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LINGUAGEM

CINEMATOGRÁFICA
narrando com imagens
JORGE MONCLAR

LINGUAGEM
CINEMATOGRÁFICA
narrando com imagens

1ª EDIÇÃO

Rio de Janeiro
Jorge Monclar
2009
Capa
Thyago Maia

Revisão
Damião Nascimento

Diagramação
Abreu´s System

CIP-BR ASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
Monclar, Jorge, 1944
Linguagem Cinematográfica, Narrando com imagens/Jorge Monclar.
Rio de Janeiro. Jorge Monclar 2009.

ISBN

1. Linguagem Cinematográfica – Rio de Janeiro (RJ) – Cinema. 1.


Título.

Todos os direitos reservados a Jorge Monclar


Rua Jardim Botânico, 601, sobrado – Jardim Botânico
Rio de Janeiro – RJ – CEP 22.470-050
Tel. (21) 3874-0012 2239-8291
j.monclar@aictv.com.br
Sumário

1. O alfabeto visual ..........................................................................7

2. Posições de Câmera ..................................................................31

3. Movimentos de Câmera...........................................................39

4. A Pontuação ...............................................................................53

5. Continuidade e eixo dramático ..............................................65

6. Situações dramáticas.................................................................73

7. Concluindo .............................................................................. 123


Capítulo Um

O alfabeto visual

D esde que o homem existe sobre a face da terra, buscou


uma forma de registrar visualmente a sua presença. Re-
produzir o seu grupo social e registrar os seus hábitos, mesmo
que ainda não tivesse desenvolvido uma grafia que corres-
pondesse à fonética do seu idioma. Os desenhos primitivos
nas paredes das cavernas da pré-história, nos portais dos mo-
numentos gregos e nas pirâmides do Egito são testemunhos
disso.
Através dos tempos da história da humanidade o homem
desenvolveu formas e materiais para reproduzir a sua imagem
e suas crenças. Através do desenho, da escultura, da pintura
e finalmente da fotografia, registrou para a posteridade a sua
imagem e a do seu semelhante ou grupo social. Seus hábitos e
suas crenças. Sua maneira de viver, transcender ao seu tempo e
sonhar com a eternidade.
Percebemos de imediato que a linguagem de representação
visual sempre foi sua maneira de se expressar. E, em todos estes
estágios de sua evolução cultural a imagem foi sua ferramenta
de registro. Porém, sempre representava um momento do mo-
vimento, mas num registro estático.
Em todas as culturas sempre se tentou reproduzir o movi-
mento, não um trecho dele. O movimento em sua totalidade.
Por mais expressivos que fossem os desenhos primitivos, eram
sempre congelados e apenas uma fração do movimento. Em
outros estágios da civilização: pintores, desenhistas e esculto-
res das mais variadas nacionalidades conseguiram captar com

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maestria e talento um momento desse movimento, mas não sua
continuidade e totalidade.
No final do século XIX muitos fotógrafos já faziam seus ex-
perimentos visando a captar e reproduzir o movimento numa
sequência de fotos fixas. A experiência dos irmãos franceses
August e Louis Lumière, da cidade de Lyon, era a mais espan-
tosa: o cinematógrafo. Esta máquina revolucionaria na arte de
captar e reproduzir imagens em movimento. Tornar-se-ia o ins-
trumento de uma nova forma de expressão, informação e regis-
tro da história do homem. Um novo divertimento e uma forma
de obter o conhecimento global de nosso planeta e do próprio
homem. Gerou um novo discurso, e, conseqüentemente, uma
gramática própria; dissociada da literatura, do teatro, da música,
da pintura e outras formas de expressão até então conhecidas.
Não era a negação destas formas de expressão anteriores, mas
de certa maneira, a reunião de todas elas num conjunto novo,
com novos signos, compostos por: planos visuais, movimentos
tal qual o olhar humano, posicionamentos, composição, pers-
pectiva, formas de pontuação. O cinema consolidava-se como
uma outra forma narrativa e de expressão. Com uma linguagem
aplicável em outros novos veículos contemporâneos, tais como:
a televisão digital, a telefonia móvel e a Internet. Uma gramática
que foi sendo criada através do desenvolvimento de sua forma
de expressar, do ponto de vista artístico e tecnológico.
Qualquer forma de escritura tem seu alfabeto, sua gramáti-
ca, regras de redação e pontuação. Nestes últimos cem anos, o
cinema criou e desenvolveu a sua linguagem.
Desde que o cinema rodou a primeira imagem em movi-
mento (1895) com as câmeras a manivela, empregou um plano
para se expressar visualmente. O plano torna-se a primeira letra
desse novo alfabeto visual. Esta escritura em planos (ou trechos
narrativos visuais), que é a sua característica, ainda teria que
evoluir muito para atingir uma gramática própria. Esta máqui-
na de narrar com imagens tornar-se-ia, entre tantas, a invenção
do século XX.

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O cinema nasceu visual, em preto e branco e mudo. No
momento de sua invenção, o mundo não dispunha ainda da ca-
pacidade tecnológica de captar os sons simultaneamente com
imagens coloridas. Essa impossibilidade foi talvez um dos mo-
tivos do seu rápido aprimoramento narrativo. Essa nova forma
de expressão tinha que se expressar apenas visualmente. Não se
podia fazer valer do recurso do som. Teria que buscar novos e
diferentes planos visuais para contar suas historias.
No início de sua existência, o cinema ainda empregou
meios de outra escritura para ajudar a expressar-se. Usava en-
tre os planos visuais filmados, “cartelas” escritas no idioma do
cineasta, contando ou complementando o que se passava nas
imagens. Era nada mais do que uma literatura ilustrada, com
fotos em movimento. Um teatro visual, sem falas, representado
para as câmeras. E uma outra vertente com um cinema factual,
quase que documental ilustrado.
A busca de concisão narrativa fez com que os cineastas de
então fossem progressivamente substituindo o uso destas car-
telas, que intercalavam as imagens, por uma narrativa visual que
contasse a história ou reportasse um fato.
O cinema em seus primórdios era apenas factual, docu-
mental. Não ressentia da falta de outros tamanhos de planos
enquadrados pela câmera. Quando o ator-dramaturgo e mágico
George Meliès teve a idéia de filmar a sua peça teatral: “Viagem
à Lua”, criou sem intenção, um gênero de cinema – o ficcional. E
sem que os personagens, cineastas e técnicos percebessem, pas-
saram a utilizar o tempo dramático. Um tempo síntese do real.
Na medida em que o cinema descobriu o gênero ficcio-
nal, tornou-se necessário enquadramentos diferentes do que
o usado até então: o plano geral. Testam-se novas posições de
câmera, colocando o espectador em locais diferentes do que
normalmente estava habituado, ao assistir a um espetáculo. Ini-
cialmente empregava-se até então, uma posição de câmera qua-
se sempre frontal, como uma “boca de cena” teatral e filmada
na altura dos olhos do cinegrafista.

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O emprego de apenas um formato de enquadramento (o
Plano Geral) no recém-nascido cinema decorria da incapacida-
de tecnológica das lentes empregadas nas câmeras. Os cineas-
tas eram condicionados a filmar em enquadramentos abertos,
amplos, em plano geral. As focais ou lentes não dispunham da
capacidade de aproximação (foco), menor do que três metros
de distância mínima da câmera. Isso inviabilizava outros tipos
de planos ou enquadramentos. E o afastamento maior era im-
possível devido a uma profundidade de foco limitada a cerca de
cinco metros. Os negativos de então possuíam também muito
pouca sensibilidade. Isso não facilitava no ganho da profundi-
dade focal.
Na virada do século XIX para o XX, quando se deu a Re-
volução Industrial, com o salto tecnológico obtido em várias
áreas da ciência, o cinematógrafo pôde se beneficiar e aperfei-
çoar-se como equipamento, seus acessórios e lentes, seus su-
portes de imagem (películas) e, conseqüentemente, apurar a
sua narrativa.
A captação e controle da energia elétrica, a criação das lâm-
padas elétricas, a invenção dos motores elétricos, a explosão e
todos os avanços científicos do século XX iriam colaborar com
o desenvolvimento deste novo meio de expressão, informação
e documentação.
Costuma-se dizer que o cinema nasceu na hora certa e
no lugar certo. O cinema nasce em pleno processo das gran-
des invenções e no centro mais avançado do mundo de então:
a Europa. Pôde, com isso, se beneficiar de todos os avanços
tecnocientíficos e tornar-se o lazer do século, avançando sua
narrativa em parceria com o desenvolvimento da tecnologia de
outros vários setores.
Esse conjunto de fatos colocou a indústria do cinema
como a mais importante do entretenimento mundial. O ci-
nema nasceu para as massas, se globalizou e elas se tornaram
exigentes, querendo sempre novos espetáculos e novidades
tecnológicas cada vez mais surpreendentes. Esse contínuo

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movimento em torno da atividade cinematográfica carreou
muitos recursos para essa indústria nascente. Estabeleceu
pressões comerciais na busca de novas histórias, formas de
narrar e o emprego de novas tecnologias, visando agradar, di-
vertir, emocionar, mas, sobretudo, atrair e manter esse novo
grande público.
Os cineastas e técnicos de cinema do início do século XX,
criadores desses filmes, muito pesquisaram e experimentaram
para melhorar a sua narrativa. Aquela única letra do alfabeto
de até então – o plano geral não era mais suficiente para narrar
as histórias de ficção. O cinema não pertencia mais apenas aos
franceses. Era da Europa e do mundo inteiro. Em toda parte do
planeta desejava-se captar imagens em movimento, criar histó-
rias, registrar fatos e fazê-las circular pelo mundo. A máquina
dos irmãos Lumière foi copiada, modificada, espalhando-se
pelos países.
O cinema torna-se uma arte narrativa de todas as culturas
onde tudo se copiava, adaptava e se modificava. Foi a primeira
atividade a nascer globalizada, muito antes disso se falar. Através
do cinema, viajávamos para outros países, conhecíamos outras
culturas e histórias. Era a primeira vez que o homem comum
tomava consciência do mundo como um todo. Descobríamos
que vivíamos num só planeta. Mas quais foram as consequên-
cias concretas para a atividade cinematográfica?
A principal e imediata foi o aprimoramento da narrativa.
Pesquisou-se bastante na área da ótica. Criaram condições
para o desenvolvimento de novas lentes que supriam as ne-
cessidades dos cineastas: novos enquadramentos. As lentes
passaram a ter uma qualidade invejável. A química viabilizou
novos filmes, mais sensíveis às luzes artificiais e naturais. Com
isso, progressivamente, criam-se novos enquadramentos =
planos.
Os ingleses desenvolveram uma lente que reduzia a distân-
cia focal e obtinha o enquadramento de um rosto, preenchendo
toda a tela: o plano em close up. Esta mesma lente leva os france-

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ses a terem a idéia de enquadrar os objetos ou trechos de uma
cena, e cria-se um outro plano, com uma nova nomenclatura:
o plano de detalhe. Estas duas novas letras do alfabeto visual em
formação ganham o mundo e impõem mudanças na arte de
contar histórias com imagens, ainda sem som.
Os planos continuavam a ser experimentados por vários
povos. Em todo o mundo cinematográfico, buscava-se um en-
quadramento = plano, de tamanho médio, do ponto de vista
dramático, entre o close up (até então o plano mais fechado)
e um plano aberto, (o plano geral). Os franceses encontraram
esse enquadramento, que logo se popularizou. Um plano que
enquadrava a figura humana dos pés à cabeça e que foi, conse-
quentemente, denominado plano médio.
Os americanos, com sua indústria cinematográfica em ple-
no desenvolvimento, não estavam de acordo em relação a este
enquadramento, como uma média dramática entre os planos
existentes.
Na opinião dos cineastas americanos, o tal plano médio
defendido pelos europeus era um full shot (um plano cheio).
Achavam que a média dramática seria um enquadramento
ainda menor, cortando a figura humana na altura da cintura
ou dos joelhos. A esse enquadramento os americanos chama-
ram de midle shot (plano médio), em desacordo com o resto
do mundo, que produzia cinema até então. Em contrapartida,
os demais cineastas do planeta passaram a chamar a este plano
criado pelos americanos, da figura cortada na cintura, de: plano
dos americanos, estabelecendo-se no alfabeto visual como: pla-
no americano.
Discordâncias à parte, rapidamente o alfabeto dessa nova
linguagem se enriquecia. Não só por causa da variedade de ta-
manhos de planos, mas também pelas experiências de movi-
mentos e posicionamentos da câmera. Falaremos mais sobre
questionamentos na ordenação dos planos quando justapostos
e a relação dramática entre eles, pelo tempo de permanência na
tela durante a narrativa.

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No momento, nos dedicaremos às novas letras deste alfa-
beto que são os planos e sobretudo, entender o que é um plano
cinematográfico.

Plano
É o instante compreendido entre o momento em que liga-
mos a câmera (ou o motor da câmera é acionado) e o diretor
do filme de ficção, de publicidade, videoclipe, documentaris-
ta ou jornalista grita para a sua equipe: “Ação! ou Roda!” até
o momento em que ele ordena: “Corta!” (e a câmera é desli-
gada).
Essas imagens captadas são impressas num suporte (que
pode ser filme, fita magnética, cartão digital ou apenas sinal di-
gital). A esse trecho temporal, denominamos de plano.
Um plano pode ter vários tamanhos ou enquadramentos
na tela. Cada enquadramento, conforme seu tamanho, recebe
um nome específico que é universal. É o mesmo em todas as
cinematografias do planeta. Esses planos podem ser fixos ou
em movimento.
O alfabeto cinematográfico e agora do audiovisual em
geral, devido ao desenvolvimento de outras mídias que usam
imagens e sons para se expressar e informar, é constituído dos
seguintes planos:

Plano Geral, Close-Up, Plano de Detalhe,


Plano Médio e Plano Americano

Recapitulando, podemos dizer que o alfabeto audiovisual


constitui-se destas cinco letras = planos. Será com eles que
formaremos palavras e frases visuais dessa nova gramática au-
diovisual. E essa nomenclatura corresponde, precisamente, ao
tamanho do enquadramento na tela, a saber:

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Plano Geral – É o maior espaço possível ou desejável enquadrado de um am-
biente, onde se passam as ações dramáticas, documentais ou
factuais.
Close-Up – É o enquadramento de um rosto ocupando toda a tela.
Plano Detalhe – É o enquadramento de um objeto ou de um detalhe da cena
ocupando todo o espaço da tela, dando-lhe destaque ou ên-
fase na narrativa.
Plano Médio – É o plano que enquadra a figura humana dos pés até a cabeça.
A média visual dramática entre os planos fechados e os mais
abertos.
Plano Americano – É o plano que enquadra a figura humana cortada na altu-
ra, das coxas, da cintura ou do peito.

Existem casos especiais e excepcionais em que o diretor do


filme ou obra audiovisual, para obter determinado efeito dra-
mático temporal, resolve reunir vários planos em um só, varian-
do o tamanho dos enquadramentos durante a cena e a captação
do plano, mas sem corte. A este plano denominaremos plano-
sequência. Ou seja, uma seqüência pode ser contada com um
só plano ou vários curtos planos-sequência. Assim como, por um
conjunto de diferentes planos.
Na atividade audiovisual, costumamos afirmar que um con-
junto de planos reunidos e ordenados, narram uma seqüência
dramática.

Sequência
Sequência é um local onde narramos um conjunto de ações
em planos. Cada locação onde filmamos constitui-se numa se-
quência.
Para que um filme seja rodado, necessitamos reunir pes-
soas das mais variadas especialidades(operador de câmera,
técnico de som, figurinista, maquiador, e etc). Os trabalhos
das filmagens devem ser previamente organizados, tendo um
documento como guia (roteiro da história que contaremos nas
telas).

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Um roteiro organiza as sequências com seus respectivos
diálogos ou entrevistas a serem filmadas, sequencialmente, em
vários locais ou em estúdio. Cada sequência deve estar nume-
rada na ordem que irá para as telas quando estiver terminado.
E cada sequência, contada ou narrada por um determinado nú-
mero de planos, que serão filmados, para que não percamos o
fio da história que o diretor deseja contar.
Simplificando, a sequência é cada ambiente ou local em que
iremos desenvolver uma ação dramática. Todo diretor decupa
ou detalha cada seqüência em planos, que depois justaporá em
ordem numérica para formar suas frases visuais narrativas.
Pela prática de produção de filmes ou vídeos, podemos
afirmar que um filme de curta-metragem ou obra audiovisual
de ficção de 10 minutos, emprega aproximadamente 60 planos
para narrar a sua história.
Um filme publicitário de 30 segundos de duração, entre 3
a 26 planos, decupando-se em 3 planos de 8” ou 6 planos de 4”
ou ainda 27 planos de 2” e mais um plano de pack shot* de 5”. E,
1” utilizados nas fusões.
Um filme de longa-metragem, com duração entre 70 e 120
minutos, necessita de 700 a 1.000 planos para contar sua histo-
ria de ficção.

Princípios de uma narrativa fluida e objetiva


Como vimos, o discurso cinematográfico se faz em planos
narrativos, que são a transposição de descrições de um texto
literário específico (o roteiro), em planos visuais a serem filma-
dos ou gravados e, em seguida, justapostos um após o outro na
edição. Portanto, decupamos as frases ou descrições literárias e
transpomos em planos. Esses planos se reúnem em blocos nar-
rativos que são as sequências dramáticas, organizadas em or-

* pack shot – apresentação do produto anunciado em separado acompanha-


do do seu slogan e assinatura gráfica ou logomarca e sonora.

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dem cronológica no roteiro, conforme se imagina o filme ou
vídeo finalizado na tela.
O roteiro é então uma narrativa literária visual do filme
com as ações dos personagens e os seus respectivos diálogos
e a decupagem, o seu detalhamento em planos a serem filma-
dos. Essa decupagem trata-se de um planejamento prévio dos
planos que serão necessários na edição final. Nesta etapa final,
a essas imagens serão acrescidos sons dramáticos (música + ruí-
dos + dublagens e narrativas of).
Para trabalharmos com um discurso visual de forma orga-
nizada, necessitamos seguir estas etapas: argumento, roteiro,
decupagem do roteiro em planos, filmagem e edição final dos
planos.

Idéia = argumento = sinopse


(uma idéia síntese da história, fato ou matéria)
roteiro
(um conjunto de sequências cronológicas de ações e diálogos)
Decupagem
(transposição do roteiro em planos visuais)
filme ou vídeo
(edição cronológica dos planos filmados)

Um roteiro de qualidade apresenta em sua narrativa, uma


objetividade visual dramática bem precisa, onde cada frase pra-
ticamente corresponde a um determinado plano (incluindo in-
diretamente seu movimento e posicionamento).
Não se trata de um texto repleto de informações técnicas.
Mas aquilo que vai se ver na tela. É um conjunto de descrição
visual sintética, das ações e seus diálogos. Essas ações, reunidas
em sequências em geral narradas em até três minutos (duas pá-
ginas de um roteiro no formato padrão internacional) e as frases
visuais (compostas de planos) não devem ser muito longas. Evi-
ta-se também diálogos muito extensos, construídos no máximo
em três linhas, não sendo aconselhável retratarem o que já se vê
na imagem. Os diálogos devem levantar questões subjetivas.

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Os diálogos ou narrativas of (ou voice over), devem estar
em equilíbrio com o discurso visual do filme, programa ou ma-
téria como um todo. Percebemos ao longo dos anos que nos
roteiros enxutos e de bom resultado dramático, os diálogos ou
narrativas em of não ocupam mais do que 40% da duração total
do filme.
A trama dramática central do roteiro, equilibrado tempo-
ralmente, envolve poucos personagens e um número limitado
de locações. Essa concentração facilita o aprofundamento da
trama e dos personagens. Com isso, conquista emocionalmen-
te o espectador, envolve-o e emociona-o. O filme ou vídeo ter-
mina e nós, espectadores, queremos mais.
Todo diretor de cinema ou televisão visa, ao decupar um fil-
me em planos narrativos, encontrar uma forma fluida e objetiva
de contar uma história, transmitindo a emoção desejada. No
momento preciso da trama.
Depois de assistirmos a milhares de filmes ou lermos os
mais variados gêneros de literatura, constatamos que todas
as histórias já foram contadas. E o que importa é como con-
tá-la. Buscando sempre um ritmo narrativo envolvente. Daí a
necessidade de aprofundarmos o conhecimento da linguagem
audiovisual que nasceu da linguagem cinematográfica. Mãe de
todas as narrativas audiovisuais.
A linguagem cinematográfica é a gramática e a forma de
contá-la, o estilo é do cineasta. O trabalho estilístico cabe aos
críticos e não é objeto destas anotações. Nosso objetivo é a gra-
fia e como empregá-la bem.
Nestas notas ou observações, não abordaremos estilos nar-
rativos de diretores de cinema ou televisão, apenas a gramática,
que é anterior ao estilo desses artistas. Analisamos a gramática
como ferramenta para quem deseja contar algo com imagens.
A gramática, você pode descobrir por intuição, por muito
filmar ou gravar, mas, através do conhecimento prévio de de-
terminados princípios consagrados desta linguagem, conseguir
escrever melhor com imagens. Dominar e saber como funcio-

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nam certos detalhes do discurso cinematográfico, tais como: o
ponto de vista narrativo, a pontuação, como se dá a ligação de
um plano a outro, a temporalidade e a progressão dramática.
São regras que se constituíram e evoluíram através da experi-
ência narrativa de vários cineastas e cinematografias de vários
países. Consequência também, das invenções e avanços tecno-
lógicos dos equipamentos empregados nas filmagens e na fina-
lização, visando narrar melhor e emocionar, surpreendendo o
espectador.
O que parece contraditório aos leigos é que são regras que
devem ser estudadas e, sobretudo, desrespeitadas, reinventadas
constantemente. Porém, para romper com essas regras, deve-
mos primeiro dominá-las com segurança. Saber os seus signi-
ficados. Elas existem há mais de um século e se consolidaram
através da aplicação e experimento de vários cineastas, de di-
versas cinematografias no mundo. O uso e o emprego destas
regras corretamente resulta em discursos fluidos, objetivos e
que exprimem informações e emoções concisas.

Ponto de vista narrativo


Uma história audiovisual pode ser contada na primeira, se-
gunda ou terceira pessoa. A clareza e a concisão de uma ação
dramática em planos é consequência do ponto de vista narrati-
vo escolhido. A decupagem é feita a partir de um desses pontos
de vista.
O espectador toma consciência do espaço que ele vê, que
construímos para ele na tela. Ele frequenta e vivencia esse es-
paço, e as ações através do olho da câmera. Onde esta câmera
está posicionada, o tamanho do espaço que enquadra e os seus
movimentos. Isso é fundamental para a compreensão do que
se narra. Constrói-se o espaço imaginário com os planos. Por-
tanto, o ponto de vista narrativo é o que é visto pela câmera.
Equivocar-se na escolha de um plano, posicionamento ou mo-
vimento de câmera, pode desorientar o espectador, dificultar a

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compreensão dos fatos e cortar o envolvimento do espectador.
“Tirá-lo da tela”.
Ao lermos um roteiro bem escrito, percebemos imediata-
mente quem narra a história. A pessoa narrativa é quem nos
conta e vê os fatos. Do ponto de vista de qual personagem com-
preendemos a história. Uma frase do roteiro já deve ser um pla-
no (ou um conjunto de planos) visual da história, detalhado
plano a plano do ponto de vista de quem vê a ação.
A decupagem deverá ser concisa, para que a história seja
bem transposta da escrita literária para a visual. Um roteiro e
uma decupagem podem ser narrados do ponto de vista do prota-
gonista da história, ou seja, na primeira pessoa narrativa. E nós,
espectadores, veremos e vivenciaremos toda a trama através
dos olhos deste personagem. Deveremos evitar pontos de vista
conflitantes dentro da mesma narrativa. Quando isso ocorre,
em um texto literário onde não há concordância, a compreen-
são torna-se truncada. No filme isso também diminui a clareza
da narrativa, afasta o espectador, as ações ficam inverossímeis.
E, em certos casos chega a confundir o espectador. O espec-
tador tem de ser cúmplice do narrador. Estar envolvido até a
medula na trama narrada.
É muito comum, na finalização de um filme ou vídeo, o
editor solicitar ao diretor um plano que não foi filmado ou gra-
vado. Não é uma busca estética. O montador /editor necessita
de um plano que dará clareza e concisão ao discurso do diretor
do filme, mas ele não existe no material filmado ou gravado que
recebeu para montar. O diretor, por ter estado no set, compre-
endia ou imaginava que certas coisas daquela ação estavam su-
bentendidas e não as registrou em planos. Foram vistas por ele
no set, mas o espectador não estava lá. O espectador só pode
ver o que está contido nos planos filmados ou gravados, os
quais irão para as telas. E que cada plano captado na sequência
esteja interligado ao outro.
Um filme só tem “alma” e impressiona o espectador, quan-
do este, lá no escurinho da sala, sente e emociona-se, através

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do que o protagonista da historia vê. E os planos podem ser
detalhes visuais, símbolos que representam uma idéia, um sen-
timento, uma informação precisa; visto pelo olho do protago-
nista (captada pela lente da câmera e projetada na tela).
Uma história pode também ser contada pelo personagem
coadjuvante das ações, na segunda pessoa narrativa. Tudo que é
visto por seu olhar e não pelo do protagonista. Estamos dentro
das ações, mas através do olhar do coadjuvante.
Um outro ponto de vista é o de voyeur. Nós espectadores,
estamos no seio das ações, vivenciamos tudo que acontece e
muitas vezes sabemos dos fatos antes dos protagonistas e co-
adjuvantes. Estamos lá, mas não somos nenhum deles. Somos
uma terceira pessoa da trama. Uma pessoa privilegiada que tudo
vê, não sendo percebido pelos demais personagens. Somos um
personagem anônimo no seio das ações. Que detemos todas as
informações da trama; sentimos todas as emoções, mas fora do
ponto de vista deles. O filme documental emprega com frequ-
ência a linguagem de terceira pessoa.
Devemos ter muita clareza antes de decuparmos uma cena.
Isso nos facilitará saber com precisão o plano a ser adotado para
que não se perca a concisão narrativa. Muitos diretores inexpe-
rientes gostam de trabalhar sem fazer uma decupagem prévia
de suas ações, em planos a serem filmados. E, tampouco um
shot list*. Acabam descobrindo, ao terminar as filmagens, que
lhes faltam planos ou o seu discurso visual não ficou claro na
tela. Que o encadear de planos não monta, não se interliga. Não
tem raccord (continuidade visual e narrativa). Não consegue pas-
sar e exprimir o que desejavam e o filme não funciona junto ao
espectador.
A escolha da pessoa narrativa de um filme é uma opção do
roteirista que cria os personagens e estrutura a trama. Assim
como é do diretor que transpõe essa trama literária em narrativa
visual de planos. Daí, podermos cometer equívocos narrativos,

* shot list – lista de planos previstos, a serem filmados no set.

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pois perderemos a concisão, o ritmo, a fluidez e a objetividade
narrativa de nossa trama.

Um homem procura alguém, estaciona o seu carro diante de


um galpão. Abre a grande porta e penetra no seu interior completa-
mente às escuras. Somente alguns fachos de luz penetram pelos fu-
ros do telhado. Ouve um ruído, engatilha a arma e se protege atrás
de uns grandes caixotes de madeira. Dois tiros espocam no caixote,
próximo ao seu rosto. Um vulto salta de um jirau e foge pela porta
dos fundos. O homem ainda atira em sua direção.

A cena acima pode ser decupada na primeira pessoa, da se-


guinte maneira:

P.Geral – Um carro estaciona diante de um galpão abandona-


do. Um homem salta e dirige-se ao portão do mesmo.
Abre o portão cautelosamente e entra.
P.Geral – Subjetivo do interior do galpão as escuras. Fachos
de luz penetram pelos furos do telhado. Travelling à
frente.
Close-up – do rosto do homem caminhando em trav. à ré. De re-
pente estanca.
P.Am. – do homem que dá um passo e estanca. Olha para os
lados e PANO, Esconde-se atrás de uma pilha de gran-
des caixotes.
Close-up – O seu rosto sai de trás do caixote, conferindo, dois ti-
ros estouram na madeira, bem junto a seu rosto. Pro-
tege-se.
P.G. Subj. Um vulto salta de um jirau (tilt), corre e sai por uma
porta. Em pp. entra em quadro o homem com uma
arma e atira em direção ao vulto.

Conferindo os planos, observamos que descobrimos toda


a ação através dos olhos do homem que entrou no galpão. E
penetramos no galpão junto com ele. Nunca percebemos o
homem de outro ângulo. A seguir, detalharemos, em planos, a

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mesma cena do ponto de vista de um outro personagem, na se-
gunda pessoa narrativa. Vejamos que planos utilizaríamos.

P.Geral – (enquadrado do pto de vista do interior do galpão)


Através da vidraça de uma janela, Percebemos que
um carro chega e estaciona do lado de fora do gal-
pão. Salta um homem e vem em direção ao galpão.
Um vulto corta o quadro em primeiro plano.
Close-Up – (visto do int.) O rosto do homem que saltou do carro
surge na fresta da porta do galpão que é aberto vaga-
rosamente. O rosto sai de quadro.
P.G. Plongèe – O homem abre a porta do galpão e caminha com
uma arma. Ouve um ruído, esconde-se atrás de uma
pilha de caixotes.
P.Detalhe – Uma arma é engatilhada e sai de quadro,
P.Am Over the shoulder – o vulto atira contra a pilha de caixotes. Sai
de quadro.
P.Médio – O vulto de um homem entra por cima do quadro. Cor-
re em direção a uma porta e desaparece. Travelling
à frente rápido acompanhando-o até a porta que se
fecha sobre a câmera.

Com a mesma quantidade de planos (seis), apenas posi-


cionados de outro ponto de vista, contamos as ações através do
olhar do vulto. Narramos a sequência na segunda pessoa narra-
tiva. Vejamos o terceiro e último exemplo com a mesma ação
vivenciada pela terceira pessoa, um voyeur.

P.Geral – Um carro estaciona diante de um galpão abandona-


do. Um homem salta e dirige-se ao portão do mesmo.
Abre o portão cautelosamente e entra.
P.Geral – (ponto de vista do interior do galpão) Através da vidra-
ça de uma janela percebemos que um carro chega e
estaciona do lado de fora. Salta um homem e vem em
direção ao galpão. Um vulto corta o quadro em p.p.
P.Geral – Subjetivo do interior do galpão às escuras. Fachos de
luz penetram pelos furos do telhado. Travelling à frente

22
Close-Up – do rosto do homem caminhando em travelling à ré.
P.Detalhe – uma arma é engatilhada
P.Detalhe – pés do vulto escondido pisa em algo e provoca ruído.
P.Geral Plongé – O homem caminha observando, com uma arma em
punho. Ouve um ruído e esconde-se atrás de uma pi-
lha de caixotes.
Close-Up – O seu rosto sai de trás do caixote, conferindo, dois ti-
ros estouram na madeira, bem junto a seu rosto. Pro-
tege-se.
P.G. Plongèe a silhueta do vulto entra em quadro e salta de um jirau.
Corre em direção a uma porta. O homem sai de trás
da pilha de caixotes, atira e corre atrás do vulto que
desaparece na porta.

Nesta última versão, na terceira pessoa narrativa (como um


voyeur), observamos que empregamos mais planos (nove), pois
narramos a cena em três pontos de vista simultâneos, mas sem-
pre permanecendo fora das ações. Temos uma visão privilegia-
da. Sabemos mais do que os dois personagens individualmente
(o homem e o vulto). Eles, somente têm uma visão parcial das
ações acima apresentadas na sequência. Portanto, é necessário
que o diretor saiba a priori quem está narrando a cena para es-
colher bem os planos a serem empregados em sua decupagem.

Seqüência dramática
Num roteiro cinematográfico, as sequências são blocos
narrativos dramáticos, semelhantes aos capítulos de um livro,
onde no seu interior desenvolve-se um trecho da trama global
do filme. Para cada ambiente dramático corresponde uma se-
quência. Nos roteiros, as sequências são justapostas na ordem
em que se planeja colocá-la na tela. São numeradas em ordem
crescente, com um título que deve localizá-la dentro da trama
central e com indicações de que será rodada em interiores ou
exteriores e se dramaticamente no filme, temporalmente a cena
se passa de dia ou à noite, no amanhecer ou anoitecer, se chove

23
ou relampeja. Uma sequência dramática é narrada em vários
planos, como se fossem frases visuais, com suas respectivas
pontuações. Observemos este exemplo de decupagem em pla-
nos de uma sequência de um roteiro de ficção:

9ª sequência: casa de praia de Marcelo – exterior /dia


Em uma das janelas da casa de praia, Marcelo observa a praia
deserta e o mar. Percebe que alguém se afoga nas ondas. In-
quieto, pega o telefone celular e liga para os guarda-vidas. Na
praia, um pescador percebe o afogado, joga-se no mar e inicia
o salvamento. Logo a seguir, chega uma viatura do Corpo de
Salvamentos e estaciona. Os homens que vinham no seu inte-
rior desembarcam da viatura, jogam-se no mar e vão auxiliar o
afogado. Marcelo mais tranqüilo, fecha a janela.

Decupagem da sequência anteriormente citada:

9ª. Seqüência: casa de praia de Marcelo – exterior /dia


PLANO DESCRIÇÃO DO PLANO
1 P. G. da fachada da casa. Marcelo abre a janela e observa.
2 P. Am. – Marcelo abre a janela e percebe algo no mar.
3 Plano Geral subjetivo de Marcelo. Alguém se afoga no
mar.
4 Close-Up de Marcelo aflito. Pega o telefone celular, disca
para Corpo de Salvamento
5 P.Geral – Um pescador joga-se no mar, socorre o
afogado. Viatura do Corpo de Salvamento estaciona.
Guarda-vidas desembarcam, jogam-se no mar e ajudam
a retirar o afogado.
6 P. Am. Marcelo na janela da casa, tranqüilo, fecha a janela
FAD OUT

24
Plano- sequência
Em casos especiais, um conjunto de planos pode ser narra-
do em um só plano, em tempo real. A isso chamamos de plano
seqüência. Há casos de plano-seqüência fixos ou em movimen-
to. A câmera conta toda a sequência em um só plano, sem varia-
ção de tamanho. No primeiro caso examinaremos um plano-se-
qüência onde a câmera fica imobilizada durante todo o plano.
Todas as ações acontecem dentro do plano.
Pegue em uma locadora, as cópias dos filmes: “O Ilumina-
do”, de Stanley Kubrick, e de “Ghost”, de Jerry Zucker e confira
os exemplos de emprego de planos-sequência fixos.
No filme de S. Kubrick, na sequência em que a família do
escritor J. Torrance ( Jack Nicholson) viaja em seu fusca indo
instalar-se como vigia de um hotel nas montanhas, numa tem-
porada de inverno visando terminar o seu livro. Toda a sequên-
cia é filmada em estúdio (utilizando o recurso de Croma Key)
rodado apenas num plano Americano de Conjunto, sem cortes.
Os três personagens dialogam enquanto o carro se desloca na
estrada. Este plano-sequência sem movimento dura cerca de
noventa segundos.
O mesmo ocorre no filme “Ghost”. Dois amigos chegam
ao prédio em que trabalham e se instalam num elevador ceno-
gráfico, acomodando-se entre os demais passageiros. Os dois
conversam, um deles faz uma piada de mau gosto para se diver-
tirem dos demais passageiros enquanto o elevador sobe. Tudo
é captado em um único plano-sequência fixo, enquadrado em
plano Americano de Conjunto Frontal. A entrada e saída em
quadro é feita por Corte de Movimento, com os atores entrando
e saindo de quadro pela câmera.
Os planos-sequência em movimento, capta as ações no
interior do quadro, com a câmera em movimento. Aproveite e
verifique dois exemplos no mesmo filme “Ghost”, de Jerry Zu-
cker . Após a cena do elevador os dois amigos desembarcam do
elevador e invadem o escritório em que trabalham caminhando

25
juntos. Atravessam todo o andar cumprimentando os colegas,
um deles se instala em sua mesa e o outro vai para a sua sala de
chefia sendo comunicado de um compromisso. Toda a ação se
desenrola em num plano-sequência, sem corte, enquadrado em
Plano Americano. O plano é captado todo em movimento, com
pequenas interrupções para alguns diálogos com os coadjuvan-
tes das ações.
Uma outra alternativa para o emprego de plano-sequência
pode ser observada em uma cena do filme do gênero policial:
“Instinto Selvagem” (Basic Instinct–1992), de Paul Verhoeven.
Na terceira seqüência do filme, no quarto da vítima assassina-
da, vários investigadores da polícia colhem pistas e analisam in-
formações sobre o morto. Cerca de dois minutos de ações são
relatadas em quatro planos-sequência em movimento e planos
de insert entre um plano seqüência e outro. A sequência, como
um todo, é composta por microplanos-sequência, com o intui-
to de reunir várias informações, provocando junto ao especta-
dor uma sensação de tempo real, sem arrastar a narrativa.
Observem a decupagem. Identificaremos quatro planos-
sequência, com três planos de inserts e mais dois planos isola-
dos. Os planos-seqüência se interligarão pela movimentação de
todos os participantes da cena, numa marcação tal qual uma
coreografia. Há deslocamentos de investigadores em todos os
planos e movimentação de câmera que seguem os personagens
que detêm as falas do diálogo. Uma bela sequência composta
por microplanos sequência, inserts e planos isolados.

Plano-sequência é o plano que pode ser rodado fixo ou em movimento,


envolvendo vários tamanhos de enquadramento ou não (como se fos-
sem planos ali inseridos) durante a sua filmagem ou gravação. Podemos
também, empregar vários microplanos-seqüência para narrar uma só
sequência dramática em uma locação.

Toda sequência, não importa o gênero do filme, deve pri-


mar pela clareza e objetividade narrativa determinada pela

26
escolha da quantidade e dos tipos de planos empregados na
decupagem. O emprego excessivo de planos-sequência pode
arrastar a narrativa, torná-la enfadonha e teatral, por reproduzir
o tempo real da vida.
Há experimentos fantásticos do emprego de plano-sequ-
ência como no filme “Festim Diabólico” (The Rope – 1962),
de Alfred Hitchcock, todo rodado em planos-sequência. As
emendas são feitas no final do chassi contendo 300 metros de
negativo. O diretor camufla a emenda fazendo o ator caminhar
contra a câmera e encostando na lente, permitindo a emenda
sem ser percebida pelo espectador.
Um bom emprego do plano-sequência foi feito pelo dire-
tor Stanley Kubrick, no seu filme de longa metragem “O Ilumi-
nado”. Ele utiliza o tempo real do plano-sequência para passar
a sensação ao espectador da distância que a família percorre de
carro para chegar ao hotel, O isolamento a que estarão confi-
nados durante a sua permanência lá, associando a este plano-
sequência, vários planos gerais em tomada aérea.
Em um único plano-sequência fixo, enquadrado em dia-
gonal no interior do carro cenográfico (Plano Americano de
Conjunto), realizado em estúdio, os personagens dialogam so-
bre o hotel para onde irão. O personagem de Jack Nicholson,
ao volante. No banco do carona, sua esposa Shirley Duvall. E o
filho do casal, no banco de trás, recostado nas costas dos pais.
O diálogo mórbido da família revela casos apavorantes que
aconteceram neste hotel, aumentando o clima de insegurança
no espectador.
Os planos aéreos demonstram como os três personagens
ficarão distantes da cidade mais próxima durante todo o inver-
no. A paisagem grandiosa e deserta, sem casas, vilarejos ou pre-
sença humana informa visualmente o isolamento a que esses
personagens serão expostos.
As sequências devem manter um equilíbrio temporal entre
si, como um todo no roteiro, para evitar que o filme se arraste
na narrativa evitando um desequilíbrio temporal dramático,

27
com sequências muito longas ao lado de outras muito curtas.
Ou, ainda, um excesso de sequências curtas que aceleram em
demasia a narrativa, dificultando a compreensão do desenrolar
da trama. Se o espectador não acompanhar os fatos com com-
preensão mínima necessária, você o perde. É importante sem-
pre manter a tensão e o equilíbrio temporal entre as sequências
de um filme. Eles fazem o espectador pensar e se envolver emo-
cionalmente com a trama. O espectador pensa e compreende
junto com o personagem.
Uma seqüência é descrita em planos. Os planos devem se
interligar no interior de cada sequência e o seu conjunto deve
se equilibrar temporalmente com as demais sequências que a
precedem ou a sucedem. Cada sequência tem uma progressão
dramática própria, porém está inserida no crescimento e pon-
tuação dramática no todo do filme.
Para que possamos ter uma avaliação do tempo dramático
das seqüências basta recordar que uma página de roteiro, escri-
ta dentro dos padrões internacionais: Fonte Courrier, corpo 12,
papel carta 27,94 cm X 21,59 cm, numeração das páginas: em
cima, à direira, seguido por um ponto; margens: alto da página
2,5 cm e o rodapé da página 3 cm, Diálogos: 6,5 cm à esquerda
e 7,5 cm à direita da página, espaço duplo entre cabeçalho da
sequência e a ação
Os diálogos devem ficar centralizados nas páginas e o
nome dos personagens em caixa alta). Na formatação acima
descritas, as cenas, quando filmadas, duram em torno de um
minuto e meio cada página. E, o roteiro formatado conterá um
total entre oitenta a cem páginas. A primeira folha, a capa do
roteiro ou folha de rosto deve conter as seguintes informações:
Título, nome do autor do argumento se for obra literária adap-
tada, nome do roteirista, o numero de registro no Escritório de
Direitos Autorais, endereço, telefone e e-mail do autor.
O que deve se buscar entre 90 e 100 sequências de um filme
de longa-metragem (com a duração entre 70 e 120 minutos) é
o equilíbrio temporal entre as sequências entre si. Normalmen-

28
te as sequências finais em um roteiro são mais curtas em sua
duração para evitarem o esvaziamento do clima dramático da
conclusão da história. Dizem os especialistas que um dos se-
gredos de um roteiro é começar e terminar bem o filme. Que
as seqüências de abertura e encerramento de um filme marcam
o espectador. Saber começar e terminar bem uma narrativa é
fundamental em qualquer espetáculo audiovisual.

Os Diálogos e o ritmo narrativo


Se um diálogo não tem nada a dizer, corte o diálogo. Na
certa ele estará sobrando. Se pode ser substituído por uma ação
visual, faça-o. Essa talvez seja a melhor reflexão sobre o empre-
go de diálogos e narrações em off, em qualquer tipo de obras
audiovisuais. O roteiro deve “falar” com imagens e não com
diálogos. Sempre que for possível, substitua diálogos por ima-
gens... imagens síntese de uma idéia.
Toda sequência em sua narrativa deve ser a mais visual
possível. É importante observar a duração dos diálogos. Não
devemos colocar nos diálogos informações que já são vistas na
imagem. Todo e qualquer diálogo deve ser coloquial, o mais
natural possível, servindo de contraponto dramático, sugerin-
do fatos ou intenções que não vemos nas imagens; evitando as
“literatices”, linguagem empolada ou falsas descrições poéti-
cas, com palavras difíceis ou muito eruditas, desconhecidas do
grande público.
Os diálogos não devem ser compostos por frases muito
extensas. Elas dispersarão os espectadores. Percebemos que os
roteiros, com uma dramaturgia concisa, empregam poucos di-
álogos. Um roteiro dramaticamente bem construído não tem
mais do que 35 a 40% de diálogos. E eles sugerem mais do que
narram.
Ao contrário da estrutura das peças teatrais, em que os di-
álogos informam a trama e constroem os personagens, os di-
álogos cinematográficos devem conter informações subjetivas

29
ou somente dados de algo que não vemos na tela. A intenção
oculta do personagem ou da trama. Devem servir de contra-
ponto do que vemos na tela. Os diálogos podem conter tensão
dramática, estabelecer perguntas e significados.
Os roteiros dos filmes do gênero comédia podem ser com-
postos por gags visuais, piadas descritivas (stand up), situações,
trocadilhos e absurdos falados. Isso pode ser observado em
filmes dos “Irmãos Marx” (Marx Brothers), de Woody Allen.
Mas isso não impede que haja roteiros de comédias totalmente
visuais, como os filmes de Charles Chaplin, Buster Keaton ou
Jacques Tati.
Cada bloco narrativo (a sequência) deve obedecer a uma
pontuação, valer-se de uma das figuras de linguagem (Fads,
fusões, cortinas etc) para pontuar ou encerrar este bloco e pas-
sarmos a outro, sem que haja uma perda de ritmo narrativo
(empregando outras figuras de linguagem como cortes de mo-
vimento, fusões, congelamentos da imagem). A narrativa deve
fluir no interior da sequência (de plano a plano) e no todo do
filme (sequência a sequência).
No capítulo dedicado à pontuação da narrativa desenvol-
veremos mais detalhadamente algumas observações sobre as
figuras de linguagem.

30
Capítulo Dois

Posições de Câmera

A o mesmo tempo em que os cineastas buscavam descobrir


os mais variados tamanhos de planos para enquadrar o
espaço filmado e poderem narrar com objetividade e compre-
ensão o que desejavam, muito se buscou, através do posiciona-
mento de câmera.
Na fase inicial do cinema, quase sempre a câmera era
pousada sobre um tripé rústico, sem a possibilidade de fazer
movimentos e nivelada na altura do olhar do cinegrafista. As
histórias e fatos quase sempre eram relatadas (e filmadas) na
altura do olhar do operador de câmera, correspondente ao
olhar humano. Variava-se muito pouco a altura do plano. Ex-
perimentaram e perceberam que a câmera podia ser pousada
acima do objeto filmado, de cima para baixo ou de baixo para
cima a noventa graus do piso ou do céu. Essas experimenta-
ções mostraram aos cineastas que seus planos podiam ganhar
força, colocar o espectador em ponto de vistas surpreendentes,
causar instabilidade no espectador, dá-lhe uma imagem domi-
nadora ou inferiorizar um personagem. Esses posicionamentos
de câmera e conseqüentemente dos planos resumiram-se a:

Posições de câmera (ou dos planos)


Plongée Contra-Plongée
Zenital Anti-Zenital
Baixa/rente ao chão Alta ou aérea
Por cima do ombro (over the shoulder)
Subjetiva

31
Câmera em posição PLONGÉE (ou plano em posição plongée)

É o plano com a câmera (em mergulho), posicionada do


alto para baixo. Com este posicionamento obtemos uma infe-
riorizarão do personagem enquadrado. O Isolamos no espaço
dramático da cena. No caso de planos subjetivos, podemos as-
sumir o ponto de vista da pessoa que está de pé na cena, do
olhar deste personagem para algo abaixo da linha do horizonte.
No caso de planos gerais que envolvam muitos personagens ou
figurantes em quadro obtemos uma ampliação da perspectiva
do plano, valorizamos a terceira dimensão. É o caso de Planos
Gerais de: platéias, auditórios, em templos ou de pessoas à
mesa em um restaurante etc.
Podemos observar os planos com esse posicionamento em
filmes como: “Sexto Sentido”, de M. Night Shyamalan, nas ce-
nas da igreja quando o menino conversa com o espírito do “psi-
canalista” caminhando na aleia central da igreja, assim como no
filme “A Cor Púrpura”, de Steven Spielberg, na cena em que um
rico proprietário vem comprar uma menina para serviços em
sua fazenda. Diante da casa a menina observa o novo senhor
em contra-plongée, sendo observada pelo senhor montado a
cavalo em plongée. Da mesma maneira que no filme anterior,
são posicionamentos de câmera que visam a estabelecer para o es-
pectador a relação que se mantém entre os personagens.
A cinematografia mundial está repleta de exemplos de câ-
meras posicionadas em plongée e contra-plongée, mas dare-
mos mais um exemplo para que você possa conferir. O filme
em questão é: “Ghost” de Jerry Zucker. Na sequência onde o
jovem casal se instala num novo apartamento e faz a sua mu-
dança, entrando com uma enorme imagem de um anjo pela
janela. Os protagonistas se arriscam em dar um balanço na
imagem para que possam alcançá-la e puxá-la para o interior
do imóvel. O balanço arriscado é filmado em plongée. Na mes-
ma sequência observamos um plano da fachada com a pesada
estátua pendurada por uma corda na fachada. Tudo isso visto

32
por um plano geral em posição contra-plongée, filmado em ex-
teriores.
Na cinematografia brasileira podemos dar alguns exem-
plos do emprego da posição plongée em momentos dramati-
camente corretíssimos como no filme: “Cidade de Deus”, de
Fernando Meirelles na cenas em que os grupos de traficantes
de Zé Pequeno caminham entre as vielas da favela. Assim como
na primeira parte do filme, um dos personagens é assassinado
pela polícia em plena favela. Outro filme nacional que emprega
um posicionamento plongée, dando imponência e grandiosi-
dade a um moinho primitivo operado pelo ator José Dumont,
é “Abril Despedaçado”, de Walter Salles Jr. O uso desta posição
aumenta a violência do plano e da cena e superdimensiona o
personagem.

Câmera em posição ZENITAL (ou plano em posição zenital)

É o plano com a câmera posicionada a 90º do piso, na po-


sição do zênite. Este posicionamento de câmera desestabiliza
o espectador. É uma posição inusitada para o espectador. Pro-
voca também uma sensação de esmagamento em planos gerais
de paisagens. Muito empregado em sequências de suspense,
terror, perseguição, visando deixar o espectador inseguro, sem
chão.
Podemos observar os planos com esse posicionamento
em filmes como: “Psicose”, de Alfred Hitchcock, quando na
cena em que o jovem hoteleiro vai até a casa de sua mãe e o
seguimos como um voyeur, através do olhar e da curiosidade
do personagem feminino. Seguimo-lo discretamente. O jo-
vem entra no quarto da mãe, porém nós não. Ficamos aguar-
dando enquanto a câmera se movimenta e se posiciona em
zenital, desestabilizando-nos, e logo a seguir, o jovem passa,
carregado a mãe nos braços e não sabemos ainda tratar-se
de uma mulher empalhada. Esse posicionamento de câmera
permite ao cineasta esconder-nos que se trata de um bone-

33
co e faz-nos acreditar ser a mãe do personagem em carne e
osso.
Caso deseje observar outro exemplo, ele pode ser visto fil-
me: “Sociedade Secreta”, de Rob Cohen. Na abertura da cena
que precede o duelo, abre com um plano geral zenital com a
grua movendo-se e re- enquadrando em Plano Médio Frontal.
E ainda, no filme “Eu sou a lenda”, de Francis Lawrence, planos
gerais aéreos em posição zenital quando se mostra as ruas de
New York, completamente desertas e o carro do personagem
se deslocando na paisagem urbana. O plano não só provoca
uma imensa instabilidade ao espectador, como lhe passa uma
sensação de solidão. Muitos são os filmes que contêm este posi-
cionamento, sobretudo filmes com cenas de perseguição aérea,
em áreas urbanas ou florestais.

Câmera em posição ANTIZENITAL (ou plano em posição antizenital)

É o plano com a câmera posicionada a 90º do céu. Na po-


sição anti-zenite (sol do meio-dia). A câmera é colocada abaixo
do nível do solo, voltada para o alto. Você já deve ter muitas ve-
zes assistido a tais planos, sem perceber esse posicionamento.
Mas sentiu o medo, o esmagamento e a insegurança que o di-
retor desejava, empregando o plano com a câmera em posição
antizenital. Vê-se comumente o emprego deste posicionamen-
to de câmera = plano em filmes que contenham cenas de per-
seguição com veículos ou pessoas (filmes do gênero policial)
ou animais (películas do gênero Western). O veículo passa por
cima da câmera e conseguimos até ver o assoalho do automó-
vel, a parte inferior de um trem, do animal ou do personagem
saltar sobre nós.
Um bom exemplo do emprego do plano antizenital pode
ser visto no filme: “Era uma vez no Oeste”, de Serge Leone, logo
nas cenas iniciais da película quando o trem chega ruidoso e
agressivamente à estação, num prenúncio de violência. A loco-

34
motiva passa sobre a câmera posicionada em antizenital e, con-
seqüentemente, sobre nós, os espectadores.

Câmera BAIXA ou RENTE ao CHÃO (ou plano em posição baixa)

É o plano captando imagens com a câmera rente ao chão. Dá


força ao plano, causa-nos impacto, aumenta a violência do plano.
É muito empregado em situações de suspense, no enquadramen-
to de monstros ou malfeitores caçando as suas vítimas, explo-
sões, capotagens de veículos e outros efeitos especiais. Também
superdimensiona a figura humana, um veículo, um animal etc.
Nas competições esportivas ou corridas de Fórmula 1 sempre
há entre as câmeras distribuídas para cobrir o evento uma delas
colocada rente ao chão, aumentando a importância de um trecho
do evento, causando impacto e reproduzindo a real velocidade.
Podemos observar os planos com esse posicionamento em
filmes como: “Eu sou a Lenda”, de Francis Lawrence (2008),
nas cenas onde o personagem transita de carro pela cidade de-
serta e abandonada de New York, perseguindo animais para
caçar. Observe como aumenta a velocidade e a violência dos
planos empregados na seqüência.
Nos filmes de guerra, para criarmos intimidade com os
personagens em combate nas trincheiras empregamos planos
com a câmera posicionada rente ao chão. Muito utilizado no
filme “Nascido para matar”, de Stanley Kubrick. Variados tra-
vellings rentes ao chão.

Câmera posicionada POR CIMA DO OMBRO (ou plano em


posição over the shoulder)

Para criar intimidade do espectador com o personagem,


bisbilhotando sem ser percebido por ele, empregamos a posi-
ção da câmera por cima do ombro dos personagens e conferi-
mos o que dizem ou o que fazem no plano. Participamos, como
espectador, sem ser um deles.

35
Para a sua aferição, seria bom assistir a um exemplo corri-
queiro desse posicionamento de câmera = plano, no filme “So-
ciedade Secreta”, de Rob Cohen. Dois jovens alunos de uma
escola de segundo grau na Inglaterra conversam sigilosamen-
te numa sala de aula sobre o que arquiteta fazer um grupo de
colegas. Em posição over the shoulder acompanhamos toda a
conversa.
Este posicionamento de câmera é também empregado
quando seguimos um personagem pelas costas, tendo ele como
referencia no quadro durante o deslocamento em travelling à
frente e, em situações em que o personagem escreve ou lê uma
correspondência e desejamos que o espectador a leia também,
evitando-se uma visão subjetiva do personagem, com a carta
em plano detalhe. Empregamos então a posição over the shoul-
der com referência do personagem em quadro.

Câmera em posição ALTA ou AÉREA (ou plano em posição aérea)

Em uma narrativa tensa, quando desejamos “respirar”, entre


uma sequência e outra, empregamos um plano geral com a câ-
mera posicionada de um ponto de vista alto ou aéreo. Quando
desejamos dar ao espectador a sensação de abandono, solidão
ou de monumentalidade do espaço dramático onde se passa a
cena, empregamos um plano geral aéreo ou com a câmera alta.
Podemos observar os planos com esse posicionamento
em filmes como “Aviador” e “Gangues de New York”, de Mar-
tin Scorcesse, nas cenas do deserto, e, pequenas passagens de
filmes como “Instinto Selvagem”, nas cenas de investigação da
casa da escritora suspeita de assassinato.
No filme “Instinto Selvagem”, nas cenas da viagem de carro
dos investigadores da policia à casa da personagem (a escrito-
ra), percebemos o emprego de uma posição de câmera aérea.
Nesta posição avistamos sua casa e a localizamos num bairro
chic de São Francisco; a continuação da viagem de investigação,
dirigindo-se para a sua casa de praia, a posição da câmera aérea

36
informa tudo isso. uma casa de praia, à beira-mar, num bairro
distante, local de moradia de gente rica e poderosa. Como é o
caso da personagem da escritora.
É importante salientar que, quando desejamos dar ritmo
a uma narrativa audiovisual, não empregamos apenas planos
de diferentes tamanhos e em posições variadas. A colocação
da câmera = plano, em alturas diferentes também provoca
um contínuo estímulo à atenção do espectador. Obriga o seu
olhar a reformular constantemente o espaço onde se passam as
ações. Construindo este espaço, através das informações que
recebe dos planos e sua justaposição na edição. Isso é o que faz
o espectador interagir constantemente com a narrativa. O ten-
sionamento de todas as suas energias, para captar as variadas
informações formais que a narrativa contém: os diferentes pla-
nos, os posicionamentos desses planos, e, sobretudo, as alturas
variando constantemente. E isso se associará aos movimentos
dos planos, como veremos mais adiante.
O cérebro do espectador edita e associa constantemente es-
sas informações para manter e concluir o discurso lógico desta
linguagem. Trabalha com os “sete buracos da sua cabeça”. Essa
deve ser a preocupação constante de um narrador, que emprega
a linguagem audiovisual para formular as suas informações ou
histórias ficcionais, onde cada elemento assume uma impor-
tância fundamental. Não há espaço para divagações, somente
para precisões. Conteúdo e objetividade. Busca-se constante-
mente o discurso enxuto, sem “firulas” desnecessárias, sem de-
cupagens estéticas ou puramente espaciais. O espaço (ou am-
biente), onde se passam as ações dramáticas (das sequências)
são revelados pelas necessidades narrativas dos planos e não de
exibicionismo estético. Movimentos gratuitos. Tudo deve ser
revelado através das cenas.
A decupagem de uma narrativa em planos audiovisuais não
deve ter a preocupação de mostrar o lugar, mas, sobretudo ser
um detalhamento dramático. O domínio sobre essas três ferra-
mentas narrativas deve ser total: o plano específico, a posição

37
ideal deste plano e a altura do plano empregado no fraseado
deste discurso visual.

Plano em posição subjetiva


Toda vez que um diretor deseje que o espectador veja atra-
vés dos olhos do personagem (a câmera), emprega um plano
em posição subjetiva. Por exemplo: o personagem caminha pela
rua procurando uma casa comercial. Para diante de um prédio
e olha para a fachada, onde há uma placa. Desejamos que o es-
pectador leia e seja informado com precisão o que está escrito
naquela placa. A câmera ocupa a posição do ator, enquadra a
placa em detalhe e filma ou grava o tempo necessário para a sua
leitura e compreensão quando as imagens forem editadas.
O espectador leu esta placa de forma subjetiva (no lugar
do personagem), daí o nome do posicionamento do plano em-
pregado.
A posição subjetiva de câmera pode ser empregada em
planos fixos ou gravados /filmados em movimento, nos mais
variados tamanhos de enquadramento. Pode ser o olhar de um
ambiente ou paisagem, de um determinado objeto a que dese-
jamos dar ênfase.
É importante ressaltar que, quando empregamos um plano
subjetivo na decupagem de uma sequência, deve estar previsto
para ser filmado ou gravado, um plano americano, médio ou
close-up de quem em cena olhou subjetivamente determinada
paisagem ou objeto. Isso possibilitará uma melhor compreen-
são da cena por parte do espectador. Este plano será inserido
na edição final da cena, sempre antes ou depois do plano em
posição subjetiva.
As posições dos planos determinam uma intenção visual
narrativa dramática. Pontua e acrescenta algo ao fraseado nar-
rado nas telas.

38
Capítulo Três

Movimentos de Câmera

D esde a invenção do cinema, os diretores e cinegrafistas


pesquisavam uma maneira da câmera mover-se durante
as filmagens. Acompanhando o movimento dos personagens,
veículos e animais à distância ou se deslocando com eles duran-
te as filmagens ou gravações em externas, estúdios e locações
reais. Mas todas essas tentativas foram frustradas, pela falta de
estabilidade da imagem. Sempre se captava uma trepidação
muito incômoda reproduzida de forma acentuada na projeção
das imagens na tela. Foi necessário o aprimoramento dos equi-
pamentos e acessórios de câmera para que esse passo na lingua-
gem audiovisual fosse alcançado: captar planos em movimento
com estabilidade visual na exibição.
No discurso audiovisual constituído por planos, existem
dois tipos de movimentos: o do próprio plano apoiado em um
suporte de câmera quando filmado (portanto, dinâmica exter-
na), e a movimentação dinâmica no interior do plano, cons-
tituído pelo deslocamento dos atores, veículos ou animais no
quadro(dinâmica interna ao plano).
Esses movimentos ou dinâmicas podem atuar separados e
conjugados. Ou seja, um plano fixo com movimentação no in-
terior do quadro ou um plano em movimento acompanhando
um deslocamento no interior do quadro. Exemplo:
Um homem parado observa a paisagem. O plano que o homem é fixo
e o personagem está estático observando à paisagem. E, o plano sub-
jetivo da paisagem (seu olhar) está em movimento de panorâmica que
é o seu olhar.

39
Todos os movimentos (de câmera = plano), quando em-
pregados no discurso cinematográfico, devem ser “sentidos”,
mas não percebidos pelo espectador. Atinge-se com isso uma
sutileza narrativa. Os movimentos internos ou externos dos
planos nos conduzem pelos olhos e ouvidos na narrativa. Os
planos passam a ter uma ocupação total em nossa percepção
e sensibilidade de espectador. Interagimos as informações e as
emoções que nos são sugerida: objetivas e subjetivas. Os movi-
mentos atuam como um arranjo melódico envolvente. “Vemos”
com os ouvidos e “ouvimos” com nossos olhos, sentindo com
o coração e a mente o discurso audiovisual. Somos conduzidos
por todos os elementos da narrativa audiovisual a um espaço
imaginário, real a nossos olhos.
Os planos (e os sons) se interligam. Passamos de um lo-
cal a outro. De um tempo a outro, diferente do tempo real e
sem sentirmos. Atingimos a plenitude da narrativa audiovi-
sual. Eu, espectador, estou, sinto e ouço naquele espaço ima-
ginário, criado pelo narrador (o diretor do filme), com suas
ferramentas audiovisuais: o tamanho dos planos, as posições
e os movimentos de câmera e as figuras de linguagem (que é a
pontuação). Isso é o domínio do discurso em cinema, televisão
e qualquer outro meio audiovisual que exista ou venha a ser
inventado.
Outros fatores importantes na escritura audiovisual são o
ritmo e os movimentos, como veremos a seguir.
Quando a câmera cinematográfica foi inventada pelos ir-
mãos Lumière, ela era montada sobre um tripé de “queixo duro”.
Não havia possibilidade de se executar nenhum movimento
com a câmera. Era muito semelhante aos velhos fotógrafos de
praça: “os lambe-lambes”. Todos os planos eram captados ini-
cialmente fixos.
Para seguir um movimento com a câmera e reproduzi-lo na
tela, o cinegrafista era obrigado a detalhar em vários planos e
posições de câmera, a ação do deslocamento. Colocar a câmera
em várias posições do percurso para dar ao espectador a noção

40
do deslocamento e a continuidade do movimento quando o
personagem se deslocava na paisagem.
Um dos primeiros acessórios a serem desenvolvidos pelos
técnicos e cineastas europeus, sobretudo os franceses, foi a ca-
beça suporte de câmera, que ia como base para a câmera, insta-
lada sobre o tripé. Com este aperfeiçoamento técnico, qualquer
camera man podia, a partir de então, executar movimentos com
a câmera no sentido horizontal, em torno do próprio eixo da
câmera, durante a filmagem de um plano.
Esse movimento acompanhava o deslocamento de uma
pessoa, um veículo ou um animal no espaço cênico. Um movi-
mento de câmera que torna um plano descritivo da paisagem,
panorâmico, daí o seu nome: movimento panorâmico (panora-
mique) ou, de forma abreviada pan e panô.
Esse movimento, desde que as câmeras ficaram mais leves,
pôde ser executado pelo cinegrafista, com a câmera na mão. A
câmera gira em torno do eixo do operador de câmera. Ele trans-
forma-se no próprio tripé. A sua cintura transforma-se na ca-
beça de câmera. Tal qual quando a câmera está instalada sobre
um tripé com cabeça de câmera móvel. O equipamento gira em
torno do eixo da câmera sobre o seu tripé, em um movimento
de acompanhamento na horizontal.
Logo, este acessório foi aperfeiçoado pelos ingleses e tor-
nou-se possível um outro movimento em torno do seu eixo,
mas no sentido vertical. Daí o movimento receber o nome in-
glês de tilt. Da mesma maneira que esse movimento pode ser
feito com a câmera sobre o tripé, pode também ser executado
pelo operador de câmera, seja no sentido baixo-alto e vice ver-
sa: alto-baixo.
A panorâmica e o tilt passam a ser os primeiros movimentos
de câmera em torno do seu eixo, dando mobilidade aos planos,
acrescentando uma melhora na narrativa visual da linguagem
cinematográfica. E, consequentemente, criará uma nova posi-
ção para a narrativa: a visão subjetiva do personagem = espec-
tador, o plano subjetivo.

41
Plano subjetivo é aquele em que a câmera ocupa o lugar do ator e a lente
transforma-se em seu olhar possibilitando ao espectador ver subjetiva-
mente por ele (ator/personagem).

Observe estes exemplos, decupando em planos, essas se-


quências abaixo:

19ª SEQUÊNCIA MONTANHAS DE PENEDO – EXT. DIA


Fernando sobe uma montanha, para no seu topo e observa
o que há do outro lado da montanha: um enorme vale verde
(ou uma pequena cidade).

Ou ainda, esta sequência de outro roteiro:

9ª SEQUENCIA – CASA DE MARIA – INT. DIA


Maria chega em casa e para no hall, surpreendida. Obser-
va sua sala, totalmente revirada. Gavetas abertas, armários
revirados, louça quebrada e muita coisa jogada pelo chão.
Percorre com o olhar as prateleiras da sala e localiza a porta
do cofre arrombada.
MARIA:
– Desgraçado, você me paga, Pedro, ladrão de merda!

Se o diretor do filme ou vídeo fosse decupar essas duas


cenas, poderia empregar os movimentos de panorâmica e tilt.
Decupemos a cena das montanhas de Penedo:

42
Decupagem da seqüência aplicando plano subjetivo

19ª SEQUÊNCIA MONTANHAS DE PENEDO – EXT. DIA


PLANO DESCRIÇÃO DO PLANO
1 P. Geral – Fernando sobe a montanha (tilt baixo alto).
Para no topo e observa
2 Close Up Frontal e Subjetivo – Fernando observa
surpreendido a paisagem, movendo a cabeça
3 P. Geral Subj. Panô (direita para a esquerda) da
paisagem ou cidade no vale

O mesmo plano empregaríamos na decupagem da cena da


casa de Maria:

Decupagem da seqüência com aplicação de plano


subjetivo

9ª SEQUÊNCIA MONTANHAS DE PENEDO – EXT. DIA


PLANO DESCRIÇÃO DO PLANO
1 Pl. Médio – Mária abre a porta de casa e para no hall,
surpreendida. Observa.
2 Close-Up – Mária surpreendida observa o interior da
sala
3 P. Geral subjetivo + Panô. (direita para a esquerda),
revelando: gavetas abertas, armários com as portas
escancaradas, louça quebrada e objetos no chão. Olha
rápido na direção da estante, de baixo até em cima.
4 P. Am. – Maria olha para a estante, prateleira por
prateleira. Fixa na última.
5 Close-Up Plongée Maria olha de baixo até em cima
Diálogo 1.
6 P. Detalhe Subj. das prateleiras em movimento de Tilt.
Fixa ao revelar a porta do cofre arrombada.

Percebemos que em ambas as cenas, ao serem decoupadas,


foram empregados os dois movimentos em torno do eixo da

43
câmera: Panorâmica e Tilt. E, nos dois casos de movimento de
tilt, a câmera ocupou o lugar do personagem (o ator). A câmera
foi colocada no seu lugar e viu por ele, de forma subjetiva. E,
consequentemente o espectador ficou em seu lugar quando a
câmera enquadrou a visão do ponto de vista do personagem.
Sempre que empregamos um plano de posição subjetiva,
devemos prever na decupagem um plano (enquadrado em clo-
se-up ou Plano Americano), para na edição ser colocado an-
tes ou depois dele. Assim, o espectador compreenderá quem
olhou subjetivamente. Isso tornará a frase visual mais clara e
objetiva para o espectador, incluindo-o na ação.
Outros movimentos de câmera darão aos planos uma agili-
dade narrativa fantástica. Nos primórdios do cinema, os técni-
cos e cineastas buscavam formas de fazer a câmera se deslocar
durante a filmagem dos planos, colocando mais ação nas nar-
rativas. Experimentou-se, quando a câmera ainda era movida
a manivela, amarrar um cinegrafista na frente de um trem, na
dianteira de um velho Ford bigode e andar pelas ruas de New
York e da Europa. O espectador gritava na sala. Não havia uma
cena de perseguição de veículos que não entusiasmasse as pla-
téias das salas de cinema em todo o mundo.
Quando se tentava deslocar a câmera em estúdio, seguindo
os movimentos dos atores em cenas de dramaturgia, percebia-
se a trepidação da câmera. O plano não tinha estabilidade e in-
comodava o espectador, tirava a sua atenção da narrativa.
Muitas foram as “traquitanas” e acessórios tentados. Po-
rém, essa deficiência só seria sanada quando os ingleses, expe-
rientes em construção de ferrovias, tiveram a idéia de produzir
um carrinho de estrutura pesada e resistente que deslizasse
sobre trilhos retos e curvos, com rodas forradas de borra-
cha, silenciosas e macias. Sobre esse carrinho tracionado ou
empurrado pela força humana, a câmera é instalada, com o
cinegrafista posicionado numa plataforma deslizante, acompa-
nhando o deslocamento dos atores em cena durante a capta-
ção do plano.

44
Foi uma revolução estética e da narrativa cinematográfica.
Uma novidade que muito acrescentou a linguagem cinema-
tográfica. O cinema ganha movimento, agilidade narrativa. O
espectador começa a participar das ações, deslocando-se com
os personagens, sendo colocado no centro do drama. Logo, os
cineastas compreendem que podem utilizar todos os planos
existentes em movimento. Conseguem acompanhar um casal
de personagens durante sua ação e depois, no período do cine-
ma falado, seus movimentos e diálogos.
Passa a ser possível fazer a trajetória subjetiva de um perso-
nagem. Podíamos, a partir de então, criar um grifo emocional
em um close up. Com a câmera aproximando-se discretamente
do rosto do personagem em determinado momento da ação,
pontuando sua emoção ou a importância de seu diálogo. Su-
blinhado por um acompanhamento musical ou simplesmente
sonoro.
Tornam-se inúmeras as utilizações do equipamento tra-
velling (ou carrinho). A descoberta foi tão importante para a
gramática cinematográfica que o nome do equipamento tor-
nou-se o mesmo para o movimento do plano. Podemos empre-
gar o equipamento em quaisquer tipos de planos em movimen-
to, como:

Travelling à frente Travelling à ré


Travelling paralelo Travelling em diagonal
Travelling em curva Travelling circular
Travelling sinuoso (reto associado a um curvo)

O movimento de travelling pode ser empregado em qual-


quer tamanho de plano ou posição e executado sobre qualquer
suporte (além dos tradicionais trilhos e o seu respectivo carro)
que faça a câmera se deslocar, numa externa, em estúdio ou lo-
cação adaptada.
A câmera pode estar posicionada sobre o equipamento
com o mesmo nome do movimento ou ainda sobre: um auto-

45
móvel, com o cinegrafista sentado com a câmera na mão, em
uma cadeira de rodas de enfermo e outros tipos de carro supor-
tes para a câmera como as dollies etc.
É importante diferenciarmos o movimento com a câmera
fixada sobre um tripé girando em torno do seu eixo (panorâ-
micas e tilts), da câmera se deslocando no espaço dramático da
cena, quando o plano é filmado (em travelling).
O movimento de travelling, na maioria dos casos, é feito
mantendo-se o nível do olhar humano. Pode a câmera estar po-
sicionada um pouco abaixo ou acima deste nível (plongée ou
contra-plongée). Mas, na maioria das vezes, na altura do olhar
humano.
Existem equipamentos de estabilização da câmera, que
permitem que façamos um movimento(do plano) de travelling
com a câmera em terrenos irregulares, subindo uma rampa ou
uma escada, sem trepidação da imagem. É o equipamento de
criação americana nos anos 70: o steadicam (estabilizador de
câmera) inventado por Garret Brow. A câmera é operada pelo
cinegrafista, montada sobre um braço articulado, com molas e
contra-molas preso a um colete em seu corpo. Com este aces-
sório de câmera podemos fazer um travelling acompanhando
um personagem deslocar-se andando ou correndo em terrenos
irregulares ou subindo/descendo uma escada/rampa, saltando
valas e desviando-se de obstáculos, sem trepidação na imagem.
Para todas as sequências de ação ou movimentos rápidos
empregamos o steadicam, para conseguirmos movimentos
de travelling com qualidade. Seja uma competição esportiva,
um espetáculo de dança, uma perseguição ou briga corporal.
Nessas situações, os movimentos de travelling necessitam de
qualidade visual.

Movimento de GRUA ou CAMATE


A primeira vez que tentamos mudar o horizonte de um pla-
no em movimento, saindo do particular para o geral, de uma

46
altura para outra, foi no filme “Nascimento de uma nação”, de
David W. Griffith., em 1915 o cineasta empregou um protóti-
po encomendado ao técnico e cineasta Alan Dawn, para filmar
uma multidão partindo de um ponto de vista baixo, atingindo a
uma grande altura, sem corte ou trucagens.
A partir daí, o equipamento também deu nome ao movi-
mento. O equipamento foi de tal maneira aperfeiçoado, que
atualmente podemos obter o movimento sem a presença de
um camera man sobre o equipamento (cabeça remota). O mo-
vimento da câmera e o enquadramento são feitos por controle
remoto e visionados em um monitor montado em paralelo.
A grua é um equipamento de suporte para câmera, cons-
tituída de uma lança apoiada sobre uma base (com ou sem
rodas) onde, em uma de suas extremidades, há uma platafor-
ma articulada, na qual se instalam a câmera e o operador do
equipamento. Na outra ponta, uma caixa articulável, onde são
acumulados pesos de chumbo para contrabalançar o peso da
outra ponta. Um maquinista opera os movimentos ascendentes
ou descendentes da câmera, posicionada na ponta da grua. O
equipamento dá nome ao movimento do plano: grua.
Este plano em movimento de grua, sai do enquadramento
particular de uma cena para o geral e vice-versa. A sua função
dramática como plano é de revelação de um ambiente em uma
narrativa. Um plano em movimento empregado como encerra-
mento ou abertura de um bloco narrativo. Utilizamos para in-
terligar dois ambientes ou personagens em um mesmo plano,
sem corte. O movimento de grua dá grandiosidade ao plano e as
ações enquadradas. Pode provocar uma sensação de perda, des-
pedida, abandono, caso a narrativa da sequência seja encerrada,
deixando o personagem no meio do quadro, variando de altura.
No Brasil há gruas de variados tamanhos. O tamanho da
lança que proporciona o movimento ascendente de grua (ou o
plano) atinge alturas de até 3, 7 e 10 metros. No exterior há gru-
as que atingem 20 metros de altura com bastante estabilidade,
segurança e qualidade de movimento.

47
As gruas podem estar montadas sobre caminhões especia-
lizados para receberem tais equipamentos, podem manter-se
fixas em um local ou deslocar-se durante o movimento de cap-
tação do plano.
Do ponto de vista narrativo, o plano, enquadrado em geral,
sai de um detalhe da ação e revela o ambiente total, onde se
passa o conjunto de ações dramáticas e vice-versa. Este movi-
mento muda o horizonte visual do plano sem corte.
O plano que emprega a grua pode associar vários movi-
mentos simultaneamente, tais como: grua e travelling (à ré, à
frente, circular). Tudo vai depender das necessidades narrativas
da história e das intenções do diretor.
Esse tipo de movimento pode ser conseguido sem empre-
garmos um operador de câmera instalado na plataforma. É o
Camate. A plataforma onde se instala a câmera é substituída
por uma cabeça remota. Na cabeça remota, instala-se a câmera
e o seu comando de movimento é feito de fora da grua, por
controle remoto. O maquinista opera os movimentos de lança
e o cinegrafista opera a câmera, visualizando tudo através de
um monitor ao lado do equipamento e se comunicando com o
maquinista através de um fone.
O Camate possibilita movimentos, posicionamentos e al-
turas de câmera praticamente impossíveis com a grua. Movi-
mentos sem corte, próximos e distanciados do objeto filmado.
Este equipamento enriquece profundamente a narrativa do
discurso audiovisual. Mas seus movimentos, devem estar pre-
vistos antes de sua execução e bastante planejadas as filmagens
com antecedência. Para quem estuda linguagem audiovisual é
fundamental vê-lo em operação, para descobrir todas as possi-
bilidades de planos que o Camate pode realizar.

Movimentos de câmera com FLYNCAM ou WAISCAM


Sempre foi um sonho dos cineastas voar com a câmera, ter
uma visão abrangente de uma locação externa. Uma empresa

48
da cidade Pasadena (USA) desenvolveu um equipamento com
suspensão ativa e estabilizador acoplável à estrutura externa de
um helicóptero convencional, podendo ser comandado do in-
terior da aeronave pelo camera man: o Waiscam.
O equipamento é constituído por uma bola de metal leve,
com visor de vidro, com suspensão ativa e estabilizador de ima-
gem, evitando a trepidação, com a câmera instalada no interior
da esfera. No interior da espaçonave, o cinegrafista comanda,
por equipamento de controle remoto, os movimentos da esfera
e de seu equipamento de filmar, visualizando as imagens atra-
vés de um monitor, que ele porta no interior da aeronave.
Este equipamento deu dinâmica às narrativas externas, em
cenas de perseguição, documentação de paisagens, locações
perigosas, filmagens de animais ferozes, visões de conjunto de
manifestações esportivas e shows ao ar livre. O equipamento
tem um limite de aproximação, devido ao vento que provoca na
paisagem em que filma e o ruído do motor da espaçonave.
O flyncam cumpre a mesma função do Waiscam em termos
de captação de imagens aéreas em movimento e o seu uso nar-
rativo. Porém, o flyncam tem algumas vantagens sobre o wais-
cam. É menor, tal qual um aeromodelo. É comandado do chão,
com suas imagens transmitidas por sinal (transmissor) e visua-
lizadas num monitor de vídeo em terra. Conseguem planos em
movimentos bem próximos do objeto filmado, devido ao seu
baixo ruído. As suas pás minúsculas de náilon, não provocam
muito vento na cena como o helicóptero tradicional.
As limitações do flyncam são o tempo de autonomia por
plano (até 4 minutos), devido ao consumo de combustível que
ele pode carregar. E a distância de até 2.000 metros, que man-
temos por controle remoto sobre o mesmo. Suas imagens são
sempre impressionantes e monumentais. Tem o seu emprego
específico e deve corresponder a estrutura narrativa do filme
em questão.
Esse conjunto de novos movimentos possíveis dos planos
acelerou a narrativa cinematográfica, criou novas sensações

49
para o espectador, aumentou as ferramentas dramático-narra-
tivas à disposição dos cineastas e enriqueceu a linguagem ci-
nematográfica. Mas, o que é mais importante, é ter colocado
o espectador, mais do que nunca, no seio das ações. Sofrendo,
rindo, chorando, pensando, desejando, apaixonando-se e emo-
cionando-se.
Foram experimentos e descobertas que modificaram defi-
nitivamente a narrativa do cinema, dando-lhe lastro para cons-
tituir-se numa linguagem própria. Diferente da literatura, do
teatro, do rádio, da música e outras formas de expressão. Verda-
deiramente a sétima arte.
A linguagem cinematográfica passou a ter à sua disposição:
os planos, as posições e os movimentos de câmera para narra-
rem as suas frases audiovisuais. Mas ressentia-se de mais um
elemento fundamental para qualquer narrativa e uma gramáti-
ca – a pontuação.

Movimentos de câmera (ou dos planos)

Panorâmica – movimento horizontal em torno do eixo da câmera


Tilt movimento vertical em torno do eixo da câmera
Travelling a câmera se desloca durante a filmagem do plano
Grua a câmera faz um mov. ascendente ou descendente
Aérea a câmera posicionada acima do horizonte visual

Numa folha de decupagem de uma sequência de planos,


obedecemos ao padrão internacional adotado em várias indus-
trias do audiovisual:

a) Primeiramente, colocamos o número de ordem dra-


mática da seqüência que decupamos, com seu título e
a indicação se a cena se passa de dia ou de noite, em lo-
cal interno ou externo e se há algum tipo de intempérie
como chuva, neblina ou vento.
Ex: 19ª Seqüência: Casa de Maria – interior /noite

50
b) A seguir, o número de ordem dramática do plano na-
quela sequência específica. Exatamente como ele está
previsto na futura montagem ou edição da cena;
c) em seguida, o nome (correspondente ao tamanho na
tela) do plano;
Ex.: Plano Geral, Plano Americano.
d) depois o posicionamento do plano,
Ex.: Plongée, Zenital .
e) e, finalmente o movimento (se for o caso)
Ex. Panorâmica, travelling.

Podemos concluir também, que dramaticamente mante-


mos o ritmo de uma narrativa audiovisual, variando o tamanho
dos planos, as posições, alturas e os movimentos de câmera.
Assim como cada plano, posicionamento ou movimento cor-
responde a uma interpretação visual de uma emoção ou de
uma intenção, os movimentos gratuitos tornam-se clichês e o
espectador percebe.

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Linguagem_Cinematográfica.indd 52 26/6/2009 14:11:35
Capítulo Quatro

A Pontuação

E m todas as formas narrativas utilizamos figuras de lingua-


gem para estabelecermos uma pontuação. São com elas
que obtemos os tempos dramáticos desejados, dividimos blo-
cos narrativos, realizamos os efeitos dramáticos e, sobretudo,
a respiração narrativa, atingindo assim, a precisão. São figuras
de linguagem, efeitos visuais empregados entre uma imagem
e outra, ou entre blocos narrativos (as sequências) para obter
uma determinada pontuação na narrativa.
As figuras de linguagem são: fads (in e out), câmera lenta
slow motion congelamento (freezer) e acelerada (fast motion),
elipse, cortina, congelamento, volta ao passado (flash back) e num
tempo futuro (farward), fusões, cortes de movimento, Símbolo, du-
pla imagem, pulo no eixo. Analisemos cada uma dessas figuras
de linguagem que ajudam a pontuação e a clareza da narrativa.

Fad In e Fad Out


O fad é um escurecimento ou clareamento progressivo da
imagem que serve como um ponto final ou abertura de uma
narrativa. Uma separação temporal entre uma narrativa e ou-
tra. Após uma perseguição intensa de um personagem ao outro,
um deles é alcançado pelo outro e o mata. No último plano da
sequência empregamos um fad out (escurecimento progressivo
até o black total). Serviu nesta situação como ponto final.
Se desejarmos marcar uma passagem temporal entre este
assassinato e um tempo à frente na história, na abertura da pró-

53
xima sequência, o seu primeiro plano virá de um black total na
tela e irá clareando até atingir a sua luz normal (um fad in).
Podemos utilizar também numa sucessão de situações dis-
tintas de um filme publicitário, onde se emprega tal produto e
interpormos estas ações por vários fad out/ fad in. Separamos
situações espaciais por esta figura de linguagem.
Outro bom exemplo é uma sequência onde alguém aguar-
da outro personagem durante muito tempo. Vários planos
idênticos em enquadramento se repetem, mas na imagem há
mudanças visuais: neva, chove, é dia, é noite e finalmente o per-
sonagem esperado chega. Os planos são intercalados por fad
out/fad in marcando essa separação temporal dentro da mesma
sequência.

Tempo dramático X tempo real


O cinema trabalha com uma narrativa de tempo dramático.
O tempo é sugerido, irreal. Não necessitamos reproduzir todo
o tempo real de uma ação nas telas. Uma sequência de planos
curtos conta uma longa ação. Um sujeito cai de um prédio. Isso
na vida real, ou seja, no tempo real, leva alguns segundos. Mas,
ao reproduzirmos essa cena, podemos fazê-la em vários planos,
em velocidades diferentes e alongarmos a cena para vinte a trin-
ta segundos. Ou seja, distendemos um tempo real muito cur-
to em um tempo mais longo. Distendemos a emoção, criando
uma espetacularidade não existente.
Podemos também diminuir durações reais de tempo, trans-
formando-as em tempo dramático mais curto. Contamos vários
anos da vida de um personagem num conjunto de sequências
curtas. Três, quatro planos podem sugerir uma longa viagem
a cavalo, de carro, a pé ou de trem, por exemplo. Chamamos a
isso de tempo dramático.
Nos planos sequência que não têm corte, o tempo do plano
corresponde a um tempo real que levou aquela cena na tela. É
o caso também de telenovelas que gravam com várias câmeras

54
a mesma ação e editam em corte direto, sem inserir nenhum
plano após as gravações. A duração daquela cena será de tem-
po real. Apenas mudou de uma câmera para outra. Isto é um
tempo real.

Slow motion
É a figura de linguagem empregada para distendermos o
tempo real. Um fato que acontece em frações de segundos é
alongado artificialmente por planos gravados em uma frase au-
diovisual, com a câmera em registro duplicado, com as imagens
em câmera lenta (slow motion). Transformamos o tempo real
em tempo dramático distendido. Aumentamos o impacto e a
emoção do plano para o espectador, que vivencia a cena através
do olhar da câmera.
Quando num filme temos uma cena forte, que se passa em
alguns segundos mas queremos distender o seu tempo real,
dando mais dramaticidade ao fato, empregamos planos com
câmera lenta (slow motion). Ou seja, distendemos o tempo real
em um tempo dramático, artificialmente.
Um prédio é implodido. Ele cai em alguns segundos. Um
carro capota. Tudo ocorre em frações de segundos. Alguém
leva um tiro de seu algoz e cai imediatamente morto em milési-
mos de segundo. Empregando a câmera lenta (o slow motion),
distendemos esse curto tempo real em um tempo dramático
mais prolongado.
Numa sequência, um casal se reencontra depois de anos se-
parados. O primeiro abraço é muito curto para descrevermos essa
sensação saborosa de reencontro. O êxtase que os dois sentem e
que desejamos passar para os espectadores. Desejamos prolon-
gar essa sensação. Empregamos, então, o slow motion (a câmera
lenta) nos planos destas ações ou sequências. Pode ser também
alternado com planos em velocidade normal. Empregando en-
tão a câmera lenta, obteremos uma distensão de um tempo real
em tempo dramático. Ganharemos em sensação e emoção.

55
Fast motion
Para reproduzirmos um movimento humano, necessitamos
em cinema de 24 quadros por segundo. Quando diminuímos a
quantidade de fotogramas ou frames por segundo, a movimen-
tação captada pelo plano acelera-se. Isso torna o movimento
acelerado.
O emprego do fast motion (câmera acelerada) irá provo-
car uma sensação mecânica nos fatos, uma repetitividade, um
tom risível das ações ou o aumento brutal do impacto da ação
filmada.
A repetição do tempo real em um tempo mais curto tor-
na-se risível. É o caso dos filmes de Charles Chaplin e da fase
do cinema mudo em geral, que eram rodados a 16 quadros por
segundo (fast motion). Numa das sequências do filme “Tem-
pos Modernos”, o personagem Carlitos, trabalhando na linha
de montagem de uma fábrica, aperta o dia inteiro parafusos.
Quando sai à rua, continua repetindo os movimentos.
No caso de sequências onde haja perseguição, a velocidade
é obtida com o emprego do fast motion (câmera acelerada). Nas
cenas de combate, lutas ou impacto, quando empregamos fast
motion (câmera acelerada), a violência aumenta.
Podemos ridicularizar algo, torná-lo mecânico e sem inte-
resse quando empregamos o fast motion (câmera acelerada).
Um bom exemplo pode ser observado na sequência de orgia
sexual do filme “Laranja Mecânica”, de Stanley Kubrick,. A
sequência é toda rodada em fast motion (câmera acelerada),
obtendo junto ao espectador uma sensação de vulgariza-
ção e mecanização do ato de fazer sexo. A cena deixa de ser
erótica.

Cortina
É a figura de linguagem empregada para deslocarmos no
tempo e no espaço uma narrativa. Um elemento visual que pas-

56
sa diante da câmera no final de um plano e vai ligar-se a outro
plano, com um movimento semelhante neste outro plano, em
outra sequência dramática.
Observe este exemplo no filme “Ghost”. Após um longo
plano-sequência, onde dois amigos conversam e caminham
numa das ruas de New York, saindo do metrô e indo em di-
reção ao trabalho. Atravessam a rua no final do plano indo em
direção ao fundo de quadro e um táxi corta o quadro em pri-
meiro plano, efetuando uma “cortina” visual. No primeiro pla-
no que sucede na próxima sequência, os personagens entram
no elevador, entrando em quadro pela câmera, na mesma di-
reção que o táxi fez a “cortina” no plano anterior. Essa ilusão
visual provocou uma elipse temporal e espacial na narrativa. O
mesmo ocorre no filme “Cidade de Deus”, de Fernando Meirel-
les quando emprega uma “cortina” para deslocar sua narrativa
no tempo. O personagem caminha (em uma outra época) pelas
ruas da favela. Um ônibus passa em primeiro plano, diante da
câmera, e a caminhada do personagem em outra época conti-
nua no mesmo ambiente da favela.
A “cortina” é uma figura de linguagem muito prática e ba-
rata numa produção cinematográfica. Evita a construção de
cenários, economiza recursos e acelera a narrativa, dando ob-
jetividade dramática ao filme ou vídeo.
Dominar as figuras de linguagem representa precisar o dis-
curso.

Elipse
É a figura de linguagem que possibilita a narrativa deslocar-
se no tempo e no espaço. A elipse pode ser sonora, visual ou so-
nora visual, simultaneamente. Podemos passar de um cenário
a outro sem necessariamente filmar a trajetória intermediária.
Avançar no tempo num mesmo local ou sequência. Encurtan-
do a narrativa, concentrando a trama e fazendo a história ser
contada de forma fluida. É talvez uma das mais usadas figuras

57
de linguagem para pontuar uma narrativa visual, dando perfeita
concisão ao discurso visual.
Pode ser usada no interior de uma sequência ou para passar
de uma sequência a outra. Não interrompe o bloco narrativo de
forma explícita. Dá fluidez ao discurso, sem que o espectador per-
ceba uma forma sintética de narrar um fato, em tempo dramático.
A primeira vez que foi empregada uma elipse sonora no ci-
nema foi no filme “Cidadão Kane”(Citizen Kane – 1941) de
Orson Wells. Vejamos um outro exemplo de uma elipse sono-
ra, aplicada no filme “Coração Satânico”. O detetive particular
caminha nas ruas do bairro do Harley, onde mantém o seu de-
cadente escritório de investigações. Percebemos que ele é bem
popular no bairro. Caminha pela calçada cumprimentando as
pessoas e os comerciantes. Na sua trajetória, ouvimos um te-
lefone que soa ao fundo. De repente, ele se detém em frente a
um prédio e olha para cima. O telefone soa na trilha sonora do
plano médio na externa (elipse sonora). No interior do seu
escritório (construído em estúdio), o detetive Harold Angel
atende em plano de detalhe um velho telefone que soa (elipse
sonora) numa escrivaninha desgastada. O ambiente é velho,
decadente e desarrumado. Senta-se à mesa e conversa com um
novo cliente ao telefone, marcando um encontro. No final do
telefonema, a conversa continua, mas na imagem, o detetive já
caminha em plano geral na calçada do bairro onde se encontra
o escritório do seu cliente. A conversa entre os dois elipses so-
noras. Deslocamos as ações no espaço, embora temporalmente
a conversa ainda esteja na sequência anterior.

Símbolo (Angel Heart)


A figura de linguagem narrativa dá-se por um objeto en-
quadrado em um plano detalhe ou outro tamanho de plano
qualquer, remetendo a memória de um personagem ou situa-
ção de uma outra seqüência do mesmo filme. Observemos no
filme “Efeito Dominó”, de Roger Donaldson. Em uma das se-

58
qüências iniciais do filme, dois policiais do FBI (uma mulher e
um homem) se encontram no elevador e conversam a propósi-
to dos anéis e umas pulseiras hippies que a jovem policial porta.
Numa das sequências do final do filme, esse policial participa
do cerco da casa de um foragido da polícia e descobrem que ela
tinha sido morta e enterrada no terreno da casa. A identificação
é feita quando o policial vê um símbolo no corpo da morta (as
pulseiras e os anéis que ela portava no início do filme). Essas
pulseiras e anéis são os símbolos que marcam a presença e a
identificação da personagem.
Um outro belo exemplo encontramos no filme brasileiro
“Central do Brasil”, de Walter Salles Jr. No início do filme, a mãe
do personagem principal, o menino Josué, morre atropelada
por um ônibus bem em frente à estação ferroviária Central do
Brasil. A escritora de cartas para analfabetos (interpretada pela
atriz Fernanda Montenegro) recolhe o lenço desta senhora,
depositando-o sobre a sua banca. Mais adiante no filme, Dora
(a personagem de Fernanda Montenegro) resolve partir para o
nordeste, acompanhando o menino Josué, para que ele reen-
contre seu pai. Quando chegam lá, o menino corre em direção
à casa paterna e em primeiro plano, num cruzeiro (crucifixo de
madeira), percebemos o mesmo lenço colocado na cruz. Não
sabemos quem o colocou, mas concluímos ter sido Dora e, com
este símbolo, trazemos de volta a lembrança da mulher morta
para o espectador. O lenço é o símbolo empregado nestas duas
seqüências do filme. Não importa o nível cultural do especta-
dor ou da cultura do país onde o filme é exibido, ele sempre
compreenderá o que quer dizer aquele lenço no quadro e a
quem pertence na história narrada.
Como a bola de cristal no filme “Infidelidade” pertencente
Ao personagem do marido, doada por sua esposa ao jovem
Amante francês que servira como arma do crime. O objeto,
Volta a casa do casal pelas mãos do marido assassino, sendo
Percebido pela esposa. A bola de vidro transforma-se no
símbolo da infidelidade conjugal, na narrativa.

59
Congelamento
É a figura de linguagem empregada para chamar a atenção
de um determinado plano no momento narrativo da trama, sobre
um detalhe importante para compreensão da história. A imagem
é paralisada por alguns segundos. O congelamento dá relevo a este
elemento ou situação. Serve como um grifo ou negrito na narrativa
visual tal qual a foto feita do grupo de policiais comandados Eliot
Ness (Kevin Coster) em um resaurante no filme “Os Intocáveis”
(The Untouchables, 1987), de Brian de Palma.

Corte de movimento
É a ligação de um plano a outro, conseguido por dinâmicas
semelhantes, existentes entre o último plano de uma sequência
e o próximo plano da outra sequência. Por exemplo:
Uma pessoa abre a porta para sair de um ambiente em
uma sequência e fecha a porta às suas costas. Como no filme
“A Malvada” (All About Eve), 1950, de J. Mankiewicz. Em ou-
tra sequência, em corte contínuo, abre e fecha a porta às suas
costas em um outro ambiente. Fizemos uma mudança de espa-
ço físico e avançamos no tempo narrativo, ligando um plano a
outro em movimento. É evidente que o corte do editor deverá
ser bem preciso. E que, na filmagem, o tamanho do quadro a
dinâmica do personagem seja a mesma para facilitar a emenda
continua do movimento.
A coincidência de movimentos, ritmo, tamanho de plano, a
direção que se move em quadro e similitude, é que possibilitam
este tipo de corte. Deve ser pensado no momento das filma-
gens e estar anotado na decupagem plano a plano, para não ser
esquecido. Quando bem filmados ou gravados, o espectador
não perceberá o corte e a história avançará no tempo e no es-
paço. Pode-se misturar movimentos de câmera com dinâmica
interna de outro quadro. Ou seja, a movimentação pode ser da
câmera ou no interior do quadro. Observe no filme “Ghost” a

60
dupla de atores que vem da rua e entra no elevador cenográfico
pela lateral da câmera, na diagonal do quadro. Ao desembar-
carem do elevador no andar do escritório, saem também pela
câmera e entram no escritório andando pela câmera (seguidos
pela câmera em travelling à frente) e com isso conseguindo
um corte de movimento. Os movimentos nos dois planos que
se sucedem, devido a sua similitude de dinâmica e velocidade,
possibilitam a emenda de um plano a outro. Ou seja, um corte
de movimento.

FUSÃO
É a sobreposição gradativa de uma imagem sobre a outra
até que a primeira desapareça totalmente, predominando a cla-
reza e definição da segunda. A fusão de um plano a outro pode
ser feita em várias velocidades de transição.
A fusão é uma figura de linguagem utilizada para pontuar
o ritmo de uma narrativa. Pode alongar ou encurtar uma sensa-
ção de tempo narrativo, dependendo de sua velocidade e inten-
ção. Imaginemos que num filme de faroeste, um homem terá
que viajar três dias a cavalo de uma cidade a outra. Esse trajeto
longo pode ser narrado em três ou quatro planos do homem
viajando a cavalo, e os planos se sucederem em fusão. Isso dis-
tenderá o tempo dramático e aumentará a sensação no espec-
tador de uma longa espera, apesar da distenção artificial. É um
tempo dramático representando um tempo real. Dias narrados
em segundos.
Essa mesma figura de pontuação pode ser empregada para
encurtar uma narrativa, como fazem os publicitários em seus
spots de propaganda. Uma pequena ação é contada em 8 se-
gundos, com dois planos de 4 segundos, que passam por fusões
de 5 frames, ligando a mais duas outras situações de 8 segundos
que repetem o uso da fusão. Com 25 segundos, contamos três
situações dramáticas, onde o produto é utilizado pelo persona-
gem. No final de todas as cenas congelamos a ultima ação onde

61
o produto está em evidência pelo tempo de cinco segundos,
como assinatura do comercial. Isso só é possível porque a pas-
sagem de plano à outra é feita por fusões rápidas, empregando
de 3 a 5 frames, encurtando, assim, o tempo real de narrativa.
Percebemos que podemos encurtar ou distender o tempo real
através do emprego de fusões, entre os planos empregados num
discurso visual.
A fusão também é empregada para fazermos deslocamen-
tos no tempo e no espaço durante uma frase visual narrativa.
Podemos vivenciar uma situação e naquele mesmo local, mu-
dar de aspecto o cenário através de um plano semelhante com
decorações modificadas, que indicam uma passagem temporal
na situação. A passagem de um plano a outro (seja para o passa-
do ou para o futuro) se faz pela superposição de uma imagem a
outra, através do uso de uma fusão.
Em sequências em que reproduzimos encontros, sensações
de enlevo, sonho ou imaginação, ligamos os planos, uns aos ou-
tros, através de fusão, e, com isso, distendemos o tempo real
num tempo dramático de sensações, através do uso da fusão
entre um plano e outro.

PONTUAÇÃO
Figuras de Linguagem

Fade In Fade Out


Elipse visual Elipse sonora
Slow motion Fast motion
Fusão Freezer
Corte de Movimento Cortina
Símbolo Foco e desfoque
Flash Back Flash Farword

62
DOIS PLANOS EM UM (foco e desfoque)
É uma figura de narrativa empregada para ligar dois planos
em um, empregando a mudança do foco dentro do mesmo pla-
no. Dois personagens ou espaços dramáticos estão enquadra-
dos no mesmo plano, o foco situa-se apenas em um. Num dado
momento da ação o foco é transferido para o outro deixando
o anterior desfocado. Quase sempre empregamos este artifício
narrativo marcando a mudança de foco no diálogo entre os per-
sonagens e seus movimentos. O primeiro personagem em foco
dá o seu diálogo (em foco). O outro em quadro está desfocado.
O outro personagem, responde. Na resposta, o foco é transferi-
do para o segundo personagem em quadro.
Um bom exemplo desta figura pode ser conferido no filme:
“Silêncio dos Inocentes”, de Jonathan Demme quando a deteti-
ve Starling é chamada ao gabinete do diretor da escola do FBI.
Na sala se julgando sozinha, observa as fotos na parede de uma
investigação em curso. Na porta da sala, o chefe, em desfoque,
observa-a. Chama o seu nome e o foco é transferido dela para
ele.
Esse conjunto de figuras da linguagem narrativa audiovisu-
al, ajudam a pontuar os fraseados compostos por planos e mo-
vimentos, tornando a narrativa cinematográfica fluida e precisa.
Respondendo as intenções dramáticas do diretor numa obra de
cinema ou televisão.

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Capítulo Cinco

Continuidade e eixo dramático


de Gláucia Pelliccione

O discurso cinematográfico ou do audiovisual, de uma forma


geral, é construído de forma fracionada (em planos) que
são filmados, muitas vezes por necessidades de produção, fora
de ordem. A narrativa audiovisual é feita em síntese, ou seja; num
tempo dramático, abreviado ou distendido, diferente de outros
meios de expressão que trabalham com um tempo real como
no teatro, por exemplo. Um personagem morre e assistimos o
tempo real de sua morte. Num tempo verossímil, como na vida.
Apenas alguns segundos se passam. Já no cinema, por interesse
dramático, distendemos esse tempo artificialmente, ou seja, num
tempo dramático (que pode ser mais longo ou mais curto que na
realidade). Tudo pode ser contado em mais ou menos tempo.
Esse conjunto de prerrogativas da gramática audiovisual
obriga o cineasta a dispor de técnicos auxiliares em sua equipe,
controlando a continuidade narrativa do filme ou vídeo. São
eles: a Continuísta (ou script girl), o primeiro Assistente de Di-
reção e o Diretor de Fotografia durante as filmagens e o Editor
na finalização do filme/edição.
Essa continuidade dramática narrativa implica a observa-
ção da ligação de um plano a outro, de uma sequência a outra e
do conjunto das sequências como um todo no filme. Estes pro-
fissionais, sobretudo a Continuista, devem se preocupar com o
ritmo narrativo interno e externo dos planos.
O ritmo interno dos planos, são: a movimentação dos per-
sonagens, veículos e animais em quadro, ligando um plano a

65
outro; a velocidade e o tom das falas de um plano a outro, man-
tendo a continuidade dramática da narrativa. O espectador não
deve perceber a ruptura de um plano a outro. Na sala de exibi-
ção, na tela da tv e demais mídias, o espectador deve sentir a
sensação de que todos os planos foram rodados de uma só vez,
com uma só câmera.
A Continuísta deverá ficar atenta também: ao posiciona-
mento dos objetos em cena, da maquiagem e dos penteados
dos personagens, dos vestuários e do ritmo dos movimentos
de câmera, da continuidade de luz, de foco das lentes e de ob-
jetos estranhos à cena enquadrada (por exemplo: um cabo elé-
trico, um tripé, uma sombra ou reflexo da equipe, uma placa
moderna de publicidade, um veículo ou uma pessoa estranha
ao elenco)
Consideramos ritmo externo dos planos os movimentos
da câmera durante a captação das imagens. Eles devem ser per-
feitos para se ligarem sem que sejam percebidos, uns aos ou-
tros. Os movimentos devem corresponder às intenções dramá-
ticas de um plano. Aproximações, afastamentos em direção ao
personagem ou acompanhamentos dos personagens em cena
devem corresponder a uma pontuação de uma emoção, dar ên-
fase a uma fala do personagem, explicitar um objeto ou símbolo
na sequência.
A compreensão espacial de onde se passa uma sequência e
a orientação do espectador neste espaço dramático compreen-
dido visualmente pela ligação entre os planos, é uma das tarefas
fundamentais de uma Continuísta no set de filmagens. Esta liga-
ção correta de um pano a outro é conhecida como raccord. Por
isso ouvimo-la advertir durante as filmagens: – Não monta!
Como vemos, a Continuísta é a responsável pela qualidade
do discurso e a continuidade narrativa da obra audiovisual de
ficção. Deve ter o filme na cabeça, conhecer cada plano da de-
cupagem. Dominar com perfeição a escritura audiovisual. Ela
é a principal auxiliar de um diretor artístico no acabamento da
escritura de um filme ou vídeo.

66
Além de todo o trabalho de controle do acabamento artís-
tico dos planos é ela quem classifica e identifica cada plano para
uma futura edição: rápida, precisa e segura. Para tal, ela a cada
plano faz uma claquete ou clap, com todas as informações sobre
o plano. São cerca de 900 a 1.000 planos em um filme de longa-
metragem com duas horas de duração. Em um filme de curta-
metragem de ficção com dez minutos de duração, empregamos
cerca de 60 planos. E um filme publicitário de 30 segundos de
duração, narramos empregando de 3 a 6 planos.
Na claquete, gravada ou filmada antes de cada plano, cons-
tam as seguintes informações: o nome da empresa produtora,
o título do filme, o nome do diretor do filme, o número da se-
quência, do plano, da tomada , o número do rolo de filme, fita
de vídeo ou cartão digital no qual está registrado aquele plano,
a câmera que captou aquele plano e em que data foi filmado.
Assim como o nome do responsável pelas imagens: o diretor de
fotografia. A haste tracejada em preto e branco na parte supe-
rior da claquete é um acessório de sincronismo da imagem com
o som. Podemos afirmar então que a claquete é a carteira de
identidade de cada plano. Ela é fundamental como registro em
cada plano. As informações contidas nas claquetes, dos planos
filmados ou gravadas fora de ordem, é que ajudarão o editor
a ordená-los dramaticamente. Esta ordenação é feita segundo
a decupagem do roteiro do filme. Assim, o editor conseguirá
então, editar sem problemas.
Quanto mais uma Continuísta domina a linguagem cine-
matográfica, mais ela será eficiente nas filmagens e ajudará o
filme a conter um discurso claro, com ritmo, objetivo e eficien-
te do ponto de vista dramático.

Eixo dramático
Todo espaço dramático em cinema ou televisão é construí-
do pelos planos. A cena somente existe para o espectador a par-
tir do que ele visualiza no enquadramento. Para o espectador,

67
nada existe além da tela. Por isso, devemos orientar o espec-
tador de cinema ou televisão em relação ao espaço utilizado,
que os planos enquadram e obedecer a este eixo dramático
estabelecido para a narrativa. Lembrando que nenhum plano
existe de forma isolada. Todos estão interligados uns aos outros
formando as frases narrativas e delimitando o espaço onde se
passam as ações que narramos.
A ilusão de terceira dimensão se constrói com os planos e
o que acontece no interior deles. Nesses planos, para que a ter-
ceira dimensão seja percebida visualmente pelo espectador, de-
vemos orientá-lo dentro de um eixo visual de 180 graus. Tudo
será construído nos planos mantendo-se esse eixo. Devemos a
todo custo evitar “quebrar esse eixo”. Nos planos que se suce-
dem, devemos situar o espectador espacialmente. Para tal, ne-
cessitamos a cada plano, preocupar-nos com a direção do olhar
em relação ao eixo dramático estabelecido, para filmarmos os
planos. De onde para onde o espectador se locomove. Onde
ele se situa em relação ao conjunto de planos filmados em uma
sequência de planos.
O posicionamento dos personagens ou a direção do olhar
é que determinam o eixo dramático. Se mostrarmos num plano
geral, médio ou americano que um homem se situa à direita de
quadro e uma mulher à esquerda, determinamos um eixo que
devemos manter na inter-relação dos próximos planos.
Invertendo-os, por exemplo, o próximo plano deverá se
relacionar com este novo eixo, para que, desta forma, o espec-
tador volte a se orientar, compreendendo o posicionamento
dos personagens no espaço dramático da cena e a inter-relação
entre eles.

Direção do olhar
A direção do olhar que irá manter ou estabelecer o eixo
dramático no qual estamos trabalhando. Se partimos de um
close up de alguém que olha para outra pessoa para a direita de

68
quadro, no plano seguinte mostramos a outra pessoa olhando
para esquerda de quadro. Deste modo, cruzamos a direção dos
olhares e fazemos o espectador compreender que os persona-
gens se olham.
No filme “Coração Satânico”, de Alan Parker o detetive par-
ticular interpretado por Mickey Rourke vai visitar o seu clien-
te Robert De Niro, sendo recebido pelo secretário particular.
Nesta seqüência a decupagem é quase toda feita em close-ups e
planos americano. Observe a importância da direção do olhar
dos personagens que interligam os personagens durante os di-
álogos da cena. No caso das duas pessoas olharem para a mes-
ma direção no quadro, por exemplo, para a direita, entende-se
que ambas estão olhando para algo ou alguém, que no plano
seguinte deverá ser revelado.
Podemos observar outro exemplo no filme brasileiro, “O
Estômago, de Miguel Jorge o personagem de Babu e outro pre-
sidiário olham para o personagem do cozinheiro interpretado
por João Antônio. Observe a direção do olhar em cada plano
desta decupagem.

Deslocamento com entradas e saídas de quadro


Imaginemos que numa sequência filmaremos um perso-
nagem se deslocando, num mesmo espaço, dividido em vários
planos. Este deslocamento será compreendido pelo espectador
se obedecermos a continuidade de entradas e saídas de qua-
dro (ou plano). Quando o personagem se desloca num mesmo
tempo e espaço, ao sair de quadro e entrar no quadro (plano)
seguinte, devemos respeitar a regra de continuidade da direção
do deslocamento. Se alguém sai à direita de quadro, no plano
seguinte entrará à esquerda. Deste modo, mantemos a conti-
nuidade da direção do deslocamento deste personagem.
Se não respeitarmos esta regra, como por exemplo: um
personagem sai à direita de quadro e, no quadro seguinte, entra
à direita de quadro, isso dará a impressão de que o personagem

69
se deslocou para uma direção e retornou. Se este for o objetivo,
tudo certo, mas se não, a narração visual ficará comprometida.
O deslocamento que não obedece ao tempo e ao espaço em
que o personagem percorre, estabelece um salto no tempo dra-
mático. Neste caso, não é preciso respeitar a regra de continui-
dade de direção do deslocamento do personagem. Por exem-
plo: uma professora encerra sua aula e sai da sala despedindo-se
dos alunos. No plano seguinte, ela entra em quadro aparecendo
numa rua, fazendo sinal para um táxi. Compreendemos que
houve um salto no tempo real e dramático do filme, adiantan-
do a chegada da personagem à rua. Neste caso, não precisamos
respeitar a regra de continuidade de direção do deslocamento
deste personagem. Se a personagem sai da sala de aula à direita
de quadro, poderá entrar no quadro seguinte da rua também
à direita de quadro, sem prejuízo para a compreensão de seu
deslocamento.

Saltando o eixo dramático


Em todo espaço que filmamos estabelecemos um eixo
dramático de 180º para mantermos a orientação do especta-
dor no conjunto de planos narrativos da cena. Ao invertermos
esse eixo “saltamos ou quebramos o eixo dramático da cena”
e, conseqüentemente, desorientamos o espectador. Exemplo:
se num plano uma mulher que se encontra à direita de quadro
dialoga com um homem que está à esquerda de quadro, esta
relação deverá ser mantida nos planos seguintes: ela sempre à
direita de quadro e ele sempre à esquerda, ou, ela olha para ele
para a esquerda de quadro e ele olha para ela à direita de quadro
nos planos isolados de ambos. Se em algum plano invertermos
estes posicionamentos, o eixo foi “pulado”. Neste caso, o posi-
cionamento da câmera rompeu os 180° estabelecidos no eixo
inicial. Quando invertemos o eixo, ou “saltamos para o outro
lado”, tudo se inverte: quem estava à direita, passa a estar a es-
querda e vice-versa.

70
Para saltarmos o eixo criamos uma dinâmica, utilizando,
por exemplo, o movimento do personagem no plano, repetin-
do-se no plano seguinte, como dinâmica para o corte e visua-
lização do novo eixo. Exemplo: no filme “Bagdá Café”, numa
cena do bar quando o turista alemão acaba de deixar rapé de
presente para os funcionários, mostramos num plano ameri-
cano de conjunto o funcionário índio num lado do balcão e o
negro do outro lado do balcão. Ambos se aproximam do balcão
para cheirar o rapé. No plano seguinte, mostramos num clo-
se-up de conjunto, os dois personagens entrarem no quadro,
repetindo o movimento de aproximação ao rapé em eixo opos-
to ao mostrado anteriormente. Ouvimos em of o grito de uma
mulher, que faz com que ambos se afastem do rapé, assustados ,
saindo de quadro. No plano seguinte , mostramos os dois repe-
tindo o afastamento ao rapé , num plano americano de conjun-
to no novo eixo (igual ao do plano anterior do close-up). Essa
modificação não incomodou o espectador porque:
Houve modificação no tamanho dos planos, repetição do
movimento em todos os planos e foram as linhas de enquadra-
mento em relação ao balcão. Outro exemplo clássico é o de mo-
vimento de personagens caminhando frente à câmera (câmera à
ré) e, no plano seguinte, a câmera vai para as costas dos persona-
gens seguindo-os. Mais um exemplo é o de pessoas a mesa. Um
garçom entra em quadro atravessando um plano a outro, possibi-
litando a inversão. Quem estava de frente fica de costas e vice-ver-
sa. É revelado ao espectador o outro lado do cenário e a reposição
dos personagens em quadro. Nas transmissões esportivas, o eixo
dramático visual do espectador deve ser resguardado. Por isso as
câmeras devem ser posicionadas somente de um lado do campo,
respeitando os 180°. Quando um jogador, de um lado do campo,
em plano fechado, arremessa uma bola para o outro lado do cam-
po ou quadra e, em seguida, cortamos para um plano aberto, mos-
trando a continuidade do percurso da bola arremessada, devemos
obrigatoriamente respeitar o eixo dramático, caso contrário, tere-
mos a sensação de que a bola está voltando para o mesmo lugar.

71
Passagem de tempo
Plano ou seqüência de planos que avança a história no tem-
po e no espaço ou no mesmo espaço físico. Esse artifício narra-
tivo pode associar outras figuras de linguagem.

Dinâmica interna e externa dos planos


Ao longo deste capítulo observamos que a diferença do
tamanho dos planos, a sua diferença de posicionamento dão
ritmo a narrativa. Porém, alem disso outros recursos podem
colaborar no andamento da narrativa. É a dinâmica interna e
externa do plano em si, independente do tamanho ou posição.
A dinâmica interna de um plano é a movimentação dos ele-
mentos que estão enquadrados nele. Ou seja, o deslocamento
dos personagens e figurantes, a movimentação dos veículos e
animais no plano enquadrado. Essa dinâmica interna facilitará
a ligação de um plano a outro. Aumentará a verossimilhança
ficcional do plano e a sua inter relação. A dinâmica externa de
um plano é a movimentação dele apoiada por um suporte de
câmera. É o deslocamento do plano durante a filmagem dele.
Um movimento pode pontuar uma emoção, colocar o especta-
dor no seio das ações, conseguir pontos de vista privilegiados
para o espectador. Ou seja, podemos associar todos os elemen-
tos internos do plano a uma dinâmica externa e, com isso, con-
seguir um resultado surpreendente junto ao espectador.
Concluindo, as dinâmicas internas e externas aos planos,
aliadas ao tamanho e posicionamento do plano se integram ao
conjunto de ferramentas que compõem a gramática do audio-
visual como um todo. Veremos a seguir que podem ser usados
nas mais corriqueiras situações dramáticas das teledramaturgias
ou gêneros ficcionais nos filmes de curta e longa-metragem, nas
coberturas jornalísticas e nos documentários temáticos dando
fluidez ao discurso e qualidade à narrativa, sem perda de obje-
tividade.

72
Capítulo Seis

Situações dramáticas

A ssim como na vida dos homens, inúmeras situações se


repetem nos roteiros e nas telas nos mais diversos gêne-
ros dramáticos e meios audiovisuais, tais como: comer à mesa,
dormir ou assistir televisão deitado, conversar com o carona
no interior de um carro em movimento, andar de bicicleta,
duas pessoas conversando ao telefone, uma partida esportiva,
uma cerimônia de casamento, uma briga corporal entre duas
pessoas, um casal conversando e caminhando na calçada etc.
Essas situações quando reconstruídas em filmes ficcio-
nais: de publicidade, videoclipe, seriados, telenovelas, em lon-
ga e curta-metragem de ficção e documentários, obedecem a
uma gramática consolidada pela experiência de vários cine-
astas, de diferentes formações, executadas nos mais diversos
gêneros dramáticos de filmes ou vídeos. Daí a necessidade de
observar os planos mais empregados nas narrativas destas si-
tuações para evitar filmar/gravar de forma pobre ou incorreta,
faltando ou exagerando na quantidade de planos, utilizando
planos de efeito plástico sem resultado dramático. Frases vi-
suais longas, não correspondentes à emoção desejada pelo
cineasta ao contar uma sequência. Piadas que ficam fora de
tempo, perdendo o seu humor. Construções narrativas enfa-
donhas, sem ritmo, de pouca clareza e objetividade. Narrati-
vas com dificuldade em obterem uma progressão dramática
nessas situações.
Na verdade, ao reunirmos estas observações, visamos cola-
borar com uma gramática para quem deseje escrever cenas fic-

73
cionais com imagens, tornando o discurso mais eficiente. Saber
preparar a sequência e os seus respectivos planos para trabalhar
com uma ou mais câmeras nas filmagens ou gravações destas
situações, evitando desperdício de energia, tempo e dinheiro.
Mas atenção, isto não é uma receita de bolo. Leia e releia o ro-
teiro com bastante atenção antes de detalhar a cena em planos.
Compreenda a intenção da cena, o que está por trás dos diá-
logos e da trama em si. Evite o óbvio, mas também não peque
pelo exagero e o preciosismo.
Analisando variados roteiros cinematográficos de boa
construção dramática, concluiremos que cada frase correspon-
de a um plano ou um conjunto de planos. Sugere movimentos
e posicionamentos de câmera.
É necessário que, antes de escolher um plano, haja uma
leitura atenta do roteiro para descobrirmos a real intenção da-
quela narrativa literária que irá se transformar em discurso vi-
sual. Perceber o intuito da trama. E, após esta análise e reflexão,
escolhermos os planos necessários para compreensão da cena
por parte do espectador. Perceber qual o plano necessário mais
eficiente. E com isso, alcançarmos o que é mais importante: a
emoção e cumplicidade do espectador, fazendo com que ele
interaja conosco.
Achamos que essas modestas notas ajudarão aos diretores
emergentes ou experientes de cinema e tv de broadcasting, aos
assistentes de direção, às continuístas, aos diretores de fotogra-
fia e os operadores de câmera no set de filmagens ou gravações.
E servirá também como ferramenta auxiliar para quem escreve
roteiros e edita imagens ao vivo ou pré-gravadas.
Comecemos pela mais corriqueira das situações em que
o homem frequentemente se encontra, seja no café da manhã,
num acerto de contas entre gângsteres, numa cantina de escola,
num almoço em família ou num jantar romântico a dois... Pes-
soas sentadas à mesa.

74
Um casal à mesa (de formato quadrado ou redondo)
Em qualquer tipo de obra audiovisual, ao nos deparamos
com situações de casal à mesa, não importando o formato da
mesa, nossa primeira preocupação ao efetuarmos uma decupa-
gem ou posicionarmos a câmera para a execução dos planos,
deve ser situar a mesa no espaço informando onde se passa a
sequência (locação real adaptada ou cenário), sempre no intui-
to de orientarmos o espectador e balizarmos os trabalhos de
filmagens ou gravações. Ou seja, optarmos pelo eixo dramático
que filmaremos os planos e a sequência como um todo.
Trabalharemos no detalhamento plano a plano, descreven-
do a cena, com nossa atenção voltada para mantermos o eixo
dramático, colaborando com o espectador na sua orientação
no espaço que filmamos e que vai para as telas. Lembre-se: o
espectador só conhece o espaço que está enquadrado na tela.
Ele não está no set de filmagens em que nos encontramos. Nós
sabemos em qual lado se encontram as portas e as janelas, ele
não. Sobretudo nos planos fechados, se não empregarmos logo
no início da narrativa das ações, planos abertos. Em algum mo-
mento deveremos revelar onde estamos, e com isso, situar o es-
pectador. Nosso personagem, numa sequência de planos fecha-
dos, olha para algum lugar ou pessoa que está naquele espaço e
o espectador deve subentender para quem ele olha.
Em função do texto, devemos também estabelecer uma
progressão dramática, conseguida através do emprego pro-
gressivo do tamanho dos planos, de seu posicionamento e de
determinados movimentos de câmera, escolhendo o plano de
tamanho indicado e, uma vez iniciada a conversação central
do diálogo, manter o intimismo entre os personagens. Marcar
e pontuar emoções ou intenções com movimentos de câmera
(ou plano) a cada trecho da narrativa. Sentiremos a necessida-
de, após uma grande tensão dramática, de “respirar” no espaço,
ou seja, trabalhar com um plano mais largo, um movimento de
recuo ou ascensão.

75
Qualquer ação dramática pode ser narrada de dentro para
fora. Inicialmente concentrando-se na relação entre persona-
gens, com planos fechados e em seguida ir aumentando o ta-
manho dos planos, revelando aos poucos o ambiente onde nos
encontramos. Ou seja, iniciamos a cena com planos fechados
e vamos revelando aos poucos o espaço cenográfico ou real,
com planos um pouco mais largos. Demonstraremos também,
de forma progressiva, os demais participantes da cena; e, fi-
nalmente, num plano bem mais aberto que os demais, identi-
ficamos o espaço total onde se encontram. Mas isso, sempre
na proporção que a ação dramática avança e o diálogo orienta.
É recomendável nos apoiarmos nos diálogos da cena ou suas
ações, para escolhermos o plano correto. Antes de tudo, é ne-
cessário que entendamos a cena contida no roteiro para depois
detalhar em planos fixos ou em movimento.
Pode-se também adotar a forma narrativa inversa. Inicia-
mos a sequência pelos planos mais abertos, situando imedia-
tamente o espectador onde se passam as ações da sequência
em questão. E, na medida em que a trama avança, empregamos
planos progressivamente mais fechados, aproximando-nos dra-
maticamente dos personagens. Selecionando, no conjunto dos
atores e figurantes que estão em cena, quais deles nos interes-
sam naquele momento dramático, quem tem mais importância
para a cena desenvolvida naquela sequência.
Em qualquer um dos casos, observemos o emprego de de-
terminados planos neste tipo de sequência:

Detalhamento em planos para cenas com pessoas à mesa

Plano Geral ou Médio Conj. Plongée (situando os pers. no ambiente)


Plano Médio lateral (os personagens de lado, frente a frente)
Plano Americano de Conjunto (da direita e outro da esquerda)
Plano Americano frontal (de um e do outro personagem)
Close Up Frontal (de um e do outro pers. com e sem referência)
Plano Geral ou Médio de Conj. (o casal parte após a cena)

76
Esse conjunto de planos pode ser incorporado por opção
narrativa do diretor, em um ou vários planos-sequência (fixo
ou em movimento), mas variando o tamanho dos enquadra-
mentos.
No filme de longa-metragem “Sexto Sentido”, de Night M.
Shymalant, encontramos um belíssimo exemplo de emprego
de um plano sequência em movimento, muito bem escolhido,
do ponto de vista dramático narrativo, em substituição a uma
decupagem plano a plano.
A narrativa da sequência tem um duplo sentido. O roteiro
deseja que o espectador pense que a cena trata apenas de um
encontro de um marido workaholic com sua esposa, num jan-
tar de comemoração de dez anos de casados. E como sempre,
por dedicar-se em demasia ao seu trabalho, está mais uma vez
atrasado para o encontro.
Ao mesmo tempo, do ponto de vista da trama da história,
ele já está morto, é um “espírito” (mas não temos totalmente
certeza) e a sua presença, em função do roteiro, é inexistente.
Ele é apenas um fantasma que só os videntes veem. Que apare-
ce aos nossos olhos de espectador-vidente, mas não aos olhos
da personagem que é a sua esposa. E nós somos como o perso-
nagem do menino, videntes.
Esta cena, caso fosse detalhada plano a plano, estabeleceria
imediatamente uma inter-relação dos personagens, dificultaria
a compreensão e credibilidade por parte do espectador, de sua
inexistência como um personagem “morto”. Que só nos espec-
tadores vemos. Se o personagem da esposa fosse vidente, veria
também o personagem “espírito” com quem contracena. Então,
o diretor resolveu acertadamente empregar: um plano-sequên-
cia, evitando uma inter-relação dramática dos personagens. E ob-
serve que, apesar de ser um plano sem corte, conterá todos os ta-
manhos de planos empregados na gramática de uma decupagem
plano a plano, nesse tipo de cena. Evitando a perda de ritmo.
O plano-sequência adotado inicia a cena com um plano mé-
dio de conjunto, estando a personagem feminina da esposa sen-

77
tada à mesa, de costas para a câmera em um grande restaurante.
Ao fundo quadro, chega o personagem masculino, o marido
psicanalista. Dirige-se à mesa e começa a sua explicação pelo
atraso, e a esposa está triste e emocionalmente distante, suge-
rindo-nos que ela não quer saber de suas eternas desculpas. A
câmera move-se lentamente em travelling à frente, enquadran-
do os dois em plano americano de conjunto, enquanto o marido
senta-se à mesa. Ele continua falando, e ela de costas para nós
nada diz, absorta. Não sabemos se está zangada com ele ou tris-
te e distante. A câmera continua avançando em travelling bem
lento, até enquadrarmos em plano americano frontal o marido
desculpando-se e dizendo o que estava fazendo. Não há cortes
nem inserts da esposa, para não rompermos a tensão e objetivo
da escolha do plano-sequência. Mantê-los juntos mas sem uma
interação.
O movimento de travelling à frente no plano, continua até o
close up do marido, que não para de falar, sem apartes da esposa.
Por trás dele, chega uma garçonete colocando a conta sobre a
mesa. Um rápido tilt, mostra o movimento do rosto do psica-
nalista até a sua mão sobre a mesa, tentando pegar a conta, mas
a mão da esposa, em plano de detalhe, puxa rapidamente a conta
para verificar e pagar. Não há contato físico entre os dois perso-
nagens. A câmera simultaneamente continua o seu movimento,
e a enquadra em plano americano frontal a esposa (como se fosse
um contra-plano), mas ainda sem corte. Neste enquadramento
a esposa preenche o cheque e a câmera recua em travelling à ré,
revelando os dois a mesa em plano americano de conjunto. Ago-
ra, o marido de costas e a mulher ao fundo quadro, assinando o
cheque. Quase um contra-plano do enquadramento inicial. Ela
diz uma frase que poderia ser para o marido ou uma reflexão.
Levanta-se e parte cortando o quadro em primeiro plano, dei-
xando-o só na mesa. A sequência é encerrada com uma figura
de linguagem (um fad out), empregado como um ponto final
desta narrativa. Uma transcrição perfeita da ação literária numa
narrativa visual precisa e dramaticamente eficiente.

78
Esta mesma sequência logicamente poderia ser narrada
nos oito planos fixos e curtos que acima descrevemos, mas to-
dos esses planos ficaram contidos no plano-sequência utilizado
pelo diretor. Se empregássemos a decupagem plano a plano, se
estabeleceria na tela a relação real contada pelo roteiro. E esta
não era a intenção do diretor. Sua proposta era provocar uma
dúvida, mas narrando de forma explícita. Nós é que acredita-
mos que eles estão juntos e o marido “vivo”.
Num outro filme bem popular: “Sr. e Sra Smith”, de Doug
Liman, em uma cena à mesa entre Brad Pitt e Angelina Jolie
num restaurante, o diretor empregou a decupagem clássica do
plano a plano obtendo o efeito de suspense e ironia dos perso-
nagens. Pegue os dois filmes numa locadora e compare as duas
cenas para que possam perceber o emprego dos mesmos planos
básicos que já apontamos, empregados na gramática da decu-
pagem de cenas como essa:

1) C.UP Angelina só, com uma taça na mão, deixa escapar


uma lágrima;
2) P.AM. Angelina sentada à mesa, de costas para a câme-
ra, segura a sua taça. Alguém entra em quadro, coloca
um guardanapo no braço (dando-nos a impressão de
que se trata de um garçom);
• situa o personagem (e o espectador) no ambiente
em que se passarão as ações da sequência. Estabe-
lece também o eixo dramático narrativo.
3) C.UP Angelina tem a sua mão segura por alguém ser-
vindo champagne ela olha para a diagonal alto do qua-
dro, conferindo. Dialoga.
4) C.UP Subjetivo de Angelina – Brad se desloca seguido
em PANO.
5) C.UP Angelina olhando para Brad. Dialoga.
6) C.UP Brad C.,Plongée. Dialoga.
7) C.UP Angelina em suave travelling semicircular. Dialo-
gando

79
8) C.UP de Brad em contra plongée. Dialogando.
9) P.AM. Conj. Angelina sentada à mesa de costas para a
câmera e Brad senta-se diante dela. Dialogando.
10) P.AM LAT de Angelina reagindo.
11) P.DET das mãos de Angelina sob um guardanapo
apoiado em seu colo, engatilha uma arma.
12) C.UP de Brad que observa tenso, mas controlado. Abre
um guardanapo, TILT até a altura da mesa, puxa o
guardanapo para o seu colo e ouvimos engatilhar uma
arma. TILT até o seu rosto.
13) P.AM + Trav. Lento semicircular, “cortina” por um fi-
gurante revela Angelina
14) P.AM + Trav. lento semicircular, Brad pede algo ao gar-
çom, sem tirar o olho dela.
15) C.UP Angelina dialogando,
16) C.UP Brad dialogando,
17) C.UP Angelina reagindo
18) C.UP Brad dialogando,
19) C.UP Angelina dialogando
• inicia-se uma progressão dramática a partir do
3º plano (close-up de Angelina). É estabelecido
um duelo verbal (daí a sucessão de close-ups que
culmina com os planos de detalhe das armas sen-
do engatilhada sob os guardanapos, embaixo da
mesa. A partir do 13º plano a dinâmica externa
do plano (criada pelos movimentos sutis de tra-
velling semicirculares) passamos uma sensação de
duelo. Aguardamos um ataque eminente. A tensão
aumentará a partir da nova sucessão de close-ups
que vai do 15º ao 21º plano, quando Brad convida-
a para dançar, surpreendendo-a.
20) C.Up Brad convida-a para dançar
21) C.UP Angelina reage
22) C.UP Brad dialoga e levanta-se, saindo de quadro,

80
23) C.UP Angelina Brad faz uma “cortina” revelando seu
rosto. Levanta-se com referência de Brad em quadro.
24) P.MEDIO Angelina levanta-se apoiada por Brad. Diri-
gindo-se, TRAV. à ré, para o salão de dança. Brad aperta
violentamente os dedos da mão de Angelina. Enlaça-a
com força seu corpo contra o dele e começam a dançar
o tango da trilha sonora.
• Embora a sequência continue no mesmo restau-
rante, no salão de dança, no plano 24 encerra-se
um bloco dramático.

Como a cena é de muito suspense, o diretor optou por uma


sequência detalhada em vários planos. Observem que os planos
básicos da gramática de uma cena como esta estão lá contidos
na decupagem da ação.
Percebemos que há dois momentos de tensão. O primeiro,
iniciado nos planos 11 e 12, quando ambos engatilham suas ar-
mas sob a mesa, acentuam-se nos planos 13 e 14, sob um guar-
danapo apoiado em seu colo. Planos em detalhe, com as armas
sendo engatilhadas.
A inserção dos movimentos semi-circulares, em travelling,
nestes planos 13 e 14 passa-nos a sensação de estarmos numa
situação de um pré duelo armado, enfrentamento entre os dois
personagens.
A tensão é mantida do plano 15 ao 19 pelo enquadramen-
to de toda esta sequência de planos em close-up. O suspense
ou expectativa atinge o seu clímax no plano 20, quando Brad
convida-a para dançar e Angelina reage surpresa no 21. Disten-
siona parcialmente a progressão dramática.
O casal se levanta e a violência e tensão agora acontece no
interior do quadro do plano 22, com Brad atacando-a discreta-
mente. Espreme seus dedos da mão e puxa o seu corpo contra
o dele para iniciarem a dança. Tudo apoiado por uma trilha de
tango pontuativa, sem uma melodia explícita que se desenvol-

81
verá na próxima ação da seqüência, quando o casal a dançará
no salão do restaurante.
Podemos observar os mais diversos diretores, cult ou não, e
confirmar que a mesma gramática é utilizada em cenas à mesa.
É o que se passa em filmes como de outro grande diretor e exce-
lente narrador de cinema, Alfred Hitchcock. Ele nos mostra um
curioso exemplo clássico de cena à mesa de um restaurante de um
trem cenográfico em estúdio, no filme “Intriga Internacional”.
Um exemplo de outro diretor, roteirista e ator, bastante po-
pular, Quentin Tarantino, é em seu filme: “Cães de Aluguel”. Na
cena em uma lanchonete, um dos personagens vai ao encontro
de outro. A seqüência se inicia com movimentação no interior
do quadro associado à dinâmica externa do plano, enquadrado
inicialmente em P. Médio, fechando até P.Am, em trav à ré. O
personagem caminha no interior da lanchonete, indo em dire-
ção a uma das mesas onde alguém o aguarda. Chega na mesa.
A ligação de sua chegada é feita por um movimento no pró-
ximo plano. Um close-up em plongée com ligeiro travelling à
frente, narrando o ponto de vista do personagem que chegou à
lanchonete. O personagem sentado à mesa observa-o. A partir
de então, há uma sucessão de close- up em plongée e contra-
plongée, segundo a posição dos personagens em quadro, toda
dialogada rompida pela colocação de um plano geral, gravado
do exterior do bar, visualizado através dos vidros da loja.
Os personagens se abraçam, cumprimentando-se. Um vi-
sível salto de eixo, mas atenuado pelo corte de movimento. É
usado para “respirar” a narrativa, após a primeira progressão
dramática da sequência. O personagem que chegara senta-se
à mesa. A conversa prosseguirá em planos e contra-planos en-
quadrados em americano de conjunto, sempre com referência
de primeiro plano. Vai ser inserido um plano de conjunto late-
ral de ambos à mesa.
Novamente lá estão os planos sugeridos pela gramática vi-
sual deste tipo de cena, empregados na progressão dramática.
Será uma opção do diretor contar este tipo de cena em plano

82
a plano ou em um plano-sequência. Assim como os posiciona-
mentos de câmera para cada plano desta gramática consagrada
por diversos diretores ao longo dos cem anos de cinema.
O plano-sequência, seja qual for a cena, não deve ser em-
pregado como um exibicionismo estético do diretor. Ele deve
corresponder à sua função dramática, tendo em vista que ele
alonga o tempo dramático narrativo de uma história filmada ou
gravada. Quando mal empregado torna a seqüência arrastada.
Pode desequilibrar temporalmente o filme como um todo. É
uma opção difícil de se fazer, mas quando o escolhemos acerta-
damente, tráz muito benefício dramático à narrativa. Deve ser
exaustivamente planejado antes de seu emprego, com atores e
figurantes precisamente ensaiados e com “marcas” e movimen-
tos de câmera pré-definidos. Obriga todos os técnicos estarem
bem ensaiados e cientes do que acontecerá durante o plano,
com todos os elementos que comporão e interferirão durante a
trajetória do plano (figurantes, veículos ou animais em quadro)
compreendido por toda a equipe no set. Não é um plano para
cineastas inexperientes e de pouco conhecimento narrativo. O
plano sequência quando indevidamente empregado tende a te-
atralizar a cena, torná-la falsa e inverossímil.

Um grupo de cinco pessoas (em uma mesa circular)


O formato da mesa e a quantidade de pessoas nelas acomo-
dadas condiciona uma determinada gramática na decupagem
da sequência.
Podemos, como no caso anterior, empregar uma decupagem
de plano a plano ou em vários planos-sequência, caso seja uma
proposição do roteiro ou uma escolha estilística do diretor.
No filme “Lua de Fel”, de Roman Polansky, numa das pri-
meiras cenas do filme, no salão de restaurante do navio, um ca-
sal de ingleses está sentado a uma grande mesa circular onde um
outro passageiro, um indiano de turbante também está instala-
do. Nesta mesa circular há outros lugares vazios. A decupagem

83
da sequência procura resguardar o eixo dramático, cortando a
mesa ao meio, estabelecendo dois eixos, embora haja um salto
de eixo sem desorientar o espectador. A sequência é narrada
em sete planos. Caso você deseje conferir, separe uma cópia do
filme, coloque em seu aparelho doméstico, abaixe totalmente o
som e depois compare os planos empregados do quadro abaixo
com a decupagem da sequência deste filme.

“Lua de Fel” – Sequência do restaurante

1) P.AM. De um indiano de turbante sentado à mesa, faz uma pergunta a ou-


tro passageiro instalado à mesa.
2) P.AM CONJ. do casal inglês sendo servido por um garçom. Em PP de refe-
rência o indiano (um pulo de 180º), dialogando com o passageiro indiano.
3) P.AM do indiano dialogando com o casal
4) P.Am. do casal inglês. O marido dialoga com o indiano.
5) P. Am do indiano dialogando com o casal
6) P.Am. do casal, Fiona retruca o indiano
7) P.Am. do indiano discordando e sorrindo

Percebemos na decupagem desta cena do filme “Lua de


Fel” que tudo é narrado em planos americanos, mais ou menos
largos. No plano 2 (Am de Conjunto) orientamos o espectador
em relação ao espaço e posicionamento dos personagens. Ou
seja, embora a mesa seja circular, de um lado está instalado o
personagem indiano e do outro eixo de 180º o casal de ingleses.
Em ambos os planos visualizamos ao fundo do quadro outras
mesas e figurantes. Caso houvesse outras pessoas instaladas à
mesa principal interferindo nos diálogos, deveríamos posicio-
ná-las, destacando cada grupo de pessoas em um eixo dramáti-
co da mesa para não desorientarmos o espectador.
Observe também que o diretor construiu a partir do plano
3, uma progressão dramática na decupagem da sequência, iso-
lando o indiano e o casal em planos americanos sem referência.
Criando dinâmicas no fundo do quadro com a movimentação
de garçons e figurantes.

84
Mesas retangulares
Este formato de mesa quase que impõe uma decupagem
tomando como referência o sentido do eixo dramático. Pode-
mos optar por dividir a mesa ao meio, no sentido longitudinal
ou transversal.
Nas mesas retangulares, a decupagem da cena torna-se por
isso mais complexa. Os personagens estarão fatalmente dispos-
tos dos dois lados da mesa e com pessoas instaladas à cabecei-
ra. Isso nos obriga a nos preocupar com o posicionamento dos
personagens por importância na mesa. Para facilitar a compre-
ensão do espectador no espaço dramático e situarmos os perso-
nagens à mesa, empregamos:
– Um plano geral ou médio (ligeiramente plongée), si-
tuando a mesa no espaço cênico onde se passam as
ações e dando ao espectador uma noção clara da distri-
buição dos personagens instalados à mesa.
Do ponto de vista prático da decupagem, devemos dividir
a mesa ao meio, estabelecendo um lado direito e um lado es-
querdo ao comprido ou duas metades, como eixo dramático,
tal qual nas mesas de formato redondo.
Empregamos após o plano de situação já situado em um
plano americano de conjunto (de um grupo à direita ou à es-
querda na mesa). Em seguida, na decupagem, individualizamos
todos os personagens, coadjuvantes e figurantes, empregando:
– Um plano americano frontal de personagens com di-
álogos ou suas reações. Esses planos podem ou não,
terem referências dos personagens que estão de costas
no plano em primeiro plano no quadro. E nos planos
americanos frontais, referências de parte do corpo de
quem está sentado ao seu lado.
Para marcarmos os personagens principais e darmos ênfase
às suas falas e reações numa progressão dramática tendo o ro-
teiro como referência, empregamos os:
– Close-Up (com diálogos ou reações do personagem).

85
Com isso, percebemos que cenas em mesas retangulares ou
circulares, com mais de quatro personagens instalados à mesa,
empregaremos numa decupagem plano a plano, cerca de oito
planos, de diferentes tamanhos e posições, obedecendo à pro-
gressão dramática indicada pelos diálogos do roteiro. Planos
fixos ou com pequenos movimentos, saindo de um detalhe de
um copo ou cartas de baralho, em tilt até close-up, por exemplo.
Um travelling à frente imperceptível numa troca de olhares en-
tre os personagens pontuando uma intenção.

Sugestão para uma decupagem de uma cena


em mesa retangular

P. Geral ou Médio (ligeiramente plongée),


P.Geral (zenital) no caso de criar tensão,
P. Am. Conj. (de um grupo à direita ou à esquerda)
P. Am. Frontal (de personagens com diálogo ou reações; c/ REF. de *pp das
pessoas no lado oposto da mesa ou as que a ladeiam).
P.Am de conjunto Lateral de um dos lados da mesa.
Close-up (com diálogos ou reações do personagem)

Nas mesas retangulares, os personagens principais podem


estar instalados nas cabeceiras da mesa e os demais coadjuvan-
tes nas laterais ao comprido. Nesse caso, o eixo dramático ado-
tado pode ser o meio da mesa, em relação às cabeceiras, e não
o eixo longitudinal da mesa. Para que o espectador não se de-
soriente, seremos obrigados, em algum momento, a empregar
um plano médio ou geral da mesa, ligeiramente plongée para
situarmos o conjunto de personagens instalados à mesa e o es-
pectador no espaço onde se passam as ações. E, de qualquer
forma, não poderemos nos esquecer da progressão dramática,
tendo como referência o roteiro. Sobretudo os diálogos.
A mesa retangular, onde todos os personagens falam, obri-
ga-nos o emprego de determinados planos, tais como os conti-
dos no quadro gramático visual abaixo:

86
Sugestão para uma decupagem
em uma mesa retangular
Onde todos os personagens falam
P. Am. Conj., ligeiramente Plongée, nas duas diagonais
P. Médio, com ou sem o personagem da cabeceira, de costas
P. Am Conj. (pares de personagens nos diálogos ou reações)
P. Am. Frontal (de personagens nos seus diálogos e reações)
Close Up (de diálogos e reações de todos os personagens)
P. Am. Conj. em trav. num dos lados da mesa com os PP/costas.

Uma infinidade de filmes, com esse tipo de situação, po-


dem ser assistidos para examinarmos os planos empregados em
sua decupagem. Recomendamos o filme: “A Festa de Babette”,
de Gabriel Axel, “Abril Despedaçado”, de Walter Salles Jr. e a
comédia de Danny De Vitto “A Guerra dos Roses”. Nos dois
filmes há mesas retangulares com a participação de vários per-
sonagens dialogando e a participação de figurantes.
No filme de De Vitto a gramática de construção da cena
em planos pode ser bem observada. Os personagens principais,
anfitriões do jantar (o ator Michael Douglas e a atriz Kathle-
en Turner) estão à cabeceira. É um jantar que foi oferecido ao
chefe do dono da casa. Entre os convidados está o seu melhor
amigo, o personagem de De Vitto, recém-separado,
que leva a namorada Elke. Eles têm um relacionamento
sexualmente tórrido e tiram um “sarro” sob a mesa de jantar,
que é de vidro. Tudo é discretamente percebido pela dona da
casa e alguns convidados. Nesta sequência do jantar para a es-
colha do eixo dramático o diretor tomou as cabeceiras da mesa
como referência e empregou a seguinte decupagem. Analise-a
em seu vídeo doméstico acompanhando com o quadro exposto
a seguir:

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“A Guerra dos Roses”, de Danny De Vito
– Decupagem da cena do jantar
1 – P.Am.Conj – da mesa ao comprido. Ao centro do quadro,
Kathleen, à esquerda e à direita 3 convidados de cada lado.
Uma pessoa de pé saúda os donos da casa.
2 – P.Am.Conj – de pé, um convidado dirige a saudação. Ao
fundo quadro o dono da casa, Michael. Taças dos demais
convidados, em primeiro plano.
3 – P.Am. – de um convidado saudando com a taça de vinho.
4 – P.Am.Conj. da mesa ao comp., Kathleen à cabeceira, lade-
ada por 3 convidados de cada lado. Danny dialoga.
5 – P.Am.Conj. (c/plano do P.4) na cabeceira, Michael ladea-
do por 2 convidados.
6 – P.Am.Conj. em diagonal Danny sorri em PP e Kathleen
na cabeceira. Danny dial. Duas crianças chegam ao fundo
quadro.
7 – P.Am.Conj. Duas crianças se aproximam e cumprimentam
a mãe, Kathleen
8 – P.Médio da sala. As crianças em pp de costas p/câm. Ka-
tleen se levanta e fala com as crianças.
9 – P.Am Michael fala com as crianças fora quadro. Convida-
do em referência
10– P.Médio da sala. Katleen beija as crianças. Manda-os cum-
primentar o pai. Ao Fundo quadro Michael levanta-se e
vem até os filhos. As crianças vão ao seu encontro.
11 – P.Am.Lat. Michael se aproxima e os filhos também, beija-
os. As crianças saem de quadro.
12 – P.Am. da mesa, Kathleen à cabeceira, ladeada por De Vitto
e Elke. Ao fundo, passam as crianças, retirando-se. Danny
dialogando.
13 – P.Am.Diag. na outra cabeceira Michael e convidado em
referência no quadro.
14 – Close-up de Elke, a namorada de De Vito.
15 – P.Detalhe o pé de Elke tocando o seu pênis, sob a mesa.

88
16 – Close-up de De Vitto reagindo ao toque de Elke
17 – P.Am. Conj. da cabeceira da mesa com Kathleen e em pp,
lateral De Vitto.
18 – P.Am.Conj. ¾ – o casal de convidados. A mulher dialoga
com Kathleen.
19 – P.Am. de Kathleen dialogando com a esposa do convidado.
20 – P.Det.Plongée/Subjetivo de Kathleen. De Vitto limpa a
faca no prato. O pé de Elke pousado entre as pernas dele.
21 – P.Am.Conj. ¾ o casal de convidados. A mulher dialoga
com Kathleen.
22 – Close-up – do sorriso maroto de De Vitto para a namora-
da Elke em frente a ele.
23 – P.Detalhe/Plongée. As mãos de de Vitto corta a meia de
nylon de Elke.
24 – Close-up de Elke reagindo.
25 – P.Am contra plongée. Cãm sob a mesa de vidro. Katlhen
observa o que De Vitto em pp faz com a meia de Elke.
26 – repete plano 21
27 – P.Ddetalhe plongée de De Vitto descobre os dedos dos
pés de Elke.
28 – Close-up de uma das convidadas do casal observando dis-
cretamente.
29 – repete o plano 21.
30 – P.Am.contra plongee repete o plano 25
31 – Close-up de De Vitto
32 – P.Detalhe das mãos de De Vitto molhando os dedos no
molho do seu prato e massageia os dedos dos pés de Elke.
33 – P.AmConj. da cabeceira de Katlhen ladeada por De Vitto
e Elke.
34 – Close-up Lateral, em PP Elke olhando para De Vitto fora de
quadro. Ao fundo quadro, personagens comendo à mesa.
35 – Close-up Conj.Lat. de De Vitto em pp sorri e convidados
ao fundo quadro.
36 – P.Am.Conj da cabeceira de Micahel servindo vinho a uma
convidada, à esquerda um convidado.

89
37 – P.Am.Conj. de Kathleen ladeada à esquerda e à direita por
3 convidados
38 – P.Am.Conj. de Micahel ladeado por dois convidados.
39 – P.Am.Conj. de Katlheen ladeada por Elke e De Vitto.
40 – P.am.Conj. do patrão e Michael dialogando.
41– P.Am.Conj. de Kathleen ladeada por Elke e De Vitto.
42 – P.Am.Conj. de Michael ladeado por 4 convidados ouvin-
do Kathleen.
43 – P.Am.Conj. de Kathleen ladeada por 3 convidados ela fala
dos cristais.
44 – P.AmConj. de Michael na cabeceira ladeado por 4 convi-
dados. Aparteia Trav.
45 – repete o plano 43
46 – repete o plano 44
47 – P.Am. de Kathleen. Trav. à frente, avança lento durante o
diálogo.
48 – P.Am. de Michael em trav. à frente, lento.
49 – P.Am de Kathleen dialogando.
50 – P.Am. de Michael observando a esposa narrar o fato.
51 – P.Am.Conj. de Kathleenladeada por Elke e De Vitto
52 – P.Am.Conj. de Micahel ladeado pelos convidados.
53 – P.A.Conj. de toda a mesa. Na cabeceira, fundo quadro
Michael.
54 – P.Am. de Kathleen narrando
55 – Close-up de De Vitto enfadado com a história de Kathleen
56 – P.Am de Micahel controlando o efeito do diálogo de Ka-
thleen s/ os convidados.
57 – P.Am. de Kathleen que não acaba nunca de narrar a sua
história.
58 – P.Am. de Michael aflito com a narrativa que não termina.
59 – P.Am. da mesa em diagonal, Michael de costas para a câme-
ra. Ao fundo quadro Kathleen narra ainda a sua história.
60 – P.Am de Michael intervindo, cortando o diálogo da esposa.
61 – P.Am. de Kathleen ouvindo desapontada, sorri sem graça.
Não gostou.

90
62 – P.Am. de Michael que sorri e encerra a narrativa, dando
um peteleco numa taça
63 – P.Am. de Kathleen que o imita dando um peteleco na sua
taça de cristal.

Acompanhando a projeção do filme “A Guerra dos Roses”


com a decupagem acima, podemos concluir alguns aspectos da
gramática:

a) Os eixos dramáticos adotados tomam a cabeceiras


como centro.
b) Os 4 primeiros planos americanos de conjunto situam
o espectador
c) Há 3 momentos dramáticos na sequência: as crianças,
o “sarro” de Elke com o De Vitto e o fato dos cristais
Baccarat de Kathleen
d) Os planos de detalhe do pé da namorada De Vitto par-
ticularizam a piada visual que se passa em paralelo à
ação principal.
e) Uma sequência de contra-planos dá ritmo a narrativa e
mantém os personagens em equilíbrio na ação.
f) Somente dois movimentos são empregados na se-
quência. Em dois planos, à saber: O trav. (em Cama-
te) à frente sobre a mesa em direção à cabeceira de
Kathleen e a seguir em direção a Michael. Como plano
e contra-plano em movimento ao centro de atenção de
ambos os eixos dramáticos escolhidos pelo diretor.

Embora a seqüência totalize 63 planos em sua edição final,


sabemos que há procedimentos de filmagens desta decupagem
que possibilitam esse aparente volume excessivo de planos rea-
lizável numa jornada de trabalho. A decupagem previu o tempo
dramático narrativo mas, no momento de captação, foi filmado
aglomerando os planos por eixo, gravando todos numa direção
e, em seguida, na direção do outro eixo.

91
Do ponto de vista de produção, os planos são filmados
por eixo dramático e de luz evitando desperdício de tempo e
desgaste da equipe. Em determinadas posições de câmera se
rodará ou gravará continuamente os planos, em sua ordem dra-
mática. Ou seja, no eixo da Kathleen rodamos: os close-ups, os
planos americanos e os Planos americanos de conjunto. Assim
como o faremos para o eixo inverso ou contra-plano da mesa
no sentido longitudinal.
Cumprida esta etapa, passamos a rodar em separado os pla-
nos que envolvam algum tipo de figuração (no caso, as crian-
ças) e os planos que necessitem algum tipo de posicionamento
de câmera especial (os detalhes dos pés de Elke em plongée e
contra-plongée). Isso transformará as jornadas mais condensa-
das. Os atores renderão mais e a mecânica de trabalho ficará
bem mais leve. Os planos rodados em bloco obterão um rit-
mo mais fluido do ponto de vista narrativo e a interpretação
por parte dos atores, de melhor qualidade. O volume de cortes
assegurará o ritmo necessário à cena. Basta que o editor seja
minimamente competente.

Ao volante de um carro
As cenas que se passam no interior de um carro em mo-
vimento podem ser solucionadas de acordo com os recursos
financeiros disponíveis da produção e o tempo de que dispo-
mos com os atores envolvidos na cena. Elas podem ser roda-
das em veículo real em externas, com a câmera montada sobre
equipamentos especiais como um camera car (sobretudo para
atores que não sabem dirigir veículos). Caso o ator saiba dirigir
e contracenar ao mesmo tempo, podemos filmar ou gravar a
sequência com o veiculo pelas ruas. Caso tenhamos um prazo
exíguo a cena pode ser filmada ou gravada em estúdio, em carro
cenográfico, empregando o recurso de croma key.
Independentemente do processo de produção da cena, a
decupagem obedece a uma gramática ou grafia, resultado da ex-

92
periência coletiva dos diretores que a empregaram e obtiveram
a resposta dramática e de produção que desejavam, empregan-
do determinado conjunto de planos ou um só plano sequência
com atores ao volante dialogando ou não.
Este tipo de cena, que imobiliza o ator em uma posição,
necessita uma decupagem que dê ritmo à narrativa e um de-
terminado número de cortes para manter a tensão e a atenção
do espectador. Além do emprego de planos que alternem de
posição, de tamanho e movimento e, sobretudo crie verossimi-
lhança junto ao espectador na sala de cinema ou na tv.
A duração da cena e dos diálogos é que vão determinar a
quantidade de planos de que necessitamos para narrar visual-
mente a sequência neste tipo de situação. A primeira iniciativa
antes de decuparmos a cena é cronometrar a duração das ações
no trajeto em que vai ser filmada a cena, adotando os diálogos
como referência temporal. Em seguida, analisar a progressão
dramática, para escolhermos o plano certo, sua posição e mo-
vimento. Isso porém, não impede que a sequência possa ser
rodada em miniplanos-sequência ou em um plano- sequência.
Tudo está diretamente ligado à característica dramática da cena
contida no roteiro, sua duração e a qualidade dos atores envol-
vidos na cena. E, sobretudo, o estilo do diretor.

• camera car são plataformas rebocáveis por caminhões


que possuem 6 jogos de pneus duplos, suspensão ativa
e sua altura dista cerca de 20 cm do asfalto. Motos, bici-
cletas ou automóveis podem ser colocados sobre elas.
O ator não precisa saber dirigir. Pode ser instalada a
iluminação sobre o camera car e posicionarmos a equi-
pe técnica também. Existem vários modelos de câmera
car para locação.

Abordemos primeiramente uma cena no interior de um


carro que se desloca em uma locação, ou seja, num trecho de
ruas da cidade. Empregaremos a decupagem plano a plano em

93
uma sequência, em que os dois atores estão sentados lado a
lado, no banco da frente do veículo. Um dos personagens está
ao volante e o outro acomodado no banco do carona, ao seu
lado. Não há passageiros no banco traseiro.
Nesse tipo de sequência, os diretores, para um melhor
rendimento dos atores e a qualidade da cena, gravarão um
único plano máster de toda a sequência, com a participação
de ambos os personagens. Não que ele vá empregar como
um plano-sequência, mas como um plano máster de referên-
cia, onde incluirão os demais planos. Normalmente o que se
faz é rodarmos inicialmente: plano am. conj. frontal ao para-
brisa, máster (câmera fixa no capô voltada para o para-brisa
dianteiro)
Para corrigir eventuais erros dos atores ou interferências
externas, e identificar o trajeto do veículo empregamos um pla-
no geral subjetivo a ser utilizado na edição da sequência. Este
plano sugere o ponto de vista do motorista, do ponto de vista
do carona ou de ambos: um plano geral subjetivo da paisagem
onde nos deslocamos(com a câmera fixa no capô, voltada para
frente do carro, tendo como referência uma parte dianteira do
veiculo em primeiro plano).
Em seguida o diretor interioriza a cena, detalhando a parti-
cipação dos personagens, dentro do veículo, tais como:

Plano Am. Frontal do Motorista (parte do diálogo, insert no máster)


Plano Am. Frontal do Carona (parte do diálogo, insert no máster)
Close-up Frontal do Motorista (parte do diálogo, insert no máster)
Close-up Frontal do Carona (parte do diálogo, insert no máster)

Para obtermos uma mudança de posição, que enriquecerá


o ritmo da narrativa, beneficiará o interprete e criará um novo
ponto de vista para o espectador, empregamos:

Plano Lateral do Motorista (câm. fixa na lateral esquerda do carro) e um


Plano Lateral do Carona (câmera fixa na lateral direita do carro)

94
Visando “respirar” a narrativa, sentimos necessidade de lo-
calizar a sequência no contexto da cidade e valer-se de um artifí-
cio para corrigir um eventual erro de diálogo dos interpretes ou
continuidade de movimento do ator na cena, empregaremos:

Planos Gerais com 2 ou 3 planos de posições e alturas diferen-


tes, em alguns trechos da trajetória do veículo na paisagem.

No caso de necessitarmos acelerar a narrativa ou tencio-


ná-la com planos curtos, empregaremos os planos de detalhe
para insert de cobertura na edição final da sequência (mão do
motorista na passagem de marcha, olhos do motorista no retro-
visor, detalhes do painel do rádio sendo ajustado com música
ou noticiário de contraponto).

Sugestão de Decupagem de uma cena


no interior de carro em movimento
Plano Am. Conj. Frontal do motorista e do carona
Plano Geral Subjetivo do motorista e do canona
Plano Am. Frontal do Motorista (parte do diálogo, insert no máster)
Plano Am. Frontal do Carona (parte do diálogo, insert no máster)
Close-up Frontal do Motorista (parte do diálogo, insert no máster)
Close-up Frontal do Carona (parte do diálogo, insert no máster)
Plano Am. Lateral do motorista (em PP e ao fundo quadro o carona)
Plano Am. Lateral do carona (em PP e ao fundo quadro o motorista)
Planos Detalhe (insert) plongée – passagem de marcha
Planos Detalhe (insert) do retrovisor com os olhos do motorista
Planos Detalhe (insert) mãos ajustam o rádio no painel do carro
Planos Detalhe (insert) do porta luvas sendo aberto
Planos Gerais de passagem do carro, variando de altura.

Nesse tipo de sequência essa decupagem pode ser observa-


da em filmes dos mais variados diretores e gêneros, tais como:
em “Beleza Americana”, de Sam Mendes (1999), “Tomates Ver-
des Fritos”, de Jon Aunet, “Conduzindo Miss Dayse”, de Bruce

95
Beresford (2003),“Cães de Aluguel”, de Quentin Tarantino e
“O Iluminado”, de Stanley Kubrick.

Carro em estúdio (em Croma Key)


As cenas de atores ao volante de um veículo cenográfico ro-
dadas em estúdio apresentam inúmeras facilidades à produção.
Os atores não precisam se deslocar para o local das filmagens
ou gravações. Podem ser rodadas a qualquer hora do dia, em
qualquer condição meteorológica e muito mais rapidamente.
Mas, de qualquer forma, obedecerão a metodologia clássica de
preparação e de planos a serem filmados.
Da mesma forma como é feito em filmagens com veículos
reais em locações externas, cronometramos os diálogos da cena
para determinar quais os planos a serem empregados e a sua
quantidade. Estabelecemos a progressão dramática dos planos
segundo o conteúdo da sequência em questão, seus posiciona-
mentos no veículo e o trecho de deslocamento na paisagem. E
onde será esta locação externa que deverá ser captada por uma
segunda unidade de imagem, do interior de um veículo, para
após ser inserida nas janelas do carro cenográfico na finalização
do croma key.
Quando rodamos esse tipo de cena em estúdio, emprega-
mos um carro cenográfico, construído somente em parte, a ser
enquadrado pela câmera. A carcaça do veículo é disposta diante
de um fundo infinito pintado na cor verde, azul ou vermelho,
para que a sobreposição dessa imagem sobre as imagens exter-
nas previamente filmadas sejam feitas na finalização, em labo-
ratório cinematográfico ou numa finish house, em uma ilha de
edição não linear.
A gramática dos planos de cenas como essa filmada ou gra-
vada em croma key, será a mesma:
– empregamos vários planos(“Psicose”, de Alfred Hi-
tchcock) ou um só plano-sequência (“O Iluminado”,
de Stanley Kubrick).

96
O importante para o cineasta é ter em mente, que tudo
isso busca manter o ritmo narrativo da sequência, a sua flui-
dez, compreensão e tensão dramática narrativa, por parte do
espectador.
No filme “Instinto Selvagem”, emprega-se vários planos ge-
rais em locação real, acompanhando em panorâmica do veículo
do personagem de um investigador dirigindo-se até um hospi-
tal fora de Nova York, buscando o paradeiro de um ex-comba-
tente de guerra. Inserem-se nesta seqüência, planos americano
frontais do personagem do investigador ao volante do veiculo.
Esses planos mais próximos são rodados em estúdio (Croma
Key). E nos planos externos, quem conduz o carro em externa
é um dublê, não o ator.

Perseguições a pé, em veículos ou sobre animais


Em todas as perseguições devemos estabelecer um parale-
lismo entre os planos apresentados. Ou seja, por onde o per-
seguido passa (locação) o perseguidor também passará. De
preferência com o mesmo enquadramento e posicionamento
de câmera. A duração temporal dos planos deve ser idêntica
por um tempo e, a seguir, diminuindo de tamanho para apro-
ximar os algozes. Podemos incluir obstáculos para um e para
outro, visando aumentar a tensão. Os planos devem mudar
de tamanho, posição de câmera e alternar movimentos. Uma
particularidade é empregarmos a variação constante de planos
muito abertos e planos bem fechados. Há possibilidades de
acelerarmos a narrativa empregando em alguns trechos da edi-
ção planos com a câmera sobre um suporte especial: stadycam.
Isso dará velocidade ao plano com estabilidade da imagem.
Sobretudo em passagens estreitas ou terrenos irregulares, em
aclive e escadas.

97
Sugestão de um detalhamento de
cenas de perseguição a pé

P.GERAL Plongée – uma rua, um personagem corre por uma calçada se-
guido por um policial correndo entre os carros no meio da rua.
P.Am .C/Plongée do fugitivo (em trav. à ré)
P.Médio C/Plogée do policial (em trav. a ré)
P. Médio em Pano do fugitivo vira uma esquina entrando em Q.
P. Médio em Pano do policial vira a esquina entrando em Q.
P. Am.C.P. o fugitivo salta um muro, um cachorro encurrala-o.
P.Am. C.Pl. o policial salta o muro.
P. Geral o policial alcança o fugitivo, dispara contra ele. O fugitivo prote-
ge-se num canto, atinge o policial e mata o cachorro com outro tiro.
Foge beco afora.
Close-up do policial que atira
P. Detalhe da arma do fugitivo atirando
Close-up do fugitivo
P.Detalhe do cachorro sendo atingido pelo disparo
P.Médio, câmera baixa, em pp o policial agonizando, o cão morto e, ao
fundo, quadro do fugitivo se evadindo.

As perseguições de carro seguem a mesma estrutura, po-


rém, há sempre há uma conjugação muito bem decupada de
cenas, que se complementam e com a participação de vários
técnicos especializados em capotagens, explosões, maquetes,
ao vivo e croma key.
Um exemplo bastante rico de perseguição em veículo para
ser visto em DVD é o filme de ação “Sr. & Sra Smith”, de Doug
Liman. Uma espetacular sequência de perseguição em uma
auto-estrada, no meio do trânsito urbano. Os dois personagens
dentro de um utilitário se revezam ao volante enquanto um de-
les atira contra os perseguidores. Assistimos a abalroamentos,
tiros, luta, capotagens e explosões num curto espaço de tempo.
Um show de imagens em locação real e estúdio.
Ao analisarmos plano a plano a decupagem empregada
nesta cena perceberemos algumas particularidades:

98
a) duração curta dos planos
b) alternância do tamanho dos planos e posições de câ-
mera
c) o emprego de várias técnicas: cenas ao vivo com duble,
em estúdio em croma key, em camera car com a partici-
pação dos atores, efeito especial de explosões e capota-
gens ao vivo.
d) planos aéreos para situar a ação e “respirar” a tensão da
cena

É importante observar que cenas onde se empregam vários


efeitos especiais e a participação de doubles; os planos, deve-
rão ter curta duração na tela para que o espectador não perceba
como foi feito e obtermos impacto emocional. Assim como,
evitarmos a perda do ritmo da narrativa da cena.

Diante de um balcão
Quase toda a sequência que se passa diante de um balcão,
seja de um bar, recepção de uma empresa ou de uma loja, de-
vemos de imediato situar o espectador no espaço físico onde se
passam as ações. Qual a disposição dos moveis e a posição dos
personagens envolvidos na cena. Daí a necessidade de abrir-
mos a seqüência com um plano geral ou médio do ambiente.
De imediato, disporemos os personagens no espaço. Quem é
funcionário e está atrás do balcão, quem é cliente (persona-
gem ou figurante) no estabelecimento comercial. A partir de
então, podemos nos aproximar dos clientes /personagens mais
importantes na sequência. Devemos escolher o ponto de vista
narrativo da sequência: se do ponto de vista do dono da loja,
que percebe a chegada dos clientes, ou se do olhar dos perso-
nagens que invadem a loja para compras, assalto ou outra cena
qualquer.
No primeiro caso:

99
Do ponto de vista do comerciante

Plano Geral ou Médio Subjetivo da loja, porta ao fundo quadro, clientes en-
tram. Em pp. O comerciante percebe a entrada dos clientes e prepara-se
para atendê-los. Os clientes dirigem-se ao balcão.
Plano Médio Lateral /Plano Sequência O casal entra em Q. e dirige-se ao bal-
cão onde está o comerciante que está.
P.Am de Conj. dos clientes diante do balcão. Em referência em primeiro
Plano, o comerciante atrás do balcão
P.Am de conjunto dos Clientes conversando com o comerciante
P.Am. do comerciante atendendo os clientes
P. Am. Dos clientes dialogando com o comerciante
Close-up do comerciante dialogando com os clientes ou observando-os
Close-up de conj. dos clientes escolhendo o produto e pagando.
P.Geral da loja plongée. O comerciante dá o troco, entrega a mercadoria, agra-
dece e os clientes se despedem e partem ao fundo quadro saindo pela
porta da loja.

No segundo caso:

Do ponto de vista dos clientes

Plano Geral ou Médio Subjetivo da fachada da loja, um casal de clientes entra


na porta da loja.
Plano Americano o casal entra em Q. Pano revela a loja enquanto o casal se
dirige ao balcão, o comerciante vem atendê-los.
Plano Médio Lateral /Plano-sequência O casal entra em Q. e dirige-se ao bal-
cão onde está o comerciante.
* a partir daqui repete-se a decoupagem anterior até o final.

Existem bons exemplos de cenas de lojas, rodadas ao bal-


cão, realizadas em apenas um plano-sequência. É o caso de uma
sequência existente no filme “A Cor Púrpura”, de Steven Spiel-
berg. A menina negra entra na loja, é discriminada pelo comer-
ciante e trava uma conversa com a personagem que ficara com
seu filho. Baixe o filme na Internet ou alugue a cópia em sua
locadora e examine a cena plano a plano.

100
Falando ao telefone
Desde que o cinema dominou a tecnologia da captação
de som, mais de uma centena de filmes empregam seqüências
com os personagens falando ao telefone. Usam telefones fixos
domésticos, comerciais, em cabines públicas (que imobilizam
o ator no espaço cênico) ou com aparelhos móveis, em que o
ator pode se locomover no espaço cênico ou se manter parado.
O que dará ritmo a este tipo de cena serão os cortes de um pla-
no a outro, passando de um personagem ao outro. E, em certos
casos, mantendo o personagem sempre em cena, empregando
a voz do interlocutor como pontuação dramática.
Examinando vários filmes onde há sequências de persona-
gens falando ao telefone, percebemos três tipos de situações:

1) Sem a voz of do interlocutor – O personagem principal


falando sozinho, sem som off e sem cortes para o inter-
locutor.

Um grande exemplo é um criativo filme de longa metra-


gem onde o personagem fica preso em uma cabine telefônica
pública dialogando com seu interlocutor em of: “Por um fio”,
de Joel Schumacher.
Outro bom exemplo de filmagens em estúdio ou internas,
como a do investigador particular no filme “Coração Satânico”
de Alan Parker. Repare que há cerca de quatro planos: plano
americano frontal e lateral, e close-up de duas posições de câ-
mera diferentes para todo o diálogo e a inserção de três pla-
nos de detalhe: de uma mão retirando o telefone do gancho
atendendo a chamada; de seu sobretudo sendo jogado sobre
um sofá velho, da gaveta de sua escrivaninha e mãos retiran-
do um bloco de anotações, o bloco onde escreve o trocadilho
do nome do personagem e o bairro onde irá para atender cha-
mado deste cliente. Toda a sequência resolvida em 9 planos;
o que restou de diálogo ele usou como uma elipse sonora. O

101
personagem ainda fala e ele desembarca do seu carro no bairro
do Harlem.
Para que os planos se interliguem com facilidade, quando
rodados com apenas uma câmera, devemos observar bem os
movimentos do ator em quadro para que ele se repitam iguais
nas duas sequências de planos. E no final de cada plano haja
um movimento que forneça um corte de movimento. Nas fra-
ses of que ele não ouve, o ator deve imaginá-las para preencher
de dinâmica (“marcas” de atuação) em cada plano sem diálogo.
O ideal é que o ator crie estes diálogos imaginários, ou sejam,
escritos pelo diretor e ditos em of durante as filmagens e sejam
eliminados na finalização.

2) Com Som Of – com o personagem falando em direto


e reagindo ao som of do coadjuvante,sem a presença
de sua imagem. Não vemos o interlocutor na tela. O
exemplo mais marcante na cinematografia mundial, é
o filme de longa-metragem “Por Um Fio”, de Joel Schu-
macher, todo rodado em uma cabine pública de telefo-
ne, em uma rua do centro da cidade de Nova York.
3) Numa conversa em paralelo – os dois personagens que
conversam ao tel., cada qual numa locação, aparecem
na tela, separadamente ou juntos, dividindo a imagem.
Como é o caso do filme “Central do Brasil”, de Walter
Moreira Salles Jr., onde a atriz Fernanda Montenegro
contracena com a atriz Marilia Pêra ao telefone em
narrativa paralela, cada qual em uma locação. Uma na
rodoviária e outra num apartamento. Dora, na rodo-
viária, em um telefone público, e a personagem coad-
juvante no apto. dela, encurralada pelo homem que a
procura para vingar-se.

Para obtermos o ritmo em uma sequência como as acima


descritas, é aconselhável, primeiramente, decuparmos o seu
tempo dramático. Cronometrando os diálogos in e of (real ou

102
imaginário), temos uma idéia de quantos planos necessitamos
empregar.
Pela experiência e observação destas cenas editadas nos fil-
mes, sabemos que uma fala de até 15 segundos é suportável na
tela. Mas, dependendo da tensão da cena, podemos estabelecer
um tempo mais curto e, consequentemente, mais planos. De-
vemos evitar repetir planos, posições de câmera e sim, buscar
uma aproximação dramática.
Para decupar, cronometre o diálogo (in e of) e estabeleça a
divisão rítmica do diálogo para saber quantos planos serão ne-
cessários filmar. Em seguida, determine dois ou três ângulos de
filmagem e estabeleça uma progressão dramática dos planos.
Todos os planos pré decupados para a cena podem estar
reunidos em num único plano-sequência, que pode ir mudando
de tamanho em um travelling à frente, semicircular ou circular.
Quando não há interlocutor, todos os planos devem ser do
personagem solitário. Quando há interlocutor, os planos de-
vem ser dobrados, metade para cada um dos personagens.

Sugestão de decupagem de uma cena solitária ao telefone


com ou sem voz of

Plano Detalhe (o telefone toca, mão entra em quadro e atende ou dedos


discam os números de alguém)
Plano Médio ou Plano Americano (o outro personagem atende)
Plano Americano (de duas posições, parte do diálogo)
Close-up (de duas posições outra metade dos diálogos)
• Volta-se noutra direção e reiniciamos repetindo todo o diálogo
P. Médio, P. Americano e Close-up (e, caso haja necessidade, para tencionar
a sequência empregarmos um Geral Zenital

Você pode observar uma situação de telefonema com in-


terlocutor, no filme “Central do Brasil” de Walter Salles Jr., na
cena da conversa de Dora (com a atriz Fernanda Montenegro)
falando de um telefone público na rodoviária (é a atriz Marilia

103
Pêra) no apartamento dela. Pode-se filmar a mesma cena em
dois Planos Americanos, mas o ideal é decuparmos em vários
planos de tamanhos e posições diferentes para obtermos um
ritmo narrativo mais tenso.

Dançando de par e dialogando num baile


Em todas as sequências de baile em filmes, onde um casal
de personagens conversa e dança simultaneamente, os cineas-
tas deparam-se com um problema técnico crucial: a captação
do som. A decupagem do som fica sujeita a esta técnica de cap-
tar os planos. Primeiramente, filma-se ou grava-se a orquestra,
banda, ou grupo musical em um plano- sequência, com toda a
duração da música que faz fundo sonoro da cena. Optamos por
um plano aberto de todo o conjunto de músicos, ou seja:

Plano Geral Frontal ou de ¾ da orquestra.

O técnico de som fará uma gravação da trilha musical para


transformar-se em playback, quando ensaiarmos os figurantes
que dançarão junto com os nossos protagonistas, assim como
servirá de base para o ensaio dos músicos, que na hora da gra-
vação dos planos com diálogos, simularão a execução de seus
instrumentos naquela musica.
Em seguida, cronometramos a duração da música, para
dividirmos em planos de até quinze segundos. Esses planos,
serão de detalhe ou americano dos instrumentos, sendo toca-
dos pelos músicos. E, se desejarmos, um plano alternativo, do
regente ou crooner e back vocal, caso existam.
Feitos os ensaios com a figuração e os músicos, passaremos
a executar a decupagem da sequência propriamente dita, em-
pregando os seguintes planos:

– Plano Am de Conj. do casal dançando sem música, um


dos personagens diz uma frase do seu diálogo e gira,

104
saindo de quadro. Ele está posicionado ao fundo qua-
dro e ela em pp ( primeiro plano).
– Plano Am de Conjunto (contra plano) do casal dan-
çando sem música. O outro personagem diz outra frase
do seu diálogo e gira saindo de Q. Ela está posicionada
ao fundo Q e ele em pp.

Para manter o ritmo narrativo, repetimos os diálogos finais


de cada personagem:

Close-up da mulher e do homem dançando, ao fundo fi-


guração.
Para cobrir qualquer eventual falha nos diálogos, repeti-
mos todo o diálogo em plano geral do salão com os figurantes, a
orquestra executando a música ao vivo e o nosso casal de perso-
nagens conversando e dançando, sem captação dos diálogos.

Briga corpo a corpo


Em todas as cenas de ação necessitamos de cortes rápidos
e com dinâmica interna no plano, alternando os planos (no seu
tamanho, posição e altura de câmera) com cortes de movimen-
to em continuidade de tempo e direção, sem quebra de eixo,
distendendo o tempo real em tempo dramático (slow motion),
aumentando os impactos e a violência dos golpes e encurtando
o tempo real (fast motion), procurando montar o ordenamento
do plano numa progressão dramática surpreendente.

105
Decupagem de uma cena de briga corporal

P.Médio – Inicia-se o confronto, Os dois personagens se estudam


P.Am – Os personagens se estudam e um deles desfere um soco.
Close-up – A mão atinge o rosto de um dos combatentes. Sai de Q.
P. Médio ou Am de conj plongée. O atingido cai no chão, em ref. o agressor. O
atingido volta-se e tenta levantar-se.
P.Am em contra-plongée – O agressor observa o atingido.
Close-up do atingido em plongée. Levanta-se e sai de quadro
P. Geral – O atingido levanta-se e a luta é retomada.
* o ciclo é retomado. Procura-se alternar alguns planos variando a altura e a po-
sição de câmera, assim como podemos empregar o slow motion.

Conversando e andando na rua ou no cenário


Uma cena muito comum em variados gêneros de filme.
Um casal ou uma dupla de homens ou mulheres, e, até mes-
mo um grupo de pessoas. Neste caso, empregamos um equi-
pamento ou veículo que nos dê possibilidade de fazermos o
acompanhamento dos personagens. Em terrenos irregulares
esses planos devem ser feitos sobre um travelling. Trata-se de
um carro montado sobre trilhos retos. Sobre o carro é montado
o tripé da câmera e operam sobre ele: o camera man e o auxiliar
ou assistente de câmera. O carro é tracionado ou empurrado
pela força humana do maquinista. A dupla ou grupo de pessoas
caminha ao lado do trilho e a câmera os mantém enquadrados
enquanto caminham e dialogam durante a gravação ou filma-
gem do plano. O plano deve ser repetido do outro lado do tri-
lho, posicionando as pessoas novamente em um novo quadro
(semelhante ao anterior) e repetindo as ações. Na edição final,
esses planos se intercalarão com os demais planos mais fecha-
dos que particularizarão os diálogos mais importantes.
Há vários filmes com este tipo de cena, mas em “Ghost” de
Jerry Zucker, e “Sociedade Secreta”de Rob Cohen ou “Os intocá-
veis” de Brian de Palma há bons exemplos a serem conferidos.

106
Sugestão de decoupagem de uma cena
de traveling de acompanhamento

P. AM. Conj. Lateral (em Travelling à ré) registra todo o diálogo do personagem
e as partes do personagem que está em PP.
P. AM. Conj. Lat. em contra-plano (em trav. à ré) registra todo o diálogo do
personagem e as partes do personagem que está em PP.
CLOSE-UP – (em trav. à ré) do personagem Um.
CLOSE-UP – (em trav. à ré) do personagem Dois
PLANO GERAL Plongée (fixo ou em Pan), da trajetória dos dois personagens
na paisagem onde caminham e conversam.

Numa entrevista jornalística


Nos filmes documentais ou nas matérias jornalísticas para
tele-noticiosos, temos um compromisso com o tempo dis-
ponível para a inserção da entrevista e da matéria como um
todo. Somos obrigados a ganhar tempo e informar o máximo
no menor espaço de duração da matéria. Daí a necessidade de
dominarmos a gramática de decupagem em planos, das entre-
vistas externas ou de estúdio e como conduzir uma entrevista
ou apresentação das notícias, em uma bancada de um tele-no-
ticioso.
Os planos vão variar entre 5 a 10 segundos de duração. O
tamanho dos planos variam do americano largo, empregando
um americano cerrado e close-up. Esta variação de tamanhos
ajudará a manter o ritmo narrativo e o interesse do espectador
pela matéria.
Inicialmente abordaremos as entrevistas externas, dada a
intensidade de seu uso em matérias para noticioso e filmes do-
cumentais. Há, neste tipo de filmagem ou gravação, uma neces-
sidade premente em ganhar tempo e concentrar informações.
Daí a conveniência de iniciarmos as matérias, com “cabeças de
matérias” apresentadas pelos jornalistas, em plano americano
frontal. Neste plano, no áudio, o repórter faz uma síntese de
apresentação do tema.

107
Devemos nos preocupar em enquadrar um plano ameri-
cano mais largo, para que possamos no rodapé do quadro, so-
brepor o nome do repórter. O mesmo ocorre com a primeira
imagem do entrevistado. Devemos deixar o espaço para colo-
cação do nome do entrevistado e sua função. Ganhamos segun-
dos preciosos no curto espaço de tempo que dispomos para as
respostas do entrevistado. Já estamos informados de quem se
trata, dispensando apresentações por parte do repórter e con-
sequentemente perda de segundos preciosos. Este plano de
abertura deve ter em torno, de no máximo, 15” de duração.
O ritmo e a objetividade de uma entrevista é fundamen-
tal. Daí, a necessidade do repórter ou diretor do documentário
formular perguntas curtas. Para evitarmos respostas monossi-
lábicas devemos ter em mente ao formular as perguntas (Por
que?, Pra que? e Como?). Não explique nada ao perguntar. Nas
perguntas, não devem conter as respostas. Procure amarra as
respostas entre si, evitando a narração off para completar a in-
formação dada pelo entrevistado.
Como já observamos, o ritmo da edição somente pode ser
conseguido se houver uma quantidade de cortes (planos), va-
riando de tamanho e posição de câmera do entrevistado, e na
documentação do tema abordado pela matéria ou documentá-
rio. Para tal, algumas posturas devem ser observadas pelo dire-
tor e realizadas pelo camera man. O operador de câmera, para
variar de planos, necessita de um curto espaço de tempo, en-
tre uma pergunta e outra, para fechar a sua lente zooom. Pode
também, iniciar com plano americano largo, mantendo esse
quadro num tempo correspondente à leitura dos créditos no
rodapé, e ir fechando a zoom lentamente, até atingir um plano
mais fechado (em close-up) e, no momento da segunda per-
gunta, abrir um pouco mais o quadro, conseguindo um terceiro
enquadramento. Essa variação de planos permitirá uma edição
mais ritmada.
É bom também que após as perguntas, façamos um ou dois
planos do repórter ou entrevistador, ouvindo as respostas ou

108
formulando as perguntas. Podem ser necessários na edição fi-
nal do material gravado.
Após a entrevista, devemos captar material de documenta-
ção sobre o tema abordado pela matéria. Esse material também
deve conter uma quantidade de planos em tamanhos e posi-
ções variadas para que o ritmo da matéria seja mantido. Alguns
cuidados devem ser tomados no momento de filmagem desta
documentação, a saber:

a) Os planos não devem exceder a uma duração de 30


segundos. O ideal é que mantenham uma duração de
cerca de 10 segundos.
b) Para cada plano geral devemos nos preocupar em cap-
tar um plano de detalhe da mesma ação.
c) Os planos em movimento devem ter uma alternativa
fixa.
d) Os planos devem variar de posição de câmera, de altu-
ra, de enquadramento e movimento.
e) Os planos devem ser captados com ruído ambiente.

Com isso, disporemos de um material passível de uma boa


edição, com ritmo, fluência narrativa e riqueza visual. Vejamos
abaixo uma decupagem padrão de uma entrevista:

P.AM Frontal do entrevistado, com espaço no rodapé da imagem para inserir-


mos o nome do entrevistado e sua função,
CLOSE-UP Frontal – do entrevistado respondendo as perguntas.
P. AM largo, com referência em PP, do repórter ou entrevistador.
CLOSE-UP de contra-plano do repórter, fazendo perguntas e ouvindo respos-
tas.
P.AM frontal do repórter gravando as “cabeças” e “encerramento” da matéria.
P.Médio, Detalhes e Gerais – (documentação) do tema que o entrevistado

109
Casal deitado numa cama
Nas cenas de cama, deparamo-nos com atores imobiliza-
dos. Eles estão deitados ou recostados no espaldar. A gramáti-
ca deste tipo de seqüência é bem precisa. A situação comporta
três posições de câmera: o ponto de vista das laterais da cama, o
ponto de vista central e em posição zenital e ou plongée. Nestas
posições, podemos variar os tamanhos de enquadramento, em-
pregar movimentos e posicionamentos de câmera.
Nesse tipo de situação dramática duas coisas devem ser
observadas: recostar os personagens nos planos frontais e
evitar enquadrar o corpo por inteiro, com pés em primeiro
plano. Não só é antiestético, como quase sempre ocorre, os
pés dos atores estarem sujos. O enquadramento deforma o
corpo dos atores. De uma forma geral, uma sequência de dois
atores na cama pode ser decupada, empregando os seguintes
planos:

Sugestões de Decoupagem
de uma cena na cama

P. MÉDIO Conj. Frontal (a cama e o casal recostado ou sentado na cama, com


ou sem trav. à , até Plano Americano).
P.AM. Conj. (do casal sentado ou recostado na cama).
P. AM (de cada personagem; um sentado, outro recostado).
P.AM. do personagem (dois sentados ou recostados em continuidade)
CLOSE-UP frontal do personagem(recostado em continuidade).
CLOSE-UP frontal do personagem (dois recostados em cont. )
P.AM CONJUNTO Lateral da cama do casal recostado.
P. AM CONJ. Lateral oposto ao da cama do casal recostado.

Inúmeros são os filmes que contem este tipo de cena, como


por exemplo: “Fargo” dos irmãos Cohen, “Ghost” de Zucker e
“A Guerra dos Roses” de De Vitto entre outros. Confira.

110
Um jogo de tênis e esportes de quadra
Toda filmagem de um jogo em quadra deve obedecer al-
guns cânones da gramática audiovisual, evitando assim, deso-
rientar o espectador. Seja qual for o tipo de jogo: uma partida
de vôlei, basquete, futebol de salão ou tênis. Lógico que, em
cada jogo, a particularidade das regras e os elementos empre-
gados em quadra solicitam planos somente empregados nessas
modalidades de esporte. É o caso da cesta de basquete, onde
empregamos dois tipos de planos específicos desta modalidade
esportiva: o Plano Zenital da tabela sobre o aro, revelando “as
enterradas”, assim como os planos médios contra-plongée sob
a tabela. E, finalmente, os planos de detalhe do aro da cesta,
quando a bola é arremessada em sua direção e marca ou não
ponto para a equipe.
O mesmo ocorre nas partidas de vôlei. Haverá sempre uma
câmera posicionada lateralmente à rede, para que possamos vi-
sualizar as “invasões” de quadra, os toques na rede, os bloqueios
e “cortadas” espetaculares executados por parte dos jogadores.
É muito importante para a contagem dos pontos e compreen-
são de quem assiste à partida em casa, pela tv.
O que os jogos de quadra têm em comum é a escolha do
lado onde ficarão as câmeras na quadra. A escolha do eixo dra-
mático que orientará o espectador, que não está presente no
estádio. Ele só pode ver o que as câmeras mostram. É preciso
que o editor das imagens captadas mantenha uma continuida-
de entre os planos transmitidos, uma continuidade visual e dra-
mática da partida. Esse tipo de técnico edita a partida “ao vivo”,
durante as transmissões.
Abaixo relacionamos, como sugestão, uma planilha de pla-
nos de uma transmissão esportiva de uma partida de tênis, real
ou montada ficcionalmente.

111
Sugestão de uma decupagem de uma partida de tênis

P. GERAL situa o eixo dramático (a platéia, o juiz e os jogadores na quadra).


P.GERAL Subj. Lateral da platéia – A platéia assiste aos dois jogadores.
P. AM. Conj. da platéia iniciando a progressão dramática.
P. AM. Plongée da quadra ao comprido, dos 2 lados.
P.AM. de um jogador, visto do pto de vista dos 2 desafiantes.
P. AM. Ct. Plongée do juiz em sua cadeira.
P. DETALHE do placar movimentando-se na contagem.
CLOSE-UPs dos personagens, caso estejam na platéia assistindo ao jogo.
P. GERAL Plongée, caso queiramos dar a suntuosidade do local.

No filme “Match Point”, de Wood Allen, você pode obser-


var uma cena de ficção onde uma partida de tênis é jogada en-
tre os personagens. Alguns planos sugeridos em nosso quadro
estão lá. Em outro filme de Alfred Hitchcock, nos deparamos
com uma sequência onde os personagens estão envolvidos com
uma partida de tênis.
No caso de uma transmissão em direto de uma partida de
tênis, podemos também perceber que esses planos indicados
em nosso quadro de sugestão de decupagem são empregados.
Aliás, como todos os esportes de quadra (vôlei, basquete, fute-
bol de salão etc), empregam esse tipo de plano posicionando as
câmeras para poderem captá-los durante a transmissão. O dire-
tor do evento evitará colocar as câmeras em posições opostas
na quadra.
No caso de transmissões esportivas, cada câmera está em
link (ligada) a uma switter ou mesa de corte. Cada câmera com
um monitor diante da mesa de corte. O profissional optara por
uma câmera que transmitirá (estará no ar) naquele determina-
do momento. A edição é feita durante as transmissões ao vivo
ou pré-editadas como as telenovelas e depois finalizadas com a
inserção de planos feitos a parte durante as gravações por uma
câmera volante independente.

112
Casamento religioso
É uma situação em que a decupagem está subordinada às
qualidades e limitações espaciais da locação real ou cenográfi-
ca. Mas, de qualquer forma, necessitamos seguir uma certa or-
denação de planos, para melhor compreensão do fato aborda-
do: a cerimônia. Seja uma filmagem de cobertura jornalística,
para um álbum familiar ou para uma cena de broadcasting de
uma teledramaturgia ou cinema de ficção.
O fato pode ser resumido em mais ou menos planos, em
função da necessidade da sequência dramática ou da importân-
cia do fato jornalístico abordado. Pode ser uma simples cena de
um filme ou o casamento de uma personalidade, tornando a ma-
téria mais longa, composta com entrevistas de celebridades etc.
Observe esta sugestão de decupagem numa progressão
dramática linear:
Progressão dramática de um casamento
P. GERAL da entrada da igreja e/ou Plano detalhe do sino badalando.
P. M. Frontal visto do int. da igreja, trav. à ré do casal de noivos entrando.
P. AM. Conj. ,2 diagonais, trav. à frente, subj. dos noivos, os convidados.
P. G. Plongée, os noivos avançam a ala central da igreja convidados nos bancos
laterais, observam a passagem do casal de noivos.
P. MÉDIO, trav. à frente, o altar, os padrinhos ao lado do padre. O casal entra
em Quadro pela câmera e dirige-se ao altar. Se posicionam. A realização
da cerimônia.
P. AM. Frontal, Contra plongée do padre no altar e volta-se para os noivos.
P. AM. dos padrinhos observando a cerimônia.
CLOSE-UP do padre proferindo a pergunta aos noivos.
CLOSE-UP do noivo aceitando.
CLOSE-UP da noiva aceitando.
P. AM. Conjunto, os noivos se olham, colocam as alianças.
P. DETALHE das alianças sendo colocadas nos dedos dos noivos.
P. AM. Conj., do pt. de vista da platéia. O noivo levanta o véu da noiva e beija-a.
O padre abençoa-os,os noivos se voltam e partem.
P. MÉDIO trav. à ré. Os noivos caminham em direção a porta da igreja.
P. AM. travelling à ré dos noivos que sorriem e caminham.
P. GERAL da porta da igreja. Convidados jogam arroz.
P. AM. Da noiva na porta do carro, joga o buquê e entra no carro.
P. GERAL Plongée, o carro da noiva parte.

113
Noticioso ou Meteorologia
Os programas de telejornalismo, com quadros de meteore-
ologia ou esporte, também obedecem a uma decupagem plano
a plano, realizada no momento da transmissão, que é subordi-
nada ao ritmo narrativo de um noticioso. Esse ritmo está ligado
à experiência colhida ao longo de mais de cinquenta anos de
existência da televisão, nesse gênero de programa.
Especialistas em linguagem audiovisual de vários países
perceberam que o tempo máximo de atenção de um telespec-
tador, diante da tela de tv, assistindo alguém que fala quase
que interativamente com ele é de até 10 segundos, e que sua
atenção máxima está compreendida num plano de 5 segundos.
Daí, detalhar as frase do texto a ser apresentado em trechos não
muito superiores a esses tempos. Organizar o texto prevendo
várias câmeras, empregadas durante o noticioso, enquadradas
em planos diferentes: plano médio, incluindo a bancada e o
cenário, plano americano largo, close-up, plano americano cer-
rado. A diferença entre os planos e a duração, dará ritmo à ma-
téria apresentada. A matéria poderá ser ilustradas com cenas ou
entrevistas em externas ou material de arquivo.
Os publicitários, em seus filmes de venda de um produto,
compreenderam isto e, assim, aplicam universalmente esses
tempos de exposição dos planos. Os filmes tem versões em tor-
no de 5”, 15” e 30 segundos. A duração de uma chamada de 5
segundos fica reservada a vinhetas e assinaturas de um produto,
no final de um filmete. E a trama onde os personagens usam ou
empregam o produto difundido, é desenvolvida entre 10 e 25
segundos.
Nos filmetes de 15 segundos, 10 segundos são trama de
historieta de situação de consumo e 5 segundos, assinatura do
produto. Nos filmes de 30 segundos, 25 segundos são de tra-
ma de até 3 historietas de 8 segundos ou uma só trama de 25
segundos, com uma assinatura de 5 segundos do produto no
final do filmete.

114
Nos telejornais, o tempo geral das matérias é dividido pe-
los repórteres apresentadores e comentaristas dos temas, com
a participação de um âncora (um jornalista renomado), no co-
mando da bancada do noticioso. Quando apenas um repórter
apresenta o jornal, damos ritmo às matérias, cortando as noti-
cias de uma câmera a outra, alternando tamanhos de planos e
posições de câmera no estúdio. Tudo isso para empregar da for-
ma mais correta a duração dos planos, para obter-se um ritmo
narrativo que prenda a atenção do espectador. Quando a maté-
ria tem um volume maior de informações, o próprio apresenta-
dor convoca pelo telão do estúdio (em croma key) o jornalista
nas imagens externas, ou então, o comentarista especializado
em esportes ou um quadro dentro do próprio noticioso dedi-
cado a meteorologia e a situação do trânsito.
Na mesa de corte no switer, o editor realiza a decupagem
de cada matéria ao vivo, obedecendo a uma gramática já uni-
versalizada nos tele-noticiosos, a saber:

Sugestões de de decoupagem de um tele-noticioso

P. GERAL do cenário com a bancada e um cenário virtual e o(os) jornalista(s)


acomodado(os) em sua(as) posições. Tudo isso, enquadrado por três ou
mais câmeras em posições e planos diferentes.
P AM. do apresentador ou de Conjunto dos apresentadores.
CLOSE-UP do apresentador.
P AMERICANO mais fechado que o anterior.
P MÉDIO de Conjunto do jornalista na bancada e o telão no quadro.
+
Conjunto de planos da externa: P. AM. do repórter e documentação do fato
abordado (PLANO GERAL, PLANO MÉDIO,AM. e ClOSE-UP)

Uma palestra ou culto religioso


Quando cobrir uma palestra ou a reconstituír em uma obra
audiovisual para broadcasting, verificaremos que alguns planos
são indispensáveis na decupagem narrativa, para que se torne

115
compreensível cena ao espectador, que não está ali ao vivo na
locação.
Fisicamente, todas as palestras, na maioria das vezes, são
realizadas em auditórios. A platéia distribuída diante de um
palco, palanque ou estrado, ligeiramente acima do nível do
olhar da platéia, com uma mesa sobre ele e as cadeiras dos par-
ticipantes, palestrantes e o mediador, assim como um púlpito
para o palestrante ou pastor proferir a sua pregação, palestra ou
conferência.
É conveniente que as câmeras estejam dispostas de forma
que possam oferecer uma quantidade variada de planos, para
que possamos ter um material decupado ao vivo ou gravado
para edição, a posteriori e, com esse material, situarmos o es-
pectador, como se ali ele estivesse. Observem essa sugestão de
localização das câmeras e os planos necessários para uma trans-
missão desse tipo de evento, a saber:
Plano geral de ¾ da mesa, do ponto de vista da platéia.
Esta mesma câmera poderá oferecer planos mais fechados da
mesa de palestrantes e do mediador, assim como acompanhar
o palestrante convidado até o púlpito, onde o enquadrará
durante o seu discurso, em plano americano ou mesmo, em
close-up.
Plano geral de ¾ da mesa, do ponto de vista do palco. Esse
posicionamento poderá facilitar o enquadramento lateral da
mesa com o palestrante ao fundo, assim como um plano geral
ou planos mais fechados frontais da platéia.
Plano geral, por trás da platéia, frontal à mesa de palestran-
tes e o púlpito.
Todos os operadores destas câmeras deverão portar um
intercomunicador com a mesa de corte. E todas as câmeras
também deverão estar linkadas à mesa de corte. O diretor po-
derá comandar os planos desejados aos seus câmeras, visuali-
zar suas imagens, uma em cada monitor e escolher qual estará
colocando “no ar”. Ou, pré-editando o material para acaba-
mento e inserts de imagens na finalização. Quando dispomos

116
de recursos, solicitamos uma câmera volante que fará detalhes
de todo o evento, a serem inseridos na finalização de progra-
ma pré-editado. O som deverá ser captado na mesa de som do
evento, linkado a uma das câmeras que cobrirá o máster do
programa.

Um videoclipe
Esse tipo de obra audiovisual também obedece a alguns
princípios, visando atender os seus objetivos comerciais. Um
videoclipe é uma peça de venda de uma música, instrumen-
to de difusão comercial, nas mais variadas mídias, da música
em questão. Uma mistura de musical com filme publicitário.
Uma narrativa onírica, sem compromisso com o raccord entre
planos e o realismo. Cria-se um espaço imaginário para que a
música seja memorizada pelo espectador, pelas imagens. Como
um filme publicitário, o videoclipe pretende destacar-se entre
os demais exibidos em emissoras especializadas, dando “visi-
bilidade” à música que lhe serve como tema. Necessitamos,
por isso, de uma decupagem com planos suficientes para uma
edição métrica musical, reunindo uma quantidade de planos a
serem editados, em tempo e contratempo musical, para as va-
riações melódicas e dos arranjos, fazendo a mente do especta-
dor dançar.
Cada diretor de um videoclipe pode narrar a história que
desejar, a partir da melodia e da letra desta música em questão.
E, sobretudo, evitar ilustrar a letra, tornando o videoclipe de-
sinteressante e óbvio. Que a historieta não seja mais importan-
te do que a participação do cantor ou banda que interpreta esta
canção. O intérprete é o nosso personagem principal.
Para uma edição de qualidade, ritmada e rica em imagens,
são necessários alguns planos fundamentais para cobrirem a es-
trutura visual da música. As canções têm usualmente em torno
de um a dois minutos de duração. De uma forma geral, se apre-
sentam com a seguinte estrutura e divisão de tempo:

117
Estrutura de musicas em dvds

introdução da música (cerca de 6 a 8” de duração)


primeira estrofe da música (cerca de 10 a 20” de duração)
back vocal ou instrumental (cerca de 6” a 8” de duração)
segunda estrofe da música (cerca de 10”a 20” de duração)
instrumental ou solo (cerca de 10” a 15“de duração)
terceira e última estrofe (cerca de 10” a 20” de duração)
encerramento da música (cerca de 6“ a 8” de duração)

Para servir como base para uma decupagem de um video-


clipe, apresentamos as seguintes sugestões de planos: close-up,
plano americano e plano médio do cantor (ou da banda) can-
tando ou executando a musica toda. É o que chamamos de pla-
no master do videoclipe. Ele servirá como base para a edição. O
diretor, tendo gravado esses planos, a priori, já dispõe do video-
clipe em si. A seguir, deve-se criar o resto da “embalagem”.
A introdução visual da música deverá ser coberta por um
plano síntese da historia, com duração de oito segundos ou
subdividido em dois planos de 4 segundos, ou ainda 4 planos
de dois segundos (no caso de uma música muito ritmada).
A primeira estrofe é composta de quatro a seis frases po-
éticas interpretadas pelo cantor. Reservamos parte dela para
inserção de dois ou três planos curtos, com síntese visual, da
sugestão de uma situação dramática que a musica sugere. Es-
sas situações serão interpretadas por figurantes, modelos ou
atores. E, em casos especiais, com a participação do próprio
intérprete. Essa decupagem das historietas é muito semelhan-
te às cenas descritas num filme publicitário. A idéia-síntese da
cena deve ser solucionada visualmente, com poucos planos e
curtos.
O back vocal deve conter a quantidade de planos evocados
pelas notas musicais, proferidas pelas cantoras. Planos fecha-
dos, individuais e de conjunto dos cantores, componentes do
naipe vocal.

118
Na segunda estrofe, também composta de quatro frases
poéticas diferentes, interpretadas, em parte, pelo cantor, e a se-
gunda parte do roteiro dramático vivenciado pelos atores.
Para a parte instrumental da música há duas possibilidades:
uma delas é contratar músicos para figurarem durante a passa-
gem musical tocando em cima do play back, para pós-sincro-
nização em edição. A outra, é o emprego de bailarinos em um
trecho coreografado que cubra a duração deste trecho musical.
Isso não impede de misturarmos as duas sugestões: músicos e
bailarinos.
Na terceira e última estrofe, também composta de qua-
tro frases poéticas diferentes ou conclusivas da trama da le-
tra, interpretadas em parte, pelo cantor, e a ultima parte do
roteiro dramático, vivenciado pelos atores. O conjunto de
situações dramáticas apresentadas deve fazer um fecho da
trama proposta de fácil compreensão por parte do especta-
dor. Não necessariamente, um fim em si, mas, talvez, uma
conclusão poética da pequena trama visual apresentada ao
espectador, marcando sua memória. Essas imagens trarão
uma referência imaginária da musica ouvida e vista, para o
espectador.
A finalização ou encerramento da música deverá ser cober-
ta por um plano síntese da historia, com duração de oito segun-
dos ou subdividido em dois planos de 4 segundos ou, ainda, 4
planos de dois segundos (no caso de uma música muito ritma-
da). Há casos em que encerramos com instrumentos, simulan-
do a execução do arranjo até o fad out.

Empregando um Croma Key


O croma key é uma técnica de sobrepor imagens (planos)
de dois ambientes diferentes, numa mesma imagem. Um per-
sonagem (ou repórter) em estúdio pode ser sobreposto sobre
uma imagem de uma paisagem em movimento. Por exemplo:
uma praia, uma floresta etc... Para que isso seja tecnicamente

119
realizável, é necessário uma das imagens (a do estúdio) estar
sobre um fundo infinito, pintado com uma dessas cores: azul,
verde ou vermelho que são as cores básicas: o RGB. Outro
detalhe técnico é que a pessoa que se encontra no estúdio
não deve estar vestida com uma roupa que contenha a cor
do fundo, assim como os móveis que serão empregados no
cenário.
Todo filme de estúdio depende dos cortes de câmera para
câmera, para que possamos manter a atenção do espectador.
Como afirmamos anteriormente, sabe-se por experiência co-
letiva dos técnicos atuantes no mercado que a atenção máxi-
ma do telespectador diante de um plano transmitido pela tv
é de até 15 segundos. E o melhor tempo de fixação, girando
em torno de 5 segundos. Daí, a necessidade dos programas de
estúdio, sejam de entrevistas ou de apresentador, empregarem
três câmeras, com a mesa de corte dispondo sempre de três ta-
manhos, posições e movimentos de câmera, a cada momento
da cena.
Um método simples e eficiente, é pré-decuparmos o pro-
grama, a partir da cronometragem do texto, noticioso ou da
cena, no caso de broadcasting e estudarmos a progressão dra-
mática e o equilíbrio do ritmo geral da transmissão. Muitos di-
retores fazem isso na intuição, mas nem sempre serão eficien-
tes e fluidos em sua narrativa. Dependerá do estado físico e da
atenção do editor de imagens, no momento da transmissão ou
gravação. Para obtermos eficiência narrativa é necessário pre-
viamente, pensar no corte. Seja uma teledramaturgia, telenoti-
cioso ou programa ao vivo. Examinemos abaixo alguns exem-
plos de corte:

120
Telenoticiosos e talk shows
Vinheta de apresentação 5 segundos
Plano geral do cenário 5 segundos
P. Médio, Plano Am. , Close-up do apresentador
síntese da pauta do programa 15 segundos
Durante os quadros:
P.Am.Conj. entrevistador/entrevistado 10 segundos
P. Am do entrevistador 5 segundos
P. Am do entrevistado 10 segundos
Insert documento ou externa 20 segundos
Close-up do entrevistado 5 segundos
Close-up do entrevistador escuntando/aparteando
P. Am. Conj. ou médio apresentador 10 segundos
Vinheta do programa 5 segundos
Intervalo ou Brake

Neste estudo de pré-decupagem, devemos, a priori, saber


quais as matérias pré-gravadas e as entrevistas ao vivo em exter-
na que serão inseridas no programa (tempo), para que possa-
mos equilibrar o ritmo do mesmo. Estabelecermos um teto de
tempo proporcional à duração do programa. É recomendável
que estes documentos não excedam a 30% da duração do qua-
dro ou do programa.
As imagens que serão inseridas no fundo infinito (croma
Key) deverão também estar programadas e com versões para
planos mais fechados. A proporção no quadro se modifica na
medida em que utilizamos um plano aberto e passamos ou
alternamos para um plano mais fechado (close-up ou plano
americano), no mesmo fundo de croma. Isso vale tanto para
matérias jornalísticas como para ficção.
Muitos diretores optam por um plano só, para não se de-
pararem com esse problema. Um bom exemplo destes, pode
ser examinado no filme “O Iluminado”, de Stanley Kubrick.
Na cena da viagem da família indo para o hotel nas montanhas
isoladas pela neve, a sequência é resolvida em um plano ame-

121
ricano de conjunto, filmada em estúdio. A carcaça cenográfica
do carro é colocada diante de um fundo infinito de estúdio, em
croma key, onde os três atores contracenaram.
As imagens que desfilam nas janelas foram captadas em ex-
terna, anteriormente, e sobrepostas na finalização do filme em
laboratório ou numa finish house. A luz no estúdio varia con-
forme as passagens do veículo sob as árvores na externa. Um
outro plano, aéreo, feito de helicóptero, segue o veiculo na es-
trada. A conjugação destes três planos torna a cena verossímil.
Esse método de filmagem tornou viável a participação de
atores importantes, sem terem de sair de suas cidades. Gravan-
do ou filmando a cena em estúdio. Veja como Kubrick resolveu
esta cena em “O Iluminado”.

Croma key em Broadcasting

P. AMERICANO de Conjunto (em cenário na carcaça do carro em estúdio)


P. GERAIS aéreos em externa (carro na estrada indo para a casa da escritora)
P. GERAIS Subjetivos (paisagem em movimento, da janela do carro)

Outro bom exemplo em que empregamos a técnica do cro-


ma key em cenas de automóveis em movimento é no filme “Psi-
cose”, de Alfred Hitchcock. A secretária da imobiliária foge com o
dinheiro da empresa, que pegara para fazer um depósito bancário.
E, no meio do trajeto, se depara com o patrão na rua, atravessan-
do num sinal de trânsito. Observem a decupagem e o emprego da
técnica, embora ainda, na época os filmes foram produzidos em
preto e branco. Hoje em dia, muitos são os filmes e programas
de teledramaturgia que empregam o croma key como medida de
economia e cumprimento de prazos de suas produções.
A técnica do cromakKey serve também aos programas de
broadcasting, noticiosos, publicitários, videoclipes e de educa-
ção. Basta saber utilizar as ferramentas da gramática do discur-
so audiovisual para empregar esse tipo de tecnologia, com bons
resultados.

122
Capítulo Sete

Concluindo

A o longo dessas anotações, podemos perceber que a es-


critura audiovisual é construída por vários elementos: os
planos, as posições e movimentos de câmera, a construção do
espaço respeitando o eixo dramático narrativo, a interligação
entre os planos e as figuras de linguagem, que nos possibilitam
a pontuação. Todas essas ferramentas buscam na verdade, esta-
belecer um ritmo, uma fluidez narrativa, sem que o espectador
ou telespectador perceba, fazendo-o entender a mensagem ou
se divertindo com ela.
Podemos afirmar, com quase certeza, que existem poucas
histórias novas a serem contadas. E o que interessa a todos os
espectadores do audiovisual é como elas são contadas. E, em
que veículo será difundido.
O homem, através dos séculos de sua existência, nunca
deixou de ter sentimentos e emoções. O que buscamos com
a linguagem audiovisual é criar condições, para melhor retra-
tar os fatos, os sentimentos humanos, seus relacionamentos e
emocionar o público com nossas histórias e notícias.
Visamos mostrar que a gramática audiovisual tem uma
escritura própria. Os veículos que empregam imagens e sons,
para narrar não importa o quê, estão retratando, estão constan-
temente se modificando, apresentando avanços tecnológicos
que melhoram a comunicação com o espectador. Isso obriga
aos profissionais do audiovisual e da comunicação em geral,
dominarem com segurança essas ferramentas, indispensáveis
para o exercício de sua atividade.

123
Podemos ser acusados de pretensiosos, mas afirmamos,
sem sombra de dúvida, que o audiovisual penetrou na vida das
pessoas e se tornou indispensável para o homem do século XXI.
Seja através da telefonia móvel com imagens, seja no emprego
diário da web ou diante de qualquer tipo de tela contendo sons
e imagens. Quem sabe, talvez no futuro, a linguagem audiovi-
sual se torne obrigatória nas escolas de educação básica, para o
indivíduo poder sobreviver no mundo digital.
Escrever com imagens e sons não é mais um conhecimento
de luxo. É uma necessidade básica para o homem contempo-
râneo. Uma ferramenta fundamental para qualquer atividade.
Seja para criadores e técnicos profissionais do setor do audio-
visual, seja para os de outras áreas. Nos dias de hoje e dos que
virão, qualquer atividade empregará equipamentos e meios de
comunicação que utilizam sons e imagens.
Esperamos sinceramente que estas modestas notas e ob-
servações tenham servido para a sua reflexão sobre o tema.

124
Autores

Jorge Monclar – Diretor de Fotografia


Graduado pelo IDHEC – Institute des Hautes Ètudes
Cinematographiques/ Paris
Atua como Diretor de Fotografia no cinema, na publicidade e na
televisão brasileira há mais de vinte anos. Fotografou filmes de longa-
metragem como: “Garrincha - estrela Solitária” de Milton Alencar Jr,
“O Cego que gritava luz”, de João Baptista de Andrade, “Um ladrão”,
de Nelson Pereira dos Santos, “Lembrar é resistir”, de Nelson Xavier
e “A Enxada”, de Iberê Cavalcanti. Foi presidente do STIC – Sindica-
to dos Trabalhadores na Indústria Cinematográfica. É o coordenador
técnico-didático da Academia Internacional de Cinema e Televisão. É
autor de outras obras técnicas: “O Diretor de Fotografia”, O Operador
de Câmera”, “O Assistente de Câmera Cinematográfica” e o “Assis-
tente de Direção de Cinema””. Escreve para revistas técnicas, tendo
publicado artigos sobre linguagem audiovisual e novas tecnologias.

Capítulo 5 – Continuidade e eixo dramático


Gláucia Pelliccione – Continuísta
Atua há cerca de vinte anos no mercado brasileiro de cinema e
televisão. Participou de várias produções de longa-metragem nos
mais diferenciados portes: “Chatô – o rei do Brasil”, de Guilherme
Fontes, “A Máquina”, de João Falcão, “Divã”, de José Alvarenga Jr.,
“Tempos de Paz”, de Daniel Filho, “Sexo com Amor”, de Wolf Maia,
“Uma onda no ar”, de Helvécio Ratton, “Maria – mãe do filho de
Deus”, de Moacyr Goes, “Xuxa em sonho de menina”, de Rudi
Lagemann, “Adágio Sostenuto”, de Pompeu Aguiar, “High School
Musical – O Desafio” de César Rodrigues, “As Vidas de Chico
Xavier” de Daniel Filho entre outros. Produziu e foi Continuista em
mais 70 filmes de ficção de curta metragem. Dirigiu os curta-
metragens: “Orgasmo Multilingüe”, “O Sebo”, "A Tv Quebrou",
"Apertadinho", "Aliança", "Pau Brasil", "Pé na Alcova", "Viúva
Negra". É diretora da Academia Internacional de Cinema e
Televisão (RJ).

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