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O ENFOQUE DE PLATÃO1
A idéia de justiça social deita suas raízes, quanto à sua formulação lógica, à
concepção platônica de justiça distributiva, pela qual justo é distribuir os cargos e
funções na sociedade segundo o mérito de cada um, avaliado pela sua capacidade.2
Pgs. 42,43.
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Muito já se avançou na tutela dos direitos fundamentais em relação à
antiguidade. Entretanto, analisando a efetividade dos direitos hoje consagrados,
percebe-se que muitos dilemas da antiguidade ainda não foram solucionados.
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preferencialmente utilizada. A seguir, faremos uma explanação da tutela dos direitos
em Platão e preceitos aplicáveis ao direito laboral, a fim de se estabelecer os critérios
de formulação da Justiça em Platão e, sobretudo, da via arbitral para a solução dos
conflitos laborais.
No plano ideal não há diferença entre as leis e a justiça. As leis são justas
porque editadas por quem pratica a virtude da justiça e, por isso, contempla a idéia.
como virtude.4
das leis justas, formula as leis que todos deverão obedecer, inclusive os governantes.
O requisito que as torna justas é, não apenas o preceito da justiça proporcional, que
governados e não dos governantes. Tal preceito é confirmado nas Leis, quando
Platão afirma que só são justas as leis feitas em favor do interesse comum de todo o
5PENNA, J. O. de Meira. Introdução ao Górgias de Platão. Revista Brasileira de Estudos Políticos. Belo
Horizonte, n. 84., jan. 1997, p. 108.
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estão de acordo com o moderno direcionamento do direito ao coletivo, que
preceitos do direcionamento para o bem comum, para a função social dos direitos.
Estado real, não mais pautado no compartilhamento integral de bens, como ocorre
os seguintes preceitos:
“Os bens dos cidadãos terão que estar distribuídos de uma maneira a não
suscitar conflitos intestinos, caso contrário no caso da presença de
pessoas que mantém antigas disputas entre si, os indivíduos humanos de
livre e espontânea vontade não progredirão na construção política se não
tiverem um mínimo de senso.” (Leis, 733a-b)
como idéia – todos deverão obedecer às leis, inclusive os governantes. Aquele que
se desvia dos preceitos legais deve ser responsabilizado pela prática do injusto. Além
disto, nenhum funcionário do Estado poderá realizar sua função sem prestar contas
6 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Teoria Geral dos Contratos no Novo Código Civil. São Paulo: Editora Método,
2003, p. 47-58.
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apelação (Leis, 761e). São também responsáveis pelas lesões que causarem aos
realizá-la como virtude, criando um Estado pautado em leis que a concebam e que
individual, seja no plano coletivo. No Críton, Platão afirma ser o saber o maior bem
pelos direitos e na inserção social. Tal como na sociedade grega de sua época, Platão
enuncia que o cidadão em seu Estado tem inteira participação nos destinos do
governo, não apenas na eleição dos governantes, como também nos próprios
para a função que realiza e para a concretização de seus direitos, enquanto membro
para os conflitos complexos que o moderno Direito do Trabalho gerou, já que não
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pode solucionar. Pela educação o trabalhador se torna não apenas mais qualificado e
escolhem também, sob pena de não terem como discernir sobre a melhor escolha, o
que lhes tolhe o exercício da cidadania, como extensão da educação para cumprir
árbitros, que constitui um nome mais adequado do que juízes.” (Leis, 956b-c)
Segundo ele: “A forma mais elementar de corte é a que as partes arranjam para si
7 Para um aprofundamento neste tema e na solução apontada, cf: ÁLVARES DA SILVA, Antônio.
la são os que conhecem a ação em litígio. Platão sugere então que as partes se
preceito antes lançado de que os que devem decidir são os que têm maior
conhecimento da causa e por isso estão mais aptos a dar uma solução justa. Embora
tenha se referido aos vizinhos, isto não quer dizer que os que vão decidir a causa
estão dispensados da formação adequada para a decisão, pois tal contrapõe-se à sua
concepção de justiça. Ora, a busca pela justiça é uma das grandes preocupações de
Górgias, onde a justiça não se identifica com a legislação, mas dá-lhe fundamento; na
Estado ideal; e, por fim, nas Leis, onde é concebido o Estado real, cuja legislação e
arbitral – sendo as demais cortes reservadas aos recursos nas causas mais relevantes.
Se tais preceitos não forem obedecidos, ele prevê multa ao litigante, traçando os
Se não for possível a definição da causa pelo árbitro e pela corte das
que seja humanamente possível.” (Leis, 767c-d) A terceira corte compõe-se de juízes
eleitos e aprovados em teste realizado pelos que os elegeram, que atuarão, no caso
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Todo o povo poderá participar do julgamento, sobretudo nas ofensas
contra o Estado, já que sendo lesado o interesse deste, todos são indiretamente
atingidos:
um sistema judicial que, ainda hoje, são considerados revolucionários por grande
parte da doutrina, o que prova que o ateniense, além de atual está muito a frente até
8 ÁLVARES DA SILVA, Antônio, Procedimento sumaríssimo na justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 2000. p. 37.
9 ÁLVARES DA SILVA, Antônio, Reforma do Judiciário. Belo Horizonte: Sitraemg, 2003. p. 06. ÁLVARES
DA SILVA, Antônio, A transcendência no recurso de revista. São Paulo: LTr, 2002 (a).
10 ÁLVARES DA SILVA, Efetividade do Processo do Trabalho e a reforma de suas leis. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 1998.
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4) A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS EM PLATÃO
A lei é soberana aos seus servidores, mesmo àqueles que as criam (Leis,
fonte material das normas criadas pela cúpula legislativa do Estado, denominada nas
primeiro lugar, a meta da polis e qual a melhor maneira de atingi-la. Para que a
unidade do Estado seja preservada, este conselho deverá ter em mente todas as
estrutura social e as leis que regem o Estado. Tais preceitos são os paradigmas do
toda a ordem nela estruturada, pois valida as demais leis criadas, desde que
possa atingir a igualdade substancial. Realizando cada um sua tarefa para si e para o
outro, todas as funções são de suma importância, pois sem qualquer delas não
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proporcional.12 Este Estado se legitima na medida em que tem a plena aceitação de
todos, já que são educados nos preceitos supremos do Estado, elegem o conselho
também se revela na estrutura judiciária, através da seleção daqueles que são os mais
virtuosos para que a Lei e a justiça não sejam corrompidas, quando de sua aplicação.
definição nas suas minúcias no que trata aos processos sejam colocadas num código
realizadas na solução da demanda pelo juízo arbitral, sendo que a recorribilidade aos
tribunais das tribos e, posteriormente, ao tribunal do Estado, pode gerar uma multa,
caso a primeira decisão seja confirmada e não haja fundamento para a protelação da
12 DORÓ, Tereza. O Direito Processual Brasileiro e As Leis de Platão. Campinas: Edicamp, 2003, p.127.
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demanda. Apenas se insatisfatória a primeira decisão, há legitimidade para suscitar o
uma decisão que põe fim à lide em tempo razoável. Aqui se afigura também a
importância do acesso à justiça, não mais como direito de propor a lide, mas como
merecendo estas uma apreciação mais acurada pelo conselho dos magistrados,
reconhecendo que os árbitros, como pessoas mais próximas às partes, têm maior
conhecimento dos fatos que geraram a lide, sendo hábeis a apreciá-las. Aqui há uma
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real, já que “ a matéria em disputa de cada lado tem sempre que ser esclarecida e
detém a confiança de ambas as partes e nos tribunais os juízes são eleitos para os
cargos sob uma criteriosa seleção, para que só possam exercer a função aqueles que
perverter a aplicação dos princípios consagrados é que não podemos nos esquecer
da seleção dos juristas com base na justiça como virtude, já que os princípios são
modelo; e o Estado real sintetizado nas Leis, criado como ordem justa porque
jurídico e partindo então para a preocupação da justiça como virtude, a fim de que o
modelo positivado no ordenamento não seja pervertido por quem jamais teve
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De acordo com Platão, o homem justo é aquele que possui em perfeita
de um julgamento justo. É necessário que este julgamento seja realizado por alguém
que tenha a compreensão dos valores que estes critérios implicam. Daí a
importância de se ter contato com a justiça como idéia e com os valores por ela
também um homem justo, pelos critérios delineados por Platão, o que implica,
necessariamente que este seja probo, equilibrado, isento e que possua vasto
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O homem temperante é aquele que é equilibrado e discreto, que sabe
manter o sigilo que a sua função implica e tem uma conduta ética condizente com a
Por fim, a coragem implica não ceder aos ditames da platéia, estar
O juiz deve ter o respeito popular pela sua postura e saber e não pela sua
integralmente para o árbitro. Não há nada que nos faça inferir que seja necessária a
13 SILVA, Dalmo Lima. A psicologia aplicada ao Direito e à justiça no seu dia-a-dia. Rio de Janeiro: BVZ,
1996, p. 113.
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Platão, que elevou tão sábias considerações acerca da justiça como idéia e
desde que observados os critérios de seleção dos árbitros dentre aqueles que
PLATÃO
“... a justiça ditada por um ‘centro de justiça vicinal’(...) pode ser mais
eficaz, mais informada e em definitivo, mais justa do que aquela ditada
por um Juiz togado, destacado, longínquo, incompreensivo para as
partes de uma controvérsia entre vizinhos, partes as quais os seus votos
possam ser incompreensíveis ao Juiz mesmo.”14
seja por aqueles que estão mais próximos da lide. Apenas nos casos das ofensas
maiores, ou se não for possível uma decisão satisfatória da primeira corte, estarão as
apreciação acima descrita e aquelas nas quais esteja sendo lesado o próprio Estado.
interesse tutelado não diz respeito a toda a sociedade. Além disto, os direitos são,
platônico, quanto no nosso sistema (lei 9307/96). Os bens indisponíveis tais como a
vida, a honra, a integridade física, a dignidade humana, não comportam a via arbitral
(lei 9307/96), mas são raras as hipóteses em que tais bens estejam sendo pleiteados
apreciação.
maiores. Afinal, o que são as ofensas maiores senão aquelas que revelam interesse
para toda a comunidade e não apenas para os demandantes? Assim, se entende, que
amplo sistema recursal, estes são, por exemplo, os passíveis de gerar a nulidade da
os árbitros não devam conhecer e praticar a justiça delineada de acordo com o seu
modelo fundante, critérios criados para toda solução justa, mas apenas que aqueles
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que solucionarão as controvérsias propostas terão melhores condições de julgar o
caso em razão de lidarem mais de perto com os fatos que deram origem às
controvérsias.
qual são partes. É por isso que diversos países e até mesmo as organizações
proposta que aqui se delineia, a fim de que empregados e empregadores vejam suas
Mesmo que não haja instituições para tal fim criadas, poderão os
Lei complementar 75/93, art. 83, XI, está é uma de suas funções. Poderá também
ser escolhido criteriosamente, mas neste caso a própria pactuação deverá prever o
arbitragem em convenção coletiva nem sempre é necessária, podendo ser esta a via
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já que neste caso não prevalece mais a situação de inferioridade ocorrente no curso
(art. 1º, inc. IV da CF), que é fundamento do Estado Democrático de Direito, sem
conta a desigualdade entre as partes. Assim, para a adoção da arbitragem nas lides
15 Convém lembrar, que mesmo no caso da previsão em negociação coletiva, a adesão do empregado e
empregador à solução arbitral é livre, sob pena de representar vedação do acesso à justiça.
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As instituições arbitrais poderão ter funções mais amplas, tais como a
próximas às partes e ao dia a dia laboral, poderão ter função consultiva e até mesmo
repressiva, caso previsto multa na negociação coletiva para aquele que tentar frustrar
vínculos, exaltação de ânimos enfim, evitar que se busquem direitos apenas após a
que ocorre no dia a dia da relação laboral poderá dar maior efetividade também para
Primeiro há a prevenção dos conflitos. Caso se instaurem, pode ser prevista uma
nenhum direito, não terá que pagar para ficar livre da demanda. A solução madura
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sem nenhum direito. Assim, longe da ânsia imatura da conciliação judicial, que se
reduzido pelas pautas lotadas, a solução aqui proposta atende melhor à tutela do
empregado.
neste momento (art. 330 do CPC), serão produzidos as demais provas pertinentes.
lhe são típicas ou ainda prevendo a situação de cada empresa que mereça particular
consideração. As situações que a realidade congrega são muito ricas para serem
condenada pela OIT, mas uma via facultativa de apreciação das controvérsias
solução se legitimar como célere e justa, não haverá quem não queira por ela optar.
soluções, porque vedar esta opção? Afinal, a democracia não implica em pluralidade
de escolha?
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Havendo um meio de aproximar as partes, prevenir litígios e ainda dar-
lhes condições justas para a solução de suas próprias controvérsias, esta solução é
cidadania, com o pluralismo, com a busca da solução pacífica e ainda com o acesso à
justiça, em seus novos contornos, primando pela solução justa e rápida, não
necessariamente estatal.
soluções, preferíveis à pura lamentação dos direitos trabalhistas cada vez mais
mesmo pela pressão da demora sobre o trabalhador que já perdeu o emprego e não
tem como esperar pelo decorrer do processo para receber seu crédito). Caso não
não?
debate em torno de soluções alternativas mais hábeis à composição justa e célere das
7) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LTr, 2002. (a)
3. ------. Eleição de juízes pelo voto popular. Belo Horizonte: Movimento Editorial da
UFMG, 1998.
4. ------. Flexibilização das relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2002. (b)
9. LOUREIRO, Luiz Guilherme. Teoria Geral dos Contratos no Novo Código Civil.
São Paulo: Editora Método, 2003.
13. ------. As Leis. Incluindo Epinomis. Trad. de Edson Bini. São Paulo: Edipro,
1999.
14. ------. Eutífron, Apologia de Sócrates, Críton, Fédon. São Paulo : Nova Cultural,
1996. (Os Pensadores)
15. ------. Fédon, Sofista, Político. Tradução de Jorge Paleikat e João Cruz Costa. Rio
de Janeiro: Ediouro, [19--].
16. ------. Obras Completas. 2a ed. Traducción, preámbulos y notas Maria Araujo,
Franciso Garcia Yagüe et alli. Madrid: Aguilar, 1979.
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18. SILVA, Dalmo Lima. A psicologia aplicada ao Direito e à justiça no seu dia-a-dia. Rio
de Janeiro: BVZ, 1996.
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