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CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA


PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010

MATERIAL DIDÁTICO

FUNDAMENTOS DE PSICOLOGIA
JURÍDICA

Impressão
e
Editoração

0800 283 8380


www.ucamprominas.com.br
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 3
UNIDADE 1 – BREVE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA ............................................ 9
1.1 Funcionalismo ................................................................................................ 12
1.2 Psicologia da forma (Gestalt) ......................................................................... 13
1.3 Behaviorismo.................................................................................................. 15
1.4 Psicanálise ..................................................................................................... 16
1.5 Psicologia social ............................................................................................. 18
UNIDADE 2 – TEORIAS DA PERSONALIDADE ................................................ 20
2.1 O que é personalidade ................................................................................... 20
2.2 Desenvolvimento da personalidade ............................................................... 22
2.3 Teorias psicodinâmicas .................................................................................. 24
2.4 Teorias comportamentalistas ......................................................................... 31
2.5 Personalidade, psicologia social e psicologia jurídica .................................... 34
UNIDADE 3 – FATORES QUE INTERFEREM NAS REAÇÕES DO INDIVÍDUO 41
3.1 Constituição corporal ...................................................................................... 42
3.2 Temperamento X caráter................................................................................ 45
3.3 Cognição ........................................................................................................ 48
UNIDADE 4 – DIREITO E PSICOLOGIA: UMA UNIÃO POSSÍVEL ................... 56
UNIDADE 5 – CONCEITUAÇÃO DE PSICOLOGIA JURÍDICA E CAMPO DE
ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL ......................................................................... 61
5.1 O que é psicologia jurídica ............................................................................. 61
5.2 Campos de atuação da Psicologia Jurídica.................................................... 64
UNIDADE 6 – ÉTICA NA PSICOLOGIA JURÍDICA ............................................ 70
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 78
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INTRODUÇÃO

Enquanto orientadores sempre recomendamos a pesquisa de materiais


recentes, porém, ao se utilizar obras clássicas (como no caso deste material, em
que grande parte do conteúdo foi embasado em obras de teóricos que abordam
sobre diferentes autores) isso não se faz possível – ainda mais em caso de livros
que já possuem edições mais recentes, porém lançamos mão de cópias mais
antigas. Fora isso, é sempre importante mantermos o conhecimento científico
atualizado! Bons estudos!
Essa introdução pretende, como diz o próprio nome, introduzir conceitos
que serão abordados neste material, assim como pretende realizar uma breve
apresentação do curso de Psicologia Jurídica.
Dentre várias definições possíveis, compreende-se a Psicologia Jurídica
como o ramo da psicologia que serve de subsídio para a prática do Direito. A
especialização em Psicologia Jurídica é reconhecida no Brasil e, da mesma
forma, a profissão é reconhecida nos meios jurídicos. Porém, antes de
conhecermos melhor essa especialização, vale a pena apresentar brevemente o
histórico da Psicologia no Brasil. Alguns detalhes da história da psicologia
enquanto ciência (a nível mundial) e que possuem algum tipo de relação com a
Psicologia Jurídica estarão explícitos nesse material, mas faz-se importante
compreender como a profissão de psicólogo foi regulamentada no país.
Segundo Baptista (2010), o processo de regulamentação da profissão de
psicólogo levou anos para ser consolidado. Ao final da década de 1940, os
profissionais brasileiros começaram a se manifestar em prol da regulamentação,
ao mesmo tempo em que os primeiros cursos de especialização foram criados.

A Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962 (BRASIL, 1962), dispõe sobre os


cursos de formação em psicologia e regulamenta a profissão do psicólogo. Dois
anos depois foi promulgado o Decreto n° 53.464 de 21 de janeiro de 1964,
documento que regulamenta a Lei nº 4.119. Esse decreto, em seu artigo 4°,
elucida as funções do psicólogo. Já pensando na atuação do Psicólogo Jurídico –
a qual foi reconhecida posteriormente – destacam-se as seguintes funções:
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1) Utilizar métodos e técnicas psicológicas com o objetivo de:


a) diagnóstico psicológico; [...]
d) solução de problemas de ajustamento.
2) Dirigir serviços de Psicologia em órgãos e estabelecimentos públicos,
autárquicos, paraestatais, de economia mista e particulares. [...]
5) Assessorar, tecnicamente, órgãos e estabelecimentos públicos,
autárquicos, paraestatais, de economia mista e particulares.
6) Realizar perícias e emitir pareceres sobre a matéria de Psicologia
(BRASIL, 1964, art 4°).

Observamos aqui que a atuação do psicólogo pode ser útil ao meio


jurídico devido às suas funções de diagnóstico psicológico (e consequente
emissão de laudos), solução de problemas de ajustamento psicológico dos
indivíduos, assessoria técnica em instituições.

Importante destacar que mesmo antes da regulamentação, muitos


profissionais da psicologia já exerciam seu trabalho no Brasil e, após a
regulamentação, não apenas os profissionais que acabavam de formar poderiam
ter sua profissão regulamentada; diretrizes foram instituídas para que os
profissionais que já exerciam a função pudessem ser devidamente
regulamentados e, posteriormente, inscritos nos órgãos de classe.

A implantação da Lei e do Decreto supracitado foi essencial para a


regulamentação da profissão do psicólogo, porém, o processo não se encerrou
em 1964. Segundo Baptista (2010), o processo de regulamentação se encerrou
na década de 1970, época em que os principais atos regulatórios já haviam sido
aprovados e os conselhos de classe já haviam sido criados.

Assim como aconteceu com a Psicologia de modo geral, a psicologia


jurídica já era exercida no Brasil, porém os profissionais não eram organizados
em associações. Isso modificou na década de 1990, como expresso na citação a
seguir:

A Psicologia Jurídica, como campo de conhecimento e de pesquisa, já


existia no Brasil antes mesmo da regulamentação da profissão de
Psicólogo, sendo este o marco que possibilitou a inserção oficial destes
profissionais nas instituições jurídicas. No entanto, foi apenas na década
de 1990 que se iniciou um movimento no sentido de organizar os
psicólogos em uma associação de nível nacional. Nesta época, outros
países da América Latina também vinham numa crescente mobilização e
a criação da Associação Ibero-americana de Psicologia Jurídica (AIPJ)
na Argentina foi determinante para a mobilização em nosso país (ABPJ,
s.d., s.p.)
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Já sabemos o que é a Psicologia Jurídica e que, assim como em outros


países, no Brasil a atividade é regulamentada e bem organizada. Entretanto,
surgem outras questões:
 O que faz o psicólogo jurídico?
 Para que a especialização em psicologia jurídica?
 Como vou aprender a lidar com testes?

Tentaremos, ainda na introdução, responder esses questionamentos, de


vital interesse para o primeiro momento neste curso.
Para respondermos essa primeira pergunta: “O que faz o Psicólogo
Jurídico?” teremos que recorrer ao passado, para assim compreendermos quais
eram as atribuições iniciais do psicólogo jurídico e, atualmente, quais são elas.
Inicialmente a prática do psicólogo jurídico voltava-se apenas à avaliação
psicológica e posterior emissão de laudos que serviam para contribuir para a
tomada de decisão dos juízes.
Optamos, nesse primeiro material do curso de Psicologia Jurídica, por
fornecer subsídios básicos que nos levassem a compreender esse primeiro
momento da psicologia jurídica. O livro texto que será citado em vários momentos
da apostila é o clássico “Manual de Psicologia Jurídica” de Mira y López, cuja
primeira publicação data de 1932. Essa obra é uma das pioneiras na área e ilustra
a prática do psicólogo voltada para a avaliação e compreensão do indivíduo e
suas possíveis reações.
Atualmente, a Psicologia Jurídica sofreu uma série de reformulações e o
psicólogo que trabalha na área – seja no fórum; no sistema prisional; nas Forças
Armadas; ou em instituições para a aplicação de medidas socioeducativas ou
voltadas para o acolhimento de crianças e adolescentes, ou em outras instituições
– preza prioritariamente a assistência, o acolhimento, o respeito aos aspectos
psicológicos e emocionais envolvidos nas situações nas quais há intervenção da
lei. A questão dos direitos humanos passa a ser central nessa nova postura.
Ainda há espaço para a realização de avaliação psicológica e elaboração de
laudos – muitos dos quais essenciais ao trabalho de promotores, juízes,
defensores públicos, advogados e outros profissionais da área – porém, a
atuação do psicólogo jurídico é reconhecida e não se restringe a essas tarefas.
6

De posse dessas informações – as quais serão detalhadas ao longo deste


material – surge um novo questionamento: Por que a especialização em
psicologia jurídica?
Parte-se do pressuposto que, atualmente, ao graduar-se em psicologia e
associar-se à entidade de classe de sua região, o psicólogo generalista está apto
a atuar em diferentes campos. Entretanto, sabe-se que a prática é diferente da
teoria. Para uma atuação bem embasada, seja em qual área o psicólogo deseja
atuar, a especialização faz-se necessária, principalmente se levarmos alguns
pontos em consideração:
 a Psicologia é bastante ampla e serve de fundamento para vários outros
cursos. Hoje em dia, além da Psicologia Jurídica, existem outras especializações,
tais como a Psicologia Hospitalar, a Psicologia Escolar, a Psicologia
Organizacional, a Psicologia Clínica, a Psicologia do Esporte, dentre outras áreas.
Frente a essa infinidade de campos fica fácil compreender que dificilmente um
profissional terá ampla base teórica e experiência prática em todas as áreas, daí a
necessidade de uma especialização na área de sua escolha;
 frente a essa multiplicidade de áreas nas quais o psicólogo pode atuar,
muitas instituições têm optado dividir a graduação em ênfases – normalmente
uma mais voltada para a parte clínica e outra para a parte institucional. Assim,
desde a sua formação, o estudante já opta por qual caminho deseja trilhar, mas,
com isso, deixa de investir em sua formação em outras áreas. No caso da
psicologia jurídica, muitos acadêmicos concluem o curso sem nem ter cursado
essa disciplina. Outras instituições que mantêm o curso sem a divisão por
ênfases, devido à quantidade de disciplinas obrigatórias, acabam por deixar a
psicologia jurídica como uma disciplina eletiva, a qual acaba não sendo cursada
por todos.

Tendo isso em vista, compreendemos a necessidade do profissional que


deseja atualizar seus conhecimentos em Psicologia Jurídica ao buscar uma
especialização. Nesse sentido, faz-se importante esclarecer possíveis dúvidas.
Através da Resolução 014/00, o CFP discorre acerca da instituição do
título de especialista em psicologia que é concedido pelo respectivo Conselho.
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Esse é um ponto que precisa ser ressaltado, para se evitar possíveis divergências
de interpretação.
Entende-se, de maneira bem simplificada, que o Título Profissional de
Especialista é concedido pelo CFP, conforme regulamentado pela Resolução
014/00 (CFP, 2000). Por outro lado, os cursos de pós-graduação são aqueles
oferecidos por instituições reconhecidas pelo MEC (como o nosso caso).
Diferentemente do título de Especialista, que visa um título profissional, num
curso de pós-graduação – como este que você está cursando – o título é
acadêmico.
Em relação à formação acadêmica do psicólogo jurídico, a citação a
seguir complementa o que já foi falado e responde claramente ao nosso
questionamento: “Por que a especialização em psicologia jurídica?”:

Certamente este panorama que passamos a denominar de psico-jurídico


alerta as instituições responsáveis pela formação de psicólogos, que os
novos profissionais interessados neste campo de atuação, deverão ter
formação generalista e buscar sua especialização após a graduação. As
diretrizes curriculares aprovadas para os cursos de Psicologia propõem
esta formação genérica, dada a importância que se domine de maneira
aprofundada os conhecimentos básicos em Psicologia, para depois
adequá-los às várias necessidades que se apresentam na atualidade.
Portanto, temas como Psicologia do Desenvolvimento e da
Personalidade, Psicopatologia, Teorias e Técnicas de Avaliação
Psicológica e Intervenção, dentre outros, são fundamentais para a
inserção do psicólogo no campo jurídico. A partir daí, o profissional pode
ser beneficiado pela formalização de espaços acadêmicos que incitem a
reflexão, a crítica e o estudo da prática psicológica na justiça, fornecendo
subsídios para atuação inovadora e contextualizada à realidade
brasileira (ROHERIG, 2007, p.22).

A citação mostra, também, que para a formação do psicólogo jurídico


temas como Psicologia do Desenvolvimento e da Personalidade, Psicopatologia,
Teorias e Técnicas de Avaliação Psicológica e Intervenção, dentre outros, são
essenciais. Sabemos que esses temas são presentes em todos os cursos de
graduação, mas, em nível de pós-graduação, faz-se necessário recapitulá-los e
aprofundá-los, porém voltando o seu enfoque para o curso em questão. Isso será
feito nesta apostila, que trata de muitos desses temas, e em outras.

Realizamos a divisão desses temas ao longo do curso de forma que cada


tema básico, por assim dizer, apareça na apostila que versa sobre um assunto
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diretamente relacionado ao mesmo. Objetivamos, com isso, facilitar os seus


estudos e, consequentemente, promover uma melhor aprendizagem.

Finalmente surge a última questão: “Vou aprender a lidar com testes?”.


Os testes psicológicos não estão no escopo deste material. Os mesmos são
apresentados ao futuro psicólogo na graduação e, posteriormente, caso ele tenha
necessidade de aprofundar seus estudos na área, faz-se necessário cursar um
curso específico na área. O Conselho Federal de Psicologia apregoa que a
aplicação de testes é instrumento privativo do psicólogo, conforme expresso na
Lei nº 4.119 (BRASIL, 1962), que fala sobre a avaliação psicológica. Portanto,
interpretando essa diretriz à risca, consideramos que especificamente, a questão
dos testes psicológicos não deva ser utilizada em EaD, já que não encontramos
nenhum documento que se referisse explicitamente a essa situação.

A EaD atualmente é uma ferramenta bastante positiva, pois promove a


democratização da educação, principalmente onde não há formação presencial
disponível para aquele que deseja se aperfeiçoar. O aluno tem a vantagem de
construir seu próprio conhecimento onde e quando for mais conveniente para ele,
o que acaba por promover maior adesão aos estudos num ritmo próprio, diferente
do padronizado nas salas de aula. Com este curso, pretendemos levantar várias
discussões imprescindíveis ao trabalho do Psicólogo Jurídico.

Os objetivos deste material encontram-se na primeira página. Os principais


autores pesquisados foram Mira y López (2015), Página do Conselho Federal de
Psicologia (CRP – Código de Ética Profissional e Resoluções), ROEHRIG (2007);
Gazzaninga e Heatherton (2005), Fadiman e Frager (1986), Sternberg (2010),
Hall e Lindzey (1984), dentre outros livros e artigos científicos indexados em
bases de dados.
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UNIDADE 1 – BREVE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

A Psicologia percorreu um grande percurso histórico para atingir o status


de ciência e profissão. Seria impossível delinear esse trajeto em poucas páginas,
visto que muitas escolas diferentes foram surgindo – muitas das quais são
utilizadas até hoje devido à sua credibilidade.

Diversos investigadores descobriram técnicas diferentes que lhes


permitiram chegar a diversas concepções para a descrição
compreensiva dos fatos e leis da vida mental; por conseguinte, o estado
atual se caracteriza pela simultânea existência de distintas escolas
psicológicas; cada qual delas em sua esfera é digna de atenção e
respeito, desde que não procure sair dos limites do empirismo para
invadir o terreno da metafísica ou da filosofia (MIRA Y LOPÉZ, 2015,
p.12).

Além disso, tomamos o cuidado de selecionar algumas escolas que


possuem relação com o Direito, visto que compreendemos a Psicologia Jurídica
como uma interface entre questões da Psicologia aplicadas ao contexto jurídico.
A Psicologia e o Direito trazem muitos pontos em comum desde os seus
primórdios – ambos são cursos da área de Humanas e uma de suas bases
repousa na Filosofia:

Normalmente os historiadores da Psicologia identificam suas primeiras


raízes em duas abordagens diferentes para a compreensão da mente
humana:
 a Filosofia busca entender a natureza geral de muitos aspectos do
mundo, parte por meio da introspecção, ou seja, o exame das ideias e
experiências internas (intro = para dentro; spectione = olhar,
inspecionar).
 a Fisiologia busca um estudo científico das funções vitais dos
organismos vivos, basicamente por meio dos métodos empíricos
(baseados na observação) (STERNBERG, 2010, p.3).

Diferentemente da Psicologia, o Direito não proveio da Fisiologia. Essa


origem faz com que a Psicologia fique, muitas vezes, “no meio” entre as áreas de
Humanas e de Saúde. Compreendemos que para a psicologia jurídica, essa base
da fisiologia também se faz necessária, visto que o psicólogo que atua nessa área
precisa compreender questões relacionadas ao cérebro, à psicopatologia, dentre
outras questões que são de interesse da área da saúde.
A partir dessas correntes psicológicas surgiram várias outras linhas,
muitas das quais de vital importância para a psicologia enquanto ciência e
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profissão até os dias de hoje. Entende-se que a psicologia pode ser aplicada
diretamente pelo profissional da psicologia em diferentes contextos, como, por
exemplo, clínico, educacional, hospitalar, jurídico, dentre outros, ao mesmo tempo
que pode servir de subsídio para o entendimento do funcionamento psíquico do
ser humano. Por isso, a psicologia é uma disciplina que serve como base para a
formação de outros profissionais que também lidam com seres humanos – sejam
das áreas da saúde, educação ou humanas, por exemplo – e carregam, desde os
seus primórdios, as bases na filosofia e na fisiologia – assim como a psicologia –
como pudemos observar nesse breve histórico.
A palavra “Psicologia” remete ao grego psyché, que significa “alma”, e
logos, que significa “razão”. Assim, inicialmente compreende-se psicologia como o
estudo da alma (MAIA, 2008).
Schultz e Schultz (1992) elucidam que para a sua efetivação enquanto
ciência e profissão – tal como se estabeleceu nos dias de hoje – a psicologia
sofreu influência da fisiologia e da filosofia.
“Sabe-se que a psicologia se desenvolveu no fim do século XIX como
fruto da filosofia e da fisiologia experimental” (HALL, LINDZEY, 1984, p.3).
Descartes (1596-1650) inaugurou a psicologia moderna ao sugerir que a
mente influencia o corpo, ao mesmo tempo em que o corpo pode exercer sobre a
mente uma influência maior do que até então se supunha, o que é um grande
avanço, pois, desde as ideias de filósofos clássicos, como Platão, acreditava-se
que a mente (ou alma) e o corpo possuíam naturezas diferentes. Observa-se que
aqui já não se fala mais em alma, como na definição clássica de psicologia, mas
em mente (SCHULTZ; SCHULTZ, 1992).

A ideia mais radical de Descartes foi sugerir que, embora a mente


conseguisse afetar o corpo, o corpo também conseguia afetar a mente.
Por exemplo, ele acreditava que paixões, como amor, ódio, tristeza,
surgiam do corpo e influenciavam os estados mentais, embora o corpo
agisse sobre essas paixões por meio de seus mecanismos. Dessa
maneira, Descartes aproximou mente e corpo ao focalizar suas
interações (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005, p.48).

Retomando a ideia que levantamos anteriormente sobre as diversas


escolas psicológicas existentes, citaremos a seguir nove grandes direções
metodológicas da Psicologia enumeradas por Mira y López como aquelas que
possuem conexão direta com o Direito. Optamos por esse livro texto, visto que é
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um material de renome na área, cuja primeira edição data de 1932 e é uma obra
que sempre ganha novas edições devido à sua grande importância. Porém,
ressaltamos que não iremos aprofundar no estudo de todas essas escolas,
apenas as que se mostrem mais relevantes para nós no momento, pois não
podemos desconsiderar que em grande parte de sua trajetória profissional, o
autor não esteve no Brasil (o que pode modificar o foco), além do que, com o
passar dos anos, novas tendências também foram surgindo. Assim, pretendemos
discorrer de forma mais aprofundada sobre poucas escolas, escolhidas por serem
relacionadas à psicologia jurídica, mas também por serem uma tendência na
psicologia brasileira atual. A tabela a seguir mostra essas correntes psicológicas:

Tabela 1: Direções metodológicas da psicologia relevantes para a Psicologia


Jurídica

Escola Psicológica Principais representantes


Funcionalismo (SCHULTZ; SCHULTZ, 1992) Münsterberg (SCHULTZ; SCHULTZ, 1992)
Psicologia Condutista ou Condutismo Watson
Psicologia da Forma, Configuracional ou Wertheimer
Gestalt
Psicanálise e Neoanálise Freud
Alexander
Psicologia Personalística Stern
Psicologia Genético-Evolutiva Krueger
Werner
Psicologia Neuro-Reflexológica Betchterew
Pavlov (no nosso material também representa
o Behaviorismo ou Comportamentalismo)
Psicologia Tipológica Kretschmer
Sheldon
Psicologia Patológica Jaspers
Janet
Psicologia Social Murphy
Allport
Fonte: adaptado de Mira y López (2015, p.13-14) e Schultz e Schultz (1992).
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Os nomes das escolas e dos autores que aparecem em destaque na


tabela sinalizam aqueles que serão abordados mais detalhadamente a seguir.

1.1 Funcionalismo

Não iremos aprofundar nos métodos apregoados pela corrente do


funcionalismo, aqui o nosso objetivo se restringe a falar brevemente sobre as
escolas que, de alguma forma, relacionam-se diretamente com a psicologia
jurídica.

Uma Escola anterior, o Estruturalismo, estudava, como diz o nome, as


estruturas psicológicas, já o Funcionalismo voltou seu foco para o funcionamento
da consciência, ou seja, “a utilidade ou o propósito dos processos mentais para o
organismo vivo em suas permanentes tentativas de adaptar-se ao seu ambiente”.
Observa-se, a partir dessa definição, que o termo “funcionalismo” não foi
claramente definido, fato esse que abriu margem para várias críticas a essa
escola psicológica (SCHULTZ, SCHULTZ, 1992, p.143).

Segundo o funcionalismo, a mente passou a existir no decorrer da


evolução humana e funciona do jeito que funciona porque é útil para
preservar a vida e transmitir genes para futuras gerações. Em outras
palavras, ela ajuda o organismo a se adaptar às demandas ambientais.
Em termos do problema mente-corpo, a maioria dos funcionalistas via os
estados mentais como resultantes das ações biológicas do cérebro, o
que caracterizaria a mente por ser ela própria um mecanismo fisiológico
(GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005, p.51).

Essas ideias do funcionalismo fizeram com que os psicólogos se


interessarem a tornar a psicologia mais prática, ou seja, buscaram aplicar os
conhecimentos em psicologia aos problemas da vida real, ao invés de se focarem
apenas aos estudos em laboratório. A partir da investigação do funcionamento
psicológico de animais, crianças, povos primitivos e pessoas com deficiência
mental é possível para o psicólogo descobrir variações significativas e úteis na
vida mental (SCHULTZ, SCHULTZ, 1992).

“O Funcionalismo busca entender o que as pessoas fazem e por que o


fazem” (STERNBERG, 2010, p.5).

Apesar de não existir hoje enquanto corrente psicológica, o funcionalismo,


enquanto atitude ou perspectiva geral, tornou-se parte da principal corrente de
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psicologia americana. Um ponto que merece destaque em nosso estudo de


psicologia jurídica é que essa escola desenvolveu, além do método de
introspecção (que não será detalhado), outras técnicas para a obtenção de dados,
como os testes mentais, os questionários e as descrições objetivas de
comportamento (SCHULTZ, SCHULTZ, 1992).

De acordo com Sternberg (2010), o funcionalismo apregoava que a chave


para a compreensão da mente humana e dos comportamentos era entender
como a mente funciona, por que funciona, dentre outras indagações relacionadas
ao funcionamento da mente.

Münsterberg foi um nome de destaque nessa corrente devido ao fato de


buscar a aplicação da psicologia em diversas áreas, inclusive a forense.

Münsterberg escreveu uma série de artigos sobre tópicos como o uso da


hipnose no interrogatório dos suspeitos, formas de evitar o crime,
detecção de pessoas culpadas por meio do uso de testes mentais e o
caráter inconfiável das testemunhas oculares. [...] Em 1908, ele publicou
On the Witness Stand (No Banco das Testemunhas), que descrevia os
problemas das testemunhas oculares. A obra também considerava
outros fatores psicológicos que podem afetar o resultado de um
julgamento, tais como as falsas confissões, o poder de sugestão no
interrogatório de testemunhas e o uso de medidas fisiológicas (a taxa de
batimentos cardíacos, a pressão sanguínea, a resistência da pele) para
detectar estados emocionais alterados num suspeito ou réu (SCHULTZ,
SCHULTZ, 1992, p.199).

A questão do testemunho ocular é um tema relacionado aos processos


psicológicos básicos e merece investigação até nos dias de hoje. Numa outra
seção desta mesma apostila, iremos falar mais sobre isso.

1.2 Psicologia da forma (Gestalt)

“De acordo com a teoria da Gestalt, o todo da experiência é muito maior


do que simplesmente a soma de seus elementos constituintes, ou o todo é muito
maior do que a soma das partes” (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005, p.52).

A gestalt é também denominada psicologia da forma. Estudos mostram


que a percepção dos objetos é subjetiva e dependente do contexto. Para
comprovar essa hipótese, alguns desenhos (como o expresso na figura a seguir)
foram apresentados para que diferentes pessoas os descrevessem.
14

Figura 1: Rosto e jarros


Fonte: Canha (2014).
Observa-se que há diferentes percepções da mesma figura. Há pessoas
que primeiro enxergam dois rostos, outras visualizam um vaso. É difícil perceber
as duas imagens ao mesmo tempo, mas a mesma pessoa pode visualizar ambas,
uma de cada vez.

Assim, a sua mente organiza a cena em um todo perceptivo, de modo


que você vê o desenho de uma maneira específica. A lição importante da
psicologia da Gestalt é que a mente percebe o mundo de forma
organizada, que não pode ser dividida em seus elementos constituintes
(GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005, p.52-53).

Mesmo parecendo uma escola voltada apenas ao estudo da percepção, a


psicologia da Gestalt também contribui com a Psicologia Jurídica, visto que os
fenômenos perceptivos que essa escola aborda não são apenas os objetivos,
como também os subjetivos, também passíveis de uma interpretação:

[...] o ato delituoso é também uma estrutura (Gestalt) que não pode ser
esmiuçada ou decomposta – como fazem os juristas – para ser
deduzida. Toda tentativa de “análise” do delito, no sentido clássico, está
sujeita a chegar a conclusões errôneas e assim, por exemplo, ante a um
crime é completamente errado perder tempo em considerar se o
indivíduo deu uma punhalada a mais ou a menos, se elas foram ou não
“necessariamente mortais” etc.; a situação deve ser, antes, concebida
em suas origens e ser focalizada sem solução de continuidade até o
desenlace. É o que fazem alguns defensores hábeis, mas lhe falta para
merecer o qualificativo de científico não só a “objetividade” como
também a “técnica” necessária para a recoleção, compreensão e
avaliação dos mal denominados “antecedentes do delito” (MIRA Y
LÓPEZ, 2015, p.21).

Recapitulando, a partir de uma abordagem gestáltica só é possível


compreender melhor os fenômenos psicológicos quando se olha para eles como
15

todos organizados e estruturados. Por outro lado, não é possível compreender


totalmente o comportamento quando os fenômenos que o compõem são
desmembrados em partes menores (STERNBERG, 2010).

Essa abordagem reforça – como expresso na citação anterior – porque a


análise de um delito pode ocasionar em interpretações errôneas caso o todo seja
decomposto em partes analisadas separadamente.

1.3 Behaviorismo
Nessa subseção, pretendemos apenas apresentar a escola behaviorista e
a contribuição de um de seus principais teóricos para a evolução da psicologia
jurídica. Na seção a seguir, retomaremos ao estudo desse tema, porém voltado
para a dinâmica da personalidade.
“Behaviorismo – nasceu nos Estados Unidos, com Watson, elevando o
status de ciência à psicologia.” (MAIA, 2008, p.16).
Seu fundador foi Watson (1878-1958), mas teve também outros nomes de
grande importância, Skinner (1904-1990) e Pavlov (1849-1936). O behaviorismo
ou comportamentalismo enfatiza o papel do ambiente no comportamento
(SCHULTZ; SCHULTZ, 1992; GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005).
O behaviorismo ou comportamentalismo preconiza uma abordagem mais
científica da psicologia e, em linhas gerais, enfatiza o papel das forças ambientais
no comportamento humano. Os primeiros estudos dos behavioristas
(comportamentalistas) aconteceram em laboratórios de psicologia, com animais.
(GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005).
Para o behaviorismo há dois tipos de comportamento que merecem
destaque para nós: o respondente e o operante. Segundo Schultz e Schultz
(1992), no comportamento respondente “a resposta comportamental é suscitada
por um estímulo observável específico” (p.281), enquanto que no
condicionamento operante “a resposta do organismo é aparentemente
espontânea – no sentido de não estar relacionada com nenhum estímulo
observável” (p.281).
Pavlov não representou apenas o behaviorismo, mas também a corrente
denominada psicologia neuro-reflexológica, linha essa que contribuiu com a
evolução da psicologia jurídica. Seu estudo baseia-se no estudo sistemático dos
16

reflexos condicionados e explica todas as reações dos indivíduos a partir da


interação de dois processos fundamentais: a excitação e a inibição. Esses
processos atuam nos diversos planos funcionais do sistema nervoso central
(MIRA Y LÓPEZ, 2015).
Com base nesses fundamentos, torna-se relevante para o psicólogo
jurídico refletir que:
A concepção neuro-reflexológica explica, igualmente, a ineficácia das
sanções (penas e castigos) para conseguir evitar a reincidência: esta
requereria a formação de um deflexo condicional negativo ante a
situação delitógena e para isso, os estímulos inibidores teriam que ser
aplicados de um modo que estivessem de acordo com as leis de
formação e extinção desse tipo de reflexo, o que não sucede agora nem
por causalidade, uma vez que a sanção é sempre a posteriori, distante e
continuada (isto é, sem intervalos) (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.23).

1.4 Psicanálise
Daremos bastante ênfase no estudo da Psicanálise ainda nesta apostila,
quando iremos expor a dinâmica da personalidade do indivíduo. Agora
pretendemos apenas explanar brevemente sobre essa importante escola e
associar alguns de seus conceitos à psicologia jurídica.
“Psicanálise – nasceu com Freud, na Áustria, a partir da sua prática
médica. Postula o inconsciente como objeto de estudo. Enfatiza que
determinados impulsos instintivos seriam de origem sexual” (MAIA, 2008, p.16).
Ao contrário das escolas psicológicas da época que enfatizavam o estudo
do consciente, Freud propôs um novo ponto de vista ao considerar a importância
do inconsciente na dinâmica da personalidade e no surgimento das neuroses.
Além disso, postulou que a sexualidade é o cerne de grandes conflitos
inconscientes.
Freud deduziu que grande parte do comportamento humano é
determinada por processos mentais que operam abaixo do nível do
conhecimento consciente, no nível do inconsciente. Freud acreditava que
as forças mentais inconscientes muitas vezes entravam em conflito, o
que produzia desconforto psicológico e, em alguns casos inclusive,
alguns transtornos mentais aparentes (GAZZANIGA; HEATHERTON,
2005, p.53).

Segundo Freud (1856-1939 apud JORGE; FERREIRA, 2002, p.7-8),


criador da psicanálise: “Todas as criações humanas, sem exceção – os esportes,
17

as artes, a ciências etc. -, estão ancoradas num desejo sexual indestrutível que
constitui o núcleo do inconsciente”

O objetivo da psicanálise freudiana é trazer à percepção consciente


lembranças ou pensamentos reprimidos, que ele supunha ser a fonte do
comportamento anormal do paciente. [...] Mediante a livre associação,
Freud descobriu que as lembranças do paciente iam invariavelmente à
infância, e que muitas das experiências reprimidas de que o paciente se
recordava tinham relação com questões sexuais (SCHULTZ; SCHULTZ,
1992, p.335).

A psicanálise enquanto método de intervenção psicológica visa à cura das


neuroses através do processo de associação livre – expresso na citação anterior.
As primeiras pacientes curadas pela psicanálise foram as histéricas e, através das
sessões com as pacientes, Freud pôde compreender melhor o funcionamento
psíquico, a etiologia e a cura das neuroses.
O mecanismo de recalque (ou repressão) é compreendido como um
mecanismo de defesa do ego, opera inconscientemente, de modo que a pessoa
não tem consciência do que está acontecendo. Ao reprimir (recalcar) um
conteúdo, a pessoa está enviando para o inconsciente algum tipo de conteúdo
que causa dor, sofrimento, vergonha, repulsa ou medo muito grandes a ela, de
forma que o sofrimento de ligar com esses sentimentos iria trazer prejuízos muito
grandes ao seu ego. Hall e Lindzey (1984, p.39) ilustram sobre o processo de
reclaque (repressão):

As repressões, uma vez formadas, são difíceis de desfazer. A pessoa


procura assegurar-se de que o perigo não existe mais, o que só
consegue quando a repressão é suspensa e a realidade pode ser
encarada de frente. É como um círculo vicioso. Essa é a razão por que o
adulto conserva medos infantis. Nunca tem a possibilidade de descobrir
que esses medos têm base na realidade.

A Psicanálise – assim como o funcionalismo, a gestalt, o behaviorismo e


as outras escolas que não iremos enfatizar aqui – também contribuiu para a
psicologia jurídica. Mira y López (2015) afirma que a psicanálise oferece à
psicologia jurídica subsídios para a compreensão da conduta delituosa, da
psicologia do testemunho, de algumas atitudes reivindicatórias e de alguns erros
judiciais cometidos até mesmo por juízes experientes.
18

Um ponto central na teoria de Freud (que será apenas superficialmente


abordado aqui devido à sua complexidade) e diretamente relacionado com a
psicologia jurídica é a transferência. Esse fenômeno foi observado por Freud na
relação que seus clientes estabeleciam com ele – o analista:

A transferência é uma manifestação do universo subjetivo do paciente,


que encontrou na figura de determinado cuidador a possibilidade de
manifestação, pois é compatível com as condições de relação
previamente estabelecidas pelo sujeito. É a transferência de sentimentos
de amor, raiva e ódio que muitas das vezes os pacientes nos remetem
(ALVES; OLIVEIRA, 2010, p.67).

Mira y Lopéz (2015) elucida que o princípio da transferência é de grande


interesse para o profissional da área jurídica, pois esse explica inúmeras
transgressões (simbólicas) que acontecem no dia a dia da rotina judiciária. O
princípio da repressão (censura ou reclaque) ilustra que certas situações (de
alguma forma interpretadas como agressivas pelo indivíduo) são “expulsas” da
consciência e tornam-se conteúdo inconsciente, impossível de ser lembrado. O
autor ilustra o delinquente que vive lutando contra o seu remorso.

1.5 Psicologia social

Assim como elucidamos nas subseções anteriores, este tema também


será aprofundado na seção a seguir, por isso aqui, iremos apenas definir
conceitos básicos acerca dessa área da psicologia que também oferece subsídios
para a psicologia jurídica.

Partimos do pressuposto de que o homem é um ser social, ou seja, as


interações que se estabelecem com outras pessoas moldam quem somos e como
compreendemos o mundo. A psicologia social é o ramo da psicologia que
investiga a influência das outras pessoas no modo do indivíduo pensar, sentir e
agir (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005).

A psicologia social investiga temas como estereótipos, preconceitos,


agressividade, dentre outros. Focaremos no estudo da agressividade – devido à
sua íntima relação com o delito – na próxima seção desta apostila.

As reações do indivíduo passam a ser compreendidas considerando-se


alguns fatores, tais como o ambiente social; a pressão social e as contrapressões
19

que o indivíduo sofre e exerce em suas inter-relações; os recursos disponíveis


(considerando-se tempo, lugar e circunstância social) para garantir o melhor
ajustamento possível das equações indivíduo X grupo e grupo X indivíduo (MIRA
Y LOPÉZ, 2015).

A partir dessa perspectiva, investigaram-se as ideologias, aspirações,


propósitos e condutas de pessoas caracterizadas como frustradas e desajustadas
socialmente. Esse tipo de estudo é muito válido para a psicologia jurídica e
também marca um novo olhar sobre os comportamentos delinquentes: estes
deixam de ser atribuídos apenas ao individuo, mas também aos grupos:

Principalmente, o estudo das oscilações da agressividade, das mutações


radicais do nível de aspirações e dos fatos mais convenientes para uma
mudança de atitude ou de opinião em diversos problemas de conduta,
conduziram a uma nova concepção e enfoque das transgressões legais,
quanto à sua profilaxia e correção coletivas. De acordo com isso, já não
se trata o delinquente isolado, mas procura também tratar e corrigir
grupos delinquenciais, podendo estabelecer-se uma verdadeira
terapêutica social, baseada em fatos psicológicos irrefutáveis (MIRA Y
LOPÉZ, 2015, p.28).
20

UNIDADE 2 – TEORIAS DA PERSONALIDADE

2.1 O que é personalidade


Compreender o conceito de personalidade (ou aprofundar o seu estudo)
se faz necessário para o psicólogo que deseja atuar em diferentes áreas,
inclusive a jurídica, visto que a sociedade e a justiça muitas vezes precisam
compreender se fatores subjacentes à personalidade de determinado indivíduo
influenciaram o acontecimento de determinada situação, por exemplo. A
personalidade é a marca característica do indivíduo, mas não é imóvel, sofre
transformações.

A personalidade, síntese funcional do organismo humano, não pode de


modo algum ser concebida como alguma coisa rígida e estática, incapaz
de evoluir no tempo; ao contrário, o indivíduo modifica-se com a idade e,
do mesmo modo, como as marcas dessa alteração se traduzem em
modificações corporais morfológicas, dão lugar também a alterações do
aspecto de sua personalidade. Existe, até certo ponto, uma norma geral
de evolução da personalidade, de suma importância para o jurista, pois,
sem seu conhecimento não chegará nunca a compreender devidamente
os problemas psicológicos suscitados por seus clientes (MIRA Y LOPÉZ,
2015, p.67).

Partimos do pressuposto de que a personalidade garante a singularidade


psicológica do indivíduo (assim como comparamos que sua composição genética
carrega componentes que o caracterizam como indivíduo único). A personalidade
se estrutura a partir da interação de um potencial herdado em contato com o
ambiente.
Segundo Mira y López (2015), o recém-nascido nasce em situação de
total vulnerabilidade e não tem condições de sobreviver sem os cuidados dos
pais. Entretanto, esse pequeno ser é dotado de um potencial energético
transmitido através da hereditariedade e, a partir desse potencial e dos estímulos
presentes no meio em que ele está inserido, desenvolve uma série de reações,
cada vez mais complexas, que irão constituir sua vida interior, de
autoconhecimento, que o levará à categoria de ser consciente dotado de uma
personalidade que lhe é peculiar.
Procuraremos abordar nessa seção algumas teorias da personalidade,
considerando a diversidade de aspectos, segundo os teóricos seguidores da
mesma, que influenciam na estrutura da personalidade humana. Existem diversas
21

teorias de personalidade, porém, para fins didáticos, selecionamos apenas


algumas. Sabemos que cada teoria da personalidade carrega consigo
características de extrema importância, mas como o intuito desse material é
relacionar as teorias com a práxis do psicólogo jurídico, procuraremos abordar
apenas as mais relacionadas ao assunto.

Segundo a abordagem psicodinâmica, os motivos e conflitos


inconscientes que são experienciados durante toda a vida, mas
especialmente na infância, moldam a personalidade. Os humanistas
acreditam que cada pessoa é única e capaz de realizar um grande
potencial. Os teóricos do traço descrevem o comportamento das
pessoas com base em disposições de traços. Os teóricos cognitivo-
sociais focalizam como as interpretações e crenças cognitivas afetam a
percepção das pessoas de seu ambiente social. Essas variadas
abordagens não se opõem, necessariamente, umas às outras. Elas
compartilham o objetivo comum de tentar compreender de que maneira
as pessoas são semelhantes e diferentes entre si (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005, p.479).

Existem várias teorias, as quais divergem e convergem em vários


aspectos, e podem ser definidas como tentativas desses diferentes teóricos para
formular ou representar aspectos significativos do comportamento humano.
Falamos sobre personalidade desde em rodas de conversa informais até nos
meios acadêmicos, mas o que é personalidade?
Gazzaninga e Heatherton (2005) definem que:

A personalidade se refere às características, respostas emocionais,


pensamentos e comportamentos do indivíduo que são relativamente
estáveis ao longo do tempo e em diferentes circunstâncias. Os
psicólogos da personalidade estudam os processos básicos que
influenciam o desenvolvimento da personalidade em diversos tipos de
análise, tal como a influência da cultura, aprendizagem, biologia e fatores
cognitivos. Ao mesmo tempo, os que estudam a personalidade estão
mais interessados em compreender pessoas na sua totalidade. Isto é,
eles tentam entender o que torna cada pessoa única. (p.471)

Já Hall e Lindzey (1984), importantes teóricos sobre o assunto, afirmam


que é impossível definir personalidade de forma geral, sem, para isso, lançar mão
dos conceitos de determinada teoria. Os autores enumeram alguns aspectos que
se relacionam ao conceito, como habilidades sociais (caracterizam-se o indivíduo
a partir de traços de personalidade, sejam eles positivos, ou negativos, como, por
exemplo, uma “personalidade agressiva”); mediadora ao ajustamento do
indivíduo; essência do homem (aquilo que é mais característico do indivíduo).
22

Gazzaninga e Heatherton (2005) acrescentam que, dentre as diferentes teorias da


personalidade existentes, atribuem-se como fatores determinantes da
personalidade fatores biológicos e genéticos, cultura, padrões de reforço ou
processos mentais e inconscientes.
Falamos em traços de personalidade ao nos referir a características das
pessoas, como, por exemplo, extrovertidas e introvertidas. Esses traços de
personalidade podem ser definidos como uma tendência para a pessoa agir de
determinada maneira, ao longo dos anos, em diferentes situações
(GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005).

2.2 Desenvolvimento da personalidade


Antes de explorarmos algumas teorias da personalidade iremos
apresentar brevemente como ocorre a evolução da personalidade.

Tabela 2: Evolução da personalidade ao longo do desenvolvimento humano

Período Características principais

Infância - Curiosidade, experimentação. Divide-se em quatro períodos:


 período dos interesses perceptivos – a criança volta-se para tudo o que
estimula os seus órgãos sensoriais;
 período dos interesses glóssicos – por volta do segundo ano há o
desenvolvimento da linguagem e expansão do vocabulário;
 período dos interesses intelectuais gerais – por volta dos quatro anos,
fase dos “por quês”;
 período dos interesses especiais – dos sete aos doze anos, o interesse da
fase anterior torna-se mais especializado.

- Na criança menor é notável a presença do pensamento mágico


(projeção da personalidade infantil para o exterior, não distingue fantasia
e realidade).
- Com o passar dos anos, a criança começa a realizar a separação entre
o real e o imaginário e apresentar ambivalência (reação oposta ante um
mesmo estímulo: de um lado a partir de sua própria concepção, por outro
lado, dependente da concepção objetiva proveniente dos adultos ao seu
redor).
- Entre 10 a 12 anos a personalidade distingue perfeitamente fantasia de
realidade (juízo de realidade); o pré-adolescente já sabe a conduta social
adequada para cada situação.

Juventude  Pensamento abstrato (capacidade de estabelecer relações lógicas entre


conceitos gerais).
 Aquisição de responsabilidade social.
 Término do desenvolvimento da sexualidade.
 A personalidade adolescente organiza e pondera conhecimentos
23

concretos adquiridos anteriormente e estabelece seus conceitos e


crenças gerais.
 Excesso de agressividade, desejo de independência que oscila com
períodos de regressão à Infância.
 Parece que a família não se encontra totalmente preparada para
favorecer a normal evolução da personalidade do jovem, o que faz com
que muitos adolescentes dissimulem sua própria personalidade em casa.
 “A consideração desses fatos psicológicos é da maior importância para
compreender múltiplos problemas suscitados pela delinquência infantil;
toda a afetividade encontra-se exagerada e transformada ao ter que se
adaptar a novas concepções ideológicas, até então não suspeitadas. [...]
Nessa época podem dar mostras, ao mesmo tempo, do maior egoísmo e
do mais sublime altruísmo, da mais fina sensibilidade e da mais fria
indiferença ou ‘impermeabilidade sentimental’, por isso, devemos evitar
bastante estabelecer um prognóstico da definitiva evolução moral ou
caracterológica de um jovem, sem conhecer se seus fatos atuais
correspondem ao observado na infância” (p.73).

Estado  Personalidade estruturada, o que permite o seu melhor reconhecimento e


adulto classificação.
 Equilíbrio entre a atitude agressiva e romântica juvenil e a atitude
medrosa e positivista da velhice.
 “No campo psicológico social, isso é, da conduta delituosa, é
característica masculina a menor frequência com que faz uso da
violência, mas com menor intensidade desta; em troca, é característica
feminina a fácil ‘perda de controle’, mas com as leves consequências
dessa queda moral” (p.87).
 Acentuam-se as diferenças psicológicas entre homem e mulher:

Homem Mulher

 Culto ao poder e à força.  Culto ao querer e à graça.


 Propensão para a conquista.  Propensão para a conservação.
 Interesse fundamental.  Interesse pelo detalhe.
 Tendência à experimentação.  Tendência à contemplação.
 Tendência à abstração.  Prefere o gozo.
 Prefere o prestígio.  Usa mais julgamentos de valor.
 Usa mais julgamentos de  Tendência à atitude masoquista.
forma.  Suporta mais a dor do que a
 Tendência à atitude sádica. pena.
 Encoleriza-se mais que  Tendência à dúvida, admite
assusta. mais facilmente seus erros.
 Maior resistência à pena que à  Maior conhecimento intuitivo.
dor (física).  Mobilidade suave, grácil,
 Decisões rápidas. delicada e curvilínea (p.87).
 Dificuldade de confessar seus
erros.
 Maior conhecimento lógico.
 Mobilidade ampla, segura,
enérgica, angulosa. (p.86-87).

Maturidade  Alteração do funcionamento genital normal e na dinâmica das relações


familiares (saída dos filhos de casa, promoção a posições sociais ou
profissionais diferentes, etc).
 Proximidade com a velhice e com o inevitável fim da vida faz com que as
tendências egoístas da personalidade atinjam seu ápice.
24

Velhice ou  Progressiva diminuição da eficiência das funções psicológicas, dentre elas


senilidade a atenção, o que faz com que as pessoas mais velhas sejam más
testemunhas, mesmo se apresentarem boa fé.
 Tendência a apresentar reações psicológicas de prejuízo ou perseguição
(o que pode gerar boletins de ocorrência ou processos que não são
embasados na realidade, mas no estado senil).
 Necessidade de modificação de testamentos pode ser complicada para o
idoso e os herdeiros.

Fonte: Adaptado de Myra y López (2015).

A seguir tentaremos expor duas teorias que realizaram o estudo da


personalidade, porém vale a pena ressaltar que todas são teorias bastante
complexas e muito embasadas. Para fins didáticos, selecionamos apenas
aspectos de cada teoria que irão se relacionar com os temas abordados ao longo
do curso, portanto, muitos pontos também importantes de cada uma não serão
abordados aqui.

2.3 Teorias psicodinâmicas


A principal teoria psicodinâmica é a teoria de Freud, a qual será
explicitada a seguir. Entende-se por psicodinâmicas por que são teorias que
enfatizam os processos inconscientes e dinâmicos. O principal pressuposto da
teoria da personalidade de Freud é que as forças inconscientes (instintos –
pulsões), como os desejos e motivos influenciam o comportamento humano.
Para Freud, o corpo é a fonte básica de toda experiência mental. Ele
apregoa a ideia do determinismo psíquico, ou seja, cada evento mental decorre
de intenções conscientes ou inconscientes (a grande maioria), em outras
palavras, do ponto de vista psíquico nada ocorre como obra do acaso (FADIMAN;
FRAGER, 1986).
No estudo sobre a personalidade numa perspectiva psicodinâmica,
partiremos do ponto em que Freud propôs a divisão da mente em três partes: o
consciente, o pré-consciente e o inconsciente. Na primeira tópica da
personalidade Freud propôs o modelo topográfico da mente, em que comparou a
mente com um iceberg.
25

Figura 2: Modelo topográfico da mente.


Fonte: EXPANDIR A MENTE (2009).

Em síntese, pode-se compreender sobre cada uma dessas instâncias que


compõem a primeira tópica do aparelho psíquico (FADIMAN; FRAGER, 1986):
 Consciente – contém pensamentos dos quais as pessoas estão cientes.
Recebe informações do mundo exterior e interior (percepção, atenção,
raciocínio – processos cognitivos);
 pré-consciente – zona intermediária que abriga conteúdos que não estão
corretamente no inconsciente, mas podem ser trazidos à consciência com
um certo esforço. “O pré-consciente é como uma vasta área de posse das
lembranças de que a consciência precisa para desempenhar suas funções”
(FADIMAN; FRAGER, 1986, p.8);
 inconsciente – parte maior, mais importante e mais profunda do iceberg. O
inconsciente contém desejos e motivos que estão associados a conflitos,
ansiedade, sofrimento e o mecanismo de recalque (ou repressão) os
deixam inacessíveis, protegendo a pessoa da angústia. Os conteúdos
inconscientes são impossíveis de serem lembrados de forma voluntária.
Gazzaninga e Heatherton (2005) complementam que, para Freud, na
mente inconsciente há desejos e motivos carregados de conflitos,
ansiedade e sofrimento – por isso, esses conteúdos não se localizam a
26

nível consciente, protegendo, assim, a pessoa da angústia. Em algumas


situações esses conteúdos inconscientes escapam para o consciente de
maneira involuntária, através dos sonhos, chistes, atos falhos (chistes e
atos falhos são lapsos da linguagem), sintoma (quando os conflitos
extrapolam o nível da linguagem e aparecem no corpo, na forma de dor ou
doença), associação livre (o método do tratamento analítico – mencionado
na seção anterior).

No inconsciente estão elementos instintivos, que nunca foram


conscientes e que não são acessíveis à consciência. Além disso, há
material que foi excluído da consciência, censurado ou reprimido. Esse
material não é esquecido ou perdido, mas não é permitido de ser
lembrado. O pensamento e a memória ainda afetam a consciência, mas
apenas indiretamente (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.7).

O mecanismo de recalque (ou repressão) é compreendido como um


mecanismo de defesa do ego. Opera inconscientemente, de modo que a pessoa
não tem consciência do que está acontecendo. Ao reprimir (recalcar) um
conteúdo, a pessoa está enviando para o inconsciente algum tipo de conteúdo
que causa dor, sofrimento, vergonha, repulsa ou medo muito grandes a ela, de
forma que o sofrimento de lidar com esses sentimentos iria trazer prejuízos muito
grandes ao seu ego. Hall e Lindzey (1984, p.39) ilustram sobre o processo de
reclaque (repressão):

As repressões, uma vez formadas, são difíceis de desfazer. A pessoa


procura assegurar-se de que o perigo não existe mais, o que só
consegue quando a repressão é suspensa e a realidade pode ser
encarada de frente. É como um círculo vicioso. Essa é a razão por que o
adulto conserva medos infantis. Nunca tem a possibilidade de descobrir
que esses medos têm base na realidade.

Para compreendermos melhor a dinâmica da personalidade, faz-se


necessário aprofundar o estudo sobre um conceito que já foi abordado: os
instintos (ou pulsões). A denominação pode variar de acordo com a tradução da
obra original de Freud para outras línguas primeiramente até chegar ao
português.
“Os instintos são pressões que dirigem um organismo para fins
particulares” (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.8).
27

Os instintos são fatores propulsores da personalidade, já que


impulsionam o comportamento e determinam a direção do mesmo. Diferente dos
instintos animais, nos seres humanos, os instintos exercem controle seletivo
sobre a conduta. Os estímulos podem ser tanto internos quanto externos e o
desejo age como motivação para o comportamento. Alguns estímulos, como por
exemplo, a fome, relacionam-se ao instinto de sobrevivência desde o nascimento
e contribuem para a perpetuação das espécies (HALL; LINDZEY, 1984).

Todo instinto tem quatro componentes: uma fonte, uma finalidade, uma
pressão e um objeto. A fonte, quando emerge a necessidade, pode ser
uma parte do corpo ou todo ele. A finalidade é reduzir a necessidade até
que mais nenhuma ação seja necessária, e dar ao organismo a
satisfação que ele no momento deseja. A pressão é a quantidade de
energia ou força que é usada para satisfazer ou gratificar o instinto; ela é
determinada pela intensidade ou urgência da necessidade subjacente. O
objeto de um instinto é qualquer coisa, ação ou expressão que permite a
satisfação da finalidade original (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.8).

O funcionamento mental saudável consiste na redução da tensão para


níveis aceitáveis, o que faz o organismo voltar ao estado de equilíbrio que era
atingido antes do surgimento da tensão. Entretanto, alguns pensamentos e
comportamentos não reduzem a tensão, pelo contrário, criam tensão, pressão ou
ansiedade (FADIMAN; FRAGER, 1986).
Para Freud, a personalidade é composta por três sistemas: id, ego e
superego, os quais estão envolvidos em constantes conflitos e acordos psíquicos.
“A um instinto opunha-se outro; proibições sociais bloqueavam pulsões biológicas
e os modos de enfrentar situações frequentemente chocavam-se uns com os
outros” (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.10). Segundo Hall e Lindzey (1984):

O id é formado pelos aspectos psicológicos inatos, herdados, inclusive


os instintos. Funciona de forma a descarregar a tensão interna do
organismo e ocasionar prazer – o que ele denominou princípio do prazer.
O ego seleciona a quais aspectos do meio reagirá, além de decidir quais
instintos devem ser satisfeitos e de que modo. ‘A diferença básica entre
o id e o ego reside em que o primeiro conhece somente a realidade
subjetiva da mente, enquanto que o segundo faz a distinção entre as
coisas da mente e as do mundo exterior’. O superego é o representante
interno dos valores da sociedade, os quais são transmitidos pelos pais e
reforçados pelos castigos e recompensas que foram impostos à criança
‘De modo geral podemos considerar o id como o componente biológico
da personalidade, o ego como o componente psicológico e o superego
como o componente social’ (HALL; LINDZEY, 1984, p.27-28).
28

A meta fundamental da psique é manter – e recuperar, quando perdido -


um nível aceitável de equilíbrio dinâmico que maximiza o prazer e
minimiza o desprazer. A energia que é usada para acionar o sistema
nasce no id, que é de natureza primitiva, instintiva. O ego, emergindo do
id, existe para lidar realisticamente com as pulsões básicas do id e
também age como mediador entre as forças que operam no id e no
superego e as exigências da realidade externa. O superego, emergindo
do ego, atua como um freio moral ou força contrária aos interesses
práticos do ego. Ele fixa uma série de normas que definem e limitam a
flexibilidade deste último (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.12).

Os constantes conflitos entre o id e o superego podem levar à ansiedade


e, em resposta a esta, o ego utiliza alguns mecanismos de defesa, que consistem
em estratégias mentais inconscientes que a mente utiliza para proteger o
indivíduo da angústia (GAZZANINGA HEATHERTON, 2005).
Os principais mecanismos de defesa são a sublimação (não patológico),
repressão, projeção, formação reativa e regressão. Os mecanismos de defesa
(exceto a sublimação) negam, falsificam ou distorcem a realidade e operam
inconscientemente (FADIMAN; FRAGER, 1986; HALL, LINDZEY, 1984).
A tabela a seguir sintetiza os principais mecanismos de defesa:

Tabela 03: Principais Mecanismos de Defesa

Mecanismo de Definição Exemplo


defesa

Sublimação  Meio mais eficaz de adaptar-se Pessoa com instinto sádico


a um desejo irrealizável, mais sublima os impulsos e
desenvolvido no adulto normal. transforma-se em cirurgião.
 Energia destinada para fins
agressivos ou sexuais, é
canalizada para outras
finalidades, como artísticas,
culturais e acadêmicas.

Formação reativa  Atitude oposta ao do desejo, Pessoa com desejos


pois o ego procura afastar o homossexuais não
desejo recalcado. reconhecidos faz frequentes
 Aquilo que aparece (atitude) comentários homofóbicos.
visa esconder do próprio
indivíduo suas motivações e
desejos, para preservá-lo de
uma descoberta sobre si
mesmo que poderia ser
dolorosa.

Regressão  Retorno a etapas anteriores de Adulto que pede colo em


seu desenvolvimento. situação de doença.
29

 Forma de expressão mais


primitiva.

Projeção  O indivíduo projeta ao mundo “A propósito, é típica a reação


externo alguma característica projetiva citada por Sanchis
sua e não percebe aquilo que Banús em seu filho, de quatro
foi projetado como algo seu anos, que, achando-se no
que ele mesmo considera jardim zoológico com seu avô
como indesejável. e tendo se assustado por uma
 “Esse mecanismo é também reação de cólera de um dos
de particular importância, e o exemplares enjaulados, puxa
jurista deve conhecê-lo a manga do velho e diz:
perfeitamente, pois é o ‘Vamos embora, porque tu
responsável por um grande estás com muito medo’”
número dos denominados (MYRA Y LÓPEZ, 2015, p.79).
delírios de perseguição,
origem de conflitos e litígios
nos quais aquele deve intervir
profissionalmente” (MYRA Y
LÓPEZ, 2015, p.79).

Repressão  Excluir da consciência a fonte Não ouvir o “não” na frase


da ansiedade. “não fume”.
 Este aspecto que não é
percebido pelo indivíduo faz
parte de um todo e, ao ficar
invisível, altera e deforma o
sentido do todo.

Racionalização  O indivíduo cria uma Justificativa dos nazistas para


argumentação o extermínio.
intelectualmente convincente
para justificar estados
“deformados” de sua própria
consciência.
 Mecanismo mais consciente.
 “A racionalização, como se
depreende, desempenha um
papel primordial em todas as
declarações forenses, tanto de
acusados como de
acusadores, e é preciso toda a
severidade do raciocínio
lógico, precedida de uma fina
seleção do material de fatos
que serão discutidos, se quiser
se destruir sua perniciosa
ação.” (MYRA Y LÓPEZ, 2015,
p.80).

Identificação  O indivíduo assimila um Identificação da vítima com o


aspecto, uma propriedade, um agressor.
atributo do outro e se Indivíduo para de odiar o rico
transforma, total ou quando também se sente rico.
parcialmente, segundo o
modelo desta pessoa.
 Mecanismo inconsciente
30

Negação  Mecanismo mais simples e Pessoas que procuram um


mais ineficiente. advogado para a resolução de
 O indivíduo apresenta assuntos econômicos e
objeções ao fundamento de familiares e afirmam não
seu desejo até que ele mesmo serem movidas por nenhum
se conclui que não mais tipo de interesse, já que esse
deseja aquilo. mecanismo faz com que o real
desejo não atinja a
consciência.

Realização imaginária  Mecanismo mais desenvolvido A pessoa perde várias


do desejo no jovem e na mulher. oportunidades de realização
 Pessoa vive num mundo de de seus desejos por estar
ilusões. envolvida na satisfação
imaginária dos mesmos.

Catatimia  Mecanismo que justifica que a A mãe vê seu filho como o


nossa percepção sofre melhor, parece enxergar
influência de nossa tendência apenas as suas características
afetiva, ou seja, vemos as positivas e ainda exacerbá-las.
coisas como gostaria que Vemos apenas os defeitos do
fossem, não como realmente inimigo, independente de suas
são. reais qualidades.
 “Tanto a percepção otimista
como a pessimista serve
definitivamente para o mesmo
fim – a satisfação da tendência
anterior da reação e, por
conseguinte, devem ser
estudadas e conhecidas sob o
mesmo qualificativo” (MIRA Y
LÓPEZ, 2015, p.78).

Fonte: adaptado de Gazaninga e Heatherton (2005); Hall e Lindzey (1984); Fadiman e Frager
(1986); Myra e López (2015).

Como foi possível observar na tabela anterior, compreender os


mecanismos de defesa é de suma importância para o profissional da psicologia
que irá atuar na área jurídica. Esses mecanismos de defesa explicam o discurso
de réus, vítimas e testemunhas, portanto, o profissional da área jurídica precisa
conhecê-los, compreender que muitos são inconscientes e tentar identificá-los no
discurso do cidadão em questão, seja ele quem for.
Os mecanismos de defesa ilustram como o psiquismo reage diante de
situações adversas, portanto, certas reações do sujeito tornam-se mais
previsíveis e inteligíveis para o profissional da área jurídica – seja ele da área da
Psicologia, do Direito, da Polícia, entre outras. Importante destacar que os
mecanismos de defesa não aparecem apenas em situações adversas – como as
muitas que acontecem nos meios forenses, prisionais e policiais – lançamos mão
31

dos mesmos em nosso dia a dia frente às pequenas ameaças às quais estamos
expostos. Entretanto, no caso de situações que podem realmente ferir o indivíduo
do ponto de vista físico ou psicológico, a ameaça torna-se real e o psiquismo, de
forma inconsciente, tenta se adaptar às situações adversas de forma a evitar o
sofrimento.

2.4 Teorias comportamentalistas

Na década de 1950, a maioria das teorias psicológicas da personalidade


era fortemente determinista, isto é, a personalidade e suas
características comportamentais associadas eram consideradas
resultado de forças que estavam além do controle da pessoa. Como
vimos, Freud acreditava que a personalidade era determinada por
conflitos inconscientes. Em uma linha diferente, behavioristas como B. F.
Skinner argumentaram que padrões de reforço determinavam tendências
de resposta, que eram a base da personalidade (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005, p.474).

Para Skinner, não há ego, eu ou personalidade, como a maioria dos


teóricos costumam afirmar. Ao contrário das teorias psicodinâmica e humanista,
por exemplo, no behaviorismo, os estudos são experimentais, científicos, o que
inviabiliza o estudo da personalidade. “Se não podemos mostrar o que é
responsável pelo comportamento do homem dizemos que ele mesmo é
responsável pelo comportamento” (FADIMAN; FRAGER, 1986, p.208).
Os comportamentalistas falam que, se formos pensar numa definição de
personalidade, devemos entendê-la como uma coleção de comportamentos.
Situações diferentes evocam diferentes padrões de resposta, sendo cada uma
delas individual e baseada apenas em experiências prévias e na história de vida
do indivíduo. “Skinner argumenta que, se você basear a definição do eu em
comportamento observável, não é necessário discutir o eu ou a personalidade”
(FADIMAN; FRAGER, 1986, p.195).
“Ao contrário dos que vêm a personalidade como o resultado de
processos internos, behavoristas como B. F. Skinner viam a personalidade como
pouco mais que respostas aprendidas e padrões de personalidade”
(GAZZANINGA; HEARTHETON, 2005, p.477). Por isso, para compreender a
personalidade nessa perspectiva, faz-se necessário entender alguns conceitos
básicos do behaviorismo.
32

Para o behaviorismo, há dois tipos de comportamento que merecem


destaque para nós: o respondente e o operante. Segundo Schultz e Schultz
(1992), no comportamento respondente “a resposta comportamental é suscitada
por um estímulo observável específico” (p.281), enquanto que no
condicionamento operante “a resposta do organismo é aparentemente
espontânea – no sentido de não estar relacionada com nenhum estímulo
observável” (p.281).
Segundo Maia (2008), relacionam-se ao comportamento respondente
(reflexo) as interações estímulo-resposta entre ambiente-sujeito incondicionadas,
ou seja, aqueles comportamentos provocados por estímulos antecedentes ao
ambiente (exemplo: arrepio de frio). Por outro lado, o comportamento operante é
intencional, são aqueles relacionados diariamente de forma desejada (exemplo:
ler um livro). Papalia, Olds e Feldman (2006) sintetizam a definição de
comportamento operante ao afirmar que nesse tipo de aprendizagem a pessoa
repete o comportamento que foi reforçado e cessa o comportamento que foi
punido.
“Outra diferença entre o comportamento respondente e o operante é que
o comportamento operante opera no organismo, ao passo que o respondente não
o faz” (SCHULTZ; SCHULTZ, 1992, p.281).
Entende-se como reforço qualquer estímulo que possibilite o aumento da
probabilidade de resposta, podendo os reforços ser positivos ou negativos. (MAIA,
2008). Os reforços são mais eficazes quando seguem um comportamento
imediatamente.

O reforço positivo consiste em dar uma recompensa, como comida,


troféu, dinheiro, elogio – ou brincar com um bebê. O reforço negativo
consiste em tirar alguma coisa que o indivíduo não gosta (conhecido
como evento aversivo), como, por exemplo, um ruído intenso (PAPALIA;
OLDS; FELDMAN, 2006, p.73).

Importante não confundir os conceitos de reforço negativo e punição.


Enquanto o reforço negativo consiste em retirar do indivíduo algo que ele não
goste (o que faz com que ele se sinta beneficiado com isso), a punição é definida
como um estímulo experimentado após um comportamento (bater numa criança
ou aplicar um choque elétrico num animal) ou retirar um evento positivo (não
permitir assistir televisão ou ir ao recreio).
33

Skinner e seus seguidores fizeram muitas pesquisas sobre problemas de


aprendizagem, tais como o papel da punição na aquisição de respostas,
o efeito de diferentes problemas de reforços, a extinção da resposta
operante, o reforço secundário e a generalização. [...] No caso dos seres
humanos, o comportamento operante envolve a resolução de problemas,
reforçada pela aprovação verbal ou pelo conhecimento de ter dado a
resposta correta (SCHULTZ; SCHULTZ, 1992, p.281).

A punição é um exemplo de obstáculo ao crescimento do indivíduo, visto


que apenas informa sobre o que não fazer, ao invés de tentar ensinar o que se
deve fazer (FADIMAN; FRAGER, 1986).
O conceito de punição será melhor explorado no material que apresentará
questões relativas ao sistema penal, mas, de início, podemos compreender a
prisão, o pagamento de multa indenizatória e a prestação de serviços
comunitários como exemplos de punições que são aplicadas no sistema penal
brasileiro. Será a punição sempre efetiva? Isso iremos debater num outro
momento.
O comportamento verbal é, segundo Skinner, a única área em que há
diferenças no condicionamento entre o homem e o rato. O comportamento verbal
exige a interação de duas pessoas: um falante e um ouvinte. No caso da criança
que está aprendendo as primeiras palavras, o adulto – o ouvinte – pode, através
do seu comportamento, reforçar, não reforçar ou punir a criança pelo que disse ou
não disser, assim controlando seu comportamento subsequente. “Para Skinner, a
fala é comportamento, estando, pois, sujeita, como qualquer outro
comportamento, a contingências de reforço, de previsão e de controle”
(SCHULTZ; SCHULTZ, 1992, p.284).
Essa abordagem da personalidade enquanto pouco mais que respostas
aprendidas e padrões de reforço foi alvo de crítica de outros teóricos cognitivistas,
como Kelly e Bandura, os quais defenderam pontos de vista de que a
personalidade vai além disso. Kelly defendeu a existência dos construtos
pessoais, os quais se desenvolvem a partir da experiência e representam sua
interpretação e explicação dos eventos no meio social no qual o indivíduo está
inserido. Já Bandura propôs uma teoria cognitivo-social da personalidade que
enfatiza como as crenças, expectativas e interpretações pessoais das situações
sociais moldam o comportamento e a personalidade.
34

Albert Bandura aceita muitos dos princípios da teoria da aprendizagem,


mas argumenta que os humanos possuem capacidades mentais, como
crenças, pensamentos e expectativas, que interagem com o ambiente
para influenciar o comportamento (GAZZANINGA; HEATERTHON, 2005,
p.478).

A aprendizagem social também será explorada num momento posterior


desse curso. Parte-se do pressuposto de que a criança aprende a partir das
situações e interações que ocorrem no meio em que ela está inserida. Assim, é
de se esperar que uma criança que nasceu num ambiente de violência e crime é
mais propensa a reproduzir esse tipo de comportamento a medida em que cresce,
por isso os apelos de que a ampliação de serviços educativos possa ser mais
efetiva que a ampliação do sistema prisional. Parte-se do pressuposto de que é
possível prevenir ou reduzir danos ainda em tenra idade, ao invés de remediar
situações que, na verdade, foram reforçadas desde o início da vida.

2.5 Personalidade, psicologia social e psicologia jurídica


Após a Segunda Guerra, muitos psicólogos e pensadores procuraram
compreender melhor o comportamento humano no mundo real, assim passaram a
investigar questões como autoridade, obediência e comportamento de grupo.
Esses estudos marcaram a psicologia social, que focaliza o poder da situação e
como a interação das pessoas com os outros acaba por moldá-las.
(GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005).

Em 1962, Adolf Eichmann, um dos principais oficiais de Hitler, foi


enforcado por ‘causar a morte de milhões de judeus’. Um pouco antes da
sua morte, Eichmann declarou ‘Eu não sou o monstro que fazem de
mim. Sou vítima de uma falácia’. As atrocidades cometidas na Alemanha
nazista levaram os psicólogos a investigar se o mal é uma parte integral
da natureza humana (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005, p.55).

Procuraram compreender por que alemães aparentemente normais


participavam, de maneira voluntária, do assassinato de homens, mulheres e
crianças inocentes. Concluíram, assim, que algumas pessoas, especialmente
aquelas criadas por pais muito rígidos, apresentavam maior propensão para
seguir ordens, porém a psicologia social ampliou essa linha de raciocínio ao
perceber que quase todas as pessoas são diretamente influenciadas por
situações sociais. Ou seja, voltando ao exemplo de Eichmann, seus argumentos
35

não desculpam os seus atos, porém ele estava correto ao explicar que as
pessoas estavam ignorando o poder do contexto, da situação, como explicação
para as suas ações hediondas (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005). A partir
desse exemplo, concluímos que ao se deparar com ações hediondas, a psicologia
deve levar em consideração aspectos da personalidade do indivíduo e também
situacionais.
A psicologia social alerta para um fenômeno que deve ser levado em
consideração pelo psicólogo jurídico: a desindividuação. Caracteriza-se por um
fenômeno de baixa autoconsciência – ou seja, as pessoas não estão prestando
atenção sobre os seus padrões pessoais – no qual os indivíduos perdem sua
individualidade e passam a seguir padrões grupais. As pessoas desindividuadas
fazem coisas que, muitas vezes, não fariam sozinhas e essas coisas podem ser
ruins ou não. Exemplos de comportamento de desindividuação são tumultos
ocasionados por fãs quando próximas de seu ídolo; saques após desastres,
dentre outras (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005).
Num estudo realizado no departamento de psicologia da Universidade de
Stanford transformaram o porão da instituição num presídio fictício e dividiram
aleatoriamente os alunos em dois grupos: guardas ou prisioneiros. O estudo teve
que ser abortado após seis dias, pois os alunos apresentaram desindividuação e
reagiram de forma muito características, de acordo com os papéis
desempenhados: enquanto os guardas mostraram-se agressivos, muitos
prisioneiros reagiram com apatia e indiferença (GAZZANINGA; HEATHERTON,
2005).
Outro ponto que merece ser destacado é o conceito de normas sociais.
Compreendem-se como normas sociais os padrões esperados de conduta que
influenciam no comportamento do indivíduo e dos grupos, pois indicam qual
comportamento é adequado para cada situação. Dessas normas sociais,
observamos dois tipos de comportamento: a conformidade e a submissão. A
conformidade consiste em alterar as suas próprias opiniões ou comportamentos
para se adequar aos outros e explica, por exemplo, o fato de membros de um júri
seguirem a opinião do grupo ao invés de defenderem sua própria opinião. A
submissão é definida como a tendência do indivíduo a concordar com coisas
36

solicitadas pelo outro, especialmente se forem pedidas de maneira polida


(GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005).
A obediência é a disposição que os indivíduos apresentam a seguir
ordens dadas por uma figura de autoridade. Voltando às pesquisas que ocorreram
após a Segunda Guerra, um experimento foi realizado para que pudessem
compreender como as pessoas seguem ordens de autoridade, mesmo que para
isso acabassem por ferir ou mesmo expor pessoas a risco de morte. Num
experimento, um professor administrará choques elétricos, de carga progressiva,
em seu suposto aluno – um senhor de 50 anos – cada vez que ele errasse as
questões. Na verdade, a máquina de choque não funcionava de verdade, mas a
pessoa que iria aplicar os choques não sabia disso e ouvia gritos de dor da
“vítima” a medida que a intensidade dos choques iria aumentando, até que o
mesmo parou de emitir sons, como se houvesse vindo a óbito. A pessoa que
estava aplicando os choques pode até ter se arrependido de participar do estudo
ou mesmo ter tentado parar o experimento, mas diante da negativa do
experimentador – uma visível figura de autoridade que falava que ele não podia
parar – a pessoa obedeceu e continuou aplicando os choques, independente das
consequências do mesmo para o bem-estar do homem. Os resultados do estudo,
o qual foi replicado em outros países, mostra claramente que pessoas comuns
podem ser obrigadas a obedecer a autoridades insistentes, mesmo que para isso
posam colocar pessoas em risco de morte ou mesmo matá-las, ou seja, não
apenas os sádicos são capazes de tomar esse tipo de atitude (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005).
Outro tema de estudo dos processos sociais em total consonância com a
psicologia jurídica é a agressão. Em linhas gerais, compreende-se agressão como
um amplo repertório de comportamentos ou ações que têm como objetivo
intencional prejudicar alguém. É um fenômeno multicausal que, no geral, assusta
as pessoas, e precisa ser compreendido pela psicologia jurídica:

A agressão física, embora comum entre as crianças pequenas, é


relativamente rara entre os humanos adultos; seus atos agressivos
envolvem mais palavras ou ações destinadas a ameaçar, intimidar ou
machucar os outros. A agressão precisa ser considerada em diversos
níveis de análise, da biologia básica ao contexto cultural. Vale a pena
destacar que, na maioria das vezes, os fatores isolados não explicam,
por si só, a agressão, mas quando combinados são capazes de
37

ocasionar situações agressivas (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005,


p.456).

É importante reforçar que a agressão relaciona-se a fatores biológicos,


afetivos, da aprendizagem e culturais, como expresso a seguir:

Tabela 04: Fatores que influenciam a agressão

Fatores que Como acontece Exemplos


influenciam a
agressão

Fatores biológicos  Lesões ou estímulos no Um caso clínico famoso que marca os


(estruturas septo, na amígdala e no primeiros estudos da neuropsicologia
cerebrais e hipotálamo são é o de Phineas Gage. O operário que
neurotransmissores) responsáveis por ocasionar se destacava por ser habilidoso,
mudanças no padrão de atencioso e cuidadoso, sofreu um
agressividade de animais. acidente de trabalho com explosivos,
 Lesões no lobo frontal os quais lesionaram seu lobo frontal.
associam-se ao aumento da Todos se assustaram, pois, a despeito
agressão – perda do do grande ferimento, Gage andava e
autocontrole (inclusive dos conversava normalmente. Entretanto,
impulsos agressivos). Não com o passar do tempo ficou visível
se pode afirmar que esse uma mudança na personalidade de
tipo de lesão, por si só, Gage, que se tornou agressivo,
aumente a agressão, mas a irresponsável, imaturo, suas decisões
perda do autocontrole não levavam em conta interesses de
acaba por favorecer o longo prazo.
comportamento agressivo.
“O neurologista Jonathan Pincus
(1999) examinou mais de cem
criminosos violentos, muitos dos quais
estavam no corredor da morte. Ele
encontrou uma combinação de abuso
na infância inicial, transtornos
psiquiátricos como paranoia e
disfunções no lobo frontal evidentes
em mais de 90% desses assassinos
violentos” (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005, p.456).

Afetos negativos  Hipótese de frustração- Pessoa que assistiu a um filme


agressão: “a extensão em violento ou se estiver próxima de
que as pessoas sentem-se armas, provavelmente reagirá com
frustradas prediz a agressividade se estiver no trânsito e
probabilidade de elas agirem um motorista ultrapassá-la
agressivamente” perigosamente.
(GAZZANINGA; No Brasil, um crime ocorrido em 1999
HEATHERTON, 2005, p.457). ilustra essa situação: um estudante foi
 Qualquer situação que induza assistir ao filme “Clube da Luta” no
afeto negativo (ser insultado, cinema e atirou na plateia, o que
estar com medo, sentir dor, resultou em três mortos e quatro
entre outros) pode feridos.
desencadear agressão física,
38

mesmo que não induza


frustração.
 A possibilidade de ocorrer
ação agressiva depende do
contexto.

Aspectos  A evolução mostra que a Os homens do sul dos EUA são


aprendidos e natureza humana é criados para brigar por sua honra e
culturais agressiva, entretanto, a responder agressivamente a ameaças
cultura exerce forte influência pessoais, ou seja, são recompensados
sobre a ocorrência de por defender sua honra e aprendem
violência física. que a violência é uma maneira
 A teoria da aprendizagem aceitável de se fazer isso.
social (Bandura), mencionada
na subseção anterior, explica
que grande parte do
comportamento agressivo é
aprendida pela observação
social de recompensas e
punições.

Fonte: adaptado de Gazzaninga e Heatherton (2005); Rosenthal e Affonso (2006); Terra (2012).

Como vimos na seção sobre o desenvolvimento da personalidade, foi


possível observar algumas diferenças entre a personalidade do homem e da
mulher adultos. Algumas dessas diferenças dizem respeito à agressividade e são
pontos-chave para o trabalho do psicólogo jurídico, visto que há uma íntima
relação entre a agressão e a participação do indivíduo em delitos.

Geralmente se acredita que os homens são muito mais agressivos do


que a mulheres. Está claro que os homens são mais violentos que as
mulheres, cometendo mais de 80% dos assassinatos e a vasta maioria
dos estupros, assaltos, e assim por diante. Na verdade, mais de 90%
das pessoas presas por violência são homens; os atos violentos
cometidos por mulheres são raros (e quase nunca envolvem estranhos).
Mas embora os homens sejam muito mais agressivos fisicamente do que
as mulheres, homens e mulheres apresentam níveis similares de
agressão verbal ao expressar raiva, proferir insultos, falar pelas costas
de alguém ou revelar segredos. A escolha de agressão social em vez de
física pelas mulheres pode refletir a atitude social de desencorajar a
agressão física entre as meninas ou pode refletir a força física relativa de
cada caso (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005, p.457).

Convém ressaltar que os temas que estamos abordando nessa subseção


dizem respeito aos padrões normais de personalidade do adulto, ou seja, dotada
de capacidade de adaptação, com traços relativamente estáveis que se mantêm
ao longo da vida.
39

Segundo Myra y López (2015), a personalidade do homem se caracteriza


pelo pleno funcionamento dos mecanismos psíquicos de defesa outrora
elucidados, os quais permitem que o indivíduo satisfaça seus desejos sem causar
um maior mal-estar à consciência moral, ou mesmo conformar-se à incapacidade
de satisfação dos mesmos.
Do equilíbrio entre aqueles e estes resulta a conduta normal da
personalidade; um ligeiro predomínio de qualquer deles e já nos
encontramos diante de um tipo de personalidade mal preparada para a
vida social e, por conseguinte, apta para entrar em conflito com as leis e
consigo mesma (MYRA Y LÓPEZ, 2015, p.74-75).

A personalidade adulta da mulher apresenta características distintas


daquelas observadas no homem. Enquanto que no homem a maioria dos litígios
se embasa em questão econômica, na mulher os mesmos costumam acontecer
em decorrência de algum conflito afetivo.
A lógica do homem e a intuição da mulher fazem sentir, por outro lado,
de um modo distinto, sua posição perante a lei. Por isso, um argumento
ou raciocínio que pode fazer mudar de critério o primeiro, é capaz de se
mostrar completamente ineficaz na segunda. E vice-versa. Do ponto de
vista criminológico, os motivos que impelem o homem ao delito
costumam ser mais pragmáticos ou de imediata utilidade do que os da
mulher; além do mais, não há dúvida de que a violência é mais usada
pelo homem e a astúcia pela mulher (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.82-83).

Assim, tendo em vista as discussões elaboradas até aqui neste material,


fica evidente que os delitos não decorrem de uma única causa. Ainda iremos
definir e delimitar o contexto de aplicabilidade da psicologia jurídica num outro
momento, mas desde já, adiantamos que esta não se resume ao estudo do
comportamento delituoso e intervenção nos indivíduos que cometem delitos.
Porém, não podemos deixar de ressaltar que esta é uma área de grande
relevância, principalmente se levarmos em consideração o contexto violento no
qual estamos inseridos na atualidade.
A personalidade é, sem dúvida, uma dimensão que precisa ser bem
compreendida e investigada pelo psicólogo jurídico. Nessa seção, mostramos
também a importância de aspectos sociais no comportamento delituoso, porém,
restringirmos nossa compreensão a essas duas dimensões seria por demais
reducionista.
Para finalizarmos essa seção e já introduzirmos a outra fica a seguinte
interrogação: a personalidade pode mudar?
40

Partimos nossa reflexão apontando evidências encontradas em estudos


realizados com as mesmas pessoas em diferentes momentos de seu
desenvolvimento (da infância à meia idade) que apontam que a personalidade
permanece relativamente estável. Isso é fato, visto que conseguimos predizer
mais ou menos o comportamento das pessoas que amamos ou que convivemos
com bastante frequência. Alguns traços de personalidade tendem a se manter, ou
seja, pessoas extrovertidas permanecem extrovertidas; indivíduos introvertidos
continuam introvertidos. Essa estabilidade da personalidade do adulto é
justificada por fatores como dependência de fatores biológicos (que normalmente
não se modificam), ambientes estáveis (casam-se com parceiros com traços
parecidos, escolhem empregos com características em comum), o que contribui
para a estabilidade da personalidade (GAZZANINGA; HEATHERTON, 2005).
Por outro lado, ocorrem algumas mudanças – por exemplo, quando uma
pessoa tímida e introvertida sente-se incomodada com as situações ocasionadas
ao seu estilo pessoal e busca ajuda psicológica para lidar com sua timidez –
certas mudanças podem resultar, com o passar dos anos, em sabedoria.
Reforçamos também que as pessoas mesmas relatam que elas mudaram, o que
pode auxiliar a predizer motivos e comportamentos (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005).
Em síntese, a personalidade costuma manter-se relativamente estável,
mas também pode sofrer modificações (segundo a intenção do próprio indivíduo
ou em decorrência de fatores biológicos, como as doenças e acidentes que
podem afetar o cérebro e ocasionar várias mudanças de personalidade).
Pretendemos encerrar essa seção (e realizar a abertura da próxima), deixando
bastante evidente a ideia de que o psicólogo jurídico precisa compreender essa
característica da personalidade de ser, ao mesmo tempo, estável no adulto,
porém, adaptativa – o que pode ocasionar certas mudanças. Assim, ele será mais
cuidadoso em seu trabalho quando precisar investigar mais aprofundadamente a
personalidade de algum indivíduo e tomará cuidado ao realizar certas inferências
do tipo: “Esse indivíduo sempre foi pacato, é impossível que tenha cometido esse
crime”.
41

UNIDADE 3 – FATORES QUE INTERFEREM NAS


REAÇÕES DO INDIVÍDUO

Sabemos que a personalidade de determinado indivíduo apresenta


padrões relativamente estáveis no decorrer da vida (em estado normal, pois,
como ilustramos anteriormente, condições patológicas – tais como acidentes que
lesionam o cérebro, doenças degenerativas, quadros psicopatológicos, dentre
outras condições ligadas ao cérebro ou à mente), porém, também precisamos
levar em consideração que certas reações do indivíduo podem ocorrer de maneira
inesperada e fugir completamente do seu padrão de comportamento.
Mira y López (2015) elucida os fatores gerais responsáveis pela reação
pessoal em um determinado momento:

Quadro 1: Fatores gerais responsáveis pela reação pessoal num determinado


momento:

a) Constituição Corporal.

Herdados... b) Temperamento.

c) Inteligência.

Mistos... d) Caráter.

e) Experiência Anterior
Fatores gerais responsáveis de Situações Análogas.
pela reação pessoal em um
dado momento f) Constelação.

g) Situação Externa
Adquiridos... Atual.

h) Tipo Médio da Reação


Social (Coletiva).

i) Modo de Percepção
da Situação.

Fonte: Mira y López (2015, p.37).


42

A seguir iremos explanar sobre cada um desses fatores. Dentre os fatores


que o autor considerou como herdados, discorreremos também sobre alguns
processos psicológicos básicos – como a memória e a inteligência – pois são
fatores que podem influenciar diretamente a reação do indivíduo ou mesmo
fornecer subsídios para uma compreensão maior das atitudes do mesmo e de seu
funcionamento psíquico. Para fins didáticos, realizaremos agrupamentos um
pouco diferentes desses expressos no quadro.

3.1 Constituição corporal

Segundo o Dicionário Michaelis On-line (s.d.), o termo constituição


significa:

1 Ação ou efeito de constituir. 2 Organização, formação.3 Compleição do


corpo humano. 4 Temperamento. 5 Coleção de leis ou preceitos que
regem uma corporação, uma instituição. 6 Lei fundamental que regula a
organização política de uma nação soberana; carta
constitucional. 7 Ordenação, estatuto, regra. 8 Dir Ato de estabelecer
juridicamente (MICHAELIS, sd, sp).

Dessa forma, podemos entender como constituição física, o conjunto de


componentes anatômicos, fisiológicos, funcionais, hereditários e adquiridos que
determinam fisicamente um indivíduo. Mira y Lopez (2015) definem constituição
física como: “Conjunto de propriedades morfológicas e bioquímicas transmitidas
ao indivíduo pela hereditariedade” (p.40)

A constituição corporal parece influenciar diretamente certas atitudes do


indivíduo. Posteriormente, iremos discorrer acerca do processo de tomada de
decisão, mas sem uma maior reflexão, já se torna possível deduzir que as
reações de uma pessoa alta e forte podem ser diferentes das reações de uma
pessoa magra e baixa.
Não podemos desconsiderar que, segundo Kretschmer (apud MIRA Y
LÓPEZ, 2015), há relação entre a constituição corporal e o temperamento, assim
também como entre o temperamento e o caráter. Inferimos que a influência
desses fatores se encontra inter-relacionada, mas é importante que o psicólogo
jurídico possa conhecer cada uma delas separadamente com o intuito de
compreender de que forma esses fatores influenciam diretamente na reação do
indivíduo, principalmente em situações adversas e inesperadas, ou naquelas
43

carregadas afetivamente – situações essas nas quais é mais comum o indivíduo


reagir de forma diferente às respostas consonantes aos seus traços de
personalidade.

Permanecendo todos os fatores iguais [temperamento e caráter], não


será a mesma reação de um homem corpulento e de um homem magro
e baixo, por exemplo. Com efeito, o fator morfológico origina na pessoa
um obscuro sentimento de superioridade física diante da situação, que
entra muito na determinação do seu tipo de reação; é um fator vulgar
que a mesma fosse pronunciada por um garoto ou por um carroceiro não
desperta no ofendido a mesma reação e isso é, principalmente, devido a
que o indivíduo se mostra subconscientemente superior em força ante o
primeiro e inferior ante o segundo. Por conseguinte, sentir-se-á irritado
diante daquele e o esbofeteará ‘para dar-lhe uma lição’, mas evitará
travar discussões com o segundo ‘porque não é próprio de pessoas
bem-educadas brigar com gente baixa’ (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.38).

Fica aqui a ressalva de que o exemplo politicamente incorreto, por


envolver a agressão de um “garoto” e de “gente baixa” é justificável visto que a
obra original desse material, como já foi ressaltado, data de 1932, época em que
a preocupação com o menor e seus respectivos direitos ainda não era
considerada. Da mesma forma, não havia preocupação com o fato de certas
expressões serem extremamente preconceituosas e pejorativas. A mesma foi
escolhida, pois ilustra muito bem a linha de raciocínio que pode direcionar um tipo
de atitude agressiva por parte de uma pessoa cuja constituição corporal pudesse
colocá-la numa situação de vantagem em caso de uma possível luta corporal.
Também devemos levar em consideração que, frente a situações de
perigo, o indivíduo pode apresentar uma reação de ataque ou fuga. Para
explicarmos essa reação – a qual apresenta um caráter evolutivo, pois garantiu a
sobrevivência das espécies – precisaremos abrir parênteses para falar do sistema
nervoso e explicar por que ela ocorre.
O Sistema Nervoso Central (SNC) é subdividido em dois (GAZZANINGA;
HEATHERTON, 2005, STRAUB, 2014):
 sistema nervoso somático – composto pelos nervos que levam as
mensagens dos órgãos sensoriais até o SNC e deste para os músculos e
glândulas. Controlado de maneira voluntária;
 sistema nervoso autônomo (SNA) – nervos que ligam o SNC ao
coração, intestinos e outros órgãos internos. Controlado de maneira
involuntária.
44

Nesse momento iremos voltar nossa atenção para o sistema nervoso


autônomo, o qual sofre grande influência das reações de estresse – como, por
exemplo, aquele ocasionado quando o indivíduo é abordado por um ladrão. O
SNA é subdividido em simpático e parassimpático. Em linhas gerais, a divisão
simpática prepara o indivíduo para a ação, enquanto que a divisão parassimpática
faz o corpo voltar ao seu estado de repouso (GAZZANINGA; HEATHERTON,
2005).
O sistema nervoso simpático prepara o organismo para o ataque e fuga,
portanto, reações como dilatação da pupila, aceleração dos batimentos cardíacos,
liberação de glicose pelo fígado e estimulação da produção de adrenalina
preparam o corpo para esse tipo de reação. Passado o perigo, o sistema nervoso
parassimpático contrai a pupila, reduz os batimentos cardíacos e volta ao corpo
ao seu estado de repouso.
Associando essa reação à constituição física do indivíduo fica possível
compreender porque, independente de sua personalidade, temperamento ou
caráter, a reação de uma pessoa que é abordada por um ladrão pode ser de
ataque e fuga. Caso sua constituição corporal seja favorável em relação ao
cidadão infrator, provavelmente ele partirá para o ataque, entretanto, caso seja
desfavorável, ele poderá fugir, correndo com uma velocidade muito maior do que
ele costuma atingir em seu dia a dia.
Como deixamos claro anteriormente que as reações fisiológicas do SNA
ocorrem de maneira involuntária, isso explica porque muitas reações das pessoas
frente a situações de perigo (como ataque e fuga) não condizem com a
personalidade do indivíduo, podem ser perigosas (pois não houve tempo para o
indivíduo analisar sua tomada de decisão) e também podem não levar em
consideração a constituição corporal.
Vamos apenas citar que existem estudos tipológicos que associavam
certas reações/atitudes do indivíduo ao seu biótipo. Assim, fatores como
periculosidade, tendências antissociais e antilegais poderiam ser identificados
antecipadamente ou também corrigidos graças à “terapêutica constitucional”
(MIRA Y LÓPEZ, 2015).
Como muitos desses estudos são bastante antigos e alguns já foram
refutados por outros, optamos por não fazer alusão aos mesmos nesse material.
45

3.2 Temperamento X caráter


O temperamento é definido por Mira y López (2015) como “a resultante
funcional direta da constituição, que marca a cada momento a especial
modalidade da primitiva tendência da reação ante os estímulos ambientais”
(p.40).
Gazzaninga e Heatherton (2005) elucidam que os temperamentos podem
ser compreendidos como tendências gerais a agir ou sentir de determinada
maneira. Os temperamentos são de base biológica, por isso os estudos sobre os
mesmos são normalmente realizados com bebês, para perceber que as
diferenças de personalidade existentes desde tenra idade são indicativos da ação
de mecanismos biológicos.
A questão que colocamos para reflexão é: os temperamentos
permanecem estáveis ao longo da vida ou tendem a modificar-se? Para
responder a essa questão, recorreremos às categorizações provenientes de um
estudo realizado na década de 1970 e resultados de pesquisas mais recentes
nessa mesma área. Chess e Thomas concluíram que é possível categorizar as
crianças em três tipos de temperamento. Entre as décadas de 80 e 90 outros
pesquisadores buscaram compreender se esses padrões de temperamento se
mantinham na adolescência e início da idade adulta (GAZANINGA;
HEATHERTON, 2005). Os resultados desses estudos podem ser conferidos na
tabela abaixo:

Tabela 05: Tipos de temperamentos

Infância Adolescência

Crianças fáceis: ciclos regulares de sono e Bem ajustado: padrões da infância mantêm-se
alimentação; boa capacidade de adaptação relativamente estáveis.
a mudanças.

Crianças difíceis: padrões irregulares de Subcontrolado: Possibilidade de apresentarem


sono e alimentação; dificuldade de problemas com álcool, crime, desemprego, a
adaptação a mudanças; tendem a afastar-se tentar suicídio, a ser antissociais e ansiosos, além
dos outros quando ficam mais velhas; de terem menos apoio social.
dificuldades para lidar com as expectativas
dos pais, professores e colegas.
46

Crianças de aquecimento lento: Inibido: Maior tendência à depressão.


inicialmente cautelosas e ansiosas frente a
novas situações, mas demonstram
capacidade de adaptação com o passar do
tempo. Menos emotividade positiva se
comparadas às crianças fáceis.

Fonte: adaptado de Chess e Tomas; Silva e Santon (1996 apud GAZZANINGA; HEATHERTON,
2005).

Como falamos anteriormente, não se pode afirmar que a personalidade


sempre será estável. Ao mesmo tempo, compreendemos também que o
temperamento corresponde à parte biológica da personalidade. Dessa forma, é
relevante que o psicólogo jurídico compreenda que, muitas vezes, o
temperamento e o caráter podem ser responsáveis por certas reações por parte
do indivíduo, como expresso na citação a seguir:

Um erro frequentemente cometido é o de confundir temperamento com


caráter. Não obstante, este se define objetivamente pelo tipo de reação
predominante, exibida pelo indivíduo ante as diferentes classes de
estímulos e situações; claramente se compreende que nem sempre a
tendência primitiva de reação coincide com a reação exibida, já que
entre ambas se interpõe todo conjunto de funções intelectuais
(discriminativas, críticas, de julgamento) e das inibições criadas pela
educação. Ainda mais, em muitos casos o caráter da pessoa se
desenvolve – por supercompensação psíquica secundária – em direção
oposta à de seu temperamento (este fato foi percebido pelos antigos
moralistas quando afirmavam que o medo de um erro pode fazer-nos
cair em outro pior). Assim, quantas vezes uma reação agressiva e um
caráter violento têm sua explicação na existência de um temperamento
medroso! Por isso, é preciso conhecer bem as distintas modalidades de
temperamentos, e os meios para sua explicação e diagnóstico, se
quisermos ter a devida noção de todos os fatores determinantes de uma
reação pessoal (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.40).

A citação anterior aponta o temperamento como uma tendência primitiva,


ou seja, como explanamos anteriormente, de origem biológica. Porém, o
temperamento não é a única explicação para as reações pessoais. Somam-se a
ele o caráter, as funções intelectuais (aqui iremos abranger o tema cognição) e a
educação (falando em outros termos, podemos compreender essa educação
como a aprendizagem social ou os comportamentos aprendidos por estímulo –
respostas que moldam certas atitudes indesejadas na criança ou no adulto
enquanto membro de determinada sociedade).
47

O caráter constitui o termo de transição entre os fatores endógenos e os


fatores exógenos integrantes da personalidade, e representa
definitivamente o resultado da sua luta. Os fatores endógenos impeliriam
o homem a uma conduta puramente animal baseada na satisfação de
seus instintos e tendência apetitivas ou repulsivas. Os fatores exógenos,
ao contrário, o conduziriam à completa submissão ao meio externo; é a
clássica oposição entre o homem e o mundo (a luta pela vida) a que é
simbolizada na luta entre o elemento endógeno e o exógeno, isto é, o
caráter (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.43).

Tanto o psicólogo quanto os outros profissionais da área jurídica devem


prestar atenção em “caracterizar” uma pessoa, ou seja, em se dar conta de seu
caráter. Deve-se levar em consideração que o indivíduo em questão pode
aparentar-se de maneira extremamente oposta ao seu caráter, o que pode
confundir a percepção ou o julgamento dos profissionais. Em linhas gerais, não se
pode acreditar que é possível conhecer um indivíduo simplesmente por sua
conduta externa, é importante, na maneira do possível, conhecê-lo internamente,
para assim obter subsídios para compreender os motivos da ação em geral (MIRA
Y LÓPEZ, 2015).
A citação a seguir ilustra, de maneira prática, o que foi tratado
anteriormente. Optamos por não abranger aqui a discussão de temas sobre
preconceito e estereótipo, os quais poderiam se encaixar perfeitamente:

[...] o problema é que em muitas ocasiões o fato que põe o indivíduo em


contato com o jurista é em si contrário ao seu caráter. Quem diria, quem
o adivinharia? O homem honrado e escrupuloso como poucos, cometeu
um desfalque; B, tímido e escrupuloso como todos, cometeu um delito
sexual; C, pacífico e inofensivo, chega a ser o autor de um crime
horripilante (MIRA Y LÓPEZ, 2015, p.42).

Para sintetizar, reforçamos que, como expresso no quadro anterior,


proposto por Mira y López (2015), enquanto o temperamento é uma característica
herdada (visto o que fora elucidado nos estudos que investigavam bebês de
temperamento fácil, difícil e de aquecimento lento), o caráter provém de fontes
mistas, ou seja, herdadas e adquiridas através da interação do indivíduo com o
meio.
48

3.3 Cognição
Em linhas gerais, compreende-se a cognição como o ato de pensar. O
cérebro representa a informação que chega até ele (via órgãos dos sentidos e
vias motoras, por exemplo) e a cognição manipula essas representações.
A área da psicologia que estuda esse campo não é a psicologia jurídica,
mas a psicologia cognitiva, que é “o estudo de como as pessoas percebem,
aprendem, lembram-se e pensam sobre a informação” (STERNBERG, 2010, p.1).
Em linhas gerais, pode-se afirmar que a Psicologia Cognitiva preocupa-se com os
processos internos envolvidos em extrair sentido do ambiente e decidir que ação
deve ser apropriada. São processos cognitivos a atenção, a percepção, a
aprendizagem, a memória, a linguagem, a resolução de problemas, o raciocínio e
o pensamento. Não iremos discorrer aqui sobre todos os processos cognitivos,
apenas os que se associam diretamente com a psicologia jurídica. Dentre esses,
Mira y López (2015) caracteriza a inteligência como herdada, enquanto que as
demais funções cognitivas como funções psíquicas diferenciáveis que vêm a
constituir o indivíduo.
Talvez, numa leitura inicial dessa subseção, você irá se perguntar: “Qual
a relação dos processos cognitivos com a práxis do psicólogo jurídico?”
Reforçamos que alguns temas básicos – como as linhas que foram delineadas no
percurso histórico da psicologia, a personalidade e os processos cognitivos são
conteúdos que servem como base para outros estudos mais aprofundados que
precisam ser desenvolvidos a posteriori. Esses temas são de relevância não
apenas para o psicólogo jurídico, mas para a equipe diretamente relacionada à
área jurídica que deseja realizar uma especialização na área, assim como para
psicólogos que atuam em áreas afins.
Além disso, como enfatizamos na introdução, esse curso não será voltado
para a área de testes psicológicos devido aos motivos já elucidados. Entretanto,
muitos psicólogos jurídicos lidam, em seu dia a dia, com o uso de testes e
avaliações psicológicas que poderão, além de investigar aspectos da
personalidade do indivíduo, avaliar instâncias como esses processos cognitivos –
o que pode ser extremamente necessário para a elaboração de um laudo
psicológico.
49

Assim, antes de se avaliar e saber utilizar um teste, faz-se ainda mais


importante conhecer bem o que se pretende avaliar – como, por exemplo, a
atenção, a memória e a inteligência. Numa outra apostila retomaremos esse
assunto ao apresentarmos alguns transtornos relacionados a esses processos
cognitivos que precisam ser considerados pelo psicólogo jurídico em situação de
avaliação.

a) Memória

Assim como a atenção, a memória é imprescindível para o desempenho


de atividades cotidianas, como para a nossa sobrevivência em geral. Gazaninga e
Heatherton (2005, p.216) definem memória como:

[...] a capacidade do sistema nervoso de adquirir e reter habilidades e


conhecimentos utilizáveis, permitindo que os organismos se beneficiem
da experiência. [...] Todo nosso senso de self é aquilo que sabemos por
nossa memória, nossas lembranças de experiências pessoais.

Os autores levantam um ponto extremamente importante, o qual iremos


reforçar: a memória é nossa identidade, pois somos aquilo que lembramos. A
linguagem exerce um importante papel por ser um processo cognitivo relacionado
com a memória e, além disso, por, junto dessa, atuar na formação da identidade
de cada um. Izquierdo, na citação a seguir, reforça essa ideia:

Memória é a aquisição, a formação, a conservação e a evocação de


informações. O conjunto das memórias de cada um determina aquilo
que se denomina personalidade ou forma de ser. Um humano ou um
animal criado no medo será mais cuidadoso, introvertido, lutador ou
ressentido, dependendo mais de suas lembranças específicas do que
de suas propriedades congênitas. Nem sequer as lembranças
específicas dos seres clonados (como os gêmeos univitelinos) são
iguais; as experiências de vida de cada um são diferentes. [...] O acervo
das memórias de cada um nos converte em indivíduos. Em seu sentido
mais amplo, então, a palavra “memória” abrange desde os mecanismos
que operam nas placas de meu computador, até a história de cada
cidade, país, povo ou civilização, e as memórias individuais dos animais
e das pessoas. [...] Os seres humanos utilizam, a partir dos 2 ou 3 anos
de idade, a linguagem para adquirir, codificar, guardar ou evocar
memórias, as demais espécies animais, não (IZQUIERDO, 2006, p.9-
12).

Os estudiosos da memória dividem-na em diferentes sistemas, o que não


será abordado aqui. Apenas iremos ressaltar dois tipos de armazenamento na
50

memória que devem ser conhecidos: a memória de curto prazo e a memória de


longo prazo.
A memória de curto prazo possui capacidade limitada e contém
informações na consciência por um período de tempo muito breve. Caso essas
informações não sejam direcionadas para a memória de longo prazo elas serão
perdidas (GAZANINGA; HEARTHETON, 2005).
Já a memória de longo prazo contém informações que foram transferidas
da memória de curto prazo, as quais pareceram úteis para o indivíduo que as
armazenou. Para que a informação seja armazenada e mantida, alguns aspectos
devem ser considerados, como, por exemplo, a repetição (GAZANINGA;
HEARTHETON, 2005).
A emoção e o interesse afetivo também estão diretamente relacionados a
uma boa memória, da mesma forma que a ansiedade prejudica o bom
funcionamento da mesma (STERNBERG, 2010).
O estudo da memória é de suma importância para o psicólogo jurídico.
Segundo Mira y López (2015), a Psicologia do Testemunho é uma área de grande
relevância na psicologia jurídica e seu estudo associa-se diretamente com a
investigação sobre a memória. Segundo o autor, há importantes atos psíquicos
que compõem o processo mnêmico, como:
 fixação das impressões;
 conservação;
 evocação;
 reconhecimento.

Ainda segundo o autor, é preciso examinar separadamente cada uma


dessas fases para se descobrir o grau de confiança e certeza que é possível
conceder uma declaração que determinada pessoa tenha feito em juízo, por
exemplo.

Nessa Psicologia do Testemunho vale a pena apresentar uma questão


importante para o psicólogo jurídico: o paradigma do testemunho ocular.
Sternberg (2010) elucida que grande número de suspeitos são presos anualmente
nos EUA após serem identificados por testemunhas oculares, entretanto, nem
sempre o possível suspeito era o verdadeiro culpado. Há relatos de muitos
51

indivíduos terem sido erroneamente presos devido a falsos testemunhos que, ao


contrário do que se possa pensar, não ocorreram de maneira intencional por parte
da pessoa que visualizou a cena. Nossa memória pode nos pregar peças.
Estudos como os de Wells (1993 apud STERNBERG, 2010) embasam essa
realidade.

Existem problemas sérios de condenação errônea quando se usa o


testemunho ocular como único ou mesmo principal fundamento para acusar
pessoas acusadas de crime (LOFTUS; KETCHAM, 1991; LOFTUS, MILLER,
BURNS, 1987; WELL, LOFTUS, 1984).

Além disso, o testemunha ocular, muitas vezes, é um determinante


poderoso para um júri vir a condenar uma pessoa acusada. O efeito é
pronunciado, particularmente, se testemunhas oculares permanecem
altamente confiantes de seu testemunho. Isso é verdadeiro mesmo se as
testemunhas oculares conseguem indicar poucos detalhes perceptivos
ou oferecem respostas claramente conflitantes. As pessoas, algumas
vezes, até pensam que se lembram das coisas porque imaginaram ou
pensaram sobre elas (GARRY; LOFTUS, 1994 apud STERNBERG,
2010, p.212-213).

Porém, bem antes de 1993 já se investigavam esses tipos de


acontecimentos. Münsterberg, teórico funcionalista já citado nesta apostila,
percebeu, em suas pesquisas sobre as testemunhas oculares o:

[...] caráter falível da percepção humana de um evento como um crime e


da lembrança subsequente do evento. Ele descreveu pesquisas sobre
crimes simulados em que se pedia às testemunhas, imediatamente
depois de terem visto o crime, que descrevessem o que tinha ocorrido.
Os sujeitos não concordavam quanto aos detalhes do que tinham
testemunhado, embora a cena ainda estivesse viva em sua memória.
Quão preciso poderia ser tal testemunho numa corte, perguntou
Münsterberg, já que o evento em discussão teria ocorrido muitos meses
atrás? (SCHULTZ, SCHULTZ, 1992, p.199).

O que pode fazer a memória humana falhar frente a uma situação tão
séria que, em países como os EUA, pode levar o réu à pena de morte ou resultar
em prisão perpétua? Mesmo no caso do Brasil, cujas penas aplicáveis não
incluem a pena de morte ou a prisão perpétua, a condenação de um inocente e as
implicações de ser preso num ambiente extremamente adverso pode ser
suficiente para desencadear uma série de desajustes psicossociais no acusado
injustamente.
52

Sternberg (2010) enumera alguns aspectos, embasando-se em


pesquisas já publicadas:

 suscetibilidade das pessoas para distorção de relatos; propensão a


imaginar que viram coisas que não viram (LOFTUS, 1975, 1977 apud
STERNBERG, 2010);

 fileiras de suspeitos – testemunhas oculares supõem que o suspeito


sempre esteja na fileira, porém nem sempre é o caso, ou seja, quando os
responsáveis pelo crime não estavam na fileira, as testemunhas tendem a
reconhecer alguém naquela fileira como o responsável pelo crime
(WELLS, 1993 apud STERNBERG, 2010);

 características raciais – observa-se que o reconhecimento de uma face


por testemunho ocular é ineficaz ao se identificar pessoas de uma raça
distinta daquela da testemunha (BHIGHAM; MALPASS, 1985 apud
STERNBERG, 2010);

 nível de estresse das testemunhas – maior nível de estresse resulta em


menor precisão da recordação do fato e da identificação do rosto (PAYNE
et al., 2002 apud STERNBERG, 2010).

O autor supracitado também mostra o outro lado: existem autores


(ZARAGOZA; McCLOSKEY; JAMIS, 1987) que não são céticos aos relatos das
testemunhas oculares.

[...] alguns psicólogos (por exemplo, Egeth, 1993; Yuille, 1993) e muitos
promotores acreditam que as provas existentes, baseadas em grande
parte em estudos de testemunha ocular simulado em vez de relatos reais
feitos por testemunhas oculares não são suficientemente sólidas para
arriscar ir contra a credibilidade do testemunho ocular, quando tal
testemunho poderia resultar na prisão de um criminoso verdadeiro,
impedindo a pessoa de cometer mais crimes (STERNBERG, 2010,
p.215).

Visando aprimorar a identificação por testemunha ocular, faz-se


necessário minimizar possíveis vieses de percepção e interpretação, tomando
cuidados tais como:

 diminuir a pressão de escolher um suspeito de um conjunto limitado de


opções;
53

 assegurar que cada indivíduo na fila de suspeitos se enquadre na


descrição dada pela testemunha ocular;

 não formular entrevistas sugestivas;

 avisar os jurados que o grau de confiança da testemunha ocular pode


não corresponder ao grau de precisão da identificação realizada pela
mesma (STERNBERG, 2010).

Lago et al. (2006) elucidam, sobre o fenômeno das falsas memórias, que o
ser humano é capaz de armazenar e recordar informações que não ocorreram e
isso pode se dar devido à repetição de informações consistentes e inconsistentes
no depoimento das vítimas sobre determinado exemplo.

b) Inteligência
[...] inteligência é a capacidade para aprender com a experiência,
usando processos metacognitivos para incrementar a aprendizagem e a
capacidade de adaptar-se ao meio ambiente que nos cerca. Pode exigir
adaptações diferentes no âmbito de contextos sociais e culturais
diferentes (STERNBERG, 2010, p.474).

Essa é uma definição bastante genérica sobre inteligência, conceito que


não é unificado. Há testes para medir a inteligência, mas hoje em dia acredita-se
que nem tudo pode ser testado e quantificado. Gazzaninga e Heatheton (2005)
elucidam que uma série de estudos aponta que a inteligência sofre influência dos
fatores genético e ambiental.
Segundo Mira y López (2015), a inteligência é um fator endógeno e de
grande importância no fator reação pessoal. Uma pessoa obtusa possui menor
capacidade de adaptação às situações e pode recorrer à violência como forma de
solucionar um problema. “[...] grande número de delinquentes e dos indivíduos
que entram em conflito com a sociedade apresentam um déficit intelectual
acentuado” (p.41).
Alguns pesquisadores acreditam que a inteligência é um construto
unificado, ou seja, existem pessoas muito inteligentes de maneira geral ou pouco
inteligentes de maneira geral; por outro lado outros teóricos enfatizam a existência
de inteligências múltiplas, o que torna a definição menos segregatória. Há
54

também o conceito de inteligência emocional, o qual, em linhas gerais, articula


emoção e pensamento, bastante utilizado na atualidade.
Segundo Mira y López, é possível associar determinados tipos de delitos
à inteligência do cidadão infrator, ou seja, quanto maior o nível de inteligência
maior a complexidade do delito. Porém, essa análise não pode se restringir à
inteligência apenas, mas à capacidade de julgamento abstrato, diretamente
relacionado ao juízo moral.

Segundo Gazzaninga e Heatherton (2005), a moralidade envolve as


escolhas que as pessoas precisam fazer e que afetam diretamente a vida de
outras pessoas, como quando suas ações podem ocasionar em algum dano para
determinada pessoa ou o rompimento de algum contrato social implícito ou
explícito. Desde cedo, as crianças aprendem regras sociais e desenvolvem a
moral, sendo a empatia – a capacidade de se colocar no lugar dos outros – a
primeira emoção moral a surgir. O raciocínio moral envolve componentes da
cognição e da emoção, já que cognição e afeto encontram-se interligados.
“Pesquisas mostram que, se as pessoas não possuem capacidades cognitivas
adequadas, suas emoções morais podem não se traduzir em comportamentos
morais” (p.393).

Ainda segundo o mesmo autor, as práticas parentais podem promover o


comportamento pró-social nas crianças, porém, como já falamos na seção sobre
personalidade, existem também fatores fisiológicos que se relacionam à
moralidade. Estudos de Damásio e colaboradores com pessoas que sofreram
lesão na córtex pré-frontal quando bebês apontam sérias deficiências no
raciocínio moral e social, na tomada de decisões. Não expressavam empatia,
remorso, culpa e cometiam delitos (furtos, ameaças e agressões físicas,
mentiras).

Nesse sentido, Mira y López (2015) elucida que existe, na infância, uma
predisposição à delinquência por ignorância, ou seja, a criança pode tornar certas
atitudes por desconhecimento da moralidade, o que tende a se desenvolver com
o passar dos anos. Quando essa falta de compreensão da responsabilidade moral
persiste na juventude ou na idade adulta, torna-se a melhor explicação de muitos
atos delituosos – fato que também será explorado em outro momento do curso.
55

Segundo o mesmo autor, a capacidade de julgamento ou de inteligência


resulta de um conjunto de disposições em virtude das quais é possível ao
indivíduo solucionar novos problemas. Para isso, ela embasa-se na resolução de
problemas anteriores, ajustando-os e combinando-os de acordo com cada
situação. O autor mostra aqui a importância da inteligência no meio jurídico
lançando mão do exemplo a seguir:

Do mesmo modo que existem diferenças relativas na qualidade das


distintas fases (quatro) do processo mnêmico, essas são também
observadas nos períodos de que se compõe toda operação intelectual e,
assim, podem ser encontradas na vida pessoas muito aptas para
compreender, outras para inventar e outras preferentemente dotadas
para a crítica destruidora. Essas diferenças devem ser conhecidas pelos
juristas que têm de agir nos tribunais, visto que, definitivamente,
conforme o tipo intelectual de seu oponente, deverá orientar sua
informação de uma ou de outra forma. Tinha razão quem dizia que às
vezes é mais interessante para o advogado conhecer a psicologia dos
juízes que a psicologia de seus clientes (p.55-56).
56

UNIDADE 4 – DIREITO E PSICOLOGIA: UMA UNIÃO


POSSÍVEL

[...] a identidade do psicólogo jurídico está relacionada à Psicologia,


enquanto área de conhecimento e atuação profissional, e ao Direito,
enquanto um atributo que lhe confere a relação da sua atuação
profissional com as especificidades do campo jurídico.
ROEHRIG (2007, p.17).

Optamos por iniciar esse curso discorrendo sobre alguns conceitos da


psicologia diretamente relacionados ao contexto jurídico. Na maioria desses
conceitos – como, por exemplo, de personalidade, memória, Inteligência –
buscamos contextualizar exemplos de como a compreensão dos mesmos pode
se associar à psicologia jurídica, para que, nesse momento, o cursista já tenha
condições de compreender que a psicologia e o direito se inter-relacionam.
Não iremos ainda definir psicologia jurídica – tema que será abordado na
próxima seção. Nesse momento, nosso objetivo é compreender como a psicologia
pode auxiliar o direito. No início deste material, citamos que tanto a psicologia
quanto o direito derivam de uma mesma vertente: a Filosofia. A partir daí
compreendemos que essa união entre psicologia e direito se faz possível, visto
que ambos possuem uma de suas origens em comum.

Esta área de especialidade da Ciência da Psicologia se posiciona em


todas as áreas do Direito como corolário do princípio da dignidade
humana, da efetividade da decisão jurisdicional e da busca da “verdade
real”, consagrada ao magistrado na direção do moderno processo
judicial (BODSTEIN, 2007, s.p.).

Antes de focalizar especificamente a Psicologia Jurídica e sua relação


íntima com o Direito, pretendemos expor brevemente alguns dados históricos que
mostram o caminho que foi delineado há vários séculos para que essa união entre
Psicologia e Direito se concretizasse tal como acontece nos dias de hoje.
A literatura clássica mostra narrativas de casos verídicos e fictícios que
ilustram quão complexa é a conexão entre a subjetividade e os fatos jurídicos.
Essa conexão é bastante complexa, já que o homem elabora as leis, lança mão
das mesmas nos julgamentos dos fatos, porém não podemos deixar de
57

considerar que é este mesmo homem quem protagoniza o ato jurídico passível de
julgamento (CARVALHO, 2007).
Lago et al. (2009) reforçam que, na Antiguidade e Idade Média, a loucura
era um fenômeno bastante privado. A partir do século XVII, os doentes mentais
passaram a ser excluídos da sociedade, todos aqueles que representavam algum
tipo de ameaça à razão e à moral da sociedade passaram a ser confinados em
manicômios. Posteriormente houve a desinstitucionalização. Não iremos entrar
em detalhe sobre esse fato, apenas é importante relacionarmos a loucura à
psicologia jurídica, já que muitos doentes mentais podiam cometer crimes e a
avaliação psicológica dos mesmos pareceu uma estratégia importante para se
aplicar possíveis penas. A associação da doença mental com a incidência de
delitos é uma área de interesse para a psicologia jurídica e será elucidada num
outro momento.
Até a Idade Média, a religião desempenhava função primordial na
discriminação e julgamento das atitudes do homem. O Direito passou a buscar
maior diversidade de leis que organizassem os vários contratos estabelecidos
entre as pessoas e que também considerassem os progressos ocorridos em
outras ciências, os quais poderiam auxiliar na compreensão de comportamentos
desviantes e criminais. A psiquiatria forense foi uma dessas ciências que auxiliou
na análise de crimes por ser uma possibilidade para identificar alterações das
funções mentais que poderiam estar relacionadas ao ato em julgamento,
entretanto, os psiquiatras não dispunham de instrumentos para uma avaliação
mais específica (CARVALHO, 2007).

Por outro lado, no final do século XIX, a Psicologia foi reconhecida como
ciência e vinha predominantemente pesquisando e desenvolvendo
instrumentos para a investigação da memória, pensamento, entre outras
funções mentais. É dessa forma que a Psicologia se aproximou do
Direito, auxiliando nos processos periciais que forneciam subsídios ao
juiz na determinação da pena a ser cumprida (CARVALHO, 2007, p.21).

A psicologia – ou ciência psicológica, como denominam alguns autores da


atualidade – pode ser muito útil à área jurídica porque:

A ciência psicológica é igualmente útil para aqueles que, em sua


profissão, precisam entender as pessoas. Para persuadir os jurados, os
advogados precisam saber como os grupos tomam decisões
(GAZANINGA; HEARTHETON, 2005, p.57).
58

Segundo Lago et al. (2009), a primeira aproximação entre a Psicologia e o


Direito se deu na área criminal, já que a avaliação psicológica mostrou-se uma
importante estratégia para os profissionais de direito atuarem junto aos indivíduos
envolvidos em situações de crime. Com o passar dos anos, o psicólogo mostrou
sua importância junto ao Direito da Infância e Juventude, sendo que, depois, a
psicologia jurídica também abrange o Direito do Trabalho, Direito Civil, Direito de
Família, dentre outras áreas.
Segundo Gonzaga e colaboradores (2007), os psicólogos jurídicos
formulavam laudos periciais a partir da realização de diagnóstico e da aplicação
de testes psicológicos, para assim auxiliarem a instituição judiciária na tomada de
decisões.
Mira y López (2015) elucidam claramente essa primeira aproximação
entre a Psicologia e o Direito, já que o autor, em sua obra, enfatiza que, na época
da primeira publicação desse livro (década de 1930), a psicologia jurídica estava
limitada às seguintes questões: psicologia do testemunho, obtenção de evidência
delituosa (confissão com provas), descoberta da motivação que levou a
determinado delito, informação forense ao seu respeito, reforma moral do
delinquente e prevenção de problemas futuros. Observa-se que nessa época não
se falava da aplicabilidade da psicologia jurídica em outras áreas do direito, o que
veio a acontecer em outro momento.

Bodstein (2007) corrobora dos postulados de Mira y López ao afirmar que


os primeiros estudos na área da psicologia jurídica voltavam-se ao Direito Penal;
o psicólogo empenhava-se em buscar a “verdade judicial”. Para isso, os estudos
da época postulavam que os fenômenos físicos ou sensoriais eram transformados
pela sensação em fatos conscientes e assim provocavam a percepção como
fenômeno psicológico.

Desta inicial concepção – que o universo exterior chega ao nosso ‘eu’


como os sentidos nos apresentam –, temos a premissa de que há uma
variação potencial de nosso ‘ser emocional’, de indivíduo para indivíduo
e do mesmo indivíduo em cada momento de sua existência.
(BODSTEIN, 2007, s.p.)

Segundo Gonzaga et al. (2007), a Psicologia Jurídica, em seus


primórdios, surgiu na tentativa de controlar os indivíduos. Para isso, os psicólogos
59

aplicavam testes psicológicos e exerciam laudos para auxiliar a instituição


judiciária na tomada de decisão. Com o passar do tempo, a atuação psicológica
do psicólogo jurídico passou a ser repensada. O psicólogo buscou novas formas
de intervenção e o foco principal passou a ser o resgate da cidadania e a
promoção do bem-estar dos indivíduos, como expresso na citação a seguir:

Diante do exposto, percebe-se um histórico inicial da aproximação da


Psicologia e do Direito atrelado a questões envolvendo crime e também
os direitos da criança e do adolescente. Contudo, nos últimos dez anos,
a demanda pelo trabalho do psicólogo em áreas como Direito da Família
e Direito do Trabalho vem tomando força. Além desses campos, outras
possibilidades de participação do psicólogo em questões judiciais vêm
surgindo, (...) (LAGO et al., 2009, p.485).

Importante destacar que, mesmo com a notável união entre Direito e


Psicologia na atualidade, os cursos de graduação em psicologia nem sempre
oferecem a disciplina Psicologia Jurídica. Quando o fazem, costuma ser uma
disciplina opcional ou de carga horária reduzida. Por outro lado, no Direito, a
disciplina é de caráter compulsório, mesmo sendo de carga horária reduzida
(LAGO et al., 2009).

Como pode ser evidenciado, o Direito e a Psicologia se aproximaram em


razão da preocupação com a conduta humana. O momento histórico
pelo qual a Psicologia passou fez com que, inicialmente, essa
aproximação se desse por meio da realização de psicodiagnósticos, dos
quais as instituições judiciárias passaram a se ocupar. Contudo, outras
formas de atuação além da avaliação psicológica ganharam força, entre
elas a implantação de medidas de proteção e socioeducativas e o
encaminhamento e acompanhamento de crianças e/ou adolescentes.
Observa-se que a avaliação psicológica ainda é a principal demanda dos
operadores do Direito. Porém, outras atividades de intervenção, como
acompanhamento e orientação, são igualmente importantes, [...]. São
áreas de atuação que devem coexistir, uma vez que seus objetivos são
distintos, buscando atender a propósitos diferenciados, mas também
complementares (LAGO et al., 2009, p.486).

Atualmente, percebe-se que a atuação do psicólogo nos meios judicial e


forense deixou de se restringir à aplicação de testes na área criminal ou na
atenção à infância e adolescência. Os ramos do Direito que frequentemente
demandam a atuação do psicólogo jurídico são Direito da Família, Direito da
Infância e Adolescência, Direito Civil, Direito Penal e Direito do Trabalho. Nesse
contexto, a testagem continua sendo um importante processo de avaliação,
porém, ao contrário do que aconteceu nos primórdios da psicologia jurídica,
60

deixou de ser a única estratégia adotada pelo psicólogo, mas sim um dos
recursos que o profissional lança mão quando precisa realizar uma avaliação
(LAGO et al., 2009).

Finalizamos esta seção com a ideia de que no ambiente forense e


prisional faz-se premente uma atuação multidisciplinar, na qual o psicólogo
encontra-se inserido, já que nesses meios se faz necessária uma maior
compreensão dos fenômenos emocionais subjacentes às situações e aos
indivíduos a elas relacionados:

No campo do Direito Moderno, em todas as áreas de atividade judicial e


jurisdicional, observa-se a premente necessidade de subsidiar
tecnicamente as decisões em compartilhamento inter, multi e
transdisciplinar; calcadas no bem juridicamente tutelado no processo
judicial à luz das percepções emocionais das partes (BODSTEIN, 2007,
s.p.).
61

UNIDADE 5 – CONCEITUAÇÃO DE PSICOLOGIA


JURÍDICA E CAMPO DE ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL

5.1 O que é psicologia jurídica

Recapitulando, antes de chegarmos à definição de psicologia jurídica,


compreendemos que a união entre o Direito e a Psicologia não é apenas possível,
mas sim bastante interessante e útil. Assim como acontece em outras áreas de
saber – como a área da saúde, por exemplo – a perspectiva de um trabalho
multidisciplinar também traz a possibilidade de inúmeros benefícios no âmbito
jurídico.

Tanto a equipe multidisciplinar, quanto as pessoas que precisam, por


alguma razão, recorrer ao sistema jurídico, saem beneficiadas pela atuação do
psicólogo já que, normalmente, as questões que precisam de intervenção judicial
para ser resolvidas dependem da lei, mas não pode-se deixar de considerar o fato
de que são questões bastante carregadas emocionalmente e afetivamente. Aí
entra o diferencial oferecido pelo psicólogo.

A Psicologia Jurídica emergiu quando as realidades fenomenológicas


surpreenderam os operadores do Direito na tutela dos interesses de
ordem pública, exigindo uma reflexão pacificadora voltada às finalidades
sociais. Nos encontros e desencontros hermenêuticos e epistemológicos
da atuação profissional, criou-se uma nova especialidade, além das
tradicionais Psicologia Escolar, Organizacional e Clínica (BODSTEIN,
2007, s.p.).

Assim como outras áreas foram se despontado na psicologia – como a


Escolar, a Organizacional, a Clínica e a Hospitalar – a Psicologia Jurídica surge
como mais uma área da psicologia voltada para uma realidade institucional –
nesse caso, o fórum, a prisão, as instituições que acolhem crianças e
adolescentes devido a diversas situações – que passa a obter benefícios com a
inclusão do psicólogo em sua equipe multidisciplinar.

A partir daí vêm as definições. A primeira, de Mira y López (2015, p.28)


refere-se ao início da psicologia jurídica, quando, como vimos na seção anterior, a
psicologia ainda era aplicada a apenas algumas áreas do direito: “A psicologia
jurídica é a psicologia aplicada ao melhor exercício do direito”.
62

Gonzaga et al. (2007, p.27) fornecem uma definição mais ampliada para a
psicologia jurídica. Segundo eles, a Psicologia Jurídica é uma área específica da
Psicologia que surge da inter-relação com o Direito, tanto no âmbito teórico
quanto no prático. Nesse encontro interdisciplinar, Souza (1998, p.6) afirma:

(…) que a Psicologia vem por um lado, procurando compreender o


comportamento humano, e o Direito, por outro, possuindo um conjunto
de preocupações sobre como regular e prever determinados tipos de
comportamentos, com o objetivo de estabelecer um contrato social de
convivência comunitária.

França (2004) define a psicologia jurídica como a área da psicologia que


se relaciona com a justiça. A autora estabelece uma diferenciação entre os
termos “Psicologia Jurídica” e “Psicologia Forense” que, para alguns, aparecem
como sinônimos. Enquanto o termo “forense” diz respeito ao foro judicial e aos
tribunais, o termo “jurídica” é mais abrangente por relacionar-se aos
procedimentos ocorridos nos tribunais, àqueles que são fruto da decisão judicial,
assim como também àqueles que são de interesse do Direito.

O CFP (2001) elucida claramente a descrição das atividades que podem


ser desenvolvidas pelo psicólogo jurídico, as quais se encontram, na íntegra, na
citação a seguir:

Atua no âmbito da Justiça, colaborando no planejamento e execução de


políticas de cidadania, direitos humanos e prevenção da violência,
centrando sua atuação na orientação do dado psicológico repassado não
só para os juristas como também aos indivíduos que carecem de tal
intervenção, para possibilitar a avaliação das características de
personalidade e fornecer subsídios ao processo judicial, além de
contribuir para a formulação, revisão e interpretação das leis: Avalia as
condições intelectuais e emocionais de crianças, adolescentes e adultos
em conexão com processos jurídicos, seja por deficiência mental e
insanidade, testamentos contestados, aceitação em lares adotivos,
posse e guarda de crianças, aplicando métodos e técnicas psicológicas
e/ou de psicometria, para determinar a responsabilidade legal por atos
criminosos; atua como perito judicial nas varas cíveis, criminais, Justiça
do Trabalho, da família, da criança e do adolescente, elaborando laudos,
pareceres e perícias, para serem anexados aos processos, a fim de
realizar atendimento e orientação a crianças, adolescentes, detentos e
seus familiares; orienta a administração e os colegiados do sistema
penitenciário sob o ponto de vista psicológico, usando métodos e
técnicas adequados, para estabelecer tarefas educativas e profissionais
que os internos possam exercer nos estabelecimentos penais; realiza
atendimento psicológico a indivíduos que buscam a Vara de Família,
fazendo diagnósticos e usando terapêuticas próprias, para organizar e
resolver questões levantadas; participa de audiência, prestando
informações, para esclarecer aspectos técnicos em psicologia a leigos
ou leitores do trabalho pericial psicológico; atua em pesquisas e
63

programas sócio-educativos e de prevenção à violência, construindo ou


adaptando instrumentos de investigação psicológica, para atender às
necessidades de crianças e adolescentes em situação de risco,
abandonados ou infratores; elabora petições sempre que solicitar alguma
providência ou haja necessidade de comunicar-se com o juiz durante a
execução de perícias, para serem juntadas aos processos; realiza
avaliação das características das personalidade, através de triagem
psicológica, avaliação de periculosidade e outros exames psicológicos
no sistema penitenciário, para os casos de pedidos de benefícios, tais
como transferência para estabelecimento semiaberto, livramento
condicional e/ou outros semelhantes. Assessora a administração penal
na formulação de políticas penais e no treinamento de pessoal para
aplicá-las. Realiza pesquisa visando à construção e ampliação do
conhecimento psicológico aplicado ao campo do direito. Realiza
orientação psicológica a casais antes da entrada nupcial da petição,
assim como das audiências de conciliação. Realiza atendimento a
crianças envolvidas em situações que chegam às instituições de direito,
visando à preservação de sua saúde mental. Auxilia juizados na
avaliação e assistência psicológica de menores e seus familiares, bem
como assessorá-los no encaminhamento a terapias psicológicas quando
necessário. Presta atendimento e orientação a detentos e seus familiares
visando à preservação da saúde. Acompanha detentos em liberdade
condicional, na internação em hospital penitenciário, bem como atuar no
apoio psicológico à sua família. Desenvolve estudos e pesquisas na área
criminal, constituindo ou adaptando os instrumentos de investigação
psicológica (p.10-11).

O objeto de estudo da Psicologia Jurídica são os comportamentos


complexos que ocorrem ou podem vir a ocorrer – comportamentos esses que
devem ser de interesse do jurídico. Essa definição é bastante importante, pois
delimita a ação da Psicologia Jurídica, já que o estudo do comportamento é uma
das práxis da psicologia. Compreendem-se como jurídicas as atividades que
fornecem embasamento ao campo do Direito, realizadas pelos psicólogos, dentro
dos fóruns e fora deles. A especificidade da Psicologia Jurídica ocorre no campo
de intersecção com o jurídico (POPOLO, 1996 apud FRANÇA, 2004).

Retomando a Psicologia Jurídica, acredito que ela deve ir além do


estudo de uma das manifestações da subjetividade, ou seja, o estudo do
comportamento. Devem ser seu objeto de estudo as consequências das
ações jurídicas sobre o indivíduo. (FRANÇA, 2003, p.76).

No Brasil, a história da Psicologia Jurídica coincide com a data do


surgimento da profissão, em 1960. A partir da Lei de Execução Penal – Lei
Federal 7210/84, o psicólogo passou a ser reconhecido legalmente dentro da
instituição penitenciária (FRENANDES, 1998 apud LAGO et al., 2009). Isso foi
mostrado na introdução deste material.
64

5.2 Campos de atuação da Psicologia Jurídica

Conforme explanamos anteriormente, em seu início, a Psicologia Jurídica


voltava-se à área criminal, sendo que o uso de testes e avaliações psicológicas
contribuiu para a sua disseminação. Com o passar dos anos, o psicólogo jurídico
encontrou vários espaços de atuação, como pretendemos mostrar agora.

Gonzaga et al. (2007) afirmam que, inicialmente, a atuação do psicólogo


jurídico voltava-se à tentativa de classificar e controlar os indivíduos, porém, com
o passar dos tempos, algumas mudanças foram surgindo e a psicologia jurídica
buscou uma nova forma de intervenção que prioriza o resgate da cidadania dos
indivíduos.

As avaliações psicológicas, como as perícias, são importantes, contudo,


há a necessidade de repensá-las. Justifica-se tal postura porque realizar
perícia é uma das possibilidades de atuação do psicólogo jurídico, mas
não a única. O psicólogo jurídico pode atuar fazendo orientações e
acompanhamentos, contribuir para políticas preventivas, estudar os
efeitos do jurídico sobre a subjetividade do indivíduo, entre outras
atividades e enfoques de atuação (FRANÇA, 2004, p.75-76).

A tabela a seguir ilustra as áreas do Direito e os tipos de atuação que o


psicólogo jurídico pode desempenhar, deixando explícito, assim, que a união
entre Direito e Psicologia não é apenas possível, mas extremamente necessária.

Tabela 06: Atuação do psicólogo jurídico e as áreas do Direito

Área do Direito Subárea Atividade desempenhada pelo psicólogo


Direito de Separação e divórcio Atuação nos processos de divórcio litigioso.
Família
Atuar como mediador quando as partes se
dispõem a encontrar um acordo.
Quando a mediação não obtiver sucesso, o juiz
pode solicitar avaliação psicológica de uma das
partes ou do casal.
Partilha de bens, guarda de filhos,
estabelecimento de pensão alimentícia e direito à
visitação.
“[...] seja como avaliador ou mediador, o psicólogo
buscará os motivos que levaram o casal ao litígio
e os conflitos subjacentes que impedem um
acordo em relação aos aspectos citados. Nos
casos em que julgar necessário, o psicólogo
poderá, inclusive, sugerir encaminhamento para
tratamento psicológico ou psiquiátrico da(s)
parte(s)” (p.486).
65

Regulamentação de A regulamentação de visitação faz parte do


visitação processo de divórcio, mas, mesmo após esse, é
comum surgirem conflitos em torno da visitação
dos filhos.

“Nesses casos, o psicólogo jurídico contribui por


meio de avaliações com a família, objetivando
esclarecer os conflitos e informar ao juiz a
dinâmica presente nesta família, com sugestões
das medidas que poderiam ser tomadas” (p.486).
Pode atuar na mediação dos conflitos do casal,
visando um acordo pautado na colaboração
(SCHABBEL, 2005).
Disputa de guarda Nos casos mais graves, o juiz pode solicitar uma
perícia psicológica para verificar qual dos ex-
cônjuges dispõe de melhores condições
psicológicas para deter a guarda da criança.

A mediação não é uma estratégia muito comum


nesses casos, pois normalmente os pais em
questão são pessoas que colocam seus
interesses pessoais, vaidades e conflitos com o
ex-cônjuge em primeiro lugar, em detrimento do
bem-estar do filho.

“Além dos conhecimentos sobre avaliação,


psicopatologia, psicologia do desenvolvimento e
psicodinâmica do casal, assuntos atuais como a
guarda compartilhada, falsas acusações de abuso
sexual e síndrome de alienação parental podem
estar envolvidos nesses processos” (p.487).
Direito da Adoção Nos Juizados da Infância e Adolescência, o
Criança e psicólogo presta assessoria constante às famílias
Adolescente adotantes antes de depois da adoção.

“Como a adoção é um vínculo irrevogável, o


estudo psicossocial torna-se primordial para
garantir o cumprimento da lei, prevenindo assim a
negligência, o abuso, a rejeição ou a devolução”
(p.487).

Nas Fundações de Proteção Especial, busca-se


prestar assistência às crianças e adolescentes
institucionalizados para que a realidade nesses
locais seja bastante parecida com a realidade
familiar.
Destituição do poder Os pais podem perder o direito à guarda dos
familiar filhos, que passa a ficar sob a tutela de uma
família até a maioridade.

“Independentemente da causa da remoção –


doença, negligência, abandono, maus-tratos,
abuso sexual, ineficiência ou morte dos pais – a
66

transferência da responsabilidade para estranhos


jamais deve ser feita sem muita reflexão”
(CESCA, 2004, p. 487).
Adolescentes autores Medidas socioeducativas coercitivas e punitivas.
de atos infracionais
“Os psicólogos que desenvolvem seu trabalho
junto aos adolescentes infratores devem lhes
propiciar a superação de sua condição de
exclusão, bem como a formação de valores
positivos de participação na vida social. Sua
operacionalização deve, prioritariamente, envolver
a família e a comunidade com atividades que
respeitem o princípio da não discriminação e não
estigmatização, evitando rótulos que marquem os
adolescentes e os exponham a situações
vexatórias, além de impedi-los de superar as
dificuldades na inclusão social” (p.489).
Direito Civil Dano psíquico Caracteriza-se por sequela psíquica ou emocional
decorrente de um fato traumatizante.
O psicólogo deve avaliar a real presença desse
dano, levando em consideração a possível
manipulação dos sintomas, já que está em suas
mãos a determinação de um ressarcimento
financeiro ou não (ROVINSKI, 2005).
Interdição Incapacidade do exercício, por si mesmo, dos
atos da vida civil.

Encaminhado pelo juiz, o psicólogo perito realiza


avaliações que podem comprovar ou não situação
de doença mental.

“ À justiça interessa saber se a doença mental de


que o paciente é portador o torna incapaz de
reger sua pessoa e seus bens” (MONTEIRO,
1999).

“As questões levantadas em um processo de


interdição incluem a validade, nulidade ou
anulabilidade de negócios jurídicos, testamentos e
casamentos. Além dessas, ficam prejudicadas a
contração de deveres e aquisição de direitos, a
aptidão para o trabalho, a capacidade de
testemunhar e a possibilidade de ele próprio
assumir tutela ou curatela de incapaz e exercer o
poder familiar” (TABORDA, CHALUB &
ABDALLA-FILHO, 2004).
Direito Penal “As avaliações psicológicas individualizadas,
Atuação nos presídios
“o psicólogo pode previstas em lei, são inviáveis nos presídios
ser solicitado a brasileiros em razão das superpopulações
atuar como perito existentes. Pelo mesmo motivo, proporcionar um
para averiguação “tratamento penal” aos apenados ou estabelecer
de outro tipo de relações institucionais com os
periculosidade, demais funcionários, internos e/ou seus familiares
das condições de são tarefas difíceis para os psicólogos que
discernimento ou trabalham junto ao sistema carcerário” (KOLKER,
sanidade mental 2004).
67

das partes em
litígio ou em
julgamento”
(ARANTES,
2004).
Institutos Psiquiátricos Atuação junto a doentes mentais que cometeram
Forenses algum delito.

Direito do Perito em processos trabalhistas.


Trabalho
Investigar a relação entre supostos danos
psicológicos e doenças relacionadas ao trabalho
(afastamento, aposentadoria, condições de
trabalho).
Outros campos Vitimologia Avaliação do comportamento e personalidade da
de atuação vítima.

“Cabe ao psicólogo atuante nessa área traçar o


perfil e compreender as reações das vítimas
perante a infração penal. A intenção é averiguar
se a prática do crime foi estimulada pela atitude
da vítima, o que pode denotar uma cumplicidade
passiva ou ativa para com o criminoso. Para tanto,
a análise é feita desde a ocorrência até as
consequências do crime” (BREGA FILHO, 2004).

Além disso, a vitimologia dedica-se também à


aplicação de medidas preventivas e à prestação
de assistência às vítimas, visando, assim, à
reparação de danos causados pelo delito.
Psicologia do Avaliação da veracidade dos testemunhos de
Testemunho vítimas e suspeitos.
Atenção ao fenômeno de falas memórias
elucidado na seção anterior.

Depoimento sem dano: “objetiva proteger


psicologicamente crianças e adolescentes vítimas
de abusos sexuais e outras infrações penais que
deixam graves sequelas no âmbito da estrutura da
personalidade” (p.489).
Fonte: adaptado de Lago et al. (2009).

Além dessas áreas de atuação detalhadas na tabela anterior, a citação a


seguir expõe as áreas de atuação do psicólogo jurídico, elucidando que, além da
parceria bastante comentada com os profissionais do Direito, o psicólogo jurídico
também trabalha diretamente com os profissionais do Serviço Social:
68

Desdobra-se ao longo dos princípios constitucionais: proteção aos


idosos; atendimento de réus, aprisionados e pró-egressos; conflitos
interfamiliares; abandono e recolocação em adoção; preservação do
afeto e do cuidado nas relações judiciais familiares – nos fóruns, no
sistema prisional, nos procedimentos junto aos assistentes sociais;
processos judiciais conciliatórios e mediatórios na esfera familiarista;
atos de violência contra a mulher; preservação de abrigos legais para a
inserção da criança e do adolescente em situação de risco por
abandono, assistência inadequada ou orfandade (BODSTEIN, 2007,
s.p.).

Roehrig (2007) também elucida o vasto campo de atuação do psicólogo:

 Sistema penitenciário;

 Varas de família;

 Varas da Infância e da Juventude;

 Juizados Especiais (Cível e Criminal);

 Varas de Penas Alternativas;

 Varas Cíveis;

 Diversos locais do Poder Judiciário.

 Forças Armadas;

 Secretarias Estaduais de Segurança;

 Ministério Público;

 Escolas de Magistratura, entre outros.

Como já afirmamos em outros momentos, o campo de atuação do


psicólogo jurídico sofreu grande ampliação, além da aplicação de testes e
elaboração de laudos em réus, testemunhas e outros envolvidos em processos. O
psicólogo jurídico pode realizar tais tarefas, mas, além disso, esse profissional
preocupa-se com as questões emocionais e afetivas subjacentes às pessoas
envolvidas nos ambientes forenses, prisionais, de abrigos – questões essas que
nem sempre são abordadas pelos demais profissionais.

Além de todos esses profissionais diretamente relacionados ao contexto


jurídico, existem também os profissionais que não estão alocados no sistema
69

jurídico, mas que exercem funções diretamente associadas ao trabalho jurídico;


fala-se na psicologia em interface com a justiça. A citação a seguir ilustra quem
são esses profissionais, cuja atuação também é de suma importância tanto para o
Direito, quanto para o Psicólogo Jurídico:

Destaca-se, contudo, que o CFP vem usando a designação psicologia na


interface com a Justiça, a partir do entendimento de que essa expressão
incluiria não só os profissionais lotados nos tribunais, mas também os
que executam trabalhos que são encaminhados ao sistema de Justiça,
ou seja, psicólogos que não possuem vínculo empregatício com o Poder
Judiciário. Inserem-se aí, portanto, trabalhos realizados por aqueles que
atuam em consultórios clínicos e os que compõem equipes de outras
instituições, convidados ou solicitados a emitir pareceres que serão
anexados aos autos processuais. Nesse último grupo, pode-se listar, por
exemplo, os psicólogos que exercem sua prática profissional em
unidades que executam medidas socioeducativas, em penitenciárias, em
Conselhos Tutelares, em CREAS e em ONGs, entre outros. (BRITO,
2012, p. 199).
70

UNIDADE 6 – ÉTICA NA PSICOLOGIA JURÍDICA

Antes de aprofundarmos sobre questões éticas que permeiam a práxis do


psicólogo jurídico, faz-se necessário proceder a algumas definições.
Primeiramente iremos definir ética e moral – duas palavras bastante comuns em
nosso vocabulário, mas cuja definição nem sempre é bem delimitada. Após essas
definições pretendermos discorrer brevemente sobre o Código de Ética dos
Psicólogos (CRP, 2005), documento que delineia a atuação do psicólogo no
Brasil. A partir de alguns postulados desse documento, iniciaremos nossa
discussão sobre a ética na psicologia jurídica especificamente.

Moral e ética costumam ser compreendidos como sinônimos. Assim,


ambas as palavras dizem respeito a um conjunto de regras de conduta
consideradas como obrigatórias. Essa sinonímia se dá devido à origem das
palavras: enquanto a moral descende do latim, a ética descende de origem grega.
Ambas as palavras, cada qual em sua cultura, nomeiam o campo de reflexão
sobre os costumes dos homens, sua validade, legitimidade, desejabilidade,
exigibilidade (LA TAILLE, 2006).

Entretanto, mesmo observando que ambas as palavras, desde seus


primórdios, aparecem como sinônimos, atualmente autores propõem uma
diferenciação entre ambos. O termo “moral” diz respeito ao fenômeno social, ou
seja, todas as comunidades humanas são regidas por um conjunto de regras de
conduta e proibições cujas transgressões às mesmas acarretam sanções
socialmente organizadas. Toda organização social humana tem uma moral (LA
TAILLE, 2006).

Chaui (1995) compreende a ética como “[...] filosofia moral, isto é, uma
reflexão que discuta, problematize e interprete o significado dos valores morais”
(p.339). Aqui deparamo-nos com outro ponto a ser compreendido: “a moral.
Segundo a mesma autora, moral consiste nos [...] valores concernentes ao bem e
ao mal, ao permitido e ao proibido, e à conduta correta, válidos para todos” (p.
339).

A moral, portanto, refere-se à normatividade oriunda da sociedade, refere-


se aos costumes, normas e regras que permeiam o cotidiano e que visam a
71

regular as relações entre os sujeitos. A ética é a reflexão crítica sobre a moral, ou


seja, pensar naquilo que se faz, repensar os costumes, normas e regras vigentes
na sociedade (MEDEIROS, 2002, s.p.).

A ética consiste no trabalho de reflexão filosófica e científica acerca da


moral, ou seja, pode-se viver uma moral sem se realizar uma reflexão ética.
Também, pode-se definir a moral como as regras que valem para as relações
privadas (por exemplo, comportamentos familiares), enquanto que a ética
relaciona-se às normas que regem o espaço público (LA TAILLE, 2006).

Moral e ética variam em função do contexto histórico, cultural e social.


Como nosso foco é a psicologia jurídica, faz-se importante diferenciar a moral –
livre escolha do sujeito – das normas jurídicas – impostas e obrigatórias:

Os traços específicos que diferenciam a moral das normas jurídicas


evidenciam a adesão íntima, característica particular da moral, e a
coação externa, pertencente ao âmbito das normas jurídicas. Ou seja, a
moral implica a livre escolha do sujeito frente às diferentes possibilidades
de solução de uma determinada situação. Diferente da moral, as normas
jurídicas não requerem convicção pessoal e liberdade no que se refere à
escolha de possíveis alternativas de ação. As normas jurídicas são
impostas pelo Estado e obrigatórias para todos. Mesmo considerando
uma norma jurídica injusta, o sujeito deve cumpri-la, pois a
desobediência implica punição. Para garantir o cumprimento das normas
jurídicas, estas encontram-se codificadas formal e oficialmente – códigos
e leis prescritos pelo poder legislativo (MEDEIROS, 2002, s.p.).

Sem dúvidas, o aprofundamento do estudo da ética e da moral acarretaria


em mais definições sobre os temas, porém, esse não é o nosso propósito. A partir
dessas definições, conseguimos compreender o conceito de ética para assim
entender a importância da “reflexão filosófica e científica da moral” relacionada às
questões que permeiam o universo da Psicologia Jurídica.

Em síntese, segundo Medeiros (2002), a atuação do psicólogo deve ser


pautada em três pilares: no Código de Ética Profissional do Psicólogo – já que o
seu cumprimento garante uma postura ética; em suas convicções pessoais –
valores e princípios construídos ao longo de sua formação pessoal e profissional;
em princípios éticos que servem a todos – aqueles que não priorizem crenças ou
valores pessoais.
72

O primeiro ponto levantado anteriormente diz respeito aos códigos de


ética profissionais – documentos que trazem uma série de diretrizes que visam
nortear as atitudes dos profissionais. Ilustram, de maneira clara, os direitos,
responsabilidades e deveres, proibições e penalidades que possam ser
acarretadas ao profissional que executou alguma ação indevida.

Daí as referências aos ‘códigos de ética’ de variadas profissões, ou da


presença de expressões como ‘ética na política’, os ‘comitês de ética
para a pesquisa em seres humanos’. Não faria sentido falar em ‘ética na
família’. Note-se que a diferenciação entre espaços privado e público não
implica diferenças de conteúdo: por exemplo, o não roubar ou o não
mentir vale para os dois. Em compensação, os códigos de ética (que
inspiram os diversos comitês, em cada instituição profissional) implicam
um trabalho de elaboração intelectual, fato que nos reaproxima da
definição de ética como reflexão sobre a moral. De fato, para elaborar-se
um código desse tipo, é preciso não apenas conhecer a moral da
sociedade em que se vive, mas também pensar sobre as
particularidades da profissão contemplada (LA TAILLE, 2006, p.27).

O Código de Ética do Profissional Psicólogo foi elaborado pelo Conselho


Federal de Psicologia. A versão mais recente consta de 2005. Segundo o CFP
(2005):

Códigos de Ética expressam sempre uma concepção de homem e de


sociedade que determina a direção das relações entre os indivíduos.
Traduzem-se em princípios e normas que devem se pautar pelo respeito
ao sujeito humano e seus direitos fundamentais. Por constituir a
expressão de valores universais, tais como os constantes na Declaração
Universal dos Direitos Humanos; sócio-culturais, que refletem a realidade
do país; e de valores que estruturam uma profissão, um código de ética
não pode ser visto como um conjunto fixo de normas e imutável no
tempo. As sociedades mudam, as profissões transformam-se e isso
exige, também, uma reflexão contínua sobre o próprio código de ética
que nos orienta (p.5).

Assim, postula-se que o trabalho do Psicólogo Jurídico deve ser


embasado nos postulados expressos no Código de Ética do Profissional
Psicólogo – documento que, como explicitou a citação anterior, vai além de um
conjunto de normas imutáveis ao tempo. Pretendemos elucidar alguns pontos
específicos deste documento e de outras resoluções do CFP que se relacionam
diretamente com a práxis do Psicólogo Jurídico, os quais serão elucidados a
seguir.
73

O primeiro ponto levantado diz respeito ao sigilo profissional. Sabe-se que


esse é um dos princípios primordiais que norteiam o trabalho não só do psicólogo,
mas de vários outros profissionais como, por exemplo, o advogado, o médico e o
enfermeiro. Se não fosse por esse princípio, certamente os clientes não
confiariam suas questões mais confidenciais aos profissionais que os assistem,
porém, na Psicologia Jurídica, isso pode ficar confuso, já que, por um lado versa o
direito do cliente ao sigilo, porém, por outro lado, versa a justiça.

A citação a seguir ilustra sobre o direito do profissional a manter o sigilo,


mesmo quando em atividade multiprofissional:

[...] não há motivo para supor que, junto ao sistema de Justiça, o


psicólogo estaria desobrigado de manter o sigilo profissional. Nessas
situações, cabe recordar que o Código dispõe, na alínea b do artigo 6º,
que o psicólogo, no relacionamento com profissionais de outras áreas de
conhecimento, compartilhará somente informações relevantes para
qualificar o serviço prestado, resguardando o caráter confidencial das
comunicações, assinalando a responsabilidade, de quem as receber, de
preservar o sigilo. (BRITO, 2012, p. 200).

Observa-se que o sigilo profissional deve ser mantido na maioria dos


casos. Entretanto, o Código de Ética versa também sobre situações especiais –
que podem ocorrer no meio jurídico – e implicam na necessidade do profissional
ser obrigado a quebrar o sigilo profissional, como as situações previstas em lei:

Art. 9º
– É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger,
por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou
organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.
Art. 10
– Nas situações em que se configure conflito entre as exigências
decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios
fundamentais deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, o
psicólogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na
busca do menor prejuízo.
Parágrafo único
– Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, o psicólogo
deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias.
Art. 11
– Quando requisitado a depor em juízo, o psicólogo poderá prestar
informações, considerando o previsto neste Código (CFP, 2005).

Em síntese: a citação mostra que, caso seja obrigado por lei a revelar
dados que tenha conhecimento em decorrência de sua atividade profissional, o
psicólogo precisará quebrar o sigilo para não arcar com consequências judiciais,
74

porém deve se resguardar a revelar somente o estritamente necessário. Como


essas exceções podem gerar dúvida ao profissional, recomenda-se que, quando
frente a um dilema ético sigilo profissional X lei, o profissional pode se dirigir ao
Conselho Regional de Psicologia de sua região e pedir orientações de como agir
frente a uma situação específica.

Em caso de perícia, o Psicólogo deve se atentar à Resolução 08/2010,


respeitar a privacidade durante a avaliação e garantir que o periciado não seja
constrangido:

Art. 1º - O Psicólogo Perito e o psicólogo assistente técnico devem evitar


qualquer tipo de interferência durante a avaliação que possa prejudicar o
princípio da autonomia teórico-técnica e ético-profissional, e que possa
constranger o periciando durante o atendimento (CFP, 2010a).

Em relação ao sigilo profissional, outro ponto merece destaque. Quando o


psicólogo é psicoterapeuta de alguma das partes envolvidas em questão judicial –
a psicologia em interface com a justiça da qual nos referimos anteriormente –
alguns pontos precisam ser destacados.

Segundo a Resolução 008/2010, esse profissional não pode, por


questões éticas, atuar como assistente técnico judiciário; fornecer informações
sem consentimento formal dos envolvidos e, no caso de menores de idade, esse
consentimento formal deve ser dado por pelo menos um dos responsáveis legais
(CFP, 2010a).

Segundo o mesmo documento, o psicólogo jurídico que for realizar perícia


deve garantir que essa aconteça em ambiente adequado, que zele pela
privacidade da pessoa atendida.

A Resolução do CFP n° 010/2010 institui a regulamentação da Escuta


Psicológica de Crianças e Adolescentes na Rede de Proteção. Dentre os
aspectos considerados nessa resolução, convém destacar que, assim como já
mencionado, a escuta precisa acontecer em local que garanta a privacidade do
menor. Ao produzir documentos, o psicólogo compartilhará apenas as
informações necessárias para qualificar o serviço prestado com outros
profissionais envolvidos no atendimento, de forma a contribuir para que o menor
atendido não seja revitimizado (CFP, 2010c).
75

Assim, até aqui foi possível observar que um dos pontos cruciais que
regem o trabalho do psicólogo é o sigilo profissional e, mesmo em ambientes
jurídicos, o assistido goza desse direito, salvo nas exceções elucidadas, nas quais
o psicólogo deve cuidar para expor o cliente da menor forma possível para os
demais profissionais envolvidos. Deve-se ressaltar que a exposição indevida pode
causar danos morais ao indivíduo ou deixá-lo ainda mais exposto a situações de
violência, ou seja, ocasionaria mais danos além daqueles aos quais o sujeito já
está exposto.

Outro ponto que merece destaque quando discutimos sobre a ética é a


atuação do psicólogo junto ao sistema prisional. A Resolução 009/2010 postula
sobre a atuação do Psicólogo Jurídico no sistema prisional, atuação que deve ser
pautada pela ética, por uma mudança de paradigmas e pela garantia dos direitos
humanos à pessoa em privação de liberdade:

Art. 1º.
Em todas as práticas no sistema prisional, o psicólogo deverá respeitar e
promover:
a) os direitos humanos dos sujeitos em privação de liberdade, atuando
em âmbito institucional e interdisciplinar;
b) processos de construção da cidadania, em contraposição à cultura
de primazia da segurança, de vingança social e de disciplinarização
do indivíduo;
c) desconstrução do conceito de que o crime está relacionado
unicamente à patologia ou à história individual, enfatizando os
dispositivos sociais que promovem o processo de criminalização;
d) a construção de estratégias que visem ao fortalecimento dos laços
sociais e uma participação maior dos sujeitos por meio de projetos
interdisciplinares que tenham por objetivo o resgate da cidadania e a
inserção na sociedade extramuros (CFP, 2010b).

Como já afirmamos várias vezes ao longo deste curso, a primeira prática


executada pelo psicólogo jurídico é a avaliação psicológica e a elaboração de
laudos. Mesmo com o surgimento de outras atividades que podem ser
desempenhadas por esse profissional, a avaliação psicológica continua sendo um
ponto alto na atuação desse profissional e existem questões éticas envolvidas:

Para melhor compreensão da complexidade que envolve uma avaliação


psicológica, tarefa constantemente demandada àqueles que executam
trabalhos direcionados ao sistema de Justiça, considera-se que não se
deve desmembrar essa expressão, reduzindo-a a uma investigação
qualquer, sob o risco de se deixar de lado toda a riqueza e a
especificidade que contempla. Equiparar o termo avaliação psicológica
ao ato de investigar pode conduzir ao uso de procedimentos que
parecem se afastar do domínio das técnicas psicológicas, aproximando o
76

trabalho que se produz na área da Justiça ao de uma investigação de


outra natureza, com instrumentos que seriam alheios à Psicologia.
Dessa maneira, comportamentos como suspeitar de quem se está
atendendo, verificar se o que está sendo dito seria verídico ou não e
desenvolver uma postura investigativa soam como tarefas apropriadas a
outras categorias profissionais que não a dos psicólogos (BRITO, 2012,
p. 201).

Ou seja, o psicólogo deve atentar-se, ao realizar uma avaliação


psicológica, para não fazer uma avaliação genérica, além de não adotar uma
postura preconceituosa, ou desenvolver postura investigativa – o que não seria
uma atividade do psicólogo, mas de outros profissionais do meio jurídico. O
psicólogo jurídico deve ter em mente que, mesmo trabalhando diretamente com
outros profissionais do meio jurídico, ele não é graduado em Direito e sua função
não é julgar ou realizar investigações policiais, por exemplo.

Vale a pena ressaltar que o trabalho em equipe multidisciplinar deve ser


caracterizado pela autonomia dos profissionais, cada qual dentro de sua área de
atuação contribuindo com o saber multiprofissional. Ao contrário, um profissional
não pode executar tarefas que não são próprias de sua profissão sob nenhum tipo
de pretexto, suas tarefas precisam ser bem determinadas de forma a não ocorrer
nenhum tipo de interferência no trabalho de outros profissionais.

A Resolução 07/2003 do CFP é um Manual de Elaboração de


Documentos Decorrentes de Avaliações Psicológicas e discorre sobre as
questões éticas envolvidas na redação desse tipo de documento. O psicólogo
jurídico precisa segui-las criteriosamente:

Na elaboração de DOCUMENTO, o psicólogo baseará suas informações


na observância dos princípios e dispositivos do Código de Ética
Profissional do Psicólogo. Enfatizamos aqui os cuidados em relação aos
deveres do psicólogo nas suas relações com a pessoa atendida, ao
sigilo profissional, às relações coma justiça e ao alcance das
informações – identificando riscos e compromissos em relação à
utilização das informações presentes nos documentos em sua dimensão
de relações de poder. Torna-se imperativo a recusa, sob toda e qualquer
condição, do uso dos instrumentos, técnicas psicológicas e da
experiência profissional da Psicologia na sustentação de modelos
institucionais e ideológicos de perpetuação da segregação aos diferentes
modos de subjetivação (CFP, 2003, p.4).

Finalizamos esse material ressaltando que o Psicólogo Jurídico deve ter


conhecimento desses documentos que versam especificamente sobre sua prática
77

profissional, assim como do Código de Ética. Deixamos aqui apenas a discussão


de determinados pontos de cada um desses materiais, porém recomendamos ao
cursista a leitura integral de todos os documentos. Todos estão disponíveis na
Internet e os endereços para localizá-los encontram-se disponíveis nas
referências.
78

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