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Mas o que é cultura para o filósofo? Por cultura ele entende a busca por uma fusão
harmoniosa do físico, do psíquico e do intelectual no conjunto da vida, pela plenitude
num mesmo homem da elevação espiritual, do refinamento emocional e da perfeição
mental e moral. Considera que essa totalidade harmoniosa é para poucos, não
podendo ser universalizada. Posição, sem sombra de dúvida, aristocrática.
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25/06/2019 Nietzsche, filósofo da cultura - Revista Cult
Todo empreendimento filosófico de Nietzsche tem por alvo reverter este quadro
cultural imperante na Alemanha. A partir de uma posição claramente aristocrática,
visa a atacar a cultura filisteia que então domina.
Nietzsche considera equivocada essa posição, pois, em vez de contribuir para uma
cultura aristocrática, colabora para fortalecer a cultura moderna. Considera que essa
interpretação dos gregos concerne apenas a um aspecto da realidade, o apolíneo – que
tem por modelo a escultura. Desse aspecto viriam as bases da cultura filisteia.
Nietzsche vai então ressaltar outro aspecto grego da realidade, mais profundo e nada
extático, o dionisíaco – que tem por modelo a música e a tragédia. Esse outro aspecto
contrapor-se-ia ao status quo cultural.
Contudo, esse embate de Nietzsche com seu tempo sofre uma inflexão. A partir de
Humano, Demasiado Humano (1878), os pressupostos mesmos de sua crítica à cultura
filisteia vão começar a ser colocados sob suspeita. Qual a razão para Nietzsche
considerar que não é mais eficiente opor o pessimismo dionisíaco ao otimismo
socrático? Os motivos são simples: as condições históricas mudaram.
Se antes o pano de fundo era, de um lado, a Comuna de Paris, que trazia os perigos
das “ideias modernas” (liberdade, igualdade, justiça etc.) e os riscos da revolução
socialista, e, de outro, a guerra franco-prussiana, que colocava em xeque a “alma
alemã”, e, por extensão, a cultura, agora, com a vitória alemã na guerra franco-
prussiana, o cenário se altera.
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Moral e cultura
No entanto, esta via não rende os frutos desejados. As armas iluministas são
insuficientes, o que fica evidente com a publicação da quinta parte da Gaia Ciência
(1886). A ciência, a razão e a história trazem de volta a mesma tríade socrático-
cristão-socialista de que o filósofo procura se desvencilhar.
Há, então, um novo influxo nas posições filosóficas de Nietzsche. Com o rompimento
radical que vem com o anúncio da morte de Deus, o filósofo consegue se apartar
definitivamente do modo de operar daquela tríade.
Encontrada a melhor via para realizar uma crítica radical do mundo moderno,
Nietzsche elabora todas as suas teses filosóficas em Assim Falava Zaratustra (1883-
1885): anuncia o além do homem, aquele que trará um novo sentido para a Terra ao
ultrapassar o velho conceito de “homem” e “humanidade”; descreve o mundo como
vontade de potência, como luta permanente em que se visa sempre mais, em que se
procura dominar, resultando daí todas as configurações existentes, das naturais às
sociais; formula o eterno retorno do mesmo, em que traz os meios para ir para além
do niilismo introduzido pela modernidade; propõe a transvaloração dos valores, como
meio de alterar pela base os valores que fomentaram a tríade socrático-cristão-
socialista. Com essas teses, ele pode aprofundar sua crítica, pois encontra um solo
onde assentá-la. E é exatamente o que ocorre em seus escritos posteriores.
A partir de Para Além de Bem e Mal (1886) e da Genealogia da Moral (1887), Nietzsche
instaura o procedimento genealógico. A investigação da moral se radicaliza com a
pergunta pelo valor dos valores morais. Justiça, igualdade, liberdade etc.: qual o valor
desses valores reivindicados por Sócrates, pelo cristianismo e pelos revolucionários?
Estes não se colocariam numa posição de ressentidos perante o segmento que os
domina? O caráter mutante e horripilante do mundo – já entrevisto no dionisíaco –
ganha nova formulação com a vontade de potência. Não existe, portanto, um mundo
de permanência e harmonia expresso pelos valores que os modernos (isto é, aquela
tríade) defendem.
Em sua investigação, Nietzsche estabelece apenas duas morais: uma moral do senhor
(que está em consonância com os valores da Terra, nada dóceis, mas terríveis) e uma
moral do escravo (que quer também dominar). Não sendo capaz de agir
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