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Jesus não foi indiferente aos pormenores de educação que se têm entre os
homens e que expressam a qualidade e a delicadeza interior das pessoas.
Assim o manifestou diante de Simão, o fariseu, que não teve com Ele as
atenções exigidas habitualmente pela hospitalidade. Com a sua vida e com a
sua pregação, revelou apreço pela amizade, pela amabilidade, pela
temperança, pelo amor à verdade, pela compreensão, pela lealdade, pela
laboriosidade... São numerosos os exemplos e parábolas que reflectem o
grande valor que o Senhor deu a essas virtudes. E forma os Apóstolos não só
nas virtudes da fé e da caridade, mas também na sinceridade e na nobreza 3,
na ponderação do juízo4, etc. Considera tão importantes essas virtudes
humanas que chegará a dizer-lhes: Se vos tenho falado das coisas terrenas e
não me acreditais, como acreditareis se vos falar das celestes?5 Cristo, perfeito
Deus e perfeito homem6, dá-nos exemplo desse conjunto de qualidades bem
entrelaçadas que qualquer homem deve viver nas suas relações com Deus,
com os seus semelhantes e consigo próprio. D’Ele pôde-se proclamar: Bene
omnia fecit7, fez bem todas as coisas; não somente os milagres por meio dos
quais manifestou a sua omnipotência divina, mas também as acções que
compõem a vida corrente. O mesmo se deveria poder afirmar de cada um de
nós, que queremos segui-lo no meio do mundo.
II. SÃO PAULO, numa das leituras da Missa8, exorta-nos também a viver as
virtudes humanas: Recorda-lhes – escreve a Tito – [...] que estejam prontos
para toda a boa obra; que não falem mal de ninguém nem sejam
questionadores; que sejam afáveis e mostrem uma perfeita mansidão para
com todos os homens.
Estas virtudes tornam mais grata e fácil a vida quotidiana: família, trabalho,
relacionamento...; preparam a alma para estar mais perto de Deus e para viver
as virtudes sobrenaturais. O cristão sabe converter os múltiplos pormenores
desses hábitos humanos em outros tantos actos da virtude da caridade, ao
praticá-los também por amor a Deus. A caridade transforma essas virtudes em
hábitos firmes, situando-as num horizonte mais elevado.
São Tomás afirma que “a própria ordem natural requer que quem recebeu
um favor responda com gratidão a quem o beneficiou” 9. Custa muito pouco ser
agradecido, e o bem que se faz é enorme: cria-se um ambiente novo, umas
relações cordiais. E à medida que aumentamos a nossa capacidade de
apreciar os favores e pequenos serviços que recebemos, sentimos a
necessidade de ser habitualmente agradecidos: pela casa que está em ordem
e limpa, por alguém ter fechado as janelas para que não entre a chuva, o calor
ou o frio, pela roupa que está limpa e bem passada... E se vez por outra
alguma coisa não está como esperávamos, saberemos desculpar, porque são
muitos mais os aspectos que realmente funcionam bem. Não daremos
importância a esses incidentes, e, se estiver ao nosso alcance, procuraremos
suprir o esquecimento ou o pequeno desleixo sem que ninguém nos veja, sem
querer dar uma lição: ordenar o que está fora de lugar, fechar ou abrir o que
devia estar fechado ou aberto...
(1) Lc 17, 11-19; (2) cfr. São Beda, em Catena Aurea, vol. VI, pág. 278; (3) cfr. Mt 5, 37; (4) cfr.
Jo 9, 1-3; (5) Jo 3, 12; (6) Símbolo Atanasiano; (7) Mc 7, 37; (8) Tit 3, 1-7; Primeira leitura da
Missa da quarta-feira da trigésima segunda semana do Tempo Comum, ano II; (9) São Tomás
de Aquino, Suma teológica, II-II, q. 106, a. 3 c; (10) João Paulo II, Homilia, 11.02.81; (11) São
Francisco de Sales, Epistolário, frag. 110, em Obras selectas, pág. 744.