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~ Ven.

Ajahn Chah ~
[1] Agora, por favor, preste atenção, sem permitir que sua mente divague atrás de outras
coisas. Crie a sensação de que neste momento você está sentado numa montanha ou numa
floresta em algum lugar, totalmente só. O que você tem sentando aqui agora? Há corpo e mente
apenas, só essas duas coisas. Tudo o que está contido dentro dessa estrutura sentando aqui agora
é chamado de “corpo”. A “mente” é aquela que está atenta e pensando neste exato momento.
Essas duas coisas são chamadas “nāma” e “rūpa”. “Nāma” refere-se ao que não tem “rūpa” ou
forma. Todos os pensamentos e sentimentos, ou os quatro khandhas de sensação, percepção,
volição e consciência, são nāma, eles não têm forma. Quando os olhos veem a forma, ela é
chamada de rūpa, ao passo que a consciência é chamada de nāma. Juntas, são chamadas de
nāma e rūpa ou simplesmente corpo e mente.
Compreender que sentar aqui neste momento presente é apenas corpo e mente. Mas nós
confundimos essas duas coisas. Se você quer paz você precisa saber a verdade sobre isso. A
mente no seu estado atual está ainda destreinada; está suja e não clara. Ainda não é a mente
pura. Devemos treinar esta mente por meio da prática da meditação.
Algumas pessoas pensam que a meditação significa sentar-se de forma especial mas, na
verdade, sentar, andar e reclinar-se são todos veículos para a prática da meditação. Você pode
praticar todo o tempo. Samādhi literalmente significa “a mente firmemente estabelecida”. Para
desenvolver samādhi você não tem que ir refreando a mente. Algumas pessoas tentam ficar
tranquilas sentando-se em silêncio e não tendo nada para perturbá-las de modo algum, mas isso
é como estar morto. A prática de samādhi é para desenvolver a sabedoria e o entendimento.
Samādhi é a mente firme, a mente focada num único ponto. Em que ponto ela está focada? No
ponto de equilíbrio. Esse é o ponto. Mas as pessoas praticam a meditação tentando silenciar suas
mentes. Elas dizem: “Eu tento sentar em meditação, mas minha mente não para nem por um
minuto. Num instante ela voa para um lugar, no seguinte, para outro… Como eu posso fazê-la
parar?” Você não tem que fazer a mente parar, não é esse o ponto. Onde há movimento é onde
pode surgir o entendimento. As pessoas reclamam: “Ela foge e eu puxo de volta; em seguida,
ela sai de novo e eu puxo de volta mais uma vez…” Então, elas apenas sentam, puxando a
mente para trás e para a frente.
Eles pensam que as suas mentes andam por todo o lado, mas realmente apenas parece que a
mente anda às voltas. Por exemplo, olhe para este átrio aqui… “Ó, é tão grande!”, diz você. De
fato, nem sequer é grande. Se parece grande ou não depende da sua percepção. De fato, este
átrio é apenas do tamanho que é, nem grande nem pequeno, mas as pessoas andam às voltas
buscando suas sensações o tempo todo.
Meditar para encontrar a paz… vocês devem entender o que é a paz. Se vocês não a entendem
não serão capaz de encontrá-la. Por exemplo, suponham que vocês trouxeram hoje com vocês
para o monastério uma caneta muito cara. Agora suponham que, em seu caminho até aqui, vocês
colocaram sua caneta em seu bolso frontal, e que um pouco mais tarde vocês a tiraram e a
colocaram em outro lugar, tal como o bolso detrás. Agora, quando vocês procuram por ela no
bolso da frente… ela não está lá! Vocês tomam um susto. Vocês tomam um susto por causa do
mal-entendido, vocês não veem a verdade dessa questão. O sofrimento é o resultado. Seja em
pé, caminhando, indo e vindo, vocês não conseguem deixar de se preocupar com a caneta
perdida. Seu entendimento errôneo os leva a sofrer. Entender erroneamente causa sofrimento…
“Que vergonha! Eu comprei essa caneta há poucos dias e agora a perdi”.
E então você se lembra: “Oh, é claro! Quando fui tomar banho eu coloquei a caneta no bolso
de trás”. Assim que você se lembra disso você já se sente melhor, mesmo sem ter visto a caneta.
Percebe isso? Você já está feliz, você pode parar de se preocupar com a sua caneta. Você está
certo disso agora. É como se você, andando, passasse a mão sobre o seu bolso de trás e lá
estivesse ela. Sua mente estava enganando você todo o tempo. A preocupação vem de sua
ignorância. Agora, vendo a caneta, você fica além de qualquer dúvida, suas preocupações se
apaziguam. Esse tipo de paz vem de visualizar a causa do problema, samudaya, a causa do
sofrimento. Assim que você se lembra que a caneta está no bolso de trás há nirodha, a cessação
do sofrimento.
Então, você precisa contemplar para encontrar a paz. O que as pessoas geralmente querem
dizer com paz é simplesmente o acalmar da mente, não o acalmar das impurezas, que são,
temporariamente, simplesmente controladas, como a grama coberta por uma pedra. Em dois ou
três dias você tira a pedra de cima da grama e ela logo cresce de volta. A grama não morreu de
verdade, ela só foi abafada. É a mesma coisa quando sentamos em meditação: a mente se
acalma, mas as impurezas não. Por isso, samādhi não é algo seguro. Para encontrar a paz
verdadeira você precisa desenvolver sabedoria. Samādhi é um tipo de paz, como a pedra
cobrindo a grama – em poucos dias, você a tira de cima e a grama cresce de novo. Essa paz é
apenas temporária. A paz da sabedoria é como colocar a pedra e não tirá-la mais, deixando-a
onde está. A grama não consegue crescer de novo. Essa é a verdadeira paz, o acalmar das
impurezas, a paz correta que resulta da sabedoria.
Nós falamos de sabedoria (paññā) e samādhi como coisas separadas, mas em essência elas
são uma e a mesma coisa. Sabedoria é a função dinâmica de samādhi; samādhi é o aspecto
passivo da sabedoria. Elas surgem do mesmo lugar, mas tomam diferentes direções, diferentes
funções, como essa manga aqui. Uma pequena manga verde eventualmente cresce mais e mais,
até ficar madura. É a mesma manga, a manga verde e a manga madura são a mesma manga, mas
as condições mudam. Na prática do Dhamma, uma condição é chamada samādhi, e a condição
final é chamada paññā, mas na verdade, sīla, samādhi e paññā são a mesma coisa, como essa
manga.
Em qualquer caso, em nossa prática, não importa o aspecto que você se refere, você deve
sempre começar a partir da mente. Você sabe o que esta mente é? Com o que a mente se parece?
O que ela é? Onde ela está?… Ninguém sabe. Tudo o que sabemos é que queremos ir por aqui
ou por lá, queremos isso e queremos aquilo, nos sentimos bem ou nos sentimos mal… mas a
mente em si parece impossível de se conhecer. O que é a mente? A mente não tem forma.
Aquilo que recebe impressões, boas e más, nós chamamos de “mente”. É como o proprietário de
uma casa. O proprietário fica em casa, enquanto os visitantes vêm para vê-lo. Ele é o único que
recebe os visitantes. Quem recebe impressões dos sentidos? O que é que se percebe? Quem solta
as impressões dos sentidos? Isso é o que chamamos de “mente”. Mas as pessoas não podem vê-
la, elas pensam em círculos… “O que é a mente, o que é o cérebro?”… Não se confunda com
um problema como esse. O que é que recebe impressões? Algumas impressões que gosta e
algumas que não gosta…. Quem é esse? Existe alguém que gosta e não gosta? Claro que há,
mas vocês não podem vê-lo. Isso é o que chamamos de “mente”.
Em nossa prática não é necessário falar de samatha (concentração) ou vipassanā (insight),
basta chamá-la de prática do Dhamma, isso é o suficiente. E realizar esta prática a partir de sua
própria mente. O que é a mente? A mente é aquilo que recebe ou que está consciente das
impressões dos sentidos. Algumas dessas impressões provocam a reação de gostar, outras a de
desgostar. Esse receptor de impressões nos conduz à felicidade e ao sofrimento, ao certo e ao
errado. Mas ele não tem qualquer forma. Supomos que seja um eu, mas é realmente apenas
nāmadhamma. Será que a “bondade” tem qualquer forma? E o mal? Felicidade e sofrimento
tem qualquer forma? Você não pode encontrá-los. Eles são redondos ou quadrados, curtos ou
compridos? Você pode vê-los? Essas coisas são nāmadhamma, elas não podem ser comparadas
com coisas materiais, eles são sem forma… mas sabemos que existem.
Por isso, diz-se para começar a prática acalmando a mente. Coloque consciência plena na
mente. Se a mente estiver vigilante, estará em paz. Algumas pessoas não vão pela consciência
plena, elas apenas querem ter paz, uma espécie de apagão. Assim, elas nunca aprendem nada. Se
não tivermos este “aquele que sabe”, em que se há de basear a nossa prática?
Se não houver longo, não há curto; se não houver certo, não poderá haver errado. As pessoas
hoje em dia estudam muito, procurando o bem e o mal. Mas do que está além do bem e do mal
elas não sabem nada. Tudo o que sabem é o certo e o errado – “Vou levar apenas o que é certo.
Não quero saber sobre o errado. Porque haveria de o querer?” Se você tentar tomar apenas o que
é certo, em pouco tempo ele vai dar errado novamente. Certo leva a errado. As pessoas
continuam discernindo entre o certo e o errado, elas não tentam encontrar o que é nem certo
nem errado. Elas estudam sobre o bem e o mal, em busca da virtude, mas elas não sabem nada
do que está para além do bem e do mal. Elas estudam o longo e o curto, mas daquilo que é nem
longo nem curto elas não sabem nada.
Essa faca tem uma lâmina, uma borda circular e um cabo. Vocês podem levantar apenas a
lâmina? Vocês podem levantar apenas a borda circular da lâmina ou o cabo? O cabo, a borda
circular e a lâmina são todas parte da mesma faca: quando vocês pegam a faca, vocês pegam as
três partes juntas.
Do mesmo modo, se vocês pegam aquilo que é bom, o mau tem que vir junto. As pessoas
procuram por bondade e tentam se livrar do mal, mas elas não estudam aquilo que não é nem
bom nem mau. Se vocês não estudam isso, não pode haver completude. Se vocês pegam a
bondade, a maldade vem junto. Se vocês pegam a felicidade, o sofrimento vem junto. A prática
de abraçar a bondade e afastar a maldade é o Dhamma das crianças, é como um brinquedo.
Claro, está bom, vocês podem escolher apenas isso, mas se vocês agarrarem a bondade, o mal
virá junto. O fim desse caminho é confuso, não é tão bom.
Tomemos este simples exemplo. Você tem filhos – agora suponha que você queira apenas
amá-los e nunca vivenciar ódio. Este é o pensamento de quem não conhece a natureza humana.
Se você se agarrar ao amor, o ódio o seguirá. Assim também é quando as pessoas decidem
estudar o Dhamma para desenvolver a sabedoria, estudando o bem e o mal tão atentamente
quanto possível. Agora que conheceram o bem e o mal, o que elas fazem? Elas tentam se apegar
ao bem, e o mal vem em seguida. Elas não estudam o que está além do bem e do mal. É isto que
vocês devem estudar.
“Eu vou ser assim”, “Eu vou ser daquele jeito”… mas elas nunca dizem: “Eu não vou ser
nada porque não há realmente qualquer ‘eu’”. Isso elas não estudam. Tudo o que elas querem é
o bem. E, atingindo o bem, elas se perdem nele. Se as coisas ficam muito bem, elas vão começar
a ir mal. E assim as pessoas acabam apenas balançando para frente e para trás dessa forma.
A fim de acalmar a mente e tornar-se consciente do observador das impressões sensoriais,
devemos observá-la. Siga “aquela que sabe”. Treine a mente até que ela seja pura. Quão pura
você deve torná-la? Se for realmente pura a mente deve estar acima de bem e do mal, acima até
mesmo da pureza. Está terminada. É quando a prática foi concluída.
O que as pessoas chamam de sentar em meditação é meramente um tipo temporário de paz.
Mas mesmo em tal estado de paz, há experiências. Se uma experiência surge, deve haver
alguém que a conheça, a perceba, questione e analise. Se a mente está simplesmente vazia,
então não é tão útil. Você pode ver algumas pessoas que parecem muito contidas, e acham que
são pacíficas e tranquilas, mas a verdadeira paz não é simplesmente uma mente pacífica. Não é
a paz que diz: “Que eu possa ser feliz e nunca experimentar nenhum sofrimento”. Com este tipo
de paz, eventualmente, até a realização da felicidade torna-se insatisfatória. O resultado é o
sofrimento. Só quando puderem levar sua mente para além da felicidade e do sofrimento é que
encontrarão a verdadeira paz. Esta é a verdadeira paz. Este é o assunto que a maioria das
pessoas nunca estuda, e nunca realmente percebe.
O jeito certo de treinar a mente é torná-la brilhante, para desenvolver a sabedoria. Não
pensem que treinar a mente é simplesmente sentar-se em silêncio. Isso é a pedra que cobre a
grama. As pessoas ficam bêbadas a respeito dela. Elas pensam que samādhi é sentar. Isso é
apenas uma das palavras para samādhi. Ma,s na verdade, se a mente tem samādhi, então
caminhar é samādhi, sentar é samādhi … samādhi na postura sentada, na postura caminhando,
na postura de pé e deitada. É tudo prática.
Algumas pessoas se queixam: “Não consigo meditar, sou muito inquieta. Sempre que me
sento penso isso e aquilo… Não consigo. Eu tenho muito mau kamma. Eu deveria gastar o meu
mau kamma primeiro e depois voltar e tentar meditar”. Claro, apenas tente. Tente gastar o seu
mau kamma….
É assim que as pessoas pensam. Por que elas pensam dessa forma? Esses supostos obstáculos
são coisas que devemos estudar. Sempre que nos sentamos, a mente imediatamente vai
escapando. Nós a seguimos e tentamos trazê-la de volta e observá-la mais uma vez… então, ela
se vai novamente. Isso é o que vocês deveriam estar estudando. A maioria das pessoas se recusa
a aprender suas lições a partir da natureza… como um garoto desobediente que se recusa a fazer
o seu dever de casa. Elas não querem ver a mente mudando. Como vocês vão desenvolver a
sabedoria? Nós temos que viver com mudanças assim. Quando sabemos que a mente é assim
mesmo, em constante mudança… quando sabemos que esta é a sua natureza, nós iremos
entendê-la. Nós temos que saber quando a mente está pensando bem e mal, mudando o tempo
todo, nós temos que conhecer essas coisas. Se entendermos esse ponto, então, mesmo enquanto
estamos pensando, nós podemos estar em paz.
Por exemplo, suponha que você tem em casa um macaco de estimação. Macacos não ficam
parados por muito tempo, eles gostam de pular por aí e agarrar as coisas. É assim que os
macacos são. Agora você vem para o mosteiro e vê o macaco aqui. Este macaco também não
fica quieto, ele salta por aí do mesmo jeito. Mas isso não lhe incomoda, não é? Por que não lhe
incomoda? Porque você já criou um macaco antes, então sabe como eles são. Se você conhece
apenas um macaco, não importa a quantos lugares você vai, não importa quantos macacos você
vê, você não vai ser incomodado por eles, vai? Assim é alguém entende macacos.
Se nós entendermos os macacos, então, nós não nos tornaremos macacos. Se você não
entender os macacos, você poderá se tornar um. Você entende? Quando você o ver chegar
fazendo isto e aquilo, você grita: “Ei!” Você fica com raiva… “Aquele macaco maldito!” Esse é
alguém que não conhece macacos. Aquele que conhece macacos vê que o macaco em casa e o
macaco no mosteiro são a mesma coisa. Por que você deve ficar irritado com eles? Quando você
vê o que os macacos são, isso é o suficiente, você pode estar em paz.
A paz é assim. Temos de reconhecer as sensações. Algumas sensações são agradáveis, outras
desagradáveis, mas isso não é importante. São assim mesmo. Tal como o macaco, todos os
macacos são iguais. Às vezes, percebemos as sensações como agradáveis, outras vezes não – é a
sua natureza. Deveríamos entendê-las e saber como deixá-las passar. As sensações são incertas.
São transitórias, imperfeitas e sem dono. Tudo o que percebemos é assim. Quando os olhos, os
ouvidos, o nariz, a língua, o corpo e a mente recebem sensações, reconhecemo-las, tal como
conhecemos o macaco. Então, podemos estar em paz.
Quando surgem sensações, conheçam-nas. Por que correr atrás delas? Sensações são incertas.
Num momento são de uma forma, no momento seguinte, de outra. Elas existem dependentes da
mudança. E todos nós aqui existimos na dependência da mudança. A respiração sai, em seguida
deve entrar. Ela deve sofrer esta mudança. Tentem apenas inspirar, vocês conseguem fazer isso?
Ou tentem apenas expirar sem tomar outra inspiração… vocês podem fazê-lo? Se não houver tal
mudança, por quanto tempo vocês podem viver? Deve haver tanto inspiração como expiração.
Ocorre o mesmo com as sensações. Deve haver essas coisas. Se não houvesse sensações
vocês não poderiam desenvolver nenhuma sabedoria. Se não houver nada de errado, não pode
haver o certo. Vocês devem estar certos antes para que possam ver o que está errado, e vocês
devem entender o errado antes de estarem certos. Assim é como as coisas são.
Para o estudante realmente sério, quanto mais sensações, melhor. Mas muitos meditantes
esquivam-se das sensações, não querem lidar com elas. É como o estudante travesso que não vai
à escola, não ouve o professor. Essas sensações nos ensinam. Quando reconhecemos sensações,
estamos praticando Dhamma. A paz dentro de sensações é como entender o macaco aqui.
Quando vocês entenderem o que os macacos são, não mais serão perturbados por eles.
A prática do Dhamma é assim. Não é que o Dhamma esteja muito longe, ele está aqui
conosco. O Dhamma não é sobre anjos nas alturas ou coisas do tipo. É simplesmente sobre a
gente, sobre o que estamos fazendo agora. Observe a si próprio. Às vezes há felicidade, outras
sofrimento, às vezes conforto, outras dor, às vezes amor, às vezes ódio… isso é Dhamma. Você
vê isso? Você deve conhecer esse Dhamma, você precisa ler suas experiências.
Vocês precisam conhecer as sensações antes que as possam largar. Quando verem que as
sensações são impermanentes, vocês não serão mais perturbados por elas. Assim que uma
sensação surgir, apenas diga a si mesmo: “Hummm… isso não é uma certeza”. Quando seus
humores mudarem… “Hummm, não é uma certeza”. Vocês podem ficar em paz com essas
coisas, como ver o macaco e não se incomodar com ele. Se vocês conhecem a verdade das
sensações, isso é conhecer o Dhamma. Você se desapega das sensações, percebendo que são
invariavelmente incertas.
Aquilo que estamos a chamar de incerteza é o Buddha. O Buddha é o Dhamma. O Dhamma é
a característica da incerteza. Quem vê a incerteza das coisas vê a realidade inalterada delas. É
isso que o Dhamma é. E é isso o Buddha. Se vemos o Dhamma vemos o Buddha e ver o
Buddha é ver o Dhamma. Se conhecemos aniccam, a incerteza, então deixaremos as coisas ir e
não as agarramos.
Você diz: “Não quebre meu copo!”. Você consegue evitar a quebra de algo quebrável? Se ele
não quebrar agora, isso acontecerá em outro momento. Se não for você, outra pessoa o fará. Se
não for outra pessoa, uma das galinhas o quebrará! O Buddha diz para aceitarmos isso. Ele
penetrou na verdade dessas coisas, vendo que o copo já está quebrado. Quando você utilizá-lo,
deveria refletir que ele já está quebrado. Você compreende isso? O entendimento do Buddha foi
assim. Ele viu o copo quebrado dentro do que estava inteiro. Quando o momento dele chegar,
ele se quebrará. Desenvolva esse tipo de compreensão. Use o copo e cuide dele até o dia em que
ele escapará da sua mão… “Smash”… sem problema. Por que não há problema? Porque você
viu sua fragilidade antes de ele quebrar!
Mas normalmente as pessoas falam: “Adoro este copo; que ele nunca quebre”. Mais tarde, o
cachorro o quebra. “Vou matar esse maldito cachorro!” Você odeia o cachorro por ter quebrado
o seu copo. Se um de seus filhos o quebra, você o odiará também. Você fez uma represa sem
escoamento. A única coisa que a represa pode fazer é romper, certo? Quando você faz uma
represa você deve fazer o escoamento também. Quando a água sobe demais, ela pode vazar com
segurança. Quando ela fica cheia até a borda, você abre o escoamento. Você precisa ter uma
válvula de segurança como essa. Impermanência é a válvula de segurança dos Nobres. Se tiver
essa “válvula de segurança”, você ficará em paz.
De pé, caminhando, sentado, deitado, pratique constantemente, usando sati para vigiar e
proteger a mente. Isso é samādhi e sabedoria, que são a mesma coisa, mas com aspectos
diferentes.
Se realmente virmos a incerteza claramente, veremos aquilo que é certo. A incerteza é que as
coisas devem ser, inevitavelmente, dessa forma e não ao contrário. Você compreende?
Conhecendo apenas isso você pode conhecer o Buddha, você pode reverenciá-lo corretamente.
Enquanto não rejeitar o Buddha, você não sofrerá. Assim que fizer isso, você vivenciará o
sofrimento. Assim que você rejeita as reflexões sobre transitoriedade, imperfeição e ausência da
noção de propriedade, você começa a sofrer. Se puder praticar apenas isso, já é suficiente; o
sofrimento não surgirá ou, se surgir, você poderá controlá-lo facilmente e essa causa para
sofrimento não surgirá no futuro. Esse é o fim da nossa prática, no ponto onde o sofrimento não
surge. E por que isso acontece? Porque solucionamos sua causa, samudaya.
Por exemplo, se era para o copo quebrar, normalmente você sofreria. Sabemos que esse copo
será uma causa de sofrimento, então, livre-se da causa. Todos os dhammas surgem por uma
causa. Agora, se há sofrimento relacionado a esse copo aqui, devemos abandonar essa causa. Se
refletirmos antecipadamente de que esse copo já está quebrado, mesmo quando não está, a causa
acaba. Quando não há mais causa, aquele sofrimento deixa de existir, ele acaba. Isso é cessação.
Vocês não precisam ir além desse ponto, apenas isso é o suficiente. Contemplem isso nas suas
mentes. Basicamente, vocês todos devem ter os cinco preceitos [2] como fundação para o
comportamento. Não é necessário ir além e estudar o Tipitaka, apenas concentrem-se nos cinco
preceitos. No início, vocês cometerão erros. Quando perceberem, parem, voltem e estabeleçam-
se nos preceitos novamente. Talvez errarão novamente. Quando perceberem, restabeleçam-se
novamente.
Praticando assim, teu sati melhorará e se tornará mais consistente, como as gotas de água
caindo da chaleira. Se nós inclinarmos a chaleira apenas um pouco, as gotas caem devagar…
plop!… plop!… plop!… Se inclinarmos a chaleira um pouco mais, as gotas tornam-se mais
rápidas.. .plop, plop, plop! Se inclinarmos a chaleira totalmente, as gotas se transformam em
água fluindo. Onde os “plops” estão? Não estão em lugar nenhum, se transformaram numa
torrente.
Temos de falar no Dhamma assim, usando comparações, porque o Dhamma não tem forma. É
quadrado ou redondo? Vocês não podem dizer. A única maneira de falar sobre isso é usando
comparações. Não pensem que o Dhamma está longe de vocês. Está exatamente aí, com vocês,
por todos os lados. Observem… num momento feliz, no outro triste, no outro raivoso… é tudo o
Dhamma. Observem isso e compreendam. Seja o que for que esteja causando sofrimento, vocês
devem remediar. Se o sofrimento continua lá, olhem de outra maneira, vocês ainda não estão
vendo claramente. Se puderem ver claramente, vocês não sofrerão, porque a causa do
sofrimento não estará mais lá. Se o sofrimento persistir, se vocês ainda têm de suportá-lo, então
não estão no caminho certo. Enquanto estiverem presos, enquanto estiverem sofrendo muito,
exatamente aí vocês estarão errados. Enquanto estiverem felizes, flutuando nas nuvens…
errados novamente!
Se praticarem assim, então vocês terão sati todo o tempo, em todas as posturas. Com sati,
recordação e sampajañña, autoconsciência, vocês entenderão felicidade e sofrimento, certo e
errado. Conhecendo essas coisas, vocês saberão como lidar com elas.
Eu ensino meditação assim. Se é o momento de sentar-se em meditação, sentem-se, não é
errado. Vocês também devem praticar isso. Mas meditação não é apenas sentar-se. Vocês
devem permitir que suas mentes experimentem as coisas totalmente, permitindo que elas fluam,
e considerar sua natureza. Como vocês devem considerá-las? Vejam-nas como transitórias,
imperfeitas, e sem natureza própria. Todas são incertas. “Isto é tão bonito, eu realmente preciso
ter isto” . Isso não é uma certeza. “Eu não gosto disto mesmo”, não é uma certeza. Isso é
verdade. Sem nenhuma dúvida. Apenas tentem tomar as coisas a sério…” Eu vou tomar isso
como uma certeza”…Vocês já saíram do caminho. Não façam isso. Não importa o quanto vocês
gostem de algo, vocês devem refletir que aquilo é incerto.
Alguns tipos de comidas parecem tão deliciosas, mas ainda assim vocês devem refletir que
não é uma certeza. Pode parecer uma certeza, é tão deliciosa, mais ainda assim vocês devem
dizer a si mesmos: “Não é uma certeza”. Se quiserem testar o quanto é uma certeza ou não,
tentem comer a sua comida favorita todos os dias. Todos os dias. Talvez vocês irão reclamar:
“Isto não parece mais tão delicioso”. Talvez vocês irão pensar: “Na verdade, eu prefiro aquele
tipo de comida”. Isso também não é uma certeza. Vocês devem permitir que as coisas fluam,
como a inspiração e a expiração. É necessário haver ambas, a inspiração e a expiração, a
respiração depende dessa mudança. Tudo depende de mudanças desse tipo.
Essas coisas nos acompanham, em qualquer outro lugar. Se não temos mais dúvidas quando
sentados, em pé, andando ou deitado, nós estaremos em paz. Samādhi não é apenas ficar
sentado. Algumas pessoas sentam até cair em estado de estupor. Elas poderiam muito bem estar
mortas, elas não conseguem discernir norte do sul. Não leve isso ao extremo. Se você se sentir
sonolento enquanto caminha, mude sua postura. Desenvolva sabedoria. Se você está realmente
cansado, então descanse. Tão logo você acorde, continue com a prática, não se deixe a deriva
em estado de estupor. Você deve praticar assim. Tenha sensibilidade, sabedoria, prudência.
Inicie a prática pela sua própria mente e corpo, vendo-os como impermanentes. Todo o resto é
o mesmo. Mantenha isso em mente quando você pensar que a comida é muito deliciosa… você
deve dizer para você mesmo: “Não é uma coisa absoluta!”. Você tem que golpear isso primeiro.
Porém, normalmente, isso golpeia você todo o tempo, não é? Se você não gosta de nada, você
apenas sofre por isso. Assim é como as coisas golpeiam a gente. “Se ela gosta de mim, eu gosto
dela”, eles nos golpeiam novamente. Você nunca acerta! Você tem que ver isso assim. Sempre
que você gostar de alguma coisa apenas diga para si: “Isso não é uma coisa absoluta”. Você tem
que ir contra a corrente um pouco a fim de, realmente, ver o Dhamma.
Pratique em todas as posturas. Sentado, em pé, caminhando, deitado… Você pode
experimentar raiva em qualquer postura, certo? Você pode ficar com raiva enquanto caminha,
enquanto senta, enquanto se deita. Você pode experimentar desejo em qualquer postura. Então,
nossa prática deve estender-se para todas as posturas; em pé, caminhando, sentado e deitado.
Isso deve ser consistente. Não crie apenas um show de aparências, realmente faça isso.
Enquanto estiver sentado em meditação, algum incidente pode surgir. Antes que este seja
resolvido outro pode ocorrer imediatamente após. Sempre que essas coisas surgirem, apenas
diga para si: “Não tenho certeza, não tenho certeza”. Apenas golpeie isso antes que isso golpeie
você.
Agora, este é o ponto importante. Se você sabe que todas as coisas são impermanentes, todo o
seu pensamento irá, gradualmente, descontrair. Quando você refletir sobre a incerteza de tudo o
que passa, você verá que todas as coisas seguem o mesmo caminho. Sempre que algo surge,
tudo o que você precisa dizer é: “Ó, mais outra!”.
Você já viu água corrente? Você já viu água parada? Se sua mente está em paz, ela será
apenas como a água parada, corrente. Você já viu água parada, corrente? Não! Você viu apenas
água corrente e água parada, não? Porém, você nunca viu água parada, corrente. Bem ali,
exatamente onde o seu pensamento não pode levá-lo, muito embora seja pacífico, você deve
desenvolver sabedoria. Sua mente deve ficar como água corrente, e mesmo assim estar parada.
É quase como se ela fosse parada, e mesmo assim fluísse. Então, eu chamo isso de “água
parada, corrente”. A sabedoria pode surgir aqui.
Notas
[1] Palestra dada em Wat Tham Saeng Phet, durante o retiro das chuvas de 1981.
[2] O código moral básico dos buddhistas: refrear-se de matar, roubar, má conduta sexual,
mentir e embeber-se de intoxicantes.

Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda


com a permissão dos detentores do copyright
© 2014 Edições Nalanda

Nota: “Os Ensinamentos de Ajahn Chah” consiste de uma coletânea de ensinamentos


dados por um dos mais importantes mestres da tradição das florestas da linhagem
Theravada da Tailândia.

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