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As crianças

na propaganda fascista italiana


(anos 1920-1940)

I bambini nella propaganda fascista italiana


(anni 1920-1940)
Fascismo desde o berço
O regime de Mussolini, que durou de 1922 a 1943, utilizou maciçamente a propaganda. Como regime
assumidamente totalitário, dedicou especial atenção às crianças, que quis formar física e espiritualmente para
construir o homem novo, l’uomo fascista. Os pequeninos eram a massa ideal de que se fariam esses novos
homens fascistas, os futuros guerreiros do Império de Itália. A propaganda tomou directamente as crianças
como alvo, mas utilizou-as também amplamente como tema.
“Benito Mussolini ama muito as crianças. Os meninos de Itália
amam muito o Duce” (página do livro da primeira classe da escola
elementar).

A Obra Nacional Balilla (imitada em Portugal pela


Mocidade Portuguesa), órgão do Partido Nacional
Fascista, arregimentava as crianças e adolescentes dos
dois sexos a partir dos 4 anos de idade. Os rapazes
Balilla vestiam farda de camisa negra e calção verde e,
desde muito cedo, recebiam doutrinação política e
formação paramilitar. As meninas Balilla, denominadas
Piccole italiane (Pequenas Italianas), vestiam camisa
branca e saia negra. O lenço azul era comum.

Com diferenças de vocabulário e estilo, os comunistas


soviéticos também arregimentavam as crianças. Aí, os
Balillas chamavam-se Pioneiros. Na Coreia do Norte ou
em Cuba ainda hoje existe a organização dos Pioneiros.
Postal de propaganda de 1939

CRIANÇAS!

Vós sois a aurora da vida


Vós sois a esperança da Pátria
Vós sois sobretudo o Exército de amanhã

Mussolini
Foto e postal de propaganda em que o Duce exibe o seu amor pelas crianças
Venceremos! Mussolini

Postal ilustrado
Se Mussolini amava as crianças, era natural que estas lhe retribuíssem esse sentimento, como não parece
restar dúvida em face deste desenho de A. Micheli, capa do livro Duce Nostro, de 1933. Meia dúzia de
pimpolhos, incluindo um bebé, disputam um retrato do amado Duce – uma espécie de super-pai, que o título
do livro assimila ao Padre Nostro, o Pai Nosso que está no céu.
La preghiera del “Balilla”

Padre nostro che sei nei Cieli…

A Oração do Balilla Signore, benedici e proteggi sempre la mia Italia,


nella sua Romana Chiesa, nei suoi uomini di comando,
nelle sue madri, nei suoi guerrieri, nei suoi lavoratori,
nell’oro delle sue messi.
Do Livro da Quinta Classe Benedici i Sovrani, i Principi, il Duce nostro
nella grande fatica che Egli compie;
e poiché l’hai donato all’Italia, fallo vivere a lungo
per l’Italia e fa che tutti siano degni di lui
che non conosce riposo vero se non quando
è in mezzo a noi fanciulli e ci sorride con il suo luminoso sorriso.
Benedici la mia famiglia, la mia scuola, i miei maestri,
la mia divisa d’onore e di promessa.
Concedimi una grazia: dare alla Patria il braccio,
l’anima e, ove occorra, la vita.
Sia benedetto il tuo Santo Nome.

Pai Nosso, que estás no céu...


Senhor, abençoa e protege sempre a minha Itália,
na sua Igreja Romana, nos seus homens de comando,
nas suas mães, nos seus guerreiros, nos seus trabalhadores,
no ouro das suas searas.
Abençoa os Soberanos, os Príncipes, o Duce nosso,
na grande tarefa que ele cumpre;
e uma vez que o ofereceste à Itália, fá-lo viver longamente
pela Itália e faz com que sejamos todos dignos dele
que não conhece verdadeiro repouso senão quando
está no meio de nós, crianças, e nos sorri com o seu sorriso luminoso.
Abençoa a minha família, a minha escola, os meus mestres,
a minha divisa de honra e promessa.
Concede-me uma graça: dar à Pátria o braço,
a alma e, onde necessário, a vida.
Seja bendito o teu Santo Nome.
Balillas de mama

Enquanto um bebé Balilla fardado recebe “aprovisionamento” ao colo de Rosina, outro puxa um canhão de
brinquedo. No berço, dois bebés burgueses brincam com o cãozinho e, segundo a legenda, exultam quando
vêem chegar o rei com Benito (Mussolini) e o papá.

Postais ilustrados dos anos 20, de Aurelio Bertiglia, o ilustrador especialista em fascismo infantil.

.
A consciência política destes bebés era muito precoce.
Estes miúdos Balilla limparam o nariz a uma bandeira vermelha rasgada.

Postal ilustrado de Alberto Bertiglia.


Pimpolhos de dois ou três anos, com fez de Balilla, fazendo a saudação romana. O da esquerda ainda não tem
camisa negra, mas o da direita até já é medalhado.
Supostos mini-fãs do fascismo em pose para o álbum de família
Na escola primária a saudação romana era obrigatória

Capa de livro da segunda classe da escola elementar


A doutrinação começava na escola elementar.

Na capa deste livro da primeira classe, o edifício da escola é um fascio littorio, o emblema do fascismo.
Os Balillas mais novitos chamavam-se filhos ou filhas da loba. Em Portugal copiou-se para lusitos,
primeiro escalão da Mocidade Portuguesa. Repare-se no M de Mussolini no peito. Na farda da Mocidade
Portuguesa, o S de Salazar situava-se na fivela do cinto.

O queixo em riste era um ex-libris do Duce. Os miúdos abaixo parecem imitá-lo.


Soldadinhos de calção

Como o Duce amava muito os meninos italianos, preparou-os para a guerra.


As crianças foram iniciadas no manejo das armas, meio a brincar, meio a sério. Havia uma espingarda Balilla de
fulminante, com baioneta de fantasia, como a que se vê na capa de um caderno escolar de 1936, ano da
invasão da Etiópia pela Itália.
“Vós sois o exército de amanhã”
À esquerda, jovens Balilla aprendem a marchar a passo romano, instruídos por camisas negras.
À direita, Balillas fardados numa ilustração do livro da segunda classe da escola elementar.
Na imagem da esquerda, Balillas encarrapitados num M gigante esperam a chegada do Duce pela estrada, em
Aosta, 1939. À direita, uma parada de Balillas e Pequenas Italianas, em Turim, 1939.
Uma pedrada desvirtuada
Balilla deve o seu nome a um herói infantil do século XVIII, um rapaz genovês que arremessou uma pedra
contra soldados austríacos que ocupavam a sua cidade. Desse gesto patriótico o fascismo reteve sobretudo o
elemento belicoso da pedrada, legítima defesa que transformou em símbolo de ilegítima agressão, primeiro
contra os adversários políticos nacionais e, depois, contra os etíopes, os gregos, os albaneses, os russos e
outros povos europeus e africanos.

A pedrada de Giovanni Battista Perasso, dito o Balilla, mitificada pela propaganda fascista.
Caderno escolar de 1929, alusivo à pedrada do Balilla de 1746
A propaganda de tema infantil não se destinava só aos jovens,
tinha uma função importante junto dos adultos. A atenção
votada pelo regime à juventude, as qualidades positivas
associadas à infância e os valores familiares, como a
disciplina, a obediência e a autoridade paterna, eram
sugeridos por essa propaganda e utilizados na tentativa de
coonestar, humanizar e legitimar o fascismo. Também a
rebeldia juvenil interessava ao regime, mas canalizada para os
seus fins políticos.

FIAT BALILLA

Quando em 1932 o industrial Agnelli lançou, com o apoio de


Mussolini, o pequeno Fiat 508 de preço acessível, o nome
escolhido para o modelo foi Balilla. A publicidade do
automóvel explorou a deixa e produziu este cartaz. A figura
do rapazinho inspira-se no herói do século XVIII, mas a camisa
negra adequa-o à simbologia fascista. A importação de carros
estrangeiros foi então proibida, para eliminar a concorrência.
Esse gesto proteccionista e hostil ao estrangeiro está também
insinuado no cartaz.
Nos anos 30, Mussolini decidiu massificar a propaganda radiofónica e fazer chegar os seus discursos a cada lar
italiano. Foi encomendado um aparelho de rádio de preço político, mais acessível às bolsas populares. Era
produzido por vários fabricantes e foi denominado Radio Balilla, ostentando o fascio littorio. Ao centro, uma
foto publicitária realizada para o seu lançamento em 1937.
Bebés de cacete em punho

O menino de carinha laroca e barrete (fez) de Balilla,


segura na mão um cacete, então usado pelos
squadristi, os caceteiros adultos que espancavam os
opositores do regime e escaqueiravam as suas sedes
e casas.

O comportamento brigão era estimulado e


canalizado pelo Estado, que pensava a prazo na
guerra.

O grito de guerra fascista A noi! (A nós!) teve a sua


origem em 1918, durante a Grande Guerra.
Significava algo como “a vitória é nossa”.

Postal ilustrado dos anos 20 assinado por Sette.


Postal ilustrado de Aurelio Bertiglia, 1923.

“Eis-nos aqui…
cheios de ardor
cheios de amor
pela Ítala terra.”
Um fascistazinho rico, de cassetete chic,
polainas e cigarro na mão! Aí vai o campeão,
“pronto para a represália, pronto para a
expedição” (uma expedição de pancada nos
adversários políticos).

Postal ilustrado de Antonio Rubino, que foi director da


revista de histórias aos quadradinhos Il Balilla.
Jornada do Brinquedo Italiano

Este cartaz de uma exposição de brinquedos


inaugurada em Junho de 1934 pelo general
Starace combina o elemento lúdico-infantil
com a agressividade racista e colonialista,
então dirigida contra a Etiópia, que no ano
seguinte seria invadida pela Itália.
Pinóquio vira fascista
Criado em 1881 por Carlo Collodi, Pinóquio tinha várias qualidades que os fascistas tentaram explorar em seu
proveito: era italiano, extremamente popular e amado pelo público infantil e adulto. Por isso fizeram dele
Balilla, caceteiro e colonialista. Logo em 1923, publicaram-se estas Aventuras e expedições punitivas de
Pinóquio fascista, em cuja capa se pode ver um Pinóquio squadrista (membro de um esquadrão punitivo), de
camisa negra e fez de borla pendente, armado de um cacete, fazendo ingurgitar óleo de rícino a um comunista
de barrete frígio vermelho. Numa das suas expedições, Pinóquio fascista destruiu a tipografia onde era
impresso um lunario (almanaque) comunista.
Pinóquio Balilla

O travesso e disparatado Pinóquio não queria entrar para a organização Balilla, mas foi aliciado a aderir por um
pedaço de chocolate e a possibilidade de ver cinema grátis. Uma vez membro, o fantoche tornou-se num Balilla
entusiasta e até conseguiu a adesão à organização juvenil de dois seus comparsas rebeldes (vestígios da raposa
e do gato de Collodi). Esta história é relatada em Pinóquio entre os Balillas. Novas travessuras do célebre
fantoche e seu arrependimento, publicada em 1927, cuja capa se vê abaixo.
Fascistização da banda desenhada
Após a Grande Guerra, a banda desenhada conheceu forte expansão em Itália. Logo no começo
de 1923, os fascistas reagiram, lançando Il Balilla, revista de histórias aos quadradinhos
centradas em personagens heróicas italianas. Em 1927 surgiu La Piccola Italiana, destinada às
meninas. Mas a banda desenhada de origem americana recolhia as preferências do público
infantil, especialmente nos anos 30, quando foram lançadas as primeiras revistinhas com as falas
em balões, em lugar das tradicionais legendas sob as imagens. A revista Topolino, tradução
italiana de Mickey Mouse, apareceu em 1932 e teve êxito imediato. Em 1935, surgiu o semanário
I Tre Porcellini (Os Três Porquinhos), outro grande sucesso. Todavia, a crescente popularidade dos
comics americanos e dos bonecos de Walt Disney – apesar da amizade pessoal deste por
Mussolini – começou a tornar-se num problema político. Foram lançadas várias revistinhas com
personagens italianos, mas a bonecada de Disney e as histórias de cowboys e super-heróis
americanos ameaçavam “perverter” os princípios formadores da nova geração.

Em 1935, o Topolino já intercalava no seu conteúdo propaganda fascista e historietas italianas


para contrabalançar a influência estrangeira. Em 1938, após a publicação de um manifesto de
Marinetti sobre literatura juvenil, todas as bandas desenhadas de origem estrangeira foram
proibidas, com excepção do Topolino, por decisão pessoal de Mussolini. Durante a II Guerra
Mundial o próprio Topolino foi extinto (1941), sendo substituído por Toffolino, revista cujo
protagonista era não um rato, mas um rapazinho italiano, cujas histórias eram edificantes do
ponto de vista do regime. Por fim os próprios balões foram banidos, substituídos pelas velhas
legendas, e a banda desenhada foi completamente italianizada. Em 1943, com a queda de
Mussolini e o começo do desembarque Aliado, desapareceram todas as revistas infantis.
A revista Il Balilla foi lançada em 1923, ainda
antes da organização de juventude do mesmo
nome, que só foi criada em 1926.

Na capa deste número de 1929, pequenos


Balillas armados de mocas e espadas
escorraçam uma bruxa da floresta e colocam
sobre o peito um cartaz com que a bruxa os
pretendia afugentar, contendo uma caveira e
a inscrição “Perigo de Morte”.

Desenhos de Antonio Rubino, ao tempo director da


revista. Rubino foi o pai da banda desenhada com
camisas negras.
Nesta história, meninos Balilla num avião
pilotado por um boneco levam a “chama
eterna” de Roma e do Duce para a antiga
Leptis Magna, na Líbia, sob o signo da
renovação das glórias do passado e do
cumprimento dos objectivos que o
destino cometia aos soldados do Império
Romano renascido. Não se vê um
africano em parte alguma.

A Líbia (nome que data de 1934) tem um


território seis vezes superior ao da Itália
e foi sua colónia de 1912 a 1943.

Desenhos de Antonio Rubino.


A revista Topolino (Rato Mickey), que a partir
de 1932 divulgava em Itália as figuras do
império de fantasia Disney, inseria também
historietas edificantes com um personagem
infantil italiano, fardado de Balilla.

Neste número de 1935 , o Balillino – assim se


chamava, para não haver dúvidas – lida com
um touro que ameaçava uma pequena
beldade.

Desenhos de A. Burattini.
No interior do Topolino era intercalada
propaganda política, como retratos e
citações de Mussolini. Neste caso, o Duce
justifica a chamada da juventude italiana às
armas (guerra da Etiópia) como um caso de
“suprema necessidade”, tratando-se de
assegurar “a potência e a glória da Pátria”.

Por baixo, mais um aventura do Balillino,


sempre solícito a socorrer uma menina e a
evitar pneus furados.
No final dos anos 30, o regime fascista iniciou uma
campanha de ódio contra os judeus residentes em
Itália. Sob pressão da Alemanha nazi, foram
aprovados diversos decretos, expulsando os jovens
judeus das escolas, proibindo o casamento entre
“arianos” e “semitas” e demitindo os judeus dos
empregos públicos (1938). Em 1940, Mussolini fez
saber que todos os judeus teriam de abandonar a
Itália. Seguiram-se os internamentos em campos
de concentração e, a partir de 1943, na Itália
ocupada pelos nazis, as deportações para campos
de extermínio alemães.

Neste número da revista Il Balilla de Janeiro de


1939, conta-se a história do “pobre judeu”
Assalonne Mordivò, que chorava na rua, dizendo-
se reduzido à miséria. Um rapazinho condoído,
Pierino, ofereceu-lhe o seu farnel. Mas eis que um
Balilla aparece junto de Pierino e desmascara o
falso pobre, que escondia sacos de ouro sob o
capote. Corrido a pontapé pelo Balilla, o judeu não
parou até á fronteira, deixando cair as suas
moedas de ouro pelo caminho.
Crianças na propaganda de guerra imperialista

Em 1935, Mussolini decidiu invadir a Etiópia, também dita Abissínia. Os governantes


proclamaram que os italianos tinham direito a um grande império colonial, para levar o facho
da civilização romana a paragens bárbaras onde, diziam, ainda predominava a escravatura.
Assim começou a breve, mas sangrenta aventura da “África Oriental Italiana”, juntando a
Etiópia à Somália italiana e à Eritreia. O Império durou cinco anos e a guerra provocou mais
de 500.000 mortos, muitos deles alvos de gazeamento em larga escala pela artilharia e força
aérea italianas.

As crianças italianas foram alvo da intensa propaganda de guerra imperialista, como se


constata pelos livros e cadernos escolares fabricados pelo Estado. Mas as imagens infantis
foram também largamente utilizadas na propaganda de guerra destinada sobretudo a um
público adulto.

O ilustrador infantil e entusiasta do fascismo Aurelio Bertiglia, acima já referido, produziu em


1935 uma colecção de postais de propaganda intitulada La Conquista dell’Etiopia que
adiante se expõe na totalidade.
A nova bandeira dos etíopes
Um ras (príncipe) e outros meninos etíopes, alguns armados, prostram-se diante da bandeira da sua nova
pátria, a Itália de Mussolini. Os meninos das cubatas exultam e agitam bandeiras tricolores.
Uma guerra-brinquedo
Mulherzinhas etíopes de palmo e meio saúdam o soldadinho porta-bandeira italiano, enquanto um Balilla (de
costas) recebe a rendição de outros meninos. Uma invasão idílica, sem os muitos milhares de mortos por
gaseamento e bombardeamento da população civil.
Mais realismo

Um pouco menos idílica é esta corrida a pontapé que um ras etíope leva, com os seus fiéis guerreiros em
debandada. Os soldadinhos de camisa negra nunca perdem o sorriso, como se tudo não passasse de uma
brincadeira.
A perfídia dos invadidos…
Aqui vai outro ras em fuga, de nada lhe valendo a insígnia da Cruz Vermelha, perfidamente usada como
escudo. A caixa de balas dum-dum (proibidas pela Convenção de Haia de 1899) também ostenta igual
camuflagem. A baioneta de um pimpolho italiano avança para os fundilhos de um soldadinho etíope caído.
Um exército de bons samaritanos

Com os maus postos em fuga, é a altura de os invasores servirem o arroz e o cereal ao povo. Um pequeno
camisa negra até pôs o avental. Dois meninos etíopes parecem incrédulos com a fartura.
Supressão da escravatura
Aqui se explica que os italianos foram à Etiópia para quebrar as grilhetas do povo escravizado.
“Onde tremula a bandeira italiana, aí está a liberdade!” – afirma o edital colado na parede.
Faccetta Nera
“Carinha negra” foi uma canção criada em 1935 como meio de justificação e mobilização para a invasão da
Etiópia, ocorrida meses depois. Refrão: “Carinha negra, bela abissínia, espera, espera, que a hora se avizinha.
Quando estivermos juntos de ti, nós te daremos outra lei e outro rei.” O elemento feminino da canção também
era suposto ter um efeito mobilizador sobre o soldado italiano, numa mescla de fantasia erótica e política.
Fascismo para a Etiópia
Uma menina loura de saia plissada, segurando o fascio littorio, saúda à romana os meninos etíopes, enquanto
um avião militar italiano sobrevoa a cena, pelo sim pelo não.
O mapa do Império

De novo a menina loira de saia plissada, com dois soldadinhos e um camisinha negra, ajudados por um menino
etíope, a pintarem o mapa da Etiópia, Somália e Eritreia com as cores italianas.
Os cadernos escolares durante a guerra da Etiópia

Os livros para crianças e os livros escolares em particular foram na Itália fascista um veículo de
propaganda maciça entre os jovens. Também os cadernos escolares, concebidos pelo Estado,
de capas ilustradas a cores e contendo textos curtos, atingiam um público infantil vastíssimo
em todo o país. Algumas capas relatavam a vida de Mussolini, outras tinham Balillas por
protagonistas, outras ainda enalteciam figuras históricas. Umas despertavam o sentimento
bélico, outras elogiavam certos comportamentos juvenis tidos por exemplares.

A guerra de agressão à Etiópia, um dos dois únicos países de África que na primeira metade do
séc. XX escapavam ao colonialismo, foi oportunamente aproveitada em 1935-1936 como
assunto de doutrinação para os cadernos escolares.
A guerra imperialista da Etiópia foi nesses cadernos justificada com considerações humanitárias, como a
abolição da escravatura.
O tema da educação do indígena africano era muito glosado nos cadernos escolares, provando as intenções
civilizadoras do invasor. Neste caderno mostra-se “a primeira escola indígena sob a bandeira tricolor italiana”.
A valorização e integração disciplinada dos jovens etíopes segundo modelos organizativos europeus (fascistas)
era outro objectivo proclamado do invasor. Aqui se mostra um desfile de “Balillas” indígenas, dispensados da
camisa negra.
Também a libertação da mulher etíope servia para justificar a invasão. Na capa deste caderno escolar italiano é
relatado o “estranho rito matrimonial” de uma tribo da Etiópia. O homem comprava a mulher num ajuste com
a mãe dela. A esposa, resistindo com unhas e dentes ao marido imposto, era chicoteada por este até à
“submissão total ao seu legítimo senhor”.
Subitamente, neste caderno escolar a mensagem torna-se muito diferente.
O objectivo dos italianos na África Oriental revela-se numa imagem e na sua legenda: SUBMISSÃO.
Imagens infantis na propaganda da II Guerra
Mundial

Em 1941-1942, o nosso já conhecido artista Aurelio Bertiglia criou uma colecção de


postais ilustrados de figuração infantil em apoio do Eixo. Já tinha feito algo semelhante
durante a Guerra de 1914-1918, mas em apoio do lado oposto, dada a opção da Itália
de então pelos Aliados.

Diga-se que as crianças foram sistematicamente utilizadas em todos os países ditos


civilizados pela publicidade comercial e pela propaganda de quase todas as cores
políticas durante o século XX. O ilustrador Bertiglia, em particular, explorou o filão
durante quase meio século, nas suas várias modalidades, e produziu muitas centenas de
postais ilustrados com crianças.

A série seguinte de imagens dispensa grandes comentários. O flagrante despudor na


exploração da imagem infantil para propaganda de guerra diz muito sobre o seu autor,
sobre o fascismo, mas também sobre uma certa mentalidade da época, talvez não tão
distante de nós quanto se poderá pensar.
Neste postal, soldados meninos italianos, alemães e japoneses correm a pontapé os meninos ingleses da
Europa, África e Ásia. Repare-se no guarda-chuva dos soldadinhos ingleses, um estereótipo usado como troça.
Um carro nazi-fascista, composto do fascio littorio e de rodas com a cruz gamada, segue pela ilusória Via da
Vitória, onde é proibido o trânsito de peões. O soldadinho inglês (de guarda-chuva) e o grego, a suar as
estopinhas, ficam a comer o pó levantado, supostamente derrotados.
O menino nazi põe o açaimo no leão britânico ferido, enquanto o menino italiano lhe corta as garras e o
japonês se prepara para lhe cortar a cauda. O inglesinho tem a sua bandeira partida na cabeça e o guarda-
chuva em fanicos
Com Londres em ruínas, sobrevoada pela aviação alemã, os meninos do Eixo, marchando a passo de ganso,
espezinham meninos ingleses caídos no chão, um deles com um guarda-chuva espetado no rabo. A violência e
o sadismo selvagem da imagem chocam especialmente pelo elemento infantil envolvido na representação.
Numa das imagens mais obscenas produzidas por Bertiglia, os meninos do Eixo tripartido empurram para o
precipício um apavorado menino inglês (de guarda-chuva) com um cãozinho grego pela trela. Um tiozinho Sam
e um ursinho soviético (junto a uma garrafa de vodka vazia) observam a cena com presumível estupor.
De um sadismo não menos obsceno é esta imagem dos bombardeamentos de Londres pelos alemães. De
calças na mão, os meninos ingleses (incluindo um bobby infantil, sob um guarda-chuva roto) estão apavorados.
São representadas vários tipos de civis e apenas se entrevê um soldado meio tapado, o que revela gáudio pelo
ataque aéreo contra a população urbana.
25 de Abril de 1945

Neste dia festejou-se nas ruas de Itália o fim do fascismo e da guerra.


Crianças subiram aos tanques ao colo dos pais.
O 25 de Abril é a festa da libertação da Itália, como a de Portugal.
FIM
4.ª edição

© Recolha, texto e edição de José Barreto.


Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Lisboa, Portugal, Agosto de 2012.

Todas as imagens foram colhidas na internet e são presumivelmente do domínio público. As imagens de livros e cadernos
escolares italianos provêm de DIA Banca dati di immagini per la Didattica, http://www.indire.it/archivi/dia/index.php

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