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Câmara Municipal de Porto Alegre

Escola do Legislativo Julieta Battistioli

Projeto Cafezinho na Escola

Por que repetimos os mesmos erros?

Jorge Barcellos – Doutor em Educação/UFRGS

O lugar onde nasce a repetição

Para os psicanalistas, a razão pela qual repetimos os nossos erros deve ser
buscada em nosso inconsciente. Ele não se manifesta apenas por lapsos, atos
falhos ou sonhos, é algo vital e íntimo, em termos psicanalíticos, é uma estrutura
organizada como uma linguagem. Para J.D. Nasio, nele encontram-se nossas
pulsões, a força propulsora e soberana que está por detrás de nossas
conquistas, de nossas escolhas, de nossa vida “o inconsciente é a força
soberana que nos impele a escolher a mulher ou o homem com quem
compartilhamos nossas vidas. Ao contrário da opinião geral, a escolha de nosso
parceiro é menos o resultado de uma decisão raciocinada do que a cristalização
de um comprometimento amoroso cuja causa ignoramos. Mas o inconsciente é
igualmente a força que nos leva a escolher a profissão que exercemos e que
nos confere uma identidade social; ou mesmo a força que nos leva a escolher a
cidade ou a casa onde moramos. Não obstante, todas essas escolhas, que
julgamos deliberadas ou fortuitas, impõem-se a nós sem que saibamos
efetivamente por quê. “

Existe inconsciente? O espaço já objeto de criticas no campo filosófico. Gilles


Deleuze e Felix Guattari na obra “Anti-Edipo” criticaram a definição de
psicanalistas, opondo a sua definição de lugar de uma falta, a sua noção de lugar
de produção: o inconsciente é uma fábrica. A palavra inconsciente vem do latim

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inconscius, termo psicológico com dois significados distintos. Em um sentido
amplo é o conjunto dos processos mentais que se desenvolvem sem
intervenção da consciência. O segundo significado, mais específico, provém da
teoria psicanalítica e designa uma forma específica de como o inconsciente
funciona. Ele define um complexo psíquico ou conjunto de fatos e processos
psíquicos praticamente insondáveis, misteriosos, obscuros, de onde brotariam
as paixões, o medo, a criatividade e a própria vida e a morte. Freud definiu o
inconsciente nos livros "Psicopatologia da vida cotidiana" e "A Interpretação dos
sonhos", mostrando que há um significado nos esquecimentos, atos falhos e nos
sonhos que não está definido de forma imediata. Esse significado oculto, ao
mesmo tempo que ele é transparente ao indivíduo, produz a imagem de que a
mente humana é como uma ponta de um iceberg, onde a parte submersa seria
então o inconsciente.

Nasio, contudo, aponta que o inconsciente também tem o poder de nos


compelir a repetição. “Nossa vida pulsa no ritmo da repetição que o
inconsciente estimula. Acima de tudo, o inconsciente é a força que nos leva a
reproduzir ativamente, desde a mais tenra infância, o mesmo tipo de afeição
amorosa e o mesmo tipo de separação dolorosa que escalonam inevitavelmente
nossa vida afetiva – e então a repetição é uma repetição sadia e o inconsciente,
uma pulsão de vida. Em contrapartida, o inconsciente é igualmente a força que
nos leva a reproduzir compulsivamente os mesmos fracassos, os mesmos
traumas e os mesmos comportamentos doentios – e então a repetição é uma
repetição patológica e o inconsciente, uma pulsão de morte. ”

Esse poder de regera a aparição e desaparição de condutas saudáveis ou


patológicas precisa ser objeto de uma escuta. Era emerge no servidor que sofre
periodicamente acessos de sofrimento inconsolável, que não sabe o que o
entristece, tem crises de choro imotivadas. Como você interage com o colega ou
amigo nesta situação? Você começa a imaginar, tira de sua presença verbal e
não verbal, analisa pelo crivo de sua intuição, você relaciona as ideias de
repetição que você tem acesso. Para isso, você precisa ter um método, conhecer
o método dos psicanalistas, que reza pela necessidade de tentar compreender
o contexto e o momento em que a primeira crise da vida adulta surgiu, a
manifestação inaugural da tristeza. “Há sempre uma primeira vez em que o

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sintoma aparece, e essa aparição inicial é decisiva para compreender a causa
do sofrimento. Tudo se joga no primeiro minuto porque é então que o impacto de
um sintoma é mais intrusivo e indelével. Como se a eclosão do sintoma fosse
mais reveladora de sua causa do que suas reincidências posteriores. ”

A origem da repetição

A causa da doença está relacionada a primeira irrupção do problema, nossas


neuroses no trabalho e na vida estão relacionadas com neuroses infantis da qual
ela é a repetição, diz a psicanálise. “Toda neurose de adulto repete uma neurose
infantil”, diz Nasio. Para a psicanálise, os distúrbios que não encontram
significação na mente retornam em nossos atos: por isso é preciso encontrar o
sentido dos distúrbios, o encadeamento dos eventos psíquicos que o tornaram
necessário, que problema eles somatizam ou resolvem. Um servidor que tem
problemas com seus colegas, no qual uma forma de comportamento emerge e
prejudica a relação de trabalho, é um sintoma que precisa ter significação “Há
mais inconsciente num sintoma do que na recordação de um episódio familiar
marcante” diz Nasio. Nossos sintomas são nossas verdades, a verdade do
sujeito, a manifestação involuntária que o individualiza e significa tal como ele é
no mais fundo de si mesmo. Por isso você questiona o comportamento, como
ele aparece, se todo dia ou somente no serviço, onde, em que momento de uma
relação, todas as peculiaridades permitem, como diz Freud, “observar o
inconsciente”. O trabalho é sempre do psicanalista, é clinico, mas as questões
auxiliam a qualquer um a imaginar como vive emocionalmente seu portador,
ajuda-nos a nos colocar em seu lugar, sentir o que ele pensa. Há sempre uma
realidade imaginária, fantasística, muitas vezes infantil batendo naquele
inconsciente que busca emergir. O que o trabalho de análise dirá é o que ela
sente conscientemente, a emoção da qual o adulto não tem consciência. Será
que o comportamento ruim do adulto no serviço não tem sentido em relação a
uma emoção do passado?

Ninguém sabe o que o outro já viveu realmente e que carrega algo no seu
recôndito ser. É preciso ter empatia: a primeira, estar consciente do que ocorre

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no momento em que um sintoma ou comportamento errático ocorre, a segunda
empatia, imaginar o que se passa no inconsciente, a fantasia inconsciente
responsável pelo sintoma que emerge no dia a dia. Ela não sabe se relacionar
com colegas? Não sabe lidar com limites? Não tem ideia do que fazer com
relação a uma autoridade? Encontra-se numa situação na qual se desespera? A
questão é que as reações têm motivos inconscientes, emergem porque o sujeito
está dominado por uma emoção que não reconhece.

Todos, em menor ou maio grau, somos marcados por fantasias inconscientes,


cenas difusas, contornos embaralhados, gravadas no nosso inconsciente desde
a infância, muitas vezes relacionadas à traumas que, para Nasio, constituem a
cena, suporte oculto de nossos sintomas. “Por trás de um sintoma esconde-se
sempre uma fantasia, recordação inconsciente, vestígio deixado no
inconsciente, por um psicodrama infantil” (p.20). Nasio usa a metáfora da
doença, do “foco infeccioso”: como relaciona-se com um episódio não resolvido
na vida do sujeito, ela contamina todo o ser. Sua forma de reprodução, de se
manter vivo no sujeito é a repetição “A emoção vivida conscientemente pelo
paciente quando sofre de seu sintoma repete a emoção dominante da fantasia
de que o paciente não tem consciência “(idem).A emoção atual consciente repete
uma emoção infantil inconsciente, formas de emoção dilacerantes para o
indivíduo, inexplicáveis, angustiantes, arcaicos, “demasiado violentos para
serem registrados por consciências imaturas”, fonte de nossas angustias
primordiais. A repetição de nossos gestos, de nossos erros é essa dor, retorno
de um dilaceramento original.

Ninguém pode ter a responsabilidade de decifrar a relação do inconsciente do


sujeito e as manifestações cotidianas, exceto o terapeuta. Mas cada um pode
identificar um problema digno de análise mais profunda, pois a experiência
perspectiva se dá no convívio social, nem todos os dias, é verdade, mas em
momentos que é possível identificar, espécie de pré-clínica que orienta o sujeito
à clínica, reconhece a existência de um problema, ainda que não saiba qual. É
o que Nasio chama de “repetição temporal do sintoma”, isto é, do comportamento
no qual é possível identificar uma emoção consciente, a necessidade do sujeito
em humilhar seu subordinado, a incapacidade de dizer não a uma autoridade
superior, sintomas que repetem no espaço consciente um elemento pertencente

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ao espaço do inconsciente. Nasio identifica duas formas de repetição nesse
momento: a temporal, horizontal, isto é, no tempo, as sucessivas crises,
manifestações do sintoma; e a espacial ou tópica da fantasia, vertical,
caracterizada pela superposição de ocorrências relacionadas ao mesmo motivo,
a mesma fantasia.

Definição geral de repetição

Nasio define a repetição como um movimento universal, a pulsação de ordem


biológica, psíquica, social, cósmica que faz com que repitamos os mesmos
conflitos e gestos do nascimento até a morte. Repetimos os atos de respirar,
comer e dormir como parte do ciclo da vida consolidando nosso corpo. Mas
também repetimos gestos, trejeitos, formas de agir e se comportar como parte
do espirito. Nosso psiquismo experimenta ao longo da vida os mesmos
sentimentos, pensamentos e experiências. Define o autor ”a repetição é uma
série de pelo menos duas ocorrências em que um objeto aparece – primeira
ocorrência, desaparece e reaparece – segunda ocorrência, a cada vez
ligeiramente diferente, embora reconhecível como sendo sempre o mesmo
objeto “ (P.25). Questão filosófica primordial, a reaparição do mesmo jamais
idêntica a si mesmo, sempre um pouco modificada onde, mesmo o planeta, em
seu movimento de rotação, possui pequenas nuances. A repetição do mesmo
não idêntica mas é reconhecível, repetição do idêntico a si mesmo como similar
a si mesmo.

Nasio define as três leis do processo de repetição. Primeira, é seguir a lei do


mesmo e do diferente, pois não se repete idêntico a si mesmo; a segunda, a da
alternância da presença e da ausência, propriedade que diz que o objeto da
repetição é algo que desaparece, que produz sua própria ausência; e a terceira,
a que assinala a presença de um observador que enumera a repetição. A
repetição é resultado de um procedimento mentalizado protagonizado por um
agente humano que recenseia, isola o fato relevante, o nomeia e conta o número
de vezes, transformando o fato banal em fato significante.

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Nossos gestos cotidianos, aquilo que nos torna insuportável para outras
pessoas, nossas manifestações fora da normalidade, tudo isso são significantes,
termo central no pensamento de Lacan que significa acontecimento, coisas que
podemos contabilizar, mas que é sempre a manifestação involuntária de um
sujeito que pode ser contada por ele ou por outro. Eu conto as várias vezes em
que um sujeito, servidor público, agiu grosseiramente com seu colega de sala;
eu conto sucessivamente, as vezes em que o comportamento de um colega em
relação a algo, alguém ou alguma coisa se tornou inconveniente. Diz Lacan; “um
significante representa o sujeito para outros significantes” (p.27). O ato de
bullyng de um colega para outro representa o inconsciente de um sujeito para
suas crises passadas e futuras, é o elo numa série repetitiva de significantes
semelhantes, não existe isolado, somente na repetição.

A repetição sadia:

Nasio retoma do pensamento do filósofo Spinoza, na terceira parte da Ética,


a ideia de que a tendência fundamental do ser é “perseverar no ser”. A vida já
foi de formas diversas definidas, seja pelo conjunto das funções que resiste à
morte ao que se desgasta, pois é perecível. Todas estas definições são
negativas, ao contrário, Spinoza propõem a força expansiva da vida, impulso
para sua preservação “a vida é a força que faz perseverar as coisas em seu ser”.
Todo ser tende a continuar a existir, se esforçará ao máximo para isso,
expressão de nosso desejo de viver, dizemos sim à vida. Mas é o corpo, inclusive
o inconsciente, que faz isso.

A repetição é esta forma de perseverar na vida, repetir-se é continuar a viver,


é conservar uma unidade, desenvolver ao máximo possível: eu me repito, e ao
me repetir, preservo meu passado, reencontro-o, me aproprio mais dele “repito,
logo sou”. A finalidade da repetição não existe, não tem finalidade exterior a ela
mesma, é a tendência irredutível que não tem outro fim a não ser permanecer
uma força que avança e nos arrasta para nos tornarmos mais nós mesmos, diz
Nasio. “A repetição tem a finalidade de produzir três efeitos importantes sobre
nós: preservar nossa unidade de indivíduo, desenvolver ao máximo nossas

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potencialidades e consolidar o sentimento de que somos o mesmo ontem e hoje”
(p.32).

Segundo Nasio, a repetição produz três efeitos benéficos|: a autopreservação,


o desenvolvimento pessoal e a consolidação de nossa identidade. A repetição
nos tranquiliza, nos faz bem, queremos a surpresa, o novo, ao mesmo tempo do
conforto do antigo “depois, na corrida entre o antigo e o novo, é em geral o antigo
que termina por vencer” (p.33). Nasio chama a isto de “mesmidade em nós” o
coração atemporal de nosso ser, apesar de inúmeras mudanças, somos os
mesmos ao longo dos anos, o que nos tranquiliza e nos faz bem. Ao cogito
cartesiano, o equivalente é “sou aquilo que repito” que afirma o papel da
repetição na consolidação de nossa identidade, que está em nós e fora de nós,
na eleição do parceiro masculino ou feminino, nas escolhas de amizade e ódio
que fazemos nas relações de trabalho, mediadas pela influência do inconsciente
que é irracional, pelas impressões que as relações fundantes de afeto fizeram
em nossa alma, porque, afinal, nossas relações, sejam elas de trabalho ou
afetivas repetem a primeira relação aprendida, o primeiro afeto ensinado, que o
núcleo familiar, esse fundador de afetos, medos, faz. As relações familiares, e
eis o legado de Freud, estabelecem a forja de nossa consciência e inconsciência
– e é por isso que os psicanalistas não deixam de reafirmar o quanto nossas
relações parentais primeiras ainda nos afetam na adultez. Esclareço desde já
que, ao empregar o vocábulo “mãe”, não me refiro a pessoa real da mãe, mas
sim à ideia que dela forjamos. Sua mãe não é a pessoa real da mãe, mas a mãe
que está em você” (p.34), diz Nasio.

Vivemos com a projeção de imagens idealizadas que determinam nossas


escolhas, afetam nosso discernimento, nos influenciam em nosso
comportamento: a fantasia tem poder, é usada como referência, projeção por
ocasião de decisões fundamentais em nossa existência. Por isso diz Nasio que
o inconsciente também está no exterior, fora de mim, naqueles que compartilham
comigo minha vida, pois eles também formam minha identidade. Ora, o que
singulariza as pessoas com as quais nos relacionamos também é o fato de que
neles repito o modo de me relacionar com todos os seres ao longo de minha
história. Há sempre um traço comum – não sabemos qual – na forma como
escolhemos com quem nos relacionar, encontramos nele algo que o faz para nós

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objeto de amor ou ódio, e em termos analíticos “amo-te não pelo que tu és, mas
por essa parte de mim que carregas em ti”, diz Nasio.

O outro é o lugar em que depositamos nosso inconsciente. Nasio não perde,


entretanto, a piada e lembra a tese da afeição inconsciente de Descartes, que
tinha um segredo que era gostar de uma garota vesga. “Mais tarde, durante
muito tempo, vendo as pessoas vesgas, sentia-me mais inclinado a aprecia-las
do que outras, só porque tinham esse defeito”, conforme a carta a Chanut de 6
de junho de 1647.

O retorno do inconsciente nos atos sadios e patológicos.

Tudo começa e termina na identidade, a sensação intima de si enquanto


extensão do eu no mundo exterior. Nela se repete o que já aconteceu, meu
passado volta sem cessar no presente, diz Nasio. “Distinguimos três modos de
reincidência do passado no presente: na consciência; nos atos sadios; e nos atos
patológicos”. (p.39). Nasio denomina de repetição sadia o retorno do passado
em nossos atos sadios; denomina de repetição patológica o retorno compulsivo
de um passado traumático que explode em comportamentos irreprimíveis
repetitivos, liberadores de tensão, as vezes doentios.

A repetição sadia é a mais comum, corresponde a mais comum das


rememorações, nossas lembranças de imagens visuais, impressões sonoras,
tácteis, olfativas e gustativas a moda de Proust. Não se trata de que vivemos em
função do passado, de que a memória é sua fiel depositária, ao contrário. Para
Nasio, é um passado remoto de uma realidade perdida, algo deformado pelo
filtro atual de nossa percepção. Nasio cita o retorno a casa de nossa infância,
sempre menor do que lembramos. “A recordação não é o passado, mas um ato
do presente” (p.40).

A repetição de que trata Nasio é a reincidência de uma forma de um vivido. O


sujeito produz um comportamento afetado por um passado que desconhece, que
afeta sua decisão “meu passado é precipitado nos atos essenciais de minha vida,
atos que considero no momento, deliberados e fortuitos, mas que, na verdade,

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são a repetição de um passado pressionado a ressurgir” (P.40). Nossas escolhas
atualizam nosso passado em atos que nos ligam ao objeto de amor original ou
nos afastam “Se vocês me perguntarem o que é que se repete em nossa vida do
ponto de vista psíquico, responderei que o que se repete é nossa maneira de
amar, nosso compromisso afetivo com a criatura amada” (p.41). Para Nasio, o
que repetimos são atos ligados a experiências de amor ou a experiências de
separação, cada instante acrescenta uma nova camada a este magma original,
ao nosso eu, em camadas que constituem nossa personalidade, ‘somos nosso
passado em ato”, mais, diz Nasio “somos nosso inconsciente atualizado”.

“Não me arrependo absolutamente de nada”, de Edith Piaf, encarna o sujeito


orgulho de seu passo, mesmo que as vezes impetuoso, é a expressão de alguém
em paz com o próprio inconsciente “Enquanto o sujeito pacificado aceita, e até
ama, o inconsciente que o fez como é, o neurótico em crise, atormentado por
sua história, luta contra si mesmo, contra o próprio inconsciente, ao qual ele tem
horror porque as decisões que toma ou as ações que empreende resultam nos
mesmos fracassos e erros” (p.42).

O passado é sempre vivido intensamente. Se o ato no passado foi sadio, mas


conturbado, ele foi recalcado. Se o ato foi patológico, doentio, ele foi recalcado
porque traumático. Nasio também denomina do retorno do passado em um ato
patológico também como foracluido. A repetição positiva é um ato inconsciente
assimilado às pulsões de vida. A repetição negativa é um ato inconsciente
assimilado às pulsões de morte porque originam-se de traumas. “Quando é o
inconsciente, força de vida, que sobe à superfície do eu, o passado que irrompe
insere-se muito naturalmente na ação presente, coincide com a vida e, não raro,
manifesta-se por atos criadores. Quando em contrapartida, é a inconsciente
força de morte, que se precipita numa ação selvagem e compulsiva, o passado
que se impõe abala o presente nos desestabiliza” (P.42).

Duas forças no inconsciente: forças de vida e morte. Ambas são recalcadas,


mas seu retorno se dá integrando-se e anos mesmos no presente ou aparecendo
no presente como sintoma de algo ruim. Aqui, Nasio define que a dimensão do
foracluido ocorre antes do recalque, do esquecimento, porque é a emoção de
um trauma que a consciência/inconsciência não consegue compreender, torna-
se impaciente para voltar ao mundo e assim conseguir uma significação “o
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trauma, paradoxalmente, é uma droga, e o traumatizado, um viciado nessa
droga” (P.43).

Resumo:

Os três retornos do passado

A repetição sadia ou rememoração é o retorno à consciência de um passado


esquecido;

A repetição sadia é o retorno em nossos comportamentos, de um passado


conturbado e recalcado

A repetição patológica é o retorno compulsivo, em nossos sintomas e


passagens ao ato, de um passado traumático, foracluido e depois, recalcado.

É a repetição patológica compulsiva que está por detrás dos problemas no


ambiente de trabalho que leva servidores ao consultório do analista.

Repetição patológica compulsiva

A repetição patológica e compulsiva está por detrás de nossos problemas


cotidianos. Chegamos a ir no psicanalista quando não sabemos como operar um
problema. Ela corresponde a diversos casos graves como a repetição
inexplicável de atitudes que nos levam ao fracasso, a multiplicação de
rompimentos amorosos incompreensíveis que podem ser vistos naquele servidor
que muda frequentemente de lugar de trabalho, os distúrbios obsessivos
compulsivos que podem ser observados no modo como repetidamente um
servidor trata um subordinado e pode estar por detrás de inúmeros
comportamentos aditivos (vícios) que estão por detrás de situações de
afastamento do trabalho como vício em jogos de azar, alcoolismo, etc.

Você não é obrigado a tratar uma repetição patológica, trabalho do


psicanalista, mas você pode ajudar a identificar uma. A repetição propriamente
dita é definida por Nasio como uma serie de pelo menos duas ocorrências: a

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repetição patológica é uma serie de pelo menos três ocorrências porque ela é
insistente e compulsiva, é uma emoção infantil, violenta, foracluida (isto é, não
compreendida pelo indivíduo na época) e recalcada que aparece, desaparecer,
reaparece e reaparece na idade adulta na forma de experiências perturbadoras.

Nossas emoções nos perseguem, sentencia Nasio. No passado, uma emoção


aguda e violenta é vivida na infância ou puberdade, um episódio traumático, meio
real, meio imaginado, de caráter sexual, agressivo ou melancólico que faz o
sujeito de sentir no centro dos acontecimentos como vítima, agente ou
testemunha. Essa emoção apavora a criança antes de ser recalcada. Dizemos:
“a criança sofreu maus tratos”, o que é correto até certo ponto porque não dizem
o que a criança de fato sentiu, não descrevem o abalo emocional que perturbou
a criança. A verdadeira emoção impactante é indescritível porque é um
composto de emoções, extremas, contraditórias, que podem provocar pavor,
asco, e até prazer. Nasio usa o termo “gozo” para definir a experiência emocional
extrema “o gozo é uma concreção de emoções agudas, violentas e contraditórias
experimentadas pela criança que sofre um trauma. Emoções sentidas, mas não
registradas por uma consciência imatura e obscurecida pelo pavor. O gozo,
portanto, é um misto de emoções sentidas e não assimiladas pelo eu
traumatizado” (p.48). Nasio define o campo de viver uma emoção transbordante
sem ter consciência de vive-la, sem poder simboliza-la, de ictoforaclusivo.
Foracluido: ela sente no corpo, mas não consegue representar na cabeça. Nasio
também chama a este estágio de agnosia emocional, isto é “ não reconhece as
emoções e sensações que percebe; percebe-as sem representa-las
mentalmente” (p. 49). A experiência afetiva que foge a representação, do mundo
simbólico é que se torna virulenta, é esse gozo que está fadado a retornar como
tal, emoção rejeitada pelo simbólico que almeja carregar infinitamente sua
tensão no corpo adulto.

Nasio pergunta: porque um sujeito adulto tende a repetir – a sua revelia – uma
experiência tão penosa quanto o trauma infantil que sofreu, ao passo que o bom
senso nos levaria a pensar que conviria antes esquece-lo? Porque o gozo deseja
ressurgir compulsivamente? Remos quatro respostas possíveis e
complementares: simbólica, econômica, clínica e genética:

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Em primeiro lugar, a resposta simbólica que acabamos de esboçar. A causa
da repetição compulsiva do gozo resume-se a três vocábulos: “defeito de
simbolização”, “o que excluído do simbólico” e “reaparece no real”. O que não
conseguimos compreender no passado aparece como sintoma, em nossas
ações descontroladas, está por trás de nossa obsessão em repetir gestões,
ações, comportamentos. Diz Nasio que nossa mente inconsciente tem certa
organização porque as representações ali se comunicam de alguma forma: mas
a emoção forte não enraizada e relegada ao inconsciente permanece isolada,
incapaz que é de descarregar sua tensão sobre outras representações. Nasio
ilustra: é como uma bola de fogo circulando no inconsciente que busca a primeira
oportunidade para voltar a superfície.

Se não houve associação entre um gozo e uma representação, diz Nasio, é


porque ele volta em busca dela! O sintoma, o comportamento, é busca de uma
simbolização, que o atenue, possibilite socializa-lo, integre-o ao conjunto das
emoções comuns.

Em segundo lugar, a resposta econômica: o gozo traumático infantil, isolado,


sobrecarregado de tensão, quer ser revivido numa manifestação impulsiva que
opera como válvula de liberação de energia. Ele se repetirá enquanto houver
exceção de tensão.

Em terceiro lugar, a resposta clínica: é a angustia vivida pelo sujeito. A


primeira agressão não deu tempo para a criança se angustiar, e, portanto, fugir
do perigo e se proteger, “ a angustia que teria permitido temer o perigo e prepara-
se faltou”, diz Nasio. O sujeito tenta transformar o apavorante em angustiante.

Em quarto lugar, é uma resposta genética. O trauma imprime no inconsciente


uma marca, protótipo degenerado de resposta as excitações avassaladoras. A
repetição de gestos violentos repete a satisfação brutal sentida no momento do
trauma, prazer contaminado de dor. É atração por um modelo doentio de
satisfação.

“Em resumo, porque o gozo quer ressurgir compulsivamente: para ser


nomeado, para ser descarregado, para ser completado pela angustia e
sobretudo, porque na verdade, sua natureza é permanecer no gozo. “

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O gozo não quer nada, não pede nada, não quer mudar nada, quer
obstinadamente continuar seu movimento e permanecer tal qual, idêntico a si
mesmo.

Gênese do gozo compulsivo

Ele ocorre no paciente que apresenta um comportamento compulsivo e


repetitivo e nasce em três momentos. Nasio define como psicotrauma o afluxo
avassalador e subido de uma excitação num eu infantil fraco demais para
reprimi-lo, em alguém incapaz de assimilar esse sentimento, daí o trauma: muita
excitação para um eu incapaz de retê-la. Caberá ao psicanalista localizar esse
acontecimento traumático inicial que explica os comportamentos patológicos e
compulsivos. Ele estabelece uma ordem que é a seguinte:

- Irrupção violenta na criança de um magma emocional, o gozo

- Foraclusão do gozo ou falta de simbolização, ausência de significante para


representar o gozo. É a matéria emocional que sem significante se transforma
numa “bola de fogo”.

- No exato momento do trauma, o gozo é envolto em uma imagem, uma


fantasia inconsciente, porque logo que é recalcada, relegada ao inconsciente.

- Foraclusão: não foi simbolizado

- Recalcamento: foi relegado ao inconsciente

- Relegado ao inconsciente, envolto numa fantasia, período de incubação

- Agitação e irrupção no corpo adulto em comportamentos compulsivos,


repetitivos

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As duas modalidades da repetição patológica: a repetição temporal e a
repetição tópica.

A repetição patológica temporal é aquela em que podemos fazer uma


enumeração da repetição, espontaneamente, apontando os casos semelhantes
um a um. Se o chefe tem dificuldade com um determinado perfil de estagiário,
pode ser que ele crie situações até a exaustão na qual aquelas que se incluam
naquele perfil tendam a sair do ambiente de trabalho.

A repetição patológica espacial é deduzida pelo Outro, geralmente o


psicanalista. É repetição tópica, topos – lugar, definida no campo da
metapsicologia, campo da especulação, atos que agem por substituição.
“Quando falo da repetição tópica, quero significar que na fantasia recalcada e no
sintoma que a exprime, o mesmo gozo, a mesma emoção, está presente, salvo
que na fantasia ela é inconsciente e não sentida, ao passo que no sintoma, é
consciente e sentida.

Ambas são impetuosas, violentas deflagradas pela tensão do inconsciente


traumático. É penosa pela sua irrupção e pela sua manifestação compulsiva.
“Compulsiva quer dizer incontrolável e que nada detém”. E conclui: “A repetição
é a exteriorização compulsiva do recalcado sob a forma de um distúrbio vivido
por um sujeito que, sem saber, atua sobre seu passado. A patologia da
repetição, repetir uma emoção inconsciente, que tende a se manifestar de modo
incessante, cristalizado numa necessidade: de fazer bullyng, ofender, tratar mal
os colegas, pedir dinheiro, comportamentos de fracassos repetitivos que
caracterizam o distúrbio obsessivo compulsivo, comportamentos dependentes.

Bibliografia

NASIO, J.-D. Por que repetimos os mesmos erros. Rio de Janeiro:Zahar,


2014.

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