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Entendendo o poder nas organizações

Jeffrey Pfeffer

Norton Long, cientista político, escreveu: “As pessoas concordarão


prontamente que os governos são organizações. O contrário – que as organizações são
governos – é igualmente verdadeiro, mas raramente levado em consideração” 1. Mas as
organizações, particularmente as grandes, são como governos no sentido de serem
essencialmente entidades políticas. Para entendê-las, é necessário entender sobre política
organizacional. Da mesma forma, para entender os governos é necessário entender sobre
política governamental.
Estamos em uma era em que as pessoas tendem a evitar tal tarefa. Ao andar pelas
livrarias, fico surpreendido com a incursão da forma New Age de pensar, até mesmo na
seção de administração de empresas. Acredito que o termo New Age possa ser definido de
diversas maneiras, mas o que me chama a atenção são dois elementos: (1) a auto-absorção e
o autofoco que analisam o indivíduo isoladamente; e (2) a crença de que o conflito é, em
grande parte, resultado de mal-entendidos e que, se as pessoas tivessem mais capacidade de
comunicação, mais tolerância e mais paciência, muitos (ou todos) os problemas sociais
desapareceriam. Esses temas aparecem em todo tipo de livro; por exemplo, sobre “como
fazer o casamento dar certo” e até aqueles sobre “como fazer as organizações darem certo”.
Um foco na auto-realização individual é útil, mas é difícil um foco totalmente baseado na
autoconfiança ser capaz de motivar alguém a tentar fazer as coisas com a ajuda de outras
pessoas - e a ser um executivo ou um líder. “A excelência pode ser atingida em um campo
solitário sem a necessidade de exercer-se a liderança” 2. Nesse sentido, as preocupações de
John Gardner (ex-secretário da HEW - Health Education and Welfare [Departamento de
Saúde, Educação e Bem-Estar] – e fundador da Common Cause) sobre a comunidade são
parte integrante de um conjunto de preocupações sobre as organizações e sobre como fazer
com que as coisas sejam realizadas nelas 3.
É possível se sentir bastante satisfeito, feliz e realizado sendo um eremita dentro de
uma organização, mas, nesse caso, a influência exercida pelo indivíduo é limitada e o
potencial de realizar grandes feitos, que requer uma ação interdependente, é praticamente
inexistente.
Se desconfiamos da política de grandes organizações, podemos concluir que as
organizações menores são uma alternativa melhor. De fato, há evidências de que o tamanho
médio dos estabelecimentos nos Estados Unidos esteja diminuindo. Isso não está
acontecendo apenas porque nos tornamos uma economia mais voltada para a oferta de
serviços e menos voltada para a produção; pois até mesmo nesse setor, o tamanho médio
dos estabelecimentos e firmas está encolhendo. As grandes empresas descartaram centenas
de funcionários, na verdade milhares deles - não só gestores, mas também os operários,
funcionários de todos os níveis, funcionários que executavam atividades que passaram a ser
terceirizadas. Gestores e funcionários, – que viam suas ações serem frustradas pela

1
LONG, Norton E. The Administrative Organization as a Political System. In: MAILICKM S. and VAN
NESS E. H., eds., Concepts and Issues in Administrative Behavior. Englewood cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1962,
p. 110.
2
NIXON, Richard M. Leaders. New York, NY: Warner Books, 1982, p. 5.
3
GARDNER, John W. On Leadership. New York, NY: Free Press, 1990.

1
dificuldade em exercer poder e influência causada pela interdependência e por pontos de
vistas diferentes –, mudaram-se para um universo de organizações menores e mais simples,
com menos interdependência e diversidade interna, e, conseqüentemente, menos política.
Obviamente, essas mudanças estruturais só fizeram aumentar a interdependência entre as
organizações mesmo que diminuam a interdependência e os conflitos dentro delas.
Identifico nesse movimento um paralelo com o que já vi na gestão dos recursos
humanos. Atualmente, muitas empresas resolvem seus problemas de pessoal descartando os
funcionários. O raciocínio parece ser: se não é possível gerenciar e motivar funcionários de
maneira eficiente, é melhor transferir a tarefa para outra empresa. Podemos ter funcionários
terceirizados ou temporários e deixar que a organização deles solucione nosso problema de
turnover, remuneração, seleção e treinamento.
Trata-se de uma solução sedutora, coerente com a ênfase no indivíduo que sempre
foi forte nos Estados Unidos e que cresceu nos últimos anos. Como podemos confiar em
grandes organizações quando elas desrespeitam relações de emprego duradouras? É melhor
buscar segurança e certeza em si mesmo (self), nas próprias competências e habilidades, e
no controle de suas próprias atividades.
Entretanto, existe um problema nessa abordagem de lidar com o poder e a influência
dentro da organização. Não é certeza que, ao ignorar as realidades sociais do poder e da
influência, conseguimos fazê-las desaparecer, ou que ao tentar construir estruturas sociais
mais simples e menos interdependentes, conseguimos construir organizações mais
eficientes e com maior probabildade de sobrevivência. É verdade que as grandes
organizações às vezes desaparecem 4, mas também é verdade que as pequenas organizações
desaparecem em escala muito maior e que possuem menor capacidade de sobrevivência.
Ao tentar ignorar temas sobre o poder e a influência nas organizações, perdemos a chance
de entender esses processos sociais críticos e de treinar executivos para lidar com esses
processos.
Ao fingir que o poder e a influência não existem, ou pelo menos que não deveriam
existir, contribuímos para o que eu e outros pesquisadores (como John Gardner)
consideramos o problema principal das empresas de hoje, principalmente nos Estados
Unidos – a incapacidade quase treinada ou produzida de qualquer pessoa, com exceção dos
gestores de cargos mais altas, de agir e de fazer com que as coisas sejam feitas. Quando
leciono em programas para executivos e quando comparo minhas experiências com as de
colegas que fazem o mesmo trabalho, escuto sempre a mesma história. Nesses programas,
apresentamos idéias para executivos seniores que, depois, trabalham em grupos e discutem
as implicações dessas idéias em suas empresas. Esses executivos possuem experiência e
conhecimento sólidos e geralmente apresentam recomendações e idéias pertinentes para
melhorar suas organizações. Às vezes, eles descobrem as enormes diferenças de eficiência
entre as diferentes unidades de trabalho e compartilham sugestões sobre como melhorar o
desempenho. Às vezes, eles acabam entendendo os mercados e tecnologias de suas
organizações de maneira mais abrangente e desenvolvendo estratégias para mudanças
internas e externas para melhorar a eficiência. Isso não importa, pois o comentário mais
ouvido em durante as sessões é “o meu chefe deveria estar aqui”. E quando eles voltam
para seus escritórios, depois do estímulo da semana, poucos executivos têm a habilidade ou
a determinação para por em prática as mudanças discutidas com tanta clareza.

4
HANNAN, Michael T., FREEMAN, John. Organizational Ecology. Cambridge, MA: Harvard University
Press, 1989.

2
Lembro-me de conversar com o gerente de uma grande cadeia de supermercados
detentora de uma participação significativa do setor no norte da Califórnia. Ele gerenciava
uma loja com volume de vendas de U$ 20 milhões anuais, o que, tendo em vistao volume
médio da organização, fazia dele um gerente com bastante responsabilidade - ou pelo
menos seria o que pensar. No entanto, nessa empresa, assim como em várias outras, as
responsabilidades de um gerente médio são muito limitadas. Surgiu uma questão sobre
colocar ou não o nome da empresa em uma placa no shopping onde a loja estava localizada.
O custo era de, aproximadamente, US$ 8.000,00 (pouco menos que quatro horas de vendas
da loja). Foi feita uma pesquisa que mostrou quantos consumidores seriam atraídos para
recuperar o investimento e qual o percentual desses consumidores dentro do universo do
número de pessoas que circulavam pelo shopping. O gerente da loja queria a placa, mas é
óbvio que ele não tinha poderes para gastar nem mesmo esse valor sem a autorização de
seus superiores. Quem decidiu a questão foi o presidente da divisão do norte da Califórnia.
Após uma longa reunião, o presidente determinou que o gasto não era necessário.
Podemos tirar várias lições desse exemplo. A situação poderia ser interpretada como
uma praga do excesso de centralização ou como um exemplo de um gerenciamento de
recursos humanos certamente mais top down (de cima para baixo) que bottom up (de baixo
para cima). Mas o mais interessante foi a resposta do gerente – que, por sinal, é o
responsável pelos lucros das loja, apesar de não receber nenhum tipo de poder
discricionário. Ao ser perguntado sobre a decisão, ele disse: “Bem, acho que é por isso que
os caras da matriz ganham dinheiro; eles devem saber alguma coisa que nós não sabemos”.
Ele teria sido capaz de insistir para que sua idéia, sua modesta proposta, fosse aprovada?
“Lógico que não”, ele respondeu. Uma pessoa só se sai bem se cumpre as diretrizes da alta-
gerência.
Já fui testemunha desse tipo de situação, com pequenas variações, diversas vezes.
Converso com executivos seniores que dizem que suas empresas não tomam iniciativas e
com gerentes de níveis mais altos que dizem que não conseguem ou não estão dispostos a
se engajar para mudar as organizações nas quais trabalham, mesmo sabendo que as
mudanças são importantes, talvez até essenciais, para o sucesso e a sobrevivência da
empresa. A política está envolvida na inovação e mudança. E, a menos que e até que
estejamos dispostos a aceitar o poder e a influência organizacional e a admitir que a
habilidade de fazer com que as coisas sejam feitas é tão importante quanto a habilidade de
descobrir o que fazer, nossas empresas vão ficar cada vez mais para trás. O problema é, na
maioria das vezes, não a ausência de idéias ou de inteligência organizacional, mas um
problema de passividade, um fenômeno que John Gardner analisou da seguinte forma:
Neste país – e na maioria das outras democracias – o poder tem uma reputação tão ruim
que muitas pessoas boas se convencem que não querem nada relacionado a ele. As apreensões
éticas e espirituais são compreensíveis. Mas não é possível renunciar ao poder. O poder como
estamos falando agora... é simplesmente a capacidade de causar o efeito que queremos no
comportamento dos outros... Na nossa sociedade democrática, concedemos poder às pessoas para
propósitos específicos. Se, por razões ideológicas ou emocionais, elas se recusam a exercer o poder
a elas concedido, devemos recorrer a outras pessoas... Dizer que um líder preocupa-se com o
poder é o mesmo que dizer que um jogador de tênis preocupa-se em fazer lances que o adversário
não consiga devolver. É obvio que os líderes se preocupam com o poder! As questões importantes

3
são: quais os meios utilizados por eles para conseguir o poder? Como eles o exercem? Para quais
fins ele é exercido? 5.
Se a liderança envolve habilidade de desenvolver e exercer o poder e a influência
também como a vontade de colocar isso em prática, talvez uma das causas para a chamada
crise de liderança em organizações nos Estados Unidos seja, exatamente, essa tentativa de
colocar de lado questões envolvendo o poder. Esse diagnóstico é consistente com os
argumento de Warren Bennis et al. , que analisaram líderes e escreveram sobre a liderança.
Bennis e Nanus notaram, por exemplo, que um dos maiores problemas enfrentados pelas
empresas atualmente não é que muitas pessoas exercem muito poder, mas exatamente o
contrário:
Hoje em dia, o poder é ressaltado pela sua própria ausência. Ausência de poder frente a
crises. Ausência de poder frente a assuntos complexos... O poder foi sabotado.... Instituições
tornaram-se rígidas, inertes e inconstantes. 6
Eles escrevem, ainda, sobre a importância do poder como um conceito para entender
a liderança e como uma ferramenta que permite o funcionamento produtivo e eficiente das
organizações:
Entretanto, alguma coisa está faltando... O PODER é a energia básica para iniciar e
sustentar ações, traduzindo intenção em realidade, uma qualidade sem a qual os líderes não podem
liderar... o poder é, ao mesmo tempo, o elemento mais necessário e sobre o qual mais se desconfia
e é imprescindível para o progresso humano. O poder é fundamental para iniciar e sustentar
ações ou, colocando de outra maneira, é a capacidade de traduzir intenção em realidade e
sustentá-la.7
Tais observações sobre o poder não são meramente o território de teóricos. Líderes
políticos também confirmam que o desejo de construir e exercer o poder é um pré-requisito
para o sucesso na vida pública. Em relação a considerações sobre poder e liderança,
Richard Nixon fez observações pertinentes ao tema deste artigo:
O poder é a oportunidade de construir, criar e conduzir a história para uma outra direção.
Existem poucos prazeres comparados ao do poder para aqueles que o valorizam. Mas o poder não
proporciona felicidade. . Aqueles que procuram a felicidade não adquirirão poder nem seriam
capaz de usá-lo bem se o adquirissem.
Um observador engenhoso uma vez comentou que aqueles que gostam de leis e de salsichas
não deveriam ver como elas são feitas.
Da mesma maneira, respeitamos os líderes por aquilo que alcançam, mas, ao mesmo
tempo, preferimos fechar os olhos para a maneira como eles alcançaram tais objetivos...
No mundo real, a política é fazer acordo e a democracia é fazer política. Qualquer pessoa
que queira ser um estadista deve ser, em primeiro lugar, um político bem-sucedido. Além disso, um
líder deve lidar com o povo e as nações como eles são, e não como deveriam ser.
Conseqüentemente, as qualidades necessárias para o exercício da liderança não são,
necessariamente, aquelas que gostaríamos que nossos filhos reproduzissem – salvo se quisermos
que eles sejam líderes.

5
GARDNER, op. cit., p. 55-57.
6
BENNIS, Warren e NANNUS, Burt. Leaders: The Strategies for Taking Charge. New York, NY: Harper
and Row, 1985, p. 6.
7
Ibid., p. 15-17.

4
Ao avaliar um líder, a questão-chave sobre suas características comportamentais não é se
elas são atraentes ou não, mas se elas são úteis. 8

A ambivalência ao poder
Nossa ambivalência em relação ao poder é inegável. Rosabeth Kanter, ao apontar
que o poder é crítico para a capacidade gerencial, escreveu, todavia, que “O poder é o mais
novo palavrão nos Estados Unidos. É mais fácil falar sobre dinheiro – e ainda mais fácil
falar sobre sexo - que falar sobre poder” 9. Gandz e Murray aplicaram, a 428 executivos,
um questionário cujas respostas ilustram bem a ambivalência sobre o poder nas
organizações10. Alguns itens do questionário, assim como o percentual de entrevistados que
registraram concordar totalmente ou parcialmente estão na Tabela 1. Os conceitos de poder
e política organizacional são relacionados; a maioria dos autores, inclusive eu, define a
política organizacional como o exercício ou uso do poder, sendo o poder definido como
uma força em potencial. É importante notar que mais de 90% dos entrevistados disseram
que a experiência com a política no ambiente de trabalho é comum na maioria das
organizações, 89% acreditam que executivos bem-sucedidos têm que ser bons políticos e
76% deles disseram que quanto mais se progride na organização, mais político se torna o
ambiente. Entretanto, 55% dos mesmos entrevistados disseram que a política era prejudicial
à eficiência e quase metade disse que a diretoria deveria tentar eliminar a política presente
nas organizações. É como se soubéssemos que o poder e a política existem e que admitimos
relutantemente que são necessários para o sucesso individual, mas, no entanto, não
gostamos deles.
Essa ambivalência, ou mesmo esse completo desdém, em relação ao
desenvolvimento e uso do poder em organizações provém de mais de uma fonte.
Primeiramente, há a questão sobre os fins e os meios – geralmente não gostamos de pensar
nos métodos necessários parar fazer com que as coisas sejam feitas, como sugeriu Richard
Nixon. Sentimos a ambivalência em relação à questão dos fins e dos meios porque as
mesmas estratégias e processos que podem produzir os resultados desejados, podem
também ser usados para produzir resultados indesejáveis. Em segundo lugar, aquilo que há
de mais importante que aprendemos na escola distorce nosso juízo sobre o poder e a
influência. Finalmente, de certa forma, a perspectiva sob a qual avaliamos as decisões
organizacionais geralmente não faz jus à realidade do mundo social.
Tabela 1. Impressões dos gerentes sobre a política no ambiente de trabalho
Afirmação Percentual que concorda totalmente ou
parcialmente
A existência de política no ambiente de 93,1
trabalho é comum nas organizações.
Executivos bem-sucedidos devem ser bons 89,0
políticos.
Quanto mais se avança em uma 76,2

8
NIXON, op. cit., p. 324.
9
KANTER, Rosabeth Moss. Power Failure in Management Circuits. In: Harvard Business Review, 57.
Julho/Agosto, 1979: 65.
10
GANDZ, Jeffrey e Murray, Victor V. The Experience of Workplace Politics. In: Academy of Management
Journal, 23, 1980: 237-251.

5
organização, mais político fica o ambiente.
Executivos poderosos não atuam de maneira 15,7
política.
É preciso fazer política para subir na 69,8
organização.
A direção deve tentar eliminar a política na 48,6
organização.
A política ajuda as organizações a 42,1
funcionarem de maneira eficiente.
As organizações em que não existe política 59,1
são mais felizes que aquelas onde existe
muita política.
A política nas organizações prejudica a 55,1
eficiência.
Fonte: GANDZ, Jeffrey e MURRAY, Victor V. The Experience of Workplace
Politics. In: Academy Management Journal, 23, 1980.

Os fins e os meios – Sábado, 25 de setembro de 1976, em São Francisco, foi


oferecido um jantar em homenagem a um homem cujo único cargo público foi o de
membro do conselho da Secretaria Municipal de Habitação de São Francisco. A lista de
convidados era impressionante: o prefeito, George Moscone; o vice-governador Mervyn
Dymally, o político afro-americano mais popular na época; o promotor público Joe Freitas;
o vereador democrata Willie Brown, provavelmente o mais poderoso e temido político na
Califórnia; o senador republicano Milton Marks; Robert Mendelsohn, do Conselho
Municipal de São Francisco; o editor do jornal local; advogados importantes; em suma,
tanto democratas quanto republicanos, todas as figuras importantes do cenário político do
norte da Califórnia. O homem homenageado havia conhecido pessoalmente recentemente
Rosalynn Carter, a esposa do Presidente. No entanto, dois anos depois, o mundo ficou
sabendo mais sobre o homenageado, mas com choque e horror devido ao que aconteceu na
Guiana. A pessoa homenageada naquela noite de setembro de 1976 – e que conseguira
entrar no círculo do poder de São Francisco usando algumas das estratégias e táticas
descritas neste artigo – era nada mais, nada menos que Jim Jones. 1112
Não há dúvida que o poder e a influência podem ser adquiridos e usados para o mal.
É lógico que os remédios podem matar se ingeridos na dose errada, que centenas de pessoas
morrem todos os anos em acidentes de automóveis e que a energia nuclear pode produzir
tanto energia quanto destruição em massa. Mas não deixamos de usar substâncias
químicas, carros ou mesmo a energia nuclear por causa dos perigos a eles associados. Pelo
contrário, acreditamos que o perigo é um incentivo para estudar e receber informações que
nos ajudarão a usar essas forças de maneira produtiva. Entretanto, poucas pessoas estão
dispostas a abordar os possíveis riscos e os benefícios do poder com o mesmo
pragmatismo. Prefere-se evitar discussões sobre o poder aparentemente com a suposição de

11
REITERMAN, Tim e JACOBS, John. Raven: The Untold History of the Reverend Jim Jones and His
People. New York, NY: E.P. Dutton, 1982. p. 305-307.
12
N. do T. James Warren Jones foi o fundador a seita religiosa Templo do Povo. Em 18 de novembro de 1978
mais de 900 membros da seita se suicidaram por envenenamento na comunidade agrícola de Jonestown na
Guiana. Jones foi encontrado morto com um tiro na cabeça junto aos 909 corpos.

6
que “Se não falarmos sobre poder, ele não existirá”. Tenho uma opinião diferente. Em
1985, John Jacobs, atualmente editor de política do San Francisco Examiner,deu-me uma
cópia do seu livro sobre Jim Jones. Na opinião do editor, e na minha também, tragédias
como a de Jonestown poderiam ser evitadas se, em vez de ignorarmos os processos de
poder e influência, tivéssemos uma boa formação sobre tais processos para podermos
reconhecer quando estão sendo empregados para, se for o caso, tomar medidas para
controlá-lo, e se desenvolvêssemos um conjunto de valores morais bem moldado.
Os meios para qualquer fim são, meramente, os mecanismos usados para fazer as
coisas. Essas coisas podem ser grandiosas, grotescas, ou, para a maioria de nós, alguma
coisa no meio do caminho. O fim nem sempre justificará os meios, mas ele também não
deve ser automaticamente usado para o descrédito dos meios. O poder e os processos
políticos nas organizações podem ser usados para realizar grandes ações. Nem sempre eles
são usados dessa maneira, mas isso não significa que devemos descartá-los de imediato. É
interessante que quando somos nós que exercemos o poder, o vemos como uma força
benigna e queremos mais. Quando são os outros que o usam contra nós, principalmente
para frustrar nossos objetivos e ambições, o vemos como um mal. Uma visão mais
elaborada e realista deveria encarar o poder como ele é: um importante processo social
geralmente necessário parar fazer com que as coisas sejam feitas em sistemas
interdependentes.
A maioria considera Abraham Lincoln um grande presidente. Temos a tendência de
idealizar seus feitos: ele preservou a União, aboliu a escravidão e fez o memorável discurso
de Gettysburg. É fácil esquecer que ele também era um político e uma pessoa pragmática.
A Proclamação da Emancipação libertou os escravos da Confederação, mas não os escravos
de estados vizinhos que ainda pertenciam à União, de cujo apoio ele precisava. Lincoln
também tomou várias medidas que ultrapassavam seus poderes Constitucionais. De fato,
Andrew Johnson sofreu impeachment por dar continuidade a várias ações que Lincoln tinha
iniciado. Uma vez, Lincoln explicou como justificava o descumprimento das leis que tinha
jurado seguir:
Meu juramento de preservar a Constituição me impôs o dever de preservar, por
todos os meios indispensáveis, o governo e a nação dos quais a Constituição é a lei
orgânica. Seria possível perder a nação e ainda assim preservar a Constituição? Acreditei
que medidas, mesmo inconstitucionais, podem se tornar legais se forem indispensáveis
para a preservação da nação 13”.
Lições a serem desaprendidas – nossa ambivalência em relação ao poder tem
origem também nas lições que aprendemos na escola. A primeira lição é que a vida é uma
questão de esforço individual, habilidade e realização. Afinal, na universidade, se você
souber os detalhes da contabilidade de custos, cálculo ou engenharia elétrica e os seus
colegas não, o fracasso deles não afetará o seu desempenho pessoal. Na sala de aula, a
interdependência é minimizada. O cenário consiste em você e a matéria e desde que você
consiga dominar a matéria, você alcançou o esperado. A cooperação talvez seja até
considerada “cola”.
Esse não é o caso nas organizações. Se você souber a estratégia da sua organização,
mas seus colegas de trabalho não, você encontrará dificuldades para realizar qualquer coisa.
O conhecimento e a habilidade individuais, tão úteis na sala de aula, não são suficientes nas

13
NIXON. op. cit., p. 326.

7
organizações. O sucesso individual nas organizações é freqüentemente uma questão de
trabalho com outras pessoas e o sucesso organizacional está relacionado à capacidade de as
pessoas coordenarem suas atividades de maneira bem-sucedida. Nas organizações, a
maioria das situações assemelha-se mais ao futebol do que ao golfe. Por isso, as empresas
geralmente analisam currículos para identificar não somente as realizações individuais, mas
também sinais de que o candidato possui habilidade para trabalhar em equipe. Para atingir o
sucesso nas organizações, “o poder transforma interesses individuais em atividades
coordenadas que alcançam fins valiosos 14 ”.
A segunda lição que aprendemos e que pode ser até mais difícil de ser desaprendida
é que existem respostas certas ou erradas. Aprendemos a resolver problemas e aprendemos
que para cada problema existe uma resposta certa ou que, pelo menos, existe uma
abordagem mais correta que outra. A resposta correta é, obviamente, aquela apresentada
pelo professor, aquela que está no final do livro, ou ainda aquela que está escondida no
manual do professor. A vida é apresentada como uma série de problemas com soluções do
tipo “eureca”, assim chamadas porque ao nos mostrarem a abordagem ou a solução correta,
passa a ser óbvio que aquela resposta é, realmente, a certa.
Essa ênfase no potencial de análise individual para oferecer a resposta correta – a
verdade – está geralmente, mas não invariavelmente, equivocada. Ao comentar sobre sua
política de educação, Henry Kissinger escreveu: “Antes de trabalhar como consultor para
Kennedy, eu acreditava, como a maioria dos acadêmicos, que o processo de tomada de
decisão era em grande parte intelectual e era necessário somente entrar no gabinete do
Presidente e convencê-lo de que uma opinião era a correta. Logo percebi que essa
perspectiva é tão perigosamente imatura quanto amplamente aceita” 15. Kissinger observou
que as decisões simples, aquelas com respostas certas ou erradas e que podem ser
resolvidas rapidamente com análise nunca chegavam ao presidente, pois eram resolvidas
nos níveis mais baixos da hierarquia.
No mundo em que vivemos, as coisas raramente são tão claras e óbvias. Não
somente não temos um livro ou instrutor para nos dar um feedback sobre a qualidade da
nossa abordagem, como também os problemas que enfrentamos geralmente possuem
múltiplas dimensões, o que resulta em métodos múltiplos de avaliação. As conseqüências
de nossas decisões, geralmente, são percebidas muito depois do fato e, mesmo assim, com
alguma ambigüidade.

Uma perspectiva alternativa para a tomada de decisão


Gostaria de propor uma alternativa para analisar o processo de tomada de decisão.
Há três pontos importantes a serem lembrados sobre decisões. Primeiro, uma decisão
sozinha não muda nada. Você decidir lançar um novo produto, contratar um determinado
candidato, construir uma nova fábrica, alterar o sistema de avaliação de desempenho e
assim por diante, são decisões que não serão efetivadas isoladamente. Por exemplo, tente
lembrar de quantas vezes você ou seus amigos “decidiram” parar de fumar, fazer mais
atividade física, relaxar mais, ter uma dieta mais saudável, ou perder peso. Tais resoluções
geralmente se esvaem antes de produzirem o resultado almejado. Portanto, além de

14
ZALEZNICK, Abraham e KETS DE VRIES, Manfred F.R. Power and the Corporate Mind. Boston, MA:
Houghton Mifflin, 1975, p. 109.
15
KISSINGER, Henry. The White House Years. Boston, MA: Little Brown, 1979, p. 39.

8
conhecimento sobre a ciência da tomada de decisão, é necessário entender sobre a “ciência
da implementação”.
Segundo, no momento em que uma decisão é tomada, é impossível sabermos se ela
é boa ou ruim. A qualidade da decisão, quando medida pelos resultados, só pode ser
avaliada quando as conseqüências da decisão aparecem. Precisamos esperar que a decisão
seja implementada para que suas conseqüências sejam sentidas.
O terceiro, e talvez mais importante, ponto a ser observado é que invariavelmente
passamos mais tempo vivendo as conseqüências das decisões que tempo tomando-as. Pode
ser uma decisão organizacional, como a de adquirir ou não uma empresa, alterar o sistema
de compensação, fazer uma campanha organizada pelo sindicato ou pode ser uma decisão
individual, como decidir onde estudar, qual emprego escolher, qual curso de graduação
fazer ou com quem se casar. Em qualquer caso, provavelmente, os efeitos da decisão vão
ser sentidos durante muito mais tempo que o tempo que gastamos para tomar a referida
decisão, independentemente de quanto tempo e esforço foram investidos. Assim, essa
característica fez com que vários psicólogos sociais descrevessem as pessoas como animais
racionalizados (em contraste a “racionais”) 16. A união entre nossas atitudes e nosso
comportamento, por exemplo, geralmente deriva do ajuste que fazemos em nossas atitudes
após o evento em questão para sermos capazes de adequar nossas ações passadas às
conseqüências17.
Se as decisões sozinhas não mudam nada; se no momento em que uma decisão é
tomada não podemos saber quais serão suas conseqüências; e se, em qualquer situação,
passamos mais tempo vivendo com as nossas decisões do que tomando essas decisões,
parece óbvio que a ênfase nos treinamentos e práticas de gestão tem sido equivocada. Em
vez de gastar uma quantidade incalculável de tempo e esforço no processo de tomada de
decisão, parece ser, pelo menos, útil gastar um pouco de tempo na implantação das
decisões e lidando com suas ramificações. Nesse sentido, os bons executivos não são
apenas bons em tomar decisões analíticas. Mais que isso, eles possuem habilidade para
gerenciar as conseqüências de suas decisões. Poucos líderes bem-sucedidos ficam muito
tempo se preocupando com decisões depois que elas já foram tomadas... A única forma de
dedicar atenção necessária às decisões que deverão ser tomadas no dia seguinte é não
pensar mais nas decisões tomadas ontem 18”.·.
Existem inúmeros casos que ilustram esse ponto. Considere, por exemplo, a
aquisição da Fairchild Semiconductor pela Schlumberger, uma empresa de petróleo 19. A
teoria por trás da fusão parecia perfeita – aplicar a habilidade em eletrônica da Fairchild aos
negócios de petróleo. A Schlumberger queria desenvolver equipamentos de exploração
mais sofisticados e incluir a eletrônica nos serviços de petróleo e nos equipamentos de
perfuração. Infelizmente, a fusão não produziu nenhuma das sinergias esperadas.

16
ARONSON, Elliot. The Social Animal. San Francisco, CA: W.H. Freeman, 1972. Capítulo 4; STAW,
Barry M. Rationality and Justification in Organizational Life. In: Research in Organizational Behavior.
STAW, B.M. e CUMMINGS, L.L., eds. Greenwich, CT: JAI Press, 1980, vol.2, p. 45-80. SALANCIK,
Gerald R. Commitment and the Control of Organizational Behavior and Belief. In: New Directions in
Organizational Behavior. STAW, Barry M. e SALANCIK, Gerald R., eds. Chicago, IL: St. Clair Press, 1977,
p. 1-54.
17
FESTINGER, Leon. A Theory of Cognitive Dissonance. Stanford, CA: Stanford University Press, 1957.
18
Nixon, op. cit., p. 329
19
CHAKRABARTI, Alok K. Organizational Factors in Post-Acquisition Performance. In: IEEE Transactions
in Engineering Management, 37, 1990: p. 259-268.

9
Quando a Schlumberger tentou gerenciar a Fairchild da mesma maneira que havia
gerenciado suas outras unidades de negócios, enfrentou muitas dificuldades.... não foram
disponibilizados recursos para o departamento de Pesquisa e Desenvolvimento e as
técnicas inovadoras que a Fairchild possuía anteriormente ficaram para trás. Pessoas
criativas e técnicas deixaram a organização e a empresa não foi capaz de agrupar equipes
técnicas para buscar novos avanços tecnológicos”20.
Um estudo sobre 31 aquisições descobriu que “após aquisições, surgirão, no futuro,
problemas que não foram possíveis antecipar. Tanto a sinergia quanto os problemas devem
ser gerenciados de forma ativa 21”. Além disso, as empresas que vêem nas aquisições uma
forma rápida de obter benefícios financeiros são, em regra, insensíveis à quantidade de
tempo e esforço demandados na implantação da fusão e na produção de um desempenho
superior depois que a aquisição acontece. A ênfase na escolha do parceiro para a fusão e
nos termos do acordo podem desviar o foco da importância das atividades que ocorrerão
após a aquisição.
Ou então, considere o lançamento de um novo produto. O fato de a decisão produzir
lucros ou perdas, em regra, não está simplesmente relacionado às escolhas feitas no
lançamento. Os lucros e as perdas dependem, também, da execução dessas escolhas, assim
como das decisões subseqüentes como: replanejar o produto, mudar os canais de
distribuição, ajustar os preços e assim por diante. No entanto, o que observamos com
freqüência nas organizações é que uma vez que a decisão foi tomada, despende-se mais
esforço e tempo reconhecendo ou culpando pessoas do que trabalhando para melhorar os
resultados da decisão.
Não consigo pensar em um exemplo que ilustre mais claramente essa tesa que a
história de como a Honda entrou no mercado americano, primeiro no de motos e,
posteriormente, no de carros e cortadores de grama. A Honda estabeleceu uma subsidiária
nos Estados Unidos em 1959 e, entre 1960 e 1965, suas vendas subiram de U$ 500.000
para U$ 77 milhões. Em 1966, a Honda detinha 63% do mercado de motocicletas dos
Estados Unidos22, tendo começado com zero apenas sete anos antes. A fatia de mercado da
Honda era quase seis vezes maior que a de suas maiores concorrentes, a Yamaha e Suzuki e
a Harley-Davidson, cuja fatia do mercado caíra para 4% . Pascale mostrou que esse sucesso
extraordinário foi em grande parte fruto de um “erro de cálculo, acaso fortuito e
aprendizagem organizacional” e não de um processo racional de planejamento e previsão
geralmente enfatizado em nossos esforços para alcançar o sucesso 23.
O próprio Sochiro Honda estava mais interessado em velocidade e projetos de
motor do que em construir um negócio, mas seu sócio, Takeo Fujisawa, conseguiu
convencê-lo a usar o seu talento para projetar motos seguras e baratas que pudessem ser
dirigidas com uma mão e usadas para a entrega de encomendas no Japão. A moto foi um
sucesso imediato no Japão. Como e por que Honda decidiu entrar para o mercado de
exportação e vender para os Estados Unidos? Kihachiro Kawashima, presidente da Honda
americana, relatou a Pascale:

20
Ibid., p. 259.
21
Ibid., p. 266.
22
PURKAYASTHA, D. Note on the motorcycle industry – 1975; #578-210, Harvard Business School, 1981.
23
PASCALE, Richard T. Perspectives on Strategy: The Real Story Behind Honda’s Success. In: California
Management Review, 26, 1984: 51.

10
Na verdade, não tínhamos outra estratégia senão a idéia de ver se conseguíamos
vender alguma coisa nos Estados Unidos. Era uma nova fronteira... e combinava com a
cultura “sucesso contra todos os riscos” que o Sr. Honda cultivava. Eu falei o que
achava... incluindo o objetivo, infundado, de tentar, ao longo de vários anos, alcançar 10%
do mercado de importados norte-americano..... Não discutimos lucros nem prazos para
recuperar o investimento 24.
O dinheiro para o empreendimento foi aprovado, mas o Ministério da Fazenda só
autorizou uma alocação de verbas de U$ 250.000, dos quais menos da metade era em
dinheiro e a outra parte em estoque de peças e motos. A tentativa inicial de vender motos
em Los Angeles foi um desastre. As distâncias nos Estados Unidos são muito maiores que
no Japão e as motos eram usadas para percorrer distâncias maiores, com maior velocidade
do que o seu design permitia. Problemas no motor eram comuns, principalmente nas motos
maiores.
Inicialmente, a empresa concentrou as vendas nas motos maiores, como as de 250
cc e 350 cc, e nem tentou vender a Supercub 50 cc, acreditando ser muito pequena para ter
qualquer aceitação no mercado:
Usávamos a Honda 50... para resolver coisas por Los Angeles. Ela chamava
bastante atenção. Um dia, recebemos uma ligação de um comprador da Sears....
percebemos o interesse da Sears. Mas ainda hesitamos em colocar as motos de 50cc no
mercado com medo de prejudicar nossa imagem em um mercado bastante masculino. Mas
quando as motos maiores começaram a quebrar, não tivemos opção. Liberamos as de
50cc. E surpreendentemente, os varejistas que queriam vender não eram lojas de motos,
mas, de artigos esportivos25.
A campanha publicitária “you meet the nicest people on a Honda” [“as pessoas mais
legais você encontra numa Honda”] foi desenvolvida por um estudante da UCLA
[Universidade da Califórnia em Los Angeles] para um trabalho em uma matéria e, de
início, sofreu resistência na Honda. A estratégia de distribuição da Honda – lojas de artigos
esportivos e de bicicletas, em vez de concessionárias de motos – foi desenvolvida para eles
e não por eles. O sucesso com as motos de menos cilindradas foi praticamente por acaso e
ocorreu devido a uma combinação de fatores: o uso da moto pelos funcionários da Honda,
que não podiam comprar motos mais sofisticadas; a reação positiva de quem via a moto; e o
fracasso das motos Honda mais potentes no mercado norte-americano.
A Honda não usou nenhuma análise para a tomada da decisão, nem houve
planejamento estratégico. Na verdade, é difícil achar que a Honda tomou qualquer decisão,
pelo menos no que diz respeito às relacionadas ao desenvolvimento de alternativas e
avaliação das opções tendo em vista as metas e a situação do mercado. A Honda foi bem-
sucedida porque soube ser flexível, aprendeu e se adaptou, e porque fez com que as
decisões dessem certo a medida em que eram tomadas. Ao entrar com um produto
inadequado em um mercado do qual nada entendiam, a Honda não desperdiçou tempo
procurando um culpado. Em vez disso, os funcionários da Honda trabalharam com
empenho para mudar a situação, por meio da criatividade e sabendo aproveitar as
oportunidades surgidas durante o processo.

24
Ibid., p. 54.
25
Ibid., p. 55.

11
O ponto é que as decisões tomadas no mundo das organizações não são as mesmas
tomadas nas escolas. Para o aluno, quando escreve a resposta e entrega o teste, o jogo
acabou. Isso não acontece na vida de uma organização. A decisão mais importante não é,
necessariamente, a primeira; é possível que seja a decisão sobre o que acontece depois e as
medidas que serão tomadas para fazer com que as coisas dêem certo. Esse é um ponto
muito relevante, pois significa que devemos nos preocupar menos com a qualidade da nossa
decisão no momento em que ela é tomada (afinal de contas, não é possível determiná-la
mesmo) e mais em nos adaptar às nossas novas decisões e às ações baseadas nas
informações vão surgindo à medida que os eventos se desenrolam. Assim como a Honda
emergiu como líder em vários segmentos de mercado norte-americanos, mais por acidente e
por tentativa e erro do que por planejamento, é preciso que os membros da organização
tenham coragem de continuar diante das adversidades e que sejam capazes de desenvolver
idéias sobre como reverter a situação. A habilidade mais importante deve ser a de saber
administrar as conseqüências de decisões. E nas organizações em que normalmente é difícil
tomar qualquer medida, a habilidade crítica pode ser a capacidade de execução.

Como fazer as coisas


Por que executar é tão difícil em tantas organizações? E por que parece que a
habilidade de implementar decisões está se tornando cada vez mais rara? Uma maneira de
pensar sobre o assunto e de examinar o papel do poder e da influência no processo de
implantação é considerar algumas maneiras de ‘como fazer com que as coisas sejam feitas’.
Uma maneira de fazer as coisas acontecerem é por meio do poder hierárquico.
Muitas pessoas acreditam que o poder é, meramente, o exercício da autoridade formal, mas
é muito mais que isso, como veremos a seguir. Todos os que trabalham em uma
organização já presenciaram o exercício do poder hierárquico. Os funcionários em cargos
mais altos têm o poder de contratar e demitir, avaliar e premiar comportamentos, e
apresentar as diretrizes a seus subordinados. As diretrizes hierárquicas são, em regra,
consideradas legítimas, pois a variação em autoridade formal é vista como parte da vida
organizacional. Assim, a frase “o chefe quer que...” ou “o presidente quer que...” é
raramente questionada ou desafiada. Quem consegue se esquecer de Oliver North 26,
Tenente-Coronel da Marinha dos Estados Unidos, durante o caso Irã-Contras, que durante
seu depoimento declarou que se prontificaria a plantar bananeira em um canto se essa fosse
a ordem do seu Comandante-Chefe e que nem uma única vez havia desobedecido a ordens
de seus superiores?
Há três problemas com a hierarquia como maneira de fazer com que as coisas sejam
feitas. O primeiro, e talvez o menos relevante, é que ela está extremamente fora de moda.
Em uma era marcada pela valorização da educação e pela democratização de todos os
processos de decisão, em uma era em que a administração participativa é defendida em
vários lugares27 e, particularmente, em um país onde acontecimentos como a Guerra do
Vietnã e o escândalo Watergate levaram muitas pessoas a desconfiar das instituições de
poder, a implementação por meio de ordens ou comandos é problemática. Para entender o

26
N. do T. Oliver North, oficial do governo Reagan envolvido na venda ilegal de armas ao Irã com o objetivo
de gerar recursos para apoiar o grupo rebelde Contra.
27
PASMORE, William A. Designing effective organizations: The Sociological Systems Perspective. New
York, NY: John Wiley, 1988. BRADFORD, David L. e COHEN, Allan R. Managing for Excellence. New
York, NY: John Wiley, 1984.

12
que quero dizer, os leitores que são pais só precisam refletir sobre a diferença na autoridade
dos pais comparando o período atual com a década de 50. Quantas vezes você foi capaz de
fazer com que seu filho fizesse alguma coisa apenas com base em seu poder de pai?
O segundo problema, mais sério em relação a autoridade, deriva do fato de que, na
prática, todos nós trabalhamos em posições em que, para realizar nosso trabalho e nossos
objetivos, precisamos da cooperação de outras pessoas que não estão, diretamente, sob
nosso comando. Em outras palavras, dependemos de pessoas que estão fora do limite de
nossa autoridade, pessoas essas que não poderíamos comandar, premiar nem punir mesmo
que quiséssemos. Talvez, assim como um gerente de linha em uma divisão de produtos,
precisamos da cooperação do pessoal de recursos humanos para contratar, do pessoal de
finanças para avaliar novas oportunidades, do pessoal de distribuição e vendas para vender
e distribuir o produto, e do pessoal de pesquisa de marketing para determinar as
características dos produtos e as estratégias de marketing e de preço. Nem mesmo o poder
de um CEO é absoluto, porque há grupos fora da esfera da organização que controlam a
habilidade de fazer com que coisas sejam feitas. Para vender rotas aéreas para o exterior
para outras empresas aéreas, é necessária a cooperação dos Ministérios dos Transportes e
da Justiça, assim como a aprovação do governo do outro país. Para lançar um novo
medicamento ou um equipamento médico, é preciso ter uma autorização da Food and Drug
Administration28. Para exportar produtos, talvez seja necessário obter licenças de
financiamento e de exportação. A autoridade hierárquica de todos os executivos e
administradores é limitada e, para a maioria de nós, é bastante limitada quando comparada
a tudo de que precisamos para realizar nosso trabalho de maneira eficiente.
Existe um terceiro problema em relação à implantação baseada, unicamente ou em
grande parte, no poder hierárquico: o que acontece se a pessoa no topo da pirâmide, aquela
cujas ordens estão sendo seguidas, estiver errada? Quando o poder está investido em uma
única pessoa, a organização pode enfrentar grandes dificuldades se as idéias ou a liderança
começar a falhar. Isso foi exatamente o que aconteceu com a E.F. Hutton, onde Robert
Fomon, o CEO, administrava a empresa por meio de uma hierarquia rígida e poder
centralizado:
A força de Fomon como líder foi também sua fraqueza. Ao imprimir sua estampa na
empresa, ele o fez mais como monarca que como CEO... Fomon cercou-se de... amigos
próximos e de pessoas que concordavam com ele, que o isolaram do mundo real. 29
Por ser tão bem-sucedido na construção de seu próprio poder hierárquico, ninguém
na empresa o desafiou a ver a nova realidade que a Hutton, e todas as outras sociedades
financeiras, enfrentavam na década de 80 30.Conseqüentemente, a Hutton não acompanhou
as mudanças no mercado mobiliário e deixou de existir como empresa independente.
Uma outra maneira de fazer com que coisas sejam feitas é desenvolver uma visão
comum ou uma cultura organizacional forte. Se as pessoas partilham do mesmo conjunto de
objetivos, de uma perspectiva comum de como e o que fazer para alcançá-los, e da mesma
linguagem que permite a coordenação dos comportamentos, o comando e a autoridade
hierárquica têm bem menos importância. Nesse caso, as pessoas serão capazes de trabalhar
28
N. do T. A Food and Drug Administration (FDA) é uma das agências do Ministério da Saúde do governo
americano responsável por regular sobre, entre outros, gêneros alimentícios, suplementos alimentares e
medicamentos.
29
STEVENS, Mark. Sudden Death: The Rise and Fall of E. F. Hutton. New York, NY: Penguin, 1989, p. 98.
30
Ibid., p. 121.

13
em cooperação sem precisar esperar por ordens dos níveis mais altos da empresa.
Administrar por meio de uma visão comum e com uma cultura organizacional forte tem
sido uma receita popular para as organizações 31. Vários artigos e livros ensinam como
estimular o comprometimento e uma visão comum e como socializar as pessoas,
principalmente quando elas entram na empresa, para que elas possuam a mesma linguagem,
os mesmos valores e premissas sobre o que precisa ser feito e como fazê-lo32.
Sem deixar de reconhecer a eficácia e a importância de uma visão e uma cultura, é
importante reconhecer que a implantação de decisões realizada por meio desses pontos
pode apresentar problemas. Primeiramente, a construção de uma concepção comum de
mundo requer tempo e esforço. Há casos em que uma organização está em crise ou está
diante de situações em que, simplesmente, não há tempo hábil para desenvolver premissas
comuns sobre como reagir. Por esse motivo, o serviço militar conta não somente com
técnicas que desenvolvem a lealdade e o espírito de equipe [esprit de corps]33, mas também
com uma cadeia hierárquica de comando e com uma tradição de obediência a ordens.
Segundo, existe o problema da dificuldade de penetração das novas idéias em uma
cultura forte. Uma cultura forte realmente constitui um paradigma organizacional que
indica como ver as coisas, quais os métodos e técnicas apropriados para resolver problemas
e quais são os assuntos e os problemas importantes34. Na ciência, um paradigma bem
desenvolvido fornece diretrizes sobre o que deve ser ensinado e em que ordem, como fazer
pesquisas, quais as metodologias apropriadas, quais são as questões de pesquisa mais
urgentes, e como formar os novos alunos35. Um paradigma estabelecido ou uma cultura
forte só é superado com grande esforço, mesmo se deixou de ser capaz de produzir novos
dados e levar a novas descobertas 36. Da mesma forma, um paradigma organizacional
fornece uma maneira de pensar e investigar o mundo, o que reduz incertezas e incentiva a
ação coletiva eficiente, mas que, inevitavelmente, acaba negligenciando ou ignorando
outras linhas de investigação. É fácil para uma cultura forte produzir um pensamento de
grupo (groupthink), uma pressão para adequar-se à visão dominante37. A visão centraliza a
atenção, mas com essa centralização, muitos pontos são deixados de lado.
Uma organização que enfrentou muitas dificuldades, mas que também obteve muito
sucesso devido à força de uma cultura forte, quase evangélica, foi a Apple Computer. A
Apple foi fundada e era inicialmente povoada por hackers da contracultura, cuja visão era a
de oferecer às pessoas uma forma de poder baseado no computador - um computador para

31
PETERS, Thomas J. e WATERMAN, Robert H. Jr. In Search of Excellence. New York, NY: Harper and
Row, 1982; DEAL, Terrence e Kennedy, Allan A. Corporate Cultures. Reading, MA: Addison-Wesley,
1982; DAVIS, Stanley. Managing Corporate Culture. Cambridge, MA: Ballinger, 1984.
32
PASCALE, Richard T. The Paradox of "Corporate Culture": Reconciling ourselves to Socialization. In:
California Management Review, 26 (1985): 26-41; O'Reilley, Charles. Corporations, Culture, and
Commitment: motivation and Social Control in Organizations. In: California Management Review, 31 (1989):
9-25.
33
DORNBUSH, Stanford M. The Military Academy as an Assimilating Institution. In: Social Forces, 33
(1955): 316-321.
34
BROWN, Richard Harvey. Bureaucracy as Praxis: Toward a Political Phenomenology of Formal
Organizations. In: Administrative Science Quarterly, 23 (1978): 365-382.
35
LODHAL, Janice e GORDON, Gerald. The Structure of Scientific Fields and the Functioning of University
Graduate Departments. In: American Sociological Review, 37 (1972): 57-72.
36
KUHN, Thomas. The Structure of Scientific Revolutions. 2ª ed. Chicago, IL: University of Chicago Press,
1970.
37
JANIS, Irving L. Victims of Groupthink. Boston, MA: Houghton Mifflin, 1972.

14
cada um. A IBM mantinha sua fatia do mercado por meio de suas relações próximas com
os departamentos centralizados de processamento de dados. A IBM era a opção segura -
dizia-se que ninguém jamais foi demitido por comprar um computador da IBM. O Apple II
marcou um gol de placa ao vender diretamente para o usuário final e não por meio do
gerente de processamento de dados da empresa, mas “no final do ano de 82, conceber uma
estratégia empresarial única para computadores pessoais começou a parecer uma boa idéia
e a óbvia escolha para coordenar essa estratégia era o gerente de processamento de
dados” 38. Além disso, computadores estavam cada vez integrados em rede; problemas de
compartilhamento de dados e compatibilidade eram críticos nas organizações que
planejavam comprar milhares de computadores pessoais. As empresas queriam um
conjunto de computadores que pudesse rodar o mesmo software para economizar na
compra de programas e também nas despesas com treinamento e programação. A versão
inicial de “uma pessoa - um computador” fez com que a Apple demorasse a perceber a
necessidade de compatibilidade e, conseqüentemente:
O Apple II não rodava programas do IBM PC; o PC não rodava programas do
Lisa; o Lisa não rodava programas do Apple II; e nenhum deles rodava programas do
Macintosh...... Graças a Steve (Jobs), a Apple tinha uma família inteira de computadores
que não se comunicava entre si39.
A cultura forte e a visão comum da Apple também colaboraram para o fracasso do
Apple II. A visão não era somente de “uma pessoa - um computador”, mas também a de um
computador que qualquer pessoa pudesse projetar, modificar e melhorar. Os sistemas
operacionais situavam-se entre o usuário e o computador e, com isso, a cultura da Apple
denegriu os sistemas operacionais: do ponto de vista dos entusiastas, o problema com um
sistema operacional era que ele dificultava a entrada no computador e a exibição de suas
habilidades, e construía uma barreira entre o usuário e a máquina. Os computadores
pessoais representavam o poder para as pessoas e os sistemas operacionais tiraram um
pouco desse poder... Não era um problema de design; era uma ameaça aos direitos
fundamentais de um povo livre 40.
O Apple III tinha um sistema operacional chamado SOS (Sophisticated Operating
System - Sistema Operacional Sofisticado) muito parecido com o sistema que a Microsoft
havia desenvolvido para o computador pessoal da IBM - o MS DOS (Microsoft Disk
Operating System - Sistema Operacional de Disco da Microsoft), mas ainda melhor em
muitos aspectos. No entanto, a empresa era demasiadamente cuidadosa com os sistemas
operacionais para tentar fazer com que o seu sistema fosse o sistema padrão, ou mesmo um
dos sistemas padrão, em computadores pessoais. Assim, a empresa perdeu várias
oportunidades comerciais. O mesmo fervor que fazia com que o trabalho na Apple fosse
como as cruzadas e produzisse níveis extraordinários de comprometimento da força de
trabalho fez com que a empresa tivesse dificuldade em reconhecer e reagir às mudanças no
mercado de computadores pessoais.
Existe um terceiro processo de implantação nas organizações, que é o uso do poder
e da influência. Com o poder e a influência, a ênfase é no método e não na estrutura. É

38
ROSE, frank. West of Eden: The End of Innocence at Apple Computer. New York, NY: Viking Penguin,
1989, p. 81.
39
Ibid., p. 85.
40
Ibid., p. 97.

15
possível exercer o poder e a influência sem, necessariamente, ter ou usar autoridade formal.
Nem é necessário contar com uma cultura organizacional forte e com a homogeneidade que
essa cultura implica. Logicamente, o processo de implantação por meio do poder e da
influência não acontece sem problemas próprios a ele. O importante é entender o poder e a
influência como um conjunto de maneiras de fazer com que coisas sejam feitas - não a
única, mas sem dúvida uma maneira importante.
A partir do exposto, é possível perceber que o processo de implantação está cada
vez mais difícil porque: (1) as mudanças em normas sociais e uma maior interdependência
dentro das organizações deixaram o poder formal e tradicional menos eficiente que antes, e
(2) está cada vez mais difícil desenvolver uma visão comum em organizações compostas de
pessoas heterogêneas – heterogêneas em termos de raça, sexo, língua e cultura. Ao mesmo
tempo, nossa ambivalência em relação ao poder e a ausência de programas sobre o uso do
poder significam que os funcionários, muitas vezes , não são capazes de complementar o
poder que têm com os processos “extra- oficiais” de poder e influência. Conseqüentemente,
as organizações agonizam e projetos promissores não saem do papel. Por tudo isso, é muito
importante aprender a gerenciar com poder.

O processo de gerenciamento: a perspectiva do poder


Da perspectiva do poder e da influência, o processo de implantação envolve um
conjunto de etapas, descritas abaixo:
 Decidir quais são os seus objetivos, o que você está tentando realizar.
 Fazer um diagnóstico dos padrões de dependência e interdependência; quais
as pessoas que exercem influência e são importantes para que você alcance o
seu objetivo?
 Quais são os pontos de vista prováveis dessas pessoas? Como elas se
sentirão em relação àquilo que você está tentando fazer?
 Quais são as bases do poder delas? Qual dessas bases é mais influente na
decisão?
 Quais são as bases de poder dos outros? Que bases de influência você pode
desenvolver para ganhar mais controle da situação?
 Quais das muitas estratégias e táticas de exercício de poder são as mais
apropriadas e eficientes tendo em vista a situação?
 Com base nos pontos acima, traçar um plano de ação para fazer com que as
coisas sejam feitas.
O primeiro passo é estabelecer os objetivos. Por exemplo, é mais fácil dirigir de
Albany, no estado de Nova York, para Austin, no Texas, conhecendo o destino que,
simplesmente, pegando o carro e dirigindo aleatoriamente. Apesar de, aparentemente, ser
algo óbvio, esse é um ponto freqüentemente negligenciado no contexto empresarial.
Quantas vezes você foi a reuniões ou conferências, ou conversou com alguém ao telefone
sem ter uma idéia clara do que você está tentando realizar? Nossa agenda está sempre
repleta de compromissos e muitas interações acontecem de maneira inesperada ao longo do
dia. Se não tivermos metas claras e se não soubermos quais são os nossos objetivos básicos,
é pouco provável que consigamos alcançá-los. Um dos temas que Tom Peters desenvolveu
no início de sua obra foi a importância da consistência com o propósito. Possuir um
cronograma, conhecer a língua, saber o que é medido e sobre o que é falado – tudo isso está

16
relacionado àquilo que a organização está tentando alcançar 41. Acontece o mesmo com as
pessoas na medida em que toda interação, toda reunião e toda conferência são orientadas
para o mesmo objetivo, é mais provável que esse objetivo seja alcançado.
Tendo a meta em mente, é necessário determinar quem é importante para fazer com
que o seu objetivo seja alcançado. É preciso determinar os padrões de dependência e
interdependência entre as pessoas e descobrir como elas se sentem em relação ao que você
está tentando fazer. Como parte do diagnóstico, é necessário conhecer, também, o provável
desenrolar dos eventos e saber avaliar o papel do poder e da influência no processo. Para
realizar algo, é fundamental conhecer o jogo, os jogadores e quais são suas posições. Uma
pessoa pode ficar machucada se for jogar futebol americano em uniforme de basquete, ou
não souber distinguir o ataque da defesa. Já vi muitos executivos inteligentes e bem-
sucedidos enfrentarem problemas por não terem conseguido identificar a natureza política
de uma situação ou por terem sido surpreendidos por alguém cuja posição e força eles não
tiveram a capacidade de antecipar.
Depois de ter uma visão clara do jogo, é importante verificar as bases de poder dos
outros jogadores assim como as suas próprias fontes, atuais e futuras, de poder. Dessa
forma, será possível determinar a sua força e a força dos demais jogadores. Entender as
fontes de poder é um fator crítico para diagnosticar o que vai acontecer em u ma
organização, assim como para preparar-se para agir.
Finalmente, é preciso refletir, cuidadosamente, sobre as variadas estratégias ou, para
usar um termo menos grandioso, sobre as táticas à sua disposição, assim como sobre
aquelas que poderão ser usadas por outros envolvidos nos processo. Essas táticas ajudam no
uso do poder e da influência de maneira eficiente e podem também ajudar na defesa contra
o uso do poder por parte dos outros.
O poder é definido aqui como a habilidade em potencial de influenciar
comportamentos, mudar o curso dos eventos, superar resistências e fazer com queas
pessoas façam aquilo que, de outra forma, não fariam 42. A política e a influência são os
processos, as ações, os comportamentos por meio dos quais esse poder em potencial é
usado e exercido.

O que significa gerenciar com poder?


Primeiramente, significa reconhecer que em quase todas as organizações existem
interesses diversos. Isso sugere que uma das primeiras coisas a serem feitas é diagnosticar o
cenário político e descobrir quais são os interesses relevantes e quais as subdivisões
políticas importantes que caracterizam a organização. É fundamental que não se parta do
pressuposto que todos serão nossos amigos ou concordarão conosco, ou mesmo que as
preferências são distribuídas de maneira uniforme. Há muitos grupos de interesses dentro
das organizações e é necessário saber onde eles estão e a quem eles pertencem.
Além disso, significa descobrir qual o ponto de vista dessas pessoas e desses grupos
em relação a assuntos que nos dizem respeito. Significa também entender o porquê de eles
terem a opinião que têm. É muito fácil acreditar que aqueles que possuem um ponto de
vista diferente do nosso são menos inteligentes, menos informados e menos perspicazes. Se

41
PETERS, Thomas J.. Symbols, Patterns, and Settings: an Optimistic Case for Getting Things Done". In:
Organizational Dynamics, 7 (1978): 3-23.
42
PFEFFER, Jeffrey. Power in Organizations. Marshfield, MA: Pitman Publishing, 1981; KANTER, op. cit.;
EMERSON, Richard M. Power-Dependence Relations. In: American Sociological Review, 27 (1962): 31-41.

17
acreditarmos mesmo nisso, é muito provável que façamos coisas desastrosas.
Primeiramente, talvez tenhamos uma atitude arrogante em relação àqueles que discordam
do nosso ponto de vista – afinal de contas, se eles não são tão competentes nem brilhantes
como a gente, por que deveriam ser levados a sério? Além disso, não é nada difícil
relacionar-se bem com pessoas que têm personalidade e opiniões parecidas com as nossas.
O verdadeiro segredo do sucesso nas organizações está na habilidade em fazer com que as
pessoas que discordam de nós, e de quem não gostamos, façam o que precisa ser feito. Em
segundo lugar, se consideramos as pessoas mal-informadas, provavelmente tentaremos
“informá-las”, ou de tentaremos convencê-las com fatos e análises. Algumas vezes isso
pode dar certo, mas, em regra, não dá, pois a discordância pode não estar fundamentada na
falta de informação. Pelo contrário, ela pode ter surgido de uma perspectiva diferente sobre
o significado da informação. Fazer um diagnóstico do ponto de vista de grupos de interesse,
bem como das razões por trás de suas posições, pode nos ajudar a negociar com essas
pessoas ao passarmos a ter condições de prever suas reações frente às várias iniciativas.
Em terceiro lugar, gerenciar com poder significa entender que para que uma coisa
seja realizada é preciso ter poder – ter mais poder que aqueles cuja oposição você precisa
enfrentar – e, assim, é imprescindível entender a origem do poder e como as fontes dele
podem ser desenvolvidas. Algumas vezes relutamos em refletir objetiva e estrategicamente
sobre como adquirir e usar o poder. A tendência é acreditarmos que se fizermos o melhor,
trabalharmos muito, tentarmos tomar boas decisões, formos gentis, etc., tudo vai acontecer
da melhor maneira possível. Não quero sugerir que não devamos trabalhar muito, tentar
tomar boas decisões e ser gentis, mas esses e outros clichês geralmente não são de grande
valia quando é preciso que as coisas sejam feitas na organização. Devemos entender o
poder e tentar alcançá-lo. Devemos estar dispostos a construir nossas próprias fontes de
poder ou, então, seremos menos eficientes do que gostaríamos de ser.
Em quarto lugar, gerenciar com poder significa entender as estratégias e táticas por
meio das quais o poder é desenvolvido e utilizado nas organizações, incluindo a
importância do momento, do uso da estrutura, da psicologia do comprometimento e outras
formas de influência interpessoal. No mínimo, esse entendimento nos ajudará a ser
observadores perspicazes do comportamento de outras pessoas. Quanto mais entendermos
sobre o poder e suas manifestações, melhor será nossa habilidade clínica. Mas,
essencialmente, precisamos entender as estratégias e táticas do poder para sermos capazes
de avaliar as abordagens à nossa disposição e de usar o que tende a ser eficiente.
Voltamos a insistir no fato de que, assim como no caso da construção de nossas
fontes de poder, em regra, evitamos pensar sobre o tema do poder e deixamos de agir de
maneira estratégica ou objetiva ao exercê-lo. Isso é um erro. Apesar de termos várias
dúvidas, haverá pessoas que não terão. Conhecimento sem poder é de pouquíssima
utilidade. E o poder sem a habilidade para exercê-lo tende a ser desperdiçado.
Gerenciar com poder é muito mais que conhecer as idéias discutidas neste artigo.
Significa estar disposto, assim como Henry Ford, a fazer alguma coisa com esse
conhecimento. Para fazer com que as coisas sejam feitas, é necessário traquejo político e
vontade de se impor. Durante anos nos Estados Unidos, houve muitas passeatas e protestos,
decisões judiciais e propostas de leis na tentativa de acabar com a discriminação contra as
minorias americanas nas áreas de emprego e habitação pública. A legislação sobre os
direitos civis era uma das prioridades do Presidente Kennedy, mas apesar de ter carisma,
ele não possuía o conhecimento das táticas políticas ou, possivelmente, não tinha a vontade
de usar algumas das táticas mais poderosas para fazer seus projetos de lei serem aprovados.

18
Nas mãos de alguém que entendesse sobre o poder e a influência a fundo, apesar da
oposição dos membros do congresso e dos senadores do sul, a legislação teria sido
aprovada mais rapidamente.
Em março de 1965, os Estados Unidos estavam abalados por violentas reações e
protestos pelos direitos civis no sul do país. Houve muitos mortos e feridos durante o
ataque de segregacionistas contra os manifestantes sem que houvesse praticamente
nenhuma intervenção da polícia local. Havia manifestantes em vigília em frente à Casa
Branca quando Lyndon Johnson deixou o local para falar em uma sessão conjunta no
congresso. O mesmo Lyndon Johnson que, em 1948, não era a favor da legislação federal
contra o linchamento (nota de tradutor: infelizmente, uma prática comum usada
predominantemente contra negros na região sul naquela época) e usou o argumento que se
tratava de um assunto da competência dos estados e não da União. O mesmo Lyndon
Johnson que, na época em que era um jovem deputado e posteriormente como senador,
negociou com os conservadores como se fosse um conservador, com os liberais como um
se fosse um liberal e que era considerado por muitos um político sem propostas. O mesmo
Lyndon Johnson que, durante os oito anos no Congresso, não apresentou nenhum projeto
de lei significativo e, praticamente, não fez nenhum pronunciamento sobre as questões de
importância nacional. O mesmo Lyndon Johnson que tirou proveito de seu mandato no
Congresso para enriquecer por meio da influência que exerceu sobre seus colegas na
Comissão Federal para as Comunicações [Federal Communications Commision] para obter
uma estação de rádio em Austin, no Texas, e, depois, a alterar a concessão para que a
estação se passasse a ser extremamente lucrativa e valiosa. O mesmo Lyndon Johnson que,
em 1968, tendo enganado o povo americano, decidiu não se candidatar à reeleição por estar
associado à Guerra do Vietnam e à falta de confiança na presidência. Naquela noite,
Johnson faria uso vigoroso de seu poder e de sua habilidade política para ajudar o
movimento pelos direitos civis:
Com as primeiras palavras de seu discurso, os ouvintes .... sabiam que Lyndon
Johnson tinha a intenção de levar a causa dos direitos civis muito além de onde ela já
tinha chegado... Ele apresentaria um novo projeto de lei de direitos civis... que seria muito
mais forte que os projetos anteriores... "a causa deles deve ser a nossa causa também",
disse Lyndon Johnson. "Pois, não apenas os negros, mas todos nós devemos superar nosso
triste legado de preconceito e injustiça. .. E vamos superá-lo"43.
Ao deixar a câmara após o discurso, Johnson procurou o presidente da Comissão de
Justiça da Câmara, Emmanuel Celler, de 76 anos:
"Manny", ele disse, "Eu quero iniciar a sessão hoje à noite".
"Sr. Presidente,"Celler protestou, "Não posso pressionar a comissão, pois podemos
perder o controle. Vou marcar as sessões para a próxima semana".
... Johnson baixou os olhos e sua expressão ficou séria. Sua mão direita ainda
estava apertando a mão de Celler, mas a mão esquerda estava levantada com o indicador
apontando.
"Inicie as sessões esta semana, Manny". "E faça sessões à noite também"44.

43
CARO, Robert. Means of Ascent: The Years of Lyndon Johnson. New York: NY: Alfred A. Knopf, 1990,
pp. xix - xx.
44
Ibid., p. xxi.

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Fazer com que as coisas sejam feitas requer poder. O problema é que gostaríamos
de ver o mundo como um grande jogo moral, em que os mocinhos e os bandidos são
facilmente identificáveis. A obtenção e o uso do poder não são sempre processos atraentes.
E o fato de ter sido um homem ardiloso como Lyndon Johnson o homem capaz de obter,
praticamente sozinho, a aprovação, para o maior número de leis sobre os direitos civis no
menor espaço de tempo e com mais impacto que qualquer outra pessoa na história dos
Estados Unidos incomoda o nosso senso de simetria. A questão de os meios justificarem os
fins é perturbadora. Ficamos perplexos com o fato de que pessoas “ruins” algumas vezes
fazem coisas grandiosas e maravilhosas, e que pessoas “boas” às vezes fazem coisas
“ruins”, ou que muitas vezes não fazem nada. Todos os dias administradores de instituições
públicas e privadas adquirem e empregam o poder parar fazer com que as coisas sejam
feitas. Algumas dessas coisas podem ser equivocadas quando analisadas posteriormente,
mas isso depende, em grande parte, do ponto de vista. Se você é uma pessoa que sempre
toma a decisão certa e que agrada a todos, entre em contato comigo imediatamente – vamos
fazer uma fortuna!. Cometer erros ou sofrer oposição é inevitável. O que não é inevitável é
a passividade, a omissão, a tentativa de fazer alguma coisa.
Em vários ramos, não chatear ninguém ou não cometer erros é, praticamente, uma
obsessão e acabamos por nos acomodar e a não fazer nada. Em vez de decidir reconstruir as
estradas de São Francisco, mesmo que no local errado ou, até mesmo, da maneira errada,
não fazemos nada e a cidade entra em declínio econômico por não contar com transporte
adequado. Em vez de arriscar cometer um erro com um novo produto, como um
computador pessoal, realizamos intermináveis pesquisas e análise e vemos passar as
oportunidades de mercado passar. É bom realizar análises e pesquisas. O que não é bom é a
paralisia e omissão que surgem devido inabilidade de enfrentar as resistências que,
inevitavelmente, acompanham as mudanças e da falta de interesse em superá-las.
Theodore Roosevelt, ao fazer um discurso na Sorbonne, em 1910, talvez tenha dito
o melhor sobre esse assunto:
Não é o crítico que conta; não é o homem que aponta como o homem forte tropeça,
ou onde o agente de uma ação poderia ter feito melhor. O crédito pertence ao homem que
está na arena, cujo rosto está sujo de poeira, suor e sangue; que luta com coragem; que se
engana e que erra de novo e de novo; porque não existe esforço sem erro e deficiências;
mas aquele que realmente luta parar fazer com que as coisas sejam feitas; aquele que
conhece os grandes entusiasmos, as grandes devoções; aquele que se doa a uma causa
nobre, aquele que, no melhor cenário, reconhece, no final, os triunfos de uma grande
realização e aquele, que no pior cenário, se fracassar, pelo menos fracassou ousando, de
maneira que o lugar dele nunca será como o daquelas almas frias e tímidas que não
conhecem nem a vitória, nem a derrota45.
É fácil e, em regra, é confortável sentir-se impotente e - dizer: “Não sei o que fazer, não
tenho poder para fazer nada e, além disso, não tenho estômago para engolir o esforço
necessário”. Hoje em dia é fácil e bastante comum, ao se identificar um erro na
organização, dizer: “Não é minha responsabilidade, não posso fazer nada sobre isso e se a
empresa quer fazer isso, é para isso que os altos executivos ganham dinheiro – a
responsabilidade é deles”. Esse tipo de reação é uma boa desculpa para não fazer nada; para
não tentar superar os obstáculos. É uma maneira de fazer menos inimigos e correr menos

45
NIXON, op.cit., p. 345.

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risco de passar vergonha. No entanto, essa é uma dica para fracassar tanto organizacional
quanto pessoalmente. É por isso que o poder e a influência não são um segredo sujo da
organização, mas o segredo para o sucesso das pessoas e das organizações. Inovações e
transformações em quase todas as áreas requerem habilidade para desenvolver o poder e a
vontade de exercê-lo para fazer coisas acontecerem. Ou, nas palavras de um radialista local,
“Se você não está gostando das notícias, saia de casa e faça a notícia”.

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