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RILDO COSSON
Resumo
A LITERATURA EM TODO LUGAR (Capítulo 1)
Cosson recorda que a literatura faz parte das comunidades humanas desde tempos
imemoriais, primeiramente por meio de gêneros orais até chegar à escrita. Logo em seguida, ele nos
relata dados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (2012), nos fazendo refletir acerca dos
mesmos. Os dados nos mostram que os percentual de livros lido por pessoa/ano tem diminuído
gradativamente, cujo principal motivo é a falta de tempo (ou melhor de interesse). Ainda de acordo
com a pesquisa quem lê, lê por necessidade e não por prazer. O que leem? O livro didático (quando
alunos) e a Bíblia. O livro literário quando leem é o best seller do momento ou o livro que foi
indicado pela escola. Para os entrevistados, a biblioteca é vista como um espaço para estudar e não
como local para se tomar livros emprestados. Os jovens parecem não ter tempo nem concentração
para leitura de livros impressos, contrários ao modo dispersivo e irrequieto das tecnologias e
manifestações culturais contemporâneas.
Além desse quadro desolador, para quem trabalha com a literatura e acredita que esta é
fundamental para a condição humana, a forma como a literatura vem sendo trabalhada na escola não
ajuda muito na formação do leitor literário.
O autor cita os estudos de Zilberman (2003) que afirma que os fragmentos de textos
literários presentes nos livros didáticos não formam leitor. E ainda que “as nova teorias de leitura
parecem dispensar o texto literário como um objetivo ou fim a ser atingido como fora no passado
(ZILBERMAN, 2003 apud COSSON, p. 13, 2019).
De acordo com Cosson os textos literários nos livros didáticos foram substituídos por textos
dos mais diversos gêneros. Assim nota-se o desaparecimento ou redução do espaço da literatura na
escola. Essa nova organização ocorre em consonância com as recentes teorias do ensino de línguas
as quais pressupõem que o leitor competente é formado por contato com textos de uso social
variado.
Outra forma de recusa da leitura de literatura clássica ou cânone ocorre devido as
dificuldades vocabular presentes nessas obras. Assim, os jovens recorrem a adaptações
cinematográficas ou resumos da internet ao invés de ler a obra. Diante dessas dificuldade o
professor de literatura adota duas posições conflitantes: troca o cânone por best seller justificando
que “pelo menos eles estão lendo” ou trabalha a obra literária como conteúdo de aprendizagem,
aplicando prova, resumo ou outra forma de cobrar a leitura.
O capítulo está dividido em três tópicos: “O valor da leitura”; “Uma concepção de leitura” e
“Os elementos da leitura”. O autor finaliza o capítulo com o que ele define de fábula, “A pergunta
da leitura e o enigma da morte” para ilustrar o que foi retratado no capítulo.
No primeiro tópico, “O valor da leitura”, o autor inicia a discussão mencionando um fato
ocorrido em novembro de 2009 em Brasília: o escândalo de uma escola de idiomas que falsificava
diplomas da Educação de Jovens e Adultos com o objetivo de permitir a entrada de estudantes na
faculdade sem ter cursado o ensino médio. O fato curioso e que gerou debate nessa situação, foi a
resposta para a explicação de como esses estudantes não só entravam nas universidades, mas
permaneciam nelas. Diante de várias hipóteses, Rildo Cosson, considera como mais satisfatória a
hipótese de que o motivo pelo qual os alunos que não cursaram o ensino médio passavam
despercebidos era o fato de eles saberem ler. Essa hipótese se sustenta em dois argumentos: o
primeiro é devido ao número de informação que nos são oferecidas, o que pode nos “enfoxicar” e o
segundo, vem do reconhecimento de que a escola não é o único meio de se obter uma informação
cultural e científica.
No segundo tópico, “Uma concepção de leitura”, o autor, dentre as variadas definições,
conceitos e concepções sobre leitura, escolhe aquela que toma a leitura como um diálogo. A base
teórica para tal concepção vem, principalmente, de Bakhtin. Nesta perspectiva, o autor faz três
aproximações da leitura como um diálogo: 1. Ler é produzir sentidos por meio de um diálogo, uma
conversa; 2. Ler é um diálogo que se faz com o passado, uma conversa com a experiência dos
outros; 3. Ler é um diálogo com o passado que cria vínculos, estabelece laços entre leitor e o mundo
e os outros. Em síntese, ler, segundo Cosson, “consiste em produzir sentidos por meio de um
diálogo, um diálogo que travamos com o passado enquanto experiência do outro, experiência que
compartilhamos e pela qual nos inserimos em determinada comunidade de leitores”.
No terceiro e último tópico, “Os elementos da leitura”, são apresentados os quatro elementos
da leitura: autor, texto, leitor e contexto. Ler, na concepção do primeiro elemento é buscar o que diz
o autor, o qual é simultaneamente ponto de partida e elemento principal do circuito da leitura. Ler é
ouvir o autor. Na segunda concepção, ler não é buscar o que disse ou quis dizer o autor, mas sim
revelar o que está no texto. Ler é analisar o texto. Na terceira concepção, a leitura começa no
momento em que o leitor se dirige ao texto. É apenas no momento da interação ou da transação
entre leitor e texto que o sentido se efetiva, de modo que, sem o leitor, os livros, por exemplo, não
passam de papel e tinta. Ler é construir os sentidos do texto. O ato de ler centrado no contexto,
entende que antes, durante e depois do autor, do leitor e do texto, a leitura parte do contexto e tem
no contexto o seu horizonte de definição. Ler é compartilhar os sentidos de uma sociedade.
Por fim, a reflexão que a fábula nos traz é a de que todo conhecimento começa com
perguntas cujas respostas geram novas perguntas. Ler é perguntar. A leitura é um diálogo que
começa com uma pergunta e uma resposta que gera outra pergunta e outra resposta, e assim por
diante.
A LEITURA E SEUS OBJETOS (Capítulo 3)
A leitura formativa e a literatura
A leitura como diálogo pressupõe uma relação que se estabelece entre leitor e autor, texto e
contexto, constituindo o que chamamos de circuito da leitura.
Tomada como um diálogo, como uma relação. O ato de ler é mediado por três objetos que
são os objetos da leitura: texto, contexto e intertexto, ou seja, quando leio um texto sempre leio
simultaneamente o texto, o contexto e o intertexto.
Em nossos dias, porém, por força do desenvolvimento das tecnologias e dos estudos sobre a
leitura, entre outros, a noção do que é um texto é muito mais ampla. Incorporando desde as pinturas
rupestres até as multimodais possibilidades de significar oferecidas pelos meios digitais, um texto é
bem mais concebido como “todas as maneiras de se configurar signos”.
O contexto
A noção de contexto é um tanto mais complexa do que a indicação de dados históricos e a
listagem de traços estilísticos da época de produção da obra. Em primeiro lugar, o uso do contexto
como categoria não se restringe ao campo literário; ao contrário alcança áreas tão diversas quanto a
biologia, a linguística, a história, a filosófica, a psicologia, a antropologia, a economia, neurociência
entre outras.
O contexto além do texto, por fim, compreende as dimensões mais amplas da sociedade, da
cultura e da história que influenciam diretamente o evento de letramento.
O intertexto
Como já é bem estabelecido, o termo intertexto foi cunhado em 1956 por Julia Kristeva,
com base na leitura de Bakhtin, para designar a relação entre textos ou mais precisamente o
reconhecimento de que um texto é sempre resultado de um diálogo com outros textos.
Enquanto objeto da leitura literária, o intertexto ocupa uma posição muito especial. O seu
estatuto diferenciado vem do fato de que por meio dele se verifica não apenas o texto ou os textos
que estão entretecidos em um determinado texto, mas também se evidenciam as relações que
estabelecem entre os elementos e os objetos da leitura.
Neste item, encontramos a explicação de como proceder para a criação e para a execução
dos círculos de leitura no ambiente escolar. O autor nos esclarece que trata de orientações e nos
aponta onze passos norteadores. Nessas orientações, destacamos a questão da organização e da
logística do grupo de literatura. A autonomia e o protagonismo dos estudantes são fundamentais
para que eles possam se desenvolver dentro de suas possibilidades e ampliar suas interpretações.
Sugere-se, também, que os(as) alunos(as) sejam orientados pelos mediadores. Foi citado
neste item a fichas de função. Mas, não deve ser tratado como limitador senão um material
orientador para que os(as) estudantes apreendam a atividade de leitura com foco e objetividade.
Com relação ao fechamento da obra, Cosson (2018, p. 141), nos oferece algumas possibilidades
interessantes. Vejamos, a seguir.
Quando a leitura e a discussão daquela obra se encerram, uma aula inteira é reservada para
a apresentação da obra lida para toda a turma pelo grupo. Essa atividade pode ser uma
simples apresentação oral do que foi discutido pelo grupo ou recomendação do livro a
determinados colegas até a elaboração de um produto especial, como árvore genealógica
das personagens, entrevistas orais ou imaginárias com ou autor ou personagens,
interpretação do texto por meio de encenação, dança ou canção, criação de textos paralelos
(diário ou poemas de uma personagem, novos finais e continuação da história, inserção de
uma nova personagem) e outras tantas possibilidades que professor e aluno podem
desenvolver criativamente quanto tocados pela obra (COSSON, 2018, p. 141).
Para Rildo Cosson, um clube de leitura é "um encontro semanal de um grupo de pessoas
para discutir um livro que leem ou parte dele", mas vai muito além, o autor observa que os clubes
de leitura têm potencial político ou, de acordo com Long (1993:194), "possibilita que as pessoas
definam quem são cultural e socialmente, e busquem solidariedade entre seus pares" (cf. COSSON
2019, p.139).
Talvez seja por isso que os clubes de leitura podem ser "organizados para resolver
problemas específicos ou com metas bem definidas" (2014: 150). Isso é apontado quando ele
ressalta que um grupo de professores do 8º ano se reuniu para atualizar suas leituras no campo da
literatura infantil, o que faz com que o leitor se pergunte, em seu contexto, se essa dinâmica não
poderia ser aplicada também.
É assim que se observa que os círculos de leitura são úteis dentro e fora da escola, pois
permitem que seus membros participem de uma comunidade maior, fazendo parte da cultura
letrada, estabelecendo relações intertextuais, laços de amizade e aprendendo a ler o mundo.
Enfim, na fábula intitulada "A voz da planta", o autor nos fala de uma "planta que fala", a
Tajá. Ele conta que em uma comunidade indígena, havia uma caverna ou um lugar sagrado ou
proibido, onde os anciãos diziam que não se podia entrar, porque não se saía de novo, ou se deixava
apenas "ser já homem"; isso é um piscar de olhos para o leitor, porque efetivamente aqueles que
participaram do ritual de levar a planta do Tajá eram crianças - que iriam – se- tornar - homens. As
crianças estavam em processo de se tornarem adultos, tinham passado por diferentes etapas e agora
tinham chegado ao ponto de enfrentar seus medos, estavam entrando naquele lugar para despertar a
consciência.
Quando bebem a mistura de folhas sagradas, os jovens entram em transe e adormecem,
mas em sua mente acedem a uma memória ancestral, quando acordam começam a contar o que
ouviram sobre a planta, começam a evidenciar que agora fazem parte de uma comunidade porque
conhecem os mistérios das palavras.
"No exterior, os meninos tinham aprendido a colher os frutos de mata, a caçar bichos, da
terra, da água e do ar para serem homens. Por dentro, ele aprenderá a soar juntos, compartilhando
com a palavra o mistério da palavra revelada pela planta".
Da mesma forma, o acesso à literatura é beber da fonte do conhecimento; às vezes a leitura
é um processo privado e intelectual, mas outras vezes, quando é feita em conjunto ou, nesse caso,
em um grupo de leitura, as visões são compartilhadas, as ideias são trocadas, uma comunidade é
formada, ou seja, quando a magia se torna presente.