cada um deve ajudar ao outro em suas dificuldades”.
Em amplo sentido, se trata de propor aos indivíduos do grupo o desvelar da autonomia
pela demanda de aprendizagem. Deixar que sejam mais ativos e participativos em seu
processo de “vir a ser no mundo”, de modo a vivenciarem conflitos comuns à vida e a elas
proporem caminhos e metas para sua solução (POZO, 2002 in BARROSO, 2014; MOREIRA,
2010).
Este gesto, conquistado a partir da oportunidade de um espaço neutro e sem
julgamento, aparentemente se tornou crucial para o desenvolvimento das ações posteriores.
31
Tendo isso em mente, ao longo do encontro ouviu-se exclamações de que “esse jogo é
muito difícil”, “mal sei a tabuada de 3”, entre outras tantas frases negativas. Por outro lado,
foi possível perceber outros tipos de expressões: “vai dar certo, ainda nem tentamos”; “qual
é cara, esperai, ninguém nasce sabendo”. Desta forma, apesar do alvoroço inicial tido como
estranhamento frente ao novo desafio, denotou-se um clima de curiosidade e, até, ansiedade
de começar essa “brincadeira” e “ver como se joga na prática”.
Com isso, pensa-se ser perceptível que a ludicidade apresentou se para o grupo como
função educativa, alterando os padrões convencionais de ensino em salas de aula tornando o
ato de aprender e ensinar menos penoso para ambos, aumentando as chances de sucesso. Ou
seja, o ato lúdico de aprendizagem explora habilidades e competências intrínsecas e
extrínsecas aos indivíduos, facilitando o processo de maturação de competências cognitivas
por meio da interação e assunção dos múltiplos contextos sugeridos pelo jogo com regras
(ANTUNES, 2004).
4.3. Superando obstáculos vivenciais por meio dos jogos
32
Corroborando, tem-se que, no 4º encontro, L – nome fictício – relatou ao grupo o
seguinte: “estou triste! Tenho saudades da minha mãe”. Questionada por um colega,
complementou: “[...] não consigo entender se ela me ama já que nunca dizia nada pra mim
[...]”. Compreendendo a necessidade de sugerir um conforto a situação, um colega de grupo,
parou de recortar uma tira de EVA e deu lhe um abraço que foi seguido pelos demais.
L, foi inclusa no grupo por apresentar histórico familiar complexo com situações de
abandono no lar pela mãe, tráfico de drogas e uso abusivo de álcool pelos tios. O pai deixava
a educação da menina com a avó paterna, tendo dificuldades de lidar com as demandas de L,
já moça de 14 anos. Vale ressaltar que o que foi expresso no grupo, dificilmente aconteceria
em outro contexto, pois L se defendia o quanto podia de professores e técnicos da instituição.
De acordo com relatos da avó a garota ficava em seu quarto a maior parte do dia quando não
estava na escola ou na Funcime. Dificilmente, se relacionava com amigos.
Por isso, a partir da atitude de L, o mediador passou a oportunizar em cada encontro
alguns minutos para quem quisesse contar algo que o incomodasse em si, em casa, na escola,
vizinhança ou mesmo na instituição. Como resultado obteve-se que, conforme as atividades
iam se processando, maior era liberdade para falar.
Noutro exemplo, enquanto jogava o Jogo ASMD, M (13 anos) escondia as mãos
embaixo da mesa para fazer cálculos e – normalmente – desistia da vez com receio de que os
outros jogadores o ridicularizassem por não fazer contas rápidas.
Questionado, evitava perseverar. O grupo o acolheu, alguns alunos se aproximavam
dele para ajudá-lo e as mãos que estavam escondidas pelo medo foram trazidas para cima da
mesa. M deixou para traz alguns anseios de aprendizagem, passando a perguntar e a resolver
cálculos.
Nas palavras de alguns membros daquele grupo: “estou aprendendo a pensar, eu
acho!”; “não é tão difícil de aprender matemática como eu pensava [...] não que não seja
difícil – muito difícil – só que não tenho mais medo [...], entende?”; “estou aprendendo a
confiar a mim mesma”; “gostei de aprender jeitos diferentes de ganhar na dama (jogo) [...]
ganhei até do (pro)fessor, acho que aprendi alguma coisa afinal.”
A esse respeito, portanto, Quintão (2004) e Barroso (2014) já alertavam que os
educadores precisam se desafiar e buscar novas estratégias de aprendizagem. Fazendo assim,
ele estará nomeando aos seus pupilos a chance de se igualmente se desafiarem e, com isso,
enfrentar problemas para além de escolares e agregar valores à própria experiência, além de
atribuírem novo significado àquelas que antes eram tidas como negativas, ou traumáticas.
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4.4. Considerações Finais
Neste desafio de ensinar com jogos, sem confundir prática educativa com mero
passatempo, “o professor se caracteriza como um gestor em sua sala de aula. Ele motiva,
lidera, planeja, organiza, negocia, define tempo, conteúdos, pré-requisitos, abordagens,
estratégias metodológicas, tecnologias e processos de avaliação” (NEVES, 1996). Para tanto
fez-se preciso abrir mão de uma cultura linear e estática de ensino, propondo nova roupagem
à prática pedagógica. Trazê-la para mais perto de quem precisa aprender é tarefa essencial do
professor.
Desta maneira, trabalhar com alunos difíceis caracteriza-se como um desafio
inestimado aos educadores hodiernos. Para tanto, é necessário garantir que o fazer em sala de
aula esteja munido pelo criativo, pela interação, pelo desafio do saber, pelo despertar da
curiosidade. Assim, percebeu-se que “ensinar ou aprender não é apenas a transmissão e/ou
assimilação de conteúdos teóricos, pelo contrário, acontecem por meio da mútua e contínua
convivência entre ambos” (ZABALA, 1998; BARROSO, 2014).
Como meio facilitador dessa dualidade, o professor deve perceber-se não apenas como
quem ensina, mas, também como aquele que está em constante processo de aperfeiçoamento.
Em sala de aula, deve ser visto não apenas como um professor – dono de um saber –, ele é
também um pesquisador de sua própria ação de ensino. Assim, deve dispor de avaliações
constantes de forma a aperfeiçoar a prática pedagógica a fim de obter melhores resultados
(TRIPP, 2005).
A análise caso a caso dos indivíduos encaminhados ao setor de psicologia e serviço
social da instituição como ato inicial das atividades para a formação do grupo pesquisado
mostrou que é pungente, a escola e a todos os profissionais que lidam com alunos com
problemas de aprendizagem, um olhar atento e crítico a despeito dos diagnósticos e
terapêuticas farmacológicas sugeridos como causa da defasagem escolar, visto que tais
problemas possuem inúmeras implicações que vão desde fatores genéticos a influência de
fatores de vulnerabilidades ou riscos sociais.
O desenvolvimento desta experiência pedagógica utilizando-se de jogos com regras
como facilitadores de aprendizagem permitiu ao pesquisador compreender um pouco melhor
alunos tidos como não aprendentes e oportunizar uma experiência ressignificadora, onde este
foi quem mais aprendeu com os alunos. Notou-se que, embora se possa justificar a não
aprendizagem como sendo advindo de fatores genéticos ou de algum contexto cultural, cabe
ao professor a oportunidade de fazer a diferença ante ao desafio lançado.
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Enfim, a partir do que foi vislumbrado até o presente momento, ao reafirmar que os
jogos com regras têm se constituído como instrumento eficaz na difusão e ampliação do saber,
espera-se que este documento se constitua como uma base teórico-metodológica e favoreça o
contínuo desvelar sobre a ludicidade como prática pedagógica e fomentadora do
fortalecimento da dualidade na relação professor-aluno, aproximando-os cada vez mais.
Embora este estudo retrate uma experiência preliminar, uma vez que se devam vislumbrar
novas ações de educadores que a reproduzam, reflitam, adaptem e/ou a melhorem de forma
que se tenha maior respaldo, é possível denotar o que já vem sido disseminado entre os
estudiosos de que práticas pedagógicas podem aliar o lúdico, o jogo, como ferramenta
instigadora dos processos ensino-aprendizagem.
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais. Resolução MDS nº. 109, 11
de Novembro de 2009, 64 fls.;
36
PEREIRA, A. L. L. A Utilização do Jogo como recurso de motivação e aprendizagem.
Faculdade de Letras, Universidade do Porto, Portugal, 2013, 132p. https://repositorio-
aberto.up.pt/bitstream/10216/71590/2/28409.pdf acesso em 01/10/2018;
QUINTÃO, D.; PINHEIRO, E.; PASSOS, F.; SANTOS, L.; XAVIER, M.; NUNES, M.
A Educação Física e o Desenvolvimento Infantil. Centro de Ciências de Educação e
Humanidades – CCEH - Universidade Católica de Brasília – UCB - Volume 1 - Número 2.
2004;
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984; 2000;
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA
ESPECIALIZAÇÃO EM MÍDIAS NA EDUCAÇÃO
(CARTA DE ACEITE)
_______________________________________________
Nome, por extenso, do responsável pelo setor
_______________________________________________
Assinatura e Carimbo da Instituição
_________________________
Telefone
_________________________
E-mail
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA
ESPECIALIZAÇÃO EM MÍDIAS NA EDUCAÇÃO
______________________________________________________
(assinatura do participante, menor de idade, por estêncil)
______________________________________________________
[NOME E ASSINATURA DO RESPONSÁVEL]
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