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1 Khaldoun, Ibn citado por Ulich, Robert (1954). Three thousand years of
educational wisdom. Cambridge, MA: Harvard University Press, p. 199.
1
fiz meus. Aqueles que aqui vão explicitamente citados exteriorizam
abordagens pertinentes a muitas das questões que me preocupam
como educador. Muitas das suas palavras foram vertidas para o
Português por tradutores abalizados. Quando, todavia, o título da obra
aparecer em língua diferente, a tradução é da minha inteira
responsabilidade. Espero que a tradução-interpretação desses textos
não fuja muito ao pensar que os consubstancia.
2
percebê-lo melhor, como algo integrado dinamicamente num todo
muito maior e eminentemente complexo. Estes textos são por isso
exercícios de reflexão cingidos por uma temporalidade limitada. As
percepções e as reflexões de amanhã ainda estão por fazer.
Casa do Freixo
Fevereiro de 1999
3
UMA EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO XXI
2 Davis, Wade (1985). The Serpent and the rainbow. New York: Simon &
Schuster, p. 172.
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continuamente o mundo em pedacitos, fazendo a
nossa parte. Mas como definir Loco, o espírito da
vegetação, aquele que dá poderes curativos às folhas?
Esta era a sua casa, e parecia-me que estava ali
estranhamente vivo e subitamente diferente, não uma
série de componentes, mas uma entidade viva e
singular, animado pela fé.
Que fazer de Loco, realmente! Onde é que ele cabe nos nossos
compêndios de ciência? Que fazer da unidade intrínseca do nosso
mundo quando o que sabemos fazer melhor é separar, decompor,
analisar? Como aperceber a teia de relacionamentos que define a
sociedade humana quando persistimos em tratá-la como um arranjo
simétrico de inúmeros fenómenos e actividades separados entre si
por noções de tempo, espaço e função? Que fazer de Loco,
realmente! Preocupamo-nos desmesuradamente sobre o que poderá,
ou deverá ser a educação no século XXI, como se por um acto de
magia o dia 1 de Janeiro de 2001, proporcionasse, um pouco como o
filme 2001-Odisseia no Espaço, o encontro com uma realidade súbito
transformada. Com toda a probabilidade, o dia 1 de Janeiro de 2001
será em tudo parecido aos dias 1 de Janeiro de qualquer ano. É
provável que chova nuns lados, neve noutros e se vá à praia no
hemisfério sul. Porquê, então esta preocupação com o passar do
milénio? O que é que a contagem dos dias em anos, horas e minutos
tem a ver com os processos de desenvolvimento da humanidade, tem
a ver com a educação? Será que em termos de aprendizagem o
amanhã seja mesmo o dia seguinte? Penso bem que não. Mas em
termos de ensino, o amanhã é mesmo o dia que se segue.
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de ser aperfeiçoada pelo homem racional e razoável; tudo isto
transformou por completo a face do planeta e revolucionou para
sempre a vida humana.
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· O conhecimento humano foi também condicionado, catalogado,
seriado, estandardizado e compartimentado convenientemente em
áreas distintas e autónomas, a que se chamou disciplinas, e que
raramente entravam em contacto umas com as outras. A visão da
realidade como um todo praticamente perdeu-se. Deu-se primazia
ao estudo aturado de partes desconexas e descontextualizadas
dessa mesma realidade.
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formatadoras, os clubes masculinos e os clubes femininos, os
agrupamentos políticos definidos mais pela rigidez da aderência
aos programas que pela discussão e acção livres sobre as
conjunturas sociais, os cartéis da produção, os sindicatos da
actividade laboral. Toda esta vida social desenrola-se através de
activismos consumidores de tempo, raramente através de acção
livre no tempo. O homem, e, apesar de tudo, irremediavelmente a
mulher, superprogramados, superocupados e superenquadrados,
perderam muita da sua capacidade de raciocínio crítico, de
pensamento livre, de acção transformadora. Os próprios processos
democráticos que surgem na esteira do liberalismo reforçam esta
conjuntura. Como já em 1926dizia um grande historiador
harvardiano, Arthur Schlesinger3: Em assuntos de religião, a igreja
diz, “Deixa-me pensar por ti.” Em assuntos de conduta pessoal, a
comunidade declara, “Nós pensaremos por ti.” Em assuntos
políticos, os líderes partidários anunciam, “Nós já pensámos por
ti”.
Há, todavia, cada vez mais sinais de insatisfação, cada vez mais
instabilidade, cada vez mais confusão, cada vez mais alienação, cada
vez menos esperança, cada vez menos fé no futuro. E, no entanto, a
riqueza rodeia-nos por todos os lados: os hipermercados abarrotam
de mercadorias e de compradores, as estradas estrangulam-se de
tráfico, as praias e os locais de prossecução de prazer nunca tiveram
tanta clientela.
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apesar do muito que cada vez mais existe por fazer, menos
capacidade temos de o executar. Parece, portanto, que não falta
trabalho. Parece que o que mesmo falta são empregos.
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escolas, que as enriqueçamos de gadgets electrónicos, que
reformulemos ad nauseam os seus currículos, poucos resultados
poderão ser conseguidos em termos de desenvolvimento. Daí que os
nossos projectos educativos devam ser cada vez menos planos
daquilo que queremos fazer e cada vez mais projectos daquilo em
que nos teremos de transformar. E somos nós, adultos, que
precisamos de projectos educativos transformadores, nunca as
crianças. As crianças nunca precisaram de reformas.
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Os responsáveis pela máquina, por seu turno, escolhem
empregados que sejam conhecidos pela sua lealdade, conformismo e
docilidade. As escolas tentam, por seu lado, produzir réplicas tão
exactas quanto possíveis, e sobretudo devidamente catalogadas e
classificadas, das diferentes peças requeridas pelo mercado. É assim
que a grande máquina funciona em ordem e em equilíbrio. A própria
noção de família que nos tem sido inculcada denuncia uma matriz
mecanicista, com funções, deveres e poderes explicitados
rigidamente para o homem, para mulher e para a criança. Bastará
ver a versão anos 50 e 60 da família feita por Hollywood, e a sua
reincarnação recente.
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O ser humano, por outro lado, não nasceu para a dependência.
Toda a dependência é uma forma de opressão e portanto
irreconciliável com a liberdade inerente a cada ser humano. Não é na
dependência que nos afirmamos, e vender a nossa liberdade por um
emprego estável não me parece muito compatível com a dignidade
de um homem ou de uma mulher. Toda a dependência como forma
de vida é um modo de servidão. Por isso, se tentou ao longo dos
tempos combater essa situação com a extremação de posições entre
as peças regedoras e as regidas na actividade humana. O
aparecimento de sindicatos, por exemplo, reflecte a tentativa de
suavizar a dependência na condição do emprego. Só que a estrutura
e os objectivos sindicais estão prenhes das mesmas características
que definem as organizações mecanicistas.
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Sabemos hoje, todavia, sobretudo desde a Lei da Incerteza de
Heisenberg, enunciada em finais dos anos 20, que as coisas não
parecem processar-se desta maneira. Sabemos hoje que a certeza na
ciência não é mais possível. Para isso bastou a constatação dos
dilemas levantados pela mecânica quântica. Deixamo-nos seduzir
pelo simplismo da causalidade linear e é fácil deduzir-se que não faz
qualquer sentido: o mundo e a vida dos homens são por demais
complexos para que para cada facto possa ser identificada uma única
causa. Falamos hoje em causas múltiplas, nas ciências do caos e na
ciência emergente da complexidade.
6 Drucker, Peter F. (1968). The age of discontinuity. New York: Harper & Row,
Publishers, p. 318.
7 Silberman, Charles E. (1971). Crisis in the classroom. New York: Vintage
Books, pp. 113-114.
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poderão estar no mercado do trabalho no ano de 2030,
nada poderia ser mais selvaticamente inútil do que
uma educação concebida para os preparar para
vocações específicas, ou profissões ou para facilitar o
seu ajustamento ao mundo tal como existe. Para ser
prática, a educação deveria prepará-los para trabalho
que ainda não existe e cuja natureza não pode sequer
ser imaginada. Isto só pode ser feito se os ensinarmos
a aprender, dando-lhes aquela disciplina intelectual
que os capacitará para aplicar a sabedoria humana
acumulada aos problemas novos que irão surgindo --
aquela sabedoria que lhes possibilitará reconhecer
problemas novos à medida que eles surgem. (...) Mais
importante ainda, a educação deveria preparar as
pessoas não só para conseguir o sustento de uma vida,
mas para viver a vida. Isto significa que as escolas
devem oferecer uma educação liberal e humanizante.
E o propósito de uma educação liberal deve, e na
verdade tem sempre sido, educar educadores --
produzir homens e mulheres capazes de educar as
suas famílias, os seus amigos, as suas comunidades, e
acima de tudo, a si próprios.
É lícito perguntar: mas afinal o que tem tudo isso a ver com o
emprego e a sua cultura, com o desemprego? Tem no meu entender,
tudo a ver. Nós construímos a nossa arquitectura social, política e
económica de acordo com a nossa capacidade de perceber o mundo.
Na era da macromecânica o paradigma mecanicista fazia todo o
sentido. Na era da mecânica quântica não faz nenhum. As matrizes
que asseguravam a aparente certeza de muitas premissas diluiu-se;
as coordenadas porque regíamos as nossas deduções científicas de
vida, tempo e lugar emaranharam-se; as grelhas de percepção do
mundo apertaram-se de tal modo que pouco ou nada conseguimos
ver. A mudança certinha e programada, o chamado progresso
evolutivo, a mudança na continuidade, transformou-se súbito na
mudança caótica, complexa, descontínua, incerta.
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Que fazer de um mundo em que o alicerce da paz baseada no
equilíbrio das super-potências ruiu e o próprio conceito de super-
potência produz a maior das confusões? Que fazer de um mundo em
que as fronteiras políticas e económicas se diluíram, em que os
produtos e pessoas podem transitar livremente e concorrer uÿns com
os outros praticamente sem restrições? Que vai fazer o pequeno
comerciante ou industrial que tinha um mercado definido, certo e
medível em centenas de quilómetros? Como vai ele competir com
um mercado tornado súbito global e caótico? Como vai o graduado
das escolas tradicionais, desenhadas para preparar peças para um
mercado de emprego mais ou menos previsível competir m outros
jovens vindos de sociedades maiores, mais agressivas, mais
desenvolvidas e com visões diferentes de empresa, produto e
mercado? Como vai o agricultor tradicional alentejano competir com
vantagem com as mais de mil famílias de agricultores holandeses
que escolheram o Alentejo para viver e trabalhar e se estão a dar
muito bem, muito obrigado?
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estímulo continuando a viver pelas regras do passado. Gaston
Bachelard10 já em 1934 dizia o seguinte:
Ora, o espírito científico é essencialmente uma
maneira de rectificar o conhecimento, ua maneira de
alargar o horizonte daquilo que é conhecido. Sentado
em julgamento, ele condena o seu passado histórico.
A sua estrutura é a consciência dos seus erros
históricos. Para a ciência, a verdade não é mais do que
a correcção histórica de um erro persistente, e a
experiência é um correctivo para ilusões comuns e
primárias. (...) A verdadeira essência da reflexão é
compreender aquilo que se não tinha compreendido
antes.
10 Bachelard, Gaston (1934). The new scientific spirit. Boston: Beacon Press, p. 172.
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algo em mudança constante, não evolução previsível, mas mudança
descontínua, caótica e complexa é fundamental para que possamos
encontrar um rumo para as nossas vidas como pessoas ou povos.
Não podemos continuar a esperar que os outros resolvam as nossas
carências de ocupação e de modo de vida. Não podemos continuar a
exigir simultaneamente a independência pessoal e a dependência do
emprego. Não podemos querer o melhor de duas visões do mundo,
de dois paradigmas que quase se excluem mutuamente.
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destinadas a suprir as necessidades de outras. Mesmo para aqueles
que conseguirem emprego, as condições de trabalho serão
completamente diferentes. Não serão mais caracterizadas pela
ocupação mais ou menos produtiva, mas pela contribuição que cada
empregado, melhor, que cada trabalhador poderá dar. Espera-se do
novo trabalhador que seja capaz de gerir ele próprio não só o seu
próprio trabalho, mas segmentos da actividade da empresa. Espera-
se que ele tenha iniciativa e qualidades de liderança; que se
mantenha a par de toda a evolução do ramos em que está envolvido
e que seja suficientemente generalista para a qualquer momento
poder assumir uma nova posição na empresa, ou mesmo, e o que é
mais importante, gerir a sua área, mantendo presente a visão e os
interesses globais dessa mesma empresa. No fundo, as qualidades
que se começam a exigir de um trabalhador a tempo integral numa
empresa são as mesmas que se exigem de um empresário.
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competência é baseada no saber, e em que a
tecnologia e a economia deverão sofrer mudanças
rápidas, a única segurança de emprego que faz sentido
é a capacidade de aprender rapidamente. A única
segurança real numa economia e numa sociedade em
fluxo é saber o suficiente para se ser capaz de mudar.
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astronauta, mesmo que telecomandado, tem noção do que acontece
e, face ao desconhecido, age com sabedoria: nesse momento,
conhecimento e experiência sublimam-se.
17Calvino, Italo (s/d). Seis propostas para o novo milénio. Lisboa: Editorial Teorema,
Lda., p. 22.
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Um e outro provêm de um mesmo ambiente, mas têm visões
diferentes da vida: o terráqueo encontra-se formatado para gerir o
peso da existência da gravidade unidireccional; o astronauta
encontra-se aberto para aprender a gerir o desassossego do infinito
espacial. Entre os dois há um abismo educacional. Se a formação,
melhor, se a formatação do terráqueo o levou a arquivar montanhas
de conhecimentos fragmentados e sem nexo aparente, a educação
do astronauta levou-o para o mundo das aprendizagens
permanentes. Se um foi ensinado, o outro foi levado a aprender. De
facto, como ensinar o caminho das estrelas?
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já é conhecida, e não o reflexo de mundozinhos feitos à medida das
nossas insuficiências.
18 Freire, Paulo (1970), Pedaogogy of the oppressed. New York: The Seabury Press,
p. 76.
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2. Uma educação para o século XXI tem de considerar a família
como parte integrante não só da sua estrutura humana, mas
também do seu processo curricular. O sucesso escolar dos
alunos depende em grande medida do ambiente familiar e
este, não haja dúvida, pode ser grandemente influenciado pela
escola. É preciso não esquecer que os pais, formatados que
foram na escola tradicional, guardam-na como a referência
única com que avaliam e compreendem a escolaridade dos
filhos. Por outro lado, muitos dos pais têm as mesmas
dificuldades que nós sentimos em encontrar o sentido deste
mundo novo. É mister, por conseguinte, que a escola
desenvolva esforços para não só integrar os pais na vida
escolar dos filhos, mas também para orientar os pais nos seus
próprios projectos educativos.
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e subordinar todas essas tendências em tendências a
imperativos éticos. Alicerçar um processo de aprendizagem, e
por conseguinte de mudança, na moral consensual e, portanto,
relativa, seria condenar o nosso futuro a uma cadeia
interminável de equívocos percebidos como dogmas, e a uma
concepção situacionista duma vida sem horizontes e, por
consequência, sem futuro. Proponho como horizontes éticos da
educação e da escola os valores absolutos da democracia, da
justiça e da liberdade.
É evidente que essa viagem não pode acontecer sem que haja
um roteiro. Esse roteiro deve ser o projecto educativo duma escola.
Parece indubitável que o projecto educativo não pode ser um plano
de estudos, previsto, certo, determinado, mas um projecto de
transformação de todos os seus intervenientes. Ora, enquanto que
um plano vive de um futuro fechado, prescrito e medido, o projecto
vive da tensão que existe entre o hoje e o amanhã, entre o ser e o
tornar-se, entre a visão e a realidade. O projecto educativo tem de
saber antecipar não só conteúdos importantes, mas processos de
aprendizagem e horizontes de desenvolvimento. E isso só será
possível quando abdicarmos da nossa condição de professores
detentores do conhecimento e nos elevarmos à condição de
aprendedores, isto é, quando conseguirmos passar da condição de
professores è condição de scholars, quando deixarmos de ser
técnicos educacionais e passarmos a ser cientistas, quando
deixarmos de ver o mundo, a realidade, como fragmentos
desconexos, mas como um todo integrado, dinâmico, vivo, e como
Wade Davis disse, animados pela fé.
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o espaço educativo da escola
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a seu tempo morrido, depois de, no entanto, haverem fecundado a
terra com outras sementes e a transformação da sua matéria.
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misturas estavam boas ou não. Ele como cabeça da pirâmide
sistémica vinha-nos demonstrar diariamente que nós éramos
importantes, que éramos elementos essenciais da empresa. A
mostarda era só um acidente.
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lógica: uma concepção determinista e mecanicista da
realidade. Se a lógica do mundo é a racionalidade da máquina,
a causalidade linear é o seu corolário necessário. Da mesma
maneira que a acção sobre a alavanca A força a roda B a
deslocar-se pondo um comboio imenso em movimento, o treino
das crianças em determinados conteúdos e segundo
determinadas metodologias, ministrado por mestres que por
sua vez tinham sido formados nesses mesmos conteúdos e
nessas mesmas metodologias, poderia produzir anualmente
fornadas de jovens treinados para o mercado do emprego,
suporte social da Grande Máquina. Daí a constante
preocupação que ainda ouvimos sobre as saídas profissionais
dos treinandos das escolas secundárias e superiores.
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caíram irremediavelmente por terra, sombras quase ilegíveis de um
passado sem futuro.
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continuamos presos por uma mentalidade que aceita sem grandes
angústias as maiores injustiças, desde que fora de portas.
Defendemos tenazmente a nossa liberdade, só que muitas vezes o
que defendemos não é a liberdade, mas o nosso catálogo de direitos.
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a liberdade dos outros, mas que seja compreendida como um
processo de desenvolvimento social: afinal a minha liberdade
começa onde começa a liberdade de todos os outros, e não tem fim.
Perguntar-me-eis então: como ensinar isto na escola? Não sei.
22 Handy, Charles (1990). The age of unreason. London: Arrow Books Ltd, p. 46.
23 Freire, Paulo (1970). Pedagogy of the oppressed. New York: Seabury Press.
31
compêndio que o consiga. Uma visão da realidade feita de respostas,
é uma visão necrofílica da vida. Por isso, Einstein24 disse uma vez que
as escolas se especializavam em transmitir conhecimentos mortos a
alunos vivos.
24 Einstein, Albert (1954). Ideas and opinions. New York: Bonanza Books, p. 60.
25 Freire, Paulo (1985). The politics of education. South Hadley, MA: Bergin &
Garvey Publishers, Inc., p. 94.
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ensinaram a ensinar? Qual o nosso papel num mundo de
aprendizagens? Como é que vamos agora organizar o nosso currículo
com tanta a gente a fazer tantas perguntas?
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cada um de nós saber actuar em concerto com os outros, criando
tendências, e também com o indeterminado. Um tal conceito de
realidade parece negar a nossa apregoada capacidade de
planeamento estratégico, ou até de muitos outros aspectos da macro-
gestão. Mais ainda, o próprio conceito de planeamento estratégico,
que em suma pretende fazer com que certas coisas aconteçam, é
mais próprio duma visão mecanicista e linear do mundo do que da
noção de um mundo aberto. O querer fazer com que determinadas
coisas aconteçam, limita, ao prescrevê-lo, o potencial possível duma
determinada organização. Daí, quanto a mim, um dos motivos da
falência de tantos projectos de reforma escolar.
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em futurologia e sem pretender apresentar nenhuma resposta,
gostaria, no entanto, de propor alguns conceitos para discussão.
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processo educativo. Tal atitude parece-me muito mais consentânea
com o modelo mecanicista, com a fábrica, com a Unifranck de que
vos falei no princípio desta palestra. Numa perspectiva
desenvolvimentista parece-me que o que verdadeiramente conta é o
grão de mostarda. Numa perspectiva desenvolvimentista parece-me
que o que verdadeiramente conta, que o verdadeiro espaço educativo
é o aluno, é a criança. Mas quantos de nós é que compreende isto?
Quantos de nós põe o interesse da criança em primeiro lugar quando
fazemos horários, ou delineamos currículos, ou desenvolvemos
metodologias, ou até quando lhes falamos. Perguntem a cada
professor o que é que ele ensina: se matemática se alunos, e
asseguro-vos de que vos assustareis com a resposta. Eu quando a fiz,
assustei-me. Peçam a um Conselho Directivo que altere o horário
duma escola porque um grupo de alunos precisa de ajuda que não
pode ser ministrada dentro dos confins apertados de um horário que
só leva uma coisa em conta: o conforto dos professores. E quanto
mais antigos, mais regalias. Perguntem ao Ministério, ou ao
administrador de qualquer escola, quantas pessoas lá trabalham, e
asseguro-vos de que se esquecerão das crianças.
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seres que nós fabricamos. Parece-me, pois, que uma outra tendência
será a de fazer com que os alunos trabalhem em grandes áreas de
conhecimento do que propor que estudem disciplinas desconexas. Se
ainda como educadores olharmos para fora e começarmos a
descortinar outras tendências, veremos que a escola como sala de
aulas terá de se reinventar como oficina/laboratório onde alunos e
professores investigam o real que nos contextualiza para o poder
compreender e explicar. Gostaria de levantar algumas questões:
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É claro que a transformação do processo educativo implica pelo
menos uma grande troca: teremos de trocar controle por poder.
Teremos de trocar o controle que um sistema baseado no ensino nos
proporciona por um poder diferente: não o poder hierárquico dos
sistemas fechados, o chamado poder-sobre, mas o poder duma
hierarquia de funções, ou o poder com. É esse poder como
capacidade e oportunidade de trabalhar, construir, transformar com
os outros que é o motor da educação como aprendizagem. É essa
concepção de poder que nos liberta para o estudo de tudo aquilo que
não aprendemos nas disciplinas que nos ensinaram na universidade.
Pois se o conhecimento é o centro do processo educativo e o aluno, a
pessoa humana constituem o espaço educativo, o que é que temos
estudado ultimamente sobre o funcionamento do cérebro, ou sobre a
teoria das inteligências múltiplas de Gardner, ou sobre o impacto da
física quântica ou da genética, ou da cibernética no processo
educativo? É provável que a maioria dos professores já tenha
participado em múltiplos programas de formação. É provável
também que uma grande parte desses cursos tenha andado à volta
da didáctica da matemática, ou da didáctica do francês, ou da
didáctica de qualquer outra coisa. Tudo isso não é mais nem menos
do que mais do mesmo, o que é muito pouco. Teimamos em ser
especialistas, mas alguém já definiu o especialista como aquele que
sabe cada vez mais de menos, até que sabe tudo de nada.
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Qual é o espaço educativo duma pessoa, dumacriança? Kevin
Kelly29 diz o seguinte: Talvez que o espaço da cognição possível, seja
o nosso espaço Qual o espaço possível da aprendizagem? Qual o
espaço possível da aprendizagem da vossa área de conhecimento? .
Qual será o limite da cognição possível da pessoa humana? Qual o
espaço possível do poder educativo duma comunidade?
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Gestão e organização escolar
Do controle à emergência
Quer isto dizer, que uma escola autónoma deve ser sempre
uma proposta nova e jamais uma resposta diferente. Quer isto dizer
ainda, que um projecto educacional deve viver em sinergia com todos
os outros sistemas ou subsistemas educacionais, sem, todavia, perder
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a sua identidade ou deixar-se submergir no facilitismo da
dependência de qualquer espécie. Um escola autónoma, que vive
como um sistema fechado, define necessariamente uma percepção
segmentada da realidade. Uma escola autónoma que se deixa
dissolver no sistema maior deixou de viver a vida: existe como um
apêndice a que falta integridade, carácter e congruência interna. Um
projecto autónomo de educação não deve surgir como reacção
separatista, mas como afirmação da liberdade e da responsabilidade
que temos de escolher os nossos próprios trilhos.
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quer numa organização escolar organizada, quer numa não-
organização escolar organizada?
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· Uniformização e estandardização: A preocupação com a
uniformização é quase obsessiva. Dos programas curriculares
nacionais ao tratamento das relações humanas e contratuais a
preocupação com a uniformização é elevada. Há tabelas e
formatos para tudo. Tudo tende a ser tratado da mesma
maneira. A noção de que o aluno entra vazio de saberes e
experiências e é enchido e formatado na escola advém do
conceito de escola como fábrica de profissionais, homens-peças
para a Grande Máquina do Mundo. É o império do quadrado e
do rectângulo nas mentalidades e na arquitectura.
31 Mintzberg, Henry (1994). The rise and fall of strategic planning. Hertfordshire:
Prentica Hall International (UK) Limited, pp. 227-228.
43
grandeza. Assim como cada peça de uma máquina
desempenha uma única função, de igual modo deve ser
concebido o labor humano. As funções são hierarquizadas em
termos de importância, poder e autoridade. Todo o trabalho é
bom e digno, mas cada macaco no seu galho. A instrução é
delineada de forma a promover lealdade, conformidade,
obediência, seguidismo. Ainda me recordo da frase de Salazar
escrita por cima da porta do gabinete do reitor de um dos liceus
que frequentei: Se soubesses o que custa mandar, gostarias de
obedecer toda a vida. É o reino determinista do magister dixit,
da realidade encapsulada nas páginas de um compêndio, da
imaginação reduzida à sua capacidade reprodutora, da eventual
mudança imposta de cima, como parte de um novo plano
estratégico. Ainda há muito disto por todo o mundo. Basta
entrar numa sala e observar a primeira acção dos alunos,
abrindo os seus cadernos, prontos a receber a lição do mestre,
numa reacção pavloviana fomentada por um conceito de
educação baseado na transmissão de conteúdos, aquilo que
Paulo Freire32 descreve do seguinte modo:
32 Freire, Paulo (1987). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra S/A,
p. 58.
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· Segmentarização do saber: Um conceito holístico do saber
humano não se coaduna com a visão de uma realidade que se
quer facilmente identificável e descritiva. A divisão do saber
em disciplinas autónomas, e ensinadas como se nenhuns laços
existissem entre si, acentua-se e perpetua-se, sobretudo no
ensino secundário e no universitário. A universidade é ainda
hoje a grande guardiã dessa tradição. É muito difícil querer que
professores instruídos numa só ciência, e nas virtudes da sua
autonomia, concebam e implementem eficazmente projectos
inter- ou transdisciplinares. Ou se é professor de Matemática, ou
de Física. Os próprios regulamentos da carreira e contratos
colectivos de trabalho, um pouco por todo esse mundo, assim o
prescrevem.
Alan W. era um óptimo professor de Biologia no Liceu de
Cambridge. Ainda o estou a ver entrar no meu gabinete,
sentar-se no cadeirão com abandono e falar-me da sua
angústia. Como continuar a ensinar Biologia por mais 25 anos,
era um futuro que ele não conseguia compreender. Alan era
também um escultor com um currículo invejável, mas a
universidade não o havia certificado nessa matéria. Para o Alan
ou a Biologia, ou nada. Os exemplos abundam.
45
Apesar de toda a boa vontade e de todas as reformas feitas e
por fazer, apesar de todos os esforços dispendidos, os diferentes
sistemas escolares estatais enfermam porque padecem todos do
mesmo mal: a demonstrada incapacidade de se reinventarem como
sistemas abertos, capazes de evoluirem e de se desenvolverem numa
relação sinergética com o mundo. Alguns sistemas escolares estatais,
e alguns particulares, são ainda, por natureza e por definição,
sistemas fechados, altamente hierarquizados e eminentemente
burocratizados. O modelo mecanicista está demasiado enraizado
para que possa ser transformado: a cultura prevalecente é a
mecanicista e não há vontade política suficiente, talvez até neste
momento, possível, que possa virá-lo do avesso.
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papel do estado é o de liderar o processo de criatividade, de
inovação, de mudança, de transformação. O que é verdadeiramente
perigoso é a liderança inovadora acoplada à gestão macro e micro de
todo o sistema, por outras palavras, o monopólio estatal, implícito e
explícito, de toda a gestão do sistema educacional. Mais grave ainda
é que isto tudo é um filme em que realmente não há bons nem maus.
As situações perpetuam-se porque se permite que se perpetuem.
Partíssemos agora mesmo para um processo de descentralização ou
de desconcentração do poder decisório, de possibilidades de
transformação, de verdadeiro empenho na reinvenção do sistema
educacional e suspeito que encontraríamos poucos preparados para
assumir os riscos de um tal processo. Fomos todos gerados e
formatados num mesmo sistema.
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transparece é a de um estado-providência, um estado-patrão, um
estado que por vezes até quer estar próximo dos cidadãos, mas que
nas suas manifestações de poder continua no topo de uma pirâmide
inassaltável.
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2. A perspectiva emergente, ou o novo voo de ícaro
49
sistema. Não há consenso sobre a regionalização do país, mas já
existem as direcções regionais no Ministério da Educação, e os
municípios, por seu lado, já têm algo a dizer quanto ao sistema
educativo dos seus cidadãos. A cultura, no entanto, permanece
enraizadamente mecanicista. É por isso que, estou convencido, de
que nem projectos de reforma, nem a descentralização
administrativa, poderão fomentar a emergência de condições
propícias ao desenvolvimento e ao aparecimento de novas maneiras
de conceber o processo educacional das crianças e dos adultos.
50
O facto mais importante trazido a lume ... por
sondagens cobrindo um período de 30 anos é
que mais de 60 por cento de pessoas que
obtiveram licenciaturas (em engenharia) nos
Estados Unidos ou tornaram-se gestores de
qualquer tipo nos 10 a 15 anos posteriores, ou
abandonaram completamente a profissão de
engenheiros para entrar nas mais variadas
paradas do mundo dos negócios ...
É por isso que, cada vez mais, a gestão escolar tem de evoluir
para a gestão da educação, que é um fenómeno muito diferente.
Perguntar-me-eis, onde ficará a escola? Qual a sua organização
futura? Confesso que não sei, nem estou muito preocupado com esta
ignorância assumida. Se a realidade é emergente, a minha maior
responsabilidade não é a de planear novas maneiras de remendar a
organização existente, mas a de ler os sinais dos tempos, de estar
atento às tendências que parecem prevalecer, de gerir aprendendo.
Há muito que compreendi que gestão era essencialmente uma forma
de pedagogia. Percebo hoje que organização escolar é um mero
acidente de percurso. Binney e Williams36 propõem o seguinte:
36 Binney, George, Williams, Colin (1995). Leaning into the future. London:
Nicholas Brealey Publishing, p. 7.
51
Líderes com sucesso em mudança combinam
liderança com aprendizagem: eles lideram de maneira
a que a aprendizagem seja encorajada; eles aprendem
de uma maneira que informa e guia aqueles que
desejam liderar. É a isto que chamamos inclinando-nos
para o futuro.
37 Heller, Robert (1995). The naked manager for the nineties. London: Little,
Brown & Company, pp. 352, 358.
52
A outra das tendências é, como já disse, a ênfase na
aprendizagem. Bostingl38, um dos proponentes das escolas de
qualidade, diz o seguinte:
38 Bostingl, John Jay (1992). Schools of quality. Alexandria, VA: ASCD, p. 37.
39 Senge, Peter M. (1993). The fifth discipline. London: Century Business, p. 25.
40 Binney, George, Williams, Colin (1995). Leaning into the future. London:
Nicholas Brealey Publishing, p. 147
53
A gestão escolar numa realidade emergente define-se assim
pela gestão de um projecto educacional. A maneira como os
intervenientes nesse projecto se organizam é fluida e nada
permanente. Numa tal escola nada é rígido, mas flexível: horários,
distribuição de trabalho, etc. Numa tal escola o meu amigo Alan W.
poderia ensinar escultura ou outra qualquer competência que
possuísse. É preciso não esquecer que um diploma qualquer não
confere necessariamente competência a ninguém. Aliás a nossa
competência varia com a nossa capacidade de perceber e gerir as
diferentes situações que encontramos.
41 Mintzberg, Henry (1994). The rise and fall of strategic planning. Hertfordshire:
Prentica Hall International (UK) Limited, p. 416.
54
para a complexidade de um projecto? Estou certo de que é este o
grande desafio da gestão, hoje. Permitam-me que sugira algumas
pistas, convicto que estou de que nada do que poderei dizer é novo
ou revolucionário. Uma das coisas que se aprende com a prática da
gestão e com a investigação, é a humildade. De facto, poucas são, se
é que existem algumas ideias verdadeiramente novas. Não considero
a originalidade como a preocupação principal do investigador ou do
gestor. Tenho mesmo sérias dúvidas se ela existe. O que é
importante é a criatividade, que no fundo não é mais do que pegar
naquilo que se conhece e reinventá-lo como uma outra coisa que
possa fazer e dar mais sentido à nossa vida, ao nosso trabalho, à
organização que gerimos.
55
concepção. Para que um projecto tenha maiores probabilidades
de sucesso é essencial que cada interveniente se sinta dono,
proprietário desse mesmo projecto. O gestor é-o sempre por
defeito.
56
mundos pequenos que o constituem, nem tão pouco pelo
número de interconexões que existem entre eles. A teoria da
complexidade42 parece indicar-nos que as organizações em que
o número de ligações entre os seus componentes é muito
reduzido tendem para uma vivência caótica muito irregular e
que o oposto tende a fazer com que elas se imobilizem num
gigantesco congestionamento de tráfego. Isto não tem muito
de novo numa perspectiva de bom senso, mas da perspectiva
científica é algo de muito novo.
57
das crianças mais elevado e a criação de uma comunidade de
aprendizagem mais autêntica.
58
mudança. O estado deve assim gerar e não gerir. Deve gerar
ideias, consensos, experiências, motivações, diversidade,
desenvolvimento, sinergias, e jamais gerir, centralizada, ou
descentralizadamente, as escolas. Qualquer gestão do estado é
sempre ingestão. Não estou a advogar que quanto menos
estado, melhor estado, mas sim que há uma medida certa para
essa intervenção. A pergunta que se levanta é: que fazer das
enormes estruturas estatais? Que não funcionam, todos nós
sabemos, por experiência e pela investigação. Parece-me que
uma boa medida seria reduzir a estrutura até ao ponto em que
não pudesse agir muito, mas pudesse pensar bastante.
59
A autonomia das escolas.
1 o reconhecimento
60
por todo o mundo: a escola coisificada no Estado; a escola baseada
no compêndio e no professor como leitor, transmissor e zelador da
dogmática compendial; a escola em que os alunos são considerados
objecto do ensino e produto da escola; a escola em que o educador é
compreendido como um técnico, raramente como um cientista; a
escola em que os pais existem fundamentalmente como fornecedores
da matéria prima, abstractamente, como intervenientes no processo
educativo dos filhos, raramente como parceiros da educação,
compreendida esta como um fenómeno pessoal e social.
Por outro lado, a autonomia não define, por si só, a escola como
um sistema aberto. A autonomia pura e simples pode criar um
sistema atomizado, desconexo e sem sentido. Daí que a escola tenha
de surgir como uma organização integrada num sistema local que,
por sua vez, se integra noutros mais complexos. Esta integração não
é mecanicista, mas dinâmica. A escola não se integra como um todo
determinado e prescrito, mas como um todo dinâmico, em que os
seus atributos e vivências se relacionam, influenciam e são
influenciadas pelos atributos e vivências dos outros sistemas. Essa
vivência define-se por três critérios maiores, a saber: a
responsabilidade, a possibilidade e a oportunidade. Analisemos, por
isso, cada um deles.
· A responsabilidade
Qualquer projecto educativo autónomo poderá fruir e ter vida
própria se a comunidade escolar e a sua liderança forem
responsabilizadas e se responsabilizarem pela sua
implementação. Anne C. Lewis44 diz que a capacidade de
tomada de decisão pela escola local tem sido trivializada
porque as pessoas não têm ou não querem o poder de efectuar
mudanças significativas. Paulo Freire45 chama a esta
incapacidade o medo da liberdade:
61
Os oprimidos, que introjetam a “sombra dos
opressores e seguem as suas pautas, temem a
liberdade, na medida em que esta, implicando a
expulsão desta sombra, exigiria deles que
"“reenchessem” o “vazio” deixado pela expulsão,
com outro conteúdo – o da sua autonomia. O de sua
responsabilidade, sem o que não seriam livres. A
liberdade, que é uma conquista, e não uma doação,
exige uma permanente busca. Busca permanente
que só existe no acto responsável de quem a faz.
· A possibilidade
62
O horizonte perscrutável define a medida do possível num
determinado momento. À medida que nos aproximamos desse
horizonte, dessa cumeada, um novo horizonte e uma nova
cumeada se desenham perante os nossos olhos, e uma
percepção mais alargada do possível põe-nos de novo em
movimento, impelidos que somos pelo sentido da
responsabilidade.
· A oportunidade
O sentido da responsabilidade perante um horizonte comum
implica necessariamente acção transformadora da realidade. A
escola autónoma não pode escusar-se a tirar o proveito máximo
das oportunidades que descortina, e ela descortinará tantas
mais oportunidades quanto menor for o seu medo da liberdade,
e quanto maior for o seu sentido da responsabilidade.
63
sobretudo, de pensamento sistémico. A capacidade que advém
da responsabilidade que sentimos de nos aperfeiçoarmos
continuadamente, de construirmos cenários, configurações
possíveis da realidade futura, e de podermos ver sistemas como
todos interdinâmicos, possibilita a identificação de áreas
passíveis de investigação, de projectos de aprendizagem, de
metas novas de desenvolvimento. Esta é uma tarefa
decididamente comunitária que viabiliza a configuração do
horizonte como um cone aberto para a realidade e não como o
espaço mediado por linhas paralelas, necessariamente
redutoras.
2 A partilha
64
objectivo e direito e não como atributo e com vivências
motivadas mais pelos interesses próprios do que pela viagem
de descoberta dos horizontes comuns e possíveis, é uma
sociedade perfeitamente inserida numa concepção mecanicista
do mundo e da vida; é uma sociedade que se alimenta do
passado, se bem que previsível; é uma sociedade dependente,
se bem que confortável; é uma sociedade com um futuro
determinado, se bem que certa; é uma sociedade
necessariamente hierárquica, se bem que estável; é uma
sociedade segmentarizada, se bem que definível; é uma
sociedade equilibrada, se bem que em morte lenta.
46 Prigogine, Ilya (1996). O fim das certezas. Lisboa: Gradiva, p. 150, 151.
65
A interdependência afirma a singularidade da pessoa humana e
não se baseia, como a tolerância – um estádio de desenvolvimento
mais primário que o da interdependência – no paradoxo irresolúvel
igualdade – diferença, ou como diz o slogan: todos diferentes, todos
iguais. Uma questão se levanta: como perceber a interdependência e
como traduzi-la na experiência comum, quando culturalmente todos
nós ainda vivemos, em maior ou menor grau, numa realidade que
confunde liberdade com direitos, que faz da autonomia um objectivo,
e que insere tudo isto num regime decididamente de dependência?
Por outras palavras, como é que pessoas e organizações dependentes
perdem o medo da liberdade, assumem a autonomia que lhes é
inerente e constroem uma vivência interdependente?
66
em si mesma, um processo de aprendizagem que envolve não só o
líder, mas todos os participantes endógenos e exógenos da
comunidade. É uma caminhada para a excelência, em que o que
conta não é propriamente a implementação das mecânicas de um
despacho normativo que visa uma reestruturação do sistema escolar,
mas a construção do sentido desse reordenamento – a promoção de
uma vivência escolar mais integradora. Esta legislação, que espero,
apesar das suas deficiências, venha a vigorar, tenta, assim, ainda que
timidamente, fomentar o aparecimento de novas formas de
organização e de gestão das escolas, de modo a que a
segmentarização da experiência escolar possa ser substituída por
outra muito mais integradora, que permita ao aluno, por exemplo, ir
da pré-primária ao 12º ano numa mesma instituição. É o que
acontece, por exemplo, na maioria dos colégios internacionais e numa
parte significativa das escolas privadas.
67
A percepção da realidade interdependente faz com que nos
sintamos assim mesmo, em casa. No paradigma mecanicista, não nos
era dado sentir em casa, pois nos encontrávamos imersos na
natureza e no concretismo das coisas. O nosso sucesso media-se pela
capacidade de nos conformarmos com o mundo, nunca pela
responsabilidade de olhar o mundo como uma realidade a
transformar.
3 o desafio
49 Freire, Paulo (1973). Education for critical consciousness. New York: The
Continuum Publishing Company, p. 38.
68
que denomina alguém ao serviço de outrém. A sobreposição do
Estado à Nação não faz sentido numa democracia, pois qualifica tipos
de regime autoritários e mesmo totalitários.
69
Hoje, como sempre, o Poder está nas mãos de um
grupo de homens que controlam a casa do Poder. O
chamado Poder é este grupo, cuja relação com os seus
compatriotas é a de governantes com governados. A
única mudança é a de que é agora mais fácil para os
governados mudar a composição do grupo que controla o
Poder.
70
estruturas governamentais da União Europeia, ou mais importante
ainda, no GATT, de maneira muito mais gráfica na Internet. Já nas
Nações Unidas isto não acontece tanto, uma vez que há países que
têm direito de veto. É nesta noção de poder com que tem de se
radicar o conceito de serviço público. Tenho proposto e mantenho que
a gestão do serviço público não deve ser outra que a dinamização da
sociedade civil. O princípio da subsidariedade que se aplica ao
relacionamento entre as nações da União Europeia, deveria ser a
norma que determinasse as relações entre governo, cidadãos e
organizações sociais.
71
das partes, mas geralmente duma melhor eficiência, tenho ouvido a
palavra coordenação, dos serviços administrativos.
72
escolas. Porque um direito da Constituição federal estava a ser
infringido, o governo federal pode legitimar a sua intervenção.
73
o projecto educativo: Uma visão desenvolvimentista
74
Não é fácil ser-se escola numa altura como esta em que não há
certezas sobre o que deveremos fazer para obter um determinado
resultado. Nós não sabemos até bem que resultados escolher. Por
isso, talvez, nos deixemos embalar no ramerrão do programa e do
compêndio, que pouco nos dizem como comunidade de pessoas
concretas. Por isso, adormecemos quantas vezes as nossas
consciências num fervilhar de actividades, mais parecidas com a boa
acção diária do escuteiro do que com uma acção deliberadamente
transformadora da realidade em que estamos inseridos.
75
poder parar, reflectir e mudar de rumo. Uma excursão já era antes de
acontecer. Um plano educativo é isto mesmo: não leva em conta as
situações concretas do dia a dia, nem as aspirações ou gostos
particulares de cada pessoa, nem objectivos pessoais ou mesmo
sociais. É uma viagem em que se embarca cujo itinerário alguém
determinou. É como uma fuga seguidista; um olhar sem ver; um
agir sem pensar. Óptima terapia para quem trabalhou e determinou
viajar sem pensar. Péssima receita para quem tem de trabalhar.
76
o passado e o futuro na dimensão do presente é difícil de resolver. O
presente fundamentado no passado oferece uma vivência cómoda, se
bem que fictícia. Para já, é impossível viver-se uma coisa morta, e o
passado é morto. Por outro, o passado também não é tradição. A
tradição é viva. A tradição é memória e é descoberta. É um pouco
daquilo que nos liga ao ciclo da vida das pessoas que existem, que já
existiram e que virão a existir. A tradição é assim como que um
projecto colectivo.
77
A massa de aptos que vive vidinhas dóceis, sossegadas,
encaixados em gabinetes burocráticos, puxando um papelinho atrás
doutro papelinho, tal e qual o operário da linha de montagem não tem
conta. Dezassete anos de escolaridade: aptos para quê? No sistema
mecanicista, hierarquizado e determinista em que ainda, de certo
modo vivemos, dezassete ou menos anos de escolaridade não eram
muito mais do que um passaporte para não trabalhar em actividades
laborais.O mundo da produção havia-se mecanizado e nem nos
chamados paraísos dos trabalhadores a situação era diferente.
Raramente a dacha no Mar Negro ia parar às mãos dos não
classificados aptos pela escola, e se encontrávamos aptos a trabalhar
na produção era muitas das vezes mais por castigo, que por mérito.
78
publicidade: não é paga! Se buscarmos um meio de transporte, não
há dúvida que optaríamos pelo Twingo, ou por um Volkswagen, ou por
um Ford, ou por um Rover, ou por qualquer outro carro que
despertasse a nossa fantasia e pudesse ser sustentado pela fartura
das nossas bolsas. Se quisermos, por outro lado, organizar um museu
dos transportes, talvez aí encontremos lugar para esse magnífico
exemplo da fantasia, da arte e do engenho humano que pertenceu ao
Magnífico.
79
muito a ver com a cultura do emprego e tudo a ver com a cultura do
trabalho.
80
O mundo, todavia, mudou. A nossa capacidade de perceber o
real alargou-se substancialmente. Os determinismos e as visões
mecanicistas perderam quase todo o seu sentido. A complexidade
impera. A incerteza desassossega-nos. A descontinuidade desafia-
nos. Como compreender e gerir mundo súbito interdependente,
caótico e tendente para o não equilíbrio? Como fazer sentido desse
mundo difícil de prever, mas completamente aberto e emergente?
Como educar para um mundo em que a actividade humana não é
mais vista sob a perspectiva do emprego, mas percebida como a
gestão do trabalho? Como educar para um mundo em que as
decisões não vêm necessariamente do topo da pirâmide, mas são
tomadas de forma muito mais participativa e mesmo a todos os
níveis? Como aprender a avaliar a amplitude da participação no acto
de decidir? Como aprender a identificar oportunidades? Como
aprender a gerir a descontinuidade no decurso das carreiras? Como
aprender a ver para lá do horizonte imediato? Como aprender a
trabalhar cooperativamente num contexto de concorrência
acentuada? Como aprender a decidir os momentos das nossas
mudanças? Como aprender a perceber uma realidade complexa, um
sistema aberto, uma escola como comunidade educativa?
81
passar mais de uma dezena de anos a estudar a mecânica
newtoniana que serve para explicar cada vez menos?
55 Freire, Paulo (1970). Pedagogy of the oppressed. New York: Seabury Press, p. 78.
56 Senge, Peter M. (1993). The fifth discipline. London: Century Business, p. 139.
82
respostas em que vivemos separa-nos culturalmente daquele outro
mundo, hoje fundamental, que é o mundo da aprendizagem, que é o
mundo das inquirições, que é o mundo do projecto. Atrever-me-ia
ainda a dizer que se de facto estamos interessados em desenvolver
um projecto educativo, teremos de optar pelo mundo da
aprendizagem, uma vez que, em meu entender, ensino e
aprendizagem são incompatíveis, pois pertencem a culturas, a
universos diferentes. Incompatibilidade, todavia, não inviabiliza a
coexistência. Todo o aspecto tecnológico da educação pode e, talvez
até, deva ser ensinado; não se pode, todavia, ensinar a ciência. Esta
só pode ser aprendida.
83
mesmo coisas compatíveis. A viagem da vida já não é, como o era
muitas vezes antigamente, uma excursão: 5º ano dos liceus -
amanuense; magistério primário - professor ou professora das
primeiras letras; licenciatura - título de doutor e direito a sapatos
engraxados por outrem; doutoramento - e o estatuto automático de
oráculo.
84
A recriação de nós mesmos como educadores-aprendedores
não pode acontecer na solidão das nossas pessoas como indivíduos.
Não há aprendizagem na solidão, só no convívio com os outros. O
projecto educativo como processo de aprendizagem apresenta-se-nos
assim com um duplo objectivo: a recriação de nós próprios como
educadores-aprendedores para a recriação da escola como um centro
de aprendizagem. Não há outra razão para um projecto educativo, do
que a de repensar continuadamente a natureza, função e objectivos
da escola em que trabalhamos.
61 Senge, Peter M. (1993). The fifth discipline. London: Century Business, pp. 6-12
85
por parte dos professores, todos os anos, eram sempre muitos mais
dos que aqueles que podiam ser satisfeitos. Faltava em meu
entender qualquer coisa de muito importante. Faltava-lhe alma.
Éramos quando muito, uma burocracia viva, criativa, consciente,
inovadora, flexível, mas ainda assim uma burocracia. Não tínhamos
ainda posto em causa o sistema. Não nos tínhamos questionado
seriamente sobre o que fazíamos. Quando identificávamos áreas que
mereciam uma atenção maior, tentávamos mobilizar recursos que
pudessem de algum modo aliviar esse problema. E assim por diante.
86
Lancei-lhes uma série de perguntas: como é que podíamos
definir a nossa escola? Será que o conceito de escola ainda fazia
sentido? O que significava ser professor? E ensino? E aprendizagem?
Quais as relações existentes entre estes conceitos? Cerca de 30
professores ofereceram-se para fazer parte desse grupo de discussão
que passou a reunir-se todas as quartas-feiras, julgo que às sete e
meia da manhã, uma hora, portanto, antes das aulas, para discutirem
o que é que afinal andávamos ali a fazer. A comissão funcionou
durante cerca de um ano. Mensalmente eram dadas informações
sobre o desenvolvimento dos trabalhos a todos os outros professores
e quando necessário eu era chamado para esclarecer ou ajudar numa
ou noutra questão. É claro que eu não fazia parte da comissão.
87
e dos outros, pois como disse Bostingl62: Sabemos agora que a única
maneira de assegurarmos o nosso próprio crescimento é ajudando os
outros a crescer. Aquilo a que os Japoneses chamam kaizen.
88
de discutir este último aspecto. Basta-nos o conceito de partilha e de
co-controle.
89
Um projecto educativo, tenha ele a forma que tiver, pode trazer-
nos esse sentimento de felicidade, esse sentido às nossas vidas
profissionais. Claro que como a felicidade, esse sentido tem e terá a
medida do possível e essa, quem é que sabe qual é? Quem é que
sabe qual é a medida do possível de uma criança? Quem é que sabe
qual é a medida do possível da nossa capacidade de agir? Quem é
que sabe qual é a medida do possível da nossa acção conjunta?
Quem é que sabe qual é a medida do possível de uma escola
trabalhando em conjunto, construindo uma visão comum,
aprofundando a compreensão das coisas, e olhando para a realidade
através de uma janela aberta, poderá fazer com e pelas crianças, por
si própria, pela comunidade que a integra?
65 Senge, Peter M. (1993). The fifth discipline. London: Century Business, p. 154.
90
esta a visão profética da escola: ser um laboratório hoje, do mundo
melhor que queremos construir.
Alvos para este ano – Os Alvos não têm nada a ver com o Plano de
Actividades da Escola. Os Alvos referem-se a acções ou
processos de desenvolvimento que deverão ter lugar em cada
ano de vigência do Projecto Educativo. Este domínio deverá, por
isso, ser elaborado anualmente, após uma avaliação cuidada e
participada dos resultados da implementação dos Alvos em
92
cada ano de vigência do Projecto Educativo. A avaliação deverá
ser feita por todos os órgãos de gestão da escola. O Conselho
Directivo/Director será responsável pela elaboração do
documento final, que terá, por sua vez, de ser aprovado pelos
outros órgãos de gestão.
93
res e
resolvedores
de
problemas.
2.1.1.3 2C O CLIP
Envolver os desenvolve
alunos no uma maior
planeament base de
o curricular. recursos.
2.1.1.4
Desenvol-
ver as
competên-
cias dos
profes-
sores na
apren-
dizagem
baseada
nos
conceitos
(Concept-
based
learning).
2.1.1.5
Desenvol-
ver as
competên-
cias dos
profes-
sores na
apren-
dizagem
baseada na
problemati-
zação
(Problem-
based
learning).
94
Metas mediações objectivos Alvos para Mudanças
sistémica sistémicas operacionais este ano sistémicas
s
2.2 2.2.1 2.2.1.1
Desenvolver Estimular Desenvol-
nos projectos de ver
professores investi-gação competênci
e alunos e de aprendi- as de
uma atitu-de zagem trabalho
de cooperativa. indivi-dual
investigação e em
acerca do equipa.
conheci-
mento.
2.2.2 2.2.2.1
Melhorar os Ligar pela
recursos dos www as
media. bibliote-cas
das Lower e
Upper
Schools.
2.2.2.2
Providen-
ciar
formação
suficiente e
bem
desenvolvid
a.
2.2.3 Mudar 2.2.3.1
os caminhos e Estimular o
os méto-dos uso de
de atingir os várias
objectivos de abordagens
aprendi- de
zagem. resolução
de
problemas,
dado que
não uma só
maneira
correcta.
2.2.3.2
Aplicar
metodologi
as de
ensino e de
aprendizag
95
em
baseadas
na Teoria de
Inteligência
s Múltiplas,
e nas de
aprendizag
em
baseada
nos
conceitos e
na
problematiz
ação.
2.2.4 Centrar 2.2.4.1
o CLIP na Promover a
problemática aprendizag
do em
conhecimento, individual e
fazendo com cooperativa
que todos os .
seus agentes
(alunos,
professores,
pais, etc.)
sejam sujeitos
dos seus
processos
individuais e
comuni-tários
de aprendiza-
gem.
96
Metas mediações objectivos Alvos para Mudanças
sistémica sistémicas operacionais este ano sistémicas
s
2.2.4.2
Fazer com
que todos
os
membros
da co-
munidade
escolar se
sintam res-
ponsáveis
pelo
sucesso dos
seus
processos
indivi-duais
e comuni-
tários de
aprendizag
em.
66Citado por Ferris, Timothy (1997). The whole shebang. New York: Simon &
Schuster, p. 285.
97
Uma ética para a acção educativa
98
Por outro lado, um mundo cada vez mais difícil de compreender
e que cada vez exige mais de nós como pessoas e como sociedade,
envolve-nos numa sensação de fragilidade ansiosa, por vezes, mesmo
numa sensação de impotência que tentamos dissimular. Parece-me
que o problema que se nos põe agora já não é propriamente um
problema de dúvida e, por consequência, um sentimento de
desespero, como diz Kierkgaard. A dúvida pressupõe a possibilidade
de uma escolha: crer em Deus ou não crer, casar ou não, ter filhos ou
não ter, ir para a universidade ou não ir, pactuar ou não com um
sistema injusto. A dúvida pressupõe também a possibilidade do ser
humano controlar o contexto, a conjuntura em que se encontra. Por
isso Kierkgaard69 dá tanta importância à escolha e ao momento da
escolha.
69 Kierkgaard, Søren (1986). Either / Or. New York: Harper & Row, Publishers, p.
200.
70 Kaufman, Stuart (1995). At home in the universe. New York: Oxford University
Press, p. 23.
99
por essas leis. Eu tenho ainda a audácia de ter a
esperança de que nós já podemos começar a esboçar
algumas delas. À falta de uma melhor frase geral, eu
chamo a estes esforços a busca por uma teoria da
emergência.
100
o hoje-futuro, o hoje-amanhã, o hoje-esperança, e nunca como o hoje-
tempo-parado, o hoje-imediato, o hoje-sempre-ontem. Miguel Torga 72
que pensou bem sobre estas coisas, diz-nos num dos seus belos
poemas, intitulado Eis-nos aqui:
101
Uma destas, (…) é a dualidade existente dos
oprimidos que, “hospedando” o opressor, cuja “sombra”
eles “introjectam, são eles e ao mesmo tempo são o
outro. (…) Quase sempre este fatalismo está referido ao
poder do destino ou da sina ou do fado – potências
irremovíveis – ou a uma destorcida visão de Deus.
Dentro de um mundo mágico ou místico em que se
encontra, a consciência oprimida, sobretudo a
camponesa, quase imersa na natureza, encontra no
sofrimento, produto da exploração em que está, a
vontade de Deus, como se Ele fosse o fazedor desta
“desordem organizada”.
102
O paradigma mecanicista, saído da mecânica newtoniana, veio
fortalecer esta visão. Conformou-se assim toda a realidade ao
modelo da máquina: cada pessoa uma peça, cada acção um
movimento, o encadeado de movimentos em uníssono, a ordem.
Uma sociedade ordenada era uma sociedade pacífica, rica, útil, moral.
Urgia, portanto, controlar a vontade para que esta por sua vez
dominasse o resto do ser humano. Definiu-se a pessoa humana, pré –
ou sem escola, como uma tábua rasa; o único conhecimento válido
era aquele que a escola transmitia. Como numa máquina, o
fenómeno B procedia sempre de A e C era sempre o resultado de
A+B. O conceito da causalidade linear tudo podia explicar.
103
Se no sistema patriarcal medievo os valores eram impostos
directamente, com o individualismo a situação altera-se. Se o homem
considerado em abstracto é o repositório das virtudes e dos valores, o
homem-concreto, concebido agora como auto-suficiente e movido
pelos instintos naturais e pela razão, deveria ser despertado para os
valores que lhe eram inerentes e educado para atingir essa função
superior. A formulação da escola como uma máquina de formatação
de homens e de mulheres-modelo levou a que os valores fossem
considerados como uma das partes do currículo escolar que deveria
fazer do homem-concreto uma aproximação cada vez maior do
homem-abstracto-modelo. Daí que surgisse um sistema de educação
para os valores, aquilo a que se chamou a educação do carácter. As
história bíblicas, os grandes feitos dos heróis altamente seleccionados
e romanceados, os poemas que exortavam à prática individual de um
bem, de virtudes e de feitos definidos à partida, constituíram alguns
dos meios através dos quais se efectuou a educação para os valores.
Os valores surgiam como mais uma disciplina, ou pelo menos como
um objectivo distinto da formação, melhor ainda, da formatação dos
jovens. Tínhamos, assim, não acção educativa, acção transformadora
da pessoa humana e do seu mundo, mas actividade educativa,
actividade que não nascia de um projecto, mas de um plano, e cujo
objectivo não era propriamente o desenvolvimento, mas o progresso
linear do ser humano, perfeitamente prescrito, previsível e medível.
Muitas das práticas educativas que ainda seguimos têm como critério
e valores esta concepção do ser humano e do mundo. Quantas vezes
não estrangulamos a realidade que deveria ser possível numa
realidade pré-definida e, portanto, sem potencial. Quantas vezes não
reduzimos a acção humana, a acção educativa, a meros actos
implementadores de objectivos, por vezes bem intencionados, mas
sempre redutores do horizonte possível dessa mesma raça humana.
104
Nos anos vinte, uma explosão de criatividade e de um laisser-
faire, laissez-passer, avassala as grandes capitais europeias. Essa
explosão tem causas múltiplas: os efeitos sociais da descoberta da
teoria da relatividade de Einstein e da realidade quântica, mais tarde
sintetizada no princípio d incerteza de Heisenberg, o desejo de
experimentar a plenitude da vida depois dessa hecatombe horrível
que foi a Primeira Grande Guerra, uma guerra em que não se
degladiaram ideologias, mas que surge como uma verdadeira
tragédia, o abandonar dos espartilhos que caracterizavam a rigidez
moralista da era vitoriana.
105
levadas a cabo pela França e por Portugal, a sua falta de justificação
moral e a sua futilidade final, pareceram dar razão a todos aqueles
que se recusaram, pela fuga, a participar nelas. Só que uma atitude
verdadeiramente ética teria possivelmente levado esses mesmos
jovens a lutar ao lado daqueles considerados como oprimidos. Tal
tomada de decisão teve muitos poucos adeptos. É esta geração, a
minha geração, que está agora no poder, e é visível em tantos dos
nossos líderes a nível mundial, essa falta de fibra, de estrutura
interna, e de coerência ética e moral.
106
O método, portanto, minimiza a análise racional da
actividade humana e, como consequência, não pode
deixar de cair num relativismo profundo (…). Todos os
valores são iguais: é meu gosto, a minha idiossincrasia
que determinam a sua hierarquia. A única coisa que
peço é que respeitem o meu “posicionamento” e eu, em
troca, prometo tolerância para com os outros. A
tolerância acaba por ser o único valor absoluto. Não se
vê como é que um jovem assim educado na clarificação
de valores se possa indignar com um Hitler, ou com um
Watergate, ou com Apartheid ou com qualquer outro tipo
de escravatura moderna.
107
não queres que te façam a ti. A liberdade, a igualdade e a
reciprocidade são componentes essenciais do conceito de justiça. Um
programa de educação moral kohlbergiano 79 deve centrar-se na
discussão de dilemas morais, reais ou hipotéticos. Tais
procedimentos formam –- como ele disse – um currículo intelectual
explícito de educação moral. A teoria de desenvolvimento moral de
Kohlberg80 não ocorre só a nível cognitivo, a vivência experiencial é
de importância vital, e nesta vivência é fundamental que as crianças
aprendam a assumir o papel do outro, tomando consciência dos
pensamentos e sentimentos, etc. Esse assumir do papel do outro,
mesmo que inclua aspectos afectivos, é primordialmente um acto
intelectual em que o que conta é a criação de uma situação de
justiça, baseada no respeito pelos direitos uns dos outros.
108
últimos são decididamente superiores aos primeiros. Tal postura é
decididamente não relativista84.
109
A este nível (nível 3) a moralidade é concebida em
termos interpessoais e o bem é igualado ao ajudar e dar
prazer aos outros. Esta concepção de bem é considerada
por Kohlberg e Kramer (1969) como funcional nas vidas
de mulheres maduras na medida em que as suas vidas
acontecem no lar. Kohlberg e Kramer sugerem que só se
as mulheres entrarem na arena tradicional da actividade
masculina poderão reconhecer a inadequação desta
perspectiva moral e progredir como homens para níveis
mais elevados em que as relações estão subordinadas às
regras (nível 4) e as regras aos princípios universais de
justiça (níveis 5 e 6).
Aqui reside um paradoxo, pois as características
que definem o “bem” nas mulheres, o seu desvelo (care)
pelos outros e a sensibilidade às necessidades dos
outros, são as mesmas que as marcam como deficientes
em desenvolvimento moral. Nesta versão de
desenvolvimento moral, todavia, o conceito de
maturidade deriva do estudo da vida de homens e
reflecte a importância da individuação no seu
desenvolvimento.
110
Da conjunção destas duas faces poderá surgir o estabelecimento
duma sociedade verdadeiramente interdependente. Kohlberg e
Kramer não parecem ter muita razão quando sugerem que o
desenvolvimento moral das mulheres passa pela sua masculinização.
Parece-me bem mais razoável afirmar que o desenvolvimento moral
de pessoas e sociedades passa, outrossim, pela descoberta por cada
homem da sua feminilidade, e da descoberta por cada mulher da face
masculina que a inteira.
111
para a acção humana, educativa em particular, e mentalizados que
estão na necessidade de encontrar receitas a todo o custo, muitos
políticos e educadores dos nossos dias lançaram-se num activismo
frenético de definição de problemas e de esquematização de
respostas. Mas voltemos ao nosso filme.
112
religiosidade fundamentalista, ela própria eivada quantas vezes da
ideologia individualista ainda predominante. A conversão de Jerry não
surge de um momento de introspecção, ou mesmo até de
arrependimento. Ele converte-se porque, no vazio materializado do
sucesso que experimenta, recorda subitamente os ensinamentos do
seu mentor principal, e é esse guru – figura imprescindível em
qualquer processo de formatação de consciências – que, através da
memória, o vai guiar passo a passo, situação a situação. Jerry passa,
assim, de escravo do sucesso material a seguidor irreflectido de uma
ideologia moral. Pelo meio, Jerry perde todos os seus clientes à
excepção de um, perde a namorada de sucesso, mas encontra uma
outra que não quer sucesso, mas que quer ser inspirada, e,
finalmente, de slogan em slogan, de receita em receita, num frenesi
de movimento, Jerry acaba por provar ao mundo que há uma outra
maneira de viver e de ter sucesso.
113
supostamente fragilizada por um casamento desfeito, lealdade como
o valor fundamental nas relações humanas, superior ao amor como
catalisador da família. A moral óbvia é que se o casamento falha e
deteriora em violência ou em qualquer outra situação desumana,
aguenta!, que o que conta é a lealdade. (6) e por fim, o Sexo: Há
duas cenas de relações sexuais no filme. Na primeira, Jerry e a sua
primeira namorada são exibidos na vertigem da relação sexual,
exacerbada por grunhidos primários de prazer e engalfinhados numa
posição, senão heterodoxa, pelo menos criativa. Para além dos
grunhidos conseguem-se ouvir frases que denotam uma contínua
avaliação da performance em curso, como se aquele acto não
existisse como um acto em si próprio, mas como um acto sequencial
e referenciado. Exige-se performance porque há expectativas e uma
cultura da sexualidade como prazer descontextualizado. Na segunda
cena sexual que envolve Jerry e a contabilista, o contexto é
completamente diferente. Jerry e a namorada são apresentados
depois do coito. Estão deitados calma, tradicional e passivamente.
Moral óbvia: se não queres sexo com stress arranja uma contabilista
sem ideias.
114
É difícil ser-se contra esta litania de deveres. Todavia, esta
nova versão da educação do carácter peca, como as anteriores, em
muitos aspectos, como por exemplo: a noção kohlbergiana de
desenvolvimento moral é praticamente abandonada; o ensino directo
de valores presta-se a críticas, o papel da escola, se bem que
mencionado, não é suficientemente explicitado; o papel do professor
no processo da educação moral das crianças é de tal maneira vasto
que desafia os super-homens e as super-mulheres da classe docente;
o aluno não é considerado como agente interveniente, como sujeito
desse processo, mas surge como objecto; acima de tudo, é um
projecto que, praticamente, nasce e morre dentro da estrutura
escolar e que confunde vivência ética com bom comportamento. Por
outro lado, e como já vimos, há muito de mito nas razões que Lickona
aponta como motivadoras desta nova abordagem de educação do
carácter.
89 Freire, Paulo (1973). Education for critical consciousness. New York: The
Continuum Publishing Company, p. 4.
90 Holt, John (1997). How children fail. Citado por Kohn, Alfie. How to teach values.
In Kappan (78) 6, p. 429.
115
Não concebo uma educação, seja ela moral ou não, que não
parta e que não viva da realidade e que não tenda para a
transcendência. E digo isto porque não concebo uma educação que
não seja aprendizagem. Ora, só se aprende fazendo, e o fazer
pressupõe a existência de um projecto. É evidente que há lugar para
algum ensino, mas esse ensino tem de se limitar à invenção,
melhoramento e transmissão das ferramentas necessárias à
aprendizagem. Toda e qualquer intervenção do professor tem de
acontecer no contexto dum diálogo honesto e humilde com os alunos,
com os outros professores, com as outras pessoas para a descoberta
do mundo e da maneira como devemos agir nele e com ele,
sobretudo, para a sua transformação.
116
mecânicos, como o do jogo de palavras. Daí que concordo
plenamente com Kohlberg quando ele diz que estes valores, que eu
chamo relacionais, são mesmo um saco de virtudes: só são virtudes
enquanto estão no saco.
91 Freire, Paulo (1973). Education for critical consciousness. New York: The
Continuum Publishing Company,, pp. 3, 4.
117
as pessoas. Por outras palavras, ninguém é democrata sozinho,
ninguém é justo sozinho, ninguém é livre sozinho.
118
horizonte da ética não pode ser o indivíduo, mas tem de ser a própria
vida, como expressão da acção de pessoas.
93 Freire, Paulo, Shor, Ira (1987). A pedagogy for liberation. Massachusetts: Bergin
& Garvey Publishers, Inc., p. 13.
94 Freire, Paulo (1994). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra S/A,
p. 58.
95 Soelle, Dorothee (1981). Choosing life. Philadelphia: Fortress Press, p. 89.
119
medium da publicidade, o que conspurca cada emoção humana,
porque pressupõe que tudo está para venda. A negação desta
educação massificada poderá estar no desenvolvimento da
capacidade de olhar a realidade reflectida e criteriosamente. Esta é
uma das capacidades fundamentais da construção de uma
comunidade democrática, justa e livre.
96 Emerson, Ralph Waldo (1969). Selections. Kansas City: Hallmark Editions, p. 21.
97 Kierkgaard, Søren (1986). Either / Or. New York: Harper & Row, Publishers, p.
170.
98 Eliot, T. S. (1970). Collected poems. San Diego: Harcourt Brace Jovanovich,
Publishers, p. 154.
120
activismo dos nossos dias super-ocupados perdendo assim de vista os
horizontes de desenvolvimento que dão sentido à vida?
121
Asas e Raízes*: Repensando a Escola
* Não resisti à tentação de roubar este título. A quem? Mais adiante se verá.
99 Slavin, Robert E. & al. (1994). Roots and wings: Inspiring academic excellence.
Educational Leadership, (52) 3, pp. 10-13.
100 Slavin, Robert E. & al. (1994). Roots and wings: Inspiring academic excellence.
Educational Leadership, (52) 3, p. 11.
122
Mas como funciona o MundoLab? Funciona exactamente como o
nome indica, como um laboratório da realidade. Slavin 101 e os outros
autores do artigo descrevem uma das sessões:
101Slavin, Robert E. & al. (1994). Roots and wings: Inspiring academic excellence.
Educational Leadership, (52) 3, p. 10.
123
redes fluviais ou marítimas. No MundoLab, os alunos tiveram de
investigar por si próprios as condições da vida na Baía de
Chesapeake, situada na região em que vivem, e que para além de ser
um dos viveiros mais importantes de ostras, caranguejos e bivalves
da costa leste dos Estados Unidos, é também um local
verdadeiramente paradisíaco. Essa aprendizagem não tinha a ver
com um local desconhecido. Muito pelo contrário, ela incidia sobre
temas que decerto eram mote de conversa e apreensão no seio das
suas próprias famílias. A aprendizagem do inter-relacionamento das
várias actividades humanas – a pesca, a agricultora, a economia local
– forçosamente levou os alunos a terem de analisar os problemas
através das perspectivas das diferentes disciplinas: a biologia, a
química, a matemática, a estatística, a sociologia, a psicologia, a
ecologia, a história, a geografia, a física, para além de terem de
aprender a dominar outras ferramentas da aprendizagem, como a
escrita, a retórica, o trabalho em equipa, a capacidade de ouvir,
reconhecer, assimilar e relacionar as diferentes intervenções, a
flexibilidade necessária para assumir o papel de uma outra pessoa, a
arte do debate parlamentar.
Asas e raízes. Sem dúvida. Mas a maior parte das vezes aquilo
que passa por educação das crianças e dos jovens não se radica nem
voa: espraia-se na horizontalidade indefinível de um solo infértil.
Medimos a educação pela extensão dos programas, pelo volume das
124
cargas horárias, pelas capacidades exibidas pelos alunos de encaixar
e de desencaixar, com maior ou menor facilidade, aquilo que lhes
damos por conhecimento. Parece que sempre assim foi. Parece que
assim terá de ser. Os trabalhos de projecto e a área-escola têm dado
pouco mais que um sem número de feiras medievais.
102 ERT – The European Round Table of Industrialists (1997). Investing in knowledge.
Brussels: ERT, p. 8.
103 The Economist (1997, March 29). Education and the wealth of nations, p. 15.
125
(…) se um governo pudesse ter uma só função, a
educação deveria ser essa função. Nada daquilo que um
governo providencia – estradas, leis de impostos,
regulamentos, defesa, polícia – se lhe aproxima em
importância. (…) Sem educação, a seu tempo, a economia
colapsa, as receitas fiscais afundam-se, a ética e a moral
entram numa situação caótica, as drogas e a violência
governam, a tecnologia e a defesa deterioram-se, a
democracia degrada-se, as infra-estruturas apodrecem –
tudo para nada.
104 Knoke, William (1996). Bold new world. New York: Kodansha International, p.
303.
105 Schlechty, Phillip (1990). Schools for the 21st century. San Francisco: Jossey-Bass
Publishers, p. 15.
126
resposta esperada, a moralidade no bom comportamento, tudo
encadeado linearmente, logicamente e regularmente. Este mundo-
máquina, fabricante de homens e de mulheres-peças e gerador de
instituições formatadoras de coisas e sociedades serviu bem a
humanidade e permitiu-lhe, praticamente, vencer o espectro da
escassez.
Palavras duras, saídas de alguém que vive o dia a dia do mundo real,
competitivo, incerto, complexo e desafiante. A escola que
conhecemos é muito mais o contrário: é pouco competitiva – as
vantagens e desvantagens de cada concorrente estão praticamente
definidas à partida, é certinha, simplista, previsível e muito irreal. A
vida escolar é quase uma vida de clausura, uma metodologia
iniciática, em que os segredos da vida não são descobertos, mas
transmitidos pouco a pouco, consoante a idade, o grupo e a estrutura
socio-económica do aluno. A escola baseia-se ainda na transmissão
daquilo que já se conhece. A sua vida, portanto, alimenta-se do
106Knoke, William (1996). Bold new world. New York: Kodansha International, p.
303.
127
passado, exactamente aquilo que pouco ou nada diz ao aluno do
presente, cidadão do futuro.
128
O professor cria um clima de pesquisa que promove a
aprendizagem com compreensão, ao invés de simples
memorização de factos107.
107 Secules, Teresa, et al. (1997). Creating schools for thought. Educational
Leadership, (54) 6, pp. 56-60.
108 Prigogine, Ilya (1996). O fim das certezas. Lisboa: Gradiva.
129
o desgaste, por outras palavras, a morte. É por esta e por outras
razões que tenho afirmado que é difícil que um projecto codificado de
reforma escolar possa aproximar a escola da realidade, possa
transformar a escolaridade em projecto educativo. As reformas que
conhecemos, nascidas que foram na matriz mecanicista, tendem
sempre para a reformulação da escola, alterando algumas das suas
variáveis, mas mantendo intacta a sua concepção como sistema
clássico. Por outras palavras, as reformas tendem a sanar problemas
de desequilíbrio – a falta de motivação dos professores, o insucesso
dos alunos, a alienação dos pais – pela reimposição de um novo
equilíbrio sistémico conseguido pela reformulação de alguns aspectos
do sistema escolar. Permanece, assim, intacta a obsessão da
mecânica clássica com o problema da ordem linearmente concebida,
dependendo esta do nível de controle que se consegue exercer sobre
o sistema. Daí, também, a dificuldade, diria mesmo, a incapacidade
que os órgãos centrais de gestão escolar têm em deixar as escolas
viver a sua liberdade natural. Nabokov, citado por Prigogine 109, estava
convicto, no entanto, de que o que pode ser controlado nunca é
completamente real, o que é real nunca pode ser rigorosamente
controlado. Por isso, parece haver tão pouca relação entre a escola e
a realidade; talvez, por isso mesmo, haja tão grande insucesso
escolar por parte dos alunos e tanta falta de motivação nos
professores.
109 Prigogine, Ilya (1996). O fim das certezas. Lisboa: Gradiva, p. 150.
130
contínua, não só do contexto em que vivemos, mas, sobretudo,
do desenvolvimento de instrumentos que nos permitam ver
com cada vez maior clareza e perspicácia as estruturas mais
íntimas, os critérios mais subtis, as tendências mais
prevalecentes.
110 Citado por Schenkat, Randy (1993). Quality connections. Alexandria, VA: ASCD,
p. 40.
111 Schmoker, Mike (1996). Results. Alexandria, VA: ASCD, p. 18.
131
estar. Numa linguagem que ecoa os pensamentos de
Farmer, ele descobriu que geralmente o que as
pessoas mais apreciam é a perseguição de uma
meta clara, fazível e que valorizem. Esta ligação
explica porque muitas pessoas são mais felizes a
trabalhar do que nos seus tempos livres. Na
ausência de metas, o que se instala é a entropia e a
vida sem desígnios.
132
da vida nos surpreende. Além disso, a parte visível da casa
nunca está acabada: ela evolve e transforma-se com a nossa
própria evolução e transformação. Costumo dizer que o alicerce
está para o ensino como a casa está para a aprendizagem.
Exactamente nas mesmas proporções. O alicerce da
aprendizagem define-se pelos conhecimentos, ferramentas,
metodologias, técnicas, tecnologias que devem e, por vezes,
têm de ser ensinados. O alicerce é, assim, como que o passar
do testemunho da tradição do saber humano a uma nova
geração. É a herança que recebemos. Todavia, tal como o
alicerce duma casa, o alicerce não pode ser nem o princípio
nem o fim do processo educativo: apenas isso, o alicerce
invisível e inabitável, mas imprescindível.
133
3. asas e horizontes
114 Senge, Peter (1992). The fifth discipline. London: Century Business, 150.
134
abordagem sistémica, total. Urge, portanto, quebrar moldes. Urge sair
da armadilha do familiar. Urge perder o medo do que se não conhece.
A verdadeira missão da escola é conhecer o desconhecido, é pôr em
causa o familiar, é desformatar a realidade corrente.
Asas e raízes. Talvez seja na tensão que entre elas existe que
vive a nossa dimensão educacional. Talvez a fecundidade do adulto se
alimente da possibilidade da criança. Talvez a realidade humana mais
verdadeira seja a criança. Que fazer, todavia, do ser complicado em
que nos tornámos? Como redescobrir um processo educativo que nos
liberte para a vida sem nos amarrar a um amanhã prescrito?
115Handy, Charles (1990). The age of unreason. London: Arrow Books Limited, p.
201.
135
Que aconteceu às asas da nossa curiosidade de crianças, que
tudo inquiriam, tudo punham em causa, tudo exploravam? Onde
estão os horizontes vastos que nos permitiam pensar o impensável?
Talvez que tenhamos de esquecer muito daquilo que aprendemos na
escola. É pena que tenhamos de reaprender o que nos era natural
como crianças.
136
Educação intercultural: Caminhos e horizontes
137
para lá do Cabo Espichel não tinham muita liberdade, nós também,
não nos safávamos lá muito melhor.
138
Norte têm em relação à Europa e usamos muitas vezes essa situação
como um dos critérios por que julgamos os seus sistemas de
educação. Na Europa dos sessenta, todavia, quem é que conhecia
Portugal? Não fora o Eusébio e o Benfica Lissabon e talvez nos tivesse
sido impossível aderir à União Europeia por invisibilidade geográfica.
139
vida, morte após morte? Como refazer das cinzas a nossa matriz
comum? Como reavivar essa ancestralidade herdada? Como afirmar a
humanidade que nos define e nos contextualiza?
140
lhe pergunto se já pediu à mãe, a resposta invariável é que, sim
senhor, já o fez, mas a mãe não deixa. E adianta logo, pegando em
todos os estereótipos que observa: Mas a mãe não manda nada, tu é
que mandas! Por sua vez, à minha secretária diz que quem manda
mais nela é a mãe, porque saiu da barriga dela, e que o pai também
manda, mas só um bocadinho. Quando lhe prego o sermão do
costume, sobre autonomia e responsabilidade, vai-se embora
resmungando que um dia quem vai mandar é ela.
116Levi, Primo (1989). The drowned and the saved. New York: Vintage International,
p. 112.
141
fortaleza, só a violência poderá transformar essa situação. Aliás,
conhecemos esta história, quase todos, na carne.
142
cadinho e redimir-se. Gente como essa, não deveria ser considerada
cidadã.
143
A educação multicultural é, como toda a educação, uma
afirmação política destinada a estimular (1) o desenvolvimento da
identidade de pessoas e grupos, (2) o reconhecimento do valor da
diversidade cultural e linguística, (3) o estabelecimento de projectos
de cooperação, (4) a promoção dos direitos humanos e do respeito
pela diferença, (5) a compreensão pela escolha de estilos de vida
alternativos, (6) o alargamento e aprofundamento da justiça social e
da igualdade de oportunidades, e a facilitar a distribuição equitativa
de poder entre indivíduos e grupos 117. Como todo e qualquer processo
de aprendizagem, a educação multicultural é um processo de
transformação da realidade. Não faz sentido de outro modo.
144
manta de retalhos, um mosaico de mini-subculturas que praticamente
só surge como uma espécie de todo nas grandes festas religiosas e
na mercearia da esquina. Uma visita a Cambridge Street, em
Cambridge, Massachusetts era uma visita pelos arquipélagos dos
Açores e da Madeira e pelo continente: cada ilha com seu clube e,
durante muito tempo, com a sua festa religiosa própria. A barreira da
língua e de alguns costumes, a passagem de uma cultura rural para
uma cultural industrial, já a acenar a era pós-industrial, a alteração
profunda do papel da mulher e da criança na família, e a força
centrípeta exercida pelos clãs, impediram durante muito tempo a
comunidade portuguesa de se sentir como um todo.
145
políticos, mesmo quando constituem a maioria. Os primeiros políticos
portugueses na América das décadas de setenta e oitenta foram
geralmente eleitos sem grandes apoios dos seus pares. As gerações,
todavia, que saíram das escolas transformadas pela
multiculturalidade, já o conseguem com maior facilidade.
118 Aronowitz, Stanley (1997). Between nationality and class. Harvard Educational
Review, 67 (2), p.190.
119 Aronowitz, Stanley (1997). Between nationality and class. Harvard Educational
Review, 67 (2), p.192.
146
ser alterados para permitir aos excluídos a entrada na vida pública.
Talvez o exemplo mais vívido deste comportamento contraditório seja
o da affirmative action. Como sabem, affirmative action, acção
afirmativa, é o sistema pelo qual empresas e agências
governamentais estabelecem quotas para mulheres ou minorias
raciais. Foi a acção afirmativa que permitiu a líderes de minorias
entrarem nos quadros docentes e administrativos das escolas para
poderem daí, exercer a sua mais ampla acção transformadora.
147
Alentejo é mesmo bom para a agricultura, e por espanhóis que nos
vêem como uma extensão natural dos seus mercados, e por romenos
e búlgaros e outras gentes que mal conhecíamos dos livros de
geografia, e por aqueles que conhecíamos dos livros de geografia,
mas que julgávamos acomodados um pouco mais para além dos
Açores, especialmente agora que já não nos tinham como cabeça e
consciência.
148
grande. E não há melhor fábrica para esses processos que a escola.
Diz Derek Woodrow120:
149
prescrever o que se ensina, como se ensina e quando se ensina. Tudo
devidamente estruturado, inspeccionado e medido. O caso inglês
talvez seja o mais paradigmático. As escolas inglesas que se definiam
por uma preocupação consciente pelos contextos educacionais dos
alunos vêem-se hoje manietadas no determinismo do Acto de
Reforma Educacional de 1988. Uma realidade determinada é uma
realidade estática, uma realidade que perpetua o status quo. Ora o
status quo ainda é eminentemente discriminatório e exclusivista.
Verma121 diz que: Muitos estados da Europa Ocidental afirmam, e
provavelmente acreditam, que promovem a igualdade e que esta é
um pilar das suas leis e administração. Infelizmente, todavia,
podemos sem grande dificuldade argumentar o contrário. Ora a
educação intercultural não pode reduzir-se a um processo de troca
informativa dos aspectos culturais mais evidentes, nem tão pouco
definir-se por uma abordagem destes fenómenos sociais que não
passa de um falar desentranhado. Muito pelo contrário, a educação
intercultural tem de ter por base a formação de cidadãos capazes de
perceber a natureza plural da vida e de agir sobre essa realidade
transformando-a continuadamente em algo melhor.
150
Em última análise, os objectivos da educação intercultural são
aqueles que definem hoje qualquer visão da educação. Quer isto
dizer, que num mundo plural não cabe nenhum conceito de educação
que não pressuponha essa pluralidade, que não seja intercultural.
Todavia, aquilo que vemos não é bem assim. A interculturalidade
aparece como algo periférico, quando devia constituir a centralidade
da escola. Pois como educar crianças, todas elas plurais, em sistemas
afirmadamente monoculturais, monolinguísticos e monolíticos.
124 Suzuki, David (1997). The sacred balance. Vancouver: Greystone Books, p. 218.
151
Para fenómenos tão complexos não há evidentemente
respostas simples. Gostaria, no entanto, de adiantar uma ou duas
hipóteses. O ideário educacional marxista é, por definição,
mecanicista e determinista. Quer isto dizer, que a acção do homem
pode determinar o futuro da história. E a certeza dessa possibilidade
levou, muitas vezes, a pensar que nenhum sacrifício presente seria
demais tendo em conta as benfeitorias do futuro. Como explicar de
outro modo, os milhões de mortos no processo de colectivização
agrária na URSS? Por outro lado, a opção deliberada por uma
liderança centralizada e ligada hierárquica e linearmente ao resto da
população, impossibilitava o fluxo de informação e a dinâmica
indispensáveis a qualquer processo de desenvolvimento.
152
história como um fenómeno inevitável porque fruto da vontade e da
engenharia humana. Esta situação agrava-se quando os próprios
referenciais de ética e moral são relativizados, como geralmente
acontece em tais sistemas: os fins tendem a justificar os meios.
153
tendências e evidências parecem, também, definir a história
dos nossos dias. Os resultados não poderão ser bons, a não ser
que agarremos a oportunidade de praticar uma educação e
acção transformadoras.
126 Leistyna, Pepi, Woodrum, Arlie (1996). Context and culture: what is critical
pedagogy? In Leistyna, Pepi, Woodrum, Arlie (Eds). Breaking free. Cambridge:
Harvard Educational Review, p. 3, 5, 7.
154
3 A interculturalidade está umbilicalmente ligada à noção de ser
humano e esta é influenciada pelo avanço das ciências,
especialmente da biologia. O avanço tremendo da genética tem
levado alguns cientistas a formulações desumanizantes. Reduzir
toda a vivência humana a fenómenos genéticos para daí
extrapolar políticas sociais, como já tem acontecido, é
transformar ciência em cientismo. Todavia, parece não haver
muita dúvida que o avanço da engenharia genética poderá
alterar profundamente aquela igualdade que ainda nos
distingue como seres humanos.
127 Silver, Lee M. (1998). Remaking Eden. London: Weidenfeld & Nicolson, pp. 1-11.
155
combinadas de muitos indivíduos, operando ao
longo de muitas gerações, poderá talvez fazer
surgir uma humanidade polarizada mais
horrífica que a Huxley imaginou no seu Brave
New World.
128 Bartolomé, Lilia I. (1996). Beyond the methods fetish: Toward a humanizing
pedagogy. ? In Leistyna, Pepi, Woodrum, Arlie (Eds). Breaking free. Cambridge:
Harvard Educational Review, p. 249.
129 Jones, James M. (1972). Prejudice and racism. Reading: Addison-Wesley
Publishing company, p. 178.
156
Homens e mulheres hoje:
Sob o signo da ética, da estética e da emergência
157
afirmamo-nos pela nossa acção responsável e criativa sobre o mundo,
para a sua transformação. Creio que o passado importa à construção
do presente como memória, não tanto como reminiscência. Mas como
resolver o paradoxo aparente que existe na interdinâmica memória-
esquecimento? E será que existe mesmo um paradoxo? Não será
antes que essa interdinâmica liberta o passado como um fenómeno
emergente desataviado daquilo que é acidental? Se é um facto que
as Idades do Ouro de ontem parecem tornar os nossos dias numa
realidade envergonhada, certo é, também, que nada impede que as
misérias de hoje não sejam as Idades de Ouro amanhã.
130 Prigogine, Ilya (1996). O fim das certezas. Lisboa: Gradiva, p. 11.
158
Com efeito, no decurso dos últimos decénios nasceu
uma nova ciência, a física dos processos de não-equilíbrio.
Esta ciência tem conduzido a novos conceitos, como a
auto-organização e as estruturas dissipativas, hoje muito
utilizadas em domínios que vão da cosmologia à ecologia
e às ciências sociais, passando pela química e pela
biologia. A física de não-equilíbrio estuda os processos
dissipativos, caracterizados por um tempo unidireccional,
e, ao fazê-lo, confere um novo significado à
irreversibilidade. (…) A irreversibilidade já não acontece
apenas em fenómenos simples. Está na base de grande
número de fenómenos novos, como a formação dos
turbilhões, das oscilações químicas e das emissões laser.
159
trinta anos. A guerra, que há trinta e tal anos ainda era ainda
considerado um acto heróico, não o é mais. Ninguém de bem ousaria
fazer hoje a apologia da guerra. E, todavia, ainda há guerras, se bem
que localizadas, pois nem todos se encontram no mesmo nível de
desenvolvimento moral. No Portugal de há cinco ou seis anos, quem é
que falava na violência familiar como problema grave da sociedade?
No entanto, ela é hoje notícia quase diária. Quem é que, nesse
tempo, consideraria a exploração do trabalho infantil como uma
violência à criança? Todavia, tais casos são denunciados hoje com um
zelo quase fundamentalista. Continua a haver violência familiar e
exploração da criança, mas a consciência social do nosso povo, como
um todo, já não as tolera.
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interdependentes. Da vida empresarial à política, da familiar à da
formação, o ser humano como pessoa começa a ser percebido como
muito mais importante que as noções e formas de organização. Os
grandes modelos já não fazem muito sentido como sistemas
enquadradores da actividade humana. Os grandes paradigmas
perderam praticamente a capacidade das grandes racionalizações.
Compreendemos cada vez melhor que é no estudo da fluidez
complexa das interacções de pessoas com pessoas e com a realidade
que podemos chegar a abordagens mais aproximadas do que significa
gerir processos e gerar novas maneiras de os conceptualizar.
132 Freire, Paulo (1987/1970). A pedagogia do oprimido. São Paulo: Editora Paz e
Terra S/A, p. 78.
133 Senge, Peter (1993/1990). The fifth discipline. London: Century Business, p. 13.
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Há sinais, todavia, que nos poderão permitir um melhor
aprofundamento da nossa realidade presente. Não creio que os sinais
fundamentais tenham muito a ver com a ciência, ou com a
tecnologia, ou com sistemas políticos, ou organizações sociais.
Ciência, tecnologia, política e organização são hoje cada vez mais
processos de aprendizagem que linhas mestras de desenvolvimento.
São mais veículos que caminhos. Mais atitudes que saber. Mais
actividade que acção. Proponho três outros sinais, três perspectivas
através das quais devemos compreender um pouco melhor a
realidade que somos e que nos contextualiza, a saber: a ética, a
estética e a emergência.
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Inglaterra. Mais tarde, o sistema político e judicial francês corrigiu de
certo modo a injustiça feita a Dreyfus. Esse sistema, todavia,
permaneceu. O caso Dreyfus foi isso mesmo, um caso. O segundo
incidente que gostaria de sublinhar é o do caso Profumo. Em ambos
os casos paira a insinuação da possibilidade de actos de traição. O
caso Profumo insere-se perfeitamente no modus vivendi e operandi
da guerra fria com todas as suas teias emaranhadas de espionagem.
John Profumo foi demitido das suas funções de ministro, mas a sua
declaração final elucida bem a maneira como estes casos ainda eram
julgados. Profumo disse que tinha infringido o 11º mandamento: Não
sejas apanhado! O caso Profumo que encheu de parangonas os
jornais durante muito tempo, também não logrou modificar
profundamente o sistema.
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Nixon não foi condenado pela infâmia tragicómica que foi o caso
inicial do Watergate. Nem tão pouco o foi por o ter tentado abafar,
camuflar e manipular. Não acredito que tenha sido a sua conivência e
conhecimento directo do que se estava a passar, nem talvez o facto
de haver mentido à nação americana, se bem que tudo isso tenha
pesadomuito. A manipulação da verdade é algo praticamente
inevitável no processo de governo de nações imperfeitas, pois como
gerir de outro modo situações de guerra, de concorrência ideológica,
comercial, tecnológica e científica. O que o condenou foi a sua
arrogância de pensar que como líder eleito duma democracia poderia
agir como se fosse superior à lei. Foi também a sua incapacidade
política de não ter conseguido perceber que a nação americana tinha
mudado, que se tinha operado uma metanóia colectiva e que a ética
passara a ser mais importante que a performance política. Se Nixon
tivesse admitido sem reservas nem rodeios os erros cometidos é bem
possível que a nação americana tivesse aceite a humanidade frágil do
homem quando contrabalançada pela sua estrutura ética e moral.
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conferir-lhe o estatuto de repositório das grandes virtudes éticas e ao
sobrepô-lo, de certo modo, ao ideal de nação. Um Estado virtuoso
sempre acaba por endeusar aqueles que o corporizam, o que é dizer
que a manta virtuosa do Estado cobria e justificava toda a pouca
vergonha cometida em seu nome, ou por aqueles que lhe davam
nome. De acordo com a ideologia individualista, a democracia pouco
mais era do que uma série de procedimentos organizativos,
raramente um processo de desenvolvimento.
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propriamente absolutos, ajudam-nos, todavia, a enquadrar a nossa
caminhada.
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inteligíveis, mais abertos. É, quantas vezes, uma forma de estimular
uma reacção por parte do outro.
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completamente desenvolvida, mas desenvolve-se à medida que
aprendemos a apreciar e depois a criar.
Outro dos males tem a ver com a hegemonia cultural que certos
centros poderosos de cultura exercem sobre sociedades mais
vulneráveis. Se bem que o nosso processo de desenvolvimento se
enriqueça com a exposição à pluralidade cultural do planeta, a
omnipresença de valores estéticos externos enfraquece e, por vezes,
suplanta processos locais de desenvolvimento. Daí a importância da
educação estética, preocupação que, no entanto, não parece ser de
grande prioridade, dada a sua quase ausência das nossas escolas.
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3. Emergência: a oportunidade e a possibilidade
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emprego. Aliás, já não se vive hoje uma cultura do emprego, mas
uma cultura do trabalho, que é uma coisa completamente diferente.
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requeria um trabalhador a tempo integral. Feita essa análise tornou-
se evidente que havia uma grande quantidade de trabalho à nossa
espera. Elaboramos a seguir propostas de trabalho para cada uma
das empresas. O resultado é que temos a nossa própria empresa, não
nos falta trabalho e estamos muito bem, muito obrigado.
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