CARLOS ROBERTO GONCALVES leciona que, “A lei impõe, a certas
pessoas, em determinadas situações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é "objetiva", porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade ” (GOLCALVES, 2010: 48). O risco, inerente ao exercício de determinada atividade, é apontado pela doutrina como o fundamento da responsabilidade objetiva (ULHOA, 2012: 238). Nesses casos, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. Em alguns, ela é presumida pela lei. Em outros, é de todo prescindível. Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. Vários foram os opositores da teoria do risco, o jurista Savatier os qualifica em dois grupos: os que reconheciam a existência da obrigação de reparação sem culpa, tratando- se apenas de uma simples garantia e não de responsabilidade; e os que negavam a reparação do dano, e para tal, seria necessário uma lei especial ou um contrato. ALVINO LIMA faz uma síntese de seis argumentos contra a teoria do risco pelos defensores da teoria da culpa: a) a teoria do risco seria meramente material, não se importando com a pessoa; b) o deslocamento do centro da aplicação do direito do indivíduo para a sociedade, quando na verdade, o indivíduo continua sendo o ponto central do direito; c) o agente deverá assumir a responsabilidade de todos os danos, de nada valendo a prudência e cautelas, gerando a estagnação da atividade individual; d) sem o proveito da atividade pelo causador do dano, não há que se falar em teoria de risco; e) a carência da conceituação de risco, sendo impreciso, incerto e vago; f) a conceituação de proveito não é clara, contrapondo o conceito de culpa que é claro e preciso, comprometendo a teoria do risco gravemente a própria ordem social ( LIMA, 1963:203).
Referindo-se as críticas efetuadas pelos opositores, como também os defensores
da teoria do risco, JOSÉ DE AGUIAR DIAS faz um contraponto diante de tais posições doutrinárias: “Meditando nisso, hão de concluir os espíritos democráticos que a situação desejável é a do equilíbrio, onde impere a conciliação entre os direitos do homem e seus deveres para com os seus semelhantes. O conflito de interesses não é permanentemente, como quer fazer crer a doutrina extremista, mas ocasional. E quando ele ocorra, então, sem nenhuma dúvida, o que há de prevalecer é o interesse da coletividade. Não hesitamos em consentir na amputação do membro que põe em risco a nossa vida. Não podemos, por qualquer motivo, permitir que o direito do indivíduo todo-poderoso atinja, não outro indivíduo, mas toda a coletividade. Na doutrina do risco nitidamente democrática, não se chega jamais à consequência de afirmar o principio, aparentemente individualista, mas, em essência, de sentido oposto, nitidamente autocrático, de que o direito de um pode prejudicar a outro, pode ultrapassar as raias da normalidade e fazer do seu titular um pequeno monarca absoluto.” (DIAS: 84-86)
Portanto, para as relações internas da empresa, a responsabilidade patrimonial
do administrador tem caráter subjetivo, filiando-se ao sistema clássico do Código Civil, restando imprescindível ao lesado a prova de que o administrador agiu com culpa ou dolo, levando-se em conta a preciosidade da atividade administrativa. A aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva clássica para a atividade do administrador nas relações internas da empresa faz-se indispensável sob pena de cometermos injusto insanável. Isso porque o administrador não concentra poderes de ordem absoluta, pelo contrario, sempre limitados por lei ou por convenção estatutária. É necessário se delimitar a extensão da responsabilidade do administrador quando em sua relação com a companhia e os acionistas, sendo mister que, para se imputar o dever de reparação, se fixe o grau de culpabilidade e envolvimento do mesmo na lesão, especialmente se há outros envolvidos, para que seja possível determinar os limites da solidariedade na obrigação.
Apuração e efetivação da responsabilização dos administradores
Dispõe o artigo 159 da Lei 6404/76:
“Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembleia- geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.”
Nesses termos, compete à sociedade ingressar em juízo com ação de
responsabilidade civil contra o administrador pelos danos provocados ao seu patrimônio, antes porém, tal decisão deve ser tomada em assembleia geral. A assembleia que deliberará a respeito da impetração de ação poderá ser a ordinária, “em consequência da verificação do prejuízo causado ou da evidente prática do ato ilícito ou irregular” (REQUIÃO, 2012: 222) ou extraordinária, se a matéria estiver prevista na ordem do dia ou se for consequência de assunto nela incluído. De acordo com o § 2º do artigo supracitado, o administrador ou administradores, que figurarão como réus na ação civil deliberada, deverão ser substituídos na mesma assembleia, vez que por terem praticado ação prejudicial à companhia perderam credibilidade frente aos componentes da mesma, não podendo, portanto, prosseguir no cargo que ocupavam. Além disso, o acionista também tem a faculdade de ingressar com a ação judicial, entretanto, em apenas duas hipóteses: a) qualquer acionista, quando a ação não for proposta no prazo de três meses da deliberação da assembleia geral; ou b) por acionistas representantes de pelo menos 5% do valor do capital social, quando a assembleia deliberar e não promover a ação. Segundo o §5º, em se falando de ação promovida por iniciativa do acionista, os resultados desta serão deferidos à companhia, mas esta ficará com o encargo de indenizar o acionista de todas as despesas que tiver efetuado, no limite dos resultados. Finalmente, insta ressaltar que a ação discutida neste capítulo, não exclui a que couber ao acionista ou terceiro que for diretamente prejudicado pelo ato do administrador. E ainda, que o juiz poderá decidir pela retirada da responsabilidade do administrador, se for convencido de que este agiu de boa fé, visando os interesses da companhia. No caso de a ação de responsabilidade ser promovida por iniciativa do acionista, os resultados da ação deferem-se à companhia, mas esta deverá indenizá-lo, até o limite daqueles resultados, de todas as despesas que tiver efetuado, corrigidas monetariamente e mais juros legais. REQUIÃO aduz que, caso o ato ilícito praticado causar diretamente prejuízo a acionista ou terceiro, terão estes legitimidade para promover a ação contra a companhia e contra o administrador responsável solidariamente. O juiz poderá reconhecer a exclusão da responsabilidade do administrador, se convencido de que este agiu de boa-fé e visando ao interesse da companhia. (REQUIÃO, 2012: 223). A responsabilização dos administradores é sinônimo do bom funcionamento de uma companhia, fazendo com que aqueles que se mostrem incapazes para a efetivação da gestão respondam pelos seus atos irregulares e sejam substituídos por pessoas de maior capacidade para a ocupação desses cargos de tão grande importância. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, vol. 2: direito de empresa. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1994. LIMA, Alvino. Culpa e risco,1963. REQUIAO, Rubens. Curso de direito comercial, 2º volume. 29. Ed. São Paulo : Saraiva, 2012.