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-lir \ O INCONSCIENTE
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o \ Êste 1, volumê do Vl Colóqub ite BonneDo,l se ccrlstitui
das duas primeiras partes do original francês. E as mais
lmportantes. Enquanto as outras quatro partes (objetos do
2e volume) confrontam o Inconsciente com a Neurobiclcgia,
7 s Lsiquiatris, a, Sociolo8'ia e a Filosofia, aqui se imbricam
a Psicanálise e seu objeto, o Inconsciente. Da, importância
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E desta distinçâ,o teria que falar em espaço mais amplo. Mas
nêc, se deve deixer de frisar que o otimismo de ANDRÉ GRDEN
parece pouco cientifico, já que o loro de todos os participan-
I rl tes aceitarem a existência do inconsciente pouco significe
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z. se náo se definir seu mod"o de existir. Muito bem faz LÂCÂN
o t em recusar o ecletismo das origens e o heterorletismo dos
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z conceitos.
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Sem dúvida, o texto-base é o de LÀPLANCSE e LDoLÀrEE.
Suas discordàncias com os outros parucipantes sâo bem dis-
cutidas e, além disto, resumidas por GEEEN. Mas parece ha-
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ver um problema crucial, nã.o situado expllcitamente pc.r am-
bcs: §uas próprias divergências. Náo se trata, numa pequena
"orelha", de "tomar partido", mes de recusa.r uma pretensa
tl'anqüilidade edênica da ciência: nós escolhemos o Hadés
da. inss,tisfagã,o,
LAPLANCEE (que redigiu os caps. I, II e fV) mostra
como o Inconsciente em IREUD depende do modo ccrno €ste
o o estabelece. Não se trata de fazer um catá,logG das cons-
3 trições reais ou um repertório das noções de inconsciente
t,o
7-Y que F REUD teria conhecido: as três instências estâo subordi-
V
nadas à fundamentação de uma ciência e só neste nlvel po-
I cr
dem ser compreendidas. Assim, por exemplo, o leitor náo
deve entender a crltica de LAPLÁNCIIE a Pol,rrzm como mera
il contreposiçáo a duas ou três idéias, mas como um instru-
L mento que, fundamenta.ndo sua racion&lidade, estabelece ao
n o mesmo tempo a insuficiênciâ desta em outrâs teories. Quan-
ã' do refuta a crÍtica que PoLrrzEB faz de um abstracionismo
( êm F.nEUD, LAPLANCEE nâo mostra apenas que a ciêncla abs-
.a E. -l
\ I trai (condiçâo de ser (trêncis.), mas que FREUD abstral ade-
quadamente, desde que seu sujeito não é dado nD nlvel de
uma subjetividade pronominal qualquer (eu, tu, êle. . . ) mas
r na fundamentaçâo do caráter concreto do sujetto descentrado
de seu "eu" e suas múltiplas e egoísticas referências, Se o
ouJeito que examlnamos é concreto, c. conceito que construÍ-
mos nã.o é ideal-
Com ests perspectiva de ciência, IrApIÁNcEE partirá para
I il[[il$Hil[
um exame da obra freudiana. Tornando como ponto de rêfe-
- lltltil rênci& a Meúdpsí^oLogid, privilegisrá, a topologia (a pera-
metrla em I*REUD nã,o seria também seu rompimento com as
cc.ncepgões psicológicas da época, que alnda se penssvam no
nlvel das ciências que dominavam a últtma metade do sé-
culo XIX, o evo.lucionismo, a biologla, a. fÍsica energética
tY e a' economla polÍtica? ). Isto traz certss cúnseqüências ne-
cessárias pa.ra sua interpretaçâo. O psiquismo deixa de ex.is-
tlr como realidade determinada e fêchada, unidirecional; sua
ll0Lt realidad€ é estabelecida pelas relações das três instâncies;
os slstemas serão estabelecidcs em número de dois (para o
uso de "instância" e "§istêma" ver Vooabub.ire ilo b, PsU-
VI COLOOUIO DE BONNEVAL Biblioteca clnmtlyse de LÂPLÂNoHE e PoNTÀLrs, PUF ); o inconsclente
F Lacan I Laolanche I Fontalis lDiatkine
Tempo Universitário
l,' tem aeu nÍvel próprio, não se confunaundo com a memória
e o recalque, devendo ser entendido através dos conceito§
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Stein I Léb'ovici I LiÍebvrel Green
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OOIJIBORÂIX)RES
Dr. CLAUDE BL^NC
Neuro-Pslquiatra da Àlr Flance
Médlco-Asslstente dos Hospttâ16 de PÂris
Dr. RENÊ DI^TI(TNE
Ântigo Chefe de Cltnic8 na Feculdadá de Medtctnô de PÀris
vlce-Pnesidentê da Societé Psychsnalytiquê de Parls
Médlco dos Centres de Sônté MeDtale do XII armndissement
DT. SVEN tr'O JN
Antigo CheÍê dê cllnica das Doençs6 Mentais e do Encélalo da, Fâculdad€
de Parls
Médico-Chefe do Centre Psychiotrique Ste-Annê
DT. ANDITÊ GREEN
Antlgo chefe de cllntcê das Doenqas Mentais e do Encéfalo da Faculdade
de Paris
Membro ds Societé Psycanalytiquc de Parls
Dr. CATEERTNE LÂIRY
Chefe de Leboratório no Hospltal Henri Rousselle (Pâris)
MestrE dê Pesquisq no lDstitut National de la Sânté et de Ia Recherche
Médlcale ( INSIRM )
HENRI EY
INCONSCIENTE
-VOLUME r
( VI Colóquio de Bonneval )
TrêdugÁo de
JOSIS BATISTÂ
CÂps de
MÁURICIO JOSS MÂRCHEVSKY
EXEMPLA.R, N9
Àíi 0540.
PROLEGOMENOS
PrifiLeíre Púrta
ÂS PULS)ES E O TNCONSCTENTE
Algumas Notas sôbre o Inconsciente, por §ERGE LÉBoVICE e RENÉ DIATXINE 5í
As Pulsões e o Inconsclent€, por E.nÁNçoI§ PEBRIER . 90
Diacussdo I J. LAPLÂNCHE, KAMouH, S. LÉBovIcE e R. DTATKINE . .. ... 103
Segu\ilo Porte
O INCONSCIENTI: E .{ LINGUACEIIT
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HENRI EY
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nhcciclo clo Sujcito, e tomemos siurplesrnente o exemplo aqui primorclial
c pertertanlcnte excrnplar' da história de Édípo. Édipo terne seu clestino,
mas considcua-o hipotético. O qrrc ignora e o que lhe é revelado na tra.
gédia e no sangue é que o destino sc cumptiu. Ele matou Laío e desposou
Jocasta ctendo ser o filho de Polipo, e é a descoberta dessa verdade objc-
tíva que lhe é horrível, e que forma o tema (la tragedia, exreliot'ao pró-
prio Édipo, vítima de uma terr'ível "anagke".
Mas sc esta tragédia, por s€l' reconhecitla como inerente ao desejo
dos homens, cai do personagem mítico oncle cstava para o exterior dc si-
próprio (no oráctrlo e na realidade dos acontecimentos que formam a
tragédia), para o homem real que conlém a rragédia de Édipo corno o
protótipo rucsruo do "não ser consciente" (ou desconhecido de si-mesrno),
essa traç<lia é, ao mesmo tempo, rcal nas fôrças de seu desejo ç imagi-
ndria na srra história. ÍIsse e o Inconsciente que nos foi revelado, por
Iinruo.
tí
maneira que o inconsciente "por natureza" revela à est!'lrlul'â racional
que seu ser inconsciente ó ilegal. De onde a repressão de r;rre c objeto.
Portanto, as relações entre consciente e inconsciente só porlem se inscre-
ver no contextd da Lei. Na verdade, é contra a dura lei rla realidade, con-
tra o aparelho lógico da percepção e <lo conhecimento grte o inconsciente,
como imaginárro, é recalcaclo no campo de atualitlade tla consciência, na
metlida em qrre êste é sôlidamente orgarrizado. E é contra os irnperativos
da nzáo teórica e prática, contra sua jrrrisclição qrre êle e rec:rlcado pe,,lo
Ego como contrário aos seus fins. Po<le.se dizer que o inconstiente é col-
gido a se ocultar, que êle é encarcerado e por assim dizer condenado :t
não aparecer, a não se manifestar a não ser nas tolerâncias otr nas ft;r-
quezas do texto da lei. É justamente na espessura tlo d.iscurso, como unl
hierógrifo a clecilrar, que ap€nas lhe é pennititlo trâtrsllalecer e se intro.
duzir nas rêdes.
!) EDr lngtês no oÍi8líal. "TêÍmo €mpÍeg0.lo cm psicaíáli§c para deslsn t as Isôes apÍesêí-
-um carátcÍ
tando lmgulslvo aelatlvàmeítc Gm ,uptuÍa com os sistetDâs rlê norivâçâo habl-
tuals do süicllo, ,.1ãllvamênte lnillssoclável do cuÍ3o de §u᧠âtlvldadtg, lomando mullos
vêzês a lorma auto ou héteÍo-âgr€sslva . No suÍglmenlo do acÍir8 oul o tlsíconolirla tê
a ír,aÍca da cm.Íqêncla do Íecalcado". ("VocabÚlalre dc la Psychanalys€" d'r , LAPL^NCHE e
J, lJ. PoNTlLls,-sob â dlicção dc D. L^G^CH[, P.U.F., l9ô7). (Nol:r do Tiaílulor).
l6
as tôrças rnconscientes trustram suas interdições Pela Produção de mani'
têstações neuróticas simbólicas.
A própria estrutura da neurose implica a agudeza clêsse conflito, dêsse
drama.-§e ela nos reenvia à história de Édipo, é porque o mito edipiano
re ete uma das mais radicais problemáticai da éxistência humana. Mhs
é tamb,ém porque Êdipo, por ser não sômente aguilo que foi, - um ho-
mem tràgiiaménte infeliz - mas Por ser o neurótico que êle não foi,
suportando não sômente as peripécias exteriores do seu incesto como tta'
zendco dentro de si como um enigma, como seu inconsciente, sua tÍa'
gédia - que teria sido ao mesmo temPo, Édipo e Esfinge.
Essa é, com eteito, a última palavra do conhecimento do incons-
ciente que, por essência, é enigmático e paradoxalmente entrelaçado ao
ser constientê. Pois, para não ser o nada fÍsico de um mineral ou de uma
máquina (sem consõiência), seu ser só é relativamente aquilo que êle
não é, isco-é, na e por sua relação com a Consciência que o transcende
(ou o reprime). É essa transcendêncía da Consciência. que, ao rnesmo
tempo, eng€ndra o inconsciente na sua realidade pràpriamente virtual e
torna possÍvel §ua aParição no seu desaparecimento. !
2l PoEl-aotd. Dcpoh ds ,adrçgo dêst. trxto, c epó6 o rstudo cílíco que ôp퀧eotci dat íÍt-
ouêzr' dt teoílt Íícudlrna do lnconscletrtc, dcvo cscltÍcccÍ qur - dc um ponto dc vlatr
óctodolôllco coõdlzcntc com c§lr ontologla do 6cÍ coí3clcítc-lícoí6clant. - 5c o lncon!'
cl.ítê é õbi.to a. umê ondrisc quc o Ía, aDtÍecer. clsa anállse Írz desaprÍcccí, ltrav.§salr-
do-t, a aÍinscaridênch do scÍ tonsclcntc-por rua próprla t.tnspá.êncl.. A totelldsd. do
ecr àrioulco cxlie que. lcm nos dclxsrÍnôs §eduzlÍ gelas rnállsÇ5gcntldo
-pcrcomos em ploÍundldade do
lncoàsclintc, lam-rlt dc vl6ta que êlc nlo tcm realldad. . I náo 6c. paía
o Bar conlclcntc.
l7
AS PORTÀS DO INCONSCIENTE
AN»nÉ Gnnrir
l8
aquêle gue o m(Ntrou ao olhar dos homens foi melhor entendido, em to-
dos os tempos, pelos meios literários e artlsticos do que cientÍficoc. Aquê-
Ies que, no domlnio onde sua descoberta foi a mais notável, deveriam
rcconhecer, em primeiro lugar, sua qualidade revolucionária, ú a contra-
gôsto se resignaram a isso com o desenvolvimento e extensão desa obra,
a qual ter.se-ia preferído continuar a ignorar. Na aurora do surrealismo
que o têstejava, Fnruo ainda era invenctivado nas sociedades psiquiátri-
cas, E hoje? Por uma imprevista mudança das coisas, a psicanálise é parte
integrante do saber comum e guase atinge ao dominio público. A tendên.
cia majoritária da psiquiatria - a da América - generosamente adotou
essa obra, préparou.a e lançou-a, e tdos se encon(ram, de bom grado ou
ou não, a par do inconsciente. A Inglacerra, onde a psicanálise possui seu
alvará, espécie de habeas corpus dos psicanalistas, foi a única t€rra euro-
péia que, no momento do exllio, facilitou a instalação dos primeiros com-
panheiros de FnBuo caçados pelo nazismo. Entretanto, tendo o maior nú.
mero dêles emigrado para a América do Norte, o crescimento do moü-
mento analítico europeu foi laboríoso e difícil em relação ao continente.
Por outro lado, a psicopatologia, herdeira da fenomenologia e das ten-
dências existenciais, teve o campo livre para se desenvolver sem restri.
ções. As obras de Jesnrns, Brxswlncrn, vor.r GsRserrrr, MrNKowsKr que
reinaram sôbre o pensam€nto psiquiátrico da Europa, só tàrdiamente atra.
vessaram o oc€ar.f I Por ter crescido nesse solo avaro e retícente, o freu.
dismo cresceu com mais vigor, tendo que se submeter a algumas muti-
lações, ocasionadas por sua própría maturação interna. r Também se foi
necessário esperar novembro de 1960 para gue fôsse discutido o funda,
mento ulesrtro da douuina psicanalítica, é porque en[im, tinha chegado
o momento em que se via proclamar sua sede neste lugar que perpetua
paradoxalmente a psiquiatria européia, pois que aqui ela teve o seu
santuário. s
I. RÂÍZES E PRECURSORES
Como, pois, o Inconsciente se apresenta hoje à discussão através dos
cliscursos'que lhe são dedicados? Talvez seja necessário r€transcr€v€r pÍê.:
r'íamente o mito, tal como Fnruo o revelou.
É bastante freqüente em nossos dias - por ocasião da procura do Íon-
tes em que FReuo teria buscado, mais ou menos conscientemente, a ma-
téria de sua inspiração - amputar a originalidade da descoberta pela
valorização de um movimento anterior de grande envergadura. Sabe+e o
t9
que valem as tenrarivas e os lantasmas que se exumárm g€ralmente dc
HenmrreNN, de Cenus e de HERBAnT, e que voltem ao pó de onde foram
tirados. Se sc trata de nos dizer que o tema do Inconsciente foi, no mo
vimenro das idéias, uma preocupação e mesmo uma familiaritlatle antc-
rior à FnEuo, que a-intuição de sua existência impresionou mais de um
pensaclor de seu tempo; que mesmo o pressentimento da importância clo
conÍlito e de suas fôrças operantes tem podido agitar certot espíritos,
p€rmanecem bem longe de uma aÍticulação comparável a que Frruo al-
-
cançou, de um golpe, desde os seus primeiÍos ensaios. Por ourro lado, essa
análise espectral de seu pensamento em suas proporções permire encon.
arar lessonâncias entre Fnruo e seus precursores, como se a análise do
texto nos permitisse ouvir até mesmo um diálogo entretido em sotto uocc
entre êle e os outros, colocando em suas pesquisas um estilo e um tom
de mcditação originais, que tornam certas opções mais inteligíveis. É im-
possÍvel não encontrar nessas escavaçôes ScnnrrrNc e a lilosofia da natu-
reza. Também, como rem sido sublinhado muitas vêzes, o desconhecimen.
to de si próprio por parte de Fnx,uo e igualmente a inÍluência de Scnme-
NHAUER. E enfim, de Gorrnn r na sua inspiração de interrogação das fôr.
ças naturais do mundo, pois um contacto seguido com o hino à natureza,
decidiu a vocação de Fnru». Mais ainda, e mais claramente do que se as-
sinalou até aqui, é preciso levantar a liliação com a escola rômântica
alemã dita "psrquista" que se desenvolveu sob a influência de SreHr- e da
qual Hrnrnoru (1775-1843) foi o representante maior 5 com l»rlan (1795-
lE60). Essas divagações - aqui é preciso purilicar êsse têrmo de todo
sentido pejorativo - girando em tôrno de um tema que diz "die Nacht-
seiten der menschlichen Seele" (Scnunenr) atormentado por um laefismo
demoniaco, prêso em uma cosmologia cujos elementos são assinaláveis em
Mrtologia "psicocerebral" 6 (KrEsÊR, Brrcu,rx, Bluurnoonn, etc.)
Fnruo escapou a essas seduções fuliginosas, pelas quais, na verdadc,
não tinha grande estima. Ao contrário, sua carreira foi marcada, desde as
suas origens, por uma participação na equipe do fisiologista Bnucrr quc
lotmava com Hrr:rlHorn e C. Luowrc a ponta.de-lança das pooições ãn.
-tivitalistas em Íisiologia, e que loi propagandista apaixonado de um fisi-
'calismo militante. Além disio apenàs mencionaremôs a herança ancestral
cujo eco é imposslvel não ter chegado até êle. Talvez como uma vibraçãr.r
oculta que nêle soou quando, tendo deixado os instrumentos exatos do
laboratório, tomou consciência do sujeito dianre do qual estava enr
diálogo, da esterilidade de todo encontro que pretendesse usar as meii.
mas relerências conceituais que reg€m os mundos fechados. Via-os esteri-
lizalem.se diante do impulso dos fatos, mas propensos a conÍundir o mrr.
4) Crla ,.s§onâncla, M^RC KLEIN tÊm mostÍâdo cm OO|-DSTE|N e mestDo Ílo tícorÍuptírct ciün-
tlsts que ,ol CL UDE BERN^nD.
5) D.lÊmo-no3 oqu, nas inÍluénclâs hlstóÍlcss prórtmâs, dÊlxando dG lado â lmpÍcsslo DÍo-
túídt da cultuÍa hclanlcr em FÍeld ondc a lrDpregnaçlo ptotônlca c mesfto dos íré-
socÍállcos lell sldo asslíaladâ.
6) Cí. H[Nnt Ê,t, "Frogrn.nt .l'une histoiru de to t s|thiottic" (1958) líédlto,
20
seu de mistiticaçõ€s con[oráveis. 'falvez nesse momento uma fulguração
têz.lhe entrever, sübitamente, porque os forjadores de mito - que o do-
mÍnio do sonho perpetua - merecem mais fe no seu itinerário de viaçm
da noite para a face do dia tendo por única ajuda o desejo de extraüarlse
antes de continuar, do que aquêles mais arrojados na sua emprêsa quo
arma a artíficiosa Iucidez através da qual no p€rcurso inverso do conheL
cido para o desconhecido, deíxam tudo se obscurecer, à medida gue se
desce em si, até êsse ponto mesmo onde não se distingue mais nada, se-
não a ação que detém a fonte frágil da luz, imporcnte para aclarar outra
coisa que não seja o seu suporte, seguransa ilusória para a qual o olhaÍ
procura apoio no momenco em que mais nada permiteJhe encontrar-se
ns5 lugares atravessados, estranhos ao tema dessa exploração.
Por ocasião da morte de seu pai, Fneuo teve um sorrho no qual lhe
loi dito como um dever: "Suplica-se fechar os olhos".' ,
II. RTVELÂçÀO DO IN@NSCIEI TE FREUDIÀNO
Assim pois, quando Fnrm publicou em 1900 A Ciência dos Sonhos,e
encontrava.se nessa dupla dispósição. Decidido a fazer uma obra cientÍ-
fica, mas, entretanto, tôda alimentada no fôro interior dos sonhos, como
atesta a viaçm que fêz à França para estar perto de Cnnncor e de Ben-
NHETM. A descoberta do inconsciente emergirá das trevas místicas, às quais
estava até então votado. Tôda informação sôbre a vida psÍquica não pode
passar de uma formalização pela qual se constitui sua organização, sob a
questão de quem a coloca. Ao inverso, tôda referência a uma "aparelha.
gem" tem o perigo de conduzir a se exprimir numa linguagem de subs-
tancializa$o Desconhecendo as razões de uma tal formulação, a crítica de
Porrtzrn do inconsciente freudíano, se deixou levar por essa ilusão,
como observou LÂPLANCÍ{E, apelidando.o de conceito de realismo. De
fato, quando Fnruo distingue os sistemas conscientes, pré-conscientes, in-
conscientes, para os quais postula fronteiras, regimes e uma economia
claramente autônomos, como se fôssem províncias distintas, obedece a
uma dupla exig€ncia. É impossível, sob pena de inconsciência e leveza,^
tent"r ü*" con-ceitualiza@o' da atividade' psíquica que se passa num sd
compartimento. Esse compartimento constitui de alguma maneira, neces-
sidade prévia para uma concepfo estrutural. Se se quer articular oo jot
gos e os efeitos do sentido então é indispensável "lqalizar" por assim di-
zer, êsses planos, dos guais o conjunto é necessário para o restabelecimen-
to do discursq enquanto é o suporte e a exposição de uma verdade mu-
tilada. Entretanto, para alguns, todo empreendimento de composição nesse
2t
objetivo deve renunciar à utilizar uma qualquer cartografia cerebral. A
distância que separa o que sabemos da organização do cérebro da tomada
de consciência de nossa atividade psíquica, deve sê passíu numa oura
linguagem que não seja a da anatomiá ou da anatoúofisiologia. e Tam.
bém a comparação que êle faz do aparelho psÍquico como um microcosno
não é desusada senão em aparência. Os "lugares psíquicos", essas forjas
do- esplrito, dos quais o inconsciente seria questão senãq como êle piô
prio disse, "pontos ideais" aos quais não corresponde nenhuma parté do
aparelho.
Na sua IvÍetapsicologia, o estudo sôbre o inconsciente revela em
Fnsuo a inquietação, nêle profundamente introduzida, de uma formaliza-
ção de sua concepção dos processos psíquicos. Consciente e inconsciente
aí {iguram como sistemas qualificados por duas caracterÍsticas contraditê
rias. Êlps já não são sômente dôis mundos ou dois tipos diferentes de apa.
recer à consciência como sc poderia cÍer por- uma interpretação rági-da
e que seriam o sonho, o ato Íalho, o fantasma 10 ou mesmo o sintoma, mas
dois modos de oÍganização radicalmente diferentes. rr Ver-se-á que é sôbre
essa irreduti bilidade na aÍirmação de uma exterioridade da cbnsciência,
inaceitável pela filosofia clássica, que se fundaram as oposições à psicaná-
Iise, mesmo as forma disfarçadas de concordância com as grandes linhas
da teoria psicanálica. . .
A especilicidade dos processos inconscientes - já denunciada no A
Ciência dos Sonhos - aqui é erigida em sistema. As leis dessa outra face
da vida_ do-esplrito são mal ou muito abstratamente compreendidas quan-
do se fica fora da experiência psicanalltica. Reconhecem-os de boa vônta-
de que é um pobÍe argumento recorrer a isto, mas como evitá-lo?
O inconsciente não conhece nem dúvida e nem grau na sua ceÍteza;
as fôrças que o comandam aI reinam sob a forma de uma energia livre,
com urgência de se exprimir, empregando todos os meios de dissimulação
para vir à luz, suscetlvel em seu próprio interior de uma divisão, de crís-
talizaçóes ou de desvios de conteúdq e animada, enfim, de uma indestrtr.
tibilidade às normas do tempo que perenizam nêle os efeitos todos ao
longo da vida.
Jl--tr* at"r"rantc marcâdo íâ crposrção dG J, L^eLÁNGHE G s, LECL rRr:. A Decessrdadc ou!
lÊmoi dc lcmbrtÍ cssa banalldade sc deve ao lalo dc quê íÍrultos sistêíras pslcôprtológlóos
ôpaÍcntcmcíte multo dlstaítÊs do3 dados ânátomo-Ílslológrcos sÊ ÊsfoÍccm nlo para ,lcaÍ
oÍórrrnos dos oídos da obscÍvacão clêntlílcô, o que é scmpre r'rtil. mas Í)ctô ,âto d.
conccbcÍ os ícno,I)cnos pslqulcos scgundo 03 modelos .lo cnátomo-lisiotogio, nêl.s colo-
cando ScrDpÍc as duss qrc!tõc!: 'Oode sc plssa êl€? c qlral o seu papct?,, rccu.ndo
qqrpÍc como o tncnloo crvcÍgonhâdo dlârlc rro lcría lnômcável qr{ ac torna entSmr:
"Quc é lEto"?
l0) No oÍiglnat íÍaqgês: "ranlasmc" € deÍlvado "íântasmatlquÊ" . TrnJllzlmos por "lantâsmô"
ê "íaÍtasmátlcor qrc nos prrcccr!m os têÍmos mals spÍopilâdos. Segundo.l. L^PL^NCHE
c J. B. PoliÍ^L,S (Vocobuiolrc dc to Psyehanotys., P.U.F,. !§ô7). ÍâDtasrnà é o cÊnárto
lÍírghátlo ordc O Surclto é pÍCsrttc c quc rcpÍcsanta, dc maí:iÍi Í'lâls ôn nranos dcíor-
,D!d! pclos pÍocclsos dclcíslvos, o cuÍDpÍlmcrlo dc úm dcsrro c, ern últlÍI)o caso. dc um
dcsêlo lncon3clcnla. Og lanlagrrs3 podcm !eÍ: consclantcs ou sonltos dirrrnos
hconsclcrltcg, tal8 como â anállsc os dcscobr. como cstrúlúrâ - trbrâccÍtc - c
à ürn coíteúdo
manllê31o. Súzân l2aaca pÍopô! ! Irafla "Phânlasmt" pâÍa dcslgna, o lantisnra lncons-
qlêntÊ Ê maÍca, I distlnção com o íântâsmâ ("rantasmc' consctcnt€. (Nota do Trldutor).
tl) O pÍê-con3clcÍlc conslltülrla u,D! llSssáo cntrc oe dols tlno3 dê arivldsdcs ÍrÊlqutcâs, mâs
FREUD vôl rcduzlÍ pÍo!Íes6lvarDcrl. â sua Darlr c allurr lus ltlyldrdc como aD'exo lquale
d! conscltDcl..
Certamente, essa representação é ambigua; e é a partir dessa ambi-
güidade, que é menos ém nosso entender um Ponto Íraco da teorÍa do
{ue uma fbnte de tecundidade, gue as interpretações vão chocar'se. Para
ds adversários da teoria psicanalltica, em particular para os que fazem
partir suas críticas de uma certa tradição filosófica (que se prolonga até
ôs nossos dias quando apenas se começa a terminar a rejeição da psica-
nálise e quando se tenta interrogáJa, colocando'a em questão), uma
ilusão do naturalismo conduz a duvidar dessa espécie de demonomania
aqui representada em todos os seus artifícios, recusando-se a reconhecer
nõla as'tormas mais originais da intencionalidade. Nenhuma arqueologia
(MrnI,rlu-Poxry) do espírito estaria autorizada a despojar dêle o sen'
tido que é o apanágio humano, substituÍdo em suas origens por_ uma_ -re-
tlexão de ordem natural. Para outros, no interior da própria psicanáIise,
é uma mística que se trata então de exorciiar (a lgreja não é a primcira
a desconfiar do sobrenatural?) e será grande a t€ntação de puriÍicáJo,
hoje, dessa vocaSo, para reduzi-lo a fôrgs dôcilmente dominadas. O pró'
prio espírito ç inquieta com os conceito que cria, quando êles, rorq-
pendo com os quadros que mantêm suas formas, destacam-se em uma
matéria muito nova. Hesitando entre a monstruosidade ou o gênio, se é
levado a se assustar mais com a primeira do que a saudar a germina$o
do segundo, sobretudo quando a descoberta atinge as fontes mesmas do
poder de questionamento do homem, parecendo ameaçar a integridade
de sua prbcura, ou coloca o dedo sôbre o hiato que o mantém dividido na
tensão que pesa sôbre o movimento oscilante de suas interrogações.
No entanto, Fner.rD renunciará ern parte a essa sistematização na sua
segunda concepção do aparelho psíquico, na qual abandona a primeira
separaÉo em sistema cs (consciente) rcs (pré-consciente) , Ics (incons-
ci€nte), em proveito daquela, mais claramente tópica do Id, Ego, Superc-
go. O inconsciente deixa de ser uma província autônoma; não é mais do
que uma qualidade, desprovida de estatuto que lhe confira autoridade
quase institucional. Entretanto, quando Fnpuo "inventa" o Id, retoma os
mesmos têrmos de que tinha se servido para designar o Inconsciente. Que-
quer dízer isto? Vinte anos de reflexõei em contacto com a experiêncif
concreta, tê-lo-iam convencído a extirpar a sombra de inspiração mecani-
cista que tinha escapado na sua primeira concepção. Se esta complexida-
de de agora evoca alguma maquinaría, êle sabe que se trata de uma
máquina internal. O inconsciente ergue.se então como uma dimensão es-
sencialmente heterogênea às formas vividas da consciência, como se Pre-
cisasse desfazer as suas tbntesde todo aspecto representativo. O Inconce-
bÍvel - o que não é o inefável - é que o outro de meu discurso não
seja da minha natureza. A alienação não é sômente uma divisão, é um
envolvimento. Os riscos em que cairÍamos, há um instante, de permitir
que um único sentido habite o Id, têrmo escolhido eo raáo de sua qua-
lidade de pronome impessoal, acham.se aqui multiplicados. Ou ainda o
lisco de aprisionar essa tôrça nas rêdes das prisóes do corpo natural.
23
----),
t2) Culâ ImpoÍtánch antÊs da c-xpcÍlmciÍa§lo, a obÍâ rtlntcâ dc PIUL Outn^UD ió dêstacou
l3) Porquc vÊlculsndo lníoÍmagõG! doladas dc qualldadcs dGílíldas.
24
nr-la à neuroquímica e esta à cibernetica. Além disso, o estudo dessas
tormações traz uma rica colheita de fatos experimentais sÔbre os estados
,Ie hipersexualidade, as atividades orocoocionais, o movimento de auto
matis;nos compulsionais, a memória, desde que se Po§sa aplicar êsse têr-
mo ao animal, etc, . . .
§abe.se que os neurotisiologistas evitam especulações. Parecem não
desconÍiar de-seus postulados impllcitos, e assim submetem-se raramente,
com algumas exce&s, a discuti.lôs. É precirc registrar uma certa demissão
tle sua-parte no aisunto, sob o preteito de recusa de participação nu.nt
terreno'muito vasto de uma disóussão conjetural em exce§so. t' Sem dú'
vida, usam de alguma demagogia e concordam com uma separação misti'
ficante das tarefai. "A vós oi t'atos, a nós as reflexões". Na verdade, o que
se receia com isto é o tim da objetividade da ciência e do Íundamento'
de seus postulados implícitos nessas aventuras de exame crítico'
Um-dos ensinamentos mais instrutivos dessas novas descobertas e a
inelutabilidade dos lênômenos do sentido. A pré'seleSo dos sinais rbqtrtrr
1 diferenciação de significante e do não-signiÍicante fora dos processos
de ativação da vigilância. rõ
É signiticatiú que êses trabalhos venham confirmar a intuição Iilo-
sótica jáiclaramenrc assinalada depois de HrcsL: a consubstancialidade
clos campos da consciência te e do deseio. É evidente gue nenhuma tenta'
que
ção impêde-nos novamente de fazer uso de um paralelismo psicotÍsico
ó prOpiio Fneuo recusou, precisamente à propósito do.problema.do. in'
coàsciênte. Além disso, as riralhas da consciência por onde êle dá sinal de
sua presença, deixam-nos sem outra resPosta, na PersPectiva neurofisio
lógicã ou áeuropsiquiátrica,
-exclui a não ser aquela de um malôgto de funcio'
nàmento, o que que
-psicanalistai, algum sentido daí Poqsa ser tirado.
Para os um empreendimento como êss€ é instrutivo na
medida em {ue nos revela até que Ponto o Pensamento neurobiológico
pode avançai. Êsse pontolimite seria o de uma convergência entre o§
iontos de vista de uma tendência Particular da psicanálise (que se pcí'
àeria chamar de psicobiológica) e os métodos çnéticos e antropológicos
' Buwc)
(C. .
Depois que uma corrente nova abalou a úlida tranqüilidade d-a 1eu'
rologia'clássita, muito segura de seus fundamentos e de seus resultados,
prosseguiu a tentativa de ler inteliçntemente os problemas concretos gue
àotocam a organização nervosa nas desestru turações, com Moxlxow,
Gorosrerx, Wãr'zs.uéxpr,, e mais perto de nós AlunlecuERRA e HÉceriv.
l$
'-' Trrbé, nlo é um n.uíoíl§lologl6ta, maB um cllnlco clctrG4nccíalogt!Íl§ts (C BL Nc)
Àãiiiiii.cntc lnÍoímado quc oôde íetlrtÍ mrtérla dc ÍcÍlcxão d&§c §rbcr'
rSl rü.i iiio ncrrô"a diÍusi, ndo cspêclalca, c6tcÍcotlpadâ, podc- ccítamcntc contílbulÍ ,a,a
"'' a-ààicã,iigi'ài iú ltgntilcaçro, ior cxemplo qurnôo o organlsmo-.está em vlglllE ou c.m
está'do d€ alcítal ÍÍa3 ae els nlo pode ÉetvlÍ dc lub6trat0 paía e dltcÍcncltçlo oo 6lgnlrF
iãirc-c ão iio-áteiiticintc quc lmóllcs I dhtlnçlo d8 rlgurs ! do fuído, ou. numa palavrs'
iã"ári,cersô icieitvo oe op'octçlo'" (c. 8laÍc). Dl,lâmo§, contudo, dcpols d'lc, qoc-'
dlÍcÍincleclo do slgnlílcantc c do oto-slgnlÍlcantc íequcÍeÍla prêvtamcnlc a ollcÍcnclaçao
da dlstlnçlo ds Íl8trÍr c do Íurdo.
rOl
' §ãtÀôi'ihã ãõ scjittao ncuíoÍl3lológlço psÍ-s o seítldo íllosóÍlco do tê.mo; entÍ.troto.
oossa obsàrv8çlo Í06 paÍccc dc quilqu"r Ío.ma lmgoÍtaírtc.
2ú
A Íeintcgração_ do sujeito é operada com a ajuda dos métodos
çnéticos,
com .os quais Husslnr, no Íim das Meditações CaÍtcsionos, conórda por
um instante que êles são suscetlveis de guiar-nos naquilo que podêria
ser â constituição do sujeito. A idéia coÀum que se iubentãndd desas
orientações variadas - e isto nos parece também verdadeiro tanto para
os métodos geqéticos como para as correntes antropológicas
- é a dã in.
tegração que deriva não sômente de SHEnnrncrox, mai;a de SpnNcsn e
Jrcxsot. Mesmo no método holístico de Goosrux, não se pode deixar
de pensar.que ela está pressuposrâ pela interpreração globaliira. Se aqui
não se coloca a questão dos elementos dissolvidos numa totalidade e- se
a essência continua sendo visar as diferenciaçôes de .,performance,, no
curso da alteração de uma forma dotada cle um sentido no seu diálogo
com o meio - o que impllcitamente se requer é a existência prévia ãe
um fundamento organizador dessa totalidade, mesmo se se recusa a nos
dizer.qual é. .A passagem de um comportamento ordenado para um com-
portamenro desordenado, se não é explicado pelo efeito de um acaso não
srgnilicativo, só pode levar a colocar em que§tão, através da desorganizal
ção,- o_ processo mesrno da organização. Resta saber se esta orgaiização
impllcita detém sob sua dependência, de maneira necessária e íuficiente
a- atividade pslquica. C. BurNc concluiu pela necessidade de abandonar
tôda pretensão a esperar das relaçóes de ca-usalidade. "Todo estudo psico.
lógico- situa.se numa zona de interferência de séries causais a um rempo
interdependentes e irredutíveis uma à outra". O recurso da epistemolo§ia
BÊnéticâ justilica-se então, na medida em que ela propõe um modêlo hls.
tóÍico explicarivo do tempo e das fases d'essa organi'zação desmantelada
pelo processo mórbido, e introduz uma perspectivã ondé a estrutura opô-
ratória que clefiniu o ciclo das relações do sujeito e do objeto cletermlna.
se pela referência a um pensamento nõo mais causal, maí implicatiuo.
No momento de concluir, nada mais resta quando se deliniu os
"paÉmetros axiológicos".- Essa deÍinição permanete no plano de um
localizacionismo aumentadq no qual não ie encontra essj exigência de
heterogeneidade do sentido em relação a suas determinações, mãsmo que
elas. sejam_ converg€ntes. A lortiori não estamos aqui intéressados no
{ue
se definiria como a mais sistemática atividade consciente, mas a meios
Ienomenolôgicamente verdadeira, a qual Pncsr valoriza exageradamente
nos processo§ operatórios. Â rellexão a que no§ conduzimos sôbre a teoria
do conhecimento leva a encontrar em Hussru a prevalência que vale
primeiro e antes de tôdas as outras do Ego trahscendental.
- -
-
A objeção evidente que nasce dessa crltica é a de conduzir à um ni-
lulismo cientlfico. Deveríamos, dizem os fisiologistas, espeÍar que a última
palavra seja dita sôbre o Ser ou a Essência, antes de ios auiorizarmos à
elucidação parcial do mundo? Uma tal posição seria eüdentemente tão
estéril quanro errônea. De fato, um homem de laboratório por mais que
defenda 2s su2s intençõ€s, jamais renuncia a uma explicaçào mais co:m-
pleta, senão total, de seu objeto de estudo que permadece iempre in linc
2tJ
o homem. Ese desejo é por vêzes mais ou menos advogado tardiamentc.
Os homens de cíência deicobrem-se, quase senPrie no fim de su:rs ciüt€i.
ras, como talentos de tilósofos, mais do que o filósofo que acreditaria ter
tido a boa sorte, por dom ou por método, de escapar ao hermetismo
esfumado da filosófia. Por vêzes seus olhares se tornam discretos, mas
contudo peÍrnanecem inquietos €m suas cogitações interiores. É êsse o
momento em gue o demônio despertará nêles, e então trocarão .o§ imPe'
rativos esquemiticos da Procura isolada do laboratório pela única cami-
nhada sadia em direção à descoberta da verdade. A necessidade §€ trans'
tbrma em virtude quando não mais toma a forma imperativa da lei. Mas
agui o legislador não é o que estabelece um ponto Praticável nas mudart-
çai humanas; êle se investiü de uma legitimidade que rejeita todo debate
sôbre o Íundo. É por ísso que nossa crítica recai sôbre os postulados e
as implicações dai descobertas científicas. Freqüentemente, êles deixam
o plano de uma revelação parcial do saber simulando desconhecer a in'
teição protunda que os anima na consciência de-si do pesquisador, e
- Recusarerigi-la
pretendem em saber absoluto.
sém discussão os dados da neurobiologia como impróprios
nos seus princÍpios para n<xi revelar qualquer coisa que seja_ essencial
sôbre o ínconscitnte ter-nos-ia dispensado essa entrada no mundo desabi'
tado do laboratório ou no universo impessoal de uma physis, à qual de-
sejar+e-ia fazer representar um PaPel hegemônico num período pioneiro
da neurotisiologia. Duas razões nos dissuadiram disso: de inÍcio, porque
era necessário iubmeter a um exarne aquilo sôbre o qual se apóia a
psiquiatría de inspiração organicista; em seguida para dissipar o equÍvoco
que poderia reinar sôbre uma certa interPretação naturalista da Djricaná-
lise, ã partir de certas metáforas freudianás 1í sôbre a natureza. do I! que,
segundô os próprios têrmos de Fnruo, esclarecem.se "na somática, aí reco'
lhendo as nécesiidades pulsionais qu€ nela encontram sua expressão psíqui-
ca, mas não podemos âizer em que substrato".lE Se, pois, tínhanos que
tratar da corporeidade, e temos certamente o dever de pensar alguma
6s153 1 lsspeilo, esta foi a maneira que encontramos PaÍa abordar êsse
enigma, e é o gue poderia justificar nossa caminhada.
27
concepção integradora. Essa concepção reconhece a existência de saltos
mutativos, de. aparições de "ordens'' especlficas, mas lica nunra inspiração
que se poderia chamar de piramidal.
! o próprio Mmr-reu-poxin que
nos pÍometia uma frutuosa solução filosófica do inconsciente, intrúu-
zindo. na discussão - cljâ exposição seguirá
- o conceito de grandeza
llgativa de Krxr e sobretudo sublinhando a necessidade de, dépois de
Husrnr, pensar os problemas do esplrito so-bretudo no campo dàs rela.
Sôes c9p o corpo -- na dimensão de descontinuidade.re Esperãvamos com
impaciência os estudos que. êle prometia, dos quais alguns -sinais .o permi.
tiâm prever sua importância.2r
28
Assim, H. LrrÊsvRr não pode, no estado atual da situação, senão
1»opor modelos sociológicos alcançando apenas uma representação indi-
reta do inconsciente opondo a esfiutuÍa e a conjuntura, os processos cümü.
lattuos e não-cumulalivos, a expressão e a signiÍicaçõo, e enfim, ar con.
lradições solúveis ou não-solítveis pela rcpresenlação.28 Encontra-se em
certas interpretações, como aquela da vontade de redução do individual
ao social e a desvalorização do subjetivo, na concepção de uma "ordenr"
hierárquica que englobaria os níveis de realidade e de consciência de onde
se alcançaria, no fim da ascenúo, o conscience "por cima" do inconscien.
te, como em cima do consciente, encontraríamos o real, e ainda acima
clêle, o social. É bastante perigoso substituir o exame crítico por um vo.
luntarismo ético; mesmo se a harmonia arquitetural aqui não é pré mas
pós-estabelecida, é curioso constatar que, enquanto Mrnx promovtu uma
revolução autênticâ na concepÉo da história em sua inteipreração desta
sob o ângulo da luta de classes, - contradição que permanece aberta e
inquieta - nunca os marxistas se estorçaram rCalmênte para pensar a
clialética inter e intra.subjetiva em têrrros de conflito,zr
Seria injusto proferir essas críticas a muitos daqueles que tentam
atualmente se livrar do estardalhaço intelectual que i-ncomodã o deserr-
volvimento de suas contribuições às ciências humãnas, e por ela, no gue
diz respeito.à_ psicopatologia.zr A articulação das relações -entre o psicolê
gico e o social não é, certamente, uma tarefa que se conceba tão fà;ilmen.
te. A curvação da linha firme que Fnruo tralou nas suas obras socioló.
gic-as como nas suas obras prôpriamente psicanalíticas, tem.se manifestado
pelo desenvolvimento de certas tendências da antropologia culrural otr
então, a partir de uma orientação dela. Possuír uma foimação psicanalÍtica
não é g.amntia suficiente para_ justifícar em certos sociólogos à deslocação
do.contlito, que- êles lpeqm do plano intra e intersubjetiio para o plino
indivÍduo-sociedade. O próprio Slnrnr parece ter.se deíxado
lirender'nessa
armadilha. "De faro, é um mérodo (a psicanálise) que se pieocupa antes
--ãiIt"fto é, por um m-ecanlsmo .dc ç de pÍoieçIo quc o cntgmâ ou â angúsu{
sc âcham dcslgcsdos íora dc sl. -NÍo
-cncgáçto
ixÍrte outra- soiuólo àara o o;oblcmf,: ou -êÍrt.lo
sc é obrtgado's sc í€fcrtr r vrrtantis tonsittuirónali rnhlir'áai quãijlo-ào 'apõtrià'àa:
rrcnto dr qucstlo maÍog.a.
'.:3 ) O Ítrlmclro rnodêlo 5c rcÍerc so c6tudo das ,Glsç6es enl.c e e§|ru,urd e a coaiunturo; tals
coflo .l.s podcm splrcccr nr tingusgrm, §uai Doslcõcs oíooomlnals c no'dlscurrb: a
c§lÍutura ,cprcscntâ al o sEprcto scabldo, dctcÍmloado, lóflco; ! conluntuír. o r§occto
fluruante. vartávct, llvrc. O caÍáter htlaóÍlco íundâ o ecgunilo modêlo (B), luSsr dr'ooo_
slslo. cntrc Orocelsos -c..r,nulollyos qua 6cÍlam aquêles ã! lntcltgêncls'a' pro:iosás nâo-
cumalalivos quç eSpcclílcârlam a qÍettvldsdc. A eiorcssõo e o $ts1iílcacdo ilo oooster no
modêlo 6cguíntc (C); a prlmclrg 6êído o 6uporte ils extrtlncla Ínaivtdüal coouarito qúc a
6cgloda slgnos vlndor do soclal (màs nto é cssa oposlçlo quc rcria ncccisárlo
-vlss_o!
Entírn, o últloro modalo (D) conÍroota no antrÍôntlio aà coaarudiçõat totú-
lu6tlÍlcaí?),
vets ou gsfecenoo como toit em c pela Íayescatacõo e as coatfodiçées lnsolútels em .
írala re Ítre tealo_ cllo . 06 mal-cntcídldo8 do lnconrclcntc rllo 6c ÍêÊolúm goÍ umr .vl o.
mlla coííctt dis col6ât.
2.ll Salvo ía escâls cclulrr ou rcglonal do cércbro.
251 No6Êâs crltlcat sc dlrlgcm âos p6lqulstía! c so! pslcopstologlftas maíxl6te6 quc lamsls
lazcm um crÍorlo 6lncêro para pcnsat o Oroôlcma Êm têímo3 orlglÍralr c flcundo6. ma§
ac sentcm abrlg.ados atrás dc umâ Goclo8êncsr t[o 6uÍrcíÍlclll quinto crtérll. Dc rcsto,
o pensancnto F6lqulátílco marxlstl Gc lstícltôu rlída mâls oor ocasllo do XX Con[r.r.o
do Plrtldo çotn-unlsts. qúc dclxaÍam ss Íllelras, tlntàm !8ora, num csÍôíço diílcll,
quaíto acmpo pcÍdldol Umr teo,la da9 Írl8ções ds sllcnrçlo com
essrs Ioítnulaçõc6, mas ^quélcs
il do trabtlto conthut lntalrámaítc para ser Íelt!,
29
de tudo em estabelecer a maneira pela qual uma criança vive suas rela.
ções familiares no interior de uma dada sociedade. E isso não quer dizer
que ela põe em dúvida a prioridade das instituiçôes. Muiro ao ionrrário,
seu próprio objeto depende da estrutura $o de tal famllia particular, e
esta Dão é senão uma ceÍta singularização da estrutura familiar própria
e tal classe, nas tais condições: assim monografias psicanalÍricas
--se ltas
tôssem posslveis - revelariam a evolução da lamllia lrancesa enrre o
seja mais sutil em outros lugares, por vêzes tem-se a impressão de que,
a evolução geral das relações de produção.zo Ainda que seu pensamento
seculo XVIII e o século XX, o qual por seu turno traduz à sua maneira,
se Sentlt é vigilante em denunciar o conteúdo vazio e inaceitável da teoria
da consciência.reflexo oara deÍender legltimamente a primazia do sujeito
e rejeitar a ilusão mistificante de uma possibilidade de apreensão do real
como tal (mistilicação da qual seu mérito de Íilósolo o faz evitar), quan-
do aborda o problema social, tenderia a esquecer a sua órica de filósofo
e por pouco iria até a nos deixar acreditar que o real pode ser apreendido
sob a lorma de relaçôes de produçãq realidade que se refrataria na ética
através tle seus adornos sociológicos. Na verdade, não há motivo para
volatizar aqui o sujeito e aceitar aquilo que se recusa para a teoria da
consciência-reflexo.2? A noção de papel por exemplo não se elucida, em
última análise, a não ser através da problemática da identiÍicação.26 A tra-
jetória da passâgem de um ao outro situa-se no plano de uma epigênese,
a qual P. Rrcorur definiu em têrmos felizes, numa perspectiva hegeliana.
A intervenção das instituições sôbre a estrutura do inconsciente é urn
oroblema cuja solução continua pendente. Parece-nos ter sido abordado na
sua perspectiva mais correta por C, LÉvr§rn^uss nos seus estudos de an-
tropologia social, notadamente das relações da linguagem e do parentesco,
e pelo exame dos mitos que não exprimem o inconsciente coletivo mas
lazem impulsionar as molas dessa organização significante. "Se, como acre-
ditamos, a atividade inconsciente do espírito consiste em impor formas
a um conteúdo, e se essas formas são fundamentalmente as mêsmas para
todos os esplritos antigos e modernos, primitivos e civilizados
- coúo o
estudo da função simbólica, tal como ela se exprime na linguaçm, mos-
tra-o de maneira brilhante - é preciso e é suficiente atingii a esrrutura
inconsciente subjacente à cada instituição ou à cada cosrume, para obter
um princlpio de interpretação válido para ourras instituiçõei e ourros
costumes, com a condição naturalmente de conduzir a análise bastante
lonç". (C. LrÉvr§neuss). A confronração das concepções de LÉvr-Srneuss
e de F. or Seussunr zo para elucidar as relações da estrutura lingülstica
26 'Qucstlon dr métlrodc', ln C.iriquc de to .oisoa .lior.cliq@ (D. 47).
27 E$â c.ltlcô olo_ dcvc dlmhulr â lmpoÍlâÍrclâ quc .trlbul os a obÍa dc S^RTRE plra a
pslcanátl3c, mcsôo atravér do quc consldcramos como um desÍr.a2o dalê em rclàclo à
pslcsnállsc. O movlmCnlo guc no6 dlÍlgc paÍâ êlc é aquêlc do dlálogo que êlc própÍlo
crt Êtam corD 8 pslcrtrálhc desdc a! orlgcns de sua obÍa. Ê lamÉntávcl guc assc dlllogo
írlo !c tanhâ lncâÍnâdo lâmâB, mâ6 é 6lSnlllcatlvo quÊ rrlnal, na 3ucclslo do3 Ê3cÍltôs
dc S§TnE, a psrlc dr glcrnâllrc sl sc ,açà a mels lmpoÍtaÍrtc . a mcno! lncomÍ,rccodlda.
 Cl. Á. OiEEN, L. tô1., Êaotution pychlaülquc, vol. l, le6l, p. t-26.
» Cllro lnlc.êssc c í.cuÍrdldsda Leaân comprÊcndcu trrulto ccdo,
30
com a atividade inconsciente, permite encontlar nas origens da lingua.
gem, desde a idade das oposições fonológicas, as correspondênciaí de
ambivalência da dinâmica pulsional original.so De início, na relação bi-
nária com a mãe (estrutura edipiana prévia à fase do complexo de Édipo,
que supõe a sombra da presença paterna através do desejo do falos da
rnãe); em seguida, a relação triangular (no momento do complexo dc
Édipo) quando o personagem patetnol presente não é mais mealiatizado
pela mãe, mas torna.se pela sua presença o mediador de um quarto têrmo,
a morte, encarnação simbólica da mudança e é porisso mesmo que subli-
nhamos, conccpções , lrit d, ooro.r,
Assim, o inconsciente especifica-se menos ao nível sociológico na
valotízaS.o das variantes culturais do que na busca das tigações de hete.
rogeneidade e de interdependência da economia çral ao escalão indi.
vidual e tãmiliar, que se tornam, do mesmo modo, desejos intersubjetivos
constituídos em estruturas.
o
. Já é adiantar o problema reconhecer que não se poderia compreender
tnconsciente como dimensão negativa da consciência. "O inconsciente
deve ser tido por uma instância autônoma ou pretendendo a autonomia"
(4. DE WAELHENs). Entretanto, mesmo quando esta autonomia é reco-
trhecida não sem restrição, haverá sempre a tentação de discutir as mo-
dalidades de separação da consciêntia, lembrando que tôda a tareÍa
-sua
da fenomen-olo-gia, sobretudo depois de Husrnr, foi a de mostrar que s€
ignorao pelo fato e na medida em qu€ êle é a consciência. Desde Lntão
tem-se acreditado com autoridade para situar o problema do inconsciente
em relação aos "horizontes" da cbnsciência na esfera do implÍcito, nas
suas fronteiras de ambigüidade entre o real e o irreal, presenia e ausên-
cia, sim ou não. Uma concepção como essa, talvez colfrue o'problema,
mas não chegou a_isso ficando à porta do ínconsciente. -D€sse - ponto de
vista, segundo oB Werrnrxs (manifestando aqrri sua concordâàcía com
al §ses_ defendidas por J . L.rcrr.r) a linguagem parecia o lugar priraile-
grado do discurso entre o consciente e o inconsciente. A designação do
3r
que é lormulado, desde que descohÍto, deixa de recobrir completamente
o que na aparência tinha por função transcrever, para se oferecer como
posie do significante aglomerado e entrelaçado à outros significantes, re.
velando através de seu ordenamento inicial uma estrutura segunda, a um
tempo Presente e ausente na primeira e instituindo uma cisão no sujeito.
Ê no alastamento, no sobrevôo que a linguagem permite - elevando.se
assim para além da consciência que é o seu supoÍte para visar o implkito
que é possível êse encontro com o inconsciente. Êsse s€ntido é um ser
-para, mas é também transcendência à qual a linguagem reenvia pelo jÔEo
de presença e de ausência que ela instaura, A linguagem se torna visada
do ser sutil. A nosso ver, essa conclusão tem o perigo de separar-se da colr-
cepção lieudiana, mais atentâ em denunciar a ligação lrumana do que
a união contemplativa, a partir de uma rápida visão.
O verdadeiro benefício desa confrontação é a rulna definitiva de uma
idéia da consciência possuindose a si própria, tÍansparente à si própria.
Sem dúvida, desde há muito tempo, a visão da consciência como relação
intrlnseca ao Outro deixa prever que a alienação bem poderia ser êsse
lundamento constitutivo, a um tempo, dos mais "autênticos" empreeu-
dimentos humanos e dos desvios da loucura. Mas falta especificar essa
relação ao Outro. S,rnmr dela faz o primado de sua filosofia, mas apesar
de tudq é a Hmru que é preciso voltar. O que não tem preocupado muito
a rellexão lilosófica é o caráter esencialmente otÍro dessa alienação, de
uma alteridade que não consiste em encontrar um outro mesmo, mas um
outro radicalmente dilerente, 9ue faz apaÍecer, nas articulações de seu
discurso, o estranhq não mais sômente fora da minha visacla, mas nâ
minha própria visada, no desejo que me põe fora de mim.
Se Fnruo interessa-se por êsse campo mais do que por qualquer outro,
é precisamente em razão desa divisão do sujeito por seu desejo cujas
instâncias contraditórias (representadas nos antagonismos das pulsões de
vida e da morte) situam o conflito desde os primeiros balbucios do ser,
e isto nêle próprio e por si mesmo, na sua rielação com outro e consigo.
A intuição de Fnruo, presente desde as origens e que vai lançar seu pen-
samento sôbre os caminhos do inconsciente através do recalque, faz surgir
em seu esplrito essa evidência até então não formulada: ainda que o
sujeito possa se pôr ao abrigo das excitações desagradáveis que perturbanr
sua quietude ou seu prazer por tôda sorte de manobras, por meio das
quais êle buscará liwar.se delas, permanece, no entanto, impotente diante
daquilo que emerge dê1e.3, É nesse impacto que se formam as categorias
lundamentais que vão se tornar constitutivas do recalque, mas que seril
preciso tlecifraÍ até a morte. Htctr, melhor que todos os outros, soube
traduzir na "Fenomenologia ilo Espirito", na L'Áufhebunp da consciência
de si, aquilo que Fnruo descobriu com olrtros têrmos.33
32) DEsc^pÍEs- Les nottlont de l'âme. o- lo2,
3) l. Hyppourre rlú-o multo blm DumÀ conrcrêncla e num comcntáÍlo tlotávrts (la Psychono'
iyse, Íe t (10Íi) Ê Írí 3 (195?). E à conclu3ão !Êmclhaolc quq chcSou O. L.nté.| .m 3u!B
pcsqulst! ois "óorrcspoodêlctás" do lttco[scl.nte tra obrâ dó DEsc^f,fEs, HussERL,HEtDEo-
oEn c S^RTR[.
32
IVÍais aintla que em Hussenr, é na busca do préreflexivo que se pode'
ria encontrar um lugar para o inconsciente,sr em Huorccrn, na proble-
mática da inautenticidadê que delineia uma €strutura semelhante àquela
do inconsciente, problemática que só é plenamente exprimida 1r1 qra :"'yr-
<le SARTRB. 0 lugãr resen ado "para o outro" no "O Set e o Nodt"
daria a um cncõntro com Feruo, para alem <las críticas que Sentne faz
ao treudismo, Portanto, a nosso vér, o que o autor de "O Imagindrio"
assinalou foi a situação dêsse Outro e sua natureza no próprio eu. Se o
Ser pelo qtral êle se refere a seu scr enquanto êsse ser implica um sel'
"outro qué não ê1e", é êsse ser "outro que não êle" que questiona, isto ó,
sua conslituição heterogênea em relação ao ser quc se designa como tal
no desejo. Sni.rns não pode, a não ser diflcilmente, admitir a coexistência
de tormas cl ivetsas para o ser, ou mesmo de caminhos divergentes dc
saber.
É, em cletinitivo, do lado de HccrI- que um cet'to encontro pode ser
realizado. A análise do senhor e do escravo - por mais ambígua que ela
seja - preserva sua virtude de exemplarídade .para revelar o poder dêsse
_
négativô que é o inconsciente. Mas, para os- psicanalistas ela torna'se uma
ver?ade qüe êles são talvez os únicos a poder lPre:nder através- da expe'
riêrrcia trãnstêrencial gue reenvia às relà@s dê dependência da criança
a(» seus çnitores, onãe se revela uma dialética semelhante àquela do
senhor e do escravo,
Além disso, nenhuma filosofia poderia, a nosso ver, pretender a
coerência, se não é capaz de dizer alguma coÍsa úbre a loucura. O exer'
cícío da rrzío nÁo pode parar no limiar da alienação, pois onde fixar êsse
limiar?s6 A tenoménologia hegelíana mostta-nos como nos avatares do
movimento da alienação uma profunda alienação é pensável. O defeito da
psicopatologia tênomenológica é não ter compreendido isto. Ela esgotou
iuas iaízes õm Mex Scxrr,rrn, BERGsoN, HussenL e Heloeccrn, mas iamais
em HrcBr.. É um sinal. Ela teria percebido que, em strma, o lugar já -es-
tava tomado por Fneuo, mesmo sem êle saber? Portanto, foi graças à [ilo'
sotia tenomenológica que a psiquiatria pôde tomar um impulso que a
fêz sair de um sãber Coagulado, quando estavam esgotados todo§ os re'
cunos de uma mecânica dos movimtntos da alma e Perado a continuidade
de sua pesquisa. Mas foi mesmo a fenomenologia que a tirou verdadei-
ramente dêsse ímpasse?to
31) "O líconsclcnt.. oodcÍkmos dlzcr. é tôda r oart€ do conrclênclr nto-tltlc! quc o hoocm
podc..tomaí pàtà rcÍlexo c que êlc não aprêcndc scnão em cc(ta6 qualldrdc! no.drátlc!í
'clnculaÍês doi oblctos. Sc o homcm ó cllcíclalmcntc um movlmcnto dc tÍrnsccndênclt c6
di.;c!o so quc ?ic o[o é, r|a tot.lldad. êlc t. .pÍc!ídc sobÍc os carucac.cÉ noe6lalco.
dos tbletos à doe outror, é ê!6. hlato quc, nâ í.iomeoologls, totna gosslvcl r so§lo dc
incoísclentc". (G. LANÍÊR!).
35) Â Poslcão dc SIRÍRE é ÍevelrdoÍa 6ôbÍe êsse oonto, em Lcs Séques/,.és d'Altortd. gaçl
mostrr'como nr últlma orl.fltâçlo dêssc eutoi, 06 dldos soclológlco8 (cscolhr gç ^épg-cr'
quadÍo gcogÍóÍlco. Eltuaçtro cco,iômlcr do hcÍót) se comblnlm com r hl6tórla írmlllaÍ llat
do íundã, .s-^rarÍlÊ hto ac'redlta nr loucu.a dc conta6, FR^NTZ nlo catá 8en[o com
- aÍlnal
má-Íé. êie 9c cu.a.á,.. país mor.er. Fcllzmcíte, §^RIRE no§ dlz multo mals §ôbre r loücuíl
do quc 6ôbrc rt coodlç6c! crt.ílorca do d.!flr'
36) Cí. nossa c.ltlca da ob., "Erlsaeace" publlcada Eob s dlÍ€çf,o de R. ltl^Y c H. ELLeN-
8F-RC€R cÍr l,'Êvolution Psychialúque, lgí9.
3E
VI. Á. RENOVAçÂO DA PSICOPÂTOI-OGIÂ, §EUS TIMITES
34
e leenvial' coustantemente a um e a outro a Prática e a conceitualização.
Poucas clisciplinas acham-se dianre de senrelhantes exigências. Até então
a psiquiatria tinha hesitado encre um naturalismo atrás do qual se abri-
gava a fraqueza de seu poder (uma lesão cerebral jamais se repara
salvam-se apenas os restos) e um espirittralismo ingênuo, incapaz de dar
-
conta da riqueza da vida psíquica, levantando banalidades biográficas em
vez de tatôres decisivos, sem preocupação de dar uma espessura às relações
cla existêncía humana e <la patología mental.
É signiticativo que a correnre do pensamento de inspiração fenome-
nológica que tem tentado revalorizar a srrbjetividade na alienação, enr
riltinra análíse não pôde senão cobrir.se do ridículo, no plano da gênese
rla doença, de um organicismo simplista e ultrapassado.
Estas são as principais tendências que se enconcrarão na psiquiatria
psicopatológica contemporânea, reagrupadas entre um rerrovado organi-
cisrno e uma recorrência à fenomenologia. A originalidade da psicopato
logia clínrca francesa é de se ter alçado a uma posição genetica, na qual
ocupa lugar preponderante um conceito emprestado da psicanálise: o da
regressão. Êsse conceito, aqui entendido essencialmente como uma desor-
ganiza$o da vida psíquica, compreende a manifestação mórbida coruo
uÍna lsaparição dos modos arcáicoo de comportamento € de p€nsamento,
cuja superação é concluída no individuo normal, mas que ressurgem oos
estadoo de alienação sob a influência dos fatôres patogênicos. Quaisquer
que sejam as críticas que não se pode deixar de dirigir a €ssa utilizaÉo
redutiva de um conceito psicanalítico - que está no seu contexto de
maneira mais complexa - pode-se considerar como um proveito para a
psiquiatria clássica o tato de adotar um sistema de reÍerências que instala
os fattrres históricos individuais no primeiro plano.
Com efeito, a dimensão histórica é essencial para o psiquiatra diant€
do paciente. Em primeiro lugar colocanr-se sempre estas questões: "Como
êle chegou até aqui?", "No que êle se vai tornar?" e "Que papel vou re-
presentar nesse [uturo?".
Sabe-se que depois de 1936, vinculando-se à uma aplicação dm priu-
cípios de JecxsoN, Hrnnr Ev é o autor de uma teoria chamada órgano-
dinâmica da doença mental. Seu mérito é, desde que êle se pôs a escrever
A Htslthia Natwal do Loucura, o de englobar enl uma concepção exten-
siva tanto as relações do normal e do patológico, como a relação das di-
versas [otmas patológícas entre si. A concepção jacksoniana da atividade
psíquica supõe uma sucessão de níveis, cacla urn cobrindo o que o precede
até o cinro [inal.e? Desde então, adivinhar.se.á que o inconsciente será
visto conro instância dominada vitoríosamente pela consciência. "O que
não é ;rercebido pela consciêncía é aqtrilo do gual a consciência se afasta
e o Ego nõo quer." Corolàriamente, Hrxnr E,v recusa a opacidade
ii7 ) É lslto lcmbrâ, ás outíâs íoot€s ilo peflsamento de HENet Ey. São aquclâs dê E. BLEULER
c sobíetudo de PtExRE ,ÁNET. Mas no Ílnal da .lâhoÍacão de sua obÍa HENRT Ey tende a
lomar algume dl6tâncla c reláção aos seus pí.dcccssoreg que €1. íio {biuÍs de
modo ílgum. Mos o ó.gano-dlnamt§ta de l96t hâo é o de 1936.' -
,5
(lo incons(iente. É na organizeliio (lo (anrpo tla ronsciôncia, controlatl:r
ltlo Ego consciente que se sitrra o po»to tle encontlo cntrc conscientc
c inconscicnte. O inconsciente só invade a consciôn(ia l)ala triünÍar muito
e[êmerantente sob a lorma do sonho, da lantasia, etc. Entretanto, é nc-
cessário pcrÍnallecer na ordem e ôsses Inlimos sonhos apenas conÍirmarn
nrelhor o im;Ério do Ego sôbre ôle-pró;;rio. Só a rloença pelmite que sc
l)erceba 6 inconsciente que não se levela na existência humana. Por êssc
»rotivo, a l)sicopatologia seria o caminho real qrre leva ao ilrcorts<ientc,
nessa "quecla vertical no imaginár'io".3s
Hurnr [,v será lel'ado a distinguir na exl eriência psiquiátlir:a: l) as
desestrutu raçõcs da consciência,3e clominio rlas psicoses agudas ou rl:rs
"curtas loucutns"; 2) a rla Alicrração e Alteração rla personalitlatle, do-
mlnio das psicoses crônicas ou tlas "vesanias". O primeiro domínio cotr-
preentle sàrnente o caml)o tle experiência; o segrrntlo a esfera tlos valôres
- não lcnlranros rnêrlo rla;ralavra - da Razlro onrle o Ego não (: mlris
sômente "srrjcito rlo corr hecimerr to", mas o "artesão <le seu rnuntlo". Assirrr,
na rida nornral o ser colrscicntc "contém" serr incorrsciente e "a soberanirr
do sel tnconscientc no reirro tla psicopatologia cor respontle à soberaniu
tlo ser corrscierrte no reino rla existência normal." [,ncontra-se, percebe.se
aqui, o princípio rlc rrrna organização ntestra, rla qual se poderia rlizer
tlue a crtstência ó o sinal rnais seguro de serr tliunfo. A ontologiu lxrr;r
l{Elnt l.lv não é acessivel :t n:to ser atrar,és tle trma ontogênese, e lt:-to
.temos rc( eio enr encontrâr ar;rri o que antes (lisscmos tla integraçiro.
Portanto, exrste um r:onllito cm Hriwr Ey, mas seriamos tent (los :r
(uzer que os oretes estão manrhados. Pois, qrre cornbate é ôsse etu tlrru
o vencedôl é sempre ronheci«lo tle antemão? Nenhum fato, nenhunlil
teoria ;rcrlrritern estabelecer rrnr tritério entre saritle e doença, norrnal i
l)âtológico. No entanto, HnNnr l.lv se deróm nessa tlistinção mais tlo qrrr:
cm trtrlo o rnais. Alinal, isso jrrstil'icaria urn vertladeiro imperialismo rl,r
saúdc, c arlui estariamos <liante tle uma tlessas fôt ças da lei do r oração,
miragcrn rle unra singularitlarle que proclama seu tlesejo couro Suulo llclll
universal. Alénr <lisso consciência e razão sãt> i nt or rtrPtlt,eis. É Precirr-r
que o col'l)o esteja (loeDte l):rra que a alln:r scja ufetarla, rnas sônleDtc
secuntli'r riamerr te. Se a esfera do cleseio tem algrrm valol nas expressões tlrr
loucura, é na medida em qlle suas lunções corpolais estão {eri(lâs.
O Ser c Um em Htrn [.r', sobelano jnverrcitlo, legitimado l)ol sclr
império. Senhor de si-rncsnro como tlo rrrrivcrso, as fôrças tla rroirc, or
desmaios «la experiência, a srts;rensão cle serr ;rotler' por algtrma lalrcirrarrte
(luestão, rr;r<la tlisso altera ;-»r'o[tr rrrlanlente () lrrovirlcnto tle rrnra virllr crl
cxpansiro. .l>ortanto, a rloença é trma qrretla.
38) Parí llt]lll Er, devê ser êÍlendldo: le "Qx€ o sÊr i,rconsci€nlc não podê sc tr!r'lír rflr
rcla(âo à alualldade do campo da coísciêÍcia senâo conlo "aconl.clnrênlo" (li, aonstiônaid
dastslrututodo révelándo-sa conro lDÍrllcado na ordÊrh G íos graus da consciêrrcií. 2r QI.'
o 3cÍ líconsclêíle nâo podc se r€vclaÍ ,clativanlÊnle flo srÍ coísclcnle quê constilni Â
pcssoí no sêtl sistemo dc diatétlcn de lÍaíscêndênciâ Írâra o OutÍo, senâo conru olianotiD,
ou ao mêDos allercCôo do ERo."
:tg) Cl, suí obÍa íundamental liludtls Pst'.hiottiqües, t. lll: Slr ttüíe lcs P§)'rroses oigxi's
el DétltltIttolton de lo (ons.icnce (1951).
36
Pr'óxiuros <lêle, orrtros admitem trma divis;io nrais 1>roÍunda na psiquê,
corno f'or-r.rN. É num clcsvio entre o Ego e o Eu que Forrrw, tentando en.
( ontrar-se com Sentnr, deixará aparecer o inconsciente. C) Eu se cumpre
t7
T
38
aspecto. Os dois perlis que aqui são propostos são o fruto de o-rientações
qde não é suticiente reconhe-cer coúo divergentes, mas descobrir sôbre
que princÍpios ditêrentes repousam.
- Poderia acontecer que ie tenha ficado num dêsses casos Particulares
em que concepção histórica c concepção estrutural opõem-se e
completam-se.
bepois da análise do (Pequeno Hans) - a primeira criança que foi
anatisada e tratada com suceiso - depois sobrctuclo que, reP€tindo a
afirmação da Ciéncia dos Sonhos, Fnruo proclama no L'Homme aux
Raús: '0 inconsciente é o intantil em nós" - é progressivamente indivi'
dualizada uma tendência da psicanálíse genética fundando, após as ilu'
nrinações de MÉu.rNle Klux,-a e§Perança de que um conhecimento da
crian(a pela psicanátise poderia lévar a um aprofundamento e a uma
renovâçãà da-teoria Íreuãiana. Entre as diversas orientações essenciais
indica«las por Fneuo, um campo se oferecia mais favorável do que os
outros, às novas pesquisas. O academicismo da psicologia clássica no estudo
<Ia criança deixava ã prospecção quase virgem. AIém do mais, resultados
terapêuticos [avoráveis podiam ser esperados. mais fàcilmente, a ação ana'
lÍticà apoiando-se num psiquismo úenos fixado em s€us mecanismos e
impulsrónado por uma tendência espontânea à mudança.
"Todos os psicanalístas Pensam, dizem LÉaovtcr e DTATKINE, que §eu
trabatho é o dê tibertar o ihdivíduo das opressões ligadas aos seus pri'
meiros movimentos instintivos no organismo Prematuro e das conseqüên'
clas não lrquidadas dêsses indlcios. .." Êsse ponto de vista é justific-ado
-o grande revelação foi mostrar em plena
pela clescoberta freudiana, cuja
ãlari<tade em que a criança é liai do adulto. Por outro lado, seguinclo
o curso de umã evolução êom os-instrumentos de conhecimento da psica'
nálise, o desenvolviminto traçado em suas figuras sucessivas, pode levar'
nos à uma apreenúo mais precisa dos avatares do comportamento adulto.
Várias conseQüências decoriem dessa tomada de posição: a primeira, coro-
lárío lógico àa citação acima, obriga a uma intêrpretação cada vez mais
biologizànte dos tatos. Fazer remontar às origens - e onde _começam a§
origens? - as matrizes do comportamento, leva a dar_ à organização corpo'
ral-um papel cada vez mais pregnante. Não se Pode dizer, no entanto,
que se iirtioduz aqui um ponto de vista radicalmente diferente _daquôle
<jue Fnruo sustentà em Álém clo princípio de prazer: "É verdade que a
biologia é o domÍnio das possibilidades indefinidas, uma ciência da qual
temos o direito de esperar as explica@es mais espantosas sem que Possà-
mos prever as respostas que ela poderá dar, em algumas clezenas de anos,
às questões que iol<rcamos, Essas respostas serão talvez de tal modo es'
pantosas que todo o nosso edifÍcio arÍificial de hipdrteses poderá ruir como
üm castelô de cartas"..r Mas talvez seja necessário lembrar aqui gue as
viúes naturalistas de Fnr:uo são muito rnais vistas Por uma otdem mcta'
lti<ttógica - não como domÍnio acima da biologia, ttras como a metapsico-
39
logia em relação à psicologia - canpo de interpretação ou de interrogação
através do sentido e tla estrutura dos fenômenos vivos. Falsa modéstia
então, ou precaução oratóÍia? Nem uma e nem outrâ coisa, mas como um
vai€-vem incessante entre uma organização corporal da qual é preciso
parlir nos dois sentidos do têrmo: a pulsão está na encruzilhada do somás
tico e do pslquico - e um acesso ao senrido ao qual é preciso cÀegar.
Isto porque o campo psicanalítico não pertence nem à biologia, nem ;i
psicologia, nem mesmo à filosoÍia, seja ela fenomenológica. rz
De qualquer forma, os psicanalistas genéticos pensam que a cami-
nhada histórico.genética é a que assegura a melhor reritlão ao pensamelr-
to psicanalitico. Na sua visão, êles retraçam 4 trajetória dêsse percurso
desde as primeiras lorrnas da vida - inteiramente sob a dependôncia
vilal e humana da mãe até o perlodo essencial do complexo de Édipo
Iase "nuclear" segundo a expressão de Fnruo das neuroses, como da con.
dição humana. Âssim, as pulsôes derivariam das neressi«latles fundamerr.
tais, condicionamento, biológico inicial que elas ultrapassam, por estarern,
l)or outro lado distanciadas, pelas invcstigações uheriores, de uma elabc>
ração cujo momento capital é a internalização. Se essa passagem não se
eletua, a criança não estando em condições de levar adiante o processo
I;cla tÍansmutação dessas direções, o Ego permanece prisioneiro dos tc-
nrores jniciais que ameaçam sua integridade e interditam tôda separação
coeÍenre enrre o lantástico e o real, o Ego e o mundo exrerior. Nessa vi-
sâo, os "srntomas", as lantasias, os jogos da criança são momentos nega-
tivos que permitem a estruturação das angústias primirivas e desempe-
nham um papel de maruraÉo.
O procedimento que inicialmcnte se es{orçava por encontrar uma vc-
tiÍicação das hipóteses psicanallticas pela observasão do compoÍtamento
<la criança, na origem tinha por objetivo mosrrar que a psicânálise não
consaruía gratuitamente um mundo de fantasmas dos psicanalistas que
em seguida o atribuiram aos pacientes. Até que essâ inrenção ilustradora
acabou por devorar a própria psicanálise. Com efeito, ao lim de um certo
tempo, a única coisa que se lazia era empenhar-se no mais minucioso e
no mais completo posslvel do desenvolvimento infantil, cujo inventário
lornecia o decalque do desenvolvimento pslquico, assim compreendido no
seu movimento evolutivo. Na mesma ocasião, podia-se pensaÍ que a obser-
vação das distorçôes precoces lorneceria uma base úlida para as concep-
ções patogênicas psicanalÍticas. Ora, era aí que se encontrava, na Íâlta
de uma precisão iusuficiente dos conceitos, fora dos eixos de referência
Íreudianos cujo objetivo não ó dar conta da totalidade do desenvolvimen-
to, mas precisamente do domínio do inconsciente. Por seu lado, o doml-
nto do inconsciente não se conlunde com a totalidade da experiência pas-
sada; êle só se aclara a si próprio através das categorias que definem as
pulsões da vida e da morte, a libido objetal e narcisista, os princlpios de
pra.jzeÍ e de. realidatle, os processos primários e secundários, etc. Essas ca-
4A
tetoÍias não são apreensíveis do ângulo de unr emPirismo Pragmático,
como realidades concretas, mas como sistema de referências P€rmltlndo
uma certa leitura dos fatos, de outro modo incompreensíveis.
A noaso ver, englobar a psicanálíse numa corrente de. psicologia-genc'
trca é perder-se. A fsicologia çnética não completa a psicanálise, ela en'
traqueie a acuidadê, a sensibiticlade, a justeza ilêsse instrumento; ela não
o..eicent" nada à compreensão dos fatoi colocados em dia P€lo Íreu{t1no:
ela confunde os registios. Enfím, ela não alarga a concepSo psicanalíotica
tlo homem, expõc-"na à venda e, singularmente, pela reduSo que realiza
cla noção de contlito. rr
É'preciso não se equivocar sôbre a maneira pela qual os P'sicanalistas
ge nétic'os encaram as rôlações entre a histór.ia do sujeico e o conhecimen'
io gue êste traz cle si-meimo Para a experiência psicanalítica' Ircnç de
acri'ditar que é o gue se apreênde no ôurso de uma.cura que dá conta
tto que toio vivido de outrora, os psicanalistas genéticos põem em gues'
16s'o valor reconstrutivo do passado tal como êle aparece no relato do
recalcado. Desde então, de algúma maneira uma ciúo se estabelece entre a
concepção do desenvolvimenio na sua Parúa progressiva, podendose
-sc'-
guir á iua curva, e o passado "subsumido" através do filtro da legressão.
..fern-.e
então, na medida em que o objeto principal da pesquisa será.o
estudo do desenvolvimento, a obrigaÉo de reinscrever a signiticação hts'
tórica do inconscíente numa perspeétiva que o ultrapassa e que apela pata
no@es marginais em relação à psicanálise. Por outro lado, se a regressão
é i chave, ia medida em que através dela se avalia o discurso analltlco,
a causa da própria regressão PeÍmanece muito hipotética e a exP-lica@o
que dá contã déla corrê o riscõ cle fazer a cama Para uma concepção conr
tàndência organicista, o que nc faria voltar de nôvo ao jactsonismo. que
acabamos de-criticar. Mais gravemente ainda, o recurso muico fácil à re-
-noção
gressão é soUdário de uma corretativa progresúo, portanto de
-de
ãcabamento, da qual o analistà teria o segrêdo. Um-segrêdo cuja vanta'
genr certa para êlé é a de situáJo de súbito no empÍrico onde espera-qu.e
ó pacienrc'o encontre. A crença numa orco{íênese nonnativa tem soÍrido
êrítica de uma psicanálise seilindo aos valôres conÍormistas do meio so'
" onde ela se exerce.
cial
Qualquer que seja a noção de história, ela é altame-nte. valorizada pela
pslcaniátise genética {ue se iropõe, essencialmente, a elucidar as via§ Pe-
ias quais palssa a conicru$o do sujeito normal e Partindo.do -pato(gico
Em àetiniiivo, ela é obrigada a seivir-se de um apoio teórico fora da ep
periência psicanalítica, talendo intervir fatÔres eiteriores a ela - estudos
iongitudinais, observação direta, etc. - Para daÍ completar a docusren'
tacío; do mesmo modà como ela voltará ieu interêsse para todos os fat&
res destrutivos, deformando a visão histórica, recorrendo freqüentemente
ao pêso "real" de certas situações humanas cuja ação exterior ao sujeito
rmfrime sua marca sôbre êle Por uma ação de impacto direto.
a1)
'-' Cí_ os trâbâlho6 dc H^RTttANN. KRIS C LOEWENSÍE|N hoi. laígamclrtc ultrâFâErldo6 poÍ
tOOas s8 pslcoloSlrs do Ego, com o rêlo do "Íunclonlll6ttto" '
4l
cvitlenre que a cx;xriência psicanalirica é Írrntladora de unr:.t
- Pargcc
relação histórica do sujeito ao desconhetitlo, absolutanrentc original, que
não a confunde nem coÍl a história
- no senrido de acunrulaçãõ de faios
verdadeiros da evolução da personalidatle
-, nem .on, umí tócnica clc
promoção que poria fim a noção de repctição, irrettrr rlvel rnen re central,
rrnindo no colóquio translerencial o paisivó e o passado.
. u. lãntasma do qual o honrenr dificihncnre escapa de se reconsti-
ruir Iintegralmente - ourrora panir rle ;reças e tle 1>edaços, com o pensa_
!
mento atomlstico - hoje desde o nada (nóanr) tle- a,tes clo nascirirento,
a partil de nada. (rien). Êsse apârente sinal de modéstia dos que pesqu.i-
sam sôbre a hrrnrana não- acelerará, por seu lado, umi idôologia:
^condição
mais hegenrfinica do sujcito lazentlo.se a si pióprio? Talvez Fnruo teihe
sentido.isto, quan_do, conrra os cirurgiões amigor de serrs tlisclpulos, contr..l
as opiniões cientíÍicas de seu tempo, êle rletenãeu a exisrência-de eequemas
inatos. heretli tários, organizadores., não rle alguns rraçns psicológicos, mas
de onde se clistinguem os constituinres do desejo humaito:'a cena-primitiv;r
e o coito, apêlo inc-estuoso,. a impulsão pará a rnortc pater.na, ã ameaça
_o
de castração. O que êle quer.ia qué prevalecesse aos ,rorros olhos contra'a
verdade elêmera rlos latos cientlticos era, antes de tudo, um estatuto tle
humanidade desde às origens. Se é inrposslvel ,,verificar', isso, ao menos
plocuremos nos rolnat. Íeceprivos à essa exigência de uma delinição prô-
priamerrte humana desde os primeiros balbúios da criança. .. Aqúi, Iirrs.
SERL podc vir em socorro de Fnru» contl.a cssa sedução tle objeiividatte
cnacionisra. "No que concerne à origem psicológica áa reprcseirração r.lo
espaço, do tenrpo,. da coisa, nem a física ô nem ã psicologia têm aiguma
coisa a dizer, ainda menos um psicólogo indutivo'que, eiperinrent;l ou
não exprimental, pernranece no exteriôr dos Íenômênos. t'rata-se al, ex-
clusivamente, cle problemus da constituição intencional dos fenôm,enos,'. ,..
 seqüência humana de tlescnvolvimento não se especifica pelo caminho
que ela Pelcorre desdc as suas origens, mas pela qúalificaçãã original dc
s-Âu mover histórico. É ;rorisso que a história dô deseniolvime-nto enl
Fnr-uo é utrr lesouro precioso qrre possrri
cnçoes geu(.ltcas êsse dom.
- (:om excltrsío tlas outras tles-
-
O eslrír'ito no qual Llprercsr e Lr«:L,rrtt abortlararn a qrrestão nre-
recelra, ao nrenos em pat.rc, o qualificativo de estrururel. Se, com efeito,
sem recorrer totalmente a ô:sses preclicados (le FRriLr,
tle relutal I)orque a rroção.de "esquenras ilratos" nos - que se trata rnenos
tho<;a, do que (le
compreender...porque sua elinrinação leva-nos a perturbaclores impaisses
toma-se por lirme base de partida que a linguagãm é o nosso maii seguro -
2cesso ao inconsciente. Isto porque o inconsiienie sdr sc Ievela verdadãira-
mentc nas condi@es da expriência psicanalitita e esra não pode se apoíar
41)
f"ir.,o;trli: ftlt?8: r' Hv0pollltê em seú comcntáÍlo sôbre a "\'.,ncinirns" t.o P»'.ho'
15)
'
50 ilidilottoa çütésleaoc.
^o
em outra coisa seuão no que o Paciente cliz.{0 A cstltltura tlo itrconscietr'
te passa, portalrto - e nãô podê passar [ora dela - Pelo camPo da fala.
As condiçõcs clessa revelação, segtrndo L,tpr,nNcnt e Ltctltnr, mos'
tranr a ínanidacle clc uma concepção ligando a letra ao sentido imanente,
as tacunas do dis<rtrso conscienic abrindo as vias dc trma penettação do
senti(lo pela articulação de suas cadeias associativas. Estas cadeias abrem
a possibilidade dc uma interpretação do scntido_ mais_ do que de uma
coinpreensão dêle. O estudo das sucessivas tentativas do espírito é reve'
lado pelo agenciamento de seus elementos- Êsse ponto de vista ainda tetn
a varitagem de manter num mesmo nível de realidade o consciente e o
r nconsciente.
O êxito de LlpráNcns e LscLltRE é o cle tcr- rnostraclo <1ue aqúlo
que parece pertencer prôpriamente à atividade conscientetrétousciente cla
lingüagem - é, não sômênte a mais guatificada pata aclarar a atividade
-incónscien
do te, mas por outro lado, só se aclara a si pr<ipria através dêle.
As tormas lingüísticas cla metáfora e da metonímia reenviam de ma-
neira correspondente aos mecanismos descritos por Fnruo como condetr'
sação e deslõcamento, no sonho. Tornando a petcorret'o caminho da pul-
são "energia orgânica", do desejo "princípio ativo dos Processot incons-
ciente", déscobre-se com Lepr,.rNcns e LBôLArnB qtle, se o inconsciente é
estruturado como uma línguagem, fórmula que LecrN soube extrair do
tesouro Íreudiano, é precisamênte o inconscíente, a cadeia in<:onsciente,
que permite [undar a linguagem. Pois, o inconsciente po_t'ser esttuturado
como uma linguagem não é a linguagem, e é isso o que Lerr-errcxt: e Ln'
«:L,$ne terão o cuidado de desenvolver. Se encontranros, ao rtír'el do pro'
cesso primário, as figuras da metáfora e da metonímia, o regime de quc
depende seu tuncionamento, o da energia pulsional indiÍerenciacla, nc'
crslsita de um Íundamento para "fixar" a cônstrução da significação in'
<;onsciente. É o papel do retalque. Aqui estamos diante cle uma hetcro
gcrreidacle qualitativa dos processos inconscientes, de resto conro o pro'
ilama a teoria [rcudiana no postulado de recalque de tipos <lifcrentes:
originário e secutrclário. Antes dessa intervenção originár'ia leina o imagi-
nár1o puro. Antes da imagem, (significante do inraginário) o .itn:rgo'? 9ue
não "reenvia a ncnhttm otrtro a não ser a sí próprio" - identitla<te do sig'
ni[icante e do sígníticado.. . cabeça de medusa da energia pulsional,."no
estado puro, não especiticado". É'nesse momento que intervóm os sigai-
[tcantes-chaves, que nos [azenr reencontrar aguilo que atrás dizíamos drrs
csquernas que Í'nruo.chamor de inatos, mas.que se poderia designar conro
or'íginais: cerra primitiva, incesto e parricíüô que, <le redução em redu-
çãol poclerianr chegar, com eÍ'eito, aô que LlclN chama a metáfora pa'
a6) Nlo se diz 6ccuítole[tc... maE o quc êle nlo dlz nio slgfllÍlca senão ctrr ÍelaçIo oo
oui êie dlz - r-lo mesmo modo qu. á manclra oclr qual alc o dl!, lrmbéÍrl nlo §e com-
o'rccndc senão no conÍronto com o que êle 5e devc dlzcr
411 be mcsmc ÍoÍma og orlglnal Íí8ncê5.'O imsgo é o p,otótlpo iíconsclcntc dc pcítonagtnl'À
ouc oÍlcnta Glêtlvancnt.-a manclra pclt qual o Eulclto apíeende oulÍe[r: ê claDoraÚo
(rttllllar.
àiitti'aiJ primetris Íelrções tntcÍ-§utictlva: Íeois e'írntasmátlcas com o clrculo
(Nota do TradutoÍ)
43
teÍnal, signilic ntes "aos quais, poÍ sua fôrça parricular, é clevolvirla I
pÍopriedade de colocar em ordem rodo o sistemã da linguagenr humana',
(L^rL^NcHE e Lrcretnr). Fora da inrervenção dêsses sifnilicantescharcs,
no. pleno reino do inconsciente, o sentido e o não-seniido (abertura a
todo6 os senridos) são consub,stancializados. Enfim, o mito (lo nascimenro
tlo inconsciente "rcsuhado da coptuta da energia pulsional nos rêdes do
stgntlicanlc do mesmo moclo que o signihcanre é tlestinarlo à ocultar :r
abertura r8 Íundamental do ser, assegurando sem interrupção a nreronímia
do desejo".
_ Â substituição de um significante por um oun.o, na metlida em quc
não se conlunde com a supressão do elemento substituft.lo, especiÍicá a
originalidade dos processos psiquicos tlescobertos pela psicanáliÂe. prosse-
guintlo sua fomenração, êle continua a manifestai suC existência, a dis-
correr, o recalque sendo operado. Mas se se pode dizer, com Lrpr,rtcHr,,
que o discrrrso do incoDsciente é pessoa scm ser na primeira pessoa, S.n :l
virá precisar que _êsse dircurso_porle não scr nem nrais na ieguntla pell
soa, nem na-terceira pessoa. "Trata-se, na realidadc, de lrm:r pessoa ãm-
bigua, intratluzivel, senão, sequntlo o contextq em unla ,r, otrtra das trêy
Pes§oas granlaticais".. "A pessoa quc sc exl)rime na pcssoa tlo Ego expri.
me.se em pessoa conjugatla com o verbc ser no seu póto sujeito-e com o
verbo ter no seu pólo objeto".
. A construção mítica clc um sisrema tle sinajs que rerrniria, por üit
direta, o signilicante ao signiíicatlo, é i»comparível únr,r com o pônro tle
vista liDgüIstico quanro com o ponro de vista psicanalítico. Catlâ signiÍL
cante só.pode reenviar à toralidade dos signiliiados; sômenre o reca-lque
lixa as signilicações privilegiadas, elas próprias susrenladas pela metáÍôra
paternal consrirurivâ do inconscienre. Dôis ;íveis de sinrbolizáção opõem-sc
e se completam na..interdependência. O nivel em que a diferenciaçâo entre
l im3gens e as.pala-vras é conlundida e aquêle e que ela é distinguida.
O primeiro será o do processo primário; ó ourro dó processo ,ecrãdário
na junção tlos quais se opera o recalque originário. Voharemos mais
-
tarde, em detalhe, sôbre os problemas que permánecem cnr suspenso, ape-
sar dessa tcorização aclaradora. No momenrô, limiramonos a leiantáJos'.
A perspectiva estrutural tle Leprelcnr e Lrcuunn só dá conta do
representanre pulsional como expressão tla pulsão, e deixa na mais com-
pleta obscuridade o destino da cãrga aleriva tlo sujeito, da qual não diz
nada. Ora, são as transtormações qúe a calga afetivâ sotre que dão cotta
através da identidade tlos conteúdbs orr rlos signilicantes, cl'a Íôrça prêsa
pelo retôrno do recalcado ro sob a forma da úgústia pura, tla Íaniasia,
d_o preságiq do traço de carárer. Â distinção insúficienie das represenra-
Ses de objetos e das representações de palàvras deixa imprecisa à relação
da imagem com a representação do objeto. O recalque que separa êsses
,tE) No orlglíâl liaÍtçês: .béaÍcc,,. (Nota do Tradutor)
1o) No orlSlnal: du. reíoúté.i cE alrmâo "WlGacrtcrí (ou Roclctr) dG! VcrdÍào8trn,,.
pclo quâl o! !tcm.ílo3 ,cca,codo3,
.B^_9-qÍo,cc!!9"ct-ouÍ jallats 3Gndo anutárJor geto rccãquc,
,f:lâíil:r c o cor!€gucrD de EanÊlra dÊíórmâda, rob ô ,orÍra dc'comproorÉro.
i.^lÍ,T a."
44
dois estatutos da representatividade imaginária, não permite compreendet'
sua diterença apenàs por sua ação. A eia anterior ao recalque não pode
vàlidamente ser assimilada ao Proce$o primário. A oposi@o Por Pares
contrastados que F*ruo usou enl "ls Pulsões e seu destino", mostra a exic-
tência de um- funcionamento qu€ já é simMlico, eficazmente simbólico,
análogo àquele
-êsse
gue a lingüÍstica e a antropologia descobriram por vias
diÍereátes, fúncionaménto estando presente para Enruo, na atividade
pulsional. A atividade pulsíonal, tal como a descreveu Irruu, implica seu
ênraizamento corporal. Não que o corpo se manifeste diretamente aÍ; mul
to ao contrário, êle se elaboia atravéi dela. Com a ptrlsão, FRs[Ío funda
um registro nôvo que instaura sua originalidade radical em rela@o à es'
Íêr'a colporal, mas à pulsão para o corpo continua empenhada no seu -tra-
balho, que é a obra da econõmia pulsional. As mutações que acompanham
a necessidade, o desejo, a demanda fundando categotias, Pr€servam umâ
comunicação entre elas, cuja função cabe à energética libirlinal. A cir-
culação do sentido não é separável da ação do ponto de vista econômico.
É êsse aspecto dos mecanismos de defesa que se aprecia a negatividade dl
atividade pulsional, tal como essa negatividade noc aparece atrás do eç
pelho da denegação. oo
Existe entre a esfera do corpo e a atividade pulsional o mesmo dervio
que existe entre a pulsão e suà representação. O trabalho "impi»to act
pslquico pela sucessão de sua ligação com o corPoral" de nôvo §€ €Írcolr'
iraha reiação entre a pulsão e-a'de[esa. É aqui que se abrem posihili'
'exploradas
dades não por Lurlxcnr e Lecurni, das oposições entre
culsão/detesa, pulúo (de vida) /pulsão (de morte) , defesa/defesa que
àaem sob a dependência do ponto de vista econÔmico. Desde então, não
é mais suficiente dizer que á pulsão não nos sendo conhecida a não er
através de seus "Vorstellúng-Réprâsentanz" (representante§-rePresentativos
ac quais se poderia talvez ilar ó termo de "delega@s"), só se pode.tratar'
com os seus emissários. Devemos, ainda que a contragôsto, examinar a
tundação do poder dessas delegações, julgar de sua qualificação executi-
va, isto é, a tôrça que lhe permite fazer balançar as coisas para êese ou
aquêle lado.
Continua poic, indispensável estudar as relações de fôrça.6r Essas re-
lações não podêm ser apreendidas fora da situação edipiana, a um teml»,
eampo de Íôrças e campo de s€ntido. Srsrx aclará-lG.ií com uma aná,lise
pcrtinente e atual na diferenciaÉo da estrutura edipiana, Pre§ente não
iàmentc nas situações humanas sociolôgicamente ntais misturadas àquelas
50) SeruÍrdo o DlclonÁrlo dc L^PLlNcHE G PoNÍALIS: "p.occdlmento pelo qual o 6ulclto, tottíu-
laido um de ciur dccelos, paísamcnto6 ou 6cntlmcnto! rté entlo íccalcadot, conthua ô
si céleãoeiceicJ, ncgaíroo iuc lhe 9eÍterçaG'. costucra'§€ e§cÍever também Dclncgr§Ío
(Nota do Tradutor)
ít ) S. o DslcâíÀllstâ d eoullc ouc 6c c!íorc, ooí tvlll.l o oodçr dt Í!lr, potquc
nlo é sômcatc
àiscooiiião-ã'iiinõ c'àiiu-iiráe oi uoirotloroe dar plltvíts; é taobém êlc srDc
ícçoíhaccÍ cm çaatoE- núclco6 do dlBcúlso um! lôrça, gm pêto, ugra clÍg! quc lrc lie
6ur eÍlcácla. Port!.rto. aerh Írcrsis rltu!çõGs orlglnllr c-mtl§ Glcmctltlrct qüc --l!clioÍ
§c rcvelarlrm ô'lôgo Gontradltó.to de§ âtlvldades pultloorl8 dlvcÍgentes, o trtDâlho oat
deÍesos, etç.
4í
:is <1uais l:nr:.u» deu rr:rscimento, mas tanrbém em tôdas as fases da infân-
cia humana e desde as origens o que, como vimos, foi por êle postulado
-
sob-a Íorma dessa presença da espécie manifestada nesses esquómas que
no frrndo s.ao o modêlo humano eiltccílico. porranro, como deier inelutá-
vel, temos qrre dar à genética aquilo que lhe é devido: o estutlo dos funu
damenlos do sentido e da mediação. A êsse respeito um estudo do tl.p_
renvolvin-rcnto da linguagem permanece essenciai. Mas não podemos Í1.
zêJo a não $er cofll um esplrito realista que explica a constr-ução de unr
edilitio pelo amontoamento de suas pedias, coirsiderando negiigenciávcl
esclarecer de ontle vieram os materiais ê sôbre que plano êle esú a-ssentado.
Assinr, a dinrensão genética encontra seu -veràadeiro senrido, e a rc-
corrência à energia pulsional não é mais rrm último reÍúgio clo inteligível,
Dem o. recuo para um ljmire do que-não po(lemos apreender. O comflexo
de Edipo produz sobrerutlo na itlade àe 4 a b anos. O que p.ecãde e
-se
derempenha rnegàvelmente um papel, não e o dominio de'umã relação
e.tritamenre binária, nem rambém que a era pré-verbal é aquela do iíre_
fÁvel. O pai
- ou melhor, a meráfóra paternà - está prese;te desde os
;rrimeiros instantes no que Jecqurs Lacer chama o âesejo da mãe _
deeejo do talos do qual a criança é o delegado (no senrid'o de delegar
poderes), abertura do próprio ser da criançá na percepção cle sua auün-
cra, acrescido por sua <lependência total à sua nutriz. Ulterionnente, no
moínento tla tomada de consciência clo casamento narcisista com o prô
prio corpo, a problemárica da- casrração constitui À prcsenço paternál e
bre*e principalmente. a
-problemárica do ser e do ter quã cúlmina no
a
4Íi
lÍtica empiricamente estabeleccrr na fórmula pouco feliz da Íôrça e fraquc-
za do Ego que não se confrrncle, evitlentemcnte, com uma visão volunta-
rista da subjetividade, mas visa a sitrrar a posição e os meios de seren,
postos Íora dêle por seu próprio dcsejo.
A prática depois de 1920, tornou os analistas vigilantes em relação à
lornralização do conflito edipiano e tlos aspectos patológicos que dêle se
tleduzem. As psicoses, muito recentemente aincla, escaparam à abordagem
psicanalítica. Em rrma carta à MenrB Boxrernrr, Fnrtrp escreveu: "Sabe-
mos que os mecarrismos da psicose não diÍcrcm, na sua essência, daqueles
das neuroses, mas não díspomos de quantidatlc str[iciente de energía para
ocasionar moditícações nesses mecanismos". () qrre ó assinalado na demar-
cação entre êsses doís grandes grupos de docnças "menores" e "maiores",
a clinica psicanalitica tem podido apÍeender de maneira muito mais pre-
cisa. O número de pessoas submetidas à análisc - não seria por causa do
crescimento do número <le terapeutas? - alargou o campo das indicagões
primitivas e contev€ em seu interior muitos estados aÍastando-se das for-
mas neuróticas claramente estruturadas que serviram de base às descri-
ções treudianas.
tr Aqui se abre ao conhecimento prático um domÍnio à
exploraçãO ao qrral se é levado não paÍa descobrir outra$ forÍnas diferen-
tes daquelas do conflito edipiano, mas tipos de ordenação desa estrutura
que, na cura, enfrentam diÍiculdades consideráveis. O que acarretou o in-
terêsse pelas modalidades de bloqueio dêsses pacientes, pela economia de
seu modo de trocas em relação ao outÍo ou Íace à face com êles mesmos.
É isso que explica o adiantamento do estudo do Ego feito por Nlorr,
com tantos outros, e o conceito de relação do objeto, tal como o via M.
Bowrr. Que nessa ocasião certos desvios se tenham introduzido na cotr.
cepção da teoria e da técnica - se isso é verdadeiro - não se justiÍicatiam
senão Íace ao cuidado de rrma economia e de uma estratégia geral do ana-
lista, correlativa àquela do herdeiro do netrrótico de outros tempos nessas
situações novas ou rebeldes das cenas de hojc. Antes de tudo, seria neccsr-
sário Íazer face a essa pergunta
- o ofício de terapeuta §. permanecendo
a justittcação essencial do psicanalista, dispensa-o de submeter-se à criti-
cas de ordem teóríca e decidir correções posteriores?
Uma explicação vem também ao espirito, quando se corrsidera a orierr-
tação :usumida clepoís de I920 pelos psicanalistas. Tudo se passa como s(:
os sucessores «le FnRuo não tivessem encontrí(lo nada a dizer de nôvo, a
ttão ser sôbre cssa "constituição intencional" que o pai <la teoria impul.
sionou até um pon to diÍicil de trltrapassar.
A tcoria freudiana oferece à exegese unra fonte de maneira alguma:
esgotada pelos estudos que pÍovocou. A distância que FREUD guarda em
relação aos fatos, permitiu-lhc uma formtrlação que ainda dá lugar à re-
47
Ílexío em nossos dias. É de se ver como certos filósofos lerlescobrem-rro
hoje, quando já o teriam lido há 30 anos. No movimento psicanallúco
tudo se passa como se se tivessem apalado as arestas e sc cstivesse saüis-
leito com o sentido mais curro que emerge fàcilmente tla leitura. Temrse
preferido fazer [igura de inovador, negligenciando o aspecto clinâmico -
como se tudo tivesse sido dito nesse dominio - e valorizando em excesso
pontos de vista em parte exteriores à psicanálise, que se aproximam às
vêzes, perigosamente, de concepções às quais, no ponto rle partida, esta-
vanr claramente demarcadas: psicologia acatlômica, psicologia r'la forma,
Ienomenologia, etc. O papel do inconscicnte foi progressivamente esqlle-
cido. Chegou-se à beira da culpabilidade, do masoquismo, por medidas
gÍatificantes, e a densidade do drama edipiano, em suâs Íormas tliversas,
se apagava por trás de uma extensão abusiva do recurso à noção de mt,-
canrsmo de delesa, recobrindo-se semple'uns aos outros c Íazendo, inegà-
velmente, pensar no jôgo da boneca russa, no qual se descobre sempre
um modêlo mais reduzrdo no interior daquele que apaÍece, êle 1>róprio
retirado do precedente.
O signilicado da obra de J. L,rc,rx é o de ter tentado restabelecer;
cenos aspectos fundamentais do freudismo revelando sua antropologia im-
pllcita. Devle as origens de sua obra,66 êle tentorr contestar resolutam€rr.
te as interpretações pós-freudianas que considerava como errôneas, mos-
trando que rrnra coerência maior podia ser Íetirada dos textos de FreuD.
Soube indicar as estreitas ligações que unem o pensamento de HrcrL.:r<r
de Fxrup. Ocupou.se na distinção do real e do imaginário e do simbólico
peÍa mostrar como a investigação anallrica Íetira seu preço não da des-
cober la de um imaginário profuso e difuso onde "todos os gatos são
pardoô", mas do aclaramento de uma articulação que só enconrra seu col-
rcspondente nas leis de uma estruturâ. Enfim, contestando as visões bio-
lógicas, êle dá a prioridade ao desejo radicalmente diferente da necessi.
tlade que é de ordem natural, desejo situandose sempÍe além e aquénr
tle uma pergunta. Iso explica que a gratificação e a satisfação não são,
J)or assim dizer, jamais alcançadas, abrindo-se sempre para a "aberlurir"
tle rrma ausência jamais preenchida, pré-Íiguração e cenário da castlação.
0 Etlipo não é ünicamente essa confusão de puls6es de amor e tle ódio
(é cletivamente isso, mas não ünicamente) , é ainda uma ;rroblemárica d,r
scÍ e o do ter.00 A neurose não é sômente levês, fraqueza; é a resposra ,)
rma questão que deve ser encontrada pela psicanálise.
tnlim, c sobretudo, a tese essencial de Llc,*.r que põe acima de rôtla
preot-upação o estudo da relação do sujeito ao significante, abre um cam-
1ro rle pesquisas considerável, sobretudo quando revela que o sinal dessa
rclaçio - pertencendo irredutlvelmente à concepção psicanalítica e cs.
55) As lnteÍvencôes lrosslonáls, porco comÍrrtlvêls com as ÍegÍas da discussão clcntiÍica, dlantÊ
dc aítlgos colÊg-âs qre üma clsáo s.paÍou dêle, caú§âm 8íâvcs pÍelúlros à9 lêse9 dêsse
aulor. Cooludo;;poÍ' êsse motlvo íão 6c podcrla tecusat â dlscutiÍ Â validadc e â lccundl-
dadê de sGÍs lÍâbrlhos. ÊlG! rrpicscntanr, scm dúvlda, rmâ cortÍlbul§lo caplral à pslca-
oálbc contcnrporlnea.
56) EnlÍcvlslâ po, FRIUD, mas ncglltCnclai,lô por sclls sDccs§oÍe§.
48
senclalrnente dllerente de tôda outÍa - não é a união, mas a cisão, conl
ceclerrcto de uôvo à castração a grande impottância que Fneuo lhe atribuiu'
Quanto à nós, não vemos, a menos que uma cegueira específica nos
atinjil nesse ponto, jncompatibilidade raclical cntre essas diversas pers-
pectivas. Não é tanto para estabelecer uma tueditação à qualquet preço'
iro descjo de harmonia universal que êsse (asamento não nos Parece nem
escandaloso nem impossível, mas sômente porque a verdacle freudiana
une indissolüvelmentê êsses dois aspectos na sua coet'ência metapsicológica.
Retomando a deÍinição tripartida de Fnr:uo, somos levados a dizer
<1uc sc Lodos os psicanalistas estão abertos à esftuhfia rcntradiaoria do
sêntitlo (ponto dê vista <linârnico), alguns são levados à valorizar parti-
cutarmenre sva ropologia lutdamcntal (ponto de vista tópico), enquanto
outros pensatam achar a solução de seus problemas terapêuticos no estudo
dc sra economia (ponto de vista econômico)
Vemos, pois, como:r volta a Fnruo entrega'Ilos as chavcs tlessa frlsa
qrrcrela que clivicle c nrina a psicanálise francesa.
lmagino que, após o assasslnato do par ptimitivo que I'nruo situa
rro lrmi;rr da humani<la<le, por ocasião do banquete totôrnico, os filhos
«la horcla <tividiram entre si o cadáver que tinham reduzido a um aglo'
merado inÍorme de carnes esquartejadal - e cada um deveria sorrir à
rcléia de que a sua parte ela a melhor. Cada um diante de seu lote aca-
rrciava o milagre de se ter apropriado, em detrimento dos outros, clo sê{o
arrcestral... o talos pat€rno.
57) C Í. c. STUIY, Noícs srrr lo t,toíl d'Oqdittc, en RttutFr. de Pst'thonol)'st, l0Í9, t XXlÍt,
o .73í.
49
ódio. Pior mesmo, na cólera de sua velhice impiedoca Édipo deixará es
capar, de sua bôca, ainda uma vez, a aÍirmação do desconhecimento de
seu desejo: "Vocês nasceram de um outro; vocês não nasceram de mim',.
Polinlcio parte, a morte não tem mais senão que se abater sôbre Édipo
que nada pode reconhecer. Essa morte enigmática, cujo segrêdo Teseu
detém, temos cerreza que Íoi cssa ascensão entre os deuses, malgrado as
promessas tranquilizadoras tlo oráculo? "Nosso rei (Teseu) tinhã a mão
na lronte, abaixando os olhos, como em presença de um espetáculo paao-
roso que se Ícuclou a éle c cuja visão não pôde suportat',.3E O corifeu
concluirá, lêchando o caminho: "a história aqui se acaba definirivamen-
te". Ê, pois, sômente diante <la morre que a tonsciência alcança sua ta-
rela hrstórica, EIa está, como o vê Ricoeur, nessas obras do gênio hrrma-
no, nessa anamnóse em que o poeta trágico suscita uma noú problemá-
tica: aquela rla passagem tla consciência à consciência de.si parà aquêles
que a escutam.
A psicanálise não suloca a obra de arte ou de ciência, mas sômrente
as aclara, para dela fazer sair a luz oculta; uma outra via é possivel, senr
que a interpretação se esgote em sua riqueza.
Talvez o exemplo dc Érlipo mosrre melhor a insuficiência fundamen-
tal de tôcla concluta humana tliante tlo saber. Que Êdipo tenha sabido que
matolt seu pai por rrma <luerela fútil e tonrado s€u lugar ao lado de jua
mãe - que esta, pressentindo o levantamento (lo nristério o tenha encr>
rajatlo a recobrir com seu vérr a anriga raÍa
junto de seus lrlhos e dc suas filhas conduza.se - qrre, enfim, êle própio
de maneira tão d-isciimi-
natória, tudo isro revela que é mais fácil respontler aos enigmas da Es-
linge ou- de levantar a quesrão que conrinua no seu glorioso desnucla-
mento, do que saber o que é pai, o que é mãe.
Nada se cumpriu e terminou; tudo permanece para ser colocado em
questão. A psicanálise lornece apenas os instrumentos para tornar nossâ
pesquisa menos hesitante. Ela não conduz nem à cssa certeza tranquila de
possuir unra ve-rdade, nem a opressão de nossa cólera, não mais qué à uma
posse liberta de seus enrraves. Logo, ela nos ensina que possúimos em
nós os instrumentos de um saber que no6so saber ignora e que é nossa
única verdadeira quesrão e nosso único socorro.
Retornemos, pois, cada um para nossos trabalhos, o Iilósofo para
seus textos, o psicanalista para seus pacientes. Os enigmas que êstes lhe
colocam não são menos angustiantes, sobretudo quanão são- levados em
sua pÍocura do sentido a encontrar, trocista, a natureza que pela via de
alguma nova droga curadora, estende-lhe uma armadilhÀ reãutiva. Êle
sabe, entrerantq que a última palavra é sempre aquela cuja chave o pa.
ciente guarda na sua alienação, como a última palavra permanece com.
Sileno que confundiu a Esfinge, essa argumentadora, quando, tendo entre
50
§eus. dedos o pássaro- §imbólico, perguntava-lhe pérfida: ,,O que tenho
aqui é vivo ou morto?" e segundo sua resposta apértava as mãoi para su-
_
5l
Primeira Parte
AS PULSÕES E O INCONSCIENTE
ALGUMAS NOTAS SOBRE O INCONSCIENTE '
r) O aêrto aclor Íol ícdlSldo há váÍios anos c olgqns de seus desenvolvlmetrtos olo coÍíe6-
Do[dcílo mals ao nogso gcnsamento stull. Em plrtlculsr no quc ac reÍcÍc ! ccrtog ttpcc-
io6 dos ÍaÍrtasmas lnconsclcntes c sobíetudo À aÍtlculrção cntre gênc6c e cstíutúÍr, de8en'
volvlme[to c or&8nlzação do Inconsclcntc. Sêí p6lcanallsta qucÍ dlzar também coloclÍ cooE'
tartemcntc em -cáusa,'6rrc próprla leltura da bbÍ8 Íreudl8ir, e 6e é auxlllrdo nlsso poí
.llscursóes cteúUlcas, Nlo'é êssc o ocnoÍ mérlto d8s "Jornadss dG Bonncvrl" (lulho dc
t 965).
!t5
Sc não se lrataírse de provar aqui, <1ue lrão conhe(cnros o coDjunto
rlas tlcterminações tle nossa própria conduta, nossa tarefa seria fácil. A
obra lreudiana poprrlarizou a noção dos aspectos inconsrientes tle rrosso
( omportamento, cuja importância Íoi entrevista por outros antes tlêle.
Seu
grande mériro loi o tle ter diminuido a lranja tlo incompreensível ent
;-rsico;>atologia e em psicologia. Também não é menos verdatleiro c;uc
essa concepção das determinações inconscientes srrscitou e ain<h susriur
vivas oposições, porque ela se apoia na descrição de prrlsões que Fnrl'»
chamou cle sexuais, por razões nas quaís êle próprio insistirr. Da r ríri.a,
rlo "pansexualismo" freudíano à rregação de t&la a sua teoria do llrcorrs-
r:rente, não vai senão um limite, que Juno atravessolr, como o vcfculos.
IVÍas talvez êsse procerlimento seja também aquêle rle r)uncrosos perrsatlo-
res qlle negam a naluleza dos conflitos psicológicos e não vêern na "co»:,
r;iôncia-reÍlexo" se[ão a sup€restrutura dos conflitos de rratureza ccorrir-
mica. Â descrição rlos Íenômenos inconscientes tem, portanto, o serr vrlor
"de instrumento mediato", tal como o descreveu .,erres.
J. P. Senrnr €m
lões de Métotlo", introdução à sua obra intitulada Critiquc de la raisotr
diolectique (32). PorrrzEn (31) saudou a era concreta em psicologia e
assinalou a importância da compreensão dramática de nosso comporta-
mento à luz de suas determinações inconscientes, Êle Íalou mais tar(lc
de "coisificação", poÍque Frnuo não tratou sômente das qualidades incons.
cientes, mas da organização do Inconsciente.
58
que essa recordasão aparece, e Bneurn e Fnruo formulanr assim seu petr-
§amento: "A dissociação do consciente, chamada dupla consciência nas
observações clássicas, existe rudimentàriamente em tôdas as histerias. A
tendência para essa dissocração, e por ela, para a aparição dos estados cle
consciência anormais que nós reunimos sob o nome de estados hipnóides,
scÍie um lenômeno fundamental nessa neuÍose". Assim, nessa primeira
aproximação, percebe-se que êles distinguem a no@o de Inconsciente a
partir do estudo das personalidades múltiplas dos histericos que tínhanr
sido descritas em particular por BrNrr, P.tul Jeuer e PTERRT: Jenur. Intc.
ressando-se em compreen(ler a significação da crise histér-ica,
- tal como
então tinha sido sistematizada por Cnnncor - Bnsurn e FRsuD mostrarn
que a terceira Íase, chamada das atitudes Passionais, tem uma signiÍica-
ção em relação a um vivido esqueci<lo. Êles se interessam pelos dois ele.
mentos gue depois se reencontrará em cacla momento da descoberta psica-
nalítica: o pavor (traumatismo) e a sexualidade reprimida. Assim, esa
clicotomia da pessoa acha-se estrutura<la desde essas primeiras elabora.
ções, em Íun@o de um sistema dÍnâmico tendo um sentido humano; e
êsse carátet tundamental que é esboçado por FREUD desde 1892, separan-
do-o, de um golpe, dos ou tros pesquisadores que se interessavam pela
patogenia das neuroses,
60
Ncssa época elalxrra uma teoria enelgética _e. ccoltôtnica dos dcsejos e. do
recalquê, na qtral opõe um processo primário e ttln Proces§o .secundário
rtc inibiçio q.t'. ê1" iigr, comã ,eremoi, às ativi«ludes ptó'conscientes' Mas
u,,m".rxtór cxernpÍos clôssc petío<lo, êle parece se Preocrrpal'sobretudo
",,,
(oln os ctesejos a curto praro, lecentes, interditados por circtrnstâncias
[:'rcrlnteute <:óntpr ccnsír'eisl o cotrfllto tem um carátet local, anedótico'
( l Lcrnos por exàmplo o sonho bcm conhecido, no qu:tl l'nr:uo se vê em
Rorna esÊantacl., lror uer as tabuletas das lojas e as placas indicadotas tlas
r',,ali esciitur cm ãlemão; interpteta êsse sonho colno o desg<isto de tcr
qtrc tazer trma viagem a Pt aga (onde urn recente decreto- imperial e real
.:ern, justamerlte, tornar obrigatório o aletnão para <lesigttar - ruas e
lojas),-quanclo tetia desejaclo ii, para-a sett l)l'a7et, :t Rotna. É <:ttrioso
vcr
q,i" '.tti significação paicelal d' que ntais inrpressionolr o público e
.i,rc permanecc, cm muitos meios, sinônimo da psicanilise.
' b) Dexle as primeiras elatrorações, FREUD tem o cuidatlo de nã<r
rlcixaí sua sistern:úização, feita numa linguagenr tópica, sc encaminhat
para uma realista. .fá Énurrun quis nrostrar 9 Perigo de ver alr:is do subs'
[antivo "conscientet' um objetó, trm "ser psíqirico", como diriam os [iló-
sotos. ! neuo tonta as . me§mas precauções quantlo fala do Cottsciente, <lrr
l'ró-consciente e do Inconscienie. Nio se tiata üni«amente <le qualidacles
ttos processoti psíquicos. Pocle.se achar ntais otl nlellos feliz str:t:o.mP.,.11'
<itica (8)
ção ôntre esrni noiões e as irnagens virtuais dos insttutnentos cle
ío. 97): cntüetanto, ela ilrrstra o ctriclado do autot enl não criar uma
ütitla«íe ten(líJ urrra ltrnção particrrlar. É r'erda<le qlle' nx ntesma obra,
Flr:urr compatn a cotrsciência a trtn ritgão dos senti<l<» qtre 1>ermite per'
ceber as qiali<ta<les psíqtricas, o que lhe [oi uruito cetrsttra<lo. - logo tle-
pois (S) jp. 500). irenros disctttir a signiticação tlessa assiruilação dos
i"t.r. ilu cohscíente cour as -l)er( cpções, mas Para compreendet' tnelhor o
pcnsarnento de tntuo, a passageni seguinte Palece-nos mrrito útil: "Ten'
i",u.t, ,go.r, esclarecet irteltrór' algúmas nô5õcs que tênt o pcrigo. de
.c..u, rnil comPreenclidas Polque, Para sinrplilicat, al)resclllalltos os clois
sistcrrras como ihtas regiõcs do itlterior tlo aparelho psíqtrico, c..i§so o
que tta(lllzern as palar,Ías "r'ccalclrtl-o" e."Pelletrado"' Qtran<lo clissemos
<itre um pensantcttio inconscictrtc ó forçado, ap<is tratluçlio, it l) ssar Para
. I'rc-coirs< iente, pal'a nêle .enetrar em seguirl:r, .:'io cntcttrlenros colll
rsto qrrc existc lor.úação de urita orrtra icleiu - sitrr:rrla lll n outr() lugar -,
:rlgrrn'r:r coisa .o,n., ü-o ttatlscrição da qual srrbsistiria. o lcxto original;
nio entendemos ainda, qtle l)cnetrar rra cottsciêtt<ia inrplir:r uma mtt-
<lança <Ie lugat . . . rliganros, o qtle e rnais. pert<r tla rqrlitlatle, (lue-.uma
ot uliaçito cle'cncrgia sã ptotltrzitr-otr foi leclir:igi<[a. ." É assitn qtre. f tt:uo
i.trtdirz, j/t rrcssi ó1tocri, ur.a noçãro 4inânri<'. .ís (o.cclxircs psicanálí-
titas qtre,'airrtla hoje l)l'eserva todo o sett valot.
c) Desde ôssc moÍtetrto, está claro qtte a oposiçio clllrc os Pl'ocessos
conscíentes c os Processos pré'conscientds ott itttottscietttes n:'ro é consi'
<teracla por Ftr:trti <omo ligaaa e esta4«rs tle corls( iôllci:l sttcessivos e qtre
6t
essas varle(lades de atividade pslquica existem ao mesmo tempo. Seria
um êrro, desr-le então, assimilai a iroção de Inconscienre à de inconsciê,-
cia ou de esratlo de consciência inteirompida. A elaboração que conduz
ao sonho n-ão se faz apenas no sono, mas a cada momento dâ vidã pslquica.
O sono não conduz senão à erupção duma cena Íorma de consciincia
daquilo que é elaborado inconscientemente.
- d) Vimos_ gue Fuuo concede um papel dinâmico às instâncias que
descreveu. o Inconsciente caracteriza oô tr-escjos recalcatros. Nessa épo'ca,
Frtuo atribui um papel muito imporranrc de regulacão ao pré_conscíenre.
Po<le-se descrever, assim, dois tipos cle efeito:.- O primeiro decorre da
análise tlos sonhos e rla utilizaçãô rlas recortlaçóes bànais para constituir
o rnaterial onlrico determinado pclo corrrcútlo'larente. Dai FRsu» deduz
gue os pensanrentos p'i-conscientes são abarcaclos e sobrecarregados pelos
desejos inconscicntes. Êles romam, assim, trma significação em"relaçãio ao
passado vivirlo mais antigo, e seu retôrno ao e.tã,lo de'c«rnsciência' é rãrr
impossível (omo o dos rlesejos intonscientes, a meDos que sejam elabo-
rados, como é o caso das represenrações oníricas. _ O iegunrio efeito d
inverso. Nessa época. IRE.;D pensa qric , sistema pré-consáente .,interdi-
la o acesso tla consciência, comandi a crrrrada dí motilidade voluntárie
e regula a l'emessa da energia «le ocrrp;rção móvel tla rlual uma parte _
a atenção - nos é familiar."- Fntuo teiia caído no laço do realismà psico_
lógico-do qual êle se clefentlc sem cessar? Não pensámos assim, poii êsse
.aspecro do sistema pré-consc.icnte significa simplesmenô que o
segunrJo
seu luncionamento escapa ao contrôle consciáte e tleve por outro'lr.lo,
ser.distinguido dos desejos inconscientes, rais como acaba tie deÍinir. Log,;
rnais veremos que êsse asPecto dinârnico será elaboratlo numa sistemai.
zação muito diferente.
e) Desde essa primeira elaboração, I'nr-uo percebe o caráter evolu-
cionista cle sua reoria do luncionamenro psíquiio e (olneça a falar enr
têrmos de rcgressão,
- 3. Sexualiilade
pletamente
infanlil e Teoria dos Inslintos. - Será ignorar conr.
a originalidade _rla. noção de fnconsciente em Énruo, sepa_
rá-la de serr conteúdo, isto é, tlas pulsõcs. Estas não são, por outro laào,
um dado exterior, mas ao contráiiq o elemento fundamental que con-
cede seu dinamismo a rodo o material dcscoberto pela análíse 1e isto
desde os inlcios da pesqrrisa psiranalirica. A noção âe sexualidade apare.
ceu a BnrusR e Fnru» como misrura(la ao tleteiminismo da crise di his-
teria. Ràpiclamente, Fntuo pensou também que os problemas sexuais es_
tavam na origem dessa parte da antiga neúrasteniã, da qual êle Íaz a
neuÍose da angústia.
. -. Yrm elaboração da noção de sexualidade e cle pulsão cleve ser «li.
vidida em muitos estágios:
a) No inlcio, Fnruo pensa que os doenres histéricos tinham sido
objetoe de tenrativas de sedução (trãumatismo sexual) . Êle se acha, então,
62
diante de um problema que não resolve a não ser progressivamente, à
medida das clescobertas que faz sôbre si-mesmo e das resis(ências a essas
descobertas.
b) A primeira dessas descobertas é a rle que não se trata mais de agres-
são sexual vinda do exterior, mas de desejos sexuais imPossÍveis de rea-
lizar e, ao contrário, reprímidos pelos que o rodeiam.
c) Igualmente, Fnruo descobre que êsses desejos dirigem-se para os
personag€ns parentais. Âcha-se assim diante do aspecto incestuoso dos
desejos intantis, diantc do complexo de Édipo. Certainentc, essa é a parte
-
de sua obra quc êlc elabora mais lentamente; a coÍrespondência conr
Fr,rrss coloca em evidência o carâter muito antigo de srra3 preocupações
(é assim que Fnruo descobre a significação profunda do desenvolvímen-
to dramático de ÉdipaHei e do Hanlet de SnerrspEAnB em 1897. Ct.
carta à Fr,srss n.o 7l de 15 de outubro de 1897 (7).) Mas os Trois Essaü
sur la SexualiÍl só aparecem em 1905 (9). É assim que Fnruo percebe
que existe na criança um desejo sexual constante em direção a úm dos
pais (o do outro sexo) e um conÍlito não menos constanre com o do
mesmo sexo, cliante do qual a criança desenvolve sentimentos ambiva.
lentes porque o desejo de se identificar com êle, ainda gue ela renh:r
mêdo gue se realize, significa entrar em concorrência perigosa com êssc
personagem amado.
d) Durante todo êsse perÍodo Fnruo esrá extremamente interessado
na elaboração de sua teoria pulsional, à qual €le dá uma significação
psicológica, pois que se trata de tensões que devem ter tendência a sc
resolver, essas tensões sendo consideradas como um mo<Io particular de
tuncionamento neuronal e interneuronal. Sabe.se que no Eiquisse d'une
Psychologie Scienlilique 2 êle tentou muito precoiemente elaborar sua
teoria, mas que jamais publicou êsse documen(o durante a sua vida. Essa
teoria energética das pulsões tem duas conseqüências: - a primeira é
a elaboração temporal de uma parogenia purãmente fisiológica da an-
gústia dos neurastênicos: é a não-satisfação sexual que é patógena em si,
sem que a teoria do Inconscíente entre nessa conctpção.
- As conside.
rações_ sôbre a €ner#tica das pulsões trazem para úma segunda conse-
qüência fundamental: queremos falar do fato de que aJ pulsões são
igualmente caracterízadas por bloqueios cujo equilíbrio detêrmina um
conjunto de sistemas econômicos de uma grande importância no domínio
psicopatológico. A clínica psiquiárrica mosrra semÉre que existem esta-
dos de equilíbrio normais ou parológicos que são riefinidos pelo Íato cle
quc certa§ pulsões tendo um caráter dominante, encontÍam um certo
modo e uma certa quantidade de sarisfações, senão de unra maneira di.
reta, ao menos de uma maneira subtraída. Essa noção energética que
Fnruo chama econômíca tem sido muito criticada. Mas quaniio se sãbe
que as pessoírs normais ou doentes tendem a vigiar suas fontes de satis.
fação por não importa que preço, parece evidente a imporrância do que
63
se chaÍnará enl psicanálise de beneficios prirtt:irios c beneficios securt'
tkirios. O aspecto econômico da otganização da lrrsonalitlatle Pelmanece
runr lato de granrle valor. A energia prrlsionill é, nÍo o esqueçamos, res-
ponsiivel pela passagem das representações pré-r;onscientes no estado itt-
ionsciente. Do mesmo modo l'nnuo elabora a sua teoria tlo prazer e tlo
ttcs;l:.rzer', e reconhece no Inconsciente pro(essos primiirios e Prooessos
set rrnthirios, enr lirnção mesmo dessa teor.ia do Pt'arer.
6-l
o Superego que di§aingue do tdeal do Ego essas nogiles sendo as maig an-
tigas da tópica freudianz (Ptychanalysc collective (16l).
A tentativa de aclarar a evolução das idéias freudianas que vem de
ser apresentad a, talvez permitirá um acesso válido para a discussão da
teoriá psicanalltica do Inconsciente. Vimos Fnruo partir do estudo da per-
sonalidãde dupla dos histéricos para estudar os mecanismos inconscientes
muito próximoo daquílo que comumente se drama de Subconsciente, ela-
borar a partir do Inconsciente o sistema pré<onsciente, dar um conteúdo
pragmático e históríco às motivações inconscientes, e enfim tentar, de
ú'a maneira muito maís arnpla, uma sistematização das instâncias psico'
lógicas que estão constantemente em atuação e que não permitem opor
sisiemas têchados, Essa consideração paÍece especialmente importante
quando se quer dar seu exato valor às críticas do Inconsciente freudiano,
á partir doi fatos clínicos de consciência inquieta ou das teorias da deseç
truturação da consciência.
Fnsuo hesitou durante muito tempo, enre uma teoria monista e uma
teoria dualista das pulsões. Desde a Cilncia dos Sonhos, distinguia pro
cesos primários e processos secundários, princípio de prazer e princípio
de desprazer. Mas durante uma longa parte de sua vida êle pensa gue
a agresiividade, o masoquismo primitivo, são o produto das pulsões libi.
dínàis transformadas sob o duplo efeito da realidade e do pré<onsciente
de início, da realidade e do Superego em seguida. Mas desde 1905, Fnruo
chega a uma fase mais pesimista de sua pequisa e p€nsa que existe uma
tbrma primária destruidora, que êle qualifica de instinto de morte. O que
em paiticular Fnruo coloca na oriçm da pulsão inconscienrc é a repeti-
$o âas situações desagradáveis ou trauma3izantes (enquanto gue na pri.
ineira elaboraSo da concepção freudiana, o princípio de repetição é expli.
cado pelo nãocumprimenio de uma pulsão recalcada) , o gu9 permitiu a
certoJ psicólogos aproximar o princípio de repetição do efeito descrito
- Zrrc.rnxrr
por (em D. Lecrcae, Lc Problême du Truwlcrt (2r» ).
No início dêsse ensaio de reconstituiÉo da história das idéias frert-
dianas sôbre o Inconsciente, talvez não seja inútil voltarmonos Para as
formulações sucessivas e mostrar suas referências internas'
Fnruo ultrapasou ràpidamente a idéia das motivações inconscientcs
de nosso comportamento. Sua obra foi marcada por três tentativas suces-
sivas de tbrmulaÉo da estrutura do Inconsciente. - No primeiro estágio,
gue é o da diferenciação entre três sistemas (o sistema percepçãoconsciên
cia que é muito análogo ao Ego da psicologia das faculdades, o sisteme
pré<onsciente e o sistema inconsciente), deve-se observar que o Incons-
ciente já é assimilado ao reservatório das pulsões € que a censura que
límita de qualquer maneira o Inconsciente pertence ao sistema pré<ons
ciente. Cremos dever insistir no fato de que o Inconsciente ou êsse reser-
vatório de pulsões tem sua expressão psicológica, mas inscrita nas bases
mesmas dos tundamentos biológicos de nossa personalidade. Esta é uma
idéia a gual Fnruo permanece extremamente fiel. - A terceira etapa da
65
teoria lreudrana do lnconsciente é a-quela da segunda tópica. O Id cor-
responde, de muito perto, ao precedente sistemã inconsciente, ao reser-
vatório das pulsões. O Ego que se diferencia, não é mais o equivalente
do sistema percepção-consciência, Todos os mecanismos homeosiáticos do
Ego correspondem por sua vez aos seus aspectos inconscientes e aos seus
asPectos pré-conscientes.
§ 2. A GÊNESE DO TNCONSCTENTE
66
damente o notne de Líbido eÍu seus escritos. De u'a maneira extr€ma-
mente esquemática e forçosamente um pouco dogmática, a evolução do
pensamento freudiano sôbre a teoria dos instintos pode ser acompanhada
assim: em tÔda a Primeira Parte de sua obra, êsse autor opunha os ins-
tinto libidinais e os instintos do Ego, concebidos nesse perÍodo, como
lêmbrando vagamente os instintos de conservação cuja exÍstência era
unânimemente reconhecida na época.
Na maior parte de sua vida científica, Fnruo opõe os instintos do
Id e do Ego. É verdade que êle admite, pelo menos impllcitamente, qrre
a coesão do Ego é ocasionada por uma energia instintiva derivada do kl,
coesão gue se pode assimilar do ponto de vista eneqgético àquela que êle
descreveu na primeira parte de sua obra como instintos do Ego (sem
reterir, em particular, à descrição do Ego em Abrége de Psychanalyse, pâg.
4 (t9). Mas a Libido não é sômente caracterizada por seu aspecto enei.
gético, mas também por seu fim, isto é, o objeto para o qual ela se dirigc.
Esse objeto pode ser exteríor ou internalizado. Pode ser também o Ego,
cuja coesão e tôrça são assim aumentadas pelo interêsse poderoso que o
sujeito tem em sua própria unidade (bloqueio narcisista primário e se-
cundário da Libido) . Como se tem visto, na última parte de sua vida,
partindo do automatísmo da repetição, Fnruo opôs Eros e Tânatos. Mas
a descrição do instinto de morte é considerada, por certos psicanalistas,
(Necrm) , (28) como contraditória com o processo mesmo da cura psica-
nalÍtica. Outros psicanalistas vêm atualmente nessa contradição das pulsões
a expressão dos tênômenos vitais anabólicos e catabólicos.
Agui chegamos num dos problemas cruciais da discussão sôbre o
Inconsciente. No espírito de Fnruo, trata.se mais do que de uma quaü-
dade particular dos processos psíquicos: um modo de articulação do bio
lógíco e do psicológico. Na verdade, êle volta sempre a isto, não elabq
rando senão precàriamente seu pensamento sôbre o assunto, pois acredita
que faltem muitas conexões em nossos conhecimentos para explicar clara-
mente a articulação dos processos biológicos e dos processos psicológicos.
O duplo movimento que citamos acima toma todo o seu valor em função
mesmo das elaboraçõ€s teóricas sucessivas de Fneuo. Em seu espÍrito, o
instinto de morte é a tradução de uma tendência çral da matéria vive
para se desoqganizar: "Temos a permissão de pensar do instinto de des-
truição que seu objetivo tinal é o de reconduzir àquilo que vive no estado
inorgânico e é porisso que chamamos instinto de morte. Se admitimos que
o ser vivo não apareceu senão depois dos objetos inanimados dos quais
está separado, devemos concluir daí gue o instinto de morte se conforma
à fórmula dada acima, segundo a qual todo instinto tende a restaurar um
estado anterior" (Abrégé dc Psychanalyse, p. I (19) ). Vê+e que essa
concep$o unicista dos instintos não deixou de preocupar Fnsuo de 1845
até 1938. Ora, é certamente sôbre êsse ponto que os próprios trabalho+
freudianos forneceram mais elementos que permitem matízar essa
concepção.
67
2. A notureza do Inconscicnte. - Ê em tôrno da questão da natureza
mesma do Inconsciente que muitos pesquisadores se dividiram e se sepa.
raram de Fnnuo.
Considerando o Inconsciente como ulla fôrça vital numa teoria in-
discutlvelmente vitalista e espiritualista, Juxc transforma a teoria «la
übido de Fnruo, dessexualizandoa. Não discutiremos, aqui, as razões
prolundas dessa evolução,s insistiremos simplesmente num dos aspectos
da teoria iungiana que nos parece mais significativo: é a transformação
da noção de pulsão na de destino. Não cremos alterar o pensamento de
Jur.tc sistematizando-o da maneira seguinte: o homem parã ser feliz deve
realizar seu destino, tal como êle está inscrito nas piofundezas de seu
.lnconsciente; o trabalho psicanalítico consiste essenciãlmente em revelar
ao paciente o que êle não conhece sôbre o sentido de sua vida, de maneira
a lhe permitir harmonizar sua existência com suas pulsões profundas. Ai».
da que Fuuo considere quo o Inconsciente deriva das mais arcaicas org-.r,
nizações do psiquismq e que tdos 09 psicanalistas pensem que seu tr.a-
balho é o de libertar o indivíduo das opressões ligadás aos seus primeiros
movimentos instintivos num organismo prematuro e das conseqüências
não liquidadas dêses esboços. Jurc dá ao Inconsciente uma finllidadc
dilerente e considera que a harmonia do indivlduo com seus Íins incons.
cientes deve ser o objeto do trabalho psicanalítico. Num trabalho recente,
l. PescHn assinalou que em nenhum caso a psicanálise poderia ser assiml
lada à uma pesquisa gnóstica. (30). Por outro lado, sabe-se que JuNo per
maneceu muito tempo na noção de Inconsciente coletivo transmitido atra-
vés das gerações sob a forma de arquétipos exprimindo-se freqüentemente
de u'a maneira simbólicâ. Ainda que inspirandose numa metodologia
totalmente oposta, os psicoterapeutas existenciais parecem.nos ter uma fo,
sição linal pouco diferente da de Jurc: "Sobrevive, enlim, na alma do
cloente alguma coisa de decisiva que se pode nomear como o encarninha-
mento para uma revelação. Êle se aclara sôbre si mesmq primeirameuc
graças a uma explicação veridica de seu caso perÍeitamente detalhado;
segundq olhando.se como num espelho, aprendendo que êle é; terceiro,
por um trabalho interior que o faz elaborando-se a si próprio
- - tornar-
se trânspârente a seus próprios olhos; quarto, por uma comunicação exis"
tencial na qual êle experimenta e realiza plenamente essa revelação. "As-
sim, para J.rsrms a psicoterapia deve conduzir a revelar ao doente alguma
coisa de seu psiquismo que êle não conhece (bem entendido, não ôusa-
remos lalar de Inconsciente poÍque se trata de um Íilósofo existencialista) ,
mas que lhe deve permitir realizar.se totalmente (21).
6E
essa época F*suD conhece todo o desenvolvimento de seu sistema meta-
psicológico que opõe aos processos secundários, nos quais a energética
blogueia os próprios mecanismos do pensamento.
Não se poderia descrever melhor a importância dessa posi$o do que
retomando a passagem da exposição de P. JosrrH Numu sôbre a oriço
e o desenvolvimento das motiyaçõ€s (em La Motiuation, p. 100 (27)).
"O tato de tomar o reflexo como modêlo e os estÍmulos como ponto de
partida da conduta não impede Fnruo de fazer da motivação a no$o fun-
daÍrental de sua psicologia. Enquanto que as outras escolas - a de Pevr,ov
e a deTnouorxs e de seus sucessores como Huu, etc. - tinham estudado
a conduh do ponto de vista da ligafio que une o estímulo à respGta
(leaming) , Fnpuo considerou o próprio estÍmulo como uma contribuiÉo
de energia e a resposta como a descarga dessa energia. Tôda estimula@o
de energia nq organismo constitui, pois, um cruzamento de energia no
organisúo que é considerado por Fuuo como um "cistema fechado". O
príncípio fundamental que domina o funcionamento dêsse sisrcma é sua
iendência tundamental para se desfazer dêsse cruzamento de energia (lei
da in{rcia). Com efeito, êsse cruzamento de energia rompe com o equi
líbrio energético do §istema e provoca o desprazer (Unhtst). É porisso
-quedesde que uma certa quantidade de estimulação lhe é acrescentada -
o organismo pode responder com uma rea6o motriz que ,constitui a
descarga da energia fornecida. Ê o que se vê, diz FREUo, no reflexo' Con-
tudo, as estimulações mais importanrcs, aquelas que Provocam ultra acumu.
lação consíderável de energia no organismo, são de origem interna, como
os excitantes que produzem a Íome, a excitação sexual e em çral as ne-
cessidades tisiõlógicas. Uma descarga direta da energia assim acumulada,
de ordinário não é possÍvel. É preciso achar no meio o -obieto qug Possa
parar a estimulaÉo (por exemplo, o alimento ou o objeto sexual e que
provoca a descarg-a da energia acumulada) ".
O princípio fundamental da teoria energética cle Fxruo consiste,,
pois, em dizer que o coÍnportamento é movimentado e impelido pela
tendência a disipar ou paÍar o cnrzamento de estimula@o.
69
vida senão com uma técnica estriaamente "behaviorista"; encontramos,
pois, a noção de pulsão e de instinto, e devemos nos perguntar se oB cotÍl;
portarnenros instintivos, tais como se pode descrevêJos observando o in.
divlduq são comparáveis à no4ão de pulsão inconsciente tal como FREUD
a descreveu. Asinalemos, logo em seguida, uma oposição que é evidente:
os oomportamentos instintivos observadoc em estudos objetivos do com.
portamento são rcalizaçóes desenvolvendo.se essencialmente de u'a ma-
neira motriz (motricidade estriada ou lisa) , Âs pulsões inconscientes nos
são conhecidas como virtualidades. O exame da criança pequena permite
compreender melhor essa oposição qualitativa,
Como tivemos ocasião de lembrar muitas v&es, o comportamento do
bebê é perfeitamente comparável aos comport:rmentos instintivos animais
descritos pelos etnólogos. Com efeitq certo{i estímulos vagamente diferen-
ciados, se sobrevêm quando o meio interior do organismo apresenta certas
particularidades, podern desencadear uma série de atos motores e viscerais
desenrolando-se segundo um esquema sempre idêntico a si mesmo, No
estado imaturo do sistema p€rceptivo-motor, êsse comportamento instin-
tivo é observável sobretudo nas condutas alimentares. Sabe-se que quando
a criança está em estado de necessidade, estímulos muito vagos provocam
uma série de atos, por exemplo o reflexo de orientação diz dos pontoe
cardiais descritos por ANonÉ THoMÂs, a sucção, a deglutição, etc. Desde
que o estado interior da criança se modifica, todos êsses compoÍramentos
desaparecem e ela, lreqüentemente, adormece, O que é muito específico
da atividade rnstintiva, é que, qualquer que seja o estado de vigilância
<ia criança, os estlmulos que desencadeiam essa conduta não têm mais
nenhum eleitq assim como os ciclos alimentares não mais acontecem, re.
conduzindo o meio interior ao seu ponto de partida de onde desperta,
etc.. Certamente, êsse sistema permite compreender que o comportamento
ê determinado em têrmos muito mais precisos. Essa orientação da ativi-
dade pode ser chamada de instinto Âs manifestações motoras e s€cretoÍas
do estado da criança são vistas pelos que a rodeiam como â expressãd de
desprazer; do mesmo modo, o estado de quietude no qual a criança parece
desaparecer num nirvana que ràpidamente conduz ao sono representa
a idéia que todo adulto faz de uma certa lelicidade. Êsse comportamento
das primeiras semanas apresenta pois, um duplo caráter: a) êle se exprime
pelas mesmas atitudes motoras que os estados de significação psicol§gica
do adulto; b) êle toma um sentido imediato para os adultos que rodeiam
a criança, Os eÍeitos do desenvolvimento perceptivomotor sôbre as con.
dutas infantis entre nós, têm sido descritos muitas vêzes em detalhe
(ct. I, 4, 24,25,26).
O leitor nos desculpará por saltar as etapas para observar diretamente
o que se pÍssa no oitavo mês da vida, no qual o comportamento da crian-
§â parece se opor cm certos pontos, de u'a maneira muito interessante,
.» Parccc que r llslologla da sub3tâncle ,ctlcu,ada rdcquo-3c pcÍícltâm.ntc conr cssas cons-
tâlaçõcs âllmcrtaÍcr (cl. DEIJ c L^riy (3) ),
70
ao conrportamento instintivo que acabamos de descrever. É a época ern
quq Sprrz observa o aparecimento do que êle chama a primeira angús-
tia. (33) : a criança não reaç mais aos estÍmulos grosseiros, mas diferencia
as lôrmas perceptivas que agora ela sabe reconhecer eletivamente. As al-
ternâncias de quietude ç inquietação não são mais ritmadas apenas pelas
rnoditicações do meio interior, mas também pelo fato de que a criança
percebe uma forma privilegiada. Sabe-se que ela manifesta um desprazer
muíto claro quando não vê o rosto do personagem que a alimenta (a
mãe e/ou a nutriz) ou guando percebe o de um estranho. Ela reage a
essas percepções da maneira pela qual reagia antigamente às satisfações
de suas necessidades biológicas. Mas um outro caráter fundamental é a
constância dessas reações que não mais estão ligadas às variações do mei«r
interior: enquanto gue antes ela reagia cle uma maneira intermitente a
estímulos grosseiros, agora a criança Ieage de uma maneira constante em
rela$o a uma certa forma que ela acredica presente ou ausente, É essa
reaSo particular à ausência, independentemente de todo estÍmulo, dc
todo sinal que têz Fnsuo dizer que a criança era capaz "cle alucinar o
objeto". Acreditamos que o deslocamento da atividade dos instintos em
caráter estritamente biológico para reações desencadeadas Pela PercePção
de [ormas não tendo mais utilídade biológiea imediata, consútui a pri'
meira apariÉo da atividade libidinal e da relação do objeto. Antes a crian'
ça reagia exclusivamente à ingestão do alimento e sua mãe não foi du-
rante muico tempo senão um sinal dessa aproximação. A partir dêsse
monrento, ela se lorna tbnte de prazer, a alimentação na sua realidade
material não sendo signiticativa a não ser em função dessa relação mãe-
tilho, O movimento da criança em dire$o à alimentação e o movimento
cta criança em direção à sua mãe são da mesma natureza. A observação
mostra que não existe nenhuma solução de continuidade entre oe dois,
mas existe uma heterogeneidade estrutural da qual devemos dar conta, se
queremos courpreendei o que mais tarde vai constituir o Inconsciente.
Com etêito, êsse interêsse da criança pela mãe ou pelo personagem ali-
mentador vai se tornar uma constante, em função da qual vai se organi-
zar todo o comportamento do indivíduo que durante tôda a sua vida
deverá lutar contra o caráter constrangedor dessa surpreendente fide-
lidade.
Não descreveremos tôda a evolução do complexo cte Édipo; assinalarc-
mos, entretanto, que hoje todos os autores estão dc acôrdo em ver in-
dÍcios do comportamento edipiano desde o fim do primeiro ano. É sern
dúvída necessário voltar a certos aspectos dêsse bloqueio maternal. Já in-
dicamos seu caráter "antibiológico"; decorre daí o fato de que, em ne-
nhum caso, a pulsão assim definida pode ser satisfeita, que em nenhum
caso a tensão que ela engendra pode desaparecer inteiramente. A satis-
tação da atividade instintiva alimentar coloca o bebê ao abrigo das esti-
mulagões exteríores. O objeto permanece sempre inquietante e, de algunra
forma sempre frustrante: é frustante por sua natureza inadequacla, é
7t
também lrustranre pclo fero de que a mãe não esrá sempre pÍesente, que
outros podem se interpor. A ausência do objeto degencadeia uma friise
de agitação gue é comparável ao desprazer dos primeiroa dias, aind{ qqe
não estando ligado a nenhum estímulo de caráter nociceptivo. Por dasião
dessa crise a atividade perceptivo.motora da criança regride considolàwl-
mente, os movimentos voluntários conquistadoe recÊntemente delàparc-
cem, os limiares perceptivos se elevam, a criança perde seu corpo, ao
mesmo tempo em que perde o objeto (4). Essa desorganização da aiivida-
de do sujeito pode ser asimilada a uma verdadeira reação de catástrofe,
no senlido da Teoria da Gestalt. Tôda atividade da criação vai se orien-
tar para a maneira de evitar êsse excesso de frustração e suas conseqüên;
cias tunestas. Diversoc meios estão à sua disposição. Depois de muito
tempo, sua atividade motora a conduz a atividades lúdicas durante seus
perÍodos de euforia, Sabe+e a importância que Wrnxrcom concedeu ao que
chamou os objetos transicionais (t4). A manipula$o dos brinquedos ptr-
mite um primeiro deslocamentq verdadeiro compromisso entrã o deiejo
do objeto e sua âusência, enue a pulsão e a realidade. Por outro lado,
tôda atividade motora e perceptiva está orientada no mesmo sentido, seja
Precjsamente na procura de objetos de compromisso, seja - e sobretudo
na valorização dos signos anunciadores da satisfação libidinal. Êsses
-"pr6signos" podem se tornar, por seu lado, fonte de satisÍaÉo e pcfle-se
ver nesse nôvo valor o ponto de partida do simbolismo; entre os signos
precursores da satisÍação do desejo, a linguagem adquire todo o seu valor
nessa época: de início linguagem percebidâ, depoir linguagem realizada,
permitindo que a criança exprima mais claramente seu desejo e também
dê uma forma mais "negociável" a(x seus desejos alucinados. A possibi-
liriade de evocar a satisfação de uma necessidade, mesmo numa linguagem
rudimentar, torna-se uma fonte de satisfação do compromisso qúe não
vai parar de desenvolver. Mas a aparição da linguagem marca a passagem
da criança para o sistema de reÍerência adulto, e a confrontação das rea-
ções infantis primitivas com êse sistema de referência vai ser fundamen-
tal para compreender a gênese do Inconsciente.
Lembremos brevemente que não é senão no fim de seu primeiro ano
que a criança, em função mesmo dm pro,gressos de sua motricidade pode
aceder à aprtensão de um espaço tridimensional contrastando cour a limi.
tada visão do espaço que ela tinha quando, de inlcio, estava deiuda no
seu berçq depois sentada. A pocsibilidade de moverse, de compreender
que os objetos que a rodeiam têm uma consrância, já modiÍicou consi-
deràvelmente os dados que a criança pôde conquistar. A tlescoberta do
corpo de outrem, que durante muito tempo não foi senão parcialmente
visÍvel, permite que sê estabeleça o conhecido processo de idendÍicação
especular. Já assinalamos que, na crise de desespêro do oitavo mês, a
criança üve uma desorganização perceptivomotore que provàvelmente
deve tazer desaparecer os indlcioe do esquema corporal. O conhecimento
do corpo de outrem, idêntico ao seu, màs distinto, opõe.sc a essa noção,
^i2
e a criança vai poder se serrir dessa constante pam lutar contra seu prós
prio mêdo. No dia eo que pessoas e coisas tonem um nome que .geranta
iua permanência, a linguaçm torna-se, em si, um elemento trangüilizador,
obrigando a criança a dar uma forma segundo o modêlo verbal, a ê§se
inoúeável que lhe causa pavor, precisamente no quadro dessa rela$o com
a sua mãe, da presença desta, da ação de outros peÍsonag€ns, entre os
quais ela diterencia o pai - ao mesmo tempo o terceiro embaraçador e
iquêle sôbre quem se cóloca uma parte do interêsse pela mãe. Assim, che-
gamos a considerar que as pulsões elaboradas - porque distintas das ten'
dências biológicas iniciais - conduzem, por seu caráter inadequado, ao
mêdo e a um certo número de posições próprias a diminuirem a inteu'
sidade da dura@o dêsse mêdo. Aí reencontramos a distin$o dos processos
primárioo e dos processos secundários. A aparição de um certo número de
Íatôres vai determinar progressivamente à organização do Inconsciente,
isto é, o recalque fora do conhecimento do sujeito dêsse elelrento energé'
tico que cada íez menos encontÍa seu lugar no sistema de referência adul-
to doqual a criança participa grags à lihguaçm. A reflexão sôbre o que
os prsicãnatistas chámãm o fántàsma inconsciente que se organiza e a úda
psiõológica dos adultos, orientada segundo um sistema completamente
ãiferente. Os modos de aparição da angústia do bebê estão ligados à im-
possitrilidade da satisfação das pulsões que se dirigem Para um objeto cuja
[unção é a de não satisÍazêla- - por um lado porque sua presença de'
terniinou um deslocamento das tendências instintivas, e por outro lado,
porque êsse objeto se internaliza à medida que a criança se desenvolve.
Êsse conceito de internalização merece explicação. Por êsse têrmo, de'
signa-se um pro€esso complexo que pode se decompor em vários 1€mPos.
O primeiro êorresponde ãquele (ue-acima descrevemos quando dissemos
que a perda do objeto acaÍretava uma perda do esquema corPoral. E ver-
dade que essa perda do esquema corporal é acompanhada de um rrÍess
particülar; nenhum tãto pe-rmite dist-ingui-lo dos êstados fisiológicos de
hiperemotividade e de angústia do adulto, dado que as mani[esta_ções
exteriores da crise são idênticas. Uma ligação se estabelece entre a situa-
ção do objeto e o sentimento de existência. Em segundo lugar, dissemos
gue a mãe era vista como se fôsse o alimento. A pulsão tende a traduzir-sr:
ria linguaçm do tantasma de incorporação oral do objeto. Em terceiro
lugar, a pàrtir dêsse nromento, a criança experimenta nela, isto é, em sÉu
coipo, as tonrcs do prazer e do desprazer cálcadas no mesmo modêlo quc
os équemas de quiétude e de necessidade dos primeiros meses' Êsses esta'
dos dêsencadeiam o primeiro interêsse hedônico, a um temPo, Para o e5'
qu€ma corporal, parã os objetos alucinados cuja rePresentação pode sigrrr.
ticar desencadeaàentos de estados aÍetivos benéÍicos ou, ao contrário,
satistação de compromisso, e ao mesEo temPo os primeiros mecanismos
de elaboração dêsses compromissos que designamos com o nome de pri-
meiros elemeltos do Ego. Dizemos então gue a criança blogueia os obje'
to6 internalizados. O desenvolümento da linguaçm vai levá-la a exPú
l7
miJos em suas fantasias ou em sua linguagem interior, de igual manêira
que os objetos exteriores, Aoeditamos que oE processoc que ãcabamos de
descrever são.os únicos que podem explicar o Íato de quê, desde a9 Eais
precoces análises, a criança apar€ce como infinitamentd mais dependente
de.suas representações do que de suas percepções. Para um espirito me.
tódicq o têrmo laDtasma inconsciente é umá antinomia. Estaúos perfei-
tamente de acôrdo sôbre o valor dessa objeção metodológica. Coitudo,
como outros autores, somos levados a descrever fantasmas inconscientes.
Cremoe que é o momento de compreender suas origens e seu destino..
Lembremos a emoção desencadeada tânto nos psicanalistas como em
todos os qus ss interessam pela psicologia normal e-parológica, pelas des-
cobertas de MÉrer.lrr Kr-ur. Com efeitq ela descreve na criançã de oito
'neses, interêsses por objetos que de maneira nenhuma ela porieria reco.
nhecer. Ora, todos os que examinaram e trataram crianças desde a idade
de dois anos e meio reencontrâram em seus jogos, em suas Íantasias c
mais tarde nos seus desenhos, tôda a dramática klêiniana. Os autores dessa
exposição eslbrçaram-se para imaginar como se podia conciliar fatos tão
contraditórios, dandose por princípio não admitir nenhuma "maquina.
r.ia" arquetípica que viria explicar o inexplicável. Com efeito, peniamos
que, sob a inlluência da elaboração do pensamento racional e ão desen-
volvimerto d1 linguaçm, a criança integra e elabora progressivamente
Que lhe câusa pâvor e o que não poderia, sem essa eláboiação, enqua-
!drar.se nas categorias de seu pensamento consciente. De onde uma dúpla
construção - lãntasias conscientes de um lado, mêdos inconscientes de
outro, êsses mêdos inconscientes estando sempre ligados à sua vida racio
nal, isto é, tendo sempre um caráter dramáiico. Um exemplo pernütir-
nos-á compreender melhor do que se trata.
O que mais impressiona nos desenhos das crianças pequeninas é a
constância, Íora de tôda experiência real, de tôda umâ séiie-de fantasias
concernentes à destruição do corpo e à morte. O fantasma de desmembra-
mento do corpo é constantemente representado. Como podemos expticar
êsse fenômeno? Para iso é necesário tetomar a gênese da percepção tlo
corpo e do objeto. Sabemos que a criança não tem, a não ser no finr
do priÍÍieiro anor uma noção global de seu próprio corpo, distinto do
corpo de outro. Sabemos igualmente que antei de reconhêcer o corpo de
quem está a seu ladq e principalmente o de sua mãe, a criança nãó tem
dêle senão um conhecimento parcial: rosto e seios em particular. No
fim do primeiro .anq ela deve elaborar dois traços mnêmicos que se
tornam ainda mais terrilicantes poÍque não têm sentido: suas lenibran-
ças de partes do corpq suas lembranças de desestruturação do êsquema
corporal, fora da crjse de lágrimas. Ora, essas experiênciai contradizem-se
com tôdas aquelas que lhe permitem colocar um signo verbal numa pes-
soa ou nuÍrr objeto. Não pensamos que se possa separar êsse processo
daquele muito precoce da organização da fase, na qual a criançá distin-
gue através de atos múltiplos a constância daquela qr. Âs lembran-
"g..
?+
ça§ dc objeto§ Parciaís tornam-§e elemento§ perigoso§ arriscando rornPer
a unidade e a permanência do sistema que se elabora, EIas se tornam
nega@o, destruição e morte: õ esconder-se dos objetos e encontrá-los, dçe-
nhar essa morte, imaginar ser aquêle que mata, para ter a impressão de
dominar êsse mêdo pela linguaçm interior e pela linguagem com outro,
do mesmo modo que essa me§ma linguaçm lhe permitiu encontrar com-
promissos com seus desejos impossíveis de serem satisfeito§. Progressiva-
mente, as imaçns de destruiSo do corpo ligadas ao fantasma da agresão
recíproca com a mãe que trcca com ela partes do corpo que podem
aparecer como boas ou más, transformam-se em angústia de perda dc
uma parte mais privilegiada do corpo, sob a influência «lo conflito com o
pai, cujo papel é agora reconhecido - mas esa é uma outra história. ..
O que mais nos preocupará aqui, é ver como, por um lado a criança
organiza fantasias conscientes tendo um valor homeostático e além disso
maturante; e por outro, como estabelece seu comPortamento, seus mcdos,
seus ritos, em função de conteúdos latentes que vão ter exatamentc a
mesma temática e que são elaborados progressivamente em função do
efeito tranqüilizante dos jogos e dos ritos, do efeito angustiante das expe-
riências realmente vividas, seja pelo fato de incapacidades psíquicas, seja
pelo fato de condutas ínadequadas das pesoas que a rodeiam.
Assim, o têfino Ídntdsma inconscienae pode ser mantido. Em tôdas as
produções espontâneas da criança vemos os mecanismos que acabamos de
descrever. Ora, mesmo para os muito pequenos êles têm um caúter lúdic<r
e contingente. Contudo, para o psicanalista que os obrerva, parece que essas
produções são caracterizadas por uma dinâmíca constante gue age no
comportamento. Essa dinârnica subjacente é característica de uma relação
gue tem um sentido, a um tempo, dramático e histórico. Estudando a
g€nese do Ego, pode-se tentar esclarecer as razões pelas quais êsses fan-
tasrnas tornam-se inconscientes. Nos primeiros momentos da organização
da vida psíquica, êles estão em contradição com o que a €xperiência en-
sina a criança, em outros têrmos, com o que se pode chamar os rudi-
mentos de seu Ego gue são o fruto de sua experiêncía, de seu desenvolvi;
mento e do acesso exterior da linguagem (reconhecimento e identificação
dos objetos exteriores, aquisiSo através da linguagem do princípio de
idenúdade, das noções de identidade e de estruturação temporal e espa.
cial). Por êsse tato, pulsões e traços mnêmicos terrificantes não aparecem
mais no campo da consciência, mas não perÍnanecem menos inguietantes
determínando tôda uma série de precauções e de ordenações por parte
do sujeito. Num segundo tempo, o sujeito acaba por se identificar com
o pai (ou a mãe, no caso da menina); os mêdos e os temores citados
acima determinarão o drama edípiano, cujas conseqüências são a impos-
sibilidade para a criança de guardar presente em seu espírito os s€nti-
5) frEUo obscrvou multo cêdo és6ê6 logos Íltuollstlcos do nenlno, Serve-se dêles pâÍa dc.
monstÍaÍ a exlstêtrc|8 de um lnstlnto dc mortc rutônomo (cÍ. Au-detà du Prlnclge dc Plol.
rtr ( lú) ).
75
ÍDcnaos de anlor ou de ódio que ncla se desenrolam. O início da liqui-
tlação dos sentimentos edipianoc leva a criança a ',descrotizar" pârõial.
mente suas relações com seus pais, sem para isto liquidar as condüras dc
tem,or que se segü-em, mesrno- se elas correspondem mais â uma represen-
tação consciente. encontr:rmos o recalque tal como- é des
-Nessc -estágio,
crito em clÍnica de adultos. A conrribuição da psicanãlise das crianças e,
é. preciso dizer, da.Escola inglêsa de MÉrexrr K-rrlx que retomou ai teo-
rias de Abrúam, foi moatrar que a organização do líconsciente não co.
meça com a rêsoluÉo do complexo de ÉdipO mas que existem elementos
do Ego agindo num sêntido idênrico, desdt o iníciõ da relago matenral
que nela própria contém os grrmes da ambivalência fundaúental.
7C,
Na série flg artigos publicados em francês sob o título Technique dt la
Psychanalysc, êle consagra um capítulo àquilo que se convencionou clra-
ru-_ar depois dêle de "psicanálise selvaçm" (ll): o material fornecido pelos
pacientes no curso de entrevistas clínicas tem muítas vêzes uma grande
riqueza e o médico prevenido eE relação às motivaçóes inconscientes pode,
a partir daí, compreender numerosas sobredeterminagões. Para aquêles que
não têm experiência da cécnica interpretativa, seria grande a tentação de
dar ao doente um conhecimento das causas superficiais e profundas de
seus sintomas e de seu compoÍtamento, tanto como de seus traços de ca-
ráter. Uma tal atitude só pode ter dois efeitos: ou o doente, assustado
pelas revelações que êle só pode negar, renuncia a manter contacto com
o médico, se é livre para Íazülo; ou então, diante dêsse tipo de material,
não lhe resh escapatória senão racionalizar tôdas as interpretações e se
tornar mais forte do que aquêle que tentou aclaráJos. Explicar a um
doente o determinismo provável de seus sintomas nunca tem valor cura-
tivo. Se ela é praticada com prudência e com um indivÍduo tendo uma
personalidade sufícientemente coerente e um interêsse positivo muito
grande, a interpretação pode permitir ao sujeito uma certa habílidade
ligada a um desbloqueio dos sintomas; êsse é um dos erros fundamen-
tais de um certo tipo de "psicoterapia de consciência". De qualquer modo,
o que chamamos organização inconsciente é toElmente outra coisa, além
de uma série de lembranças traumatizantes que constituiriam como quc
corpos estranhos, abcessos subconscientes supurando na consciência e além
dela.
Após seu primeiro esbôso da teoria do traumatismo sexual, Fnruu
ttcou muito interessado no fato de que muitoe pacientes pareciam ter
assistido ,às relações sexuais de seus pais, em sua inÍância. Do mesmo
modo, durante muito tempo, êle relaciona a angústia dc castração ao fat<r
de que, num momento ou noutro, o pai teria ameaçado seu filho de lhe
cortar os órgãos çnitais se êle continuasse a se masturbar. Muito disso
ainda permaneceu na segunda concepção freudiana do traumatismo
sexual. Entretanto, d€sde lÍ[5, na análise de "L'Homme aux Loup{' (17),
Fnsuo descobre gue a recordação da cena primitiva é de uma oriçm
mais complicada e que se trata mais da oqganizaSo fantasmática do pa+
sado vivido do que de uma lembranga realmenrc vivida. Mas daÍ o mo.
tivo para que muitos imaginem que a ação psicanalÍtica consista essen.
cialmente em que o paciente se lembre dos acontecimentos de sua pri-
meirr inÍância que êle teria realmente vivido e esquecido. Entretanto, é
necesMrio insistir um pouco mais sôbre o papel das lembranças.imaçns.
À medida que evolui seus conhecimentos no sistema de referência dos
adultos, o sujeito conhece sítuações novas cada vez mais complexas e as
vive com uma sobrecarg'a emocional ligada às experiências vividas arr.
teriormente que não podem mais se traduzir senão da mesma forma. In-
§istimos no taSo de que a mãe era "cercada" de maneira tal que ela re
um objeto fundamentalmente frustrante e angustiante O"r"
"
:-""" ;;
jeito. Quando êle reconhece e identifica seu pai, não pode ÍepresênraÍ
as relasões que existem entre seus pais num ouaro modo que não naquele
que êle está em vias de elaborar enrre si próprio e sua mãe. Essa t'edi-
pilica$o" muito precoce da relação do objeto é o tipo de elaboração
lora do tempo do pasado vivido. Mas as experiências quotidianas do
sujeito tendem a tranquilizáJo sôbre a gravidade do perlgo de perder
seu corpo e da peÍda real do objeto mateÍnal, ainda que tôda umâ pan:
te das relações dos pais entre si peÍmaneça oculta e contenha, por lsso
mesmq todo o interêsse e tdo o temor que anres estava ligado à perda
do objeto maternal. O interêsse precoce da criança por seús órgãos ge-
nitais (pÉnis, clitoris) dá muito cedo o definitivo caráter genitál à eisa
Libitlo primitivamente oral e anal; desde êsse momenro, oralidade e ana-
lidade não são vividas senão como qualidades da genitalidade e as relâ-
çôes dos pais entre si tomam caráter, a um tempo, terrificante e genital
que encontramos mais ou menos bem liquidadas nos adultos. Do mesmo
modo, a ansiedade a propósito do esquema corporal elabora.se progres.
sivamente em ansiedade localizada nas zonas erógenas - essencialmen.
te na zona genital. Ainda que ela esteja ligada à atitude maternal,
no menino torna-se ràpidamente ligada ao seu conflito com o pai em
razão dos processos de identificação e do interêse da criança pelas rela-
ções seüetas dos pais. O resultado de tudo isto é que incidentês aparen-
temente desprovidos de signilicação e es,quecidos dos pais bruscamente
tomam nessr neoorganização do passado vivido uma significação para a
criança, que reenconrÍamos como "lembrança traumatizante" no adulto
que analtzamos. Tudo se passa como se o sujeito vivesse com a lembran.
ça terrorilicante de ter assistido as relações sexuais de seus pais e de ter
sido ameaçada de castração por seu pai, e isso tanto mais que êle seria
privado dos meios habituais que tôdas as crianças têm de se defender
contra êsse tipo de angústia (desenvolvimentos harmoniosos dos meios
instÍumentais do Ego, círculo familiar oferecendolhe imagens coerenrc$
e tranquilizadoras) . Êsse exemplo da elaboração progressiva do passado
vivido mostra que o trabalho do analista não poderia atingir a revelaçãcr
de uma história da primeira infância do paciente porque os primeiros
anos de vida são marcados por uma série de reestruturações do pasado.
De restq essas experiências vividas, assim construldas, se atualizarão em
todo momenro importante da vida do sujeito quando a identificação ter-
minal com a imagem que êle fêz do pai (ou da mãe, no caso da me-
nina) vai ser recolocada em causa e quando êle irá afrontar as "lem.
branças" angustiantes Iigadas à asungão de suas posições de identificação.
É asim que a puberdade e as primeiras ejaculações, assim como a apari.
ção das regras, cada estágio da vida genital, os sucessos escolares e univer-
sitários, a entrada na social adulta, - são momentos em que se poderia
julgar da boa ou da má integração do pasado. o
6) LembrÊEos à êss-c ,cspclto quc âlgúD! pslcanallslas, spolando-sc na t.orla do campo ope-
raclonal dê NURT LEwlN, apÍcsê[taÍD â Drállcâ pslcânslltlca cottlo o írulo de ullâ lcorls
gcnétlca e ahistóÍlca (EznrEL ê SUrHEÂLr"rlD (ô) ).
78
- - Um exemplo mosrará como se organiza o Inconsciente em cada um
dêsses estágios. Retomemos o caso maii clássico de uma doente possuida
de uma fobia .de lfpulsão de matar seu filho, ainda que viesie dar à
luz a um menino. Na sua análise descobriremos que tôdas as anteriores,
experiências vividas se reprojetaram numa série de acontecimentoo trau-
matizantes ligados à sua vida genital; êles são atualizados. É através das
experiências m.ais r€centes que descobriremos a significação e o pêso de
seu- passado intantil. A rememoraSo da primeira infância se farâ essen-
cialmente na atual, Sabemos, por outro làdo, que é em razáo dêsse fenôi.
meno de uma potencializa@o do vivido atual em função de lembranças'
inc_onscrentes, elas próprias reorganizadas em formas sucessivas, que a re.
lação médicodoente toma um valor determinante e que se cria á rehção
_possÍvel ir mais lonç €m n-ossa descrição do-as.
transtêrencial. Mas não é
pecto clÍnico do Inconsciente sem olhar agoia o gue é a intérpretação
psicanalítica e como pensamos que ela aç. Já temoi feito atusõej ao fáto
de qu-e.ela está longe de ser uma revClação inrelectual, uma hipótese
patogênica comunicada ao doente.
Uma das obras de FnBuo mais lidas e com razão
La Science des Rêves (8). Todos pensanr-que o estudo do - éInconsciente
certamente
79
que muito o espantou: êle comete uma fraude numa sala de hospital (s&
Ére a blusa luai a marca distintiva dos estudantes do rcr); êle tem vergo
nha por se aúar num luqar onde não deveria estar. No meio da sala, um
cirur'gião opera uma mulf,er: corta-a com uma grande faca de coÍtâÍ Gar'
ne - prato que o nosso paciente aprecia particularmente. Nesse momento,
-que
êle reãonhecã com pavoi que é suã mãe está sendo operada. Acorda
muito desgostoso, tórna a ãormir e tem imediatamente- o sonho -seguinte:
êle beiia úa irmã na bôca, mas dela sai um chouriço fecal que lhe entra
na garlanta. Êle acorda atlito e com uma sensação intensa de suÍoca-
men*to,-Está muito desgostoso por êsses dois sonhos que conta com-grande
repugnância e só o leúbra pára explicar'nos e que Ponto os sonhos são
ausuidoe e sem a menor significaçáõ. Ora, é claro que se pode encontrar
no que nos foi contado pol êsse doente, todo o-seu drama inconscientre,
assiri como as razões dê sua impoesibilidade de se identilicar a uma
imagem paternal viril, seus desejós vergonhosos diante da cena primiti:
,r, íu" côn.epção sadomasoquistâ das rêlações entre homem e mulher, a
importância àós desejos oraii em seu interêse -genital, etc. Foram pre'
cisôs três anos de análise para que cada um dêsses acontecimentos to'
masse um sentido para o pãcientê e que êle pudesse modificar os meca-
nismos de defesa muito êstruturadoi que tornavam totalmente incons'
cientes as pulsões sustentando êsses sonhos.
Isto nos leva agora a tocar de mais perto o problema da interpreta'
ção em psicanálise.- Uma das técnicas mãis freqúentemente empregadas
ielos pslianãllstas é aquela que consiste em mostrar, numa sequência do
iraterirl, as ligações {ue existem entre seus diferentes elementos' Êsse
método dá urn-séntido à expressão do material na relação psicana'lítica.
Êle se apoia sôbre o trabalhb do Ego f-ace aos desejos -pulsionais. Os pa'
-mesmo
cientes, entre os mais prevenidos, ficam geralmente esPantados
.om esias aproximações que prdduzem verdadeiras mutações no- material.
S. N.lcir, em muitos dos seus exritos técnicos (29), falou de ensinar
ao paciente seu "oIlcio de analisado Quando o analista intervém nessas
condiçõer, a revelação que ela dá ao"paciente_ é uma das gratilicaçóes es'
senciais compensando ás Irustrações iistemàticamente impostas'
Fntu» támbém insistiu na importância do trabalho associativo, qua-l-
quer que seja o valor que se dá-à regta lu-ndamental da associação de
iàéias.'Êsse óto.eoo é esi,encialmente o trabalho que êle intitulava: "lem'
brar-se, remêmorar, elaboÍar" (12). Fnruo falou da elaboração interpre-
tativa; de fatq tôda uma intervenção do analista Provoca efeitos estru'
turantes ao mesmo temPo que desoiganizações. Na situação de transferir,
essas intervenções podeni sei dirigidaã numá base histórica e é a referência
constante ,o tontêúdo explicitaão pelo material das sessões - ao Preço
da posição do Ego em facé dessas siiuações, -às organizações sucessivas que
nad sãd senão a €xpressão das estrutuias do Ego -- que se aplica êesd
têrmo de elaboragãô interpretativa' Ela não chega fo-rços-amente ao {a'
moso levantamenó da amhésia inlantil. A reconstrução do passado é o
EO
produto <Ie um cruzamento do "insight" que êle PróPrio a favorece Por
seu lado.
Ainda que não obedeg a uma planiticação rigorosa, o psicanalist'r
deve seguir úma certa linha diretriz que evite dar ao seu tratamento u;11
caráter iaótico. É porisso gue, em numerosos textos, fala-se da necessidadr:
de interprehr na'ordem: 'das camadas mais superficiais às mais- profun'
das. . . Írata.se evidentemente de um esquema grosseiro. Quando o pst'
canalista tala cle interpretar o que é superficial, êle quer dizer o que Ó
capaz de ser aceito no sistema éonscientê de referência, mas aceito nãq
si§nitica que o sujeito deva concordar com a interpretação fornecida. Nr
midida mlesmr em que seu Ego se adapta à sua dramática pulsionaL ó
geralmente por uma-denegação viva que o paciente vai reagir à revela-
ção do que por comodidade chamaremos 'g que está perto .do conscte_n-
ie". Mai essá denegação viva mostràrá precisamente que a interpreta@<r
e plcna de sentldo para o indivíduo, que ela faz alusão à tendência cotr-
trà a qual êle luta- mais vigorosamente. Sabe-se que essa denega@o fre-
qüente-mente tem um encadêamento associativo que conduz à tomada dc
cbnsciência da verdade contida na interpretação. Se é verdade que o In-
conscienrc não conhece a negação, é ígualmente verdade gue o sujeito
conhece, de início, seu Inconsciente através de uma apaixonada denegaçãc,.
A psicanálise não é uma interpretação de conteúdos nem de símb<>
los. De- tato, a regra técnica que foi especialmente Posta em luz. depoir
que os psicanalistas se interessaram no gue se chama o Ego,, exige -qtle
sà interprete as resistências antes do conteúdo que elas encobrem. Senr
entrar em detalhes técnicos, contentar-nos-emos em lembrar que exisrc
uma ligação entre as defesas e as pulsões, gue essa ligação é inconsciente
e que ãs'defesas se constituem em formações reacionais que negam [re'
güõntemente as pulsões e cuja signiticação tem por isso um caráter in-
ionsciente. Um e-xemplo tornârá úenos àustera eisa exposição e Penuiti'
rá ao leitor situar mélhor os elementos. Uma médica se faz analisar por
desordens bastante graves de caráter, comprometendo a sua vida femi'
nina e sobretudo, o desenvolvimento harmonioso de seus filhos. Essa mu'
lher está muito interessada em psicologia e psicanálise; tem grandes co'
nhçcimentos teóricos sôbre êsses temas' Ela dêseja curar'se o mais rápido
pdsível e, descle as primeiras sessões, declara quê sabe gue o§ mecanismos
ile detêsa e as resisaências podem tornar a análise extremamente longa,
que êsse não será o seu caio e que ela vai se esforçar por abolir tôda
rêsistência. Faz então um inventário detalhado de sua vida sexual, às
vêzes enrubecendo e assinalando que está embaraçada por falar assitn.
Descreve o que lhe dá prazer e o que lhe dá menos prazer; recorda de
suas prtmeiràs emoções sexuais infantis e em Particular de seu interêssc
homossexual pol sua mãe; pergunta-se se essa homossexualiclade está crn
relação com ã diticuldade que ela tem em encontrar companheiros mas-
culinos que a satistaçam. O- que ela absolutamente não vê em tudo isto,
é que se- ela se exibe assim, é ünicamente 'para mosttar ao seu analisÍ;t,
EI
que el'a e tão viril quanto êle, Pois não tem mêdo de {alar de sexualidade,
que ela é melhor analista do que êle, pois acredita poder derrubar suas
próprias defesas; numa palal'ra, que ela não Pode se identilicar senão
com um personag€m extremamente forte e íntegro. O comportamento
dessa doente, na análise, será determinado por essa preocupação - total-
mente inconsciente - que tem um sentido muito preciso no seu passatlo
vivido. Contudq a panir de quando poderá ela sublinhar o que sc po-
tleria chamar sua reivindicação fálica? É de experiência corrente que tôda
alusão à essa posição, se é prematura, não leva senão ao serr recalque. É
que a doente, em sua relação transferencial, vive sob um duplo tenror':
temor de uÍn2 agressão contra seu corpo - e ela tleve se delender clisso
(eÍeito dinâmico) , e temor de ser frustlacla pelo analista como acredi-
-ta ter sido na sua inlância (eleito econômico) . A prática da análise rnos-
tra a ineliciência da interpretação, enquanto a doente não tenha pleen-
chido uma dupla condição: a) ter vivitlo suÍicientemente, por muito
tempo, a aventura analítica parâ que se tenha criado uma experiência
corretora relerindo-se à persistência da integridade de seu corpo e do
analista; b) aúar-se suficientemente gratiÍicada pelo analista para aceitar
privar-se dessa contribuição fantasmática que constitui a reivindicação
Iálica.
Não é suficiente reconhecer um Inconsciente descrito nô sentido hu-
mano; é preciso igualmente reconhecer uma implicação dinâmica e eco-
nômica para que êle tome sua forma real, tal como é percebida pelo
analista que aceita viver muito tempo a experiência com seu doente para
nêle âpreendeÍ uma outra coisa e não o corte instantânco que perdeu
o essencial de suas qualidades.
tsse exemplo mostra que no pÍocesso analltico está tôda a organiza-
ção econômica e dinâmica sôbre a qual, histôricamente se constituiu a'
dimensão relacional da personalidade implicada no pÍocesso analltico: a
história e as vicissitudes da transferência sãô precisamente feitas de unta
projeção externa das relações vividas com o objeto internalizado - a
atirude do analista permite o seu deslocamento. Assim, a relação objetal
cuja gênese foi estudada acima, e que repousa no deslocamento das pul-
sôes a partir de sua expressão biológíca àté à sua expressão num contexto
psicológicq enconra ,i"s ertrutrrrs- inconscientes dâ personalidade o íeu
modo de expressão clinica e justifica o man'ejo técnico do qual um exen-
plo acaba de ser dado.
Tudo o que acabamos de dizcr sôbrc o perigo da interpretação intenr-
pestiva dos conllitos profundos, sôbre a necessidacle cle rrm trabalho ela-
borativo, sôbre a tomada em considelação da significação atual e histó-
rrca do trabalho associativo, sôbre a.importância de uma certa planifica-
ção do trabalho psicana'lítico, sôbre a justilicação daquilo que se chama a
interpretação do superlicial para o profundo, - mostra que a ação do
psicanalista tende ao alargamento tlo "insight". Se se refere ao ponto dc
vista tópico, pocle-se consiclelar que se tÍata, essencialmente, de um des-
82
locamcnto de energia blogueada no Itl em clireção ao sistenra do pré-
consciente, aquêle onde os traços mnêmicos podem se descnvolver c onde
a percepção e a consciência podem represcntar um papel no teconheci-
mento da verdade histórica daquilo que o sujeito experimenta.
83
monstra que êle não é nada disso e que êsse estado paÍticulaÍ do son,o
modifica sômente a forma da tomada de consciência e da elaboração pelo
Ego dos desejos inconscientes segunclo Leis bem conhecidas.
b) Demoraremos muito tempo em cerras experiências vivitlas sc-
gundo um modo particular, como a experiência delirante prinrária. Se
sua descrição fenomenológica já foi feita, é útil contudo, lembrar suas
relações com os processos inconscientes. Podemos deÍini-los como a sd-
brecarga das representações conscientes por tôda uma série dc significações
de origem inconsciente que atinge trrdo o que se rorna significativo para
o doente. Não empregamos o rêrmo "significativo" no sentido de um.r
consciência clara de uma signilicaçÍo, mas para indicar que nada do que
a rodeia é banal ou indiferente, que tudo se torna obscuramente "blo-
qrreado" e perigoso. No curso da evolução da criança, cada nova aquisi-
çãq quer seja no mo(lo perceptivcmoror ou no modo mais elaborado do
conhecimento, ó bloqueada libidinalmente por um deslocamento e uma
elaboração dêsse interêsse que a criançâ tem desde o inlcio pelo persona.
gem maternal. Num segundo tempo, suas atividades se aurontatizrm e seu
bloqueio diminui assim como o de seu objero. No curso da experiência
delirante primária, a descrição clas modificações esrruturais da consciên,
cia ? não daria senão uma idéia incompleta do clesenrolar dt.amático, sc
não devesse levá-la na conta (lessa significação nova, dêsse bloqueio nôvo
de tudo o que rodeia o sujeito. É o que em linguagem psicanalÍtica re
descreve com o nome de plojeção clo Id na realidade, o que equivale a
rlizer que o mundo no qual o sujeito vive torna-se mais oú menos conr-
pletamente objeto de desejos impossíveis, Ionte de ameaças e de tenrores,
no inlcio inexprimíveis.
Rápidamente, o Ego do sujeito pode intervir; consideremos t» siu-
tomas psicóticos, que então apal ecem, como um efeito secundário entran-
do no quadro do que é habitualmente chamado de mecanismos de defesa
oo Ego. Mas o qtre nos parece dever ser sublinhado aqui e o que justifica
ésse desenvolvimentq é o fato de que a temárica e a dramática incons.
cientes não são modificadas pelas modificações estruturais re;rresentadus
por êsse momento lecundo da elaboração delirante. A moclificàção passa.
geira ou crônica da estrutura da consciôncia não mais intet.venr úbre o
lnconsciente do que o real tlo sujeito normal. Vimos que Fnuuo descrc.
via uma sobrecarga de representações pré-conscientes pelãs pulsões incons-
ctentes. Na experiência delirante primária, exisre uma sobrécarga idênticlt
das representações conscientes.
_ Que sabemos nós sôbre o determinismo dêsses estatlos? Todos os que
tôm uma certa prática de uma psiquiatria ativa têm a convicção de que
não se pocle encontrar o modêlo explicativo simples e unicista. Toâr.:s
sabem que numerosas alterações de ordem física podenr descncadear es-
tados de consciência turvada, qualquer que seja a fôrma precisa. No curso
dêsses estados, se o Inconsciente não Íoi modificado, seris efeitos sôbre a
8.1
organizeção do campo da consciência o foram. No vivido do doente, essa
evollrÉo tomará um sentido nôvo em ÍunÉo de seu Inconsciente, que terá
rrma nova organização das clefesas contra o mêdo que permanecem rJra-
matizadas em função dêsses temas que descrevemos sob o nome de Íart-
(asmas inconscientes, do jôgo de satisfações e das Írusrrações que o indi.
víduo se permitirá, em função mesma dêsse mêdo. Entre essas satisfaçõeE,
a existência de sintomas-defesa contra o mêdo será para o sujeito uma
satistação narcisista. Tôda essa reorganização torna-se, por seu lado, pa-
tógena, pots ela tixa o doente num nôvo tnodo de ser que preserva, en.
tretanÍo, todo o seu senti(lo em relação aos desejos e aos mêdos infantis.
.L,ntretanto, certos estados de consciência turvada podem parecer muito
mais ligados a êsse equilÍbrio Íundamental da pessoa do que a um pr<>
cesso orgânico estranho. Certas organizaç.ões psíquicas podem ser com-
preenclidas pelos acontecimento{i exteriores colocando o indivÍduo em si-
tuação pcrígosa, ísto é, tazendo-o viver uma cxpcriência particularmente
angustiante em [unção de seu passa«lo vivido ou modiÍicando brutalmen-
te o equilíbrio econômíco das satisfações e das frustrações. As pessoas nor-
mais e sobretudo os indivÍcluos neurtíticos têm poderosos mecanismos de
cletês2 qug os mantém afastados clêsse
tipo cle situações vividas.
A observação dessa jovem mulher que nos foi encamínhada com um
sintoma de anorexia mental grave fornece um exemplo interessante: nos-
sa equipe hesitou por muito íempo em dar um diagnóstico estrutural
cleÍrnitrvo - histeria ou esquizoflenia. Annabelle apresentava, além de
sua anorexía mental, graves taltas no comportanrcnto: cóleras clásticas
com destruição compulsiva de objctos, fugas, afetaç:io. O início da anore.
xia mcntal remontava, segunclo ela, à iclade cle 12 anos: ela ainda experi-
tnentava-a, quando anrrnciaram,lhe a morte de sua avó, o que a deixou
de início muito indiferente. No clia seguinte se <lesencacleou uma crise
tle ansiedade difusa com a idéia de que tinha comerido uma falta gravc.
Seus pais descrevem êsse prirnciro a(esso como um estado de agilação
ansiosa, com semimutismo e um comportamento incocrcnte. Êsse estado
se dissipou depois de alguns d ias, mas clesde êsse momento a doente tevo
um comportamento alimentar muito anormal com altcrnâncias de ano.
rexia, de rituais alimentares muito complicados e de bulimia. Entretanto,
ela terminou seus estudos sectrn<lários, passou no "baccaulauréat" com str-
cesso, cmpreendeu esttrdos cle lctras, interrompeu.os bruscamente, aínda
qtre sua licença estivesse qllase terminada, deíxou sua cidacle de província
onde vivia com sua família para ir à Paris seguir o curso de arte dra-
mática. Mais tarde ela nos disse de seu grande prazer em representat. Serr
desejo de 56 atastar de seus pais motivava, em parte, sua mudança de
vitla. Ela se sente muito embaraçada pelo caráter erótico das propctas
vindas clc scus professôres e alunos do curso. Sente-se muito confusa du-
t'ante êsse período, ainda mais que tôdas as suas amigas têm igualmente
comportamentos alimentares singulares (pois não se cansa de dizer.que a
85
obesidade é pouco compatível com o oflcio de atriz). Um dia, um colega
esboça um "Ilirt" com ela, de aparência banal, o que desencadeia nela
imediatamente uma experiência delirante: sente-se perdida, está segurâ-
mente grávida, tem muito lbliculina no corpo, tudo se torna ameaçarlor
em tôrno dela. Foge de seu domicllio; erra por Paris e acaba por voltar :'r
província em casa de seus pais onde chega fatigada, sem bagagens e qrra-
se muda. Trouxeram-na até nós nesse momento. Decidimos tratá-la p»lo
psicodrama, Não entraremos aqui em cletalhes dêsse tratamento; lnas lo
curso de seus cloís primeiros anos a doente tem duas recaldas em circuns-
tâncias idênticas: a cada vez que tinha uma aproximação sexual corn urr
homem. Âcabou, com efeito, por ter verdadeiras relações sexuais conr um
homem que ela ama, mâs que, residindo no estrangeiro, só pôde vê.lu
râramente. Por cluas vêzes ela vai encontrá-lo no estrangeiro e volta ern
plena experiência delirante, desta vez muito mais organizacla, mas desen-
rolandose sempre sôbre o mesmo tema: é perseguida pela polícia que a
suspeita de atividades subversivas; as pessoas que encontra têm um com-
portamento bízalro e a espionam; vaga pelas ruas, chega até o domicílio
cle um de nós, mas na escada sente um oclor de morte, tem a intuição cle
que o médico está morto e que ela é responsável, não ousa apertar a
campainha e acaba por ir se confessar ao comissário de policia que a
hospitaliza. Durante êsse acesso ela apresenta, alérn do mais, um sintoml
alucinatório auditivo de tema idêntico. O habitual de seus acessos é tle
se resolvelem ràpidamente; a utilização precoce de neuroplégicos permi-
ae.nos continuar seu tratamento, malgrado êsses incidentes, Não insis-
tiremos no "happy end" atual da evolução, pois essa doente, tendo Íeito
grandes progressos, leva uma vida social, sentimental e sexual pràticamen-
re normal. É a cada vez que Ânnabelle se aúa numa situação clesenca-
deando um grande mêdo que a coesão de sua apreensão do real se destroi
e tudo se torna significativo em tôrno dela, em função dêsse mêdo c tlc
sua incapacidade de aceder à sexualidade normal que não deixa de clesc-
jar conscientemente. Ê a incapacidade de atlaptar suas pulsões incotts'
cientes contraditórias à certas situações previlegiadas, que desencadci:r
uma desestruturação da consciência. A moclificaçáo de sttas defesas diante
de seus desejos edipianos, sub-entendidos pelas pulsões pré-genitais olga-
nizadas (como o desejo perigoso de incorporal o objeto parcial (pênis)
tlestruindo o corpo materno), é o Írnico elemento que lhe tem permititlo
seus desejos amorosos sem reviver os estados de angústia que desctevemos.
Mas de qualquer maneira, quaisquer que sejam as origens, tôdas cs-
sas experiências vividas em consciência turvada tomam um sentido ent
tunção da or§anização inconsciente; e fregüentemente é necessário motli-
lrcar, por uma psicoterapia apropriada, a nova organização psicológica
que arriscam a se opor a um retôrno ao modo relacional normal, mesmo
se os'Íatôres nãopsicológicos tleixarem de ser eficientes.
86
CONCLUSÃO
87
a
ci€nte, e transferência não é uma simples repctição do passado, mas é
também um ultrapassar que com o tempo leva ao doente suficientes grlr
tilicações e a segurança para que a tomada de consciência
- pela verba;
lizdção - dessa rêde de signiÍicações se torne possível. Mas essa dramá-
tica tem sempre uma dimensão central que representa a diÍiculdade maior
da evolução do homem. Por que êle é prematuro; porque muito cedo êle
concede à percepção de uma forma individualizada e reconhecida como
tal, um valor que ultrapassa sua significação biológica e que é, de Íato,
uma [onte permanente de prazer - o emor maternal vai estar na oriçnr
dessas incrlveis complicações que Frruo Íoi o primeiro a descrever. Inter-
ditada, essa fidelidade vai turvar sua vida sexual. sendo um dos agenres
meis e{icientes dx olganização de sua vida social. A sexualidade, através
de seus avatares, aparece-nos como o elemento inconsciente qlle vem esti-
mular tudo e tudo molestar, o que não significa. bem entendido, que
tudo é sexualidade. Ela colore as sucessivas situações vividas; ela deter'-
mina no homem suas ações mais elevadas, como seus entrâves e selrs
mêdoc menos defenslveis, Pouco nos importa que esta não seja uma mo-
tivação vital - como o obseÍva H. Prrnot (27) - pois 1>recisamente o
próprio do homem é ser animado por uma loucura que o leva a preferir
deveres inúteis biolõgicamente, mas que lhe dão satisfação num domlnio
que lhe é próprio.
88
a
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sr§, XXXÍV, 2, 1954,89-97.
89
ÀS PULSÔES E O INCONSCIENTE
Fnescols Prnrun
90
Insistinrlo dcstlc srra introdução, por um lado, tra natureza inicial das pul-
sões, e por outto, na teoria psicanalítica do Ego, o qual aparece "como
trma organização do inconsciente" que "se estrutura progressivamente a
partir dos blo<lueios pulsionais sôbre o objeto", os autores mo§tram'nos a
órientação cle sua lrsqtrisa. Se êles lembram que a teoria da libido leva-
nos, com os estágiós dã sexualidade infantil, aos fundamentos biológiccs
da vida rnstíntil'a, é para melhor evocar os ptincÍpios mesmoo de uma
:lção terapôutica que acenttra menos a interpretação dos conteúclos dcr
rltre os coirccitos estrtrttllais a obter no Ego, jogantlo sôbrc a clinâmi<:r c lt
c< onomia pulsional.
92
radrcalmente heterogêneo e que seria aquele de um imaginário em estado
puro, em rclação com as categorias da "linguaçm adulta".
Isto leva.nos, por outro lado, a interrogar sôbre o uso quc é feito,
aqui, da noção de mêdo. Parece.nos que uma criança não poric tcr mêdo
senão na uredida ern que as coisas têm já um s€ntido para ela; o inomi-
n:ivcl não podc críar senão a angústia no insucesso mesmo de uma tcn-
tativa de stmbolização. O mê<Io que daí clcriva - e é um fato patcnte na6
tobias - não é senão uma meclida de defesa óntra a angústia, assim conur
sc sabe depois do pequeno Hans. Com relação à qrrestão çlo corpo des-
rrtembrado, etrr que momento ela tcm mêdo? Patece.nos quc é após o
descnvolvimento lúdico dos [antasmas, quanclo nas imagens que ela desc.
rrlra ou modi[ica a criança encontrou o caminho da siurbolização e o
domÍnio de elementos signilicativos no manuseio sádico que é seu nrorlo
<lc expresão. No nosso entender é nessa perspectiva qrre rccebem todo o
seu sentido as proposições de MÉr,lNrr Kt.t:tN: t "O saclismo cru seu ponto
culminante, e a ltukão cpistemofílica quc a|arc(c ao mcstno temPo quc
o sadtsmo, têm por objeto o corpo da mãe e seu conteúdo imaginário."
Qrrer dizer senão que êsses são elementos de signi[icação, representaçõcs
signiticantes que são promulgadas pela criança para estrutural' seu mun-
do, um nrundo que muito cedo tenta se triangularizar, "edipíaniza-se" . . .
na tlireção do objeto parcial que prefigura a procura dos falos? O sadismrl
ncssc nível nfut é, no nosso entend,cr', senão o prolocolo imaginári<t do
processo mesmo clo simbolisnto. É, em outros têrmos, o que diz MÉr.exru
Klerx quan«Io assetura que "a realidade prinritiva da criança é totalmen-
te fantasnrática" c que é o curnprimento dos estágios dos fantasmas sádiccx;
(e epistemofílicos) que condiciona a relação ulterior cour o mundo. Di-
zendo de outra Íorma: a estruturação simbólica precede e condiciona t<xkr
acesso à realiclade exterior.
Ir mais longe agora justificaria, por um lado, uma exposição sôbrc a
estnrturação da linguagem e só poderenros enviar então ao (exto de I. L^.
pr.ANcHE e S. Lrctlrns, que é consagraclo a essa questão. Ist«r scria, grr'
outro lado, voltar a explorar a teoria dos instintos, seÍnpre para scr Íeita
e releita segurrdo as palavras do próplio t-nsuo. Contentar'-nos+tuos, lxrr
nosso Iado, com algumas considerações úbre as pulsões, para evocat sobrc-
tudo o problema do dualismo, as perspectivas ditas econômicas e o enigm.r
da pulsão de morte.
95
obscuritlatle e na com;;lexitlade de certos texros {undamentais; nas arru-
nraçõcs sucessivas que tlão elasticidacle à pesquisa; nos regisrros não passi-
aeis de superposiçào nos quais, no grau de tal especulação ou observação,
s€ tem leito o uso do conceito cle pulsão, Nos trabalhos pós-freudianos as
corsas se complicam, pois é preciso ter em conaa as seleções inevitáveis
que cada qual opera pàra acentuar êsse ou aquêle aspecco da doutrirra
ireudiana.
Fonte, f6rça, lim, objeto das Pulsões; essas proposições sempre fuu.
damentais Iacilitam, por exemplo, as definições parciais. Assim, a pulsão
serve-se de boin grado da etnologia quando se trata de mostrar sua natu.
rera e seu lim. Serve-se da neurobiologia, quando se trata de situar suas
lontes e sua aparelhag€m orgânica. Serve.se da físicoquímica quantitativâ,
quando se trata de lelar em conta a sua fôrça. Recorre ao vocabulári()
de um certo psicologismo, quando se rrata de esboçar seu objero. Recorre
à filosofia quando se trata de evocar Eros e 'fânatos. Ao constatar a
ntultiplicidade das referências, é preciso dizer que se é tentado à escolher'
a sua, E é o que queÍemos evitar, pois parece-nos gue o que cspecifica o
conceito de pulsão em sua originalidade fundamental, C a nêcessidarle
que se tem de colocar juntas tôdas as re{erências precipitadas, para dar
3 inteira signilicaSo dessa "Trieb" inrra<luzlvel, à qual em lingua fran-
cesa (e portuguêsa) não podemos opor senão um neologismo, uma pala-
vra sem história e sem plurivocidade. Não é suficiente, por exemplo,
dedarar que a palavra instinto não tladuz "Trieb", para ntedir sua saída
das relerências etnológicas que podem, em um certo nível, assinalar.nos
por exemp)o, condutas animais e a narrrreza imaginária das coaptações
putsionais.
O mais que é preciso dizer é que no nivel humano todo imaginário
é insepaúvel de seu significado e que ôsse signilicaclo confunde.se com a
aparição da linguagem. Portanro, a referência ao instinto rem por inte.
rêsse delinir a utilidatle, mais a insuliciência da recorrência ao modêl,r
ctnológico; assim, pode-se rejeitar tôda assimilação cla pulsão à sua fonte
orgânica, e da economia pulsional à trma biologia tlo inst.into. Essa fonte
orgânica nos é útil, de fato, parâ sublinhar que as esrlururas do funcio-
namento psíquico reproduzem, em seu nivel, os esquemas frrndamentais
tlc aparelhos somáticos identificatlos e isolados, pois recorrhecidos pol
outÍo, .isto é, já inseparáveis de uma simbolização. Não é, 1;ois, com unl
torpo real que temos que lidar nessa perspecrir,a, não mais rlo qtre ô pro.
blema dualista da articulação ent! e sortla e psiqtrê, mas j;i corrr :i rlerífoÍa
que ;rocleria ser escrita assirn: S'
s
Para tlar rrm exemplo, servintlonos do estágio oral, poderiamos pr.o
l)ot S' introjeção rlc rrma imagem
para pôr em fónnula não a
S absorção cle rrma intagem
?) Cf. o tr-\to de ,. L^pl.Âxclrf € de §. l-rcr.ArRE
91
rcal,dfide , rnas um rrrodo de conccitua lizaçã«r do clcsenvolvimento psiquico
a partir da hipótese da pré-maturação, isto é, da etotiução dos aparelhos
da vicla relacional <Ia criança. De [ato, o que é criado é um duplo tecido
de significantes com o fim de Íundar uma combinatória que permita, a
pertir do princlpio de prazer, dar conta do progresso pslqrrico, das fixações
libidinais, da vàriabilidade dos objetos, dos deslocamentos e das condetl'
sações; como permite dar conta da translbrma$o das pttlsões nas PerÍnu-
tações espontâneas ou sistemáticas dos significantes em causa. r Ao insistil:
deide então, no fato de que uma pulsão não tem sentido e cxistência
próprias senão em sua ligáção com um tepresentante.ÍePresentativo; que
rietá mesma, ela não é nem consciente nem inconsciente, nem suscetÍvel de
ser apreendida em sua essência, nem recalcável, volta-se simplesmente aos
dados freudianos fundamentais que nunca foram repudiados pelo autor
e que perrnanecem necessários para a definição do inconsciente. O estudo
de J. Lerrexcns e S. Lrcr,lrnr, é muíto explícito nesse pon[o Para que
insistamos mais.
3) Rcler í êsse oíooóslto, o terto de FREUD, I-€s traílíorfiotions des Pulsions poÍticuliàrc,ncítt
dols t'titotisúe anol, Rcv. Fr..le Psych., 1928, no 4, p 609.
95
do mistério provocante de Eros o objeto de uma ciência? Como inventar
os elemenlos de um saber, de um ter conhecimento, nesse plano do incoDs-
cienre que é o da Aporia, mãe mlstica e platônicâ de Eros? Êsse é o pr<>
blema ao qual se atém FIEUD, sem mêdo de escândalo, mas sem compla-
cência para com êle, e dependendo do que êle é, para com suas próprias
resrstências. E então?. .. Se a pulsão não pode ser delinida fora de sua
ligação a um representante-tepresentativo, qual "Vorstellung" escolher
para nnir a Trieb a alguma coisa de manuseável em todos os casos e enr
todos os domínios? Parece-nos que o único "Íepresentânte" que po<le dirt
conta do tenômeno subjetivo pulsional, sem particularizáJo, que posa
neurralizá-lo, deserotizá.lo s€rn matal seu movimenro, é o da quanridado
tle energia. É êsse, pois, um conceito intlispensável à teorização, o que não
quer dizer que em qualquer caso sejâ utilizável ao nivel da cura na rela-
ção terapêutica. Notamos que se encontra, por ourro lado, na Esquisse e
nas cartas que comentam sua êlaboração, o embaraÇo ern que se encontr:l
Fnru», quando se vê obrigado a passar da quantidade à qualidacle para
tlelinir essa lunção de um sistema de neurônios.r
Ê numa relerência mais hegeliana do que freudiana que seremos
tentados a propor uma modificação dos têrmos, para intlicar que, em nosso
ententler', a quanudude deue ser cnlendida como qualidatle: como pre-
crsão prirueira e imediata da pulsão.5
Agora podemos ir mais longe e ver como se insere o conceito de pulsão
em ludo o que em psicanálise se refeÍe ao ponto de vista econômico. A
êsse propósito, uma primeira observação nos levará a denunciar a Ireqüen-
te conlusão entre energia e economia pulsional. O conceito de energia, sc
remete-no§ ao quantitativo, remete igualmente a essa noção de transfor -
ÍlaÉo, de deslocamenro que, a partil do princípio .de constância, é abso-
lutamente necessário a Fnruo para dar conta de tôda a cinética, de tôdas
as permutações, condensações e deslocamentos que fazem a vida do lrr-
consciente. O conceito de energia ó, êle tanrbém, admiràvelmente escolhi.
do para objetivar, scm deformar ou sem particularizar, tudo a«1uilo cle
que o obseryador psicanalltico deve testemunhar se quer dar conta dêle
no nlvel relacional do diálogo (e antes de tudo do que é o deslocamento).
Com as referências lingüísticas temos agora outras conoraçôes possiveis.
O uso que Fnruo {az, ao longo de sua obra, da expressão "ponto <le
vista econômicn", exige outros comentários. De maneila geral, parece-nos
e isto não é aqui senão a evocação de urn estudo que desenvolvernos
-noutro lugar - que a promoção das referências econômicas é sempre ulr
úhimo recurso, quando o teórico otr o clínico chocam.se com um enigma.
96
Isto faz pensar gue s€ tem tôda a possibilidade de encontrar nesse modo
de explicação o inarticulado ou o insatisfatório de sua pes,quisa.
No plans teórico, será suficiente enviar ao texto de J. LeruxcHe e
de S. LrcLATRB para evocar com êsses autores, a preocupação em que sc
encontra l'ruuu de aprofun<lar a distinção topológica entre consciente
e inconsciente por uma diferença econômica (da qual êle nos disse o lado
problcmático) .
No plano clínico, o recu$o ao ponto de vista econômico abre-se sôbre
outros horizontes. Com efeito, é em sua prática também que Fneuo afrou-
tou "a tôrça das pulsões" como urn. problema inevitável, e finalmente,
como o maior obstáculo ao progÍesso terapêutico. Aqui, não se trata mais,
para êle, de recorrer a um modêlo que facilite a especulação, mas sím da
apreciação dos limites do analisável e dos fatôres criticos da cura. Perple-
xidade díance de uma traumatofilia, uma recaída pós-analítica, uma rea-
ção terapêutica negativa: é nesse momenco que aparece para o terapeuta "o
poder invisível do tator quantitativo na causação cla doença". Eis-nos le-
vados, de maneira mais clara, ao fator quantitativo; mas justamente, cons.
tatamo-lo no registro mesmo de onde êle é inseparável.
Ao nos interrogarmos sôbre a própria expressão e ao abrir os dicio-
nários, po<lemos encontral' problemas que, tratando do doméstico e do
político, deixam abertos ao capículo "economía" questões muito aplicá-
veis à análise. Ciência, a economia pode permanecer com efeito simples
estudo dos tenômenos cle troca e cle distribuição de riquezas; arte de ges-
tão, lqro ela implica uma Psição normativa, e é a ideología do econo.
mista que está em questão desde que existe projeto de bem dispor das
diversas partes de um todo com vista a um fim prêviamente concebido.
É também a ideologia do analista que está em questão, desde que para
êle trata-se mais de curar do que de procurar entender. Parece-nos, em
particular, que a partir de uma certa definição do Ego retirada da se.
gunda tópica, detinição que exige critérios de adaptação à realidade e de
bloqueio pulsional nas reterências quantitativas e energéticas, definição
que exige também uma certa concepção da transferência e implica seu
"manuseio", pode.se chegar a falsear o sentido e o resultado da cura; ou,
ao menos, situar-se numa posição muito incômoda para seguir o paciente
na aventura desconhecida a que êle nos leva na pes«1uisa do Sésamo de
seu desejo. Se o terapeuta é um economista é em sua arte de apreciar o va-
lorizado e o valorizável na linguagem singular da neurose gue nunca é
aquela da necessidade, mas a do desejo inconsciente, o qual nunca é men-
surávcl, e não pode domesticar suas irredutibilidades conflitivas no cou-
lôrto da harmonização das tendêncías. O que circula no diáIogo, o que
se produz, o que deve ser redistribuÍtlo, não são quanta de energia, mas
sim a moeda usada das palavras veiculando os diamantes em facêtas dos
signiticantes privilegiados para a promoção. É êsse ponto de vista quc
nos leva a pensar que, quando FnBuo evoca o insondável da fôrça das
pulsões para explicar sua impotência terapêutica, testemunha assim o que
97
escapa à sua teoÍização, de tudo isto que, em certas curas, clesalia rapali
titnmente as tentativas de rearticulação simbólica. Isto pode conduzir-nos
à nossa segunda observação que se relere ao dualismo pulsional.
Quando está em questãã o problema econômico no registro clinico,
não é, em FREUD, apenas da pulsão sexual que se trata, mas também da
"outra", isto é, da pulsão'de morte. (Pela libido se falará muito mais da
solidez de uma lixação). Isto não quer dizer - os textos disso dão fé -
que al esteja em questão uma "quantidade" de pulsão de morte. De fato,
tôdo moviÀento ligatto à intervenção da outra pulsão finalmente semPle
empresta da libido a sua energia. O que não impede que a teoria inteira
se re[ira ao princípio de um dualismo pulsional. Antes do instinto de
moÍte existem, em FREUD, as pulsóes de conservaSo do Ego. Não existe
nenhum monismo pulsional. Que resta pois, do sistema antagonista, uma
vez que êle nos leva paru além do princípio de praur, isto é, para além
do sistema em que a pulsão dita agressiva não mais pode ser motivada
pela procura de uma satislação? Se partimos do sistema quantitativo, istr)
se torna diflcilmente concebivel.' O instinto de morte, enquanto princlpio
de catabolismo, enquanto aspiração ao Nirvana, à redução das tensões ou
26 inorgânico, Iôgicamente não pode se inserir num modêlo econômico.
Mas não se leia nessas Iormulações que, como metáfora, assim como aca-
bamos de propor, toÍna-se talvez mais Iácil tratar da prrlsão de morte scln
de inlcio sã feichar nos esquemas neurobiológicos, Notaremos aqui que, se
é posslvel delinir a pulsão libidinal apenas com as referências de uma
psicologia do tipo relação de objeto; em troca, quando se quer dar sua
ãoerência ao princlpio de dualismo pulsional, não se pode encontrá-la
senão na linguagem de uma interpsicologia que deve sua importância
essencral à noção de Outro e que articula em vários niveis e em várim
registros, as leis da relação dita intersubjetiva e da simbolização.
Eis.nos, pois, numa encruzilhada onde é necessário esclarecer no;sa
orientaçãq antes de partir um pouco para a aventura, ou pelo menos, Para
(x terrenos não balizados pelas definições da primeira metapsicologia (a
qual é suliciente para destacar a noção de pulsão libidinal). Pràticamente.
perguntaremos de inlcio em que o princípio de dualismo pulsional nos Per-
mlte melhor compreender a formação do inconsciente. Apoiamo-nos rto
trabalho de J. Lerr.eNcrr e S. LncrerRE para dal ir com êles ao proble"
m1 flo recalque primário; a saber: êsse momento mítico e original tal
como é postulado a partir do recalque secundário, aÍim de rlar conta da
primeira ligação pulsional. Êsse recalque primário leva-nos ao problenta
mesmo da simbolização. O "Íort-da"o é, uma vez mais, o exemplo priú-
legiado, aquêle que nos mostra, em sua simplicidade, em que a essência
da linguaçm é negatividade. Essa negatividade está no princípio da pulsão
de morte? Essa será nossa primeira interrogação. O sonho "Philipe-err-
tenhosêde" que forneceu a seus intérpretes a ocasião paÍa uma tão rica
e tão rigorosa análise, pode ser um exemplo que, melhor do que outros,
6) Sôbre o "íort-dâ" vc, . Gxposlçâo de Â. DE WÂELHENS nesta obrí. (Nôla do TÍad.)
98
:9*i.á P:r1 o losj9 objetivo;,o qual se relaciona com aquilo que Fnrr,»
chama, desde o inÍcio, de pursão d-e
_conservaso do Ego. Rieferinào-nos aos
últimos têrmos da análiú do sonho, seremos rent;dos a atribuir tôdi
9.1a .importância a essa ambigüidade notada entre nominativo e vocativo.
"Philippe-eu-tenho-sêde" no iocativo cria o sentido do deseio de ph iooe:
enquanto que Lili q-ue o exprime, refere.se, ela própria, "a .,- t.rài.o
-Ígç::Jo do
ourro). Nesse registro, o qrre é mobilizàdo e anunciado e
Philippe é o sen_tido da pulsãó oral.,,pÉilippecu-renhosêde,,,
no no-ino_
trvo' provoca o fenômeno contrário. A farã âe Liri identificando philippe
à^sua sêde, não pode levar senão a philippe, ou para p..d., ,"u Êgã'ã,
sêde, ou, para recalcar sua sêde para sc'ônstituir urrr Ego <1ue é intao
denegação da sêde. O que nos paiece necessário acrescentai ao texto
cita-
do paÍa dar conta do recalque primário, é pop, o fato de que a palavra
do outro, nomeando, ao rÃesmo t.*po, o' desejo e o sul'eito, ilú; ;
Sper,Tur.rc que cria a antinomia radicai entre o ,i. . o ter,
e nesse nível,
entre o Ego e a necessidade do munclo <Io desejo.
Assim concebemos o nascimento do Ego como neracão do periso
percebido da.alienação, no dia em que o .e[rimido ,e a'.rloLre-id;;ii?i
caoo e nao rdentrco ao desejo do outro, durànte a Íunção nominativa
da
palavra. O têrmo pulsão de- conservação <to Ego toma,'des<Ie enrão, todo
o seu sentido, e. vê;se.qug êle não póde dar cãnta de- ,uu gener. ,e ,,áo
se tem como ret'erência imprícira ai categorias do imagináiio
e do sim.
bólico, de um lado e, de ou.iro, a-ertrururr significante qire situa o .rirnç"
no.ponto <Ie partida como "falos,, da mãe anús do surgiàento da metátoia
paternal que descentraliza a colisão inicial. Nesse nivit, e bem a fala do
outro que, denunciando a carência do ser do sujeito em ,eu orruyeit"-
mento, comanda a instauração do Ego imaginário, como tambéru ciia o
recalque primário.
Mas, tudo isto é suticiente para nossa visacla, se se trata cle detinir
de mork? O que se esboça_no momenro é o esquema <Ie um mo_
!!:f:,
vrarento de negação, de uma parada, de uma mofle da pulsõo maís rto
que uma pulsão de morte. Istõ não «lá conta da curva d'cscenclente qrre
desenharia o principio de Nírvana no rerôrno a zero, no apaziguameito
das tensões, assim como não expríme o processo uu to.ugrarJino 'd" *"ro-
quismo primário.
Ao reexaminar o exemplo escolh ido para a nossa demonstração, nG
taremos que êle se refere a uma estrutura ielacional do tíno oral. iito é. a
um modêlo que deixa de lado certos elementos constitutiios tlo iampo do
desejo. Seria preciso, (to rrwno§, as coorclenadas da relação ae tipo'an"f
para colacar os têrmos de um estudo satisfatório, e assiáalamos ê. oo..
ticular a necessidade do uso da noção tlc obieto parcial para fundar àcla
a dialética da separação, do "cortê,,, da caiêncià e cla àgressividade, em
relação a um primeiro "outro". Mas, no ponto onde ertráos, não é mais
a partir da teoria do que da clínica quê se colocam os problemas em
rl9
suspenso. Todos ai encontram um ProÍundo testemunho nas perplexi-
daáes teralÉuticas de Fnru», tais como ela-s se exprimem num texto como
"anátise têrminada e análise interminável". Dal, todos encontrarão eco,
rgualmenre, nas diliculdades em que. atualmente estão, qua-ndo se trata
d"e dar conta dos processos psicosomáticos, de manejar os distúrbios cla
sexualidade leminina, de estender as indicaçóes da análise a êsses mÍtl'
tiplús caso§-limites em que se tem tôdas as chances de encontrar a reaçãc
te'rapêutica negativa. E'Pensamos nâ estrutura hipocondrlaca,- nas depres'
sões'neuróticaigraves --sobretudo as da mulher; - numa palavra, nesses
casos cujo e*em-plo se escreveu em filigranas nos motivQs. que Fnr.uo de-
senvolvJ no citaão texto. Sem dúvida, não é à toa que êle trata do caso
em que o corPo está em questão em seu estatuto e em suas manifestações
sintoimáticas. '(çmbremo-nos do exemplo da mulher histerectomizada e
as alusões ao homem com úlceras) . ? Tampouco, não é à toa que Fntulr
dil chega âo enigma biotógico do "grande mistério da sexualidade"; é
mesmo ãpós ter tüblinhado tema di recusa da feminilidade no homem
ã
Ieminilidade que não é angústia de casrração, .mas sim rejei'
-cão,a.rr"'d"
dessa t>osição de passividarle recePtiva, que obliteraria o Iugar do
Jrj.it" n" 'rednhecimánto e aceitação do do-m-.que lhe vem do outro'
Eá nosso entender, êle fala assim áa inacessibilidade terapêutica dê§ser
ãror.* que todos os significantes mobilizados vêm cercar o inefável na 4c
.rm" ';"beituta". É um i'ato muito significativo que tantos trabalhos
tr"r" att,at levem-nos a alguma coisa ãe fundamental que conota a "aber-
tura", a lalha, a cesura, i carência, o vazio, etc. Na etaPa em que- e§ta'
mor, a. nossa exposição, essa "abertura" pode situar a interioridade do
sêr. Dara circunscrevê-la nos contornos de'uma lacuna, de um vácuo' tlc
uí iãó onde se perde a verdade na Promessa de-seu nascimento' Vol"
trnaà iata as cooidenadas cllnicas, teiemo§ o melhor exemplo no Pro-
Utema lue nos coloca o informalizável tlo destino da libido' quantlo' para
,te-- aà-pá.-.t da volúpia, ela se oculta no segrêdo desrealizante do
organismo feminino. 8
" Mas isto pode nos ferir também no lantasnla penertido; assim' podc'
se dizer que na cisão imaginária que êle forma com o outro, o masoquts-
ío est"b'ele.e a lrgação dã seu sei ao desejo, como a- ligagio da carência
erógena que o m;câ no flagelo Iálico que constitui essa carência como
cisã"o. Esú cisão conduz-nos ãe nôvo ao corpo, não mais como fálico or.r
falólicq mas ao inÍerso, como "cercado e reférido" pelo significante fálicr-r
do desejo, em suas soluçóes de continuidade, em suas brechas gYc :e
abrem úbre profundidades não simbolizadas, e al tocamos a problemá-
tica do feminino. Aqui é a "abertura" que reenvia a questão do desejo,
a um temPo Para tentar PÍomover a cas-
alienacla no outro imaginário,
tração srmbólica de onãe nasce o desejo, e para abortáJa em Parte, na
102
sens do deseio, como verá se cavar o abismo insondável de um turbilhão
tpirando a êle próprio em seu PróPrio centÍo. -Na verdade, a "fôrça' da
pühao de morte nãô é sômente o apêlo de-ssa deiscêncía pata nosso desejo,
Que nela se perde e nela se esgotai A pulsão de morte não existe
a não
ser Para o outro?
DISCUSSÃO
103
náo se trÊta ruls dê rnesma ooiêa, que não estÀmos mÀls em presenga de
pulsôes no senudo pneclso deíinido em ?Íês EflsoíoE ou em ás Pr.lsóes e soús
desti os, mas de grandes prlnclpios gerals corno o mostra tôda a discussâo de
Alérn do pítnctpto ilc preer. Que ê oposiçêo nâo mais seja vitêIlstê (como
o Dr. DIÁTUNE o sugere), mas ao contrárlo que o seja menos. isto será fócll
de mostrar, ao nlvel das pulsões dê morte, no texto de Além'ilo princíplo ile
pÍozer. Al vê-se que, em tôdas as experiênclag que F'REI D cltâ ê anallsa, a
pulsêo de morte aparece Bempre dê mânelrê mêfginal, de manetra suplemen-
tar êm relâ,çã,o a tudo o que poderia sêr compêübtlizável êm têrmos de ener-
gia pulsional. Por outro lado, é evldentê nesse texto que Ês referências blo-
lógícas traádês pâra êpolêr ô tese da pulsáo de morte, e mesmo as reÍeÍên-
clês pslquicas como o indiccu num certo firoÍrrento o Dr. L,rCrx, sÁo a.s mals
contestáveis. Penso que, se sempre exl6te um duêllsmo, é um dualismo cadÀ
vez menos vttêllsta, malgrêdo as apêrênclÊ8, e quo ê pulsâo de morte está
âlndê mais longe do instinto do que a pulseo sexuêt. A oposlçeq tÀl como a
concebe na nova sistematizaçâo que tentamos tntroduzir continuaÍrdo JÁceuEs
LACAN, §eria a de um pólo pulsional e de um pólo simbóIlco. Ê a oposlçâo
que se êncontrâ na deslntrinca4âo que tentúnos em nossa exposiçào. mos-
trando o cÊÉter conbÀditório do energia de bloquelo, € em partlcular, o que
FhEUD chame a energle do bloqueio inconsciente. ContradiçÉo que nos mostra
pelo slmplês fato de que À energia de bloquelo lnconsclente seria, ê um tem-
po, a que aumenta, o sintomÊ a surg'ir e a que atirê as siglrúicâções perê o
inconsciente. A desintrincaçÁo que tentamos consiste em opor (ao menos pro-
vlsôÉamente ê se nesse reglstro se pode Íalar em enôrgla) energiu tr ulsionÚl e
pregnonc'ro sistornátko. EssÊ úlüma serl& apenês um outro nome do lnstinto
de mcrte, e finalmente penso que em nossa, exposiçÁo nÉo fizemos outrê coi-
sÊ, falando dê linguagem, do que Íalar, do comêço ao fim, do lÍEtinto de
morte.
2) ,U. FoLLIN íuma lnteÍvençâo quc Ícnunciou r ,cdi8ir, insisliu .sôbÍc a inlposslbillditde de
íalaÍ dos pÍocess9s inconscieDles sem ía2eÍ intêrviÍ n lloção de Íressoa. Nâo sc Dodc csca-
Írrr, dlss€ él€, à pôla\'Ía "algúém" que se op6c à algumu Colsa. Qr/cm é ansioso? Qrem
cslá enr pêÍigo?
104
é trouco analitico. Para. quê o §eguDdo tome todo 9 se! valor, é necessárto dar
p;êvtemente
-trAno eo fsEtssma ume fórmula e6truturêl e tópice complet+ Do con-
se €6tá condenedô a teorlzar €sÍr pnolongemento do dl§cut§o do paclen'
te, lgto é, o delirar üm pouco mals do que êle.
Nehhumê tnterpr€taç&o aem unra mcduleçáo tópic8, e & experiêncle slm'
plesmente o comprova, dá conta, da expeíêncie analÍUca.
3) c . SÍE|N, L'iúentil icat iod |rirnoirc, ln Rev. Fr. dc P§ychanolt'se, XXvl, 1962' íúÍlleÍo espc'
cl al.tt. 257-264.
A. (i(t:t:N, Lcs noracs da t'llconscledl, ln L'Évotulion Psychíolrique, XXVll, lV, p. 569-613.
5 J. B. PoNTÁLIS,'Lo lcclur( dc t't(ud, ií Ttmps lloú.fits ls5, P.380-:18t
6 s. LúEovtct c É. Dtlrrlxrl, ,ltude des lantos//r'.cs chcz t'rnla,,,t, ln Rr'v. /'r. de Psychaaolyse,
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s. l;Énóvicr, Lo iclotlod ôtticctale chcz l'Ealont, eín P§ychiolrie de I'enladl, lll, I' p l4?'226
E c . STETN, ,oc. cit., g. 2b4.
rci
J. LÁc^N, tdôtado por J. B. FoNT us, À .,metáíora paternal ag.e em si, en-
qua[to a primaziÊ do falos é lnstaurad8 na ordem ds cultura... Â criança
devo, em um prlmelrc tempq ldentlÍtcar-se com aquilo que é o objeto do
desero dÀ mÂe, pâra egÍadü à mâe".
Quê pensÀr dessas aflrma4ões ? Ninguém porlê em dúvidâ o valor stÍn-
bólico d8 crlatrqa. O €tn funçêo atêse bloquelo, a, um tempo obJetal e rârcl-
sistâ, que I mãe reage à crlangê e que as suas aüvtda.deÀ se tornam slgni-
ficâ.ntes pars I criançÀ ânteô de tôda llnguêgerÍL Que êsse bloquêlo tenha
umâ história, que possúr uma criÊnça sitnificÀ possuir o Íâlos, são noções
que ninguém discutlrá, âIndâ que falos nâo stgnlílque obrlgatôriaffente o
pênls do pal. Mâs o que slgliÍlcê essa necessidade paro & criançê de se con-
lormar qo desejo da mã,e? Sabemos que elê proJeta nê criançâ a signiÍtcaçÉo
fállcê. O que exige dêla. é ser parê elâ m&s s€Ddo indepêtrdente dels -"-
parô nÉo ser feridâ. narcislsücamento por- su8 passividade. Esê contradiçáo
fundarnental determina I ambivelência dêsse btoquelo. Ela nÁo tntroduz o
tercelro personagem, rnas ê m6.e como boê ou má e a referência de J.
LacÁN (trad"-ldê por J. B, PoNTÀLIS) ao pequeno- Hêns e ao preÊtdente
SCHBEIBER, mostr8 a necessidade de utilizar um material infinitomente mÊis
evoluldo para chegâr a essa demonstrêqÃo. A triangulaçâo ediplÊnê crladâ
só pelo Íâto de que o tEconhecimento eletivo d€ um enquanto fonte de prazer
impUcs. o dos outrDs enquanto elemento de de€prazer. pcr que um outm é mâis
famillar, êle acêba entretê[to por paruclpar dos dols slstemas; o pai êcaba
por ser amado c3.mo ê môe e detestâdo como o tercêlr1o embâragoso. Todos
nós podemos constêtar a reâ.lidade dêse fenômt3no e o feto de que â putsôo
tibidinÀl em direçAo À mâe crta condlçâo necêss6rla para que À ct.lanqa, eB-
tendendo seus meios de açêo, uttllze êsse ststemê dc õomunlcagao ao qual sô-
mente então €la se torna sensÍvel. Subsütulr ê angúsuê do oitavo mês, â de-
presâo desencadêsda p€la sepÀraqáo íatos qúe nos parecem essênctais
pâra, expllcar a gênese do fantasma do-mau objeto pârcia.l pels concepçâo
-
lacâniana da metá.íora do pât, ó voltâr às concepçõês Íilosóficas mrais distÂn-
tes da obra de E\'EuD e dã lesqulsa pstcanaliUcÀ. É imêg:tnar qire um ser
humano é por ous natureza determinÀdo por umâ estruturo, que exlste fora
dêle m€smo. RetomÊndo ê argumentaçã.o do Dr. PERRTER sôbre as pulsões, as
necessidades e o desejo, acredltr.mos compreender que os alunos de LACÂN
estitqâm quê nâo exlste desejo sem llnguagem. Compreendemos múto bem
os progressos d Unglllstlca, depois dos trÀbalhos de F. DE SÁussuBE mos-
tlando Às nec€sstdadeg €§truturals dâ linguagem. tendo seduzido certos soció-
logos, que procurarn na estrutura, dÊ llngua umê chave parâ descnever fenô-
menos sociêis. F. DE SAUSSURE talvez ficasse surpreendido ao ver certcs psi-
cólotos âdsptar suâs concepções eÊtruturals à descrtqáo da vidâ pslquica.
Ma6 todos aquêles que foram chocados em suas crençes rnals sinceras, agre-
dtdos em suas deÍesas mâ.ls tndispensávels parÀ â obrê dc FhEUD, sêm dúvida,
têm nccesidade de encontrÀr outras viâs em suas pesquisâs que nâo as do
drama individual do fantasnê inconsciente. Ora, o Dr. f,mRtER perguntâ-ncs:
"Mas que é, pois, um desejo senâo a constltulçÃo de tôda linguagem? senÀo
ums. simples necessidade, e desde que exlste um mec8nisrno de deslocamento
nâo é êlê a estrutura da ltnguagêm?" Mas a visã.o dê um' pêrsonÀgem não
dênunclodo mas entretânto reconhecldo ccmo ldêntlco a sl-próprio, constitui
uma fonte de prazêr em uma relâçõo novâ; é um fâto que todos podem
observar. Que a ausência tlessa organizaqão lmpede s. crlança. de conquistar
todo slstema llngüístlco, tênto no plâno dê comprêensáo como no plano dê
reallzaqâ,o, é lffualmente um fâto que todo cllnlco constata. Nossa oposiçAo
âo Dr. PERntt:n afirmê-se tanto no que nos sepÀra da posiqÁo klêlnla.na â.
qual êle ae lefere, citando SUZAN IsAAcs ( "concluindo, SuzÂN l§AÁcs aproxi-
mâ. o fântasm& lnconsciente de reprêsentsnte-representattvo da pulsáo no pr.o-
cess) priÍnário" ).
t06
Âcr',editamos que I experiência clÍnics e psicanalitics mcstra-nos. no es-
tsdo perturbador, os nepresentstrtes das pul6õ€s e é isto o que no:r a€pera.
como F. I,BBtEa : e ) dos etnólogps que obserrrem os ccmportamentos d€
modo hstlntivo; b) dcs klelnianos que nos falem apenas de coúlitos de ins-
tintos e negant o pepel estruturante do obJeto. Mas nÉo segulmos o Dr. LACÂN
que náo compreend€ e transformeçã,o da Decessldêde ern deseio senão na
"êbertura" do objeto. O bloqueio do pré-objeto nos mcmentos. de necessidade,
einda, que náo seja percebido, a organtza,çlo nerclslsLa, dos ltmites do Sl, fe-
zem compt€ender a dlatégca, que se orgBnlze no quadro de um& cotÍruntcaç&o
extra, e lnfrs-verbal que se medieüze no modo transltlvo e tr&ns8clonsl.
S ainds J. LAcAN que escreve: "A introdução do sujeito ern quelquer
reelidsde que seja, n6o é posslvel pel8 experlêncla de uma frustr8çÉo: é p€lo
modo como o slgnificente entra em iôgo que se constitui o princtplo de resll-
dade. Antcs mesblo da, apr€ndlzsgem da llnguatpm no ptano motor e eudi-
tivo, exlste, desde a.s prtmelras relações da crlançe crm o objeto metern&!,
rÍm pnooesso de slmbollzegáo; alesde que e crlatrçê começe a poder opor dols
fenômenos, já exlsüe com os quatro elementos intrcduzidos os dois vocá-
bulos: aquêle que cr proüuncta e &guêle aos qus,ts êIes se -dÍrigem para
conter úrtu&lme[te em st tde e combtnatórla de cnde vel surBlr a-orgeni-
zação do slgnlftcante." E aind&: " relaçÉo ds criÊnçe s6m g ryÀe, Já o vi-
mos, nêo é baseade simplesmente ne satisfaçÉo ou náojrustrsçáo, mas nc
reconheclmento do cbJeto do desejo dB mÉe". Essa expostgêo de J. B. PoN-
TArrrs de uma das idéiss mals ceractertstlcss de J. IJÁCAN peJÍnlte-nos assins-
lsr o que nas separa dêsses &utor€s. Serie posstvel ilnaginer uma descriçáo
do pslquisrro humla.rro que não desse conta senõo de sua forÍna, de sue co€-
são e de sues necesidades atueis. Ele se sltuarla, pars utillzsr e exptrcdo
dos llngülstas, nê sincronia. Mas ê$se proceümento, por sua natureza, seris
contrárlo fu teoriss freudianas, evoluclonlstas desde as primelras doscober-
tss de sexualldade lnfa.lttl até à últlmê elaborasêc d8 teorlê dos lnstlntos.
Todo psicanelíst8 recoloca as estruturas psÍquicss e o conceíto de lD-
consciente em um8 trajetória evoluuve e de6cr€ve -dêsse modo o que ae
-
deve pa§sar na cria.nça^ E b€m tsto o que pÍrrece fezer o Dr. LÂCAN (trsdu-
zido por J. B. PoNTAr,ts ) quando fez uma slusão dlscreta à teorla das opo-
sições íonéticas de JacKoasoN. Mas é necessárlo olha,r de mais perto os Íatos
oos quêls êles par€cehr se referir. O murrriúrlo infa.ntil observÉdo depols do
segundo mê6 e evotuindo sté e modificssão que c&rscteriza a apsrlçáo d& lin-
guagem, fot estudado por GBADIMoNT, por LÉopoLD, por JAcKoBsoN e por L.
STEIN, psra não citar s€não os especielistas ds linguagem. §e as conttgvér-
sías recaem sôbre s ordem de aparigÃo das barulhos e dos sons, sÔbre I e8-
truture lnterna. desso 6ucessã,o é e êsse prcpóEtto que a teortê de JAcKoB-
soN tom& todo seu valor - eestarnos
todos de êcôrdo em negar & êsses mur-
múrlos pré-verbeis tcdo -valor de comunlcaçilo, à esss Btividade sensorial-
motora lúdlca tôds estrutura stgrificatrte. Âs "lalsções" aporecem no peúo-
do de quictude, quando a cri8trç8 néo manifesta ncm necessidsde, nem de-
sejo resto, é por ess& razÉo que muitos não quer€m Essinrilá-los acs
- de
fonemÊs que constituem os sÍgntflcentes na segunde aÉlculeçã,o de Ungua-
gem. Dizer que exlste processo de simbollzaçóo antes mesmo da epr€n-
dlzagem de linguagem no plano motor e auditivo- desde as primeiras r€-
lações ds, cria.nça com o obJeto mêternal (quando - ume crlançs começa e
cpor dols fonemas) é uma aÍlrmagêo oposte à observsgêo mals eleÍnentar ou
em ccntradiçéo com e definiçêo mesm& de símbolo. NÉo existe nenhum vo-
cábulo no murmúrio que nÉo se diriJ& à pessoa, e que náo simbollze n&d8. O
único elêmento de comuniceçõo nesse estégio é global e néo compreende ne-
nhuma diferenclação eplcrltlca. Quando ê crlançe grits, a núe reage cu ln-
terpretando o €frito como urn chamado ou como um& prova de maugnidade;
quando & criança murmura, & mÉc supõe-na eufórica. Essa reaçÉo da mÕe
tq7
teÍr um vâlor orgsrdzÀdor fundamental da exptlessáo vocâI enquanto melo
dê sção, depois dê comunlcaçá,o. Mas o significsnte não se organlzêrÉ senÂo
ao neatno tempo que o slgrlÍlcêdo ê cíançê utiliza meios setr-
- mesmc se de
sorlals e motores experimentâdos atteríormelte um outro modo. Quôndo
I crianqJt, livrando-se das necessidsder ftsiolóB:ica§, encontr& .umê Íonte dê
prezêr constânte na percepgâo dô umÊ Íorme contlnua e treconhêcida, o que
impllca pela primetrê vez nÀ organlzêgêo mJrêmlca, quândo a pulsã.o em di-
Í€gâo ao objeto bloqüeado ma,nlÍestê-se; as êxcttagões sonoras orgÀrúzam-se
em íorrIIE §lgriflcênte percebldês e rêproduzlda.s globêlmente e aproxllnâ-
tivamente, num fenôm€no - sobrretudo rudimentar que contrâsta com Ê agl-
lldêde Íônicê do murmúrlo. Â prrcisâo fôntca do- significante em sua relêqâo
com o alSniÍlcado é o têrmo de umê segundê êprendlzágem, multo mais di-
ÍIcll do que a primelra. Mas as relações edipiÀnâs da criança têm, antês dessê
épocs, uma long'a htstóda- A rêlÀçÉo objetÊI nÁo se exprlme senôo num dê9-
sês momentcs pêlos dols Íonemas "Íort" e "alB". É suíiciente pârâ tanto re-
ler com hoDesudade o texto quê FIEUD consâg"ê ao Jôgo do carretel para ver
conlo, ÀtrÀvés dêsse jôgo, exprimeln-se organizsções diferentes, tôdaô dtretê-
mentê llgadas à hlstóriâ pessoal da criança, tôdas significativas de sue orga-
nlzagâo do momento para se tornar estruturante; no momento em que F\EUD
fêlÀ dêsse Jôgo ( relsüvamente tardto) êle se lnscreve no quadro da relÀçÃo
mle-criança. -Mals târde êle testemunhê os primeiros ensâlos dc trlêngutarl-
zaçÃo. Isto náo é splica.r a. linguagem ao desenvolvimento. mâs estudar o
bloquêlo de sua Íunçáo. Modo expressional verbal, elÊ nÁ] se torno chamado
ehquênto nêo é slgntÍlcativê parê a. mêe. Quêndo ela se torne instrumento
de comunicôçã.o, Êpêtrece como um dos "organlzadores" (SpITz) da rtlaçáo
obietâ1. Assim o objeto bloqueado do desejo da pulséo organiza também os
íÀntasmas lnconsclentes do desejo, §eg'undo os Ínodos imagóicos,e que refle-
têm ccrtra-bloquelos secundÁr'los. Para compreendêr êssê equiltbrlo, e even-
tualmente tentar modificá.-los, evidentemente é prcclso levar em coDta o con-
junto dG bloqueios c das organizaçõ€s tóplcas.
g) lrnogói@s, reÍ.r€ntes âo lrnogo. ylde nota 4d do tcxto de ÂNDRÉ CREEN (N. do Ttod_l
I08
Segunda Parte
A TINGUAGEM E O INCONSCTENTE
O INCONSCIENTE: UM ESTADO PSICANALÍTICO
lll
psicologial" numa época em que os conceitos metapsicol(fuicos de FREUD
p€rseveram no ser, sobretudo pelo benetício secundário que tÍazem: como
meio de defesa cohtra o pensamento.
Ditlcilmente se encontraria uma introdução mais clara ao problema
clo inconsciente, ou mesmo um debate sôbre êsse lexto. O inconsciente
c um sentido ou uina letra? A essa questão, Pol.lTztn responde, de maneirir
exemplar, por um radicalismo do sentido que qucr retomar por sua conta
o con3lrnto da descoberta (reudiana, eliminando o realismo clo inconscien-
te. Sua tentativa leva-nos de uma'só vez para além das velhas objeções
2c) ÂtÍlbul, oo lncoÍscientc xma Íêalldade da mesmo cspacíc qur aquclâ dâ letÍa
dc um laxto, é sallsÍazêÍ, por uIIl cerlo modêlo tcôÍlco, s cssa dupla cxlgénclr. ,ú48, a
pârll, dal, suÍgcm todas as rÍDblguidodÊs dêsse ".oro úÍDa llnSuagcm',
Tenlôr-se-á aclora, o ,ealldade do loconsclÊotê poÍ aquela da llnguagem, obrclo .lr
llo8ülstlca? DlrlcllmÊntc sc cscapaÍá de úma dupls diíiculdadc: ou tedu2lÍ â cspcclílcl-
.laoc do lDconscientc ÍÍeudiano c csquecaÍ I dlrcacoça cxlslcnte crtÍê o i08o e t natuaeza
dag ÍcpÍascntacócg nos nlvclg líconsci€ntc dc um lôdo c pÍé-coíclÊnte-consclcÍlc dê oü-
tÍo; ou cnlão, gÍasâs à unra ccÍla subvcrEto do9 coícêlto9 lln8ailgtlcos; notadanrênle
aqúêlcs dc mcráfoÍa c dê Írclonlmla, oíeÍeccr, sob mcdlda, lrml c..ta noção da llnguagêm,
plra cm scguida mostaaÍ quc o lnconsclênt€ nf,o luÍclona dc oulÍo modo.
SêÍn dúvlda, é ceÍlo quc llma corlÍonta§lo dlalérlca nao podeÍlâ dclxaÍ lmulávcrs
ncm os coÍrccltog pslcônallllcos c nem os concellos lingüistlcos. Âlnda corvém quc r dla-
léllcs sêlo, êm cada um dc 3cu3 lcmpos, Ssslnalsda, e telorÍrulando os conceltoô. Evlla,
o cnurchdo de qúc o dGslocarDento ,ÍGudla[o d a mêtolrlmlâ, ê â condcosa§lo â mctálora
é gassaa sob silénclo Ínullos dos csclaacclmeÍ|tos e deservolvlÍrcnlos quc dcvcmo3 lonto
â FnEUD, qüanto aos tinSül$las, é saltâr, pclo menos, rnúltas mcdltações,
NotaÍ-se-á quc êm nosgo têxto utll12imos o ,Íodêlo llng0lstlco de metlíoÍa, oáo
paÍa âsÊlÍnllá-lo ao pÍoccsgo lnconsclenle de condersação, ,ttas paÍa ilrstÍaÍ o mcclnl6mo
do Íecalquc trl coÍno Éla sc Íêali2â crrÍe lnconsclentc ê l'aé-Consclenle, carae pioceSSo
pÍlrnárlo e DÍoccsso secundÁÍlo.
3{) Vamos tnals longr. O lrco,|scleDtC Ircudlaío, c a llnSuagem dos llngUl6lâs
tc op6em lAo .adlcâlmcntc quc a tÍanspogl§lo tê.mo poÍ têimo dc súas ptopÍlêdad€s c dc
suas lels podc, com Íâ2ão, apâaêcêa como üma teítatlva ÍrarEdor.al. De soÍte quc o Con-
tro[to dÊ pslcâÍrállsc c dê lhgülstlcâ ,!ão nos pârccêu posslv.l scnão ao DtÊço dc um
dcsdobÍarDcrto dc câdô ürÍr dê §clls câmpo!. Degdobaamcnto do carDpo pslca[allllco núm
c.Íípo lnconsclcntc rcgldo pclo procêsso pÍlmáÍlo c num campo pÍé-consclêntc{onaclcntê
,elldo pclo pÍoccaso secundá.1o. Mas dcsdobÍamcnto Iambém do campo llng0lsllco numa
llDguagcm qúc nlo é oulrâ scnáo aqüela gÍsços r qual nos comu[lcamos. é cssa ! "llcClo
dc rma llÍrtuageÍÍr no $lado aêdrzido" quc trílamos esboçaÍ.
Ásgim o apÍorlmaCão sG eslabelccÊ cnt,e qualro téÍmog: a "llnguagem" quc é o
lnconsclcíte, se êle possul o caÍáteÍ essenclol de se, uma ciÍcülaçIo dc VorslclluBgcn,
a congráyet sêÍrão a c6sa câmada vcÍllSloosa dr llnguaScnr quc, às vêzes, algun3 9oêtas 'nâo
not delxâm crtÍcv€Í.
4c) Á paÍrllr dal, nossa pcaqulsa colocava urn ccrto númcÍo dc questõe9, obÍla as
vlâ3 mâls larDeráÍíâs:
- Qüal é a rclaçâo anttc êsscs tlpos dc lhtuagem aocsqulzoÍrêílca,
'poétlca, quG sâo a lin8ua8cm do lícorsclcDlc, â llnguâ8em
Drlmárle3
mÊstro lcmpo abcrÍanlcs e
a lloguigcm
umô llccão.nllm de uÍna "llnguâgcm no cstado têdúzldo". Pol9, sê c8!a últlma,
õÍr nosio Etto,-aupostaDeDte ÊrBtla só, antcs da GcpaÍaçlo da lêtÍa c do céu, aa outÍâs
llnguágên8 qllê aqll cvocâmos s[o tlnglagêns de depolg da 3cparação, tÍazendo nelas !s
aobrevlvênclas de uma llÍrguagem o.lglnáÍ14.., quc lanals erlgtlu.
são as condlcóe3 da pâ85â8cm do iÍoce8go ptlÍnárlo ao pÍoccsso sccrndá'
- Quals
Ífo? Êssc é unr problcmâ clásslco, iundam€Í|tal cm psicaíállse, equclc da "tigoçôo"t .ll'
sctttldo quc lh?
iaçlo da encrgla'pslqulca, llgação das ,GptcsGítrçoG4, Gnllm tlSação dopcnsameíto,
coníara úmâ caÍta ,hldcz. l)ê3Ênvolvêndo oo eitÍGmo nossâ llnha dÊ pro
curamos moslrai s llSa{eo opê.ando no ptocc§so do tccotqrre originúio, conccbldo 6ôbtc o
oodêlo dÊ uma mctlíorã. O quc coÍrclul cssô p.ogosl§ão sutptccttdcrtc: o quê coÍldlclona
a pasgatcrD do paocGsso prlmóÍio ôo p,ocassó sacundáto, é 9Íeclsamcíle a conglllul§lo
G ; máí-utêíçáo 'do lícoí;clcítc como'doÍDl,llo sppaÍado. O inconsclente, dl2lamos nós,
mals do que úma llDguogem, é o condicáo mesrna do tilguogem.
5e) Alé êsse 9onto, em 1959, Não l8[otamo6, GntÍctlnto, que o pÍoblcmi- d! ll-
8acâo é ;ullo c-omplàxo para Dodêr aGt rcduizldo aDenas ao mccanilsmo dos slSnlÍlcontrs
óui sc llram, p.clE'metál'oÍa, óndequÊa lcí, lÊl de caátÍacãb, "lcl do pal" é pÍêDondcÍante.
c:onr a liga(âo'ôÊlo 'Ggo", dquêlc o OcrsarDenlo paicâíalilico dcpols do 'PÍ.,ielo de
umr p3lcolo8lâ clcntlllca" não ccssa dc .llrJnaJ? Como sc opiicm c como ac tttlculanr
cm sàus eÍeItos, ío Glelto lambém no pglcôrlco, de sGu d.síÀlcclmcntoz Ê êsse utn dos
prolooSame[tog nuG gosterlamos de eopiceodcr fara êssc texto. (rE^N LAPL NcHt, 196.5).
tt2
(le ulrrit psi(ologia cla tonsciê'ncia, tais corno Fnruo as refuta por exem.
plo, rro prirneiro capítulo de O Ineonscientc.
RctomerDos os [el nlos r]a crítica de Poluzrn.
À hipótcse rneta psicokigica do inconsciente vão-se opor duas ccnsur;rs
nraiorcs: a absl.taiã<t e o rt:ulismo,
A abstração é a prirneira dessas queixas. Aqui Fnruo teria feito uma
prova <lc tnconseq iiênc i:r cru relação à stra dcscoberta; isto será bastante
sensivel rr:r rrraneir':r pel qual progride seus pensamento em "A Intcr-
prctaçíto dos Son lns" . Lnquarrto o essencial da descoberta freudiana con-
sisti:r crn srrbstitrril os mecanismos irnpcssoais por uma explicação qrre
situa o sonho como ato de um sujeito palticular num drama "na primei-
ra fressoa" - cln tô(las as suas tcntativas metapsicológicas, ern particular'
no tiltirno calrítulo rJe"Á lnlcrpretação dos Sonhos" (Psicologia dos pro
cessos do sonho), F-nr:r:rr recaía no nivel de entirlades psicológicas abstra-
tas, (:uio jôgo se desenrolava no plano tle um mecanismo e não mais no
nÍvel da subjetividade. O qrre aqui viria em primeiro plano seriam os
latôres inrpessoais, instâncias, tôrças psíqtric:rs cuja maquiltaria se esfor-
çet-ia em vão para lecolrstituir o [enômeno naguilo que êle tem de con-
creto. Fneuo não telia permanecido [iel à sua visão fundamental; o que
se explime no conteúdo rnanifesto como o ato de um Eu não <leve ser
re<luzrrlo, no Ílívcl la(ente, :i interaçãp de coisas psíqtricas, o conteúdo
latente e o rlesejo do sonho não devem- deixal' o camlrc da strbjetiviclacle
que a psic,ologia definiu.
() que se pocle lxnsar da rnaquinaria freudiana, tentarenros cxpri.
mi-lo rnais longe a pro;úsito da elaboração metapsicológica feita em 1915.
Aqrri itcarcmos sôrnente na expressão "primeira l)essoa" para indicar o
(les\:t() ou, enr todo caso, a restrição que ela traz à <lescobetta Íreudiana:
não exlste outra altel'nativa senão a do mecanismo - o processo desen-
rolan<lo-se ao nível da coisa - e da primeira pessoa? O que Fnruo des-
cobrc n:-ro é precisamentc, sob o têrmo dos pensamentos do sonho, um
ctts<:rrrso qtre pocle sc tleserrrolar "em pessoa", scm ser enttetanto na Jrri-
rneir il l)essoa, mas sitn sob a forma irlienatla da segunda orr da terceira
pessoa? O srrjeito tlo rliscurso, por não ser, cle início, senão o sujeito gra-
matical, não é menos strjeito: quanclo "ça [ala" ! no inconsciente, encontra-
sc betrr a truidacle <ltam:itica cat'a a PottrzeR, sem que êsse clrama se de-
senlolc rrecessà r'iamente ern "primeira pcssoa". Pode-se mesmo perguntar
sc n:fo c próprio rlas cstt'utulas inconscientes incluir orrtras vozci alêm da
"primcíra pessoa".
(l rcalisno é a segrrn<la (etlsula maior. Sigamos, aqrri, í deruonstÍa-
ção leita pot Poltrzun, a prolúsito do sonho.
A análisc do sonho <l:i a impressão de <1ue passamos de um conteúdo
nranitcsto pal'a urn conteúdo latente. Ora, "para íalat mais exatamente.
o sonho nío tem senão unr s<'r conterltlo" (p . I8.1) - o coÍrteú(lo latente,
u5
como sê 1>otle dizer que êle não tem senão trma só narratit.a
- il nal.rativa
manilesta: o texto do sorrho não Íaz senão exprimir, em uma linguagem
não convencional, intenções significativas que não enconrral' m serr signo
adequado. A análise do sonho é cerramente uma tradução, mas o êrro do
realismo freudiano consiste em supor a existência em si dessa tratlução,
no Ínomento mesmo em que o sonho é elaboratlo sob a forma tlos pcn-
samentos rnconscientes. Sob pretexto de que "as iDtenções significativas"
do sonho potlem ser exprimidas na linguagenr tla vigília, supontlo-se quc
elas já são, no momento do sonhq realizaclas nunl texto distinto clo conç
teú(lo mâniíesto.
A êsse realismo da signilicação, Polrrztn opõe uma reoria da ima-
nência do sentido que, se não empresta seus elementos da tloutrina feno-
menológica, poderia perfeitamente ser reivindicada por ela. Por.rrznn nos
íaz sentir a relação do manifesto ao latente por diversas comparações:
é a relação cênica que liga uma peça de reatro ao seu tema, sem que tenha
que se supor que êsse tema já esteja inscrito em alguma parte (gr. 73)
c a relação da imanência que Íaz com que numi parrida de tênis, as
-regras sejam apresentadas de maneira implicita (p. 190)
lingüística . . ., mas, aqui, deixemos a palavÍa a Polrrzrn:
- é a relação
"No sonho cla injeção leita em lrma, "lrma está doente da garganta"
signilica "desejo um êrro de diagnóstico". Ora, nío existe de início expli-
cação senão no plano das significações, pois esramos diante de rrma expli-
cação do texto ou, então, diante de uma análise de uma cena clramática.
O desejo do êrro de cliagnóstico explica então a doença da garganta, como
o têrmo latino "pater" cxplica o têÍmo português "pai", ou, então, como
o ciúme explica o gesto de Otelo" (p. 176) .
Êsse duplo "ou então" pelo qual Polrtzrn abandona ràpidamente a
telação "lingülstica" em proveito de uma relação expressiva de uma ourra
ordem, noradamenre a expressão de um estado afetivo em um gesto, é signi-
lrcativo: como Pot-ttzsR buscaria auxílio no seu exemplo lingüistico, em
uma Íelação que é não mais a imanência tie uma hipotérica intenção
srgurllcauva a um signo, mas a substituição tle um signo por otrtro?
Àías l'echemos provisôriamente essa potta cntreaberta sôbre a rlinleu-
s.'ro lingüística da substituição dos significantes, para indicar em qlte pcl s-
;rectiva Porrrzrn pretendia "Íundar" a psicologia.
O qtre Fntuo teria srrbstan tilicado conr o rôrmo inconsciinta seria
aPenas um caso particular da categoria geral tla signilicação, orr "<lo dra-
rna na primeira pessoa", catcgoria destinada:r scr srrbstiruftla em psicolo-
, gia pela tle causalidade. Essa categoria é, para Porrrzrn, uma caregoria
crentílica no sentido pleno do rêrmo, porque é o resultado tle rrma ela-
boração objetiva: em relação a êsse conhecimento, o sujeito jamais é
privilegiado; certamente êle próprio pode ser aquêle que interpreta seus
próprios atos, mas por êsse ato do conhecimento sua própria posição
subjetiva lhe será então deslavor'ável: "Não nos parece legltimo exigir do
sujeito orrtr;r coisa além clo cumprimento nlesmo clo ato: a signilicação
ll4
(lo alo po(le lhe ser conhecida, mas o sonho e os fatos da patologia men-
r:rl mosrram-nos suficientemente gue êle pode também ignoiá_Io,,"(p. 2ll).
A psicologia concreta .'precisamente porque não considera- que a
ignorância do sujeito- sôbre o ieu próprio sei sejà um Íaro part icu rarrirente
notável, não tem nenhuma necessidade da noçãó de inconsciente,, (1t. Zl4).
". . . Os fatos do inconsciente não são mais <lados imediatameiite, mis
construídos como os das ourras ciêncías',. (p. 215).
dissimulemos o que nesses encontra unl eco tanto na cxpe-
" Nã"e na doutrina freudíana comotextos
t rôttcia numa certa tradíção filoaótica: obiti.
ttação que, pelo fato mesmo de sua posição, impressioáa o sujeito quanto
à signiticação de seus atos; opacidadc radical do cogi to, essá tese'mate_
lrt'anchrana tem seu correspondente na teoria de Fneuo.
Quanto à outra vertente da posição politzeriana, a. noção de qtre o
rrrconsciente não é senão a constru-ção'do ôutro como sujeito cognosientc,
censurar-se-á o artigo de FnBuo sôbre as ..Construções ira análise', onde
se acha demonstrada tôda a importância dêsse moclo de acesso ,,inre-
lectrralista".
Entretanro, por_-mais importante e estimularrte que possa sel. uma
perspectiva que, en[im, expurgaria o velho arsenal rrietapiicol<ígico, Por
mais ptóxima que ela possa parecer de uma tese moclernà gue
foria àrn
primeiro plano as similitudes entre o- campo da análise e o da lingüística
otr do clecitramenro, como não perceber á redução, o verdadeiro ãcha.ta-
rnento op€rado por l,orrrzrn na climensão subjetiva tal como Fnruo a
colocon? Em outros têrmos, sirnples oposição da narrativa ou do gesto
_a
manil'esto, e do drama ou da significação que lhe são imanentes, e-que
:r an;ilise dev-ería simplesmente reconstruir, parece-nos incapaz de dar
conta dos dados da psícanálise. Mostrar-se-á islo, tanto no níiet do com.
lx)rtamento ou clo texto manifesto, como no tlo sentido latente.
No nível do texto manitesto: nossa experiência se opõe à redrrção de
lrrn g€sto, de um símbolo, de uma palavra, tais como nos são apre.senta:-
<Íos rra análise, a não ser que um signo original inventado peló sujeito
possa cxprimir nunla linguagem única uma intenção significante, cla
1lrópria marcada l)or particularidades. O signo, o sintoma, o símbolo qtrc
rros são apresentados, retiram sua substância não sàmente do senticlo ln-
consciente que temos que descoblir nêle, mas do senticlo imediato no
qrral, de inÍcio, êles se clão para a expressão.
Um homem diz: "Sonhei com a Sra. X. EIa trazia um lenço velme-
lho". O lenço vernrelho leva-nos ràpidanrente à mãe do paciente. Essa pes-
soa é minha mãe, dit êle. Eis tu<lo. Não sabemos então que êle sinrplcs-
mente levou-nos a um impasse, a um ponto de estagnação do qual êle
poclcria sair compreendenclo porque sonhou com sua mãe sob o signo da
§ra. X e pela tradução clêsse Ienço vermelho? Se o signo manifesto, na
verclade, expnme uma só signiticação. não se escapará à alternativa
scguinte:
ll5
1.") Ou o srrjeito tliz: "Quero tleitar com minha ntire", o qrre sigrri-
lica que êle quer <lcitar com sua mãe, e eis-nos no (amPo da psicosc.
2.") Ou o sujeitq pala exprimir qrle quel se deitar com sua ntÍc,
cria um signo absolutamente individual, um neologismo absoluto, mirs
então a via que nos permitirá ou que llre permitirá aceder ao sctrtitltr
latenre é 'absolu tanlente inconcebível.
,{ objeçÍo e t:rmbém sensivel se cxaminamos a retlução elettratla por
Polrrzrn do conteúdo latente para rrrn "sentido".a
Para exprimir as coisas brevcmente, pois teremos ocasiÍo rle voltat'
a isto, noções como a rlo conflito, rla formação do coml>romisso etc, sd-o
,nsusle ntáoeis em urna eslrulul a tujas duas unicas d,imensões seriam us
de unta letra - o conteúdo rnanifcsto, e de trm scnlido - que tomaria
o lugar do inconsciente. Quem nos tlirá em que terreno potle se prodrrzir
o encontro entre êsses dois personagens, tlos quais o primeiro, como tltttna
Iarsa, deixa semple a cena quando o outro entra? Para Íetomar' um:r cont-
paração de Poltrztn, se o inconsciente não deve ser "realizatlo" por mais
tempo como não o (', no plano tla ciência flsica, a lei coustrtritla Pebs
sábios para dal conta «los fatos, qrrem saberia tlescrever o conflito «lt:
I 12 gt 2 com a guetla tle trma maçã?
Entre uma sri letra e um só seDti(lo, tal conto os concebe PoI.rtz!:R,
rrma letra tão particrrlarmente aclaptada ao senti(lo, (omo as "<lialcticas
convencionais", "são ineficazes" para interpretá-lo, como conceber outlrt
Íelação adequada? Couro entenderiamos também êsse testemunho de Fnnu»
cle qtre pode existir, em casos excepcionais, uma cooperação clo incons-
ciente e tlo pré-consciente, que, quando ela se plotltrz, tleixa sôbrc a açiio
que dai resulta uma matca que não pode ser menosprezada: trâta-se e ntão
tle uma ação parricularmente perfeita, que resiste a tôrla contratlição, :r
maneira do sintoma obsessivo;' a lnssibilitlacle tle rrma tal atlição rlos
efeitos do inconsciente aos do pre.consciente oferere a maior prova tlc
qrre êste não é a simples manifestação tlo orrtro.
il6
lr) Os tlois modos dc cscutdr. Ás loamas do tliscurso consricntc. A noção
cle "lormação do inconscicntc".
Por esquemitticas que sejam estas considerações, seml)t e têm . res§o-
nâncias maii diretas com uma prática quotidiana. Nessa otclern, seria par.
ticrrlarmente interessante esclarecer as atitucles, os ttrodos de escuta, ern
que se concÍetiza o que cada um de n<is entende Por. "atenção livrentente
fiutuante". Em nosso entender, encontt ar'se'ão clois tip<xi (le escuta, lnuito
diferentes, entle os quais virá se ordenar a maior parte dos casos inclivi'
duais: vamos opôJoí sob os têrmos de: "atitudc tle traclução simrrltânca
e "atitude de atenção aos fenômenos lacunosos".
Se não é consêqüência direta clo sentído, :t atiLtrclc de tradrrç:io si'
multânea parece-nos, entretanto, cortcsponder à posiçiro, do incorrscientc
como sentido, tal como Poutzut< o expt irnitr. O discurso do Pacicnte (mas
também seus outros tipos de produçíô, desenhos, pr exemplo) é tonrado
aqui como puro matérial, para i trter;:retaçiio do qrral a intenção cons-
ciànte do páciente não devê ser lcvada especialmenrc em- consiclet ação.
A atenção iiuremente flutuante tenr Por efeito, não privilegiando netthttnr
conteúdo, privitegiá.los a todos, consitlcrar o conjtrnto do discurso cotno
rrm texto suscetível cle scr traduzido em linguaçm "inconsciente". Ma§,
nessa expressão, colocar-se-ia de bom grado no plural o têrmo "lingua'
gem", pois a ambigüidade essencial de iodo material ern telação às__síg15
iitaçõei permi te, núm mesmo texto, ttma demarcação co€rente em "oral",
"anáI",
;fálico", para citar apenas os mais clássicos idiomas.5
Mais ocasionálmente falai-se-:i das livres associações do analista, auto'
r iz:rnclonos, talvez ttm pouco ràpidamente, ao lugar comum da "comuni-
t ação entre inconscientàs". Aqrri propomos a fácil .contta'Prova de ttma
tlridução de um conteúdo manifesto - pot exemplo, a narrativa de llm
sonho - não mais sômenrc em freudiatro, mas em jungiano, em existen-
r ialista ou (essa não é uma hipótese glatuita) em marxista. Que fazer,
scnão projetar assirn nosso objeio em diferentes sistemas de coordenadas
rlas quãis,-sem dúvida algtrma, são mais cômotlas, mas tlas quais nenhuma
p,xlc pretencler-se a mais verdadeira?
5) Sem dúvlda, se símaria lqui da noção de sobrcdct..mln:rção Parâ lu§tlÍlcer essas dcscodl'
iiãiioes Ãrittiitai, mas é'a íosso'v!r, um abuso dc tlnS{a8em aollcaÍ ao coniunto do
iliií-pitiàidiiiõ. oe mahelro tromogêneà, um íenôneío dc qu1 n-to toma todo o seu §entldo
íir?i íoJ-cle .ntos partlõularci do dl§cuÍso, mirnelía pat(lculaÍ a cadâ um
"iãáo'*-
ai.iiis eiementos. asslnalável ia estÍutura mesma do elcrrlento .m qúe§t!o ("flo
- --- rtmtirJo ---
nâ srra extcnsão.m Íclaclo ao coíiunto do texto psicológico 6Ú0tr-
Ílclê"1. â 6ohíêdêtêÍmlíIlcIo
'ãrã nâo é menos llmitads "na prolundldaile". Ê como "íluple
u"io1úiuicec; I thtioa,,Jtaa oo. FREuo: "um slntoma hlstérlco ítro sua
§epÍoduz s.-
;i; ;i à'iit "ii
dô-ls cumnrlmentos
-oslouico de dà§elo§ oposto§. cadu um eÍrcoítÍaído
(C'
lonte íum
p
slstema i,utira etpí.ssIo úílcí" w
'il i nianeri:r conÍusa com que rc reiorre à ess! noção centíll
rllÍcrchte. vêm concorrer II-lll' 575)
' do fíeúdi§mo'
iiãàã"ãrio'.ài
oaía declaíar comíratlvels todas a§ lnte;píetaçóes possíveis sêfl mostÍar conlo elas §'
irticílarn entre si. Irflril tal 'iríinidade" do inconscieíte, não paÍece, em todo caso, qÚc
Íôl dêscohertâ íoí Fptil D em sua €xgerlcírch.
Não se iermlnará em rlenonciàr o é..o (bem d.íiíldo) c o Í'al'ios (lnÍlnitol qu'
({rn curso no t?m:r
-sotrrcdn análl6c "lnÍlnlta". É preclso ao titulo do
llíritaÍ-sc §ôm.nte
,iriigo e questãó p:rri
-chàcirrõo cornpieender que, §.grrn(lo alç. uma artálise nIo
;;it-flnl-ta; "aa;Iõ'
aã- fÀ-euo
(! poiqoe' eta se com um obstácuio betti .leteíírinldo; o coÍnFlexo
dc çastíação.
Il7
É bem pelo Íato da ambigüidade radical tla lerra, ral como rlbscr -
vamos aqui, que rôda atirude de escura psicanalítica visa a ser,.livrcrncntc
Ílutuante". l\Ías aincla que, no caso que acabamos tle clescrever, o tr t:.1-
mento igualitário tlo material leve à uma espécie dc nivelamento olilc
Íodos os são igualmente significativôs e carregados (por quê?)
-conteúdos.
dc sentido inconsciente numa outrâ perspectiva, ao con'irário, êssa igrral-
tlade tlo campo da atenção tem por fim ólocar em evitlência no disc-urs,r
tlo par:iente "ponros nodais" ("Knotanpunhte") pontos tle carga ou, :,o
contrário, de ausência de carga, lacunas, depressõei no discurso do pacierr.
te.-Tornamos de ernpréstimo essa perspecriva do próprio Fnruo qüe niio
-na -experiência
definiu de-outro modo a.pnesença do inconsciente psicann-
lítica: os dados da consciência são "lacunosos" (,'liickcnhaÍt',); o-incons-
cienre é o que permite restabelecer uma seqüência coerente, irma rclação
inlsltgivel qüando interpolamos atos inconsciêntes que concluímos',.6 Vê-sc,
aqui como Fnruo pode afirmar umâ tese "construc'ionista,' sôbre o incons-
ciente (o inconsciente é "concluído") e pelmanece à distância do ponto <te
vista que se poderia chamar politzerianb: o inconsciente é rigorôsamente
separa-do do texto manifesto, e é nessa meclida que po<le entrai ern relaçÍo
com êle:
a) -o inconsciente não é coextcnsivo ao manilesto como srr:r signili.
cação; êle deve ser interpolado nas lacu.nas do texto nranifesto.
b) o inconsciente está em relação corn o manifesro, não conro o
sentido com a letra, mas num mesmo nivel de realitlade, e ó isto quc no5
autoriza a conceber uma relação dinâmica entre o texto rnani[e;ro c o
que e-stá ausente e aí deve ser interpolado: é um fragmento do tliscrtrso
que deve encontrar seu lugar no próprio discrrrso.
Conclulmos notando que o morlo cle escuta que tentamos clefinir,
tende a_ colocar em primeiio plano a noção de manifestaçÍo previlegia,
da, de lormaçãg t
ryóp1ia ao inconscienre: o sonho, o lapso, o ato failro
são seus
_exemplos-clássicos. O inverso é dizer que todo o-cliscurso do pa:.
ciente não é tle direito interpretável, que êle -é tlisctrrso sem correspon-
tlente. inconsciente... palavras freqüeitemente vazias no contexto'
l)si-
canalitico, mas também, por vêzes, palavra "plena", assunção cle rrrn strr-
titlo até entÍo inconsciente pois se a análisc visa elucidal o que o falar
rluer tlizer,-.é preciso aintla que, por momenros, falar queira -dizcr. . . tt
que grrer tlizer.
6) C. W., x, p. 265.
1) Seguíilo o têÍmo de FnEUD ÍetooraJo poÍ ,. L^C^:,{
il8
tópico; nesse sentido êle se opõe tanto ao "pré-consciente" (que não ó
inconsciente senão no sentido l)uralnente «lcsctitivo) como à consciêncla.
Na verclade, essa distinção se encontra enr tôda a obra freudian:r.
De um ponto de vista puramente desctitivo, fenomenológico, a consciêrr-
cia como campo de consciência sitrrado (ou situanclo'se) no teflrpo, podc
scl ot)osta ao conjunto dos conteúdos que ela não visa atualnrentc, e quc
são ;r<;r clefinição inconscientes. Mas a separação importante, aquela quc
coincitle cour a ação da censura, passa no interior clêsse dominio "incons-
ciente". O inconsciente, no sentido psicanalítico, é constituítlo (le con.
teticl<rs inacessíveis à consciência; o pre-consciente, ao contrário, est/r aberto
a cla; constituído de minhas lembranças n:io-atualizaclas, de nrctrs conlrc.
cimcn(os, cle meu estoque de o;riniões, etc., êlc recobre toclo o calnpo (lo
quc, Íi)l'a cla psican:ilise ou antes <lela, c gerahncntc clcscrito conro "iu-
conscaente" ou "subconscien te".
Ftuuo tlesigna ôsse sistcrna pr'é-consciente de maneira característica,
pelo norne <le "conhecimento consciente" (bezuussle Keunlnís) que o opõe,
sem dúvida, à consciência luc el nunc, e ainda mais ao sistema, Ics.8 Os
dois termos são bastante caracter'ísticos: o tlo "conhecimento" que impli-
ca que a distin@o essencial coloca-se em têrmos de sistemas de um certo
saber (ou disctrrso) de si; o tôr'rno "conscíência" insiste nessa mesma clis.
tínção pois vem qrralificar fenôrnenos rnanifestamente irrconscientes do
ponto de vista descritivo, rnas ligaclos :ro consciente do ponto de vista
t<ipico.
tssa é trrna posição invali/r\€l enr I'REUD qtre se opõe raclical e escan-
dalosanrente à tôtla centativa <le interpretação pelos instuumentos concei-
tuais <le uma psicologia da consciência. Vemos aí a conseqüência direta
cla experíência da "tornada de consciência", tal como ela se produz na
cura psicanalitica. Nesta, é r'aro, e mesmo cxcepcional, que a descoberta
clo inconsciente se ;rroduza como um feuômeno situável no momento e
no campo cle unta corrsciência. Geralmente, trata-se de um trabalho pa.
ciente, procedendo rlo particular para o particular, onde a modificaçã<r
das perspectivas cou(inua através dos momentos de consciência clesconti-
ntros, isolatlos, [t eqi.ientemente separados uns dos outros, dos quais nc-
nhtrnr se caractet-iza l)ot' essa brusca reconversão (lo conjunto das signi.
ficações que poderia clesignar o têrmo desvelamento.
Airtrla mais, quando às vêzes se prduz o que se pode chamar em
scntido estreito uma "tomada de consciência" - rcssurgimento de uma
lemblança esqueci<la, súbita ilumirração - poder-se-ía dizer que êsse fe-
tl) L'ltrconscicil, C. W., X, p. 265, Sem dúvlds, levrdo Íroí neccssldedcs apologétlcas FREUD
usa aqul a exlstêncla lncotrteôtávcl do pré-coírsciente (le b.anças, etc.) como argumento
ÍraÍa deÍende. { posslbllldsde de ljm pslqulsmo lncoísclentc .m geíal. Poí ufl momento,
nesse texto, a dlstlnçlo "descíltlva" (Cs,/Pcs, lcs) e rão a 'tóplsa" (Cs, Pc§/lc§, parece
Fassir pa.a o prlÍn€lÍo plano.
De íato, a dlstlíção sisteoátlca csseÍtcial (. Íàpirl mentc ,€enconlrada, pols quc, ao
íinr do dcsenvolvimÊnto (p, 267: dle ho',nlicklge Ableànuaq...l f'REt:D lfldlca quc a qucstão
dô lncoísclente nlo é essenclalmcnte colocada sentro pclos latos descobeÍto5 pcla pslcs-
Dálise. e que Ío18 dêlcs é sutlclcntc "negllgenclar alguís enlgmas da pslcologla da coí§.
ciênçla pârâ se poúpar a hlpótese de uÍna atlvldadc psÍqúíca lnçonsclente".
il9
na)rneno, incon testivelmente consciente no senti(lo tlescritivo, nio trermi-
re julgar de sua pertinência tópica ao sistema corrente. É jí o calo, na
evolução da técnica, tlas bruscas e efêmeras revit,escências sob hipnose.
Numa etapa uherior, a teoria energética da abreação <la lembrançC trau-
mática encontra!'a-se, pol sua vez, in<lÍgente diante ttas revivescôncias que,
mesmo acompanhatlas de todo o corrêjo afetivo suscetivel tle rnorliíic:ir a
estrutura do campo de consciência, não chegavam a ltma l.eesrÍu rrr ração
estável do sujeito. É aqrri que inrervejo a teoria tla " l)urchorbci tetr" cla-
boração interpretativa orr "perlaboração", cujo papcl tl tecer., em rôrlo
de um elemento rememorado, tôtla uma rêde tle ielições significantcs que
a irrtegre na apreensão explÍcira que o sujeito rem cle'si-meimo no sisteh;r
Pré.consciente.Conscienre. Nessa passagem de um sistema a ollrro, o !llo-
mento da "tomada de consciência", no sentido <lescritivo (lo rêrmo, lri()
é senão uma passagem efêmera, todo o acento sendo colocatlo na mrxliÍi-
cação do sistema pré-consciente.
Resumamos ràpidamente nossas conclusões:
Os problemas que o lnconsciente no senti(lo fl'eu(liano colo(.a s:ir)
muito- distantes daqueles que se apresentam paÍa umir psicologia ou para
uma fenomenologia clo campo «.la consciência. O inconsciente psicanÀllri-
co não se define, de fato, em relação ao cam;ro intencional óntle o su-
jeito se "temporaliza", mas pol' oposição a um sisrerna na maior parte
trão<onsciente: o sistema Pcs-Cs.
Se se desejasse encontrar unr correspondente filosófico ;rala rrnr tal
$istcma, não se potleria compará-lo senão ao que HEcEL cleicreve sob o
têrmo de um "consciência" ("consciência inleliz", "bcla alma", ctc), isto
é, uma estrutula organizada da apreensão de si, que comporra e engloba
ruma pluralidade de rnomentos, todo um discurso coerente que janrais é
atualizado ("uma consciência", um "Beuusstsein").
Isto equivale a dizer que o acesso psicanalítico ó estranho às descri-
ções que podem ser dadas no dominio fenomenológico. Num Sartre, por
exemplo, a crltica do inconsciente psicanalitico desconhece suir hetero-
geneiclade raclical, concluzindo os conteúdos inconscientes para as franjas
e para as implicações rJesprezadas de uma intencionalidade atual, ou sêia
em têrmos Íreudianos, ao limite etrtre conscienre e prc.cotlsciente. As
questões assim colocadas (mri-té, rericência conscienre, clesconheci men r o,
patologia clo campo da consciência, erc) não perdem seu interêsse se as
caracterieamos como malginais enr relação ao catDpo Pr'ôpriamcnte psi-
rarralitico; elas se situam ao nivel rlessa segtrncla censura qtre Fntuu co-
loca no limite do pré.consciente e da consciência, mls iuja descrição
rluase nada (ou muito pouco) seduziu-o.e
tJ) () e\êmplo qúe SÁRIRI:. cÍr sua ÍeÍutnção do incclrsaiê t,: írerdlino, Íctoíta dc Srr:xt t.:
o mulhrr rriSldâ que "nâ Ícalldaíle" tcrla Drazer mas íeo qúcÍia reco ll(ct-lo, sitúll-sE
Ícssa Íronlailir ê Dâo nnquela do lcs. ê o pÍocêsso de dêscoihcclnlenlo a dê dlssimt,lasâo
d€ um ê3lado arelivo, r€pÍessáo \UnlanlíilaRung, qüc os l)tiica nlistís uistrngusrl rlo Í(-
cílque. ( Yardrlirgrrrp).
t20
II. O INCONSCIENTD COMO SI§TEMA EM FREUD _ ORTENTAçÃO E
IMPÂSSE DAS HIPÓTESES FREUDTANAS
O texto de Fnr:uu sôbre "O Inconsciente" 10 enquaclra de maneira bas-
tante rigorosa o tema ProPosto qtle, com proveito, sc Podet'ia contentar
_
c) Á htpólcsc cconômic«
) Que sortc reservs FReuo à tcoria da dupla iíscíiçio na contlíqaçlo déssc iexto?
veÍ-!e-á ínal6 abalxo qu. á iíttÍodução do ponto dc vlsas econôdico pe,mlte-lhe em
apa.anck cllmlna. a hipóte9g 'tóplcs" cm Díovclto da tlpótr6r dÍunclonal". N. vcídadc.
8 hlpótcsc tóolc, da 'duola lnscrlçlo" rcoorreccÍÁ alndr ulterioímente (p. 28E) qúrodo
FREUD lídlca quc é preclso sdmltlí paÍa as lcmbra.rseE Ír.é-contclcnte§ . lncon6clcnt.s d.lis
lnscrlçóe3 dlÍcíefltcG. Áqul FREUD lndica que o que tlnha Ícjeltodo aclma (p. 279) náo
cía dc Íato senão a duDla lnscÍlçro "pâra í ,clação das Ícpíe8ênlaçõea con§clcotc e lll-
consclcíte". Me8 sc 5e volta à psssagem pícçedente, vê-se qúc é mesmo paÍ! a Íelação
dos slstenras oíé-coosclentc c lnconsclcítc, quc a hlpótcs. "tóplcâ" .râ abandoíad.. Qúe
quer illzar lsto? FIEUD paÍacc tíazeÍ neo m0la do que um çonpl€crcírto ao quc êlc dizl;r
acima, mas umr vcrdadcl.a coír!ção. Esta d.vc, à §au ve.. '96í Ílm À no§sa líd.cisão
cm lclação á denominacâo do slstems msls alto, que aaualmcnte chamamo§ ttnto Pcs,
lanto Cs" (p. 288). E66a soluçlo nlo 6e í.Eolvc senão na dlírção seguintc: a passagenr
do Icô ao Pcs se ÍáÍla oeccsgÀÍlamente pelo C§, e lgto sem [ova lnscrlç[o, nrE a pâssagem
§ubsequcnte âo pré-conscleíte lm0llcarla, nova i scrição. o qúe !e esq.reír|atlzíria a§§lnr:
Durclúíbcilt i
Ics- C Pcs
(,\"icdct|chtiÍt I <Níedetschtill»
r23
nrento (lc um sisterna para ourlo sc produz por desbloqrreio (la parte (lo
Primeiro e rebloqueio pelo segundo.
2.") Até aqui as cojsas parecem relarivatnente simples: (ada sistemn
possui uma espécie de fôrça de coesão, de energia interna que, aplicada a
um elemento isola<lo, mantém-no no t:onjunto. i!Ías Fnn'o niio pêrmanece
scmprc liel a êsse esquema, em particular no cAso da energia inconsci,en-
te. vêzes, esta palece exercer uma lôrça tle atração strbr:e as r.epresen-
-Por
taçõ:s:
-é,
em particulaÍ, o caso da reoria do rer:alque r. onrle a átrlçãrr
pelos elementos já recalcados vem colaborar corn a repressiro tlo sistema.
superior'. Mas, em outros casos (ou muito simplesmerrre. seguntlo uma
outra modaltlade do pcnsamento fretrdiano) , o bloqueio inr ônsciente sc-
ria, ao contrário, o que imprrlsiona umâ represenração a e»rer.eir no pró-
consciente. r3
Assim e colocarla - mas tlcscjaríamos qrre a contracliç:io fôsse me-
lhor explicitada - a qucsríro esscncial cle saber em que senrido age o in-
consciente: Iôrça de cocsão, atl'aliva, repctitit,il, opóntlo.se à romada de
consciência, ou ao conrr'árío, Iôrça que tcnderiu ionstantcmcnre a fazel
emgrgir suas ramilicações à cot.rsciôncia e sr'r seria contcútlo graças i vi-
gtlância da ccnsura?
5.") Mas talvez essa tlilir:rrldarle se relacione conr a obscrrridade
maior tla hipótese econômica flcutliana, que consiste em identificur purr
e simplesrnente essa "cnclgia tle blo«.;rreio" sisrcnxitica l\ energia libidinal,
ou seja, à energia das pulsões sexuais?
LcmL»ramr», cott efeito, qrre a libido, enquarrro tal, rrío porle ser er-
pecílica de um <los sistenras em presença. Para l'tr.u» a prrlsiro no inícío
não é nem consciente, nem inconsciente, llras orgânica. l-la chega a s:
localizar no sistema, ligandose prccisamente :r lrnla lcl)r'cscrr I acÍo, e rrrrr
"representante-representativo".
Vê-se a diÍicul<ladc que existe em assirrrilar à energi;r pulsiorral u
"energia de bloqueio" sistêmico: ainda que esta última tlcva tlar cont:r
tla dependência de uma representação a tal sistema, é, ao rontrário, I po.
srção róprca de tal representação que decide da posição tripica da libiclo
rluc aí vem se lixar.
Deserrvolvenclo a fundo essa assimilação, chegar-se-ia a rrm:r »oção
tl ue contradiz a teoria geral da libido: a tle uma oposição róp.ica e t;ua-
liÍativa iÍledutlvel entre uma libitlo inconsciente e rrma libirlo (pré.cônsr
ciente), oposição tal que uma não poderia se transfornlrl n.t outra.
(ioncluímos êsse estudo do texto freudiano sfibre o Iuconscientc: o
ob jcltvo rle Fttuo e anles de tudo o de lurulnr a inilepcr ittcia e ( t ue-
são dos dois sstemas,
 explicação mais sâtislatória qrre dêles sc oÍerece e a l.ripóresc eco-
nômica, mas a única .interpretacio coerentc tlrrc poclenro., apresenrlrl rlc.
vcria clrstrng-rrir altsolutamente as "energ.iâs tlc bloqrreio" ctrl cilllsâ c a
12) C. W x p 250-25'
13) o. w. p. 2!to
t24
energia libiclinaÍ. Podemos oterecer provisôti:rnrente, ;rat'a êsse jôgo ener-
géticã, urrr urotlêlo gestaltista. A eneigia cle bloqueio dc trnl sistema dado
íeria comparável à pregnância de ttnra boa forrna. Mas irnporta obsetvad
a que nlvel se oPeta a Passagem de um sistema a- otltro: não se pode
traiar de passagem globa[ de uma mesma estrtltuÍa de trut tnodo de orga-
nizaç:-ro :r unt outt.t,, Passagem ' compa tável ao b:tlou-ço que sc oPera na
imãgem equívoci' O quc passa de uma gcstalt.pata
-outra,cle unra
lrelcépçã<r
irnra é sentpre um elemento isola<lo, eqtrívoco, suscetível de ser
capta<Io pela "pr e§nância" <la grstalt inconsciente. ou (pre-) consciente: .o
'"trabalha
reàalqtte,' como' assinala Fnuup, de nraneira c<tntplctanrcrttc irttli-
atttuil; cada restrltado isolado tl«r rccalque llodc tet scu tlestitro parti-
crrlal'". rr
Um exemplo cômo<lo selia aqrli'lc dos tlcscnhos'enigmas ottcle uma
certa atitr.rde lierceptiva Íaz aparecér nos galhos cla árvore quc abriga unr
prque-nigue tarrtiliar, o cltapéu de Napoleão. Mas se êsse chapéu .é sus-
cetitel de apal'ecer, é porqtre êle pode se unir a uma outra "anedota", que
não está al)solutamcrrte Plesente no rcsto do t[esenho: :t "Iegenda napt>
leônrca".
Nesse modêlo, o que l;reco chama bloqucio seria a ligação do dee-
lhe ern qtrestão (o chàpeu) ao sistema que lhe corresponde (a legenda
napoleônica) . O contrabloqrrcio encontra-se na ligação dêsse -mesmo dc.
talhc ao têl'mo ([uc o evoca no outro sistema (ou seja, as fôlhas das ár-
vores); c a Prcgnância <lo sistema "consc;ente" (o Pique-nique) que suí:
tém na exigêncía a árvorc e suas Íirlhas e tnantém o tltapéu cnr estado
cle latência.
IJis pois, contaclo por Philíppe, um obsessívo <lc lnais ou menos tritt'
ta anos, um plimeiro sonho, o "sonho da licorne".
"O lugar deserto de uma cidadezinha; é insólito,, procuro algunra
roisa. ApaÉce, pés descalços, Liliane - que eu não conheço - e que me
<lrz: há nruito tôrnpo vi unra areia tão [ína. Estamos na floresta e as ár-
t25
voÍes parecem curiosamente coloridas, (le t.intas vivas e sinrples. penso
que existem muitos animais nessa lloresta e, como me apreiso a dizer
isto, urnr licorne cruza nosso caminho; caminhamos todoi os três para
ruma clareira que se advinha lá embaixo".
.. É yT" hipótese, geralmente arhnitida, que o sonho ú u cxpressÍo
dissimulada da realização cle rrm desejo. Digâmos logo crn seguiila quc,
o que êsse sonho subtende é tm desejo dc bebtr, e van)os nlosn.ar como,
a partir dêsse relato, êsse desejo se destaca com evidência.
No texto manilesto do sonho, nada exprime direranrenre trm desejo
tle beber; é o dizer de Philippe que nos assinala, logo em seguitla, no c[e-
correr da sessão, que êle acortlou um pouco mais tla(le na trrcsma noirc
com rnrtita sêde, mas não menciona lenhum outro sonlro precerlentlo
(liretamente o despertar. A êsse propósito, indica que na rúspcra
.ientorr
"arenques do Báltico" muito salgados, prato de que êle gosr;r particular-
mente. Do mesmo modo, cncontramos na narrativa do aionter.imento tla
véspera o essencial rlo material onirico e tle outras cvoc:rções tlo desejo
de treber: Philrppe tinha passeado na lloresta com sua sebrirrlre Annã;
êles trnham, como lhe acontecia às vêzes, espreitado a cac:r rlc animais e,
sobretudq observado no fundo do vale ondá corria rrm riirJro, numeroso§
traços de- cervos e tle corças indicando unr dos pontos em quc os animais
vinham beber. Aqui notamos, de maneira anretipacla, quC c nrrriro pro-
vàvelmente no momento eÍn que a lenrbrança do sorrho se ;rpaga, qtre
ôlcs aconrpanham a licorne-corça que vai bebêr na clareir:r.
- . - A_ análise prôpriamente tlita tlo sonho leva-rros ir rrês lcnlbt anças (lu
inIância.
O lugar deserto clo sonho apresenta alguma coisa tle irrsrilito no sen.
tido em que lhe- {alta um motlrmento ou uma l)esu conr /rgtra; se sc se-
gue as palavas de Philippe, rrarar-se-ia cxatameirre rla 1;ra1ã de rrnra ci-
(ladezrnha cla província onde se acha a "tonre da licorne',. \ão e sômentc
a nbtável representação clo aninral Íabuloso ornantlo a fonte o que purecc,
ter permanecido na memórja dc Philil>pc: ó rambérrr, mas inrlisriiro »o irri.
cio, depois se destacando do relaro, a lembrança rlc uma cena de férias
«le verão que êle- viveu nesse lrrgar, então com a itlatle tle três anos apro-
ximadamente: êlc tenta beber.a água qtre jorra tla fonre toru a conca-
vidade de suas mãos unidas. Encontrâmos, por. outro larlo, na segunda
lembrança, uma réplica dêsse gesto, muito si§nificarivo de uma ceria in-
tlependência. aliada :i experiência de unr tlonrinio rn,ror crrmPlitlo rru
segunda lembrança.
. É a um- passeio na montanha ao qrral nos leva mais espccialmente o
lragmento de lrase: "há mtrito tempo que etr vi . . .,' Tt.;rta-se tle Íato
de um resto diurno, a frase aplicando.sc ao passeio cla vóspera, ao clarão.
tle uma poeira (é o mesmo clarão colorido que, no sonho, o cspanta, cG
brindo as árvores). A lembrança dêsse lugar da montanha suiçã (poeira
Iuminosa e lloresta) está lig (la à uma tãnrativa infanril de imiür um
126
(ompanheiro lnais velho qlre conscglria fazel um barulho de sircna so.
prando nas duas palmas das mãos dispostas em côncavo, apêlo ou sinal
que soava particularmente bem na floresta.
É um apêlo mais precisamente articulado o que encontramos na ter-
ceira lembrança, a de uma praia atlânticá à gual nos levam, através dos
arenque§, para uma volta ao BáItico, pois o aparecimento inesperatlo cla
lrase "há muito tempo. .. uma areia tão fina", ainda e sobretudo o nonle
tlc Liliane que não corresponde a nenhuma pessoa conhecida de Philippc.
Éle decompõe então êsse nome: "Anne" é o de sua sobrinha; seria poi§
de "Lili" quc sc trata? Lili é uma pesoa muito próxinra de suas relações,
prima de sua mãe, que estava com êle na praia atlântica, quanclo tinha
três anos (verdadeiramente, no início das mesmas férias que o rinham
levado à cidade da licorne). A lembrança que eletivamenre marca essa
temporada é a de uma bríncadeira de Lili: como Philippe nesse junho
<leslumbrante, não cessasse de repetir no campo, a to(lo mometrto, com
um ar grave e insistente (pocleria se dizer sedutor?) "tenho s&Ie", lili
acabou por interrogar, a cada vez que êles se l'eencontravam: "Então, Phi-
lippe, eu tenho sêde?" Essa aÍetuosa brincadeira tornou.se, nos anos que
se seguiram, uma espécie de fórmula, quase um sinal de reconhecimento
entre êles, dito no mesmo tom grave e falsamente clesespcrado (conivên-
(ia, segurança ds satistação): "Philippe, eu tcnho sêcle".
Assim encontramos, esboçados sumàriarnente pela evocação das trôs
lembranças, uma primcira interpretação aproxirnativa dêsre sonho.
Graças a uma sêdc claramente motivada pela ingestão de arerrques,
por ocasião dessa necessidade de beber surgiu um sonho <1ue, por um
Íempo ao rnenos, forneceu ao srrjeíto uma certa tlan(luilidade do desejo
tle betrer e adiou o nrornento de clespertar.
Mas convém sublinhar logo que a tranquilidade temporária que o
sorrho trouxe não se retere à necessidade de beber, isto é, a êssc esta(lo
Iturnoral para o qual o sonho não ÍÍa7. nenhum lemédio. O sonho parece
reslronder a uma outra coisa que é o dcscjo de beber, a sêde de PhilÍppe:
c n ela quc convérrr intcrrogar. O sonho envia-nos à declaração fundanren.
tal de Philippe: "eu (enho sêde" e às duas consequências dessa proposi-
ção: de um lado, êle bebe com :rs suas próptias mãos, testemunhan<lo
llnr ccÍto domínio motor; de outro lado, êle se situa em face cle Lili como
aqtrela que chama, diz a sua sêde: êle se encontra prêso a êsse lato sol)
a lórmula irônica e al'etuosa: "Philippe, eu tenho sô(|e".
Resta-nos, certamente, continuat a análise esbocacla dôsse souho c
prrncipalmentc o estudo dêsse tlescjo de beber'. Por <pre ôle se mostra li.
gado à êssc alflo e à cssa tentativa <le domínio? Por qrrc c precisamenre
sob o signo da licorne que se glavou a lemLrrança de um gesto qtre não
loi sem dúvida o primeiro, nem o último? Oncle nos levam enfim, as orr-
tras lembranças tragment:irias de um l'er'ão abrasador? Por errquanto, dei.
xemos essas questões em suspenso.
t27
Esta sêtle aparecia claramente como o rlcsejo nrcsr»o ao tlual resltonilc
a pro(lução onilica. Mas o que sobletntlo vernos, tlestle :rgola, é a duplt
linça gue subentende êsse sonho: tle trnl laclo, rrma ncccssitlirtle de beber,
sêcle contingente, atual, inelutár,el (aquela r;ue provocar':i secundària.
menre o despertar); cle outro latlo a sêtle, descjo de bcbcr, que recebe
alguma satislação pelo fato mesnro tla protluçÍo onirica. l.lssa rlrrpla fôrça
une-se, sem ent!etanto se conluntlir na palavra Sáde.
t28
cisamente porque a I)ulsão introduz na esfera da necessidade rrma quali.
clade eútica: a libiclo vai substituir a necessicladc e c dela que vamos
tomar conhecimen(o no campo, psicanalítíco.
Eis, que, pocleria se pensar, uma primeira fôrça reconhecida, aquela
qtrc tende a recluzir o estado de tensão orgânica, a libido: a pulsão ocal,
cssa "enetgia pulsional" que encontramos em Philippe seria essa fôrça
Ínacrônica em sua manifestação, que o impeliria a aplacar um estado «le
tcnsão psicológica, qualquer que seja, por meío da esfera libidinal oral.
Certamente seríamos tentados a simplificar assim a interrogação con-
ccrnente :i naturcza da pulsão e da enigmática "cnergia pulsional" se
Fnr:t-ro, do comêço ao lirn de sua obta, n:io (ivessc nranti(lo a exigência
(luase dogmáti ca tlo dualismo das
Pulsõcs: "Nossa corrcepção era dualista
tlesde o início, ela o é ainda mais clararnente hoje, depois que designam«rs
por pulsões de vida e pulsões de nrorte a oposição que chamamos pulsões
clo ego e pulsões sextrais", escreveu Fn*:uo em 1920. 17
Assim, não nos c possível limitar o estudo da cnergia pulsional a
utrta das que animam o sonho, à única libido que nôle se manifesta em.
um contexto oral.
Mas, como separar entilo êsse outlo aspecto da energia pulsional, essas
pulsões clo ego, essas pulsões de morte, que devent tambcni desempcnhar
algum pa1xl, rnesmo na produção do sonho?
Talvez não seja sem interêsse lembrar aqui, uma outra expressão
que servia comumente para designar Philippe: êle fazia parte dessa ca-
tegoÍia de criança que se chama comumenre de "moi-je" porque a maior
parte de suas palavras começam por essa fórmula rituáI. Mas quan<lc
chamavam-no de Sr. "r\'toi-Je" rd não era, sem dúvida, no mesmo contexto
simpático com que Lili lhe enviava êsse sinal cúmplice: "Philippe-eu.te-
nhosêcle". Nlostrava-se aí seu egoismo detestável, a<1uêle que se diz tão
natulal às crianças. Desde então, êsse "moi" quc vinha rnontar sôbre o
"je" aparecia simplesmentg como intlecente, insuportável numa palavra.
Notamos, no molnento que, com êsse " ntoi" aparecia na verdade aqui.
lo que em boa companhia não convem jarnais cxi6ir: a palavra que supor.
ta o vazio da pulsão de morte (pulsão do ego na prinreila terminologia).
Se no conjunto é tácil lept'esentar o domín[o da energia pulsional
sexual, ou clizendo dc outra [or-ma, da libido, não ó corn a mesma segu-
r':urça que se destaca o <lomínio da pulsão de rnorte.
l)esejaríamos, a ôsse propósito, nlostlar um segun<lo sonho de Philippe,
sensivelnrente posterior ao <[a licorne.
"Alguém (um meuino de trns cloze arros, parece.lhe), acaba cle escor-
l'cgal corn urna só l)erna num buraco, Êle estll (leitado de lado e grira
mtrito l<rrte como sc estivesse gt avcmente Íericlo. Algucm (sou eu) pieci-
pita-se 1>ala ver orrcle est:i a ferida; nras nada apalece, nem no joelho, ncm
r99
na perna; encontra-se sÔmente no pé, do lado do calcanhar, ulnâ âl Íár-
nhadura vlslvel ctn lorma de longa e grantle virgula, que rrem nresmo
sangra. Êle se telia lerido contril um objeto ocrrlto no buraco: procura-se
ôste objeto, pensantlo etn um plego cnferrujado, tnas antes, êle sc asscrrrc-
.lha a uma loice".
Se o contexto castÍativo dêsse sonho salto aos ollros de totlos, tlispen.
§alemos comentáJo globalmente para poder consâgralmGnos, sem opinião
preconcebida, aos temas principais que seu relaao nos traz. Se é claro
que é o "desejo de casaração" o motor do sonho, que podemos rlizer tle
mais preciso dêsse tlesejo paradoxal, parecendo tão estranho a rô(la "ne-
cessidade"?
Um {ragmento da análise do sonho da foice vai nos 1:ermitir sitrrar
a pulsão de morre em sua (unção <lc matriz tlo desejo e tle strporte rlo
comPlexo de castração.
A primeira idéia que vem ao nosso paciente clcpois tlêsse rclaro c:
de uma cicatriz no rosto tal como é indicada na sua carteira de identi<larlc
diante da menção "sinais particulares". Assim o ferimenro se rornou
r:rcatrize agoÍa peÍmanece mascaÍaclo por êsse 0.aço, se poderia dizer.
() sonho desmascaÍa o ferimento que, pelo fio do discurso, remotrta tlrr
<alcanhar à coxa, Íace posterior, Íace anterior, para enfim enconl.lI seu
Iugar verdadeiro entre elas - or, Íerida, caverna orr santuário.
O lerimento - dislarçado - consaitui o ponto-pivô clo sonho. [rrr srra
ovocação, êle aparete como significativo pela i nstan raneicla<le mesnla rlc
seu acontecimelrro aciclental, lulguranre e Íácil como um golp rle nava.
lha; a dor não sobrevóm senão após o instanre do [erimento e parerc-llrc
r;ue o grito catastróÍico esteja menos ligado ao sofrimenro que sri se rlr:-
senvolve lentamenre, do que à surprêsa do acidente.ru
Vemos, com Philippe, nessa represenração esqrremática cle trm golpc à
rntegridade do tegumento, a radical colocação em causa de sua uniclatle
tle corpo vivo, ruptura, arrombamenao, desordenr fulgurante, intrusão
latal; na cadeia associativa que o golpe de foice do sonho tlesenvolvc enr
nosso paciente, s.io os temas <le arnputação, de tétanos morrais, tle tlegol:r-
ção que sobrevêm: é o tema capital tlo {im ou do t:omêço que ai aparecc
em sua instantaneldacle catastrófica. Observemos, l)or ourro larto, quc
êle marca a origem de um esrado rlc tensão - a rlor - correlatir.o tl,r
sobrevivência do sujeito a êsse dano. Nlas com a tlor deixamos o faro
inqualilicável, incompreensivel da pulsão de morte: entrarnos já no c:rmpo
rla economia libidinal, aqui sob a forma negariva tle «lesprazer, de renslio
ilresolvida.
Mais comumente, porém nrrma srrcessão contrária, cncontriul()s it
cxperiência de uma inst;i ntaneidarle l'esohttiva, quase cxtáricâ, no inslílnlc
de fruição que conclrri - e clá scu scnri(lo
ttlião amorosa.
- ao pra/cl ctesceDre tlc trm:r
l9) Cofio l€s1c,r)llrln rlnra oulÍa lcDrbraDçx rlL' l)i lico , idoso quc íc ltunt dano eíelivo po!;rr
susleÍ (cÍ. "r€sposta à dlscussã0").
t30
 pulsão cle morte e essa firrça radical, ordinàriamente condensada
e [ixa, que aflora no instante catastrótico ou extático, nesse ponto em que
a coerência orgánica do sujeito em seu corpo aparece pelo que elã é
inomeável e rndrzível, síncope e- êxtase, gritando seu apelo por úma pala-
vr:a que a trltrapasse e a sustenha.so
Assim, a pulsão de morte aflora sem jamais se mosrrar. Mas já vimos,
senr poder insistir nisso aqui, que ela constitui essa "rocha",er ã funda-
rnento do complexo de castração, que permitc, cnquanto limite inquati-
licável_e rigorosamenre inquantificável, o descnvoivimento e a olgani.
zação das pulsões scxuais e que enÍim, voltaremos a isto, ela suscita iinpe-
riosamente o desenvolvimento e a estruturação da linguagem.
Não poderíamos pesquisar as fontes energéticas do sonho sem deixar
aqui a questão <la nahuem das pulsões. A afirmação de Fneuo concel.nen-
te ao seu dualismo obrigou-nos a essa longa volta. Resta.nos agora olhar
ttnr outro aspecto clo problema das pulsões, ac;uêle de :stas rcpicscntações
na vida psiquica.
-talando, a pulsão qêg tern nenhum lugar na vida
Prôpriaments
psíqurca,z2 não é sôbre ela que está o l.ecalque, ela não é neú consciente
nem inconsciente e não entra no circuito da vida 1>síquica senão pela
mediação tJos " Vorstellungs-RepÍticscntanz".':r Êsse é -urri têrmo bastãnte
singular do qual é preciso dizer, aliás, de um golpe, que se encontl.a fre-
qüentemente cinclido, no uso que Fnsuo faz dêle, eú um de seus dois
componenrcs. Traduziremos essa expt.essão compósita por ..representantc-
Icpresentativo" e nos interrogalemos sôbre a natureza rlessa médiação que
taz entl'al (pocler-sc-ia mesmo <lizer, que í'cal)tul.a") a pulsão áa lrida
1.lsÍquica.
É sôbre o representante reprcsentativo que - cliz l'neuo - inci<le o
rer:alque original constitutivo clo inconscientê (assirn como o detalhare.
rnos nrais adiante) ; do mesmo modo sãíJ nas rel)resentações que vão se achar
ligarl:rs as ramificações dessa energia pulsion:il bioltrgicaménre [undada. !'
Na verctade, o que_é êsse domíniô da "reprrcserrkrção" <;ue faz errtrat
a pulsão na vida psÍquica?
§c tomamos o exemplo do sonho cla licolne n:io é senão no con[exto
asso< iativo que achamos têrmos l.epÍesen ta tivos tla pulsão oral, e nela
assrnalamos dois: o primeiuo e a lembrança clc uur gesto que se encolltra
gravâ(lo como uma. intagern
- Philipl)e, contatr(lo a lembrança, arr.emeda
o gesto no dir,ã, e ísto c, aliás, como indicarnos, o que o levã à evocação
tlas mesnras rniios juntas ern coucha Para Prorlrr,,ir.'trrn aPêlo <le sir.eira.
r3l
Potlemos clizer que, para Philippe, êsse gesto permaneceri't ligatlo, em
qualquer crrcunsiância, à evocação de uma pulsão oral; êsse gesto gua r-
dará na sua ocorr'ência mesma, todo o seu potler de evocação da sêdc
saciada na [onte da licorne. Certamente, se esta rePresentação motora
peÍmanece assim eletivamente ligada a essa sêde, scnr d_ú-vitla é porq-uc
tal gesro evoca para cada um de nós, bem antes qrre Philippe o tenha
"redtscoberto", ãquêle mesmo gesto do mendigo quc esPeÍa a esmola ott
o óbulo, gesto tle invocação, "sumbolon", enfim realizado por êsse arremê'
do; c também mais concretamente, mas não menos PÍofundamente a for-
ma complementar, invclsa em slta concavidatle, tla agradável e plena
conlexidade do seio.
O segundo têlmo rcpresentatito da pulsão nas associações tlo sonlto
é a lórmula "eu tenho sôtlc". Mais claramente ainrla qtre o gesto, ela
assinala a oralidade da pulsão, Iixa-a, po<ler-se-ia dizer, e já intlicamos
uma rlas maneiras particulares em quc cla se lixotr e institlou na lristdrria
de Philippe; êle dizia "eu tenho sô<le" erigintlo verdadeiramente ess:t
<leclaraçãô - muito motivarla por êsse verÍo abrasatlo!'- como uma csl)c-
cie de insígnia clêlc, Pltilippe, um l)olICo perditlo nessa grantle Praia. IvÍas
essa lórrnula representiltiva se fixorr, sobt'etttdo, graças a Lili, e essa Íórnrrr'
la "eu tenho sôde" se toÍnorr uma es;rócie <le palavra.chave qtrantlo para
inrer'pret:i.lo, orr lalar tlêle, Lili tlizia: "Philippe-eu-tenho-sêcle".
Na mecl.itla em qlle potlemos, gl'aças a um lragmento rle atriilisc, rlcs'
tacal o quc são os "répreselttantes-rePlesentativos" tla pulsão, tliremos <;rre
êles são êsse gesto e essa {órmula. Sío ôles, imagem e palavra, que vão
prossegrrir a arentula na lida psíqrrita tle ?hilippe; "represen tanter"
àaqui em rliante rndilerentes ou pelo ntenos bem tlestacados tla pcrtur-
bação humoral que potle sttbententler a sêde biológica, calregam §cmPle
cori ales e não impoita em qlle ocorrônt:ia, rllna Pequella parte tla aviclcz
tundamental, da exigência ansiosa tlessa libido oral e do a{loramento
fundamental da pulsão de rnorte.
Tentantlo situar o nívcl especíÍico das {ôrças prrlsionais e distingrri'
las da pura "necessidade", resta-nos caracterizar o que se chama.prôpria'
mente ile descjo clo sonho, essa fôrça particular, que pode sôzinha, se'
gundo I'nruo, pôr o aparelho pslquico em movimento.
Portanto, corDo se apr€senla, na análise tlo sonho tla licorne, ess:t
Iôrça motora cssencial? Ê tácil ver que aParece para além da Íórmrrl:r
proviúria que ela o "tlcsejo dc bcber" trm oullo clesejo, menos calcado
na puls.iio, êssencialmentc lôrja<lo a partil' ílêsses rePresentantes e de sctls
rellêxos. É em tôrrro tle Lili, a quem Philippe tlirigc o rePresentativo
"et tenho sôtlc", que parcce se articulat o essencial do tlesejo de Philip.-pc'
lsss 165 leva a úais rle uma via: tle início o jôgo cle palavras fácil c
ambiguo que (le "Lili" nos faz passar a "lolo", na tlupla acePção infantil
(leite) e vulgar (seio) tlessa palavra. Âssim, se distingrre rnais claramettte
&ss "desejo de Lili" cujas implicaçôes apenas conlcçamos a (le-scobrrr.
Pois, o quê, por outlo larlo, Phil\rpe nos tliz é qtte o soblenome Lili etl
132
resel'vado ao uso cxclusivo de scu rnarido (- c dêle ptóplio, Ptrilippe -) .
Oonvém, entim, assinalar a inrportância muito par(icular do fonema "li"
que encontl anlo§ uma outra l,ez no texto do sonho, em Ii- corne; paralnos
aqui, simplesmente para lembrar um outro jogo cte palavras fácil que
l'hilippe evoca a êsse propósito: o /it (leito) de Lili, tnuilo evocador para
êle do "bom par" que Lili Íormava corn sen nrariclo, cnl contraste com
as rclações mais clifíceis de seus próprios pais
Assim, chegamos por uma laboriosa obliqüidade ao r;ue, de trrn golpe
l) llm ouvido analítico, marca o r,ínctrlo <lo sonho e a alma do desejo,
ra
a licorne: animal [abuloso, compósito, uteio-cervo, rneiocavalo, símbolo
evi<lente da tôrça viril exposta. Mas, para Philipp, como veremos, não
é por acaso que precisamente a licorne sutja uesse sonho: toclos os ttaços,
pocler-se-ía dizer', levavam a ela, e ela, por seu lado, leva ao lttgat'
para beber, ao inslantc tle beber em que cuhnina e apaga o desejo.
Pottanto, por que, para Philippe, êsse compósito sinlplista de Lili
c dc "corne" enr licorne vem se impol cíJmo um enigmático símbolo?
Potque êsse chifre (corne) tl'ansportado clos pés para a cabeça (vêJo-enros
mais longe a propósito da análise de rrm sirrtoma) assim como no sonlto
<la toice t cica$iz. era deslocacla da [ronte para o calcanhar? Voltaremos
a isto e, por hora, nos contentalemos em intlicar o que precisamente nos
revela a análise do desejo de Philippe: êsse dcsejo e pala êle plecisamente
o de cstabelecer uma ligação, «le tazer a ponte, de ocultar uma fenda, de
irnpcctir a catástrofe de uma ferida, de esconder a todo preço o que pode
evocar a castração de gualqrrer maneira que sejà ela. Nesse sentido, o
anrnral fabuloso que, em ltrgar do terceit'o ôlho traz o aPôndice invulnc-
rável e vencedor', apresenta.sc como a realização mesma clessa unificação
rnítica. A maís comum das lcgcndas diz que a Licorne e cle dificil captura;
o caçador só consegue caçá-la, emboscando o animal com a ajtrda de uma
jovern virgem, pois, após ter colocarlo o chifre em seu regaço, a licotne
atlot mece.
O nivel do desejo e de sua fôrça é êssc nlesmo: o intagin:irio, o nrito,
o engôclo, clo mesmo mo<lo que assumenl a esscncial e natulal Ítrnçío
tlc ntascalar a fôrça radical que é a pulsão de morte.
Nrrma palavra, talvez mais enígmática, díremos por hora que a li.cor-
ze aparecia na análise do sonho como a mctortínria do desejo cte Philippe.
tu
pleciosas par-a uma investigação; são êsses têrmos que devem ser considera-
dos como os elementos constitutivos do texto inconsciente. Assim, desde
então, os têrmos Lili, praia, areia, licorne, trazidoa pelo texto manifest<r
ou pelas cadeias associativas do prímeiro sonho, constituem certamente os
clenlentos da cadeia inconsciente que vamos descobrir.
Não desejarÍamos parar êsses comentários sôbre a textura mesma do
sonho e do processo correlativo de nossa interpretação, sem voltar à ques-
tiio do "processo primário" insistindo no que Jlcqurs Llc,lw tem subli-
nhado 27 inúmeras r'êzes, a saber - a natuÍeza perfeitamente indicável, enr
tôrnros cientíticos lingüísticos, <los dois mecanísmos do cteslocamento e <la
<on<Ícnsação.
O mecanismo da condensação, Verdichlung, que consiste na substi-
trrição de um significance por um outro, pode ser aproximaclo do mec:r-
n ism<r da metáf ora. Assim, no texto do sonho, o significante "place" (lu-
gar) parece ter sido substituído pelo significante "plage" (praia). Retor-
naremos mais longamente sôbre o mecanismo da metáfora, sobretudo ne
medida em que êle está liga<to ao recalque.
O <leslocamcnto, ou Verhiebtng, corresponde à mctonimia. A llcor-
ne aparecia no sonho como uma maravilhosa metonímia, reenviando, é
certo, à tbnte, mas também à sua legenda, e na verdade, a todo um circuito
que deveremos detalhar na sua estrutura. Têcnicamente, a metonímia é
prccisamente a tigura que sublinha a conexão de um significante a urn
outro, suportando assim todo o mecanismo elementar da linguagem, aquê-
le que o sonho utiliza sem limites.
Mas o que convém assinalar aqui é que a conexão metonÍmica esta-
beleceu uma ponte entre dois significantes (ou vários) cujo parentesco
seja expressivo, seja formal
-arbitrário - é muito menos evidente (muito mais
e singular) do que para a metáfora: entre place (lugar) e plagc
(praia), a ligação pode aparecer; mas apenas a licorne pode supLantar e
rrnir o conjunto heteróclito de fantasmas que suportam o desejo <[u
Phrlippe.
A ltcorne é metonírnia no senrido em que tu«lo nela, na efígie como
na palavra, indica a condensa$o; mas também o deslocamento e o in-
tcrüalo que separam os têrmos que ela une. Do li (Q de Lili ao corne gue
Philippe deseja ter nos pes,/ licorne contém no intervalo de suas duas pri.
metras sílabas os clementos intermediários da cadeia inconsciente. Nurn
outro plano, ela reenvia, mais simplesmente, da fonte gue ela ultrapassa,
para a água que nela jorra no instante mesmo de beber; dos pés à cabeça
enttm, como a cicatriz do sonho da foice, ela desloca o chifre (corne)
t r-a nslotman<Io-o de crosta em dardo.
r35
que designa, recoble e mascala â "abertura" tlo srrjeito, olr, se se prefcro,
sua "castração 9r'.rgi-nol". Assim, a metonímia, como a cicatriz, lior sua
lnesgotável possibilidade de deslocamento, é prôpriamente feita para mar-
car e mascarar a l'entla onde nasce e se precipita perpêtrramente o desejo,
sôbre o rochedo cla pulsão de morte.
.'É num dêsses pontos-limite do aÍloramento tla pulsão (lc morrc que
podernos situar mlticamente, segundo l'nruo, o "nasciincrrto tlo inconsci'en.
te", assim como mostraremos mais adiante.
136
(ôntinuação tle nosso desenvolvimento: êsse Iastro qtre srrbtrai a lirtguagenr
do reino exclnsivo <Io processo prirnário. . . é pt'ecisamerrte a cxistência
<la cadeia inconscicnte.
138
linguagem seria devolvida a urna ligação com algum objeto "real", a essa
ligação de hábito qrre rrnra cer-ta experiurcntação moderna <lesigna como
"condicionamento".s'
Se retomamos os exemplos <lo dicionár io, dircmos que o que impe<le
unr têÍmo de se confundir rrum outro, não é a sua ligação empírica a
rrrna coisa, mas o fato de que o têrmo não é unívoco, que êle comporta
várias dettnições, é o conjunto <lo sentído (b), (c), etc., guc impede unr
vocábulo x de entrar pela porta que lhe abre o senticlo (a). Vê-se que
nossa ficção de uma "linguaçm em estado reduziclo" liga-se, aqui, :r
Itcç:io cle uma linguagem sem equívoco, e que essa linguagenr sem equt
voco seria, pratadoxalmente, aquela em quc nenhtrnr scntido estável seria
1rcssÍvel.
159
Âpalentemente, se passou uma coisa muito simples, umr nludança
tle nome: êsse signiticatlo "s" que eu llomeava tle início pelo nome de
"S", conoto-o daqui por dianre por "S'".
Mas vê-sc também, e é o tlue nos interessa, qtre alguma coisa reio
para baixo, "simplilicado" no senli(lo algúbrico do têrmo: o significantc
original. Ê na med.ida em que a suida tlêsse signilit:unte "5" *: tlistittgttc
de uma pua e símples supressão. que a n)etáfora oferece recursos poéticos,
t riadores de sentirlo, dilêrente tla simples "detinição de nomc": "É pre-
ciso definir a metáIora pela implantação, numa mcsma cadeia significante,
tle um outro signilicante, para que aquêle que ôlc suplanta câi:l na cate-
goria de signilicado, e, como significante latente, perperue ai o intervalo
r:m que uma outra cadeia signilicante possa ser encaixada."ss
O que se tornou o signilicarrtc "S"? Êle caíu rra categoria «le signiÍi-
cado, mas,.ao mesmo tempo, rra caregol ia de signiÍicante latente; rle sorte
qllc, por nosso la«lo, escreveremos conro seglre, a Ír'rrrnrrla dêsse processo:
s'
s s
(lr; ',
s s S
s
Não rcrrros outl'
coisn e»r nossir. ftiurrrrla (ll) serrão o (squ?na neç
,tzo tlo tccalqu,c onrlc se acha consetvatlo numa outra linha, o (llte apa-
Ícntemenrc foi "sirnplilicado" no tliscurso pré-conscienre.
Êsse csquema estii apto ltara tlar conúr de um cer.to nÍrnrero de cl-
lacteres cssenciais. tanto do rccalque corto da relação do irrtonscielrte
recalcado ao pré.conscicnte, colno tlã estrutura tla catleia jnco»seiente.
1.") lnsistimos, de inlcio, sôbre a cstr tura disposta em quarro âtr-
tlares cla lórmula. Unra certa ambigiiidade lhe é essencial porqtre os pró-
prios dois andares inleriores que consrituem a catleia inconsciente estão
em posição de signilicado em relação à cadeia pré-consciente, e lo mesl)l{)
tempo êles próprios se separâm - ao menos lirrualmente
- lrunra letr.:t c
trum senlido, do rnesmo modo, aliás, que a catleia pré-conscie»re. Encorr-
trx-se, assim, simbolizatlo o que pr.ocuramos mostl-ar, tanto ent nossa crí-
tica da posiçíio tle P<xtrzrn corno na exigrência que Percorre to(lo o texto
tle innuo, tle manter em sua autonomiir tle sisiemãs
- certalrrente coÍ-
relativos, mas mais ainda indeltentlentes
(ientc. - o pró-conscientc c o incon\-
:t8) J. l-^cÁN, Lo PsythonolJ'st, vol. V, p. 12.
39) Ulili2amo§ :rssim a posslbllidadii dr irilnsIoÍrnasilo que sc c:!cr('\.(' s!rb a ÍorrDi grneÍali2í\l]r
seguinlc:
A
c D
^ X
tr l) R
c
140
2.o Ern que que, na origetn, ó o <la metáfora ent tôd:t
êsse es<1uema
a sua generaliàacle, metái'ora poética, consciente, - palece'no§ Particular'
mente apto para simbolizar o rccalque?
Na vertiade, não ttos parece resolvida a que§tão de saber se existetrt
nrctáforas l)ulamente conslientes. Em todo cáso, deixando. por unr íns'
tante essa questão em sllsPenso, prender-nos-emos em aplicar nosso c§-
(luema em ciitêrentes casos de recalques, e notadamente nas cltras. grandts
;rtegorias qtre F*uuo distingue: o úcalque após'golpe (Nachdriingen) c
o recalgue original (Urverdriinguns). _
No'caso dlo recalque após gollJe, diz Fneuu, a rcpresentação c retal'
ca<la numa dupla ação: primeiramente, urna repulsão Por Partc do slste'
ma superior, pré<orisciente; por outro lado, a àtração .Por Pal te_ do gue
anteriórmente foi recalcado. Fnpuo diferencía essa primeira ação - re-
pulsiva - cm desbloqueio (ruptura <Ia conexão que existia na cadeia
-(recolocação
superior) e eru contra-bloqueio na cacleia superior do- têrnro
reôalcatto l)or um outro têrmo). Vê-se qtre essa descrição coincide com
o cssencial <to mecanisrno tla metátota.
Mas, die }'nsuo, não existitia tecal<ltre sc o tôtmo recalcado não en'
tlasse em conexão conr os elementos clo inconsciente que iá se achavam
aí, e que exclcem sôbrc êle uma vcrtladeira aúação. Quer dizer, senão
S
que o têt'mo cla cadeia interior, - acha-se como que aspiraclo pelas cone'
xões signilicautes quc êle coutrai ao ttír'el inconsciente, seja pelo.que.iÁ
encontianros como- bloqtreio inconscicntc ou pcl:t "pr-egnância sistêmica
inconscientc".
Mas, para que essa atração possa se oPerar, c Preciso que já exista um
sistema iniotrsciénte, e c porisso que Fncuo recorle a um conceito que nos
parece esscncial rra sua teolia, e em Particular no domínio <las psicoses:
o recalquc originário.
"Sómos, 1rois, levados a admitit' ua recalquc otigindr.io,.uma. primeira
tase do recalque que consiste cm que o l'ePresentante Ps_lquico (represen-
tativo) da ptilsão iecrrsa.se ao encargo do inconsciente. Çom êle. produz-se
uma fixaçào; o l'epresentante correspotrclente subsiste' a Partir daí, de
rnaneira inaltcrár,e[ e a Jrulsão pel'manece ligada a êle".ro
Comenaemos algumas expressões: "O rePreselrtante _da pulsão recusa'
sc ao encatgo do ídconscientê. . . " Quer dizer que o objeto_ «lo recalque
primário;aãrais se tornou consciente; rnas como, Por outro lado, êle náo
-irrcottsciente
àr'a mais antcs de ser recalcaclo, ao menos no sentido do
incouscientc dinârnico, ó preciso
-a athnitir então uma espécie de estado
primitivo rnítíco em quc difelenciaçÍo dos sistemas pré'consciente e
inconscientc nis s1i51g-aincla, e a nosso entender, êsse mito une-se dire-
tamente ao ntito que acabamos clc exllor Ptececlentemente (le tlma lin'
úuagem unilinear.
112
tellbarkctt).r! As rel)l€sentações de Palavlas, as palavras tomadas no serr.
tido mais material de traços acústicos, caracterizam o'sistema pré-cons-
ciente. Ora, Fnsuo volta aqui à gtrestão que percorre todo o seu trabalhd
- a questão da dupla inscrição:
"De um golpe, parece.nos ter descokrto em que uma lepresentaçã<r
consciente 5s distingue de uma rePresentação inconsciente. As duas não
são, como tínhamos acreditaclo, ínscrições díferentes clo mesmo conteúdo,
ern ltrgares psíquicos ditêrentes; também não são estactos cle bloqueio fun-
<iottal diterentes produzindo-se no mesmo local; mas a representação
conscierrte engloba a repr€sentação <lc coisa rnais a represcutação cle pa-
lavra correspondente, enquanto que a representação inconscierrte ó apenas
a rcpresentação de coisa".,s
Nosso esquema vem ilrrstrar essa passag€m <le maneila surpreen-
dente: ao nível da linguagem pré-consciente, a distinção clo significantc
(as palavras) e do signilicado (as "imagens") existe. Ao nível da lingua-
gcm lnconsciente, não existe sen:io imaçrrs, a um tempo e indissolüvel:
nrente em tunção de significanres e de significados. Num sentido, pode-
se dizer que a cadeia inconscientc é puro sentido, mas pode.se tamhçinr,
dizer que ela é puro signilicante, puro não-sentido, ou então abera a
todori os sentidos.
É porquc existe i ntlissolür,.elrnente essa cadeia sígnificante incouscicn-
te que a linguageru pré-consciente comporta uma certa fixidez de significa-
<,ões, um celto estotamento (capilonnage) que caracteriza o processo se-
cundário, - e porque existe uma cadeia pre-consciente com os cat actercs
t;ue lhe conhecemos, e que a cacleia inconsciente retomou, por assim dizer,
po[ sua conta, os caractetes clo Processo primário, tais como os aPrese[-
tamos miticamente "na origem", como caracteres de uma cadeia signi[i-
cante reduzida a uma só dimensão. Entretanto, conr,ém distingrrir o modo
de funcionamento do processo prirnírio em nossa "ficção originár'ia" e
no caso da cadeia inconscientc: no prinrciro caso havia, al)esar (le tô(la
<listinção do nível significante e do nível significado, um cleslizar incoer-
cível de um para o outro; no segunclo caso, a possibilidade de "todos trs
scntidos" se produz a partir de uma verdadeira identidade do significantc
c (lo slgnrticado. Isto equivale a dizer que aqui não existe mais a pos,
sibrlidacle de deslizamento? Bem ao contrário, mas o que agui deiliza,
o que c mobilizado, dizemos que é a energia pulsional ern estaclo 1>uro,
rr:'io especi[icaclo.
Concluamos êstc capítulo rlc clal.rolação teórica.
A origcm. do inconsciente clcvc scr procurada no pr.ocesso qrre intro-
tltrz o sujeito no universo simbólico. Abs(ratamente, pôder-se-ia desclcver
clrras etapas clêsse processo. Nunr primeíro nÍvel de simbolização, as ma-
lhas, a rêde das oposições significantes é jogada sôbre o universo subjetivo;
121 CÍ. à ér6c Í.6p.ito CompléÍtc\l mllaq»thologiquc i lo doctrine dci tév?s, C. W., p. 418
qndc a submlssão do sonho ao Orocesso pÍlmáalo é ípÍeseÍrtada soílo a co sequênci;r dcssa
ícgíessão ao ílvel das representações dc col6as.
13t G. \r'.. \. p. :100.
143
mas nenbuut signilicado ,)alticulal é tomaclo eÍr nta ntalha ;rar ticular.
O que é simplesmente introduzirlo com êsse sistema coextensivo a9 vivi«lo,
é a pura rliferença, a ascensão, a barra: a beira clo leito no gesto do
"fol't-dâ". Trata-se ai, é necessário rel)etir, tle uma etapa puramente mi-
tica, mas os lenôrmenos tla linguagem psicótica mosrram que ela pode res-
surgir "após o golpe" na "regressão", sob a forma de uma reunião de
elementos dilerenciais..l
O segundo »ivel de simbolização ó o que, segundo Fnruo, descreve-
mos como recalque originário;r, segundo .f . l,AcAN, cotno metáfora. É i:le
que cria verdatleiramente o inconsciente, introduzindo êsse lastro que
lallar'á sempre a uma linguagern rrnilareral, e que falta - cle maneira mais
ou menos cxtens:r - no mundo simbólico do esquizofrênico. O signif icadn
está, daqui em (liante, prêso em (ertxs malhas, em certos pontos privilc-
giatlos: o + e o -, o Oe o A, o "bom" c o "mau", a tlireita e a esquertla
vêm pôr rrrn fim à stra oscilação incleÍinida. Para retomar um têrmo que
Mrnr-e.eu-Ponry utiliza a prolúsito tla percepção, essa segunda etapa é
a da ancoragetn no mundo simbólico.
(.luíulto ao cslatuto ontológico «lo inconsciente assim constituiclo, será
preciso lculbrar quc, se é um estatuto tle linguagem, essa lingr.ragem não
Pode absolutamente ser assinrilatla ii n«rssa linguagem ',verbal"?
Âs "palavras" qrre a com;>õent são elementos emprestarlos ao imagi-
nário - notadameDre ao imagin:irio visual - mas eleva«los à dignidade
de signilrcantes. O têrmo imago, um polrco em tlesuso, corrcsponcle muito
bem, conr a con<lição de tomáJo nlrnr senli(lo largo, a ô.sses rôrrnos ele-
mentares rlo discurso inconsciente.
Nesses têrmos, pelo fato mesmo tle gúe permonecem imagens, não se
acha distinção entre um significanre e rull significado; a imagem signi-
tlcante não reenvia a nenhuma outÍa coisa qrre não a si própria, feita
de significado. L.la é Íechacla conro aberta - a to<los os sentidos.
- tantonesse
As "Irases" que se encollrram discurso são curtas seqüências,
heqüentemente quebradas, circulares, leperirivas. São elas qrre descobli.
mos como lantosmas inconscientes ou, mais englobantes, coÍíto complexo.
Imago, Íantasma inconsciente, complexo
- êsses três níveis de orgr-
nização tlos conteúdos inconscientes apresentam clois caracreres aparen-
temente contraditórios: a tixidez, i rigidez mesma cle sua lormulação e
cle sua estrutura, e a intermutabili<lade dos elementos que êles podem ser
levados u rxrrltar na existência eletiya do sujeito. O exemplo mais admi-
145
cessário clo tliscurso consciente, caracteriza-sc pcla ligação rle tlois signl
s
licantes -. Vimos sobretudo, e pensamos têlo demonsrratlo claramente,
s
que as duas lórmulas estão- ligadas pelo processo merafórico tlo recalque;
poÍtanto, representamos a ligação metafórica por uma linha vertical abêrra
nos dois sentidos, enquanro que a linha verrical paralela, só funcionanUo
em tlircção à de baixo, inclica o recalquc. Convém observar que, ness€
(aso, partimos do recalque constituído, po anro dc qtralquer morlo, da
lórmula:
S'
s
"place" (lugar) é o significanre S', potlc.se tlizer que e strbsti-
..Semetalôricâmente
tuldo ao significante "plagê" (pr.aia), od seja S, qrrc
se acha recalcado. Temos, pois, na cadeiã súperioi (discrrrso manitesô)
o- signilicante "place" (lugar) que aí se Íeú;e ao significado .,cena,, ou
"lugar rl-a ação", -'í', o signi{icado, é portanto, a .,céna,, ondc se passa
a ação. Se restabelecermos a corrente no sentido inverso do recalquô, err.
contraÍemos o sinal original_ S ," saber, a praia (plagc) como lugar cl;r
s
ação plage (praia).
cena
Observemos na passagenr o caráter mui to elerivo tlo recalque que,
na ocorrência (se adotamos o ponto de vista ,'literal" ao qual Fnruo hos
acostumou) recai sôbre o "ge", homólogo no contcxro da-cadeia incons-
ciente do "je" de "eu (je) tenho sêrle" ou clo "moi-je".
Portanto, é assim, simplcsnrente, ilustratlo o processo de um recal-
que prôpriamente dito (secuntlário) conforme às perspectivas de nosso
esquema. A partir dai, seria lácil colocar o problema irresolvido tlo re-
calque originário (setor mlricq à esquerda dC nosso esquema).
Fntuo indica muito expllcitamente, e nós o lembramos, que não po-
deria existir recalque secundário se o têÍmo recalcado não êntrasse ãnr
conexão com os elementos do inconsciente que já se achavam ai, e qrre
exercem sôbre êle uma verdadeira arrâção. O (ue rlizer., serão que o rêrino
da catleia inlerior S , ou seja, place hlgar , acha-se coimo que as-
-S- piãge pr.i.
pirado pelas conexões significantei onde êlã enrra no nível do incons-
ciente, na ocorrência pelo "je", homólogo de,'ge" que observamos a unl
rnstante.
e não podemos senão nos repetir, para que essa .,pregnância sis.
- .Ora,inconsciente"
têmica possa se manifestar, pãra qüe essa aúação possa se
140
excrcer',c Preciso qtre 7Z exista um sistctn;t ítlconscientc, aquôlc [resmo
que é "crraclo" pelo rccalque origtnário.
Vamos tentar, semPrc com a ajuda tlo trtcsttto exemPlo, ilustral'cssa
"crtação" c lembramos tambóm que convént corlsitlerá-la colno tlrlr mito.
Se voltamos ao nosso esquema c caminlramos para a esqttcrda de
nossa cadeia tnterior, chegamos ao setor mítico ondc o recal<1ue origin:r,-
rio "criando" uma primeira ca(leia irrconsciente com a ajuda dos repre-
sentantes-represen tativos <la pulsão, torna virtualmente Pos§í1'el o íces§o
:i verdadeira linguagem. Façamos pois, deslizar para a esquerda S , otr
plage ge S
scja [Iage, ou melhor ainda lí o quc l)ela tleslocação nretonínrica
nos dá Soif (sê<te). Eis-nos, pois, diante rlcssa relação signi[icante re-
§iT-
calcada onde está em questão a sêde (soif). Indicamos em nossa análise
<lo sonho, a que ponto a fórmula "eu tenho sêde" constituía urn dos
temas inconsciêntei fundarnentais do sonho. Mas a verdadeira questão já
se colocava ao saber como articular o que lá aparecia como dcseio de be-
ber, com a pulsão oral e a necessidade de beber.
Como de uma "cnetgio pulsional" suposta no início, po<le-se <{rega.r
ao "dcscio", enquanto fantasma compósito e simbolizado pela metonímiir
I icorne?
A análise do sonho indica-nos de uma rnaneira insistente que a me-
ctiação entre a energía pulsional e o desejo está nesse caso assegurada
eletivamente pela fórmtrla: "eu tenho sêde" que se torna o "rePresen-
tante-representativo", aquêle que, segundo F*:uo, faz encrar a pulsão na
vida psiquica. É assim, como já lembramos, pelo processo de sua "fixa-
ção" (inscrição) num representante, que a pulsão é introduzida e pre-
sente no inconsciente.
É, poís, na energia necessária à manutenção dêsse contrabloqueio que
habtta ttrcto o que po<[e ser considera<Io como energia criadora do in-
conscrente.
A título de ilustração sugestiva, podemos neste caso reconstittrir o
mito orlglnal da sêcle de Philippe, senão com absoluta correção - quÊnr
o poderia? - mas com a maior verossim ilhança.
Quancto o menino Phitippe estava aínda ncsse es(ado de cxrstência de-
penclcnte que sua mãe gosta cle lembrarJhe - e que todos invocanr para
nêle atundar, - certamente experimentava a vontade de beber nessa mai
neira desprovida de mediação e de nuance que evocamos pclas palavtas
plenitude e vazio. Qtrer se lhe desse de beber ou não, isto sem tlúvida,
hão mudaria grande coisa da insistência de uma necessidade semPre Ít
novada, até o dia em que (podemos dizer assim: após o golpe, à mancira
dos contos), - foi Lili ou uma outra? - alguém articulou claramente:
"Phitippe tem sempre sêcle" e o chamott "Philippe-eu'tenho'sêde".
Reionhecer e dízer que Philippe trnha §ede era introcluzir nêIe, mal'
graclo a benigna aparência da observação, uma «limensío tôda nova' Ter
147
sêde não atundavâ mais Philippe no abisnro (le uma pulsão cega; quando
nruiro isto se tornavâ unra paixão para ôIe... que êle cultiva scmpre;
pois, ter sêrle não era mais simplesmente abrir a bôca gritantlo, era, des-
de então, ser reconhecido como sofrentlo nma pulsão delinida pela pala-
vra "sêde"; era, sobretudo, e isto é essencial, introduzir pelo significanre
"sêtle" a drmensão lundamental da sêde de Lih, pois Lili dizia, {alanrlo
dela. - sua lembrança é lormal nesse ponto: - "Philippe, eu tenho sêde".
(Na vcrdade, como se pode ver, a lenrbrança é amblgua, e é isro que lhc
concctle seu valor. Lili diz assinr "para rir", nras sabe-se o que "l)ara
rir" <1rrcr tl.izer'. Ora, tutlo intlica que Philip;>e terrlra entenditlo literal-
rnente, e alérn disso no seu pleno senti(lo, a brincadeira).
Quc se trata de uma lembrança lelativ:rurcnte tartlia da idade de trêl
anos em natla, aumenta seu valor ttc iluscraçiro a1x'rs o golpe rle uml expe-
nência lundamental marcanrc pat a Philipltc, 1;ois não remos a ingenui-
dadc tlc acretlitar que essa lernbranca privilegiatla Íesrinta e limite a cx-
periência de nosso pacienre.
Agora podenros dar rrrna plinreira fónrrtrla para resumir o urito rlo
nascimenro do inconsciente: êle rtstlta da capluro da energia pulsionol
nas údes do significante.
Completemos, pois, o scrol mirico tlc nosso esquema, nôle represen-
tando lror uma flecha horizontal a cnugia pulsional indiÍcrenciado; acres-
centaremos também o fragmerrro intercorrente tla cadeia significarrte ma.
nilesta de Lili:
Sêtle s
Ê êssc "crr tenho sêtlc" que vai cotrstittrir um dos núcleos originais rl;r
catleia inconsciente.
Segulamente, ainda se poderia interrogar sôbre o fato tte qrre sej:r
precisamente êsse signilicante que se acha recalcado para constitirir rr;rl
dos têrmos de base dêsse inconsciente primordial. Sem querer adiantar
muito o rlesenvolvimento desta análise, pensamos, cntretanro, que é opor-
tuno desenvolver ainda um aspecto particular dela.
r48
Já vimos, lro clecoruer <Ie nossa precedente análise, que pelo subter.
túgio do nome néo-tormado Lilianne, Lili tomava uma posição parricular
no nível das tbrmações inconscientes domrnantes da vida psíqtrrca de
Philippe. Além do tato já notado, da passaçm fácil de lolo a Lili, a pr<»
;úsito da questão de beber, e a ogrosição fonética lo-|i... (l) que não
<lesenvolverernos aqui, convém lemblar que Lili não era o nolne da pessoa
em questão, mas sônrente o'diminutivo pelo qual apenas setr rnariclo e êle
< hamavam-na.
Portanto, parece bastante claro, como já mostramos, que poru olétn
<l<t<ksajo de bcbcr, pelo qual resumimos o desejo formatlor tl«r sonho,
apat'eciam sucessivamente, o desejo dc Philíppe por Lili, o desejo de beber
«le Lili, enfim, e sobretudo, o dcscjo d.c l-ili por seu maido c de seu na-
rido por ela.
Podemos, pois, dizct que, se a int:i<Iôncia "Lilí diz: Phitippe, eu tenho
sêde" toma assím função de catalizador criador clo inconsciente, e na me-
tli<Ia em que o signiÍicaute SÊDE ai surge como encluzilhacla representa-
tiva, cruzado por caminhos que levam tanto a unra situação dual cle de-
penclência da mãc, como a uma situação edipiana do lado da sêde de Lili.
Assim, indicamos para uma pl irneira recons(ituição do fantasrna da
sêde de Philippe o miro do nascimento do inconsciente "que, iguahnente,
restrlta da captura da energia pulsional nas rêdes do significante".
Mas agora devemos precísar, de rrma maneira mais rigorosa, ôssc lugar
mitrco do encontro entre a pulsão e o significante.
No sonho da licorne é o momento mesmo do beber que aboliu por
rrur instante tôda tensão: é o momento onde o "rnoi+u-tenho sêde" se
realiza e se apagr, que aflol'a, nós o dissemos antes, a pulsão dc morte.
Para o bcbê é o instante em que, cheio no sentido literal, êle adormece,
assirn como a licorne da legenda adormece e se perde após tet cedido às
artimanhas do caçador: pal'ece que, por um instante, com a plenitude
ablc-se o apêlo tascínante de um vazio km-aventul'ado ou catastrófico.
I{as para Philippe, hoje não é mais ao beber que êle se enche ou, igual.
imente, que §ls se inquieta. O que resta é, por vêzes, a angústia de se
achar num lugar onde poderia Íaltar água, mas sobretudo o que subsiste
hoje, igualmenss, vivo, é o "moicu-tenhosêde", verdadeira fórmula má-
gica que abre e esconcle para êle os abismos de alto a baixo, que êle não
grode drzer de outla torma. A essa evocação êle se inquieta, assim como
uo sonho o abismo otr a ltrz entrePercebida suspenclendo o sonho num
grito ott num riso.
Sem dúvida, podemos compreelrder quc, <tescÍe o dia enr q ue "eu
tenho sêde" pode mudar êsse glito ínalticulado, Philippe clominotr algu-
tna cois:r do ine[ável. Ao rnesrno tcmpo que êle asstrmiu, assim, trrn pctlaço
tle linguagem, nascia com essa prinrcír'a octrltação rla pulsão cle rnot'te, sett
rrtconscienre primál'io.
O que ainrla ntais clararncnte nos aparece no sorrho da foicc onde
o glito faz parte rlo próprio sonho, evocando o "kiai" (êsse glito sagrado
r49
rle que é qucslão rro budismo Zcrt) tapaz de matar ou de ressuscitat. ()r;i,
nessê sonho, o que vem suprir a ausência do Íerimento no Iugar tla morrc,
é uma cicatriz, um "traçon. Vamos ver que êle não é indiferente, que êlt:
se revela mesmo como significante Pol excelêrria.
Êsse traço vermelho no calcanhar, único datro aParente no sonlto
causatlo pela dissimulada foice castradora, envia'nos, já o vimos, a uma
cicatriz que Philippe traz efetivamente na fronte. Ela é o traço tle ttm
acidente lelativamente sério tle sua infância: num contexto tle lrrta tle
prestigio com um rapaz sensivelmente mais velho que êle, sobrer'ém ôs»c
ieriménto vivido catãstrôficâmente que o leva a unra sitrtação cle satislit'
ção regressiva da criança cuidada por sua mãe. Hoje, essa marca, êsse
sinal particular l)ermanece de certa maneira a marca do p-referitlo, -ott
clo eleito. Simbolo cla distinção preferencial, significantlo sobretu«lo êssc
lerimento e, através dêle, todos os outros ferimentos, a cicatriz enviou-nos
ainda mais diretamente à marca dominante da circuncisão ritual. Por via
da análise do sonho a significação do pé onde se marca a feritla revela-sc
correlativa do pênis circunciso e dos avatares atuais de seu desejo. Ter
sido o prelerido é efetivamente ter siclo objeto de tlesejo por sua mãe'
Natla marca melhor para nosso paciente a segurança, o recttrso ina'
balável (consolação, Iortãleza e impasse) do quc essa cicatriz, traço tlc
ruma situação em que sua mãe o recolheu amorosamente; ainda mais
que "seguÍança", a cicaúiz signif ica que êle foi "amado de amor". Assirlr,
elsa maica indelével pcrÍnanece o slmbolo de uma consolação imediata,
estéril e prêsa; sobretudo ela estigmatiza e lixa o paciente nessa posiçirtr
lantasmática, mas aberrante, de significante do desejo.
Assim como a marca de sua circuncisão funda virtualmente o ios-
trumento de sua virilidade e sua fecundidade num ferimento e ntrma coll'
sagração, paralelamente a marca de seu rosto parece ser votada tôda irr'
teila à sua mãe: a cicatriz está aí para signiÍicar que o corPo em su:r
totalidade perÍnanece o privilégio do desejo de sua mãe.
O chifre da licorne indica o local mesmo dessa cicauiz: tudo se Passa
no rnconsciente de Philippe como se precisamente ela aí residisse.
A questão que colocamos da energia especlfica e que perrrrite o
contrabloqueio necesário do recalqrre originário, r'erdadeiro "criatlor
tlo inconsciente", - não podemos responder melhor no momento do qrtc
pela análise do caso de Philippe que acabamos de desenvolver. A energi;r
especllica é o iato da pulsão de morte por mais precisamente (llre css.r
pulsão se apresente como uma Íôrça radical e imóvel, um vazio por excrrt-
plo, que lrão tem ligação com as pulsões libi<linais a não ser no setrti(lo
em que elas o fundam. Aclaralnos mais nosso pensarnento dizendo quc o
replesentanre tla pulsão é anlcs de tuclo rrm lel)rescntante da 1>ulsão rle
morte; assim, sêdc ou cicatliz (traço, marca, foicc); são êsses tepresentarl-
tes prrmordiais que constituem o ,nconsciente prirnário, aquêle qtte n:io
extste senão em cstado de rccalquc lttttnurrc, Assinr qrrc êle aparccc crrr
I50
nosso lragnlcnto de anírlise, é a pat'tir rlêsses representantes inconscient.es
print:irios que se pode clcsenvolver verdadeiramente - mais ou meno§
bcnr - o que se chama o clesejo do sujeito: é a partir dêsse texto primor-
dial inseparàvelmente ligaclo ao afloramento da pulsão de morte, que apl-
recem os representantes das pulsões libidinais e que se estrutura o qlrc
se poderia verdadeiramente chamar de "desejo". É a partir do significante
sê(le que se desenvolve o complexo libidinal do "preferido".
Geralnrente podemos clizer que a lingtragem, como o inconscien.
te, é primária e indissolüvelmente ligada ao afloramento da pulsão
(le nlorte, por mais que permaneça precisamente êsse fundamento do murr.
<[o do desejo que não se pode, vivo, nem ver nem nomear. Parece-nos útil
rnsistir nessa dimensão específica do inconsciente "primário"; se ela nos
escapa tol'na-se muito diÍícil manejar oportunamente tanto o inconsciente
"psicótico" guanto o domínio «lo inconsciente neurótico, feito do recalqtte
secun<lário cujo mecanismo detalharemos.
Assim, para Philippe, os signiticantes sêde e traç,o parecem-nos cous-
titutivos do inconsciente primoldial. Sêde e traço são e fazern o recalqucr
origrnário, isto é, a "tixação" <lo afloramento inefável ou catastrófico da
pulsão de morte.
É nesse fundo de inconsciente primário, cuja gênese mítica nesse caso
tentamos descrever que se vai poder destacar a licorne como excelente
nretonÍmia do desejo de Philippe.
/í?) Os câpitülos L ll e lV ÍoÍnllr cscÍilos por J. L,rplÀsCIIi; os cípitn los lll e v t)o. S
LEct^tnE.
151
LTNGUAGEM E INCONSCIENTE
Coltrlu Srl:tr.t
r57
alóm tla dilererrqa rle lingttagem - êles dão uma imprersío tlc ttnitla<lc
que reduziria provisôriamente suas oposições a particu la ritlarlcs de
<letalhe.
J. LenrencHn c S. Ltcletnt intitularam seu seguntlo capítulo í) In-
consciante como sistema em Freuil. Nesse ca;-»itulo, êles Íazem â slra exe-
gese do inconsciente, tal como o Mestre o aprescntou no qrratlro de str:r
lnetapsicologia conclulcla na maturi(lade,. por volta do ano de 1915. Isso
implica de sua parte a opinião de que as modiÍicações e aperÍeiçoamen tos
(tópico dramático das três instâncias e dualitlade fundamental tlos ins-
tintos) que Fnruo trará ulteriormente a êssc sistcma não oferecerão ne-
nhum acréscimo ao essencial do que então tinha fixado. Sua exegese conr-
portantlo uma escolha pessoal a propósito de posições fretrrlianas qlrc peÍ-
manecem amblguas ou hesitantes conduziJos-:i ao ponto on(le l)oderiio
introcluzir seu estudo do "inconsciente estrutura(lo como uma linguagem".
S. LÉsovrcr e R . Drerrrrr, ao contrár'io, consagram uma lrrirneira parte
rle sua exposição à visão cle conjunto da evolução clo conceito de incons-
(rente em Fnr-up, Portanto, não é possivel comparar ponto pol ponto a
nraneira pela qual essas duas exposiçôts compreenclem o perrsanrento tlc
Inruo. Limitar-me-ei a chamar sua atenção para clois pontos: os autores
rlas duas exposições parecem tirar scu conhccimento clo irrcorrsciente cle
rluas maneiras especllicas, não disse idênticas, mas pelo menos rrÍio hetc-
rogêneas, de ouvir seus pacientes - e a qualidade de realiclatle que é
Preciso conferir ao inconsciente que êles entenclerarn potler tlal lugar à
r.ontrovérsia.
quando S. LÉrovrcl e R . Dterxtilti tlizerl que "a psir:análise não
é lrma rnterpretação rlos conteúdos e dos slnrbolos", que "uma rlas técni-
r as mais lÍeqüentemente empregadas pelos psicanalistas e aquela que con-
siste em mostrar numa seqüência do ntatelial as ligacócs qrte existem
cntre seus diferentes elemelltos", êles não lazcnr senão lernbrar PrincíPios
clássicos que J . Lerlrrlcst e S. Lrcl.ctnt rclonlam na srta elegante, mas
talvez muito rígida distinção "entre tlois motlos tle esruta, um em tradtl-
çào srmultânea, outro lacunoso". O [ato cle que se perceba o inconscientc,
antes rle tudo nas Iacunas do cliscurso trão porlcria tlar lrrgar à contratlição.
À4as que existam lalas sem correspontlente inconsciente, {alas vazias, jil
não ó um corolário da verdade de que o conjunto do discurso <lo pacien-
tc não é, de direito, interpretável. Dai ;rorler-se-ia ter matóril para
rliscussão:"O inconsciênte é uma segunrla cstÍllntÍa na qual os fenôntenos
llcunosos (da conscierrcia) encontram srra trnitlade, intlepenrlententente
tlo rcsto do texto", alirma J . LepnNcsE c S . Ltcl-ltn.u. P(Jt-t-rzrt, se-
guido - parece-me - da A. »r WetLnt:rrs, r'cjeita essa segunrla estl uttlr.l
poÍque prêsa ao realismo. S. LÉsovrcl e R. Dt,trxtne Pensam que Fneu»
não caíu na armadilha do realismo do inconsciente, ainda que J. Le-
Pr.ercHn e S. Lrcrlrnr pareçam considerar que, se o realismo é uma rea-
lidade, ête se acha ao abrigo da visada infamante do epiteto Íealista. É
necessário mosÍrar-se senslvel ao pé da letra à critica de Pourztn e reftr-
t58
tá-la, otr admitir a letra e rrela refutar a cr íti< a? iVÍeu papel aqui é o tte
chamar a atenção para a ques6o do realisrno pretenso ou não cio incons-
ciente freudiano. Mas clevo dizer - e não creio ser suspeito de rrma posi-
ção antifilosófica em matéria de psicanálíse - que, êm metr entender,
uma vcz admitido o inconsciente freudiano, essa questão acal)aria numa
querela puramente escolástica. Ainda mais que J. Ller,nxcne e S. LE-
cr-./\rRE se esforçam por estabelecer
- com sucesso me parece - que o
inconsciente é uma realidacle que escapa à segurrda crítica, a da abstiação,
que P<.rltrzr:n lhe laz; qrrc ô'le não é uma coisa, mas sim a realidade de
trm cliscurso em pessoa.
Um qual pesso-a, perguntar-se-á? Não necessiiuianlente na pr-imeil x
pessoa, única possibilidacle considerada por Porrrzrn, respondeião Ll-
rLANcHE e S. Lnclirrnr, que acrescentam: ,'Quanclo algo (ça) fala no
inconsciente. . . . "
- algo se exprime na gramática do sisrema pré-cons-
ciente em terceira pessoa, mas não seria necessário concluir, pór outro
lado, <;uc o discurso inconsciente fala em terceira pessoa. Na -realidade,
trata.Se de uma pessoa ambítua, intraduzível senão, segundo o contexto
<io ntonrento, em uma ou outra das três pessoas gramaticais. Quando algo
se tonla ;usim o ego in('onsciente que [ala, o ego é aincla uma pessoa
ambígua. O inconsciente que discorre na pessoa do ego ainda não dis.
corrc na primeira pessoa. Não é necessário deixar-se levar pelo fato de
(lue, na falta de melhor tôrmo, Fnsuo tenha se contentado êm transfor-
nrar em nome o pronome ich, poís o inconsciente nunca designa os sêre6
pela idéia_ de uma relação ao ato da fala,r êle não conhece plolrome.
O inconsciente qtre Íala na pessoa do ego pode set lraduzido, asiim comc
l'nruu o mostrou 2 - o que tive ocasião cle lembrar a - como telrdo um
pólo sujeito e um pólo objeto, como podenclo falar em primeira pcssoa
conjugada com o vcrbo ser e em prinreira pessoa conjugailo com o-verbo
ter. O objeto dêsse ter pode ser reconhecido no sistema pÍé-consciente
como. uma terceira pessoa que pode falar à segunda pessoa, mas a palavra
lrercebida e recalcada não mais estará no inconsciente na terceira- ou na
§egunda pessoa, mas na pessoa do supelego agindo no lugar do lcl. O in-
consciente não conhece as pessoas da gramática: Id, ego, superego são os
sôt es rle um sistema que lhes e próprio.
r59
como o sistema Pr'é-consciente.conscieD te; que um e outro são, a um
tcmpo, Ietra e sentido com a condição de que a letra do inconsciente não
seja a mesma que a do pré.consciente; que o inconscienre esrá esrruturado
c(lno.uma linguagem, com a condição de que essa linguagem não seja
uma llnguit.a A questão da dependência ao sistema pré-cãnsiiente da gia-
mática- da língua é de uma muito grantle inportância. Ela reenvia por
outro lado, à sua lormulação arcaica que se acüa ern Ftr»rNen» DE S;us.
suRE: para êle, a gramática pertencia à ortlem sincrônica, inconsciente c
individual, aquela da parolc. t3em entenditlo, aqui é necessário tonrar. ;r
palavra inconscienre num sentido puramente dcsiririvo.
[sclarecidos êsses pontos, restaria examinar. se a tópica das três ins-
tâncias tàrcliamente introtluzidas por FnEuo em sua concepção tlo incolrs-
cienre cleve lbrnecer um argumtnto em favor da hipôtêse da dupla
inscrição.
'l'ôda a seguncla parte do trabâlho cle . Llrler.rcHs e S. LucLernr;
J
- constituída de seus rrês últimos capitulós - é consagrada ao esturlo
tlo que se acha inscrito no inconsciente estruturado como uma linguagcnr
e ao estudo <la maneira pela qual a inscrição ai se efetrra. Logo dC inicio
nâo se pode esquecel de abordar êsse rrabalho sob o ângulo cla subjcti-
vitlaCe. O que chama a atenção nurna primcira leituri rápitla é, com
efeito, o conjunto da análise clo sonho tla licorne visando irão sômente
estabelecer o "texto inconsciente" que o srrbententle, mas tambénr clar
conla (lo estabelecimento mesmo dêsie texto. De minha parte tive gl.andc
prílrer nessa primeira leitura, e fiquei vivamente seduiido pela Íabili-
dade tlo procetlimento dessa metamorfose proposta à minha imaginação,
procetlinrento aparentado com aquele dos [iagmentos tle In lerpretãção'dos
Sonhos e <le A Psicopatologia tta aida qlotidiana, ,nrs e*ploracla aqui
numa escala mais ambiciosa tle um grande conjunro.
- A sôduçiro inclt
à desconlian_ça, mas a«1uêle que desconfiar do giro cle prestidigiiaclor t;trr:
o secluziu não rerá senão quê aprender seu minejo lrara encontrar-se enr
contliçôes de experimenrar, pelo efeito de sua ação sôbre os outro6, a su:l
realidade. Desde que o procedimento tem sucesso, e é verdade, restari:t
estabelecer a ordem de sua verdade. Pr.oporei, pois, algumas reÍlexões
sugeri<lus Pelo exa[te detalhaclo dêsse texto, c ía mediãa cnr que el:rs
160
ser'ão cr-iticas quercas como tais, em tunção de sua visada mesmo, isto é,
construtivas. Seu esrudo rraz muitas dificuldades que incitam à circuns-
pecção e aqui não €ncontraremos senão fragmentos.
Examinarei "o inconsciente estruturado como uma tinguagem", tal
como o vêem os au(ores sob o ângulo de seu inventário, ou então de sua
semiologia clesde o inÍcio, e sob o ângulo de seu mecanismo ou aínda
clos proceclimentos de sua articulação, em seguida. Aí se encontra fone-
nras (palavras, cadeias de palavras e também frases artictrladas segunclo
o rrso cla língua); aí se encontram representações de coisase imagens enca-
dcadas em complexos. Isto não é muito sarisfatório e tende, creio, a quc'
:t _distinção entre os sinais do processo primário e os do proc:iso secún.,
<Iário não seja sempre rigorosamente Íespeitada. A demonsira$o clo sonho
da licorne não se superpõe sempÍe ao estudo teórico exposto no capítulo
quarto. Notemos que não é muito evidente que a palavra'.sêde" (soiÍ_t
ou "eu tenho sêde" constitua no paciente analísado um núcleo originat
<la cadeia inconsciente, pois que se nos diz que beber permaneceu sua
paixão e que êle nunca deixou de enunciar "eu tenho sêde". Mais lonee
proporei considerar como núcleo original cle sua cadeia inconsciente não
a palavra "sêde" mas o fantasma "Philippe, eu tenho sêde", o que é com.
pletamente ditêreure. Notemoo ainda que a cadeia ,'Lrtr
- pràia - pele
pé - conua" e consticuída de têrmos gue reenviam a lembranças ou a
-prcocupações achandose, ao menos no momento da análise, à disposiSo
<la consciência do paciente. Quer seja pelo eÍeito da análise ou não, essa
seqiiência pertence ao que se poderia chamar o léxico pessoal do sujeito,
rnscri(o enr seu pré-consciente. E se ela aí se acha inscrita pelo efeito da
análise, não se tem o direito de supor que ela surgiu tal como aquela
do inconsciente, o gue irá chocar-se com a hipótese da dupla inscrifão e
n:-ro J:oclerá se explicar senão pelo deslocamento da energia de bloqueio
de um sistema de representação única. Essa cacleia é uma cadeia de signi-
ficantes, tendo cada um uma certa fixidez em sua signifícação, reenviand(,
cada um, em lembranças determinadas, a coisas e a estados afetivos, rela-
tivamentc <letinidas e, ao me§mo tempo, ao seu lugar comum na lJngua,
ten«lo soírido o efeito <lessa " capitonn dge" en$e diferentes cadeias de-sig-
niticantes, o que sôzinho, segundo Llcer, assegura ao vocábtrlo um lugal
<leterminado no léxico.
Os autores mostranl.nos como, para significar o ltrgar cta ação a
rnet:itora lugar (place) se substituiu ao significante praia (plage) que
se acha recalcado e "entre, dizem êles, em conexão com os elementos do
ínconsciente". EIa é, no exemplo escolhido, apresentada como uma dessas
"palavras<ncruzilhadas" consideradas como sen<lo os elementos cons-
(itutivos do texto iuconsciente. No inconsciente, ela se acha em conexão
com o [onema "j" que é de alguma [orma representativo do fantasma
gue sc pode nonlear "Phílippe eu tenho sêde". Tenros o direito cle supor
rluc a palavra praia (plage) tomou importância para Philippe, não tanro
porgue ôlc poder'ía sempre se lembrar que esrêve na praia com Lili (êle
' tol
se enconllou com ela em rnlritos outros lugalcs, l)ois ela Pcl'ten(ia its suas
lelações), mas antes, porquc, ouvin(lo nomear a plaia, êle senrirr lcnascer
a carência de satisÍazer a pulsão representarla pelo fonema "j". Assim,
a representaçâro da coisa que era essa praia dererminada à bcira rlo Atlân-
tico, sob uma iluminação determinada, acha-se ligada ao represcntante
signilicativo de uma pulsão, representantc significativo que c o nÍrcleo
de um lantasma. A representação da palavla "ptaia" permanece, betn
entendido, segundo a viúo de l'nruo que os auroÍcs lembram, srrbmissa
ao Processo secundário que se inscreve no pré.consciente. Quanto a essa
"pâlavra-encruzilhada" praia, ao mesmo rempo signiÍicante e significado,
que não é completamente a praia do vocabrrlário e não mais completa,
meDtc a representação imaginiiria da praia €m causa, cujo caráter ambíguo
ó clefinido pelos autores como um sinal emprestado ao inraginário, mas
elevado à dignidade do signiÍicante e que êles designam pelo têrmo inragr»,
essa palavra.encruzilhada me parece situar.se na encruzilhada rlos siste.
mas inconsciente e pré-consciente, antes clo que ne encruzilhacla das
associa$es mais profundas do inconscienre. Ela perrence ao vocabulári,.r
submisso ao processo secundário, e ao mesnlo tem;», ela ó srrbrrrissa a
ligaçóes particulares com o inconsciente em razão de um componente fo.
nemático que lhe assinala um valor parricular.
- As palavras não rne
parecem mais achar seu lugar naquilo que o inconsciente tem cle mais
essencial, não nrais do que os elementos constitutivos do inconsciente rrão
se articulam seguntlo a gramática da língua. Antes, o inconsciente tem
por elementos, representações de pulsões que, na medida em que são da
ordem da linguagem, cstariam ligaclos a fonemas oll talvez a grupos rle
lonemas, mas jamais a palavras enquanto rais. Êsscs fonemas representaF
aivos de pulsões entrariam na constituição de fantasmas inconscientes
onde se achariam ligados às representações imaginárias, as representafes
ile coisas, como as chamava Fnru». Pode.se dizer que o inconsciente é
estruturado como uma linguagem com a condição de reconhecer nessa
linguagem raÍacteres particrrlares que a diferenciam radicalmcnte da
llngua. A lÍngua, usando tle palavras arriculadas segundo a granr:ttica,
p€Ímanece inteiramente no domlnio dos processos secundários. Bem en-
tendido, ela se exprime na parole particular em razÁo dos efeitos das liga-
ções que constata com a linguagem inconsciente pela mer.liação tlessas
"cadeias de palavras.chavcs" estabelecidas por S. l.ncrernr, e J. Le-
PLA.!.ICH-E.
Êsses pontos de vista vão complicar o esquema da oposição entre sis-
tema inconsciente e sistema pré.consciente. Essas "palavras-encruzilhadas"
que eu teria a tendência para situar na encruzilhada dos <.lois sisterlas,
sempre potleria clisputar seu lugar na camada mais superficial rlo incons.
ciente, ou numa camada mais profuntla tlo pré-consciente. Isro eqrrivale
a lembrar as dificuldades inrlicadas pela psicologia modernâ dêsse eu que
participa, a um rempo, dos dois sistemas; err que convém disringrrir do que
162
Necrr chama o inconsciente elementar,t têrmo que se Poderia muito
trcm conservar para designar êse inconsciente radicalmente inconsciente,
cujo inventário acabo (le tentar limitar. Âs ',cadeias de palavrai-chaves,',
tlas quais se trata, situanr-se ao nÍvel das estruturas conflitivas habitual-
mente designadas pelo tôrmo de rnecanismos de deÍesa do ego. Talvez se
porleria enconrrar aí o acesso a um estudo da função lingüística dêsses
mecanismos. IVIas não teutarei empreender isro hoje. Sou, pois, levado a
consi<Ierar que a oposição mais radical ao pré.consciente é aquela de um
trrconsciente para o qual proponho conservat., ao menos provisôriamente,
a designação limitativa de inconscíente elementar. O inconsciente elc-
menhr não sc superpõe exatamente à instância, lugar anrorfo das pulsões,
que Fnuuo chamou o Id. Êle paÍticipa também das funções assinaladas
ao Superego e talvez aos ruclimentos do ego. Certamente, êle é, como <-r
163
J. Larueirrcut e S. Lnct.,rtne nos tlão tlm esqrlema tlo rccalque..sc-
gun<io o processo tla metáfora - êsse e o núcleo cle sua tese e acredi'to
que cla niio se acha alteracla pela reserva de que o significante -caítlo tto
inconsciente entra em conexãó com elementos do inconsciente elementat
sem por isso tornar-se, pràpriamente lalanclo, constitutivo tlessa última es'
trutúra; isto pelo recalque a posteriori, o único, ali:is, tlo qual temos urn
conhecimentó direto peia prática da análise. Ao contrário, o recalqtre ot'i-
ginal é rrreversível. Éle é constitutivo dos lantasmas do inconsciente ele'
áentar. Para compreender o recalque origin:lrrio, rlizem os atrtores, "ó
necessário concebetl a existência de ctrtos "significantes-chaves" colocatlos
em posição metaforizante, e aos quais são devolvidas, além tle sua Íôrça
particular, a propriedade de colocar em ordem todo o sistema_ da linguagem
Àumana. Vô-se (ue lazemos alusão em PaÍticular ao que J. LeceN cha'
mou a "metálora paternal". Mais longe, êles nos propõem uma recons'
tituição do que chãmam, muito justamente, o mito do recalque. original.
com a ajudi de seu exemplo clÍnico. O nascimento do inconsciente, di-
zem.nos então, "resulta tlá captura da energia pulsional indiferenciatle
nas rêdes do signilicante por mais que o significante esteja al destinaclt>,
precisamente, â prender ã "aberturà" fundamental do ser, _asscguranclo,
3em interrupção, a metomínia do desejo". Mas a reconstituição que ern
seguida noi é proposta consiste pura e simplesmente cl_n -a{irmar quc- o
si§nificante sêdê, nretonfinia a rrm tempo do desejo de Philippe . 99 .19'
sejo do qual Philippe quer ser objeto, .constitui um dos núcleos oriHinais
dá cadeiá inconsciãnte. A fôrça da Iunção meta[orizante tlisso que J- l,t'
ceN chama "o nome clo pai" não está mais em questão. Antes de rejeftar
â tese em razão dessa ligeireza de sua ilustração clinica, tentemos recolls'
tittti-la usando do inétodo proposto pelos autores: o significante "Philippg,
eu tenho sêcle" reenvia incontestàvelmente ao desejo (à "abertura" de
Philippe) e isto não enquanto se refere a água de uma fonte_ ou ao jôrro
de ág'ú ou de leite que ie dava talvcz à Philippe quando dizia que--tinhai
sêde, mas enquanto ãla tem a função de "nome de pai". O significante
"sê«le" que re-envia ao desejo de inçrir água ou leite ó aí uma metáfor':l
que é támbém uma litote. Segundo o esqúema, se colocamos que o-signi'
ticante "Philippe eu tenho sêde" reenviánclo à "abertura" de Philippe c
recolocada pe1ó nôr'o signilicante "sêde" - a "aberlura" de Philippe se
aúará conotada pela sêãe, assim como o significante "Philippe eu terlro
sêde" será submdtido ao recalque. Êle formará um núcleo original do
jnconsciente assim como no sisiema pré-consciente o verclacleiro desejo
de Philippe se acharia mistificado pela sêde: sêde
164
Que o signilicarrte "Philippe eu tetrho sêclc" csteja subrnetido ao
nío significa que a lrase [orrnada Pelas palavras "Phi'
re<alque original,
lippe eu tenho sêde" seja constitutiva clo inconsciente elementat', mas
sim o [antasma do desejo da mãe que assim podemos designar, na falta
de têrmo melhor, pois afinal, é preciso falar com Palavt'as. Quanto à pa'
Iavla sêde, se ela sê torna no sisierna pré-conscientc tttna metonímia dês-
se desejo, nada prova que no seio do tantasma, ela tenha uma existência
enquanto elemento constitutivo suscetível de ser isolatlo, a§sim como te'
rnos tôda a conclição pal'a crer, ao contrário, que o fonema "j'" (de. "crÚ
tenho") e que se acha em "plage" (praia), c aí ttttt núcleo privllegiado'
O lato de que a lembrança da palavra "Philippc ctt tenho sêde" porsa
ser fàcitmenle evocada não traz nenhuma dificuklade, pois o gue faz o
objeto do recalque original não é essa palavra, mas sim o fantaslna do
tleiejo <la mãe <ltre <lesignamos assim, na falta de nrelhot têrmo. A lem-
blança poderia, aliás, ser secundàriamente recalca<la, contraindo ligações
resistênús conr o tantastna. Recalqtre originário e tecalque secunclário
assim se achariam ilustrados ao mesmo tempo. Nacla prova, aliás, que o
iuconsciente elemetttar seja definitivamente constitttí(lo muito cedo, pode
ser que q recalque originário contintre durante tôda a vida, ao lnesmo
temlio em qrre se clesenrola o processo mais rttidoso do t'e<alque sccttn.
<lário quc o recobre.
Fazia alusão, ainda há pouco, à se<lução <la detnonstração clínica de
J. L,eeurvcnr e S. Lrcr.lrnr: êles tomaram a precaução de nos dizer que
os signiticantes de seu texto reconstituldo não §ão exatamente da mes-
ma natureza que aquêles do vocabul:lrio - signi[icados ao mesmo te]npo
qtre signilicantes, representações de coisas ao meslno tempo que rePrc-
sentações tle palavrai, signos inquietantes, aÍ nTto reconhecemos as pala-
vras tamiliares do texto manitesto. E, quando êlcs rr<x; 1>ermitem ottvir o
que está recalcado, clesde a origem, no mais llrofrrrttlo de nós Inertnos,
rião c scn:io por cssa natureza benígna, que encotltramos a bela satisÍa'
ção <le crer que nossos fantasmas são apenas fantasias. O que em su:t
;rrópria linguagern, pocle ser enunciado: conl trtna rnctonímia do inconri
-ocültam-
ciente êles a "abettura" clo psicanalistir setnPre entretido na
vivência prática de seu otício. Nenhumi metal:sicologia se destaca do co-
Ióquio plicanalistico. EIa resulta sempre tlc ttma tomatla tle distâncie,
e Ii está- sempre a scrviço d isso que sc cottvcnciott<lu chamar as resistên-
cias contra ã psicanálisê, ela deve semprc ser submetida à prova -clo re'
tôrno à experiência. Mas o tempo clêsse-retôrtto niro é ainda chegado pois
que aqui não é o seu lugar. Sem prctencler completo êxito no esfôrço d.e
etcapai à crítica que fa(o aos outros, acl'escctr( a t'ei ainda uma reflexão
que me sugere o cstudo de sua exposição.
165
exchlsão dos sinais do vocabuliilio e tlas regras da gr.antírtica por cxenr-
plo. Uma de suas quali<lades posirivas apalece de um golpe conro lun-
damental, aintla que inrpte(isa, ao psitanalista: o inconsciente é estlu-
turado segunrlo o mo(lôlo conÍlitivo grre lhe Íorneceu, o posteriori, o
complexo tle Êdipo. É unr tlaclo qlre, no fim tle rrma an:ilise lel,ada. a
seu têrmo, percebe a problemática mais prolunda»rcnte regr.essiva se irr-
tegrar nos tlados do confliro edipiano, conferindo-lhe um scntido uô\.o.
Sabe-se que MÉrerrr: Ku,rN quis dar conta dêle encontrantlo o complexo
de Étlipo nnma idade muito mais delicada do qrre era atlmitido. I'c,i
contluzida assim, a lormular conceitos, os quais sêtrs adversários sentcrn
que correspondem, cle certa maneira,;i uma realiclarle, mas quc l)erlna.
necem inadmisslveis porque são atribuidos à crianças incapazci tle concc-
bêJos, a um inconsciente elementar que não tem a linguãgcm.
Conviria, para evitar confusões dêsse gênero, distinguir, de urn lado,
o cotnplexo de Édípo, de outro a estrutuÍa edipiana do incortscicnlc. (l
complexo de Édipo se forma na idade em que FREUD o ttescr.eveu, srra
existf'ncia supõe a de uma linguagem suscetível de ser urilizatla para :r
(olrulticação em pelfeita conformidade com o uso das r.egras rla Íngrr.r,
não rrecessàriamente em sua fineza gramatical, mâs em seu carátcr ãcle-
quatlo. Â esarutura etlipiana do inconsciente, assim chamatla por analt>
gia, c :rquela que lhe é conferida desde a origem, arravés tlo rec.alque ori-
ginal. Ela é a lorma na atração cla qual o complexo de Édipo, devido
ao Íe.alque a poslerrcÍi,1oma I esrnlrura que lhe é própria. S. LÉrovrcr
e R. DrerxrNr saem da conlusão kleiniana, quando formulam seu prirr.
cipio cla constância da rePrescntação do Íantasma da cena primi tivã na
regressão cla angústia de castração à angústia do desmembramento. 6 O
chamarlo lantâsma da cena-primitiva é como que o sêlo sôbre o qrral virá
se esrluturar o drama cdipiano.
Êsse lantasma multiforme e indescritivel por essôncia,
Podc ser rc-
presentaclo ulteriormente por cenas imaginárias de Íascinanie violênri.r,
aquelas que se acham desenhatlas ou arremedadas pof gestos em tôdas as
análises de crianças, e por vêzes tão bem reprodúzidai no discurso clos
pacicntes adultos. Porem, mais perto do recalgue original que o precipite
no inconsciente, pde-se muito bem vêlo nomeado cômo o queria ;. Lr-
cAN, se eu compreendi bem, pelo nome do pai, pois não é nenhum orrtro
se.não o íant-asna do desejo tla rnãe. Quando, comentando o exemplo clií-
nico e-studado por J-. Lr,rr-lNcHE c S. Ll:clArnr, eu falava do fantasina qrrc
se pode nomear "Philippe, cu ienho sêcle", não se tratava de uma moàa-
lidade do lântasma da cena primitiva. Pode-se observar, de passagem,
que o tantasma da identificação ao desejo da mãe implica umà relãção
que não conhece nem o verbo ser e nem o verbo ter a ação do incons-
ciente é aquela da identiÍicação primária que não-conhéce nem o ser
nem o ter. Sàmenrc por aproximações pode-se clesignáJa mais Íàcilmentc
6) S. LÊBovtcr e F.lude ies ldntosrÍIcs thoz I'cilont, en RLv. fr, .lc pq,.ho-
nolyse, 1954, n f;,r.Dt^rx,nn,
r66
pelo ser, para (liref com F'REUD que o ser é mais primitivo, o ter aParecendo
àosteÍiormente. É mais importante dizer que a relação ao desejo da mãe
não pode ser senão repleção ou carência, beatitude ou angústia mortal, pte-
sertçã ou ausêncía; ela não pode ser conotada senão por um sinal positivtr
ou, urn sinal negativo. O célebre exemplo do jogo do carretel mostra-nos
coÍno essa relação e ativamente significada em sua positividade e em sua
negatividade pela oposição de um primeiro par de emissões vocais. E êsse
par de emissões vocais e talvez realmente, um dos primeiros que têm o
valor de sinal, pois êsse jôgo que Fneuo observou numa criança de 18
meses pode set observado numa forrna menos acabada mas iclêntica, quan-
to à tbrmação, pouco tempo antes da aparição das primeiras palavras, an-
tes da idade de um ano. Pode-se formular a hipótese de que êsse primeiro
par de sinais vocais tornam-se, ao mesmo tempo, significantes do desejrr
da mãe e valôres substitutivos de troca. ? Não são palavras: o nome do
pai tal como o concebe J. LnceN não pod e ter clesde à origem um esta-
tuto semântico. Parece que se deva ver aí,
nais indtviduais nomeandoo resp€ctivamente em sua positividade e ern
sua negatividade. e Mais tatde êsses sinais vocais poderiam enconttar s€u
Iugar numa espécie de fragmento de discurso, tal como "Philippe, eu tc-
nho sêcle", fragmento que não vale pelo sentido das palavras que aPa-
lentemente o compõem, mas sim por seu valor individual e único que
taz dôle, a um tempo, um sinal do fantasma. e um valor substitutivo de
troca. Além do mais, êle envia provàvelmente a Pares de oposição mais
sutis que aquêles da simples positividade ou negatividade do cumpri-
mento da pulsão original. Alguém se lembrará de tpr cultivado €m sua
intância, durante longos anos, uma espécie de melodia fonológica, de pa-
lavra complicada ou pedaço de frase à cuja distinção as palavras escapar
vam, melodia fonológica privilegiada tendo um valor mágico e que teria
sido destruída pot uma atribuição de sentido por parte dos adultos, espé-
cie de unidade que empresta sua face significante à língua para signifi-
car, t'ora da convenção linguística, o fantasma. §e as perguntas das crian-
ças atestam uma necessidade de sair dessa magia, sua ausência de peqgurl-
tas concernentes a certas Iocuções que elas não "compreendam" responde :i
necessidade de conservar um setor privilegiado de fórmulas mágicas stts'
cetíveis de simular o cumprimento dos fantasmas inconscientes que elas
designam. A estru(ura do inconsciente e aparece, se as considerações qtrc
precedem são válidas, como apatentada àquela da meta-linguagem quc
167
lormam segundo LÉvr-Stneuss, os mitos. 10 Os mitos fazern tla linguagen/
ltm uso que se situa num nível diferente daquele da lingua. Os à-om-ptg1
xos (onológicos que reenviam aos fanrasmaí inconscienós são anál&ós
aos mitemas, unidades constirurivas dos mitos, dos quais CI. LÉvl.Srne'fss
diz que se situam não no plano do vocabulário, màs naquele dos fone-
mas. Como os lbnemas, êles-resultam de um jôgo <le oposiçâes. parece acêi_
to que a estrutura elementar do inconscientd résrrlta <io iôEo de umâ oDô.
sição ral qyl e1.". pode ser sustentada por um par. dc'rigno, vo.riri .r,
signos "lort" e "da" no célebre exempló de Fnrúo, signos "conotanclo res-
pectivamente a negatividade c a.posiiividade clo cumfrimento da pulsão
origina-l no movimento de identiÍicação ao desejo tla'mãe. Assim, a pr.o-
jeção de modalidades contraditórias ão cumprimenro da prrlsão no ffan-
tasma conlina com umâ estrutllra {ormada por dois
;tares^tle signos con-
"peto clr_
trários, segundo o esquema (I) ontle a mãà está reirresentada
-
culo,. ser'- desejq o "desejo da mãe" estando represenrado em tôrla a sua
ambigüidade e nas duas modalidades pelos doii pontos à sua tlireit:r e ri
sua- esquerda e que se poderia, por rCíerência à'criança com o carretel,
designar pelos fonemas "o" e,,a',. A criança que se iáenrifica ao tlesejo
de sua mãe e representada na ponre. rlo triân§ulo por lrm ponro
um po o porque ela não se constitui aincla como tún sujeirô e - por
lrorqrrt o
desejo da mãe não é em si um objeto.
ESQUEMAS
168
\I) se leconhece a ambivalência da pulsão original replcscntada pelos
tlgis lados do triângulo partindo de sua ponta, e o desdobramento da
P§eçao da pulsão representa<[a pelas duas metades de sua base. A relai
çãd biníria chamada ple+dipiana, da cliança à sua ruãe - pelo fato dc
sua ambivalência de um lado, e da ambigüidade clo desejo da mãe que
contém a um tempo a rcpresentação da pulsão e sua projeção no fantasma
- est;i bern estruturada por uma relação em quatro sinais, clois pales dc
sinais opostos. rr
A ambivalência edipiana em [ace do pai permitirá reconhecer a es-
l-rutura do complexo original em filigrana, através daquela do complexo
de Édípo que supõe sempre, sabe-se, um quarto clemento; ela é uma cs.
pécic de pré-figuração dêle, numa outra linguagem, aquela do incons-
ciente elementar. J. Lerrewcnr e S. Lrcrerns êles vêem a coisa
cla maneira como apresento aqui?
- mas
- dizem muito justamente que o in-
conscierrte e a condição da linguagem. A questão pode ser colocãda, pois
êles afirmam o que a intuição nos indica sem dela nos ter dado veida"
deiramente uma demonstra@o até o fini. Aqui, é preciso lamentar que
êles não tenham feito a distinção precisa entre lingúagem e língua. Àcs-
(ruturâ em quatro sinais da relação binária com a mãe, que sc pode qua-
Itficar de complexo original pois que faz do objeto do rtcalquê original
um Íantasma inconsciente, essa estrutura que não e aquela dô complexo
de Édipo, nela tudo se encontrando em filigrana, merece ainda a quali-
ticação cte edipiana por sua analogia com a mais elementar estrutuia do
parentesco segundo Cl. LÉvr-Smeuss, estrucura que é, segrrnclo êIe, prc-
t3) Essa seqilêícla êncontre sua llustíação n.rlna seqüêncla de psicanálise dramátlca lndi-
vidurl, t l como Íol colocada poÍ S. LÉBovtCt. A técnlca dramátlca Fermlte ÍepíesentaÍ
cm sua slmultaneldadê a ê6tíutura slnc.ônica do complexo, ainds que um movlmento
do dlscurso analitlco quc sc desenrola Ílum modo dlacÍ0ílco como todo dl6cuÍso, nlo
íeenvle ai s€não poÍ uma apíe€nsão ÍeÍlexive de sua totelldade, de seu inicio ao seu Íim,
totalldíde que não é maÍs o própÍlo dlscurso. A técílca dÍamátlcâ se diílge às pessoa§,
nâs ql(âls uma lal cafracidade de apÍeensão íeflexlvü é grávemeÍltc peí(uÍbüda: os psicó-
ticos. (Paíeceu-me que a colocação dessâ técílcâ poÍ mals lntcÍessânte que cla scls
-
íío pcÍmltld lníelizmente restit(ií { é5ses docntes essl capxcidade de apíceosão).
-Tive ocaslão de colocar em cena, para um adolesceíte hebetíêníco, FrédéÍlc, o esqúerna
do conlplexo oÍlgloal tal como lhês apreseítei. Êle nos caüsavá muití diÍiculdade em
ÍazÍo de selr comportameÍto incoerente que não podla seí coísldeíado coíno uma peÍtlci-
pâção nas cenas reprêsentadas, eÍn tôdÀ á medida em que élc não acciteva a distlnção
ent.c a íepresentação díam4tica e a Íealidade do tíetamento. Uma col.ga ocupa, poi§,
o lugar da mãe, a mãe Ce Frédéric, enquanto que dois colegas trornens ocüpam os logaíes
do deseio da mãe. A mãe châmava um dêles com úm "vlvà o doutor STÍiiri!" c o óutro
com "lmundo Doutoí STEIN!" o qúe eÍa duas exclar ações Íreqüentes e multas vêzes
consecutivas ilo sujeito depols de algum tempo. E os dols ltomeís nro Íízlem outÍa colsa
seíão rep€tir essas Ííases, cada om ío qúe o conceÍnla. Colocado em Íace dêsse trlo,
Fri'rltiric na ponta do t.lângulo se diÍlgla espontânesmente tânto pâ.â um coflo psía outío
dos dols homcn§, repetlndo as Írases de cada um cont expíessão e gestos apropÍiâdos de
amor e de ódlo. Mas depois de um momento êle s€ Íl\ou em seu luAjrÍ, ía oonta do
tÍlângulo e enunclou "Frêdéílc!" Essa Íoi a pÍimeiÍe vez que éle sc designou-por seu
nonrê. Eu lhe pe'li então erpllcaçôes e essa iol a prlmelía vcz que Âs obtlve. Quando
s_ue mãe dlzla "lmundo, Doutor STEÍN!" lsto signiílcava, me diz €le. quc ela çopulava com
êtê, o qüe Íhe causava mâ1, e quando ela dizla ..vlvá o DÍ. STE|N," ísto q erla dtzer que
cla o masturbava, o que lhe fazia bem. Â copulaçâo (pênis coÍl(ra pênis e em relaçlo
com o tcma delltante de uma empragada que querla quelmáÍ seÚ pêíiÊ coÍn o ferro de
pa6sar roupa) c a masturbação poÍ outío (ant Íelâção com ufi Jeseio exrr:mldo mÍltas
vêzes) eram dols de seus tcmas habltuals, mas nlo lhe tlnhá Eldo possívcl obteÍ a Íneíor
assoclação metaÍórlca e respelto, assim como a pÍopósito das duas exclamações conceÍ-
nentes ao Dr. STEIN: elas bâlaíç0vam 9em Ílm em encadelarnentos nratonimlcos (cÍ. a
concepçlo dc ,. LÂc^N tal como a exoõêm J, L^pL NCHE e S. Í,EcLÁtRE). Â apÍeen6ão do
dlscurso inconsclente em sua estÍutura slncÍônlca restabeleceu a dlsposição da metáÍoÍa.
169
cisamente aquela da interdição do incêsto. Êsse tio matetno constiturivq
cla lamllia elementar enquanro representante tlo grrrpo que deu cm lÍoü
uma mulher de seu sangue, a psicanálise encontra.o iempre presenle,
numa textura de valor inverso, da imagenl do pai. A regras do cdsa-
mento e do parentesco são, segunrlo Cl. LÉvr.Srn,luss, comparáveis à uma
linguagem. "A posição amblgua das mulheres nesse sistema cle comuni-
cação entre homens em que consistem as regras do casamento e o voca-
bulário do parentesco, olerece uma imagem grosseira, mas utilizúvel, do
tipo de relações que os homens puderam, há rnuito rempo, enrreter cotu
as palavras. Por essa sinuosidade chegaremos a um esiatlo quc reflete
aproximativamente certos aspectos psicológicos e sociológicos caracrerís.
ticos dos inlcios da linguagem. Como no caso das mulheres, o impulso
original que levou os homens a "trocar" palavras não tleve ser proctrrado
numa representação desdobrada, ela própria resuhante da função s.im-
Mlica lazentlo sua primeira aparição? Desde que um objeto sonoro é
apreentlido como olerecendo um valor imediato, a um tempo para aquôlc
que Iala e para aquêle que ouve, êle adquire uma narureza contraditória;
cuja neutralização não é possivel senão por essa rrocâ de valôres complc-
mentaÍes aos quais tôda a vida social se reduz". 1,
O Dr. HE,.-xr Ev quis que a manhã de hoje Íôsse consagrada ao rerlir
"O Inconsciente e a linguagem". As reflexões sugeridas pla exposição em
cuja drscussão eu devia introduzir, e que acabo de submeter a todos, não
fazem senâo chegar ao ponto onde, na perspecriva cle uma antropologia
psicanalirica moderna, deverá ser empreendido o estudo da teorif psiõa-
nalltica do inconsciente em suas ligações com a lingüistica e a antropolo-
gia social.
DrscussÃo
M. MERT,EAU.POIEY 1
t70
PoN"rY dcsiír.o lr€lo ,.onrc de letência, uo aer.tido güe HEIDIEGEB úi o essa palo-
o16 (Verhrgenheit), e ,.úo paro quaLÍiodt'um aer que se díssitnulcria, atr&s da'
aparêncios. A percepçõo, com o condqdo de ndo concebê.,o cofi, úmo opert-
çdo, corna unt , ,odo d,e reçresenta4õot ÍLos corno urnú mi§turú de wno impet'
cepçdo, poile sera\ir d.e nod,eb, e útparnfr o símple' ÍEto de oer: "ter é ndo tet
necesEid,ad,e ila fornwr um per8onlento". M. MaLEAU-PoNTY ,entDTo que, ú feíI
ecr, fl abertutú lraro o 9cr nõ,o é lít,giíístíca: é no pcrccPçdo Q*e êlg oé o lugúÍ
d,e u@sc,ttct.to dú Ía10.
EAbre o problenlú do irrcol.sciente, segunilo élc, os !ílóeolos ndo estõo con-
d,ono(Los d aitenrutiua: ou tirsr o so,bot d,ú noçdo (ssirnilo;ndo-c- d untt cons-
ciêuciõ degestruturaila, o$ tomá-lo nurtu $entido estritometrte realisto, o que
conduz & lmagínar urrla açd,o cawoa no sfu al4 pslquê. Entdo, ,tdo se Íoz senõo
anorter um pté- julllomento tirad,o ilo perasarnento cortesiono e qtte co siste,
conro HUSSEBÍ, colocou etn eúidêncio, enl construir o mito de uttll t §iguê 86bre
o lfloilêlo do ntu do lístco, amo urn tecid,o contlnuo de laottao'lrflentos aigdos
cntre sí por rel,qções de cúu.súlrilúi1,o. A aoluçdo ndo é rnaís o de procüror rs
Íetonerlologi,e, oo |twrooa qtnnito 8e s conhece corno urrw úrt4líta{Ú intenciontÚ
que ili.atíngúltiú e dcsaaeoerl@ posltioornente &rrut sérle de operações ou de atos
fu, consciêttciz. É precko encont"ct N)ções qúa seiú7t neuttos ern rewio d8
distitwões trúdicionois dú ÍilosoÍia clós,cico, e eú*te nos trúbú,hoy de Hussarà
por maio Íiel qt e ela bflfu iüto 4té o lhn de atd oido d cnal[taco, o it diaryú,t
ile túis ,.oções o d esagêt cfu ile unlú tal pÍocurú (o corW cotno oldente otoíoel
e como cumpríndo "wno esgéc.le ile reÍl&oo" irléia de simultaneiMe, de 0ç60
d distancüt), D*er do +r.c@t6oie to qae êle é' o lnoerso do cotncbnte é seg*-
ramet.te eÍrôlco se do reÍere d kÁéür ile símetrio e ,úa é assím que é preolso
entend.ê-lo, Ante| se deoeÍó penflr nquib que K.*NT disse do conceato da
grandeza negatlva, auia lrnportdnoiÚ no que c(mcerna d gênese ,w histÓtiÚ da|
adAas ila u,oçdo ile bwü§ci(r.te, M. MERT,EÂU.PoMY súDIínIrÚ, no Íim ile sta W
teruençdo, 8e umo grandezo negetiüo é uno grandezo ile sinal contr6do, so
KANT pode itizer gúo o 6illo é ttfl atnot fiagatbo, qu,e' por eoemplo, o üabÍ é
un ilortu nellotitso, é al q*e ge ilove reconhecer únle úrttcuwdo, utttd, simultanei-
dade da presençd e da 6u,sêncid,. t
M. ANDBÉ GBEEN. Certamente o belo trebêlho de J. LÂPLÂNCEE e §. IE-
-
c[/lrRE{ é feliz no restabelecimento que êle m8rce desss primazia do Inccns-
ciente na Psicenálise, e aua exegegê ilnterpEtative permitê 8 ccnfrontaçÉo das
teses freudlanas com ss últimss eqúslgões das mais svençada6 clêBclas huma-
nas (lingüÍsticas, antropolóBiicas) ou dos movimentG filosóficos cotrtemporê-
neo§ (fenomenologia, msrxismo ) em beneflcio da psÍcentlJlse. Entretanto, po-
de-6e per€fu.ntar se na su& tênta,tlvê, qu&tsquer que sejam as vantc.gens de uma
6ttueçÉo do probleme em s€u nlvel mals elevedo, êles trazem algumo, confir-
maçõo do inalterável rlgor d& metapsicologie psicanalltlca?
17r
não por negações próprias a assegurar uma melhor repartiqío dc fôr9as,
â prátlcê exlgindo- as revrsõês constêntes dos conceitos. As6ill1, um grande
nútnem das pcsições adotÂdas no artigo aparecido nà Aetupsicologio em 1915,
ao qual J. LAPLaNCHE e s. LECIáIRE consagram seu comentário, elarn êpne6en-
tâdês na Cillncia ilo§ Sorrhos desde 1900. Nesse momento já é introduzido na
teoria e difêr€nciação em consclente, pré-consciente, lnconscicntc, como sáo
descritas as lets do pnocesso prirÍúírio, utilizadas a.s noçôes de bloqueio e de
descsrgâ, estabêleclda a conexâo entrê o fnconsclênte e o recalque e fcrnrulado
ao pé dê letra o ponto de üsto econômlco. Desde entÃo, pode-se perBuntar
em que o artigo de 1916 inova? J. LÂPLANCIIE e s. LECLÁIR}: fazem entendêr
no inlclo de seu trsbalho: tôda â dtscussáo, centraliza,-se em tôrro dÊ pr€vÊ-
lêncla em concordar com â dlstinçêo dos sistemas conscientes e lnconsclentes
do ponto dc vtstÊ tópico (aquêle quo deflne e opõe aB i,rsÍfrflcio§,) ou do
ponto de vista econômico, (equêle que esp€cifica os regimes dê energla
p§lquice numê Êvêliagâo quântltÊtlva) 5 ao qual censuram a obscllridade, ou
apresentam coÍlo depêndendo do ponto de vista tópico. Por outlo !ado, parÀ
fundar a lndependêDcla e a coesâo dos dois slstemas sá) cbrigâdos a reconhecer
que "s expllcaçéo mais satlsíêtórlo que êle ( FRELID) oÍerece é a hipótese econô-
mlcâ.". Desde o inlcio, nÁo se vê porquc Ê coisa é feitê de maneírê téo rôplda.
em J. !ÁPLÂNCHE e S. LECLÁInE, contra FaEUD, pela teoris da dupla inscrlção
que velortzê o pcnto de vtsta tóplco. Iremos comprendê-lcs plenamente quando
ocupâFem-se na demonstraçÃo da proposrçâo fr€udlanê que JÁcQrl;s LACÂN
búlhantemente desenvolvêu apoiondc-se nos dadcs da lingtlistlca moder-
na: o o lnconsciente é êstruturado como uma linguagem. Obsclvcmos logo que
êle nâo dlz: a estruturê do Inconsclente é ê linguagenl, mas que I estruturâdo
como o llngaagern. Desde enüto, colocâ.-se o problemê do liniite d€ssas compa-
rações e de sua legitimidade. De fÀto, J. tÂPr.^NclIE e s. LE('L{rIIE ldêntiflcêrn:
purê e simplesmente o si8,,llflcante "saussuriani" com o r'epresentante dê
pulsã.o. Porque, como FIREUD o indlca, a pulsáo nos é lnco8'noctTel ( sendo, por
nÊtureza, ortânlca, tomando sua fonte na encruzilhÊda do sonrrltico e do psl-
quico, âgjndo nas €sferaa meis mlsturedas da consciê[ciâ) pol'qne âpenas sêu
repre§entânte pulsional nos é acessh,el, não se pcderá contralizâr todo o desen-
volümento teórico sôbre o representante. Um racioclnio conlc êsso favotece â
hipótese tópica, porque pêrmlte descrever as pêrmutações de significantes, oê
desvios de sentido, as substltuiçõ€s de um têrmo a um outlo no cnrzâmento
das cadeiâs inconscienteslT
Tôda â construçáo de J. L^pL^NctlE e S. LEcLAtttE repolsa €nT dois pressu-
postos: 10) ê poêslbiltdade de nâo ter que dar ccnta senáo do l'epresentânte
pulsional como expFessáo dê pulsÁo numâ pêrspectivâ tópica, negligcnclandc â
conotaqão econômlce no Vorstellur|-Repriíse tanz; 20) â re(luqáo prlra e sim-
ples das representaqõês de objetcs c dâs representações dê pâlavras, âo repre-
sentante-representâ.tivo pulsional. Ê isêo o que me parece contestável.
À primeira vista, os âutore3 poderiam responder que de maneira alguma
nêgligenclam a hipótese econôrr;ioa, pots náo cessâm de tratâr', êo longo de
seu estudo, da energ'ia pulslonal, daÁ diferenças entre os regimcs enclgétlcos
5) Assin, lodo o lerlo i a pcsqüiso lr mo dislinção que lunda o soforaiõo /rc|, ttipíca
dos iloís sístemos, dlstlnção que é pÍocuÍada tanto Íruma dilcÍença qll lilaliva (lcori. das
dúas líscÍlçõcs) qu0nlo n!Íra dlleÍenca econômicâ ííuma "eneÍgia (lc bloqllêlo" ptóprií
à cada um dos dols slstêmâs). J. LAPLÂNCHE e S. LECL^|RI,
6) Cl. os trabâlhos d€ R. JÁfioBsoN. ObscÍvamos de passa*enr quc lokobson murtfl o deslo-
camenlo e a condcísnsÍo descrilos ÍioÍ FÍeud em Lo Scicnrc de Riv?s O1t4 o pólo Írcto-
niJnlco paJA opô-los à ldêntlllcsçáo ê ao slmbollsmo qú€ peÍlcnccriâm ro Dólo nrclllÍóÍico.
LrcAN opôe o deslocamcíto conro proccsso rDelonlmlco à condênsaçto como pÍocêsso
mctaíóÍl(o.
7) Na ocaslâo, seÍlâ lDtcrcssanle conlr€ceÍ o aviso dos liígüislas sôbÍe o íilo dí qrcdâ de
um slgnlílcante pÍimclÍo (S) nâ cât.goÍla de slgítílcado (s), um llgnlÍlcanle scgulldo (S')
ocupâído o t[gar do slgrlllcaDl€ inlclâ1, Que pensaÍ lgualmente dêssÊ il€sapa, ccifieÍlo de
lodo o dcs€ÍrvolvlÍreDto ultcÍioÍ do slgnlÍlcado Íttlmclto?
r72
do consciente e do inconsciente. Ma§ ésse náo é senÉo um aspecto do pro-
btema. Se importe distinguir o estado de energia, livre ou ligada, no inco.ns-
ciente e conscúnte e se FREUD efetivomente deseJê seperar radicalmcnt€ cs doi'-s
sistenlas po} ês.ses dois mcdos, nlo é menos levar ena cont& da trensfolmação
energéticà que sofre e eman&gã,o da expressêo putsionat nos seus avetares.E A
prefõréncia por um ponto de vista tópico leverla os outores a náf, considerar
õomo relevaÀte do põnto de vlsta econÔmicc senóo as dlferengas en-tre as duas
"r"egiões" da psiqué, nÉo ês transf:rmâções que efetam os signiflca'ntes em
suê pessagem de uma à cutra.
ÉnBui cbscrvou que a pulúo só é cognocÍvel por seu representante'rEpre-
sentativo. It{as, entÉo seria necessárto segui.to até o fim do seu d€§envolvlmento'
Vejamos ;
'lio que píecede. cstudamos o tecalquc de u repíesentante ds pulsÍo, o quÀl' â
íosso veí, õu t,ma Íepres€ntaçío. ou u'm grupo dc iepresentaçôes bloqueído -a paÍtlÍ
" uma carga deteÍnilnada rle enérgla FsÍq(lca (llbldo, lnteíêsge). Á obse-í'
da t,Ítsáo por
viçáo clinlàr obrlga-íos- 4go.a a dl§§oclar o qúe 8té Àqul nÃo temos con§ldcÍado §cnão
na'(nlcldade, polí cla noi mostÍl que é pÍecl§o scpaÍar alguma colsa da outÍd. qllc
Íspresenta o làstlnto ao ládo da Ícpie§eítaçIo. E§§8 alguma col§a soÍre um dcstlno dc
reâaiouc oue oode ser multo dlterehte daqdele da ÍeoÍe-s€ntaçâo. Ê oqtÍo el€meíto d1
reoreientaião psiqulca, por mal§ que esta àel8 dl§tlnts da Í€pÍeÊcnta§ão -e cncontíe- um'r
cxÍrle§§áo Sdesuada à sua qusntldade nos píocc§60§ quc §c toríam §enslveis 9oo lo'm;l
ãà'eiiàãàs ãfitlvos. Dcsdc'entlo, quaído' descrevembs úm ca§o dc ,ccalque ileveÍnos
eitudar senaradamente o que o recaÍque Íê2. da rep,€seíta§tro de utn larlo. e, de outt't
do encÍgia in6tlítlva flxada nelB"'
r7J
de retôrno do recalcêdo ou do destino da pulsáo. Sêm essa refêrência, êtÍa-
vés de uma siÍÍúIarldade de "conteúdos", nAó apâreceriam as diferenças essen-
ciais, entre êsses atlvet:sos estados e menos ainda entrê os planos dtsttntos se
bem que êêttritarnente lltados, da normàlldade, da ueurose, da psicose, sssim
como dâs articulações no interlor de cada um dêlês.
171
É aqui que é necessário insistir no funci: namento da atividadc pulsional,
tal
como FREUD a, descreveu em pares antagonistas. J. LÁpLÁNCHE e S. Le-
cÍÁIRE têm razÃo de observar, como o tintE também indicado F.. PAsCHÍ:lr "ê
exlgênciê qusse dogmática do duallsmo d&s putsões". Essa exigência. etnda se
aclera melhor hoje, depois que um lingülsta (JAKoBsoN) e um antropôlogo
(Cl. LÊ\'I-STR{uss) permitiBm denuncler nos pares de oposlçüo funcional, a
m'dalldade mesmo do funcionÊmento simbólico, cuja lingusgem é a reslizaçêo
nr&is acebada, m&s que panece, para além de suÊ expresseo menlfesta na lÍngua,
esp€cificar e crdem humana. Asslm Cl. LÉvI-STRÁUss mostr.:u cotno os sis-
temas de porentesco ou 8, organiz8çóo socia,l que nÉo sáo con6truçõe6 intelec-
tuals obedccendo & leis que sâo aquelea da ativldade consclente do espÍrtto c
que se identlflcam com a6 lels do simbólico- C. STEIN assinslou-o perfeite-
nrente. Sem dúvida é necessáÉo observsr que ésse funcionamento nêo iem sen-
tido senã,o porque se ebre sôbre a posslbllldade de u:n tercelro têrho, meta-
fóÉco. Mes antes mesmo da, intervenção do recetque, antes que o inconsciente
cnquanto lnstâncÍa tópice seJa identifioável, a atividede pulstonal é Já, senêo
uma, "linguagem" constituÍda, pelo ÍÍteno6 um Glstema simbólico que mereoe
êsse nome e cúJos ,necafiismos de delesa intlicam-noe o ,túodtc ile fwnciott-
,neüto e uma possÍvel indicagÉo. fsto nos leva a, interesgarmo-nos por êB6e
aspecto do probleme e nã,o mais aômente pelo ,ôgo dos repr€sententes-r€-
sentativos, ou mals exat8mente a colocar ê6tes no lugar do sistems conceitual
de FIEUD. Se pois, o recslque inegàvelmente dosemp€nh8 um pepel no Ínodú
da negaç&o, sôbre o qual justem€nte inslste JAcquEs LACÀN, é talvez pcsív€l
enconttar esse oposiçÁo tóplce e grametlcal nos modos dlfercnteo, ma!, numS
abordagem lgualmente íecunda dss oposições dos pBres ccntrastedos pulsto-
nals, ace§slvel6 à nosse investigação pelc par pulsáo-deÍe6a, ou pelo par ant8-
gonista pulsÉo de vld&-pulsÉo d€ morte. Serle um belo Jôgo retorquir quo
ainda, s€ri& necessárlo culdar do r€prc§€ntante-t€prtsentetlvo. O que orientaÉ
nos6a, lnvestlgação serlt nt€nos a phocura do recobrlmento da6 dtversas reprc-
scntr,gões do gue a, operaçêo pels qual s€ oporéo os paros pulsÉo-defes&
defesa-defesa, ou puls[o (de vlds) pulsáo (de morte). Essa operaçêc viaa -
- entretém entro
estrrdar as relações que os elémentos si, ns sua continuasto
do dlscurso. Scm dúvids, sería, necessárlo, como subllnhou C. STEIN, operar aa
distinç{es segundo êsses elementos sejam fonemas, fragmentos de -cadei8s,
complexc6. Mas o método permanece o mesrno : o estudo das relações entrre
os slgnlftcantes mais do que a busce do que estaria sob os recobrlmentos
suceasivcs do dlscurso.
Vê-se que noêsa, preocup&çêo etn rclação à reint€graçéo do inconscÍente
no consciente, procurará, menos se iúiltrer entre as reslstêncl&s ou nas vias
d& menor r€sÍstêtrciê para a.ceder eo "conteúdo',, do que a fozer rrcair e aná.lisê
na rêde.das deíesss 6empr€ prestes e, se reconstituir pelo energia que estó a
seu.servlgo e que lmp€de tôde tomada de consci€ncia, ou que autoúze por vêzeq
mais seperad& de sua. conotagéo afetiya, como é o caso no lsolamento -obsesstvo,
para melhor mlstlflcar o Ego. rr Ao modo de escuta citado por J. LA-
PLÁNCHE e S. ITECIIIIEE de a6slnS.lar Es la,cunas do dlscurso ccniciente, que
êles opõem àquele do "traduçeo-simultênea,' de poLrrzEB quc ltga, ne'lrúa-
nêncla, ilma letro e um sentido, pode-se acrescentar aquéle qúe no texto
tJ) F. P^SCHE, Atlour dc quclquas froÍosilioas lrcudicnncs conlcstics. in R(r,. Fr. de Psrcha-
1g!1sc,p.X\ 1956. 0. ,í17. O gêíio de FREUD, ln Rev, Fr. de Pstchodott!;r. X\t, 1956-
1057. 333.
r 5) De Ííto. os Ínétodo8 rc complcl:Úr. Não r.coíhecé-lo é cnt.eteí um dlálogo dc sÍrdo§.
(lís dl.ão áos oútíos: {o sc ocupar com o destlío do rcpícscntônte da putstrb c ao neg(-
fençláí o aspccto aconôÍnlco, voÊsí ânállse tem o risço de passe, pcia suÍrc,ílcle, sifl
chcgar alé à ncurose; 09 outÍos poderÍo respondeÍ: ao vos prcàcupnr êspressivanrente corn
a6 reslstênclás cftegarêls à úíla aíállsc coaÍcitive, íatoÍnanilo 0os l€moos da sutcrtto
e delxnícls cscapar b (esouro da ncurose, süa slgniÍlcação esne(iÍicit. Â rtlrrl;rrle esti-íessc
aÍrontam€nao do negstlvo c do posllivo.
t75
de lrma sessâo, permite sepârar sincrônica ê dlacrônicamente os diver-
sls Parc€ de oposigêo fiDcional, à maneirê pcla qual um lévl-Stlauss inter-
pretâ um mito. Sem dúvida â eobrevinda do recalque originário constjtuinto
do inconsciente Já terlê pêssodo al quaJrdo esuvéssemos preocupados em en-
contrar os tragos das mallÍestaç6€B pulsionais pdmltlvos. Ma6 cstÀ nâo é â
questeo. F.azei trI'euo dizêr que é o recalque qúe "ordeni" uma energia pul-
sionâl â qual nâo existirá senâo em estado lndlferenciado, antes dessa interven-
çâo, pârece-Dos que é fcrçar um pouco o scu pensamento. Nâo que neguemos
a existência de um nivel primitivo onde a energia pulsionÀl Lrstariê em cs-
tedo indifercnciado, o que S, NACHT chaÍrou de inconsciente elementar. Mas
pÀrece-nos âbuslvo assln lar a' era anterlor ao rEcalque ao proc€Bso primá-
tlo. De fôto, uma tal carnadÀ do lnconsciente é prôprtâmente inacesslvel ou
mcsma nitbu. De r€sto, J. LÂcÀN mosttDu que rnesmô âo nivel do procesBo
primário âs lels da llnguagêrl metáfora e metonlrÍúê, encontravam-se sob
a, Íormê da condensâçêo e do deslocamento, o que é Jê um certo modo de
estruturaçã.o. Na verdade, o pensamento de FREUD â êsse respeito obrlga-nos
& admitlr, a um tempo, ê eusência de organlzagÊo que carecteriza o processo
prlmÁrlo e c indiscutlvel estruturaçáo quê JÁ r€prês€ntam a condensação e o
deslocamento. A lortiori, as etÊpas anterior'Ês ao recêlque que nâo podem sêr
inteir'8,mente confundidas com o processo primá.rio testemunham um nlvel de
atividâdc quo mêrece o ncme slmbóllco ccmo nô-lo ,ndicÀ a simllitude de fua-
clonamento pot' pares contrastados das pulsôes, e aquêles da linS'uagem Gu dê
organizâ.çeo social.
Se poiÂ, pode-se sustentâr com F BEUD a contemporâneidade do inco,nsciento
e do r'ecalque,rÍj é prectso estabelecer corrolsuvarnente a cotrtemporaneidôde
dB atividade simbólica ou pulsionêl manlf€Btêvel desde a colocaçâo em ,ôgo
das defesâs primitivas. Entretanto, parece inegúvel o papel do rccatque na
constltulçeo do sujelto normal ou neuróüco (por opostçÃo ao psicótico) como
sujcito interceptado, sujeito do desconhectÍrento.
Mârcar-no.s em rclaçÉo Êos dois têmpos dc recalque é expor-se fatalmente
à discussâo sôbre "a ortgtnalldade" do sujetto quê é prccíso entÁo sltuar, nâo
sem dificuldade, depots, entre ou êntes dêsses dols tempos. Essaa diversss e6-
colhas lcvou até Ê dividir bastânte os êutores para que experlmentem a necêsêi-
dadê de esclarecer sua. divêrgência.l? Se J. LAprÁNcHE €tê atento À sucessâo
de dots tempos de sirDbolizaçÂo, e se S. LECLÂIRE r€gula o pmblema parando
no prinrclro, é porque Âo menos é âsslm que êcredltamos compreendê-lo
-
J. LÁPLANcuti cêntralizado no estudo -
das pslcoses, sente tÔdÀ a lmportÀnctÀ
das muteçocs c das estagnagões do slmbóltco que no unlverso pslcológico se
desenrolo, â nosso ver, Êo êvêsso e se põe neceBsàrlamente a questÉo do sur.
gimênto do ,nonÉnto simbôlico, senÃo genêUcamente, ôo menos dlalêtlcamente,
a parur dê uma experlênctê bruta e slgnlÍtcÀnte ao mesmo tempo. Esse procê-
dimento do quâl nos scntimos próxlmos tem o mérlto de nÁo nos deixar
íàcilmento dcsembaxaçêdos diântê de nosso dever de clsrlÍtcar as dlferênças
estruturais entre neurose e trxicose, sob o pretexto de que Ê ordern humana es-
peclflcando-se pêlo Beu advento no relno simbólico, tôdê a questã,o começa
depois dessa proposlçõo. Na. verdade, é dlÍicll escâpar à questôo dêsse nasci-
mento do sentido, de sua e)nertêncla ou de sua lutÊ contrê o nêo-sentido de
onde êle parcce orlundo e de auê tentÂgáo de vottêr ê êlo. Se, entretânto,
detém-se em testemunhar a preBenqê do sujelto desde âs origens, é preciso
der contÊ dos tipos de funcionamento sucessivos onde a estrüturâ. simbólicâ sê
llga num modo nâscente ou constltuido.
t6) Obseisanros qúe o icrlo lrêodláío di, que o Íccâlquc nâo podc sc produzlÍ senlo úma
rÊz estabclêclda a dlsllngão clara eDlre conscieltc e inconsclcntc, o quÊ dclxaalâ 6upoÍ qúc
nâo ó o Íccalqllê qú€ luÍrda o incorsclente, ,nas qüe a aslo dlctc t suboÍdinade à scpa.açâo
dos slstccrr§, Àlaa pod.-se dizcr que se t.ala aqrl, no pcísamcnlo d€ FkÊrt, do lccalquc
t7) lioln !, p. 122 (do oÍi8lnâl írancês).
r76
vemos pois, que o que nos separs de J LAPrÁNoHE e S' LEcLAIBE nêo 6
irredutÍvel. Nossa posição se resume ern velorizar mals o p8,pel das pulsões
em seus espectos econômicG e suas organizaqões banais e procurar, sempDe
levando erÍr conte o pêpel estruturente fundamental do recalque, dlscerÍrir
a.s manife€tações do sújeito no confllto entre e positividade e a negatiúdade.
t77
pelo estêdo de impotêncla ê de dependênclê dê criângâ. em Buê primeirÊ ,mê-
turida.ds. Êss€s mecêrúsmos neo represertarn ürna atividade llmitêda ou seto.
rlzada. Êle8 traduzem o labor impôsto À pulsêo, a.slm como ests é o resultêdo
do^'trêbalho impôsto ao pslquico nâ conttnuâçào de suÀ llgaçêo com o corpo-
r{:j Designamo-lo como o ,tuomento negoüoo itd ativdaite pu,lsional. A energta
utltzada nessê trsnúormaçôo é a carga afeüva que conôta o representaite
pulstonêl e que podê se descÀrtrgâr eob a forma de â.ngústia quando as
defesas, os sintomas náo podem êcalmar iuafltitêUvâmente esta, -ou entâ.o
como assinÀlamos, tomar pêrte nê elêboraçêo do sintoms, do fantasma, do
sonho, e mats âlnda na constituiçâo das defesas.
Sem dúvidâ obJetar-se-á quê nÃo existe nêda de contJaditório nlsso com
Ê demonstragão de J. LAPLÂNCHE e S. LECLATRÉ. Á anáIise de seu sonho
como tEallzâçâo de um desejo muito bem essâ êlâboraqã,o prl.-
márlê e sêcundáriê do inconsclente.- mostraria
Uma ta.l escolhâ é, portênto, slgnlfica-
tjva, enquanto que elÊ se sltua nê práucÊ dê âüúdade onde s, censuia está
mêls anuladê e nâd& nos dtz da posçÉo de phlllppê diânte dêsse outro que âssim
sê revela. Pêra concordarmos com êlêa sêriê Decessár'io que melhor fôssemos
hÍorlnâdos dê outra face do conÍlltq dê dêtregêçâo que;ubentende o desejo
de Philippe e da manelrê pele qual êle experimenta, êsse desejo na transfà.
rência. Estarlâmos, entã,o, em presença do quê dlsttng.ue trabâlho pslcâne-
llttco_ e rnalêutico, pois é isto o que êvocâ a demonstração, de J. LÁiLÂNCEB
e S. LECIÁIRE que prog"ldem no senudo de um desvelamento que'nad6 pareco
contreíar, sem que apaJreçê o confllto, dado fundsmental da neurose e da
transferência.
t79
todo olhar dlreto. Dêsde entáo, o Ego que náo é o EgD consciente em sue po-
siçáo ambÍgua de agente de compromlsso entre e reâlidade e o inconsciente,
lnstrumento de um mínimo de cficácia e de um máxlmo de engôdo pcde no§
servir de abertura para as profundezâs de outra forma lnace§slveis ao olhar
humano, para ê análisê da eBtrutura quê o ccnstitul. Há pois, como que uma
rÀdicalizÊgão do problemÀ O lnconsciente mergulha suas ralzes no corporal
mais do que nuncâ, apresentâ-se numo opacidadc atnde mais ,mpenetrêvel
do quê nÀs prlmeiras descrições, e enfim, infiltra-se largêmento no dÍnlnio
do Ego.
I'REUD trocou a oposiçÃo entre bellgersnt€ê pertencentes e territórios
delimitêdots que se chocarÁo como dois pâÍses em I'uerra, por uma outrâ fcrma
dê conflito quê está no interior mesmo do Ego que se dá ao trabalho entr€
fôrças rEcalcartes e recêlcêdâs.2s Umê comperâçáo vem ao espírito: e da
conccpqão da história como succssôo de discussôes entrc as diversas castas
que governam o mundo, e essê outra interpretação que põe luz as con-
tradiçôes ,nternas dos dlverEos sistemas econômicos pela existência da luta de
classes no interior de cada pals. Asslste-se nesse sêgundâ tóplca â uma re-
distribuiqão dos valôres e das fôrças segundo um modo mats diâléuco.
Entre a íormulaçâo dd, Metapsicologio e aquele do Ego e do fd, vem se
intercalar â descobertÀ da pulsão de morte. A resistêncla da neurose à mu-
dança, à cura, o freqüente triunfo do sentimento dê culpâbilidade incons-
clente que subentende a reaçáo terâpêutica negâtiva, o além do principio de
prazer, colocam o psicanêlista dlante de ulna estrutura que o simples desve-
lamento de suas articulações não é suflciente para modlflcar. Portanto, ó
lógico que FREITD tenha sido levâdo, âjudado pele expêriência a reccnhec€r
Das defesos um papel que êle jâ tinha percebtdD, ma8 cuja importânciâ ünha
subesümado.2{ O estudo do inconsciente se desl@ou do recâlcado para o
recalcante. Mas, no final dÀ obra freudianê constatâmos uma vez mâis como
o fator econômlcc se lmp6ê co?no o mals determinÊnte. "Assim, somos levâdos
a concluir que o resultado finêl ds luta empreendida depende de relações
q dntlt(üiüas2' e dê soma de energlâ que moblllzamos no paciente em nosso
provelto em rcla,çáo à quântidâde de energla dâ qual dlspõem as fôrçâs quê
êgem contrê nós... Âqui, uma vez mals, Dcus combate do lad} do lnâiê
Íorte." 2ü
Essê tomadâ de posiçâo, lnclinado à modéstia, nâo imp€diu entretênto,
o extcnsã.o do campo da psicanálise para além dos domlnios dê neurose.
Pslcoses, cas3s limites, doenqas psicoesomáticas, inquietâções da infância, mui-
tos capltulos novos êbertos à técnlcas psicanaliticas. Ora, o que eepântou tanto
FBEUD como seus succssores Íol preclsamento ê ldentldade dos conteúdG, a
permanência do c:mplexo de Édipo, complexo "nuclear" e univorsâI, cuJa for-
tnâllzaçâo varia.vâ sob s depêndêncta de fatos econômiccs e do estado do Ego,
isto é, dÀ estruturaçÃo de suâs defesas. Em uma carta a MABIE BoNÁPÂBTE,
E ITEUD teaürcv'e: "Sâbemos que os mecanismoB dâs psicoses não dlferEm em
essênclê daqueles das neuroses, ma.€ nâo dispomos da quantidade suficiente
de energia pâra êcalretêr rnodificâções nesses mecanismos". Desde entã,o,
como se espantar que se tenha centralizado srra ateDção nas fot'mas defensi-
vaa de acomcdamento do conflito edipiano ? É na experiência de transferência
e da contra-trânsferênciÀ quc são mêlhor ob6ervâdos pelo subterfúglo do
estudo dâ economia ger'al das mudanças que ligam o anâlista êo aÍrâ.lisado.
ú lsto que jttsUfica as p€squlsas. inscritas nums. corrente gêrâl da psicaná-
llse contcmporânca, dc NACHT e M. BouYET. Certamentc Írinda extste muita
r80
coisa ê ser feitê na teorizaçáf, dêsse aspecto da aná'lise, epesar dss
peEpectives abertes pels obra de M. BouvEr sÔbre e rela.çáo e o obJeto. Ao
iongô dessa exposiçáó temos insistido nos mocanismos de defesa como tr'e-
balho do negêtlvo da atÍvidede pulsion&l ns, constitÚçéo do sujeito, do slg-
nlficente, da neurose, da transÍerênct8. Temos praticado ê leltura dos textos
das sessõ€s de cura no mesmo modo de análise da atividsde simbóltca,
e qual ebdu-nos aB pesquisas sÔbre os funcionamentos por psrt€§ sntago-
nlstes nas oposÍções entre e pulsão e I defes&, 8s pulsões adversas, ou mesmo
tipo8 de defbse opostos. Trate-se, aqul, de um outro aspecto de decüração
dessa lingu8gem do inconsciente que é, talvez, dlfcr€nte da lingu&gem sem
- com-
delxar de s€r uma lingua.gem.?7 Ainda é preciso fazer esse linS{lÍstlca
parsds dss diversas ordens de registro do discursg analÍtico, do sonho, do
fantasma, do sintoma, etc. Também é menos um outro "6asteme" que oPor€-
mos a J. LÂPLANCHE e §. LECLr\IRF: do que uma perspective complementar'
Esses divergências, antes de nos separar, convidam-nos ao diálogo.
I8l
lDten)retacÃo novô, quêr ela. venha das tendênclas fllosóílca§, blclóglcas, ge-
néUcas, cllnicas, estruturais, dâ pslcânÁllse contemportneê, que tôdas se pre-
tendêm êxausuvês e homog€neês e ê mutilêm sêmpre numÊ partê. Na ver-
dade, é preciso r€conhecer que I obra írêudlana engloba ecsas dlv€rsâs pes-
qúsas pele dlmensâo de seu gênlo e por suê lnrdutlvel orlginÀlldÊde. Para
nó8, qualquor cênsura dê ecletlsmo quê poalêrla nos ser diligida, como sê
acumulássêmos os lncotrvenlentes mÊis do que as vantâgens ao êstender nosso
ouvldo âberto a todo acento de verdade, de onde quer que venhâ, Jamais êsta-
mos mals atentos do que quêndo reconhecemos À voz de F'REUD, mâs elegramo-
nos também quando através das dissonÀnciâs de seus filhos, paFeoe-nos p€r-
ceber a concordênclâ que é onde os prctagonistas se harmonlzarn através do
§eu pr€cedente.
M. ToSQUÍ'r r Es. Deserarlâ llcar num ponto cruclal tão bem evocado
- também
pelos expositores, como pelas intervengões de MM. RTCoEUR ê MERLEAU-
P0NTY: a sêber, aquêle das relações entrc o ima.ginário ou as imagens e a
lrnguagem. Num certo momento pârece que a linguâtem ílui, nêsce, desâbro-
cha ou ae eprofunda em tôrno dessa matrlz que sell& a âtlvidade lmâgeênte.
Irns e outroB dlssêram-no mals ou menc!. Há têlvêz uma cêrtê evoluçâo, ou
mêsmo umê deteriorâção, uma distor!áo que vâi do fantasma ao imago e à
lmagem, depois ao Imaginário e à fÀntasla; lsto numâ certa m6dldê precede
a ling'uagem . Ásstm, pode-se dlzer que ê ltnguagem retoma ê lmÊgêm e o fÀn-
tasma corÍr tnalê ou menos complâcênclâ, dissimulâçÁo ou eficácia. Pode-se
íàcllmênte ev@a.r relatos analÍtlcos onde Ê llnguagêm "comenta" a imagem
e outros onde Ê linguagem lntroduz s lmagem. Al exlste uma corrente em
duplo senudo, o fantasma, opÊrecendo, por ssslln dizêr, por trênspêrênciÊ atrús
dê aliÊlétlca precedente. Pêrece-me que a concordância de tôdas as escolês
aiallticÊs pode ser feitê I êsse propótsito. Contudo, desejarlamos inslstlr no
fato seguinte: quê esta se veJa por ocastáo dê psicênállse das crianças onde
e passagem da lmêgem, ou mesmo do desenho à palavra é â malB ca.rlca-
turêlmente clara ou nos adultos, onde e eclÉâo da pala.vra. eutênücê
nã,o pode ae fazer- senão levâda pela prêsengs ê a lnclusÁo do ottttÍi, a nm
tempo, hêterqg€neo e homogêneo o terêpeuta. Na passêgem da imÊgem
à Íala o outro nÁo é um acldente -sem lmportÂnclâ, mas um elemento constl-
tuclonal de s€u movimento, de sua mêls concreta e pêrtlculú dlDâmlcê. Têl-
vez €steja, ardscando lr além de heu próprio penêamento, mas parâ fazer
compreender lsto qle asslnêlo, ouso dizer que a estrutura repeütlva da
trarsferência efetiva nÊ situsçáo analitica -
adapta-sê maravllhosâmente
-
a essa, arquitetura dinêmlca ds lmagem tornândo-se dlscurso. Segue€e que â.
tÉnsferência se presentlflce, prcclsâmente porque o outro que está al (o te-
rapeuta) ráo é o outro que não estê al e cuJa estrutura dê besê íunda-se
aessa, ausência, À quêl se dirige o d€§ejo.  falê não surge alê lmagem pelê
simples conünuidade gênétlca, tndo de sl. Há, entre elês, êsse oútro, letdà-
dêiro melo têrmo que pefinlte seu movimento di8létlco.
AlndÀ des€ja.f,ia intnoduár nesse problema cruclêl uma artlculaçâo parâ
mim dificil de formular
- e doentes
curar os esquizofrênlcos, êsses
entretarto essenclal
- sobretudo
cuio comportamento
se queremo§
psicânalltico ou
slmplesme[te psicoterapêutico colocÊ no pÉmelro plano, estruturas -signi-
ficÀnt€rs e demândas pré-verbals - que dlsp€nsâÍn o universo do discurso. Na
seqiiência "fantâsma-lmag'olmêgem-tmagÍnário" desejsria â.rticular êsae mo-
mento pelo qual o próprio fartâsmâ. sê nega a sl próprto, r.ecalca-se, satisfa-
zendo-s€, por vêzês sômente em parte 6ob a forma, do imaginártc essas
reprEsentÊções das quals dlâÍr FIETUD que se trata de "bloqueics" como - lem-
bra S. LEcr.aInE. Perg'untamo-nos se essê "pa.ssâtem" diflcilmente ârtlcula-
da, nà,o comporta aqui a intervenção dê um cutro "terceiro têrmo" quê,
em princlpio, quase nada tem a vêr com o Jôgo dâs significâções nas quais 6e
I82
tece a vide pslquica,. Â experlência analÍtica dss debítidsdes proÍlrndas e da§
regressões proÍundss des crlenge6, freqüent€mente mal disgnosticadas, elrco'
r&Ja,m-nos a fofmulá-lo. Ssse tercelro têrmo seris o que se deve formular
assim: o prccesso de m&turegáo do sistema nervoso de um lodo; de outro, o
pnocesso das atitudes corporals nas quals o fentasm8 se estrutur& e se re-itera
precisamente com o sua perde. O Dr. LEoLAIBE fElou de um8. "matrlz motora
reelizada-' no «rnho de Philippe o que nos perÍnite reunir as concePsões
de wALrrN. Por mals importsnte- gue seja s sequênciÊ do discutlso Bnslttlco
de Pht[ppe, ele nâo o é, como diz o exp6itor, na relaçÉo com a eua "ne-
cessidade" d6 "sêde" im-pessoal, ou antes sem tratrscendêncts na €dific8,çá,o
da pessce de Philippe. Sua importância esté na "incarneçêo" do íantasma,
no gesto corporal, essa6 máoE que se unom em concha reproduzlndo o va:zlo,
o lnverso do seio suseDte e de onde súg1u a palavrs o suaaurro ou o
chamado ne "tentativs infantil de imitar o ca,msrada -mais velho" de Ílo-
- Nesse exemplo partlculaÍmente feltz da anélise msglstrsl que
resta suÍça.
S. IJECLAIBE nos deu do sonho de Phiuppê, encontra,m-se ss tr€6 etapas quo
acentüamos em noss& intervençÃo. ú suÍlcient€, pera melhor destacá-lc, per-
gunter-§e onde e êm que medida S. LECLÁIBE nÉo estÉ presente-ousente na
florests suÍs3 no lugâr "do carnar8dê ma,ls vetho", ne cloreara por exemplo'
do sonho. Êle serle êsse outro que, atrevéê da lmagerla do - sonho, t€sta-
-
betece o fantasma. e p€rmite e panole, e parole verdadeira.
E.MrNKowsKI. [.únitsr-me-et üDicamente ao que fol dito hoje. Apreciei
multo o que M. de-WÁLHENS dis:se sôbre a, mcrte, sôbr€ seu Êspecto humano
que ultrspassa, o quadro de uma simples aniquileçáo bioló8ice, §obretudc §e
Eceitamos a diferensa entre a moÉe vinda de fora e a morte im&nente quo
faz perte de ncse existêncis huÍranÀ Como dtda M. de WALEENS, os eni-
mais não mcrrem ? Sômente o ser humêno acede à moÉalidade com todog
os problemas vivos que €la nos ccloca. É por isso que & noçã,o de lnsttnto
de morte sempre determlnou utna reserva em mím. Nc fundo, néo há n&da
de msis fócil do que unir o têrmo "instinto" s tôdas as mÉnlfestações da
vids. human&. Fale-se do lnstinto de justiça, do instlnto moral, 8té do
insttnto r€llgloso; mss sômente lsto nÉo oferece nads, e aind& acrcdito que
em vlÉude de um certo pctuledo neurobiológico cu outro, berra-se aaslm o
canlnho em dteçâo ao exame Cêsses fenômenos fundamentais em sua e8-
sência e em seu asp€cto humano.
Volto à linguagem. Tenho sôbre a consclência, entre outros, um estudo
que epa,neceu no tomo da enclclopédis fr&ncesa "Pilofia" e que intitulei Feno-
,nenologia dÃ, ling&úgern. Nesse trabalho esclerecl esse releçáo completa,mento
particúsr que estabelecemoB com & lingusgem e que consÍste no íato de que sc'
mos todos túbutárics da ltnguagem; e portã,nto oentimo-nos p€feitemente
de acôrdo nesse ponto de vlsta, §abendo utllizar tdas &s riquezas que I lln-
guagen. coloca, à nosse dlsposlçâo sem sentlrmo-nos nem um pouco subju-
gados a, ela. Confesso que após a discussã,o dests m&nhé, náo pude me lmpe-
dir de perguntar: mas, no fundo, o que é & tinguagem ? Crelo que nesse ponto
de vistê temos todo o lnter€sse em retornar a essa.s relsções, naturals e pes-
scais ao mesmo tempo, com o linguêgem. A êsse propó6lto, tenho uma ques-
téo e diriglr ao Dr. LAPÍ,ÂNCHE e sobrEtudo Êo Dr. LEoLAnE e, por seu inter-
médio, igualmente, e JAceuEs LAC^N : é o problema ds metáfora. A met6-
fore comporta" como se diz, um sentido próprlo e uÍn sentldo flgurado do
têrmo. Entretento, essa distinçáo é feita,, no meu entender, de umÊ meneira
artificial e arbttrárle; e segutndo essa distinção faz-6e quase sempre pender
a balança do ladc materlel dê vlda- Portanto, pare o sentlmento de profur-
dtdade que náo é se referir à profunüdade de um poqo pare se der conta
do que êle é. Poderia clter qusntidade de exemplos dê mesm& ordem. Ao
contráno mesmo no fundo, a profundidade do poço só aparec€ no seu valor
t83
qualitêtivo a partll' do momento, não em que medimos a profundidade, mas
quando chegâmos a alcânçar com o c.lhar o fundo do poço que por êsse mo-
tlvo, nos parece proÍundo como é um senümento.
El é dêsse ponto de vistê que evoco À frase de S. LEoLAIRE quando êle nos
dizia, que se alegrave "amargamente" em presença de certas exigênciâs de
nosso cêro HENnI EY, quê pcr vêzes é um pouco dttatorial mas náo posso
ÍellcitáJo, pols é gragas a lsto que êle nos detém a todos e chegê ê essas
leâUzêsõeB que adrúramos e das quais nós lhe somos profundamente reco-
Dhecidos, É eüdente, M. LECLÁIRE, que nêssa frase vós fizêstes, no meu en-
totrder, uso de uma metêÍora. que exprimlê ums. cêrta r€alidade primitiva.
E quando dlzeis, igualmente, que certas colocações do Dr. LAPLÂNCHE pesa-
vam "pesadÀmente" sôblE vós, de nôvo êsÊ€ pêso e essa lentidâo nos colocam
em prêsença de uma rcalldade úvidâ, diretumente. Assim também, quêndo
pedis alguma coisa de "sólido", é pcrque as pâlâvlas dançam e é através
delas que encontraJnos o sôlido. Por vêzcs lsto se torna tâo sólido quc as
colsâs se lmcbilizarn c conenr o Iisco de ser um pouco dogÍLiticâ-6.
De sorte que, dêsse ponto de vistâ, não creio me engânar dizendo que, quândo
nos seraimoB da metáÍore, nÂo expêrlmentamos nenhuma nêcessidade, e rem
a linguegem, de conÍinar-se nas palavrês, csmo signos âlgébricos, dos quais
cada um teria túnÊ sitnificação, quer' 6ejâ próplls ou figurada. Vivemos
nassas metáforas. Dêsse ponto dc vista, penso que deve ser disting:uida a. mê-
táÍorê e o slmbolo que em nossa vidÊ, na vidâ das civilizações, repreaentam
um pSpel coÍnpletamente dlferente e aprêsentam lgllâtÍnente caracteres di-
ferentes, sôbr€ os quêls nÀo poso ,nslstlr mutto aqul. Mas €mpregâr um
têrmo em seu sentido própÉo e figurado, ao mesmo tempo, isto nos é abso-
lutamente necessát'lo. I ptEctso evitar, sobretudo nas pr:oblemas tâo com-
plexos quê estudamos Âqul, empregâr os têrmos não impo}te como, e ó
tambêm, devo dizê-lo, em parte o casl dos têrmos "conscientes" e "incons-
cient6".
184
co€rênci8 que the Íalteva outrJrs. Elê permanece, portanto, sustentével. Ne6sa
direçAo, a pstologís. so deflne pels petturbsçÉo, squela que excede a capaci-
d8de de retôrno ao equilÍbrio do sistema conslderedo. se a perturbaçâo é ver-
dadeiramente excessiva, forê dtsso nÉo se vê como êse retôrnc é possível.
É-se poi§, tentsdo a classificar as perturbeções em dois grupos: &quêles qu€ se
aviziiham dos Íeed-ttacks e aquêles que dêles se separarn ou os destróem'
Essê concepsáo factlitaria uma terepêutice timiteda, mas lhe marcarlê llmites
muito estreitos.
Segundt, concepção. O ser vlvo é feito pare a de6tluiçáo e a auto-
destruiçêo, isto é, para a,- mortc. Nêo há nêle nenhume fina.ltdade, nenhum
equilÍbiío interno déterminável. O fim é o nada, e o insl,into do nada ou de
môrte afronta o scr e o corrói até o cerne da consciênclÊ e até aqtlilo que
êle conduz. o ftm, o n8da, & morte determinam pois, ac mesmo tempo, a con6-
ciência, ê vontêdc, lsto é a aceitação ou a nã,J-aceitsçáo. Indo nesse sentldo,
representa-Je fàcillnente a patologia (E antústie, o delÍr'io) como norm&l e in-
veisamente. Çontudo, a paitir dêlse paradcxo pode-se elab:r'ar ume terapêu-
tica que ac:moda a consôiência como uma permenência habit{ivel no deserto,
como um compromisso durável entre e aceitoçã,o e a recus& da exístêncla
em su& atroz áventura. A normallzeçeo 6 entÉo uma cria§áo d8, vids, sacial
e ds eçâo [crapêutica que organizam úma zona mediano e vlvencisl no selo do
absurdó normel. E)ssa, conc€pçÉo, p&radox&lmente, estende o poder racional
de eçÉo.
TeÍce,r@ conceftçdo, Els s€ untrt& à e6tétice, mais do que à mecânica
e à bio,logl& -nôo serie uma extraordtná,ris Proliferogá,o, um& su'
A "natureze"
perebundãncle, um desperdicio desenfreedo, 6em outro fim que o de ser.c de
ii.,er, mas náó absurd6, pois que o ser natural é de inlcio vida e ca'pacidade
de viver? A "natureza" náo série, até no gue se chanla "netur€ze human&",
um jogo perpétuo, um luxo de fcrmas, um lOgo prodigioso de aparênciâs e
Oe riCiiaaa"s-, um Jôgo perigoso, mas de forme que a morte náo seja senáo utn
&specto de68e exuberêncie? NÁo se pode pois, assinelar ao §er vivo e cons-
clente um equillbrio interno, uma lei de economia; êle viss, e dispender 6ua
energia, vltal, a representar, e pÔr em causa sua existência, nÉo per& a. mort€,
ma" -p"r, intensificar sue vidá. Por outro lado, nÉo são o neda, o instintl
ou a-vontade ou a consciêncis do nede que comandam o tempo e determi-
nam as modalidades da vlde. O nada é reletivo.
Essa concepçáo é pouco moral, eu I sdvogo, pois é a ela que dirigiria ml'
nhas preferênciàs. Como formular, nessa per§pectiv8, as relaçõe6 do normol e
dc peaológlc.r. O patotógico e mesmo o mc,n§truoso fazem parte do luxo descn-
freado ds neturcia viva. A n&tureza, que nÉo é nem consciênci& nem rn-
coÍrsciência., nem causalidade mecânica e nem finalidade, lança os sêres- ern
tôdes as direções ela tentâ simultôneamente todo os possÍveis. El& é bem
sucedlde ou malcgra. Podemos nos pergtlntar se o homem nÉo é um mons-
tro que foi bem -sucedidc (maís ou menosl). Existem mutantes falhos e
outrú que se desenvolvem. Entáo o ser patológico ou monstruoso é ccmo
os outrol, um brílhc, uma fusÉo no cclossal J€o de artifÍcio. É uma dtre'
çã,o que declerêmos má, e qtte é por êsse fato, porque "nós" scmos a
sociedâoe, o mediano, o meic onde é preciso que ête viva Entretant'. dêsse
mutante do quel náo sâbemos o que contém, e que pode às vêzes conter em
Bi o melhor, ô futuro, o genlalidade prem&tura, devemc§ nos aproximar c:m
respeito e temor. Pensaremos que êle tem 6uas-razões que nÓo sáo as nossas.
Nói o restttulremos pr€cavidamente ao mcdlano, à normalidade, cxplicandr-lhe
que êlc é prejudicial por ter razeo e rezão por ser preiudicial, êsse alienado '
Mas, conto voltar depois sôbre a noçáo de alieladçdo. §ublinho de p&ssagelrr
que, nôvJ paradoxo, e concepção cstética e imorali§t& transforma'§e numa ética
riruito partlcular. Ela. impõe considereçáo e respelto para o alienodo (inegàvel'
mente, e disso se deriva, menos para os demcntes plecoces do que pare o§
185
dellrantes). Ela impõe a ldéiê de que o êlienado, âquêle que se chaÍna asslm,
nôo é nêcêssàrlâmente o mais Êlienado dos sêre8, e que ô homem norrÍrâl, o
homem scclêl mediâJro, nÁo é talvez menos allenâdo! O homem soctal mediano
redu-z o parte do aleâtório e do rrsco;êle é rÀzo6vel.8le é determinedo e empe-
nhad) em determlnlsmoB. Êle joge pouco e sômente excêpclonêlmente. S16
está Íora da naturezÊ que Jogâ êêm cêssar e estende sua tuxurlência
para tôdê parte. Eu sou, eu que íalo, um homem são, equilibrêdo, nor-
mal. Que náo se conÍle trisso. Sou Êlienado em relaçã,o à natu!€za, §ou
abstrato e sou aliênâdo socialmente, sou uma euqueta, umâ merca.dorla, uma
colsâ. Á' allcnaçôo pÀtológics, que serle umo desâIienÊção em relaçáo à nor-
mÀüdêde sociológlca, me tenta. Ela me fâscinâ. Muitas vêzeê tenho vontade de
me tornar um pouco loüco (não tsnto pêra que nào volte por mlnhê vontâde
a ser normâI, mas é que eu ,ogo mal). Tenho freq ente vontadê de delirar
pêIa linguêBer! de Jog&r excesslvêmente com as palavras, numa palÀvra, de
me tornar poeta. Eu aã.o.ouso...
fsto m!, levâ a uma segunda série de considerações que desejarla vos
submeter.
Nunca ae ,âIou tarto de linguagem ou sôbre ê llnguagem. Nos metos ftto-
§óficos sêo os fllósofos do logos. O que me espantâ múito como filósoíc, é que
a linguagem se tornou obJeto de estúdo a parltr dr momento em que se duvi-
dou dâ ltnguâgem. EssÀ dúvida se exprime um pouco em tudo; seus slntomÀs
literárros sêo evldentes (Zúzie alans le rnetÍo e a,-cbra de Quenau). Existe crlse
e doengê do llnguagem, e conspiraçéo contrê a linguagem. A fllosofla. dê lln-
Suagem se torne coff€nte no mdnento em que se âtenua ê Íunçâo dê llnglagem.
em que se duvtdê dela- Tudó se passê comó sê os têorizadores ttvessem-tomado
distância em relâ.çã,o à ltn$rÀgem e Ê estudassem como um obJeto, porque estÉo
fora dela. Porque estamoe- toia dela" fora de seu velho uso nôrmal. ..- portan-
to, não é de €apantêr que a filosofia da. llnguâgem neo sejÊ comptetamento
clara.
_. -Este de manhô, aqul mesmo, ouvl falar de ,.cadeias dê stBnrlcantes,, e de
"cadel†signiflcêdos". Êsse discursc sôbre o discurso era- prodlgiosarnente
e se ouso Íalêr assim lnteUgente. Se se deÍiniu a fliosofiâ
-
como discurso sôbre o dlscurso- íâustosamente
e tentÊtivâ de discurso pêrfeitâmente coerente,
o quê ouvl era altamente Ítlosóftco. Entretanto, pelmâneci inquletor Náo
Bômente porque se substitulâ, me parecia, por umâ rêtórica o usô soclal ds
llnguagem, quero dlzer pela metáJorê e pela metonlmia figuras
- pãlavrasdecorrrntes
retórica
e lógícâ e a grêmáUca correntes. Aflnal de contas, nas
-ex-iste- s-emprê retór'lcâ. e figura de retórlco lrreduuvel à lógica e à graÍná,uca.
Nâo. Nâo é tstc. Por mals que eu tenhê compreendtdo a úguagern-e sua es-
trutura, é preciso falÀr de cêdeias dê signos. ô slgao faz a únidãde dos signi-
ficentês e dos significados que náo se encadeiam ênáo através de sua meáia-
çâo. Quer-se dizer que a conÉciência mórbida subsütui por uma ca.deiâ. do
signiflcântes oü de significados â cadeia normal dos stgncs? e que êsse dcslc-
camento permitê em segulda o uso e o Àbuso das metáforas e metonlmias que
telescopâm ou curto-circultam â passâgem pârâ a linguagem da vtda emoclonal
e prática, sccialmente normâl ? Gostsiia de alguns elchiecimentos.
Pessoalmonte, penso que s ling âgem nâo é tódê Ê experiência, mas um
certo nlvel dâ. experiência (da práttcê iocial). Mss enquantõ m€diadorâ gerêI,
tudo deve pass&r por ela. De onde üma contradtçêo que cada indivÍduo e cadâ
grupo resolvc mais ou menos bem: a parte se toma pelo todo e nâo pode se
tcmar pelo todo. Efeuvâmente. a ,,necessidade,' ( temfo pouco clâro) iara se
tornâr. "deseJo", deve pâssar pela provê da linguÀgem. -Devo falar-mã. falar
êos outros e ser interpelado pelcs outros parâ m6 tornar socialmente reai, para
ter deseJes e p€rseguir seu cumprimentõ no real sociâI. Nessê circultó -,,ne-
cessidade-linguagem-desejo',, quântos erros, quantoc desvios pcssiveis ! A lintua-
1S6
gem, enquanto cêdelo de slgnos nÉo pode jogar um papel estranho, ambtguo'
contredltório. Opsctdêde e transparência, plena e lecunosa, a lingusgem cris-
taliza e filtra; el8 impede o caminho pare certos desejo§ e determina-os prc-
cisírmente asEtn; logo, ela permite que êle pass€ e a.utorlza a elaboraçÕo do ato
no seio do qual o desejo se constltui manúestando-so. Os iogcs de palavras,
aqui como álhures, tem muita importâ,ncie. Umê semântica geral tiraú8 dal
seu malor rlotivo. .rá que colcco questões ao Dr. LAoAN, eu me peúnltlrlB
reiteiler uÍne interrogaçêo (que eu lhe prcpuscra já em Royeumont, há
alguÍ-nas ser.rs.nas, foú Oo colóquio sÔbre a dtalétlcs ). Cr€lo compreender
como'o doente, através des deflctêncies e d88 excrecências de sua expressão
falada, por lapsos, silênclos ou brusces emergêncla,s, r€vele sté um certo ponto
o que êle é. Existe, pois, a linguagem do dccnte, lsto é, um uso p&toló8ico d&
llngue8em trlvisl. Em seguids, existe a ltnguagem conceitual do homem gu6
etabor& teôricamente sua exp€riêncla de cÍnlco, de terspeuts, de sábio. E agora
coloca-se o problema de ttnguegem enqua.nto medÍaçAo entre o "doente" e a
sociedêde, entre o "dlente" e o anallsta. ou o psiquiatra. ú a linguagem cor'
rente ? É I própri8 lingusgem do doente, emend&da, modiflcada ? t a llnguegem
ccncettual do teórtco, arrumada em funçáo de têl oll tal peclente ? Ú aliás
poÉrÍvel que nác me coloque êsse problema, senêo porque dotedc' ainda que
filósofo ou pot causa da filosofiê, de ume grendê lngenuidade. E agor8, porque
estou segurr, dêsse mal caminhc, ir€i mais longe e me mostrêrel fr&ncemente
irreverente. Talvez lsto Íaça parte de mlnhs concepção da filosofia, concepçAo
ir6nica, certamente censurével, pois que elÊ conduziu SóCRATES ao que vós sab€18!
Um fato me espsnta: pstgulatras, psica.nalistss, psico-sométlcos pertencem
à escoles e à tendênclas multo dúerentes que s€ ccmbatem. Ora, tcdos cutrm
doentes. Estes náo Eêo provÀvelmente os mesmos. Mag como compreender êsse
feto ( sôbl'e o qual, aliás, os m&is pr€clsos e esteÚsticos enslnamentos serlam
deseJáveis) ?
Interpreto êsse par&doxo como segue. As dlvers&s releções entre o médtco
e o doente, as dlferentes maneÍras de lhe falsr, as dlversas lin8:uagens concet-
tuais, entram ne teorla geral deE tátlcas e das estratégl8s, A entrevists com o
doente constttui uma tática, espontânee ou refletida. A doutrltre edotada e o
vocebulárto determtnam uma estretégis, vale dlzer que há um elemento d€
acaso e de aleatórlr tanto na relÊçáo com o do€nte como na seqüêncis das
decisões conccrnentes a êsse doente. PoÉanto, hé probâbtlidsde de nÉo imports
que estratégia tenh& sucesso num certo número de casos. Ainda hals que o
"doente" tem também sue tátlce e sua estratég'ia. De sorte que, por vêzes, o
jôgo se j.gs no estilo do quem perde ganhs! §e o ateatórto tem um grande
pspel, isto nác quer dizer que tôdas &s táticas e tôdas ês estraté8tas se equi-
valhsÍn. Âinda é necessá.rlo, antes de alinhá-ls,s por ordem de eficácia e pela
consegüente verdade ( reta,tiva), determiná-las exatamente como tai6. Inlcial-
mente é necessário sab€r qual o jôgo gue se joga: xedr€Z, brídge, pôquer, ou
outro Jôgo. Admlrô muito o Dr. LÁcÁN e vejo nêle um preãtlgioso Jogador de
pôqucr. Mas êle a,credite verdedeiramente que Joga xadrez? suplico ainda que
perdoem minha, tendência aborrecida à ironle. Alnde alErumas pelâvrss. Esta
ma.nhá, e contribuiçáo da filosofia. resumiu-se à tec,ria do lnconsclente. Lem-
brou-se 06 nomes de llustres pensadores: LEIBNITZ, MÂÍNE DE BIRAN. Esqueceu'
se um nome, o de um pensador tÉo célebre quanto lgnoredo. Entretanto, êle
escreveu sôbre a, ltbldo. Classtficou mesmo, pel& primeire vez, os tlpos de
llbido: "lthido santiendi", o apetlte de prazer, de sensa.çã.o, de intensificaçáo da
vida "libido dominandi", e vcntade d€ poder, de conquista, de domínio, -
- sclendi",
"libido a ms.is pertgoGe, a c'rriosidade, o pecêdo original, o deseJr
de eonhecer.
Ésse pensador desconhecido fol o mestre de PÂscAL: JANSÊNIUS.
Há uma extraordinária, filiaçáo entre s doutrine jansenisto e as doutrinas
modernas, atrcvés dc Pascal
t87
JÂcQUEs LAcÁN,r'J Num colóquio como êste, a propósito da técnica de
cada um dos fllósofos,-dos psiqulatrâs, doB pslcólcgos e dos psicanalistas, o
comentário não pode se ajustar no nlvel da verdade em que se atém os textos
de tr'REUD.
Sôbr.e o inconsciente da experiência freudiana é prects) ir ao fato.
O inconscl€nte é um concelto forJado sôbre o rastro daqnilo quc cperâ pâra
constituir o sujelto.
O inconsciente ndo é vma. espécie na realidade pslquica, definindo o chcul3
do que nêo tem o êtrlbuto (nem a vlrtudê) dê consclênciâ.
Podem exlstlr al fenômenos que dependam do inconscicntc nessas duas
êcepgões; ma.s não deixam de ser menos estranhas uma à outra. Êles mantêm
entre si apenâs relações de homonlmla.
O pêso que concedemos à linguagem comf, câusa do sujcito, Íorça-nos a
esclarecer: a aberraçôo de rebater o primeir'o conceito indlcndo, ao aplicá-lo
Àos fenêmeno6 oil libtturn registÍáveis sob a espécie homônlma; rcstoular o
concelto a partir dêsses fenômenos, é impensável.
Acusam6 nosse posiçÁo sôbre o equÍvoco ao quâl se pnestariam o é e o
nõ,o é de nossas posiç6es de pütidâ.
O lnconsciente é o que didsemos, se que.remos entender o qrre Fnnt'o aple-
sentâ em sua.s teses.
Dizêr que o lnccnsciente para Freud nrio é o que assim 6e chama alhures,
é nâo entender o que quelemos dizer: que o inconsciente de ântcs de !'RDI,'D
,td,o é, püta" e simplesmente. Isto porquê êle nêf, denomina nâda que vâlha mais
como objeto, nem quo merêça que se lhe dê mais existência, como o que se
dêflniria por situé-lo no in-noiÍ.
O inconscient€ antes de FhEUD náo é nada de mais consistente do quc ésse
in-noir, o\ seja, o ccnJunto do que se ordenariê nos sentidos divcrsos da pala-
vra negrq (noir) de que êle recusaria o atlibuto (ou a, virtude) (la negrura,
(fislca ou moral).
pâra
- (191ô),tomâr as oito definlçõcs dc Droclshaüocrs etn
O que há de comum
colocaçâo num livro antiBo mâs dê tal forma fora de dâtâ, que o hete-
róclito nác, se veria reduzido e r€fazê-lo êm noÊsos dias -- quc existe de
comum, com efeito, entre o lnconsciente da sensação (nos efeitos dc ccntrâste
ou de ,lusã,o ditos óUcoE), o inccnsciente de automâtismo que desenvolve o
háblto, o co-ccnsciente (?) dâ dupts personalidade, as emergênclâs idélcas
de umâ ativldade lÀtgnte que Bê lmpõê como orlentada na criaçâo do pensa-
mento, ê telepatla quê go qucr relêclonar com essa última, o Íundo âdquilido,
ou mesmo integrêdo da memória, o passional que n:s ultrapassa em nosso
caràter, o hereditário que êe reconheciâ em nossos dons naturais, o lnconsclen-
te râcional enflm, ou o Inconsclente metajtslco que implica "o at) do espírito" ?
(Nadâ disso se reúnc, a nÁo ser pol confusÁo, ao que cs psicênalistas têm
acÍescentado de obscuraJrtismo, em nÉo distinguir o inconsciente do lnstinto,
ou como êles dizem, do instintual, do arcaico ou do primordial, numô ilusão
(lêcisivamente denunciada por. CLAITDE LÉx'I.STRr.uss, ou mesmo do Bcnético
dc rtm pretenso "desenvolvimcnto" ). -
Dizemos que al não exiête nêda de comum para se funder' uma objetividadê
psic:lógica, aquela que fol estendida à êsquemas de umx psicopatologia, c quê
êssc câos nã,o é senão o rcfletor a. revelâr o êrro cêntro'l da psicologia. Ésse
êrro é o de considerar coÍrro unitáriô o f€.nômeno da própria consciência, de
29) Êssc.tcxto Ícsurrc as irrll.rvcnçôcs dc J. LÂcÂN, intÊÍvríçircs qnc consliluirnol poÍ sur
irnpoÍláícin. o pr(tDrlo êixo dê lôdils as discussões.
 rcdação drssís interveí(ór,s Íoi conilcnsad;r poÍ JAcQt,l:s LÁcAN ness:rs pÍBlrns rscrll0s
crn lrlárço dê 196l a ,Reu pe(ltlo (llritiRt EY).
O lrrto dc LÁCÁ:{. c\lÍL'nramcntc illlieil, com uma sinla\c mnilas v(zes inusilrrlir, conslituill
DnrA das maiores (liÍlaÚldadês dêssa Iridusão. Enr muitos cisos. o lÍirlluroÍ DÍelÉÍiLr rllrlo
qnirsr inlcrprclâsão Iar lorD:ú o lsÀlo mais intcligivel. (r_ol;r Jo TrâdIlor).
188
falar de me6ma consciência tída pcr poder de sÍntese, no claro lugar de utn
campo sensorial, na atençéo que o trensforma, na dlalética do Julgamento e n8.
fantasla comum.
Êss€ êrro repouse na transferência para êsscs fenômenos do mérito de
uma experlêncta de penEamento gue os utiliza como exemplcs.
O Cogito caÉcslono, dessa, experlência, é a proeze maior, talvez terminel,
no que êle alcançe uma certeza, de saber. Mas éle nÉo denuncla senão que
privilcgia o momento ou nêle se apóia (e como é froudulento estender o seu
privilég1o ), par& fazer dêle um estaluto dos fenômenos providos de consclêncl&.
Pare & clênclo, ao contrário, o Co8:ito marca a rupLura, com tôda a segu-
rsnça condicionada na intuiçÉo.
E a letência pesqutsa.da. dêsêe momento fundador, colno §elà,sb€u['s§ú8cítr,
na seqUêncla dialétíca de uma fenomenologis do €Bpírito por HEGEL, repousa
no pressuposto de um sa.ber absoluto,
Ao contüririo, na realidade psíquica tudo dcmonstra, de certa m&neira,
que se ordena sua tcxtur&, sua distrlbuição, heterótopo quanto aos níveis errátl-
cos da consciêncía.
A única Íunção homogênea da consciência está na captura imaginárls do
ego por scu reflexo especular e na funsá.o de desplêzo que a êle permanece
ligsda.
A denegaçâo lnerente à psicologÍa ncsse lugar serla, seguindo HEGEÍ,, antes
de levar n& conta da Lei do coraçeo e do delírio de pre6unçâo.
 subvençóo que recebe essa presunção perpetuada, nêo seria aquela gue
sob as espécies de honrarias clentÍficas, abre qu€tstÊo cnde se detém comc
bom provelto; não se poderia reduzir à adiçáo de mais ou menos copiosos
tr&tados.
A pslcologie ó veÍculo de ideals : a pstquê aÍ nã.o rcpresent€, mais do
a.padrinhamento que lhe permite o qualificetivo dc ocadêmlca. O ldeal é servo
da sociedode.
Um certo progresso que nos pertence ilustra a coisa; a p€icologis,, mas não
sômente ela, forneceu cs caminhos ma.s também ajudou as tcntatlvss de estudo
do mercado,
Um estudo dêsse gênero tendo conclu[do sôbre cê meios próprios a susten-
tar o consumo nos E.U.A., a psicologia se enrclou e enrolou FREUD com ela,
ao lembrar que há mais oferta porque a metade da popul8çáo
- a mulher
nêo 6e completa senÉo através dos ideals do sexo (cf. BEtty FBIE)MAN -
sôbre
a vÊga de "mÍ6tic& feminlns" dirlgida, em tal décods dc após-guerra).
Talvez, nessa saida ir6nica, a psicolcgia, advoge ê rszão de suê subslstên-
cia de sempre. Mas a. ciência pode se lembrar que o ético impltcito em sua
formaçêo ordenaJhe que refute tode ideologla. Tanto o inconsciente dos psicó-
logos é debilitsnte per& o pensamento que é €sse o únlco crédito gue els tem
que lhe conceder pers, discuti-lo.
Ora., os debates dêsse colóqulo têm lsto de notévet. Não cesserarn de se
voltar em direqã,o ao conceito freudiono cm sue diflculd&de, e mesmo tomsrem
sua fôrça no pl8no dess& dificuldade em c&d& um dos exposltor€s.
Esse fêto notável, ainda mais que nessa dête no mundo os psicanallstas
não se aplicem senão em retGrnar à categorÍs ds, psicologie. O efetto de
aversáo que encontra em sua comunidade tudo o que vem de F REUD, é &dvogado
cl&r8.mcnte, notadamcnte numa fraçáo dcs p6lcanalistas presentes. Dado gue
nã,o pode ser deÍxado fora do exame do tema em causa. Assim com êsse outro:
que se deve ao ncsso ensina,mento que êsse colóqlrio tenha derrrtado essa cor-
rente. NÉo sômente paÍa Í.azer o seu ba.lanço muito se tem felto mas
porque lsto nos obriga a darmos conte das vias- quc tomamos. -
Quendo e pslcanéllse é convldade a entrar no berqário da "psicolc8ia 8e-
ral", é pare sust€ntar o que rnerece, sômentc aÍ c náo nas longÍnquas c:linas
I89
deÍuntas, s€r denunciÀdo como mentÊlidÂd€ prlmitiva. Potê é êssÊ a espécie de
interêsse que a psicologia Bc8b8 têndo em nossa sociedade prresente e do qual
temos dado uma tdéla.
A psicanálise entâo sobrevém pÀrÊ fornecer umÊ astrologia mals decentê
do gue aquela à qual nossÀ sociedade continuê a sâcrificar-se em surdina.
'Portênto, achaÍnos JustiflcÊdÀ Ê prevenqeo que â psicanálisê enconf,râ. no
IJste. PermÀnecendo posBlvel que ao ae lhe oferôcer & prcvÀ de exlgênciâ,s
sociais diferentes, ela se achou mêno8 tratÁvel por ser mals mal tratadê. Pre-
JulgÊmo8 lsto, segundo nossê próprlê poslqã.o ne psicâ.nállse.
À psicanÁlise tem feito melhor em aprofundar sua táUce e em se instrulr
no examê da teologlo, segundo umo, vlê que tr'REUD a€slnêlou nÁo poder ser
evitedê. Âo menc§, que suÀ deontologia na ciência faça-lhe sentir que ela é
nesponsêvel pela presença do lnconscientê nesse campo.
Essê fol e funçâo de nossos alulros nesse colóqu'io, ê nós contribulmos com
método que fol constartemênte o nosso em semelhante ocasiÉo, §ltuando câda
um dos autores em sua poslçâo quânto ao têma. Dal se lndlca o plvô nas
respostas aqul con§ignadas.
Nêo seria sem interêsse aômentê para o historiador ter as
- e náoreâImente
notas onde seo recolhidos oÀ dlscurso€ pronunclados, mesmo- cortados
por carências que êÍ deixararn os defeltos dos registradores mecânic6. Êles
subllnham a cârência daquele cujos serviços se designavam por acentuar, com
o maior tÀto e fidelldado, os desvlos de um momentc de combate num lugar dê
mudânça, quando seus núcleos, suê cultura, permiuaÍr-lhe destacâr nelas, me-
lhor do que quÀlquer outro, os modos dô escuts com as intençó€s. Seu desfa-
leclmento levâ-ncs já aos fêvores dc abandono.
Nâo mâls deploraremos a ocaslâo estrsgada, pols que cadê um dos autoreB
depols de tester com lêrguezê o beneftcio de uso bem recebido, refizerâm culda-
dosarnente sua contribuiçáo. Dlsso aproveltaremos pa.ra nos êxplicsr sôbrre
nc,Bsa doutrlna do lnconsciente nesse dla, e alnda mais legltlmamente porque
ôs rreslstênclas de repertlqêo slngular lmpediram-nos entâo de dlzer mais.
Essê conslderaçêo néo é pollticâ, mÊs técnica. Nasce da condiçâo seguin-
te, estabelecida por nossâ dcutrina: oB psicânallstas fazem parte do conceito
do lnconsclente, pci,§ que êles consUtuem a suê flnurÀ. Nâo podemos, dêsde
entáo, nâo lncluir nosso discurso sôbre o inconsciente na tese mesmâ que êle
enuncia: que s presença do inconsclentê, p:r sê situar no lugar do Outro, deve
§êr pFocnrada em todo discurso, em §rrê elucldaçáo.
O sujeito mesmô do candldato & sustentar essa pnesença, o anallsta, deve,
nêss8 hipótese, pelo mesmo movlmênto, ser lníormado e "cJlocado em caüsa",
ou seja: experlmêntar-se suJeltâdo ao referente do siEarlflcânte.
D€ onde o aspecto de espirêl interrompida que se obBervÊ no trabalho
âqui apresentado por nossos aluncs S. LECLATRE e J. LÂPLANCHE. D que êles o
)imitâram à prova de uma pega destacada (o caso de Phlllppe).
E é o stnal mesmo de que, em seu rlgor, nossoÉ enunclados seo íeitos
primelramente para a funçéo que êles s6 preenchem em seu lugÀr próprlo.
Âo tempo propedêuttco pode-se ilustrar o efeito de enunclaçÁo a demandar
do aluno, se êle lmegina o inconsclênte do arimal, ao menos pot' algum êfelto
de llnguagem, e dâ llnguêgem humana. Se êle consente que essa sejê e condl-
çâo panÀ que, sômento al, êle possa pensar, têreis verificado nêle a clivagem
dâ,s noções de lnconsclente e de lnstlnto,
Feliz âuspÍcio do poflto de pârtlds, porque Íêla teo bem a todo ana.llstê,
À êlgum creilo q1ue êle tenhê levado mals avânte, podendo-se dizer que, no
exercicio de suas funções ( suportar o discurso do paciente, rêstÂurar cs efeitos
de seu sentldo, colocar-se em causa antes de r€€ponder, como tÀmbém se calar),
êle Jamals teve o sentlmento de entrêr em combâte com algumê cols quê
lembre tun insunto ?
190
A leiturs dos escritos anellticos e as traduções oficisis de Eteuo (que jri-
matA e8Creveu esse pÂtavre) COlOcam-nc em nossa linguegem, e talvez -exlste
algum tuterêsse em obúar urna, retórla que oculta todd o eficrlcle do con-
ceito. O Justo e6tilo do texto náo é tfia s t€orla. Mes é a, garantia de que os
enunciedoa que o impõem, têm um efeito de enunciagáo onde se atueliàm e
metáíora e a' metonÍmie, antes que nossas tese6 feçim tr longe os púprios
mecanlsmos descritos por E REUD, como 6endo equêles do lnconsõienLe. - -
Mas v-olt&-nos aqul,_ leglthsmente, e questã,o: €les são efettos de tlngua-
g€:n, ou eÍeitos de patole I Neo adotsmos, aqui senáo o contôrlro da dicot-onia
d€ SAUSSUBE Volteda pa.ra o que lnteressa seu eutor, lsto é, os efeitos da,
lingua, ela fonrece cs.dela, e trs,ma oo que se tece entre sincronia e diacronia.
A tsto, volta-se em dlr€çáo ao que nos põe em causa (igualmente aquele
gue nos questlone, se Já não fol extrovledo pelos portedoreÀ da questáo), a
sBbêr: o sujetto; e & â,ltern&tiva se propõe em disJunção. Ora, é essà disjunçã,o
m€sna que nos dá a resposta, ou a,ntes é levando o Outro a se fund&r corro o
lugar dê no86a resposta, ofetEcendo-a êle próprio, invertendo su& questêo em
mens&gerÍ! que lntroduzimos s disjunçáo efetíva, a, partir da quel a questã,o
tem um sentido.
O ef€ito de linguagem, é a causa tntroduztde no sujeitc. por êsse efeito
êle. náo é csusa de si-púpriJ, êle carrcga em ai o verao d& csusa que o íende.
Pois cêusa é o significante aem o qual nÕo eúsürle nenhuri sujelto no
rea.l. -sua,
Mea êsse.sujeito é squêle que o slgnúicente rcprcsents, e êle nêo podertB
nade representar senêo por um outrc sitrlficante; ao qual, desde en-tão, se
reduz o surelto que escuts-
Portanto, o sujeito nêo se (lhe) fela" O Id Íale dêle é no Id oue êle s€
apreende, e cada, vez mais fcrte do que êntes, porque o ld'se dlrtge i ête e ête
desapa,rece c:mo suJeito scb o signiflcante no qual se transforme. Ele não
erB &bsolutamente nada. Ma.s êse nada se sustents, de seu futuro, Êgors, pelo
8pêlo feito so Outro nesse segundo stgniÍtcante.
Efeito de lingus.gem, porque ête nasce dess& fends oÉgtnel, o sujeito traduz
uma, sincronl& 6lgntflcênte em pul6a,çã,o temporal. prlméiro moyimento. Mas
no segundo, o desejo fs,zendo-se no corte stgüÍtcante onde se efetua e inetont-
miÊ, é a, diacronie (cha,madê ',histórte', ) qúe retorna à espécie de flxidez que
E BEUD concede ao desejo inccnsciente (úttime fase da. Traimileuntung).
Ése segundo subordinamento nõo prende sômente o efeito do prlmeiro,
conduzlndo-o à topolcgie do sujeito sob i espéclc da sincronla do fantasma.
_
Ele sele-o, com efelto, no gue é recusado so sujeito do desejo gue êle se
sabe feito de Wrole, pela quol êle é desejo do Outrc.
É por isso que todo discur:so está em vlas de se ter por ser, por êsse efelto,
irrcsponsóvel. Todo discurso, sêlvo equêle do enslnantê quendõ éle se drige
a pslcsnalista.s.
Sempre acredltamcs num tel ef€ito e, se bem que derigual à tarefa, de im-
pedt-lo, fol egso a proeza. secretá, de cad& um de nosso§ .,ÀemÍnáÉos',.
_ E_ que sguêles que vêm nos ouür náo sã,o cs prlmeiros comunhantes que
PLÁTÁo expõe ne interrogaqão de SóCBATES.
Que o "secundério" de onde êles seem dêvs pssser por uma prop€dêuttca,
diz muito de suss cerênciss. De sua "f[osofia",- a maiôr perte íÉo guerdou
senÉo uma mix&gem de fórmulas, um catecismo em pagéô que os úestesia
pere tôdÊ surpr€68 da verdade.
- Állde
ideais
mÀis que €les são prêsas oferecidas às opersções de presugío, aos
de Êlto personalismo, pelos que!6 e ctvllizaçêo- apt€ssa-os e vivei actme
do seus melos.
Meios menteis, se entende.
O ldeal de sutottdede com o quat @ncorda o candld8to médico
qúse de opiúêo onde se desfila o m€diador dc tmpasses r€laclonals, - a p€s-o
-
r9t
,neaning ol meaning onde tôdâ conquistê encontra seu állbi, - a fenomenolo-
giq invêntôrlo é vasto e Srande
vÁó que se ofeiece às andorinhas do céu,
a dispersêo no ponto de partlda. - o
 igual resistência em deneSêr, mâlgrâdo HEGEL e FnEIlD, e a infclicidade
da consclência e a doença da civilizaçÁo'
Uma "koiyé" da subietivâçÉo subentênde-a, que objetivâ as falsas evidên-
ciâs do ego e dêsvta tôda â provê de uma certezâ em direção à suâ prccras-
tinaçáo. aQue se nôo nos cpônha nem os malxistas c nem os católicos, nem
os próprios freudlânos).
Ê por isso que §ó um enÊlnamênto que fragmente êsse traço por viê da
análise que se inütula dlttática, pois que os rêsultados da experiênclÀ s6o falsos
Bó pelo fato de se registrÀr nessÊ "kolyé".
Essâ constrlbuiçÁô de doutrina tem um nome: é simplcsmcnte o €splrito
cientlficc, que faz cômpleta falta nc§ lugarcs de recrutamento nesBe dominio'
Nosso ensinamento é anátêma porqüe se inscrêve nessa verdade.
-eú qüe se tem Íeito vêler de suà inctdência na trânsferênciê
À objeçáo dos
analistas foimaçáo, fari4 rir os analistas futurog, se, graças à nós, .êles
alnda soubêrem que-F REM) existe. Mâs o que el8 prova, é ê ousência de tôda
doutrina dâ psicanálise did6tico quanto à afirmâção do inconsciente.
Dêsde entáo, comprêender-se-á que nosso uso da fenomenolo8Íâ de HE[Eú,
n6o comportava nenhuma ollgcraçâo do sistema, mâs pr€stava-se como êxem-
plo ccntia âs evidênciâs da idintificaçÁo' É na conduta do exame de um doentê
ã no modo de concluir dêlê que se âfirma a critica contra o bestlárlo lntelectual.
É não evitando as lmpllcaçôee éticas de nossa praxis na deontologla e no- de-
bâte cientlfico, que sã desmascararÁ a bcta alma. A lei (lo coraçóo, nóê o
dlssemos, faz daÀ suas, aindê msis que Ê paranólâ- É a lei de üma astúcia
que, na astúcla dê razão, traça um meandro de contcrnos multo fracos.
Para além disso, oc enunciâdos hegellanos, mesmo ao se deter em seu
texto, sÃo propiclos á dizer sempre Outrs coisâ. Outra coisa. que - corrig€ seu
lugâr de sl-nteôe tantasmôttca, sômpre conservando seu efeitc dê denunclar as
ldentlficações em 6eus engôdos.
É nossa A.uJlrcbung em nós, que transforma aquela de Ht:cut., sêü cngódo
nêle, numa ocastão de- soerBuer rio lu8ar dos sâltos de um progresso ideel'
os avÀtar,es de umâ âusêncla.
Pâra. confirmar em sua fungão êsse ponto de ausência, nâda cxiste de
melhor <io que o diálogo de PLÁTÁo, porquãnto êle pertence ac gênero. cÔÍúco
e não recusà â mârcâi o ponto quando nãc há mais o que opor aos "insultos
de bonecos mascarados dó fantoahe", e porquê êle prcserva o roeto de már-
more para âtrâvessar os séculos esperando que íará melhcr na tomadâ que
êle condensa em seu Judô com ê verdade.
.Ê assim que no Banqttete, F'REú|, é um conviva que sê pode Àrrlscâr a c-on-
vidsr para o improviso, sobr',etudo se Íiar na pequenÀ notê que .Jtgs- iÍ-ldtgê
o que êle lhe dev em sua iustezê sÔbre o amor, e talvez na trÊnqüilidade dê
seú ohar sôbre À transíerêncla. Sêm dúvida êle seria homem capaz de reviver
êases rclÊtos bacantes, tlos quals ninguém, após ter pÀrtlcipado déles, nÁo se
lembra mais depois dâ ebriedsde.
Nosso seminárlo nêo erâ "1â ondê algo (o Id) fala", ccmo acontece quo
se diga prazeirosamente. Êle suscita o tugar de onde algo (o Id)- podiê Íalâr,
abrinão inats de um ouvido para ouvir o que, na fattâ de reconhecê-lo, terla
deixêdo pêsêar como ínatlfere;te. E é verdade que ao asslnalá-lc lngênuâmente
pelo f-ato de que foi à tarde me§mo, a menos que não fÔ§se JuBtâmente na
-vésiera, que êle ;ê encontrou nâ sessao do paciente, tal auditor nos espantê de
que algo (Id) tenha §âldo, tornando'ce até textual o que dissemcs em nosso
seminêrio.
192
O lugar em qucstáo é e entrada da caverns, a quel PLATÃo ncs gula
para a sàÍda, e imegine-se ver entrar nela o psic&nelist&. Ma.1 as coisas
sáo menos fáceis porque é ume entredê onde só §e cheg8, qtlando iti se encontra
fechad& (êsse lugar náo será jsmais turístico), e que o úntco meto para. que
ela. se entreabra é o de chamar de dentro.
fsto pode ser resolvido, se o sésamo do incon6ciente tiver efeito de potole,
de ser €struluto dc ltnguagem, mas exlge do analista que êle retorne sôbre a
fechadura.
"Abertura", palpitaçáo, um &larma de sucçóo para seguir certas indica-
çõcs de FRuuD, cis o-de que precisamos dar conta e é o que fizemos so funder
ums, tipografia.
A estrutura, do que se fechs inscreve-se, com efeito, nurno Seometria onde
o espaço é prôpriamente lsto gue aqui se chama uma. bcrda.
Ao estudar formalmente, nas consequências ds irredutibtlldade de 6u& cisão,
poder-se-á reúrdenEr oÍ alSumas fungÕes, entre estética e lógtca, des mat§
intere§&ntes.
Percebe-se aI que é a fechedura do inconsciente que dá e chave de §eu
espaço, e principelúente de tmpropriedade que existe em fazer dêle um "de
fore".
Eta, demonstre t&mbém o núcleo de um tempo rever§lvo, bem necessário
para introduzir com tôde 8, eflcácla do discurso; bs6tante sensivel Jé ns, retme'
çéo sôbre a quat inslstlmos hé muito tempo, do efeito do sentido n& frase, o
quel para se fechar exige sua último palawa.
O ü(chtriiglich ( leribrem:s que fómos o prlmelro a extral-lo do texto de
FBEUD), o r.achtrdgltch ou após-golpe segundo o quBl o trauma se lmpllca no
sintoms, mostra um& estruturê temporal de uma ordem mais elevada.
Mas, sobr€tudo, e exp€riênci& d*sa fechadure mostra que nóo serls sô'
mente gratuito para os pslcanallstas, reabrir o debate sôbre a ccrcc, êsse fan'
tasma imposslvel de se conjurar do pensamento, cr{tico ou nâo. Êsse fentasma
nã,o é como também se diz dc ser, a sombra das formas do discursr ou
entáo j6 sc teri& dtsslpado. 8le perpetua a razáo que subordlna o suJeito - ao
efeito do BignificsJrte.
S sômente como instâ.ncia do inconsciente, do lnconsclente fltudlano, que
se têm atcançêdo a cause no seu nÍvel, o qual um HUME pretende dellnear €
que é justamente aquête onde els tome consl6tênci8: a retrosçáo do siSrúÍIcatrte
em sua eficácia, que é preciso distinguir completêmente da c&usa fínal.
Deve mosmo ser demonstrado que é & t'uric8, e verdaatetre c8u§e primeira,
que se verá se reunir à eparente dlscordância das quatro c&usss de Ârlstóteles,
e os anstlstas aÍ p:deriem, em seu terreno, contribuir vantêJosBmente.
- Eles terls,m & prtmezl& de poder servir-se do t€rmo freudÍano sobredeteÍmi'
naçúo, de outro forma que nã,o para o uso de ume piruets. No que seguirá é
que se verá o treço comum que serr functonamento manifesta nessas for?nas:
sua, artlculação circular, mas nã,o rec[prcca.
Se existe fechadure e entrads, não se pode dizer que elas seperam; elas
dão pera dois domtnios seu modo de delimitaçáo. Esses domÍnics sÉo respecti-
vs,mente o stUelto e o Outro, €sses domÍnios não estando aqui para §er §ubst8n'
tificodos comf, nossas tcses sôbre o inconsciente.
O sujeito, o sujcito certesiaJro, é o pressuposto do inconsciente, nós o te'mos
demonstrado em seu lugêr.
O Outro é s dimens&o cxlgtda de que a fela se afirme em vcrdadc.
O Inconsciente é entre êles sua cisÉo em ato.
Encontrar-se-6, comandando as duas operações fundsmcntais, onde convém
formular a causaçÉo do sujeito. Opereções que se dedicam à ume rclaçáo clr'
culer, mas não-recÍprcca.
A primeira,.8, alienaçáo, é o feto do sujeitc. Num cempo de obietos, náo
é concebtvel Ienhuma relaçÉo que engendre a alienação, senáo aqtlela do signi'
rt3
ficantc. Tomcmos por. crigem êsse dado de que nenhun sujeito tcrn rxzáo dê
apÍrrecer no reâ|, salvo se al êxlstem sêr€s fâlânte§. Ê concebivel uma fÍsicâ
que dá conta dc tudo ao mundo, nêle compreendido sua parte animoda. Um
sujcito âl nôo se impõe scnão pelo que havia nesse rnundo dôs signifieântes
qllc nàdâ querem dizer e que existem para serêm decifrados.
Concordar com essa prioridade do significantc sôbrc o sujeito é, para nós,
levar em conta a experiência que Freud nos abliu, qirc o sitni(icante jotâ e
ganha, se podemos dizer, antes que o sujeito seja âvisa(lo, ào pontc (le quc
no jôgc, do Witz, do "mot d'esprit", por exemplo, ôle sur'plorndc o Êujeito. Pelo
seu rr@srl,, o que êlc aclara, é â divisÃo do sujcito cdnsi8o mesmo.
Mas o que êle lhe revelou não deve nos ocul[ar qrre essa divisáo náo
proccde de nenhuna outra coisa que do mesmo jôgo, do jôgo dos significan-
t(§... dos si8niflcantes, e nâo sômente dos signos.
Os signos sâo plurivalentes: sem dúvida, êlês representam alguma coise
para alguém; mas, do mêsmo modo que a linguagcm prctcnsa de cer í,os
animals, Ilngucgem de signos que nÁo admitc a mctôfora, um engcndra ê
metonÍmia.
Êssc alguém no limite, êsÊe talvêz o universo enquanto êlc si circula, nos
diz dclB, da. infolmação. Todo centro onde ela 6e totaliza p3de sel tomado por
s.lguém, mas para um sujeito.
O reglstro do signiÍicante se institui porqu€ um sig ificante r€preselrlâ iün
sujcito psl'a um outro sig'nificantê. É â estrüturâ sonho, lâpso e "mot
d'esprit" dê tôdâs as fcrmaqõê€ do inconscientc. -E é tâmbém aqucla que
êxpllca ê -dlvisã.o originária do sujeito. O significante se pÍoduzindc no lugat
do Outro s.indâ nôo alcançado, fâz surgir ai o suj€ito parlr o ser que n!-D tem
ainda a fala, mas é ao prego de condensá-l?. O quc êí cxistii (il y evaii) C,r
prestes à fâlar, ncs dois sêntidos que o imperfeito Írancés dó à "il y
- isto
tivÀit", de colocá-lo no instante de antes: êle estave lá e nao está mp.is lá;
tâmbém no instante dê âpós: um pouco maiB e eu nâo cstava âí, p-r tel' pcilido
estâr lá. porque êsse "lI y avait" desaparccc ai por nóo ser. r,rais q"c rrnl
-
siBalificênte.
Náo é, pois, seneo o ponto de partida dessa operação: quo seje no Outlo
que sc fez qualifical a alien&qáo. Que o Outro seja palo o sujeito o lugal. de
suâ causa slg'nlflcântc, aqui náo fâz §eneo motlvar a râzâo porque nenhllm
sujeito ná.o poderia ser causa de sl. O que é preciso náo o é, ao menoB s-. dê-
vemos pensá-lo como sujeito, sânto AGosTlNHo úu-o muito bcm recusando
o atributo de causa de si âo- Deus pessoal.
A allenaçÁo reside nÊ divis6.o do sujeito que destacamos em sua càris.1,
ntâs ollc mcroue que se â considere como estrutüro lógicâ. frssâ estrutilr lr é
aquelâ dc um ocl nôr'o â apresentar aqui sua orl8inalidade. .É precis:,, par'a :isto,
derivá-lo do que sc chBma, eln lógica dita matemática, uma rcuniôo (e da
qual se sabe que ela. define um certo o-el).
Essa r€união é tal como o oe, que dlzemos dc âllcnaçâo c cilrc inrpõc uma
oscolha cntrc scus têrmos, eliminandc um dentle êlcs. Portânto, G, jcigo limita-
se, aparcntcmente, À conservaçá3 ou nâo do outro térmo, quanrlo n rerrn;áo
é binár'ia.
Essa disjunçAo se incor'na num nível mais ilustrávetr, scnáo dr'anrático,
dcsde que o significânte se incarnl num nh,el mais personalizldo na busca
ou no oferecimento: em "a bôlsa o1l a vidâ" ou cm "a llbardada oi.l a mol'te"-
Neo sc trata sená.o de sabcr se vós desejais oll nÀr /sic eltl |o)t) ccnserl,ar'
a vldâ orr rccusal'a moltc por ês6e que é o ot|tt,o têrmc Ílâ alte)naLivâ: â bôlsÀ
ou a liberdâ(le, vos'sa escolha será em todo caso engâncse.
É prêciso cuidar que c que rcste é dc qualquel' folma nlutila(lo: scr'á a
vidc, scm a bôIs1, olr terá a vidâ pr)r'tcl l.ec|lsâdo a mort'r-', umâ \.ií]a lDr.r
- DIeço
poLrco incômodâ pelo (lâ libêrdâde.
19,1
É ês6e o cstigma dísso que o ucr, aqul fu:rcionanco dielêticamente, op€ra
sôbre o ue, da reuniáo lógica que, sabe-se, equivale à um e, (sic et ,ort). Como
êlc ilustra que no mais longo têrmo serie preciso deixar o vida apó§ a bÔl.se'
e que nÃo restaria enfim senêo a llberdade de morrer.
Do mesmo modo, nossc sujeito é colocedo no oe, de trm certo sentid: a
recebel' ou d& petriflcaçáo, mas se êle pr€sen/e o sentido, é ncsse cempo (do
sentidc) que vir{i mordê-lo o nec-sentido que se produz por sue mudança cm
sigrifíconte. E é bem (lo campo do OutIo quc êsse náo-sentido depende, aind8,
que produzido pot' suo eclipse de sujeito.
 coisa dcve scr dita, pois ela quatifica o canrpo do inconsclente, a, toms'r
a.ssento, direrlos nós, nc luger do anallsta, entendâmo-lo literelmente: cm sue
poltrona. É nêsse ponto que deveremos deixarJhc essa poltrona num "gesto
simbólicc". É & cxplcssão em uso par& dizer: um gesto de protesto, c êsse
gesto teriâ o slcance de se inscrever no reverso da senha que se tcm táo- be'
iâmente e"cvogado no grosseiro de;emberaqo, no franco-htlmor, e quc se poderle
dizer', numa traduçã.o dlretamente jorrada da "smathia"; que tlma prtnccsa
se incarnou na psic..rná.liss ftances&, aquela qtre traz a tons,lidade pré'socrátice
familÍar ao Frcird de: wo es uor, soll lch Lac'tde'., o §om falso e discordante
do: o ego (do analista, §em dúvida) deve desalojar o Id (bem entendí(lo' do
pacicnte).
-
Que se conteste a S. LECLuRE por pcder tomar a, seqüêncie da, Iicorne,
Felo inccnsciente, €ob o pretexto cle guC ela é consciente, o qrre quer dizer
que nÉo se vê que o lnconsclcnte não tem sentido senáo no campo do C)utro,
e ainda mencs, Ísto dRi resr:lto: é que nêc é o efeito de sentldo quc opcra na
-
lnterpreteçáo, mns a altiorlaçáo no sintcma dos slgnlficantes (sem nenhum
sentido) que aí sôo encontrados presos.
Vamcs à segund& operação, ondo se fecha a causaÇÉo do suieitg, para ai
c:,iperr'mentar a estrutura da borda em sua, funqéo de limite, mas tamllém na
torsã,o que motlva e lnvasêo do incon§ciente. Chemal€mcs essa opeüaçeo:
seDâ:'aílã.o. Reccnhecercmos aÍ o que Freud chame lchspcllung ou nova fenda
cc sllJcltc. e deatacaremos porqrre. no texto onde FBofrD & introduz, étô a ftlnda
n'.rmo fendo não do surclto, mas do obJeto (fólico. prineipalmcnte ).
 forma lógicê que vem pâra modiflcar dlalêticamente essa segrrndâ cpe-
râçáo, chama-se em lógica simbólica: a intersecçôo, ou alnds o prodttto que
se fonnula dc uma dcpendênclâ d Essa funçéo modlfica-sc, aqui, por
- e d -. porque
lrnra par'te tomada dB. car'ôncia-à cs.rêncie. o suielto vem de €ncontrer
no desejr do Outro sua equivalência ao qttc êle é como suJeíto do inconsciente.
Por esse via o sujelto sc realtza na perde cnde ê[e surgiu como inconsclen-
te, pele carência, qlre e.le produz no Outrc, scguirldo o tracado ottc r.rBÍ:In dcsco-
bre como e pulsã.o maís radical e que êle den.mina: pulsã,o dc morte. Um
nem d é aqut chamado para encher um outro nem ô O ótomo de EIÍPÉDo-
-
cLEs, respondendo a. isto, manlfesta que ôe tfata de um -. quercr. O uc, retorna
em üelle. Êsse é o fim da, operaqÉo. O processo agora.
S€pílre, scparar aqui termin& em se parere, engendrar-se o si-mesmo.
Dispensemo-nos dos bcncflcÍos certos que encontrsmos nos etimologistas, cspe'
ctalmente do latim, à êsse deslizar do sentido de üm vefbc para o outIo. Que
se saibe sômente quc êssc deslizat' é fund&dc em seu comum cmparclhe-men-
to na funçóo de lrúrs.
 partc não é o todo, colno se diz, nlas de ordinário inconslder'?da mente.
Pois seró necessário accntLtar que ela náo tetn nada a fazer conl o todo. Dsí'
é prectso tomar scu parEido, elo desempenlta sua parte sÔzínha' Aqui, é de
sua, partiçÉc quc o sujeito procede à sua partuÉqão. E isto náo implica a me-
táf-^ra glotcsca dc que éle õe colocâ no mundo de nôvo. O quc, aliás, a. lin-
guagdm será bcrn cnrbaraçada paro expt'imiü por. rrnr têrmo originol, ao me'
nos nl área in(lo-elliopéia ondc tôdas &s palavras utilizsdas parr, ê6se emprêgo
têm uma origcm jurÍdica ou social. Pttrcra é, Ce inÍcio, pr-c'.lrâ r'. E Jtot rltte o
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sujelto podc prccurar o que âqul se refere a êle, um estado qtle qualificaremos
de civil. Nadâ na vida de êlguns desencadeiê mals obsttnaçêo para chegar
aI. Para ser pois, êle sacrificÊró uma grande parte de seus interêsses, e isto
náo é pars se lntegrâr nâ. totalidade que, de resto, não constitui os interêses
dos outros, o ainda menos o interêsse geral qu€ dêle se dtstlngue §eguramente.
Separarc, ae Darate: pàÍa se pcÍer (emparelhar) ao §ignificante sob o
qual êle sucumbe, o sujeito âtÂcÊ a cêdeie que r€duzimos ao mêls simples dê
uma binarldade, em seu ponto de lntervêlo. O lntervalo que se repete, a mâis
radical estrutura da cadeia signiftcarte, é o lugar que a metonlmla freqüenta,
velculo do desejo.
Em todo casc, é sob ê incldênciê quê o sujeito expêrknenta nesse in-
tervalo. Outrê col6a â motlvô-lo do que os efeitos de sentido, o quel solici-
tê-Ihe um discurso, que êle encontra efetivamente o desejo dc Outro, antes,
mesmo que po§sa §Ômente nomeá-lo deseJo, e ainda menos lmâ8'inar seu objeto.
O que êle val situar al é ê sua próprlê carênci& sob ê formê d& carência
que êle produzirá no Outro por seu próprio desÀpaÍecimento. Desapareci-
mento quê êle tem, se podemos dizê-lo, sob a mã.o, da parte de si-mêsmo que
lhe revém de suâ prlmelrê aliênaçáo.
Mas o que êle €êusfâz êsslm nÁo é e falhê que êlc cncontÍo no Outro,
mas, de inlcio, aquela dÊ perdâ constituinte de uma de suâs partes e pela qual
êle se acha em duas partes consütuidas. Reside Êl a torsâo pcla quâl a. separâ-
ção reprêaênte o retôrno da êllenaqâo. Ê que êle opeÍa ccln suê pl'óprlâ perdc,
que o condüz Êo seu pontc, de parüde.
Sem dúvlda, o "êle pode me perder" é seu recurso contrÀ ê cpacidade dêsse
que êle encontra no lugâr do Outro como desejo, mas. é pÀra cottduzir o su-
jeito à opâcidade do ê€r que êle retorna dê seü acontecimentl de sujeito, tal
como de lnlclo êle se produziu dê intimação do Outro.
Essa é uma operâção cujo desen-ho fundamental val se encontrar na téc-
nlca. Pors é nâ escÀngáo do discurso do paciente enquanto nêle intervém o
ÀnÊlistâ, quc sê verá adequâr-se essa pulsaçâo da borílâ por onde deve surgir
o Ber que reside aquém dcla.
O golpe do acontecimento dêsse ser em suê relação com o que designa-
mos como o dêsejo do anêlista, no que êle tem de inapcrccbido, oo menos até
êssc dia, dc suê própria posiqáo, eis a fôrça verdadeira e últimâ do que
constitul a trânsferência,. -
E porque ê tronsfeÍência é uma relaçáo essenciêhncnte liSadâ ao tempo
e êo seu mâruseio Mas o ser qüe nos responde, operardo do câmpo da fala
e da linguagem, do aquém dâ. entrada da caverna, gual êle é? h'emos dar-lhe
corpo com os muros da pr6pria caverna que viverÁo, ou ântes se animarão
de uma pâlpitaçã.o cuja relaçáo com â vida deve ser destacada, agora, isto é,
depois que tenhamos articulado a funçâo e o campo da fala ê da linguagem
em seu condlclonamento.
Pols nâo vemos bem que se tenha o direito dc nos imputâr dc negligen-
clar s allnêmica em nossa topologia : nós a ol.ientamos, o que vale melhor do
que fazer dela um lugâr comum.
Pela sexüalldade cnde se nos ocorrcria que é à fôrço quc temos que usar
e quc elê é biolótica, podemos achar quc a análise talvez nao tenha clala-
mente contribuldo porquê so têria de e6perar um tempo para o oclaramento dê
suas fôrçâs, senão para preconizar o natural delo cÍn tcmos dc litonel:s atÓ
o mlrrmúrio, VaÍncs tentar trazer alguma coisa de mflis nôvo, âo recorrer a
umâ formâ que o próprio trhEUD jamats pretêndêu lrltrâpassar', âquela do mito.
Paro ir aos r'âmos dâs ôrvores de ÀRIsrorÁNEs do Eanqtlete, acimâ evo-
cado, lembremos o animâ-l primitivo de dois dors:s onde se soldam as duâs
metadeB tâo firmes como aquelês de uma esfera de Magdebourg, as quâls se-
paradas num segundo tempo por uma intêrvengão cirúrgica do clúme de
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zeus, repr€sentam o{r sere6 esfomeedos de um inincontrá,vel complemento que
nós nos tornamos no &mor,
Ao c:nsiderer essa, esfericidade do Homem, prlmordisl antês de sua dt-
viseo, é o ôvo que se evoca e que talvez se lndlque como recalcÊdo ne con-
l.inueçÉo de PIÁTÃo na proeminêncla com que se adapte à esfera nume hte-
rarquie dss formas sancionadas pelas ciências de Datureza.
Conslderemos êste ôvo no ventre vtvÍparo onde êle nêo tem necessidade
de ca6ce, e lcmbremcs que e cada vez que se rompem su&s lnembranes, é uma
pa.rte do ôvo que é ferida, pcis ês membranes do Ôvo fecundado sÉo ftllres,
do mesmo modo que o vivente que vem à luz por sus perfurasácr De onde
le6ulta, que, com a secçêo do cordáo, o que o recé'm-nascido perde não é, como
o pensem Gs analístas, sua máe, ms,s 6eu complementc anatÔmico.
fmag{nemos que, a cada vez que se rompem as membranas, pels mesma
saÍda, um fantasm& levante vôo, aquêIe de uma form& infinitamente m8,ls
prtmárie da vida, e que está quase pre6tes a repetlr o mundo em microcosmo.
Ao romper-se, o ôvc faz o Homem, mas também a HcÍnmelette.
Suponhamc-la, larga massa, uttra-chate a se desloc&r como a &meba, a
pesser sob as portas, onisclcnte de ser leva-da pelo prlro instlnto de vlda, lmortal
por êer cissiparida. Eis algumo coiss que nã,o seria bom sentir que desllza
sôbre vosso rosto, sem berulho, durante o sono, para selá-lo.
Se nesse ponto o processo de digestão começ8, &lcansa-se que e Hom-
melette terá muito tempo de que se sustenter (lembremos gue ela é, do§ or'
ganlsmos, Jé muitc diferenciedos, o que nÉo tem spsrelho digesttvo).
Inútil acrescentsr gue e luta. seré logo engaiads contra um ser teÍtüvel,
mos que seró difÍcil. Pois, pode-6e supor que e auséncia de &parelho sen-
soriel na Hommelette nÉo lhe deixando para se gúar senáo o puro real, ela
terla ve,ntagem sôbre nós Hcmens que devemos nos fornecer um homúncrllo
em noss& cabeça, para fazer do me6mo real uma realídade.
NÉo seria fócil, com efeito, evltar o caminho aos seus ataques, de resto
impossÍveis de prever, pois quc, alnde mais, cla, não conheceri& &Í obstóculos'
ImpossÍvcl educáJ&, emboscá-ls ainda, é mais diflcil.
Pere destruir e Hommelette será necessárlo saber que ela não lhe chega,
mas que els pulule e que fezer um entelhe serla prester-se à §us reprsdu'
ção, c que a menor de suas estacas para sobrevlver conservaria todo§ og s€us
podêres de causer dano§. F.ora dos efeitos de um raio mortal que ainda seria
preciso experimentar, I úntca salda seri& fechá-la, ao prcndê-la n&s mandÍbu-
tes de um& esfera, de MagdebcurE por exemplo, que revém aÍ, o único instru-
mento, como por s,caÁ!o, para se propor.
Mas seré necessárlo que ela chegue eÍ tôda só. Pols ao colocat' os dedos
ncla, para, impelt-la para um neda qire a transborda, náo scria mais corajoso
olhá-la dues vêzes, temendo que entre seus dedo6 ela nôo deslizasse para sc
alojar em elgum lugar?
Sôbre êeu nome quese que varnos mudó-lo p.r aquêtc mêis decente de 16'
melle' (de que a palavra oúmelette de resto náo é senáo tlmê metástase), esse
lmagem e êlse mito nos parecem muito púprlos Pera r€presentsr e também
para situar o que chomamos a líbido.
 imagrm nos dá a ,ibido pot aquilo que ela é, ou sej8, um órgáo cujos
meios aparintam-no bem meis que a um campo de fÔrçss. Dízemos _que é
como supeÉÍcie que ela ordena êsse campJ de fÔrças. Essa concePçáo coloce-se
à prove-ao reconhecer e estrutura, de montagens que l'I.EUt, ccnferiu à pulsão
e a[ articulá-la.
À referência à teorie eletro-magnétlca e notadsmente e um tecrema dito
de SmKF:s, nos permitirá situar com a condiçáo de que essa supeÉÍcie se
-
) Pequclln liimína (N, do T.)
197
apoie numâ borda fechadâ que é a zona erógena à razá.o da constància
-
do inrpulso da pulsâo, sôbre a qual FREUD tanto in§istc.3o
vê-se tâmbém que o que tr'RELÍD chama o Schub ou a circuloçõo de ptllsáo,
náo é sua descargâ, mas antes deve ser descrita coÍno a invaginaqáo, indo e
vindo de um órgào cuJa funçáo deve ser situadâ nas coordenâ.das subjetivas
prcccdente§.
Êsse órgóo deve ser châmado de irreâI, no sentido cm que o lrrcâl não
é o lmag{nár'io ê prêceal€ o subjetivo que êle condicionâ. ao sel' tomedo dile-
tamonte cdmo o real.
É disso que ncsso mito, como todo mito, se csforqâ por dar tlmo arrtl-
culaçáo slmbólica quc antes sua imagem mâscâta.
Nossa lorD?lrc t'cpresenta âqui essa parte do vlvênte que se perde ao se
repr-.duzir pelos üas do 3exo.
Essa pârte é Índicada em suportes que a anatomia microscópicâ mâte-
rializê nos glóbulos cxpulsos pâra as duas ctopas dos fenÔmenos que se or'
Ítenam em tôrno da reduçúo crom:sômica, uir mat,.rleção de umo gÔno.dl
sexualizâdâ.
Ao ser r€presentada cqui por um sêr mortifcro, cla marca a relâção,
da scxuatidade cspccificâda no iDdividuo, co.m a sliâ morte-
Do que se rêpresenta no sujeito, o que espantâ é â formÀ de clsêo anâ-
tômicâ areâninrando o sentido etimolótico da palavla: anatcmia) ondc se
(lêcirl-' a função dc certos objct:s, dos quais é preciso dizêr' qrre não §áo per'-
ciais, mas que têm uma situaqáo bem À podc.
O seio, parâ tomar' âqui o exemplo dos problemâs que srlscitâm êsscs
objetos, neo é sômentc a fantc de uma nostalS'tâ. "regressil'4" por ter si(lo
aqucla dê uma âlimcntâçAo âsseguladâ. Êle cstó litâdo, ao seu calor', oll
mesÍno aos cuidados do âmor. Isto náo é dar ums razâo suficiente de seu
valor erótico, do quâl um quadro (em Berlim) de TrEPoLo em seu horrôr
êxâltâdo em rcprcscntâr santa Ágata apôs o scu suplício, nos parecc mais pró-
úmo da idéia.
De fâto, não se trâta do selo, no sentido dc matriz, ainda que sc mis-
ture ao prazer cssâr: ressonânctas ondo o significanlc representê plcnamentc
Ê metáfora. Trâta-sc do seio especificado na funqão ('lJ desmamar que pr.c-
figura a castmçAo.
Ora, o desÍnamar cstá muitc ligado à cxpcrlência dos fântasmas do des-
membramento de mác pâra que náo suspcitemos que êle falha em colocat'
o plano de pârtilhs entre o seio e â mee, que o desmâmar' é o selc perdido
como causâ do dêsejo.
E é precisc lcmbrando-nos da rclaqáo de patâsitismo ondê a orgâ-
nizeqáo mamifcrê- póe o pequeno, do embriÉo ao recém-nascido, em relâçáo
com o cor?o da máe conceber o seio cdmo. pertencendo mais ao domÍnlo
do orgonlsmo em formação - do que ao da plÀccnto.
A libtitc é e'sse lrúrr.cllr crlre cmprit'rr. o ser'cnl sclr panto de disjünçôo. Irun-
Qáo do animal êm súa raiz, e qlre nêle materiâlizír a queda súblta de scu po-
der de lnttmidaçio no limitc de seu "território".
O srjeito humâno tem êsse privilégio de simbalizar ô sontimsnto mor'-
tlfêro dêsse órgão que se atém ao efeito real, da sex[alidâde, pcrque o slgni-
ficante como tal, petrificando-o pelâ primeira lntcnçÀo, fêz cntrâr nêle. o seD-
tido da marte. (Â letra mata, mas nós apreêndemos isso da própria letrâ).
É poris6o que tôda pulsão é virtuâlmente pulsÁo de mortê.
O important€ é destacâr onde se faz o enroizamcnto do organismo na
dlalética do sujeito. Êsse órgáo do irreal no ser vivo, é êle que o sujeito,
,» S^b"-* qüc cas-c tcoÍcma dcmonslÍa que o lluxô rôt.cioDil provenieote dí sllpcrlicic se
iguala à ciÍcxla(áo Íolitclonlll sôbÍe a boÍrla ícchirda ondc cla sc apóia, il qu:ll é constânte.
Êsse Íolaclonal é obtido como derivado dos vilrliCôcs de unr vêlôÍ, as qrrâis sÍo dcÍiDirlirs
poÍ caClâ ponto de boÍdí e de supeÍÍici€, clll ílrnçio dr sllll vlzinhançil.
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num momentc vem situar no tempo em que se opera sua, §eparaçáo. Ú do
su& morte que realmente êle faz o obieto do deseio do Outrc.
Todos oi outros objetos que virúo a êsse lugar, §eráo substitutcs empre6t8,'
dos daquele que êle perde, b excremento, ou do quc êle chame no Outro
que seja suporte de seu desejo: seu olhar, sua voz.
É ao voltá-los pare nêles rctotnar, nêle restaurar sue perda originel
que sc cmprcg& esõa stividade que de[ominamoe pulsáo (Í,ieb).
Nào é por outro, via que se manifests no sujeito a incidência da se-
xualidade. Â pulsá) enqu8nto representa a sexualidade no inccnsclente, ia'
mais é senáo pulsã,o parcial. Est& é o carência. es6enci8,l, 8 saber, aquela
dc quc se podõria rcp-resentar no sujeito o modo enr seu ser do que o.i d
mecho ou fême&.
O que no:,isa experiêncie demonstro dc vacilaçáo no suieilc, concernentc
ac seu ser de masculino ou de femlnino, nã.o esté claremente em voltar-se
para. e sua bi-sexuatidade biológica, senêo ao que nóo há nade em sua, dialé'
iiea que represente ê bi-polaridadc pulsóo-açÉo do extcrior, que é tÔda imprópria
psra. representar em seu fundo.
É aÍ onde queremos chegar ncssc discurso - que a sexualtdad€ §e re'
partiu de um lado ao outro de nossa bord@ enquanto núclco do lnconsciente,
como segue:
De úm lado do vivcnte enquanto ser apreendido n8, fala, à qu8,l êle ie'
mais pode advir todo inteiro, nesse d,qüérn do nÚcleo que néo é, entretanto,
nem dentra nem for&, êle náo tem acesso ao Outro do sexo opo§to 6enlo
pele via das pulsões dites parciels onde o §uieito Procura um obieto que
lhe compensa ess8, pelde de vida que é e sua de ser sexuallrede.
Do lado do Outro, do lugar onde 8, fala 6e ver'ífica para encontrar a
troca. (lo3 significantcs, os ldeais que êles suportam, as cstruturas elementares
dr piirentesco, a rnetáfora do pei como princlpio ds separ&gêo, a divisÉ!
semprc eberta no sujeito em sua alienaçÁo primeirs; sÔmente dêsse lâdo
e por essas vlos que acabamos de dlzer, a ordem e o norÍna que diz eo 6u-
jeito o gue é pr€ciso fazer cotno homem ou mulher deve se lnstaurar.
Nõ.o-é verdade que Deus os fêz macho e fêmea, se é o dizer do casel
Adáo e Eve, como também o contradiz expressementc o mito últrsconden-
sedo gue se acha no mesmo texto sôbre a criaçáo d& compenhelrê.
Deixamos ao passado os debates onde, no que se refere ao inconsclente
freudiano, intervenções lrresponsáveis eram benvlndas, iustamente porque os
responsáveis n&o viessem senáo de má volttade, psra nada mals dlzer dêle, de
uma certe bord&.
Um resultado foi o de romper a impressão de sllêncto €m relação ao
nosso cnsinamento.
Que o complexo dc Édipo, o pcnto final ou antes e vcdcte americena,, seia
levado a uma exploraçá,o hermenêutic&, conÍlrma nossa apreciaçáo dêsse
colóquio: efeito encantatório. Do quel o futuro dirá o alcance.
Indicamos aqui, e os riscos são nossJs, o aparelho por onde podeni
reentrar o rigor.
r99
clÍlcos que entrarn em jôgo em tal ou qual modo de agôo que sc podc ser tentsdo
a sustentar essa lronia do "nâo importe o quê". Voltarci a isto, rnâ.is em
detalhe, da$ú a pouoo.
O cúdado do Dr. GREEN nessa intêrvençáo que toma quase ê dlmensÃo
de uma contrê-exposlçâo me p&receu ser o de reintroduzir os pontcs de viBta
dinâmlco e economlco em nossa perspêcüva, que lhe par€ceu como muito ex-
cluslvamentê estrutural. A "carta afeüvs," "ê ênergia instintiva" é preclsê-
mente, diz êle, isso que Júnâis estêrla em questêG em nossâ contnbuição.
Podê Eer. Mas, Justarnente, desde hé al8lrm tempo que um diálogo enfim se
engaJou entre !ól§, e eu me interroguei sôbr€ o que lâzia com que um seme-
lhante vocêbulário fôsse tão mal vlsto noa meios "lacanianos". À êssa quêstêo
nB qual me coloquei assim pârte graças ê êle duas linhas de pes-
- emfoi e de me interrogar
qulsas responderaÍn. Á prlmelra - sôbre o eniBma da
pulsâo de morte, pols, em todo o seu rlgor, esta deve, como a pul6âo de vida, ter
obJeto, fim, fôrçâ. Mas, sebe-se dê ccnflssâo dê FRlrUD, como é dlfÍcil o al-
cance cllnlco dessê corrente pulsional. Àqui neo posso senâo lembrar a hl-
pótesc que êvanço nÊ expcição, tentendo fundá-la cllnlcâmente, a sêber: "que
essa pul8ão se epresentê como umê fôrga radicêl e imóvcl, ou, melhor aindâ,
comc o contrário de umê fôrça, um vazio por exemplo, que nÀo tem rela-
çÕ€s com as pulsões libialinais senáo no sêntido em quc ela as fundâ".
 êse propósito, assinalel aliás, que nâo podemos, de nenhum modo,
conceber simplêsmente a pulsêo de morte como urla fôrqa simétrica, de signo
oontrário à pulseo libidinal. A segundê linhâ de pesquisas, assim suscitadaê
por noBsâs controvérsias, fol uma intêrrogsçÁo ênallttcê sÔbre o conceito mcsn]o
dô enerEla ftslqulca. Isto me levou a claborar um texto sôbre o ponto dc virlta
econÔmico.3r O conceito de energia ê de uma maneirâ. geral o ponto de
vlstê. quântitativo em pslcanálise, parece-me ser evocado quando o cllníco se
a.cha diante dâ questão da ,ratureza do prazer; â1, ântes de prosseguir sua
caminh&da aralltlca, êlê é tentÊdo a utilizar ê Íicçâo de um "aparelho" psl-
qulco e de subBtituir "qualidades de excitaçêo" pelos paradoxos do dcserc
e pela permanência de suê insatlsfaçôo principal. Se se ultrapâssa essa
tentaçÃo de escamotear o pnoblema, ê fôrça psiquica enfim destacada de suas
lmpllcações "anais" dominantes aparecia. antes de tudo como o capacldade dô
assumir as êntlnomlas do desejo ealipianl. Àssim me pareceu também que
os pnocessos de ftxaçáo de blcqueio tomam o sentido preciso, quando se os In-
terrogê por umÊ distinção particular de tal ou tal Íepreserttoção..
VGU ao texto do Dr. STEIN, contra-€xposiqÁo. Náo sômente para home-
nageé-la, mas pÊrê dizer que êle mereceria, por seu lado, que fôsse comentado
em detêlhe. Ná.o é êsse, entr,etanto, o camlnho que escolhl, mas antes, usando
de seu próprio método crlüco, tentarei "Àpós golpe" ir um pouco mais longe
nâ exposlção da ânêlise do desejo de Philippe. A llustraçáo cllnica dc nossa
teEC nos diz C. STEIN, pecâ por sua, "ligeilezâ", ela é câr'ente de rigcr', "mis-
turando elementos heterogêneos, fonelnas, palavras, câdeiâs de palavras, fra-
ses articuladas, reptescntações de colsos, imâgens", e tudo isto, "náo o satis-
faz". No fündo, diz êle, a c8deia LtLt-cOnNE pêrtênce ao que se poderia
chamar o léxico pessoal do sujelto lnscrito no pré-ccnscicnte. Ora, "nã,) se
tem o dlrclto de supor que êla. surglu assim do inconsciente". E o Dr. STETN
nc diz porque: "as pal{llr,.,s nfu (lhe) Fnrecem encontraÍ se ht'gar no quo
o lnconsLiente tern de rnois essencial... Antes, o lnconsciente tem por ele-
mentos dâg rêpresentações as pulsões que, na.'medida em que sâo da ordem da
Ilnguagem, sêriem ligadas & fonemas, ou talvez, ê g:'upos de fonemas. Êsses
fonemês representâtlvos de pubõ€s êntrariam na consutuição de fantasmas
inconscientes onde ge ac.haríam ligado6 ê representações imaginárias, as re-
presentações de colsas, segundo FhEUD". Estâ dito e eu o subscrevo. Isto
3! ) Le point dc vue iconontique en ?sychonolysc. ConÍerêrcia íelta íí Êvolrllior PsychiatÍique
Êm 26 d€ março de 1963, Épor. Psych., 1965, ll, p. 189 à 213.
200
me leva & pensar que, sem dúvide, fui muito tÍmido na exposiçáo dessa
aná,lise, e temo confusêmente parecer P€l'der a serleciade relacionandl, como
o Dr. sTErN me convlda, os elementos anatttico§, teis como em verdsde êles
§ã,o presentes. ú um& coisa, coín efetto, feler de fonemas (ou de néo importa
que outro elemento lnconsclente) e ume outre é tran§crevê-los, descobri-lcs
tLis como nêles mesmos êleo aparecem, pois êles sáo de elSum& forma fun-
damentalmente obacenos.
Mas talvez se possa, hoie, em parte p€lo Íato dessas JoInada6 apresen'
ter o lncontsciente numa maior aproximativa nudez. Em todo caso, vou tentar
fazer isto, com o risco de suscltar (pela eusênciÉ de prudêncle à qual meu
interlocutor me convida) sorriscs, cetlcismo, desprêzo ou revolta, como acon'
teceu sempre em retaçáo &o inccnsciente nos prlmelros tempos de sua rcve-
laçúo.
E verd&de que para dar conta táo fielmente quanto pcssível do Processo
inconsciente, é prefertvel tlmttar-se à indicogêo de elementos fonemético§
por mais que êles conotcm especlficamente, flxem 8§ emogões pulsíonais e s€
iorncm assirn, entre outros, os. primeiros representantes da pulsÉo. Parelela-
mente, no campo da experiêncii visual algunB traço§ especÍficos fixom tal
pe6soa, tet situaçéo, tal emogáo. Mais ger&lmente êtnda, proponho como têrmo
õssencial de todo elemento font8smático inconsciente uma exPerlência sen-
sorlal de dlÍerenç8, e dlsunçáo da emoçÁo, a percepçáo de umÊ "dlferenç8", ê
experiência, desse distlnçêo diferencial enquanto tal. Na experiênciê de Phi-
lipÉ, diferenge entre a, as6cciagâo tranquiuzente de rlm contacto de pele e a
irritaçôo punttforme do gráo de erela, ou einda e difer€nq8, pelcebíd& visuel-
mentõ poi êle entre & pls,nura dos homens e o colo que marce o coraçáo
meternel; êsse luga,r femintno por excelência pareceu-lhe, há muito tempo,
apresentar-se verdadeiramente como utll8 depressÉo, ou mesmo como um&
dôiscência misteÉosa. Mas para dsÍ chegsr dlreto ao campo de experlência
euditivo e vocal eo qual cóncedemos el§um priüléglo, proporel asím, sem
outro preàmbulo, o que tendo & cotrslder&r como um fantasma tncon§ciente,
bastante prlmordtel, de Philippo E uma espécte de eJaculeçÉo sccreta, uma
fórmula júbilatóri8, ume onoúatopéla poderi& se dizer mais prosaicamente, que
podc ser transcrlta (com o minÍmo dú disfsrce ) pele seqüêncie:
PooB (d) Lr
J'e
-
A articulaçáo dessa fórmula, em voz alt& ou baix&, conota.v& em sue
lembrançe a rãpresentaçóo, antecipaçác, ou mesmo e realizeçeo de -úm mo.-
vimento oe júüito difÍôil' de <reÀcréver, do tipo "enrolar's€-de§dobrar'se"'
compr&zer-se no resultado oütido, e recomeçar: mais simplesmente, um& es-
péciã de "cambalhota" poderia se dlzer. E raro que em &nólise se chegue e
isto, à consideraçêo désas fórmulas 'mais sccl€tas o há sempre nesse des'
velamento aparentemente táo 8Jródíno alguma coisa gue é sentida, como o ex'
tremo do iúpudor, ou mesmo como o llmlte do sacrilégio.
É precisõ agore (ai também com o mtnlmo de disforc€) e, detendo'me
na extrema borda de uma transgressã,c, dar o nome completo de Philippe,
aquêle que êle sabe dizer ràpidaminte para r€sponder ao comum "como você
sd chamâ": PHILTPPE GmRcD§ ELHUYANi, nome que ilustra de um golpe (colno
em guase todos os casG de e§trutura enÉlogÊ) o parentesco essencial entre o
fantãsma fundamentsl e o nome do suJeltó. Com o mals perfeito rigor de
uma nêo -lógice do ttpo primário, com e mals lnconsciente ligeircze da qual
cada um seú livre para-aprectar a fÔrçs de verdade, vou sgora me deixar
ir €m alguns comenfários ãnalitlcos dês§c fBntasms inconsciente. De inlcio,
posso tenter assinalar a emoçÉo emoçêo r€conhecida qtte se.encontra
-
ãtravés dessa fórmuta,: ctê seila alguma -
coise como o domÍnio de üma, crla-
çÉo, uma seqüência: "rien de tudc - quolque cho§e" (ebsolutamente nada, -
- ume
álguma cotsa-" ) e antes de desapalEóido: re8pa.recido espécie de
- -
201
fórmulâ mágica que "fâz aparccer concrctamentc". Essa cncantoçôo jô é
conjuratóÉa ? Ê possivel. Ivlas tomemoÊ êsse fantasma, elemento por êle-
mento, âssim como tr'REUD Íazia com os sonhos.
Poôn: o màis enigmático dos lragmentos; o fun(lo, eu creio, o GuoR de
GEoRcEs quc se torna P-oB, aspirado pelo fim de Philippe; se se unc-o tam-
bém âc conPo e talvez mesmo ao coR cujo apêlo surgiu cio fundo do bosque;
bem cntendido tâmbém â GoRcÊ (o coto) (entendendo-a, geográfica e ânatÔ-
micamentê) .Enfim, e âi vou ao exttEmo, por mois que êsse OR central §c
una com a MÊRE (mâe), a MoRTE aparece entre a IIEnE de utn lado e o J'e
do ctltr.o ("J'e" tao bem àssinâlado pelo Dl'. STETN cnquânto que de O pêra
]{, J'e nos indica J (e) acques, o irmÀo dê Philippc. "ÀloRTD" por que? Por-
que JÁcQUl:s cra antes de trldo o irrnão mais velho do pai, molto pouco
a.ntes do nescimento de Jacques, o irrnão mais vclho de Philippe, porque enfim
Jâcques é também o nome do marido de LIL!. Eis o que pocerô tentar os
,amadorres de esquemas e gr'áficos! "J'e" e logo de inlcio o duplo cc de
GEoRGDS,'em seguidâ, o JE rnêsmo do "moi-je" com o qual Phllippc muito
sofreu. Sabemos a idâde (Áou), da praiâ (placE), mâs ante's achariamos c
ambiguo J i-TÉ (jogou) parÊ baixo da beira do lcito, o JrNl, (iôgo prctêrldo,
e o ,ID T'^I (enfim!) de uma mee natlsfeitâ por êle.
Do Lr cÍeio que Já dlsse tudo antcs, do Lrr dc LILI ao LoLo pela via do
LoLr... Ser-me-â suficiente acrescentâr a obscrva(1o do tedcsdobramento do
LI no nome completo de Philippe.
Eis o que é tâtvez o esbôço do fântasma inconscicnte que subentcndc a
cadeia LILI-CoRNE. Êsse nÍvel de análise, quc tenho pol cssencial, exige duâ6
observações.
1. Éle ilustra, se lsto é necessário, a naturêzê própria do quc sc pode
cha-mar a ousênci8 de rigor Àparente da pesquÍsa analitica em sua essência.
Como falor do inconsciente ? Pode-se dtzêr legltimamente que o elemênto ,
que os pares LI-In, LI-coR, POR-LI sêjam "purâmente inconscienteB" ? Qual é
o estatuto (inconsciente? pr'é-inconsciente ? ) dêsses fonemas, dêsscs trâ-
- ?
qos asBim malcados na ânállse
2. Êsse nlvel de snálise coloca tâmbém a questáo dos critérioG que
fazem que sejâ. levâdo â distinguir, reter e sublinhar tal pâr fonemático
antcs que outro. No câso dêsse fantêsmâ inconsciente, propofía trê§ crl-
téric.i entre outros. o) À insistência repeütiva dcs elcmentos si8'nificântes,
isto é, de tal traço singular, úntco, insubsututvêl, dlferencial e 'Btmbóltccf'
em sua essência. Àssim, tal traço singular, dellneênte do rosto ou do corpo,
para falar da imâgem, tâl trêço significante fonemêuco ainda mÀis que rea-
parece no curso da análise sob uma forma sempre análoga. OR, por exemplo.
D) A dificuldade da confissão dêsses traços, tanto mâior porquê êles tocaÍn
mais de porto o fântasma Íundamental, na essênciê mesma da singularldade
e da intimidade do sujeito. c) Seu índicê de "vitalidâde," isto é, de presença
âtiva, constantê, que ceracterlza o lndivÍduo e asstln l€mbra sua ireduttblll-
dade fundamental.
3. N€sse câso tâmbém a análise revela as relêções do fantasmê fundâ-
mentel com o nome do sujeito: é preciso asslnalâr que aparece aqui, num
certo modo, à função do nome do pat. O nome próprlo, lembrêmo-lo, é irredu-
tlvel, intrâduzivel, salvo por derrlsáo (quê pode, âllás, ser sentido quÀsc como
sacrlléglo).
4. Dsse nlvel de ânálise âclârâ, sobr'êtudo e de mâneira patente, o au-
sência constltutiva de "relaçeo lóFicâ" entre o nível primário inconsciente
e a etaboração sccundfia pré-consciente-consciente. O que comumente encon-
tramos nÊ análise são réplicâs pré-conscientcs do fântasmÊ inconsciente.
Àssim, fol multo natural, a pârtir de um fanta§ma inconfessado como Poon (d)
J'e-Lrt âlcânçar uma fórmula jd trailuzida em língutt,, têl como por exemplo,
as variantc.3 "lingulsticas" seguintes: "coêur joli," "gorgc à Lili," "Joli corys
202
de Lili". Ncssa insisténcta sôbre "LIcoBNtt" visave §u§tentar sob ss aparên-
cia6 de uma tógica "secundárie" a essêncla do processo de tlpo primário.
Se a, llcornc náo nos punha completamente ao abrigo dos riscos de ums, fór'
mula, já traduzida cm lÍngua," ele, tinh&, ccntudo, a vantagcm de náo nos pre'
clpttai muito ràpidamenté na viÊ de uma "comprecnsáo analÍtica", Se, dia.nt€
dc "coeur joli," "gorge à Liti," 'joli corps de Llli," nós nos dcixamos ir em
nosso cfÍcio de analista (êsse lado tranquilizsdor de nós nresmos que, muito
de uma experiêncÍa, acrcdite saber) .traduziremos "autdmàtlcanrenLe" essa
csnstrugá,o em Iinguagem Faremos do cor.po um "falo§" ou
-coràgáo falocêntrlca. num&
ulno, "matriz," do ou mesmo, forTna m3is ambígus., do colo
um dcsfils.dcilo gcnttal 6ôbre o qual fundat'emos alegrcmentc tlossas coils-
truções tnterpretativas nlais sólidas, convencedolas e eficazes. Ccrlamente,
menos "lógica," mais inquietaute, lnas scm dúvlda lgualnrenLe orr luais cficez,
a intelpretagão que forí do corpo um coR (a.pêto longinguc) c (lo coto e pfe'
nitudc do seio suslentando e6s8, interprctagáo na evocaçóo do gesto das máos
juntas para bebcr, ou em concha pare ch&mor. O lmportante ó ver aqui que
nossa interprctaçáo recai sentpre num& "treduçÉo em lÍngua" do f&ntasma
fundamentel.
5. Enflm, Por essas observações, chcgamos a'colocar a qucstáo do modo
de açáo de nos:as intcrptttações e de stl& spsrente gratuidade (votto aqui
à palavra de Lefebvle: "náo importa o quê"!) No caso de Philippe, evocar
cxpltcitohrentc ao nível da intei'pretaçéo o Íalicismo da "corne" ou a. "fe'
minilidade essencial" dc colo ou da cicstriz, tem uma eficácii.:- no pl&no ca
organizaçã,o do crganismo tibidinal de nosso paciente. Aí está o parsdoxo e,
pora alguns, o escândalo da açÉo, a.nalÍtlco.
- Nololóquio singular qrte eta é, a análicc dcscobre ao pacicntc, pe; des-
vÍos Ínéditos- de sue históiia, as estruturas fundarnentais, para ête também,
quo sáo a €strutura do Édipo e & da, castração. Ela destaca pora cads um
ôg avatares dêsses signiftcantes-chaves, aquélos que estruturam, metaforizs,m'
e qur-. sáo, de algum modo, cs fechos de abóbadas de ced& edifício §ixí/trlot.
Mai, evidentemente, é suficiente que se csqtteça, por complacência ou [assi'
dão, cssa, única pslsvra, "singulsr" p8r9, que sc descubra nesse Ponto e me'
c:lnit.a e a armaãilho da funião normativànte da análise: com um p3uco de
Édtpo e de castraçáo, o ptaticante possuit'ia uma fórmu1a §eFuro que só
podôrÍo "fazcr bem" a todos, e seria, para todos, bcm rápido, uma vie não
menos segura paro um suttl genocÍdto. Entretanto, a fôrçe de nossa aqÉo
bem parece ser essa. rcferéncia (ecima de tudo bastsote sistemática) às es-
trutrlras fundamentais do Édipo e d& castraçã,o. Â exigêncie crÍtica de ncsss
aqÉo tcrá senrDro que se pr€servar, de um ledo do aparente rigor de um& re-
duçio sistemática por mai6 rcfinada que ela seje, e do outro, das seduqões
fáceis das intuições in:iipiradas. É antes, eu ecredito, do lado do "rigor poé-
tico" que seró necessário achar seu lugar n& irredutibilidade dê psicanálise.
A irredutÍvel sinllularidrule de Philippe é aquela que tentei fazer aparecer
por cssa Írnálise. Dc lníclo conslderando o emblemÊ da, licornc; em seguida,
escutando seu fa,ntasmo "poôr(d)j(e)li" que conota bem, nê síncope do
"(d)j(e)", essa diferen(a no cume do movlmcnto de reversáo; enfim, evoca-
rnos dirctamcntc o fantasma. desvelsndo um reflexo de seu nome: aÍ o GE
balança antcs de cair cm tÔrno do OE de cEoRGEs, para se encontt'ar com
jubilaqáo no cE do fim, semelhante e outto, interrogando: ie? quem? Phi-
lippê Elhuyani. seu nome. êle também que intcrroga ao inverso, qucstáo em
susp€nso em tômo de "LI".
Pararei aqui minha respcsta. eo Dr. Stcin. Alnda qtte fôsse possÍvel ir
nlais longe e conslder&r por exemplo o tema da RO§A ne vida de Phtlippe;
csss flor quc p:trccc surgir <te um& reversáo do OR que dissemos (ientral'
 fonte de licorne n& lemlJronça de PhilÍppe, conduz (ambém a um outro lu-
gar eleito, muito próximo, gue se chama o "jardim das Ros,{s".
203
Mas resta-mê âgora rcspondcr à impotantc ohBcrvoçao dr Dt'. TosQt'!;L-
LEs que trecal sôbre êsse ponto, nÊ verdade cfucial, das relnções ilo corpo corn
o signilbúnte. E será a ocaslâo para ver, como concluseo, aindâ umê outra
vertente da anállse de Phlllppe.
Todos sabem que o cuidado coDAtante em relâçêo ô um certo "domlnio"
é um traço comum nos neurôtlcos obssessivos. É a essa paixÂo por uma
certâ habllldade que deseJêriê lnterrogêr para começsr. O gesto dâs duas
méos em concha pâra beber r€allze de uma manelrâ exemplar o que quero
§ublinhar squl. Seguramente, êsse vaso feito com a palmo das mãos, meio de
beber, cort€sponde a, ou chama, a plenitude do seio. Mas para 1r âo mals
vivo, dírel que êsse gesto me parece uma mâneira de dominâr a problemá-
tica conjungÃo de dois elementos; essa problemática é senstvel no fato bem
conhecldo de que os setos se carâcterlzêm em geral pelo jorral de stras fen-
das. O prâzer de Philippe nesse gesto, pârece ter sido antes que o de bebêr,
o de realizar uma taçe quase períelta, um domlnio momentânco do que corre
e foge, um domtúo que êle consêgra bebenda essa ógua.
Numa, pôlêvra, panece-me que se trâta de üm gesto ritual, que representa
ou êtualiza cdrn o corpo a pura materlalldado do sig-nlficânte c o llusório do-
minio do sujeito. Acrescetitârei mcsmo aquilo que apârece a todos, que êsse
gesto su6cita precisamentê o "slmbolô" (no sentidc prim€iro) porque se es-
força por lâzer correr conjuntamente os elementos do que pode também ser
o suportc do um âpêlo, o gesto de um mendigo.
Quando folo dB "pura materialidâdê do signtftcante" designo o par oposto
de dois elemêntoB; sem dúvidâ, para constltuir um significantc importa pouco
que êsses elementos sejÀm acústicos, gráficos ou táteis. O essenciâl é que
â articulação dêsses dols treços no êxtremo, pura mâterialidade totâlmcntc
despmvido de significeçao
- o -essencial, digc eu, é que essa oposigêo seJa
conotagáo da antinomle.
Creio que é Justo dizer que o stgaliflcante é uma prlra conotaqeo da anü-
nomia. Âcreaccntarel que essâ êntinomlâ em nossâ experiência é fundamen-
tÀlmente Âquela constituuvê do sujeitc; o que me permite propor êqui, tam-
bém essê fórmule paradoxâ1, que "o slgnificarte é lndice do sujeito," ou mals
precisamente, que ê "signlficâncla" é indlce de subJcüvidade. AntiJromio, ou
alnda, ccmo diz o Dr. LacaD, hetercnomia radical, é a dimensÁo que nos im-
põe necessÀriamente a vla freudiana c nossa experiênciâ de analista. Ser-me-á.
necêssôrlo acrescentár aqui, que o cbjeto no sêntido lacâniano, "e", é preci-
§amente o que escapa à con:tagÂo do sig'nificântc, e em sua tlatur€zÀ, ccr'-
tamênte à anünoÍrú6.
Nessa p€rspectiva de que "o significante é uma prira conotação dâ anti-
nomiê," "índice do sujêito," compreênder-Be-ô melhor talvez, o que qucro ,n-
dicar apresentando o gesto das duas mâos júntas como uma certâ tentâtivâ
de dominio gesto rituâl da natureza mesma do siBnificânte, Entcndarn
bem que nâo - evoco tôala ê -conünuação do imaginêrio e da morte, dominios
eleitos do obsessivg ó sômente porque, constrâJr8ldo pela dlmensâo limitêda
dessa rêspostâ, üso mals ao rlgor ünêar dêsse esbô9o do quc ao cintilar dos
jogos de adÍrbra. Àcrescento sômente que o outro 8esto, aquêle das duas máos
Juntas em concha para fâzer ressoor o chamado, porcce-me poder se inscre-
ver na mesma linha de uma certa "tentativâ de domlnio" c chegarei â isto
à manelra de conclusao.
204
Deixarei a. outros o cuidado de felar do "Begriff," do conceito, para me
demorar um instante no problema do corpo se esforçando p8,ra dominar...
Mas o quê, justamente? Bem, nada nê vcrdade, ou mak prectsamente alnd&,
'o vou tentar
objeto em su& nudez.
explicar-me, sumàrismente.
Para lsto é suficiente lembrar-vos "e pura diferenç&" ou ainds, mais nro-
destamente a "pequena diferença" que encontlEmos lrredutivelmente como pivÔ
de nos& experiência de analiste, de vivente, isto é, de desejante. Essa "pura
diferença" interessa-nos, no mals alto ponto, designá-I8 de inÍcio ao nÍvel do
corpo, corpo de delito cu corpo s€nslvel como se diz, e é o que sublinhel
no têrnro "diÍerença".
Es6a "difelença" certamente pode se llustrar secundÀriBmente, comg Íoi
o coso de Phllippc, pcla irritaçáo puntiforme do grÉo dc areia, mes deseioria
dar'-vos mois um excmplo, que me veio recentemente, tal como s€ acha em
análise€ levadas bastsnte longe, e saber:
kt lrantge acrilulée d'urc d,cuceur
(a frania acidulada de uma doçura)
em sua precisã,o de "reminiscêncie" e em su& indetermin8ção de "lemlrranç&"'
Nesse pónto é c:loced&, sem escopatóri& poss[vel, a. necessidade do "puro
sentido", a saber, o 8úgto que daÍ se subentende, co-nÊsce e realtza esse pura
dlíerença da, doçura e da franje acídulada.
Para passar do campo dB doçure parê equêle da a.cidez é o puro senudo,
vetor do gôsto, que, saÍdo dessa "abertura" mema do corpo, faz como que
um& excursão em tôrno de urn outrc corpo, antes de reunir a outrê vertents
de deiscêncte de ond€ tinh8 saÍdo.
Ess€ "outro corpo" que faz refletir o vetor do sentido, ó §uficiente oo
princtpio de que seJa nsda, ou quase, um& bole de êçúcer vermelho acidulsdo,
trazido num pequeno bastã,o e que, eltás, ec&bou por se &pagar, afund8ndo'se.
Nada ou quaie-e, entretsnto cômo. fazla recentemente a experiêncls, é pelo
exemplo
' dêlse perfume teo pleno de uma bebida, têo dcnso gue antes de bebê-l-a
e de experimentá-la eu sontle sôbre a minha linguE, nume precisáo alucl-
natórla, o Efrão um pouco rude dessa espécie d€ fruts que se distila.
é artificiatmente gue distingo c§§ss duas possíbi-
- e corpo" à imagem do primeiro, seJs posslvelmenl,e
Mas se se acha
Itdadcs -- que êsse "outro
o lugar de uma "pura diferença", entáe aparece, enfim claramente, & dimcnsÉo
do DITSEJO.
Dtzendo rle outro modo: se substitulmrs pele cereia com açúcÊr a têta
do seio, o puro sentido do gôsto empreenderÉ §ue cxcursáo, assim como se
flzesse a volta inteira da máe, aproxímando-se de um meslno golp€ de sua
bôca, de sua púpria "eberture". de uma deiscênci& do corpo maternal, da
t€t& por seu orifÍcio.
E simultâneamente, o corpo maternal - isto se rcpresenta fàcilmente -
íaz pcla voz, pelo Gentido do tocer oo meno§ (mas l,ambém é preclso es-
perrl-lo, por oútras vtas,o olhar sobret[do) a volta do corpo "aberto" do
criança.
E claro Já nessa figura, eu o penso pelo menos, partindo de umê "dife'
r€nçÍr" quc ao tentar dominer o outro r:orpo em sua inevttável "abertura",
para par'Ír a sua pr'ópría, o corpo se afitma como deseir inesgotável.
20í
o quc o corrote n'lelhor é o significante, tal eomo o definimos ain(la há potlco
ccms pur'8 conotâçáo da antinomiâ, tndice do sujêito.
Certamente, em su& neurose Phillipe nlo o ouvia assim e se Já dissc
como êle se esforçava por arrêmendar o stgnificante pelo gesto quase ritllâl
dâs mãos unldas em concha, nêssê ponto desejâr'iâ sublinhsr trm poilco molhcl'
como, paralelamente, a fórmula jaculatóriê "poordjeli" pâlece destÍnadâ a do-
minâr (quasê a prendê-lo em morte) o clrcuito do dcseJo.
 vccalizaçã.o da fórmula secr€ta contém êsse cume ontle se culnpl'e a
reversáo e sobretudo o movimento do corpo que ela conota, a "câmballlota"
desenvolvc a figurÀ mesmÊ do anel, sem dúvida em tôr'no Cc alBum nade,
da própria fórmula ou, mais precisamcnte, cri tôrno dc um ( tltro col'po il.lr-
sente. Êsse movlmento, rcsumldo melhor pela 6cqüência: "rien de tout .. '
quelque chose", assinala a apariçáo (como na sâtda (le un1 E..rito de pl.esti-
digitaçâo) dess& alguma coisa quc estava Iá, no saida dês6e cxcr'clcio ds ar.rc-
mêdo do significanle; c parece que ê6se seiâ de fato lrm t'csto excremental,
um "objeto". Aparece al um resto como o ponto em tôrno do qual se ctlm-
pre o anel, objeto prcsente e derrisório cuJa opacidadc stlbstitui o otltro
corpo auseni:e,
Âssim, sustentado pelo caso de Philippe, e tieixando, por hoio, clêlrb,radir-
mente de lado os fâscinantes Jogos do olhar que servem hâbituâlmente pâra
llustrar os tempos da rcflexâo, da. r€clplocidade ou do en8ôdo, detêr-mc-ei
nesse modo palticular de tentativa de domlnio que é a voz.
Logr de inlcio, a voz mê pârece ter o privilé8io, âinda rnais que elâ
uaio é mâis slmples grtto, de ser êm Princlplo dominio em cco do disculso
quc suporta o voz do outro; neo há um "mamâ" que nâo seja rctomâdc pela voz
do outro e, por êsse fato, a voz constitui uma espécie de modélo privilegiad,
dessa prlmeira relação ccm o outro. Em êeguida, porque a voz faz intervir'
necessÀr'lamcnte um outro "órgão", a saber, os ouvíCos. Enfim, c tâmbém'
porque a ltoz ê. o vetor privilegiâdo do significante que, por' êsse fato, se
torriâ sitnificante verbal.
Nê história de Philippc, o Êpêlo de sirena soprado nas máos juntâs em
concha produz e se oferice âo €co da floresta, apresenta-so como imitâçÃo,
redupllcÃçôo, rcproduçâo vozlê do âpêlo do voz. Mas êle é também, no modo
obsessivo. Jôgo de dorünio.
É preciso lembrar âqui o sonho dâ foice pala dizer um for.lco mais sô-
bre a voz, o grito e o opêlo. Nesse sonho, Phil'ipPe Põe em cenâ tlm jovcm ropaz
-deslizar
cuja perna ácaba de num buraco; êlc estô fertdo, Por um3 foice
scm dúvido, mas náG se vô seneo uma affanhadura no calcânhar. O mcnlno
grita muito forte; é üm grito insólito, grito de terror e chamado ilr€sistivel
áo'mesmo tempo, o quc fâz Phtllppe evocar o Srlto (que é do tradiqã.o zen)
que seria capoz de resuscitâr um morto. Mâs ê6se Sito reenviâ, sobrettldo, â
uIna lcmbronça de pânico: Phitlppe tem 8-9 anos, êIe está em viâgem com seus
pais ê se acha sôzinho, âlgrns meninos mâ.iB velhos que brincam no Erande
parque de um hotel, atacam-no. Tomado de pânico, êle fcge gritando... mas
náo importâ como. Êle grita muito forte, c;mo num thamâdo, os nomes dc
meninos: Guy, Nicolas, Gtlles, para fazer cs seus atâcântês âcrcditârc)n que
êlo também fsz pârte de llm grupo numeroso; êle tenta não p|oferil noínes
muito comuns. Pierre, Paul ou Jacquert (seus âpelcs devem dar a imDrcssâo
de serem precisos) e êle se lembra Justamentc de, assim, tcr invocado "SerBc"
(na épocê LIFAB ou STÂvlsrl).
Certamcnte, êse sonho foi, nâo há dúvida, pelo temâ do apêlo â LtlcLÁrEE,
uma fôrça lmportante Da cura. Mas hojc nâo pretend) mâis contlntlâr' êsse
ponto.
Êese grito, êsse pedido de socorro, completâ e aclara, pcl' uma outra
faceta, o chamado de "Lili-j'ai-soif", o1l a invocaçe3 de "Pooxljê|i".
206
De "Lili-j'ai-soif" sômente desejaria sublính&r ainda uma vez o catíitcr'
ambÍguo de modêlo ou dc eco cm relaqáo à outla frtrse ou fasê do circtrito,
da voz, a saber: "Philippe-j'aÍ-s: if" artÍculêdo pcr Lili.
Ivlis é evidenLemcnte ao nÍvcl da fórtoulii jaculetória de "Poordejeli" qr:c
quero retornar, para concluír.
Já n:ostrei gue, em si-mesma, essa fórmula rcpr€'lentárva, suscital'a lltcs-
nlo. êsse moviNetrto Cc revcrsáo necessário paftr colllFlcer:(le[ o que qtlcr que
seja, nà realidadc da pulsío e do d€seJo. Mas o qr.re ainda dcseieria aoeniuaü
a-qui é que ei.{sa f(irirt!la- constitui, dc &lguma fcLntl trmir, retoma(trr. lior
Pirilippc de voz quc êle chamava por seu nome. E mais literalmente aillda,
c:rs p delia risa r rctom&da da voz amoiosa de sua mac, &cariciando.o âo
mesmo temp r enl que ar'ticula alguma coisa ccmo "tesouro querldo".
I!Ías se tenrús nessa intcrpletasáo de "tesouro querido" um dos pÓ].,s llc-
ccssários da análisc da fórmuls, creio que desprez&mos o essencial, se náo
I'etot nfl.rnlos a Osse limitc d) sagredo qu€ noÍi é perceptÍvel nessa cncalnàçáo
Philippe, lembremo-lo, é judeu. E o tema da fórnlul& encalrtatória, assin'l
como o car'átcI quose "sagrado" do tesouro que êle representa para su& nrãc,
o conduz a se lembrar de al8uns clementos "t'udimeniares" C:j sua f:lma'.jito
rellgiosa.
Do hebrcu, que êle aprendcu a lei', tráo lhe restn natlit ott quÀ6e neda.
§ômente essa prece essoncÍal quc se chs,ma, o "Chema". É, tinham-lhe dito
muito cedo, uma, prece quc jameis se pode esquecer pois, no momcnto de
morrer, é necesário dizê-ls- E um viótic-., mas é também, em sua lembl,f,nça
um pouco confusa, alguma cciso como u[ra, bendiçÉo. concrets.mente, enr sua
llist(iria, essa l:cndiçúo sussrlrradament(. rncotnpreensÍl'e[ qtic sc acom!]anhavo
preclsamente da jlnposiçóo das mÉos sÔblrc a cab€ça, geGto pat€rnal ott sj-
de avô, tcnde, contude, a se confllndir cm sua lenlbl i{nça com o abra§o
br',cLudo
msternal.
Mas essa prece é também, de um ledo uma invoca(áo â Deus (cuiJ no:xc
nõo sc dcve pronunciar), mâ,6 &inda mais, em sue ,ormulaçáo mesnla, unl
spêlo àguele que dove dízê-la. Eis aqui, de nuito per[o, o tcxto, seu iníc]io
pelo menos, dessa fórmuta que no tempo dc morrer é plecis) podcr' dizcr:
"Escuta fsrael, o Eterno é nosso Deus, o Etcrno é Unr." vemos qtre e:rsa
prece é um apêlo àquele que a diz. Em caÁos extrelllos, nssim ^Í pcnseva Phi'
lippe, êó, a aÍticrrlaqáo da primcir.a palavra: "C!.:eI1â" podi?r ser suficientc pc.tiL
servir de vlótico. Nr fundo, e é a[ que quero chegor, o oue diz a voz? Â \'oz
diz: escu,td,.
Pararci aqui minha resposta o esss dlsctlssáo ê ll1erl ngradecÍmento à:lnc-
les quc a suscitaram, deixando agorra, a cad& um, o prazer da dtivida, dr rc-
flcxão, ou ainda do sonho.
207
que dêfineEl sua realidade (libido, pulsõ€s, princtpios de pra-
zer e realidade, prccessos primário e secundário, os mecanis-
mos especüicos do processo primário, a condensaçâ.o e o
deslocamento, etc.); as pulsões, que têm origem orgâ,nica, só
se localizam no sistema através de sua ligaçã.o com um re- BIBLIOTECA TEMPO UNIVERSITÁRIO
Presentante ideativo; etc.
Lo Íazet o estudo do psiquismc tal como êle se elabora
em FEEUD, LÂcÁN afirmou que "o Inconsciente é estruturado A Goleção reclamada pelas necessidâdes atuais
corno uma linguagem". LEoLÀIRE (que redigiu os ceps. III da Universidade Brasileira
e V) quer estudar a questâo tópica da inscrrçâo inconÁciente
e a economia na energia própria do sistema, Inconsciente. I MARTTN HErDEcCw, / IntroilucÚa ü Uetdl$ü
LAPLANCHE mostra que uma. inscriçào única nos dois plancs
traz dificuldades pars. a afirmaçeo de dois sistemas, e ter- 2 A. L. MAcEÂDo NE,to / ?eorb Getal ala Dírelto
minê por mostrar que cada sistema a,pesa.r de sua mútua
coesáo tem sua energia própria. LECIÁIRE pa.rte daÍ e mostre 3 JEÂN-PÁUL SAN"RE, J. ORCEL, ROGER GARAUDY, JEAN HYPPOLITE
como através do sonho se pode chegar ao Incon§_iente. D.s- e JEAN-PrmRE VTGIER ,/ Mor*i§,no e Ecistencl'alismo (C:ntro-
tinguindo entre a necessids.de, energ.ia, orgâ,nica, e o desejo, vérsis sôbre s dialétlcê)
princÍpio ativo dos processoa inconsiienteq êle mostra como
o sonho é a expressáo dlsfarçâda da realizaçã.o de um de- 4 C. R. BoxEB / RelaçÕes Raciais ,to Império Colonial Portúgtl,ês
sejo; e que, por isto mesmo, s.tra.vés do sc.nho se poderia, gôb7e o Hurnanisn o
ver como o desejo se estabelece nos sintomas sob forma de
5 MÂRTrN IIEIDEccEa /
compromisso. Na interpreta.çã,o dos sonhos de seu paciente ô JEAN VIEI / Métoilos Estrutu?alisto,s nús Ciér,,ias EoclaiE
Philippe, mostra que, ccmo na teoria sempre duelieta de
FREUD, além da pulsáo cr&l encontra-se a pulsôo de morte 7 CLÂUDE LÉVr-STRÀV§S / Antropologb Estruturo,l
(que na primeira terminologÍa freudiana er& a. pulsã.o do
ego). Ora, a pulseo se estabelece no cerne da vidl psiquigg 8 JEÂN-PÂUÍ, §AR"BE / Coloniahano e Neocolonio,lisrno
pela mediaçã.o do reprês€ntante ideativo; e sâo êstàs mes- I Raciono,liitaite e lrrocionaliitade nú Eco-
mos representantes ideativos que con6tituem o sistema, In-
MAURTCE GoDEIJER /
taolnut
ccnsciente. Â putsã.o só ganha, realidade psiquico pela, ins-
criçã,o no sistema (de onde se originará a teoria ào privi- 10 MÂURIoE MERLEAU-PoNTY / Hurnanisrno e Tenot
légro de cadeia do significante). Lntr,,q.rnn toma do mitô que Doença Mental e pdcologio
LAPIáNCHE criara para explicar, metafôricamente, a orlgem 11 MICHEI, FoUoAULT /
do inconsciente e passa da perspecüva comum a ambots de
"um inwnscíenúp estruturado como uma certa linguagem
72 GÂsToN BACHELARD / O NôDo Esplrlto CíentiÍaco
primária" (modo de êxplicar a.s inscriçõ€s e sua mú1ua re- l3 I{IRBmT MAaCUSE / Makrtaheíno Eiotóríco e Esistencio
lagã.o) para a afirmaçÉo ünicamente sua de que êste incons-
ciente seria "um correlntiüo necessário da únguagem prô- 14 ABRÂIrÂM MoLEs / Teorio alo InÍorrrnçdo e Percepçõ,o Eaté-
prlamente dita', (linguagem verbal). Enquantõ LePr,excne tlca
mant€rá sua posição (ef. o po§t scriptunl de 1965: ..8. .lin-
guegem' que é o inconsciente, se possui o caráter essenci8l 15 JOSÉ GUÚIIERME MERQUIoR / Arte e Bocieilai/,e qm Marause,
de ser uma circulaçã,o de Vorstel,l,tmger, ( representagões ), Adorno e Benjdrnin
só é cotnwrdue, neste camada vertiginosa dn linguageú que EMIr, Conceitos Funilornentals ila poétbo
certos poetas, às vêze§, nos deixam entrever,,. . , ,,O Imeons-
16 STÀIGER /
cíente, dlzlalJí.os, mais que uma linguâ,gem, é a própric- con- 77 IITA.NN§-ÀLBmT STEGEB / AE Aniüersíilailes no Deaanüoloirner.to
diçõp d,o lí.nguagem',), LEoLÂrRE, rêptado, inclusive, pelo ri- Soctal ila, Amérbo Lotüno
gor e coerência de §TEIN na anáuse de súa tese, a levará, ao
extremo: "O passo seguinte da análise, que é preciso com- 19 KoSTÂs ÂxEIOs / Introilu.çõo ao Petaanlento Futuro
preender literalmente no sentido de um úovimentq nos faz
passar in€verslvelmente para esta mna matriclal da vida 20 Lurz / lécnian ile lornal e perióilico
ÀMÂRÂL
psÍquica onde a significaçáo s€ desfaz por um instante numa 2t FiÀLF DAIIRENDoRT / Eomo BociolrgküB
fórmuls literal, réplica secreta, do nome próprio, cifra alo
inconsciente. Uma Jaculaçêq aqui transcriü ãom'o mÍnlmo EnlrEsro GUEBBA D^ C^L / Língu.a, e Esti,la dc Eçt ik eueiroz
de desflguraçã.o necessá,rio, paiece ter o nome secreto de
i-ryIppe: 'Pôor (d) i'e-li' " (Fsgch.$,'?orgr,ser. údiuons du Seuil, Peça, à suf, Lh)rarit o oo ?.osso Reernbôl\o Postt l
1988, p. 112).
Entre a linguâgem verbal como modêlo (LÁpLÂNcfiE) Rua Geto Coutinho,6l (Laranjeirasl - ZC-01 - Tel.: 22õ-8173
e como ser (LF,rÀIRE) abre-se uma nova e gravÍssima que§-
teo._ .A.lém das inúmeras que êste livro indispensável prôpõe,
sugiro mais esta.
CEÁIM SAMUEL KÀTz