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Dança + Igreja:
essa união é possível?
Como desenvolver
um ministério de dança?

T emos dois caminhos: ou fazemos uma correta teologia bíblica e


missiológica e a aplicamos em nosso contexto para a redenção de
nossa cultu ra, ou então seremos alvosde mais um modismo que vai
e vem, sem provocar verdadeiras mudanças espirituais e éticas em nossas
igrejas e em toda a sociedade. A arte como serva do Evangelho pode
transformarestruturas; no entanto, um evangelho servosubmisso da arte
pode se descaracterizar e permitir o surgimento de uma arte alienadora,
em vez de instrumento de libertação.
Dança- o queestamos dançando? - por uma novadança na igreja, tem
como objetivo instigar investigações e questionamentos quanto à
apreensão e produção da dança feitas pela igreja atualmente. O livro
promove uma ampliação do conhecimento em dança, propondo uma
reflexã o sobre a produção nesta área artística e novas possibilidadesde
criação e trabalhos. Dessa forma, colabora para a reconstrução da visão da
dança na igreja ao provocar um diálogo que tem como finalidade a
quebra de paradigmas com relação à dança.

ISBN 978- 85-Z43 - 0364-7

978852 4303647
fjp
o que estamos dançando? - por uma nova dança na igreja
Categoria , Ministério Cristão
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o que estamos dançando? - poruma nova dança na igreja


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© 2007 por Carolina Lage Gualberto

Revisão
Regína Aranha
fosemar de Souza Pinto

Capa
Douglas Lucas

Diagramação
Alis Design

Gerente editorial
Juan Carlos Martinez

Coordenador de Produção
Mauro W Terrenyui
Todos os direitos reservados para:
Editora Hagnos
1a edição - Outubro 2007
Av.Jacinto Júlio, 620
04815-160 - São Paulo - SP -TeJlFax: (11) 5668-5668
Impressão e acabamento
hagnos@hagnos.com.br - www.hagnos.com.br
Imprensa da Fé

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Gualberto; Carolina Lage
Dança: o que estamos dançando?: por uma nova
dança na Igreja / Carolina Lage Gualberto. --
São Paulo: Editora Hagnos, 2007.

Bibliografia

ISBN 978-85-243-0364-7

1. Dança 2. Dança - Aspectos religiosos -


Cristianismo 3. Dança - História 4. Dança na
educação religiosa I. Título.

07-5582 CDD-246.7

Índices para catálogo sistemático:


1. Dança na Igreja: Propósito religioso:
Cristianismo 246.7
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O~ meu~ âl~, ârCe o U~ erto e

At I '
~nl~ ~t er, eaena filll ~ ân ~*
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Pelas portas abertas, Haanos

Pela fraternidade, Carlinhos Veiga.

Pela paciência, carinho e tempo; por ajudar-me com os


"CoreIDIlAWs" da vida, Pri Sathler.

Pelas belíssimas imagens, Quasar Cia. de Dança (Ana Paula, Adriano


Bittar e Érica Bearlz), Gestus Grupo de Dança (Gilsamara Moura e
Aline Viveiro), Camila Fersi, Carolina Romano e Carolina Natal

Pela confiança, você, Leitor.

Pelas mãos sempre prontas a aplaudir, amigos queridos.

Pelo amor que incentiva, Juninho Santos.

Pelo amor incondicional família.

Pelos sonhos doados e pela insistência em me comissionar, Deus.

Sinceramente., obrigada!

Carolina Lage Gualberto


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As leis da vida são as mesmas leis da dança. [-l


Ainconsciência é que gera a mediocridade
(VIANNA, 1990, p. 26).
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Prefácio ,, , li li • • • • li • li • • , li li lo li • • • • • • • • • " li li li • • • 11
Introdução 17

1. Dança: possíveis definições 21

Dança é movimento 26
Dança é arte 30
Dança é cultura 33
Técnicas em dança to to 35
Funções da dança 40

2. História da dança 43

Pequena história geral da dança 44


Nornes da história da dança 50
A Bíblia e a dança: história da dança no povo de Israel 53
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3. A questão do corpo 57

Corpo na igreja ~ 57
Corpo na dança 61

4. Sobre coreografia 67

5. De mãos dadas com a dança 77

Música (estímulos sonoros) 77


Público "' 80
· . '"
F l.gurlno li '" "' '" '" '" "' '" .. '" "' '" .. "' '" '" '" .. "' .. 87
Cenografia '" 93

6. Dança como ministério 103

Estruturação de grupos de dança 113


Produção em dança 119

7. Algumas dicas 123

Companhias brasileiras de dança 124


Filmes, vídeos e documentários 126
Formação acadêmica em dança 128
Dança on-Iine 130
Dança em imagens 131

Bibliografia 139
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embro-me, quando eu era menino, assentado


no sofá de nossa casa, como me impacien-
~....- tava ao assistir ao programa de televisão
"Concertos para ajuvcntude", sendo este o meu pri-
meiro contato com a música clássica. Acostumado
aos programas musicais populares, confesso que
detestei. Achei a música monótona, enfadonha. O
, ~. .
mesmo se repetiu em vanas outras tentativas no en-
contro com algumas manifestações artísticas mais
elaboradas, como os quadros e esculturas de artistas
contemporâneos, sem entender aqueles traços e
formas, procurando dar sentido àquilo, buscando
referenciais compreensíveis que coubessem dentro
da minha compreensão lógica.
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12 Dança

Em determinada época das minhas andanças com a música,


decidi estudar contrabaixo acústico. Meu professor convocou
todos os alunos para assistir a um concerto da orquestra na
qual ele tocava. Era um convite com o peso de uma obrigação;
não tive como escapar. Fui ao teatro, busquei um lugar onde
ele pudesse me ver e fiquei lá, meio desacreditado do que iria
acontecer. No entanto, fui surpreendido. Desde as primeiras
notas daquele movimento, a emoção me tomou de tal maneira
que não resisti ao seu convite. Viajei por lugares imaginados.
Visitei tempos e épocas que não conhecia. Senti-me conduzido
por caminhos diferentes e belos, por pradarias, matas, cam-
pos e cerrados: alegrei-me com a alegria e chorei com a dor
do artista. Só então compreendi, verdadeiramente, que a arte
não é para ser compreendida, como se compreende um objeto
qualquer, mas para ser fruída. A linguagem da arte transcende
a nossa lógica, ela possui um profundo ingrediente emocional,
ainda que evoque também o nosso intelecto. Está mais ligada à
alma que à mente, ao subjetivo que ao objetivo.
É uma pena que nós, na igreja, ainda não tenhamos enten-
dido as manifestações artísticas por essa ótica. Pelo menos é o
que parece! Talvez seja essa a razão de a nossa arte ser tão óbvia
e tão pobre; tão evidente e tão pouco artística; tão direta e tão
pouco reflexiva.
Com a dança, lembro-me de três fortes experiências. A
primeira foi ao assistir a apresentação do Momix, um grupo
de Washington, EUA. Conhecido internacionalmente como
companhia de "dança-ilusionista", o Momix evoca o mundo
surreal usando luzes, sombras e o corpo humano, numa beleza
estética fantástica. A criatividade, somada à técnica, produz um
efeito impressionante e inesquecível. É claro que, para con-
quistar aquela qualidade, imagino que passam ensaiando dia-
riamente horas a fio, dedicando-se a uma obra quase perfeita.

I I ti.' I I ! 'i ' I" ,I . ~r 4' I" III 11 II 1'11'" di, .. I' 111,
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Prefácio 13

A segunda experiência que me impactou foi minha parti-


cipação no 3° Congresso Latino-Americano de Evangelização
(CLADE 111), em Qpito, Equador. Os programas da noite
eram abertos com a apresentação de uma dança muito diferen-
te das danças que conhecemos hoje em nossos templos. Quem
nos preparava para ouvir a mensagem da Palavra de Deus era
uma jovem da Argentina, que trabalhava profissionalmente
com a dança clássica. Por intermédio de seus movimentos belos
e de extrema leveza, ela nos aproximava mais dos céus, abrindo
nosso coração para aquilo que o Senhor falaria ao grupo pelos
Seus mensageiros. Nunca mais vi nada igual no meio evangé-
lico. Arte e adoração.
A terceira e última experiência que compartilho, vivi em
Nairóbi, no Quênia, em 1991. Participava da Conferência
Internacional da Mocidade para Cristo, com centenas de
obreiros de mais de cem países. As atividades eram bastante
intensas. Para quebrar o pesado ritmo dos trabalhos, foi ofe-
recida aos congressistas a oportunidade de participar de um
programa chamado Noite Africana, com a apresentação de
algumas manifestações culturais daquele continente: música,
teatro e principalmente dança. Em determinado momento, o
grupo musical cantou uma canção popular bastante conhecida,
com ritmo forte, e o povo desceu das arquibancadas e ocupou
o centro daquele auditório em forma de um coliseu. Todos
adoravam a Deus, dançando e se alegrando na presença dEle.
Aquela noite me marcou tanto que eu chorei ao perceber que,
àquela altura da história, se fôssemos desafiados a promover
uma Noite Brasileira, não teríamos nada a mostrar aos irmãos
dos outros países, porque a nossa cultura, e em especial a nos-
sa dança, havia sido demonizada por uma teologia que vê as
manifestações culturais brasileiras como algo indigno de ser
oferecido ao Senhor.
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14 Dança

Três experiências: dança contemporânea, dança clássica e


dança popular. Falam de criatividade, louvor e resgate da cul-
tura. O que podemos fazer para mudar a mediocridade da arte
a serviço do Reino de Deus no Brasil? Esta é a proposta deste
livro, que surge num momento histórico delicado e de grande
importância. Temos dois caminhos: ou fazemos uma correta
teologia bíblica e missiológica e a aplicamos em nosso contexto
para a redenção de nossa cultura, ou então seremos alvos de
mais um modismo que vai e vem, sem provocar verdadeiras
mudanças espirituais e éticas em nossas igrejas e em toda a
sociedade. A arte como serva do evangelho pode transformar
estruturas; no entanto, um evangelho servo submisso da arte
pode se descaracterizar e permitir o surgimento de uma arte
alienadora, em vez de instrumento de libertação.
A autora deste livro, Carolina Gualberto, é mais que amiga
e irmã: é praticamente uma sobrinha. Eu e seu pai, Marcelo
Gualberto, somos grandes companheiros de ministério desde
que Carol era menina. Vi essa garota crescer e ser despertada
para seus dotes artísticos quando, ainda pequenina, não se can-
sava de assistir aos intermináveis ensaios do Quarteto Vida,
maravilhoso grupo vocal do qual sua mãe, Vânia, participava.
Ela cresceu com o Som do Céu, esse evento artístico de gran-
de peso que revelou e referendou grandes artistas cristãos no
Brasil. Vibrei quando o Marcelo me contou, com um sorriso
e muita expectativa, que ela havia escolhido prestar vestibular
para dança na Unicamp. Depois do curso, vieram as especiali-
zações e pós-graduação.
Por tudo isso, estou muito feliz no grande privilégio que
me foi concedido de prefaciar este livro. Percebo nele a con-
cretização de um sonho de tantos artistas como eu, de ver uma
nova geração rnais preparada e rnais culta assumindo seu papel
na produção da arte no Brasil. O que nos faltava, eles têm de

I, ., I! '" I" .... ~ ~II i~ I II ,11 "I' I' I " I 1111 i


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Prefácio 15

sobra. Constroem a partir dos alicerces lançados, de maneira


tão sofrida epenosa, por alguns poucos corajosos eousados que
viveram nas gerações anteriores. Carol e seus novos parceiros
são os continuadores do trabalho ainda incompreendido da
aplicação da arte a serviço do Reino, principalmente quando
este trabalho envolve o resgate da cultura brasileira.
Tenho absoluta certeza de que este livro será de grande va-
lia para todo aquele que pretende envolver-se nesta séria tarefa.
Aqui você encontrará bases bíblicas e teológicas, bem como
fundamentos da teoria da arte e da dança, inclusive sugestões
e dicas para serem aplicadas nos ministérios dentro ou fora da
Igreja.
Qge Deus ilumine a Carol a cada dia. Qye Deus ilumine
a Igreja e nos dê capacidade para discernirmos o tempo e a
urgência que ele exige.

Carlinhos Veiga,
maio de 2007
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á alguns anos, participei de uma oficina de


........ dança em São Paulo ministrada por um
grupo. Apesar de não me identificar com
o trabalho realizado por ele Gá o conhecia havia
algum tempo), decidi me inscrever para conhecer
mais da produção em dança na igreja e ampliar
minhas possibilidades de críticas construtivas. Ao
chegar ao local onde seria realizada a oficina, de-
parei-me com mais de cem pessoas que também
participariam do minicurso e fiquei feliz por ver
tanta gente interessada em saber mais sobre dança e
com o desejo sincero de se aperfeiçoar nessa arte. A
oficina começou com uma hora de exposição teóri-
ca a respeito da atuação da dança na igreja. Pontos
com os quais discordei foram levantados, questões
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18 Dança

duvidosas forarn expostas, e corriecei a rne sentir incomodada.


Colocações inquietantes, mas não insuportáveis. Ainda.
Em seguida, uma das palestrantes disse a todo o grupo de
participantes que se ajoelhasse para uma oração. Os integrantes
do grupo de dança começaram a fazer movimentos corporais
aleatórios, chamados de "dança espontânea", ao redor das pes-
soas ajoelhadas, ao som de uma música que, por sinal, também
possuía uma letra um tanto questionável. Por minha criação ter
sido na "Presbiteriana do Brasil" e, portanto, considerada por
muitos como engessada e tradicional, pensei que estava fechada
para o mover do Espírito Santo. Fechei os olhos e sinceramente
orei ao Senhor, pedindo que Ele me quebrantasse e mudasse
meu modo de ver as coisas. Qjial não foi minha surpresa quando
senti alguém tocar meus cabelos e acariciar meu rosto. Abri os
olhos e vi uma integrante do grupo dançando ao meu redor en-
quanto outra me abraçava e me balançava num ritmo repetitivo
e constrangedor na tentativa de envolver-me e "desembaraçar-
me" para aquele momento. Ainda me abraçando, a integrante
balançava-me com tamanha força que parecia querer colocar-me
deitada no chão. Qyando olhei para o restante da sala, vi rnui-
tos participantes já deitados e outros também abraçados pelos
integrantes do grupo. Passadas duas horas, desde que tinha me
ajoelhado, a música que tocava ainda era a mesma. A "oração"
terrninou, e todos ficaram de pé. Nesse rnornerrto, saí e continuei
acompanhando a "aula", que, para mim, já tinha se tornado in-
suportável, do lado de fora da sala. Acompanhados pelo som de
dois percussionistas, todos foram instruídos a marchar e gritar,
"expulsando vários demônios" até então desconhecidos por rnirn,
corno o demônio da gripe, o demônio das fraturas, dentre outros.
A marcha durou mais uma hora, quando, finalmente, os partici-
pantes foram convidados a dançar, nos últimos quinze minutos,
de forma espontânea em louvor a Deus.

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Introdução 19

A partir daí, meus olhos, que já viam crescer na igreja uma


dança equivocada, não suportaram tamanha falta de luz. Desde
então, prossigo refletindo seriamente sobre a dança na Igreja
evangélica brasileira e, após alguns anos desde esse aconteci-
mento, decidi escrever este singelo livro na tentativa de registrar
o que aprendi sobre dança até hoje e de instigar investigações e
questionamentos quanto à compreensão do papel da dança na
igreja e a produção ali realizada atualmente.
Este livro, portanto, pretende ampliar (ou ajudara recons-
truir) a visão da dança na igreja e na vida dos cristãos. Para
isso, busquei ser o mais simples e prática possível na minha
linguagem e no trato da dança, embora utilize um meio pura-
mente teórico. Tentei abranger os assuntos que, em minha pró-
pria caminhada, creio que foram importantes, como também
as perguntas que constantemente são feitas a mim por alunos,
amigos e interessados.
Neste momento, é necessário que alguns pontos sejam escla-
recidos. O primeiro deles é o fato de que não pretendo, com este
livro, fechar essa questão tão polêmica da dança na igreja, tam-
pouco construir uma teoria rígida e imutável. Meus registros ape-
nas refletem uma possibilidade flexível e em constante mutação,
aberta a intervenções futuras e a novos questionamentos. Mesmo
porque as realidades do mundo, da Igreja brasileira e da dança são
escorregadias e mudam a todo instante. Isso, certamente, afeta
tudo que for dito aqui, e é importante que o leitor interaja com o
livro para uma aplicação pessoal desse conhecimento.
Qjiero alertar também para o tratamento dado, no livro,
àquele que dança. Chamo-o de dançarino, e não de bailarino.
Apesar das inúmeras conotações negativas desse termo, optei
por dançarino para que, assim, fique claro que não trato aqui
somente daqueles que já dançam profissionalmente, tampouco
dos que dançam balé. Dançarino, portanto, é toda pessoa que
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20 Dança

possui uma empatia pela dança a ponto de se aprofundar no


conhecimento e na prática dela.
Optei por uma divisão, puramente didática, do livro em sete
capítulos. No primeiro capítulo, busquei discutir as possibilida-
des na definição do que é dança, ao falar sobre a dança como
movimento, arte e cultura, bem como de suas técnicas e funções.
Num segundo momento, tracei um pequeno panorama sobre a
história da dança e seu percurso em alguns povos. Discorri, em
seguida, sobre a trajetória conceitual do corpo na filosofia e em
sua relação com o cristianismo. Ainda nesse capítulo, tratei do
corpo em sua relação com a dança. O quarto capítulo trata mais
especificamente de questões coreográficas, ao discutir um pou-
co sobre o trabalho do coreógrafo e o processo de elaboração
de uma coreografia. Já no quinto capítulo, procurei tratar de
outras questões relativas à dança e necessárias para a produção
de trabalhos relacionados à dança. Num sexto momento, trouxe
a dança, de forma ainda mais específica, para o contexto cristão,
ao discutir sua faceta ministerial. Finalmente, no sétimo capí-
tulo reuni algumas dicas interessantes de vídeos, companhias,
sites, artigos acadêmicos e imagens sobre a dança.
Meus objetivos aqui se resumem basicamente em ampliar o
conhecimento sobre a dança da comunidade cristã evangélica,
propondo uma reflexão acerca da produção nessa área artística
e de novas possibilidades de criação e trabalhos, como tam-
bém instrumentalizar aqueles que desenvolvem ministérios
de dança. Assim, pretendo colaborar com a igreja evangélica
brasileira e com todos os artistas interessados em dança pro-
duzindo este livro que, apesar de ser uma tentativa pequena e
simples se comparada ao imenso universo da igreja atual, quer
contribuir ao iluminar outros possíveis caminhos - por uma
nova dança.

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or mais que se defina o que é dança, não há


como obter um conceito fechado e único. O
universo da dança abrange inúmeras reali-
dades distintas, além de estar em constante trans-
formação pelo próprio caráter artístico da dança.
Descobri, principalmente na atividade do ensino,
que, por mais que se tente, não há como definir o
que é dança. Cada pessoa tem uma definição pró-
pria e, mesmo em bibliografias especializadas, as
conceituações são variadas. Apesar disso, podemos
tentar traçar um panorama do que há em dança e,
assim, revelar algumas possibilidades no caminho
para defini-la.
A dança tem seu início na necessidade natural
do homem de se expressar. Necessidade tal que nos
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22 Dança

move a "falar" com nosso corpo. Por isso, a dança está no nível
básico da expressão do ser humano. E, a partir dessa necessida-
de, cada pessoa, na tentativa de expressar à sua maneira aquilo
que deseja, trabalha seu corpo de forma distinta.
De forma geral, cada um de nós possui um conceito próprio
do que é dança baseado em nossas vivências pessoais e no que
conhecemos e já vimos sobre essa manifestação artística.

Dança moderna
Dança contemporânea
Educação
Dança-teatro

Magia

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Dança: possíveis definições 23

Ao citar a educadora e bailarina francesa Jacqueline Robin-


son (1978), Márcia Strazzacappa (2001) discorre sobre a "árvore
da dança" - uma tentativa de fazer um breve panorama do que
é conhecido na área. Ela inicia com sua raiz - denominada
por Robinson de magia (no sentido metafórico de encanto por
meio do qual desenvolvemos nossa dança), e que aqui chamarei
de comunicação - a razão motivadora da dança: a necessidade
do ser humano de comunicar algo. Dessa raiz, surgem três
motivos principais representados pelos ramos: lazer, expressão
e espetáculo. Aliam-se a esses ramos outras duas possibilidades
representadas pelos ramos da saúde e da etnia.
O principal ramo é o da expressão, também chamado de
motivação. É aquele motivo mais puro e relevante para a dan-
ça; e é aí que se encaixam a dança-teatro, a dança-educação, a
dança moderna e a contemporânea.
Complicado definir sem que se assista a um espetáculo, mas
posso adiantar e resumir ao dizer que a dança-teatro relaciona
movimento, mímica e espaço num trabalho muito específico
do corpo e tem como característica o seu uso no limite de suas
expressões.
Apesar de toda dança ter um caráter educativo, chamamos
de dança-educação aquela trabalhada principalmente em um
ambiente de ensino com o intuito de promover uma educação
mais corpórea e artística do indivíduo por meio da dança e de
seus princípios. Muitas escolas atualmente têm descoberto a
importância e o valor da dança na educação de seus alunos e
aberto espaço para essa manifestação artística.
Sobre a dança moderna e a contemporânea, falaremos mais
à frente.
Embora esteja representada de forma destacada, a expres-
são está presente ainda nas demais ramificações (lazer, etnia,
saúde e espetáculo), uma vez que, independentemente da
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24 Dança

motivação principal, a dança, como já dito, sempre terá presen-


te seu caráter expressivo.
Ao redor desse ramo principal, notam-se também as danças
étnicas, ou populares, que são expressões de uma cultura, presen-
tes em ritos, jogos ou até mesmo em espetáculos. Em termos de
manifestações dançantes brasileiras, devem-se destacar o samba
(especialmente o de raiz), o frevo, o maracatu, o forró, dentre
tantas outras expressões corporais ligadas às festas populares.
Há, nesse ramo, as danças chamadas primitivas, que são
consideradas "puras" por não perderem seu caráter originário
de rito. Importante ressaltar que o tronco das danças étnicas
tem duas bifurcações, sendo uma para o lazer e a outra para
o espetáculo. Isso, portanto, quer dizer que é possível levar as
danças populares para o palco por meio de companhias profis-
sionais (ex.: Balé Folclórico da Bahia), ou ainda praticar essas
danças apenas para entretenimento pessoal (ex: pessoas que
praticam forró em academias).
Strazzacappa segue citando as danças amadoras, danças de
salão e o jazz, todas encontradas no ramo do lazer e praticadas
pelas pessoas por puro prazer, sem interesse de se profissiona-
lizarem.
O jazz pode ser percebido especialmente nas produções
hollywoodianas das décadas de 1970 e 1980, como nos musi-
cais da Broadway ou nos filmes da série Os embalos de sábado à
noite. É importante dizer que o jazz se profissionalizou muito
tempo após a sua origem que foi puramente recreativa. Já a
dança clássica originou-se com um caráter estritamente de
espetáculo profissional, posteriormente interessando a indiví-
duos que começaram a praticar a técnica como complemento
da educação corporal formal (STRAZZACAPPA, 2001, P: 42).
Algumas danças populares brasileiras, corno o forró, o samba,
entre outras, conquistaram espaço nas academias juntamente

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Dança: possíveis definições 25

com as já antigas danças de salão (tango, salsa, bolero etc.),


situadas também no ramo do lazer. Outras danças originárias
de países e culturas específicos, como o sapateado americano, a
dança do ventre, a dança flamenca e as danças de rua, aparecem
como um galho que tem seu início nas expressões folclóricas
(culturais) e se ramifica tanto para a área recreativa - pela
busca de entretenimento - quanto para o campo espetacular
- pelo caráter de apresentação pública.
Finalmente, Strazzacappa diz da pequena ramificação que
parte do ramo expressão - a da saúde (terapêutica). Esse
galho revela a busca crescente de pessoas pela dança e seus
fins terapêuticos (equilíbrio de tensões, tratamento de estresse,
terapia de grupo, reinserção social etc.), bem como a associação
da dança a diversas técnicas terapêuticas, como a técnica de
Feldenkrais, de Alexander (eutonia), entre outras.
Ao fazer uma análise completa desse pequeno panorama
conceitual, podemos perceber a dança em suas diversas mani-
festações e aplicações. Vemos a dança como recreação (pratica-
da por puro prazer); como manifestação de uma cultura (ritos,
cerimônias, festas e crenças de uma comunidade); como ati-
vidade terapêutica e social (dançaterapia); como propiciadora
de expressão e de descoberta do corpo expressivo (dança nas
escolas ou a dança dita "educativa"); e ainda a dança ensinada
em escolas profissionalizantes com objetivo específico de for-
mar artistas profissionais.
Dado esse panorama geral, é interessante perceber que a
dança, ainda que em suas distintas configurações, pode ser
sempre associada a movimento do corpo. Não importa se rea-
lizada como recreação ou manifestação de um povo, a dança
nunca perderá sua relação com os gestos e movimentos corpo-
rais de um indivíduo. Nesse momento, pode-se afirmar, então,
que dança é movimento.
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26 Dança

Dança é movimento
Bibliografias especializadas na questão da definição da dan-
ça trazem, de forma geral, a idéia de que a dança é composta
por movimentos e gestos corporais executados pelo homem.
Mas isso não nos traz uma solução quanto à sua definição.
Afinal, executamos vários movimentos diariamente sem que
necessariamente estejamos dançando. É aí que surge a questão:
como diferenciar os movimentos da dança dos demais com-
portamentos motores humanos?
Na tentativa de trazer luz a essa questão, Judith Hanna
(1977) sugere que movimentos e gestos comuns são transfor-
mados em figuras de dança quando trabalhados e transpos-
tos para um contexto coreográfico. Susanne Langer (1980)
vai além e faz uma diferenciação dos gestos pelo seu caráter
expressivo. Nessa linha de pensamento, há, portanto, os ges-
tos que são sinais diretos de emoções. Para exemplificar, é só
lembrar-se da mão ao encostar-se a um objeto quente e sua
velocidade, ao fugir rapidamente dessa sensação de queimação.
Ou mesmo da contorção do tronco, ao sentirmos uma dor de
qualquer espécie na região abdominal. Enfim, esses e outros
movimentos exemplificam essa primeira categoria sugerida por
Langer que inclui sinais automáticos de sensações corporais
que realizamos a todo momento, resultantes de necessidades
ou dos reflexos físicos.
Há uma segunda categoria em Langer que trata dos
gestos organizados sistematicamente numa lógica expressiva.
Isso significa que existem alguns movimentos colocados, por
assim dizer, em uma linguagem, organizados de forma que
cada movimento tenha um sentido fixo e único. Exemplo
dessa categoria gestual é o sistema de Libras (sinais) utilizado
para a comunicação entre deficientes auditivos. Com algumas

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i I 11' .11 ~HII , I•
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Dança: possíveis definições 27

variações e exceções, o gesto que traduz a palavra "céu", por


exemplo, é o mesmo em qualquer contexto ou lugar do Brasil.
O gesto simboliza e significa a palavra "céu".
Mônica Dantas (1999) complementa e diz que o gesto na
dança assume diferentes especificidades e características que o
°
diferem do gesto natural. Na dança, gesto ganha a forma de
um signo artístico. Para um melhor entendimento, é importan-
te pensar na definição de símbolo eem que sentido ele se difere
de um signo.
Quando se pensa em símbolo, logo vem à mente algo que
representa diretamente outra coisa. Por exemplo, na nossa so-
ciedade encontramos as placas de trânsito que designam leis
a serem seguidas (luzes do semáforo: luz vermelha significa
"pare"1 ; uz amareI"...."
a, atençao; e Iuz verd"''')
e, sIga ; a cruz po de
simbolizar o cristianismo, atividades relacionadas a hospitais,
entre outros significados; as diversas sirenes que são tocadas de
diferentes formas podem indicar oinício de uma aula, uma ati-
vidade policial ou médica etc. A diferença entre esses símbolos
e o gesto na dança é o fato de que nela o gesto é um símbolo
livre. Isto é, ele significa algo que depende do contexto em que
está inserido. Na verdade, o movimento na dança é um signo.
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28 Dança

o conceito de signo! provém da scmiótica'' que se caracte-


riza, especialmente, por não ter sempre o mesmo significado.
Ele varia de acordo com a forma em que está sendo trabalhado
e com os componentes contextuais que se associam a ele, rea-
firmando o fato de que o significado de cada forma só existe
em função do sistema no qual ela se insere. Para exemplificar,
retomaremos o exemplo do movimento de contração do tronco
ao sentir uma dor abdominaL Realizar esse movimento num
contexto cotidiano e como resposta direta da dor significa uma
mensagem específica. Já a mesma contração, trabalhada, inseri-
da numa seqüência coreográfica e associada a outros movimen-
tos e elementos cênicos, pode ter vários outros sentidos.
Na tentativa de distinguir um movimento comum do movi-
mento em dança, é fundamental que se lembre, então, que todos

1 O signo - que nesse universo vai do desenho infantil até o mais rigoroso tratado
de lógica, incluindo também o homem que os produz como um signo - é concebi-
do como uma tríade formada pelo representamen - aquilo que funciona como signo
para quem o percebe - , pelo objeto - aquilo que é referido pelo signo - e pelo
interpretante - o efeito do signo naquele (ou naquilo, podendo-se aí incluir os seres
ou dispositivos comunicativos inumanos como os computadores) que o interpreta.
Vale lembrar, com Merrell (1998:49), que não devemos pressupor que o signo e
seu objeto "são sempre entidades concretas - espaço-temporais - ou até objetos
físicos. Peirce sempre cuidava para evitar esse erro". Em muitos casos, podemos
experimentar a concretude de signos, objetos e representamina, embora em outros
eles careçam de qualquer materialidade.
2 Segundo Winfried Nõth (1995:19), "a semiótica é a ciência dos signos e dos pro-
cessos significativos (serniose) na natureza e na cultura". A investigação semiótica
abrange virtualmente todas as áreas do conhecimento envolvidas com as linguagens
ou sistemas de significação, tais como a lingüística (linguagem verbal), a matemática
(linguagem dos números), a biologia (linguagem da vida), o direito (linguagem das
leis), as artes (linguagem estética) etc. Para Lúcia Santaella, ela "é a ciência que tem
por objeto de investigação todas as linguagens possíveis" (1983:15).

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Dança: possíveis dejin ições 29

os movimentos corporais humanos são passíveis de serem


movimentos de dança, o que não significa que todos o sejam.
O movimento na dança não é como qualquer gesto cotidiano.
Ele, na verdade, extrapola essa realidade ao interpretar o ges-
to do dia-a-dia e o reelabora, recriando-o, transformando-o e
transpondo-o para um contexto coreográfico.
Vimos que uma forma qualquer só adquire sentido se vis-
ta a partir do contexto no qual está inserido. Portanto, todo
movimento corporal só pode ter significado se visto sob a
perspectiva do seu sistema. Cada trabalho coreográfico é
a reunião de signos criados durante sua execução e de acordo
com as necessidades circunstanciais específicas. Se retirados de
sua composição originária, esses signos deixam de ser ativos.
O signo surge..no momento em que é empregado e para deter-
minado fim. E, assim, aberto e móvel, ao mesmo tempo que
precisa ser fixo para poder significar. Nesse sentido, o movi-
menta de dança é, certa e naturalmente, expressivo, mas não
auto-expressivo. Também não possui um significado último.
Na verdade, o signo possibilita a coexistência de vários sentidos
e a apreensão feita por cada interpretante de acordo com suas
preferências e características próprias.
Além disso, o signo artístico não é propriedade exclusiva da
dança. Na verdade, esse é um elemento primordial para toda
manifestação em arte. Seja nas artes plásticas, seja na música,
. .., . ..
seja no teatro, o sIgno artístico sempre VaJ. ser um ponto comum
entre todas elas. Nesse momento, vale a pena pensar na dança,
portanto, enquanto arte - outra peça fundamental de nossa
reflexão.
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30 Dança

Dança é arte
Já tive
inúmeras conversas sobre a dança e suas possíveis
definições e sempre ouvi comentários que rerneriam à sua fa-
ceta atlética: "dança é esporte"; "a dança deveria ser oficializada
na Olimpíada" etc. Obviamente, adrnito os benefícios corpo-
rais da prática da dança, bem como a rígida disciplina para
uma boa resistência física e eficiência nos movimentos. Mas
o que quero ressaltar aqui é que a dança, antes de ser um bom
exercício corporal e puramente movimento, é arte, e isso requer
necessidades e reflexões outras que não só as de uma atividade
física.
É preciso reafirmar, então, que dançar é fazer arte. Mas o
que é arte? Apesar de tantas discussões e debates sobre o as-
sunto, niriguérn ainda foi capaz de achar uma definição justa e
ampla. Para a nossa reflexão, focarei o caráter sociológico da arte
que é, nesse sentido, reveladora da trajetória humana através da
História, ao permitir a interface do homem com seu real trajeto.
Pela arte, podemos enxergar o passado, analisar o presente e in-
dicar um futuro, ainda que ela esteja estacada num determinado
ponto da História. A arte, ela própria, é uma realidade social.
Toda manifestação artística está submetida a seu rnornerito his-
tórico, bem como foi condicionada pela humanidade graças a
suas aspirações, idéias e necessidades específicas. Mas, apesar
disso, consegue superar essa condição, trazendo verdades e no-
vos possíveis caminhos que perduram ao longo da História.
Obviamente, se toda manifestação artística também possui,
dentre tantas funções e âmbitos, o aspecto sociológico, assim,
logicamente, a dança também é registro civilizador e produto
social. Por meio da dança, é possível termos uma identificação
social a partir do seu caráter documental, algo que também se
aplica a qualquer obra artística.

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Dança: possíveis definições 31

o papel da dança e sua atuação nas sociedades, bem como


na história da humanidade, a confirma como civilizadora e
parte integrante do funcionamento social humano. Por ela, nos
são revelados conceitos, princípios, valores e crenças de uma
sociedade e também nos são apresentadas possibilidades do
futuro do homem e seu meio.
Nesse momento, surge uma questão: o que podemos cha-
mar de dança hoje? Como reconhecê-la? Já discutimos a dança
enquanto movimento. Mas, se é assim, toda seqüência de movi-
mentos corporais é dança? De fato, ao refletir sobre o que vem
a ser dança, é necessário que se pense nela como movimento e,
ainda, que se discuta as características desse movimento como
arte.
De forma geral, predomina a idéia de que, pelo fato de a
dança estar intrinsecamente ligada ao movimento corporal,
todo movimento - se produz prazer estético ou aparenta o já
estabelecido comercialmente como dança - é, portanto, arte.
Com relação a essa questão, diz Ferreira Gullar sobre as artes
plásticas:

Não há dúvida de que qualquer objeto artístico ou


não pode ser fonte de prazer estético e, portanto, sujeito
à contemplação. Não obstante, a produção de objetos
que se querem "obras de arte" resulta numa opção espi-
ritual e prática, diferente da que produz outros objetos.
(GULLAR, 1993, p. 16)

Afirmo ser esse também o caso quando se trata do mo-


vimento em dança. Qualquer movimento pode proporcionar
prazer estético, não sendo, no entanto, necessariamente dança.
O movimento em dança é provido de uma reestruturação sim-
bólica, própria do processo criativo em arte, sem a qual não
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32 Dança

passa de um mero movimento corporal qualquer. Ele resulta


de um processo de pesquisa, maturação e composição pelo qual
passa a possuir um caráter inteligente, motivado e consciente.
Qyando esse processo não ocorre, surgem trabalhos co-
reográficos mecânicos e mercadológicos; cópias regidas pelo
show busz"ness e sem nenhuma preocupação em serem claras,
coerentes ou inovadoras em propostas e em reflexões. Com
o crescimento desse tipo de trabalho, todas as formas que se
dizem dança, por utilizarem movimentos corporais para a sua
efetivação, ganham ainda mais espaço, mas, na verdade, não o
são. Gullar diz que "[...] a existência da linguagem da pintu-
ra não significa que toda e qualquer tela pintada seja obra de
arte" (1993, p. 31). Tomando como base essa afirmação, assim
também se pode dizer que a existência da linguagem da dança
não significa que todo e qualquer trabalho coreográfico consti-
tuído simplesmente de movimentos corporais seja obra de arte.
Para se fazer dança, não é suficiente que haja, puramente, uma
movimentação gratuita. Volto a dizer que a dança tem relação
com um processo artístico e, portanto, pode ser identificada
quando, dentre outras questões, uma coreografia colabora para
um entendimento maior da sociedade na qual está inserida.
De qualquer forma, a discussão não se esgota aí. Talvez
seja necessária uma vida inteira para falar do que é arte ou da
definição da dança. Isso também vale para a tentativa de se
diferenciar arte de cultura. Apesar de muito ligadas, a manifes-
tação cultural pode diferir da manifestação artística. Por isso,
é importante que façamos uma breve reflexão da dança como
cultura.

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Dança: possíveis definições 33

Dança é cultura
Antes de tratar da dança como cultura, é importante trazer
um possível conceito de cultura que orientará esse pensamento.
Heibert, citado por Alencar (2005, p. 15), define cultura como
um "sistema integrado de comportamentos aprendidos, idéias
e produtos que caracterizam uma sociedade". Nesse sentido,
cultura é tudo aquilo que é produzido pelo homem, seja uma
idéia, seja um produto, e não apenas o que tem sido denomi-
nado como "cultura" no sentido clássico (Heibert, citado por
ALENCAR, 2005, p. 15).
Ao refletir sobre esse conceito, entenderemos que cultura e
arte não são a mesma coisa. A primeira se relaciona com toda
produção humana. Já a segunda precisa de uma motivação outra
que não a de uma simples produção. Fica mais fácil compreender
essa questão quando paramos para pensar que algumas pessoas
pintam ou tocam um instrumento, mas nem todas produzem
arte. Obviamente, essa delimitação do que é arte ou cultura
ainda é difícil de ser estabelecida. Uma das principais razões
para tal dificuldade tem relação tanto com questões econômicas
quanto artísticas. Pela suposta elite da arte regida por artistas
"eruditos", e também pelas diferenças nas classes sociais, acaba
por se considerar arte apenas o que eles produzem (música
clássica, por exemplo), ficando de fora toda a produção popular.
Como se a arte fosse produção apenas dessa classe erudita
(universo acadêmico, críticos de arte etc.), e tudo que deveria ser
considerado arte, mas por ser produção do povo, fosse, então,
a chamada cultura. Muitas pessoas ainda se confundem pela
influência desse pensamento em nossa sociedade. Nesse sentido,
a arte é para alguns poucos elitizados, quando na verdade
ela independe disso. Obviamente, essa postura é um grande
equívoco! Mas deixaremos essa reflexão para outro momento,
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34 Danca
~

uma vez que nosso objetivo aqui é tentar delimitar o que vem a
ser dança e enxergá-la enquanto cultura.
Já foi visto que a dança é arte, e isso nos ajuda a compreendê-
la com suas especificidades artísticas e evidenciar seus aspectos
culturais. Algo que pode auxiliar-nos nessa reflexão é lembrar
que toda produção artística é cultura, mas nem toda cultura é
arte. A dança é cultura? Sempre. Isso porque é criação humana
e também está sempre inserida num contexto social, o que, de
alguma forma, influencia a obra. O corpo do dançarino (que foi
escultado num determinado momento histórico social), suas
escolhas e processos criativos são, de certa forma, influenciados
pelo ambiente cultural no qual estão inseridos.

Existe o espetáculo dos dançarinos movendo-se no


°
tempo e no espaço, som deste movimento, ° cheiro
do esforço físico do dançarino, a sensação táctil dos lo-
cais onde o corpo tocou o chão, tocou outro bailarino,
ou os objetos de cena, o ar se movendo ao redor dos
dançarinos, e a sensação de distância. Todas essas face-
tas da dança podem ter significados com base cultural.
(HANNA, 1983, p. 33)

Assim, cada sensação, movimento e elemento constituinte


de um trabalho coreográfico estão fundamentados em um con-
texto cultural que influencia a produção do artista. Apesar dis-
so, nem todos os que produzem trabalhos coreográficos estão
fazendo arte, uma vez que um trabalho artístico tem relação
com outras questões que não só as culturais.
Visto que há várias facetas da dança, é interessante tratar
das diversas possibilidades técnicas nessa área, uma vez que,
apesar de ser cultura, movimento e arte, a dança nos é revelada
em idéias distintas. Tratarei dessas idéias a seguir.

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Dança: possíveis definições 35

Técnicas em dança

À medida que trabalhamos, é preciso buscar a


origem, a essência, a história dos gestos - fugindo da
repetição mecânica de formas vazias e pré-fabricadas.
(V~NA,1990,p.58)

É importante que se repita os movimentos muitas


e muitas vezes, porque só a partir daí é que eles passam
a ser meus. É após muita repetição que temos a possi-
bilidade de realizá-los com clareza e individualidade.
(vrlANNA,1990,p.62)

A dança nasce de algo natural do ser humano. Basta


observar as respostas corporais de uma criança ao ouvir uma
música, mesmo sem saber ° que significa dançar. A criança
naturalmente se move independentemente de seu país, cultura
ou família.
Durante a trajetória histórica e o crescimento das socieda-
des e culturas, as danças, havia muito já executadas, aos poucos
foram organizadas quando conectadas a diferentes linhas de
pensamento e valores. A dança, portanto, revela-se em diver-
sas idéias. Em dança, utilizamos o conceito de técnica, ao nos
referirmos a uma idéia específica que ganhou autonomia e,
portanto, recebeu um nome que agrupa uma acepção de movi-
mento num determinado tempo histórico. Cada técnica é uma
maneira específica de trabalhar o corpo, compreendê-lo e, à
medida que é adquirida, aumenta as possibilidades dele.
Na verdade, nem todas as técnicas são conscientizadas pe-
los seus praticantes, principalmente quando se trata das danças
populares e folclóricas. Por serem comumente passadas "de
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36 Dança

pai para filho", a apreensão dessas danças não se dá numa sala


de aula, mas na vivência e observação crescente das danças.
Já outras técnicas desenvolveram sistemas codificados e são
repassadas por intermédio de pessoas que se especializam e as
ensinam por meio de aulas.

BALÉ CLÁSSICO
O balé clássico nasceu com o intuito de atender à realeza
em suas festas e celebrações e teve seu início na Itália, onde foi
estruturado, sendo, posteriormente, levado à França. Lá, em
1661, Luís XIV, fundou a Academia Real de Dança, que marcou
o desenvolvimento do balé clássico.
O balé tem variações de acordo com o país no qual foi de-
senvolvido (balé italiano, russo, cubano, inglês etc.). Chegou ao
Brasil na década de 1920.

Algumas bases técnicas e características:


1. Trabalho intenso dos membros superiores e inferiores,
tendo várias codificações para ele.
2. Na sua origem, uma busca pelo divino. Para alcançá-lo,
uso constante de saltos e de sapatilhas de pontas; movi-
mentos que tentam contrariar a gravidade e alcançar o
'~to".
3. l?ostura ereta.
4. Movimentos codificados e estruturados.
5. Privilégio de movimentos e gestos lentos e densos.
6. Utilização de coreografias com narrativas lineares e com
temáticas utópicas e/ou românticas.

DANÇA MODERNA
Começou pela contestação e rejeição do rigor acadêmico e
dos artifícios do balé, na busca de uma dança mais apropriada

II
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Dança: possíveis definições 37

ao momento em que se vrvia. Seu início data de, aproxima-


damente, 1811 e se desenvolveu principalmente nos Estados
Unidos e na Alemanha.

Algumas bases técnicas e características:


1. Introdução do uso do tronco.
2. Utilização do chão não só como apoio, mas como espaço
coreográfico e parte de movimentos.
3. Pés em total relação com o chão.
4. Movimentos livres e individuais.

DANÇA POPULAR
É aquela produzida espontaneamente numa comunidade
com laços culturais em comum. Inclui tanto as danças antigas
quanto as atuais e é realizada em festas, ritos e reuniões de um
povo. As danças populares (ou folclóricas) foram desenvolvidas
como parte das tradições e dos costumes de um povo e são
transmitidas de geração a geração. Apesar de serem preserva-
das por meio da repetição, essas danças acabam sofrendo trans-
formações em pequenos gestos e elementos graças à dinâmica
cultural de um povo.
No Brasil, como já citei anteriormente, há vários exemplos
de danças populares.
Norte: danças caracterizadas pela forte influência indígena
e portuguesa e coreograficamente marcadas por movimentos
ligados à natureza (fauna e flora). Exemplos dessas danças são
o Carimbó e o Siriá, ambas provenientes do Estado do Pará.
Nordeste: forte influência holandesa, portuguesa, indígena
e negro-africana. Dentre os instrumentos que acompanham os
contagiantes ritmos das danças nordestinas, estão a matraca, a
zabumba, o triângulo, o pandeirão e o acordeão. O Maracatu
e o Xaxado, do Estado de Pernambuco, o Bumba-meu-boi
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38 Dança

(presente em todo o litoral brasileiro, de norte a sul do país,


mas especialmente divulgado no Maranhão), e a Araruna, do
Rio Grande do Norte, são algumas danças do Nordeste.
Centro-Oeste: marcadas pela herança ibérica e indígena,
as danças dessa região caracterizam-se principalmente pelos
sapateados e palmas realizados ao som de pandeiros, violas de
cocho e caipira, tambores e reco-reco. Vale destacar a Catira, o
Siriri e o Cururu.
Sudeste: influenciadas pela cultura portuguesa, negro-afri-
cana e indígena, têm como representantes a Folia de Reis, a
Congada e a dança das Pastorinhas.
Sul: Marcadas pelos sapateados, as danças dessa região
tiveram como influência as culturas espanhola e portuguesa.
Exemplos dessas danças são o Malambo, o Xote Carreirinha e
as danças gaúchas.

Algumas bases técnicas e características:


1. Normalmente, privilegiam os pés, o quadril e os braços.
2. Em sua maioria, são feitas em pares ou em grupos.
3. Adereços e roupas típicos do povo e trabalhados junta-
mente com os movimentos durante a coreografia.

DANÇA CONTEMPORÂNEA
São inúmeras as dúvidas que surgem quando converso
sobre dança contemporânea em minhas oficinas e workshops.
Nada anormal quando nem acadêmicos e profissionais da área
definem com exatidão o que vem a ser esse "tipo" de dança.
Apesar das constantes questões, creio ser possível traçar mi-
nimamente uma possível definição no intuito de entender a
dança contemporânea.
Na verdade, a principal característica da dança contemporâ-
nea surge do próprio nome que traz a noção de temporalidade.

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Dança: possíveis definições 39

Não a noção de um tempo compartimentado, e sim de co-in-


fluências entre linguagens de diferentes períodos (MARINHO, si
data); de um diálogo entre distintas idéias. Nela podemos perce-
ber a interligação entre voz, movimentos, vídeos, textos e uso de
diversas outras técnicas para cena, trazendo, na complexidade
das relações, novas perguntas e idéias e, portanto, um constante
convite à reflexão. Não há maneira (tampouco necessidade) de
definir com clareza seu estilo. Na dança contemporânea, corpo,
movimento e outras propriedades da dança revelam suas pri-
mícias básicas, a capacidade de relacionar idéias de campos di-
ferentes de maneira coerente, seja os tipos de linguagem, seja a
própria gramaticalidade da dança (seu conjunto de caracteres de
movimento, espaço/tempo e demais propriedades) (MARINHO,
s/ data). Idéias de distintos períodos são deslocadas no tempo,
ganhando novas relações e interpretações.
Desse modo, a dança contemporânea não é assim chamada
somente porque está no tempo de agora, mas

[...] porque apresenta aspectos históricos deste tem-


po do mesmo modo que os desloca, exporta e relaciona
de uma maneira diferente do que antes se concebia.
(MARINHO, si data, p. 1)

Na dança contemporânea, para que se possa defini-la en-


quanto tal, não interessa a data, nem o tema. Ela também não
pode ser delimitada justamente pelo fato de estar mais rela-
cionada com pesquisas de linguagem que com uma linguagem
específica.

Algumas bases técnicas e características:


1. Uso do tronco nas suas diversas possibilidades.
2. Trabalhos mais intensos de pesquisas corporais.
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40 Danca
"

3. Intertextualidade.
4. Diálogo entre várias técnicas corporais.

Funções da dança

As manifestações artísticas fazem parte do sistema


de comunicação de cada povo e utilizam os recursos
expressivos que cada cultura vai criando, a depender
da sua época, região etc. São inúmeros os fatores que
provocam o desenvolvimento de técnicas e meios de
comunicação que, por sua vez, são determinados, ou
vêm determinar, as diversas linguagens expressivas. A
dança é uma linguagem expressiva da arte que vem
subsistindo em todas as culturas e em todos os tempos
e lugares. Por que será? Porque a dança continua tendo
função para o indivíduo e para a sociedade. (ROBATTO,
1994,p.111)

De fato, apesar de todas as suas outras facetas, é inerente à


dança seu caráter funcional, um dos motivos pelos quais segue
a sua trajetória na História e em diversos povos e culturas.
De acordo com Robatto (1994), as funções precípuas de
qualquer outra manifestação artística são as mesmas consti-
tuintes da dança, diferindo apenas nas especificidades da sua
linguagem. São elas: comunicação, auto-expressão, identifi-
cação cultural, diversão/prazer estético, ruptura do sistema e
revitalização da sociedade. Na verdade, a dança só se afirma
enquanto tal se puder atender a algumas dessas necessidades,
ou seja, se trouxer propostas de transformação, possibilitar
prazer estético ou estimular a reflexão da condição humana

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Dança: possíveis defm ições 41

política, afetiva, física, psíquica, intelectual ou social. Na ver-


dade, acredito que, como já citei anteriormente, não basta que
a dança atenda apenas à necessidade de prazer estético, uma
vez que qualquer movimento, ainda que não seja dança, pode
proporcionar essa diversão. Portanto, creio que a dança, de al-
guma forma, deve atender a essas cinco funções, mesmo que
com uma ênfase maior em uma delas.
Ao discorrer sobre as possíveis funções da dança, Robatto
afirma que a função da comunicação é

[...] do homem para consigo mesmo (individual);


do homem para com os outros (interpessoal); do ho-
mem para com o ambiente (relação com seu habitat);
do homem para com a sociedade (grupal e/ou tribal,
regional e universal); do homem para com o "divino"
(religioso). (ROBATTO, 1994, P: 112)

Na sua função comunicativa, a dança atua com o espectador,


reportando-o às suas memórias afetivas (por meio de imagens
significativas); trazendo até ele sensações corporais e cinestési-
cas (pela ressonância das sensações do corpo do dançarino); ou
ainda levando-o ao mundo das idéias (por meio de estímulos
mentais e símbolos conceituais).
A dança possibilita diversas reflexões, não só sobre o externo,
mas, principalmente, sobre o universo de quem dança. O processo
de descoberta e de crescimento na dança abre espaço para que o
dançarino seja capaz de analisar e questionar a si próprio, e essa
abertura revela a função auto-expressiva da dança.
A dança, porém, também contribui de forma significativa
para a formação, manutenção e recriação de elementos tradi-
cionais da cultura de diversos povos e, nesse sentido, ela permi-
te uma identificação cultural.
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Além das funções de auto-expressão e de identificação com


a cultura, não há como negar outra muito reconhecida que é
a de proporcionar prazer. Tanto os dançarinos (amadores, no
seu lazer, e/ou profissionais, na sua auto-realização) quanto o
público podem se deleitar na realização de um trabalho coreo-
gráfico.
Sobre a função de ruptura do sistema e revitalização da
sociedade, optei por transpor as palavras de Robatto, quando
diz que

as artes sempre tiveram uma atuação na renovação da


cultura pela sua natureza indagadora dos sentimentos,
pela sua capacidade de sonhar e criar um mundo
utópico e ideal, pela sua irreverência natural às verdades
estabelecidas, pela sua eterna busca de novas soluções,
consideradas por muitos governos como ameaça
político-revolucionária e, por isso mesmo, perseguida
pelos regimes de governos totalitários. (ROBATTO, 1994,
p. 111)

De fato, a dança como manifestação artística tem a função


de promover reflexões sobre as questões sociais e de instigar
novos possíveis horizontes para o funcionamento da socieda-
de.
Como lugar de transformação e reflexão, a dança sempre
esteve presente durante toda a História. Nesse momento, é
necessário que se faça um breve panorama histórico da dança
para que a entendamos hoje.

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Ahistória da dança é muito mais difícil


de sejuntar, devido ao fato de que dança não
pode ser gravada na escrita. (KERKHOVEN,
1993, p. 30)

[...] conhecer sua história é lançar um


olhar sobre os caminhos que nos trouxeram
até o que hoje fazemos [...] e nos ~uda
a identificar o que temos de aprender e,
também, aquilo que nós podemos, de fato,
oferecer. (CONRADO, 2005, p. 29)
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44 Dança

Pequena história geral da dança


A dança, para todos os povos, em todos os tempos, foi, ba-
sicamente, a forma encontrada para se expressar pelo uso dos
movimentos corporais de forma organizada sistematicamente,
numa lógica expressiva, e que transcendem o poder das pala-
vras e/ou da mímica.
Desde os primórdios das civilizações, a dança é vista e tra-
tada não apenas como jogo, esporte ou espetáculo, mas como
celebração e forma de participação efetiva na sociedade e da so-
ciedade. Os homens sempre dançaram seus momentos solenes
e festividades reafirmando o fato de que a dança, naturalmente,
era e é parte integrante da relação homem/ambiente.
No Egito, a dança tinha um caráter sagrado e estava pre-
sente em vários cerimoniais. Pelo cuidado na repetição dos mo-
vimentos, os egípcios foram levados à primeira notação gráfica
de dança, por meio de hieróglifos. Já na Grécia, tendo grande
importância, a dança aparecia em mitos, lendas, cerimônias e
literatura, além de ser uma disciplina obrigatória na formação
do cidadão. Na China e no Japão, a dança era parte de rituais e
tradições que permanecem até hoje.
O período da Idade Média (século 5°), chamada de idade
das trevas, teve como forte característica o triunfo da Igreja, que
condenou tudo que era considerado constituinte do mundo e
causador de sua corrupção. Assim, a arte, considerada um des-
ses constituintes, como denúncia dessa "decadência humana",
acabou sendo condenada e proibida. Além disso, pela crença
no dualismo humano, passou-se a desprezar o corpo para a
santificação da alma, o que também resultou no desprezo da
dança, totalmente relacionada com ele. O pensamento dualista
influenciou várias áreas da sociedade, inclusive a arte. Assim,
várias proibições ocorreram no campo artístico. Teatros foram

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História da dança 45

fechados, pantomimos tornaram-se ambulantes, e, com relação


à dança, a atitude foi dúbia: alguns a toleraram, outros a con-
denaram. Mas, apesar dessas proibições, a tradição do povo era
tão forte que a dança ainda podia ser encontrada nas rodas dos
camponeses e nas festas populares, livremente improvisada ao
som de instrumentos rústicos. Também permaneciam as basses
danses, danças da nobreza, envoltas pelas máscaras e vestimen-
tas pesadas da época.
Já no período do Renascimento (séculos 15 e 16), o espa-
ço para a dança cresceu graças às mudanças que esse período
trouxe ao pensamento e à forma de vida. Com o humanismo e
o antropocentrismo, retomou-se a valorização do corpo e seus
potenciais. A dança passou, então, a ser absorvida de forma
maior pelas classes dominantes que a adaptaram cada vez mais
à execução em recintos fechados. A espontaneidade foi subs-
tituída por uma postura estudada e movimentação codificada.
Esse processo determinou o surgimento do balé de corte e de
seus "mestres", cuja função era ensinar a coreografia e criá-la de
acordo com o tema encomendado pelo senhor que o contrata-
ra. Importante ressaltar que a participação no balé de corte era
exclusivamente de homens. As mulheres não podiam atuar, e
os papéis femininos eram desempenhados por homens traves-
tidos ou fantasiados de mulheres.
O apogeu do balé de corte foi em 1661, quando o rei
francês Luís XIV criou um grupo de instrutores de dança, a
rlcadêrnie Royale de Danse, para codificar as danças de corte,
tendo na direção Charles Louis Beauchamp. Considerando-se
a necessidade de melhor técnica, profissionais treinados co-
meçaram a substituir os amadores fidalgos que anteriormente
participavam dos entretenimentos da corte. Os primeiros balés
consistiam em uma sucessão de danças com música e poesia, e
os bailarinos usavam máscaras e pesadas fantasias. Entretanto,
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46 Dança

aumentava o interesse em tornar o balé uma forma dramática,


de modo que a própria dança transmitisse trama e emoção. O
principal estímulo às mudanças veio de Jean Georges Noverre,
que colaborou para a eliminação das perucas, máscaras e tam-
bém para a introdução de gestos mais naturais e de maior ên-
fase na ação dramática.
O balé começou a se expandir e foi absorvido de diferentes
formas em diversos países. Nos Estados Unidos, pode-se per-
ceber um balé que exige mais rapidez e energia. Já o balé britâ-
nico é mais apurado e detalhista. Na Rússia, o balé tem como
características principais o virtuosismo e a grandiosidade dos
espetáculos, além de uma técnica exigente e rígida, enquanto
na França o balé pode ser caracterizado como mais bonito e
decorativo. O balé percorre até hoje muitas culturas e países
distintos e, pelas diferentes absorções da técnica, vem sendo
sempre ampliado e enriquecido.
Voltemos ao início do século 20. Nesse período, colocou-
se em questão o pensamento renascentista com seus dogmas e
postulados. O balé clássico, que até então atendia às aspirações
do Renascimento, também foi questionado, e começaram a sur-
gir aqueles que contestariam o seu rigor acadêmico e suas duras
formas. Especialmente pela participação crescente de mulheres
na dança e por ser o balé direcionado, na sua técnica, para ho-
mens, a classe feminina teve grande participação nessa busca por
movimentos individuais e por uma dança mais apropriada ao
seu corpo e seus ideais. Por terem como contexto os resultados
da Primeira Guerra Mundial, os bailarinos não encontravam
mais no balé os meios necessários e adequados para sua expres-
são, criando assim novos códigos para tal. Entre os pioneiros do
movimento, estão as americanas Isadora Duncan, Loie Fuller
e Ruth Sr. Denis, o suíço Emile Jacques-Dalcrose e o húngaro
Rudolf von Laban. Foi assim que nasceu a dança moderna, na

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História da dança 47

qual se pode notar duas escolas: a européia (Alemanha), com


Mary Wigman, e a americana (Estados Unidos), com Martha
Graham. No pensamento moderno, pode-se perceber a preocu-
pação com a utilização de coisas funcionais, sem muitos adere-
ços. A dança também refletiu esse pensamento nas coreografias
sem excessos de formas e caracterizada por alguns princípios
estruturais, como, por exemplo, a composição fortemente rela-
cionada com a música e narrativas.
É importante destacar que a dança moderna não tinha como
objetivo a criação de uma nova linguagem que estivesse em
direção contrária à do balé clássico. Ao contrário, tinha como
pretensão descobrir possibilidades que adequassem e instru-
mentalizassem o corpo do século 20 para uma real expressão
de acordo com aquela nova época. É importante ressaltar ainda
que o movimento da dança moderna deve ser destacado do
balé moderno no século 20, com preconizadores como Nijinski
e Maurice Bejárt.
A transição da dança moderna para a dança contemporânea
se deu, principalmente, por meio de Pina Bausch (Alemanha),
com o teatro físico e a dança-teatro (com seus elementos e ações
dramáticos), e com Merce Cunighamm (Estados Unidos), que
trabalhou a essência da dança e o movimento pelo movimento.
Seu trabalho também estabeleceu um marco pela sua pesquisa
da relação dança-música num trabalho conjugado com o mú-
sico John Cage.
A próxima mudança ocorrida na dança pode ser percebi-
da principalmente em meados da década de 1980 e início da
década de 1990 na utilização de coisas afuncionais nos espe-
táculos com o intuito de criar sensações, relações etc. Uma das
principais características da dança contemporânea, como já
explicitado anteriormente no primeiro capítulo, é a atuação de
linguagens provenientes de períodos distintos numa conversa
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48 Dança

entre idéias e informações diferentes. A narrativa deixa de ser


linear, com começo, meio e fim, e ganha um novo formato,
caracterizado, principalmente, pela discussão, reflexão e am-
pliação de uma temática. Uma busca por esmiuçar a idéia com
a qual se está trabalhando na tentativa de suscitar outras sig-
nificações que não apenas as já conhecidas, além de reflexões
e sensações no público. Um jogo entre materiais de diferentes
campos de linguagem objetivando expressar o máximo possível
da temática proposta.
No Brasil, há muitos representantes da dança contemporâ-
nea. Observe, a seguir, alguns representantes da dança contem-
porânea e eventos periódicos na área:

AMAZONAS - Mostra de Dança de Manaus.

BAHIA - VilaDança, TranChan Cia. de Dança, Ateliê de


Coreógrafts e Quarta que Dança.

CEARÁ - Bienal de Dança do Ceará.

DISTRITO FEDERAL - Cia. Márcia Duarte, FestivalInterna-


cional da Nova Dança.

ESPÍRITO SANTO - Quorum Cia. de Dança.

GOIÁS - Quasar Cia. de Dança.

MINAS GERAIS - Mimulus, Balé de Rua, Cia. de Dança de


Minas Gerais, Cia. Seráque?, Campanha de Popularização
do Teatro e da Dança, FID, Festival de Dança do Triângulo,
Benvinda, Grupo 10 Ato, Vis Grupo de Dança.

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História da dança 49

PARAÍBA - Companhia de Dança do Teatro Municipal

PERNA1v1BUCO - Compassos Cia. de Dança, Festival de Dança


do Recife.

PIAUÍ - Balé da cidade de Teresina.

PARANÁ - Veroe Cia. de Dança, Casa Hoffman Centro de


Estudos do Movimento, Dança Curitiba Circuito.

RIo DE JANEIRO - Ana Vitória Dança Contemporânea,


Deborah Colker; Cia. Regina Miranda e Atores Bailarinos,
Lia Rodrigues Cia. de Dança, Márcia Milbazes Dança
Contemporânea, Márcia Rubin Cia. de Dança, Pulsar Cia. de
Dança, Renato Vieira Cia. de Dança, Circuito Brasil Telecom
de Dança, Panorama RioArte de Dança, Solos de Dança no
SESC.

RIo GRANDE DO SUL - Anima, Congresso Nacional de


Dança.

SANTA CATARINA - Grupo de Dança Cena 11, Mostra de


Dança de Florianópolis, Festival de Dança deJoinville.

SÃO PAULO - Baléda Cidade, Domínio Público, Nova Dança


4, Gestus Cia. de Dança, Bienal SESC de Dança, Festival de
Dança de Araraquara, O Feminino na Dança, O Masculino na
Dança, Circuito Brasil Telecom de Dança, Solos Duas e Trios.

SÃO LUIZ DO MARANHÃO - Pulsa Cia. de Dança.


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SODança

Nomes na história da dança


• Alicia Alonso (1921): importante bailarina, até hoje atua
como tal e é ainda diretora do Balé Nacional de Cuba.

• Alvin Ailey (1931): bailarino e coreógrafo, iniciou sua


carreira com Lester Horton (fundador da primeira com-
panhia de dança de várias raças). Em 1958, fundou sua
própria companhia, a única a expressar a cultura negra.

• Ana Pavlova (1881): bailarina russa que se tornou a mais


notável de sua geração, especialmente pelo seu comoven-
te solo em A Morte do Cisne.

• Catarina de Médicis: enquanto o balé tinha se desenvol-


vido apenas na Itália, Catarina de Médicis levou a Paris
o balé Comique de la Reine.

• George Balanchine (1904): bailarino americano, nascido


na Rússia, foi um dos maiores coreógrafos do balé mun-
dial. Revolucionou o balé europeu e americano com suas
criações abstratas.

• Isadora Duncan: preconizadora da dança moderna,


Isadora, ignorando os movimentos convencionais e se
inspirando na cultura grega e na música clássica, buscava
movimentos livres, com pés descalços e túnicas soltas.

• Jean Georges Noverre (século 18): autor de Lettres sur la


Danse et les Ballets, que trazia leis e teorias do balé, é um
dos mais importantes nomes nessa dança. Noverre criou
o balé dramático (história contada por meio de gestos) e

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História da dança 51

sempre reclamou figurinos mais simples e maior expres-


são na dança. Foi um grande transformador do balé na
,-
sua epoca.

• Luís XVI: também conhecido como rei Sol, fundou a


Academia Real de Dança, em 1661, considerada o berço
do balé profissional que deu grande impulso à dança.

• Marie Camargo: grande transformadora do balé clássico,


criou o jeté, o tas de basque e o entrechat quatre, além de
encurtar os vestidos até acima dos tornozelos e calçar
sapatos sem salto.

• Marie Taglioni (1832): criadora da sapatilha de ponta e


do futu (vestido semilongo, de tule, com corpete justo,
que possibilita maior liberdade para os movimentos) usa-
dos no balé clássico. Sua mais famosa criação foi a obra
La Sylphide.

• Marius Petipa: ajudou a transformar o balé na Rússia


ao ingressar no Balé Imperial Russo de São Petesburgo.
Criou A Bela Adormecida (1890) e O Lago dos Cisnes
(1895).

• Martha Graham (1893): coreógrafa, bailarina e professo-


ra americana, nascida na Pensilvânia, estudou com Ruth
Sr. Denis e participou de sua companhia. Rompeu com
as regras convencionais da dança do século 19, criando
sua própria técnica, que encantou o mundo. Com ela,
revolucionou a técnica, tornando-se uma das principais
figuras da dança moderna e contemporânea.
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52 Dança

• Maurice Béjart (1927): bailarino, escritor, diretor de tea-


tro, ópera e cinema, consagrou-se com a obra Sagração da
Primavera em 1959. Criou o Bt[jart Bailei Lausanne em
1985.

• Mikhail Baryshnikov (1948): bailarino norte-americano,


formado na Rússia, é considerado o maior bailarino das
décadas de 1970 e 1980.

• Mikhail Fokine: foi o primeiro coreógrafo da compa-


.nhia Balés Russos. Com Diaghilev, teve a oportunidade
de concretizar suas idéias criando importantes obras,
como O Príncipe Igor (1909), O Pássaro de Fogo ( 1910) e
Petrushka (1911).

• Pierre Beauchamp (1681): elaborou as cinco posições


básicas dos pés do balé clássico.

• Rudolf Nureyev (1938): bailarino e coreógrafo russo,


formado pelo balé Kirov, firmou-se como um dos mais
notáveis bailarinos do pós-guerra.

• Ruth St. Denin: esposa de Ted Shaw, ambos importantes


na história da dança moderna; Ruth tinha uma famosa
escola em Los Angeles onde desenvolvia um trabalho
inspirado nas religiões orientais.

• Sergei Diaghilev: fundador da companhia Balés Russos.

• Vaslay Nijinsky: um dos maiores bailarinos até hoje.

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História da dança 53

A Bíblia e a dança: história da


dança no povo de Israel

[...] num estágio inicial, possivelmente tão cedo


quanto o estabelecimento da comunidade cristã, a dan-
ça era descrita como urna das alegrias celestiais e como
parte da adoração da divindade pelos anjos e pelos salvos,
(BACKMAN, em Religious Dances in the Christian Church
and in the Popular Medicine, citado por HUF, 2002, p. 61).

É interessante refletir, por um breve momento, sobre qual


era a relação da nação de Israel na Antiguidade com a dança.
Isso porque, ao se estudar a sua história, pode-se perceber em
que dimensão se dava essa relação e refletir sobre a importância
da dança para esse povo, uma vez que os israelitas eram o povo
escolhido de Deus. Ainda que com poucos registros bibliográ-
ficos, busquei destacar alguns pontos importantes da dança no
meio desse povo.
A Bíblia nos revela a presença da dança em alguns livros
do Antigo e do Novo Testamentos, proporcionando, através de
suas páginas, importantes informações de como essa manifes-
tação acompanhava os significativos momentos da vida do povo
hebreu. Considerando as evidências encontradas na Bíblia, a
nação de Israel na Antiguidade dançava com freqüência em
diversas ocasiões. Como exemplo, podemos destacar Miriã
(Êx 15.20), que celebrou, dançando, a libertação dos israelitas
da escravidão egípcia, e Davi (28m 6.12-15), que dançou com
fervor perante a arca revelando a si mesmo diante do povo.
Pode-se distinguir, dentre as danças judaicas, as religio-
sas, executadas no templo e presentes nas festas de maio, na
festa dos tabernáculos e na festa das colheitas - três épocas
marcantes desse povo. Os fatos sociais, desde os mais simples
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54 Dança

aos mais relevantes, assim como as festividades agrícolas, eram


comemorados com canto, música e, muito freqüentemente,
com manifestações coreográficas.
As danças palestinas, na sua maioria, derivaram de danças
religiosas e foram também influenciadas por outras culturas,
com predominância da egípcia. As danças sagradas dos he-
breus expandiram-se e deixaram vestígios na Europa da Idade
Média. Há reminiscência de sua prática em muitas cerimônias
do passado e em algumas da atualidade.
Interessante registrar alguns versículos bíblicos que revelam
a presença da dança no povo hebreu:

• 2Sm 6.12-15: "Então informaram a Davi dizendo: O


Senhor abençoou a casa de Obede-Edom, e tudo quanto
é dele, por causa da arca de Deus. Foi, pois, Davi, e com
alegria fez subir a arca de Deus, da casa de Obede-Edom
para a cidade de Davi. Qpando os que levavam a arca do
Senhor tinham dado seis passos, ele sacrificou um boi e
um animal cevado. E Davi dançava com todas as suas
forças diante do Senhor; e estava Davi cingido dum éfo-
de de linho."

• 15m 18.6,7: "Sucedeu porém que, retornando eles, quan-


do Davi voltava de ferir o :filisteu, as mulheres de todas as
cidades de Israel saíram ao encontro do rei Saul, cantan-
do e dançando alegremente, com tamboris e com instru-
mentos de música. E as mulheres, dançando, cantavam
umas para as outras, dizendo: Saul feriu os seus milhares,
porém Davi os seus dez milhares."

• Lc 15.25-27: "Ora, o seu :filho mais velho estava no


campo; e quando voltava, ao aproximar-se de casa, ouviu

! I ti' I I ' I"


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História da dança 55

a música e as danças; e chamando um dos servos, per-


guntou-lhe que era aquilo. Respondeu-lhe este: Chegou
teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o
- e salvo."
recebeu sao vo.

• Êx 15.20,21: "Então Miriã, a profetisa, irmã de Arão,


tomou na mão um tamboril, e todas as mulheres saíram
atrás dela com tamboris, e com danças. E Miriã lhes res-
pondia: Cantai ao Senhor, porque gloriosamente triun-
fou, lançou no mar o cavalo com o seu cavaleiro."

• Jz 11.34: "Quando Jefté chegou a Mispá, à sua casa, eis


que a sua :filha lhe saiu ao encontro com adufes e com
danças; e era ela a filha única; além dela não tinha outro
filho nem filha."

• ]z 21.21,23: "e vigiai; ao saírem as filhas de Siló a dançar


nos coros, saí vós das vinhas, arrebatai cada um sua mu-
lher, da :filhas de Siló, e ide-vos para a terra de Benjamim.
[...] Assim fizeram os filhos de Benjamim; e conforme o
seu número tomaram para si mulheres, arrebatando-as
dentre as que dançavam; e, retirando-se, voltaram à sua
herança, reedificaram as cidades e habitaram nelas."

• ler 15.29: "E sucedeu que, chegando a arca do pacto do


Senhor à cidade de Davi, Mical, a filha de Saul, olhou
duma janela e, vendo Davi dançar e saltar, desprezou-o
- "
no seu coraçao.
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Nossas mentes ainda se apegam à idéia


de que dentro de cada homem há uma
divisão entre mente e corpo. (FERNANDES,
2000, p. 21)

Corpo na igrej_a _
A busca pela definição do que vem a ser alma,
corpo e espírito, constituintes do ser humano, tem
sido uma constante entre os teólogos e filósofos
cristãos desde muito tempo, e ainda o é nos dias
atuais. Apesar dessa contínua investigação, é fato
que a igreja cristã acabou sendo grandemente
influenciada por alguns pensamentos antigos que
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58 Dança

interferem, até hoje, na relação do cristão com seu corpo. E,


para entendermos a visão de corpo na igreja e sua atuação na
dança, é preciso traçar, ainda que minimamente, o caminho
que o conceito de corpo percorreu na História.
Ao voltarmos o olhar para o pensamento antigo, alguns
filósofos se destacam pela sua influência. Sócrates (470-399
a.C.) é um desses e propunha que "o homem é a sua alma".
Nessa idéia, o homem usa seu corpo como instrumento para
se fazer ser existente e concreto. Platão, seguidor de Sócrates
(427-347 a.C.), também teve grande relevância, e sua linha de
pensamento se diferenciava da de Sócrates por considerar o
homem como um ser racional que não tem o corpo como um
instrumento, mas como um obstáculo. Nesse sentido, o corpo
impede nossa realização plena, e é daí que surge o dualismo
corpo versus alma. A visão platônica teve grande influência
na construção do pensamento cristão, e, ainda hoje, este vê o
corpo como um obstáculo para a santificação. Não é à toa que
muitos ainda acreditam na autoflagelação, crendo que, quanto
mais violentarem o próprio corpo para enfraquecê-lo e o anu-
larem, mais terão a alma santificada e elevada.
Ao olharmos para a tradição cristã, vemos, portanto, uma
grande influência de filósofos gregos que entendem o corpo
como energia biológica, alma como sede dos pensamentos e
espírito corno energia vital divina. Basta destacar Agostinho
(357-430 a.C.), platônico em sua linha de pensamento, ou
ainda Tomás de Aquino (1227-1274 a.C.), aristotélico. Visto
isso, concordo com Ed Renné Kivitz (2003) quando diz que a
tradição cristã cometeu um grande equívoco ao interpretar os
escritos apostólicos à luz da filosofia grega, em vez de o Antigo
Testamento e o pensamento judaico (p. 135).
Por outro lado, os autores do Novo Testamento utilizaram
um mesmo termo para indicar corpo, alma e espírito, com base

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A questão do corpo 59

no judaísmo veterotestamentário que apresenta o ser humano


como um todo indivisível. Apesar de reconhecerem a distinção
entre o homem interior e o exterior, não consideram um mau,
e o outro bom e, sim, interdependentes. Por essa razão é que
o hebraico não possuiu uma palavra explícita para corpo, uma
vez que nunca precisou dela, já que o corpo era o homem. A
crença é a de que somos compostos por dois elementos - um
material e outro imaterial-, dissociados na morte, e de que na
ressurreição surge um novo corpo (KIVITZ, 2003, p. 136).
Kivitz, ao discorrer sobre esses conceitos :filosóficos do cor-
po, propõe uma nova equação na tentativa de esclarecer essa
questão. Sugere, então, a seguinte equação:
Alma vivente = pó da terra + fôlego de vida
Nessa proposta, Kivitz explica que o "complexo mente-
sentimentos-vontade, que em Deus é um atributo do espírito,
no ser humano ganha mais uma dimensão - o corpo - , e
essa soma entre os atributos do espírito mais um corpo físico
é o que a Bíblia chama de homem, ser humano, isto é, alma
vivente". (p. 137)

° °
[...] nem corpo é a prisão do espírito, porque ide-
al de Deus nunca foi que eu me libertasse de meu cor-
po. Ele não criou espíritos vocacionados a desencarnar.
Tampouco criou corpos vocacionados a se absolutizar,
O que Deus criou foi a alma-vivente, isto é, a unidade
inseparável corpo-espírito (KIVITZ, 2003, p. 137).

A alma seria, portanto, o conjunto corpo e espírito, e corpo


e espírito são inseparáveis.
Também podemos perceber algumas exceções na história
do cristianismo que vão de encontro ao pensamento grego dua-
lista. Robinson Cavalcanti (1993) nos lembra da construção
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60 Dança

integrada da noção de deificação, ou união com Deus, que,


para os ortodoxos orientais, passa por todo o ser, e não somente
pela alma. Outra exceção também citada por Cavalcanti Cp. 35)
pode ser percebida na diferenciação entre corpo (soma) e carne
(natureza caída) no pensamento dos reformadores protestantes.
Um deles, Lutero, buscava promover uma reflexão ao lembrar
que Jesus teve um corpo e nunca pecou, enquanto o demônio
não tem corpo e peca o tempo todo. Vale lembrar ainda dos
progressistas católicos romanos que seguem um processo de
revalorização do corpo, enquanto amplos setores do protestan-
tismo professam uma agressiva visão anticorpo.
Apesar dessas exceções, é fato que o dualismo grego (maté-
ria má versus espírito bom) ainda pode ser percebido nas mar-
cas deformantes que foram deixadas no pensamento cristão
quanto à matéria.
Cavalcanti (1993), em seu artigo Por uma teologia do corpo,
afirma a necessidade de mudança no pensamento da igreja, no
que diz respeito ao corpo, ao dizerr I'A igreja - veículo de sal-
vação do homem todo - tem a responsabilidade de zelar pe-
los corpos que um dia, transformados, ressuscitarão" (p. 156).
Discute ainda como o meio protestante sacraliza algumas ma-
nifestações artísticas, como música e literatura, e sataniza ou-
tras' como dança, moda e cinema. Ao observar essas questões,
fica clara a dificuldade que o evangélico tem de lidar com as
coisas do corpo - pintura, escultura e dança - , mas tem dis-
posição (apenas) para as coisas do "espírito" - poesia, música,
literatura (p. 73). De fato, o caminho percorrido pelo conceito
de corpo na história da igrej a cristã não colabora nem para a
presença nem para a excelência da dança. Pelo pensamento de-
turpado, a dança até hoje não consegue se relacionar de forma
sadia com o corpo, como também nós, os cristãos evangélicos,
continuamos a não estabelecer relações positivas entre o nosso

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A questão do corpo 61

corpo e a nossa fé. Paradoxo? Sim. Absurdo? Também. Afinal,


é pelo corpo que existimos aqui na Terra.
O que sinto na igreja é ainda uma busca por uma dança sem
corpo. Impossível? Certamente, mas a maioria de nós ainda
não crê nisso de fato. Só para variar, os "conceitos" de uma dan-
ça ligada ao corpóreo existem em algumas poucas mentes, mas
ainda não atingiram o corpo. Mais uma vez, a teoria separada
da ação; o pensamento desligado do corpo; no fim, uma dança
apenas de idéias.
Restam-nos ainda muitas outras questões no que tange à
relação entre corpo e igreja, mas opto por finalizar (ou iniciar)
essa reflexão, concordando com Cavalcanti ao propor que bus-
quemos "[... ] um cristianismo relacionado com a nossa cultura
lática tropical que substitua sua chatice legalista por uma cida-
dania lúdica. Dancemos a nossa fé" (p, 159).

Corpo na dança
A dança é uma manifestação artística na qual o corpo é a
principal matéria utilizada. Cada técnica em dança tem uma
compreensão e uma utilização diferente do corpo. Partes dele
destacadas em algumas dessas técnicas podem não ter tanta
ênfase em outras. De qualquer forma, seja qual for a técnica,
o corpo sempre será um local de descoberta e de percepções e
deve ser constantemente estudado e pensado por quem quer
trabalhar com a dança.
Quando se trata do corpo na dança, deve-se lembrar, pri-
meiramente' que ele é sempre um lugar de transformação e
de passagem. Transformação, porque as informações que nele
chegam passam por um processo de mutação, ao se chocarem e
se relacionarem com as próprias vivências, posturas e questões
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62 Dança

desse corpo. Passagem, porque dali essas informações transmu-


tadas seguem viagem para os corpos daqueles que presenciam
sua dança.
Portanto, o corpo na dança deve estar sempre aberto e
atento para as contínuas mudanças que ocorrem nele e que
são produzidas por meio dele. O corpo que dança nunca é o
mesmo e sempre se modifica (alguém, algum lugar, alguma
coisa etc.),
Além disso, o corpo também é parte da obra de arte do
dançarino, bem como é o próprio indivíduo à medida que ele a
constrói, como diz Marina Martins (2003) a seguir:

Na qualidade de fenômeno artístico, o corpo é, si-


multaneamente, objeto pelo qual o artista produz seu
discurso simbólico, veículo sensível que traz à superfície
inúmeras intenções e vozes ocultas, e sujeito que ela-
bora poeticamente as informações e experiências vivi-
das. Assim, transmuta palavras, sensações e intenções
em imagens que integram posturas, atitudes e gestos,
fundindo a massa corporal com a fluidez da alma.
(MARTINS, 2003, p. 37)

Seguindo para questões mais práticas, há ainda outros pon-


tos nos quais se deve pensar, e o primeiro deles relaciona-se aos
aspectos de um trabalho corporal do dançarino. Lia Robatto
(1994) menciona três aspectos que devem ser considerados: ca-
pacidade técnica (preparo corporal e condicionamento físico);
consciência e domínio dos princípios do movimento relativos
a espaço, tempo e intensidade; e sensibilidade e expressivi-
dade gestual interpretativa. Obviamente, essa é uma divisão
puramente didática, pois, na dança, o movimento só pode ser
percebido na sua totalidade (p. 269). Mas, ao fazer uma análise

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A questão do corpo 63

de cada aspecto separadamente, algumas questões interessantes


devem ser destacadas.
A capacidade técnica só pode ser alcançada e mantida me-
diante um trabalho consistente, eficiente e contínuo do corpo.
Fiório (s/data) afirma ainda que

[... ] os conteúdos de anatomia e fisiologia aborda-


dos, durante o desenvolvimento do trabalho diário em
dança são ferramentas que ajudam na instrumentali-
zação dos dançarinos. Entendemos que, nessa prática,
essa abordagem nos auxilia, tanto no sentido de manter
a integridade física, quanto de proporcionar o conhe-
cimento das potencialidades, habilidades e qualidades
expressivas que podem vir a desenvolver. (FIóRIo, si
data, p. 1)

Nesse sentido, portanto, o trabalho corporal deve estar as-


sociado a um conhecimento do próprio corpo no intuito de
dar subsídios ao dançarino, no que diz respeito às suas possi-
bilidades corporais e expressivas, além de prover instruções na
prevenção de lesões e agressões físicas.
Já o domínio da linguagem só pode ser adquirido
[... ] através de uma atuação prática e analítica na
conscientização dos seus princípios, capacitando o dan-
çarino a reconhecer e diferenciar as qualidades dos seus
movimentos, ampliando, dessa maneira, o seu vocabu-
lário corporal. (ROBATTO, 1994, p. 270)

Em Fiório, esse domínio da linguagem pode estar relacio-


nado com a coordenação motora dos movimentos dos dan-
çarinos que será alcançada à medida que for praticada (p. 2).
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64 Dança

Fatores que constituem os movimentos, tais como tensão, di-


reção, equilíbrio e unidade, estão diretamente relacionados à
coordenação motora. A coordenação, por ser a ligação entre
os movimentos, é importante porque, na dança, não há como
compreender um movimento sem uma consciência ampliada e
domínio do corpo como um todo.

Verificamos que a organização do movimento é


bastante complexa, indo muito além da interligação dos
sistemas ósseo, articular, muscular e nervoso. Mesmo
quando nos atemos a um recorte do movimento para
estudá-lo, a inteireza corporal está sempre presente.
Se uma determinada emoção tensiona em demasiado
um músculo, este pode puxar um osso e tirá-lo de seu
alinhamento, causando assim um desequilíbrio ou um
erro postural. (FIÓRIO, s/data, p. 2)

Merce Cunningham (s/data), certa vez, disse que não


há como descrever a dança sem descrever o dançarino.
Complemento dizendo, ainda, que não há como descrever o
dançarino sem descrever seu corpo. É por essa razão que a
consciência corporal é essencial para o crescimento e aprimo-
ramento de qualquer dançarino. É importante que cada dan-
çarino busque se autoconhecer. Tentar responder a questões
do tipo: "Como é o meu corpo?"; "Como utilizo esse corpo
no meu dia-a-dia?"; "Como respondo aos meus sentimentos
(alegria, raiva, preocupação etc.)?"; "Que parte do meu corpo
utilizo mais nessas minhas respostas?"; essas são perguntas
importantes nesse processo. É preciso que o dançarino tenha
um conhecimento, mesmo que mínimo, do seu corpo e da
utilização dele em suas expressões. Uma vez que o mecanismo
corporal pode ser definido como uma relação funcional entre

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1-. I" I ' Ii ' 11, ~ "11" i '
• I 11111
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A questão do corpo 65

as várias partes do corpo, é preciso que o dançarino esteja


consciente de seu corpo para que haja um bom funcionamento
desse mecanismo na dança.
I á a expressividade gestual pode ser algo natural de al-
guns indivíduos. Mas, de qualquer forma, faz-se necessário o
desenvolvimento de uma técnica de interpretação para uma
consolidação dessa expressividade. Com relação a essa questão,
Fiório diz que estamos, desde que nascemos, aprendendo for-
mas para nos relacionarmos com nosso próprio corpo. Somos
submetidos a repetições de modelos de movimentos e, assim,
construímos um vocabulário social. Apesar de esse processo
facilitar nossa comunicação, a repetição de um vocabulário
acaba dificultando a nossa capacidade expressiva. Com movi-
mentos pré-codificados, "[...] dificilmente conseguimos criar
novos movimentos ricos em expressividade" (VIANNA, 2005,
p. 60). Para que o dançarino consiga descobrir sua expressi-
vidade própria, são necessárias a observação e a internaliza-
ção das percepções ao realizar seus movimentos. A repetição
atenta dos movimentos próprios traz à tona sensações que
auxiliam o dançarino na construção e no entendimento de
sua expressividade. E "[...] a descoberta da individualidade
e, conseqüentemente, da criatividade e da expressividade é
prioritária para quem deseja fazer da dança um meio de co-
municação corporal" (FIÓRIO, si data, p. 4).
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Uma coreografia por (sic) ser entendida


como um texto que pode ser recortado em
unidades gestuais significantes. O signifi-
cado de um gesto é dado por um contexto
coreográfico. (DANTAS, 1999, p. 69)

Coreografia é uma palavra de origem grega:


choreia quer dizer dança, e grapho, escrita. Dessa
forma, tem-se escrita da dança.
A dança é uma forma de pensar o mundo co-
reograficamente. As coreografias "escrevem" por
meio de movimentos corporais uma visão distinta
do mundo. Dentro do meio evangélico, há muitas
dúvidas quando se fala em grupo de coreografia e
grupo de dança. Talvez na tentativa de não "chocar"
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68 Dança

com a palavra dança, adotamos coreografia como um estilo que


significa, assim,
...
algo mais ameno e sem grandes movimentos;
mais gestual. E importante esclarecer essa questão e tentar de-
finir o que é, de fato, coreografia.
Como dito anteriormente; uma coreografia pode ser defi-
nida como um texto escrito por meio de movimentos e gestos
tornados signos artísticos (para saber mais sobre o movimento
enquanto signo, leia o primeiro capítulo). Quem "escreve" a
coreografia é chamado coreógrafo, que é, portanto, quem lida
com as pesquisas corporais de movimentos e "costura-os" den-
tro de uma seqüência significativa.
Para a efetivação de uma coreografia, é preciso que ocor-
ram alguns estágios num processo criativo. Obviamente, esses
estágios podem acontecer simultaneamente, uma vez que não
são fases estanques nem ocorrem numa ordem cronológica.
Esses distintos momentos interagem entre si e fornecem uns
aos outros subsídios e informações para que cada um se efetive
enquanto parte de um processo de criação. Há várias teorias e
opiniões com relação a quais são esses estágios e sobre como
eles acontecem, mas optei por selecionar partes interessantes
de algumas dessas teorias e resumí-las em cinco estágios dis-
tintos.
O primeiro estágio que gostaria de comentar (lembre-se de
que o fato de apresentá-lo primeiro não significa que haja uma
ordem para o acontecimento desses estágios) é o da motivação.
Essa fase envolve um desejo ou necessidade de trabalhar com
algo - um tema, um objeto, uma crítica, uma experiência ou
um sentimento, dentre tantas outras informações - que servirá
como estímulo para a construção de um trabalho coreográfico.
É nesse momento também que podem ocorrer improvisações
- pesquisa corporal por meio de movimentos livres e descom-
prometidos - que poderão sugerir movimentações distintas e

I I . I I ti' I I ' j " .


I· II 11· MI '1 i' . ,,+ I
• I 1111,
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Sobre coreografia 69

sensações específicas para a coreografia. Mas apenas a criação


livre não conseguirá sustentar um trabalho coreográfico pleno.
Como diz Robatto,

a criação espontânea, por mais genial que seja,


pode findar dispersando-se por falta de uma discipli-
na mínima, assim como o excesso de disciplina pode
cercear a liberdade da fantasia e a imaginação criadora.
(ROBATTO, 1994,p. 190)

Portanto, é importante que se tenha em mente que um


processo de improvisação e pesquisa corporal, na montagem de
uma coreografia, deve ser acompanhado de escolhas embasadas
nas necessidades do trabalho. Não basta uma espontaneidade
de movimentos, bem como não é aconselhável que se vivencie
esse processo de forma dura e/ou limitadora. Ambas são
necessárias: tanto a improvisação corporal quanto a disciplina
para a tomada de decisões.
~loração é o segundo estágio sobre o qual quero co-
mentar. Nele o dançarino trabalha de forma mais consciente e
planej ada na investigação, corporal ou não, de elementos, mo-
vimentos, estímulos e necessidades importantes na construção
do trabalho. Nessa fase, também ficarão visíveis os pontos altos
da coreografia, o que deve ser descartado ou apenas deixado de
lado por um tempo, as qualidades e problemas da coreografia e
aquilo que deverá ser produzido de alguma forma.
Outro estágio importante é o da seleção. Obviamente, ela
percorre todo o processo, uma vez que o coreógrafo/dançarino
está sempre fazendo escolhas sobre o que incluir, o que excluir,
o que privilegiar etc. Mas há um momento no qual as decisões
são tomadas de forma mais dura, e é nesse estágio que fica
clara a proposta do trabalho, as maneiras pelas quais esta será
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70 Dança

apresentada, os materiais utilizados etc. Algumas escolhas serão


claramente feitas; outras serão quase intuitivas.
O quarto estágio a ser comentado é o da construção, e é aí
que o trabalho ganha corpo e estrutura. O momento da cons-
trução é aquele no qual as idéias são organizadas e produzidas.
Poderia chamar essa fase também de produção efetiva, ou "mão
na massa", como sempre dizemos. De fato, é nesse estágio que o
trabalho ganha delineações e já pode ser revelado ao público.
O quinto e último estágio que quero citar chamo de efetiva-
ção, porque é nesse momento que o trabalho acontece e é apre-
sentado a outros olhares que não os dos criadores e produtores.
Esse estágio também poderia ser chamado recepção porque o
trabalho certamente será influenciado por esses outros olhos,
será reconstruído e ganhará novos contornos.
É importante lembrar novamente que esses estágios se
mesclam durante um processo criativo e não há como ter
domínio sobre eles. Mas tê-los em mente pode clarear o
caminho da composição coreográfica.
Ao construir uma coreografia, o coreógrafo lidará com al-
guns elementos. Creio ser importante comentá-los: movimen-
to, estímulo e outros elementos de construção.
Ao pensar nos movimentos de uma coreografia, é im-
portante destacar que eles devem compô-la com a finalidade
de satisfazer a necessidade de expressão, e não apenas de ser
original, diferente ou bonito. É necessário falar sobre isso por-
que, quando o assunto é movimento corporal, percebo uma
grande confusão no meio evangélico. Seja pelo pensamento
dicotomista impregnado em nosso corpo, seja pela acomoda-
ção em não procurar o aperfeiçoamento contínuo, seja ainda
pelas limitações causadas por inúmeros motivos, o fato é que
a grande maioria dos evangélicos, especialmente os de igrejas
mais tradicionais, não sabe lidar bem com a questão do corpo e

,I , • ~ ~j I '. ~ I ,11 ' I j." I; II ' di, '" I 1111,


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Sobre coreografia 71

dos movimentos que esse corpo é capaz de realizar. Isso acaba


gerando coreografias "evangélicas" pobres, repetitivas e mo-
nótonas. Acredito piamente que, no processo de composição
coreográfica, é primordial que se busque uma forte pesquisa
corporal, como já disse anteriormente. E em se tratando de
nós, evangélicos, essa necessidade é ainda maior e deve ser pre-
enchida com uma atenção e vivência corporal proporcional ao
seu tamanho.
Doris Humphrey, em seu importante livro The Art of
Making Dances [A arte de fazer danças] (1980), aponta uma
lista de verificação (check-list) na qual cita, dentre outros pontos,
alguns equívocos que podem ser cometidos por todos aqueles
que participam de um processo de elaboração coreográfica.
Dentre estes, gostaria de comentar alguns que creio serem de
extrema relevância para a nossa realidade em questão.
"Os olhos são mais rápidos que os ouvidos." O que
Humphrey quis dizer com isso? A resposta para tal pergunta
está diretamente relacionada à produção evangélica em dança.
Ao fazer tal afirmação, Humphrey quer dizer que não podemos
nos esquecer de que a dança é uma arte, acima de tudo, visual
e será primeira e instintivamente absorvida pelo olhar do es-
pectador. Não preciso nem entrar em detalhes quanto ao que
temos visto no meio evangélico. A preocupação com a música
(e em especial com a letra) e com uma (quase) representação
do que a música diz é ponto alto na esmagadora maioria das
coreografias ditas "evangélicas". Não sei se por esquecimento
ou falta de conhecimento, os coreógrafos e grupos de dança
do nosso meio não têm produzido as composições coreográ-
ficas da igreja com base nesse princípio que poderia modificar
muito a apresentação, e para melhor. Coreografar, ainda que
utilizando estímulos sonoros como aliados, não significa que a
música terá maior alcance que a dança e que, tampouco, deve
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72 Dança

atuar como guia dos movimentos. Absorvemos de forma mais


eficaz tudo aquilo que nos chega pelos olhos, e isso quer dizer
que um movimento "chega antes". Aliar a música a um tra-
balho coreográfico? Sim. Estabelecer relações de troca entre a
música e a dança? Sim. Aprisionar os movimentos às palavras
cantadas? NÃO.
O ponto acima discutido está relacionado com o seguinte:
"Não seja um escravo ou um mutilador da música". Somos es-
cravos da música quando nosso processo de criação é limitado
pelas questões musicais como letra, ritmo etc. Somos mutila-
dores quando nossa coreografia é tão desligada da música que
a anula por completo. Precisamos desenvolver uma relação
perspicaz e inteligente com a música, bem como com todos os
outros elementos participantes de nosso processo coreográfico.
E isso, mais uma vez, demanda pesquisa e estudo no que tange a
questões musicais e suas possibilidades de relação com a dança.
Nesse momento, queria apenas deixar algumas dicas prá-
ticas na tentativa de crescermos nesse ponto problemático da
relação entre música e dança.

• Procure ampliar suas possibilidades de movimento, bus-


cando novas soluções para expressar a sua idéia.

• Invista em conhecimento de outros rrtmos e músicas


com os quais você não tem contato.

• Arrisque utilizar, em sua coreografia, outros estímulos


sonoros que não apenas uma música letrada (especial-
mente aquelas "mais cantadas no momento"), como, por
exemplo, sons diferenciados (sons produzidos pelo cor-
po; músicas instrumentais; sons-ambiente etc.). Use sua
criatividade!

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I j; • I I Ui '
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Sobre coreografia 73

• Experimente criar uma coreografia antes de aliá-la a


qualquer tipo de sonoridade. Após algumas seqüências
prontas (todas criadas a partir da sua idéia-estímulo), se
necessário, relacione-as todas ou algumas com músicas.

"Os movimentos parecem mais lentos e mais fracos no


palco." Uma questão tão óbvia, mas ainda tão urgente! Espe-
cialmente pela falta de preparo técnico e experiência, as coreo-
grafias mal podem ser absorvidas, ou enxergadas de fato, uma
vez que os corpos "evangélicos" parecem bem menores quando
dançam. Timidez, pouca experiência em palco, mínima instru-
ção, herança cristã que tolhe os movimentos; o fato é que não
dançamos com todos os recursos técnicos que poderíamos e
acabamos realizando movimentos pequenos e confusos, uma
vez que não são trabalhados tanto quanto deveriam.
"Um bom final é 400/0 da dança." "Não deixe o final para o
fim." Apesar de serem estranhas numa primeira leitura, essas
duas afirmações guardam uma verdade pouco abraçada pelos
grupos cristãos de dança: o final de uma coreografia não pode
ser simplesmente um enfeite. Não basta copiar uma pose ou
mesmo inventar uma; não é inteligente ter um fim que, de
fato, coloque um ponto final nas idéias trabalhadas durante
toda a coreografia. Tomar tal atitude é, como se diz, "dar um
tiro no pé"; uma espécie de suicídio artístico. Lembre-se, pri-
meiramente' que as pessoas têm a visão como o sentido mais
significativo e guardarão o final de sua coreografia, mais que ela
como um todo. Em segundo lugar, não tente colocar todas as
suas idéias no fim de seu trabalho coreográfico, mas trabalhe-
as durante todo ele, para conseguir algo perspicaz e coerente.
Deixar tudo para o final, como já disse, é suicídio, além de ser
extremamente frustrante e ineficiente.
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74 Dança

"Monotonia é fatal; procure utilizar contrastes." Esse é um


dos pontos mais importantes quando se trata do meio evangé-
lico. Graças a inúmeras razões sobre as quais já conversamos
aqui, as coreografias produzidas por nós, os evangélicos, são
quase soníferas. Repetição de seqüências de movimentos que
seguem as frases de uma música, movimentações pobres e com
poucas variações são exemplos indicativos dessa deficiência em
nossas produções. Portanto, tente arriscar e comece a buscar
esses contrastes de alguma forma em seus trabalhos. Não deixe
suas coreografias caírem no comum, tentando ter diferentes
níveis de contraste em cada uma delas.
"Simetria não tem vida; desenho bidimensional não tem
vida." Não é preciso nem falar muito sobre quanto todos os que
trabalham com dança precisam saber disso. Somos seres tri-
dimensionais viciados em espelhos. Esquecemos diariamente
que somos percebidos pelos outros por ângulos que ignoramos
no nosso dia-a-dia. E isso influencia a dança que produzimos,
que acaba sendo também bidimensional e com pouquíssima
utilização do espaço cênico, ou mesmo do espaço que circunda
nosso corpo. Portanto, lembre-se de seu corpo tridimensional
e coreografe para utilizar todas as possibilidades de um corpo
assim. Explore mais o espaço cênico. Experimente fugir das
velhas seqüências "fila da frente + :fila de trás", utilizando outros
pontos de vista que não somente o frontal.
Há ainda alguns detalhes que devem ser observados duran-
te um processo de criação coreográfica. O primeiro deles tem
relação com as aberturas que o trabalho permite ter para futuras
intervenções de espectadores. A coreografia deve sugerir, e não
impor, abrindo espaço para a criatividade de quem está assis-
tindo. Isso significa que se deve buscar ao máximo um trabalho
que permita outros caminhos e idéias além do proposto. Deixar
que novas danças surjam a partir da sua coreografia não é nada

" I I r i·. i I I I 'i


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Sobre coreografia 7S

fácil. Exige um trabalho sutil de muita sensibilidade e zelo para


construí-la de forma que todas as suas partes constituintes de
fato se complementem e, ao mesmo tempo, tenham pequenas
frestas por meio das quais o público poderá criar e interpretar.
Obviamente, isso também está relacionado com a platéia, que,
muitas vezes, não está preparada para absorver um trabalho
em suas diversas possibilidades. Sobre essa questão, falarei no
próximo capítulo.
"Para ser claro, você não precisa ser óbvio." Escutei essa
frase numa aula da professora Lara Rodrigues, no último ano
de minha graduação, e nunca mais a esqueci. De fato, esse é
outro ponto interessante, muito relacionado com o discutido
anteriormente, a ser observado. Ao construir sua coreografia,
lembre-se de que ela deve ser, em cada movimento e idéia,
o máximo possível coerente e clara, mas não deve ser pronta
e última. Quero reforçar essa questão, uma vez que a grande
maioria dos trabalhos produzidos dentro da igreja acaba "cain-
do na mesmice", numa repetição contínua de passos e gestos.
Acredito que, graças ao temor de não ser fiel ao evangelho e
ao desejo de ser o mais claro possível na sua transmissão, os
coreógrafos cristãos têm se apropriado de movimentos extre-
mamente pobres e óbvios que resultam em pura transferência
de palavra (letra de música, texto bíblico etc.) para o corpo
numa "quase" coreografia. Acabam se esquecendo (ou simples-
mente não sabendo) de que a dança é justamente o contrário
dessa proposta. Uma coreografia pretende, portanto, trazer
um tema ou reflexão, configurado no corpo e, por isso mesmo,
transformado e ampliado a partir dessa transposição. A dança,
nesse sentido, é uma possibilidade de se (re) conhecer outras
dimensões e significados de uma idéia, e não somente um "jeito
diferente de falar a mesma coisa".
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[...) nada em cena deve ser gratuito


porque tudo quanto ali está se oferece ao
espectador como possibilidade de produção
de significado. (CONRADO, 2005, p. 48)

MÚSica (estímulos sonoros)


,
E comum ver muitas pessoas relacionando
constantemente música e dança. A grande maio-
ria acredita numa interdependência entre ambas
as manifestações. Mas, antes de qualquer coisa, é
importante que se lembre que a dança é uma arte
independente. Ainda que uma coreografia utilize
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78 Dança

a música ou mesmo que dê grande ênfase à questão musical


no seu desenvolvimento, a dança continua sendo dança, assim
como a ópera que, mesmo contendo uma representação teatral,
não é considerada teatro, mas música. Esse é um bom exemplo
dado por Jorge Luiz Schroeder (2000), em sua excelente dis-
sertação de mestrado desenvolvida sobre a relação entre música
e dança.
Ao discorrer sobre essa relação, Schroeder fala das áreas de
contato entre as duas manifestações artísticas; três esferas, nas
quais música e movimentos compartilham os mesmos aspec-
tos: a temporal, a da intensidade e a do caráter.

Música e dança, ao contrário de serem caules de


uma mesma raiz, me parecem mais raízes diferentes
num mesmo solo fértil. São sementes germinadas mui-
to próximas, regadas pelas águas da mesma chuva, que
cresceram talvez com seus galhos emaranhados, mas
individualmente, separadas, vivendo dos seus próprios
recursos, se ajudando mutuamente, é claro, mas nunca
se confundindo. O fato de possuírem características co-
muns não as faz idênticas. Nem mesmo considero carac-
terísticas comuns. Elas lidam com os mesmos elementos
de modos bastante diversos. (SCHRüEDER, 2000, p. 9)

Na esfera temporal, Schroeder inclui todas as questões re-


lativas a ritmo e pulso, sendo este o comumente eleito como
base espontânea para a realização temporal tanto de sons
quanto de movimentos. Nesse momento, diz, então, que tan-
to a música pode servir como base temporal da dança quanto
pode ter suporte no tempo do movimento do dançarino. É
interessante refletir sobre essa questão pelo fato de perceber-
mos coreografias, no que tange à produção em dança no meio
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De mãos dadas com a dança 79

evangélico brasileiro, que dependem ritmamente da música,


sem quaisquer preocupações quanto à necessidade desta en-
quanto elemento coreográfico. Trabalhar com o tempo da core-
ografia, especialmente quando ela está livre do tempo musical,
pode enriquecer a produção "evangélica" em dança.
Quando Schroeder fala sobre a esfera da intensidade, quer
referir-se à energia, à força e ao volume dos sons na música e à
energia dos movimentos, bem como à sua dinâmica. Na verdade,
essa esfera trata da relação entre os movimentos dos dançarinos
e o estímulo musical que os acompanha. Ao refletirmos sobre os
cinco sentidos do corpo humano, é interessante perceber o fato
de que a audição é a única, dentre eles, que pode nos surpre-
ender, ou nos "assustar", porque os sons podem vir de qualquer
lugar e com qualquer intensidade sem que os esperemos. Esses
sons promovem respostas musculares quase instintivas, e, tal-
vez, seja por isso que a relação entre a música e a dança, nesse
sentido, é tão forte. É dessa forma que o jogo de ações e reações
entre sons e movimentos é uma ocorrência fundamental da es-
fera da intensidade (p. 25). De forma prática, podemos usufruir
desse jogo entre sons e respostas corporais numa coreografia,
ou mesmo durante o processo coreográfico. Estar atento a essas
respostas pode revelar e/ou sugerir excelentes movimentações.
Qpando fala sobre a esfera do caráter, Schroeder ressalta o
poder de influência que a música costuma ter, conscientemen-
te ou não, no trabalho da dança, que é o poder da sugestão.
Estimulando a imaginação, a música cria ambientes sonoros
que têm como base algumas convenções musicais que fazem
parte da nossa cultura, as quais já atribuem certas emoções,
climas, sensações ou imagens às manifestações musicais.
Trazendo essas reflexões para nosso assunto aqui - a dan-
ça no meio evangélico brasileiro - , questões se esclarecem, e
quero apontar uma delas.
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80 Dança

Minha preocupação está relacionada com a nossa insistên-


cia em submeter a dança completamente à música. Ouvir e
escolher uma canção, prestar atenção na letra e dar, para cada
palavra, um movimento que a traduza, esse é o processo que os
grupos de dança evangélicos seguem na criação de uma coreo-
grafia. Falei sobre isso anteriormente, mas queria reforçar aqui
quão óbvios e pequenos temos sido ao estabelecer essa relação
com a música. Há tantas possibilidades de relação entre essas
duas artes! Utilização de músicas instrumentais, pesquisas de
outras sonoridades, busca de conhecimento na área musical,
essas e outras ações trariam "novos ares" para a dança que é
produzida e enriqueceriam nossas coreografias.

Público
o essencial é saber ver,
Saber ver sem pensar,
Saber ver quando se vê
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa

Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!)


Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender.
(FERNANDO PESSOA, Obras pOéticas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1974)

Gladis Tripadalli afirma, em seu artigo Quando o estranho


aparece (2005), que

quando o espetáculo tem em sua proposta efou


estrutura algo "estranho", há diversos modos de

I I t I I, I ' I' I
I. • '11 ,I , •••• ~ ~I' . 11'· H.'" 11" '11, • 11111,
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De mãos dadas com a dança 81

reagir. Reação a quê? Ao estranho que aparece ou à


impossibilidade que se tem de enxergar o que vai além?
(TRIPADALLI, 2005, p. 1)

De fato, um dos grandes problemas da dança na igreja (e


não somente na igreja) é a falta de um público passível de ler
a linguagem da dança. O público, de forma geral, ainda não
entende um trabalho coreográfico como uma possibilidade de
ampliação dos seus sentidos (TRIPADALLI, 2005). Não consegue
ver além do "estranho" que, proposto por Tripadalli, é tudo
que não "cai bem"; que não é belo; que não permite o "sonhar
prazerosamente". Resumindo,

o estranho é estranho em relação ao padrão unidi-


mensional que ainda existe quando se vê dança. Espera-
se ver o que se quer. Espera-se que o que está sendo
proposto satisfaça. (TRIPADALLI, 2005, p. 1)

Por mais que se trabalhe no sentido contrário, as pessoas


ainda querem assistir a um espetáculo para satisfação da
necessidade que todos temos do "fantástico", do "utópico", do
"bonito". Graças a essa razão, os grupos evangélicos de dança
também acabam se limitando, temerosos de não "agradar", e
produzem trabalhos que atendam apenas a essas necessidades.
Tudo que possa causar alguma estranheza, ser diferente e,
muitas vezes, ser também difícil de digerir não encontra lugar
nas cenas coreográficas da dança de uma forma geral, quanto
mais na dança produzida no meio evangélico.
Entretanto, como lidar com esse público? Qpais devem ser
as nossas escolhas diante desse perfil?
Acredito que a transformação deve começar primeiramente
nos dançarinos. Muitos ainda têm o mesmo pensamento que
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82 Dança

o público e também querem apenas satisfazer a necessidade


já discutida de se deleitar com o "belo". Dessa forma, nunca
teremos o público esperado que sabe interagir com o espe-
táculo e procura usufruir todas as suas possibilidades. É pre-
ciso lembrar, portanto, que dançamos algo porque queremos
ampliar seu significado. Dançamos algo porque entendemos
que apenas a linguagem verbal não dá conta de todos os seus
sentidos. Dançamos algo porque, ao fazermos isso, damos a
ele novas dimensões e entendimentos. Se dançamos sem essa
consciência, nossa produção certamente é limitada.
Também precisamos entender, enquanto dançarinos e artis-
tas, que a significação desse algo trabalhado também acontece
no corpo do expectador.

[...] significado é atingido pela platéia, a partir dos


movimentos e gestos que estão sendo executados: não
há outra forma de se compreender uma dança que não a
partir do ato de ver. A informação passa, num primeiro
momento, por uma visualização para que, então, se
possa apreciar, desfrutar, gostar ou não, refletir, criticar,
discutir e, talvez, tentar entender não o que a dança quis
dizer, mas o que ela proporcionou tanto para o dançarino
quanto para a platéia. (ROBATTO, 1994, p. 45)

A platéia está imbuída de saberes, semelhantes ou diferen-


ciados entre si, que permitem que haja diferentes leituras acerca
do que é apresentado. E esse é um dos pontos mais importan-
tes a serem tratados aqui, uma vez que nossa coreografia só se
efetiva quando a tornamos passível de interpretações e interfe-
rências do olhar do público. Como já dizia Pina Bausch,

I 1111'
"
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De mãos dadas com a dança 83

os espectadores são sempre uma parte do espetáculo,


tal com eu própria sou uma parte dele, e, ainda que não
esteja no palco, cada espectador é convidado a confiar
em seus próprios sentimentos. (BAUSCH, si data)

É importante pensar no tipo de platéia que queremos


alcançar (ROBATTO, 1994, p. 197). De fato, ter clareza do
público que você quer atingir facilitará sua relação com ele.
Criar pontes entre a dança e o público desejado pode ser uma
forma de permitir a identificação das pessoas para com o que
está sendo dançado. E o fato de se identificar com sua proposta
ajudará a pessoa a se manter aberta para receber seu trabalho
coreográfico como um todo e possibilitará que você alcance
a platéia esperada. Uma boa maneira de fazer isso é munir-
se de referências culturais mais significativas que podem ser
aproveitadas como ponte de ligação com o público esperado.
Outra questão importante é ter em mente que as reações do
público serão sempre diversas e inesperadas. É preciso aprender
a lidar com isso e, ao mesmo tempo, zelar pelas suas idéias
(ROBATTO, 1994, p. 199). Como já disse anteriormente, se nos
deixarmos guiar pelas opiniões e reações do nosso público,
certamente acabaremos produzindo trabalhos repetitivos e
com poucas possibilidades e significados. Para exemplificar,
quero contar uma experiência própria vivida há alguns anos.
Logo após apresentar uma coreografia, duas pessoas vie-
ram me procurar em momentos distintos. A primeira, com
um sorriso no rosto, veio me agradecer. Disse que, por meio
daquele trabalho, fui usada por Deus para "mexer" com algu-
mas questões problemáticas da sua vida. A segunda, com uma
postura séria e franzina, criticou negativamente meu trabalho
dizendo que "sentiu uma coisa estranha e ruim" ao assistir à
minha dança.
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84 Dança

A mesma coreografia suscitou sentimentos e questões di-


ferentes. Se isso aconteceu com aquelas duas pessoas, imagine
todas, cada uma com suas particularidades e momentos de
vida distintos, ao assistirem à minha coreografia! Certamente
muitas interpretações e reações diferentes. A minha reação? Só
de gratidão a Deus por saber que Ele trabalha com cada um
de forma específica a partir das suas necessidades particulares.
Nem sempre a dança causará uma "sensação boa". Nunca será
"boruta
. " a to d os os o Ih os. S empre "mexera," com as pessoas,
seja por meio de um sentimento de paz, seja por meio de uma
"coisa ruim". Deus sabe em que área cada um de nós precisa
ser trabalhado (aleluia!). Fora esses, há ainda aqueles que não
absorverão nada por estarem "fechados", ou por simplesmente
não estarem habituados a "ler" tal linguagem. É por isso que
devemos investir no crescimento de um público de dança.
A transformação desse público (e da dança no meio evan-
gélico) continua com a nossa colaboração enquanto formadores
de opinião.

[... ] temos que evitar a tirania do bom gosto conven-


cional ou da estética da moda, num esforço consciente
para tentar formar platéias mais sensíveis e esclarecidas
de dança. (ROBATTO, 1994, p. 204)

Nosso público precisa assistir a trabalhos inteligentes e que


gerem nele reflexões e novas ações. Para facilitar o entendi-
mento do que estou propondo, quero trazer uma rápida análise
iniciada por Robatto:

Fórmula do sucesso dos musicais da Broadway =


produção de peças com 70% de informações e soluções
já conhecidas e assimiladas pelo público, restando uma
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De mãos dadas com a dança 85

estreita faixa de 30% de elementos autênticos e inova-


dores (ROBAITO, 1994, p. 196).

Essa fórmula revela uma das razões do tamanho sucesso


da Broadway, que produz espetáculos maravilhosos (deve-se
reconhecer sua qualidade), mas que acaba caindo no "lugar-
comum" do significado pronto e terminado. Urge que essa
proporção mercadológica e própria do show business seja inver-
tida, especialmente no meio evangélico, e que sej
. am oferecidas
novas informações e propostas para o público. E preciso que se
crie um público cada vez mais sensível para captar os signos e
os dados da dança e treinado para absorver os trabalhos como
um todo. Obviamente, cada espectador captará um trabalho de
forma específica e de acordo com suas particularidades, como
já disse anteriormente, e muitos ainda ficarão sem "entender" a
proposta coreográfica, mas

a percentagem "perdida" não invalida o trabalho,


pois, em arte, a medida de compreensão de uma men-
sagem não pode ser quantitativa nem absoluta; ela é
qualitativa, relativa à percepção de cada espectador,
com suas referências culturais e/ou de ordem subjetiva.
(ROBATTO, 1994,p. 196)

Precisamos desse público "esponjoso" que sabe apreender


a dança e incorporá-la, e não apenas "entendê-Ia" ou "compre-
endêe-Ia" .
É importante também saber quais são as expectativas de
um público e buscar atender a elas, mas sem que isso compro-
meta a proposta do trabalho. Por exemplo, o público espera
ver qualidade dos dançarinos, além de trabalhos "limpos" e
homogêneos. Duas questões que podemos e devemos buscar
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86 Dança

em quaisquer circunstâncias. Não há como adquirir qualidade


sem um constante trabalho de aprendizado técnico e ensaios
(falarei mais sobre isso no capítulo seguinte). Além desse
contínuo aperfeiçoamento, Robatto propõe, como mais uma
possível solução, o estímulo à individualidade dos dançarinos,
preservando assim a criatividade e singularidade do trabalho.
Incentivar as particularidades de cada dançarino gera um elen-
co de excelência diferenciada, caracterizando a qualidade do
grupo.
Qjialidade da produção da montagem cênica é ainda outra
expectativa do público, e Robatto acerta quando diz que o
encantamento do palco pode ser dado, por exemplo, por meio
de uma abordagem cênica simples. Por que não substituir um
supercenário, repleto de imagens, móveis e cores, por um que
"fale" o necessário com a utilização de menos recursos? Que tal
uma bacia com água, em vez de um tanque e um rio pintado
em papel kraft no fundo do palco? Não precisamos ser óbvios.
Precisamos, sim, refletir sobre as necessidades do nosso trabalho
e aliá-lo a uma montagem cênica coerente e inteligente.
O público atenta muito para o roteiro das coreografias e,
normalmente, quer mais uma "colagem de videoclipes pela in-
fluência televisiva, e não querem espetáculos com longa dura-
ção' ou mais líricos" (ROBATTO, 1995, p. 197). Não sugiro aqui
que façamos cópias de videoclipes e caiamos nesse lugar que
também é mais do que comum. Mas podemos estar atentos
para a duração do nosso trabalho, por exemplo, e evitar que seja
muito longo para que seja assim melhor apreendido.
De qualquer forma, o mais importante é entender que nossa
responsabilidade é a criação de um público de dança que pos-
sa apreender nosso trabalho em todas as suas possibilidades.
Comecei com Tripadalli e termino também transcrevendo suas
palavras, aplaudindo-as:

; , . i I ti' I I i I ~,
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De mãos dadas com a dança 87

Acho que a idéia agora é de propor um ensaio so-


bre a capacidade de ver, de aprender e ver, de perceber
e sentir com os cinco sentidos. Não dá mais pra per-
guntar: "E ai,~ voce gostou!', "l:voce
A T
..... "
entendeu!'. . . " , "O que
A

você achou daquela parte?", dois segundos depois que o


espetáculo acaba. (TRIPADALU, 2005, P: 3)

Figurino
Ao tratar de questões em dança que, normalmente, cau-
sam confusão dentro do meio evangélico, é imprescindível que
se trate do figurino. O figurino difere da cenografia, porque
é quase corpo do dançarino, enquanto a cenografia pode ser
tratada como a continuação desse corpo cênico. A reflexão so-
bre movimentos corporais e trabalhos coreográficos deve vir
acompanhada necessariamente do que se torna parte do corpo
e colabora para a efetivação da proposta. Mais do que um ade-
reço, o figurino participa da cena tanto quanto o dançarino, e
isso deve ser sempre lembrado em nossas produções.
Um figurino nunca é neutro. Por mais que se tente, a cor
(ou não-cor), a textura, a estampa, o tamanho, sempre "falarão
alguma coisa". E é por isso que o figurino deve ser coerente
com toda a proposta coreográfica.
Q!1e tipo de tecido devo usar? Qpal a vestimenta adequada?
Há algumas questões-chave a serem pensadas quando se proje-
ta o figurino de um trabalho.
A primeira delas tem relação com a própria movimentação.
Não há como pensar em um figurino que não permita os mo-
vimentos das pernas, se elas são freqüentemente utilizadas na
coreografia, assim como também se deve fazer ensaios com um
sapato diferenciado, parte de um figurino.
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88 Danca
..

Deve-se também considerar o espaço no qual se dará a


apresentação, bem como a iluminação, a proximidade do públi-
co etc. Já apresentei em lugares onde a iluminação era intensa,
e o palco, bem distante do público. O evento tinha objetivos
diferentes de um culto de domingo à noite, e, por isso, pude
utilizar uma roupa um pouco mais aderente ao corpo, já que
essa circunstância pedia uma maior definição dos movimentos.
Quanto mais próximo o público, menos definição se pede no
figurino. Nesse caso, pode-se abusar de roupas mais largas, por
exemplo. Convém lembrar que essa opção só é válida se o figu-
rino mais "largo" é coerente com a proposta coreográfica.
Há ainda muitas outras questões interessantes nessa relação
do figurino com a dança, e conversei sobre elas com Clarice
Gualbertoê, minha irmã mais nova, na tentativa de elucidar
algumas delas. Achei interessante registrar um pouco de nossas
conversas:

C arai: Sabemos que a igreja ainda não vê com bons olhos


alguns figurinos, especialmente quando utilizados em dança.
Com isso, muitos grupos têm adotado um estilo de figurino
mais aparentemente "santo". Como você vê essa padroniza-
ção?

Clarice: Para me posicionar em relação a essa padronização


santa", é preciso defini-la, ou seja, dizer o que as igrejas que têm
adotado esse estilo entendem que é "santo". Com certeza, esse tipo de
figurino seria o menos sensualpossível: blusas até osjoelhos, mangas

3 Clarice Gualberto é formada em Moda, com trabalhos realizados sob a direção de


Raul Belém no Palácio das Artes e na Universidade FUMEC, em Minas Gerais. É
também ex-dançarina do grupo de dança Arte Vida.

i , ' I I ti' I I j j"


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De mãos dadas com a dança 89

longas, uso de tecidos grossos para evitar a transparência, estes são


alguns exemplos de recursos dos quais as pessoas se utilizam para
deixar o corpo dos dançarinos o menos exposto possível. Realmente, a
questão da sensualidade merece atenção. O problema é que, ao tentar
evitá-la, osfigurinos produzidos acabam sendo comuns e, às vezes,
destoam totalmente da proposta do espetáculo, empobrecendo-o.
Não tem que haver uma padronização, e sim um estudo de cada
coreografia, peça de teatro etc, pesquisando seus respectivos estilos e
objetivos. A partir daí, podem ser desenvolvidosfigurinos que solu-
cionem questões como a da sensualidade, sem cair no senso comum
citado anteriormente.

Carol: Em sua opinião, quais são as necessidades mais ur-


gentes a serem satisfeitas na concepção e produção de figurinos
no meio evangélico?

Clarice: A grande questão nos figurinos do meio evangélico se


chama PESQUISA. São raríssimas as igrejas que sepreocupam em
fazer algo di.firente, ou fiel à época retratada, se esse for o caso. É
necessário estudar tecidos, estampas, cores, tudo adequado à pro-
posta do grupo (no caso de um uniforme-padrão) ou do espetáculo.
Normalmente, ofigurino é a última coisa (ou uma das últimas) a
serpensada.

Carol: Sabemos que o orçamento das igrejas comumente


não inclui investimento e apoio a essa área. Há, então, tecidos
mais baratos que possam ser utilizados para que o custo dos
figurinos seja menor?

Clarice: Como disse anteriormente, quase não há pesquisa


para a confecção dosfigurinos. E ela éfundamental na questão do
orçamento. Geralmente, os tecidos sintéticos são mais baratos. Nem
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90 Dança

tudo precisa ser 100% algodão. Malhas, americano cru e poliéster


são os mais em conta e proporcionam· soluções interessantes para
diferentes propostas de trabalho. É bom optar pelos tecidos lisos
(sem estampas). Além de serem mais baratos, aspessoas responsáveis
pelo figurino podem customizá-los ou estampá-los com materiais
baratos, garantindo um ótimo acabamento.

Carol: Qual é a relação entre a cenografia e o figurino em


um trabalho coreográfico, em sua opinião?

CIarice: Figurino e cenário são intimamente ligados. Aspessoas


fazem parte da cena, e o cenário tem sua linguagem própria. É
como se o cenário fosse ofigurino, a vestimenta do lugar utilizado,
entende? O figurino e o cenário são linguagem também. E ajudam
a passar a mensagem desejada. Por isso, um praticamente não
existe sem o outro. E ambos são sempre muito improvisados,
ou simplesmente seguem clichês e padrões (nem sempre bons) já
preestabelecidos. Para desenvolver bons figurinos e cenários, que
sejam coerentes entre si, é necessário algo importantíssimo que já
citei anteriormente: PESQUISA. Vamos parar com improvisos
e coisas "mais ou menos!': pois Deus quer o melhor de nós, e isso
envolve tempo. Só a partir desse estudo - do contexto, da música
escolhida, do público em questão, do objetivo especifico, entre outros
- é que o grupo pode começar a pensar no cenário e no figurino,
jàzendo um complementar o outro. Inftlizmente, muitas pessoas
não produzem bons cenários efigurinos, pois acham que qualidade é
sinônimo de alto custo. Mas isso não é verdade. A apresentação pode
ser de qualidade, valendo-se muitas vezes de materiais alternativos
e baratos. Como encontra-los e ter idéias? PESQUISANDO.

CaroI: Até que ponto os grupos de dança evangélicos de-


vem absorver a cultura brasileira nos seus figurinos?

"
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Demãos dadas com a dança 91

Clarice: Osgrupos de dança devem buscar o equilíbrio. Uma vez


que um de seus objetivos - talvez oprincipal- é a evangelização,
o grupo precisa ralar a mesma língua" que o público, fazer algo
interessante e adequado ao contexto. Exemplos: fazer algo ligado
à dança de rua, ao apresentar-se em presídios; ou aoforrõ, quando
a apresentação for para universitários. É claro que essas idéias
não seguem um padrão ou regra, pois são apenas sugestões. Mas,
qualquer que seja a escolha, ela tem de conseguir causar algum tipo
de identificação por parte do público em relação ao grupo. Ele está
inserido na cultura brasileira, assim como aspessoas que assistirão às
apresentações. Não há como isolar ou negar essefato. O mundo está
cheio de opções, e, se a igreja se alienar e não tiver uma linguagem
interessante e apropriada, ela não será ouvida - muito menos
entendida - e, portanto, não cumprirá o seu papel. Os figurinos
são linguagem, por isso osgrupos de dança devem absorver a cultura
brasileira sim, buscando sempre, como já jôi dito, o equilíhrio. Ele
deve estar adequado à proposta e ao contexto dogrupo e, obviamente,
deve ser decente. Sempre lembrando que decência não é sinônimo de
hreguice, nem de clichês!

Caro!: É fato que, especialmente no meio evangélico, há


os figurinos que são utilizados apenas para a padronização do
grupo, e que não influem no significado de forma atuante; e há
também os figurinos que atuam de forma mais significativa no
trabalho. Você poderia falar um pouco sobre isso?

Clarice: Osfigurinos, cuja função é a padronização do grupo,


não são errados nem ruins. Mas é importante lembrar que o
figurino precisa "conoersar" com a coreografia, a música, o cenário,
além de ser atrativo ao público. Osfigurinos de cada integrante do
grupo dialogam entre si, causando a padronização desejada, sem
precisar ser uma blusa com apenas o nome escrito nela. E, se há uma
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92 Dança

circulação grande dos integrantes, ou seja, se eles não sãofixos, como


no King's Kids (cada campanha tem pessoas diferentes), as blusas
da mesma cor ou estampadas com o nome do grupo podem ser uma
boa opção, pois a simplicidade dofigurinojàvorece que ele seja usado
por váriaspessoas. Mas, para diversificar, os líderes podem optarpor
estampas diferenciadas, como a técnica tye-dye, barata eprática, ou
também utilizar alguns "toques" que jàzem a diferença, inserindo
acessórios que se apliquem à coreografia, como cadeiras, óculos,
bancos, chocalhos, investir na maquiagem etc. Figurinos que atuam
de forma mais significativa no trabalho são aqueles que exercem a
linguagemJá comentada. Uma apresentação com essa harmonia na
sua composição tem muito mais credibilidade junto ao público, por
passar a idéia de trabalho sério, elaboração e qualidade.

De uma forma geral, não acredito numa padronização dos


figurinos (principalmente de cópia de modelos estrangeiros)
para todos os grupos de dança evangélicos. Isso surge de uma
idéia errônea, predominante na igreja (a qual tenho tentado
discutir aqui), de que o figurino é apenas um enfeite, um ade-
reço.
Também quero apresentar minha posição com relação aos
"escândalos" causados pelos figurinos de dança. Acredito que,
respeitando os valores bíblicos, qualquer figurino é válido e vale
usar e abusar da criatividade (cores, tecidos diversos, formas e
cortes diferentes etc.). Infelizmente, nessa batalha pela acei-
tação da dança na igreja, ainda precisaremos prosseguir com
...
calma e com muito cuidado. As vezes, haverá a necessidade
de abrir mão de algumas das nossas idéias para que não haja
intriga e mágoa entre as pessoas. Mas é imprescindível que,
caminhando com cautela, continuemos orando para que Deus
abra portas, dê-nos discernimento nas nossas escolhas para
que busquemos promover reflexões sobre essa questão, criando

, , ,\ ti. i I ' 11" I I 111,


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De mãos dadas com a dança 93

figurinos inteligentes. Cada um vive num contexto distinto e


deve tentar aplicar e adaptar o exposto aqui à sua realidade.
Mas um princípio comum deve permear nosso trabalho: nosso
figurino deve ser coerente, estabelecendo um diálogo com nos-
sa proposta coreográfica.

Cenograp_a _
Tratar de cenografia na sua relação com a produção em dança
é algo de extrema relevância. Isso porque a igreja evangélica, de
forma geral, não tem como hábito o investimento em cenários
que são usualmente considerados desnecessários. A cenografia
é sempre tratada como algo supérfluo, considerado em último
lugar, quando se faz um orçamento. Mas é importante ressaltar
que o ato de não investir nessa área não está relacionado apenas
com verbas destinadas a ela (que também são mínimas), mas,
principalmente, com a falta de planejamento cenogrãfico, bem
como com o despreparo de pessoas que poderiam crescer nessa
área, mas não são incentivadas a isso.
Ao pensarmos em trabalhos de dança, precisamos também
considerar o espaço onde se dará a apresentação e em como
ele colabora para a afirmação e complementação da temática
proposta. Ainda que sem muitos recursos, deve-se lembrar
sempre, portanto, da cenografia.
De acordo com Gianni,

cenografia é o espaço eleito para que nele aconteça


o drama ao qual queremos assistir. Portanto, falando de
cenografia, poderemos entender tanto o que está conti-
do num espaço quanto o próprio espaço. A cenografia
faz parte do espetáculo. (RATTO, 1999, p. 12)
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94 Dança

A cenografia, então, associa-se às outras partes do trabalho


coreográfico na tentativa de transformar a realidade performá-
tica em uma verdade. Todas as partes querem "dizer a mesma
coisa", sendo coerentes umas com as outras.
Qpando falamos em cenografia, precisamos destacar algu-
mas questões importantes. A primeira delas refere-se aos pal-
cos. Existem vários tipos, especialmente hoje quando todo tipo
de espaço pode ser transformado em um espaço performático.
Um dos tipos mais conhecidos é o palco italiano, que surgiu
aproximadamente em 1660. Algumas de suas características
são:
- caixa preta
- platéia frontal e com apenas um ponto de vista
- cenários bidimensionais
- centro do palco como lugar para destaques
- tendência à verticalização e simetria dos movimentos

Há ainda o palco em arena, por exemplo, que pode ser ca-


racterizado por:
- formato circular (quatro ângulos)
- platéia superior e com vários pontos de vista
- cenários tridimensionais

Contudo, além do palco italiano e da arena, há ainda ou-


tros, como a semi-arena, com apenas dois ângulos de visão da
platéia, e espaços alternativos, como museus, parques, casas
de show, shopping centers e até mesmo espaços públicos, como
metrôs, praças e ruas.
Uma segunda questão importante a se tratar em cenografia
está relacionada aos elementos cênicos. Para trazer-nos à refle-
xão, Ratto fala sobre o exagero de elementos na cena:

; .• I. I ' Ii • ij .. "1' .~ , ,I ' .11; '. ,I I lii I


"
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De mãos dadas com a dança 95

Ataco violentamente o decorativismo gratuito, tudo


o que procura agradar, o pomposo, enfim tudo o que se
sobrepõe pretensiosamente à correta interpretação do
espetáculo que o intermedeia. (Rxrro, 1999, p. 19)

Como já disse anteriormente, simplicidade deve ser o nosso


lema. "Encher" a cena com obj etos, cores e cenários de forma
demasiada e gratuita não colaborará para a efetivação da pro-
posta temática. Ao contrário, trará confusão ao espectador. E
isso também vale para a iluminação.
O planejamento de iluminação deve ser muito bem-feito.
Isso porque a luz não somente "enfeitá', ou ilumina a cena,
como também valoriza ...
formas e traz noções de profundidade
e cor ao espectador. E importante pensar em alguns detalhes
num projeto de iluminação:

00 Apenas uma luz frontal na cena tira o volume do corpo


do dançarino. Por isso, é necessário que haja, pelo menos,
uma luz lateral e uma luz atrás. Diagonais são sempre
bem-vindas.

00 A cor do filtro (também chamado de gelatina) deve ser


planejada de acordo com a luz da superfície (do figurino,
de algum elemento cênico etc.) e a luz desejada para a
cena, pois a primeira interfere na cor da segunda.

Q!J.ando estamos tratando de cenografia no meio cristão,


a coisa complica. Difícil tratar desse assunto quando ele não
tem grande relevância para as produções ditas evangélicas.
Além da falta de priorização, os espaços para apresentações,
por exemplo, normalmente são os concorridos púlpitos e cor-
redores de igreja, que são preenchidos também por grupos
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96 Dança

musicais, equipamentos de som e projeção, cadeiras e bancos,


flores, fios etc.
Normalmente, há dois tipos de produção em dança no
meio evangélico. Há aqueles que são feitos especificamente
para uma data ou com objetivos específicos; e há também as
coreogra.fias feitas para serem apresentadas várias vezes e em
lugares diferentes.
Para tentar elucidar alguns problemas que surgem nesse
sentido, achei por bem registrar minha conversa com Priscila
Sathler," que colaborou imensamente para esse capítulo:

Carol: Produções em dança no meio evangélico versus ce-


nografia: como você vê essa relação?

Priscila: Cenografia para dança no meio evangélico, na minha


opinião, ainda não existe. Quase não se vê essa relação. vemos, sim,
muitas pessoas que investem em figurinos (não que eles sejam de
qualidade), mas cenografia e elementos cenogr4ficos normalmente
não são vistos. As pessoas colocam, às vezes, algum elemento utili-
zado em ginástica rítmica, mas nada que reflita uma preocupação
especifica com um projeto de cena. No teatro, pode-se até ver um
pouco, mas também é algo mais improvisado que elaborado e es-
tudado. O aproveitamento de objetos e móveis da própria igreja é
constante, como, por exemplo, a utilização de uma mesa, se neces-
sária, da sala de crianças. Se essa ainda não serve, coloca-se um
pano em cima. Ainda não temos o costume de produzirmos nossos
elementos especificamente para compor uma cena.

4 Priscila Sathler é designer de interiores com vários projetos premiados, além de


ter feito produções cenográficas para eventos variados. É ex-dançarina do grupo de
dança Arte Vida.

i I I I ti. I I J j 'i ' • ' , ."1 I


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De mãos dadas com a dança 97

Carol: Isso também pode ocorrer pelo fato de a dança estar


cada vez mais voltada para dentro da igreja. A questão do cenário,
assim, fica muito limitada. Não vemos grupos de dança evangé-
licos que produzam para o público de fora, ou não-cristão.

Priscila: Com certeza, não vemos isso.

Carol: E mesmo os que têm uma proposta evangelística,


acabam tendo produções improvisadas também. Normalmente,
eles, por exemplo, não aproveitam o espaço da rua ou da praça
no qual estão dançando como parte do seu projeto cenográfico.

Priscila: Sim, preocupa-me muito essafalta de cenário, espe-


cialmente nos trabalhos coreogrtijicos, o que se deve muito ao fato
de as pessoas não terem o hábito de se relacionar com a dança fora
da igreja, assistindo a espetáculos, por exemplo. Isso gera uma
falta de conhecimento das possibilidades que existem.

Caro1: Sei... acabam presas àqueles modelos antigos de


"cantata de natal", né?

Priscila: Exatamente! Fazemos cenários da mesma forma que


nossos avós faziam, reportando-nos a modelos de coral e outras
fôrmas que já conhecemos. Por que não projetar uma imagem na
parede, por exemplo? Quase ninguém faz isso. E por quê? Porque
não conhecem esse recurso.

Carol: Em sua opinião, quais são as mudanças mais urgen-


tes a serem feitas nos projetos cenográficos "evangélicos"?

Priscila: Bom, primeiramente creio que as pessoas devem ter


mais contato com trabalhos pro/issionais, assistir a espetáculos
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98 Dança

e, a partir daí, conhecer coisas novas para entenderem em quais


aspectos precisam mudar. Certamente, perceberão quão atrasada a
igreja ainda está na sua relação com a cenografia, e como isso aftta
negativamente os trabalhos que fazemos. Quando jàlo que devem
ver espetáculos, não me refiro apenas aos de dança, mas também
a exposições de artes plásticas, peças teatrais. É difícil, portanto,
jàlar de mudanças nos projetos cenogrtificos, porque não há projetos
cenogr1ficos, entende?

Carol: Então, talvez a mudança tenha de ocorrer no pen-


samento...

Priscila: É. A necessidade é de uma mudança de postura, porque


os cenários ainda são improvisados e, normalmente, óbvios demais.
Na construção cenográfica (quando ela existe), as pessoas não per-
mitem que elementos assumam outrafunção que não as que eles já
possuem (o elemento sendo outra coisa que não aquilo que estamos
vendo nele).

Carol: As pessoas sempre usam elementos de forma mais


funcional que significativa...

Priscila: Isso. Acho quefalta uso de mais criatividade, a idéia de


"vamosfazer alguma coisa diftrente, mesmo que pareça meio 'louca'
ou esquisita". Permitir que opúblico interaja com os elementos ceno-
grtificos ao buscar diferentes sentidos neles.

C arol: Isso me lembra que a cenografia e seus elementos


podem participar ativamente do espetáculo sem que necessa-
riamente se esteja dançando com eles.

I I • ·1 I ili.
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De mãos dadas com a dança 99

Priscila: Quando você fala disso, lembro-me do Onkotô, espe-


táculo do grupo Corpo no qual o cenário é nada mais que umfundo
preto ftito de tiras de borracha. Através dele, os dançarinos entra-
vam e saíam do palco.

C arai: ... o cenário funcionando quase como um dos dan-


.
çarlnos...

Priscila: ... era um elemento atuante, mas os dançarinos não


dançavam com ele. E, ao contrário do que muitos pensam quando
imaginam um cenário interativo, esse era bem simples: um fundo
preto de tiras que proporcionava possibilidades diferentes para o
trabalho coreogrtifico.

Carol: E" verdade. E, além disso, em Onkotô, o palco, à medida


que a cenografia produzia outros significados para ele, deixou de
ser um espaço no qual se está dançando. Uma vez que o espetá-
culo tinha esse nome (uma brincadeira com a mineirice e com a
pergunta: "Onde é que eu estou?"), poderia pensar-se que aquele
era um ventre que "dava à luz" os dançarinos e as idéias dançadas,
ou ainda num espaço que os "engole". Aquele projeto cenográfico
funcionou muito melhor do que, talvez, um desenho no fundo
do palco, como a gente vê em muitos trabalhos na igreja. Pensar
em utilização dos mesmos elementos de uma forma diferente é,
de fato, uma boa pedida. Mas, mudando de assunto...

C araI: Somos uma igreja brasileira só no nome. A falta de


contextualização da igreja já tem sido discutida por muitos ar-
tistas, teólogos e pensadores nos últimos anos, e, ainda assim,
continuamos a "profanar" a cultura brasileira. Isso tem reflexos
na "cenografia cristã"? Como podemos ter cenários mais abra-
sileirados no meio evangélico?
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100 Dança

Priscila: A discussão do "profano"pode ser percebida em várias


áreas da igreja, inclusive nas manifestações artísticas "cristãs". A
igreja, que antes patrocinava a arte, transformou-se e passou a
"abominar" a arte, e isso, obviamente, tem reflexos nas questões
cenogrtificas. Na verdade, a cenografia ainda nem é reconhecida
como arte ou como um elemento importante dentro dos trabalhos
da igreja. Quanto a cenários mais abrasileirados, acredito que essa
brasilidade tem de acompanhar o processo do espetáculo, desde a
sua concepção. A igreja, como a sociedade brasileira de forma geral,
é extremamente influenciada pela cultura americana (música,
cinema, dança etc.). Há grupos prcjissionais que trabalham
diretamente com as danças brasileiras, mas a igreja mal sabe
da existência desses grupos. Continuamos com nosso padrão
americanizado de dança, mas épossívelfazer algo brasileiro dentro
da igreja. Estou me lembrando agora do trabalho do qual nós
duas participamos - Pescador - , em homenagem ao compositor
cristão Sérgio Pimenta. Nele, cada dançarina tinha uma cor de
roupa (camiseta de malha colorida, calça curta de americano cru,
lembrando as calças usadas porpescadores). Dançamos descalças. A
maquiagemfoi algo bem sutil,· sópra que a gente nãoficasse muito
pálida no palco (não era nossa proposta que estivéssemos pálidas).
E cada uma também tinha uma "rede de pescar'~ na verdade
uma trama feita de barbante, tingida com diversas cores. Havia
também as flores de plástico espalhadas pelo chão do palco. Com
materiais simples e baratos, conseguimos um resultado muito legal
e uma estética, um visual muito bonito. (veja foto no capítulo
Algumas dicas).

Carol: Percebemos que esses elementos deram uma vida


diferente ao espetáculo. A flor que, ao ser "chutada" sem querer,
se mexia; a rede que se movimentava o tempo todo.

,I ' I I ~ I., I i j "


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De mãos dadas com a dança 101

Priscila: Movimentos involuntários que dão uma dinâmica


diferenciada ao trabalho efazem cada espetáculo acontecer de uma
firma distinta. Isso é muito legal!
..
Caro1: E possível, então, utilizar a nossa cultura e nossas
danças em nossos trabalhos coreográficos?

Priscila: Claro! Lembrei também do trabalho quefizemos em co-


memoração aos SOO anos do Brasil. No começo da coreografia, havia
três "portugueses" em cima de três cubos (feitos de compensado). Os
cubospodiam ser os barcos nos quais osportugueses estavam;podiam
trazer a idéia de hierarquia em relação aos índios. E são elementos
supersimples e versáteis, que você carrega para qualquer lugar.

CaroI: Há alguma sugestão para a utilização de púlpitos de


igreja em produções de dança, normalmente compartilhados
com outros ministérios?

Priscila: É complicado,porque "brigamos" com umaparafernália


de objetos e equipamentos. Mas talvez, novamente, o uso de elemen-
tos versáteis. Às vezes, pode ser interessante delimitar o espaço da
dança com alguma coisa no chão ou com algo que vocêpossa colocar na
hora da apresentação e depois retirar. Talvez até algum tipo de biom-
bo, com o qual sepossa "tampar" ofundo e, ao mesmo tempo, criar o
"ambiente da dança". Obviamente, não é preciso esconder tudo que
está no fundo, mas usar dessas possibilidades que funcionam como
cenário, ambientação (ou que simplesmente desviem ofoco dos ins-
trumentos musicais ou dofundo do púlpito) e delimitação de espaço.

CaroI: Na falta de recursos financeiros e enquanto a igreja


ainda não prioriza a cenografia no seu orçamento, que mate-
riais você sugere para montagens cenográficas?
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102 Dança

Priscila: Creio que há muitas possibilidades de materiais "oul-


gares". Temos um lado reciclável da cenografia que deve ser usado
com muito cuidado porque, apesar de podermos usar materiais do
dia-a-dia, devemos atentarpara a razão do seu uso. Usar materiais
recicláveis não signijica usá-los naforma ou nas cores em que elesjá
se encontram. Por exemplo, se você quer utilizar uma caixa de uva,
pode amassá-la, quebrá-la, pintá-la, e não, necessariamente, man-
tê-la no seu estado primeiro. Além desses, ainda temos materiais
incríveis que podem ser utilizados: plásttOcos, borrachas, brinquedos,
E"01 (que é muito barato efácil de trabalhar), entre outros.

" . I I ti'; I I j 'I


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Onde háo ser humano, quer seja cristão


quer não, há a natureza humana, que nos
torna sempre suspeitos em nossas imper-
feitas ações, fora ou dentro da igreja. Aliás,
será que nossos cultos, cantos, hinários,
músicas, quadros são expressões perfeitas
de louvor ou testemunho? Nem a dança o
será. Essa perfeição ainda virá quando esti-
vermos com o Salvador no novo céu e nova
terra. (HUF, 2005, p. 65)

Defato, adança aqui naTerra nunca será perfeita.


Os ministérios de dança sempre terão imperfeições.
Mas até que ponto os erros são frutos do nosso
limite terreno, ou resultados de uma má formação
de nosso ministério?
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104 Danca
"

Refletir sobre a dança como ministério não é tarefa fácil.


Isso porque a igreja em si, mesmo que o crescimento de grupos
de dança ali seja significante nos últimos anos, ainda luta com
seus costumes e tradições na tentativa de encontrar um lugar
adequado para esse ministério.
Talvez colabore para essa reflexão a busca pela definição
mais adequada do que significa a palavra ministério. Voltemos
nossa atenção para o primeiro de seus sentidos, que quer dizer
ofício, função de servir, ocupação, trabalho. Portanto, ministério
está relacionado com uma função ou um serviço específico. Em
suas várias aparições na Bíblia, a palavra continua com esse
mesmo sentido, revelando diversas formas pelas quais alguém
pode servir especificamente a Deus. Hoje, no meio evangélico,
ministério tem ganhado alguns outros sentidos (corretos ou
não); estes pouco nos remetem a seu significado primordial:
quem tem um ministério, tem um serviço específico a prestar
em nome de Deus.
Ao falar, portanto, de um ministério de dança, queremos
nos referir a uma das possíveis formas de servir à comunidade
cristã e de implantar o Reino de Deus na Terra por meio de
arte, trabalho, serviço e excelência. E" importante enfatizar esse
ponto para que a questão da presença da dança na igreja se
esclareça.
Ao fazer uma avaliação do que tem sido produzido em
dança na igreja, faço minhas as palavras de Gedeon Alencar,
quando afirma, com relação à Igreja brasileira de uma forma
geral, que "estamos cada vez mais parecidos uns com os outros
- principalmente nos erros". (ALENCAR, 2005, p. 24). Essa
é uma palavra dura, mas extremamente realista e sincera. Ao
olhar com olhos mais perspicazes e inteligentes para os grupos
de dança evangélicos, não há como negar uma importação e
padronização de movimentos e idéias coreográficas, bem como
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Dança como ministério 105

uma extrema falta de criatividade e maturidade dos grupos.


Estamos cada vez mais parecidos e, especialmente nos erros,
porque, em vez de repensarmos nossos trabalho e proposta,
buscando novas soluções, estamos cada vez mais multiplicando
cópias imaturas e sem fundamento.
Certamente, uma das razões para tal postura e atitude é
a falta de parâmetros em dança dentro da própria igreja. Os
grupos que têm se destacado ainda não podem servir como re-
ferência se comparados com as companhias de dança de fora da
igreja. E, em virtude de nossa falta de conhecimento e envol-
vimento com essas produções, resta-nos apenas os "modelos"
chamados evangélicos.
Dando seguimento a essa breve análise da produção em dan-
ça na Igreja evangélica brasileira, percebo como o crescimento
qualitativo não tem acompanhado o quantitativo, revelando
cada vez mais grupos imaturos. Assim, creio ser interessante
apontar alguns indicadores dessa imaturidade que podem ajudar
na compreensão e percepção dos erros e acertos de cada grupo.
Começo trazendo para essa reflexão, novamente, a
acomodação na pouca técnica. Infelizmente, ainda não posso
mencionar algum grupo cristão que demonstre uma boa
qualidade técnica e uma busca de aperfeiçoamento contínuo.
Em geral, vejo grupos que se encontram (quando muito) uma
ou duas vezes por semana com o intuito principal de aprender,
ou ensaiar, uma coreografia e, nos últimos quinze minutos,
orar pela apresentação do domingo seguinte. Isso sem falar
da coreógrafa, que, normalmente, é uma menina que fez balé
quando tinha 6 anos de idade, ou que tem um pouco mais de
"jeito" para dança. Desconheço trabalhos que seriamente se
dediquem a um preparo corporal; aulas periódicas pelo menos
três vezes por semana, além de outros momentos para ensaios e
devocionais. Por que, quando o assunto é dança, temos coragem
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106 Dança

de agir assim? Se alguém deseja ser um tradutor, precisa estudar


bem a língua desejada. Assim também é com quem quer ser um
profissional em violão, pois necessita estudar diariamente seu
instrumento. Engraçado, e triste, é perceber que muitos cristãos
ainda não entendem essa lógica no que diz respeito à dança
e acreditam ser possível a excelência na arte sem a dedicação
ao aprendizado de uma técnica. O corpo que dança necessita
constantemente de informações que o possibilitem tornar
natural o movimento. E é a técnica que prepara o corpo para
responder à exigência do espírito criativo de cada ser humano
(VIANNA, 1990, p. 82). A importância do aprendizado de uma
técnica, seja ela qual for, está nessa ampliação do vocabulário
corporal do dançarino e no fortalecimento específico desse
corpo. Parece-me que os ministérios de dança dentro da igreja
ainda não entenderam isso.
Outra questão importante, que, certamente (mas não so-
mente), está ligada à técnica, é a produção de trabalhos pobres
e imaturos em nome de Deus. Alencar (2005) traz uma reflexão
sobre a produção musical evangélica e declara que:

[...] cristãos alegam que suas músicas são de "ins-


piração divina". Quem se responsabiliza, então, pela
mediocridade musical e a pobreza das letras? As músi-
cas são assim porque as pessoas gostam, ou as pessoas
gostam porque só isto é produzido? (ALENCAR, 2005,
p.78)

É possível também dizer o mesmo quando o assunto é


dança. As coreografias são assim porque as pessoas gostam (ou
" entendem melhor'l
or ou t'acei . ") ,OU as pessoas gostam,
acertam mais
entendem e aceitam porque só isso é produzido? Se as coreo-
grafias são dadas por Deus, quem é o responsável pela pobreza

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Dança como ministério 107

dos seus movimentos e pela má construção dos trabalhos?


Fazer algo para Deus não é simplesmente alegar que fazemos.
Na verdade, fazer algo para Deus requer entendimento do que
se faz, e não apenas um coração disponível e boa vontade.

Parece que não basta, ao Deus verdadeiro, o culto, a


oferenda ou o sacrifício, quando acontecem sem a com-
preensão dos significados envolvidos. Traduzindo, para
Deus, é preciso que saibamos o que estamos fazendo de
modo a fazermos o que lhe agrada. (.A1v1oRESE, 2004,
p.36)

De fato, é verdade que, para agradar verdadeiramente a


Deus e realizar a Sua vontade, é preciso que saibamos o que
O agrada, o que Ele deseja que façamos, e de que forma.
Mas parece que fazemos o que fazemos baseados apenas no
famoso "achôrnetro", Achamos que fulano é capaz de criar uma
coreografia. Achamos que nosso grupo está desenvolvendo
um bom trabalho. Achamos que não precisamos de mais
conhecimento. Achamos que sabemos o que é preciso fazer, em
vez de buscarmos o que de fato é o melhor. Rubem Amorese
diz sabiamente sobre a questão do sermão:

Uma palavra sobre a arte da mensagem propriamen-


te dita. Imagino que deva agradar a todos os "públicos"
uma mensagem esteticamente atrativa. Não se deve
trocar a forma pelo conteúdo; um sermão plasticamen-
te arrebatador, mas de conteúdo duvidoso. No entanto,
a diferença entre um belo sermão e outro enfadonho
pode ser da "água para o vinho". Uma palavra séria não
precisa ser enfadonha, nem mal preparada, nem pobre
em ilustrações, nem feia. E não nos deixemos iludir:
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108 Dança

assim como o belo é importante em todas as artes li-


túrgicas' mais ainda o será quando aplicado à exposição
das Escrituras. (AMORESE, 2004, p. 158)

É de extrema relevância que se tenha em mente a colocação


anterior e, mais do que isso, que ela seja aplicada ao contexto
da dança. É preciso lembrar que um ministério de dança, ou
mesmo um trabalho coreográfico sério, ainda que pequeno, não
precisa nem deve ser repetitivo, pobre, mal preparado e feio.
É possível (e urgente) aliar a seriedade da mensagem a uma
coreografia bem-feita e de qualidade. Após estarmos cientes
disso, há ainda reflexões que devem ser feitas.
Outra questão importante e que tem influenciado o minis-
tério de dança nas igrejas evangélicas é a desaculturação" pela
qual o cristão passa após sua conversão. Percebe-se que a Igreja
evangélica brasileira só tem Brasil no nome. A desvalorização
da cultura nacional, de forma gera!, permeia a igreja, que cada
vez mais perde sua identidade. Parece que esquecemos algumas
diretrizes cristãs importantes, como, por exemplo, a valorização
da pessoa como um todo. "A conversão não deve desaculturar
o convertido", já disse Robinson Cavalcanti (2000, p. 43), ao
lembrar-nos do pacto de Lausanne." Foi Cavalcanti que tam-
bém afirmou que "devemos respeitar a cultura em tudo o que
não se choca com os princípios bíblicos", e é perceptível quanto
esse não é o pensamento que direciona alguns atos da Igreja
evangélica brasileira, quando o contrário deveria ocorrer.

5 CAVALCANTI, Robinson.A igreja, o país e o mundo, 2000. p. 43,143.


6Documento redigido em Lausanne, na Suíça, no ano de 1974, durante o Congresso
Internacional pela Evangelização Mundial, considerado como impulsor de reflexão
e prática da missão integral da igreja.

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Dança como m in istérío 109

Falar da história do Brasil é também falar da mis-


cigenação que gerou um povo aberto, emotivo e en-
volvente. É falar de uma cultura rica e atraente, de um
espírito voluntário e criativo em todas as suas expressões.
(~os,2000,p.18)

Como artistas, precisamos promover lugares de reencontros


identitários; trabalhos que retomem essa nossa cultura rica e
atraente. Além disso, precisamos ser exemplos para os não-
cristãos da aceitação divina, do amor para com nosso povo, da
gratidão pela nossa história, da criatividade revelada em nossos
produtos culturais.

Sendo cristãos, temos um sacerdócio que não se limita


aos quatro cantos de um templo, mas que perpassa a nossa
vida em comunidade e a nossa cultura. (HUF, 2005, p. 65)

Também somos nação brasileira e vivemos aqui, e não Lá.


Ainda que estrangeiros (enquanto não vemos novo Céu e nova
Terra), é urgente que reconheçamos nossa cultura e recupe-
remos nossa identidade. Precisamos ser parte da mudança de
pensamento e atuar no intuito de colaborar com uma Igreja
que reconheça suas raízes, sua história e seus potenciais como
povo brasileiro.

Ela [a Igreja evangélica brasileira] supervaloriza os


pregadores estrangeiros, os livros de fora, os modelos
importados de crescimento, a administração e organi-
zação de igreja, e até o praise music americano e inglês.
Posso estar enganado, mas a meu ver a igreja brasileira
não precisa aderir a essa moda. Acredito que um projeto
de transformação de sociedade brasileira começa com
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110 Dança

a construção de uma auto-imagem nacional que har-


monize com a condição de filhos de um Deus que nos
aceita como somos. Sonho com o dia em que gostar do
Brasil não seja privilégio de gringo. (MARK CARPENTER,
2005, p. 65)

Urna auto-imagem nacional se constrói numa apreensão


e valorização da cultura nacional. Saber reter o que é bom?
de nossa herança cultural que, apesar de ser constituída por
elementos negativos (sensualidade, sincretismo religioso etc.),
tem muito a nos oferecer.
Em dança, essa construção de uma auto-imagem nacional
passa por uma descoberta das manifestações populares, por
exemplo. Conhecer mais a fundo danças brasileiras, como frevo,
samba, maracatu, dentre tantas outras, e, novamente, saber reter
o que é bom (garanto que há muito que aprender e aproveitar).
Pesquisar e apreender a riqueza dos elementos populares como
instrumentos, figurinos, adereços, calçados, enfeites e bonecos,
numa combinação única de cores e materiais que muito podem
instigar a criatividade da Igreja evangélica. Buscar a relação com
o corpo que inicia sua (re) descoberta e valorização e continua
na busca de multiformas dançantes e brincantes.
Para exemplificar, lembro-me de dois trabalhos que me
solicitaram quando da realização da Festa Brasileira que abriu
a Assembléia Geral da MPC8 Internacional, com a presença
de obreiros e voluntários de mais de setenta países do mundo.
Carlinhos Veiga, cercado por comidas e bebidas típicas do

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8MPC - Mocidade para Cristo - é uma missão que trabalha com jovens. Está
presente em mais de cem países e, no Brasil, há mais de 55 anos.

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Dança como ministério 111

Brasil e por uma belíssima decoração, apresentou-se com sua


banda num show composto exclusivamente pela brasilidade
musical. Eu e algumas antigas companheiras" participamos,
dançando três belíssimas canções, das quais quero destacar
duas. A primeira coreografia acompanhou uma folia de reis
chamada Santa Folia, na qual dançavam quatro lavadeiras
(figura tipicamente brasileira), com suas bacias e panos, que
foram tocadas pelas boas novas do nascimento de Jesus e
descobriram verdadeiramente essa folia santa. Já a segunda
coreografia tinha como base uma música de ritmo originário
do bumba-meu-boi - Guarnicê da Esperança. Fitas coloridas,
pés descalços, pedaços de pau lembrando o maracatu... enfim,
uma festa divinamente brasileira que honrou a Deus em cada
movimento e ritmo. Aleluia!
Contudo, há ainda outra questão sobre a qual creio ser
necessário refletirmos, e esta está ligada à relação entre dança
e adoração. Para iniciar este momento, devemos voltar nosso
olhar para o conceito real de adoração: uma palavra muito usada
no meio evangélico e com tantos sentidos diferentes que aca-
bam gerando confusão,. até mesmo nos ministérios de dança.
O que é adoração? Bem, eu poderia escrever um livro somen-
te sobre esse assunto, o que não é meu objetivo no momento.
Mas posso tentar traçar algumas diretrizes para nossa análise,.
frutos de algumas pesquisas e vivências que tenho tido.
Do dicionário, temos adoração como veneração; culto que
se rende a alguém ou algo que se considere uma divindade;
respeito profundo (Dicionário Aurélio). Fica claro, portanto,

9 Antigas companheiras (Clarice Gualberto, Karen Arine, Miriã Gualberto, Priscila


Sath1er, Talita Estrela e Thaís Sathler: obrigada pela disposição de semprel), porque
reuni algumas ex-integrantes do grupo de dança Arte & Vida, que coordenei por
mais de cinco anos.
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112 Dança

que, para os cristãos, adorar é primordialmente prestar culto


a Deus. Quando se volta para a Bíblia, fica fácil perceber a
adoração na vida de diversas pessoas e em vários momentos do
povo que seguia ao Senhor. Mais do que cultos e momentos
dedicados especificamente para honrar a Deus, a adoração era
um estilo de vida daqueles que O amavam. Adorar era ter uma
consciência viva e permanente de Deus e Seus princípios.
Hoje também tem sido assim, certo? Certamente que não.
A palavra adoração, atualmente, tem, no meio evangélico, vá-
rios outros sentidos, ficando esse primordial em último lugar.
Agora adoração está relacionada ao louvor a Deus com músicas
(e deve-se ressaltar que um tipo bem específico de música).
Também tem relação com algumas atitudes ditas "espontâne-
as", e é nesse contexto que entra a dança. Fica até complicado
definir o que é adoração hoje. Prefiro ater-me ao que ela não é,
e, certamente, não tem sido entendida como um estilo de vida
constante de veneração e honra a Deus.
Danças de adoração! Qye equívoco fazer essa distinção!
Não existe uma dança específica que possa ser chamada de
dança de adoração. Existem danças por meio das quais pode-
mos adorar a Deus. E esse é um ponto de extrema importância
que deve ser tratado no seu grupo e deve ser sempre lembrado
durante seu ministério.
Obviamente, nossa adoração nunca será perfeita. Longe
de mim imaginar que isso seja possível. Mas considerar essas
questões e refletir seriamente sobre cada uma delas colabora
para um ministério que, de fato, agrade a Deus.
Portanto, entenda e aprenda que adorar a Deus com danças
é fazer uma coreografia bem-feita. Adorar a Deus com dan-
ças é dar o seu melhor durante o ensaio. Adorar a Deus com
danças é pesquisar, estudar e buscar se aperfeiçoar constante-
mente. Adorar a Deus com danças é considerar esse ministério

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Dança como ministério 113

específico de modo sério e sacrificial e não apreender qualquer


"nova onda" que surge no meio evangélico nessa área.
Quantas "novas ondas"! Dança profética, dança litúrgi-
ca, dança espontânea, entre tantos outros "estilos" de danças
"evangélicas". O que significam esses termos? Quem criou e
legitimou essas danças? Ao conversar com seus praticantes,
nem mesmo eles sabem explicar o que estão dançando com
fundamentos bíblicos ou técnicos. A meu ver, creio que, para
termos ministérios sadios de dança, precisamos enxergar, com
olhos críticos, essas "ondas" que chegam até nós e não nos dei-
xarmos envolver por esse "misticismo evangélico" (que envolve
muitas áreas, até mesmo a área artística) revelado nas tentativas
de invocar, por força humana e por meio da dança, forças so-
brenaturais ditas divinas. ''Andar sobre sal grosso para afastar
os demônios" é tão perigoso quanto crer que movimentos "es-
pontâneos" asseguram maior unção e ação do Espírito Santo.
Poderia ainda falar sobre danças de louvor, danças medita-
tivas, mas creio j á ter esclarecido essa questão, mesmo porque
nomes como esses surgirão a todo momento, e cabe a nós o
estudo e a pesquisa sérios quando tivermos dúvidas. Vale res-
saltar que creio na multiforme utilização da dança para louvor,
para evangelização ou para edificação da igreja.
Confusões à parte, gostaria de seguir tratando de algumas
questões mais práticas no que diz respeito a um ministério de
dança. Falemos, portanto, do seu início. Como começar um
grupo de dança?

Estruturação de grup_o_s_d_e_d_a_n_ç_a _
Por mais que se apresentem dicas e passos para a estru-
turação de um grupo de dança, não há uma fórmula pronta.
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114 Dança

Antes, é interessante rever alguns tipos de grupo de dança


existentes. Neste momento, agradeço às essenciais e deliciosas
aulas de minha professora de graduação, Júlia Ziviani,t° que
muito colaborou prática e teoricamente para minha forma-
ção. Comecemos, portanto, pelas companhias estatais, ligadas
à Secretaria da Cultura, que é a responsável pela escolha dos
cargos de direção das companhias. Há ainda grupos vinculados
a academias ou escolas (normalmente formados por alunos
amadores que pretendem crescer na área de alguma forma) e
também grupos independentes (formados por profissionais).
Qpando coreógrafos decidem ampliar suas idéias e seus traba-
lhos, surgem os grupos criados por eles nos quais assumem a
direção, produção e organização do grupo. Vale citar ainda os
grupos folclóricos profissionais.
Cada um desses grupos tem suas especificidades e funcio-
na de forma distinta. Qpando pensamos, então, em grupos de
dança dentro das igrejas, estes ganham mais características.
Assim também cada pessoa tem seu contexto e propostas pró-
prias que não têm como serem todas tratadas aqui. Mas alguns
passos podem ser citados na tentativa de auxiliar a estruturação
de um grupo de dança cristão.
O primeiro passo é ter objetivos claros. Qya1 será a proposta
do grupo? Para que público e em que locais o grupo se apresen-
tará? Qual a nossa linha estética (comece buscando a técnica
com a qual trabalharão)? Todas essas perguntas devem ser feitas
com o grupo - no caso de já haverem dançarinos - ou entre
os idealizadores do projeto. Sem essas perguntas claramente
respondidas, o grupo acabará se perdendo no caminho.

Júlia Ziviani é natural de Belo HorizontelMG e professora do curso de dança na


10

Universidade Estadual de Campinas - Unicamp.

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Dança como ministério 115

No caso de haver um ou dois idealizadores do grupo, a


seleção de dançarinos também será de extrema importância.
Ela trata de testar as habilidades de cada um e conhecê-los
mais a fundo. O que temos visto no meio evangélico é uma
aceitação ampla de qualquer pessoa que demonstre o desejo de
fazer parte de um grupo de dança, ainda que esta não possua
talento ou interesse suficiente para se dedicar à disciplina da
aprendizagem da dança. Neste momento, é importante traçar a
diferença entre sujeito dançante e dançarino.
Sujeito dançante somos todos nós. Faz parte de nossa natu-
reza nos expressarmos com o corpo e respondermos a estímu-
los externos por meio de gestos ritmados e compassados. Toda
pessoa é um sujeito dançante, se assim desejar.
No entanto, para ser um dançarino, as implicações são outras.
Há um ônus e um bônus quando se opta por esse caminho. Guido
Conrado (2005), ao tratar de questões relativas ao teatro na igreja,
afirma que "atuar requer sim uma disponibilidade do sujeito tanto
quanto de uma habilidade para tal" (p, 14). De fato, lidamos com
uma postura complicada na igreja que está relacionada ao "estar
disponível" para o ministério de dança sem o talento mínimo
esperado e, com a nossa falta de prática em sermos sinceros, di-
zermos em amor que tal pessoa não poderá participar do grupo
como dançarina, sendo bem-vinda em outras áreas. Sempre que
ministro oficinas, tento esclarecer o máximo possível essa ques-
tão, desafiando cada um a buscar sinceramente de Deus o seu
lugar no corpo de Cristo. Cada um de nós tem uma missão divina
a ser cumprida aqui na Terra. Em se tratando da dança na vida
de cristãos, há aqueles que são chamados para dançar. Outros,
para coreografar. Outros, ainda, para cuidar dos figurinos, criar
os cenários ou trabalhar com a sonoplastia. No final, o que resta
é a grande pergunta: você está cumprindo a SUA missão ou tem
tentado cumprir outra que não a sua? Você está no lugar certo?
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116 Dança

Para aqueles que não possuem uma habilidade para a dan-


ça, há duas possíveis razões para tal. Ou o sujeito, de fato, não
tem talento para a dança, ou falta -lhe técnica. Mais uma vez,
tomo emprestadas as palavras do meu grande amigo Guido
Conrado:

Com um trabalho criterioso, é possível fazer qual-


quer pessoa avançar seus próprios limites, mesmo que
em muito longo prazo. Mas, àquele que não conseguir
atuar de forma satisfatória, precisa-se oferecer um
cuidado ainda maior; devemos apresentar ao referido
irmão outras funções no grupo, algo que ele possa de-
sempenhar com êxito. Não é incomum caber ao teatro
receber as pessoas que não foram incorporadas pelos
corais, ou por grupos de louvor da igreja. E assim, em
relação ao teatro, ano após ano executado de forma
precária e mal elaborada, criou-se a ficção de que qual-
quer pessoa pode representar. Mas o fato é que não
pode! Enquanto não entendermos o trabalho artístico
como um chamado específico, não vamos dispor de
produções teatrais em nossas igrejas que dignifiquem
e testemunhem a glória do Criador. (CONRADO, 2005,
p. 15)

De fato, assim como no teatro, na dança ainda temos a


prática de aceitar e acomodar aqueles que claramente não têm
as condições mínimas necessárias para constituir um grupo de
dança. Investir em técnica e ensaio triplo deve ser a primeira
atitude para com aquele que não demonstra habilidade. Caso,
ainda assim, a pessoa "estacione" no seu crescimento técnico,
é hora de desafiá-la a buscar de Deus seu chamado (que tem
relação com quem ela é, suas características e facilidades) e

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Dança como ministério 117

oferecer outras possibilidades dentro do próprio ministério, ou


talvez até em outro.
Um dançarino é aquele que está disposto a priorizar a dança,
seja por meio da fidelidade às aulas e aos ensaios, seja por meio
de uma disciplina individual na busca do aperfeiçoamento ar-
tístico. Rory Noland (s/data), em seu livro O coração do artista,
menciona algumas características de um músico profissional,
as quais adaptei para a dança na tentativa de caracterizar um
dançarino
. profissional:
1. E pontual nos ensaios.
2. Está pronto para atuar em todas as posições.
3. Tem cuidado com o próprio corpo (alimentação, aqueci-
mento, preparo físico etc.)
4. Sabe ouvir o dirigente.
5. Está pronto para as entradas (atenção mesmo quando não
está dançando).
6. Realiza o final e o meio da coreografia com o mesmo zelo
do começo.
7. Aproveita os intervalos dos ensaios para sanar suas dúvi-
das, manter-se aquecido etc.
8. Sabe atender da melhor forma possível às instruções do
dirigente.
9. Não falta aos ensaios.
10. Busca sempre crescer.

É nesse momento também que se deve pensar bem sobre


o número ideal de dançarinos desejado; sobre especificidades
como sexo (apenas homens, apenas mulheres, ou, ainda, um
grupo misto?), nível técnico exigido dos dançarinos, técnica
com a qual o grupo trabalhará (contemporâneo, balé, folclórico
etc.), perfil desejado dos dançarinos (idade, características etc.),
etc. O ideal é que se organize uma audição para escolha dos
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118 Dança

dançarinos. Ao planejá-la, tente responder a algumas pergun-


tas, como:
00 Onde será divulgada a audição? A audição será aberta à

comunidade geral ou apenas aos convidados?


00 Onde e quando será realizada a audição? A audição será

realizada em apenas uma etapa ou em várias?


00 Quais os requisitos para os concorrentes?

00 Q1Iem serão os avaliadores?

Responder a essas perguntas pode ajudá-lo muito na hora


de escolher os integrantes.
Após a escolha dos dançarinos (ou durante esse processo),
deve-se também recrutar pessoal para trabalhar em outras
áreas do grupo. Segue abaixo um organograma geral de algu-
mas funções existentes e importantes num grupo de dança.
Obviamente, algumas funções poderão ser acrescentadas, mo-
dificadas ou excluídas, dependendo das necessidades e propos-
tas do grupo ou de um trabalho específico.

Estrutura de uma companhia

. .

. S:~~~~~~:~~:~~:::: .
:::
: Iluminação :
Eletricista

Maquinista Figurinista
....................... .
. ............................................... . .
~

. .. .. .. .. ~ .. .
:.~~~~~~. ~~r:'S~~~ .: t------: .~~~~~~. f~~S~~~ .:

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Dança como ministério 119

o quarto passo a ser dado é o planejamento de aulas, en-


saios, estudos ou encontros para o grupo. Qual será a periodici-
dade das aulas/ensaios (três vezes por semana, semanalmente,
etc.)? Qual será o próximo trabalho a ser desenvolvido?
Posteriormente a esse momento de estruturação do grupo,
segue o momento de produção em dança sobre o qual falarei
.
a seguir.

Produção em dança
Se nos dispomos a ter um ministério de dança, precisamos
arcar com o bônus, bem como com o ônus, dessa empreitada.
Produção em dança, especialmente no meio evangélico, não é
nada fácil, sendo um desafio para todos os que se propõem a
fazê-la.
Há várias possibilidades de produção. Pode ser que seu
grupo se proponha a construir apenas uma coreografia de
quatro minutos. Pode ser ainda que o projeto seja maior, e vocês
desejem produzir um espetáculo de 45 minutos. Isso dependerá
da proposta do seu grupo e das necessidades encontradas em
determinado momento.
Num primeiro momento, acontece a idealização do projeto.
Qual é a proposta do trabalho? Qual a temática com a qual
trabalharemos? O que será preciso fazer para ampliar os signi-
ficados dessa temática? Quanto a essa pergunta, sugiro algumas
respostas que são maneiras de se conhecer mais sobre o tema
proposto e de trazer para o corpo as respostas encontradas para
as questões temáticas.

1. Pesquisas, leituras e discussões: ler livros e textos relacio-


nados à proposta do trabalho podem ampliar o espetáculo
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120 Dança

à medida que o grupo conhece mais detalhes sobre o


tema proposto. Sugiro, portanto, que pesquisem - na
Internet, em livros e revistas - tudo o que puderem so-
bre o assunto a ser tratado. Discutam sobre algum texto
interessante ou sobre os materiais recolhidos pelo grupo.

2. Pesquisas de campo: de forma geral, essa expressão signi-


fica uma ou mais visitas a espaços relacionados ao tema.
Mas é importante esclarecer que essa não é uma visita
qualquer. A idéia é que cada um seja apenas um obser-
vador e perceba como se movem os corpos daquele lugar,
como se relacionam as pessoas, corno elas lidam com o
espaço e os elementos ali presentes etc. Durante essa ob-
servação, é possível anotar as percepções feitas para uma
análise posterior individual ef ou em grupo.

3. Vivências corporais: essas vivências podem ser feitas com


base na pesquisa de campo ou serem direcionadas pelo
coreógrafo. Os estímulos estão sempre relacionados à
temática proposta e podem ser sonoros, falados, visuais
etc. Estimular a criatividade e ver as respostas corporais
de cada dançarino pode revelar excelentes movimentações
e possibilidades inesperadas de elementos cênicos.

4. Oficinas específicas sobre o tema: trazer alguém de fora


para ministrar urna oficina sobre a temática proposta
ou mesmo ir até alguma instituição ou lugar que
ofereça workshops interessantes ampliará certamente o
conhecimento do grupo e suscitará novas idéias para se
trabalhar.

, , I ~. II • ,. I • lii
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Dança como ministério 121

Além do trabalho de construção coreográfica eda ideali-


zação do projeto, é necessário que se liste, àmedida que se for
coletando essas informações, quais serão os elementos cênicos
aserem utilizados, ofigurino, amúsica (se houver), bem como
outras necessidades específicas ao momento do grupo. Com
base nessa listagem, deve ser feito um planejamento de recursos
I

eda forma como estes serão levantados. Emuito importante


que, de fato, se planejem gastos, materiais etc, uma vez que,
no nosso meio, não temos ohábito de investir em produções
artísticas eprecisamos realizar nosso trabalho da melhor forma
possível.
Em produção de dança, esses são dois pontos básicos que
devem ser sempre considerados. De qualquer forma, épreciso
estar atento às necessidades que surgem durante o processo
de construção ebuscar as melhores soluções em vista das suas
possibilidades.
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epois de todas as questões aqui tratadas,


optei por escrever este capítulo, que é uma
tentativa de ajudá-lo, indicando algumas
possibilidades no caminho do conhecimento da
dança e reunindo um pouco do que a elucida e a
concretiza. Obviamente, o reunido aqui não exclui
outras tantas e excelentes manifestações da dança.
O intuito deste capítulo é, apenas, destacar algumas
mostras em dança, traçando um possível direcio-
namento para quem quer se aprofundar nessa área,
sem exclusão de outras manifestações que possam
existir ou, futuramente, surgir.
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124 Danca
~

Companhias brasileiras de dança


Todo dançarino, ou todo aquele que tem interesse em apro-
fundar-se no conhecimento da dança, deve priorizar o contato
com companhias que já desenvolvam um bom trabalho. É
importante esclarecer que boas companhias não são somente
aquelas que possuem dançarinos de excelente nível técnico.
Também não são aquelas que têm uma produção virtuosa.
Tudo isso é importante, mas uma boa companhia pode ser
reconhecida na excelência da sua totalidade. Deve-se prestar
atenção à coerência do trabalho, à novidade de idéias, às crí-
ticas apresentadas, à sintonia entre os dançarinos, à clareza da
proposta da companhia e a suas produções de uma forma geral.
Lembrando-se disso, programe-se para assistir a algum espetá-
culo em sua cidade. Sugiro algumas companhias de dança:

00 Qjiasar Cia. de Dança: companhia de GoiãnialGO, fun-


dada em 1988 por Vera Bicalho e Henrique Rodovalho;
desenvolve um trabalho no qual conjuga a cultura erudita
da dança com a cultura brasileira, misturando diferentes
estéticas e promovendo sempre relevantes reflexões e crí-
ticas à sociedade urbana. www.quasarciadedanca.com.br

00 Grupo Corpo: com mais de vinte anos de existência


(fundado em 1975) e trabalhos reconhecidos no mundo
inteiro, o Grupo Corpo é uma companhia de grande rele-
vância histórica por sua inovação artística, especialmente
na década de 1980. Também é vinculada à cultura nacio-
nal e com produções que buscam a reafirmação de uma
identidade brasileira. Possui ainda uma escola de dança
em Belo Horizonte/MG, cidade na qual a companhia foi
fundada. www.grupocorpo.com.br

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Algumas dicas 125

00 10 Ato Cia. de Dança: fundada em Belo Horizonte/MG,


a companhia possui um trabalho de extrema sensibili-
dade lúdica e valoriza detalhes nos movimentos e nas
produções como um todo. Os espetáculos revelam core-
ografias apuradas e um grande trabalho no que tange à
presença cênica dos dançarinos. Com mais de vinte anos
de existência e grande reconhecimento internacional, a
companhia tem se afirmado como grande colaboradora
no cenário da dança nacional. www.primeiroato.com.br

00 Cena 11: esse é um grupo com um trabalho inovador na


utilização de elementos cênicos associados à tecnologia e
apresenta um trabalho corporal próprio, criado pelo co-
reógrafo Alejandro Ahmed. O grupo é de Florianópolis/
SC e se caracteriza por possuir uma dança extremanente
relacionada com temas polêmicos, música eletrônica, re-
cursos tecnológicos e androginia na produção de traba-
lhos não-lineares, complexos e construídos com recortes
de todas essas temáticas. www.cena11.com.br

00 Deborah Colker (Rio de Janeiro/RJ): essa é uma compa-


nhia para quem gosta de muito espetáculo e aprecia a fa-
ceta atlética da dança. Isso porque o trabalho do grupo é
essencialmente voltado para a ampliação da resistência física
corporal, além do desafio aos limites do corpo, sempre pre-
sente em seus espetáculos. As produções cenográficas tam-
bém valem a pena serem vistas. A companhia é do Rio de
Janeiro/RJ e leva o nome da coreógrafa Deborah Colker.

00 Balé da Cidade: criado em 1968, a companhia é um corpo


estável do Teatro Municipal de São Paulo que iniciou seu
trabalho como companhia clássica e, posteriormente, foi
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126 Danca
"

transformada em companhia de dança contemporânea


(1974). O Balé da Cidade pode ser reconhecido por uma
excelência técnica, fruto das seis horas e meia de trabalho
diário de todos os dançarinos.

00 Grupo de Dança Gestus: companhia de AraraquaralSP


com a qual trabalhei em minha dissertação de mestrado,
podendo conhecer melhor a sutileza de seus espetácu-
los, baseados, em sua maioria, em obras literárias. A
coreógrafa, desde seu surgimento em 1990, é Gilsamara
Moura. www.gestus.com.br

Filmes, vídeos e documentários


Se em sua cidade o acesso a um espetáculo é limitado, alu-
gar um filme de dança pode ser uma boa pedida. Mas, antes de
fazer algumas sugestões, é importante que se faça a distinção
entre um videodança e um filme de dança, por exemplo. O
vídeodança se define como um gênero próprio da arte, não com
o objetivo de simplesmente documentar uma coreografia no
palco, mas com a idéia principal de criar uma coreografia em
função da obra cinematográfica, em que o movimento da câ-
mera desempenha um papel integrante da coreografia. Assim,
os movimentos da dança se mesclam aos da câmera; a dança
tendo como suporte a linguagem cinematográfica.
Portanto, sugiro aqui alguns filmes relacionados à dança.
Para conhecer mais sobre videodança, vá até videotecas e facul-
dades da área em sua cidade. Elas poderão ajudá-lo de alguma
forma. Aqui optei por reunir diferentes possibilidades video-
gráficas em dança, visando a alcançar diversas preferências e
facilidades de acesso distintas:

i I . .I I til' I , I 'I • I I 111 '


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Algumas dicas 127

00 Billy Elliol [Billy Elliol]:filme que conta a história de


O
um menino de onze anos que, em vez de praticar boxe,
como seu pai desejava, envolve-se com o balé clássico e
opta por vivenciar as alegrias e as lutas dessa decisão. É
um filme de extrema sensibilidade e de muito bom gosto
e vale a pena ser assistido por todos os interessados em
dança.

00 Dança comigo? [Shall we dance?]: nunca imaginei que pu-


desse sugerir um filme tão hollywoodiano, mas esse re-
vela a dança e sua motivação de forma sincera e sensível.
Diferente de outros filmes produzidos em Hollywood
relacionados à dança, Dança comigo revela princípios
bíblicos (como a preservação do casamento), e estes sur-
gindo como conseqüência do envolvimento com a dança.
Para aqueles que sempre relacionam a dança a questões
"carnais", essa é uma boa pedida.

00 Dançando no escuro [Dancer in lhe dark]: denso e sensível,


não se deixe enganar pelo título. Dançando no escuro é
um musical de narrativa não comumente atraente, mas
construído com uma fotografia belíssima, excelentes
cenas musicadas e dançadas e uma brilhante performance
da cantora Bjork.

00 Dança, paixão efama [Boolmen]: outro filme hollywoo-


diano, mas que vale a pena ser visto pelo incentivo ao uso
da criatividade, com a história de um operário siderúrgico
que opta por sapatear, utilizando estímulos e elementos
constituintes de seu contexto. É uma boa pedida para
quem quer se sentir motivado a criar e a dançar, ainda
que num contexto que não combine com tal produção.
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128 Dança

00 Série Rumos Itaú Cultural - dança: o banco Itaú tem


uma proposta de apoio e incentivo à cultura chamada
I taú Cultural. Nesse programa, há um trabalho específico
para a dança, até agora com duas edições, sendo uma em
2000, e a outra em 2003. Coreografias de todo o Brasil
são selecionadas, apresentadas em mostras da própria
série, gravadas e disponibilizadas para o público de forma
geral. Infelizmente, o acesso a essa série não é tão fácil,
mas vale a pena pesquisar nas videotecas e faculdades
(da área) em sua cidade na tentativa de encontrá-la. Para
quem é de São Paulo, ou visitará a cidade, basta ir até a
BibliotecalVideoteca do I taú Cultural para fazer algumas
consultas, disponíveis apenas no local.

Formação acadêmica em dança


Qpando prestei vestibular para dança, há alguns anos, não
tive muitas possibilidades de escolha, uma vez que só havia três
faculdades de dança em todo o Brasil. Hoje fico feliz em poder
fazer uma listagem (ainda inexata) de opções para quem deseja
ter uma formação acadêmica na área. É importante ressaltar
que ainda há muitos projetos em andamento para implanta-
ção de novos cursos e nada aqui registrado pretende fechar a
questão.

00 Unicamp (Campinas/SP): oferece graduação (bacharela-


do e licenciatura) em Dança; Mestrado em Artes.

00 UFBA (Salvador/BA): oferece graduação (bacharelado


e licenciatura) em Dança; Especialização em Dança;
Mestrado em Dança.

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Algumas dicas 129

00 Faculdade Angel Vianna (Rio de Janeiro/RJ): oferece


graduação (bacharelado e licenciatura) em Dança, cursos
técnicos em Dança e terapia através da Dança e, ainda,
a especialização em dança, em parceria com a UFBA.
www.escolaangelvianna.com.br

00 Uerj (Rio de Janeiro/RJ): oferece graduação em Dança.

00 UFRJ (Rio de Janeiro/R]): oferece graduação (bacharela-


do) em Dança. Especialização em Dança Educação. Possui
também outras atividades na área (Programa de iniciação
em Dança / Programa pré-profissional em DançalTécnico
em dança e coreografia). www.ufrj.com.br

00 UFV (ViçosalMG): oferece graduação em dança. www.


ufv.br

00 Unicruz (Cruz Alta/RS): oferece graduação (licenciatura


plena) em Dança. www.unicruz.edu.br

00 Faculdade de Artes do Paraná: oferece graduação (ba-


charelado) em Dança; Especialização Corpo Contempo-
râneo. www.fapr.br

00 Anhembi-Morumbi (São Paulo/SP): oferece graduação


em Dança e Movimento.

00 PUC/SP (São Paulo/SP): oferece graduação em Comu-


nicação e Arte do Corpo. www.pucsp.com.br

00 Faculdade Paulista de Arte (São Paulo/SP): oferece gra-


duação em Dança.
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130 Dança

00 PUC + RS: oferece especialização em Dança.

00 Udesc (Florianópolis/Se): oferece especialização em


Dança cênica. www.udesc.br

00 UEA (Manaus/AM): oferece bacharelado e licenciatura


em Dança. www.uea.edu.br

00 UniverCidade (Rio de Janeiro/RJ): oferece graduação


(licenciatura) em Dança.

Dança on-line
00 www.idanca.net

00 www.conexaodanca.art.br

00 www.rio.rj.gov.br/centrocoreograficodorio

00 www.revistadadanca.pt

00 www.escolaangelvianna.com.br

00 www.fccdigital.com.br/relache

00 www.itaucultural.org.br

00 www.artesemfronteiras.com.br

00 www.revistadadanca.com.br

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Foto de Luiz Paulo eném.

Camila Fersi, em Aca sos, direção de D ora Andrade, SESC Tijuca, 2004.
Foto de Anik M éier Werner.
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Lavínia Bizzotto, da Quasar Ci a. de Dança. Espetáculo Só tinha de ser


com você, 2005 . A realização desse trabalho se deu com o patrocíni o da
Petrobr ás e do Ce ntro Cultural Banco do Brasil, por meio da Lei Federal
de Incentivo à Cultura. Foto de Rubens C erqueira.

Lavínia Bizzotto e Samuel Kavalerski, da Quasar Cia. de D ança.


Espetác ulo Só tinh a de ser com você, 2005. Foto de Rub ens Ce rqueira .
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Gestus G rupo de D ança, em O homem que odiava a segunda-feira, 2005.

Ges tus Grupo de Dança, em O homem que odiava a segunda-feira, 2005.


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~EM AUTOR. Dandng thegoodbOON, In: Cnoreograpny ana


Dance, voI 1, parte]. Lon&es: Harwooa Acaaemic
Puonsners GmDR, 1~~2
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ATIS
-
Esta Obra foi composta pela Atis
Design, na fonte Adobe Caslon
corpo 12/15, eimpressa em Off-
set 75gr na Imprensa da Fé,
São Paulo,Brasil,Primaverade2üÜ7.

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