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~ Ajahn Chah ~

[1] Olhe para seu medo… Um dia, quando a noite se aproximava, nada mais havia… Se
eu tentasse pensar comigo mesmo, eu nunca iria para lá, então peguei um pa-kow e
simplesmente fui.

“Se está na hora disso morrer, então deixe morrer. Se minha mente vai ser tão teimosa e
estúpida, então a deixe morrer” … foi assim que eu pensei comigo mesmo.
Verdadeiramente no meu coração, eu realmente não queria ir, mas me forcei a ir.
Quando se trata de coisas assim, se você esperar até que tudo esteja perfeito, você vai
acabar nunca indo. Quando é que enfim você irá treinar? Então eu apenas fui.

Eu nunca tinha estado em um cemitério antes. Quando eu cheguei lá, as palavras não
podem descrever como eu me senti. O pa-kow quis acampar bem ao meu lado, mas eu
não queria assim. Eu o fiz ficar bem longe. Na verdade eu queria que ele ficasse por
perto para me fazer companhia, mas não seria assim. Eu fiz com que ele se afastasse,
caso contrário, eu teria contado com ele para me ajudar.

“Se haverá muito medo depois, então, deixe-o morrer esta noite”

Eu estava com medo, mas me atrevi. Não é que eu não temesse, mas eu tinha coragem.
No final, você terá que morrer de qualquer jeito.

Bem, assim que foi escurecendo eu tive a minha chance, eles vieram carregando um
cadáver. Que sorte a minha! Eu não podia nem sentir os meus pés tocarem o chão, eu
queria muito sair de lá. Eles queriam que eu entoasse alguns cânticos fúnebres, mas eu
não queria me envolver, eu apenas parti. Poucos minutos depois de terem ido embora,
eu voltei e descobri que eles tinham enterrado o cadáver próximo a mim, e fizeram uma
cama para mim com o bambu que usaram para carregá-lo.

Então o que eu deveria fazer agora? Não é que o vilarejo fosse perto, ele ficava uns bons
dois ou três quilômetros de distância.

“Bem, se eu vou morrer, eu vou morrer”… Se você nunca se atreveu a fazê-lo, você
nunca saberá o que é. É realmente uma experiência.

Como ficou mais e mais escuro, eu me perguntava para onde poderia correr no meio
daquele cemitério.

“Oh, deixe morrer. Nascemos nesta vida só para morrer, de qualquer maneira”.

Assim que o sol se pôs, a noite me disse para entrar em meu glot [2]. Eu não queria
meditar andando, eu queria tão somente chegar no meu mosquiteiro. Sempre que eu
tentava caminhar em direção ao túmulo era como se algo às minhas costas estivesse me
puxando para trás, me impedindo de caminhar. Era como se meus sentimentos de medo
e coragem estivessem num cabo de guerra comigo. Mas eu o fiz. Este é o modo em que
você deve treinar a si mesmo.

Quando estava escuro eu entrava em meu mosquiteiro. Parecia como se tivesse uma
parede de sete camadas em torno de mim. Ver a minha fiel tigela de alimentos ao meu
lado era como ver um velho amigo. Mesmo uma tigela pode, algumas vezes, ser um
amigo! Sua presença ao meu lado era reconfortante. Eu tinha uma tigela no lugar de um
amigo, pelo menos.

Eu me sentei sob meu mosquiteiro observando o corpo durante toda a noite. Eu não me
deitei ou mesmo cochilei, eu apenas me sentei silenciosamente. Eu não poderia estar
sonolento mesmo se eu quisesse, eu estava tão assustado. Sim, eu estava apavorado, e
ainda assim consegui. Sentei-me através da noite.

Agora, quem teria coragem de praticar isso? Experimente e veja. Quando se trata de
experiências como essas, quem se atreveria a ir e ficar num cemitério? Se você
realmente não fizer isso, você não obterá os resultados, você realmente não terá
praticado. Dessa vez eu realmente pratiquei.

Quando o dia clareou eu senti: “Oh! Eu sobrevivi!” Eu estava tão feliz, eu só queria
aproveitar o dia, não havia escuridão alguma. Eu queria terminar com a noite e deixar
apenas a luz do dia. Eu me senti tão bem, eu tinha sobrevivido. Pensei: “Oh, não há
nada, é apenas meu próprio medo, isso é tudo”.

Depois da ronda em busca de doações e de comer, me senti bem, a luz do sol apareceu,
fazendo com que eu me sentisse aquecido e confortável. Descansei e caminhei um
pouco. E pensei: “Essa noite eu deveria fazer uma meditação boa e tranquila porque isso
já aconteceu toda a noite anterior. Provavelmente, não há nada mais que isso”.

Então, mais tarde, você não sabia disso? E veio outro, um grande dessa vez [3]. Eles
trouxeram o cadáver e o cremaram bem na frente do meu ponto, exatamente na frente da
minha vista. Foi pior do que a última noite!

“Bem, está bem”, eu pensei, “trazer este cadáver para queimar aqui vai ajudar minha
prática”.

Mas ainda assim eu não iria fazer quaisquer ritos para eles, eu esperei que eles saíssem
antes de dar uma olhada.

Queimando tal corpo para que eu me sente e assista por toda a noite, eu não posso te
dizer como foi. As palavras não podem descrever. Nada que eu dissesse poderia
transmitir o medo que sentia. Na calada da noite, lembre-se. O fogo do cadáver ardente
piscava em vermelho e verde e as chamas tamborilavam suavemente. Eu queria fazer
meditação andando diante do corpo, mas dificilmente poderia fazer. Eventualmente, eu
me recolhi ao meu mosquiteiro. O mau cheiro da carne queimada permaneceu durante
toda a noite.

E isto foi antes de as coisas começarem realmente a acontecer… Enquanto as chamas


cintilavam suavemente, virei as costas ao fogo.

Esqueci-me do sono, nem conseguia pensar nisso, os meus olhos estavam rígidos de
medo. E não havia ninguém a quem recorrer, havia apenas eu. Tinha de confiar em
mim. Não conseguia pensar em nenhum lugar para onde ir, não havia nenhum lugar
para onde correr naquela noite escura como breu.
“Bem, eu me sentarei e morrerei aqui. Não me moverei deste ponto”.

Aqui, falando da mente ordinária, ela gostaria de fazer isso? Ela os levaria para uma tal
situação? Se vocês tentassem raciocinar, vocês nunca iriam. Quem gostaria de fazer
uma tal coisa? Se vocês não tivessem uma fé sólida nos ensinamentos do Buddha, vocês
nunca fariam isso.

Agora, por volta das 10 horas da noite, eu estava sentado de costas para o fogo. Eu não
sei o que era, mas chegou um som embaralhado do fogo atrás de mim. O caixão teria
apenas desabado? Ou talvez um cão estivesse pegando o cadáver? Mas não, soou mais
como um búfalo caminhando firmemente ao redor.

“Oh, não importa ….”

Mas então, ele começou a caminhar em minha direção, assim como uma pessoa!

Caminhou atrás de mim, com passos pesados como os de um búfalo, no entanto, não…
As folhas restolhavam debaixo dos pés à medida que se aproximava para a frente. Bem,
eu apenas podia me preparar para o pior, para onde fugir? Contudo, não se aproximou
realmente de mim, apenas fez círculos à frente e depois desapareceu na direção do pa-
kow. Depois, tudo ficou em silêncio. Não sei o que era, mas o meu medo pôs-me a
pensar em muitas possibilidades.

Deve ter sido cerca de meia hora mais tarde, eu acho, quando os passos começaram a
voltar vindos da direção do pa-kow. Exatamente como uma pessoa! Vinha para mim,
desta vez, como se fosse me passar por cima! Fechei os olhos e me recusei a abri-los.

“Morrerei com meus olhos fechados”.

Ele chegou cada vez mais perto até que parou à minha frente e apenas ficou imóvel. Eu
me senti como se ele estivesse acenando as mãos queimadas num vai e vem, à frente
dos meus olhos fechados. Oh! Era realmente isso! Eu joguei tudo fora, esqueci tudo
sobre Buddha, Dhamma e Sangha. Eu esqueci todo o resto, havia apenas o medo em
mim, enchendo-me completamente até a borda. Meus pensamentos não podiam ir a
nenhum outro lugar, havia apenas medo. Desde o dia em que nasci, eu nunca tinha
experimentado tanto medo. Buddha e Dhamma tinham desaparecido, eu não sei para
onde. Havia apenas medo brotando no meu peito, até ele se sentir esticado como uma
pele de tambor.

“Bom, vou deixar quieto. Não há mais nada que se possa fazer.”

Sentei como se eu não estivesse tocando o chão e simplesmente notei o que estava
acontecendo. O medo era tamanho que me tomou todo, como uma jarra completamente
cheia de água. Se você colocar agua até que a jarra esteja completamente cheia e depois
continuar a colocar ainda mais, a jarra irá transbordar. Da mesma forma, o medo se
acumulou tanto dentro de mim que começou a transbordar.

“Afinal, de que tenho tanto medo?”, perguntou-me uma voz interior.

“Tenho medo da morte”, outra voz respondeu.


“E, então, onde está essa coisa chamada de ‘morte’? Por quê todo o pânico? Olha onde a
morte reside. Onde está ela?”

“Bem, a morte está em mim!”

“Se a morte está em você, então para onde você pode correr? Se você correr para longe,
você morrerá; se você ficar aqui, você morrerá. Onde quer que for ela estará com você
porque habita em você e não há escapatória. Não importa se você a teme ou não, você
morrerá de qualquer maneira. Não há lugar algum para onde fugir da morte”.

Assim que eu havia pensado isso, a minha percepção parecia mudar. Todo o medo
desapareceu completamente, com a facilidade de virar sua própria mão. Foi realmente
incrível. Tanto medo e, ainda assim, ele pode desaparecer desse jeito! O não-medo
surgiu em seu lugar. Agora minha mente se elevou mais e mais até que me senti como
se estivesse nas nuvens.

Tão logo havia conquistado o medo, a chuva começou a cair. Eu não sei que tipo de
chuva era, o vento era tão forte. Mas eu não tinha medo de morrer agora. Eu não estava
com medo de que os galhos das árvores pudessem desabar sobre mim. Não dei a menor
atenção. A chuva trovejou como uma torrente de verão, realmente pesada. No momento
em que a chuva havia parado tudo estava encharcado.

Sentei-me imóvel.

Então, o que eu faço agora, encharcado como estava? Chorei! As lágrimas escorriam
pelo meu rosto. Chorava enquanto pensei comigo mesmo: “Por que estou aqui sentado
como algum tipo de órfão ou criança abandonada, sentado, encharcado na chuva como
um homem que não possui nada, como um exilado? ”

E, então, eu pensei além: “Todas essas pessoas sentadas no conforto de suas casas neste
momento, provavelmente nem sequer suspeitam que exista um monge, encharcando na
chuva durante toda a noite assim. Qual é o significado disso tudo?” Pensando dessa
maneira comecei a me sentir com tanta pena de mim mesmo que as lágrimas vieram
jorrando.

“Não são coisas boas afinal, estas lágrimas, deixe que elas fluam diretamente para fora
até que todas elas tenham ido embora.”

Era assim que eu praticava.

Agora, eu não sei como posso descrever as coisas que se seguiram. Eu me sentava…
sentava e ouvia. Depois de dominar os meus sentimentos, eu apenas sentava e assistia a
todo tipo de coisas que surgiam em mim, tantas coisas possíveis de notar, mas
impossíveis de descrever. E pensava nas palavras do Buddha… paccattam veditabbo
viññūhi [4] – “o sábio vai saber por si mesmo”.

Que eu tinha sofrido tanto e me sentado numa chuva dessas… quem estava lá para
experimentá-la comigo? Só eu poderia saber como ela era. Havia tanto medo e, então, o
medo desaparecera. Quem mais poderia testemunhar isso? As pessoas em suas casas na
cidade não podiam saber como era, somente eu podia. Foi uma experiência pessoal.
Mesmo se eu fosse contar aos outros eles não teriam como saber de fato, era algo que
cada indivíduo precisaria experimentar por si mesmo. Quanto mais eu contemplava
mais claro ficava. Tornei-me mais e mais forte, minha convicção tornou-se cada vez
mais firme, até o dia amanhecer.

Quando abri meus olhos ao amanhecer, tudo estava amarelo. Fiquei com vontade de
urinar durante a noite, mas a vontade eventualmente passou. Quando levantei da
almofada pela manhã, tudo o que eu olhava estava amarelo, igualzinho a luz do sol bem
cedo em alguns dias. Quando fui urinar, havia sangue na urina!

“Hein? Meu intestino está rompido ou algo assim?” Eu fiquei com medo… “Talvez
esteja realmente rompido”. “Bem, e daí? Se estiver rompido, a quem eu vou culpar?”,
uma voz me disse imediatamente. “Se estiver rompido, está rompido, se eu morrer,
morrerei. Eu fiquei apenas sentado lá, eu não estava fazendo nada errado. “Se vai
queimar, deixe queimar”, a voz disse.

Minha mente estava como que a discutir ou brigar consigo mesma. Uma voz vinha de
um lado, dizendo: “Ei, isto é perigoso!” Outra voz vinha enfrentá-la, desafiá-la e superá-
la.

Minha urina estava manchada de sangue.

“Hmm. Onde é que eu vou encontrar um remédio?”

“Não me vou incomodar com essas coisas. De qualquer modo, um monge não pode
cortar plantas para medicamentos. Se eu morrer, morro, e daí? Que mais há a fazer? Se
eu morrer enquanto pratico assim, então estou pronto. Se eu morresse fazendo algo ruim
isso não seria bom, mas para morrer praticando assim, estou preparado”.

Não sigam seus humores. Treinem. A prática envolve por sua própria vida em questão.
Vocês devem ter chorado ao menos duas ou três vezes. Tudo bem, essa é a prática. Se
vocês estão sonolentos e querem se deitar, então não se permitam dormir. Façam a
sonolência ir embora antes de se deitarem. Mas olhem para vocês todos, vocês não
sabem como praticar.

Às vezes, quando voltamos da ronda do alimento e contemplamos a comida antes de


comer, não conseguimos sossegar, a nossa mente é como um cão raivoso. A saliva
extravasa, temos tanta fome. Às vezes, nem nos damos ao trabalho de contemplar,
atacamos logo a comida. Isso é um desastre. Se a mente não se acalmar e se não é
paciente, então temos de afastar a tigela e não comer. Devemos praticar, fazer este
exercício, isso é prática. Não devemos só continuar a seguir a mente. Devemos afastar a
tigela, levantarmo-nos e sair, não nos devemos permitir comer. Se a mente quer tanto
comer e atua de maneira tão teimosa, então não a deixemos comer. A saliva irá secar. Se
as impurezas souberem que não vão conseguir o que comer, elas vão ficar com medo.
Elas não se atreverão a incomodá-los no dia seguinte, elas vão ter medo de não
conseguir o que comer. Experimentem isso se vocês não acreditam em mim.

As pessoas não confiam na prática, elas não se atrevem a realmente levá-la a cabo.
Temem a possibilidade de passar fome, sentem medo achando que vão morrer. Se vocês
não experimentarem não vão saber do que se trata. A maioria de nós não se atreve a
fazê-lo, não se atreve a experimentar, temos medo.

Quando se trata de comer e coisas afins, eu sofri com elas (as impurezas) já por um
longo tempo, então, eu sei o que são. E isso também é apenas uma coisa pequena.
Portanto, essa prática não é algo que se pode estudar facilmente.

Considerem o seguinte: qual é a coisa mais importante de todas? Não há nada, apenas
morte. A morte é a coisa mais importante no mundo. Reflitam, pratiquem,
investiguem… Se vocês não tiverem roupa, vocês não morrerão. Se vocês não tiverem
semente de bétel [*] para mascar, nem cigarros para fumar, ainda assim vocês não
morrerão. Mas se vocês não tiverem arroz ou água, então vocês morrerão.

[*] semente de bétel é o fruto de uma palmeira, usado na Ásia como estimulante ou
analgésico. Ref: https://plantasenteogenas.org/threads/areca-catechu-betel-nut.58/

Eu vejo apenas duas coisas como essenciais neste mundo. Vocês precisam de arroz e
água para nutrir o corpo. Então, eu não estava interessado em nada mais, eu ficava
satisfeito com qualquer coisa que me fosse oferecido. Enquanto eu tivesse arroz e água,
isso já era o suficiente para a prática; eu ficava satisfeito.

Isso é suficiente para vocês? Todas as outras coisas extras, se vocês as tiverem ou não,
não importa. As únicas coisas realmente importantes são arroz e água.

“Se eu viver assim, será que irei sobreviver?”, perguntei-me. Há que chegue para toda a
noite. Provavelmente conseguirei arroz na próxima “esmola por alimentos” nos
arredores da cidade, uma porção em cada casa. Costuma haver água disponível assim
terei o suficiente…” Eu não almejava ser particularmente rico.

Em relação a prática, certo e errado normalmente coexistem. Você tem que ousar, ousar
praticar. Se nunca esteve em um cemitério você deveria se treinar a ir. Se você não pode
ir a noite, então vá durante o dia. E, então, se treine para ir cada vez mais tarde até que
você consiga ir ao entardecer e ficar lá. Então você perceberá os efeitos da prática e
compreenderá.

Essa mente foi enganada agora por sabe-se lá quantas vidas. O que quer que não
gostemos ou amemos nós queremos evitar, nós simplesmente fazemos a vontade dos
nossos medos. E então, dizemos que estamos praticando. Isso não pode ser chamado de
“prática”. Se é prática verdadeira, você até arriscará sua vida. Se você realmente se
convenceu de praticar, por que se ocupar com preocupações mesquinhas? “Tenho tão
pouco e você tem tanto”, “Você discutiu comigo, então estou discutindo com você…”.
Eu não tive nenhum desses pensamentos porque não estava procurando por essas coisas.
O que os outros fizeram foi um assunto deles. Indo para outros mosteiros, não me
envolvi em tais coisas. Se os outros praticavam muito ou pouco não me interessava, eu
apenas cuidei do meu próprio assunto. E assim eu ousei praticar, e a prática deu origem
a sabedoria e insight.

Se a sua prática realmente acerta o ponto, então você realmente pratica. Dia ou noite
você pratica. À noite, quando está calmo, eu sento em meditação, em seguida, vou
caminhar, alternando o ir e vir dessa forma, pelo menos, duas ou três vezes por noite.
Andar, sentar-se, andar um pouco mais… Eu não estava entediado, eu estava deleitado.

Às vezes, chovia suavemente, e eu pensava no tempo em que trabalhava nas plantações


de arroz. As minhas calças ainda estavam molhadas desde o dia anterior, mas eu tinha
que me levantar antes do amanhecer e vesti-las novamente. A seguir, tinha que ir lá para
baixo da casa para tirar o búfalo do seu lugar. Tudo o que eu podia ver do búfalo estava
coberto de excremento de búfalo. Naquele tempo, o rabo do búfalo sibilaria de lá para
cá e ainda por cima me respingaria com excremento. Meus pés estariam doloridos com
frieiras e eu andaria, pensando: “Por que a vida é tão triste?” E agora, aqui, eu estava
meditando andando… o que era um pouquinho de chuva para mim? Pensando dessa
maneira, eu encorajava a mim mesmo na prática.

Se a prática tivesse entrado no fluxo, então não haveria nada comparável a ela. Não há
sofrimento como aquele de um cultivador do Dhamma, e também não há felicidade
como a dele. Não há zelo comparável com aquele do cultivador e também não há
preguiça como a dele. Praticantes do Dhamma são superiores. É por isso que digo: se
vocês realmente praticarem, trata-se de algo muito importante.

Mas a maior parte de nós só fala sobre a prática, sem nunca a ter feito ou atingido. A
nossa prática é como o homem cujo telhado tem um buraco e pinga de um lado então
ele dorme no outro lado da casa. Quando o sol bate naquele lado da casa, ele se vira
para o outro lado, pensando o tempo todo: “Quando terei eu uma casa decente como os
outros?”. Se todo o telhado pinga, ele apenas se levanta e parte. Isso não é maneira de
fazer as coisas, mas a maior parte das pessoas é assim.

Essa nossa mente, estas impurezas… Se você segui-las elas vão causar problemas.
Quanto mais segui-las mais a prática degenera. Com a prática real, às vezes você
mesmo se surpreende com o seu zelo. Se outras pessoas praticam ou não, não há
qualquer interesse, basta manter a sua própria prática de forma consistente. O que quer
que venha ou vá não importa, basta manter a prática. Você deve observar a si mesmo
antes que isso possa ser chamado de “prática”. Quando você realmente pratica não há
conflitos em sua mente, só há Dhamma.

Onde quer que vocês estejam inaptos, onde quer que vocês estejam ainda “em falta”, é
exatamente onde vocês devem se esmerar. Se vocês ainda não a romperam, não
desistam. Ao terminarem uma coisa, vocês ficarão empacados em outra; assim,
persistam até que a quebrem, não parem. Não se contentem enquanto não esteja
terminado. Ponham todas as suas atenções naquele ponto. Enquanto estiverem sentados,
deitados ou andando, olhem exatamente para lá.

É como um agricultor que não terminou o trabalho no campo. Em cada ano, ele planta
arroz mas este ano ele não terminou a tarefa e, então, a sua mente fica presa nisso, não
podendo descansar em paz. O seu trabalho está inacabado e mesmo quando está com
amigos, ele não consegue relaxar, ficando todo o tempo inconsolável pelo seu trabalho
inacabado. Ou como uma mãe que deixa o seu filho na casa e vai alimentar os animais:
ela traz, sempre, o seu bebê na mente, para que não caia lá dentro da casa. Mesmo que
realize outras atividades, o seu bebê estará sempre nos seus pensamentos.
É o mesmo para nós e nossa prática – nunca esquecemos! Mesmo que nos ocupemos
com outras coisas, nossa prática nunca está distante de nossos pensamentos, ela está
constantemente conosco, dia e noite. Tem que ser assim se você pretende obter algum
progresso.

No começo você tem que contar com um professor para instruir e aconselhá-lo. Quando
você compreender, pratique. Quando o professor tiver instruído, você segue suas
instruções. Se você compreender a prática, o professor já não será necessário. Você
mesmo faz todo o trabalho. Quando a negligencia ou outras qualidades prejudiciais
despontarem, você se autodisciplina. Você faz a prática. A mente sabe, ela é a
testemunha. A mente sabe se você ainda está muito ou pouco iludido. Naquilo em que
você ainda se encontra imperfeito tente se aperfeiçoar. Aplique-se.

A prática é assim. É quase como estar louco, ou você pode até dizer que é louco.
Quando você realmente pratica, você é louco, você “flipa”. Você distorceu a percepção
e então ajusta a sua percepção. Se você não a ajustar, será tão problemático e tão
miserável quanto antes.

Então, há muito sofrimento na prática, mas se você não conhece seu próprio sofrimento,
você não entenderá a Nobre Verdade do sofrimento. Para entender o sofrimento, para
matá-lo, primeiro você deve encontrá-lo. Se você quiser atirar em um pássaro, mas não
sair para encontrá-lo, como você vai matá-lo? Sofrimento, sofrimento … o Buddha
ensinou sobre o sofrimento: o sofrimento do nascimento, o sofrimento da velhice … se
você não quiser experienciar o sofrimento, você não verá o sofrimento. Se você não vê
sofrimento, você não entenderá o sofrimento. Se você não entende o sofrimento, não
será capaz de se livrar do sofrimento.

Agora, as pessoas não querem ver o sofrimento, elas não querem ter a experiência do
sofrimento. Se elas sofrem aqui, elas correm para lá. Você entende? Elas estão
simplesmente arrastando seu sofrimento com elas, sem nunca destruí-lo. Elas não
contemplam nem investigam o sofrimento. Se perceberem o sofrimento aqui, elas
correm para lá; se ele surgir por lá, elas correm de volta para cá. Elas tentam fugir do
sofrimento fisicamente. Enquanto você ainda for ignorante, onde quer que for,
encontrará sofrimento. Mesmo se você embarcasse em um avião para se livrar do
sofrimento, ele embarcaria no avião com você. Se você mergulhasse em águas
profundas, ele mergulharia junto com você, porque o sofrimento está dentro de nós.
Mas não sabemos disso. Se ele está dentro de nós, para onde podemos correr para
escapar dele?

Pessoas sofrem em um lugar, então elas vão para outro lugar. Quando o sofrimento
surge, elas fogem novamente. Pensam que estão fugindo do sofrimento, mas não estão,
o sofrimento está com elas. Elas carregam o sofrimento por aí sem saber disso. Se não
conhecemos a causa do sofrimento, não podemos saber da cessação do sofrimento, não
há como fugir.

Você deve olhar para isso atentamente até que esteja além das dúvidas. Você deve ousar
praticar. Não se esquive, seja em grupo ou sozinho. Se outros são preguiçosos, não
importa. Quem quer que faça uma grande quantidade de meditação andando ou outra
prática… eu garanto resultados. Se você realmente pratica de forma consistente, se
outros vêm ou vão ou o que for, um retiro das chuvas é suficiente. Faça isso como se eu
estivesse lhe falando aqui. Ouça as palavras do professor, não pergunte, não seja
teimoso. O que quer que ele lhe diga para fazer, siga adiante e faça. Você não precisa
ser tímido na prática, certamente o conhecimento surgirá disso.

Prática é também patipadā. O que é patipadā? Pratique equilibrada e consistentemente.


Não pratique como o Velho Reverendo Peh. Em um Retiro das Chuvas ele se
determinou a parar de falar. Ele parou de falar, certo, mas então ele começou a escrever
notas… “Amanhã, por favor, prepare-me algum arroz”. Ele queria comer arroz torrado!
Ele parou de falar, mas terminou escrevendo tantas notas que ele estava mesmo mais
disperso que antes. Num minuto ele escreveria uma coisa, no próximo uma outra, que
farsa!

Eu não sei porque ele se importou a se determinar a não falar. Ele não sabia que prática
era essa.

Na verdade, nossa prática é estar contente com pouco, apenas ser natural. Não se
preocupe se você se sente preguiçoso ou diligente. Nem mesmo diga “eu sou diligente”
ou “eu sou preguiçoso”. A maior parte das pessoas apenas pratica quando se sente
diligente; se elas se sentem preguiçosas, não se importam. As pessoas normalmente são
desse modo. Mas monges não devem pensar assim. Se você está diligente, você pratica,
se você está preguiçoso, você também pratica. Não se chateie com outras coisas, ignore-
as, ponha-as de lado, treine a si mesmo. Pratique consistentemente, se dia ou noite,
neste ano e no próximo, a qualquer hora… não preste atenção aos pensamentos de
diligência ou preguiça, não se preocupe se está quente ou frio, apenas faça. Isso é
chamado sammā patipadā – prática correta.

Algumas pessoas realmente se aplicam na prática por seis ou sete dias, então, quando
elas não obtém os resultados que querem, desistem e revertem completamente,
entregam-se a tagalerice, socializando e qualquer coisa. Então, elas se lembram da
prática e vão nisso por até outros seis ou sete dias, então desistem outra vez…. é como o
jeito que algumas pessoas trabalham. Primeiro elas se jogam nisso… então, quando elas
param, elas nem mesmo se incomodam de pegar suas ferramentas, elas apenas saem e
deixam para lá. Mais tarde, quando a sujeira endureceu toda, elas se lembram de seu
trabalho e fazem um pouco mais, apenas pra deixá-lo de novo.

Fazendo as coisas desta maneira você jamais terá um jardim ou um arrozal decente.
Com nossa prática acontece o mesmo. Se você acha que patipadā não é importante,
você não chegará a lugar nenhum com a prática. Sammā patipadā é
inquestionavelmente importante. Pratique-a constantemente. Não dê ouvidos ao seu
humor. E daí se seu humor está bom ou ruim? O Buddha não se importava com essas
coisas. Ele havia experimentado todas as coisas boas e as coisas ruins, as coisas certas e
as coisas erradas. Essa era sua prática. Selecionar somente o que você gosta e descartar
tudo o que você não gosta não é prática, é desastre. Onde quer que vá você não se
sentirá satisfeito, onde quer que você fique haverá sofrimento.

Praticar dessa maneira é como os brāhmaṇas fazendo seus sacrifícios. Por que fazem
isso? Porque querem algo em troca. Alguns de nós agimos assim. Por que praticamos?
Porque buscamos renascimento, um outro estado de ser, queremos alcançar algo. Se não
conseguimos o que queremos, então não queremos praticar, exatamente como os
brāhmaṇas fazendo seus sacrifícios. Eles o fazem por causa do desejo.
O Buddha não ensinou assim. O cultivo da prática é para o abandono, deixar passar,
parar, desenraizar. Você não o faz para renascer em qualquer estado particular.

Certa vez houve um thera que inicialmente se tornou monge na seita Mahānikai. Ele
achou, porém, que ela não era estrita o suficiente, e tomou a ordenação Dhammayuttika
[5]. E começou a praticar. Algumas vezes ele jejuava por quinze dias, então comia, e
comia apenas folhas e grama. Ele pensava que comer animais era um mau karma, que
então era melhor comer folhas e grama.

Depois de um tempo… “Hmm. Ser um monge já não é tão bom assim, não é prático.
Não é fácil manter a prática vegetariana. Talvez seja melhor eu abandonar a vida
monástica e me tornar um pa-kow”. Pensando assim, ele se secularizou e se tornou um
pa-kow, coletando folhas e vegetais e escavando raízes e tubérculos. Passou um tempo
vivendo assim até chegar um ponto em que não sabia mais o que fazer. Ele desistiu de
tudo. Desistiu de ser um monge, desistiu de ser um pa-kow, desistiu de tudo. Não sei o
que ele está fazendo hoje. Ele pode estar morto, não sei. Tudo porque ele não conseguiu
encontrar nada que se adequasse à sua mente. Ele não se deu conta de que estava apenas
sendo conduzido por impurezas. As impurezas o governavam sem que ele soubesse.

“Por acaso o Buddha deixou a vida monástica e se tornou um pa-kow? Como o Buddha
praticava? O que ele fazia?” Ele não considerou tais questões. Por acaso o Buddha
comia folhas e grama como uma vaca? É claro, se você quiser se alimentar assim, vá em
frente, se isso é tudo que você pode fazer, mas não ande por aí criticando os outros. Seja
qual for o padrão de prática que você achar adequado, então persevere nele. “Não
escave nem entalhe demais ou você não terá um cabo decente” [6]. Você ficará sem
nada e, no final, simplesmente desistirá.

Algumas pessoas são assim. Quando se trata de meditação andando elas realmente o
fazem por quinze dias ou algo assim. Elas nem se incomodam em comer, só caminham.
Então, quando terminam isso elas se deitam e dormem. Elas não se importam em
considerar cuidadosamente antes de começarem suas práticas. No final nada lhes
agrada. Ser um monge não lhes agrada. Ser um cidadão comum não lhes agrada. Então
acabam sem nada.

Pessoas assim não conhecem a prática, não olham para as razões de praticar. Pense em
para quê você está praticando. Eles ensinam esta prática para jogá-la fora. A mente quer
amar esta pessoa e odiar aquela pessoa… essas coisas podem surgir, mas não as levem a
sério. Então, para quê estamos praticando? Simplesmente para que possamos largar
essas coisas. Mesmo que você alcance a paz, jogue fora a paz. Se o conhecimento
surgir, jogue fora o conhecimento. Se você sabe, então, você sabe, mas se você tomar
esse entendimento como seu, então você acha que sabe algo. Então, você acha que é
melhor do que outros. Depois de um tempo, você não consegue viver em nenhum lugar,
qualquer que seja o lugar onde você more problemas surgem. Se você praticar
erroneamente, é como se você não tivesse praticado nada.

Pratique de acordo com sua capacidade. Você dorme muito? Então tente ir contra a
corrente. Você come muito? Tente comer menos. Pratique tanto quanto você precisar,
usando sīla, samādhi e paññā como base. Então introduza as práticas de dhutanga
também. Essas práticas dhutanga [7] servem para desenraizar as impurezas. Você pode
achar que as práticas básicas ainda não são suficientes para desenraizar as impurezas,
então você terá de incorporar também as práticas de dhutanga.

Tais práticas dhutanga são realmente úteis. Algumas pessoas não podem matar as
impurezas com sīla e samādhi básicos, elas precisam das práticas dhutanga para ajudá-
las. As práticas dhutanga cortam muitas coisas. Viver aos pés de uma árvore… Viver
aos pés de uma árvore não é contra os preceitos. Mas se você se determina à prática de
dhutanga de viver em um cemitério e, então, não o faz, isso está errado. Tente. Como é
viver em um cemitério? É o mesmo que viver em grupo?

Dhutanga: isso se traduz como “as práticas difíceis de se fazer”. Essas são as práticas
dos Nobres. Quem deseja ser um Nobre deve usar as práticas dhutanga para cortar as
impurezas. É difícil observá-las e é difícil encontrar pessoas com o compromisso de
praticá-las, porque vão contra a corrente.

Tal como com os manto; eles dizem para limitar a três mantos básicos; se manter com o
esmolar com a tigela; comer apenas na tigela; comer apenas o que você esmolou, se
alguém traz comida para oferecer depois, você não a aceita.

Manter esta última prática na Tailândia Central é fácil, a comida é bem adequada,
porque lá eles colocam muita comida na sua tigela. Mas quando você vem para o
Nordeste, aqui esse dhutanga adquire nuances sutis – aqui você recebe basicamente
arroz! Nestes locais, a tradição é colocar simplesmente arroz na tigela de esmolas. Na
Tailândia Central eles dão arroz e também outros alimentos, mas ao redor destes lugares
você recebe apenas arroz puro. Essa prática de dhutanga se torna realmente ascética.
Você come apenas arroz puro; seja o que for oferecido em seguida, você não aceita.
Então, existe alimentação uma vez por dia, de uma só vez, vinda de apenas uma única
tigela – quando você tiver terminado de comer, você se levanta do seu assento e não
come novamente naquele dia.

Estas são chamadas de práticas dhutanga. Agora, quem as praticará? Hoje em dia é
difícil encontrar pessoas com compromisso suficiente para praticá-las porque são
exigentes, mas é por isso que elas são tão benéficas.

O que as pessoas chamam de prática nos dias de hoje não é realmente prática. Se você
realmente praticar, não é fácil. A maioria das pessoas não se atreve a praticar de
verdade, não se atreve a realmente ir contra o usual. Elas não querem fazer nada que
seja contrário aos seus sentimentos. As pessoas não querem resistir às impurezas, não ir
fundo nas impurezas, nem se livrar delas.

Em nossa prática, eles dizem para não seguirmos nosso próprio estado de humor.
Considere: nós fomos enganados por inúmeras vidas a acreditar que a mente é nossa
propriedade. Na verdade, não é; é apenas um impostor. Ela nos arrasta para a ganância,
nos arrasta para a aversão, nos move para a ilusão, nos empurra para o roubo, o saque, o
desejo e o ódio. Essas coisas não são nossas. Pergunte-se agora: Você quer ser bom?
Todo mundo quer ser bom. Agora, agir de tais maneiras, isso é ser bom? Aí está! As
pessoas cometeram atos maliciosos e, no entanto, ainda assim querem ser boas. É por
isso que digo que essas coisas são trapaceiras, isso é tudo o que são.
O Buddha não queria que seguíssemos essa mente, ele queria que a treinássemos. Se ela
segue de uma maneira então refugie-se de outra forma. Quando ela vai para lá então
refugie-se bem aqui. Para simplificar: o que quer que seja que a mente queira, não a
deixe ter. É como se fôssemos amigos por anos, mas finalmente alcançamos um ponto
onde nossas ideias não são mais as mesmas. Nós nos separamos e seguimos nossos
caminhos diferentes. Nós não mais entendemos um ao outro, de fato nós até mesmo
brigamos, então nós terminamos. Isso mesmo, não siga sua própria mente. Qualquer um
que siga sua própria mente, segue seus gostos e desejos e tudo o mais; essa pessoa ainda
não praticou de forma alguma.

É por isso que digo que aquilo que as pessoas chamam de prática não é realmente
prática… é um desastre. Se você não parar e der uma olhada, não tente a prática, você
não verá, você não atingirá o Dhamma. Em poucas palavras, em nossa prática você tem
de comprometer sua própria vida. Não é que não é difícil essa prática, ela gera algum
sofrimento. Especialmente no primeiro ou segundo ano, há muito sofrimento. Os jovens
monges e noviços realmente passam por tempos difíceis.

Eu tive muitas dificuldades no passado, especialmente com comida. O que você pode
esperar? Tornar-se um monge aos 20 anos, justo quando você está querendo aproveitar
sua comida e dormir… alguns dias eu me sentava sozinho e apenas sonhava com
comida. Eu queria comer bananas em caldas ou salada de mamão, e minha saliva
começava a correr. Isso é parte do treinamento. Todas essas coisas não são fáceis. Esse
negócio de comida e comer pode levar a um monte de kamma ruim. Pegue alguém que
está saindo da infância, querendo aproveitar sua comida e dormir, e force ele nesses
mantos e seus sentimentos correm enlouquecidos. É como estar barrando uma torrente
de água veloz, às vezes a barragem acaba se rompendo. Se ela sobreviver tudo bem, mas
se não, ela se rompe.

Minha meditação no primeiro ano não era nada além de comida. Eu estava cansado…
Às vezes eu sentava e era quase como se estivessem realmente brotando bananas na
minha boca. Eu podia praticamente sentir eu descascando as bananas e colocando-as na
boca. E isso tudo é parte da prática.

Então, não fique com medo disso. Todos estivemos iludidos por incontáveis vidas,
então começar a nos treinarmos, a nos corrigirmos, não é tarefa fácil. Mas se é difícil é
porque vale a pena. Por quê deveríamos nos importar com coisas fáceis? Realize essas
coisas que são difíceis, pois qualquer um pode realizar o que é fácil. Nós devemos nos
treinar para fazer aquilo que é difícil.

Deve ter sido assim para o Buddha. Se ele tivesse se preocupado apenas com sua família
e com seus parentes, com sua riqueza e com seus prazeres sensuais anteriores, nunca
teria ser tornado Buddha. Essas questões não são insignificantes também, elas são o que
a maioria das pessoas está procurando. Portanto, seguir em frente tão jovem e abrir mão
dessas coisas é como morrer. E ainda assim algumas pessoas vêm e dizem: “Oh, é fácil
para você, Luang Por. Você nunca teve mulher e filhos com quem se preocupar, por isso
é mais fácil para você!”. Eu respondo: “Não chegue muito perto de mim quando diz isso
ou receberá uma pancada na cabeça!”. Como se eu não tivesse coração ou algo
parecido!
Quando se trata de pessoas, não é pouca coisa. É o que a vida realmente é. Assim, nós
praticantes do Dhamma, deveríamos sinceramente nos envolvermos com a prática,
realmente ousar fazê-lo. Não acredite em outros, apenas escute os ensinamentos do
Buddha. Estabeleça a paz em seus corações. No momento certo você entenderá.
Pratique, reflita, contemple, e os frutos da prática estarão lá. A causa e o resultado são
proporcionais.

Não se entregue às suas disposições naturais. No começo, você pode ter dificuldade até
de saber quantas horas de sono são necessárias para você. Você pode decidir dormir um
certo número de horas, mas pode ser incapaz de cumprir sua meta. Você precisa de
treinamento. Se você decidir levantar em um determinado horário, quando esse horário
chegar, saia da cama sem demora. Algumas vezes você vai conseguir, mas, outras
vezes, por mais que você queira sair da cama, você não vai conseguir! Você pode
precisar dizer a si mesmo: “Um… dois… queimarei no fogo do inferno se não sair da
cama quando eu chegar ao ‘três’!” Você precisa usar esse tipo de recurso para se
disciplinar. Quando chegar ao “três”, você vai se levantar imediatamente, temendo o
fogo do inferno.

Você deve se treinar, você não pode dispensar o treinamento. Você deve se treinar de
todos os ângulos. Não se baseie apenas em seu professor, seus amigos ou no grupo que
pertence o tempo todo ou você nunca se tornará sábio. Não é necessário ouvir tanta
instrução, apenas ouça o ensinamento uma ou duas vezes e depois coloque-o em prática.

A mente bem treinada não ousará causar problemas, mesmo em particular. Na mente do
adepto, não existe tal coisa como “privado” ou “público”. Todos os Nobres têm
confiança em seus próprios corações. Devemos ser assim.

Algumas pessoas se tornam monges apenas para encontrar uma vida mais fácil. De onde
vem essa facilidade? Qual a causa? Toda facilidade deve ser precedida por sofrimento.
Em todas as coisas é igual: você deve trabalhar antes de obter arroz. Em todas as coisas
você deve primeiro experimentar dificuldade. Algumas pessoas se tornam monges para
descansar e relaxar, elas dizem que querem simplesmente se sentar e descansar um
pouco. Se você não estudar os livros você espera estar apto a ler e escrever? Não é
possível.

É por isso que a maioria das pessoas que estudaram muito e se tornaram monges nunca
chegam a lugar algum. Seu conhecimento é de um tipo diferente, em um caminho
diferente. Elas não treinam a si mesmas, elas não observam suas mentes. Elas só agitam
suas mentes com confusão, buscando coisas que não são propícias à calma e à
moderação. O conhecimento do Buddha não é um conhecimento mundano, é um
conhecimento supramundano, completamente diferente.

É por isso que quem ingressa na vida monástica buddhista deve abrir mão de qualquer
nível, posição ou status que já teve anteriormente. Mesmo que um rei se torne monge,
ele deve abandonar seu status anterior, ele não traz aquelas coisas mundanas para a vida
monástica para que elas fiquem pesando ao seu redor. Ele não traz consigo sua riqueza,
status, conhecimento ou poder para a vida monástica. A prática envolve abandonar,
abrir mão, desenraizar, parar. Você deve entender isso, a fim de fazer a prática
funcionar.
Se você está doente, e não trata a doença com medicamentos, você pensa que a doença
irá curar a si mesma? Sempre que estiver com medo você deveria ir lá. Onde quer que
haja um cemitério que seja particularmente assustador, vá até lá. Coloque seu manto, vá
até lá e contemple: “Aniccā vata sankhārā….” [8] Faça meditação em pé e caminhando
lá, olhe para dentro e veja onde jaz o seu medo. Será tudo muito óbvio. Entenda a
verdade de todas as coisas condicionadas. Fique lá e observe até que a poeira abaixe, e
fique mais e mais escuro, até que possa ficar lá por toda a noite.

Buddha disse: “Quem quer que veja o Dhamma vê o Tathāgata. Quem quer que veja o
Tathagata vê Nibbana”. Se não seguirmos seu exemplo, como veremos ver o Dhamma?
Se não vemos o Dhamma como conheceremos Buda? Se não vemos Buddha, como
conheceremos as qualidades de Buddha? Somente se praticarmos os passos de Buddha,
saberemos que aquilo que o Buddha ensinou é absolutamente certo, que o ensinamento
de Buddha é a suprema verdade.
Notas:

[1] Dado em uma noite de observação lunar (uposatha), em Wat Pah Pong, no final dos
anos 1960.

[2] Glot – o grande guarda-chuva dos monges tailandeses da floresta , a partir do qual,
suspenso em uma árvore, penduram uma rede protetora contra mosquitos para ficar
debaixo dela na floresta.

[3] O corpo na primeira noite tinha sido o de uma criança.

[4] A última linha dos tradicionais versos pāli listando as qualidades do Dhamma.

[5] Mahānikai e Dhammayuttika são as duas divisões da Sangha Theravāda na


Tailândia.

[6] Uma expressão tailandesa significando: “Não exagere”.

[7] Treze práticas permitidas pelo Buddha sobre e acima do código disciplinar geral,
para aqueles que desejam praticar mais asceticamente.

[8] Parte de um verso em pāli, tradicionalmente recitado em cerimônias fúnebres. O


significado do verso todo seria: “Infelizmente, transitórias são todas as coisas
condicionadas / Tendo surgido, elas cessam / Tendo nascido, elas morrem / A cessação
de todos as composições é a verdadeira felicidade”.

Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda


com a permissão dos detentores do copyright
© 2017 Edições Nalanda

Nota: “Os Ensinamentos de Ajahn Chah” consiste de uma coletânea de ensinamentos


dados por um dos mais importantes mestres da tradição das florestas da linhagem
Theravada da Tailândia.

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